flexibilidade espacial e apropriaÇÃo da cidade · 2019. 1. 31. · viviane gomes medeiros...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE VIVIANE GOMES MEDEIROS FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE: ANTEPROJETO DE ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO USO NO BAIRRO DE PONTA NEGRA Natal 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

VIVIANE GOMES MEDEIROS

FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE:

ANTEPROJETO DE ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO

USO NO BAIRRO DE PONTA NEGRA

Natal

2015

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VIVIANE GOMES MEDEIROS

FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE:

ANTEPROJETO DE ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO

USO NO BAIRRO DE PONTA NEGRA

Trabalho Final de Graduação

apresentado à banca examinadora da

Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, requisito para conclusão de

bacharelado em Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora:Verônica Maria Fernandes de Lima

Natal

2015

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VIVIANE GOMES MEDEIROS

Flexibilidade espacial e apropriação da cidade: anteprojeto de estruturação de um

espaço público de múltiplo uso no bairro de ponta negra

Trabalho Final de Graduação

apresentado à banca examinadora da

Universidade Federal do Rio Grande do

Norte no semestre de 2015.1, requisito

para conclusão de bacharelado em

Arquitetura e Urbanismo.

Aprovado em: ____ de junho de 2015

BANCA EXAMINADORA:

____________________________________________________

Professora Dra. Verônica Maria Fernandes de Lima – UFRN (Orientadora)

____________________________________________________

Professor Francisco da Rocha Bezerra Junior – UFRN

(Examinador interno)

____________________________________________________

Arquiteta e Urbanista Camila Furukava - UFRN

(Examinador externo)

Natal / RN

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“Life in city space has a significant impact on how we perceive the space. A lifeless street is like an empty theater: something must be wrong with the production since there is no audience.” (Jan Gehl)

“A vida no espaço urbano tem um impacto significativo em como

nós percebemos o espaço. Uma rua sem vida é como um teatro vazio: deve ter algo errado com a produção, já que não há plateia.” (Tradução nossa a partir de Jan Gehl)

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer, nesse momento de final de curso, a todos que estiveram

comigo durante esses seis difíceis anos. Aos meus pais, por me apoiarem em todos os

momentos, e me estimularem a explorar e a buscar sempre melhorias. Aos amigos que

sempre estão lá, para as horas boas e ruins.

À todos os Arquitetônicos, amigos de curso (muito além de colegas), que me

acompanharam por todo esse tempo, aquela turma que entrou sorrateira, mas que logo

mostrou a todos que era diferente. Somos e continuaremos a ser uma turma unida o tempo

todo, e disso eu me orgulho muito. Um “obrigada” a mais para aquelas que têm me

acompanhado de perto no final desta jornada: Aninha, Mari, Rafinha, e Bárbara.

Também existem aqueles que nem sempre estiveram, mas que a partir do

momento que entraram na minha vida, só vieram a adicionar. Meu “muito obrigada” ao meu

namorado, Roberto, que só veio a me acrescentar coisas boas e que só me dá apoio até

quando as decisões tornam as coisas mais difíceis para ele mesmo. Para Verônica, minha

orientadora (do trabalho final e da bolsa de pesquisa), pelas oportunidades dadas e pelos

ensinamentos passados. Aos brasileiros que viveram cada momento comigo na Holanda:

obrigada pelo ano lindo vocês me proporcionaram.

Obrigada àqueles que deixaram ensinamentos marcados em mim por cada canto

que eu passei, com os chefes mais pacientes e gentis do mundo: Camila, Cândida,

Jacqueline, e Dixon.

Por fim, obrigada aos professores e à coordenação o curso de Arquitetura e

Urbanismo, por ter dado a oportunidade de fazer parte de um ambiente como o nosso

Galinheiro, cheio de vida, dedicação e comprometimento para fazer um lugar cada vez

melhor.

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MEDEIROS, Viviane Gomes. Flexibilidade espacial e apropriação da cidade: anteprojeto de estruturação de um espaço público de múltiplo uso no bairro de Ponta Negra. Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Centro de Tecnologia – Curso de Arquitetura e Urbanismo. Natal/RN: 2015.

RESUMO

Em muitas cidades brasileiras, observa-se uma tendência à diminuição da

apropriação dos espaços públicos, a exemplo de praças, ruas, e largos. Diminui o número

de pessoas conversando em cadeiras nas calçadas e de crianças brincando nas ruas

quando este tipo de dinâmica urbana passa a ocorrer em novos ambientes de convivência

que possuem acessibilidade restrita, como os shopping centers e os condomínios, que

surgiram num contexto de sensação de insegurança no meio urbano. Soma-se a isto a má

distribuição dos espaços públicos existentes, a notar-se pelos resultados parciais da

pesquisa “Os sistemas de espaços livres públicos e a urbanidade”. Notou-se que enquanto

alguns distritos da cidade possuem equipamentos públicos de lazer dos quais se podem

fazer uso, existem áreas que sofrem com a insuficiência de espaços públicos, seja de lazer,

seja para contribuir com a complexa teia ecológica da urbe. Como resposta a esta

problemática, trabalha-se aqui sob a ótica da multifuncionalidade, tanto como forma de

retomar o uso dos espaços públicos ao convidar vários atores à ocupação e apropriação,

quanto como espaço de democracia onde a adaptação e a flexibilidade permitem que esta

diversidade de apropriações tome forma sem restringir o espaço do outro. É objetivo deste

trabalho estimular a apropriação dos espaços públicos através do desenvolvimento de uma

proposta adaptável, levando em consideração os diferentes tipos de usos apresentados pela

população local, tendo como elementos norteadores a multifuncionalidade e a flexibilidade,

unindo áreas outrora dispersas.

Palavras-chave: espaços livres; apropriação; multifuncionalidade.

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MEDEIROS, Viviane Gomes. Spatial flexibility and city appropriateness: pre-project of a multifunctional public space in the district of Ponta Negra. Federal University of Rio Grande do Norte – Technology Center – Course of Architecture and Urbanism. Natal/RN: 2015.

ABSTRACT

In many Brazilian cities, there is a tendency to decrease appropriateness of public

spaces, such as squares and streets. The number of people chatting at the sidewalk

decreases, in the pace that this type of urban dynamic begins to happen in new

acquaintanceship places, like shopping malls and “condomínios”, which aroused in a context

of general feeling of public unsafety. According to the research “The system of open public

spaces and the urbanity” another factor is the poor distribution of public spaces, says the

research’s partial results. Therefore, on one hand, there are some districts that have plenty

of public spaces to enjoy, and in the other hand, some districts don’t have enough spaces,

whether to leisure or to have participation at the city’s complex ecological web. As a result, in

this paper, it is worked through the optics of multifunctional spaces, both as a way to retake

the use of public spaces by inviting various actors to occupy and appropriate, and as

democracy space where adaptability and flexibility allows diversity to take form without

restricting someone else’s space. It is this paper’s goal to stimulate public space

appropriateness through the development of an adaptable proposal, taking into consideration

the different kinds of usages practiced by the local community. The proposal must have as

guideline the multifunctionality and the adaptability, to rejoin areas once scattered.

Keywords: open spaces; appropriateness; multifunctionality.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Formas de apropriação e potenciais de uso........................................................ 24

Figura 2 - Compilação dos conceitos de flexibilidade e adaptabilidade ................................ 27

Figura 3 – Localização da cidade de Houston nos Estados Unidos ..................................... 35

Figura 4 – Mudanças provocadas pela inserção do Parque Discovery Green em um centro

urbano ocioso ...................................................................................................................... 36

Figura 5 – Leiaute geral do Parque Discovery Green .......................................................... 37

Figura 6 – Gateway Fountain e Mist Tree representando o lazer contemplativo e sensorial 38

Figura 7 – Obras dos artistas Margo Sawyer e Doug Hollis, respectivamente ..................... 38

Figura 8 – Permeabilidade e conectividade visual entre as partes do parque ...................... 39

Figura 9 – Leiaute geral do Parque Superkilen .................................................................... 41

Figura 10 – Vista do Parque Superkilen ............................................................................... 41

Figura 11 – Inserção da vegetação no Parque Superkilen ................................................... 42

Figura 12 – Criação de novas topografias e elevações ........................................................ 43

Figura 13 – Mobiliário urbano diferenciado e diversos tipos de apropriação ........................ 43

Figura 14 – Planta zoneada das diferentes áreas da Praça André de Albuquerque ............. 45

Figura 15 – Recomendações de Neufert e Ludwig para alturas de cercas vivas ................. 45

Figura 16 – Vista do parque Superkilen no período da noite com iluminação bem distribuída

............................................................................................................................................ 46

Figura 17 – Pisos desmontáveis em madeira e plástico, respectivamente ........................... 48

Figura 18 – Enzo, mobiliário urbano criado para ser multifuncional e móvel ....................... 48

Figura 19 – Strip Ease e Sinus, mobiliários urbanos de uso flexível .................................... 49

Figura 20 – Localização do bairro de Ponta Negra no município de Natal ........................... 51

Figura 21 – Mapas figura-fundo do crescimento do bairro de Ponta Negra .......................... 53

Figura 22 - Orla da Praia de Ponta Negra na década de 1930............................................. 54

Figura 23 - Início da ocupação da orla por grandes casas de veraneio ............................... 55

Figura 24 - Imagem aérea do Conjunto Ponta Negra na década de 1970 ........................... 56

Figura 25 - Setores das tipologias de ocupação urbana no bairro de Ponta Negra .............. 57

Figura 26 – Moradores por classe de rendimento ................................................................ 59

Figura 27 – Cobertura vegetal no bairro de Ponta Negra ..................................................... 60

Figura 28 – Espaços públicos de lazer no bairro de Ponta Negra ........................................ 61

Figura 29 – Legislação incidente sobre o bairro de Ponta Negra ......................................... 62

Figura 30 – Localização da área de estudo no bairro de Ponta Negra ................................. 63

Figura 31 – Equipamentos urbanos na área de estudo e adjacência ................................... 65

Figura 32 – Mapa de uso do solo na área de estudo ........................................................... 66

Figura 33 – Mapa de gabarito na área de estudo................................................................. 67

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Figura 34 – Registro fotográfico das calçadas da Rua Manoel Rodrigues e Rua do Golfinho,

respectivamente .................................................................................................................. 71

Figura 35 – Visuais do espaço livre sem muros ou cerca .................................................... 71

Figura 36 – Visual interna do espaço livre murado .............................................................. 72

Figura 37 – Lagoa de captação e estação elevatória de esgotos da CAERN ...................... 73

Figura 38 – Mapa de situação e locação das áreas de intervenção ..................................... 69

Figura 39 – Equipamentos de drenagem urbana, de iluminação pública e vegetação como

empecilhos à livre circulação do pedestre............................................................................ 69

Figura 40 – Equipamentos urbanos e vegetação como obstáculos para o pedestre no

entorno da lagoa de captação e EEE da CAERN ................................................................ 70

Figura 41 - Mapeamento dos vestígios comportamentais observados ................................. 73

Figura 42 – Criação de trilha por erosão na vegetação ........................................................ 74

Figura 43 – Deposição através da colocação de uma placa indicativa de comportamento .. 74

Figura 44 - Mapa mental com elementos da natureza ......................................................... 78

Figura 45 - Morfologia urbana da via como linear, e mais elaborada, respectivamente. ...... 79

Figura 46 - Mapa síntese das entrevistas ............................................................................ 81

Figura 47 - Esquemas relacionando problemas encontrados e soluções propostas ............ 86

Figura 48 - Esquema de implantação do módulo de mobiliário urbano ................................ 90

Figura 49 - Perfil proposto para a Rua Curimatã .................................................................. 91

Figura 50 - Funcionograma criado a partir do programa de necessidades ........................... 92

Figura 51 - Primeira proposta de zoneamento ..................................................................... 93

Figura 52 - Primeira proposta de traçado (nomear espaços) ............................................... 94

Figura 53 - Curvas de nível no lote 4 ................................................................................... 97

Figura 54 - Piso drenante em concreto na cor grafite .......................................................... 98

Figura 55 - Mobiliário urbano sugerido para o Espaço Cultura e Ação ................................. 98

Figura 56 – Exemplo de playground temático sugerido ..................................................... 100

Figura 57 - Mobiliário sugerido para o Espaço Mobilidade e Informação ........................... 100

Figura 58 - Piso intertravado retangular vermelho ............................................................. 101

Figura 59 - Exemplo de estruturação sugerida para o espaço turismo ............................... 101

Figura 60 - Esquema de paginação no passeio que abrange os quatro lotes .................... 102

Figura 61 - Horta suspensa em concreto ........................................................................... 103

Figura 62 - Composição paisagística com pedras como forração ...................................... 103

Figura 63 - Exemplo de mobiliário sugerido para as demais áreas .................................... 104

Figura 64 - Sugestão de floreiras para guiar fluxos ............................................................ 104

Figura 65 - Posteamento sugerido para o interior dos lotes ............................................... 105

Figura 66 - Exemplo de poste para o passeio público ........................................................ 105

Figura 67 - Diversos modelos de balizadores para iluminação .......................................... 106

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 12

1 CONCEITOS E ABORDAGENS .......................................................................... 18

1.1 O ESPAÇO, O LUGAR E O PÚBLICO ................................................................. 18

1.2 FUNÇÕES NO ESPAÇO URBANO....................................................................... 21

1.3 APROPRIAÇÕES E SEUS MODOS ..................................................................... 23

1.4 MULTIFUNCIONALIDADE COMO UMA NECESSIDADE ...................................... 26

1.5 O (ESPAÇO) PÚBLICO NA CIDADE CONTEMPORÂNEA: ................................... 29

1.6 COMO AVALIAR O ESPAÇO? (METODOLOGIAS E SEUS COMPONENTES) .... 31

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................... 32

3 ESTUDANDO ESPAÇOS MULTIFUNCIONAIS ..................................................... 35

3.1 PARQUE DISCOVERY GREEN ............................................................................. 35

3.2 PARQUE SUPERKILEN ......................................................................................... 40

3.3 DIMENSÕES DA MULTIFUNCIONALIDADE E DA APROPRIAÇÃO DO LUGAR .. 44

4 OBSERVANDO A REALIDADE LOCAL ................................................................ 51

4.1 O BAIRRO DE PONTA NEGRA .............................................................................. 51

4.1.1 Histórico da área ...................................................................................................... 52

4.1.2 Dados gerais sobre o bairro de Ponta Negra ........................................................... 58

4.2 SOBRE A ÁREA-DE-ESTUDO ................................................................................. 62

4.3 ÁREA-PROJETO E CARACTERÍSTICAS ................................................................ 68

4.3.1 Percursos e visuais ................................................................................................... 70

4.3.2 Leiaute atual e posição geográfica ............................................................................ 68

4.3.3 Apropriações sob o ponto de vista dos vestígios comportamentais ........................... 70

5 CONVERSANDO COM A COMUNIDADE ................................................................ 75

5.1 ENTREVISTAS ......................................................................................................... 76

5.2 O ENVOLVIMENTO DA COMPANHIA DE ÁGUAS E ESGOTO DO RIO GRANDE DO

NORTE - CAERN 82

6 REBATIMENTOS ...................................................................................................... 83

6.1 PARTIDO URBANÍSTICO .......................................................................................... 87

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7 MEMORIAL DESCRITIVO ........................................................................................ 89

7.1 TRATAMENTO URBANÍSTICO DAS VIAS VISANDO A INTEGRAÇÃO FÍSICO-

TERRITORIAL DA PROPOSTA .......................................................................................... 89

7.2 ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO USO ...................... 92

7.2.1 Evolução da proposta .............................................................................................. 92

7.2.2 Proposta final ........................................................................................................... 95

7.2.2.1 Espaço Cultura e Ação ............................................................................................. 98

7.2.2.2 Espaço Movimente-se .............................................................................................. 99

7.2.2.3 Espaço Mobilidade e Informação ........................................................................... 100

7.2.2.4 Espaço Turismo ..................................................................................................... 101

7.2.2.5 Espaço Bosque do Aprendizado ............................................................................ 102

7.2.2.6 Espaço Aventura e Natureza .................................................................................. 102

7.2.2.7 Demais áreas e considerações gerais .................................................................... 103

CONCLUSÃO ........................................................................................................ 107

REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 109

APÊNDICE A ......................................................................................................... 114

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 12

INTRODUÇÃO

Em muitas cidades brasileiras, observa-se na atualidade uma tendência à

atenuação da apropriação dos espaços públicos pelo cidadão, a exemplo de praças, ruas, e

largos. Diminui o número de pessoas conversando em cadeiras nas calçadas, crianças

brincando nas ruas ou jogando futebol na quadra do bairro quando este tipo de dinâmica

urbana passa a ocorrer em ambientes murados e de acessibilidade restrita. Este fenômeno

já era apontado por Richard Sennett em 1976, em seu livro “O Declínio do Homem Público”,

no qual atribui o esvaziamento na vida pública à difusão do capitalismo e as transformações

trazidas pelo mesmo, como, por exemplo, a criação de novos espaços de convivência como

os shopping centers e os condomínios.

