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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA MUDANÇA ORGANIZACIONAL, CONTROLE E DESEMPENHO: A EXPERIÊNCIA DO BANCO CENTRAL COM O COMBATE À LAVAGEM DE DINHEIRO DISSERTAÇÃO APRESENTADA À ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PAULO JOSÉ DE CASTRO JATAHY Rio de Janeiro, 2003

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  • FUNDAO GETLIO VARGAS

    ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAO PBLICA E DE

    EMPRESAS

    CENTRO DE FORMAO ACADMICA E PESQUISA

    CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAO PBLICA

    MUDANA ORGANIZACIONAL, CONTROLE E

    DESEMPENHO: A EXPERINCIA DO BANCO

    CENTRAL COM O COMBATE LAVAGEM DE

    DINHEIRO

    DISSERTAO APRESENTADA ESCOLA

    BRASILEIRA DE ADMINISTRAO

    PBLICA E DE EMPRESAS PARA A

    OBTENO DO GRAU DE MESTRE EM

    ADMINISTRAO PBLICA.

    PAULO JOS DE CASTRO JATAHY

    Rio de Janeiro, 2003

  • ii

    Nmero de Chamada

    T/EBAPE J39m

    Autor Principal Jatahy, Paulo Jos de Castro

    Entradas Secundrias

    Vieira, Marcelo Milano Falco Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas. Centro de Formao Acadmica e Pesquisa

    Ttulo Principal Mudana organizacional, controle e desempenho : a experincia do Banco Central com o combate lavagem de dinheiro / Paulo Jos de Castro Jatahy.

    Publicao 2003.

    Descrio Fsica xv, 197 f.

    Notas

    Orientador: Marcelo Milano Falco Vieira. Dissertao (mestrado) - Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas, Centro de Formao Acadmica e Pesquisa. Inclui bibliografia.

    Assuntos Desenvolvimento organizacional. Estudo de casos

    Controle organizacional. Estudo de casos

    Lavagem de dinheiro

  • iii

    Agradecimentos

    O autor agradece a todos aqueles que contriburam direta ou indiretamente

    para que este trabalho pudesse ser realizado, e em especial:

    ao Professor Doutor Marcelo Milano Falco Vieira, que com sua orientao segura

    e vasta experincia acadmica, soube estimular e construir em conjunto esta dissertao;

    aos professores e colegas de mestrado da EBAPE/FGV, que comigo partilharam

    estes dois anos de convivncia, pelo apoio e incentivo recebidos; meu agradecimento

    especial colega Marcela Cohen, pela valiosa ajuda no tratamento dos dados desta

    pesquisa;

    aos colegas de Banco Central do Brasil, que souberam compreender a importncia

    desta etapa para meu desenvolvimento profissional e contriburam, com seus testemunhos e

    participao para o desenvolvimento deste trabalho; agradeo, particularmente, o apoio

    recebido de meu Gerente Tcnico Ari da Silva, que possibilitou a minha participao no

    Curso de Mestrado, e a ajuda recebida do colega Leonardo Lima e S na coleta dos dados

    deste trabalho;

    minha esposa e meus filhos, pela compreenso, estmulo e companheirismo ao

    longo desta jornada;

    e por fim, Prof Deborah Moraes Zouain, pela receptividade a todas as nossas

    demandas.

  • iv

    Resumo

    O objetivo principal desta pesquisa avaliar at que ponto a mudana de

    mecanismos de controle numa organizao pblica contribui para melhorar o desempenho

    na sua atividade fim. Trata-se de um estudo de caso da mudana ocorrida no final de 1999

    na Diretoria de Fiscalizao do Banco Central do Brasil. Ao receber a atribuio de

    implementar uma estrutura de preveno e combate lavagem de dinheiro atravs do

    Sistema Financeiro Nacional, esta organizao absorve a equipe de monitoramento de

    cmbio, originalmente ligada Diretoria de Assuntos Internacionais, e reorienta sua

    estrutura de controle, com vistas ao alcance da nova misso. O entendimento dos

    condicionantes e do modo da mudana, das dimenses e formas de controle organizacional

    e das diferentes abordagens do desempenho forma o embasamento terico deste estudo. Os

    dados secundrios, bsicos para a caracterizao das variveis desta pesquisa, foram

    coletados principalmente em bases de dados, publicaes e documentos internos do Banco

    Central do Brasil. Os resultados encontrados apontam uma flexibilizao significativa da

    organizao em foco, que no teve contrapartida favorvel no desempenho medido pelos

    indicadores selecionados para esta pesquisa. Estes resultados, em retrospecto com a

    implementao da mudana, sugerem a influncia de um conjunto de fatores no

    considerados neste processo, tais como a adequao do pessoal e a legitimao da nova

    forma de trabalho. Recomenda-se que sejam mantidos pela organizao os

    desenvolvimentos alcanados com a nova estrutura de controle, mas que sejam reforadas

    as atividades que geram os resultados positivos em termos de desempenho. Alguns temas

    para futuros trabalhos so apresentados, destacando-se o estudo dos efeitos da implantao

    do sistema preventivo nas instituies financeiras supervisionadas pelo Banco Central do

    Brasil.

  • v

    Abstract

    The main objective of this research is to determine whether the change of

    control mechanisms in a public organization contributes to enhance the performance on its

    core activity. It is a case study focusing on the change occurred in the end of 1999 in the

    Supervision area of Banco Central do Brasil, the Brazilian Central Bank. After receiving

    the newly created task of prevention and combat money-laundering in the financial system,

    this organization takes the currency exchange monitoring personnel, formerly allocated to

    the Deputy Government for International Affairs area, and rearranges its control structure,

    focusing on the new mission. The understanding of the determinants and modes of change,

    the components and forms of organizational control and the different perspectives to

    performance, build up the theoretical background of this work. Secondary data, essential to

    establish the research variables, were mainly gathered from data base, publications and

    internal documents from Banco Central do Brasil. Obtained results point out a significant

    flexibilization of the focused organization. However, the performance indicators selected to

    this research do not have equally favourable outcomes. These results, compared to the

    change implementation process, suggest the influence of a set of factors not considered in

    this process, such as personnel adequacy and work process legitimacy. It is recommended

    that the organization keeps up the development achieved with this new control structure,

    while reinforcing the tasks that produce positive outcomes. Some subjects for further

    researches are outlined, such as studying the effects of the implementation of the preventive

    system against money-laundering in the financial institutions supervised by Banco Central

    do Brasil.

  • vi

    SUMRIO

    Relao de Figuras viii

    Relao de Quadros ix

    Relao de Grficos xi

    Siglas Utilizadas xii

    1. Introduo 1

    1.1. Objetivos Geral e Especficos 5

    1.2. Justificativas Terica e Prtica 6

    1.3. Estrutura da Dissertao 8

    2. Fundamentao Terica 11

    2.1. Mudana Organizacional 11

    2.2. Controle Organizacional 18

    2.3. Desempenho Organizacional 40

    2.4. Mudana, Controle e Desempenho 55

    3. Metodologia 58

    3.1 Perguntas de Pesquisa 58

    3.2 Definio de Variveis 59

    3.2.1. Definio Constitutiva de Variveis 59

    3.2.2. Definio operacional de Variveis 60

    3.2.2.1 Mudana 60

  • vii

    3.2.2.2 Controle 61

    3.2.2.3 Desempenho 66

    3.3 Delineamento e Mtodo 70

    3.4 Coleta de Dados 70

    3.5 Tratamento dos Dados 71

    3.6 Limitaes da Pesquisa 73

    4. Apresentao e Anlise de Dados 76

    4.1 Antecedentes histricos 76

    4.1.1 Origens do Monitoramento do Mercado de Cmbio 76

    4.1.2 A Evoluo do Monitoramento do Mercado de Cmbio 78

    4.1.3 A Reorganizao Administrativa e a Criao do DECIF 82

    4.1.4 Caractersticas do Monitoramento do Mercado de Cmbio no DECAM 89

    4.1.4.1 Metas e Objetivos 89

    4.1.4.2 Principais Processos 90

    4.1.4.3 Estrutura de Controle 94

    4.1.4.4 Desempenho 98

    4.1.5 Caractersticas do Monitoramento do Mercado de Cmbio no DECIF 100

    4.1.5.1 Metas e Objetivos 100

    4.1.5.2 Principais Processos 101

    4.1.5.3 Estrutura de Controle 107

  • viii

    4.1.5.4 Desempenho 113

    4.2 Anlise da Mudana 116

    4.2.1 Deciso e Planejamento da Mudana 116

    4.2.2 Forma e Grau da Mudana 119

    4.3 Anlise do Controle 120

    4.3.1 Estrutura inicial (DECAM) 120

    4.3.2 Estrutura final (DECIF) 129

    4.3.3 Alteraes na Estrutura 137

    4.4 Anlise do Desempenho 141

    5. Concluses e Recomendaes 161

    5.1 Concluses 161

    5.2 Observaes 177

    5.3 Recomendaes 178

    6. Referncias Bibliogrficas 181

    7. Anexos 188

  • ix

    Relao de Figuras

    Figura Captulo Pgina

    Figura 1 - Estrutura de mensurao do desempenho 2 41

    Figura 2 - Fluxo de anlise e providncias derivadas 3 68 do processo

    Figura 3 Organograma do Banco Central antes da 4 85 reorganizao administrativa

    Figura 4 Organograma do Banco Central depois da 4 86 reorganizao administrativa

    Figura 5 Organograma do DECAM antes da 4 95 criao do DECIF

    Figura 6 Subordinao das equipes de monitoramento 4 98 no DECAM

    Figura 7 Organograma do Banco Central aps a 4 109 criao do DECIF

    Figura 8 Organograma do DECIF aps sua 4 110 criao

    Figura 9 DECIF Configurao atual 4 111

    Figura 10 Subordinao das equipes de monitoramento 4 113 no DECIF

  • x

    Relao de Quadros

    Quadro Captulo Pgina

    Quadro 1 Uma Caracterizao de Abordagens 2 14 de Mudana Organizacional

    Quadro 2 - Nveis de Mudana Organizacional 2 15 em Funo do Grau de Mudana

    Quadro 3 Estruturas de controle organizacional 2 21 Perspectiva evolutiva

    Quadro 4 Tipologias comparadas 2 22

    Quadro 5 - Modalidades de anlise da eficincia 2 48 no setor pblico

    Quadro 6 Estrutura de controle 3 62

    Quadro 7 - Indicadores de desempenho para o 4 99 monitoramento de cmbio

    Quadro 8 - Indicadores de desempenho no DECIF 4 114

    Quadro 9 Estrutura inicial (DECAM) 4 128

    Quadro 10 Estrutura final (DECIF) 4 136

    Quadro 11 - Quantitativos de pessoal 4 142

    Quadro 12 - Quantidade de op.de cmbio e TIR 4 143 verificadas

    Quadro 13 - Quantidade de op.de cmbio e TIR 4 145 verificadas por monitor

    Quadro 14 - Quantidade de processos instaurados 4 146

    Quadro 15 - Quantidade de processos administrativos 4 148 Instaurados

    Quadro 16 - Quantidade total de comunicaes ao MP 4 149

    Quadro 17 - Quantidade total de comunicaes SRF 4 150

  • xi

    Quadro Captulo Pgina

    Quadro 18 - Quantidade total de comunicaes ao MP 4 151 por doc. origem QMPa

    Quadro 19 - Quantidade total de comunicaes SRF 4 152 por doc. origem QSRFa

    Quadro 20 - Quantidade processos que resultaram 4 154 em comunicaes ao MP ou SRF

    Quadro 21 Razes QPT/QPTCa e QPTCa/QPT 4 155

    Quadro 22 - Quantidade de processos relacionados 4 156 ao Caso Foz de Iguau

    Quadro 23 Quant. Retificada de processos 4 156 que resultaram em com. ao MP ou SRF

