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  • Glossário

    2 www.fredericoporto.com.br

    3 Introdução 4 Desvendando o Cérebro 5 A gestão não é uma ciência exata 6 Já ouviu falar em desenvolvimento vertical? 8 Porque só treinamento não basta 9 O tamanho do nosso problema12 O Modelo Integral19 Fortalecendo o córtex pré-frontal21 Liderança triádica25 A Cereja do Bolo 28 Alinhavando tudo30 Conclusão31 Apêndice 131 Apêndice 232 Referências

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    NeuroLideraNçaCérebro, mente e gestão

    NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e gestão

    Um corpo parado tende a ficar neste estado a não ser que uma força externa o coloque em movimento. Essa é uma das leis da Física enunciadas pelo cientista inglês Isaac Newton (1643-1727). É difícil achar quem discorde dela. Mas, nas nossas práticas, muitas vezes tentamos subvertê-la. Inclusive dentro das empresas. Dito de outra forma: a grande loucura humana é fazer o que sempre fez e esperar resultados diferentes. Temos que mudar o modo de fazer se almejamos um resultado diferente.

    Todo processo de transformação começa pela mudança do modelo mental. Nasce da coragem de questionar pressupostos e verdades. Ao modificar as crenças, mudam-se os comportamentos. O avanço dos exames que permitem ver o cérebro em atividade não só confirmou essa premissa como trouxe informações surpreendentes que podem ser aplicadas ao mundo empresarial, melhorando a relação entre líderes e liderados e, consequentemente, os resultados corporativos. A Neuro Liderança foca na aplicação da neurociência para desenvolvimento de lideranças, treinamento em gestão, gestão de mudanças, educação, consultoria e coaching. Ela fornece a base para esse texto, escrito com a intenção de provocá-lo. Espero que você sinta-se incomodado, pois o que nos incomoda desafia o nosso modelo mental e assim nos obriga a sair da nossa zona de conforto – o que não é fácil.

    Na maior parte do tempo funcionamos de modo mecânico e previsível. Nossa tendência é simplificar, utilizando para isso artifícios, como estabelecer relação de causa

    e efeito onde há somente correlação. Isso acontece com uma frequência bem maior do que imaginamos. Por exemplo, em 2012 um dos mais importantes periódicos médicos, o New England Journal of Medicine, publicou o artigo intitulado “Chocolate Consumption, Cognitive Functionand Nobel Laureates”, do cardiologista Franz H. Messerli, do St. Luke’s – Roosevelt Hospital, em Nova York (EUA), mostrando a correlação entre ingestão de chocolate e número de laureados com o Prêmio Nobel. Os países campeões de consumo de chocolate apresentavam mais ganhadores deste prêmio outorgado anualmente pela Academia Sueca.

    Pode-se concluir, então, que para o Brasil ter uma respeitável galeria de premiados deveria incentivar o consumo de mais chocolate por habitante? Seguindo a mesma linha de raciocínio, se eu quiser que meu filho torne-se um pesquisador brilhante e com mais chances de ganhar um Nobel, preciso dar a ele muito chocolate? É evidente que não, mas esta dedução equivocada ocorre em muitas áreas da ciência, na maioria das vezes, sem culpa do pesquisador; a mídia faz isso por ele. O elemento oculto nessa correlação é que países que consomem mais chocolate, tem uma população com maior nível educacional, o que aumenta a chance de surgir um Nobel.

    As empresas também são afetadas. O gestor compra certas ideias e acaba dando chocolate para seus colaboradores esperando que eles ganhem Prêmios Nobéis. Seria cômico se não fosse trágico. Quer ver? Um grande número de estudos no mundo dos negócios reúne dados de empresas que mantiveram alto desempenho

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    por mais tempo. As características que os integrantes desse grupo têm em comum são identificadas e prescritas – vou repetir em maiúsculo e negrito, PRESCRITAS – a outras empresas, partindo-se do pressuposto que, se elas desenvolverem aquelas competências, também serão duradouras ou grandes, ou o quer que seja.

    A falácia neste argumento é que ninguém sabe informar quantas das milhares de organizações falidas tinham as mesmas características. Se soubéssemos poderíamos talvez concluir que algumas das tais características na verdade contribuíram para a mortalidade delas. Infelizmente, muitos best-sellers como Feitas Para Durar, Feitas para Vencer, A Estratégia do Oceano Azul, dentre outros, são vítimas desta falácia, como nos alerta o professor Phil Rosenzweig, da escola de negócios IMD, na Suíça, no livro Derrubando Mitos.

    Esse texto pretende apontar caminhos novos, tendo como ponto de partida estudos de última geração que estão elucidando como funciona o cérebro humano.

    Desvendando o CérebroNosso órgão mais nobre, sede da nossa

    consciência, o cérebro humano tem 10 bilhões de neurônios com 100 trilhões de conexões entre eles. Mesmo consumindo 20% de toda a energia que produzimos, pesa somente 2% do nosso peso. Alguns acreditam que essa complexidade talvez o torne impossível de ser compreendido na sua totalidade.

    Como disse o estatístico britânico George Box (1919-2013), “Essencialmente, todos os modelos estão errados, mas alguns são úteis”. Então, para entendermos melhor o nosso sistema nervoso central, vou usar como modelo a teoria do cérebro trino ou triuno, do médico e cientista

    norte-americano Paul MacLean (1913-2007), mesmo que existam algumas críticas com relação a ele.

    O cérebro preserva dentro de si toda a evolução neurológica de nossa espécie. De acordo com MacLean, nosso cérebro é trino, isto é, resulta da existência de três cérebros em um: o reptiliano, o sistema límbico e o córtex, sendo o córtex pré-frontal (fica atrás da testa)a parte mais sofisticada.

    O reptiliano, herdado desses animais de sangue frio, encarrega-se da respiração, digestão, batimentos cardíacos e funções motoras, dentre outras tarefas. O sistema límbico é herança dos mamíferos inferiores. Dirige as glândulas, os ritmos do corpo e as emoções. Já o córtex (ou neocórtex), a parte enrugada do cérebro, é a mais importante, a sede das nossas inteligências superiores. Compreender, memorizar, recordar, ter insights, empatia, inibir ou tomar decisões são funções do córtex e, em especial, do córtex pré-frontal.

    O cérebro inteiro é capaz de absorver 11 milhões de bits de informação por segundo, mas só temos consciência de 40 bits. Quer dizer, não temos consciência da grande maioria das ocorrências. Nossos processos inconscientes em grande parte dirigem nossas vidas. Uma metáfora hindu descreve o ser humano como um guia sentado num elefante. O guia seria a consciência, que surgiu há cerca de 300 mil anos. O elefante é a parte mais primitiva do cérebro, que surgiu há 600 milhões de anos.

  • 5NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e Gestão

    Inspirado nesta antiga metáfora, o professor de administração Richard L. Daft, da Vanderbilt University, nos Estados Unidos, uma das escolas de negócios mais prestigiadas do mundo, apresentou uma imagem mais contemporânea, a do executivo sentado em cima do elefante. O executivo interior é nossa consciência elevada, digamos, nosso CEO. O elefante interior simboliza os sistemas e hábitos inconscientes.

    A metáfora de Daft também está correlacionada ao Sistema 1 (elefante) e ao Sistema 2 (CEO interno) do psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do Nobel de Economia em 2002.

    Segundo Daft, o executivo interior tem influência limitada sobre os processos mentais e comportamentais do elefante interior. Quando nosso executivo está alinhado com nosso elefante, sentimos que estamos no controle. Mas quando pretende ir em direção diferente à que o elefante interior quer, precisa fazer muito esforço para desviá-lo. Os hábitos estão concentrados nessa parte primitiva, o elefante, por isso é difícil mudá-los.

    Por exemplo, você está querendo manter a forma e se depara com uma barra de chocolate. Se este elefante quer comer o chocolate, você vai ter que fazer muita força para resistir. O córtex talvez decida que você vai se contentar com dois quadradinhos. Mas, quando você vê, a barra desapareceu. Quem comeu foi o elefante. Entre o prazer imediato de saborear o chocolate e o benefício à saúde que virá dentro de alguns anos, ele escolhe a primeira opção. Quem toma as decisões, na maioria das vezes, e é vítima de vários vieses, é o elefante e não o executivo. Os vieses são vícios da mente, do elefante, que impedem nossas decisões de serem racionais. O mesmo acontece quando ele quer ficar deitado no sofá em vez de praticar exercício físico.

    Outro exemplo: quando ficamos com raiva, o elefante toma conta como se

    o executivo tivesse sido desconectado. Somos vítimas desse processo, que impacta nossas vidas e a produtividade. Elefantes interiores têm um radar para ameaças no ambiente e julgam, concluem e reagem de maneira instantânea baseados em pequenos pedaços de informação. Resumindo: Decidimos emocionalmente e justificamos racionalmente.

    Ao examinar o cérebro de pessoas enquanto tomavam decisões, pesquisadores mostraram que as regiões do cérebro responsáveis pela tomada de decisão são ativadas antes de as pessoas estarem conscientes da decisão tomada. E que a racionalização da decisão é construída depois do fato. Por isso, os líderes muitas vezes adotam comportamentos insensatos mesmo estando cientes da melhor opção.

    Para Daft, o grande desafio da liderança não é descobrir o que fazer, mas fazer o que sabe que vai produzir ótimos resultados. “O desafio é aprender a liderar a si mesmo (grifo do autor) para fazer o que é preciso quando necessário”.

    A única parte do cérebro capaz de inibir o elefante é o guia/executivo. À medida que o córtex pré-frontal se fortalece, pode gradualmente substituir os pensamentos indesejados e as respostas automáticas.

