formulaÇÃo e “design” de microestrutura...
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ASPECTOS NUMÉRICOS E FÍSICOS DE SOLUÇÕES DAS EQUAÇÕES
DE SAINT-VENANT
André Luiz Andrade Simões
1, Romualdo José Romão Brito
2*,
Harry Edmar Schulz3, Rodrigo de Melo Porto
4, Raquel Jahara Lobosco
5
2Instituto Superior Politécnico de Tete, Moçambique
1,2,3,4,5Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, Brasil.
*Email: [email protected]
RESUMO
As equações de Saint-Venant são deduzidas a partir dos princípios de conservação de massa e
quantidade de movimento com o uso de hipóteses simplificadoras. Freqüentemente tais
equações são empregadas em sua forma uni-dimensional com o intuito de prever o
comportamento de ondas de cheia em canais, ondas ocasionadas pela ruptura de barragens e,
em alguns casos, para prever a posição de ressaltos hidráulicos. O equacionamento geral
compõe um sistema de equações diferenciais parciais do tipo hiperbólico e não linear (em
ambos os casos, unidimensional e bidimensional). As soluções analíticas são ainda muito
raras para esse sistema, sendo necessário o uso de métodos numéricos para obtenção de
soluções. A sua utilidade aponta para a necessidade de sua apresentação didática aos
estudantes e profissionais de Engenharia, o que justifica o presente texto. Este trabalho utiliza
as equações de Saint-Venant aplicadas a problemas com superfície livre em uma e duas
dimensões. São discutidos aspectos físicos das soluções e detalhes matemáticos, como a
imposição adequada das condições de contorno e a estabilidade de esquemas numéricos, por
meio do uso da análise de von Neumann aplicada à forma linearizada das equações
unidimensionais.
INTRODUÇÃO
Em situações nas quais as alterações sofridas pelo fluido em movimento são pequenas e
ocorrem de modo progressivo, é razoável supor, para fins práticos, que o escoamento seja
permanente, ao menos em intervalos curtos de tempo. Há, todavia, casos em que esta
simplificação não é adequada, como, por exemplo, durante a passagem de ondas de cheia em
canais, rios ou sistemas de drenagem, alterações de nível e vazões produzidas pela parada ou
partida de bombas ou turbinas hidráulicas, ondas originadas por manobras de comportas em
canais de irrigação, rompimentos de diques ou barragem, etc. Como exemplos de eventos
menos abruptos, temos a previsão do comportamento de correntes marítimas e conseqüentes
elevações da maré, que são eventos de considerável relevância para a navegação e a dispersão
de poluentes, e a ocorrência de transporte de sedimentos durante escoamentos variáveis, com
implicações ambientais e na navegação. Antes de iniciar a dedução das equações, cabe
mencionar que o escoamento turbulento é sempre não permanente, apesar de ser considerado,
em alguns problemas, como permanente em média, ou, em alguns textos, como
“estacionário”. Assim, os termos escoamento variável e escoamento permanente empregados neste texto se referem ao comportamento médio das variáveis. A seguir são expostos
brevemente alguns conceitos elementares sobre escoamentos variáveis, especificamente
alguma terminologia ligada ao estudo de ondas. Essas definições foram extraídas das
referências Lamb (1945) e Porto (2006).
Conceitos básicos
Uma onda é definida como uma variação temporal e espacial da altura do escoamento
(distância vertical do ponto mais baixo da seção até a superfície livre) e da taxa de vazão. O
comprimento de onda (L) é a distância entre duas cristas sucessivas, a amplitude da onda é a
altura entre o nível máximo da superfície livre e o nível d’água em repouso e a altura H é a
diferença de cotas entre as cristas e os cavados (vales). Há diferentes tipos de classificações
para as ondas, como ondas capilares, nas quais o fator predominante na propagação é a tensão
superficial, e ondas de gravidade, cuja ação principal é a atração gravitacional. O termo água
rasa se refere ao caso em que a relação entre L e a profundidade da água y, distância entre o
fundo do canal e o nível estático da água, for maior que 20. Caso contrário, define-se o que se
chama de águas profundas. Uma onda é chamada de onda oscilatória se não há transporte de
massa na direção de propagação (são ondas normalmente ocasionadas pelos ventos e de
grande relevância para Hidráulica Marítima). Ondas de translação são aquelas que envolvem
deslocamento de massas líquidas da sua posição original, como ondas de cheia em rios e
canais. As ondas de translação podem ser classificadas como onda solitária, que possui um
tramo de ascensão e outro de depleção e um único pico, e trem ou sistema de ondas, que é um
grupo de ondas consecutivas. Uma onda de translação que tenha um tramo de depleção (a
frente de onda) de modo íngreme é chamada de surto ou vagalhão. Em relação às ondas em
canais, estas são ditas ondas positivas se a altura da água atrás da onda (a intumescência) é
maior que a altura da água no escoamento não perturbado no canal. Se a altura da água atrás
da onda é menor que a altura da água do escoamento não perturbado no canal, a onda é
classificada como negativa.
Para ondas de gravidade de amplitude pequena, considerando escoamento ideal e sem
efeitos significativos decorrentes da tensão superficial, a celeridade (c=velocidade relativa de
propagação da onda em relação ao meio líquido) pode ser calculada aproximadamente por
meio da equação 1 (Lamb, 1945):
L
h2tgh
2
1
gL
cou ,
L
h2tgh
2
gLc
2
(1)
em que L é o comprimento da onda, h a altura do escoamento e tgh a tangente hiperbólica.
Esta equação é normalmente chamada de equação da celeridade de Airy, em homenagem a Sir
George Biddle Airy (1801-1892), certamente o primeiro a apresentar o seu desenvolvimento,
em 1845 (Porto, 2006).
É interessante notar que se L>>h, condição relativa às águas rasas, a tangente
hiperbólica tende ao valor do arco e então a celeridade de tais ondas é calculada simplesmente
por:
h/L
1
gL
cou ,ghc
2
(2)
A Figura 1 ilustra este comportamento. A partir de L/h = 20 as equações fornecem
praticamente os mesmos resultados. No caso de ondas de águas profundas, em que h>>L, a
tangente hiperbólica tende à unidade e a celeridade passa a ser calculada por:
2
1
gL
cou ,
2
gLc
2
(3)
Este é o valor constante da curva gerada pela equação 1, apresentada na Figura 1.
Figura 1 – Comportamento da celeridade adimensionalizada em função de L/h (y=h)
DEDUÇÕES DAS EQUAÇÕES PARA O CASO 1D
As equações que modelam os problemas tratados neste artigo têm como origem o princípio de
conservação de massa e de quantidade de movimento (2ª lei de Newton). Trata-se de uma
formulação simplificada em relação ao equacionamento geral para fluidos newtonianos
(equação da continuidade completa e equação de Navier-Stokes) e, por esta razão, considera-
se válido apresentar parte da sua dedução para o caso unidimensional com o intuito de
evidenciar as limitações inerentes ao modelo e valorizar aspectos físicos e matemáticos
presentes nas equações. Como referência sobre o os procedimentos adotados para as deduções, cabe destacar os trabalhos de Chaudhry (2008) e Porto (2006).