  • xii

    Relao de Grficos

    Grfico Captulo Pgina

    Grfico 1 - Quantidade de op.de cmbio e TIR 4 144 verificadas (QTM)

    Grfico 2 - Quantidade de processos instaurados 4 146 (QPT)

    Grfico 3 - Quantidade total de comunicaes 4 149 ao MP (QMP)

    Grfico 4 - Quantidade total de comunicaes 4 150 SRF (QSRF)

    Grfico 5 - Quantidade total de comunicaes 4 152 ao MP por doc. origem (QMPa)

    Grfico 6 - Quantidade total de comunicaes SRF 4 153 por doc. origem (QSRFa)

    Grfico 7 Quantidade processos que resultaram 4 154

    em comunicaes ao MP ou SRF (QPTCa)

    Grfico 8 Quantidade retificada de processos que 4 157 resultaram em comunicao. ao MP ou SRF (QPTCaex)

  • xiii

    Siglas utilizadas

    ACIC Avaliao de Controles Internos e Compliance

    ACOC - Acompanhamento e Controle de Operaes de Cmbio

    ADM - Manual de Administrao do Banco Central do Brasil

    ANDIMA Associao Nacional das Instituies do Mercado Aberto

    BACEN Banco Central do Brasil

    BIS Bank for International Settlements (Banco de Compensaes Internacionais)

    CAMOB - Carteira de Mobilizao Bancria

    CC5 Carta Circular no 5 CCR - Convnio de Crditos Recprocos

    CEMLA Centro de Estudos Monetrios Latino Americanos

    CINSP - Curso de Formao de Inspetores

    COAF Conselho de Controle de Atividades Financeiras

    COCAM Coordenadoria de Controle Cambial

    CODEP Comit Deliberativo sobre Propostas de Deciso de Processos Administrativos

    COLOG- Coordenadoria de Logstica

    COMON Coordenadoria de Monitoramento

    CONAC - Consultoria de Acompanhamento do Mercado de Cmbio

    CONAF Coordenadoria de Atividades Financeiras

    CONOR - Consultoria de Normas

    COREX Coordenadoria de Exportao

    CORIM - Coordenadoria de Importao

    COTEC Consultoria Tcnica

  • xiv

    COTIC Coordenadoria Tcnica de Ilcitos Cambiais

    COTMi Coordenadoria Tcnica de Monitoramento i

    DECAM Departamento de Cmbio

    DECEC Departamento de Capitais Estrangeiros e Cmbio (sucessor do DECAM)

    DECIF Departamento de Combate a Ilcitos Financeiros e Cambiais

    DEFIS Departamento de Fiscalizao

    DEPAD Departamento de Controle de Processos Administrativos e de Regimes Especiais

    DEPIN - Departamento de Operaes Internacionais, depois Departamento de Operaes

    das Reservas Internacionais

    DERIN Departamento da Dvida Externa e Relaes Internacionais

    DESUP - Departamento de Superviso Direta

    DIAUT - Diviso de Autorizaes e Anlise de Operaes

    DICAF Diviso de Controle de Atividades Financeiras

    DICAM Diviso de Controle de Processo Administrativo Cambial DIFIS Diretoria de Fiscalizao

    DILIC - Diviso de Ilcitos Cambiais ou Diviso de Apurao de Ilcitos Cambiais,

    conforme esteja situada no DECAM ou no DECIF, respectivamente

    DIMON - Diviso de Monitoramento das Operaes de Cmbio

    DIOPE - Diviso de Operaes Comerciais e Procedimentos Especiais

    DIPAD Diviso de Controle de Processo Administrativo Financeiro DIREX Diretoria de Assuntos Internacionais (sucessora da DIRIN)

    DIRIN Diretoria de Relaes Internacionais

    DIVAP - Diviso de Desenvolvimento e Apurao de Dados

  • xv

    FATF/GAFI Financial Action Task Force on Money Laundering/Groupe dction

    Financire sur le Blanchiment de Capitaux (Grupo de Ao Financeira sobre Lavagem de

    Dinheiro no mbito da Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico)

    FIBAN - Fiscalizao Bancria

    FICAM - Gerncia de Fiscalizao Cambial

    FIRCE - Departamento de Capitais Estrangeiros

    GABIN Gabinete

    GABC-AE Gratificao de Atividade do Banco Central - Atividade Especial

    GECAM - Gerncia de Operaes de Cmbio

    GEFIN - Gerncia de Fiscalizao Financeira

    GTCUR Gerncia Tcnica em Curitiba

    GTPAL Gerncia Tcnica em Porto Alegre

    GTREC Gerncia Tcnica em Recife

    GTRJA Gerncia Tcnica no Rio de Janeiro

    GTSPA Gerncia Tcnica em So Paulo

    IGC Inspeo Global Consolidada

    ISBAN - Inspetoria Geral de Bancos

    MECIR - Departamento do Meio Circulante

    MP Ministrio Pblico

    MPR Manual de Procedimentos e Rotinas

    OCDE - Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico

    PA Processo Administrativo

    Pt Protocolo de identificao de processo

    SFN - Sistema Financeiro Nacional

  • xvi

    SISBACEN - Sistema de Informaes do Banco Central

    Siscomex - Sistema Integrado de Comrcio Exterior

    SRF Secretaria da Receita Federal

    SUMOC - Superintendncia da Moeda e Crdito

    TIR Transferncias Internacionais em Reais

  • 1

    1. Introduo

    O crescimento do mercado financeiro nas ltimas dcadas, alavancado pela

    crescente integrao das economias mundiais e pelos desenvolvimentos tecnolgicos que

    eliminaram as barreiras geogrficas, introduziu uma dinmica e um alcance aos fluxos de

    capitais que trouxe tanto benefcios como inconvenientes s naes. Se por um lado

    permitiu um acesso mais direto ao capital, e portanto com menores custos, interligou de tal

    maneira os mercados financeiros que os reflexos das instabilidades regionais se fazem

    sentir globalmente.

    O lado menos visvel da integrao dos mercados financeiros encontra-se

    nas dificuldades de se regular as atividades das instituies financeiras numa base

    geogrfica transnacional. Embora agindo de forma global, as instituies financeiras

    permanecem sujeitas s leis do local onde fica sua sede. Suas subsidirias em outros pases

    podem ter tratamento diferente, pois estaro reguladas pelas leis locais. Acordos

    internacionais, ratificados pelos governos locais, permitem, em tese, a uniformizao de

    procedimentos e critrios.

    A motivao para tais acordos se deu principalmente a partir da percepo

    do risco sistmico causado por instabilidades regionais as crises do Mxico, da Tailndia

    e da Rssia serviram como um alerta aos governos. Organismos internacionais, informais

    como o G-10, ou oficiais, como o FMI, tm demonstrado preocupao em orientar os

    pases membros a adotar padres mnimos de exigncia s instituies financeiras sediadas

    em suas jurisdies, e a discutir princpios que devam nortear a superviso bancria destas

  • 2

    instituies. Desde 1974, atravs do Comit de Superviso Bancria da Basilia, Sua,

    estabelecido pelos Presidentes dos bancos centrais dos pases do G-10, a cooperao

    internacional tomou forma, atravs de resolues que tm sido adotadas por pases

    membros, incorporando-as s suas legislaes.

    O Brasil, que participou informalmente da elaborao dos 25 Princpios

    Essenciais para uma Superviso Bancria Eficaz, documento do Comit da Basilia que

    resume exigncias mnimas que os rgos de superviso bancria devem fazer em suas

    jurisdies, tem procurado adequar-se s recomendaes que este frum internacional tem

    emanado.

    A superviso bancria exercida no pas pelo Banco Central do Brasil

    BACEN, e vem sendo remodelada desde 1998, em funo do abalo que as quebras dos

    bancos Nacional, Econmico e Bamerindus produziram na confiana dos investidores no

    Sistema Financeiro Internacional. A adoo dos Princpios da Basilia tornou-se

    imperativa, deslocando-se o enfoque da superviso bancria da fiscalizao de um perodo

    passado para a atuao prudencial, voltada para o presente e futuro, procurando conhecer a

    instituio, seu mercado, oportunidades e ameaas, traduzidas pelo risco de seus ativos.

    Outros temas ligados integrao dos mercados vieram a se somar s

    preocupaes em solidez dos governos e das autoridades supervisoras. A corrupo, na

    medida que no define regras claras e onera investimentos e operaes em geral, torna-se

    um tema mundial, no mais restrito s fronteiras nacionais. A expanso dos negcios

    ilegais ligados ao crime organizado, como o trfico de entorpecentes, a corrupo e a

    sonegao fiscal, favorecem-se do extraordinrio desenvolvimento do sistema financeiro

    internacional para incorporarem na economia dos pases recursos, bens e servios

    originrios ou ligados a atos ilcitos. A lavagem de dinheiro uma atividade em expanso,

  • 3

    com desenvolvimento rpido e concentrado na ltima dcada do sculo XX. Estima-se que

    cerca de US$ 500 bilhes em dinheiro sujo - cerca de 2% do PIB mundial - transitam

    anualmente na economia.

    A lavagem de dinheiro se d por diversos mecanismos, mas alguns setores

    da economia so mais visados, destacando-se os parasos fiscais, as bolsas de valores, o

    mercado de seguros, o mercado imobilirio, as loterias e jogos, e, principalmente, devido

    velocidade e abrangncia que d aos recursos lavados, as instituies financeiras.

