fundamentos axiolÓgicos e epistemolÓgicos da … · 2015-11-01 · axiologia apresentada por...
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ISSN 2176-1396
FUNDAMENTOS AXIOLÓGICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA
AVALIAÇÃO: EM BUSCA DE SENTIDO
Rosa Virgínia Wanderley Diniz1 - UNISO
Grupo de Trabalho - Políticas Públicas, Avaliação e Gestão do Ensino Superior
Agência Financiadora: CAPES
Resumo
O artigo desenvolvido é produto de reflexão docente acerca da temática da avaliação e sua
percepção por parte dos alunos, uma vez que estes demonstravam percepção conflitante com
o apregoado pela epistemologia da avaliação, para verificação do proposto foi realizada
revisão bibliográfica para compreender as concepções existentes acerca do tema, suas
interfaces com a axiologia e a ética, além das características mensuratórias e mercadológicas
das práticas avaliativas constadas nas salas de aula. Para, a partir deste aporte teórico, poder
comparar e compreender com maior precisão a realidade dada pela experiência. Além disto,
foram realizados dois experimentos, com objetivo de corroborar, ou não, a existência da
percepção contraditória da prática avaliativa. Dessa forma, a partir da disciplina de Avaliação
Educacional e Institucional ministrada para alunos do ensino superior de um curso de
Pedagogia, tais experiências ocorreram. Na primeira estimulava-se, por meio de um
brainstorm, que os alunos apresentassem suas impressões a respeito de sua vivência em
avaliação, na segunda atividade os alunos, já tendo estudado o tema, deveriam elaborar um
painel lúdico. Tendo sido realizadas no início e no final da disciplina os experimentos em
questão visavam aferir a percepção do fenômeno da avaliação, antes e após a intervenção dos
autores estudados. Os dados foram trabalhados numa perspectiva fenomenológica para tentar
compreender as sensações implicadas com o tema a partir das provocações docentes. Os
resultados demonstraram a contradição entre percepção discente e teoria da avaliação, ainda
que sem caráter absoluto, e confirmaram a necessidade de investimento na formação docente
nos mais diversos níveis educacionais, buscando-se viabilizar um sentido mais educacional e
emancipatório para esta ferramenta.
Palavras-chave: Percepção discente. Práticas em avaliação. Formação docente.
1 Doutoranda em Educação: Ensino Superior pela UNISO. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela
UFPB. Especialista em Filosofia pela Universidade Claretiano. Professora Adjunta das Faculdades Max Planck.
E-mail: [email protected]
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Introdução
O trabalho apresentado é fruto de inquietação docente a partir da experiência em
ministrar a disciplina de ‘Avaliação Educacional e Institucional’. Lastreada pelos estudos
doutorais, pude observar o distanciamento entre a avaliação como instrumento emancipatório,
cujo aporte teórico cresce enormemente e a prática delineada, não apenas, no ensino superior,
como aquela trazida na memória dos alunos, ora discentes do terceiro grau.
A primeira abordagem do trabalho é teórica, visando apontar quais os caminhos
epistemológicos veem desenhando a avaliação como processo ético e ferramenta de
emancipação do sujeito, bem como, a compreensão de que há na avaliação uma prática
axiológica a partir dos valores hegemônicos e esferas de poder.
Após as explorações bibliográficas apresenta-se o relato de experiência, buscando por
meio desta, a percepção discente quanto à avaliação visando verificar se de fato o
distanciamento observado se traduz no olhar dos alunos.
Para tanto, foram realizados dois experimentos com alunos do curso de graduação em
Pedagogia propostos a partir da disciplina de Avaliação Institucional e da Aprendizagem,
numa instituição particular, no interior do Estado de São Paulo, sendo o primeiro estimulado
por um brainstorm conceitual no início da disciplina em questão e o segundo, após leitura e
discussão de diversos artigos científicos acerca do tema, e posterior elaboração de um painel
lúdico a respeito.