    Neste texto você aprenderá como fazer uso do potencial máximo do nosso córtex pré-frontal, ou da nossa cognição, para atingir resultados mais consistentes.

    A gestão não é uma ciência exataA demanda sobre os profissionais cresce

    vertiginosamente. Como o indivíduo não será capaz de possuir todo o conhecimento necessário para entregar os resultados esperados torna-se fundamental a habilidade de trabalhar em equipe. Há, também, uma necessidade crescente de profissionais em cargo de liderança. A gestão não é uma ciência exata, mas nem por isso deixa de ter princípios a serem seguidos.

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    Não há uma fórmula única e precisa para o sucesso. Mas acreditar na existência desse modelo reduz a insegurança de ter de lidar com variáveis sobre as quais não temos controle, como rupturas tecnológicas, concorrentes e mercado instável. Também é ilusório supor que um profissional seja capaz de adquirir os requisitos necessários para liderar uma equipe passando apenas pelos treinamentos convencionais. O que falta, então?

    De acordo com o conceito largamente disseminado hoje, de “Pipeline de Liderança”, elaborado pelos consultores Ram Charan, Stephen Drotter e James Noel, um profissional se desenvolve por sete níveis, a partir do nível de autogestão, passando para gestor de outros, daí para gestor de gestores, depois gerente funcional, então gerente de negócios, gerente de grupo e, finalmente, gestor corporativo. As seis passagens de um nível para outro seriam passagens profissionais críticas para o sujeito e para a organização. Elas requerem o desenvolvimento em três dimensões: habilidades, aplicações do tempo e valores profissionais.

    Por exemplo, ao passar de gestor de si para gestor de outros, o profissional deve adquirir novas habilidades, dentre elas, a capacidade de dar feedback aos subordinados. Seu tempo também terá de ser alocado de forma diferente. Em vez de apenas se concentrar na tarefa diária e mais operacional, ele terá de abrir espaço na agenda para desenvolver a equipe e atentar, por exemplo, para o planejamento estratégico anual. Seus valores também precisam mudar: ele terá de reconhecer o trabalho dos outros em vez de valorizar somente o seu e ser capaz de se realizar através das outras pessoas.

    Aparentemente, essas três dimensões poderiam ser adquiridas e consolidadas via treinamento, mas com frequência não é o que se verifica na prática. Nesse texto pretendo apresentar uma hipótese do que possa ser o link faltante para se ter uma melhor compreensão desse processo. Apesar

    de o “Pipeline da Liderança” ser uma boa ferramenta de diagnóstico nas empresas e ter efeito motivacional–permite avaliar em que posição cada profissional se localiza, se está trabalhando no nível certo e quais comportamentos e atitudes são necessários para avançar na carreira – não prevê outra variável impactante conhecida como complexidade cognitiva.

    Já ouviu falar em desenvolvimento vertical?

    Para se ter ideia das implicações da complexidade cognitiva, vamos considerar apenas a dimensão aplicação do tempo. Segundo Charan, Drotter e Noel, o gestor de si tem foco na tarefa diária, já o gestor de outros tem foco no planejamento anual. Essa diferença em Time Span é muito grande.

    Time Span (horizonte temporal) seria a tarefa mais longa em tempo que uma pessoa conseguiria fazer, ou que estaria sob a responsabilidade de determinado cargo ou função. Essa métrica foi descoberta pelo psiquiatra canadense e criador do conceito de Organização Requerida, Elliott Jaques (1917-2003), que se dedicou ao estudo das relações organizacionais, lançando as fundações do conhecimento científico que nos permite explicar e predizer o comportamento humano nas organizações.

    O Time Span de um dia, que é exigido para uma tarefa de um gestor de si, está dentro da complexidade cognitiva de 80% da população adulta, ao passo que o de um ano, necessária para um gestor de outros, está presente em somente 4% das pessoas. A partir disso, já dá para imaginar a dificuldade de encontrar gestores capazes. Jaques defendia que a complexidade da tarefa tem de ser alinhada à complexidade do indivíduo. Ou, dito de outro modo, a organização é mais produtiva quando as pessoas têm tarefas que estão de acordo com sua complexidade.

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    Aliás, historicamente, o conceito do Pipeline surgiu a partir dos trabalhos que Elliott Jaques realizou na indústria inglesa de canos e peças para motores Glacier Metals nos anos 1950. Foi o que me contou Ken Shepard, presidente da Global Organization Design Society, associação de acadêmicos, empresários e consultores que praticam a Organização Requerida, durante uma conversa que tivemos. Os estudos de Jaques não pararam por aí, eles se estenderam por anos. O tema da complexidade cognitiva surgiu décadas depois. Portanto, o Pipeline sem a questão cognitiva é um modelo faltando um pedaço muito importante, como verão nas páginas seguintes.

    O desenvolvimento da complexidade cognitiva faz parte do que alguns autores chamam de desenvolvimento vertical, enquanto o das competências é chamado desenvolvimento horizontal. O desenvolvimento vertical refere-se à capacidade de pensar de forma cada vez mais complexa, sistêmica e estratégica.

    Segundo o psicólogo suíço Jean Piaget (1896-1980), a partir do nascimento a criança passa por quatro estágios progressivos de desenvolvimento da cognição, que vão

    transformando a lógica infantil em lógica do adulto. Em cada estágio ou nível, ela tende a pensar de modo mais complexo e sofi sticado do que no estágio anterior e assim vai se tornando capaz de lidar com problemas de difi culdade crescente. Por exemplo, aos 6 anos, ela ainda não consegue entender o conceito de volume, mas a partir de 7 anos sua capacidade de abstração já permite compreendê-lo, como se pode observar nesse vídeo: https://bit.ly/2sxwnO6.

    Piaget acreditava que o processo de desenvolvimento cognitivo seria encerrado na adolescência, com a aquisição do Estágio Operacional Formal. Os novos estudos da neurociência têm mostrado, porém, que o amadurecer cognitivo prossegue ao longo da vida. Pensadores, como o pedagogo de Harvard, Robert Kegan, o acadêmico e consultor Bill Torbert e o próprio Jaques, verifi caram que os estágios continuam, Esses pensadores seriam como um Piaget do adulto, mesmo organizando os estágios ou níveis de maneiras diversas.

    Na visão de Kegan, seriam três os níveis de desenvolvimento vertical de um adulto, como demonstra o gráfi co a seguir:

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    Por sua vez, Torbert apontou a existência de sete níveis de desenvolvimento do mindset, e em trabalhos mais recentes acrescentou um oitavo, que está em estudo, conforme demonstra a gráfi co acima. Observe-se que a maioria dos adultos norte-americanos acompanhados em suas pesquisas localizam-se entre os níveis 3 e 4:

    Uma das diferenças fundamentais entre o modelo de Elliott Jaques e de outros, como Kegan e Torbert, era que ele não considerava que ao alcançar um nível cognitivo mais complexo, a pessoa teria, por causa disso, moral mais elevada, ou melhores habilidades interpessoais, ou mais facilidade em ser autêntico, dentre outras características.

    Ou seja, a cognição não tem nada a ver com outras questões, como moral ou valores pessoais. Se fosse assim, não teríamos líderes de facções criminosas extremamente inteligentes, mas com valores no mínimo

    questionáveis. As páginas da história descrevem dirigentes políticos engenhosos que cometeram genocídios. Resumindo: uma pessoa pode ter cognição sofi sticada e moral primitiva, ou cognição sofi sticada e ser pouco amadurecido emocionalmente.

    Portanto, embora a linha da cognição apontada por Jaques seja extremamente relevante, talvez a mais importante – daí o destaque ao desenvolvimento vertical – quero deixar registrado, desde o início deste texto, que só ela não consegue resolver todos os desafi os enfrentados pela humanidade. Ela é necessária, mas não sufi ciente.

    Porque só treinamento não bastaA realidade com a qual nos deparamos

    atualmente está sendo descrita pela sigla V.U.C.A. (em inglês). Segundo esta visão, o mundo atual apresenta quatro características

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    principais, que configuram também quatro tipos distintos de desafios e, que por, sua vez, demandam diferentes respostas:

    * Volátil: as mudanças são rápidas, inesperadas, em larga escala e de duração desconhecida;

    * Uncertain (incerto em inglês): faltam informações gerais, o futuro não pode ser previsto;

    * Complexo: os desafios são potencializados por muitos fatores; há diversas variáveis e partes interconectadas, embora não se consiga estabelecer relação de causa e efeito.

    * Ambíguo: há pouca clareza sobre o significado dos eventos e os efeitos que podem trazer. Não há precedentes.

    Lidar com o aumento da complexidade do ambiente profissional e perceber que suas organizações não estavam equipadas para tal tarefa foram as principais preocupações apuradas por um estudo com 1500 executivos realizado pela IBM entre 2006 e 2008.

    O desenvolvimento vertical é necessário para enfrentar desafios cada vez mais complexos. Já dizia o físico Albert Einstein (1879-1955), “o problema não pode ser resolvido no mesmo nível de consciência em que foi criado”.

    De modo geral, os treinamentos focam apenas o desenvolvimento horizontal. Então o profissional que precisa dar um salto de complexidade, continua exatamente no mesmo patamar. Em minha opinião, seria esse um dos motivos porque se gasta tanto em treinamento no Brasil e no mundo e muitas vezes se obtêm resultados aquém do esperado. Segundo estudo divulgado pela revista Época Negócios, as empresas brasileiras estão preocupadas em qualificar suas equipes. O valor investido por funcionário em treinamento

    e desenvolvimento foi de R$ 624 em 2016, 24% a mais do que no ano anterior. Ainda assim, a média brasileira de investimentos no desenvolvimento dos profissionais está abaixo da média norte-americana, que é de U$ 1.229 por colaborador.