O homem se afasta cada vez mais da experiência urbana, como colocado por

Ângelo Serpa (2007), quando afirma que “caminhamos para a consagração do

individualismo como modo de vida ideal, em detrimento de um coletivo cada vez mais

decadente” (p.35). Apesar de concluir que o cerne da esfera pública não está reduzido ao

suporte físico oferecido pelos espaços urbanos, o autor coloca que os próprios usuários

erguem barreiras simbólicas, resultando em um espaço fragmentado pelos interesses dos

diversos grupos que ali frequentam, substituindo o compartilhamento do espaço pela divisão

e territorialização. Por sua vez, isso vem a restringir a acessibilidade que é a essência da

definição de espaço público. Segundo Eugênio Queiroga (2009), o espaço público é aquele

em que ocorre a construção da cidadania, do interesse público, e do bem público constituído

socialmente diante do conflito de interesses individuais ou de grupos. Logo, é o local onde

vários interesses atuam, um conjunto de necessidades se faz presente.

De forma mais prática e fisicamente evidente, Sun Alex (2011) argumenta sobre a

incorporação de modelos diretamente absorvidos de outras realidades sociais – como, por

exemplo, aspectos estéticos e funcionais do paisagismo moderno norte-americano nas

praças de São Paulo. Segundo o autor, “nem sempre resultaram em espaços mais

convidativos ou adaptáveis à presença da população [...] têm-se revelado fechadas para o

entorno e o convívio pretendidos” (p.17).

A partir dos estudos desenvolvidos pelo grupo de pesquisa Espaços

Contemporâneos do Habitat (do qual a presente autora faz parte), pôde-se constatar a

necessidade de investigação dos espaços públicos e suas apropriações na cidade de Natal.

Através da pesquisa denominada “Os sistemas de espaços livres públicos e a urbanidade –

um diagnóstico da situação dos espaços livres na cidade de Natal”, foi levantada a situação

de aproximadamente 500 espaços livres distribuídos por quinze bairros da cidade de Natal.

Destes, cerca de 45% são de livre acesso público, como praças, becos, largos, canteiros e

outros tipos de suporte aos sistemas de mobilidade urbana, orla marítima, lagoa de

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 13

captação, entre outros. Porém, reduz-se a 30% do total a quantidade de equipamentos em

que há permanência e desenvolvimento de atividades de lazer – praças, por exemplo -

quando excluídos aqueles espaços livres de uso específico ou dedicados a um só propósito

(canteiros, rotatórias, cemitérios, escadarias). A distribuição destes espaços se dá de forma

irregular pela cidade de Natal, o que significa que, enquanto alguns distritos da cidade

possuem vários equipamentos públicos de lazer – ainda que sua qualidade não seja

garantida, como, por exemplo, no bairro de Lagoa Nova - existem áreas que sofrem com a

insuficiência de espaços público, como o bairro de Nossa Sra. da Apresentação, na região

administrativa Norte.

A apropriação desses espaços pode ocorrer de variadas “formas, tipos,

temporalidades, escalas, pode ser lícita ou ilícita, positiva ou negativa, intensa ou episódica”

(Silvio Macedo et al, 2009, p.65). Essa multiplicidade de interesses que agem em um

espaço público indica a necessidade de uma multifuncionalidade do suporte físico para

agregar diferentes atividades e diversas possibilidades para aquele local. Ian Bentley et al.

(1985) coloca a “variedade” como uma qualidade chave em um espaço público. Esta

variedade pode ser de pessoas, que vêm ao espaço em variados momentos por variadas

razões. Pode ser também diversidade de formas e ocupações das construções ao redor do

espaço público. Porém, os autores enfatizam que o alicerce da multiplicidade no espaço

público é a diversidade de usos.

Como resposta a esta problemática, trabalha-se aqui sob a ótica da

multifuncionalidade, tanto como forma de retomar o uso dos espaços públicos ao convidar

vários atores à ocupação e apropriação, quanto como espaço de democracia onde a

adaptação e a flexibilidade permitem que esta diversidade de apropriações tome forma sem

restringir o espaço do outro. Este pensamento foi desenvolvido com base em referências

bibliográficas que colocam a multifuncionalidade como uma qualidade chave rumo à

espaços públicos bem sucedidos, mas principalmente, teve base naqueles conceitos de

espaço públicos em que a democracia e a acessibilidade são o cerne do significado.

De posse destas informações, resolveu-se desenvolver um trabalho final de

graduação que discutisse o tema tendo como foco um dos bairros de Natal: Ponta Negra.

Mais precisamente, decidiu-se por uma proposta a nível de anteprojeto de um espaço

público de acessibilidade generalizada e de caráter multifuncional, que poderia vir a

compensar a falta de espaços públicos de permanência em uma área carente do bairro – a

Vila de Ponta Negra, em uma tentativa de conciliar os diversos interesses. O objetivo

principal deste trabalho é o de elaborar um anteprojeto urbano de um espaço público que

tenha como elementos norteadores a multifuncionalidade e a flexibilidade, incentivando a

apropriação desses espaços por diversos atores e de diversas formas. Logo, o objeto de

estudo é uma amostra de espaços livres públicos de Natal e suas apropriações.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 14

O presente trabalho tem como objetivos específicos os seguintes: contribuir com a

reflexão sobre as condições dos espaços públicos de uso coletivo encontrados na cidade de

Natal; compreender e valorizar a tradição local para que possa haver rebatimento dos

hábitos da comunidade no projeto urbano; ressaltar a importância das questões de

multifuncionalidade, adaptabilidade e flexibilidade em um espaço público de uso coletivo; e

estimular a apropriação dos espaços públicos através do desenvolvimento de uma proposta

adaptável aos diferentes tipos de usos apresentados pela população local e que responda

aos desejos dos seus usuários.

Este tipo de intervenção urbana foi planejado para uma categoria específica de

espaços livres. De acordo com Magnoli (2006), nas áreas urbanas, os espaços livres

compreendem todo espaço não ocupado ou coberto por volume edificado, diretamente

associado ao entorno das edificações. Eles podem desempenhar funções de lazer, de

âmbito de relações sociais, de drenagem, de regulação climática, entre outros,

representando elementos estruturadores da cidade. Podem ser públicos, como as praças e

orlas marítimas, ou privados, como quintais e lotes de uso institucional, sendo o foco deste

trabalho nos espaços livres públicos.

Através da pesquisa citada, estima-se que cerca de 15% dos espaços livres

públicos encontram-se em situação de inércia, sem investimentos para fins de estruturação,

parados no tempo, representando um desperdício de potencial para uso coletivo, sendo

geradores de insegurança para os habitantes das adjacências. Esta tipologia de espaço livre

público constitui rica base para o tipo de intervenção proposta: denomina-se como área

verde não-acondicionada. Entende-se por áreas verdes não acondicionadas os lotes com

uma estruturação básica, porém insuficiente, como o passeio em seu perímetro, ou como a

presença de vegetação - ainda que esta seja relativamente controlada, o que a diferencia de

terrenos baldios.

Ainda assim, são áreas sem condições de uso, pois não possuem mobiliário

urbano, nem acessibilidade. Muitas vezes estas áreas apresentam utilização ocasional pelos

habitantes, notada através de vestígios comportamentais como a trilhas abertas pela própria

população, e a deposição feita pela colocação de barreiras (como os pneus) para garantir

uma delimitação física de seu perímetro, o que denota um suposto cuidado pelos moradores

do entorno. Ainda que haja um ordenamento mínimo, estes espaços não possuem uma

estruturação cristalizada e restritiva como alguns dos espaços públicos já estabelecidos –

por exemplo as praças objeto de estudo de Sun Alex - oferecendo a oportunidade para uma

estruturação flexível.

Uma área com essas características foi escolhida para servir como suporte físico ao

projeto urbano proposto neste trabalho, e esta se localiza na Vila de Ponta Negra. Apesar de

estar localizada em um bairro que congrega as atividades turísticas de Natal, que recebe

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 15

investimentos de capital nacional e estrangeiro, é uma área singular, e se diferencia do seu

entorno tanto pelo seu traçado orgânico e informal, quanto ao manter a tradição de uma

parcela dos moradores que vivem da pesca e do artesanato. A vila é um local com carência

de oferta de espaços públicos de modo geral, em que estima-se que a maioria de seus

residentes apresentam uma baixa renda, e têm histórico de movimentos sociais urbanos. De

acordo com KELLER apud SERPA:

[...] nossas relações de vizinhança são condicionadas de uma forma determinante pela densidade populacional do local que habitamos, pelo nível econômico e pelo grau de cooperação de seus habitantes, bem como pela distância entre as unidades de habitação (KELLER apud SERPA, 2007, p.35).

Ainda sobre as relações de vizinhança, o autor coloca que “nos bairros populares, a

limitação de oportunidades, a pobreza e o isolamento relativos, a insegurança e o medo

acabam por fortalecê-las e torna-las parte fundamental da trama de relações familiares”, o

que vem a reforçar a escolha do universo de estudo como uma área em que a população

sobreviva com baixos rendimentos, mas que possui uma alta coesão social. Além disso, a

Vila de Ponta Negra também expressa sua rica atividade cultural através de eventos como

ensaios de grupos folclóricos, rodas de capoeira, e feiras gastronômicas e de artesanato, o

que ajuda a sustentar o discurso da necessidade de multifuncionalidade no espaço público,

pregado neste trabalho.

A inquietação de trabalhar com os espaços públicos - em teoria acessíveis a todos -

provém do conhecimento das inúmeras possibilidades para estes, seja aqueles espaços

utilizados por uma comunidade que mora nas redondezas, seja aquele espaço que atrai

pessoas de outras regiões da cidade. Em bibliografia utilizada durante intercâmbio

universitário, a autora do presente trabalho teve acesso à produção de Andre Viljoen,

Continuous Productive Urban Landscapes (2005), livro cujo autor aponta o importante

caráter multifuncional para estes espaços, com possibilidades como a agricultura urbana, o

transporte ativo, o comércio, o lazer, a interação social, entre outros. A flexibilidade e

adaptabilidade são características da sociedade contemporânea globalizada, com toda a

sua fluidez e conectividade. Este fato faz com que busque-se um suporte físico que não seja

rígido, cristalizado, mas que tenha a capacidade de aceitar e acomodar novos usos. Dentre

esses novos usos põe-se em destaque aqui os eventos itinerantes, como o Pluk de Nacht

em Amsterdam, e o Ecopraça em Natal.

Percebeu-se que estes não só alteram a dinâmica de uso dos espaços públicos,

mas também garantem esta flexibilidade no uso do espaço, por se tratar de estruturas

desmontáveis, e temporárias. Propor espaços flexíveis para que estas manifestações se

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 16

instalem da maneira mais eficaz possível se torna um objetivo deste trabalho, um

experimento na longa jornada de entendimento dos fenômenos atuais desse organismo tão

complexo e imprevisível chamado cidade.

O primeiro capítulo deste trabalho se destina à discussão e esclarecimento de

conceitos como o de espaço - desde o geográfico até o público – onde se realizou uma

diferenciação entre as funções que os espaços públicos podem ter e as apropriações que de

fato acontecem. No mesmo capítulo, encontra-se também uma breve explanação sobre o

significado de multifuncionalidade e alguns termos com semelhanças de definição

(adaptabilidade e flexibilidade, por exemplo), além de explorar no discurso de vários

diferentes autores a necessidade de flexibilidade e multifuncionalidade nos espaços

públicos. De forma a complementar o suporte teórico criado, demonstra-se de forma sucinta

as características da cidade contemporânea, incluindo a relação da sociedade com o

espaço público, em uma tentativa de aproximação da atualidade. Por último, têm-se a

definição de algumas variáveis de análise da qualidade do espaço público, colocadas pela

instituição internacionalmente reconhecida Project for Public Spaces (PPS), e por Bentley et

al. (1985).

A segunda seção se dedica à exposição e explicação das etapas que foram

cumpridas para que o trabalho tomasse uma forma final. Com base na definição de área-de-

estudo e áreas-projeto (Ferdinando Rodrigues, 1986), analisou-se a área pelo ponto de vista

do suporte físico (considerando atributos físicos e perceptivos), dos vestígios ambientais da

ação humana (com base em Pinheiro, Elali e Fernandes, 2008) e na noção de percepção

ambiental dos moradores da área estudada, trazida pelo discurso de Kevin Lynch (1997).

Esta abordagem parte do pressuposto de que nenhuma metodologia é completa por si só, e

sim complementar à outras.

Uma vez formado o suporte teórico necessário e definidas as etapas a seguir, foi

impreterível buscar na realidade exemplos de espaços de uso múltiplo, compondo os

estudos de referência, que podem ser encontrados no capítulo 3, juntamente com uma

seção que discute os materiais e técnicas que remetem ao elemento norteador buscado: a

multifuncionalidade. Para tanto, foram buscados espaços que tivessem características de

parques, com espaços pouco ligados a uma função específica, buscando propor a seus

usuários experiências diversificadas, seja através da organização de eventos, seja através

de uma arquitetura que busque refletir a diversidade do entorno.

A criação de um referencial teórico e empírico permite a passagem para a próxima

etapa: as análises do local, que podem ser vistas no capítulo 4. Esta seção busca a análise

em diversas escalas, abrangendo desde os dados gerais (posição na cidade, população e

sua composição) sobre o bairro de Ponta Negra, a sua consolidação territorial fragmentada

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 17

pelo tempo demonstrada através do histórico, até a escala da área-de-estudo e da área-

projeto.

Em uma tentativa de integrar os diversos atores que formam a comunidade em

questão no feitio do projeto, o capítulo 5 demonstra o resultado dos diálogos realizados

através de entrevistas e conversas informais. A comunidade foi entrevistada com base em

variáveis de análise da percepção ambiental. Já as instituições (representadas pela

Companhia de Águas e Esgoto do Rio Grande do Norte, e pela Agência Reguladora de

Serviços de Saneamento Básico no Município de Natal, ambas ligadas à gestão de águas e

resíduos) foram envolvidas para que pudessem dar sua contribuição como parceiras e

apoiadoras do projeto, além da CAERN ter posse de alguns lotes na área-projeto.

