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Estudos Feministas, Florianópolis, 19(3): 392, setembro-dezembro/2011 853 “Adiós soccer Adiós soccer Adiós soccer Adiós soccer Adiós soccer, here comes , here comes , here comes , here comes , here comes fútbol!”: transnacionalização de fútbol!”: transnacionalização de fútbol!”: transnacionalização de fútbol!”: transnacionalização de fútbol!”: transnacionalização de comunidades espor comunidades espor comunidades espor comunidades espor comunidades esportivas tivas tivas tivas tivas mexicanas nos Estados Unidos mexicanas nos Estados Unidos mexicanas nos Estados Unidos mexicanas nos Estados Unidos mexicanas nos Estados Unidos 2 Resumo Resumo Resumo Resumo Resumo: Este artigo discute a dinâmica esportiva de comunidades mexicanas nos Estados Unidos no contexto do futebol. A partir da análise de grupos mexicanos que imigraram para o território americano e de suas práticas futebolísticas (de resistência), esta pesquisa se questiona se estaríamos presenciando uma “latino-americanização” esportiva dos EUA através do futebol. Como contrarresposta a uma homogeneização e subordinação, os mexicanos-americanos (e, por extensão, os latinos em geral) criaram novas práticas culturais (e, dentre elas, as práticas esportivas) que amalgamam tradições mexicanas com valores da sociedade estadunidense, constituindo, assim, um terceiro espaço (a third space) que transpõe as fronteiras de ambos os Estados nacionais. O presente artigo, portanto, analisa por que um crescente número de imigrantes reforça as relações com suas comunidades de origem no México através da (re)criação de um universo futebolístico próprio, expressando, com isso, uma “mexicanidade transnacional” que não é “harmônica”, mas é marcada por linhas de conflito. Nessa “nova mexicanidade” manifestam-se conflitos de gênero, de classe e étnicos, locais e nacionais, que se dão simultaneamente nos EUA e no México, e que se influenciam mutuamente. Palavras-chave Palavras-chave Palavras-chave Palavras-chave Palavras-chave: futebol hispânico; migração internacional; transnacionalização; “mexicanidades”. Copyright © 2011 by Revista Estudos Feministas. 1 Ingrid Kummels é professora doutora de Antropologia Social e Cultural no Instituto de Estudos Latino-Americanos (LAI) da Freie Universität (Universidade Livre), em Berlim, Alemanha. 2 Artigo traduzido do espanhol, reescrito em português e revisado por Wagner Xavier de Camargo. O artigo original – “Adiós soccer, here comes fútbol!: la transnacio- Ingrid Kummels 1 Freie Universität, Alemanha São chamados de Necaxa, Tlatizapan, El Aguaje, Morelia, Toros ou Pumitas. Nos últimos anos centenas de clubes amadores de futebol proliferam-se por todas as partes. Isso tem ocorrido nos Estados Unidos (EUA), país em que esportes como beisebol, futebol americano e basquetebol têm, tradicional e historicamente, dominado a cena esportiva nacional. Dados clubes, que trazem nomes das comunidades de origem mexicana de jogadores ou de equipes populares do México, atualmente caracterizam a paisagem urbana com pelejas futebolísticas dominicais, tanto em grandes cidades das costas leste e oeste dos EUA

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ResumoResumoResumoResumoResumo: Este artigo discute a dinâmica esportiva de comunidades mexicanas nos EstadosUnidos no contexto do futebol. A partir da análise de grupos mexicanos que imigraram para oterritório americano e de suas práticas futebolísticas (de resistência), esta pesquisa se questionase estaríamos presenciando uma “latino-americanização” esportiva dos EUA através do futebol.Como contrarresposta a uma homogeneização e subordinação, os mexicanos-americanos (e,por extensão, os latinos em geral) criaram novas práticas culturais (e, dentre elas, as práticasesportivas) que amalgamam tradições mexicanas com valores da sociedade estadunidense,constituindo, assim, um terceiro espaço (a third space) que transpõe as fronteiras de ambos osEstados nacionais. O presente artigo, portanto, analisa por que um crescente número deimigrantes reforça as relações com suas comunidades de origem no México através da(re)criação de um universo futebolístico próprio, expressando, com isso, uma “mexicanidadetransnacional” que não é “harmônica”, mas é marcada por linhas de conflito. Nessa “novamexicanidade” manifestam-se conflitos de gênero, de classe e étnicos, locais e nacionais, quese dão simultaneamente nos EUA e no México, e que se influenciam mutuamente.Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chave: futebol hispânico; migração internacional; transnacionalização;“mexicanidades”.

Copyright © 2011 by RevistaEstudos Feministas.1 Ingrid Kummels é professoradoutora de Antropologia Social eCultural no Instituto de EstudosLatino-Americanos (LAI) da FreieUniversität (Universidade Livre), emBerlim, Alemanha.2 Artigo traduzido do espanhol,reescrito em português e revisadopor Wagner Xavier de Camargo.O artigo original – “Adiós soccer,here comes fútbol!: la transnacio-

Ingrid Kummels1

Freie Universität, Alemanha

São chamados de Necaxa, Tlatizapan, El Aguaje,Morelia, Toros ou Pumitas. Nos últimos anos centenas declubes amadores de futebol proliferam-se por todas as partes.Isso tem ocorrido nos Estados Unidos (EUA), país em queesportes como beisebol, futebol americano e basqueteboltêm, tradicional e historicamente, dominado a cenaesportiva nacional. Dados clubes, que trazem nomes dascomunidades de origem mexicana de jogadores ou deequipes populares do México, atualmente caracterizam apaisagem urbana com pelejas futebolísticas dominicais,tanto em grandes cidades das costas leste e oeste dos EUA

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quanto nas da região sul e também naquelas do cinturãoindustrial do entorno dos Grandes Lagos.

Nessas regiões, tais equipes associam-se em ligaspróprias, independentes das ligas anglo-saxãs. Um exemploé a Alianza de Fútbol Hispano, fundada em 2004, a qual sevangloria de representar 200 mil jogadores de futebol e suasfamílias em todo o território estadunidense.3 Em outrosaspectos, esses grupos formam um mundo esportivo à parte,uma vez que o futebol hispânico (hispanic soccer) é jogadode acordo com regras e estilos distintos da variante ‘gringa’(ou norte-americana). Alex Flores, presidente da Liga deFútbol Inter Latinos, assim explica: “Como nós latinos nãosomos muito altos, jogamos mais próximos ao solo, comtoques mais curtos e muitos passes, sem chutes longos oumesmo jogo aéreo, características do jogo anglo-saxão”.4

Estaríamos presenciando uma “latino-americani-zação” esportiva dos EUA através do futebol? E, em casoafirmativo, isso ocorreria pois os migrantes mexicanos seriamferrenhamente apegados às tradições e também àsidentificações esportivas de seu país de origem? Seobservarmos detidamente tal fenômeno, a simples cadeiacausal se complexifica: nativos mexicanos habitantes dosEUA = mesmas preferências esportivas que os mexicanos =futebol como esporte nacional.