    Não basta investir mais. É preciso investir melhor. Para o consultor neozelandês Nick Petrie, do Center for Creative Leadership(CCL), “o objetivo do desenvolvimento vertical não é adicionar mais (capacidades e habilidades) ao copo, mas aumentar o tamanho do copo”. Portanto, o fator limitante deixa de ser o conteúdo (conhecimento do líder) e passa a ser o cálice (a mente do líder). Em vez de apenas “transferir informação”, busca-se a “transformação” do líder.

    O tamanho do nosso problemaMergulhado nesse mundo V.U.C.A., o

    Brasil se defronta com um desafio ainda maior, visto que:

    * A produtividade brasileira é 81ª do mundo. O ranking de 2016, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial em parceria com a Fundação Dom Cabral, avaliou 138 países. Em quatro anos, o Brasil caiu 33 posições devido ao agravamento da crise econômica.

    * O Brasil fica muito atrás do país mais produtivo do mundo, os Estados Unidos. São necessários quatro trabalhadores brasileiros para produzir o mesmo que um trabalhador americano.

    * Dentre os problemas que impedem o aumento da eficiência produtiva, destacam-se a baixa qualificação do trabalhador e o chamado Custo Brasil (elevada e complexa carga tributária, excesso de burocracia e falta de infraestrutura, com ferrovias insuficientes e estradas em condições precárias, o que acarreta altos custos logísticos).

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    * Grande parte da baixa produtividade é creditada ao baixo nível educacional do brasileiro.

    Uma das formas de avaliar o nível educacional do brasileiro é por meio dos dados levantados pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA, na sigla em inglês). Trata-se de uma prova coordenada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que acontece a cada três anos e oferece um perfi l básico de conhecimentos e habilidades dos estudantes para oferecer indicadores de monitoramento dos sistemas de ensino ao longo dos anos.

    Na edição mais recente, de 2015, a prova foi aplicada em 70 países, incluindo o Brasil: 23.141 alunos de 15 anos, de 841 escolas brasileiras, fi zeram o PISA. Comparada à prova anterior, os estudantes brasileiros tiveram queda de pontuação nas três áreas avaliadas: ciências, leitura e matemática. Com isso, o país caiu ainda mais no ranking mundial: fi cou na 63ª posição em ciências, entre a Indonésia e o Peru, na 59ª em leitura, entre a Jordânia e a Albânia, e na 66ª colocação em matemática, entre a Jordânia e a Macedônia. O país campeão nas três áreas avaliadas foi Singapura.

    Os resultados dos estudantes em ciências e leitura são distribuídos em uma escala de sete níveis de profi ciência (1b, 1a, 2, 3, 4, 5 e 6). Em matemática, a escala vai de 1 a 6. De acordo com a OCDE, o mínimo esperado é o nível 2, considerado básico para “a aprendizagem e a participação plena na vida social, econômica e cívica das sociedades modernas em um mundo globalizado”. No Brasil, em todas as três áreas, mais da metade dos estudantes fi caram abaixo do nível 2: 56,6% em ciências, 50,99% em leitura e 70,25% em matemática.

    Vamos nos deter um pouco mais sobre os resultados apresentados em matemática, mostrados na tabela a seguir, extraída do relatório O Brasil no Pisa: Análise e Refl exões sobre o desempenho dos estudantes brasileiros, publicado pelo Ministério da Educação. O documento compara os resultados brasileiros com os de países da América Latina que tiveram resultados válidos no PISA 2015 (Colômbia, Costa Rica, Chile, México, Peru, Uruguai e República Dominicana), com os de três países que se destacam por apresentar resultados próximos à média dos membros da OCDE (Estados Unidos, Espanha e Portugal) e com três países com resultados superiores à média dos da OCDE (Canadá, Coreia do Sul e Finlândia). O campeão, Singapura não foi incluído nessa comparação.

  • 11NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e Gestão

    Como se pode observar, 44% dos alunos brasileiros ficaram abaixo do nível 1,

    27% no nível 1;

    17% no nível 2;

    9% no nível 3;

    3% no nível 4.

    Se fizermos uma correlação com a população brasileira economicamente ativa (segundo o IBGE, 104.258 milhões em setembro de 2017), teremos:

    45,873 milhões com proficiência abaixo do nível 1

    28,199 milhões no nível 1;

    17,723 milhões estão no nível 2;

    9,383 milhões no nível 3;

    3,124 milhões no nível 4

    O Relatório Nacional PISA informa que só no nível de proficiência 3, os estudantes “são capazes de executar procedimentos descritos com clareza, inclusive aqueles que exigem decisões sequenciais”. Desse nível em diante, eles “conseguem selecionar e aplicar estratégias simples de resolução de problemas”, “interpretar e utilizar representações baseadas em diferentes fontes de informação e raciocinar diretamente a partir delas” e ainda “desenvolver comunicações curtas que relatam interpretações, resultados e raciocínio”.

    Os atributos que acabam de ser descritos são absolutamente necessários para a sobrevivência e o sucesso das empresas. Porém, na nossa correlação, apenas 12,507 milhões de brasileiros apresentariam essas características.

    Calcula-se que em 2017 existam no país quase 21 milhões de empresas ativas. Pouco mais da metade, 57%, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, são MEI (Micro Empreendedores Individuais), ou seja, 11,97 milhões. Restam, então, 9.030.000 empresas micro, pequenas,

    médias e grandes. Se fizermos uma divisão rápida para saber quantas pessoas com proficiência 3 encontramos, em média, nessas empresas (dividindo 12.507.000 por 9.030.000), chegamos ao número de 1,38 pessoas por empresa. Evidente que essa distribuição é apenas figurativa, pois as grandes empresas absorvem a maior parte desta mão de obra.

    A conclusão é que falta gente com capacidade de pensar e resolver problemas, o que é imprescindível nesse mundo V.U.C.A.. Há um gap entre a complexidade das tarefas a serem enfrentadas e a capacidade mental dos encarregados de realizá-las.

    Os dados apresentados apontam um déficit cognitivo que terá impacto direto na trajetória das empresas e a necessidade do desenvolvimento vertical em todos os níveis da organização. Adquirir competências, leia-se MBAs, Pós Graduações, workshops, eventos motivacionais, não é suficiente para o desenvolvimento cognitivo vertical.

    Para as organizações prosperarem nesse mundo V.U.C.A., os programas de treinamento não podem se limitar à aquisição de habilidades. Como assinala Petrie, “será necessário ter líderes que combinem a mente sábia para escolher as estratégias certas (desenvolvimento vertical) com as habilidades e experiências para executá-las (desenvolvimento horizontal)”. Portanto, o Santo Graal é encontrar métodos que estimulem o desenvolvimento vertical e horizontal, ao mesmo tempo.

    De acordo com Kegan, o aprendizado vertical catalisa um crescimento quântico na complexidade mental. “Isso radicalmente melhora a habilidade do líder de navegar no atual contexto altamente complexo, ambíguo e instável e, mudando rapidamente, em efeito cascata, essas novas competências em toda a organização”. O desenvolvimento vertical transforma como o líder pensa, sente e faz sentido no mundo.

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    Surge, então, a questão inevitável: é possível acelerar esse desenvolvimento? E na sequência, a pergunta premiada: como fazê-lo? Para a primeira pergunta, não há consenso. Segundo Jaques, que foi quem juntou a maior quantidade de dados, a resposta é NÃO. Mas, como verão adiante, ainda assim, fazendo uso da teoria, podemos tornar as organizações muito mais saudáveis e produtivas.

    Para os que acreditam que sim, a ideia é que para tal precisamos de um novo sistema operacional muito mais abrangente e inovador. Segundo o filósofo norte-americano Ken Wilber, quanto mais perspectivas pudermos incluir na nossa consciência, mais duradouras serão as mudanças e melhores as transformações que poderemos criar.

    O Modelo Integral“TODA CLASSIFICAÇAO É UMA

    INJUSTIÇA”, afirmou a psicóloga norte- americana Jane Loevinger (1918-2008). Porém, como a mente não tem como não classificar, a saída talvez seja ter consciência de como estamos classificando e preferir categorias mais abrangentes. Vamos conhecer agora uma classificação integral.

    Ken Wilber se propôs a reunir todo conhecimento disponível ao ser humano

    em um modelo capaz de conectar diversas disciplinas (dentre as quais Psicologia, Medicina, Educação e Negócios). Batizado de Modelo Integral, ele constitui um mapa didático para olhar a realidade e compreendê-la sob várias perspectivas.

    Este filósofo considera a mente humana incapaz de criar algo completamente errado. Sendo assim, todos estão certos, nem que seja parcialmente: “Assumo que cada abordagem é verdadeira, mas parcial e, então, tento visualizar como encaixar estas verdades parciais, como integrá-las. Ao invés de escolher uma e me livrar das outras”.

    A abordagem integral oferece a possibilidade de aprender a refinar seu autoconhecimento a fim de lidar com mais clareza com suas fraquezas e forças, como também reconhecer e lidar melhor com as fraquezas e forças dos outros, sejam eles liderados, líderes ou pares. É um novo mapa para olhar a realidade.

    O Modelo Integral apresenta cinco componentes: quadrantes, níveis, linhas, tipos e estados. A seguir vamos abordar cada um deles.

    1. Quadrantes. Toda realidade deve ser analisada, pelo menos, sob quatro perspectivas: duas interiores e duas exteriores; duas individuais e duas coletivas, como se pode observar na tabela a seguir.

    Interior Exterior

    Individual

    Subjetivo Objetivo

    Intencional Comportamental

    O que eu experiencio? O que eu faço?