Conservação de massa
A equação de conservação da massa para volumes de controle e em sua forma integral pode
ser escrita como:
0ndAVdVolt
scvc
(4)
0,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0 5 10 15 20 25
c2/(
gL
)
L/y
Eq. 1
Eq. 2
Assume-se que o escoamento é unidimensional e incompressível. O canal é considerado
prismático e não há aporte lateral de vazão. O volume de controle adotado mantém tais
simplificações e corresponde a um volume de controle com uma entrada (seção 1), uma saída
(seção 2), parte da superfície de controle é a superfície livre e a superfície restante
corresponde ao contorno sólido. Com tais hipóteses, a equação anterior, quando aplicada ao
referido volume de controle, é simplificada para:
0QQdxt
A12
x
(5)
em que: A = área da seção transversal, Q = vazão. Utilizando o teorema do valor médio e
fazendo x0, obtém-se a equação da continuidade na forma conservativa:
0x
Q
t
A
(6)
Quantidade de movimento
O princípio de conservação de quantidade de movimento linear para volumes de controle
pode ser escrito como:
scvc
ndA.VVdVolVt
F (7)
em que: F = força resultante. A dedução da equação diferencial a partir de (7) pode ser
encontrada em Porto (2006) e Chaudhry (2008). A única diferença entre a equação
apresentada aqui e aquela apresentada por esses autores está nas forças devidas às pressões
(F1 e F2), que são calculadas por meio das seguintes equações:
coshgA2F
coshgA1F
22
11 (8)
em que: h com uma barra superior é a distância desde a superfície livre até o centróide da
seção transversal. Além das hipóteses anteriores, considera-se que o coeficiente de
Boussinesq () é uma constante e que os efeitos da aceleração de Coriolis são negligenciáveis. A equação resultante, obtida a partir da conservação de quantidade de movimento é:
fo IIgAcoshgAQVxt
Q
(9)
Esta é a equação de quantidade de movimento na forma conservativa, que junto com a
equação 6 forma um sistema hiperbólico semelhante às equações de Saint-Venant. Io e If são
as declividades de fundo e da linha de energia, respectivamente.
Equações simplificadas para o caso de águas rasas
Continuidade
Para obtenção da equação da continuidade aplicada ao caso de águas rasas, por meio da
equação 6, a única simplificação necessária é a de canal retangular, como apresentado a
seguir. Nesta situação Hm=A/B=Bh/B=h, logo:
x
Vh
x
hV
t
h
x
V
B
A
x
hV
t
h
0x
Vh
t
h
(10)
Quantidade de movimento
Utilizando a mesma simplificação adotada na obtenção da equação 10, a equação 9 é
manipulada algebricamente para dedução da equação de quantidade de movimento linear para
águas rasas 1D. Desprezando a não uniformidade do perfil de velocidades (b=1) e o efeito do
cos no cálculo das forças de pressão, vem:
fofo IIgBh
x
hgBhVhV
xB
t
VhBIIgA
x
hgAQV
xt
Q
fo
22 ghIghIh2
ghV
xt
Vh
(11)
Para calcular a declividade da linha de energia If, assume-se que é válida uma equação
de resistência desenvolvida para o regime uniforme e permanente. Utilizando a equação de
Chézy, deve-se assumir ainda que o canal retangular é largo (B>>h). Com esta hipótese, a
equação mencionada assume a seguinte forma:
hC
VV
h2B/Bh
1
C
VV
P/A
1
C
VI
222
2
f
(12)
Sabe-se que C=(8g/f)0,5
, em que f é o fator de resistência de Darcy-Weisbach. Assim,
nota-se imediatamente que C não é uma grandeza adimensional. Sendo preferível trabalhar
com grandezas adimensionais, utiliza-se aqui a equação de Darcy-Weisbach no lugar da
equação de Chézy:
gh8
VVfIf (13)
ASPECTOS MATEMÁTICOS E MÉTODOS NUMÉRICOS
Formas vetoriais e autovalores
As equações 10 e 11 formam o sistema de equações para águas rasas em uma dimensão. Com
uma notação compacta, as equações podem ser escritas como:
sx
f
t
q
(14)
em que:
hV
hq
(15)
2
11
22
2
22q
2
g
q
q
q
h2
ghV
hVf
(16)
fo ghIghI
0s
(17)
Do mesmo modo, em sua forma não conservativa, as equações de Saint-Venant podem
ser escritas na forma vetorial como apresentado a seguir:
Jx
UA
t
U
(18)
em que:
V
hU (19)
Vg
HVA
m (20)
fo II
0gJ (21)
Os autovalores da matriz A definem a que classe pertence o sistema de equações. Para
calcular os autovalores de A, sabe-se que:
0gHV0Vg
HVdet m
2m
(22)
Calculando as raízes desta equação, obtém-se:
m1 gHV (23)
m2 gHV (24)
Nota-se imediatamente que os autovalores correspondem às velocidades absolutas das
ondas, uma vez que c=(gHm)0,5
. Para escoamentos subcríticos e supercríticos os autovalores
assumem valores reais e diferentes. Isto permite classificar as equações como um sistema de
equações diferenciais parciais hiperbólicas, assim como as equações de Euler e do
escoamento variável em tubos, por exemplo. A mesma conclusão é obtida com o cálculo dos
autovalores da matriz Jacobiana do vetor f, como apresentado a seguir:
1
212
1
22
2
2
1
2
2
1
1
1
q
q2gq
q
q
10
q
f
q
f
q
f
q
f
fD
Esta matriz também pode ser escrita em termos das variáveis primitivas:
V2ghV
10fD 2
Os autovalores (i) desta matriz podem ser calculados com a equação característica (em que
I=matriz identidade):
0ghVV20ghV1V2
V2ghV
1det
V2ghV
10
0
0detDfIdet
222
22
Resolvendo o polinômio, tem-se:
2
ghV4V4V20ghVV2
222,122
ghVghVVV 221
ghV2
Vê-se que a única diferença entre os autovalores calculados com o jacobiano está na
expressão para a celeridade, ocasionada por ter sido utilizada a condição de águas rasas.
Método das características
O sistema hiperbólico obtido para condutos livre é não linear e só admite solução analítica em
casos ainda mais simplificados. Por este motivo, o uso de métodos numéricos é natural e
comum em aplicações que envolvem as equações de Saint-Venant. O método das
características, certamente um dos mais difundidos na prática da engenharia hidráulica, é
freqüentemente escolhido em simulações de escoamentos variáveis em condutos forçados.
Dada a semelhança entre as equações, o desenvolvimento do método para as equações de
Saint-Venant é parecido, exceto pela dependência de c com Hm, o que exige uma
simplificação adicional em relação aos condutos forçados.
Considera-se as equações de Saint-Venant escritas com a forma não conservativa, como
apresentado a seguir:
0x
VH
x
hV
t
hm
(25)
fo IIgx
hg
x
VV
t
V
(26)
Seguindo os procedimentos usuais para o desenvolvimento do método, a equação da
continuidade é multiplicada por e somada à equação da quantidade de movimento,
resultando em:
fom IIgx
hg
x
VV
t
V
x
VH
x
hV
t
h
(27)
Com o intuito de identificar as derivadas materiais de h e V, os termos desta equação
foram reagrupados resultando em:
fom IIgx
hgV
t
h
x
VVH
t
V
(28)
ou
fo IIgdt
dh
dt
dV (29)
A equação anterior permite concluir que:
m
mm
2m
H/g
H/gHgVH
gV
dt
dx (30)
Com este resultado, verifica-se que dx/dt pode ser igual a cada um dos autovalores da matriz
convectiva do sistema hiperbólico:
1mgHV
dt
dx (31)
2mgHV
dt
dx (32)
Ao substituir os valores de na equação 29, obtém-se duas equações diferenciais
ordinárias válidas ao longo das características:
1
fom
dt
dx
IIgdt
dh
H
g
dt
dV
:C (33)
2
fom
dt
dx
IIgdt
dh
H
g
dt
dV
:C (34)
Assim como ocorre no problema de condutos forçados, as equações diferenciais parciais
válidas para o plano espaço-tempo foram substituídas por duas equações diferencias
ordinárias que devem ser integradas ao longo das curvas características. Do ponto de vista
matemático, a diferença básica entre as equações está no fato de que os primeiros elementos
dos autovetores da matriz convectiva do sistema formado pelas equações de Saint-Venant são
funções de uma das variáveis dependentes, especificamente de y, uma vez que Hm=A/B e
A=A(h). A matriz convectiva das equações para condutos forçados possui autovetores que
não incluem quaisquer das variáveis dependentes.