    As preocupaes mundiais ligadas ao tema lavagem de dinheiro e atividades

    ilegais vem se materializando desde 1988, a partir da Conveno contra o Trfico Ilcito

    de Entorpecentes e de Substncias Psicotrpicas, assinada em Viena, na ustria, no

    mbito das Naes Unidas, e ratificada pelo Brasil por meio do Decreto 154, de 26.06.91, e

    especificamente no mbito das autoridades financeiras, atravs da Declarao da Basilia,

    de 12.12.88, do Comit de Superviso Bancria. Em maro de 1998, dez anos aps a

    Conveno de Viena, o Brasil aprova a Lei 9613, tipificando como crime a lavagem de

    dinheiro, e criando o Conselho de Controle das Atividades Financeiras o COAF a fim

    de coordenar os vrios rgos governamentais incumbidos da implementao de polticas

    voltadas ao combate a este crime, entre eles o BACEN.

    At 1998, o BACEN dispunha de dois departamentos incumbidos de

    fiscalizar as atividades das instituies financeiras: o Departamento de Fiscalizao -

    DEFIS e o Departamento de Cmbio - DECAM, ligados respectivamente s Diretorias de

    Fiscalizao e de Relaes Internacionais. A atividade de combate lavagem de dinheiro

    no era atribuda especificamente a nenhum dos departamentos, mas inclua-se

    implicitamente nas atividades de auditoria das instituies financeiras desempenhada

    pelo DEFIS e no monitoramento das operaes de cmbio desempenhada pelo

  • 4

    DECAM. As operaes consideradas suspeitas no curso da fiscalizao ou do

    monitoramento de cmbio eram investigadas independentemente por cada um destes

    departamentos. As prticas de cada departamento variavam, mas o foco da atividade era

    corrigir distores encontradas e iniciar processo administrativo no caso de irregularidades

    e ilcitos.

    Em comum, a atividade de fiscalizao das instituies financeiras consistia

    em orientao em relao s normas, prospeco de irregularidades e punio para os

    desvios. Apoiava-se nas normas do CMN, do prprio BACEN e nas Leis 4595 e 4131. O

    fiscal, ou monitor de cmbio, era elemento essencial nestas atribuies. Sua experincia

    determinava o sucesso ou fracasso da fiscalizao. Qualificando-a, a fiscalizao atuava de

    forma prospectiva e repressiva.

    A partir de 1998, com a adoo dos Princpios Essenciais da Basilia, a

    fiscalizao do DEFIS passou a atuar de forma preventiva, verificando a solidez da

    instituio financeira como um todo, nas Inspees Gerais Consolidadas. O monitoramento

    de cmbio passa a constituir um novo departamento, o Departamento de Combate a Ilcitos

    Cambiais e Financeiros - DECIF, incumbido do combate aos ilcitos financeiros e cambiais,

    neles includo a lavagem de dinheiro. O suporte jurdico para esta atuao encontra-se na

    Lei 9613, nas Circulares 2554 e 2852 e na Carta-Circular 2826, do BACEN, todas de 1998.

    Alm de definir o tipo penal lavagem de dinheiro,e seus crimes antecedentes,

    esta legislao inovou ao atribuir responsabilidade s instituies financeiras de manter

    controles internos capazes de detectar operaes consideradas suspeitas e de denunciar tais

    operaes ao BACEN. A fiscalizao passa a atuar na avaliao dos sistemas de controle

    interno o compliance e na investigao dos casos denunciados pelas instituies

  • 5

    financeiras (Circular 2852, do BACEN), em detrimento de uma atuao prospectiva e

    repressiva baseada na experincia.

    Ao criar o DECIF, sob a subordinao da mesma Diretoria de Fiscalizao

    do antigo DEFIS, que passou a constituir o DESUP - Departamento de Superviso Direta, e

    alterar substancialmente as atribuies dos monitores de cmbio, o BACEN introduziu uma

    mudana organizacional destinada a alterar a forma de fiscalizao das instituies

    financeiras. Com base nesses acontecimentos, busca-se nesta pesquisa investigar o seguinte

    problema:

    at que ponto a mudana do mecanismo de controle tradicional, baseado

    nas aes ou resultados e com enfoque repressivo, para um controle

    baseado nos procedimentos, focado na preveno, contribuiu para melhorar

    o desempenho do BACEN na fiscalizao contra a lavagem de dinheiro ?

    Para responder adequadamente ao problema a ser investigado, segue-se as

    etapas estabelecidas pelos mtodos cientficos, que comeam pelo estabelecimento dos

    objetivos da pesquisa descritos a seguir.

    1.1.Objetivos Geral e Especficos

    O objetivo geral deste trabalho consiste em analisar o desempenho do

    sistema de controle organizacional preventivo no combate lavagem de dinheiro atravs do

    Sistema Financeiro Nacional aqui representado pela verificao de compliance e

    comunicados da Circular 2852 em comparao com o sistema repressivo tradicional

    fiscalizao e monitoramento das operaes bancrias.

  • 6

    A fim de possibilitar o alcance do objetivo geral da pesquisa, foram

    estabelecidos os seguintes objetivos especficos:

    Identificar e descrever os critrios de desempenho organizacional para o subsistema

    de fiscalizao do BACEN, com nfase para o grupo de monitoramento de cmbio.

    Descrever a mudana ocorrida no subsistema de fiscalizao do BACEN.

    Descrever a estrutura de controle anterior mudana.

    Descrever a estrutura de controle introduzida com as mudanas .

    Comparar e analisar as estruturas de controle anterior e posterior em relao aos

    critrios de eficcia.

    Este estudo pretende, ainda, como objetivos complementares:

    Apontar, na concluso, como conseqncia dos resultados obtidos e segundo os

    critrios e metodologia empregados, os pontos positivos e as deficincias do novo

    modelo organizacional.

    Propor aes que possam corrigir eventuais falhas identificadas nos procedimentos

    adotados pelo Banco Central do Brasil.

    1.2. Justificativas terica e prtica

    A administrao pblica brasileira tem sofrido profundas reestruturaes nos

    ltimos anos, fruto da necessidade do Estado adequar-se aos imperativos de uma nova

    ordem econmica mundial. Neste contexto, o BACEN reformulou sua misso institucional

    e vem procurando estabelecer novos paradigmas em sua atuao, refletindo as

    preocupaes da sociedade. Temas como corrupo e lavagem de dinheiro requerem do

    corpo social respostas enrgicas e imediatas e o BACEN vem reorientando seu foco nestes

  • 7

    assuntos de forma a dar sua contribuio no esforo do governo para coibir prticas ilcitas

    que se utilizem do sistema financeiro nacional.

    O estudo proposto pretende refletir estas mudanas, detalhando as principais

    motivaes, as formas de sua implementao e as conseqncias previstas. Os resultados

    desta pesquisa podero ser teis numa perspectiva histrica e crtica, indicando para o

    BACEN os acertos e as deficincias da introduo de novas formas de trabalho.

    Considera-se que dada a importncia do tema, a relevncia do estudo

    ultrapassa os limites do BACEN, estendendo-se postura das instituies, e em ltima

    instncia, da sociedade, para com o problema lavagem de dinheiro.

    A reviso das principais abordagens da teoria organizacional relativas

    mudana , ao controle e ao desempenho pretende contribuir para o desenvolvimento de uma

    base cumulativa de conhecimento sobre os temas que, embora tenham merecido ateno do

    meio acadmico, especialmente nos EUA, produziram no Brasil relativamente poucos

    trabalhos. A discusso das motivaes da mudana organizacional, conjugada com a

    anlise da estrutura organizacional e do desempenho procura colocar uma luz sobre a

    coerncia das aes empreendidas, e nesse sentido, preenche uma lacuna da teoria no que

    diz respeito ao planejamento e implementao da mudana.

    Por sua natureza terico-emprica, este estudo insere-se numa linha de

    pesquisa aplicada que valoriza-se sobretudo pela verificao no campo das evidncias

    tericas. Os resultados deste trabalho traro uma contribuio para os planejadores

    organizacionais e para a prtica gerencial ao discutir conceitos e mtodos luz de um caso

    concreto, permitindo verificar-se as conseqncias da mudana nos aspectos controle e

    desempenho.

  • 8

    Acredita-se na importncia da presente anlise de um segmento da atuao

    do BACEN pouco estudado a fiscalizao na medida que o foco na eficcia das aes

    de capital importncia para a instituio. bastante oportuna a discusso dos temas

    propostos, pois a mudana objeto do estudo ainda se processa, e colhe seus primeiros

    resultados. Espera-se contribuir ao propor alguns indicadores para a avaliao do

    desempenho e verificar em que grau as polticas implementadas contriburam para o

    alcance destes resultados. Nossas concluses podero reorientar aes ou sedimentar

    diretivas adotadas.

    Ao abordar a funo fiscalizao, inclui-se no escopo desta pesquisa, ainda

    que indiretamente, as instituies financeiras sujeitas ao fiscalizadora do BACEN. A

    estas compete um papel mais ativo na nova ordem instituda. O presente estudo ser til

    para o sistema financeiro como um todo ao discutir as relaes derivadas deste novo

    contrato social, e suas conseqncias na eficcia do combate lavagem de dinheiro.

    Amplia-se a importncia desta pesquisa, se confirmada a percepo que a eficcia da

    fiscalizao da lavagem de dinheiro pode ser determinada pelo papel desempenhado pelas

    instituies financeiras objetos da fiscalizao.

    1.3. Estrutura da Dissertao:

    Em cumprimento aos objetivos propostos, e visando responder ao problema

    de pesquisa definido, organizou-se a presente dissertao da seguinte forma:

    Inicialmente, apresenta-se a contextualizao do tema da pesquisa, definindo

    o problema de pesquisa a ser investigado, seus objetivos, bem como as justificativas para a

    realizao do estudo.

  • 9

    Em seguida, elabora-se a fundamentao terica-emprica necessria ao

    desenvolvimento metodolgico a ser seguido e s anlises subseqentes. Neste sentido, so

    apresentados inicialmente as teorias e pr-teorias acerca da mudana organizacional,

    identificando-a com o planejamento ou com o imperativo ambiental em sua deciso, e com

    o radicalismo ou o incrementalismo em sua implementao. Para que se possa entender a

    forma e a profundidade da mudana, estuda-se a seguir os mecanismos de coordenao que

    do forma estrutura de controle organizacional. Caracterizam-se as formas de controle

    exercidas nas organizaes a partir da evoluo histrica destas formas, sempre dirigidas a

    garantir a conformidade individual ao processo produtivo. Apresenta-se os elementos

    constituintes do controle organizacional segundo as principais abordagens tericas, no

    esquecendo os aspectos das relaes sociais que precedem e se formam no ambiente

    organizacional e as conseqncias para o trabalho das formas de controle exercidas.