    Psicologia Biologia

    Coletivo

    Intersubjetivo Interobjetivo

    Cultural Social

    O que nós experenciamos? O que nós fazemos?

    Antropologia Sociologia

  • 13NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e Gestão

    Nos quadrantes, exterior é tudo o que se pode medir objetivamente na vida, como taxa de colesterol e faturamento da empresa; interior é o que tem que perguntar ao outro, não há acesso à informação sem que o outro fale. Deste modo,

    • Exterior Individual diz respeito ao mundo objetivo;

    • Interior Individual refere-se à realidade subjetiva;

    • Coletivo Exterior remete ao que pode ser medido no grupo (social), realidade interobjetiva;

    • Coletivo Interior abrange os valores do grupo, a cultura da empresa, realidade intersubjetiva.

    Os quadrantes comportam diversas disciplinas. A análise considerando as quatro perspectivas evita reducionismos, como supor que só a biologia determina o comportamento humano ou, no outro extremo, que o que conta apenas é a cultura.

    Um exemplo é a ideia usual de que toda violência no Brasil decorre da pobreza, reduzindo-se a reflexão ao quadrante social. Daí como responder à pergunta: Por que na Índia, que é muito mais pobre que o Brasil, não há tanta violência? A resposta possível – por causa da cultura – inclui outro quadrante. Seria o caso, então, de indagar: qual o componente da nossa cultura que favorece a violência? Será o senso de impunidade?

    Se aplicados ao mundo empresarial, os quadrantes podem ser utilizados para analisar o comportamento de um funcionário. No quadrante Objetivo, pode-se verificar se ele atinge as metas. Já no Subjetivo, investigar se ele entende o significado do seu trabalho, seja como colaborador ou como gestor. No Cultural, analisar a cultura da empresa. E, finalmente, no Social, como são os sistemas e processos que determinam as tarefas realizadas na organização.

    O ideal é que os quatro quadrantes estejam alinhados, isto é, que o comportamento

    do indivíduo e suas crenças em relação ao trabalho estejam em sintonia com a cultura e os processos da empresa. Quando as quatro dimensões estão alinhadas, a capacidade de gerar resultados é muito maior e estes têm mais impacto.

    Por exemplo, uma empresa quer aumentar suas vendas. Para isso, lista as competências que quer desenvolver e como medi-las (quadrante individual exterior-objetivo), procura compreender as crenças e os valores dos seus vendedores e gestores (quadrante individual interior-subjetivo)e ver se estão alinhados. Avalia se a cultura (quadrante coletivo interior-intersubjetivo) da empresa dá sustentação (uma cultura mais relacional não vai apoiar maior competitividade) e, por último, se as métricas da empresa, sistemas e processos (quadrante coletivo exterior-interobjetivo), bônus, metas, estão alinhados com as competências que pretende ver em seus colaboradores.

    Todos nós temos preferências por perceber o mundo através de um ou dois destes quadrantes, em detrimento dos demais. Em geral, pessoas que trabalham com RH têm preferência pelos quadrantes interiores, tanto individuais quanto coletivos, por isso buscam resolver as questões também através destes quadrantes, promovendo treinamentos de competências, coaching, trabalhos de integração de equipe e de mudança de cultura. O quadrante exterior coletivo normalmente é um ponto cego, como mostrarei mais à frente. Muitas vezes, desconsidera-se como o desenho organizacional e métricas não sistêmicas impactam profundamente o comportamento das pessoas.

    Se quiser refletir mais sobre esse tema, procure no Apêndice o item 1*.

    2. Níveis. Referem-se aos estágios alcançados durante o processo evolutivo, quando algo caminha para maior complexidade. Por exemplo, átomos passam a

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    moléculas, moléculas passam para células e seres vivos unicelulares e assim até chegar aos seres vivos multicelulares. Um processo de transcendência e inclusão de níveis de complexidade inferiores por níveis de complexidades superiores.

    Uma imagem que representa essa ideia é a de círculos concêntricos, onde cada novo círculo inclui o anterior.

    O que chamamos de desenvolvimento vertical passa por níveis, como vimos anteriormente. Níveis servem como escalas para as linhas de desenvolvimento e o centro de gravidade do nosso eu atual, seria como uma média do nosso desenvolvimento nas diversas linhas – é o que veremos logo adiante.

    Nos anos 1950, o psicólogo norte-americano Clare Graves (1914-1986) definiu essa evolução na mente humana como um “processo espirálico, emergente e oscilante, marcado pela progressiva subordinação de antigos sistemas de comportamento de ordem inferior por outros de ordem superior à medida que os problemas existenciais mudam”. Ainda segundo este autor, a cada nível de complexidade, a pessoa prefere aprender de forma diferente, portanto deve ser gerenciada também de forma diferente. Isso seria um modo de demonstrar respeito ao nível em que a pessoa se encontra.

    A tabela a seguir traz um resumo dos principais níveis e suas características, que Wilber entende existirem, e aos quais nomeia pelas cores do espectro luminoso.

    Cores

    Nome Características

    INFRAVERMELHO

    • Pré-verbal, pré-espacial (comum nos bebês);

    • Arcaico;

    • Satisfação das necessidades básicas de sobrevivência.

    MAGENTA

    • Satisfação do desejo;

    • Pensamento simbólico e mágico;

    • Ritualista;

    • Necessidade de segurança.

    VERMELHO

    • Agressivo;

    • Imediatista;

    • Impulsivo e egocêntrico;

    • Prioriza suas necessidades e desconsidera as alheias.

    ÂMBAR

    • Aparece com a agricultura;

    • Cognição no mundo concreto;

    • Só vê “branco” ou “preto”; é dicotômico;

    • Emergência das religiões;

    • Cultua valores tradicionais, a lei e a disciplina;

    • Respeita hierarquia;

    • Tem organização e propósito;

    • Traz ordem e estabilidade;

    • Controla a impulsividade pela culpa.

  • 15NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e Gestão

    LARANJA

    • Capacidade de operar sobre os objetos;

    • Base do pensamento científico, por hipóteses;

    • Pensamento multiplístico, possibilidades múltiplas;

    • Racional, competitivo e motivado para o sucesso;

    • Joga para ganhar;

    • Manipula recursos naturais para gerar riqueza.

    VERDE

    • Pluralístico, multicultural;

    • Perspectivas são relativas;

    • Busca consenso,diálogo e harmonia;

    • Procura de paz interior;

    • Tem senso de justiça e se preocupa com o planeta;

    • Prega a igualdade.

    TEAL

    • É o primeiro nível a reconhecer e aceitar todos os anteriores;

    • É o primeiro a não precisar defender o seu ponto de vista agressivamente;

    • Autonomia e estratégia;

    • Liga a teoria com a prática;

    • Procura feedback;

    • Consegue ver o paradoxo do relativismo e universalismo;

    • Interativo e criativo, vê o todo, o curto e o longo prazo;

    • Interessa-se por si sem prejuízo aos outros.

    • Aceita verdades conflitantes;

    • Estima-se que apenas 2% da população estejam neste nível.

    Turquesa

    • Ligação entre meta-sistemas;

    • “Highermind”;

    • Começa a ver o ego como uma limitação de crescimento;

    • Redução da tentativa de estabilizar o ego;

    • Procura mudança pessoal;

    • Pensamento holístico e intuitivo;

    • É holístico, intuitivo, individualizado, mas incorporado ao todo;

    • Prioriza a união mente e espírito;

    • Estima-se que menos de 1% da população esteja neste nível.

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    Para mostrar como os níveis se traduzem na prática das organizações, vamos imaginar uma equipe de vendas formada por indivíduos no nível vermelho. Agressivos e autocentrados, eles vivem brigando entre si. Para canalizar essa energia de modo mais produtivo, a empresa poderia promover uma atividade no nível superior, o âmbar, com o objetivo de alimentar o sentido de pertencer a um grupo. Por exemplo, criar um time de futebol da empresa para que todos se alinhem e se tornem uma equipe, além de terem regras para seguirem no jogo. Não adianta fazer um treinamento que proponha abraçar árvores ou emocionar os participantes, que pertence ao nível verde e é muitas vezes usado como panaceia.

    Mais um exemplo: a história da adminis-tração transpôs para o mundo corporativo a hierarquia seguida nos exércitos e na Igre-ja. E assim surgiram os organogramas. Mas à medida que as condições de existência fi caram mais complexas, os gestores foram percebendo que não dá para levar algumas regras ao pé da letra. E do âmbar evoluíram para o laranja. Em vez de se concentrarem na efi ciência (fazer certo as coisas), passaram a focar na efi cácia (fazer as coisas certas). As empresas mais bem--sucedidas da atuali-dade dominam o nível laranja. Percebem o mundo de modo mais fl exível e com maior possibilidade de ga-nhos. Sabem fazer marketing; posicio-nam-se no mercado.

    O nível verde res-gata conhecimentos magenta e âmbar, busca a conexão en-tre as pessoas e o mundo que as cerca. Geralmente rejeita o

    nível laranja. No próximo salto, porém, do verde para o teal, percebe-se que o cami-nho não é guerrear com a tecnologia, mas incorporá-la para ter um mundo mais sus-tentável. As empresas buscam o chamado lucro consciente. Não negam o laranja, mas o integram com a perspectiva verde, do todo. Esse é um salto maior e mais difícil. Um belo exemplo seria o Banco Grameen, de Muhammad Yunes, o chamado banqueiro dos pobres, ganhador do Nobel da Paz em 2006. Eu me pergunto: será que no teal em vez da ausência de hierarquia, como muitas vezes é apregoado, não teria uma hierarquia saudável, que tenha sido estudada cientifi -camente? Por incrível que pareça, Jaques se propôs a pesquisar exatamente isso.