Os resultados foram analisados numa perspectiva fenomenológica e apontaram para
necessidade de uma desconstrução quanto à compreensão e prática cultural do que significa
avaliação.
Referencial Teórico
Este estudo tem por eixo temático uma questão bastante crítica, a avaliação
educacional. Avaliação esta que em sua episteme sofre a crise entre a ideia de emancipar e sua
prática, eivada de vícios, tradicional, mnemônica e repressora, onde o aluno tem de provar
que sabe e não se avalia o que ele aprendeu, e que, na atualidade, tem se transformado em
processo contábil de eficiência da educação capitalista.
Segundo Miranda (1982, p. 40) “avaliar significa julgar em referência a um critério”,
enquanto, etimologicamente o verbo avaliar, do latim valere, significa “atribuir um juízo de
valor” (BARBOSA, 2012, p. 2; SOUZA; VIEIRA, 2009, p. 171). Esclarecendo Tavares
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(2013, p. 60) que “[...] que toda avaliação tem por referência um padrão que representa o
valor vigente, dependente da questão cultural e, assim, variável no tempo e no espaço”.
Observa-se que a avaliação seria, portanto, uma ação pautada por critérios pré-
estabelecidos donde o sujeito-avaliador julga o objeto-avaliado. A partir desta breve análise já
se colocam alguns dilemas essenciais: a subjetividade implicada na ação de avaliar, a
compreensão objetiva e concreta dos critérios, os valores, impressões e preconceitos
implicados na ação de julgar, e o fato de que o objeto-avaliado esconde um sujeito.
Transportando esta perspectiva valorativa para o campo filosófico esbarramos com a
axiologia apresentada por Abbagnano (2007, p. 101) como "filosofia dos valores", ainda o
autor (2007, p. 1000), quando disserta sobre o termo valor, aduz:
[...] o uso filosófico do termo só começa quando seu significado é generalizado para
indicar qualquer objeto de preferência ou de escolha, o que acontece pela primeira
vez com os estoicos, que introduziram o termo no domínio da ética e chamaram de
VALOR os objetos de escolha moral. Isso porque eles entendiam o bem em sentido
subjetivo podendo assim considerar os bens e suas relações hierárquicas como
objetos de preferência ou de escolha. [...]
Conforme comentado, a ideia de atribuição de juízo de valor carrega consigo um
sentido subjetivo, a partir dos critérios estabelecidos no ato de avaliar; segundo Barbosa
(2012, p. 2) o fato de sermos diariamente avaliados e avaliadores construiria a ideia de que
todas as pessoas estariam preparadas para tal ação, sem que se coloque em questão o fator da
qualidade de como e o que se avalia.
Para Tavares (2013, p. 60):
a avaliação como medida apresenta em seus aspectos ontológicos e epistemológicos
alguns pressupostos distintos em relação à visão de mundo e de homem, e também
de educação e avaliação. O homem é concebido nesse modelo como uma realidade
pronta, objetiva e acabada, um ser permeado por verdades perenes e não sujeito a
alterações.
No caso específico da avaliação de alunos, sujeitos obviamente em formação e
transformação, os critérios devem definir-se em termos de objetivos educacionais
(MIRANDA, 1982, p. 40), é necessário se inserir a dimensão ética para uma apropriada
intervenção docente. Segundo Alves (2012, p.41), a “[...] ética ressaltada nas práticas de
avaliação revela concepções de conhecimento, de ensino, de aprendizagem, de relação que
afetam a coletividade.”
Vez que, este critério ético – educacional seria única possibilidade de se observar uma
ação avaliativa cujas subjetividades do sujeito-avaliador, constituída por sua concepção de
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mundo e esferas de preconceito, contaminariam em menor grau a processo avaliativo, buscar-
se-ia, uma organicidade entre avaliação-aprendizagem, bem como, avaliador – avaliado.