    Discute-se a seguir os resultados do processo produtivo que constituem o desempenho

    organizacional, destacando que sua avaliao faz parte do escopo do controle

    organizacional. Enfatiza-se as caractersticas especficas das organizaes pblicas em

    relao aos critrios de desempenho, fazendo ao final uma resenha dos principais modelos

    desenvolvidos para a avaliao do desempenho organizacional.

    No captulo seguinte, so apresentados os procedimentos metodolgicos que

    guiaram o presente trabalho. So definidas inicialmente as perguntas de pesquisa que se

    pretende esclarecer. Define-se em seguida as variveis a serem analisadas, apresentando os

    indicadores que as tornaro operacionais. Caracteriza-se o tipo de pesquisa, a forma de

    coleta e o tratamento dos dados, e por fim, as limitaes da pesquisa.

    Na seqncia, os dados coletados so apresentados e analisados, segundo o

    modelo descrito no captulo anterior. Procura-se, inicialmente, descrever da forma mais

  • 10

    completa as estruturas anterior e atual, apresentando o processo evolutivo que culminou

    com a mudana, e caracterizando os principais elementos das estruturas estudadas. Na

    anlise dos dados, procura-se extrair das informaes os significados que mais fielmente

    retratem as caractersticas que pretende-se categorizar, baseadas no modelo proposto.

    Apresenta-se as diferenas entre as estruturas inicial e final segundo estas

    subdimenses. Ao analisar o desempenho em cada momento, procura-se estabelecer as

    relaes causa-efeito que justifiquem as constataes efetuadas.

    Nas consideraes finais, recapitula-se os objetivos intermedirios e a

    pergunta principal da pesquisa, apresentando as respostas encontradas neste trabalho.

    Sugere-se medidas para o aperfeioamento da estrutura implantada e possibilidades para

    estudos futuros.

    Finaliza-se o trabalho com as referncias bibliogrficas utilizadas e com os

    anexos que apoiaram o tratamento dos dados neste estudo.

  • 11

    2. Fundamentao Terica

    2.1. Mudana Organizacional

    A sociedade em que vivemos evoluiu de forma assombrosa num curto

    espao de tempo. As inovaes tecnolgicas e o saber vm sofrendo mudanas num ritmo

    acelerado, especialmente no final do sculo XX, com a chamada era da informao.

    Expectativas e necessidades antes difceis de atender, tornam-se a cada dia mais

    acessveis, aguam a vontade, a urgncia, e, mesmo, o otimismo sobre a mudana, como

    afirma Motta (1997, p. x).

    Neste ambiente, a mudana no simplesmente desejvel, torna-se um

    imperativo na luta pela sobrevivncia. Ao mesmo tempo que traz benefcios, sensveis nas

    reas da sade e da comunicao, produz instabilidade, com a automao que reduz o

    trabalho manual e aumenta o desemprego. As formas de trabalho passam por uma grande

    transformao, assim como a vida das pessoas. Alteram-se as crenas ou premissas sobre o

    que as pessoas julgam ser verdadeiro, ou seja, seus paradigmas.

    De acordo com Motta (1997), Thomas Kuhn, em sua obra A Estrutura Das

    Revolues Cientficas, desenvolveu o conceito de paradigma, que pressupe perodos de

    continuidade e descontinuidade provocados por rupturas com o conhecimento existente. O

    conjunto de premissas, teorias e procedimentos aceito substitudo por novos conceitos,

    que so totalmente incompatveis com os anteriores.

    A teoria administrativa baseia-se numa srie de paradigmas. Sobre este

    conjunto de conceitos, ou pr-teorias assentam-se as diversas teorias sobre mudana

    organizacional. importante conhecermos as formas de ver a realidade que estes

    paradigmas proporcionam, pois na convergncia de uma ou mais das pr-teorias aqui

  • 12

    resumidas constroem-se a teoria e os modelos de interveno organizacional. Os conceitos

    aqui enunciados baseiam-se na sistematizao proposta por Motta (1997).

    A mudana pode ser vista como um compromisso ideolgico, com a adoo

    de novos valores ou crenas. O ser humano e seus valores determinam a existncia da

    organizao, ou seja, a organizao no tem existncia autnoma e seus objetivos

    confundem-se com os objetivos individuais. Predomina neste paradigma o pensamento

    sobre a observao. A mudana a busca da verdade pela mudana de pensamento do

    indivduo. Privilegiam-se os mtodos didticos e dialticos na conduo da mudana,

    reconhecendo-se a realidade e o ideal administrativo. O limite da mudana est nas

    vontades e idias contrrias das outras pessoas; as teorias construdas sobre este paradigma

    valorizam o poder da chefia como importante alavancador da mudana.

    A mudana pode ser vista como imperativo ambiental, objetivando readaptar

    a organizao s necessidades provocadas pelo ambiente em que se insere. Separa-se, nesta

    perspectiva, a organizao de seus membros. A organizao entidade autnoma e

    tangvel, e interage com o ambiente buscando o equilbrio que lhe garanta a sobrevivncia.

    Predomina a observao sobre o pensamento, os fatos da realidade sobre as idias. A

    abordagem nesta perspectiva sistmica, valorizando-se a anlise cientfica, que busca

    explicar e prever determinado evento, em relaes de causa e efeito. A mudana

    adaptao ou redirecionamento em funo de cenrios alternativos, baseado nos valores da

    eficincia e eficcia.

    A perspectiva da mudana como reinterpretao crtica da realidade

    pressupe a participao do indivduo, que a partir da interpretao subjetiva da realidade

    objetiva, constri seus prprios valores, que socialmente compartilhados formam a

    organizao. A realidade entendida de forma fenomenolgica e intersubjetiva. As teorias

  • 13

    construdas sobre este paradigma so as teorias de ao social, que valorizam a linguagem

    ou comunicao na compreenso do mundo organizacional. Buscam compreender, e no

    somente explicar, associando a anlise e a fenomenologia. Fundamenta-se ainda no

    estruturalismo, que associado fenomenologia, constri a estrutura histrica e

    contingencial da organizao. A mudana conduzida pelos indivduos, atravs de suas

    habilidades comunicativas, interferindo na estrutura.

    A mudana como uma inteno social

    representa a vertente interpretativista

    do paradigma anterior, rejeitando o estruturalismo, embora apoiado na fenomenologia, a

    qual associa a conscincia da interao e o cotidiano, como no existencialismo. A interao

    das pessoas que cria a organizao, e envolve, alm de significados e intenes, motivos,

    emoes e sentimentos. A mudana organizacional se d na interpretao e reinterpretao

    dos significados subjetivos das relaes entre seus membros. Deste paradigma

    desenvolvem-se teorias de mudana de natureza social e psicolgica.

    Finalmente, o ltimo paradigma v a mudana como transformao

    individual, na busca de uma nova viso de si prprio. A mudana se passa no mundo

    introspectivo, atravs da articulao de sentimentos e significados, em que o indivduo

    desenvolve uma nova forma de ser e renova a vontade de agir. As teorias que se baseiam

    neste paradigma valorizam os recursos emocionais e espirituais, aproximando-se da formas

    utilizadas em algumas filosofias orientais.

    Estes paradigmas no aparecem isoladamente, se superpem e se

    comunicam nas diversas teorias de mudana organizacional.

    A moderna teoria administrativa desenvolveu-se no sentido de explicar e

    descrever a realidade organizacional como parte de uma estrutura social maior.

    Abandonando os princpios intelectuais que dominaram a teoria administrativa do ltimo

  • 14

    sculo, notadamente o reducionismo, o pensamento analtico e o mecanicismo, o moderno

    pensamento administrativo baseia-se no expansionismo, no pensamento sinttico e na

    teleologia. As teorias sobre mudana organizacional formam um conjunto complexo e

    tendem a ser grupadas pela perspectiva de anlise organizacional, sintetizada nas

    abordagens estratgica, estrutural, tecnolgica , humana, cultural e poltica. Pretende-se

    detalhar cada uma destas perspectivas e verificar como elas se refletem na mudana objeto

    de nosso estudo, usando uma viso sistmica, que se beneficie da diversidade dos focos de

    anlise, sem pretender enquadr-lo em um nico modelo (Wilson, 1992; Motta, 1997).

    Wilson (1992) sintetiza as teorias e modelos de mudana em dois eixos

    principais (Quadro 1).

    Quadro 1 Uma Caracterizao de Abordagens de Mudana Organizacional

    O processo de mudana A implementao da mudana

    Mudana planejada (voluntarismo)

    1 Incrementalismo lgico e necessidades variadas, comprometimento e viso compartilhada de modelos

    2 Reduzindo resistncias mudana (anlise do campo de fora)

    Mudana emergente (determinismo)

    3 Caractersticas de decises estratgicas: modelos de processo poltico

    4 Contextualismo: implementao uma funo de fatores e processos antecedentes

    Fonte: Wilson (1992, p.10)

    Na dimenso vertical, a mudana pode ser planejada ou emergente,

    refletindo o voluntarismo no planejamento, e o determinismo na emergncia. No eixo

    horizontal, descreve-se a implementao ora como um processo, ora como uma estratgia

    de implementao, refletindo as principais nfases da literatura sobre mudana.

    Enquadram-se na clula 1 as abordagens de mudana planejada previamente pelo grupo

    gerencial, que procura persuadir as demais pessoas de sua utilidade; requerem uma anlise

  • 15

    de processos e tm seu grau de mudana desejada previamente determinado pelos gerentes.

    Na clula 2, a administrao ainda planeja previamente a mudana, mas sua tarefa primria

    a implementao. A mudana vista como resultado da interao de diversas variveis do

    negcio, num processo emergente, representado na clula 3. Finalmente, introduz-se o

    conceito de contextualismo na clula 4, reconhecendo-se que, embora o jogo de poder

    influencie a mudana, o que importa o contexto em que estes interesses polticos foram

    construdos e operam no momento.

    Wilson (1992) destaca, ainda, a importncia do conceito do grau de

    mudana, identificando-o com os nveis de mudana organizacional, que podem ser,

    conforme o Quadro 2:

    Quadro 2 - Nveis de Mudana Organizacional em Funo do Grau de Mudana

    Grau de Mudana

    Nvel operacional/ nvel estratgico

    Caractersticas

    Status Quo 1 Pode ser tanto operacional quanto estratgico

    Sem mudanas nas prticas correntes

    Reproduo Expandida

    2 Principalmente operacional Mudanas envolvem produzir mais as mesmas coisas (bens ou servios)

    Transio Evolucionria

    3 Principalmente estratgica Mudanas ocorrem dentro de parmetros existentes na organizao (muda, mas mantm estruturas existentes, tecnologia, etc.)