Lembrando que
Vg
HVA
m , o seu primeiro autovetor, com componentes
e
é
definido de modo que:
12
11
m12
11m
gHVVg
HV (35)
Portanto, é permitido escrever:
1
g
H
gHV
1
g
H
Vg
HV m
m
mm (36)
De modo similar, determina-se o segundo autovetor. Como conclusão, verifica-se que os
autovetores são funções de y, uma das variáveis dependentes do sistema:
1
g
Hm1 (37)
1
g
Hm2 (38)
Integrando as equações 33 e 34 ao longo das curvas características, vem
P
A
fo
P
Am
P
A
dtIIgdhH
gdV (39)
P
B
fo
P
Bm
P
B
dtIIgdhH
gdV (40)
Uma vez que Hm depende de h, assim como If, que também depende de V, deve-se
empregar alguma aproximação para calcular as integrais. Como no caso de condutos forçados,
assume-se que os valores de V e h em A e B (que correspondem ao tempo anterior) são
válidos ao longo de AP e BP. Integrando, obtém-se:
tIIghhH
gVV AfoAp
mAAp (41)
tIIghhH
gVV BfoBp
mBBp (42)
Para simplificar a escrita, as quantidades conhecidas (em A e B) podem ser agrupadas
em duas constantes:
AmA
AfoA hH
gtIIgVC (43)
BmB
BfoB hH
gtIIgVC (44)
Substituindo C+ e C- nas equações 41 e 42 e utilizando a definição de celeridade para este
problema, pode-se escrever:
pA
p hc
gCV (45)
pB
p hc
gCV (46)
As formas anteriores são normalmente utilizadas em programas computacionais.
Entretanto, deve-se destacar que se houverem soluções, no sentido fraco, descontínuas, as
equações não fornecem resultados corretos.
Método de MacCormack com viscosidade artificial
O esquema de MacCormack (1969) é um método do tipo preditor corretor de dois passos que
possui acurácia de segunda ordem tanto no tempo quanto no espaço. Este método é capaz de
capturar ondas de choque e foi empregado por Gharangik e Chaudhry (1991) para analisar
escoamentos não permanentes unidimensionais em canais. Além do seu uso para identificar a
ocorrência de ressaltos hidráulicos, o trabalho de Anderson (1995), por exemplo, também
apresenta aplicações ligadas à simulação de ondas de choque normais em bocais convergente-
divergentes, ondas de expansão (leque de rarefação) e ondas de choque bidimensionais em
placa plana. O desenvolvimento do código com este método é relativamente simples e segue
os seguintes passos:
1) Preditor. Adota-se uma aproximação avançada para a derivada espacial para calcular
a derivada temporal no instante n e, em seguida, utiliza-se esta derivada para calcular
q em t+t. O resultado obtido desta forma é identificado com uma barra superior.
ni
ni
n1i
n
sx
ff
t
q
(47)
tt
qqq
n
n
i
1n
i
(48)
2) Corretor. O valor predito calculado é utilizado para calcular a derivada temporal de q
em n+1. Para tanto, adota-se uma discretização atrasada para a derivada espacial. Esta
alternância entre derivadas avançadas e atrasadas produz um método de segunda
ordem. Com este resultado, efetua-se uma média entre as derivadas temporais
calculadas em n e n+1 para que seja realizado o cálculo final de q em n+1.
1ni
1n1i
1ni
1n
sx
ff
t
q
(49)
tt
q
t
q
2
1qq
1nn
n
i
1n
i
(50)
Viscosidade artificial
A solução obtida por um esquema de diferenças finitas possui erros dissipativos se o
termo principal do erro local de truncamento possui ordem par. Se este erro possui um termo
principal com ordem ímpar, então o esquema passa a ter erros dispersivos. Os erros
dispersivos normalmente produzem oscilações nos resultados junto a ondas íngremes, o que
pode provocar instabilidade numérica. Com o intuito de corrigir esta falha, utiliza-se
normalmente limitadores de fluxo ou, de forma mais simplificada, uma viscosidade artificial,
que neste texto é dada pela seguinte equação (Anderson, 1995, p.363):
n1i
ni
n1in
1ini
n1i
n1i
ni
n1ixn
i qq2qyy2y
yy2yCS
(51)
em que Cx é um parâmetro arbitrário adimensional. Valores típicos para Cx estão
compreendidos no intervalo 0,01 a 0,3 (Anderson, 1995, p.238) para o caso de escoamento
supersônico em bocais. Existem diferentes formulações para a viscosidade artificial. Esta
escolha foi feita com base na experiência obtida com a solução do problema de localização de
uma onda de choque normal no interior de um bocal convergente-divergente. De acordo com
LeVeque (2004, p.72), os primeiros a propor este tipo de técnica foram von Neumann e
Richtmyer. O uso da viscosidade artificial altera o método de MacCormack para a seguinte
forma:
1) Preditor. Deve-se somar a viscosidade calculada no tempo n quando for calculado q
no passo preditor. Para o cálculo de cada componente q em n+1, deve-se somar a
componente S correspondente (nota-se que há consistência dimensional nesta soma):
ni
n
n
i
1n
iSt
t
qqq
(52)
2) Corretor. deve-se somar a viscosidade calculada com base nos valores obtidos no
passo preditor.
ni
1nn
n
i
1n
iSt
t
q
t
q
2
1qq
(53)
CONSISTÊNCIA, ESTABILIDADE E CONVERGÊNCIA
Um esquema numérico de discretização deve ser consistente com a equação diferencial
original, estável e convergente. A consistência de uma equação na forma discreta existe se o
erro de truncamento tende a zero quando os espaçamentos da malha tendem a zero. Este é um
aspecto importante, pois um dos requisitos para haver convergência do método numérico é a
consistência. O segundo requisito necessário para que ocorra convergência é a estabilidade.
Este é um conceito de grande relevância e que é bastante empregado em hidráulica
computacional, como em problemas que requerem a solução das equações do golpe de aríete e
Saint-Venant. Um método numérico é estável se os erros ou perturbações presentes na
solução não crescem sem limites. Esse tal crescimento descontrolado pode produzir números
que atingem os limites da máquina, com valores irreais como 10200
, por exemplo. Condições
de contorno ou iniciais incorretas podem ser responsáveis por este tipo de erro, assim como o
acúmulo de erros de arredondamento ocorrido durante o processamento. Se as condições de
contorno e iniciais forem corretas, o acúmulo de erros de arredondamento passa a ser o
responsável por uma possível instabilidade de um método numérico. Para uma discretização
consistente, se o refinamento progressivo da malha produz resultados que se aproximam da
solução analítica da EDP, diz-se que há convergência. De acordo com o teorema da
equivalência de Lax, pode-se escrever que um esquema numérico consistente é convergente
se e somente se ele for estável (ver prova em Dautray e Lions, 2000, p.37).