Segundo Alves (2012, p.45) a “[...] prática da avaliação muitas vezes é vista como
simples aplicação de procedimentos de coleta de dados e informações sem que sejam
refletidos, remetidos e articulados a outros sentidos postos pelos valores sociais [...]”, esta
visão simplista acaba por permitir distorções importantes.
Neste sentido, vale ilustrar com exemplos descritos por Piéron (1977), sendo o
primeiro em que um aluno de filosofia apresenta em carta suas impressões sobre o exame
final do liceu: “É uma prova pouco moral. Por mais que se trabalhe durante cinco meses, do
nascer ao pôr do sol, somente do acaso depende a nossa sorte” (PIÉRON, 1977, p. 11); e o
segundo diz respeito de exames classificatórios submetidos a dupla correção: “[...] um
candidato, classificado em segundo lugar por um professor, ficava em ante-penúltimo,
classificado por outro. Mostrava-se assim o fator subjectivo na apreciação, de modo a fazer
vacilar a confiança geral nas classificações” (PIÉRON, 1977, p. 14).
O autor em questão, Henri Piéron, segundo Miranda (1982), é considerado idealizador
e sistematizador da docimologia, ciência que preconiza o estudo dos problemas
psicopedagógicos da avaliação, realizando uma crítica aos métodos tradicionais de seleção e
apontando: “[...] a instabilidade das avaliações sob o ponto de vista das diferenças
interindividuais e intraindividuais, da validade e da precisão[...]” (MIRANDA, 1982, p. 39).
Souza e Vieira (2009, p. 172 – 173) comentam acerca de todo um desenvolvimento
epistemológico da avaliação numa perspectiva mensuratória, desde os testes e medidas
educacionais de Robert Thorndike (1900) para mensurar comportamentos humanos, Tyler
(1930) considerado o pai da avaliação, com a ideia de mensuração da aprendizagem através
de testes padronizados.
Todo este contexto crítico em relação à prática avaliativa se justifica uma vez que
histórica e legalmente se observa que a ideia de avaliar tem sido concebida no campo
educacional como mensuração conferindo uma dimensão economicista e burocrática à prática
educacional. Além de diversos registros legislativos apresentados pelas autoras que
confirmariam que o caráter excludente da avaliação classificatória, enraizada na legislação
brasileira, só modificada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996).
Como aponta Alves (2012, p. 45) a avaliação “[...] como política pública social
vinculada ao processo histórico brasileiro não pode ser entendida se não for analisada na sua
relação com a economia política, o direito e a legislação e com as demais políticas sociais”.
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Segundo Depresbiteris (1998, p. 162 - 163) a ênfase dada às notas nas avaliações
provoca desvios significativos dando caráter comercial e contabilístico, sem orientar o
aprendizado do aluno.
Na atualidade os estudiosos da área (RUSSELL; AIRASIAN, 2014, p. 12;
SANMARTÍ, 2007 apud PUYEO; CLEMENTE; PASTOR 2009, p. 28) ainda a concebem
como processo de coleta, síntese e análise de informações visando subsidiar a tomada de
decisões, emitir juízos de valor e compreender a realidade. Poucos deles se arriscam a
contemplar as dimensões éticas e sociopolíticas da questão.
A concepção de avaliação acaba por se constituir em produto das transformações
sociais, sendo lapidada e modificada, por meio dialético entre com as formas hegemônicas e
novas formas de pensar em cada tempo, não permanecendo a mesma. Deste confronto de
ideias verifica-se que gradativamente a avaliação passa a ser refletida numa perspectiva
ontológica como instrumento de fomento e emancipação do sujeito (Ser), denominada
avaliação formativa, embora a mesma utilizada de maneira mal estruturada possa se tornar um
instrumento de atrofia do sujeito (Não-Ser), dilacerando sua autonomia, a exemplo da
instituída progressão continuada.