    Transformao Revolucionria

    4 Predominantemente estratgica

    Mudanas envolvem substituir ou redefinir parmetros existentes. Por, exemplo, estrutura e tecnologia provavelmente mudam.

    Fonte: Wilson (1992, p.20)

    Os nveis de mudana de status quo e de reproduo expandida representam

    processos de mudana predominantemente baseados em decises operacionais, envolvendo,

    respectivamente, decises que levam a nenhuma mudana e decises que levam a

    organizao a fazer em maior quantidade o que ela j fazia antes. J as transformaes

  • 16

    evolucionrias e revolucionrias representam nveis de mudana que pressupem processos

    de tomada de decises estratgicas e que requerem a transformao ou substituio do

    modo como a organizao opera e pensa o seu negcio (Wilson, 1992).

    A deciso pela mudana organizacional pode emergir, segundo Motta

    (1997), de deliberao racional (a inteno estratgica), ou pode ser oriunda da necessidade

    de resolver problemas organizacionais (a reao adaptativa), ou ainda provocada pelo

    processo de circulao de idias existentes na prpria empresa (o aprendizado contnuo).

    Para planejar a mudana, crucial a formulao da estratgia empresarial.

    Esta formulao consiste em compatibilizar as tendncias ambientais detectadas pela

    anlise ambiental, em termos de oportunidades, ameaas, restries, coaes e

    contingncias, com as competncias internas, avaliadas pela anlise organizacional, em

    funo dos pontos fortes e fracos, recursos disponveis, capacidades e habilidades.

    Embora seja desejvel antecipar-se e planejar a mudana, as situaes de

    crises e dificuldades so muitas vezes as motivadoras para a adoo de programas de

    mudanas.

    Os programas de mudanas dividem-se entre propostas incrementais, com a

    introduo moderada e constante de novidades, representadas pelos processos de melhoria

    contnua (Kaizen, Qualidade Total), centradas na atividade do grupo e na qualidade do

    produto, e pelos de mudanas planejadas, baseados em mudanas culturais e

    comportamentais (Desenvolvimento Organizacional); e propostas de mudanas radicais,

    que do nfase aos processos (Reengenharia). A mudana radical ameaadora, pois deixa

    explcito o descontentamento com as prticas existentes e implcitas dvidas sobre as

    pessoas em funes gerenciais. Como observa Galbraith, (1982), inovar e operar baseiam-

    se em lgicas fundamentalmente diferentes, e portanto, as mudanas radicais dificilmente

  • 17

    so descobertas por trabalhadores do status quo. Exigem para sua implementao grupos

    autnomos de fora do sistema.

    A mudana do subsistema fiscalizao do BACEN insere-se no

    planejamento institucional da organizao, e numa perspectiva mais ampla, no Plano de

    Reforma do Aparelho do Estado. Desta forma, pode-se considerar que a mudana seja

    planejada, mas tem como pano de fundo alguns elementos externos que reforam a

    possibilidade de imperativo ambiental, em decorrncia da necessidade de uma maior

    insero do Brasil e do BACEN na comunidade internacional, e mesmo de fatores internos

    que propunham uma coordenao nica da atuao da fiscalizao. De qualquer perspectiva

    que se analise a mudana, mandatrio estudar os mecanismos de coordenao da

    organizao para que se possa avaliar os efeitos da transformao na estrutura e nos

    processos objetos deste estudo.

  • 18

    2.2. Controle Organizacional

    A mudana organizacional implica em reavaliar as relaes da organizao

    com o ambiente externo, bem como seus relacionamentos internos, buscando adequar sua

    configurao, de forma a atender uma deliberao ou imperativo estabelecido pela prpria

    organizao ou pelo ambiente social em que est inserida. Para modelar a organizao, a

    teoria serviu-se de metforas que possibilitassem simplificar o entendimento das

    distribuies dos indivduos e suas relaes no conjunto de papis determinado pelo

    contexto organizacional. Assim, o pensamento administrativo utilizou-se, em sua evoluo,

    da analogia da organizao com mquinas, que predominou na abordagem mecanicista

    desde Taylor e Fayol at Weber, analogia com organismos, viso que dominou os estudos

    a partir dos anos 40 (Morgan, 1986). Em ambas as vises, sobressai como elemento

    caracterstico das organizaes, sua estrutura, que pode ser entendida como a forma como o

    trabalho dividido entre os indivduos e a coordenao entre as tarefas resultantes desta

    diviso. Com ligeiras variaes, os estudiosos apresentaram perspectivas semelhantes sobre

    a natureza das estruturas organizacionais. Destaca-se a concepo de Ranson, Hinnings e

    Greenwood (1980, pg. 3), em que a estrutura vista como um meio complexo de controle

    que continuamente produzido e recriado em interao e que, ainda assim modela essa

    interao: as estruturas so constitudas e constitutivas. Esta perspectiva, que enfatiza a

    volatilidade das estruturas, ser retomada mais frente, ao relacionar-se mudana, controle

    e desempenho organizacionais.

    A estrutura organizacional uma modelagem que atende a trs funes

    bsicas: orienta-se aos objetivos organizacionais, limita a influncia das variaes

  • 19

    individuais sobre a organizao e estabelece o contexto em que as decises so tomadas e

    as atividades executadas. Em funo das formas que assumem, as estruturas determinam

    tipologias para a classificao das organizaes. Estas classificaes so teis para o estudo

    comparado das caractersticas de diferentes organizaes e do grau de influncia que

    exercem sobre os resultados alcanados por elas. Embora as estruturas organizacionais

    possam ser vistas pelas diversas perspectivas histricas que a Teoria Administrativa

    apresenta, tenciona-se, neste trabalho, analis-las sob a tica dos mecanismos de controle

    organizacional, que contribuem para o alcance dos objetivos da organizao.

    O controle organizacional tem vrios significados e pode ser interpretado de

    diversas maneiras. forma de alinhar comportamentos individuais ao plano racional da

    organizao. A coordenao e o ordenamento criados a partir dos interesses diversos e

    comportamentos potencialmente difusos de seus membros uma funo prioritria do

    controle (Tannembaum, 1968). Com o surgimento da burocracia, torna-se menos direto e

    visvel, e confunde-se com a estrutura organizacional, como destacam Rosen e Baroudi

    (1992). Adotando uma perspectiva histrica, estes autores verificam que a produo e o

    trabalho so inicialmente avaliados pelos resultados ou sadas produzidos: os sistemas de

    produo artesanais, pr-capitalistas, no so estruturados, embora j se manifeste uma

    forma simples de controle do trabalho, atravs da superviso direta, da hierarquia e do

    ajustamento mtuo dos trabalhadores. Com a revoluo industrial e as mudanas na

    organizao do trabalho, o processo produtivo passa a ser visto como crucial para garantir

    os resultados, e assim, o controle do comportamento individual passa a ser exercido por

    meio de um sistema de regras formais. As estruturas organizacionais, que refletem a diviso

    e diferenciao do trabalho, trazem embutidas estas regras, por meio de controles que

  • 20

    garantam a conformidade individual ao processo produtivo. Desta forma, controle e

    estrutura organizacional fundem-se em estruturas de controle.

    Burris (1989) traa o processo evolutivo das estruturas de controle

    organizacional, que culmina com a integrao das formas alternativas de controle tcnico,

    burocrtico e profissional na forma tecnocrtica, destacando as principais caractersticas,

    resumidas no Quadro 3. No entendimento da autora, as diferentes formas de controle

    organizacional sucedem-se num processo dialtico de racionalizao: a cada crise

    decorrente das contradies internas da estrutura de controle, novas formas so

    desenvolvidas para resolv-las. Em sua anlise, o controle simples, pr-industrial, evolui

    paralelamente em trs diferentes estruturas, que servem aos diferentes ambientes de

    trabalho surgidos com a industrializao: o controle tcnico, nas indstrias, a burocracia,

    nos escritrios, e o profissionalismo, nos ambientes de trabalho especializado, como

    universidades, institutos de pesquisa e entre profissionais liberais. Estas trs formas

    representam tipos estruturais de controle, onde o controle exercido nas regras e hierarquia

    (burocracia), nos sistemas fabris (controle tcnico) ou nos cdigos de tica e educao

    formal (profissionalismo).

  • 21

    Quadro 3 Estruturas de controle organizacional Perspectiva evolutiva

    Estruturas Perodo Caractersticas Contradies

    Controle artesanal,familiar Pr-capitalista Aprendizado Descentralizao

    Colegiado

    Processo laborial e produtivo

    insuficientemente controlados

    Controle simples A partir do sc. XVIII

    Superviso direta

    Autoridade coercitiva

    Disciplina de horrios

    Coero transparente

    Resistncia do trabalhador

    Impraticvel em larga escala

    Controle tcnico A partir do sc. XIX Controle embutido no sistema fabril

    Especializao

    Isolamento do operrio

    Controle e ritmo visveis

    Resistncia do trabalhador

    Inflexibilidade dos sistemas

    de produo

    Controle burocrtico A partir do sc. XIX Diferenciao da estrutura

    Tarefas especializadas

    Asceno baseada em

    critrios objetivos

    Conflitos

    profissionais/burocrticos

    Favoritismo vs. objetividade

    aparente

    Ineficincia e falta de

    flexibilidade para situaes

    imprevistas

    Controle profissional A partir do sc. XIX Grupos elitizados Auto-regulao

    Cdigos de tica

    Formalizao do treinameno

    Conflitos

    profissionais/burocrticos

    Interesses velados vs. tica, auto-

    regulao

    Controle tecnocrtico A partir dos anos 60 Polarizao entre especialistas e no-especialistas

    Especializao tcnica como

    base de autoridade

    Barreiras do credenciamento

    Organizao em equipes, a

    maioria no setor especializado

    Reestruturao de habilidades

    Centralizao/descentralizao

    Potencial produtivo da tecnologia

    avanada frustrado

    Neutralidade aparente vs.

    segregao por sexo e raa

    Adaptado de Burris (1989, p.4)

    A tipologia do controle organizacional de Burris (1989) , em seus

    elementos bsicos, coincidente com as propostas por Rosen e Baroudi (1992), Prez

    Vilario e Schoenherr (1987) e Perrow (1986). No Quadro 4 so resumidas as

  • 22

    denominaes e caractersticas de cada uma destas tipologias, destacando suas semelhanas

    e a sntese que elas representam: o controle tem por base a superviso direta, como no

    controle simples de Burris, no Quadro 3, ou a orientao por regras explcitas e normas,

    como nos controles tcnico, burocrtico ou profissional de Burris (ver Quadro 3), ou ainda,

    pressupostos culturais, que embora no explcitos no controle tecnocrtico de Burris, esto

    presentes no controle colegiado dos grupos de trabalho, compostos de profissionais

    especializados.

