gabriel cruz de souza
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O VISÍVEL E A VISUALIDADE DO ARTESANATO DE FIBRAS VEGETAIS NO
CATÁLOGO “O PODER DAS MÃOS” (SANTA CATARINA, 1980)
Gabriel Cruz de Souza - Mestrando PPGH - UDESC1
Introdução
Este artigo pretende discutir as relações entre o visível e a visualidade do artesanato de
fibras vegetais no catálogo “O poder das mãos”. Em um primeiro momento, farei
considerações sobre o catálogo como documento iconográfico, pensando o conceito de
artesanato e as coisas artesanais como coisas vivas, que possuem capacidade própria de agir.
Ao longo do trabalho buscarei reconhecer os visuais dos artesanatos de fibras vegetais
presentes no documento, examinando o visível e a visualidade desses artesanatos a partir de
duas imagens: a das cestarias indígenas com alça e a da boneca de palha.
A partir dessas considerações, é possível questionar algumas das relações de presença e
ausência nas imagens, confrontando as relações de (in)visibilidade com os planejamentos de
Governo e com os discursos produzidos pelo Estado. O catálogo o “Poder das mãos” fornece
indícios sobre as diferentes concepções de arte e os interesses e estratégias em jogo no campo
da cultura. A sua visualidade nos permite refletir sobre como os sistemas de comunicação
visual foram ao mesmo tempo agenciadores das políticas culturais do período e espaços de
disputas por visibilidade.
O catálogo como documento iconográfico
A emergência do visual é um elemento intrigante para desafiar os historiadores a pensar
1 Licenciado e bacharel em História. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em História do Tempo Presente pela
Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, com orientação da professora Dra. Mara Rúbia Sant’Anna. Email:
sobre as suas relações com as fontes históricas e com a capacidade cognitiva das imagens.
Partindo do ponto de vista de Durval Muniz (2009), podemos tomar o catálogo “O poder das
mãos” como um discurso, que nos cede pistas sobre as suas condições de produção, sua
respectiva época e circunstância de contingência. Para investigar o visível e da visualidade do
artesanato de fibras vegetais no catálogo “O poder das mãos” utilizarei como base teórica a
grade de análise de documentos iconográficos sugerida por Sophie Cassagne (1996) e os
balanços provisórios apontados por Meneses (2003).
O catálogo “O poder das mãos” foi produzido durante um período de abertura política e
de reorientação econômica do país com o mercado internacional. Publicado na década de
1980, o catálogo fez parte de um projeto publicitário organizado pela Fundação Catarinense
do Trabalho - FUCAT e o Governo de Santa Catarina em parceria com a Fundação Roberto
Marinho. Esta edição integrou uma campanha veiculada nacionalmente pela televisão, criada
com o objetivo de divulgar e valorizar a arte do artesão catarinense.
O impresso é feito de um material resistente, de qualidade, brilhoso e colorido,
semelhante ao de revistas, com uma dimensão de 25 X 21 cm. No documento não consta
nenhuma datação específica registrada, mais consta a marca “cumprindo a carta dos
catarinenses”, o que permite chegar a uma data aproximada. O primeiro Governo de Espiridão
Amin se deu entre os anos de 1983 e 1987 com um plano de Governo que ficou conhecido
como à “Carta dos catarinenses” (AMIN, 1987). Uma das metas de Amim era articular as
tradições e as etnias da cultura catarinense com o desenvolvimento econômico. A fundação da
FUCAT2 e a criação do Programa Catarinense de Desenvolvimento do Artesanato -
PROCARTE indicam algumas das estratégias formuladas pelos governos catarinenses para
gerir a cultura do artesanato no Estado.