Estabilidade e o método de Lax-Friedrichs
Embora a metodologia analítica para análise de estabilidade seja bem conhecida para
problemas lineares, considera-se válido explorá-la neste trabalho com uma aplicação direta às
equações de Saint-Venant linearizadas. A discussão é desenvolvida com base no esquema de
discretização centrado e, em seguida, com o esquema numérico de Lax-Friedrichs. O método
de Lax-Friedrichs é uma variação sutil e necessária do esquema centrado. No esquema
centrado, as derivadas espaciais são aproximadas por diferenças finitas centradas de segunda
ordem no instante “n” e as temporais por diferenças finitas avançadas de primeira ordem na
posição “i”, como apresentado a seguir:
x2
)q(f)q(f
x
)q(f n1i
n1i
(54)
t
t
qn
i
1n
i
(55)
Há um grave problema com a escolha das aproximações 54 e 55 para os sistemas
hiperbólicos de um modo geral, que é a instabilidade numérica. Para um sistema hiperbólico
linear é possível provar que o esquema centrado é incondicionalmente instável. Com o intuito
de verificar a estabilidade de um método numérico, normalmente é utilizada a análise de
estabilidade de von Neumann. Como o sistema deve ser linear para que essa análise seja
empregada, considera-se um estado de referência “0” que permite definir h = h0 + y e V = V0
+ v, em que h0 e V0 são constantes e y e v são perturbações em torno desses valores
constantes. Inicialmente, empregando a regra do produto e desprezando os termos fonte, as
equações para águas rasas são reescritas na forma não-conservativa, como apresentado a
seguir:
0x
hg
x
VV
t
V
0x
hV
x
Vh
t
h
(56)
Substituindo as definições anteriores para h e V na equação 5 e eliminando as derivadas de
constantes, obtém-se:
0x
yg)
x
vv
x
vV(
t
v
0)x
yv
x
yV()
x
Vy
x
vh(
t
y
0
00
(57)
Desprezando os termos que envolvem produtos de flutuações, o sistema é linearizado,
assumindo a seguinte forma:
0x
yg
x
vV
t
v
0x
yV
x
vh
t
y
0
00
(58)
Aproximada com o esquema centrado, a equação 58 pode ser escrita da seguinte maneira:
0v
y
x2
tV
x2
tgx2
th
x2
tV
v
y
x2
tV
x2
tgx2
th
x2
tV
v
y
10
01
v
y
10
01
n
1i
1i
0
00
n
1i
1i
0
00n
i
i1n
i
i
(59)
A aplicação do método de von Neumann requer a identificação das matrizes A e B
presentes na seguinte relação:
n1n UTBUTA (60)
em que: TU é um operador de translação. Para a equação 59, as matrizes são:
10
01A0 ,
10
01B0 ,
x2
tV
x2
tgx2
th
x2
tV
BB0
00
11 .
Note-se que = -1 corresponde à posição i-1 da malha espacial, = 0 ao índice i e = 1 ao
índice i+1. Para n+1 identifica-se as matrizes A e para o instante n as matrizes B. O
próximo passo consiste em calcular o símbolo do esquema numérico, definido como:
)Ikexp(B)Ikexp(A)k(S
1
(61)
em que: S(k) = símbolo ou raio espectral, k Rm
e I = unidade imaginária. Substituindo as matrizes, obtém-se:
)ee(
x2
tV
x2
tgx2
th
x2
tV
10
01)k(S IkIk
0
00
(62)
Das relações trigonométricas elementares, sabe-se que eIk
-e-Ik
= 2Isenk. Portanto:
1Isenkx
tVIsenk
x
tg
Isenkx
th1Isenk
x
tV
)k(S0
00
(63)
Se o módulo de um dos autovalores do símbolo for maior do que a unidade o esquema é
instável. Sendo assim, é necessário calcular os autovalores de S(k), o que pode ser feito com a
solução da função característica.
1IsenkghVx
t
1IsenkghVx
t
)]k(S[autov
ksenIx
tgh)]k(S[autov1Isenk
x
tV
00
00
22
2
20
20
(64)
Nota-se na equação 64 a definição do número de Courant (Cn):
00n ghVx
tC
(65)
Teorema 1. O esquema numérico centrado é incondicionalmente instável.
Prova. |autov[S(k)]|>1 Cn.
A partir dessa conclusão de cunho geral, de que o esquema centrado não é adequado para as
equações linearizadas, verifica-se que o problema não linear não pode se utilizar desse
esquema. O método de Lax e Friedrichs, já mencionado, altera o esquema centrado com o uso
da seguinte aproximação para a derivada temporal:
t
)qq(2
1q
t
qn
1i
n
1i
n
1i
(66)
Seguindo os mesmos procedimentos, é possível demonstrar a condição de estabilidade do
método de Lax-Friedrichs. O sistema de EDP’s linearizado e discretizado com este método
assume a seguinte forma:
0v
y
5,0x2
tV
x2
tgx2
th5,0
x2
tV
v
y
5,0x2
tV
x2
tgx2
th5,0
x2
tV
v
y
10
01
n
1i
1i
0
00
n
1i
1i
0
001n
i
i
(67)
Portanto, o símbolo é:
kcosIsenkx
tVIsenk
x
tg
Isenkx
thkcosIsenk
x
tV
)k(S0
00
(68)
Calculando os seus autovalores, obtém-se:
kcosghVx
tIsenk
kcosghVx
tIsenk
)]k(S[autov
00
00
(69)
Teorema 2. O método de Lax-Friedrichs é estável se Cn < 1.
Prova. O módulo do segundo autovalor de S(k) é:
1C11)1C(ksenkcosksenC)]k(S[autov n2n
2222n
2
Sob a forma de gráfico, a Figura 2 ilustra o comportamento de |autov[S(k)]| para diferentes
números de Courant. Uma descrição detalhada do método de análise empregado pode ser
encontrada em Dautray e Lions (2000) e, uma abordagem ligeiramente diferente, em
Chaudhry (2008, p.392).
Figura 2 – Comportamento de |autov[S(k)]| em função de Cn
CONDIÇÕES E INICIAIS E DE CONTORNO
As condições iniciais para um dado problema de escoamento variável em canais podem ser
estabelecidas com a equação diferencial ordinária que representa o escoamento permanente e
gradualmente variado (equação 70):
2
fo
Frcos
II
dx
dy
(70)
Se a profundidade é conhecida em todos os pontos do domínio no instante inicial,
também é possível especificar as velocidades. Para um caso simples em que s=0, os
invariantes de Riemann são conhecidos ao longo das características, pois são funções de V e y
0
0,4
0,8
1,2
0 1 2 3
|au
tov[S
(k)]
|
k
Cn = 0,25
Cn = 0,50
Cn = 0,75
Cn = 1,0
Cn = 1,2
apenas. Isto dá a opção de especificar V ou y ao longo das características em qualquer ponto,
sendo a outra variável calculada com os invariantes de Riemann. Impor as condições iniciais
desta forma tem a vantagem de aproximar o problema da realidade física. Pode haver casos
em que o interesse maior não é o de obter uma solução em regime variável, mas sim em
regime permanente. Em uma situação como esta, a solução da equação 70 seria suficiente se
não houvesse descontinuidade. Havendo descontinuidades, pode ser vantajoso integrar as
equações de Saint-Venant em suas formas conservativas até o estado estacionário e, como
condição inicial, não é estritamente necessário o uso da solução da equação diferencial
ordinária.
Os autovalores calculados anteriormente indicam de que maneira as condições de
contorno devem ser estabelecidas. Observando as diferentes possibilidades, conclui-se que, se
o escoamento for subcrítico, 1>0 e
2<0. Isto significa que apenas uma variável primitiva
deve ser fixada no contorno, enquanto a outra pode flutuar livremente em função do que
ocorre no domínio, sendo isto feito por meio de extrapolação ou com o uso das equações
obtidas com o método das características. Se Fr>1, 1>0 e
2>0, o que implica impor valores
para as duas variáveis se este regime ocorrer na entrada. Se o escoamento for supercrítico na
saída, V e y são calculadas com extrapolação ou com as equações desenvolvidas com o
método das características. Se a característica aponta para dentro do domínio a variável deve
ser imposta, enquanto que, se a característica aponta para fora do domínio, a variável deve ser
deixada livre para assumir valores que estejam relacionados à solução do problema nos nós
próximos ao contorno.
Algumas condições de contorno típicas de problemas de engenharia podem ser
encontradas em Chaudhry (2008, p.375-376). A presença de um reservatório na extremidade
de montante do sistema pode ser tratada com a equação da energia, resultando na seguinte
relação entre y e V:
g2
VK1hh
21n1
res1n
1
(71)
Esta equação é obtida considerando-se uma distribuição de pressões hidrostática e a
ocorrência de perda de carga localizada na entrada do reservatório, com coeficiente K. Para
calcular a velocidade no instante n+1, utiliza-se a característica negativa. Se a perda de carga
e a energia cinética forem desprezadas, não há necessidade de resolver a equação do segundo
grau.