    Quadro 4 Tipologias comparadas

    Rosen e Baroudi (1992) Prez Vilario e Schoenherr (1987) Perrow (1986)

    Tipo Base Tipo Meios Tipo Caractersticas

    Controle simples Superviso direta Controle direto Imposio de ordens

    Vigilncia expressa

    Controle direto ou

    reativo

    Superviso direta

    Regras

    Regulao

    Controle burocrtico Orientado por regras

    explcitas

    Indireto

    TI possibilitando a

    conformidade

    comportamental e

    invisibilidade de regras

    Fragmentao de

    tarefas

    Separao

    concepo/execuo

    Controle estrutural ou

    discreto

    Normas e

    regulamentos

    Hierarquia

    Seleo

    Controle burocrtico Padronizao

    Especializao

    Controle ps

    burocrtico

    Controle de idias,

    crenas, valores e

    atitudes (cultura)

    Controle difuso Pressupostos culturais Contole

    completamente

    proativo ou das

    premissas cognitivas

    Internalizao das

    premissas de

    comportamento

    necessrias ao

    desempenho das

    tarefas

    Adaptado de Rosen e Baroudi (1992), Prez Vilario e Schoenherr (1987) e Perrow (1986)

    Os trabalhos de Hall (1984) e Mintzberg (1995) so marcos importantes na

    anlise da organizao pela tica do controle e, como apresentam estudos abrangentes

    dessa teoria, esta pesquisa apia-se com maior detalhamento em suas observaes.

  • 23

    Mintzberg (1995) enfatiza o papel das estruturas na operao eficaz das

    organizaes. Partindo do exemplo da artes de cermicas, que medida que v seu

    empreendimento crescer pela maior aceitao dos produtos no mercado, adiciona

    complexidade sua estrutura organizacional, Mintzberg apresenta o controle

    organizacional como um conjunto de mecanismos bsicos para obter a coordenao entre

    tarefas separadas. Sublinha que estes mecanismos envolvem no s a coordenao entre as

    tarefas, mas tambm a comunicao entre os processos e o controle por um ou mais

    indivduos na organizao.

    A evoluo da complexidade na empresa ceramista d oportunidade de

    apresentar as cinco variaes por ele previstas nestes mecanismos. Assim, quando a artes

    contrata auxiliares e passa a dividir com eles seu trabalho, a coordenao entre os

    operadores se d por ajustamento mtuo, baseada na comunicao informal e nas

    habilidades dos especialistas em se adaptar uns aos outros. Numa segunda etapa, com o

    ingresso de mais operadores na organizao, o trabalho passa a ser dividido por grupos,

    com uma pessoa coordenando por superviso direta o trabalho dos outros, dando-lhes

    instrues e monitorando suas aes. Com a expanso dos negcios da organizao, a

    fabricao passa a ser feita em linhas de montagem, com segmentao das fases do trabalho

    e especializao dos operadores. Nesta fase, a coordenao se d por padronizao, que

    pode ser feita em relao aos processos de trabalho, ou em relao aos resultados ou sadas,

    ou ainda em relao s habilidades e conhecimentos requeridos.

    Ampliando esses conceitos, Mintzberg (1989) identificou adicionalmente a

    padronizao de normas como a coordenao que ocorre nas organizaes em que seus

    membros partilham um mesmo conjunto de valores ou credos, como nas ordens religiosas,

    e no qual o controle se d sobre as normas de trabalho

  • 24

    A padronizao dos processos de trabalho, que corresponde abordagem

    mecanicista de Taylor, utilizada quando as atividades so simples e rotinizadas.

    Operaes mais complexas podem levar a organizao a adotar a padronizao de sadas,

    onde os resultados do trabalho so especificados, mas deixa-se livre ao operador a escolha

    do processo a ser utilizado. A padronizao de habilidades se d no processo de

    recrutamento externo ou por meio de treinamento, quando a habilidade ou conhecimento

    necessrios ao desempenho do trabalho so especificados, o que Hall (1984, p.7) chama de

    padres de afiliao. Corresponde a uma forma indireta de controle, pois consegue para a

    organizao o que as padronizaes de processos ou resultados fazem diretamente.

    Mintzberg (1995) observou que a evoluo da complexidade do

    trabalho faz com que os mecanismos de controle alterem-se sucessivamente do ajustamento

    mtuo para a superviso direta e depois para a padronizao, geralmente para a de

    processos, ou de normas (Mintzberg, 1989, p. 102); com a crescente complexidade das

    operaes, pode-se especificar sadas padro; e se no for possvel especific-las,

    padroniza-se as habilidades necessrias ao trabalho. Entretanto, caso as tarefas

    diversificadas da organizao comprovem ser impossvel a padronizao, retorna-se ao

    incio do ciclo, dando-se preferncia ao mais simples, porm mais adaptvel mecanismo de

    coordenao o ajustamento mtuo. O autor reconheceu tambm que tais formas de

    controle podem conviver numa mesma organizao, e no simplesmente serem substitudas

    sucessivamente. Mais ainda, verifica que dificilmente encontra-se uma organizao que no

    misture em doses variadas estes mecanismos, pois toda organizao combina controles

    formais com comunicaes informais.

    Em seu modelo, Mintzberg (1995) identificou cinco grandes

    componentes na organizao, posteriormente ampliados para seis (Mintzberg, 1989), cujos

  • 25

    interrelacionamentos e fluxos de controle definem seu funcionamento. Desta forma,

    sintetizou a forma piramidal da organizao tendo em sua base o ncleo operacional,

    correspondente aos executores do servio bsico de fabricao de produtos ou prestao de

    servios, e no topo, a cpula estratgica, encarregada de assegurar que a organizao

    cumpra sua misso de maneira eficaz e de satisfazer as exigncias de seus controladores.

    Na poro intermediria, desenhou os nveis intermedirios de chefia como a linha

    intermediria, e em cada lado da pirmide, mas por fora da ligao entre a base e o topo,

    imaginou de um lado a tecnoestrutra, formada por analistas, responsveis por planejar e

    padronizar o trabalho, e do outro a assessoria de apoio, unidades que prestam apoio para a

    organizao fora de seu fluxo operacional. A ideologia, ou a cultura da organizao a

    sexta parte integrante da estrutura (Mintzberg, 1989). Cada um destes componentes atua

    com nfase num mecanismo de coordenao, desde o ajustamento mtuo na cpula

    estratgica e na tecnoestrutura, padronizao no ncleo operacional, passando pela

    superviso direta da linha intermediria.

    Os fluxos operacionais da organizao foram divididos por

    Mintzberg (1995) em cinco tipos: a organizao pode ser vista como um sistema de

    autoridade formal, correspondente ao organograma da empresa, enfatizando-se a superviso

    direta; como uma rede de atividades regulamentadas, que melhor representa o fluxo de

    ordens e instrues vindas da hierarquia, mas que d maior nfase padronizao; como

    um sistema de comunicaes informais, enfatizando o papel do ajustamento mtuo na

    coordenao; como um sistema de constelaes de trabalho, em que os indivduos na

    organizao se agregam em grupos no necessariamente relacionados com a hierarquia, a

    fim de realizar seu trabalho; e por ltimo, como um sistema de processo decisrio

    ad-hoc,

    retratando os interrelacionamentos numa deciso estratgica que envolve os diversos

  • 26

    componentes da organizao. Da mesma forma que nos mecanismos de coordenao,

    Mintzberg sugere que a complexidade da organizao pressupe uma combinao destas

    teorias no seu funcionamento.

    Para descrever a diviso do trabalho e a coordenao de tarefas,

    Mintzberg (1995) utilizou-se dos chamados parmetros delineadores e fatores situacionais.

    Os primeiros indicariam as variveis observadas no desenho das posies individuais, na

    definio da superestrutura, no desenho das ligaes laterais, e no planejamento do sistema

    de tomada de deciso. Os fatores situacionais influenciariam os parmetros delineadores em

    funo do ambiente e caractersticas culturais e polticas da organizao.

    Os aspectos considerados no delineamento de posies individuais

    dizem respeito especializao da tarefa, formalizao do comportamento, ao

    treinamento e doutrinao; no delineamento da superestrutura, destacam-se o

    agrupamento de unidades e as dimenses da unidade; no desenho de ligaes laterais,

    temos os sistemas de planejamento e controle e os instrumentos de interligao; finalmente,

    os parmetros de planejamento do sistema de deciso incluem a descentralizao vertical e

    a descentralizao horizontal.

    O modelo imaginado por Mintzberg (1995) culmina com a tipologia

    de organizaes, classificando-as nas seguintes configuraes:

    Estrutura simples, com base na superviso direta, tendo como componente principal a

    cpula estratgica;

    Burocracia mecanizada, baseada na padronizao dos processos de trabalho, com a

    tecnoestrutura como componente chave;

  • 27

    Burocracia profissional, com nfase na padronizao de habilidades, na qual o ncleo

    operacional o componente chave;

    Forma divisionalizada, com base na padronizao de sadas, com a linha intermediria

    desempenhando o papel principal;

    Adhocracia ou organizao inovativa, baseada no ajustamento mtuo, cujo componente

    principal a assessoria de apoio.

    Mais tarde, o modelo foi ampliado (Mintzberg, 1989), incluindo-se:

    a organizao missionria, baseada na padronizao de normas, tendo a

    ideologia como papel principal;

    a organizao poltica, que no apresenta um mecanismo ou papel

    dominantes.

    A vantagem da anlise sob a tica dessas configuraes est na simplificao

    que o enquadramento do problema real desta pesquisa a um dos padres tericos traz na

    discusso dos mecanismos de controle caractersticos e na direo a ser seguida se deseja-

    se, com a mudana organizacional, atingir outro padro. Outra vantagem est na definio

    dos parmetros delineadores, que sero de grande utilidade para a avaliao da eficcia

    organizacional.

    Contrapondo-se viso sinttica dos mecanismos de controle proposta por

    Mintzberg (1995, 1989), Hall (1984) faz uma anlise das vrias tendncias da escola

    administrativa nos estudos sobre estrutura organizacional e processos organizacionais.

    Constri sua abordagem apresentando os aspectos que considera relevantes, filiando-se s

    correntes cujas concluses lhe parecem mais consistentes, mas sem deixar de mencionar os

    diversos enfoques para cada aspecto considerado. , nesse sentido, uma abordagem mais

  • 28

    rica para a discusso da teoria organizacional, e menos formalizada na construo de um

    modelo de controle organizacional.