Já há algum tempo certas empresas norte-americanastambém intervêm no mundo do futebol latino. Há três anos,por exemplo, a famosa Lowe’s – do setor de decoração deinteriores – patrocina um campeonato no qual várias equipesmasculinas (de jovens e de adultos hispânicos) se enfrentamem 11 cidades, em sistema de alternância entre elas, porsemanas seguidas. Nas finais da Copa Lowe’s, equipessemiprofissionais jogam contra as profissionais mexicanaspropriamente ditas.5 Mike Robinson, diretor-geral daempresa de marketing La Verdad, de Cincinnati, destacapor que também outras companhias norte-americanasinvestem nesse tipo de torneio nacional: “O segredo écooptar hispânicos onde normalmente se encontram. Elesestão em quadras e não em centros comerciais que têmbotiques de luxo”.6

Por outro lado, o governo mexicano também dirigesuas atenções aos migrantes futebolistas. Desde fins dosanos 1990 tem organizado, para os mexicanos esportistasamadores, a Copa México dentro dos EUA.7 Além disso, oexcêntrico empresário Jorge Vergara, de Guadalajara, pelaprimeira vez montou uma equipe de futebol norte-americana,vendendo-a como um ícone desportivo do patrimôniocultural mexicano. Seu time Chivas USA compete, desde2005, na Liga Principal de Futebol dos EUA (US Major LeagueSoccer – MLS) com outras equipes estrelas dos EUA. A intenção

nalización de comunidadesdeportivas mexicanas en losEstados Unidos” – foi publicado naRevista Ibero-Americana, v. VII, n.27, p. 101-116, 2007. Parte dotítulo original é mantida, primeiropor trazer nela mesma as noçõesde transitoriedade e transposiçãodo espanhol ao inglês (nos termos“adiós” e “here comes”), que sãoimportantes no artigo, e, segundo,por apresentar um mesmoesporte entendido não apenas pordois universos linguísticos distintos(“soccer” e “fútbol”), mas porconcepções de jogo bastantediferentes, vigorantes entremexicanos e norte-americanos.3 ALIANZA DEL FÚTBOL, 2006.4 Matt REED, 2006, p. 1.

5 COPA LOWE’S, 2006.

6 REED, 2006, p. 3.

7 Juan Javier PESCADOR, 2004; eChristopher SHINN, 2002.

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por trás dessa ação é estimular os hispânicos a seidentificarem com a equipe e, por meio de suas devoçõesao esporte, influenciarem a competitividade e a qualidadetécnica no interior da MLS, convertendo os EUA em uma naçãodo futebol.8

Esporte, migração e “mexicanidades”Esporte, migração e “mexicanidades”Esporte, migração e “mexicanidades”Esporte, migração e “mexicanidades”Esporte, migração e “mexicanidades”

Grupos de atores sociais (de ambos os lados dafronteira México–EUA) interferem nesse hispanic soccer, e issoprova que o gramado futebolístico se converteu em umespaço central no qual se colocam em cena e se negociamquestões de identidades (nacionais) e organizações sociais,assim como é palco de integração cultural.9 Também outrosesportes dos mexicanos-americanos são expressão de novasrealidades demográficas, sociais e econômicas nos EUA,como mostra uma primeira compilação acerca do tema.10 Aexplicação para isso é a rápida mudança das coordenadasda migração mexicana, que desde os anos 1970 cresceuestrondosamente. Atualmente, os cerca de 27 milhões demexicanos representam o maior grupo imigrante dos EUA,representando 9% da população total. Devido à complexacombinação de diversos fatores, tal corrente migratóriacontinua em franca ascensão. Desde os anos 1990,sobretudo, muitos desses migrantes se deslocam a novosdestinos na costa leste e no sudeste dos EUA, fato que temtransformado, substancialmente, a composição e adinâmica étnicas nessas regiões. Além disso, dadas ascaracterísticas das ondas migratórias, tanto os gruposdenominados “hispânicos” quanto os chamados de“mexicanos”, ou “mexicanos-americanos”, são, emrealidade, grupos muito heterogêneos.11

Cientistas e políticos populistas de direita, por suavez, instrumentalizam homogeneizações em tais categoriasa fim de provocar temores sobre “a” populaçãoestadunidense ante uma suposta transformação culturalnociva da própria sociedade.12 De outra parte, cientistas“transnacionalistas” argumentam que, com a ajuda denovas práticas culturais, os mexicanos étnicos13 driblam asintervenções dos Estados nacionais – tanto de seu país deorigem como do país de destino –, escapando, dessa forma,da discriminação e da subordinação de classe (e “racial”)na sociedade norte-americana. Habitantes de grandescidades (e mesmo de povoados) no México mantêm relaçõessociais duradouras com seus parentes e amigos nos EUA,impulsionadas pela globalização dos mercados detrabalho, por novos meios de comunicação e por dinâmicasglobais de difusão cultural. Consequentemente, osimigrantes são ativos, tomam decisões, assim como formam

8 CHIVAS USA, 2006.

10 Jorge IBER e Samuel REGALADO,2007.11 Emprego o termo “origináriosdo México” da mesma forma comque se utiliza na atual estatísticaamericana mexican ou ofmexican origin, ou seja, como umtermo coletivo, o qual inclui tantoos descendentes dos mexicanosque foram naturalizados comoconsequência da guerra entreMéxico e EUA de 1846 a 1848quanto os cidadãos nascidos ounaturalizados nos EUA, os quaistêm uma ascendência mexicana(mexican americans), e atémesmo os recentes imigrantessem documentos (US-Mexicans,vulgarmente denominados“illegalaliens“). Sob a designação“hispânicos” (hispanics) incluem-se pessoas de países latinos ouluso-americanos. Apesar disso,esses termos coletivos não seafinam com as autorrepresen-tações e autoatribuições dosatores, suas diferentes situaçõesde interesse e a consequentecomplexidade das interaçõessociais, como mostraremos notranscurso deste artigo. Osenvolvidos preferem o termocoletivo latinos ou latinas emlugar de hispânicos (hispanics).12 Por exemplo, SamuelHUNTINGTON, 2005.13 O termo “mexicano étnico”agrupa os originários do Méxiconos EUA e os cidadãos mexicanospropriamente ditos.

9 PESCADOR, 2004.

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novas comunidades dentro de um espaço transnacionalconstituído por tais redes.14

David Gutierrez15 faz menção a uma partida de futebolque aconteceu em fevereiro de 1998, em Los Angeles. Nomomento em que a equipe nacional mexicana ganhou dosEUA pelo placar de 1:0, a maioria dos mais de 90 milespectadores do estádio gritava de alegria. Algunsjogadores do time norte-americano se queixaramamargamente de que aquela não era uma partida “emcasa”, pois o jogo aconteceu em uma cidade onde se estimaem 50% o número de hispânicos na composição dapopulação. Para o autor, o “drama simbólico” dessa partidaé sinal da atual “desestabilização de concepções uniformesde comunidade, cultura, nacionalidade e, inclusive, daideia de ‘nação territorial’”.16 Como resposta a suahomogeneização e subordinação, os imigrantes mexicanoscriaram novas práticas culturais que amalgamam suastradições com valores da sociedade estadunidense,constituindo, assim, um terceiro espaço (a third space) quetranspõe as fronteiras de ambos os Estados nacionais.

Na mesma linha argumentativa acham-se ostrabalhos sobre a cultura mexicana do futebol na regiãodos Grandes Lagos, do lado americano.17 Desde os anos1920, os migrantes mexicanos se organizam emagrupamentos de vizinhos, e em pequenas comunidades,por meio do futebol. Mediante a cooperação esportiva comgrupos de imigrantes europeus (que trouxeram pela primeiravez o futebol àquela área), fizeram-se respeitar e sãoapreciados pela sociedade em geral. O autor sublinha quetais atores agregaram ao ócio futebolístico valores da classetrabalhadora estadunidense, conferindo-lhe uma novainterpretação. Nesse processo ressaltaram valores comodisciplina, masculinidade, individualidade e competência.Posto isso, Pescador, com razão, desvirtua a hipótese de queo boom futebolístico nos EUA deve-se ao fato de que ospraticantes imigrantes seguiriam ferrenhamente as tradiçõesde seu país de origem. Em contrapartida, não oferece umaexplicação sobre a forte e pronunciada influência mexicanano futebol desenvolvido nos EUA. Os jogadores dessehispanic soccer nominam seus times segundo suascomunidades de origem e até mesmo com nomes deequipes profissionais mexicanas; e com frequência, inclusive,recrutam novos talentos esportivos do país vizinho. Assim,resta a questão: por que um crescente número de imigrantesreforça as relações com suas comunidades de origem (emesmo sua pátria) por meio do futebol?