Figura 3 – Reservatório na extremidade de montante
Fonte: Chaudhry (2008)
Para um reservatório situado no contorno de jusante, a equação da energia,
considerando que há dissipação localizada, resulta em:
g2
VK1yy
21nNx
res1n
Nx
(72)
Para um contorno deste tipo, a característica positiva deve ser empregada para fechar o
sistema de equações do contorno. Uma comporta pode ser modelada com a seguinte equação:
1nNxcd
1nNx gy2ACQ (73)
em que: QNxn+1
=vazão através da comporta no instante futuro (n+1) e no último nó do
domínio, ou seja, em Nx, Cd=coeficiente de vazão, Ac=área de abertura da comporta e yNxn+1
a
altura desde o fundo até a superfície livre imediatamente a montante da comporta. Neste caso
a equação característica positiva deve ser empregada para fechar o sistema de equações no
contorno.
Outros exemplos de condições de contorno são apresentados a seguir, na Figura 4. Na
extremidade a montante, a abertura da comporta é inferior à altura crítica e, portanto, o
escoamento é supercrítico. Nesta posição as características são positivas e “transportam”
informações para dentro do domínio, o que exige a imposição de valores para h e V. Na
extremidade direita, após o ressalto hidráulico, apenas uma característica aponta para dentro
do domínio. Sendo assim, uma variável é fixada e a outra deve ficar livre para flutuar, sendo
calculada por extrapolação ou com a característica positiva.
Figura 4 – Condições de contorno com escoamento supercrítico a montante e subcrítico a jusante.
APLICAÇÕES
Foram desenvolvidos códigos que funcionam em Matlab® ou, com poucas adaptações,
em outras linguagens de programação, especialmente no software GNU Octave (uma versão
gratuita muito parecida com o Matlab®). Os exemplos apresentados foram calculados tendo
como ponto de partida o conjunto de códigos HidráulicaEESC (Simões et al., 2010a,b), que
no estágio atual utiliza os métodos de Lax-Friedrichs, MacCormack, Richtmyer-Lax-
Wendroff e o método das características para problemas hiperbólicos.
Exemplo 1: Ruptura de reservatório em domínio com fronteiras impermeáveis
Este item tem como objetivo apresentar o resultado de uma simulação para o caso em
que as fronteiras do domínio são impermeáveis. Esta condição de contorno é imposta com
V=0 e h calculado com extrapolação. Como conseqüência, espera-se que o fluido oscile no
interior do domínio. Algumas imagens obtidas com o método de Lax-Friedrichs podem ser
vistas a seguir, na Figura 5. Com o código SV_Lax_Friedrichs_p_imp é possível acompanhar
a evolução da posição da superfície livre por meio de uma animação das soluções em cada
instante. Para esta simulação foi considerado que não há resistência (f=0). Simulações com
f≠0 produzem resultados coerentes com a física do problema, assim como para o caso de
declividade de fundo diferente de zero. Os valores para as condições iniciais e demais
informações para este problema encontram-se listadas no referido código, que pode ser obtido
no endereço http://stoa.usp.br/hidraulica/files/.
Figura 5 – Evolução da superfície livre. Instantes: 0; 0,063; 0,35; 0,56; 1,05; 1,68 [s].
Dados: x=0, 02 m, t=7E-4 s, f=0, max(max(Cn))=0,97.
Exemplo 2: Ressalto hidráulico
Considerações gerais sobre o fenômeno
Para uma onda positiva que se desloca para montante em um canal com seção
transversal retangular, a partir das equações de conservação de massa e quantidade de
movimento linear, pode-se demonstrar que a relação entre a velocidade do escoamento com a
velocidade de propagação da onda e com as alturas do líquido antes (h1) e depois da onda (h2)
é dada pela seguinte equação (Massey, 2002, p.629-631; Porto, 2006, p.459-460):
2
h/h1ghcV 12
21
(74)
em que os subscritos 1 e 2 identificam as variáveis antes e depois da onda.
Não é difícil verificar experimentalmente que, para dadas condições, a onda pode estar
parada com relação ao leito do canal, ou seja, c=0. Uma onda estacionária deste tipo é
conhecida como ressalto hidráulico, fenômeno que ocorre na passagem de um escoamento
com Fr>1 (supercrítico) para um escoamento com Fr<1 (subcrítico). Isto pode ser constatado
com a equação 74, reescrita para c=0:
2
h/h1
h
hFr
gh
V
2
h/h1
h
hghV 12
1
21
1
112
1
121
(75)
Já que h2/h1 é sempre maior que a unidade, Fr1>1, o que caracteriza escoamento supercrítico.
Uma análise semelhante, utilizando a equação 74 e a equação da continuidade, permite provar
que Fr2<1.
O escoamento supercrítico a montante pode ser estabelecido sob diferentes condições.
Um exemplo típico é a situação na qual o escoamento no início de um canal horizontal é
0 5 100
5
10
15
20
25
0 5 10
5
10
15
20
25
0 5 100
5
10
15
20
25
0 5 100
5
10
15
20
25
0 5 100
5
10
15
20
25
0 5 100
5
10
15
20
25
estabelecido a partir de um escoamento proveniente de um canal de forte declividade e com
curva de remanso do tipo S2 (hcrítico>h>huniforme). Outra situação é aquela na qual o fluido é
descarregado em um canal, com elevada velocidade, por baixo de uma comporta. Neste texto
foi simulado o caso em que o escoamento subcrítico em um canal horizontal encontra uma
protuberância no fundo. Isto pode ocasionar a passagem do regime subcrítico para o
supercrítico (em alguma posição sobre a protuberância o regime é crítico). Contudo, o regime
supercrítico produzido por um destes meios não pode persistir indefinidamente, em um canal
cuja declividade de fundo seja insuficiente para sustentá-lo. Para uma dada vazão, a
rugosidade dos contornos e a declividade do canal determinam o valor da altura
correspondente ao regime uniforme no canal. Para um canal de fraca declividade, essa altura é
superior à profundidade crítica, condição que caracteriza o escoamento subcrítico.
Em um canal horizontal no qual as condições de entrada são supercríticas, as
profundidades são crescentes ao longo de x (perfil do tipo H3). À medida que a profundidade
do escoamento supercrítico aumenta, o ramo inferior do diagrama de energia específica é
seguido da direita para esquerda, ou seja, a energia específica diminui. Para prosseguir com o
aumento da profundidade até ser alcançado o nível crítico, seria necessário um aumento de
energia específica, para obter um acréscimo adicional na profundidade, até o valor
correspondente às condições de equilíbrio a jusante. Entretanto, em tais circunstâncias, o
aumento de energia específica é inviável. Na condição de escoamento uniforme a energia
específica permanece uniforme e a energia total diminui a uma taxa que corresponde à
declividade do canal. Para qualquer h inferior à altura de equilíbrio, a velocidade é superior e,
como conseqüência, os efeitos dissipativos consomem energia a uma taxa maior que a da
diminuição de energia potencial. Em outros termos, o gradiente de energia é maior que a
declividade de fundo e a energia específica deve diminuir. O resultado desta argumentação
diz que o ressalto se forma antes de ser alcançada a altura crítica, de modo que o equilíbrio
seja atingido após o ressalto. Ele representa uma descontinuidade na qual a relação simples da
energia específica é temporariamente inválida porque as linhas de corrente deixam de ser
retilíneas e paralelas ao longo do ressalto, principalmente ao longo do rolo do ressalto. Nesta
estrutura o escoamento é altamente turbulento e, como conseqüência, há uma considerável
dissipação de energia. Além disto, em função da agitação na superfície e do movimento
relativo entre o rolo e o escoamento supercrítico imediatamente antes do rolo, ocorre
considerável entrada de ar no meio líquido, tornando o escoamento bifásico ao longo do
ressalto. As imagens da Figura 6 ilustram alguns aspectos físicos comentados anteriormente.