    A abordagem de Hall (1984) ao controle organizacional emerge da

    conceituao de aspectos delineadores da estrutura organizacional. Estes aspectos so a

    complexidade, a formalizao e a centralizao.

    A complexidade de uma organizao se reflete na forma que o trabalho

    dividido e as estruturas de controle atuam. Ela no uniforme na organizao, pois

    diferentes partes da organizao podem apresentar variaes em seu grau de complexidade.

    A complexidade pode se apresentar como diferenciao horizontal, diferenciao vertical e

    disperso espacial.

    A diferenciao horizontal traduz em que extenso as tarefas da organizao

    esto subdivididas entre seus membros. Esta subdiviso pode ocorrer pela atomizao das

    tarefas, permitindo que no especialistas possam desempenh-las, ou pela alocao de

    tarefas variadas e abrangentes a especialistas altamente treinados.

    A diferenciao vertical ou hierrquica descreve o nmero de nveis de

    superviso existentes ou necessrios ao desempenho da coordenao das atividades da

    organizao. Os estudos sobre a diferenciao vertical concentram-se na associao desta

    com o tamanho (quanto maior a organizao, maior o nmero de nveis hierrquicos) e a

    tecnologia da organizao.

    A disperso espacial refere-se ao nmero de locais espacialmente separados

    em que as unidades organizacionais se distribuem. Compreende tanto a diferenciao

    horizontal quanto a vertical, conforme a especializao do trabalho, ou os centros do poder

    so espacialmente divididos.

  • 29

    Embora os trs elementos da complexidade possam variar

    independentemente, verifica-se em muitas organizaes uma correlao entre a

    diferenciao horizontal e a vertical (organizaes com intensa subdiviso do trabalho

    tendem a ter menos diferenciao vertical).

    Outra constatao das pesquisas que quanto mais complexas as

    organizaes, maiores os problemas de coordenao, controle e comunicao. Hall (1984)

    comenta que estes problemas foram verificados por Lawrence e Lorsch, no estudo

    Organization and Environment, onde constataram que um alto grau de diferenciao

    (complexidade) relaciona-se com um ambiente complexo e diferenciado, comprovando que

    as organizaes se tornam mais complexas medida que suas atividades e o ambiente que

    os cerca se tornam mais complexos. Interessa-nos sobremaneira outra concluso desse

    mesmo estudo: a complexidade se relaciona, ainda que indiretamente, com a eficcia, posto

    que os problemas de coordenao, controle e comunicao gerados pelo aumento da

    complexidade so fontes de conflito que, surpreendentemente, contribuem, quando

    apropriadamente resolvidos, para a eficcia organizacional.

    O segundo aspecto do controle organizacional na abordagem de Hall (1984)

    a formalizao, definida como o estabelecimento pela organizao das normas e

    procedimentos que sero seguidos. Reflete a opinio dos responsveis pelo processo

    decisrio sobre os demais membros da organizao: baixa quando acreditam que os

    membros da organizao tenham alta capacidade de julgamento e autocontrole; alta

    quando julgam os membros incapazes de tomarem suas prprias decises, carecendo de

    normas para orientar seu comportamento. Pode tambm variar segundo o tipo de situao

    que ela tem de lidar rotineiramente. Assim, sero altamente formalizadas quando as

    situaes so previsveis, como na linha de montagem. Quando as situaes tornam-se

  • 30

    imprevistas, sem nenhum procedimento pr-programado, os membros da organizao

    devem ter liberdade para lidar com elas, caracterizando-se a informalidade ou formalizao

    mnima.

    Hall (1984) aborda em seu trabalho as relaes da formalizao com a

    centralizao do poder, com a mudana organizacional, com a tecnologia e com a

    profissionalizao, e mostra que as pesquisas evidenciam a influncia do meio ambiente e

    da prpria organizao na formalizao. A influncia mais marcante a do ambiente

    tecnolgico em que a organizao opera, enquanto que internamente, a profissionalizao

    faz com que o indivduo traga para a organizao suas prprias normas de comportamento.

    A harmonizao das normas individuais com as de que necessita a organizao fator

    crtico para a eficcia de sua atividade. A formalizao excessiva pode embotar a

    capacidade de ao do indivduo, e provocar sua reao contrria. Por outro lado, a

    formalizao mnima pode gerar comportamento individual inadequado que trar prejuzos

    para a empresa. O equilbrio entre estes extremos um aspecto que a organizao deve

    permanentemente perseguir.

    O terceiro elemento da abordagem de Hall (1984) a centralizao, que

    corresponde distribuio de poder numa organizao. elemento chave do controle

    organizacional e tal como a formalizao, indica a viso que a organizao tem de seus

    membros: quando altamente centralizada, reflete a falta de confiana no pessoal para a

    tomada de decises ou auto-avaliao; no outro extremo, quando menos centralizada, seus

    membros tm mais autonomia no desempenho de suas atividades. Na definio de Van de

    Venn e Ferry (1980), o locus de deciso que determina a autoridade dentro de uma

    organizao. Quando a maioria das decises tomada hierarquicamente, uma unidade

    considerada centralizada; uma unidade descentralizada geralmente implica que a fonte

  • 31

    principal do processo decisrio foi delegada pelos gerentes de linha para o pessoal

    subalterno.

    justamente esse jogo de delegao e normas que define a maior ou menor

    participao dos diversos grupos no processo decisrio. Embora essa participao tenha

    implicaes polticas, o fator tecnologia determinante na atribuio da delegao de

    autoridade, em oposio orientao por normas, e se relaciona com a busca por eficincia

    e eficcia organizacionais. Dornbusch e Scott (apud Hall, 1984, p.83) assinalam que a

    variedade de tarefas, de clareza, previsibilidade e eficcia distintas, executadas numa

    organizao, significa que ela tem tecnologias mltiplas para as quais variaes estruturais

    intra-organizacionais devem ser previstas. Assim, a complexidade da tarefa parece ser o

    orientador da maior ou menor participao no jogo decisrio: nas situaes rotineiras, as

    regras governam as aes dos membros organizacionais, e h pouca tendncia delegao

    de poder; nas situaes em que h incerteza quanto tarefa, provvel que haja maior

    delegao de poder.

    Outros fatores destacados por Hall (1984) que contribuem para a

    centralizao so o tamanho ou porte da organizao e o ambiente em que ele se insere.

    Observou-se que o aumento de tamanho das organizaes implica em maior

    descentralizao na tomada de decises, embora isto no acarrete na perda de controle pela

    organizao. J os estudos sobre a influncia dos fatores externos levam a concluses

    contraditrias. Enquanto alguns estudos sugerem que a competitividade conduz

    descentralizao como forma de atingir o sucesso organizacional, outros chegaram a

    concluses opostas, indicando que o ambiente mais competitivo levava maior necessidade

    de controle e coordenao, ou seja, maior centralizao. A mesma contradio ocorre

    quando se observa a estabilidade dos ambientes organizacionais: enquanto certos estudos

  • 32

    sustentam que a descentralizao mais apropriada para condies de turbulncia ou

    instabilidade no ambiente, outros argumentam em favor da centralizao nestas situaes.

    Uma noo til para a centralizao o acoplamento entre unidades organizacionais. Usado

    para descrever a baixa interdependncia entre unidades organizacionais, surge nos estudos

    de Weick (1976) e Aldrich (1979) esta imagem, que parece ser primeira vista mais

    atraente por representar uma forma de equilbrio entre centralizao e descentralizao. As

    organizaes com baixo nvel de acoplamento seriam, de forma geral, descentralizadas e

    apresentariam como vantagens: a possibilidade, na organizao, das unidades evolurem de

    forma independente umas das outras; a maior sensibilidade s mudanas; a adaptabilidade

    s condies locais; maior capacidade de inovao; o encapsulamento de problemas; o

    maior estmulo a autodeterminao e envolvimento individuais; e o menor dispndio de

    operao, j que os custos de coordenao seriam mais baixos. Hall, no entanto, diverge da

    utilizao desse conceito na pesquisa e na prtica, por considerar que a polarizao

    centralizao-descentralizao mais til na abordagem dos mltiplos pontos de deciso e

    sua distribuio na organizao.

    Finalmente, como forma de exerccio de poder, a centralizao compreende

    a discusso dos sistemas polticos nas sociedades em que esto inseridos e, obviamente

    refletem e tm reflexos no ambiente. A centralizao pode ser vista, nesta perspectiva,

    como forma de fortalecimento do poder vigente, num extremo, ou como forma de alterar os

    arranjos tradicionais de poder dentro da sociedade, no outro. Conceitos como administrao

    participativa, administrao por participao e autogesto emergem como um exerccio de

    democratizao do poder decisrio, embora compreendam nveis diversos desse exerccio.

    importante compreender como a centralizao se relaciona com a mudana

  • 33

    organizacional, pois da luta pelo poder nas organizaes, juntamente com presses

    ambientais, que surgem novas formas organizacionais.

    Zey Ferrel (1979, p. 139) acrescenta ao modelo de estrutura da organizao a

    dimenso da comunicao, que em Hall (1984) aparece como um dos processos

    organizacionais. A autora destaca que na perspectiva de sistemas abertos a organizao

    vista como uma rede de canais de comunicao interconectados que transportam a

    informao para, e a partir do ambiente organizacional , e atravs de sua estrutura interna.

    Lembra que, como o poder, a comunicao relacional, definindo-a como um processo em

    que as idias so transferidas de um remetente para um destinatrio com a inteno de

    mudar o comportamento do destinatrio.

    A comunicao com o ambiente externo de capital importncia para a

    sobrevivncia da empresa, mas no aspecto estrutural dos fluxos internos de comunicao

    que tratam as pesquisas. Segundo seu contedo, estes fluxos criam redes formais e

    informais de comunicao, se este contedo relaciona-se ou no com o trabalho. Como as

    redes informais so formadas entre indivduos que por proximidade, interesses comuns,

    afinidades e valores compartilhados passam a se relacionar fora do fluxo formal da

    organizao, representam fontes potenciais de influncia e poder que podem se refletir na

    estrutura do trabalho, fazendo com que caracterstica inicial de no relacionamento com o

    trabalho desaparea.