O capítulo 6 se caracteriza como um resumo de tudo o que foi visto até então, com

conclusões e ênfase no que foi aproveitado do conteúdo exposto para posterior rebatimento

no projeto. Com base nestas conclusões, neste capítulo são expostos também o partido

adotado, as diretrizes de intervenção, e o programa de necessidades.

Por fim, o último capítulo se dedica à descrição da proposta, apresentando algumas

etapas do seu desenvolvimentos (as mais relevantes para que se mostre como se alcançou

o resultado final). Vale salientar que a sua leitura deve ser feita de modo conjunto com as

pranchas de projeto urbano, em anexo a este trabalho.

Ainda encontram-se, após estes itens, as conclusões acerca do trabalho realizado,

as referências bibliográficas e o apêndice A, contendo o roteiro de perguntas utilizado

durante as entrevistas aos moradores da comunidade.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 18

1 CONCEITOS E ABORDAGENS

Para que seja possível a compreensão não só do problema, mas do

desenvolvimento geral desta pesquisa, faz-se necessária a apresentação de determinados

conceitos. Embora alguns pareçam alvos de senso e entendimento comum, podem ser mais

complexos em sua definição.

1.1 O ESPAÇO, O LUGAR E O PÚBLICO

O conceito de espaço, por exemplo, apresenta uma dificuldade de definição. De

acordo com David Harvey (1980), citado por Mônica Schlee et al. (2009, p.43) as diferentes

práticas humanas estabelecem conceitos de espaço diversos. Por exemplo, Saquet e Silva

definem o espaço geográfico com base nas obras de Milton Santos como “um híbrido

composto de formas-conteúdos, formas-funções, objetos-ações, processos e resultados,

sendo o fenômeno técnico uma das principais condições históricas de transformação do

espaço, juntamente com outros processos econômicos, culturais e políticos” (2008, p.39). O

filósofo francês Henri Lefebvre (1976), citado por Rhalf Braga (2004), enfatiza as diferenças

entre o espaço percebido (do corpo e da experiência corpórea), o espaço concebido (ou

espaço do poder dominante), e o espaço vivido (que une experiência e cultura, espaço de

representação). Desta maneira, a explicação do que vem a ser espaço varia, não só

tecnicamente, a depender de que contexto se enxergue, mas também com a relação pessoa

x espaço.

Para entender essa relação, é necessário saber o que difere um espaço de um

lugar. Andiara Lopes e Verônica Lima (2005) confrontam diferentes definições de lugar e

espaço em diferentes âmbitos (não só o da geografia ou o do urbanismo, mas também o da

filosofia, por exemplo), tendo como cerne os conceitos colocados por Tuan (1975). As

autoras, com base nos discursos estudados, atestam importantes características de um

lugar: aquele que é produto da experiência humana, dotado de valores, e que exige uma

relação temporal (vivência cotidiana das pessoas com o espaço, que o eleva a categoria de

lugar, como corroborado pela citação abaixo.

[...] o lugar aparece exatamente quando se definem as

particularidades desse espaço, que pouco a pouco vão se deixando perceber, trazendo-o para a dimensão do local, do reconhecível, à medida que o dotamos de valor e consequentemente de significado (LOPES E LIMA, 2005, p.4).

De acordo com Ana Fani Alessandrini Carlos (2007), um lugar possui identidade

que expressa sua relação com o entorno, com o cotidiano das pessoas, e com a história não

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 19

apenas local, mas mundial. As conclusões foram tiradas, como citado pela autora, a partir

das afirmações de Milton Santos (1995) de que existe um lugar visto “de fora” e um lugar

visto “de dentro”. Externamente, o lugar seria o resultado das transformações históricas

sobre ele, e internamente como o diálogo entre esse espaço e o usuário.

Um espaço pode ser visto isoladamente, enquanto o lugar só pode ser

reconhecido como tal pelo seu contexto. Por esses fatores é de vital importância fazer a

análise de espaços de acordo com seus contextos histórico e de suas imediações. Lugares

são restritos. São espaços amplamente vivenciados pelos seres humanos. Deseja-se que

hajam características amplamente difundidas na concepção daquele espaço na mente dos

habitantes e visitantes de um lugar, pois ainda que as relações pessoais de uso, interesse

ou conhecimento tornem cada lugar único para cada ser humano, há de existir um conceito

base para aquele espaço, a fim de que se torne um lugar de fato, e também para mostrar

que ele tem seus limites, e a partir de outra área se caracteriza diferentemente.

Ferdinando Rodrigues (1986) discursa sobre o espaço urbano, colocando-o como

“o espaço do confronto de interesses, do processo histórico da definição dos direitos do

indivíduo e da coletividade, permanentemente escrito e reescrito na arquitetura da cidade”

(p.14). Mais especificamente, tratamos neste trabalho dos espaços públicos, parte

estruturante do espaço urbano, e que se apoia na sua definição mais simples apresentada

por Carla Narciso (2013) como,

aquele espaço que, dentro do território urbano tradicional (especialmente nas cidades capitalistas, onde a presença do privado é predominante), sendo de senso comum e de posse colectiva, pertence ao poder público.

Ângelo Serpa (2007) compartilha com Jordi Borja (2003) e Hannah Arendt (2001) a

noção de que o espaço público denota o próprio mundo ou a cidade em si. Porém, este

primeiro refere-se também ao conceito de espaço público como sendo o espaço da ação

política. Já Arendt coloca o espaço público como resultado da ação humana, ou seja, das

relações sociais desencadeadas pelos indivíduos que o compõe, aproximando-se neste

ponto da definição de lugar.

O espaço público significa o próprio mundo, na medida em que é comum a todos nós e diferente do lugar que nos cabe dentro dele. Este mundo, contudo, não é idêntico à terra ou à natureza como espaço limitado para o movimento dos homens e condição geral da vida orgânica. Antes, tem a ver com o artefato humano, com o produto de mãos humanas, com os negócios realizados entre os que, juntos, habitam o mundo feito pelo homem (ARENDT apud LIMA, 2014, p.144).

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 20

Queiroga (2009) considera os espaços públicos como aqueles em que se verificam

ações da esfera pública, que envolvem a produção cultural, a construção da cidadania, do

interesse público, e do bem público constituído socialmente diante do conflito de interesses

individuais ou de grupos.

Para Antônio Lopes (1999), os espaços públicos consistem em “lugares de vida e

de sociabilização, e que, uma vez abertos a todos, representam áreas de liberdade e de

democracia”. A acessibilidade presente no discurso de Lopes é corroborada por Fátima

Matos (2010), que coloca a facilidade de acesso como função primeira que distingue o

espaço público do privado. Matos adiciona a dimensão da visibilidade como fator que pode

aumentar o caráter público do espaço, por diferenciá-lo do espaço da privacidade (que

frequentemente coincide com o privado).

Com base em todos os conceitos estudados, adotamos neste trabalho a premissa

de que, seja o espaço público destinado à ação política ou à produção cultural, o mesmo

tem intrínseca relação em seu significado com a coletividade e com o âmbito social,

fragmentando-se em tipos de acordo com a função que desempenha na cidade, como será

visto nas próximas seções.

Os espaços públicos fazem parte também do grupo de espaços livres, que são

definidos,

no contexto da estrutura urbana, como áreas parcialmente edificadas com nula ou mínima proporção de elementos construídos e/ou vegetação - avenidas, ruas, passeios, vielas, pátios, largos, etc – ou com presença efetiva de vegetação – parques, praças, jardins, etc – com funções primordiais de circulação, recreação, composição paisagística e de equilíbrio ambiental, além de tornarem viável a distribuição e execução dos serviços públicos, em geral. [...] São ainda denominados espaços livres, áreas incluídas na malha urbana ocupadas por maciços arbóreos cultivados, representados pelos quintais residenciais, como também pelas atuais áreas de condomínio fechado; áreas remanescentes de ecossistemas primitivos – matas, manguezais, lagoas, restingas, etc – além de praias fluviais e marítimas (CARNEIRO E MESQUITA, 2000,p.24).

Como exposto no discurso de Ana Rita Carneiro Liana Mesquita (2000), os espaços

livres podem ser empregados na circulação, na percepção da paisagem e dos volumes

edificados, como artifício para a interiorização do ar e da luz nas edificações, na

estruturação da morfologia urbana, na proteção de recursos naturais e culturais, ou ainda,

serem destinados para práticas recreativas. As funções que podem cumprir os espaços

livres, sejam eles públicos ou privados, serão exploradas na seção seguinte.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 21

1.2 FUNÇÕES NO ESPAÇO URBANO

São apresentas aqui diversas maneiras de categorização do espaço urbano

(público e privado, com evidente ênfase no primeiro) e de suas funções ou modos de

apropriação, visto que, segundo Rodrigues (1986, p.31), “qualquer modelo de classificação

de atividades poderá ser útil na reflexão sobre a flexibilidade de projetos de espaços de uso

coletivo e público em relação à multiplicidade de atividades no meio urbano”.

Existem autores que categorizam os espaços públicos simplesmente como locais

de circulação ou como locais de permanência e socialização. Este é o caso de Lamas

(2004) e de Matos (2010). Esta última categoriza os espaços públicos em espaços de

permanência – cuja função é definida por ações e comportamentos como brincar,

descansar, jogar – e circuitos – aqueles cuja função é a de promover a mobilidade de

pessoas ou veículos, como vias e calçadas. Em sua descrição dos elementos morfológicos

do espaço urbano, Lamas transita por diferentes escalas e perspectivas, mas de forma

semelhante a Matos, elege a rua e a praça para representar os espaços públicos, afirmando

que esta última “reúne a ênfase do desenho urbano como espaço colectivo de significação

importante” (p.102). O autor caracteriza a praça como o “lugar intencional do encontro, da

permanência, dos acontecimentos, de práticas sociais, de manifestações de vida urbana e

comunitária e de prestígio, e, consequentemente, de funções estruturantes” (Lamas, 2004,

p.102). Por sua vez, a rua ganha a definição de espaço de circulação, enquanto os largos e

terreiros seriam “vazios ou alargamentos da estrutura urbana e que com o tempo foram

apropriados e usados” (LAMAS, 2004, p.102).

Carneiro e Mesquita (2000) adicionam uma categoria à esta classificação: os

espaços de equilíbrio ambiental. Estes são predominantemente vegetados e cumprem “a

função de elevar a qualidade ambiental e visual das cidades, ajudando a melhorar as

condições higiênicas e de saúde pública” (p.26).

Os espaços que podem cumprir com esta atribuição podem ser as reservas

ecológicas, e as unidades de conservação, que geralmente são porções territoriais

generosas – o que não exclui, contudo, que pequenas glebas venham a contribuir para este

propósito. Estas mesmas autoras esclarecem um importante conceito no que diz respeito a

outra conhecida função que os espaços públicos podem assumir: o espaço de lazer.

Segundo Dumazedier (1976) apud Carneiro e Mesquita (2000, p.26), “lazer vem do latim

‘licere’, que quer dizer ser permitido, isto é, ser lícito escolher a maneira de aproveitar a

condição de tempo livre”. Deste modo, o significado de lazer – comumente confundido ou

tomado como sinônimo de recreação – é mais abrangente, englobando em seu significado

três categorias: a própria recreação, o descanso e o desenvolvimento da participação social.

De forma mais específica, as autoras expõem características de alguns espaços públicos,

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 22

ressaltando, entre outros aspectos, a função que desempenham, como pode ser visto de

forma compilada na tabela a seguir.

Tabela 1 - Definição funcional de alguns espaços livres públicos

Espaço livre Definição funcional

Unidade de

conservação

“estabelecer a continuidade com os demais conjuntos residuais do antigo

ecossistema através de corredores de proteção de vias rápidas, de

estabilização biológica de taludes e proteção de linhas d’água”

Campi universitários São espaços livres públicos vegetados e contendo edificações de caráter

educativo, incluindo mobiliário recreativo e áreas de contemplação.

Faixa de praia Pode conter equipamentos de esportes ou de lazer contemplativo

Parques

Função predominantemente de recreação composto pela paisagem natural

e edificações, destinadas a atividades recreativas, culturais e/ou

administrativas.

Praças Função de convívio social, inseridos na malha urbana como elemento

organizador da circulação e de amenização pública.

Pátios

Definidos a partir de elemento arquitetônico expressivo, exercem a função

de respiradouros, de propiciadores do encontro social e eventualmente

destinados a atividades lúdicas temporárias.

Largos “[...] com o fim de valorizar ou complementar alguma edificação como

mercado público, podendo ser destinados a atividades lúdicas temporárias”

Jardins

Espaços livres públicos de contemplação, contendo cobertura vegetal

representativa com a finalidade de melhoria climática, ambiental e de

valorização da paisagem.

Quadras polivalentes Espaços livres destinados à prática de jogos [...] quase sempre dispondo de

área circundante para o encontro e o estar.

Fonte: Editado de Carneiro e Mesquita (2000)

Já Macedo et al. (2011) agrupa de forma diferente os espaços livres de acordo com

a sua função, enquadrando-os em três tipos-padrão: de circulação, convívio, lazer e

recreação; de preservação ou conservação ambiental; e espaços livres relacionados a usos

específicos. Esta primeira categoria se compõe de calçadas, ruas, parques, praças, entre

outros, enquanto a segunda são dunas, mangues, vales, orlas, e restingas, por exemplo. Já

no último tipo de espaços livres públicos definido pelos autores, tem-se os espaços

dedicados às redes de infraestrutura, cemitérios, entre outros. Os próprios autores enfatizam

a importância de se ver estes espaços enquanto sistema, quando afirmam que “a

localização, a acessibilidade e a distribuição dos ELs constituem um complexo de conexões

com múltiplos papéis urbanos” (Macedo et al., 2011, p.3). São estes “ [...] atividades do ócio,

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 23

circulação urbana, conforto, conservação e requalificação ambiental, drenagem urbana,

imaginário e memória urbana, lazer e recreação, dentre outros” (Macedo et al, 2009, p.5).

De maneira geral, na cidade de Natal, pôde-se notar que os espaços livres sofrem

ainda com uma falta de atenção e de critérios que regulem a sua ocupação e utilização,

permanecendo à mercê da especulação imobiliária, atendendo mais aos interesses privados

do que aos públicos. Isto é dito porque, dos 507 espaços livres estudados na pesquisa

citada no início deste trabalho, 45% são lotes não construídos, e 5% foram ocupados por

empreendimentos residenciais em um curto espaço de tempo de 4 anos.

1.3 APROPRIAÇÕES E SEUS MODOS

Na seção anterior, apresentamos as funções que os espaços públicos podem

desempenhar na cidade. Porém, faz-se necessário conhecer as apropriações que

acontecem nesse espaço, pois de acordo com Eneida Mendonça (2007) - calcada nos

discursos de Nishikawa (1984) e Santos e Vogel (1985) – as apropriações são eventos

cotidianos que devem ser reconhecidos e utilizados para compreender a resposta do

usuário à utilização de um espaço “formalmente constituídos para finalidade específica”

(p.298). Esta resposta é colocada por Santos e Vogel (1985) apud Mendonça como uma

indicação de criatividade ou uma reação aos padrões formais impostos pelos planejadores

urbanos, servindo como uma espécie de mecanismo de defesa.