    Como empresa com uma cultura mais laranja, podemos citar a Ambev. Por sua vez, a Natura tem fortes traços verdes e teal.

    Esse padrão evolutivo acontece em várias áreas da realidade, no caso, nos quadrantes, então podemos dizer que níveis se manifestam nos quadrantes. Como na fi gura abaixo:

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    Há várias formas e modelos de expressar esses níveis. A figura demonstra que, na medida em que vai ficando mais complexo, há um aumento dos círculos crescentes, desta forma englobando mais da realidade, por isso esses níveis podem ser divididos, por exemplo, em egocêntrico (engloba somente o eu), etnocêntrico(engloba o nós), globocêntrico (engloba todos nós) e kosmocêntrico (engloba tudo que existe). Outra forma de olhar os níveis seria: físico, emocional, mental, espiritual.

    3. Linhas. Elas navegam pelos níveis, e como dito anteriormente, eles servem de escalas para as linhas, determinando os ritmos de desenvolvimento das pessoas em áreas diversas. Segundo Wilber, existem várias possíveis linhas, como a cognitiva, a moral, a de necessidades etc., que foram estudadas por grandes teóricos. Por exemplo, cada uma das inteligências múltiplas do modelo de Howard Gardner seria uma linha, como veremos logo mais.

    O psicólogo Jean Piaget concentrou-se na linha cognitiva, elucidando como se desenvolve na infância a capacidade de pensar. Hoje já se sabe que esse desenvolvimento continua na idade adulta, como foi explicado anteriormente. A cada cinco anos, podemos dar um salto de complexidade cognitiva. Esses momentos provocam as crises cíclicas que atravessamos ao longo da vida.

    Lawrence Kohlberg (1927-1987), psicólogo da Universidade Harvard (EUA), estudou os estágios de desenvolvimento moral, evoluindo em níveis de complexidade. Segundo esta visão, um chefe de facção criminosa não tem uma moral somente diferente de um líder religioso como Dalai Lama. Sua moral é menos complexa, menos universal e menos inclusiva.

    O psicólogo norte-americano Abraham Maslow (1908-1970) criou a hierarquia de necessidades humanas, representada por uma pirâmide dividida em cinco níveis, indo das mais simples, na base, as necessidades fisiológicas (como fome e sono), passando pela necessidade de segurança, de laços sociais (amor, amizade), de estima, até chegar à mais complexa, no topo, de autorrealização.

    O cientista norte-americano Howard Gardner produziu forte impacto na área da Educação ao divulgar sua teoria das inteligências múltiplas, no início dos anos 1980. Com base na sua formação em Psicologia e Neurologia, ele demonstrou a existência de sete tipos de inteligência. Os testes de QI medem apenas duas delas (lógico-matemática e linguística). Cada pessoa seria resultado de uma combinação particular dos vários tipos.

    As sete inteligências são: lógico-matemática (própria dos matemáticos e físicos, é a capacidade de raciocínio lógico), linguística (típica dos poetas e escritores, caracteriza-se pelo domínio da expressão verbal), espacial (comum em escultores e pilotos de avião, confere um sentido de movimento, localização e direção), musical (própria dos compositores, possibilita domínio de expressão com sons), corporal-cinestésica (presente nos atletas, permite melhor controle dos movimentos corporais), intrapessoal (habilidade de administrar os próprios sentimentos) e interpessoal (capacidade de ter empatia e se relacionar com outras pessoas).

    Gardner argumenta que a identificação das inclinações de uma pessoa ajuda a planejar experiências a fim de consolidar seus potenciais, superar suas fraquezas e adquirir novas habilidades. Por exemplo, temos grandes atletas que mal conseguem se expressar em sua língua nativa.

    No que se refere especificamente à capacidade de lidar com outras pessoas, o psicólogo, jornalista e escritor norte-

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    americano Daniel Goleman cunhou o termo inteligência emocional, que seria uma mistura das inteligências intra e interpessoais de Gardner. O termose difundiu com a publicação do livro de mesmo nome em 1986. Para esse autor, a inteligência emocional é a grande responsável pelo sucesso ou insucesso dos indivíduos, já que a maioria das atividades humanas requer relacionamentos entre pessoas. Afabilidade, compreensão, gentileza e controle emocional facilitam essas interações. Já a falta dessas características prejudica as relações e, consequentemente, os resultados. É o que se constata em equipes lideradas por gestores brilhantes, técnica ou intelectualmente, porém sem tato para lidar com os colaboradores.

    Deste modo, há várias linhas. As pessoas têm ritmos diferentes de desenvolvimento em cada uma delas e é comum um mesmo ser humano estar em níveis diversos em linhas distintas.

    Quero chamar a atenção para um detalhe interessante. Os diversos modelos que abordam o chamado desenvolvimento vertical, seja a Dinâmica da Espiral, inspirada no trabalho de Clare Graves, assim como o de Robert Kegan e o de Bill Torbert, associam ao nível diversas características além da cognitiva – como já havia pontuado anteriormente. Um bandido pode ter uma cognição no teal e a moral no vermelho. Neste caso,na linguagem do Modelo Integral, estaria me referindo a duas linhas diferentes. Importante abrir um parêntese e destacar que Wilber transformou vários desses modelos em meras linhas em seu Modelo Integral. A Dinâmica da Espiral, por exemplo, passou a ser uma mera linha que ele chamou de valores.

    Como na fi gura a seguir, poderíamos fazer uma psicografi a de linhas.

  • 19NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e Gestão

    O que não existe é alguém com todas as linhas desenvolvidas. Nem um ser iluminado.

    Nos trabalhos corporativos, em desenvolvimento de lideranças, geralmente usam-se as linhas cognitiva, moral, e uma que chamaríamos de emocional, que tem a ver com a inteligência emocional. Um líder pode ser altamente desenvolvido na linha cognitiva, mas se não for também na linha moral, em algum momento criará problemas para a empresa. Ou, se não tiver a linha interpessoal desenvolvida, terá dificuldade para integrar equipes e gerar um ambiente saudável onde as pessoas são mais produtivas.

    4. Tipos. São orientações ou maneiras de se expressar ou agir na vida, que podem ocorrer em qualquer quadrante ou nível. O tipo é estático, ou seja, ele não muda, não evolui.

    Por exemplo, no quadrante Objetivo, o tipo sanguíneo, que é algo visto no microscópio. No Subjetivo, o tipo de personalidade, que não pode ser simplesmente medido, mas constatado a partir das respostas dadas pelo indivíduo em testes específicos (MBTI, Eneagrama...). No Social, os tipos de governo (monarquia, democracia, democracia parlamentar); no Cultural, os tipos de religião.

    No mundo corporativo, podemos ver a aplicação de tipos, por exemplo, os testes de MBTI, que ajudam no autoconhecimento e no conhecimento dos outros. Temos também os tipos de cultura da Teoria das Dimensões Culturais de Geert Hofstede. Cabe, aqui, uma provocação: será que existem culturas mais complexas, que tipos não mostram, mas seriam reveladas se fossem analisadas por níveis???

    5. Estados. Traduzem uma condição ou situação momentânea e temporária. Podem acontecer em todos os quadrantes e em qualquer nível de desenvolvimento. Mas a interpretação daquela condição é determinada pelo nível cognitivo

    individual. Por isso, uma criança interpreta um sonho (estado) de maneira menos complexa que um adulto porque ela e o adulto estão em níveis diferentes.

    Pode ser um estado físico ou emocional decorrente de fator endógeno (respiração, pensamentos) ou exógeno (temperatura, alimentação, substâncias ingeridas, circunstâncias). Exemplo de estados: uma pessoa pode estar acordada, sonhando, em sonho profundo... Pode estar no estado emocional de alegria ou raiva.

    Fatores externos, como o uso de drogas ou álcool, alteram o estado interno. Ou vice-versa. Ainda que a pessoa seja um ótimo gestor ou um excelente atleta, se estiver triste, aquele estado emocional pode impactar na sua performance. Quanto melhor gerenciamos o estado emocional, mais aptos ficamos para explorar nossas potencialidades e estimular nosso desenvolvimento.

    Fortalecendo o córtex pré-frontalA gestão do estado leva à melhor

    utilização do potencial disponível do córtex pré-frontal. Permite, portanto, que se iniba o elefante – aquele nos leva a adotar respostas inconscientes e automáticas – criando condições para que o guia/executivo assuma a liderança. E como podemos fazer isso?

    A psicoterapia é um trabalho de reforço do córtex pré-frontal em situações de conflito com áreas mais primitivas do cérebro. Ela nos faz encarar o lado sombra, aqueles aspectos de nossa personalidade que não nos agradam e procuramos reprimir, negar, racionalizar por meio de explicações bonitas ou projetar no outro. Isto é, desenvolvemos mecanismos para que não venham a nos perturbar. O processo psicoterapêutico mobiliza recursos mais eficientes para lidar com a sombra.

    A meditação regular, assim como a prática de presença, ou seja, estar no aqui e agora,

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    também pode reduzir as reações inesperadas e os comportamentos indesejados. Conforme a pessoa fortalece sua consciência mais elevada focando no momento presente, mais se enfraquecem os elementos disfuncionais.

    Autores têm mostrado que práticas de atenção plena (mindfulness), como meditação e respiração, são efi cazes para modifi car estados internos. Elas não apenas aliviam o estresse e a ansiedade, mas mudam o contexto biológico, o que tem impacto direto na performance, inclusive profi ssional. “Você não pode ser brilhante um dia e medíocre no outro”, alerta o médico e neurocientista britânico Alan Watkins, que presta consultoria aos melhores CEOs e executivos do mundo. “O brilhantismo diário requer estar em sintonia com o que acontece com você em nível fi siológico e emocional”.