Intitulado como “Artesanato de Santa Catarina - O poder das mãos”, o documento
apresenta indicações bilíngüe (português/inglês) com título, sumário, uma apresentação da
edição e pequenos textos que abordam a diversidade do artesanato catarinense a partir da sua
materialidade. Os artesanatos produzidos com o barro, com os fios, com as fibras vegetais,
com a madeira, o couro e outros materiais são representados através de imagens. As suas indi
2 A FUCAT foi fundada entre 1983 e 1987, ficando responsável pela gestão do Programa Catarinense de Desenvolvimento do Artesanato - PROCARTE, criado no ano de 1979.
cações icônicas evidenciam a heterogeneidade e a materialidade dos artesanatos por meio das
fotografias3 (196 imagens) que estão acompanhadas de 06 contracapas, com legenda e uma
referência elaborada a partir de uma numeração que conta e denomina uma tipologia e um
nome para cada tipo de artesanato. Destinado a turistas, artesãos e ao público admirador do
artesanato o catálogo contém vinculações políticas, ideológicas e profissionais. As imagens e a
visualidade construída nesse documento fornecem importantes indícios sobre as relações entre
arte, política e identidade.
O conceito de artesanato pode ser empregado para compreender “os processos de
produção, ou seja, à tecnologia executada com as mãos” (LIMA, 2010, p. 25). Para o
antropólogo Ricardo Gomes Lima “todo artesanato tem a sua arte, as suas questões de estética,
contrastes e conteúdos simbólicos, com os seus significados e representações” (LIMA, 2010,
p. 25). No artesanato são as mãos que marcam e que dão forma a matéria-prima. O artesanato
não é uma simples mercadoria, é sobrevivência, técnica e criação. Ele tem a sua autoria, está
sujeito ao gesto humano e dispõe de um ritmo específico. Como uma linguagem, ele expressa
a identidade e a cultura dos lugares, dos grupos sociais e dos indivíduos.
As coisas artesanais têm um longo vínculo com o passado, mas estão em constante
transformação. Elas são coisas heterogêneas e irregulares, são coisas que tem a sua vida social,
as suas marcas, os seus usos e trajetórias. Estudos como o de Appadurai (2008) e Marcelo
Rede (2012) atestam que as coisas têm a sua agência, a sua capacidade de agir, são coisas
vivas que também significam as pessoas, os contextos e os espaços. Os artesanatos têm os
seus modos de serem vistos, os seus visuais e os seus regimes de visualidade. Dentre os
diversos tipos de artesanatos presentes no catálogo, elenquei para este trabalho o universo do
artesanato de fibras vegetais4 com o objetivo de analisar o visível e a sua visualidade no
catálogo “O poder das mãos”.
3 A fotografia do catálogo foi feita por Nilton José Passos.
Reconhecendo os artesanatos de fibras vegetais.
No catálogo o artesanato de fibras vegetais é apresentado através de 34 imagens, com um
pequeno texto e uma contracapa que reúne um pouco do universo desse tipo de artesanato.
Para analisar o visível e a visualidade do artesanato de fibras vegetais selecionei duas imagens:
a das cestarias indígenas com alça5 e a da boneca de palha6. As imagens dependem da
produção de um sujeito que a produz ou que as reconhece. De forma imaginária ou concreta,
para Joly as imagens nos levam a perseguir os “[...] seus diferentes significados mesmo que
inconscientes, subjetivos e seu poder de constituir conceitos” (JOLY, 2008, p. 19). Para
Kossoy (2005) elas são como “uma segunda realidade” que o historiador pode acionar para
investigar os fatos, os sentidos e significados construídos no espaço e no tempo. As imagens
nos possibilitam uma versão iconográfica do objeto representado.
Figura 1 - Cestarias indígenas com alça
Fonte: O PODER DAS MÃOS, 198?, p. 37.
Optei pela imagem das cestarias indígenas com alça, pois elas representam a diversidade
dos artesanatos de fibras vegetais utilitários feitos em Santa Catarina. Seja por sua materialidade
ou pela técnica do trançado, esses tipos de cestaria representam as esteiras de taboa, junco, os
cestos de taquara, as cestarias indígenas, o tipiti, as cestas, cestinhas ou cestões de vime.
4 A escolha por esse tipo de artesanato é motivada pelo meu tema de pesquisa de dissertação: As irmãs Souza e os seus artesanatos de fibras vegetais. 5 A imagem das cestarias indígenas com alça possui a numeração “109”, e está ao lado de mais três imagens, localizadas na páginas 37. 6 A imagem da boneca de palha está acompanhada de três imagens, localizada com a numeração “90” na página 33.