Nishikawa (1984) considera as apropriações como eventos cotidianos relacionados à própria vida urbana e devem ser reconhecidas, entre outros aspectos, como reveladoras de necessidade de reestruturações físicas, de modo a permitir a flexibilidade no uso do espaço (MENDONÇA, 2007, p.297).

O ato de apropriar-se trata de um processo complexo “que pode ser coletivo ou não,

que se relaciona com poder e papéis sociais, envolvimento e afetividade com o espaço”, de

acordo com Verônica Lima (2014, p.111). Brackeleire apud LIMA (2014, p.111) aponta que

apropriar-se é definir uma área como sendo própria, enquanto Tuan (1983) aproxima o

sentido de apropriar-se ao sentido de lugar, envolvendo um investimento temporal, afetivo e

de valores. De acordo com Cintia Liberalino (baseada em Enric Pol, 1996):

Apropriamo-nos da cidade quando nos identificamos com ela, e a partir desta relação de identidade com o ambiente urbano, passamos a dar sentido de lugar ao que antes era apenas local, e assim, podemos atuar neste ambiente atribuindo uma nova imagem, ou seja, personalizando o espaço (LIBERALINO, 2007, p.42).

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 24

Daremos foco aqui nos diversos tipos de apropriação, descrevendo-os e

contemplando várias categorizações.

Silvio Macedo et al (2009) cita que “[...] a apropriação se reveste de variadas

formas, tipos, temporalidades, escalas, pode ser lícita ou ilícita, positiva ou negativa, intensa

ou episódica, depende de uma série de fatores que vão desde a atuação do poder público

até a topofilia1”. Através de um organograma contendo as formas de apropriação e

potenciais de uso, os mesmo autores mostram alguns dos usufrutos do espaço, tanto

público quanto privado (figura 1).

Figura 1 – Formas de apropriação e potenciais de uso

Fonte: Macedo et al., 2009

1 Topofilia é definida por Tuan (1980, p.106) como “o elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou

ambiente físico”.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 25

Jan Gehl (1996) categoriza as atividades que podem ocorrer no espaço público nos

seguintes grupos: atividades necessárias, atividades opcionais e atividades sociais. Embora

categorizadas, possuem intensa influência no acontecimento umas das outras. O autor

coloca que o primeiro grupo de atividades se compõe de ações cotidianas, como ir para a

escola ou ao trabalho, comprar, aguardar transportes ou pessoas. Logo, a necessidade de

realização sobrepõe a influência do ambiente físico no seu acontecimento, além de

ocorrerem regularmente, desligadas de aspectos que condicionam a sua ocorrência. Já as

atividades opcionais são aquelas em que os participantes escolhem realizar, se as

condições forem próprias (principalmente as climáticas). Incluem o ato de caminhar, relaxar,

tomar banho de sol. Dependem, portanto, do clima (condição principal pelo próprio autor) e

do suporte físico do local onde são propostas. As atividades sociais dependem da presença

de outras pessoas, como brincar com outros, conversar, cumprimentar. Ocorrem de forma

espontânea, como resultado da atratividade dos outros dois tipos de atividades citadas.

Logo, não depende diretamente da qualidade do suporte físico, mas é influenciado por este.

O caráter destas atividades vai variar de acordo com a escala de abrangência do espaço

público: comunidades com ruas residenciais perto de escolas verão seus vizinhos com mais

frequência e possuem mais conhecimento do outro; em ruas no centro da cidade, por outro

lado, a atividade social se dá de forma mais superficial e se verá mais rostos

desconhecidos. Um dos pontos mais mencionado pelo autor, que realizou suas pesquisas

com uma abordagem de estudos de comportamento em vários espaços públicos da

Dinamarca, é que pessoas atraem pessoas, logo, os indivíduos irão onde outros estiverem.

Dando específica atenção à apropriação por parte da população de baixo poder

aquisitivo – característica da área em estudo neste trabalho - LIMA (2014) coloca que

A falta de espaço em suas edificações e de lugares voltados ao lazer dessa população faz com que ela se aproprie das áreas públicas, quer seja para divertir-se ou como extensão das suas casas para desempenhar afazeres domésticos; quer seja, como local de trabalho informal; ou ainda como acréscimos nas suas residências, através da apropriação indevida da área de uso comum (LIMA, 2014, p.149).

A autora também apresenta outro aspecto das apropriações do espaço público

mais voltado para a ocorrência de intervenções urbanas episódicas aqui representadas

pelas festividades.

Outra particularidade do nosso país ocorre em momentos festivos como Carnaval e o São João. Nessas ocasiões, em algumas metrópoles do Brasil, as Ruas e praças são tomadas por um grande número de pessoas de classes sociais diversas que se apropriam do espaço público para festejar e confraternizar-se, e expressar-se como cidadãos, de forma distinta do que ocorre no cotidiano (LIMA, 2014, p.151).

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 26

Deseja-se também nesta seção realizar uma diferenciação entre tipos específicos de

apropriação, no que diz respeito a usos contínuos versus usos sazonais, e ocupação ativa

versus ocupação passiva, que acredita-se que sejam conceitos diretamente relacionados.

De acordo com Stephen Carr et al (1992) no artigo “Needs in Public Space”, duas

necessidades apontadas são: a ocupação passiva e a ocupação ativa. A primeira não

envolve um engajamento físico, é mais relacionada à observação do que a expressão verbal

ou a atividades. Exemplos desta são: a observação de pessoas, a apreciação de artistas,

eventos culturais, esportivos. Pode ser ainda sazonal, dependente de terceiros, dado que se

realiza esporadicamente, ou pode ser contínua, quando o espaço público oferece uma

atraente paisagem, atributos físicos diferenciados, obras de arte, fazendo com que as

pessoas visitem de forma mais frequente. Entretanto, os autores discursam sobre a falta de

interesse que possa surgir se não houver incentivo à ocupação ativa. Já esta última

representa uma experiência mais direta com o lugar e com as pessoas nele. Atividades

como a prática de esportes, a interação com elementos naturais (como poder brincar com

barquinhos em uma fonte) e a manipulação de elementos (como uma escultura que pode

ser mudada conforme os seus usuários desejem), são ações que incentivam um uso mais

dinâmico. De acordo com os autores, este tipo de ocupação incentivaria mais o uso

contínuo, à medida que faria os usuários irem por conta própria participar e ocupar espaços

públicos, ao invés de depender de terceiros.

1.4 MULTIFUNCIONALIDADE COMO UMA NECESSIDADE

Nesta seção, é explicitada a necessidade por multifuncionalidade nos espaços

públicos entoada pelo discurso de diversos autores. Porém, antes de tudo, necessita-se

explicar o próprio conceito de multifuncionalidade ou polivalência, e outros significados

intrínsecos a este.

De acordo com o Dicionário Aurélio, multifuncional significa “aquilo que tem, ou

realiza, diversas funções”. Margarida Esteves (2013) relaciona a multifuncionalidade à

flexibilidade, mobilidade, adaptabilidade, citando uma gama de autores para o melhor

entendimento destes conceitos e suas relações (figura 2).

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 27

Figura 2 - Compilação dos conceitos de flexibilidade e adaptabilidade

Fonte: Esteves, 2013

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 28

A autora inicia e apura sua investigação no conceito de flexibilidade, que embora

seja simplesmente definido como a capacidade de ser transformado, também sugere a ideia

de liberdade, e aborda várias definições como a mobilidade, a evolução, entre outros. A

mobilidade e evolução, representam, respectivamente, uma rápida modificação dos

espaços, e a modificação do espaço a longo prazo, acompanhando transformações sociais.

O mais importante destes conceitos é trabalhado por Steven Groak (1992 apud ESTEVES)

que coloca que a adaptabilidade corresponde à “capacidade de responder a diferentes usos

sociais”. Esta descrição encaminha para a relação apontada por Herman Hertzberger (1991

apud ESTEVES, 2013) da inerente afinidade entre adaptabilidade e polivalência – diferentes

usos sociais – do qual a autora faz uso, ao final, para efeitos da construção do seu próprio

trabalho.

A adaptabilidade é uma característica da flexibilidade, tal como a

mobilidade, a elasticidade e a evolução, sendo que estas últimas requerem mudanças físicas no espaço, enquanto a adaptabilidade se relaciona com a polivalência e multifuncionalidade de usos, sem haver arranjos físicos. (ESTEVES, 2013, p.45)

De acordo com Bentley et al. (1985), Robustness é tida como uma característica do

espaço público que pode ser relacionada à multifuncionalidade, ou até mesmo a sua

adaptabilidade à novas situações e usos. Essa qualidade pode ser considerada desde a

escala do ambiente até às áreas externas, passando pela própria edificação. Os autores

relacionam todas as escalas apresentadas, apontando, por exemplo, como o conteúdo e a

fachada de prédios podem promover ou abalar a frequência de uso de um espaço público.

Lugares que podem ser utilizados para diferentes propósitos oferecem a seus usuários mais possibilidade de escolha do que locais cujo desenho os limita a uma única forma fixa de utilização (BENTLEY et al., 1985, p.56, tradução nossa)

Reforçando a necessidade por espaços multifuncionais, Pedro Brandão (2002)

citado por Inês Fernandes (2012), enfatiza que importantes critérios para espaços públicos

são a diversidade e adaptabilidade, afirmando que um espaço público deve estar preparado

para dar lugar a diversas e variadas atividades, adaptável a futuros usos ou usufrutos não

planejados.

A apropriação dos espaços livres pelo público no cotidiano está diretamente relacionada com a qualificação e gestão destes mesmos espaços. De um lado, o quanto se permite ou se possibilita a diversidade de usos, em função da não especialização destes espaços. De outro lado, a necessidade de espaços especializados que possam ser utilizados, de modo simultâneo ou alternado, por diversas faixas etárias e grupos sociais (MACEDO et al., 2009, p.63)

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 29

Do mesmo modo, Lopes (1999) critica a grande quantidade de espaços

cristalizados2 em Portugal, que não atendem às necessidades reais da comunidade,

resultado da falta de conhecimento das necessidades do cidadão quando do feitio do

projeto, atestando que

É preciso ter a coragem de redesenhar os espaços públicos urbanos destinados aos cidadãos, de descongelar muitos deles, insípidos e desajustados em pelo menos 20 ou 30 anos, de diferenciar os públicos e aceitar a diversidade das práticas, recreativas ou não, tolerando as diferentes perspectivas dos utilizadores do espaço citadino (LOPES, 1999).

O PPS também coloca a possibilidade de escolha de atividades como um ideal, ao

qual nomeia Power of ten. Sua descrição é dada pelos próprios autores da seguinte

maneira:

O cerne do Power of 10 é a ideia de que todo lugar excelente precisa oferecer pelo menos 10 coisas para fazer ou 10 razões para estar lá. Estas podem incluir: um lugar para sentar, locais de recreação, arte para ser tocada, música para ouvir, alimentos para comer, história para experimentar, e pessoas para conhecer. O ideal é que algumas destas atividades sejam peculiares daquele determinado local e que sejam interessantes o suficiente para manter as pessoas retornando ao local. (PPS, tradução nossa)

De forma mais específica, Matos (2010, p.21) coloca que o mobiliário urbano dos espaços

devem ser dimensionados e equipados de forma a apoiar as atividades a que se destinam

“devendo ser, cada vez mais, multifuncionais e concebidos de forma a poderem ser

readaptados a novos usos imprevistos, mas polivalentes”.

1.5 O (ESPAÇO) PÚBLICO NA CIDADE CONTEMPORÂNEA:

Afinal, como chegamos à atual situação de diminuição de uso dos espaços

públicos? O que acarretou isso? Quais são os novos espaços utilizados para recreação e

socialização, senão os espaços públicos como praças, parques, largos, entre outros? Para

Mark Gottdiener apud Yasminie Cerqueira (2013), a cidade contemporânea não apenas foi

ampliada, mas se transformou.

De acordo com Lima (2014), o processo de “internalização das atividades

comunitárias” se iniciou a partir da década de 70, impulsionado por diversos fatores. Um

deles é a busca pelo lucro, advinda do mercado imobiliário que vem a propor novos espaços

na urbe: ambientes segregados como condomínios e shopping centers, ambientes com a

2 O autor utiliza-se da palavra “cristalizado” para fazer referência àquilo que não tem

mudança, permanece no mesmo estado ou situação.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 30

promessa de conforto e segurança, mas que ferem o âmago do conceito do espaço público

– a acessibilidade generalizada e irrestrita. A autora atribui esse processo ainda à mudança

no paradigma de planejamento dos espaços livres públicos - que partiram de

intencionalmente planejados para a situação de áreas remanescentes do ambiente

construído – aliada à incorporação de princípios modernistas que “romperam com a maneira

tradicional de organizar as áreas livres brasileiras e passaram a estruturar as cidades, de

forma a ocasionar a delimitação imprecisa do espaço público por paredes de edifícios”

(LIMA, 2014, p.148).

Uma problemática presente no discurso de Lima e enfatizada por Cerqueira (2011)

é a exacerbada afinidade na relação, na cidade contemporânea, entre lazer e consumismo.

Essa prática é causa e consequência da criação desses espaços segregados e de

acessibilidade controlada, e não atinge só a eles, mas também ao espaço público em si, que

passa a ser fragmentado em pequenos espaços da mercantilização. Este é um dos pontos

explorados por Cerqueira – inspirada pela fala de Zygmunt Bauman – que conclui que “não

há como falar em espaço público na contemporaneidade sem mencionar a influência do

consumo nessa dinâmica” (CERQUEIRA, 2013, p.86). Sob esta perspectiva, a autora coloca

que, a partir do momento em que o espaço público é associado à atividade comercial, este

espaço se torna excludente e a acessibilidade universal (seja ela física, visual, ou simbólica)

passa a ser desconsiderada. Filtra-se e direciona-se os usuários deste local, abalando a

diversidade, e quanto a isto, a autora discursa que “o consumo representa um problema

para o espaço público urbano quando impõe barreiras ao convívio da diversidade,

pluralidade, o que fere a construção social desses espaços” (CERQUEIRA, 2013, p.87).

Desta forma, “o consumo passou a ditar projetos e formas no espaço e o lazer passou a

integrar o rol do consumo” (CERQUEIRA, 2013, p.89).

Outra questão levantada pela mesma autora, mas de conhecimento geral trata da

sensação de insegurança, causada pela violência urbana também presente no discurso de

Lima. Esta última atribui à violência urbana o fato das pessoas procurarem cada vez mais o

convívio em locais fechados, confortáveis e que passem a impressão de segurança.

Cerqueira coloca que “a criminalidade real e a sensação de insegurança enfraquecem as

relações sociais e espelham esse enfraquecimento na relação das pessoas com os

ambientes, tendo consequência direta na percepção da qualidade de vida [...]”