Uma análise que toma o esporte como ponto departida pode desvelar dinâmicas da identidade social nosEUA latino-americanizados. Pesquisas sobre etnologia do

16 GUTIERREZ, 1999, p. 483.

17 PESCADOR, 2004 e 2007.

14 Linda BASCH, Nina GlickSCHILLER e Cristina SzantonBLANC, 1994.15 David GUTIERREZ, 1999.

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esporte, com vieses históricos e transnacionais, mostram deque modo atores sociais – particularmente sob os efeitos daglobalização – utilizam a prática esportiva para dirimirconflitos sociais pelo controle do corpo físico e como,simultaneamente, contestam as identidades sociais, ospapéis de gênero, as atribuições étnicas e nacionaisexistentes, renegociando-os.18 Tanto a classe dominantecomo as dominadas souberam aproveitar as possibilidadesque oferece o esporte como ordem de conhecimento que setransmite através do corpo, ou seja, o esporte é mais acessíveldo que conhecimentos que estão mais estreitamentearticulados com uma formação institucional; e também oesporte goza de uma grande aceitação, seja porque épercebido geralmente como ‘apolítico’, seja por ser vistoalijado de interesses econômicos.

Os representantes das potências coloniais trataram,a miúde, de evitar de antemão a resistência doscolonizados, tentando pressioná-los por meio de seuesquema de “raças”, nações e classes, justamente por meiode práticas cotidianas como o esporte. De outra parte, osoprimidos transformaram os esportes introduzidos emespaços sociais a fim de “colocar em cena os antagonismosde situações coloniais e pós-coloniais e de lhes dar umasolução imaginária”.19 Por assim dizer, os esportistasaficionados “reinventam-se” através da prática esportiva,“conscientemente como atores de mudança cultural”.20

Dessa forma, por meio do futebol jogado nos EUA,poder-se-ia dizer que os esportistas hispânicos efetuam umainversão simbólica comparável a das relações de poder noâmbito societal? Expressariam, através daquelamodalidade, um novo conceito de “mexicanidade”? Aseguir abordaremos tais questões e, além disso, partindo deuma perspectiva histórica do contexto dos anos 1940 e daatualidade, analisaremos o desenvolvimento do futebol –tanto no México quanto nos EUA – particularmente em respeitoao segundo potencial “esporte nacional” mexicano: obeisebol.21

Apropriações regionais do beisebol e doApropriações regionais do beisebol e doApropriações regionais do beisebol e doApropriações regionais do beisebol e doApropriações regionais do beisebol e dofutebol: o caminho mexicano emfutebol: o caminho mexicano emfutebol: o caminho mexicano emfutebol: o caminho mexicano emfutebol: o caminho mexicano emdireção a um esporte nacionaldireção a um esporte nacionaldireção a um esporte nacionaldireção a um esporte nacionaldireção a um esporte nacional

A instrumentalização do futebol (por parte dediferentes grupos de atores), descrita anteriormente, transmitea imagem de uma longa tradição futebolística nacional.No entanto, se analisado detidamente, o México é um paísdividido em relação às suas paixões esportivas, mesmoquando o futebol tem ganhado espaço: somente no centrodo país há um domínio indiscutível do esporte-rei; o norte e

18 Pierre BOURDIEU, 1992; eJeremy MACCLANCY, 1996.

21 Em seu Programa para umaSociologia do Esporte, Bourdieu(1992, p. 195) destaca que, “[…]para compreender um esporte dequalquer tipo, […] é necessáriodiscernir a posição que ocupadentro do espaço dos diferentestipos de esporte”.

20 Louis PÉREZ, 1994, p. 500.

19 Cyril Lionel JAMES, 1963, p. 23.

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o sudeste mexicanos mostram uma preferência pelo beisebolmarcada pelo regionalismo. Se efetuado um upgradetemporal, hoje tal questão é atravessada pela política epela economia: em 2006, por exemplo, o candidato àpresidência Andrés Manuel López Obrador – originário deTabasco – pediu publicamente ao empresário dastelecomunicações da capital, Carlos Slim, que sua empresa(Telmex) patrocinasse, além das mais de 15 mil equipes defutebol, também os times de beisebol.22

Aqui se faz necessária uma explicação sobre por queo beisebol, que nos anos 1950 ainda superava o futebol empopularidade, posteriormente, acaba se tornando umesporte secundário. Pouco tempo depois que Alexander JoyCartwright propôs as regras do jogo moderno em Nova Iorqueno século XIX, o beisebol também se converteu em umesporte local na Península de Yucatán. Trabalhadorescubanos adotaram-no por volta de 1860, e tanto integrantesda elite nacional yucateca (que em parte haviam estadonos EUA) como também muitos outros trabalhadorespassaram a praticá-lo rapidamente.23

Ao norte do México algumas companhias norte-americanas, que durante o Porfiriato24 investiram namineração e na construção ferroviária, patrocinaram obeisebol com o intuito de transmitir aos empregados valorescomo espírito de equipe, considerados por elasimprescindíveis para a construção de uma modernasociedade industrial. Os habitantes dessa região adotaramo esporte rapidamente como parte de um estilo de vidamoderno, e Wallace Thompson (editor de uma revista)constatou: “foi o que mais próximo chegou o México de ter umesporte ‘nacional’”.25 Além disso, nos estados norte-americanos próximos da fronteira, constelações de poder emotivações semelhantes contribuíram, desde os anos 1920,para que migrantes de origem mexicana (em sua maioria,trabalhadores da agroindústria) jogassem, sobretudo,beisebol.26

Empresas – como a produtora de cítricos Sunkist –,patrocinavam a criação de equipes de beisebol entre ostrabalhadores mexicanos temporários com o intuito deincrementar a produtividade desses e angariar suasrespectivas lealdades. No sul da Califórnia, por exemplo, oshabitantes de comunidades mexicanas e de bairros urbanoslogo fundaram inúmeros clubes, que jogavam entre si.

Esse perceptível isolamento pode ser relacionadocom a prática da segregação, própria do mundo esportivodos EUA. Até 1947 negava-se o acesso de jogadores afro-americanos e latinos de pele escura aos clubes profissionaisque competiam na MLS. Entretanto, com a ajuda de equipesde beisebol próprias, o grupo heterogêneo de mexicanos

26 ALAMILLO, 2007.

23 REGALADO, 1998.

22 Coletânea de entrevistas comObrador sobre as relações comCarlos Slim, consultar ETECÉTERA,2006.

24 “Porfiriato” ou “Porfirismo”, comoé conhecido na história doMéxico, é o período de 1884 a1911 em que, devido a mudançasna constituição nacional, o militarJosé de la Cruz Porfirio Díaz Morypresidiu o país (Nota do Tradutor).