Figura 6 – Ressalto hidráulico em canal retangular. A primeira imagem mostra o canal utilizado nos
experimentos que, naquela ocasião, estava com um degrau de fundo para estabelecer o escoamento subcrítico a
montante e supercrítico a jusante. A formação do ressalto foi conseguida com a elevação da soleira existente na
extremidade final do canal. As três imagens seguintes ilustram a elevada turbulência e a característica bifásica. A
última imagem contém resultados experimentais para a profundidade subcrítica na posição x correspondente à
altura h=y indicada na foto (Laboratório de Hidráulica da Escola de Engenharia de São Carlos, USP).
Simulação da posição de um ressalto hidráulico
Com a breve exposição apresentada anteriormente sobre o fenômeno físico em questão
pretendeu-se evidenciar que as hipóteses atreladas às equações Saint-Venant não são
verdadeiras para o caso do ressalto. Apesar disto, é interessante notar que este modelo
matemático é capaz de prever a ocorrência deste fenômeno e calcular a sua posição em um
dado canal. Os resultados assim obtidos serão mais próximos dos resultados reais se forem
conseguidos ajustes adequados para o fator de resistência de Darcy-Weisbach, além do uso de
uma malha e um método numérico apropriado.
Geometria do canal e condições iniciais
A geometria adotada para a simulação pode ser vista a seguir na Figura 7. O início do
canal possui fundo variado definido por meio da seguinte função:
1
2xsen
2
zxz (76)
em que z é a altura máxima do fundo em relação ao trecho horizontal. A declividade de
fundo é calculada por:
2xcos
2
z
dx
xdzxIo (77)
Figura 7 – Geometria do canal
As condições iniciais podem ser calculadas com a equação 70 ou escolhidas pelo
usuário. Para utilizar esta equação, sugere-se o uso do método de Runge-Kutta de 4ª ou 5ª
ordem. A Tabela 1 ilustra uma possível maneira de definir a geometria e as condições iniciais.
Para a simulação deste exemplo, em t = 0 a água está parada no canal e com profundidade
igual a 1,0 m.
Tabela 1 – Definição da geometria e condições iniciais
%Condições Iniciais e geometria (no código, h = y):
n=1;
for i=1:Nx
%Geometria:
x(1,i)=(i-1)*dx;
if x(1,i)<=2*pi
zx(1,i)=0.5*dz*(sin(x(1,i)-pi/2)+1);
Io(1,i)=-0.5*dz*cos(x(1,i)-pi/2);%Lembrando que Io=-dz/dx.
else
zx(1,i)=0;
Io(1,i)=0;
end
q1(i,n)=1-zx(1,i);
V(i,n)= 0;%q/y(i,n);
q2(i,n)=y(i,n)*V(i,n);
f1(i,n)=q2(i,n);
f2(i,n)=q2(i,n)*abs(q2(i,n))/q1(i,n)+0.5*g*q1(i,n)^2;
J2(i,n)=g*q1(i,n)*Io(1,i)-
f*(q2(i,n)/q1(i,n))*abs(q2(i,n)/q1(i,n))/8;
Fr(i,n)=V(i,n)/((g*y(i,n))^0.5);
c(i,n)=(g*y(i,n))^0.5;
Cn(i,n)=(abs(V(i,n))+c(i,n))/(dx/dt);
End
Simbologia:
f= fator de resistência de Darcy-Weisbach;
Fr=número de Froude;
c=celeridade;
Cn=número de Courant;
yp=profundidade em regime permanente.
Condições de contorno
Os autovalores calculados anteriormente indicam de que maneira as condições de
contorno devem ser estabelecidas. Observando as referidas equações, reescritas a seguir na
forma adimensional, conclui-se que, se o escoamento for subcrítico, 1>0 e
2<0. Isto
significa que apenas uma variável primitiva deve ser fixada no contorno, enquanto a outra
pode flutuar livremente em função do que ocorre no domínio, sendo isto feito por meio de
extrapolação ou com o uso da equação característica correspondente. Se Fr>1, tem-se 1>0 e
2>0, o que implica impor valores para as duas variáveis se este regime ocorrer na entrada. Se
o escoamento for supercrítico na saída, V e h são calculadas de acordo com o que ocorre no
interior do domínio. Se a característica aponta para dentro do domínio a variável deve ser
imposta, enquanto que, se a característica aponta para fora do domínio, a variável deve ser
deixada livre para assumir valores que estejam relacionados à solução do problema nos nós
próximos ao contorno (razão pela qual é empregada extrapolação). Estas mesmas idéias são
empregadas no cálculo de escoamentos supersônicos em bocal convergente-divergente, por
exemplo. Neste tipo de problema, o número de Mach é análogo ao número de Froude e o
problema possui três autovalores, pois há três equações (conservação de massa, quantidade de
movimento e conservação de energia).
1Frc
1
(78)
1Frc
2
(79)
Resultados: método de Lax-Friedrichs
Resultados obtidos com o método de Lax-Friedrichs podem ser vistos a seguir, na
Figura 8. A primeira imagem (figura 8a) mostra a forma da superfície livre e o número de
Froude no domínio para t=30 s e resistência nula. Assim como no problema de ruptura do
reservatório (exemplo 1 deste texto), a descontinuidade esperada foi suavizada pelo efeito
difusivo inerente ao método numérico empregado. Aspectos consistentes são observados nas
imagens, como uma superfície uniforme ao longo de x nas regiões após a elevação de fundo e
o choque, já que f=0. Além disto, nas proximidades da crista da saliência, a profundidade
resultou próxima da crítica (ou Fr1). A Figura 8b contém os resultados para f=0,1 e ilustra o efeito da dissipação de energia na posição do ressalto e na forma da superfície livre a jusante
dele, que é uma curva do tipo H2 (curva para a qual h>hc em canal horizontal). Para visualizar
a evolução de h o código exibe uma animação dos resultados após a conclusão de todos os
cálculos.
(a)
(b)
Figura 8 – Ressalto hidráulico (Lax-Friedrichs): (a) f=0, max(max(Cn))=0,97; (b) f=0,05, max(max(Cn)) = 0,97.
Dados: y=h; L=20 m, x=0,025 m, t=0,002 s, t=30 s, q=9,0 m2/s, z=0,4 m, g=9,8 m/s
2.
Resultados: método de MacCormack
A posição do início do ressalto hidráulico calculada com o método de MacCormack foi
semelhante a aquela obtida com o método de Lax-Friedrichs, como ilustrado na Figura 9a,b.
Observa-se na Figura 9c o efeito dispersivo do método, por meio de um detalhe extraído da
Figura 9b. Apesar de tais oscilações, o método reproduziu a descontinuidade com uma
qualidade superior à obtida por Lax-Friedrichs. O uso de viscosidade artificial com Cx=0,6
não eliminou completamente a dispersão numérica, mas foi capaz de reduzir
consideravelmente o seu efeito em relação a Cx=0.
(a)
(b)
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 200
1
2
3
x [m]
X: 3.15
Y: 0.994
y [m] Fr Fundo
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 200
1
2
3
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 200
1
2
3
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 200
1
2
3
(c)
Figura 9 – Ressalto (MacCormack): (a) f=0, max(max(Cn))=0,98; (b) f=0,05, max(max(Cn)) = 0,98. Dados:
L=20 m, x=0,0286 m, t=0,0023 s, t=30 s, Cx=0,6, q=9,0 m2/s, z=0,4 m, g=9,8 m/s
2. Notação semelhante à
da Figura 8.