CERQUEIRA, 2013, p.96). A modificação dessas relações sociais advindas da sensação de

insegurança é capaz de modificar também o uso de determinado espaço, pois, de acordo

com a autora, para ser visto como inseguro, um local não precisa que tenham acontecidos

episódios de violência urbana realmente, mas somente o fato de passar esta impressão –

uma rua mal iluminada e deserta, por exemplo – pode causar o seu esvaziamento.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 31

Ainda no âmbito da modificação das relações sociais, enfatiza-se a informatização

e a incorporação da tecnologia ao modo de vida atual. Para Castells (apud Cerqueira, 2013),

o modo informacional é o que marca o modo de desenvolvimento do mundo

contemporâneo, e Cerqueira (2013, p.83) explana que “a incorporação da tecnologia ao

modo de vida urbano é uma realidade inegável, assim como sua influência no espaço, e

também nas transformações sociais e culturais”. Apesar disso, Carlos sugere que esta

modificação no estilo de vida do cidadão não anula o espaço, mas “impõe uma nova

perspectiva” para pensá-lo. Essas novas exigências geracionais – sendo um delas a

informatização do modo de vida atual – aliadas às “novas e crescentes necessidades da

população urbana, associada a mutações de ordem demográfica [...] repercute-se na

utilização e em novas procuras dos espaços públicos” (Matos, 2010, p.20). Apesar destes

fenômenos que vêm ocorrendo há pelo menos quatro décadas, LIMA (2014, p.149) afirma

que “pode-se ainda encontrar, principalmente nas áreas de concentração de população de

baixo poder aquisitivo, intensa vida nas ruas”.

1.6 COMO AVALIAR O ESPAÇO? (METODOLOGIAS E SEUS COMPONENTES)

Ao partir das definições apresentadas até o momento, apreende-se que o espaço é

formado por atributos físicos e ações sociais. Faz-se necessário entender os critérios para a

leitura e compreensão dos espaços públicos urbanos de forma mais nítida, para que esses

critérios possam ser citados de forma mais sucinta na metodologia, segundo capítulo deste

trabalho. Fernandes (2012), em sua tese “Requalificação do Espaço Público Urbano”, faz

um apanhado sobre os critérios de avaliação da qualidade do espaço público, de acordo

com diversos autores.

Um deles é a instituição Project for Public Spaces (PPS), que considera quatro

qualidades essenciais para o sucesso de um espaço: acessibilidade (espaço público de fácil

acesso e circulação, facilmente visto de todos os pontos, de fora pra dentro e de dentro pra

fora); possibilidade de realizar atividades (um espaço vazio não atrairá as pessoas); conforto

e imagem do espaço (não só segurança e limpeza, como também disponibilidade de lugares

para sentar); e possibilidade de socialização (diz respeito aos hábitos sociais, estado de

espírito, cautela com o local dos usuários presentes).

Bentley et al (1985) são autores do livro Responsive Environments, uma espécie de

manual para designers que define sete qualidades de um espaço – e demonstra aplicações

de cada um para todas as escalas, desde o ambiente até a cidade, passando pela

edificação e pelo espaço público. Estas são:

permeabilidade, vista como a capacidade da forma físico-espacial permitir a

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 32

integração e acessibilidade;

variedade, que diz respeito à gama de diferentes utilizações que um espaço

disponibiliza aos seus usuários;

legibilidade, como uma forma de facilidade de compreensão do espaço;

robustez como a capacidade de responder bem a diferentes usos;

riqueza, referindo-se à capacidade de escolha do usuário à diferentes

experiências sensoriais;

adequação visual, que diz respeito à um aspecto visual do lugar que

desperte no usuário a consciência acerca das escolhas disponíveis;

personalização, referente à medida em que as pessoas podem colocar sua

própria marca no local.

Os dois discursos demonstram similaridades entre as variáveis de análise

colocadas, mas vale salientar que o foco neste trabalho será na variável robustez (colocada

por Bentley et al.) e na possibilidade de realizar atividades (introduzida pelo PPS), apesar

dos outros critérios serem incorporados em segundo plano na análise do local de estudo.

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O objetivo principal deste trabalho é de elaborar projeto urbano de um espaço

público que tenha como elementos norteadores a multifuncionalidade e a flexibilidade,

incentivando a apropriação desses espaços por diversos atores e de diversas formas,

concebido com base na problemática apresentada na contextualização. Vicente Del Rio

(1990) afirma que apesar de existirem várias teorias e metodologias para o desenho urbano,

nenhuma delas apresenta-se de forma completa e suficiente por si própria, sendo todas

complementares. O mesmo posicionamento é adotado neste trabalho, e a seguir serão

explicados os caminhos de análise rumo ao produto final.

A escolha de um terreno se fez necessária para o feitio do projeto urbano que se

almeja, e foi feita com base na insuficiência de espaços públicos de permanência - entende-

se por estes os espaços públicos onde se desenvolvem atividades culturais, de lazer,

excetuando-se aquelas onde a função principal é de passagem ou de suporte ao sistema

viário, como canteiros e rotatórias. Além disso, buscou-se áreas com rica atividade cultural,

para que fosse valorizada a sua tradição através da proposição de um espaço de expressão.

Rodrigues (1986) define duas áreas quando do feitio de um projeto urbano: a área-

de-estudo e a área-projeto. A última diz respeito ao terreno que de fato irá ser estudado com

mais detalhes, enquanto a primeira abrange uma área com raio de 300 a 500 metros em

relação ao centro de gravidade física e funcional da área – considera-se o centro neste

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 33

estudo como a área-projeto. Sob esta óptica, será trabalhada a área-de-estudo com base

nos seguintes quesitos colocados pelo autor:

Uso do solo – De acordo com o próprio Rodrigues (1986, p.21), como

urbanista “cabe-nos identificar essas atividades, valorizando-as através da

reorganização ou previsão de seus variados “espaços-função” [...] com a

necessária flexibilidade de composição dos espaços coletivos e públicos”.

População – em termos de dimensão, composição (aspectos de gênero,

faixa etária, e poder aquisitivo da população habitante da região).

Além destes, as análises na área-de-estudo incluíram a busca pelo o histórico da

Vila de Ponta Negra, pois de acordo com Philippe Panerai (2006), “o estudo do crescimento

permite determinar aquelas lógicas inscritas profundamente no território que esclarecem as

razões de ser do assentamento atual”. Não sendo este o tema principal buscado neste

trabalho, a busca pela evolução histórica e territorial é breve e sucinta, tendo o objetivo de

evidenciar os locais de resistência ou mudança, identificando indícios da cultura local. Com o

intuito de compreender a relação entre os âmbitos público-privado, circulação-permanência,

relação entre cheios e vazios, a representação gráfica de figura-fundo é utilizada em vários

momentos.

As variáveis de análise colocadas pela instituição Project for Public Spaces (PPS) e

por Bentley et al. (1985) ajudaram a direcionar o olhar para o estudo da área-projeto, em que

foi dada mais atenção aos seguintes fatores de análise:

Possibilidade de chegada ao local, indicando as principais rotas dos meios de

transporte mais comuns na localidade, além das possíveis barreiras encontradas

para se chegar ao local;

Localização de estacionamentos e paradas de ônibus nas adjacências;

Acessibilidade também visual, percebendo as diferentes maneiras de se ver a área-

projeto;

Croquis do espaço, considerando ventilação e posicionamento do sol em relação ao

terreno.

De forma complementar, buscou-se compreender o comportamento apresentado

naquele local, ao apropriar-se de conceitos da psicologia ambiental que dizem respeito aos

vestígios ambientais da ação humana. Estes são “objeto de pesquisas que buscam

compreender a ocupação e uso de um local (cômodo, lote ou setor urbano) e inferir algumas

das relações pessoa-ambiente ali existentes...” (Pinheiro, Elali, e Fernandes, 2008, p.77). De

acordo com os autores, a técnica é de simples aplicação, não exigindo a utilização de

instrumentos sofisticados, e nem a sistematização de horários de observação. Ao invés

disso, enfatiza a importância do saber ver os resíduos e vestígios comportamentais no

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 34

ambiente, implicando em um conhecimento contextual (sociocultural) básico para interpretar

o que pode vir a significar os achados.

Os vestígios ambientais de comportamento são divididos em duas categorias: deposição (ou acumulação) e erosão [...] A deposição acontece quando algo é acrescentado ao ambiente, como no caso de grafito, lixo e latrinália [...] A erosão ocorre quando algo é retirado do ambiente, como no exemplo de caminhos informais criados pelos usuários em áreas cobertas por vegetação, indicados pelo seu desgaste ou ausência...” (Pinheiro, Elali, e Fernandes, 2008, p.80)

Sendo assim, as duas categorias de vestígios comportamentais citadas serão

observadas na área de estudo, a fim de obter um entendimento de como as pessoas se

utilizam (com maior ou menor intensidade) do espaço público estudado.

A análise técnica do espaço muitas vezes não é suficiente para se depreender as

reais necessidades da comunidade residente. Neste ponto, cabe enfatizar que “vai depender

em aprendermos a escutar as pessoas não-profissionais, compreender o que querem, como

eles vêem, e como realmente colaborar com eles...” (APPLEYARD apud DEL RIO, 1990).

Logo, o fato de se comunicar e envolver a população que mora ou utiliza aquele

equipamento urbano e seu entorno é essencial. Para tanto, baseou-se na metodologia

proposta por Kevin Lynch (1997), que utiliza-se da entrevista e da construção de mapas

mentais como instrumentos de pesquisa para compreender a imagem da cidade. O autor

buscava evidenciar os pontos mais expressivos da cidade ou da localidade em estudo

(estivessem os respondentes cientes disto ou não), o significado de determinados locais, e

evocava as experiências sensoriais dos respondentes. O roteiro construído a partir desta

metodologia pode ser visto no apêndice A.

Para complementar o aporte teórico criado, foi necessário buscar conhecimento em

experiências empíricas, inseridas em um contexto complexo, aqui expostas através dos

estudos de referência. Visto que busca-se aqui o projeto de um espaço público

multifuncional, estes estudos passeiam pelas mais diversas escalas, averiguando o

elemento multiplicidade (ou a sua falta) como elemento central de análise. De maneira geral,

buscou-se analisar os seguintes critérios:

Localização, levando em consideração o contexto local onde o espaço público está

inserido, além das condições climáticas, um importante definidor de que tipo de

atividades ali se desenvolverão;

A autoria do projeto e uma noção da época desde a qual o espaço público está em

funcionamento e apto para uso público;

O partido arquitetônico e paisagístico;

Uma descrição geral dos espaços e usos;

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 35

Breve descrição de cores, texturas, visuais, buscando analisar aspectos como a

permeabilidade e acessibilidade (física, visual, simbólica) quando as informações

forem existentes.

3 ESTUDANDO ESPAÇOS MULTIFUNCIONAIS

3.1 PARQUE DISCOVERY GREEN

O Discovery Green é um parque localizado no centro de Houston, no Texas, nos

Estados Unidos (figura 3). Situado na Avenida de Las Americas, é cercado por

empreendimentos culturais e de serviço, como o Centro de Convenções George R. Brown e

o Hilton Americas Hotel, além do Toyota Center. Oficialmente aberto ao público no dia 13 de

abril de 2008, possui uma área de 47.700 m2. O projeto do parque foi liderado pela firma de

paisagismo Hargreaves Associates, com a participação da filial de Houston do escritório de

arquitetura Page Southerland Page e da paisagista local Lauren Griffith.

Figura 3 – Localização da cidade de Houston nos Estados Unidos

Fonte: http://www.world-guides.com/north-america/usa/texas/houston/houston_maps.html

Desde a década de 1990 até os dias atuais, os gestores de Houston buscam

maneiras de desenvolver a cidade, encontrando a solução em parcerias de investimento

público/privado a fim de revitalizar o centro da cidade, prática adotada também por cidades

como Pittsburgh, Orlando e Baltimore. Mais ou menos 70% das quadras do centro de

Houston foram reconstruídas, fornecendo aos usuários uma área com novas vistas e mais

qualidade ao lugar. Foi investido muito em infraestrutura, renovação de prédios, e expansão

do sistema de transportes. Aliado ao planejamento do parque, pensou-se na mobilidade não

só do centro onde está localizado, como também da cidade, integrando esta fração do

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 36

centro de Houston à todo o tecido urbano através do uso de VLT. Dois eixos foram criados –

um Norte-Sul e outro Leste-Oeste, conectando todos os equipamentos na área, e

aproximadamente 4 bilhões de dólares foram investidos em prédios no entorno – novo

edifício residencial com 345 apartamentos, torres empresariais e um possível hotel são

exemplos destes novos investimentos.

Uma das mudanças propostas partia da premissa de que o centro da cidade, área

predominantemente comercial, deve ser também um local para se morar, revitalizando o

tecido urbano com múltiplos usos. Antes da inserção do parque, vários dos equipamentos

de entretenimento do centro de Houston (ver figura 4) eram isolados entre si, cercados por

estacionamentos que atendiam aos três grandes equipamentos do entorno - o Centro de

Convenções George Brown, e as arenas de esportes Toyota Center e Minute Maid Park -

todos somente utilizados durante grandes eventos, o que gerava uma utilização episódica e

não cotidiana na área. O parque começara a ser planejado em 2004 na gestão do prefeito

William White, que junto a líderes cívicos garantiu o terreno a ser utilizado. Enquanto

arrecadavam investimentos públicos e privados, os gestores responsáveis pelo parque

buscaram referências pelo país de parques ativos e bem sucedidos, além de contatar a

entidade sem fins lucrativos PPS (Project for Public Spaces), que organizou workshops com

a comunidade para gerar um programa de necessidades de espaços e atividades. É

importante salientar que a participação da comunidade no processo de planejamento se deu

de forma contínua, durante o decorrer de todo o projeto.

Figura 4 – Mudanças provocadas pela inserção do Parque Discovery Green em um centro urbano ocioso

Fonte: http://www.archdaily.com/147437/discovery-green-hargreaves-associates/

Quanto às condições climáticas no local, sabe-se que o tempo em Houston é

instável, por causa de sua localização geográfica, em uma planície com poucos obstáculos

naturais contra ventos e massas de ar. No verão as temperaturas podem superar os 35 °C

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 37

(julho), já no inverno as temperaturas caem em média para 12 °C sendo que a mínima

atinge os 7°C (janeiro). Ocorre precipitação o ano inteiro, com mais frequência no verão do

que no inverno. Isto garante a mudança de caráter de usos do parque, que no inverno tem

atividades como a patinação no gelo no Kinder Lake, área identificada pelo número 5 no

leiaute geral do parque (figura 5).

Figura 5 – Leiaute geral do Parque Discovery Green

Fonte: http://www.discoverygreen.com/discovery-green-park-map

O partido paisagístico do parque parte da interseção entre dois passeios principais

(um deles já existente antes da implantação do equipamento urbano), com a distribuição das

edificações, gerando um equilíbrio entre o construído e não construído. Pode-se ver

algumas formas orgânicas, ainda que a ortogonalidade prevaleça. Já o seu partido

arquitetônico consiste em edificações horizontais com estrutura em metal, fechamentos em

vidro, e despida de ornamentos, uma arquitetura clean, cuja ornamentação fica por conta do

paisagismo. Estas abrigam usos como o restaurante The Grove, a lanchonete The Lake

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 38

House – no qual os dois, apesar de serem edificações destinadas ao serviço de

alimentação, servem pratos mais simples ou mais complexos, atraindo diferentes públicos –

além de uma filial da biblioteca pública de Houston, com salas de leitura e internet WiFi.

Quanto ao território livre de edificações, têm-se grandes gramados destinados aos

mais diversos tipos de uso, sendo um deles um gramado para piquenique, o Sarofim Picnic

Lawn. O lago de 4000 m², o Kinder Lake, é utilizado tanto durante o verão, quanto durante o

inverno. Estes espaços foram posicionados nas proximidades de palcos ou locais com a

possibilidade de montagem destes, de modo a facilitar a realização de eventos itinerantes,

como shows, feiras, concertos. Além disso, por todo o parque foram inseridas diversas

esculturas de caráter não só contemplativo, mas interativo. A Gateway Fountain – superfície

de granito levemente inclinada de onde jorram jatos d’água - e a Mist Tree – fonte de aço

inoxidável que brinca com névoa e água - (figura 6) são exemplo destas, que provocam

outras sensações no usuário, como o alívio do calor e a sensação de umidade.