25 José ALAMILLO, 2007, p. 52.

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que haviam sido naturalizados como consequência daguerra entre México e EUA, os mexicanos-americanos e osimigrantes recentes reposicionaram-se diante dos conflitos“raciais” e de classe. Através do beisebol, tais indivíduosmanifestaram uma consciência étnica comum, umasolidariedade comunitária e um comportamento masculinoque, dessa forma, se faziam respeitar. Além disso, ligaram obeisebol às suas vidas cotidianas nos EUA. Os imigrantes(homens na maior proporção) reproduziam e reforçavam,na arena masculina do beisebol, a dominação masculinado mundo laboral agroindustrial.27

Os mexicanos de ambos os lados da fronteiratransformaram o beisebol, nesse período, em um fenômenotransnacional. Equipes mexicanas cruzavam regularmentea fronteira a fim de participarem de competições no sudoestedos EUA. Jorge Pasquel, um empresário milionário da capitalmexicana, patrocinou o beisebol do país asteca com grandeapoio financeiro, a partir dos anos 1940, influenciado porum sentimento de nacionalismo mexicano e pela ideia dedesafiar os EUA, no âmbito esportivo, de igual para igual.Apropriando-se da prática de segregação nos EUA, comproujogadores-estrelas afro-americanos para equipesmexicanas; em 1949, inclusive, passou a alistar jogadoresbrancos. Dessa forma, conseguiu um rápido incremento naqualidade – e mesmo na popularidade – da Liga Mexicanade Beisebol. Mexicanos de ambas as partes da fronteiraexpressaram, por meio de seus apoios a essa liga, umsentimento de pertencimento transnacional. Por certo tempo,a manobra empreendida pelo empresário funcionou acontento. Contudo, sua política agressiva de recrutamentode jogadores de outros clubes provocou uma contramedidapor parte das ligas estadunidenses, que frearam seuambicioso projeto.28

O futebol, naquela época um esporte semimportância tanto no México quanto entre os migrantes nosEUA, impôs-se, primeiramente, em algumas cidadesindustriais do centro do México nas quais as empresasbritânicas possuíam hegemonia na mineração e na indústriatêxtil. No entanto, em meados do século XX, trabalhadoresbritânicos especializados jogavam entre si do mesmo modocomo já ocorria em outros lugares da América Latina. Nosanos 1920, a exclusivamente britânica Liga Mexicana deFootball sofreu uma derrocada decisiva no momento emque, pela primeira vez, clubes espanhóis passaram emquantidade os britânicos.

Os clubes mexicanos, por sua vez, também semultiplicaram, principalmente graças a membros de classesaltas que haviam estudado (ou trabalhado) em paíseseuropeus. Algumas companhias, sindicatos e instituições

27 ALAMILLO, 2007.

28 Mais detalhes sobre asmanobras efetuadas, consultarAlan KLEIN, 1997, p. 66-113.

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governamentais mexicanos financiaram tais clubes.Quando futebolistas espanhóis e mexicanos começaram amanifestar orgulho nacional através das partidas e menosressentimentos entre si, o futebol experimentou uma fase deintensa popularidade. A disputa entre esses grupos estavaintimamente relacionada com a posição da Espanha comopotência colonial. Os mexicanos atualizaram esseantagonismo em vista do crescimento da comunidadeespanhola e sob os auspícios de seu predomínio emdeterminados setores econômicos. Dois clubes de classebaixa na capital – Necaxa e Atlante – ficaram bastantepopulares justamente por triunfar sobre equipes espanholase até hoje continuam sendo importantes. Com o tempo, asequipes de futebol dirimiram menos os antagonismos étnicosdo que os de classe.29

Nos anos 1960, o futebol ganhou em popularidadeem relação ao beisebol em terras mexicanas, fenômeno noqual a televisão, o novo meio de comunicação da época,exerceu papel fundamental. Por exemplo, quando em 1950a primeira emissora começou a trabalhar na Cidade doMéxico, inclusive esportes como o boxe, as corridas de tourose mesmo a luta livre cativaram muitos seguidores. Nãoobstante, os esportes que se adaptavam com granderapidez à transmissão televisiva cresciam em importância.

Além disso, a televisão estabelecida na capitaldemonstrava maior interesse de difusão de esportes queeram mais populares no centro do país do que nas demaisáreas, apoiando financeiramente, sobretudo, campeonatosnacionais com vistas a transmitir os jogos. Esse processo afavor do futebol experimentou um estímulo adicional comas celebrações dos Jogos Olímpicos de 1968 e da Copa doMundo de Futebol de 1970, ambos na Cidade do México,mediante os quais as imagens do futebol obtiveram ummarco de prestígio e foram difundidas, de forma intensiva eem nível suprarregional, através do então popular meio detransmissão: a televisão.30

Mundos esportivos paralelos nos EUA eMundos esportivos paralelos nos EUA eMundos esportivos paralelos nos EUA eMundos esportivos paralelos nos EUA eMundos esportivos paralelos nos EUA epráticas de empoderamentopráticas de empoderamentopráticas de empoderamentopráticas de empoderamentopráticas de empoderamento

No passado o futebol tinha um status marginal e demenor importância também nos bairros mexicanos do meio-oeste americano. Uma das razões de tal fato era de a maioriados imigrantes mexicanos originarem-se de comunidadesrurais onde, costumeiramente, se jogava o balompié.31

Apesar disso, Chicago era exceção no cenário nacionalnorte-americano: as estruturas esportivas e as de atividadesde lazer existentes na cidade giravam em torno do futebol etinham sido fundadas por britânicos e outros imigrantes

29 PESCADOR, 2007.

30 PESCADOR, 2007.

31 Literalmente “bola no pé”. Obalompié é um antecessor dofutebol contemporâneo, deorigem e influência espanholas(Nota do Tradutor).

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europeus (como irlandeses, checos, poloneses e croatas). Acidade até hoje tem a liga de futebol mais antiga dos EUA esegue sendo o centro nacional da modalidade.32

Os imigrantes mexicanos em Chicago se adaptarama essa estrutura e fundaram, no ano de 1927, o clubefutebolístico Necaxa, em uma referência histórica a um quefora criado em 1923, na capital mexicana. Os membros desseclube se associaram, nos anos 1940, a uma liga amadorade imigrantes europeus – a Liga Nacional de Futebol deChicago (Chicago National Soccer League – CNSL), a qualse converte em uma liga mexicana–europeia. Assim, dentrodessa organização surgiu uma estrutura competitiva queseguiu uma lógica nacional similar àquela existente (àépoca) entre equipes mexicanas e espanholas no México:a equipe mexicana competia com as demais compostasde imigrantes europeus. Isso ocorreu com êxito, e tal equipesubiu até a divisão mais alta daquela liga. Contudo,atualmente na CNSL enfrentam-se, por exemplo, DeportesColomex com FC Romania ou com FK Bosanska Dubica,33

equipes amadoras ou semiprofissionais que não são tãoexpressivas. As rivalidades esportivas se desenvolveram aolongo das mesmas linhas étnicas que conformavam omundo laboral da indústria pesada do aço, em quemexicanos e europeus competiam aguerridamente porpostos de trabalho. O processo de integração nas ligasamericanas de futebol foi mais fácil para os migrantes queo praticavam do que para aqueles que jogavam beisebol,modalidade que se negou, formal e informalmente, a cederespaço à participação desses indivíduos.