Formação de ressalto hidráulico (Método de MacCormack) – evolução temporal
O código desenvolvido é capaz de simular a formação do ressalto hidráulico de acordo
com a descrição física exposta anteriormente. Ou seja, consegue-se acompanhar a evolução
temporal da formação do ressalto. Para esta simulação, a elevação de fundo, dada pela
equação 76, foi posicionada de acordo com a Figura 10. Nesta figura também é indicado o
perfil da superfície livre e h(t=0,x)=y. Nota-se que antes e depois da elevação o perfil da
superfície livre é do tipo H3, que é caracterizado por profundidades crescentes ao longo de x
em um canal horizontal.
Figura 10 – Geometria e condições iniciais
Dados: z=0,4 m, q = 9 m2/s, f=0,10, x=0,10 (unidades: SI)
Para uma condição inicial como esta, se forem fixados os valores de q e h nos contornos
como sendo iguais aos valores em t=0, espera-se que o código forneça o mesmo perfil da
superfície livre (exceto por pequenos erros decorrentes das diferentes ordens dos métodos).
Assim, é necessário introduzir uma perturbação do sistema para que ocorra a formação do
ressalto. A alternativa adotada para este exemplo foi reduzir a vazão específica para 0,7q.
Durante a solução, os sinais dos autovalores devem ser verificados para que as condições de
contorno sejam impostas corretamente. No contorno esquerdo, se o número de Froude for
maior do que a unidade, a profundidade e a velocidade são impostas com valores fixos. Caso
contrário a profundidade é avaliada com extrapolação e a vazão permanece fixa. No contorno
direito, se Fr>1, h=q1 e q2 são calculados com extrapolação. Se Fr<1, q1 = constante e q2 é
extrapolada. A imposição das condições de contorno seguindo este critério está baseada na
análise das características, como discutido anteriormente. Para verificar a mudança no sinal
dos autovalores, foi utilizado o número de Froude, baseado no que ocorre nas adjacências dos
contornos. Como ilustrado na Figura 11, a alteração na vazão faz com que apareça uma onda
(ressalto) a partir da elevação de fundo e que se desloca para trás e um ressalto a jusante da
elevação. Para visualizar a evolução da superfície livre, o código SV_MacCormack_HJ_FM
permite observar a animação dos resultados.
5.9 6 6.1 6.2 6.3 6.4 6.5 6.6
2.5
2.6
2.7
2.8
0 5 10 15 20 25 300
0.5
1
1.5
2
x [m]
y+z y Fundo
Figura 11 – Evolução temporal da formação do ressalto hidráulico. Instantes: 0;0,77;3,85;6,15;16,9;29,23;100
[s]. Dados: z=0,4 m, q = 9 m2/s, f=0,10, x=0,10, t=0,0077, Cx=0,6.
0 5 10 15 20 25 300
1
2
3
0 5 10 15 20 25 300
1
2
3
0 5 10 15 20 25 300
1
2
3
0 5 10 15 20 25 300
1
2
3
0 5 10 15 20 25 300
1
2
3
0 5 10 15 20 25 300
1
2
3
0 5 10 15 20 25 300
1
2
3
x [m]
y(t=100,x) Fr Fundo
EQUAÇÃO DE ÁGUAS RASAS EM COORDENADAS CILÍNDRICAS
A equação para o caso de águas rasas pode ser reescrita em coordenadas cilíndricas com
o intuito de resolver problemas com simetria radial, como a simulação de um ressalto
hidráulico circular, o enchimento de um reservatório e a ruptura de um reservatório cilíndrico.
As equações para águas rasas escritas sem termos fonte, ao serem transformadas para o
sistema cilíndrico são reduzidas a um sistema unidimensional, porém, com dois termos fonte
oriundos da mudança de coordenadas. Sendo r a coordenada radial, o sistema de equações
assume a seguinte forma:
Momentum r
huugh
2
1huhu
deContinuida r
huhuh
r
22t
rt
(80)
A forma vetorial desta equação é:
sr
f
t
q
(81)
em que:
2
1
q
q
hu
hq (82)
22 gh
2
1hu
huf (83)
rq
qqr
q
r
huur
hu
s
1
22
2
(84)
O vetor fluxo pode ser escrito em termos das componentes q1 e q2 da seguinte maneira:
2
11
22
2
gq2
1
q
q
q
f (85)
Observa-se que o vetor fluxo para o presente caso possui a mesma forma do vetor fluxo
para o caso unidimensional. Portanto, os autovalores para o problema unidimensional e para o
problema bidimensional com simetria radial são idênticos.
Exemplo 3: Enchimento de um reservatório cilíndrico
O código que resolve as equações para o preenchimento de um reservatório cilíndrico é
semelhante aos demais, exceto pelas condições de iniciais e de contorno. As condições
iniciais são h(x,0) = 18 m para x < 0,2 m, h(x,0) = 0,5 m para x > 0,2 m, h(0,2, 0) =
(18+0,5)/2 e velocidade nula em toda parte. Em r=0 as condições de contorno são as mesmas
dos problemas anteriores e em r=L a profundidade é interpolada com a condição de parede
sólida, ou seja, velocidade igual a zero. O código é denominado enchimento_L_F, sendo que
uma coletânea de resultados para diferentes instantes pode ser vista na Figura 12.
Figura 12 – Evolução da profundidade da água no reservatório
Dados: t = 0; 0,3191; 0,6383; 3,1915; 30 [s]; Nt=4701, t = 0,0064 s, Nx = 51, x = 0,1 m, L = 5 m, tt = 30 s,
max(Cn) = 0,9678, código enchimento_L_F.
EQUAÇÕES DE ÁGUAS RASAS EM DUAS DIMENSÕES
Para obtenção do modelo bidimensional conhecido como equações para o caso de águas rasas
em 2D ou equações de Saint-Venant em 2D, as equações de N-S e continuidade são
integradas ao longo da vertical. Adicionalmente, considera-se que a aceleração vertical do
fluido é nula, ou seja, Dw/Dt=0, em que w é a componente vertical da velocidade. Como
resultado de tal integração, se forem desprezados os efeitos viscosos e para o caso de um
canal com fundo plano, o sistema obtido é:
Momentum
0gh2
1hvhuvhv
0huvgh2
1huhu
deContinuida 0hvhuh
y
22xt
yx
22t
yxt
(86)
em que: u=velocidade na direção x e v a velocidade na direção y, h é a profundidade do
escoamento e g=aceleração da gravidade. Estas equações carregam a hipótese de distribuição hidrostática de pressões, assim como no caso 1D.
Neste caso, o sistema de equações 86 pode ser escrito na forma vetorial como
apresentado a seguir:
0y
g
x
f
t
q
(87)
em que:
22
22
gh2
1hv
huv
hv
q ,
huv
gh2
1hu
hu
f ,
hv
hu
h
q
Pode-se verificar que:
211
23
132
3
132
211
22
2
gq2
1q/q
q/qq
q
g ,
q/qq
gq2
1q/q
q
f
Reescrevendo as equações na forma quase linear (ou não conservativa), é possível calcular os
autovalores da matriz convectiva, obtendo-se:
xa associados termosos para ,
3
2
1
cu
u
cu
x
x
x
(88)
y a associados termosos para ,
3
2
1
cv
v
cv
y
y
y
(89)
Os mesmos resultados são obtidos calculando-se os autovalores das matrizes Jacobianas de
f(q) e g(q).