Figura 6 – Gateway Fountain e Mist Tree representando o lazer contemplativo e sensorial

Fonte: http://www.archdaily.com/147437/discovery-green-hargreaves-associates/

Além disso, o local contém playground infantil, pistas de corrida (para pessoas e

para competições entre cães), além de diversas esculturas feitas por vários artistas

diferentes, utilizando de cores e materiais distintos, como pode ser visto na figura 7.

Figura 7 – Obras dos artistas Margo Sawyer e Doug Hollis, respectivamente

Fonte: http://www.archdaily.com/147437/discovery-green-hargreaves-associates/

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 39

O parque propõe uma forma diferente de vivenciar os espaços públicos pois nos

apresenta aspectos de atividade plena e pulsante. São espaços bem distribuídos e

permeáveis, com diversos eventos realizados pela direção do parque desde campeonatos

de video games até shows e aulas de ginástica. E nisso se dá sua forma, trabalhando cada

metro quadrado com ambientes ao ar livre e onde tudo se relaciona (figura 8), conectados

por todos os sentidos do corpo humano, diversificando a experiência de um lugar como o

Discovery Green. Do principal passeio, o Andrea and Bill White Promenade, tem-se uma

visão completa de todo os espaços adjacentes e de seus mobiliários urbanos, garantindo a

permeabilidade visual que convida o usuário a se apropriar destes espaços. A

permeabilidade e acessibilidade físicas ficam por conta das diversas possibilidades de

acesso, tanto por carro (com estacionamentos subterrâneos), quanto por transporte público

(linhas de VLT criadas para dar acesso e revitalizar a área), sugerindo também uma

acessibilidade universal relacionada à permeabilidade simbólica de que não existem

barreiras à utilização por pessoas de qualquer classe social, gênero ou raça.

Figura 8 – Permeabilidade e conectividade visual entre as partes do parque

Fonte: http://www.pps.org/projects/houstonpark

As texturas apresentadas pelo parque tem um aspecto singular de descoberta e

excitação devido à variedade presente em todos os aspectos, desde os revestimentos até o

mobiliário urbano, como pôde ser visto pelas figuras. Em todos os ângulos do projeto, os

materiais nos convidam a experimentar sempre um pouco mais, trabalhando sentidos que

estamos desacostumados a sentir. No geral, o projeto tem uma gama de cores bem vasta (a

ser representada tanto pelos elementos artificiais quanto pelos jardins com espécies

variadas formando variadas composições) e sempre o verde se faz presente como plano de

fundo cênico arquitetônico e paisagístico. A identidade urbanística do local foi formada a

partir de referências a símbolos locais, sejam pessoas que influenciaram a área, ou árvores

típicas da região. Isto é dito porque ao dar nome aos passeios e espaços do parque, foram

escolhidas referências significativas para a população, além de um dos principais passeios

do parque serem margeados por carvalhos centenários que foram preservados durante o

desenvolvimento do projeto. Soma-se a isto a já citada participação popular durante o

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 40

processo projetual, o que fez com que o espaço de fato tivesse características desejadas

pela população.

3.2 PARQUE SUPERKILEN

O Superkilen localiza-se em Copenhagen, na Dinamarca, ocupando uma área de

aproximadamente 30.000 m², e está em funcionamento desde o ano de 2012. O projeto

surgiu de uma parceria entre os escritórios Topotek 1, BIG, e Superflex, trabalhando em

conjunto nas diversas escalas (estruturação urbana, paisagismo e artes) para a prefeitura de

Copenhagen. O parque está inserido em um contexto de busca pelo destaque do distrito de

Nørrebro, uma área de imigrantes, portanto diversificada etnicamente, e onde se encontram

vários desafios sociais. O distrito passou por um processo de reestruturação na década de

1970, quando ocorreu a abertura de diversos espaços para grandes áreas verdes e foram

construídos apartamentos maiores e novos blocos residenciais. A intenção principal do

projeto foi de refletir no parque a diversidade da população que se utiliza daquele local,

intenção esta que é mais obviamente revelada pela presença de vários objetos de arte

vindos de diferentes locais (mais de 50 nacionalidades), como que para criar a noção de

globalidade.

O Superkilen é um parque que apoia a diversidade. É uma exposição mundial de mobiliário e objetos cotidianos de toda parte do mundo, incluindo bancos, postes, lixeiras e plantas – requisitos que todo parque contemporâneo deveria incluir e que os futuros usuários do parque ajudaram a escolher. (Archdaily, 2012, tradução nossa)

A cidade de Copenhagen possui um clima considerado “temperado marítimo”,

caracterizado por variação considerável de temperatura, e de direção e velocidade dos

ventos, cujas temperaturas mais baixas ocorrem no mês de Janeiro (média de 2ºC), e as

mais altas, em agosto – máximas de 20ºC. A incidência solar possui níveis relativamente

baixos, o que permitiu a não utilização de vegetação de grande porte para sombreamento,

garantindo certa permeabilidade visual.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 41

Figura 9 – Leiaute geral do Parque Superkilen

Fonte: http://www.archdaily.com/286223/superkilen-topotek-1-big-architects-superflex/

Figura 10 – Vista do Parque Superkilen

Fonte: http://tinyurl.com/lhq5ytb

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 42

O projeto inicia no encontro entre a Rua Nørrebroruten, e tem uma extensão de

aproximadamente 500 metros, dividido pelas ruas em três espaços: a Red Square, o Black

Market, e o Green Park, finalizando-se na rua Tagensvej (figura 9). Deste modo, permite

cortar caminho para acessar três grandes vias, e especial atenção foi dada ao modo como

se chega a este espaço público, levando em consideração os aspectos culturais locais: as

ciclovias foram reorganizadas para criar uma melhor rede de acessos, além da criação de

conexões entre as vizinhanças, juntamente à possível criação de uma linha de ônibus,

necessidade citada pelos usuários do bairro quando em entrevista. Estas modificações

fazem parte de um plano maior de tráfego, que incluem também a colocação de sinais e de

barreiras físicas redutoras de velocidade – como as lombadas, por exemplo.

De maneira geral, a relação entre cheios e vazios no parque pende mais para este

último, quando se nota poucas edificações, e mais superfícies livres, com pontuais

elementos artísticos e mobiliários urbanos representativos de diferentes nacionalidades. O

partido paisagístico do parque parte da horizontalidade e extensão, devido também às

condições morfológicas dos terrenos de intervenção, utilizando-se das cores – de forma

natural, explorando o verde da vegetação, ou de forma artificial, através da superfície

multicolorida da Red Square. A vegetação está inserida em espaços definidos e delimitados,

como cortes no pavimento cinza, como pode ser visto na figura 11.

Figura 11 – Inserção da vegetação no Parque Superkilen

Fonte: http://www.archdaily.com/286223/superkilen-topotek-1-big-architects-superflex/

O parque pode ser visto como um “jardim mundial”, devido à característica dos

jardins de transferir o sentimento de uma paisagem distante, como as ruínas gregas, os

jardins ingleses, ou as pedras japonesas, de modo que isto foi incorporado ao projeto

através da criação das visuais presentes na figura 12.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 43

Figura 12 – Criação de novas topografias e elevações

Fonte: http://tinyurl.com/lhq5ytb

A diversidade e multiplicidade de uso são vistas neste projeto, expressas através

dos diferentes espaços e suas diversas plásticas. Na Red Square, os autores do projeto

optaram por fazer uma praça aberta para ser utilizada em situação de eventos culturais

itinerantes, como concertos, feiras, utilizando-se de um piso liso em paginação em tons

vibrantes de vermelho e rosa. No Black Market, foram criadas ondulações no terreno (que

também podem ser vistas na figura 12), remetendo a um espaço mais lúdico e destinado a

pratica de atividades físicas e esportes, como skate, patins, onde o plano de fundo é

formado pela cor escura com linhas contínuas brancas. Já o Green Park é mais voltado para

a prática de corridas, caminhadas, passeios com animais, instigando o contato com a

natureza, com uma escolha de materiais mais simples, representadas por uma paginação

de piso mais neutra, deixando com que a vegetação se sobressaia. Apesar disto, trata-se de

espaços planos e de maneira geral, livres de obstáculos tanto à acessibilidade física,

quando à visualização dos caminhos, ocasionando uma boa legibilidade. Vale salientar que

os diferentes revestimentos e cores adotados para cada uma das áreas, assim como a

disposição do mobiliário e esculturas não definem o que será realizado em cada local - há

uma negação da visão “contemplativa” do espaço, onde só resta sentar e olhar: ao invés

disso, busca-se oferecer múltiplas formas de apropriação e relação com o mundo urbano.

Adiciona-se que o mobiliário urbano diferenciado (figura 13) convida a diversos usos.

Figura 13 – Mobiliário urbano diferenciado e diversos tipos de apropriação

Fonte:http://www.archdaily.com/286223/superkilen-topotek-1-big-architects-superflex/

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 44

3.3 DIMENSÕES DA MULTIFUNCIONALIDADE E DA APROPRIAÇÃO DO LUGAR

Nesta seção, trabalha-se sob a perspectiva da robustez, definida por Bentley et al

(1985) como a capacidade de responder bem a diferentes usos, onde o enfoque dado tem

relação com os elementos - construídos e naturais – e a forma como são utilizados,

permitindo mais ou menos modos de apropriações.

Como foi visto nas seções anteriores, um dos componentes da essência do espaço

público é a acessibilidade, seja ela física, visual ou simbólica. Logo, relacionando as duas

variáveis, podem-se deduzir alguns princípios que reduzem ou incrementam as

possibilidades de apropriação de um local. De acordo com o Manual de Procedimentos para

Intervenções em Praças (chamado aqui de MPIP, do ano de 2002), de autoria da Prefeitura

do Recife, o próprio ato de cercar o espaço público pode vir a dar a sensação de

aprisionamento ou de acessibilidade restrita, ainda que a intenção seja a de proteção.

É preciso evitar que grades e cercas afastem o usuário do espaço público ao dificultar-lhe o acesso. Do mesmo modo como se evitam batentes, mesmo baixinhos, em lojas de shoppings, pois podem funcionar, psicologicamente, como barreiras à entrada das pessoas, áreas gradeadas podem ter o mesmo efeito, ainda que, conscientemente, as pessoas não se deem conta disso (MPIP, 2002, p.42).

A existência de áreas em elevação, presentes também na citação acima, podem

funcionar como barreiras à apropriação. Em pesquisa realizada por Lucena e Medeiros

(2014) acerca da Praça André de Albuquerque, foram observados os modos de apropriação

em horários sistematizados, em dias típicos e atípicos, com relação ao suporte físico

oferecido (leiaute) e a legislação vigente na área. Percebeu-se que não havia utilização

alguma nos canteiros, que representam 42% do espaço total da praça, sendo elevados em

cerca de 15 cm do nível do passeio. Logo, a sua função puramente ecológica de evitar o

pisoteio sobre a vegetação pode ter sido intencional, porém a grande parcela do território

que ocupam estas áreas verdes acabam por reduzir as escolhas de atividades do usuário,

visto que muito do território restante constitui-se de espaço de passeio, sendo poucas áreas

abertas e sem obstáculos, como pode ser visto na figura 14. Porém, uma solução que

combina o elemento natural elevado e o ato de cercar o espaço público pode ser a cerca

viva, que na altura correta passa a fazer parte da paisagem, e ainda que componha uma

barreira física, pode permitir a permeabilidade visual, como pode ser visto na figura 15.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 45

Figura 14 – Planta zoneada das diferentes áreas da Praça André de Albuquerque

Fonte: Elaboração própria, 2014

Figura 15 – Recomendações de Neufert e Ludwig para alturas de cercas vivas

Fonte: Neufert e Ludwig, 1999

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 46

Um elemento que também pode influenciar bastante na permeabilidade visual é a

existência de edificações - ou elementos construídos de modo geral - que representem

obstáculos à visualização da área total do espaço público. Este foi um aprendizado advindo

dos estudos de referência realizados. Em ambos os parques, foi privilegiada uma

continuidade visual sem barre iras entre os extremos das áreas, seja a forma do espaço

público linear (parque Superkilen) ou retangular (Discovery Green). Em ambos os espaços,

as edificações ou elementos escultóricos tiram partido da horizontalidade e dos baixos

gabaritos, o que também contribui para que não se formem obstáculos à livre visualização

do território.

Vale salientar também a iluminação bem distribuída pela extensão dos parques

como um elemento que irá incentivar o uso daquele local para atividades no período da

noite – os estudos de referência demonstram eficácia na distribuição da iluminação pública,

como pode ser visto nas figuras 8 e 16. Este também foi um fator decisivo quando a

população usuária da Praça André de Albuquerque visitava o local: as zonas menos

utilizadas nesse turno foram aquelas cujos postes de iluminação pública estavam sem

funcionamento (Lucena e Medeiros, 2014). Sobre isto, MASCARÓ adiciona que,

a iluminação pública artificial tem uma importância fundamental para os espaços públicos. Sua inexistência ou insuficiência limita o uso desses espaços, dificultando a orientação e produzindo insegurança nas pessoas durante a noite (2005, p.196).

Figura 16 – Vista do parque Superkilen no período da noite com iluminação bem distribuída

Fonte: acervo pessoal de Maria Heloísa Alves, 2014

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 47

O tipo de pavimentação utilizada no espaço público também pode vir a interferir no

caráter multifuncional daquele espaço, visto que o MPIP (2002) coloca que um importante

critério de escolha do tipo de piso é “o uso ao qual se destinará cada uma das áreas

delimitadas pelo projeto [...] Assim, pisos excessivamente lisos, por exemplo, não se

adéquam a espaços destinados ao caminhar” (MPIP, 2002, p.48). O próprio manual coloca o

piso em pedra como um dos mais versáteis no sentido de poder ser aplicado em várias

áreas, como as de circulação intensa, ambientes de estar, ambientes onde se queira dar um

destaque decorativo, em pátios de eventos e em áreas que precisem de impermeabilização.

Apesar disto, destaca que não deva ser utilizado este tipo de piso em áreas de esportes, ou

em pistas de Cooper, ou ainda onde trafegam pessoas com mobilidade reduzida. Também o

piso em terra batida se destaca neste manual, não possuindo muitas restrições de

aplicação, exceto em calçadas ou em áreas que sofrem erosão e com baixa absorção de

água. Já Mascaró (2005), ao comentar sobre pavimentação de vias para pedestres, coloca o

pavimento de pedrisco como uma alternativa econômica, e este pode ser misturado com

cimento ou asfalto líquido para um melhor desempenho físico-mecânico, e a esta alternativa

podem ser adicionadas cores, conseguindo efeitos visuais variados. Quanto a este tipo de

revestimento, afirma que “pistas para atletismo ao ar livre geralmente são pavimentadas

com pedrisco, porque necessitam de certa flexibilidade [...] seu único inconveniente é

necessitar de manutenção permanente” (MASCARÓ, 2005, p.133). O autor também cita os

blocos articulados de concreto, enfatizando a sua boa aparência e resistência elevada,

existindo a possibilidade destes serem furados, com preenchimento em vegetação, evitando

a total impermeabilização do solo. Cabe salientar que no parque Superkilen, foram utilizadas

superfícies lisas, onde o efeito estético e de diferenciação de espaços fica a cargo das

pinturas, criando efeitos de cor e curvilíneos. Já no Discovery Green, uma grande parte do

território é coberta simplesmente por grama, pois faz parte do partido do local que o verde

componha o plano de fundo.