Além disso, os imigrantes usavam os clubes de futebol(como o Necaxa, por exemplo) para reestruturarem seusmomentos de ócio e lazer, ampliando-os com atividadessociais que iam além do esporte em si. As equipes, os meiosde comunicação locais, os empresários mexicanos e umaincipiente indústria “étnica” do entretenimento promoviam-se mutuamente em tal desenvolvimento, já que cada um sebeneficiava da cooperação. Algumas empresas, visandoprincipalmente à população mexicana (sobretudorestaurantes, lojas de cosméticos, charcutarias,34 armazénsde bebidas e emissoras de rádio em língua espanhola),cofinanciavam os clubes de futebol, desejosos porconquistar os fanáticos do esporte como possíveis clientes.Os novos modelos de consumo, dessa forma, participavamdo modus cultural mexicano, mas se orientavam porinfluências norte-americanas, formando parte de um novoestilo de vida dos migrantes e de seu estabelecimentoduradouro nos EUA.35

Paralelamente alguns imigrantes mexicanos seutilizaram dos clubes esportivos para construir (ou reforçar)

35 PESCADOR, 2007.

32 Gabriela ARREDONDO e DerekVAILLANT, 2006.

34 Em países como França e Itáliatal localidade vem se desenvol-vendo desde a Idade Média comouma forma de conservar carnes.A charcuterie era especializadana produção e venda de embuti-dos, linguiças, charques, chouri-ços, salsichas, bacon e afins (Notado Tradutor).

33 NSL CHICAGO, 2006.

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redes transnacionais duradouras entre seu país de origem ea comunidade de destino. Tais redes sociais facilitaram epromoveram a decisão de migrar e, portanto, aceleraram,no transcurso de uma geração, a continuidade domovimento migratório.

Douglas Massey e colaboradores36 descrevem esseprocesso para o caso dos emigrantes da cidade industrialde Santiago, Jalisco, que se concentraram, principalmente,em Los Angeles (LA). A fundação oficial de um clube defutebol lhes permitiu cobrar taxas de filiação aos membros emelhorar rapidamente a qualidade da equipe amadora.Por sua vez, as vitórias obtidas em jogos motivaram a quasetotalidade dos oriundos de Santiago a aderirem ao clube,que conseguiu assegurar um campo de treinamento em umparque público de LA, o qual se tornou um espaço deencontros fixos dos migrantes residentes da (e também dosque chegavam à) cidade. Mais tarde, compraram casasnas redondezas, transformando o espaço, ao longo dosanos, em “seu” bairro. Motivados pela pressão de êxito, ostreinadores da equipe de futebol buscaram na comunidadede origem no México mais jogadores com talento, inclusivelhes pagavam o “coyote”37 para que conseguissemtransladar o espaço da fronteira e fazer parte de suaequipe.38

Os mexicanos-americanos conquistaram, através dofutebol e de outros esportes jogados em equipe, um espaçosocial de convívio e, através desse, atacaram as estruturasde ócio existentes nos EUA, modificando-as.39 Antes daSegunda Guerra Mundial, justamente nos parques, naspiscinas e em outros estabelecimentos públicos ocorria asegregação social de acordo com o conceito de “raça”dominante, sendo o acesso negado aos mexicanos. Essesse viam obrigados a se deslocar para terrenos baldios oupara localidades agrícolas abandonadas. Até hoje em diase discriminam (veladamente) jogadores de futebolhispânicos, negando-lhes acesso aos parques públicos delazer e entretenimento.40

A falta de instalações atrativas para o tempo livreinfluenciou futebolistas mexicanos de Chicago e região aabandonarem a CNSL e a fundarem em 1968, pela primeiravez, uma liga própria que passou a ser chamada deAssociação de Futebol Latino-Americano de Chicago(Chicago Latin American Soccer Association – Clasa). Adecisão foi desencadeada pelo descontentamento dosfutebolistas imigrantes mexicanos com o fato de que osdelegados de origem europeia monopolizavam a liga efavoreciam suas equipes. Através da Clasa, os mexicanosabriram caminho a trinta parques públicos e a mais dequarenta campos de futebol.41 Dessa maneira, transfor-41 PESCADOR, 2004.

37 Atravessador da fronteiraMéxico–EUA. Geralmente cobrapor “cabeça” para ajudar nocruzamento ilegal da fronteira(Nota do Tradutor).38 Ver também Michael RILEY,2003.

40 Joel COHEN, 2006.

39 ALAMILLO, 2007; e PESCADOR,2004.

36 Douglas MASSEY et al., 1987.

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maram os parques em lugares de encontros permanentesdas famílias mexicanas de toda a região. Essas, por suavez, estruturaram suas atividades recreacionais dominicaisem torno das partidas de futebol aí organizadas,convertendo tais jogos em eventos centrais.

A transnacionalização do A transnacionalização do A transnacionalização do A transnacionalização do A transnacionalização do futebolfutebolfutebolfutebolfutebol a partir a partir a partir a partir a partirda década de 1990da década de 1990da década de 1990da década de 1990da década de 1990

Desde os anos 1990 a migração vinda da AméricaLatina tem se intensificado: aproximadamente a metadedos oriundos do México e dos hispânicos que vivem nos EUAse moveu para esse país a partir dessa década. Tal ondamigratória tem novas características: primeiro chegava,sobretudo, das regiões que se encontravam em guerra civil(notadamente Honduras, El Salvador, Guatemala eColômbia) e, mais tarde, provinha do México e do Equador,países atravessados por intensas crises econômicas efinanceiras.

Os imigrantes, por sua vez, vêm de países com umaclara preferência pelo futebol como esporte. Com respeito aesse aspecto, há que levar em conta a hipótese segundo aqual os latinos, atualmente, servem-se do futebol (esporteinternacionalmente com grande apelo e bastante popularno hemisfério sul) para “sustentar uma conexão profunda eduradoura com a América Latina”, que se torna um marcocultural a partir do qual eles forjam “um incipiente sentidode pátria em terras norte-americanas”.42 Grande parte dessesimigrantes se dirigem a cidades e regiões estadunidensessem qualquer tradição de colonização de hispânicos.Entretanto, os migrantes de diferentes origens e de distintasgerações e classe sociais usam o futebol de modointencional como um recurso que cria comunidade. Atravésda modalidade tentam melhorar a qualidade do tempo delazer em suas novas áreas de moradia, fazer trabalhocomunitário ou obter acesso a consumidores hispânicos.Além disso, o futebol também foi descoberto pelostrabalhadores comunais, pelos centros de formação, pelasorganizações juvenis, pelas instituições sem fins lucrativos,pelas instituições sociais públicas, pelos meios decomunicação de massa e pelas empresas não étnicas. Aatual política norte-americana, de sua parte, trata de integraros migrantes que vivem há muito tempo no país com seusdescendentes. Desse modo, recorre-se ao futebol dentro doespaço do trabalho comunitário fomentado pelo Estado afim de agregar os latinos.

Pode-se, assim, levantar alguns dados quantitativossignificativos que identificam o crescimento do futebol viacomunidade latina como um boom: há uma década, a

42 SHINN, 2002, p. 41.

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Liga de Futebol Inter Latinos, com sede em Columbus (Ohio),reunia menos de uma dezena de equipes. Em 2006, por suavez, contava com 92 times e 1.800 jogadores. Em Raleigh(Carolina do Norte), existia no ano de 2000 apenas umaliga hispânica. Em 2006, o número sobe para quatro ligas,que reuniam 40 equipes e 1.300 jogadores. Ao passo queas ligas próprias oferecem vantagens ao serem usadas comoformas de empoderamento, as ligas separadas predominamtanto no âmbito amador como no semiprofissional. Dr. TimWallace, presidente da liga de Raleigh, explica: “há vinteanos se podia encontrar alguns clubes hispânicos isoladosnas ligas gringas, mas agora se impõe o modelo das ligasseparadas”.43

Os grupos de atores heterogêneos produziram ummundo futebolístico de grande diversidade. Os novosimigrantes começam, minimamente, a jogar futebol sobcondições semelhantes àquelas com que iniciaram osmexicanos, nos anos 1920: em contextos informais, noschamados sandlot teams44 e beer leagues.45 Os recém-imigrados utilizam a oportunidade de participação nessasequipes como primeiros contatos, estabelecimento derelações sociais, identificação de locais para se alojaremou trabalharem e, sobretudo, para se inserirem comojogadores através da linguagem internacional do futebol.Um dos problemas mais urgentes de tais times é exatamentegarantir o espaço da prática esportiva em um campo comdimensões regulamentares, em parques públicos urbanos.46

Tal empenho segue sendo uma importante motivação paraa formalização das organizações de futebol e para acriação de ligas, cujos membros podem falar espanhol entresi e pagar contribuições mais baixas do que as que sãocostumeiramente cobradas nas ligas estadunidenses.