Exemplo 4: ruptura de barragem
O uso do método de Lax-Friedrichs para o caso bidimensional é feito seguindo o mesmo
princípio de utilizar um valor médio, porém, levando em conta os quatro nós adjacentes ao nó
i,j, ou seja, (1/4)(qi+1,j+qi-1,j+qi,j+1+qi,j-1)n. A equação 87 na forma discreta assume a seguinte
forma:
n
1j,i
n
1j,i
nj,1i
nj,1i
n
1j,i
n
1j,i
n
j,1i
n
j,1i
1n
j,igg
y2
tff
x2
tqqqq
4
1q (90)
As condições de contorno utilizadas para este problema incluem extrapolações de
primeira ordem para a profundidade h e para as componentes da velocidade que são
tangenciais às paredes. As velocidades normais são iguais a zero com o intuito de reproduzir
as próprias paredes. A Figura 13 contém resultados obtidos com o código ruptura_2D_L_F,
para diferentes instantes. É interessante notar que as ondas se propagam de modo simétrico, o
que mostra coerência no funcionamento do código, razão pela qual foram escolhidas duas
barragens com características iguais e eqüidistantes em relação à diagonal do domínio. Outras
formas de visualizar os resultados estão disponíveis no código desenvolvido. Entre elas, a
evolução do campo vetorial de velocidades e do gráfico de contornos para uma mesma
profundidade.
Figura 13 – Ruptura de duas barragens situadas nos cantos de um domínio retangular com paredes
impermeáveis. Dados: Nt=2001, t = 0,01 s, Nx = Ny = 101, x = 0,1 m, Lx = Ly = 10 m, tt = 20 s, código
ruptura_2D_L_F.
Resultados obtidos com o método de MacCormack
O método de MacCormack foi utilizado para na elaboração do código
MacCormack_2D_SW, cujos resultados podem ser vistos a seguir, na Figura 14. As imagens
mostradas nesta Figura correspondem a t = 0,22 s e t = 2,09 s. Tal escolha permite que elas
sejam comparadas com aquelas da Figura 13. Com estas imagens é possível observar
oscilações decorrentes do efeito dispersivo do esquema numérico de MacCormack.
Figura 14 – Resultados obtidos com o método de MacCormack
Dados: Nt=2001, t = 0,01 s, Nx = Ny = 81, x = y = 0,125 m, Lx = Ly = 10 m, tt = 20 s, Cz=0,2 (fator
utilizado para ponderar a viscosidade artificial).
Exemplo 5: Ondas geradas pela imposição de pulsos
Outro recurso que pode ser empregado para geração de ondas é uma função denominada
pulstran, que gera ondas quadradas. O seu uso é ilustrado nos códigos
MacCormack_2D_SW_pulsos_1 e MacCormack_2D_SW_pulsos_2. A Figura 15 contém
resultados obtidos com o primeiro e ilustra configurações agitadas da superfície da água em
um reservatório quadrado com vinte metros de lado.
Figura 15 – Ondas formadas na superfície livre da água de um reservatório quadrado
Dados: Nt=2001, t = 0,01 s, Nx = Ny = 81, x = y = 0,25 m, Lx = Ly = 20 m, tt = 20 s, Cz=0,2, código
MacCormack_2D_SW_pulsos_1.
A Figura 16 ilustra os resultados de uma simulação semelhante à anterior, porém, para
um reservatório com Lx = 20 m e Ly = 40 m. Neste caso os pulsos são gerados em uma
posição diferente, como indicado na primeira imagem.
Figura 16 – Ondas formadas na superfície livre da água de um reservatório retangular
Dados: Nt=2001, t = 0,01 s, Nx = Ny = 81, x = 0,25 m, y = 0,50 m, Lx = 20 m, Ly = 40 m, tt = 20 s, Cz=0,2,
código MacCormack_2D_SW_pulsos_2.
CONCLUSÕES
O presente texto introduz aspectos práticos e didáticos relacionados à solução das
equações de Saint-Venant em situações uni e bi-dimensionais, situações essas que são
encontradas no universo de trabalho dos ramos da engenharia que se ocupam com fluidos. A
série de exemplos escolhidos envolve fenômenos que podem ser denominados de abruptos
(ou contendo singularidades), por envolverem descontinuidades seja no espaço (por exemplo
o ressalto hidráulico), seja no tempo (por exemplo a ruptura de uma barragem). A
metodologia de apresentação seguida neste texto mostra que fenômenos como esses podem
ser assimilados e quantificados com razoável facilidade pelo estudante ou profissional que se
depara com eles. As ferramentas de trabalho atualmente disponíveis (códigos abertos,
computadores acessíveis) permitem que as complexidades matemáticas possam ser vistas
como informações básicas inerentes aos fenômenos, para as quais há procedimentos de
análise já conhecidos. Assim, demonstrou-se que o foco do estudante/engenheiro deve ser
direcionado para o reconhecimento do tipo de singularidade com o qual se depara, para então
escolher a ferramenta (numérica) que permite superar essa singularidade. O conjunto de
códigos computacionais utilizados neste texto é majoritariamente aberto ao público ou de uso
amplo (largamente aplicado), o que faz com que o leitor possa facilmente reproduzir os
exemplos e dominar as técnicas aqui descritas. Entende-se que esse tipo de abordagem é
necessário para que o dia-a-dia da engenharia se torne mais aprazível. Note-se que não se
descarta qualquer busca de soluções analíticas ou empíricas vinculadas à pesquisa dos
fenômenos básicos. A pesquisa em fluidos necessita de observação e de novos pontos de
vista, de forma que princípios e ferramentas matemáticas mais abrangentes possam ser
desenvolvidos. Assim, a pesquisa com certeza estará modificando continuamente a nossa
forma de ver os fluidos, e de resolver problemas relativos a eles. Todavia, no presente
momento do nosso conhecimento, muito se consegue resolver com relativamente pouco
ferramental, o que se procurou evidenciar nesse texto. Dessa forma, o presente texto valoriza
o reconhecimento do problema matemático segundo seus desenvolvimentos tradicionais e
busca motivar a introdução de padrões de resolução que se baseiem no uso de programas
robustos e simples, sem enfatizar ao estudante/pesquisador o conjunto de detalhes que os
gerou (já suficientemente testados ao longo das décadas). Os ramos da Engenharia que tratam
com fluidos certamente se beneficiarão com esse tipo de aplicação mais expedita. Como
mencionado, no presente estudo o universo de soluções orbitou em torno das equações de
Saint Venant, mostrando que diferentes situações podem ser suficientemente bem
quantificadas utilizando os mencionados programas.
REFERÊNCIAS
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McGraw-Hill.
CHAUDHRY, M.H. (2008) Open-channel flow. Springer.
DAUTRAY, R.; LIONS, Jacques-Louis. (2000) Mathematical Analysis and Numerical
Methods for Science and Technology. Springer, Berlin.
GHARANGIK, A.M.; CHAUDHRY, M.H. (1991) Numerical simulation of hydraulic jump.
Journal of Hydraulic Engineering. V.117(9), pp.1195-1211.
LAMB, H. (1945) Hydrodynamics. Dover Publications.
LEVEQUE, R. (2007) Finite volume methods for hyperbolic problems. Cambridge University
press.
MACCORMAC, R.W. (1969). "The effect of viscosity in hypervelocity impact cratering”.
Paper 69-354, American Institute of Aeronautics and Astronautics, Cincinnati, Ohio.
MASSEY, B. S. (2002). Mecânica dos fluidos. 6. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
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PORTO, R.M. (2006) Hidráulica básica. EESC-USP/Projeto Reenge.
SIMÕES, A.L.A.; PORTO, R.M.; SCHULZ, H.E. (2010a) Problemas hiperbólicos em
hidráulica: simulação numérica de escoamentos não-permanentes em condutos forçados e
livres. XXIV Congreso Latinoamericano de Hidráulica, Punta del Este, Uruguai.
SIMÕES, A.L.A.; SCHULZ, H.E.; PORTO, R.M. (2010b) Escoamento laminar desenvolvido
em seção genérica: simulação numérica e cálculo do fator de resistência. XXIV Congreso
Latinoamericano de Hidráulica, Punta del Este, Uruguai.