    Conforme a direo, os fluxos de comunicao so classificados em

    horizontais e verticais, e estes ltimos so ainda subdivididos de acordo com o sentido da

    comunicao em ascendentes e descendentes. A comunicao horizontal mais freqente

    nas organizaes que a vertical, e seu contedo preponderantemente informal, j que

    concentra o fluxo entre indivduos hierarquicamente no mesmo nvel, seja internamente

  • 34

    unidade ou entre unidades. Apesar desta caracterstica, os pesquisadores do pouca ateno

    comunicao horizontal, concentrando-se na vertical, onde ocorre preponderantemente a

    comunicao formal da empresa. Zey-Ferrel (1979, p.237) considera que estes

    pesquisadores falham ao assumir que toda comunicao relevante ao estudo da organizao

    percorre o caminho ascendente e descendente para ligar departamentos do mesmo nvel,

    subestimando deste modo a existncia da comunicao horizontal direta. A comunicao

    vertical descendente classificada, segundo Katz e Kahn (1987) em instrues de trabalho,

    racionalidade do trabalho (entendimento da tarefa e relacionamento com outras tarefas),

    informaes sobre prticas e procedimentos organizacionais, feedback ao subordinado

    sobre seu desempenho e doutrinao da ideologia da organizao. A comunicao vertical

    ascendente resume-se s questes colocadas pelos subordinados aos seus superiores

    relativas execuo das tarefas, ou retornos de solicitaes superiores, ou sugestes.

    Como pode-se notar, h diversas perspectivas de anlise do controle

    organizacional. Carvalho (1999) destaca que as perspectivas que tm dominado os

    modernos estudos organizacionais so a poltica, que v o controle como exerccio de poder

    e dominao; e a econmica, que tem a eficincia e eficcia como preocupaes centrais,

    tratando o controle como instrumento para a realizao das metas da empresa. Adotando-se

    a perspectiva econmica, sem esquecer os aspectos essenciais de poder e dominao,

    apresenta-se diversas formas de controle, garantidas por tcnicas e procedimentos, que

    pretendem assegurar determinado nvel de desempenho organizao. Como restries a

    estas tcnicas e procedimentos, as relaes sociais que precedem e se formam no ambiente

    organizacional devem ser observadas com ateno. Dois aspectos se destacam nas

    estruturas de controle modernas:

  • 35

    a legitimao do sistema de trabalho a cooperao do indivduo e do grupo social

    com o esforo de produo depende de suas reaes a aspectos psicossociais tais como a

    motivao e, no sentido contrrio, da percepo do controle que lhe imposto. As diversas

    formas de controle podem disfar-lo ou escond-lo nos instrumentos utilizados, tais como

    a tecnologia empregada. A legitimao a aceitao tcita pelo trabalhador da forma de

    controle e do sistema de trabalho institudos, em benefcio dos resultados (Rosen e Baroudi,

    1992). O controle tecnocrtico (Burris, 1989), para o qual evoluram os controles tcnico,

    profissional e burocrtico mais fortemente legitimado que seus predecessores.

    A tecnologia, especialmente a da informao, uma forma poderosa de controle,

    pois alm de trazer embutidas regras, para as quais necessria aceitao de quem opera

    para poder interagir com o sistema, consegue tornar o controle menos perceptvel, fazendo

    com que a legitimao do sistema de trabalho torne-se inconsciente. O controle

    hegemnico, atravs do consentimento, em lugar da coero, facilitado pela utilizao de

    tecnologia da informao. Embora a introduo dessa tecnologia encontre resistncias entre

    os trabalhadores, os computadores tornaram-se to usuais em nossa cultura, que opor-se

    sua utilizao considerada atitude irracional.

    Os impactos da utilizao de tecnologias computacionais so grandes, num

    processo que Rosen e Baroudi (1992) chamam de desburocratizao, que leva ao controle

    ps-burocrtico, com crescente hegemonia do grupo gerencial. Entre eles, destacamos:

    O desaparecimento de orientao explcita por regras, em oposio s regras

    formais da burocracia, atravs da utilizao de sistemas que padronizam a aquisio de

    dados, garantindo um controle procedural e reduzindo a discricionariedade da pessoa que

    desempenha as tarefas. No caso do BACEN/DECIF, verifica-se esta ocorrncia ao se criar

  • 36

    roteiros e formulrios informatizados para padronizar os procedimentos a serem verificados

    no compliance.

    O desaparecimento da hierarquia estrita e extensiva, medida que as

    responsabilidades de supervisores de tarefas que foram automatizadas passam a fazer parte

    do sistema informtico. Na administrao pblica brasileira, este fenmeno vem ocorrendo

    com os tcnicos de nvel mdio, embora suas atribuies nem sempre tenham sido includas

    em algum sistema informtico.

    Conseqncias para o trabalho:

    A des-Taylorizao de tarefas, que corresponde ao reenquadramento do

    trabalho de acordo com a filosofia do novo sistema tecno-social, em oposio

    especializao extensiva e diviso do trabalho caractersticas da burocracia;

    A rotinizao da especializao, que consiste na possibilidade de

    automatizar, atravs de Sistemas Especialistas e inteligncia artificial, por exemplo,

    muitas das tarefas antes consideradas especializadas, no-rotinizveis, possibilitando

    a criao de postos de trabalho com operadores menos habilitados, com menor poder

    de barganha e, conseqentemente, pior remunerados;

    E, relacionada com as anteriores, a desprofissionalizao, tendncia descrita

    por Haug (1973, p. 197) como a perda pelos profissionais das suas qualidades

    nicas, especialmente seu monoplio sobre o conhecimento, a crena pblica no ethos

    do servio e as expectativas de autonomia do trabalho e autoridade sobre o cliente, o

    que acarreta na convergncia de funes burocrticas e profissionais, fazendo com

    que surja uma nova diviso do trabalho, onde profissionais de perfil tcnico

    desempenham tanto funes gerenciais quanto operacionais. Burris (1989) considera

  • 37

    exagerada e insuficientemente comprovada tal anlise, pois persistem nas

    organizaes nveis de privilgio e status para os profissionais especializados.

    Conseqncias para o controle organizacional:

    A pseudo-descentralizao a tecnologia da informao facilita a

    descentralizao de tarefas e do processo decisrio e, ao mesmo tempo, possibilita a

    manuteno ou o crescimento da centralizao do controle, atravs da padronizao

    da informao, armazenamento mais completo de dados, e mais rpido processamento

    da informao. Aumentando a formalizao das tarefas e monitorando os resultados

    das decises de nvel subalterno, ou at prescrevendo estes resultados, a gerncia

    pode dar uma aparncia de tomada de decises descentralizada, enquanto controla

    centralizadamente os resultados. Burris (1989) observa que a tecnocracia assume a

    forma visvel e funcional descentralizada, mas com o controle centralizado

    programado no software; constata ainda que evidncias empricas indicam que a

    descentralizao mais efetiva no nvel especializado, e mais superficial nos setores

    no especializados.

    O controle invisvel a tecnologia da informao permite o controle

    permanente e muitas vezes imperceptvel das aes dos indivduos, que, se percebem

    sua utilizao com este propsito, criam resistncias que tendem a inviabilizar o

    controle pretendido.

    A transposio das limitaes espao-temporais do trabalho, caractersticas

    da burocracia, tem com a informtica uma possibilidade concreta, tornando possvel o

    trabalho em casa. Se por um lado tem o potencial de devolver muito do controle do

    ritmo e do desempenho do trabalho para o trabalhador, por outro amplia o controle e

    monitoramento do local de trabalho para a residncia.

  • 38

    A viso apresentada at aqui d a impresso de que o emprego da tecnologia

    traz conseqncias de forma geral positivas para a organizao, s custas de prejuzo para o

    indivduo, que suporta os impactos mais significativos no seu trabalho. A despeito dessa

    impresso, a tecnologia pode, dependendo da forma que implementada, ser um

    instrumento de fortalecimento (empowering) dos indivduos, favorecendo interesses outros

    que no os gerenciais, e que permitiro a criao de redes informais, tendendo a formas de

    controle mais difusas. A tecnologia de informao flexvel mas no neutra (Burris,

    1989; Rosen e Baroudi, 1992), pois corresponde s intenes e expectativas de seus

    criadores e patrocinadores. Burris (1989) enfatiza os diferentes impactos de sua utilizao

    entre os setores especializado e no especializado de uma organizao. Assim, verifica que

    o setor especializado expande-se nas organizaes centradas em tecnologia avanada na

    mesma proporo que o no especializado contrai-se; enquanto usada para aproximar

    especialistas, atravs das tecnologias de comunicao (e-mails, discusses via internet,

    acesso a bases de dados especializadas), empregada no setor no especializado para isolar

    e controlar os trabalhadores, atravs da fragmentao e monitoramento do trabalho; e

    finalmente, constata que o poder e a informao so mais descentralizados entre os

    especialistas, enquanto vigora uma descentralizao aparente mas com controle

    centralizado entre os no especialistas.

    Conquanto sirvam para destacar as diferenas, as diversas tipologias de

    controle organizacional no se constituem em modelos puros nem exclusivos de uma etapa

    histrica (Carvalho, 1999). Os autores das tipologias analisadas nesta pesquisa concordam

    que na maioria das organizaes, coexistem duas ou mais formas de controle, ajustadas ao

    tipo de trabalho desempenhado em cada unidade organizacional. As pesquisas mais

    recentes destacam a predominncia de uma forma de controle em relao s demais.

  • 39

    Utilizando o modelo proposto por Prez Vilario e Schoenherr (1987), que prev uma

    combinao de formas de controle diferente conforme o tipo organizacional, Carvalho

    (1999) confirma, por exemplo, a predominncia do controle difuso sobre o direto e o

    estrutural em organizaes no-governamentais espanholas. Por outro lado, a coexistncia

    das diferentes formas de controle tem efeitos dinmicos, fazendo com que as formas

    originais evoluam e mudem suas caractersticas em resposta s mudanas ocorridas nas

    formas de controle com que coexistem (Burris, 1989). Alm disto, caractersticas

    contraditrias entre as diversas formas de controle, convivendo num mesmo contexto,

    expem conflitos que sero resolvidos, ou no, por formas alternativas ou alteraes nas

    formas originais. do interrelacionamento entre as formas de controle tcnico, burocrtico

    e profissional que emerge a tecnocracia, que integra estas formas de controle por

    transformaes nos tipos originais.

  • 40

    2.3. Desempenho Organizacional

    A mensurao e a avaliao so atividades intrnsecas ao controle

    organizacional e necessrias para verificar-se os efeitos das interaes com o meio, e para

    propor correes nos processos, em aperfeioamento sistemtico. No h no entanto

    consenso sobre o que se deseja medir. Sob o termo desempenho, diversos significados so

    atribuveis, alguns deles quantificveis, e que historicamente foram empregados pelas

    organizaes como indicadores de sua capacidade de gerar negcios e sobre