O outro extremo está conformado pelos mexicanos-americanos da primeira e da segunda gerações. Suascondições de vida nos EUA melhoraram demasiadamente,principalmente em decorrência do Ato de Controle e ReformaImigratória (Immigration Reform and Control Act), de 1986,que promoveu a legalização dos migrantes que já viviampermanentemente no país, assim como o reagrupamentofamiliar. A antiga relação numérica entre homens e mulheresimigrantes (na qual os primeiros eram numericamentesuperiores) se equilibrou; a maioria deles vive em famílias ea tendência de uma permanência prolongada aumentouconsideravelmente. Pode-se dizer que os imigrantes daprimeira geração conseguiram certa prosperidade,ocupando com êxito determinados nichos econômicos demercado, ao passo que a geração atual sofre com piorescondições no que diz respeito à educação escolar, aotrabalho e ao perigo de se envolver em grupos delinquentes

44 Grupos de jogadores bemjovens e inexperientes (Nota doTradutor).45 Beer leagues é uma designaçãoconferida aos campeonatos nosquais as equipes, ganhando ouperdendo, comemoram seussucessos ou fracassos com oconsumo de muita cerveja e outrasbebidas alcóolicas. São jogostotalmente amadores em que apresença de uma dúzia de espec-tadores pode ser considerada uma“bilheteria” de sucesso. Não háglamour nem condições objetivase estruturais favoráveis. Jogadoresdessas ligas, na maioria das vezes,jogam com equipamentos pre-cários, sem uniformes e mesmosem calçados adequados (Notado Tradutor).46 Patrick JONSSON, 2003.

43 REED, 2006, p. 1.

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juvenis.47 Aqueles que conquistaram uma situação de bem-estar contribuem com o boom futebolístico financiando asequipes. Eles esperam obter prestígio dentro da comunidadehispânica por meio da posse de uma equipe vencedora.Para tal propósito, investem em campos de treinamento,uniformes de futebol e seguros-saúde para jogadores,mesmo sem ter ainda a segurança de valer a pena do pontode vista financeiro.48 Dessa forma, um empresário mexicano-americano se permite financiar, por exemplo, a Díaz MexicanSoccer League, em Nova Iorque (a qual leva seu nome), e oindustrial Mario Calleros, em Chicago, faz o mesmo com aequipe El Nacional. Essa, por sua vez, conquistou em 2006 oprimeiro lugar nos torneios nacionais da Copa Tecate e daCopa Lowe’s.49

Empresas étnicas ou não étnicas, meios decomunicação hispânicos e grandes ligas cooperam naorganização e no financiamento de campeonatos regionaise nacionais custosos. A cadeia de supermercados Food Citye a cervejaria mexicana Tecate, entre outras, aproveitam oseventos nacionais como meios de publicidade paraconquistar “o maior mercado hispânico do mundo”.50 NaCopa Tecate, o “maior campeonato de futebol hispânico”,competiram em 2006 mais de 2.700 equipes em 22 cidades,tendo o El Nacional de Chicago ganhado a final e o prêmiode US$ 15 mil.51 Tais competições desestabilizam a antigaestrutura de convicções das equipes amadoras de níveislocal e regional: muitos jogadores viajam horas a fio, umaparte do ano, como semiprofissionais a fim de participaremem tais eventos, recebendo por jogo uma quantia fixa,apesar de não poderem contar unicamente com o futebolpara sobreviverem.

Por outro lado, o Club México de Chicago é umexemplo da combinação de futebol com o trabalhocomunitário e o trabalho com jovens. Carlos Cerrasco,oriundo do estado de Durango, participou das fundaçõestanto de uma organização comunitária para os latinos noestado de Illinois quanto do clube de futebol, em 1996,52

apesar do fato de Cerrasco não ter experiências com futebolnem com o trabalho com jovens. Tudo ocorreu, em verdade,quando seu filho entrou na adolescência e ele quis ofereceraos jovens uma alternativa em relação à criminalidadevigente nos grupos juvenis. Cerrasco, então, fundou o ClubMéxico como um espaço para práticas esportivas deadolescentes no oeste de Chicago, no bairro de Las Villitas,local de maior localização de imigrantes mexicanos domeio-oeste americano.

Ricardo Díaz, um ativista político de origem mexicana– que em 2006 organizou os protestos contra o recrudesci-mento das leis de imigração –, inaugurou, por sua vez, o

48 COHEN, 2006.

52 PESCADOR, 2004.

51 COPA TECATE, 2006.

50 CHRON, 2007.

49 Jesse AGUILAR, 2006.

47 Robert SMITH, 2005.

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clube de futebol Amistad, no sul da Philadelphia, como“pretexto” para o trabalho comunitário. Mesmo sendomaioria, os recentes imigrantes mexicanos não contam comuma estrutura comunitária mínima, segundo Díaz. Portanto,o Amistad funciona, de acordo com ele, como um tipo deinfraestrutura que lhe permite vislumbrar as necessidadesde tais imigrantes e informá-los sobre o serviço médicogratuito e seus direitos ante as novas leis de imigração.53

Um sentimento de pertencimento entre o grupoheterogêneo de imigrantes apenas se cristaliza medianteum projeto comum. O interesse emerge rapidamente comrelação ao país de origem, e tais comunidades engajam-se em projetos de auxílio financeiro movidos pelos clubesde futebol. Os membros do Clube Ciudad Hidalgo, deChicago, por exemplo, contribuem financeiramente,principalmente, com a cidade de mesmo nome, emMichoacán. Encarregaram-se da renovação ou dareconstrução da igreja nesse lugar, do colégio, do centrojuvenil, da creche e da área de esportes. O rádio e atelevisão de Chicago comunicam, frequentemente, seucompromisso social exemplar, fomentando, assim, o orgulhode ser membro do clube.54 Esse direcionamento da atençãoem relação ao México não está motivado, em primeiro lugar,pela nostalgia. Como grande parte da populaçãoeconomicamente ativa55 vive nos EUA, as comunidadesmexicanas exigem dos migrantes, cada vez mais, auxíliosfinanceiros para a manutenção da própria comunidade.56

Sobretudo nos novos destinos migratórios, os imigrantesmexicanos atribuem ao futebol um papel-chave. Em Dalton,Geórgia (sudeste dos EUA) – que se vangloria de ser a ‘capitalmundial do carpete’ –, durante um período de grandeprosperidade na economia norte-americana e doconsequente boom do setor relacionado à construção civilsurgiu uma enorme demanda por mão de obra barata. Nadécada de 1990, no distrito mencionado, a porcentagem dehispânicos cresceu de 3 a 22%; atualmente, a metade dostrabalhadores da indústria do carpete é hispânica. Em poucosanos, os imigrantes criaram (e praticamente do “zero”) a LigaMexicana de Futebol, uma organização de centenas dejogadores. Alguns migrantes, que antes se encontravam ativosnas ligas de futebol de Los Angeles, foram os responsáveispela organização criteriosa, incluindo endereço próprio,aluguel de escritório e até contratação de um tesoureiro. Talliga foi considerada um dos ganhos mais significativos dajovem comunidade.57 Segundo esses autores, isso mostrariacomo os atores usavam os recursos, as informações e oconhecimento que haviam adquirido como migrantes(temporários e permanentes) a fim de rapidamente edificar,em um novo contexto, estruturas comunitárias.