    O sistema nervoso, do ponto de vista funcional, é dividido em somático e autônomo. Somático é o que controlamos, por exemplo, os nossos músculos dos braços, pernas, dentre outros. Autônomo se refere ao que não controlamos e funciona por si só: a digestão, o batimento cardíaco, a respiração. Acontece que existem pontes entre o somático e o autônomo, ou seja, entre o que controlamos e o que não controlamos. A mais poderosa ponte é a respiração. Interferindo na respiração, mudamos o batimento cardíaco, tanto a sua frequência (número de batidas por minuto) quanto a variação dessa frequência, a chamada variabilidade da frequência cardíaca, considerada atualmente um dos mais importantes preditores de mortalidade e saúde. Resumindo, seria a variação do tempo entre uma batida e outra do coração.

    Quando estamos ansiosos ou sob pressão, a variabilidade da frequência cardíaca fi ca caótica, o cérebro recebe sinal de caos e desativa o córtex pré-frontal. A consciência é inibida enquanto se prioriza a sobrevivência. Selecionado há 300 mil anos para garantir a continuidade da espécie num ambiente

    hostil, nosso software mais sofi sticado, o córtex pré-frontal não teve upgrade.

    No entanto, é possível alterar esses estados caóticos gerando sinais coerentes. Considerando que os pensamentos emergem nesse contexto, ao mudar o contexto biológico (fi siologia na fi gura) muda-se o emocional, daí o sentimento, que é a consciência do estado emocional. Assim, é possível mudar a qualidade do pensamento e o próprio pensamento, melhorando, inclusive, a função cerebral e daí os resultados.

    Como fazer isso? A maneira mais simples é modifi car algo sobre o qual podemos ter controle: a respiração. A ciência tem demonstrado que a respiração rítmica e suave torna os batimentos cardíacos mais regulares e menos caóticos, estimulando o cérebro a trabalhar melhor, o que deixa a pessoa mais sensível, mais aberta a insights, com o pensamento mais claro e maior capacidade de resolver problemas.

    Um amigo costuma dizer que metade dos problemas da vida se resolve respirando. E eu complemento: 25% se resolvem na psicoterapia. Os 25% restantes não têm solução, por isso não vale a pena gastar sua

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    vida com eles. Cuide dos 75%. Ao administrar nossos estados, por meio de psicoterapia ou trabalhos de autoconhecimento, práticas de mindfulnesse/ou práticas respiratórias, conseguimos usufruir o nosso melhor dentro do nível em que estivermos.

    Para tornar esse conhecimento mais acessível a um público mais crítico, que busca uma linguagem e práticas ancoradas em ciência, nos meus workshops utilizo equipamentos de biofeedback para que os participantes possam ver na tela do computador como são capazes de mudar seu estado interno, desde que tenham as técnicas corretas. Caso queira saber mais sobre esse curso, visite e deixe seu nome e e-mail no site www.fredericoporto.com.br.

    Um sistema operacional mais abrangente e inovador, como o que foi apresentado (o

    Modelo Integral), por incluir mais perspectivas da realidade, permite promover mudanças melhores e mais duradouras.

    Liderança triádicaOutra maneira de mostrar as perspectivas

    dos quadrantes é por meio de uma tríade, onde se fundem os quadrantes exteriores em um único:

    EU (I - quadrante subjetivo)

    NÓS (We - quadrante intersubjetivo)

    MUNDO (Isso - os quadrantes exteriores, que se referem ao

    que é tangível)

    Essa tríade está presente no pensamento de diversos fi lósofos, como Platão, um dos grandes fi lósofos da Grécia Antiga, que também se referiu à tríade ao falar em Belo, Bom e Verdadeiro, como os três valores pelos quais as pessoas pautam suas vidas. O belo se refere à arte, à música, tudo o que torna a vida mais agradável;

    o bom está associado à moral, à ética, à compaixão. O verdadeiro estimula a busca de conhecimento, o avanço da ciência.

    O fi lósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), por sua vez, utilizou a tríade Cultivar, Moralizar, Civilizar, o que seria possível por meio da arte, da educação, e da ciência. A tríade também está presente em suas obras,

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    Crítica do Julgamento (Eu), Crítica da Razão Prática (Nós) e Crítica à Razão Pura (Isso). Podemos, ainda, ver a tríade nos trabalhos do sociólogo alemão Jürgen Habermas e

    do fi lósofo da ciência austríaco naturalizado britânico Karl Popper (1902-1994), como revela a fi gura a seguir:

    No universo empresarial caberia outra tríade: líder, liderado e contexto. O líder deve ter conhecimento de si, suas qualidades, limites, pontos fortes e fracos, o que funciona e não funciona para ele. Acima de tudo, ser autêntico. Na História contabilizamos líderes introvertidos, outros extrovertidos, alguns

    egocêntricos, outros humildes, mas o fato é que todos os que se destacaram foram autênticos, isto é, souberam alavancar o que faziam bem, e compensar seus pontos fracos apoiando-se em pessoas próximas, que podemos chamar de colíderes.

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    Um líder deve ter conhecimento do liderado e seu potencial. Saber como os fatos são percebidos pelos subordinados e o que esperam, assim como a cultura empresarial que os conecta. Aqui vale a pena fazer uma ressalva: existem milhares de obras sobre como ser líder, mas, proporcionalmente, muito poucas sobre como ser um liderado eficaz. Dificilmente se pensa na perspectiva do liderado. Diz a expressão popular, “Temos muito cacique para pouco índio”. Mas, veja bem, quase todos somos liderados. Mesmo sendo líder de um grupo, no caso de uma organização, na grande maioria das vezes, você é liderado por alguém acima de você.

    Em português falta até uma palavra específica, que em inglês é follower para designar esse papel. E também um substantivo que, em contraposição à liderança (leadership), descreveria as ações esperadas de quem ocupa a posição de subordinado, followership. O que se aproxima do termo follower é seguidor, que se refere mais à escolha em seguir um líder, enquanto liderado mostra certa submissão à outra pessoa. Quando se explicita que todos nós fazemos escolhas, líderes e liderados, resgatamos o protagonismo e a maturidade de cada um em seu processo de desenvolvimento.

    O contexto também é essencial. Aqui está o tangível (como é o negócio, como é o mercado, como a empresa se posiciona nele, as métricas internas e externas da companhia, assim como o design organizacional). Não se deve, jamais, subestimar o poder de um contexto, pois este tem a capacidade de extrair o que temos de melhor e o que temos de pior. Ele tem um grande poder sobre nós, embora a maioria não tenha consciência disso.

    O ex-prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani demonstrou a importância do contexto ao aplicar a teoria das janelas quebradas (Broken Windows Theory) na sua política de combate ao crime conhecida por Tolerância Zero. Essa teoria foi desenvolvida pelo cientista político James Q. Wilson

    (1931-2012) e o psicólogo criminalista George Kelling. Dois carros novos e idênticos, da mesma marca, modelo e cor, foram abandonados na rua. Um no Bronx, bairro pobre e conflituoso de Nova York, e o outro em Palo Alto, zona rica e tranquila da Califórnia. O carro abandonado no Bronx começou a ser vandalizado em poucas horas. As rodas foram roubadas, depois o motor, os espelhos, o rádio. Em uma semana já haviam levado tudo o que fosse aproveitável e destruído o que não puderam levar. O carro abandonado em Palo Alto manteve-se intacto e impecável por esse período. Até que os cientistas quebraram um vidro do automóvel. Daí aconteceu o mesmo observado no Bronx: roubo, violência e vandalismo. Em duas semanas ele estava depredado.

    Os autores do estudo concluíram que um vidro quebrado num automóvel abandonado induz ao “vale-tudo” como se a lei estivesse ausente daquele lugar. A deterioração estimula o crime, pois entre a intenção de cometer um crime e cometê-lo existe um gap onde o contexto tem grande influência. Por isso, nos anos 1980, Rudolph Giuliani mandou pintar e reformar o metrô de Nova York, que havia se convertido no ponto mais perigoso da cidade. Ele percebeu que o metrô pichado e sujo criava um contexto favorável aos delitos. Fez também campanhas para reduzir o lixo jogado no chão das estações, o alcoolismo entre o público, as evasões ao pagamento da passagem. Os resultados positivos foram rápidos e evidentes. O raciocínio foi estendido para parques e outros espaços públicos. E assim o prefeito mudou a cara da cidade. E, o mais importante, reduziu os índices de criminalidade em Nova York, que se tornou uma das metrópoles mais seguras do mundo.

    Outro estudo clássico foi realizado por uma equipe da Universidade Stanford liderada pelo psicólogo Philip Zimbardo, em 1971. O objetivo era investigar como os papéis sociais influenciam o comportamento humano. No porão do Instituto de Psicologia

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    da universidade reproduziu-se fielmente o ambiente de uma prisão. Foram selecionados 24 alunos psicologicamente estáveis e com boa saúde. Um grupo desses voluntários assumiu o papel de guardas. Recebeu uniforme militar, óculos de sol espelhados e um bastão. O outro grupo, o de prisioneiros, usava apenas roupões, chinelos, um número preso às costas, pelo qual eram identificados, e correntes nos pés.

    Todos eram estudantes de alto nível, mas o contexto favoreceu comportamentos estereotipados. Os guardas se tornaram cada vez mais agressivos enquanto os prisioneiros passaram a aceitar tratamentos humilhantes. Logo no segundo dia, eclodiu uma rebelião. O estado emocional dos prisioneiros começou a se deteriorar.

