frutos maduros por caminhos distintos - unesp

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Igor Zolnerkevic Frutos maduros por caminhos distintos revistapesquisa.fapesp.br/2018/09/24/frutos-maduros-por-caminhos-distintos/ Uma equipe internacional liderada pelo bioquímico Silin Zhong, da Universidade Chinesa de Hong Kong, analisou todo o DNA de 11 espécies de plantas, além de outras moléculas envolvidas na ação dos genes, para desvendar a sequência de reações bioquímicas que controlam o rápido amadurecimento de frutos como o tomate, o mamão e a banana. As conclusões publicadas hoje (24/9), em artigo na revista Nature Plants, fornecem pistas de como aconteceu a evolução das frutas carnosas (com polpa) ao longo dos últimos 160 milhões de anos. “Foi um trabalho complexo e que levou cinco anos para ser concluído”, relata João Paulo Fabi, farmacêutico bioquímico da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP), que gerou dados sobre fisiologia e genética do amadurecimento do mamão papaia para o estudo coordenado por Zhong. Ao todo, os pesquisadores sequenciaram 361 transcriptomas – os conjuntos de todas as sequências de RNA produzidas pelos genes de um organismo. Além disso, realizaram centenas de análises bioquímicas para verificar a influência de proteínas que se ligam às moléculas de DNA, regulando a expressão dos genes das plantas. O resultado é uma enciclopédia de dados genéticos que pode ser consultada no site fruitENCODE . 1/4

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Igor Zolnerkevic

Frutos maduros por caminhos distintosrevistapesquisa.fapesp.br/2018/09/24/frutos-maduros-por-caminhos-distintos/

Uma equipe internacional liderada pelo bioquímico Silin Zhong, da Universidade Chinesade Hong Kong, analisou todo o DNA de 11 espécies de plantas, além de outras moléculasenvolvidas na ação dos genes, para desvendar a sequência de reações bioquímicas quecontrolam o rápido amadurecimento de frutos como o tomate, o mamão e a banana. Asconclusões publicadas hoje (24/9), em artigo na revista Nature Plants, fornecem pistas decomo aconteceu a evolução das frutas carnosas (com polpa) ao longo dos últimos 160milhões de anos.

“Foi um trabalho complexo e que levou cinco anos para ser concluído”, relata João PauloFabi, farmacêutico bioquímico da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidadede São Paulo (FCF-USP), que gerou dados sobre fisiologia e genética do amadurecimentodo mamão papaia para o estudo coordenado por Zhong. Ao todo, os pesquisadoressequenciaram 361 transcriptomas – os conjuntos de todas as sequências de RNAproduzidas pelos genes de um organismo. Além disso, realizaram centenas de análisesbioquímicas para verificar a influência de proteínas que se ligam às moléculas de DNA,regulando a expressão dos genes das plantas. O resultado é uma enciclopédia de dadosgenéticos que pode ser consultada no site fruitENCODE.

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Léo Ramos ChavesAs maçãs ficam no ponto graças aos genes MADS, ligados à formação de floresLéo Ramos Chaves

Ao longo da evolução, desde que surgiram as plantas com flores (angiospermas), frutossecos deram origem a versões carnosas mais atraentes para animais que cumprem opapel de dispersar as sementes ao defecá-las longe da planta-mãe. Por isso, ter seusfrutos devorados só é um benefício para as plantas quando as sementes estão totalmentedesenvolvidas dentro dos frutos, prontas para germinar em outro lugar. Nesse momento ascélulas do fruto verde começam a produzir o gás etileno, hormônio vegetal quedesencadeia mudanças de cor, textura e sabor.

O amadurecimento acelerado de alguns frutos acontece por uma reação em cadeia: apresença do etileno induz à produção de ainda mais gás, em um ciclo de retroalimentação.Isso acontece nas chamadas frutas climatéricas, que foram objeto do estudo, como abanana. Vem desse mecanismo a popular sugestão de embrulhar cachos de bananaverde em jornal: o gás etileno produzido pelos frutos fica preso, acelerando oamadurecimento.

Zhong e sua equipe identificaram os genes e proteínas que modificam a expressão dosgenes responsáveis pela produção de etileno e descobriram três tipos de ciclos deretroalimentação. O resultado indica caminhos evolutivos independentes, corroborando o

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que outros estudos já sugeriam: a evolução das plantas produziu linhagens de frutosclimatéricos de maneira independente ao longo da história da vida na Terra.

Léo Ramos ChavesAs bananas são diferentes dos mamões e outros frutos estudados: respondem aos dois grupos de genesLéo RamosChaves

No mamão, no melão e no pêssego, o ciclo do etileno é controlado por genes do tipo NAC,uma das maiores famílias de genes reguladores das plantas. Já no tomate, na maçã e napera, genes da família MADS comandam. “Os genes MADS são conhecidos por seremessenciais na formação das flores”, explica o agrônomo Lázaro Peres, especialista nafisiologia e genética do tomateiro na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz(Esalq) da USP, que não participou do estudo. A diferença na rota bioquímica explica porque os genomas do tomate, da maçã e da pera sofreram duplicações ao longo daevolução. “A duplicação permite que uma das cópias de um gene ganhe uma nova funçãono desenvolvimento da planta, sem comprometer a antiga”, diz Peres.

A banana é diferente das outras. Talvez por seu genoma ter sido duplicado um número devezes muito maior que o da maioria das frutas, o ciclo de amadurecimento é regulado tantopor genes NAC quanto MADS. A diferença também pode ser atribuída ao fato de a bananaser uma monocotiledônea, classe de plantas que inclui capins e milho, enquanto as demaisplantas com frutos carnosos estudadas são dicotiledôneas – definidas por terem duaspartes na semente (imagine um feijão brotando). Essas duas classes têm muitasdiferenças em sua estrutura e seu funcionamento.

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Além de estudos evolutivos, a equipe de Zhong sugere o uso dos dados da fruitENCODEpara o desenvolvimento de estratégias que retardem a degradação dos frutos durante otransporte, além de aumentar sua duração nas prateleiras dos supermercados.

Artigo científicoLÜ, P. et al. Genome encode analyses reveal the basis of convergent evolution of fleshyfruit ripening. Nature Plants. 24 set. 2018.

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