Vez que a incoerência constante entre o sentido emancipatório do processo avaliativo
e suas dificuldades operacionais em traduzir-se na prática num instrumento de construção do
“ser” se justifica pela discrepância entre valores sociais anunciados e constituídos dentro do
capitalismo então posto.
Dias Sobrinho (2003, p. 13) destaca a avaliação como “patrimônio das instituições
educativas”, Fernandes (1998, p. 7 - 8) aponta a expansão da avaliação no universo escolar e
suas mudanças: “[...] além dos alunos, de que tradicionalmente já se ocupava, passou a dizer
respeito ao desempenho dos professores, à eficácia do ensino, às instituições, ao currículo e
ao próprio sistema educativo”, além de reafirmar as mudanças – epistemológicas e
metodológicas - para atendimento e ajuste às necessidades sociais “[...] de fundamentar, em
bases mais sólidas, decisões que tem importantes implicações sócio morais para o indivíduo e
para a sociedade” (FERNANDES, 1998, p. 8).
Assim, a avaliação tradicionalmente reconhecida como um elemento pertencente ao
critério de promoção discente, a partir da submissão à provas e exames, na atualidade, dada a
complexificação social, passa não só a expandir-se como processo, e não ação pontual, mas
também como instrumento de legitimação docente, institucional e de reafirmação de políticas
públicas uma vez considerados todos os tipos de avaliações.
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Entretanto, não se pode deixar de reconhecer que em que pese hajam se aprofundados
os estudos e reflexões em torno da avaliação, propondo mudança de paradigma, mantêm-se
vigentes as avaliações pautadas numa visão bastante tradicional destacando as relações de
poder a serem equilibradas no processo de ensino-aprendizagem.
Alves (2012, p. 29), em pesquisa de campo na área de educação questionou quarenta
coordenadores pedagógicos do município do Rio de Janeiro a respeito do conceito de
avaliação, comenta as “[...] respostas sinalizaram a ausência de clareza na definição dos
conceitos de avaliação”, o que demonstra importante fragilidade na compreensão da episteme
que dirá no seu sentido axiológico.
Não se pode olvidar que há, via de consequência, uma cultura a respeito das práticas
avaliativas que tem sido repetida e reiterada também por parte dos discentes como bem ilustra
Barbosa (2012, p. 3 - 4):
[...] há uma prática avaliativa, com a qual muitos de nós convivemos nos bancos
escolares há bastante tempo: avaliação ligada à provas e testes e que servem
especialmente para avançar ou reter nossa evolução escolar, através da classificação
dos melhores e dos não tão bons.
Nesta dimensão é necessário que os educadores passem a trabalhar a ressignificação
cultural da avaliação, esclarecendo conceitos, inovando estratégias e repensando sua prática
docente, para que a percepção discente transforme a avaliação como parte da aprendizagem.
Para comprovação da explanação teórica e corroborar a necessária transformação,
foram realizados dois experimentos com alunos do curso de graduação em Pedagogia
propostos a partir da disciplina de Avaliação Institucional e da Aprendizagem, quais sejam:
Primeiro Experimento
– Descrição da Metodologia:
O estudo foi realizado em sala de aula, na disciplina de Avaliação Institucional e da
Aprendizagem, dada ao último semestre de Pedagogia. No início do semestre, antes que
fossem apresentados os conceitos chave foi solicitado aos alunos da turma que, a partir de
Associação Livre de Palavras, de 15 segundos, escrevessem três palavras relacionadas à ideia
de avaliação.
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De um universo de 28 alunos presentes surgiram, ao todo, 36 expressões diferentes,
apresentando-se com maior incidência apenas algumas delas, quais sejam: recuperação,
competência, conhecimento, nota, prova, não aprendi, exame, aprendizado, medo e ansiedade.
A partir destes termos recorrentes é possível observarmos perspectivas distintas de
avaliação, que podem ser dispostas nas seguintes categorias.