Foram apresentados os revestimentos fixos, permanentes temporalmente. Dado o

caráter multifuncional desta proposta, necessita-se conhecer também os revestimentos

modulares montáveis, como pisos plásticos ou decks de madeira modulares. Um destes é o

FlexDeck, piso desmontável com suporte de base plástica de alta resistência e madeira de

lei por cima, pronto para ser assentado em um contrapiso nivelado e drenado. O sistema

possui vários modelos, e conta com um sistema de encaixe que dispensa mão de obra

especializada para a instalação, sendo propício ao assentamento pela própria população. Já

o piso plástico modular pode ser aplicado como pallet, estrado ou piso, estando mais

protegido das intempéries do que o deck devido às propriedades dos materiais, permitir uma

maior gama de cores, além de ser guardado com mais facilidade por sua característica

flexível e dobrável, como pode ser visto na figura 17.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 48

Figura 17 – Pisos desmontáveis em madeira e plástico, respectivamente

Fonte: http://www.cobrire.com.br/deck-modular-de-madeira-mini-deck.htm

http://www.caixasplasticascuritiba.com.br/produto.php?cod_produto=2053243

Quanto ao mobiliário urbano, sabe-se que este pode ser feito em materiais como o

ferro, concreto, madeira, pedra natural, resina estruturada, entre outros, cada um com suas

recomendações e limitações. Porém, quando o enfoque se torna a multifuncionalidade, os

mobiliários contemporâneos tentam mixar funções, servindo a mais de um propósito com um

só elemento físico. O mobiliário urbano modular Enzo (figura 18), da MN*LS Creative

Consultancy é um exemplo desta situação: com uma geometria diferenciada, o Enzo é uma

evolução do Enzi, modelo anterior, melhorado quanto à resistência a danos e ao fogo, e

pode ser encontrado em vários modelos, cores e tamanhos. Trata-se de uma peça modular

que pode ser utilizada sozinha ou em conjunto, cuja menor peça pesa apenas 7kg,

apresentando facilidade de transporte.

Figura 18 – Enzo, mobiliário urbano criado para ser multifuncional e móvel

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 49

Fonte: http://www.enzis.at/portfolio/enzi/

Figura 19 – Strip Ease e Sinus, mobiliários urbanos de uso flexível

Fonte: http://www.designspotter.com/product/2010/07/Strip-Ease.html

http://dailydesignjoint.com/'Sinus'_urban_modular_element/11130

Além do Enzo, têm-se também o Strip Ease, e o Sinus, apresentado na figura 19.

Ambos são elementos metálicos com múltiplas funções, desempenhando o papel de banco,

de bicicletário, e que ainda permite a permeabilidade para o solo onde há vegetação. No

caso do Sinus, este tem uma característica de mudança conforma a estação: durante o

inverno, os pequenos furos em sua estrutura são cobertos por peças de silicone. Isto é feito

porque o metal tem a característica de incorporar a temperatura do entorno, e um banco

muito frio (ou muito quente) se torna desconfortável para seus usuários. Esta ação faz com

que o banco se adapte minimamente ao clima local.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 50

Por fim, como uma forma de concentrar os aprendizados obtidos a partir dos

estudos de referência, é apresentado um quadro resumo com as principais características

dos espaços estudados.

Tabela 2 – Quadro resumo dos estudos de referência

QUADRO RESUMO

ASPECTOS

OBSERVADOS

ESTUDOS DE REFERÊNCIA

DISCOVERY GREEN SUPERKILEN

LOCALIZAÇÃO Texas, Estados Unidos Copenhagen, Dinamarca

CONDIÇÕES

CLIMÁTICAS

Temperaturas entre 7ºC e 35ºC, com

estações bem definidas e precipitação o

ano inteiro.

Clima “temperado marítimo” com

temperaturas de 2ºC a 20ºC, com

incidência

ÁREA 47.700 m² 30.000 m²

OBJETIVO

Revitalizar o centro da cidade e utilizar

uma grande gleba ociosa em forma de

uma parceria público/privado, atraindo

novos investimentos.

Busca pelo destaque do distrito,

área de imigrantes com desafios

sociais. O objetivo foi de refletir a

diversidade da população do local.

AÇÕES EM

PARALELO

Resgate da conexão do centro da

cidade com as demais áreas através da

implantação de linhas de VLT em dois

eixos criados.

Reorganização das ciclovias e

criação de conexão entre as

vizinhanças através de uma nova

linha de ônibus

PARTIDO

PAISAGÍSTICO

Interseção entre os dois passeios

principais, sem concentração de corpo

edificado, gerando um equilíbrio entre o

natural e o construído. O plano de solo

é em sua maioria composto pela

vegetação.

Junção das artes, do urbanismo e do

paisagismo. Predomina a

horizontalidade , onde a cor e as

formas têm papel essencial. O verde

se insere em cortes no pavimento, ao

invés de plano de piso contínuo

PARTIDO

ARQUITETÔNICO

Edificações horizontais com estrutura

metálica e fechamento em vidro

Não houve a inserção de novas

edificações

USOS

Esportes, usos itinerantes (shows,

feiras), comercialização de alimentos,

educação ambiental, lazer

contemplativo e de permanência.

Atividades físicas e esportes, lazer

contemplativo e de permanência,

eventos culturais itinerantes.

OBSERVAÇÕES

GERAIS

Permeabilidade entre os espaços,

iluminação pública, baixa

impermeabilização do solo, densa

arborização, áreas polivalentes,

referência a símbolos locais.

Diversidade e uso de cores e

formas, alta impermeabilização do

solo, áreas polivalentes,

modificações na topografia,

mobiliário diferenciado.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 51

4 OBSERVANDO A REALIDADE LOCAL

4.1 O BAIRRO DE PONTA NEGRA

A área-de-estudo se localiza no bairro de Ponta Negra, região administrativa Sul de

Natal. O bairro limita-se a norte com o bairro de Capim Macio e Parque das Dunas, a Sul

com o município de Parnamirim, a Leste com o Oceano Atlântico, e a Oeste com o bairro de

Neópolis, possuindo ainda duas Zonas de Proteção Ambiental dentro de seu território (figura

20).

Figura 20 – Localização do bairro de Ponta Negra no município de Natal

Fonte: Elaboração própria, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 52

O bairro de Ponta Negra se apresenta atualmente como um atrativo turístico na

cidade, visto que a praia de mesmo nome é conhecida internacionalmente. Porém, este

bairro é complexo e diverso em sua constituição, pois abriga desde indivíduos com alto

poder aquisitivo, até famílias carentes vivendo em habitações como as favelas, além de

apresentar um traçado urbano diferenciado para cada área do bairro, consequência de uma

urbanização temporalmente fragmentada - como será apresentado na seção a seguir.

4.1.1 Histórico da área

Não se pode afirmar ao certo como se deu o início da ocupação do bairro de Ponta

Negra, embora seja certo que o núcleo dessa ocupação é a própria Vila de Ponta Negra, e

que é muito provável que quem tenha iniciado a ocupação dessa área tenham sido os

holandeses no século XVII. Ângelo Silva (2013) coloca três possibilidades, apesar de

apontar uma delas como a que tem mais aporte de evidências: a presença holandesa com o

intuito de ocupação e desenvolvimento da área; uma invasão militar dos holandeses

somente como uma tentativa de ataque à cidade (o autor aponta para a tese de Lois Martin

Garda como a autora deste discurso); ou o surgimento da Vila de Ponta Negra juntamente

com o nascimento da cidade de Natal, sem maiores explicações sobre o modo de ocupação,

hipótese esta colocada pela Tribuna do Norte após entrevista com os moradores mais

antigos. Esta primeira possibilidade é a mais aceita pelo autor pela quantidade de

evidências que reforçam a mesma, que não deixa de concordar com o fato de a vila ter sido

um dos primeiros núcleos habitacionais da cidade de Natal. Esta hipótese é corroborada

pelo antigo Instituto de Planejamento de Natal, e pelos documentos atuais da Prefeitura do

Natal, que coloca que “uma das primeiras referências históricas a Ponta Negra é a descrição

da ocupação holandesa, em 1633, na Cartografia do Rio Grande do Norte”. Em citação em

uma edição de 29 de agosto de 1999 da Tribuna do Norte (apud SILVA, 2013) também se

tem que “os holandeses também desembarcaram-na praia [...] Eles fizeram algumas

edificações em Ponta Negra, como o Preventório [...] Esse preventório viria a servir como

base durante a Primeira Guerra Mundial”.

Até a década de 1940, quando a ocupação da área realmente começou a tomar

forma, não há muitos indícios de adensamento na área (ver mapas de evolução da

ocupação territorial em Ponta Negra, figura 21).

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 53

Figura 21 – Mapas figura-fundo do crescimento do bairro de Ponta Negra

1920

1945

1978

1984

2006

2014

Fonte: Negreiros et al., 2014 com base em mapeamento do INPE

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 54

Há, porém, indicativos da construção de um fortim e de uma capela por volta de

1823, cuja intenção era a de impedir ataques inimigos. Outra importante mudança ocorreu

em 1923, quando houve a construção de uma estrada que ligava Ponta Negra a outras

áreas da cidade. Até o momento, essa população de aproximadamente 500 habitantes

originalmente vindos de outras cidades do Rio Grande do Norte (São José de Mipibu e Nísia

Floresta) sobrevivia da pesca, da renda e da agricultura de subsistência, levando a pé a sua

produção para ser vendida em Natal. Com a chegada da estrada, criou-se uma conexão

com o resto da cidade, e segundo Bruna Negreiros et al (2014), a criação da estrada (que

atualmente é conhecida como Rua Vereador Manoel Coringa de Lemos) “acelerou a

concentração dos imóveis ao redor da mesma”.

De acordo com documentos da Prefeitura de Natal, na década de 1940, “com a

influência norte-americana de banhos de mar, foram iniciadas construções de casas de

veraneio”, levando as famílias mais abastadas a verem a região de orla de Ponta Negra

como um local de lazer e entretenimento (figuras 22 e 23).

[...] a partir da construção das casas de veraneio, a Vila de Ponta Negra passou de espaço homogêneo a um local com características difusas, manifestas nas formas arquitetônicas, funções e distribuição de suas habitações, como também nas atividades de trabalho desencaixadas parcialmente da pesca, agricultura e pecuária” (SILVA, 2013, p.86).

Figura 22 - Orla da Praia de Ponta Negra na década de 1930

Fonte: UFRN, 2011

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 55

Figura 23 - Início da ocupação da orla por grandes casas de veraneio

Fonte: http://tinyurl.com/qe3w6vu

Silva (2013) coloca que em meados da década de 50, iniciam-se os conflitos por

causa do território que vinha sendo gradativamente ocupado. A falta de títulos de posse por

parte dos moradores da Vila põe em risco a estadia dos nativos, visto que uma influente

família envolvida com política se coloca como dona de grande parte do território da Vila de

Ponta Negra. Desta maneira, dois terços do território da Vila foram doados à Aeronáutica

para a construção da Barreira do Inferno. Isto afetou diretamente os – aproximadamente -

2000 moradores do local, que tinham como uma de suas atividades principais a agricultura,

e perderam as suas terras. Segundo Machado (1989) apud Silva (2006, p. 115):

Os moradores da Vila, dada a dificuldade de permaneceram auto-

suficientes, começaram a construir a construir barracas na orla marítima para vender peixes, caldos de peixes, água de coco, cervejas e comidas típicas. As mulheres, aproveitando o movimento das barracas, principalmente no período de férias, passavam a vender os seus trabalhos de rendas: toalhas de mesa, redes, guardanapos entre outros.

Já as décadas de 1970 e 1980 foram marcadas pela inserção de novos conjuntos

habitacionais – o Conjunto Ponta Negra em 1978; o Conjunto Alagamar, em 1979; o Natal

Sul em 1981; e o Serrambi em 1989 – de forma paralela ao crescimento da atividade

turística, como pode ser visto na figura 24. A nova forma de ocupação e o traçado regular

dos conjuntos inseridos vieram a fragmentar ainda mais o espaço do bairro de Ponta Negra,

dividindo-o e zoneando-o, como corroborado pelo discurso de Negreiros et al (2014, p.16),

quando afirmam que “com um traçado ortogonal e regular, os conjuntos habitacionais

simbolizavam a ascensão de Ponta Negra como um bairro privilegiado [...] contrastando

completamente com a tipologia da Vila”. Logo depois, Silva aponta as mudanças ocorridas

após a década de 1980.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 56

Após essa década, as características povoação, moradia, atividade pesqueira, e elaboração de renda (atividade artesanal das bordadeiras e rendeiras do local) foram sendo modificadas. Os atributos urbanos surgidos traduziram-se em um sistema de objetos imobiliários interligados funcionalmente, que contribuíram na redefinição das condições sociais distintas e percebidas, também, nas novas condições de trabalho e moradia local. (SILVA, 1980, p.78)

Figura 24 - Imagem aérea do Conjunto Ponta Negra na década de 1970

Fonte: http://tokdehistoria.wordpress.com

A permanência do bairro como ponto turístico, a construção da Via Costeira e o

adensamento na área levaram a mais mudanças, desta vez no caráter de uso do solo, que

passou a conter mais comércios e serviços (principalmente de hospedagem para atender ao

novo público que vinha de outras localidades). Isto passou a demandar uma maior atenção

à urbanização da área – pavimentação das ruas, sistema de energia elétrica, construção do

calçadão, entre outros. Negreiros et al (2014) afirma que a região possui atualmente cerca

de 10000 habitantes, apresentando uma taxa de crescimento elevado em relação a 1980,

quando tinha cerca de 2000 moradores. Os autores colocam que os conflitos pela terra

permanecem, e que o desenvolvimento urbanístico realizado – no qual em laudo pericial, a

Universidade Federal do Rio Grande do Norte e o próprio Silva atribuem à falta de legislação

- ameaça a tradição de uso e ocupação originais, enfatizando o embargo de várias obras

que tentam se estabelecer ali. É por esta falta de critérios legislativos que se luta atualmente

para a regulamentação da Área Especial de Interesse Social da Vila de Ponta Negra, em

busca do privilégio à coletividade, ao invés de beneficiar poucos que detém grandes glebas

à procura do lucro.

O resultado é então, como pode ser visto no laudo pericial da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte acerca da Zona de Proteção Ambiental 6: um bairro formado por

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 57

diferentes tipologias de tecido urbano, no qual a equipe representou em quatro setores

(figura 25). Um é definido pela própria vila, com uma configuração espacial orgânica,

consolidado a partir da década de 1940 e composto pelos pescadores, comerciantes,

trabalhadores informais. O segundo é resultado de um projeto de parcelamento do solo de

1960, feito primeiramente para ser residencial (casas de veraneio) e composto por classes

de média e alta renda, mas que com a evolução do turismo na área, muda seu caráter para

uso de serviço (majoritariamente de hospedagem). O terceiro setor é definido por uma

configuração ‘de natureza racional-funcionalista’ composta pelos conjuntos residenciais das

décadas de 1970 e 1980. Já o quarto setor apresentado se impulsionou a partir do ano 2000

e é marcado pela verticalização, estando distribuído em diferentes frações do bairro.