53 CITY PAPER, 2006.

54 PESCADOR, 2004.

55 No original encontramos men-ção a “población en edad detrabajar”, que, do ponto de vistada geografia econômica, signifi-ca “população economicamenteativa” ou PEA (Nota do Tradutor).56 SMITH, 2005.

57 Ruben HERNÁNDEZ-LEON eVíctor ZUÑIGA, 2002.

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Entretanto, pode-se dizer também que os empresárioslocais não hispânicos desempenharam um papel importantenessa bem-sucedida experiência. Eles patrocinaram amanutenção de vários campos de futebol com dinheiro daexploração da mão de obra barata dos recém-chegados:os trabalhadores imigrantes mexicanos, ao chegar, seconformam com salários baixos. Tal fato é bem distinto doque ocorre, por exemplo, com a geração dos trabalhadoreslocalizada nos arredores dos Montes Apalaches, costa lesteamericana. Esses travam uma batalha judicial desde 2006contra a produtora de carpetes Mohawk Industries, que éacusada por eles de contratar intencionalmente imigrantesilegais mexicanos.58

Ainda que equipes hispânicas amadoras levemnomes de suas comunidades de origem, elas possuem umcaráter bastante inclusivo e, tendo-se em conta o êxitoesportivo, integram jogadores de uma série de nações,como, por exemplo, do México, do Brasil, da Guatemala,da Bósnia e da Somália.59 Isso nos adverte, previamente,para não olharmos os clubes com lentes étnicas. SegundoMarcos García – presidente de uma liga de futebolhispânica com uma maioria de salvadorenhos da regiãode Boston –, os torcedores fanáticos se orientam por umpatriotismo local em relação à equipe de sua comunidadede origem, mas não os incomoda a “composiçãomultinacional”, por assim dizer, dessa comunidade. “Aocontrário”, relata, eles inclusive tratam especialmente osjogadores “de fora” como uma espécie de “filhos adotivos”do time local. Essa projeção imaginária a partir dalocalidade corresponde à ideia de nação no mundofutebolístico profissional. Consequentemente, as equipesamadoras de futebol apresentam um efeito integrador paraa comunidade hispânica sem desenvolver, explicitamente,o tema da multinacionalidade ou de uma identidade latino-americana através do nome da equipe, do simbolismo visualou de um nível discursivo qualquer.

A posição das mulheres no futebol, por seu turno,segue sendo marginal. No entanto, pela primeira vez emanos, algumas delas são dirigentes de equipes masculinase chegaram a se organizar como jogadoras em clubes eligas. Em 2002, por exemplo, fundou-se em Nova Iorque umaliga feminina, a Liga de Futebol Internacional (InternationalSoccer League), denominada de acordo com a homólogamasculina correspondente. Em 2003, competia nela oconsiderável número de 12 equipes. As jogadorasmexicanas, peruanas, equatorianas e de outros países latino-americanos haviam imigrado aos EUA, em sua maioria,apenas há dez anos ou menos. Haviam, sobretudo,aprendido o futebol lá, uma vez que tal esporte era, em seus

58 Dale RUSSAKOFF, 2006.

59 COHEN, 2006.

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países de origem, “tão guiado por testosterona e tãomachista como o futebol americano nos próprios EUA”, comoexplica uma jornalista a seus leitores, no jornal Puerto RicoHerald.60 O futebol feminino é tratado na vida pública detodos os países latino-americanos com negligência, àexceção do Brasil; por exemplo, a equipe nacional mexicanaocupa, atualmente, somente o 22º lugar no ranking mundialda Fifa.61 Ao contrário, nos EUA, a maioria percebe o futebolcomo esporte feminino e, em nível mundial, as futebolistasamericanas ocupam o segundo lugar, depois das alemãs.

As latinas, por sua vez, poderiam se orientar pelofutebol-modelo e desestabilizá-lo como “ritual masculinodado, que forma parte da socialização na América Latina”.62

Não obstante, é indiscutível que durante muito tempo asmulheres foram marginalizadas no universo futebolístico dosmigrantes, como já destacamos, pois nesse espaço sevalorava a masculinidade, tanto na prática esportiva quantonos “momentos de bebedeiras”, após as partidas. Com aslatinas não foi diferente. Infelizmente, a maioria das equipese ligas seguem ainda mantendo uma divisão de papéissexuais, integrando as latinas como não jogadoras, e simcomo espectadoras, cozinheiras de quitutes em comemo-rações pós-jogos, recebedoras de donativos e, somente emcasos individuais, como presidentas de clubes de futebol.

A criação de uma equipe estadunidenseA criação de uma equipe estadunidenseA criação de uma equipe estadunidenseA criação de uma equipe estadunidenseA criação de uma equipe estadunidenseautenticamente mexicana, a Chivas USAautenticamente mexicana, a Chivas USAautenticamente mexicana, a Chivas USAautenticamente mexicana, a Chivas USAautenticamente mexicana, a Chivas USA

Desde sua fundação em 1996, a US Major LeagueSoccer (MLS) está bastante interessada em romper aexistência paralela dos mundos futebolísticos anglo-saxãoe latino. E o que está por detrás dessa intenção, obviamente,são o interesse financeiro e a esperança de que, com aajuda dos latinos, o país possa, finalmente, converter-senuma “nação do futebol”. Entretanto, até agora a MLS nãoconquistou o público de quarenta milhões de hispânicos,apesar de muitas equipes profissionais americanas teremsuas sedes em centros urbanos com forte presença latina ede também possuírem futebolistas mexicanos-americanosintegrados em seus grupos. Com o intuito de atrair hispânicosà MLS, já foram investidos vários milhões de dólares emcompra de superestrelas mexicanas, como o goleiro JorgeCampos e os goleadores Luis Hernández e Carlos Hermosillo.Além disso, em 2003 foi criada a liga juvenil Futebolito,exclusivamente para hispânicos. Contudo, tais medidassomente tiveram êxito moderado, causando o desesperodos administradores da MLS, dentre os quais se pode citaros empresários americanos Phil Anschutz, Lamar Hunt e RobertKraft. Até agora somente os salvadorenhos e os bolivianos

60 Franziska CASTILLO, 2003.

61 Gert EISENBÜRGER, 2006.

62 SHINN, 2002, p. 242.

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(que vivem na região de Washington) converteram-se emaficionados pelas partidas da liga norte-americana defutebol. A grande maioria dos hispânicos (e sobretudo ostorcedores fanáticos mexicanos) ainda prefere assistir noUnivisión, ou em outros canais hispânicos, aos jogos de suasequipes favoritas da Primeira Divisão do CampeonatoMexicano de Futebol.63

Jorge Vergara é um empresário mexicano queconseguiu se converter em multimilionário mediante a vendade compostos vitamínicos e alimentos dietéticos em pó damarca Omnilife. Ganhou espaço na MLS quando apre-sentou sua última ideia empresarial, qual seja, incluir umaequipe adicional no conjunto das já existentes: seria, então,o retorno do Club Deportivo Guadalajara, popularmenteconhecido como Chivas. Chivas – que é de propriedadede Vergara e, há algum tempo, um dos times de maiorsucesso no México – é o carro-chefe esportivo da cidade deGuadalajara, capital de Jalisco, um dos principais estadosemissores de emigrantes aos EUA.

