gÊnero e o processo saÚde-doenÇa

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Disciplina: Gênero e Saúde Professor: Rodrigo Abreu Aula 02 GÊNERO E O PROCESSO SAÚDE-DOENÇA Vivemos num período de tumulto e transformação, no qual, em todo o mundo, as pessoas se definem, questionam e redefinem seu sentido de identidade nacional, étnica, religiosa/espiritual, política, familiar, sexual e pessoal. Por muito tempo, mudanças radicais em conceitos foram idealizadas e concebidas, levando-se em conta barreiras muito específicas. Assim, muitas pessoas também estão se liberando de velhas tiranias que vão desde governos repressores até estereótipos, segregação. Homem X Mulher As diferenças em saúde entre homens e mulheres têm sido objeto de grande interesse, mas as interpretações tendem a ser naturalizadas e essencialistas. Os estudos de gênero têm criticado essa literatura, oferecendo alternativas de análise promissoras. O gênero foi tomado emprestado da gramática, pelas feministas anglo-saxãs, referindo-se à organização social da relação entre os sexos. Durante muito tempo, as diferenças em saúde entre homens e mulheres foram naturalizadas, com base em teorias biológicas pretensamente neutras. A noção de dois sexos biológicos surgiu somente no século XVIII, quando os órgãos reprodutivos foram distinguidos em termos linguísticos e ganharam centralidade absoluta na definição das diferenças entre homens e mulheres. Até pouco, considerava-se que as discussões sobre gênero referiam-se exclusivamente a assuntos relacionados com as mulheres, ou seja, ao questionamento das definições fixas e restritivas da feminilidade. As últimas décadas deste século foram testemunhas da intensa atividade dos movimentos das mulheres, que ocasionaram grandes mudanças em diversos campos, inclusive no da Saúde. O movimento feminista deu importante contribuição, pondo em discussão a questão dos gêneros, especialmente a desigualdade entre os mesmos. Gênero X Sexo Erroneamente, usa-se sexo e gênero como sinônimos.

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Page 1: GÊNERO E O PROCESSO SAÚDE-DOENÇA

Disciplina: Gênero e Saúde

Professor: Rodrigo Abreu

Aula 02

GÊNERO E O PROCESSO SAÚDE-DOENÇA

Vivemos num período de tumulto e transformação, no qual, em todo o mundo, as pessoas se

definem, questionam e redefinem seu sentido de identidade – nacional, étnica,

religiosa/espiritual, política, familiar, sexual e pessoal.

Por muito tempo, mudanças radicais em conceitos foram idealizadas e concebidas, levando-se

em conta barreiras muito específicas. Assim, muitas pessoas também estão se liberando de

velhas tiranias que vão desde governos repressores até estereótipos, segregação.

Homem X Mulher

As diferenças em saúde entre homens e mulheres têm sido objeto de grande interesse, mas as

interpretações tendem a ser naturalizadas e essencialistas. Os estudos de gênero têm criticado

essa literatura, oferecendo alternativas de análise promissoras.

O gênero foi tomado emprestado da gramática, pelas feministas anglo-saxãs, referindo-se à

organização social da relação entre os sexos.

Durante muito tempo, as diferenças em saúde entre homens e mulheres foram naturalizadas,

com base em teorias biológicas pretensamente neutras.

A noção de dois sexos biológicos surgiu somente no século XVIII, quando os órgãos

reprodutivos foram distinguidos em termos linguísticos e ganharam centralidade absoluta na

definição das diferenças entre homens e mulheres.

Até pouco, considerava-se que as discussões sobre gênero referiam-se exclusivamente a

assuntos relacionados com as mulheres, ou seja, ao questionamento das definições fixas e

restritivas da feminilidade. As últimas décadas deste século foram testemunhas da intensa

atividade dos movimentos das mulheres, que ocasionaram grandes mudanças em diversos

campos, inclusive no da Saúde. O movimento feminista deu importante contribuição, pondo

em discussão a questão dos gêneros, especialmente a desigualdade entre os mesmos.

Gênero X Sexo

Erroneamente, usa-se sexo e gênero como sinônimos.

Page 2: GÊNERO E O PROCESSO SAÚDE-DOENÇA

Sexo refere-se à distinção biológica entre homem e mulher. No entanto, gênero compreende a

série de significados culturais atribuídos a essas diferenças biológicas.

Refere-se aos atributos, funções e relações que transcendem o biológico/reprodutivo e que,

construídos social e culturalmente, são atribuídos aos sexos para justificar diferenças e

relações de poder/opressão entre os mesmos. É importante assinalar que o gênero varia

espacialmente (de uma cultura a outra), temporalmente (em uma mesma cultura há diferentes

tempos históricos) e longitudinalmente ( ao longo da vida de um indivíduo).

Perspectiva de gênero

É importante abrir o espaço e considerar uma perspectiva de gênero em Saúde. O gênero é um

dos suportes primários, junto à classe social e à raça/etnia, ao redor dos quais organiza-se a

vida social. Raça, etnia, idade, classe social, orientação sexual, momentos históricos e região

do país são fatores que influenciam nas diferentes definições de gênero. Por isso, em vez de

usar uma definição de gênero monolítica e estereotipada , é mais apropriado falar de

masculinidades e feminilidades.

O perfil estereotipado do modelo apresenta os homens como ativos, fortes, capazes do

trabalho físico árduo, produtivos, competitivos e orientados ao mundo externo; capazes de

combater em guerras e penetrar o corpo de uma mulher.

Os homens que não possuem o físico ideal são imediatamente considerados inferiores e, por

isso, subordinados. Supondo-se – erroneamente – que estes papéis de gênero sejam universais

e absolutos. Aqueles homens que não respondem a estas premissas são tachados como

afeminados ou homossexuais . Desta maneira, os homens que não dão muita importância e/ou

rechaçam essa masculinidade rígida encontram-se em situação precária e veem-se

constantemente ameaçados por aqueles que vivem de acordo com este modelo.

Observa-se na formação familiar, uma grande porcentagem de filhos e filhas continua

aprendendo, desde muito cedo, que "o mundo da mulher é a casa e a casa do homem é o

mundo". Desconhecemos a verdadeira magnitude do dano ocasionado pelo rígido

condicionamento que impomos às crianças.

Desta maneira, aprendem a "ser homens". Afiança-se a masculinidade tal como a sociedade a

percebe e prescreve: "os homens não choram"; "ser homem (macho) suficiente para..."

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Ao contrário, as meninas não são induzidas a considerar-se "mulheres", mas a julgar-se

"mães", e provendo-as dos instrumentos necessários – bonecas, panelas, ferro de passar

roupa – que permitam desempenhar o papel que lhes é atribuído para o benefício da

comunidade em seu conjunto: o de donas de casa, esposas e mães.

A igualdade de gêneros requer a definição de novos paradigmas que, diferentemente dos

modelos atuais de masculinidade e feminilidade, não estejam predispostos a desigualdades e

contribuam para um projeto mais amplo, o de eliminar a masculinidade hegemônica como o

núcleo inquestionável, ao redor do qual gira a vida.

Os papéis sexuais estereotipados nos profissionais e instituições de saúde representam

barreiras adicionais para que os homens busquem e obtenham atenção à saúde integral. Por

isso, é necessário posicionar-se como homens e cobrir as necessidades de saúde dos filhos

homens (Korin, 1990). Reconhecer a centralidade do gênero não só em nossos pacientes, mas

também em nós mesmos, como profissionais, tem implicações importantes para a prática

clínica, a organização de serviços de saúde e as investigações (Korin, 1990; Korin & Fagan,

1995; Grimberg, 1999).