A imagem das cestarias indígenas com alça está localizada de maneira frontal no canto
superior direito da página, as suas formas retangulares e/ou arredondadas, as suas dimensões e
a inserção das alças nos remete a outros tipos de artesanatos como o tapete de taboa, a lixeira,
as sacolas e as fruteiras feitas de tiririca, as cestas de vime no modelo de taça, fruteira,
talqueira, para pão, roupa ou no estilo piquenique, assim como a versão de porta-azeite ou
descansador de prato confeccionados com o cipó.
As cores das fibras, assim como o verde, amarelo, vermelho e rocho são marcas étnicas
distintivas dos grupos indígenas. Dentro dos limites desse artigo cabe pontuar que existe todo
um repertório de significados presentes nos grafismos dos grupos indígenas, nesse trabalho
procuro interpretar essa diversidade de coloração como um elemento que representa a
diversidade dos lugares, dos grupos étnicos e dos sujeitos que produzem esse tipo de
artesanato em Santa Catarina.
Figura 2 - Boneca de palha
Fonte: O PODER DAS MÃOS, 198?, p. 33.
Já a imagem da boneca de palha está posicionada de forma frontal no canto superior
esquerdo da página, exemplificando outro tipo de artesanato, que alia a técnica do trançado de
fibras vegetais com a costura e o bordado. O uso de materiais como a linha, o verniz, o blush e
os botões codificam a complexidade cultural dos artesanatos produzidos em Santa Catarina
após a década de 1970. Signos como o cabelo, a boca, o nariz, os laços, a indumentária e as
formas humanas que compõe a boneca caracterizam a coisa artesanal de forma mais lúdica,
alegórica e/ou decorativa. O visual da boneca de palha representa aqui o índio, a bruxa, os
bonecos diversos, assim como o leque, as sombrinhas, as peneiras, o presépio, o quadro, o
lustre, a cortina, o leão e a coruja produzidos com uma série de materiais e conhecimentos que
envolvem a manipulação do bambu, da palmeira, da palha de milho, com a corda, o cipó e a
casca de bananeira.
As imagens selecionadas sobre o artesanato de fibras vegetais estão compostas por
intermédio de três planos. Os artesanatos estão justapostos em primeiro plano enquadrados por
um segundo plano retangular, de cor beje, semelhante a das fibras vegetais. O terceiro plano é
ordenado por um fundo branco que cria uma ambiência de neutralidade. A sua perspectiva
dispõe os elementos dos artesanatos em eixos horizontais e verticais, criando uma imagem
com um efeito de harmonia entre as cores similares as das fibras em contraste com as cores
complementares que se opõem. O tom dominante é o das fibras vegetais contrastado pelas
cores dos materiais industriais. A imagem é composta por linhas essenciais de estabilidade e
simetria do objeto representado, onde as relações de claro e escuro demonstram as diferentes
materialidades e saberes empregados na elaboração dos artesanatos. Os artesanatos são
identificados a partir de uma legenda que enumera as produções artesanais e estabelece uma
denominação para cada uma delas.
No catálogo “O poder das mãos” os agentes produtores do artesanato, assim como as suas
regiões e os seus lugares específicos de produção estão invisibilizados, localizados apenas
como procedentes do Estado de Santa Catarina. . Talvez alguns desses signos dispostos nas
imagens podem ajudar a traduzir as transformações sociais vivenciadas no período, como
podem fornecer pistas sobre os seus produtores, as suas táticas e os seus códigos de
significação. Meneses (2003) salienta que as relações entre ser ou não ser visto é um dos
insumos caracterizadores dos regimes de visualidade. O anonimato das cidades e das regiões
de Santa Catarina somado a invisibilidade dos grupos étnicos e a ausência dos artesãos e
artesãs na visualidade do catálogo retratam o modo como o Estado via as pessoas comuns, as
etnias e as tradições que remontavam o mosaico cultural catarinense.