    O experimento, programado para durar 14 dias, teve de ser interrompido no 6° dia porque saiu totalmente do controle. Zimbardo estava tão compenetrado em suas observações que não percebeu como o contexto estava desumanizando as pessoas. Quem chamou sua atenção foi sua namorada, também pesquisadora, que vinha trazer lanche para o autor e questionou a ética da pesquisa. Então ela foi abortada.

    A grande questão é que, avaliar contexto gasta cognição, então colocamos no automático e não ficamos atentos. Por exemplo, preferimos dar um rótulo para uma pessoa a considerar que parte da personalidade dela é contextual, ou seja, o seu jeito de ser no trabalho não é igual ao seu jeito de ser em casa ou no lazer.

    Em síntese, o indivíduo tem uma parte interior subjetiva, por exemplo, crenças e valores, o seu comportamento, que é observável, e está sempre inserido no coletivo, no que pode ser medido do grupo (números de pessoas, e outros dados) e em uma cultura que os conecta. Tudo está interligado. Assim, toda realidade pode ser analisada sob essas perspectivas. Por isso, emprego o conceito de liderança triádica, que aproxima o olhar

    para ver detalhes pessoais, depois distancia para perceber o todo interligado.

    Todo evento dentro de uma empresa, seja ele qual for, deve ser analisado sob o ponto de vista do líder, dos liderados e do contexto. Se um desses aspectos ficar de fora, a liderança será incompleta ou infrutífera. Afinal, esses três pontos influenciam a possibilidade de gerar resultados, portanto são decisivos para o sucesso da gestão.

    Esse olhar amplificado assume importância vital em uma realidade cada vez mais complexa, cheia de paradoxos e polaridades (mundo V.U.C.A.). Eis alguns exemplos de polaridades com os quais os líderes atuais se deparam:

    Lucratividade-Crescimento

    Curto prazo-Longo Prazo

    Todo-Partes

    Custo-Qualidade

    Você sabe que está diante de sistemas complexos, quando tem de gerenciar opostos, que podemos chamar de dilemas, paradoxos ou polaridades, e que não podem funcionar independentemente. Os dois lados de uma polaridade são interdependentes, não podemos escolher um como solução e negligenciar o outro.

    Diferentemente dos problemas, os dilemas não têm solução, têm somente gestão. Não podemos solucionar, somente gerenciar. Isso é difícil porque tendemos a ver todas as dificuldades como problemas a serem resolvidos em vez de paradoxos a serem geridos.

    Também decorre do fato de preferirmos o modo de pensar Ou Um Ou Outro, que não funciona no gerenciamento de polaridades. Elas requerem outro modo de pensar: Um E Outro, por serem interdependentes. Devemos ter o foco nos dois polos, procurando utilizar o melhor de cada lado e evitar os limites de cada um.

  • 25NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e Gestão

    Aplicando ao Pipeline, quando o colaborador passa de gestor de si para gestor de outros, emerge a primeira grande polaridade, que vai segui-lo dali para frente, que é o dilema de gestão entre pessoas, relacionamento e resultados, métricas. Em todos os exemplos, se você focar muito em um dos polos, o outro exigirá sua atenção: se mirar excessivamente nos resultados e não cuidar das pessoas, elas vão se desmotivar, adoecer; se focar demais nos relacionamentos e descuidar dos resultados, também terá problemas.

    Quanto mais um gestor se desenvolver verticalmente – e seguir, portanto, a infinita jornada de autoconhecimento – mais será capaz de lidar com paradoxos e encontrar o equilíbrio.

    A Cereja do Bolo Diante de toda essa complexidade os

    gestores ficam se perguntando o que podem fazer, ou melhor, por onde começar?

    Como puderam perceber nas histórias de criminalidade em Nova York e no experimento de aprisionamento, o contexto tem muito poder. Vamos entender, então, como podemos desenhar um contexto que ajude o elefante (partes mais primitivas do cérebro) a ficar mais alinhado com o guia do elefante (córtex pré-frontal) para que este possa exercitar seu potencial máximo.

    Precisamos criar um contexto onde as pessoas possam trabalhar de forma produtiva e plena, isto é, onde possam experimentar o FLOW.

    O FLOW é um estado estudado por um dos fundadores da Psicologia Positiva, o psicólogo húngaro Mihaly Csikszentmihalyi, inicialmente em artistas, mas que depois foi observado em diversos tipos de atividades. Durante esse estado, as pessoas apresentam seis características:

    • Sensação de controle sobre a atividade

    • Concentração profunda, a ação se funde com a percepção

    • Foco intenso no presente

    • Distorção da percepção do tempo

    • Perda da sensação do self

    • A atividade é autotélica, tem um fim em si. No exemplo de um jogo de tênis, ganhar ou perder não interessa, o que interessa é o prazer da atividade.

    Chamou a atenção deste autor que as pessoas em estado de FLOW ficavam horas trabalhando, às vezes se esqueciam até de se alimentar. Era, na verdade, um estado de felicidade e bem estar.

    Não é a toa que empresas com maiores níveis de felicidade são mais produtivas, como demonstraram os psicólogos Shawn Archor e Martin Seligman, dentre outros. Considerando a falta de engajamento dos colaboradores no mundo inteiro, os gestores já perceberam a importância de criar um ambiente de bem-estar.

    Mihaly Csikszentmihalyi estabeleceu três condições para ocorrer o FLOW. Obras mais recentes fundiram as duas primeiras em uma, mas serei fiel ao modelo inicial. São elas:

    • Objetivos claros

    • Feedback imediato

    • Equilíbrio entre habilidade e tarefa

    Um exemplo de como o FLOW ocorre: você começa a jogar tênis com um amigo e percebe, assustado, que já se passaram 2 horas; você deveria estar com fome e cansado e no entanto está cheio de energia.

    Gostaria de focar em uma característica, a que considero a mais fundamental, o equilíbrio entre habilidade e tarefa, apresentada no gráfico a seguir.

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    Vamos continuar a analogia com o jogo de tênis. Se o seu amigo jogar muito melhor que você, você tem ansiedade, pois o desafi o é maior que as suas habilidades. Se ele jogar muito pior, você tem tédio, pois o desafi o é baixo, e se você não souber jogar o básico e o seu amigo, também não, seria uma apatia. Mas se as suas habilidades forem parecidas, ou seja, uma hora um está melhor que o outro, há chance de o FLOW ocorrer.

    Agora imagine como poderíamos criar esse alinhamento entre as habilidades do colaborador e a tarefa a ele dada, de forma que toda a organização entrasse em FLOW.

    A única forma de fazer isso é alinhando a complexidade cognitiva ou mental das pessoas à complexidade das tarefas pelas quais são responsáveis. Por isso que Jaques tão sabiamente disse:

    “… as pessoas desejam num sentido muito profundo serem reconhecidas por aquilo

    que são, nem mais nem menos”.

    Elliott Jaques

    Segundo este autor, a capacidade atual de trabalho (CAT)de uma pessoa é determinada pela seguinte fórmula (com algumas leves modifi cações, mas sem perder, o sentido):

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    Onde

    Steve Jobs (1955-2011), fundador da Apple, tinha alta cognição (CC), mas se estivesse diante de um problema médico não poderia fazer muito, por falta de conhecimento (CH). A pessoa pode, por outro lado, ter todos os itens da equação à altura do cargo, mas não aderir á cultura

    da empresa (CV), ou não ter equilíbrio emocional(CR). Esse último é muito impactado por outros fatores, como o design organizacional.

    O interessante é que a fórmula tem relação com os quadrantes do Modelo Integral, como revela a fi gura a seguir:

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    Jaques, apesar de psiquiatra e de formação psicanalítica, era contra psicologizar as organizações, o que é muito frequente na atualidade. Escrevi a respeito no artigo Empresa não é lugar de psicoterapia, que está no meu perfil do Linkedin, https://bit.ly/2M1AN4A.

    Ele entendia que se criássemos um design (quadrante exterior coletivo) bem feito, ou seja, atuássemos no contexto, as pessoas se comportariam da maneira requerida. Deixe-me dar um exemplo de minha experiência como consultor. Certa vez, fui procurado pelo RH de uma multinacional para realizar um trabalho de coaching com um gerente que tinha dificuldade em priorizar suas atividades.

    Ao estudar melhor o quadro, descobri que ele respondia para três chefes, sendo dois em outros países. Agora imagine, se os três dessem uma ordem para ele ao mesmo tempo. Se ele soubesse qual das três ordens era prioritária, ele teria de ser o chefe dos três e não o contrário. Não era um problema da pessoa (quadrante interior individual), mas do design ou organograma (quadrante exterior coletivo).

    Veja bem, da mesma forma que os criminosos de Nova York e os alunos de Philip Zimbardo não tinham consciência de como o contexto os estava influenciando, também as pessoas em uma organização geralmente são cegas para esse efeito.

    O design ideal é baseado em ciência e não em achismos. Ele é feito medindo a capacidade atual de trabalho do colaborador, sendo a parte mais difícil desse processo a medida da complexidade cognitiva. Poucas pessoas sabem fazer isso no Brasil e ninguém ensina, com exceção do grupo ao qual sou associado.

    Junto a isso, mede-se a complexidade das tarefas. Jaques descobriu 12 níveis de complexidade de indivíduos e tarefas. Assim, temos algo científico, pois como disse o físico, filósofo e astrônomo italiano Galileu Galilei (1564-1642), ”Sem medição não há ciência”.