Vergara, por sua vez, copiou muitos ingredientes dosamadores do hispanic soccer para uma receita de sucesso:apesar das restrições que a MLS impõe em relação ao númerode jogadores estrangeiros em uma equipe, deu ao ChivasUSA um caráter latino “mais autêntico”, convocandoprioritariamente jogadores hispânicos, compondo umamescla de conhecidas estrelas do futebol mexicano, novostalentos norte-americanos de origem migrante, um ou outrobrasileiro e/ou costarriquenho e outros quatro anglo-americanos. Apesar disso, o idioma oficial da equipe é oespanhol e o grito de guerra autodenominador do grupo é“Adiós soccer. ¡El fútbol está aquí!”.

De forma calculada, integram-se particularidadesdo hispanic soccer em um novo pacote global, como acombinação do futebol com o trabalho comunitário: oChivas USA dirige vários programas juvenis como forma depromover o futebol entre os adolescentes hispânicos e possuitambém um programa de caridade a crianças neces-sitadas. No que diz respeito às mulheres, o Chivas integra asjovens nos grupos de cheerleaders do clube e mantém umgrupo júnior para as meninas.

A MLS aceitou tais inovações “revolucionárias” nãoapenas pelo fato de Vergara ter pagado US$ 25 milhõespelos direitos da equipe. Ao lado desse forte componente, otime também possui outras estratégias de autocomercia-lização pelos meios de comunicação hispânicos, como ocanal de televisão Univisión e mesmo o Los Angeles Times.Além disso, o empresário aposta na vinculação da equipeestadunidense com a de Guadalajara. “As camisetas defutebol, as cores, a tradição e a paixão”, exclama o

63 Steven GOFF, 2005.

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milionário, teriam falado mais alto até agora na MajorLeague. Por isso é que ele vestiu o Chivas USA com as mesmascores da bem-sucedida equipe mexicana Chivas,resultando em camisetas de listras brancas e vermelhasalternadas, que, combinadas com o gramado verde,relembram as cores nacionais do México. Além do mais, nosarredores do estádio do clube em Los Angeles se podetambém sentir um “clima mexicano”, visto que no parquede diversões chamado ChivaTown – seguindo apublicidade da página na web – os torcedores e suasfamílias podem “reviver a cidade de Guadalajara. Alí seencontram os arcos de Guadalajara, a [estátua] de Minerva,o Hall da fama ‘Honda’, o McDonalds ‘FutZona’, uma arenade entretenimento, comes e bebes, e muito mais”.64

Tais promessas não são de todo falsas, pois tambémna cultura do futebol de Guadalajara se combinam astradições mexicanas com os padrões de vida norte-americanos, sempre com vistas a gerar ganhos. Vergarapromove atualmente a construção de um novo estádio defutebol para o Chivas (no México), em forma de vulcão. Esse éum dos pilares de uma “cidade do futuro” que está emgestação nos arredores de Guadalajara e na qual se buscaráintegrar os aspectos de conversação ambiental e de umdiscurso intelectual ao consumo e ao lazer em larga escala.

Foi com o Chivas USA que, pela primeira vez, seintroduziu uma lógica de “nacionalidades” dentro da MLS.Seus inventores, no entanto, estão conscientes de que acriação de um cenário nacionalista mexicano não bastarápara trazer ao Chivas USA uma legião diversa de fiéismexicanos e um lugar de destaque dentro do futebolamericano profissional. A equipe necessita conseguir triunfosesportivos. Para conquistá-los, mudou-se o treinador oficialem 2006 e se contratou o americano Bob Bradley. Com suaajuda o time conquistou um respeitável terceiro lugar naporção oeste da Major League. Ainda que seja incerto comoterminará o experimento Chivas USA, em um mundoglobalizado os empresários e os meios de comunicaçãoapostam no momento de transmitir, de maneira crível, novoslocalismos e nacionalismos orientados aos países latino-americanos, incluindo, ao mesmo tempo, jogadores deoutras filiações nacionais e hemisféricas, segundo critériosde desempenho esportivo. Tal receita de sucessos lhes foraensinada pelos amadores do mundo esportivo.

Considerações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finais

Na atualidade, o futebol latino está chamando muitaatenção, visto que os migrantes hispânicos parecem difundir“seu esporte” paulatinamente nos EUA. Em consequência,

64 CHIVAS USA, 2006.

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“ADIÓS SOCCER, HERE COMES FÚTBOL!”

muitos analistas esportivos interpretam o boom do futebollatino como uma sucessiva (re)conquista cultural dos EUApor parte dos mexicanos. Com o tema “Adiós soccer. ¡El fútbolestá aquí!”, os diretores do Chivas USA comercializam a novaequipe profissional explicitamente como parte dessefenômeno.

A isso se pode agregar que os imigrantes mexicanosnão deram – em todos os períodos históricos e por todos osmeios relacionados ao futebol – expressão a uma“mexicanidade” transnacional e expansiva. Por outro lado,os atores sociais que expressaram (e ainda o fazem) certa“mexicanidade” não são, em seu conjunto, oriundos doMéxico. A perspectiva histórica bem demonstrou que notranscurso do século XX estiveram (e estão) envolvidasdinâmicas complexas. O grupo dos imigrantes mexicanos ehispânicos é heterogêneo; muitos atores se reinventaram dediferentes maneiras por meio do futebol – de acordo com operíodo histórico e mesmo região onde se encontravam – e,assim, expressaram distintas formas de “mexicanidade”.Algumas vezes foi destacada a rivalidade com imigranteseuropeus (com os quais os mexicanos competem no mundodo trabalho), por meio de uma lógica esportiva nacional oucontinental. Outras vezes, através do futebol, reforçaram-sepapéis de gênero que predominavam na migração e nomundo masculinizado do trabalho. Em dados momentos, osatores – que se diferenciavam com respeito a seupertencimento étnico, de gênero e de classe – buscavam,por meio das práticas futebolísticas, projetos de cunhocomum: isso é válido para os torcedores e para os empresáriosde uma incipiente indústria étnica do lazer e dos meios decomunicação. No caso de Dalton (Geórgia), empresários nãoétnicos e trabalhadores mexicanos de baixos salários secomprometeram em favor de um futebol étnico local.

Desde os anos 1990, tanto grupos de hispânicosquanto os de não hispânicos serviram-se, em crescenteproporção, do futebol como um recurso que constrói comuni-dade (principalmente no caso de novos imigrantes). Essesaproveitam o fato de que jogar e atuar em um mundo esportivoseparado lhes oferece boas opções de empoderamento. Poressa razão, recentemente tal experiência paralela estácaracterizando o mundo amador e – com relação à simbo-logia de um pertencimento nacional – atualmente chegoutambém ao universo do futebol profissional dos EUA. Ao mesmotempo, desde os anos 1990, os imigrantes mexicanos servem-se do futebol como cenário-chave por meio do qual estendemuma vida transnacional de práticas e relações sociais queos vincula de maneira duradoura ao seu país de origem (nocaso, o México). Com isso, expressam uma “mexicanidadetransnacional” que não é “harmônica”, e sim marcada por

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linhas de conflito, e que, portanto, se apresenta como umamexicanidade frágil. Nessa “nova mexicanidade”manifestam-se conflitos de gênero, de classe e étnicos, locaise nacionais que se dão simultaneamente nos EUA e no Méxicoe que se influenciam mutuamente.

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[Recebido em 10 de junho de 2011e aceito para publicação em 30 de setembro de 2011]

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