O poder das mãos: interfaces entre o visível e a visualidade
Ao pesquisar sobre as relações entre modernidade e as tradições no Brasil Ortiz (2001)
considera a noção de “integração nacional” importante para compreender a consolidação da
indústria cultural no país. O sociólogo indaga como após as censuras o Governo Militar
começa a atuar de maneira mais efetiva junto a esfera da cultura, “[...] uma vez que
definitivamente ela passa a ser concebida como um investimento comercial” (ORTIZ, 2001, p.
144). Foram diversas às instituições e programas que surgiram com o objetivo de gerir as
políticas da cultura, como o Conselho Federal de Cultura, a FUNARTE, e o Programa
Nacional de Desenvolvimento do Artesanato - PNDA, instituído em 1977.
Em Santa Catarina, o projeto político foi implementado por governos como o de Colombo
Salles7- (1971 - 1975); Antônio Carlos Konder Reis - (1975 - 1979); Jorge Bornhausen - (1979
- 1982); Henrique Córdoba - (1982 - 1983) e Espiridião Amin8- (1983 - 1987). A integração
regional e a articulação dos interesses diante do campo econômico era uma das principais
estratégias aplicadas pelos governos estaduais da época. Percorrendo “As Veredas do Folclore”,
o historiador Thiago Sayão (2004) pesquisou como os intelectuais ligados às instituições
públicas do Estado forjaram uma identidade catarinense que promovia a diferenciação e a
valorização das sub-regiões de Santa Catarina a partir de suas particularidades culturais. Edgar
Garcia Junior (2003) examina como essas práticas construíram as regiões catarinenses como
objetos de saber e espaços de poder associados ao desenvolvimento econômico. De acordo com
7 A integração regional era uma das princípais características do (PCD) Plano Catarinense de Desenvolvimento implementado
por Colombo Salles. GOULART, 2005. 8 A “Resposta à carta dos catarinenses”, publicada no Governo de Esperidião Amin, tinha como um dos propósitos divulgar as
ações feitas para“integrar” os “pequenos” ao desenvolvimento econômico de Santa Catarina. Em sua proposta de Governo
eram considerados “pequenos” os menores carentes, pescadores artesanais, idosos e os pequenos produtores rurais e urbanos.
AMIN, Esperidião. Resposta à carta dos catarinenses. Florianópolis: Governo do Estado de Santa Catarina, 1987.
esses autores, o catarinensismo como “mosaico cultural” diluía as diferenças e as tensões
regionais do Estado em um discurso apaziguador e conciliatório que apostava na gente
catarinense e na sua diversidade cultural como potencial de mercado. Ao lançar à Carta aos
catarinenses como lema de campanha Espiridião Amin propôs uma hipótese para o seu plano
de Governo que visava” inovar” a democracia proporcionando a todos os segmentos sociais a
oportunidade de participar do poder. Em “Resposta à carta dos catarinenses” o ex-governador
destaca como uma das suas principais ações na esfera da cultura “a preservação da memória
e da identidade cultural catarinense através do apoio a todos os grupos culturais do Estado”
(AMIN, 1987).
No catalógo “O poder das mãos” o artesanato é referenciado por sua diversidade cultural
e pela criatividade do artesão catarinense,
Na grande colcha de retalhos cultural que é o artesanato de Santa Catarina, a arte do trançado é uma das mais simples e populares. Utilizando materiais como vime, raiz de imbé, palha, taboa, tiririca, taquara ou bambu, o artesão cria uma arte tradicionalmente utilitária: cestas, bolsas, tapetes e balaios. Trabalhos que nascem dos matos e brejos e da mão hábil e paciente do trançador. O artesanato é uma tradição da mais pura tecnologia caseira, trançado por homens e mulheres de núcleos indigenas e de muitas outras pequenas comunidades catarinenses [...]. (O PODER DAS MÃOS, 198?, p. 32)
A questão do artesanato envolvia estratégias políticas nas áreas da cultura, do turismo e
do trabalho. Um dos propósitos do plano de Governo era “[...] incentivar a organização, a
produção, e a comercialização integrada do artesanato, bem como a promoção das
manifestações culturais de interesse turístico [...]” (AMIN, 1987, p. 152). Se os discursos
produzidos por agentes do Governo como intelectuais e políticos buscavam propagar a
imagem de Santa Catarina como um Estado harmônico e conciliador das suas diferenças
culturais, a visualidade construída em torno do catálogo nos permite imaginar outro
panorama. As interfaces entre a presença e a ausência nas imagens funcionam como um
sistema de controle que torna visível apenas o artesanato enquanto produto cultural do Estado.