    A partir do momento que temos esses dados, podemos partir para a segunda parte que é o alinhamento de accountability e autoridade, respondendo a duas perguntas:

    1. Quais decisões você toma, que não podem ser tomadas pelos membros do seu time?

    2. Quais decisões você toma, que não são tomadas pelo gerente para quem você se reporta?

    A pessoa somente é accountable e tem autoridade para atuar nas tarefas à altura de sua complexidade. Dessa forma, a organização se torna mais produtiva, com mais confiança entre os colaboradores e em FLOW.

    Nesta visão, não existe responsabilidade de equipe. A responsabilidade é sempre de um indivíduo por alguma coisa. Aliás, se você pensar bem, é sempre assim, raramente – para não dizer nunca – você viu equipe ser promovida ou ser dispensada, são sempre indivíduos. Assim, com um design bem feito, as pessoas podem trabalhar no máximo do seu potencial.

    Designs mal feitos criam gargalos. Imagine um prédio de 20 andares e suponha que tenha havido um erro no projeto hidráulico e colocaram no 8º andar um cano mais estreito do que os demais, criando-se um gargalo. Após um tempo, se nada for feito, o prédio cai. O mesmo acontece em uma empresa onde o fluxo de trabalho “engargala” por falta de alinhamento entre a complexidade da pessoa e da tarefa. O trabalho não flui.

    Alinhavando tudoSempre que apresento essa teoria, as

    pessoas me perguntam: Por que nunca ouvi falar disso? Um dos motivos era que Jaques provou, acompanhando mais de 15 mil trabalhadores por décadas, que não tinha como estimular alguém a mudar

    https://bit.ly/2M1AN4Ahttps://bit.ly/2M1AN4A

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    de nível de complexidade cognitiva, só poderíamos aguardar o salto cognitivo. Essa afirmação incomoda bastante a cultura de desenvolvimento em que as empresas estão inseridas.

    Faço questão de lembrar que a complexidade cognitiva é apenas um componente da fórmula da capacidade de trabalho (CAT = CV x CH x CR x CC). Ainda temos as competências, o alinhamento com a cultura e a dimensão emocional. Por isso, muitos chamam a teoria de Jaques de determinista, dentre adjetivos piores. Nesses momentos, gosto sempre de me lembrar desta fala dele: “Minha preocupação tornou-se como desenvolver instituições sociais que possam ampliar a moralidade, efetividade e criatividade humanas”.

    Para saber mais a respeito, consulte no Apêndice o item 2*.

    Eu pergunto: será que é tão difícil aceitar que tem algo que não consigamos apressar ou mudar? Por exemplo, a sua altura, você não teve de aceitá-la?

    Lembre-se que, por outro lado, com essa teoria podemos gerar FLOW em toda a empresa, aumentando a satisfação e o bem-estar.

    Em vez de querer mudar as pessoas, podemos mudar o contexto para que elas possam atuar no seu ideal.

    A teoria está de acordo com o que pensava Piaget – e você deve ter visto no vídeo mostrando a experiência feita com as crianças em relação ao volume. A biologia precede o aprendizado, ou seja, não adianta tentar ensinar a uma criança de 6 anos o que é volume. Transpondo para Jaques, se não houver a complexidade cognitiva para aquela tarefa significa que ainda não é o momento para ensinar, portanto não seria o momento para subir no Pipeline.

    Aproveito para salientar que, assim como o modelo de Pipeline desconhece a complexidade cognitiva, a interessante e prática teoria de liderança situacional não a leva em consideração, é um modelo voltado para competências que podem ser aprendidas (o CH da fórmula de Jaques).

    Quando falta a complexidade cognitiva no gestor ou colaborador, modelos como Pipeline ou Liderança Situacional, que não têm um nome para isso, geralmente consideram a pessoa imatura, ou alegam que simplesmente não consegue entregar os resultados, sendo por isso dispensada. Na verdade, ela foi mal alocada.

    Aqui abro um parêntese: Jaques estudou adultos, mas será que se estimularmos as crianças haveria a possibilidade de apressar ou aumentar a complexidade cognitiva?

    É possível que sim, se o estímulo acontecer antes dos 15 anos. Vamos entender o porquê: o nosso cérebro se desenvolve a partir de um processo de crescimento das conexões entre os neurônios e, ao mesmo tempo, de uma poda dessas conexões, como se fosse a confecção de uma escultura. A última poda ocorre na adolescência, quando há também certo boom de conexões devido aos hormônios que aumentam nessa fase. Portanto, é provável que até antes dessa derradeira poda possamos estimular maior complexidade cognitiva, o que é demonstrado pelo trabalho do pedagogo israelense Reuven Feuerstein (1921-2014).

    Imagine o estrago para as gerações futuras brasileiras o que resultado do PISA demonstrou. Por isso, em minha opinião, torna-se tão urgente e necessário alinharmos a tarefa à complexidade das pessoas no ambiente de trabalho, assim como estimularmos nossas crianças, senão, em um futuro próximo, teremos uma grande quantidade de pessoas impossibilitadas de serem produtivas.

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    ConclusãoSegundo Peter Drucker (1909-

    2005), considerado o pai da Teoria da Administração, o ativo mais valioso para uma empresa do início do século XX eram seus equipamentos. O ativo mais valioso para uma empresa no final do século XX e início do XXI são os trabalhadores do conhecimento e a sua produtividade. Daí a importância de desligar o piloto automático e exercer a liderança triádica, para tomar decisões mais sábias e conscientes.

    Os líderes precisam construir relações que inspirem e motivem os outros a fazer o seu melhor, inovar e adaptar. Por isso, é fundamental que estejam atentos às suas percepções de mundo, como às dos seus liderados, e se lembrem sempre do poder do contexto, seja externo, seja o design organizacional. Mas, acima de tudo, que nunca fujam de encarar a realidade que se encontra na sua frente.

    Neste artigo fiz duas conexões interessantes – entre Jaques e o Pipeline e entre Jaques e o modelo integral – numa tentativa de abrir um diálogo entre modelos.

    Qual destas conexões ou modelos mais o incomodou? Provavelmente é ali que está o que você mais precisa olhar, pois é da nossa natureza humana geralmente evitar o que

    realmente precisamos perceber, como disse Galileu em uma carta a Johannes Kepler, em 1630:

    “Meu querido Kepler, o que você diria dos filósofos daqui, para quem eu já ofereci 1000 vezes mostrar meus estudos, mas que nunca consentiram em olhar os planetas, ou a lua através do meu telescópio. Só posso concluir que os homens fecham seus olhos para a luz da verdade”.

    Evitamos olhar para ideias que desafiem os nossos pressupostos, mas eu o convido a fazer isso por alguns momentos. Olhe sem preconceitos para os problemas e desafios que tem enfrentado, usando como lentes o que foi exposto aqui e que, de alguma forma, pode explicar o que está acontecendo.

    Convido os leitores a olharem por esses telescópios e depois partilharem o que viram, sem nenhuma intenção de querer mudar a opinião de um ou de outro, mas que, por meio de um diálogo sincero e aberto possamos todos crescer e expandir nossas percepções.

    “Pior que não saber algo é não saber que não se sabe. O preço

    desse último cenário é incalculável e, portanto, não gerenciável”.

    Eliyahu M. Goldratt (1948 – 2011)

  • 31NeuroLideraNça - Cérebro, meNte e Gestão

    Apêndice 1Para entender melhor o que quero dizer

    com métricas sistêmicas, imagine uma engarrafadora de água mineral que tem três máquinas na linha de montagem e na seguinte ordem: a primeira envasa a água no frasco, a segunda coloca a tampa e a terceira coloca o rótulo. A máquina 1 engarrafa 500 garrafas por hora, a máquina 2 tampa 100 garrafas por hora e a máquina 3 rotula 600 garrafas por hora. Métricas de eficiência local, muito comuns, levariam a colocar todas as máquinas para trabalhar no máximo. O que isso causaria com o tempo? Um acúmulo de garrafas antes da máquina 2, ao ponto de ter de desligar a máquina 1, assim como uma falta de garrafas para a máquina 3. A máquina 2 é o gargalo, ela determina quantas garrafas saem por hora.

    Qual seria a solução? Por exemplo, a máquina 2 trabalhar em três turnos e as demais apenas em um. Se usassem uma métrica sistêmica, de fluxo, como o número de garrafas produzidas por hora, em vez de cada máquina produzir o máximo, isso logo seria percebido.

    Não se enganem, eficiência local em detrimento da eficiência sistêmica tem em todo lugar, mas talvez não seja tão fácil de diagnosticar por causa da cegueira pelo quadrante coletivo exterior. Já encontrei esse problema em centros de distribuição de empresas que faturam bilhões. O pior é que fui chamado para fazer uma integração de equipe. Aí vi que o problema não era do quadrante do comportamento individual, mas das métricas. A falta de métrica sistêmica gerava retrabalho, parada de linha e isso aumentava o estresse, o que, por sua vez, piorava as relações.

    Apêndice 2Jaques e seus discípulos acompanharam

    mais de 15 mil pessoas durante décadas e, baseando-se nos dados coletados, perceberam que não se consegue estimular a cognição do adulto, somente é possível aguardar a mudança de nível. O que ele conseguiu foi criar uma tabela de progressão da complexidade cognitiva, parecida com a usada por pediatras para avaliar a evolução do peso e da altura de uma criança e assim ter ideia se a criança está se desenvolvendo dentro da curva, ou dentro da sua normalidade.

    O modelo de Jaques consegue, então, identificar onde uma pessoa está com 20 anos e saber quando ela vai passar pelos outros níveis até os 60 anos de idade – assim como um pediatra sabe, ao avaliar um criança com 2 anos, a altura aproximada que terá na vida adulta.

    Querer negar um dado que nos incomoda é algo bastante humano, mas nunca podemos esquecer que conhecer nossos limites reais faz parte do processo de amadurecimento.

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