Quadro 1 – Expressões recorrentes a respeito da ideia de avaliação
FRACASSO SUCESSO PROCESSO
Recuperação Competência Nota
Não aprendi Conhecimento Prova
Medo Aprendizado Exame
Ansiedade
Fonte: a autora
Dos dados acima pode-se observar que a vivência dos alunos estaria pautado num
modelo completamente distanciado da ideia de avaliação como processo integral, democrático
e emancipatório. O uso das expressões ‘exame’, ‘nota’, ‘prova’, demonstra o caráter
burocrático e limitado que a prática avaliativa toma no ensino brasileiro, as expressões de
fracasso, acima consignadas, demonstram que ação de avaliar pode, visivelmente, tomar
caminhos tanto includentes quanto segregatórios por seu inegável sentido político, social e
filosófico como ação de múltiplas perspectivas.
Segundo Experimento
– Descrição da Metodologia:
Para a segunda atividade proposta, ainda na turma concluinte de Pedagogia, já haviam
transcorrido diversas leituras de artigos científicos acerca de avaliação, portanto os alunos já
haviam se apropriado de conceitos e ideias a respeito da temática.
Os artigos científicos foram lidos e discutidos exaustivamente em sala de aula ao
longo do semestre, com esclarecimentos e dúvidas, vocabulário e estímulo ao debate. Os
artigos estudados foram:
Quadro 2 – Artigos científicos estudados na disciplina
BARBOSA, F.R.P. Avaliação da aprendizagem na formação de professores: estão os futuros professores
preparados para avaliar? In: Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul, 9, Caxias do Sul, Anais [...]
2012. Caxias do Sul: ANPED, 2012, GT 08, p. 1 – 15.
CHUEIRI, M. S.F. Concepções sobre a avaliação escolar. Revista em Avaliação Educacional, p. 49 – 63, v. 19,
n. 39, jan/abr, 2008.
LUCKESI, C. Avaliação da aprendizagem...mais uma vez. Revista ABC EDUCATIO, p. 28 – 29, nº 46, jun,
2005.
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SILVA, E. M. D. da. A virtude do erro: uma visão construtiva da avaliação. Estudos em Avaliação
Educacional, p. 91 – 113, v. 19, nº 39, jan/abr, 2008.
Fonte: a autora
Na atividade proposta os alunos deveriam elaborar, em grupos, de painéis lúdicos
seguindo as seguintes instruções: Passo 1 (brainstorm individual), Passo 2 (individual, revisão
de conceitos a partir dos materiais estudados), Passo 3 (discussão em grupo para
esclarecimentos de dúvidas a respeito do tema), Passo 4 (elaboração e execução da ideia, em
grupos). Executados os passos em questão resultaram nos dados expressos no seguinte
material:
Figura 01 – Trabalhos produzidos para o painel lúdico
Fonte: elaborados pelos alunos
Figura 02 – Trabalhos produzidos para o painel lúdico
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Fonte: elaborados pelos alunos
Interpretação dos Dados
Em relação aos experimentos propostos foi realizada uma análise fenomenológica,
tomando como elemento de estudo o fenômeno estudado e considerando que “[...] eles nos
mostram a apreensão de uma qualidade, exatamente como a de uma grandeza, ligada a todo
um contexto perceptivo [...]” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 30).
Ainda Merleau-Ponty (1999, p. 30) esclarece:
[...] se tentamos apreender a "sensação" na perspectiva dos fenômenos corporais que
a preparam, encontramos não um indivíduo psíquico, função de certas variáveis
conhecidas, mas uma formação já ligada a um conjunto e já dotada de um sentido,
que só se distingue em grau das percepções mais complexas e que portanto não nos
adianta nada em nossa delimitação do sensível puro.
Ou seja, a percepção dos fenômenos nos é dada considerando todas as influências
experimentadas e contextos dados, ensejando que a sensação traduza também uma dimensão
dos valores do sujeito imerso na experiência.