Nessas relações de (in)visibilidade pode-se ler as diferentes concepções de arte e os muitos
interesses em jogo no campo da cultura.
A concepção de arte veiculada pelo catálogo se enquadra no que Néstor Garcia Canclini
designa como a “arte para as massas”, uma arte que tem como objetivo principal a
distribuição, e por razões políticas e econômicas, “[...] interesa-lhe mais a amplitude do
público e a eficácia na transmissão da mensagem do que a originalidade da produção ou a
satisfação de reais necessidades dos consumidores” (CANCLINI, 1980, p. 49). Enquanto essa
noção preza pelo espaço e pela mercantilização, a concepção de arte popular põe a sua tônica
na produtividade e utilidade prazerosa, onde a “[...] qualidade de produção e a amplitude de
sua difusão estão subordinadas ao seu uso, à satisfação de necessidades do conjunto do povo”
(CANCLINI, 1980, p. 49). Para o autor, o popular é constituído por “[...] processos híbridos e
complexos, usando como signos de identificação elementos procedentes de diversas classes e
nações” (CANCLINI, 2013, p. 220).
Assim, o anonimato dos lugares de produção e dos produtores do artesanato pode ser visto
como uma forma de sujeição e de invisilidade, mas o visual de seus produtos e a sua presença
na visibilidade dada ao artesanato catarinense podem ser encarados como uma forma de
intervenção. Para Canclini, a arte do artista “[...] representa as contradições sociais e a
contradição do próprio artista entre a sua inserção real nas relações e a elaboração imaginária
dessa mesma inserção” (CANCLINI, 1980, p. 27). A visualidade do catálogo “O poder das
mãos” pode ser considerada um sistema de comunicação agenciador das políticas culturais do
período, mas também pode ser compreendida como um espaço de visualidade onde as
representações visuais dos artesanatos de artesãos e artesãs se tornaram visíveis no cenário
nacional e internacional provocando uma interação e atuação oblíqua dos grupos subalternos
pelos meios de comunicação.
Considerações finais
As imagens sobre os artesanatos de fibras vegetais dispostas no catálogo “O poder das
mãos” são importantes recursos para analisar os regimes de visualidade construídos em Santa
Catarina na década de 1980. As indicações bilíngüe, os planos, os enquadramentos e a
ambiência de neutralidade ordenam uma visualidade engendrada com o objetivo de
comercializar e exportar os produtos artesanais como forma de promoção cultural.
É pelo anonimato do artesão e do seu lugar de produção que é possível se desvelar a
imagem de um Estado harmônico e conciliador. As relações entre a presença e a ausência nas
imagens caracterizam o modo como as pessoas comuns, as etnias e tradições catarinenses
eram vistas pelo Estado. Mesmo invisibilizados no catálogo, os visuais dos artesanatos de
fibras vegetais nos deixam indícios sobre os saberes, a cultura e as regiões dos artesãos e
artesãs de Santa Catarina.
A visualidade do catálogo pode ser compreendida como um sistema de comunicação
visual agenciador de valores e identidades correlacionadas com as políticas culturais do
período. Apesar de controlar o que pode ou não ser visto, essa visualidade envolve diferentes
conceitos de arte e disputas por espaços de visibilidade. Assim, é pela presença dos visuais
dos artesanatos de fibras na visualidade do catálogo que os grupos subalternos atuam e
interagem pelos meios de comunicação, em outras palavras, é também por meio dessa
visibilidade que os artesãos promovem as suas identificações culturais e a arte do seu trabalho.
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