Comparando-se os dois momentos da experiência restou evidenciado que a submissão
um processo avaliativo está associada à percepções discrepantes, mesmo considerando que os
alunos submetidos são formandos da área de educação.
Neste sentido, o primeiro experimento, aplicado quando os alunos nada, ou pouco,
conheciam da episteme da avaliação, ilustra claramente a cultura da avaliação como obstáculo
e não como desafio. Embora não haja equidade na percepção da experiência que variam entre
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“medo” e “competência”, são especialmente emblemáticos os sentimentos de fracasso
explicitados e as perspectivas de processo, exclusivamente apontadas para a dimensão de
mensuração.
Estas maneiras de compreender a avaliação tornam-se sobremaneira importantes se
considerarmos o fato de que todos eles serão, supostamente, futuros educadores. Neste
sentido, Barbosa (2012, p. 8-10) tece comentário a respeito da ausência de diálogo sobre
avaliação na formação de professores e segue ensinando aos futuros docentes que avaliar
significa unicamente aplicar provas para obter notas e resultados; alertando, pois, para a
necessidade de formar professores capazes de lidar com a realidade.
Além disto, observa-se ainda, que as dimensões positivas da percepção de avaliação,
acima ilustradas, apresentam a “competência” como valor, ou seja, axioma típico da
sociedade capitalista competitiva, não tendo sido registrada nenhuma ideia que relacionasse
avaliação à dimensão ética ou emancipatória.
Entretanto, mesmo quando não completamente imersos nos estudos a respeito do
tema, não foi confirmada a experiência negativa quanto à avaliação de forma absoluta,
havendo também recorrência no aspecto tão-somente somativo quanto destaques positivos
relacionando avaliação a “conhecimento” e “aprendizado”.
Ao contrário, no segundo experimento, pode-se observar, pelo material acima exposto
que após a leitura e discussão dos textos a respeito do tema houve compreensão do conceito
de avaliação como prática emancipatória: da escuridão da dúvida para o sol da eloquência, a
necessidade da avaliação como parte da aprendizagem, a educação dialogal como oposta à
educação bancária, a diferença da avaliação para o medir, vez que aquela contempla uma
multiplicidade de fatores e a ideia da inexistência de uma boa educação com uma má
avaliação.
Considerações Finais
Pelo observado, a partir dos experimentos e estudos realizados, é preciso e possível
realizar um processo de renovação do significado do processo avaliativo a partir da melhor
formação dos educadores pois, uma teoria da avaliação ética e emancipatória pedem um
trabalho de politização do-discente para que se sustentem como prática.
A maneira como é gerido o ensino brasileiro, inclusive o ensino superior, perpetua a
opressão e impedem a autonomia ambos de amplo valor para uma formação superior
adequada.
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Necessário, portanto, se compreender a expressão “avaliação” em sua amplitude, com
o aprofundamento dos estudos na área e percebida como ação mais abrangente não adstrita ao
simples examinar ou medir – embora estas ações possam estar presentes – e reconhecendo-se
o processo avaliativo como potencial ferramenta emancipatória, valorizando-a na prática
docente. Assim, passando a avaliação a ser entendida como processo complexo, dinâmico,
justo, criativo e coerente, que envolve alunos e os professores (ALVES, 2012, p. 33).
Observou-se, ainda, que o estímulo ao estudo atento e aprofundado de material a
respeito da temática em questão, cuidadosamente trabalhado e escolhido, se traduz em
mudança de sentido quanto ao valor e ao papel da avaliação no processo ensino-
aprendizagem.
Neste sentido, recomenda-se que hajam capacitações docentes recorrentes, não apenas
para os graduandos em Pedagogia mas, também, para aqueles que já se encontram nas salas
de aula, nos mais diversos níveis, e necessitam resignificar a avaliação como prática de
ensino, convergente com a aprendizagem.
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