Figura 25 - Setores das tipologias de ocupação urbana no bairro de Ponta Negra

Fonte: UFRN, 2011

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 58

De acordo com Catarina Neverovsky (2005), no final da década de 1990 é definida

a Política Nacional de Turismo, através do Programa de Desenvolvimento do Nordeste. Este

programa visava a melhoria da infraestrutura em regiões com potencial turístico, e incluiu a

reforma e acessibilidade ao Aeroporto Augusto Severo e a construção de novos eixos

viários como, por exemplo, a Rota do Sol. No bairro de Ponta Negra em si, englobou obras

de pavimentação, saneamento, iluminação e construção do calçadão, obras finalizadas em

2000. Isto resultou no que a autora nomeia de “refuncionalização”, pois o caráter de uso da

área passou a ser de casas de veraneio para o desenvolvimento de edificações de uso

comercial, de serviço, e de notada vida noturna, como restaurantes e bares. Isto significou

também que esses investimentos “acabaram por intensificar uma corrente migratória, de

pequenos e médios empreendedores, e posteriormente de empreendedores internacionais

como redes hoteleiras, locadoras de carro, e outros” (NEVEROVSKY, 2005, p.29). Deste

modo, passam a vigorar “a intensa valorização do solo, a especulação imobiliária e os

investimentos estrangeiros”, segundo Camila Furukava (2009), que aponta a consequente

elevação do custo do metro quadrado na área, que em 2003 variava entre 800 e 1000 reais

“enquanto outras áreas estratégicas ao mercado imobiliário, como Petrópolis e Tirol,

apresentavam uma faixa de preço em torno de R$ 300,00 e R$ 500,00. De acordo

com a SINDUSCON, esse valor chegou, em 2006, à R$ 6.000,00” (FURUKAVA, 2009,

p.34). Outra consequência vista é a transformação da paisagem devido ao intenso processo

de verticalização e de ameaça de degradação de áreas ambientalmente frágeis, como o

cordão dunar e a orla marítima.

4.1.2 Dados gerais sobre o bairro de Ponta Negra

De acordo com o Anuário 2014 da Prefeitura do Natal, o bairro de Ponta Negra

possui uma área de 1382 hectares - sendo um dos maiores da cidade em extensão territorial

- onde residem aproximadamente 25 mil pessoas (com base no censo de 2010) resultando

em uma densidade habitacional de 18,12 habitantes/ha. Como visto pelo histórico descrito

na seção anterior, o bairro é feito de diferentes territórios que se estabeleceram em

diferentes momentos, vindo a se tornar unidade legislativa através da Lei nº 4.328, de 1993.

O bairro é composto, portanto, pela Vila de Ponta Negra, cerne de sua ocupação, além dos

conjuntos habitacionais Ponta Negra, Alagamar, entre outros. Ainda no Anuário 2014 da

cidade de Natal, consta que o bairro possui ao todo 35 loteamentos, dos quais 19 não estão

registrados em cartório, além de aglomerados subnormais, como a favela da Lagoinha, e a

do Pião.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 59

De acordo com dados de 2010 presentes no anuário 2013, 53,07% da população

residente no bairro é do sexo feminino, enquanto os homens representam 46.93% do total.

Na época, a faixa etária mais expressiva era dos 20 aos 39 anos, contemplando

aproximadamente 30% do total. Neste mesmo documento, é possível notar que o bairro é o

segundo colocado no que diz respeito à quantidade de imigrantes morando no local, a

maioria advindo da Europa e da América do Norte. Sabe-se que, de acordo com o Censo

Demográfico de 2000, aproximadamente 22% da população possuía um rendimento mensal

de 1 a 3 salários mínimos, embora as demais classes de rendimento possuam igualitária

distribuição, como pode ser visto na figura 26.

Figura 26 – Moradores por classe de rendimento

Fonte: Prefeitura de Natal

Apesar da atividade turística em Natal ter como polo concentrador a Praia de Ponta

Negra e o seu entorno, transformando o bairro, os dados com relação à infraestrutura básica

sugerem um descaso que gera negativas consequências ambientais: a rede de

esgotamento sanitário é insuficiente e incompleta para suportar a produção atual, pois

apenas 35% do bairro é saneado, fazendo com que muitos destes dejetos sejam lançados

diretamente no frágil ecossistema marinho. De acordo com dados da Prefeitura de Natal,

pôde-se notar que a produção de esgoto do bairro de Ponta Negra tem quantitativo similar à

de bairros como Nossa Senhora da Apresentação, na Zona Administrativa Norte, embora

sua população represente aproximadamente ¼ da população do bairro citado. A partir de

2006, foi notada e declarada a incapacidade da rede de esgotamento de suportar o

adensamento populacional (fixo ou rotatório, a exemplo dos turistas) da área, fazendo com

que se pensasse em estratégias para conter este adensamento, a exemplo do indeferimento

de licenças para novos empreendimentos.

Não só na produção de esgoto, mas na produção de lixo domiciliar, e no consumo

de água e energia o bairro se destaca pelos altos valores. A taxa de produção de lixo em

kg/habitante por dia chega a 35,82, dos quais estima-se que 97% é coletado pelo serviço

público de limpeza, enquanto aproximadamente 2% é jogado em terreno baldio ou

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 60

logradouro. O bairro também lidera o consumo de água da cidade juntamente com o bairro

de Tirol, tendo a sua maior parte destinada ao uso residencial. Já o consumo de energia

elétrica denota uma divisão mais visível entre os usos residencial e comercial,

inegavelmente presente na área desde o seu desenvolvimento enquanto área turística.

O mapa presente no anuário 2013 mostra uma ampla cobertura vegetal no bairro

de Ponta Negra (mais de 55% de seu território), como pode ser visto na figura 27.

Figura 27 – Cobertura vegetal no bairro de Ponta Negra

Fonte: SEMURB, 2012

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 61

Por outro lado, na pesquisa citada neste trabalho, em que há o mapeamento e

diagnóstico da situação dos espaços livres de Natal, apenas os espaços demarcados na

figura 28 são utilizados de forma pública para o lazer e outras funções. Nota-se que, dos

poucos existentes, a maioria se localiza na porção territorial referente ao conjunto Ponta

Negra. Nas proximidades do Morro do Careca e da Vila de Ponta Negra, passa a vigorar a

falta de espaços públicos de lazer.

Figura 28 – Espaços públicos de lazer no bairro de Ponta Negra

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 62

De acordo com o Plano Diretor, o bairro como um todo é definido como Zona de

Adensamento Básico e Área de Operação Urbana. Especificamente, as seguintes zonas se

aplicam, todas com prescrições urbanísticas específicas, de acordo com a figura 29: Zona

de Proteção Ambiental, Zona Especial de Interesse Turístico e Área Especial de Interesse

Social. Porém, a área de estudo não é englobada por nenhuma das zonas citadas.

Figura 29 – Legislação incidente sobre o bairro de Ponta Negra

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

4.2 SOBRE A ÁREA-DE-ESTUDO

Como já citado, a área-de-estudo proposta em consonância com o discurso de

Rodrigues (1986) abarca um raio de 500 metros a partir dos lotes em que é proposta a

intervenção urbanística. A localização destes no bairro de Ponta Negra pode ser vista na

figura 30.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 63

Figura 30 – Localização da área de estudo no bairro de Ponta Negra

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

De acordo com Juan Luis Mascaró (2005), “o traçado urbano começa pela definição

de avenidas, ruas e caminhos para pedestres, necessários para tornar acessíveis as

diferentes partes do espaço a serem organizadas”. O traçado viário irá, portanto, definir a

forma das quadras, o tipo de tecido urbano gerado. Sabendo que se trata de um bairro cujo

tecido urbano foi estabelecido de forma fragmentada pelo tempo, é possível observar

trechos com quadras regulares cujo traçado tende a ortogonalidade, mas também quadras

de formas assimétricas, definidas por ruas tortuosas e sem continuidade.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 64

Dentro da delimitação territorial doravante denominada área de estudo estão

presentes os seguintes equipamentos urbanos (figura 31): um cemitério, uma delegacia,

uma escola, um posto de saúde, e duas praças. Dado que o posto de saúde é único para

toda a comunidade, sua localização é conhecida pela maioria dos moradores, e o mesmo

ocorre para o cemitério, ponto de referência para a comunidade. Além disso, também se

localiza no universo de estudo terri torial a Praça do Cruzeiro, que congrega várias funções

urbanas, desde âmbito de transporte até ponto de referência para orientação. Outros

equipamentos urbanos no entorno da área-de-estudo são escolas e equipamentos

desportivos como quadras poliesportivas e campos.

Quanto à disponibilidade de serviço de transporte público, apenas 5 linhas – de um

total de aproximadamente 84 linhas na cidade – passam pelo local, sendo estas as

seguintes: 26, 46, 54, 56 e 66. O verbo passar é utilizado ao invés de percorrer, pois o

itinerário destes ônibus consiste em margear o amplo território pela via principal (todos se

utilizam da Rua Vereador Manoel Sátiro, que posteriormente se torna Rua Vereador Coringa

de Lemos), sendo apenas uma linha (56) responsável por adentrar a Vila de Ponta Negra

com maior amplitude, como pode ser visto na figura 31. Nesta, pode ser observada a

sobreposição de trajetos que as linhas fazem, motivo pelo qual não pode ser visto a

trajetória da linha 66. Também podem ser vistas na mesma figura as paradas de ônibus, que

da mesma maneira se localizam às margens da definida área.

A legislação apresentada na seção anterior se aplica na área da seguinte maneira:

Todo o bairro de Ponta Negra é considerado Zona de Adensamento Básico, definida

pela Lei Complementar nº 082/2007 (Plano Diretor de Natal) como “aquela onde se

aplica, estritamente, o coeficiente de aproveitamento básico” (Art.9º), sendo este de

1,2.

Todo o território do bairro também é definido como Área de Operação Urbana, que “é

aquela que, embora passível de adensamento, apresenta valores histórico-culturais

significativos para o patrimônio da cidade e que carecem de formas de recuperação

e revitalização”, de acordo com o artigo 24º do Capítulo III da mesma Lei.

Adiciona-se ainda a isto a própria definição do Plano Diretor sobre a Operação

Urbana, que coloca, através do inciso 2º do mesmo artigo que “entende-se por operação

urbana o conjunto integrado de intervenções e medidas a ser coordenado pelo Poder

público através de plano específico, com a participação da iniciativa privada e comunidade

local”.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 65

Figura 31 – Equipamentos urbanos na área de estudo e adjacência

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

Quanto ao uso do solo na área de estudo (figura 32), percebe-se a predominância

de edificações destinadas à oferta de serviços nas proximidades da orla marítima, e da

principal via de circulação que interliga as diversas partes do bairro, efeito que se reflete e

adentra a porção terrestre por mais duas ou três quadras. Isto se dá devido ao caráter

turístico já explanado. De maneira geral, o uso do solo hegemônico é o residencial, presente

por toda a área, com pontuais comerciais. Há ainda o uso institucional, representado pela

delegacia, escola, posto de saúde e igreja, e algumas edificações de uso misto. Nas

proximidades da área projeto, muitas das edificações de caráter de serviço são do setor de

hospedagem, representados por pousadas de médio porte.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 66

Figura 32 – Mapa de uso do solo na área de estudo

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

Quanto à altura das edificações expressa em pavimentos (figura 33), doravante

denominada de gabarito, nota-se ainda uma predominância de edificações de um só

pavimento, com situação semelhante ao uso do solo: nas proximidades da orla marítima e

na extremidade Sul da área de estudo, são vistos mais prédios (acima de 3 pavimentos) e

edificações de dois a três pavimentos. Pode-se notar que na adjacência das áreas de

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 67

intervenção a maioria das edificações é de um pavimento, sugerindo uma certa

permeabilidade visual.

Figura 33 – Mapa de gabarito na área de estudo

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 68

4.3 ÁREA-PROJETO E CARACTERÍSTICAS

Esta seção trata sobre a área de projeto propriamente dita, considerando o leiaute

atual dos terrenos e sua posição geográfica, observando fatores do conforto ambiental,

como insolação e ventilação naturais. Procurou-se ver também as maneiras de chegada ao

local, atentando para as visuais que os terrenos oferecem, além da permeabilidade destes

percursos e quão convidativo este caminho se faz. Além disso, contém considerações sobre

A última parte desta seção apresenta os vestígios comportamentais observados no local

através de registros fotográficos, em uma tentativa de compreender como a população se

apropria atualmente da área não estruturada, de forma a refletir suas necessidades no

projeto proposto.

4.3.1 Leiaute atual e posição geográfica

Os quatro terrenos que compõe a área-projeto são adjacentes entre si, em posição

diagonal. O de número 1 no diagrama da figura 34 é de posse da Prefeitura de Natal,

utilizado como Lagoa de Captação de águas pluviais, além de uma pequena porção do seu

território ser de responsabilidade da Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do

Norte (CAERN), compondo-se de uma Estação Elevatória de Esgotos. O terreno de número

2 é de posse da CAERN, onde encontra-se um poço. Um terreno privativo é representado

pelo número 3 no diagrama, e uma área verde pública não-acondicionada (de uso público) é

representada pelo número 4. Todos, com exceção do número 4, são protegidos por muro ou

cerca. Apesar da proximidade, o traçado da área não garante uma conectividade direta

entre eles. A área verde não acondicionada possui 2.627 m², o terreno privativo tem 365 m²,

enquanto os terrenos da CAERN e da Prefeitura juntos somam 4.740 m² de área total,

considerando o território necessário para que os seus serviços sejam realizados, locais onde

haverá intervenção mínima pela proposta, totalizando aproximadamente 7.732 m².

Nota-se a presença de vegetação preexistente nas áreas, assim como edificações

que ocupam um território mínimo em um dos terrenos, e se destinam ao uso da CAERN. Em

três dos lotes (2, 3 e 4), a calçada é inexistente, embora haja um espaço reservado para o

seu feitio, limitado pelo meio-fio que a diferencia do espaço de circulação de veículos.

Apesar deste espaço ser destinado ao feitio do passeio público, muitos equipamentos

urbanos foram locados ali, a exemplo de bocas-de-lobo (destinados à drenagem urbana),

além de postes de iluminação e parte da própria vegetação, e compõem obstáculos à livre

circulação do pedestre, impedindo a função principal do passeio público, como pode ser

visto nas figuras 39 e 40.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 69

Figura 34 – Mapa de situação e locação das áreas de intervenção

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

Figura 35 – Equipamentos de drenagem urbana, de iluminação pública e vegetação como empecilhos

à livre circulação do pedestre

Fonte: acervo da autora, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 70

A mesma situação ocorre ao redor do lote 1, que apesar de apresentar uma certa

estruturação da calçada (pavimentada em paralelepípedos), possui em toda a sua extensão

barreiras à livre circulação do pedestre, como as lixeiras públicas, a vegetação e os postes.

Figura 36 – Equipamentos urbanos e vegetação como obstáculos para o pedestre no entorno da lagoa de captação e EEE da CAERN

4.3.2 Percursos e visuais

Dada a grande quantidade de espaços livres na área de estudo, percebe-se que

uma dificuldade encontrada nos percursos que levam à área de projeto é a falta de

estruturação das calçadas, que de maneira geral são deixadas a cargo do proprietário do

terreno. Logo, se não há ocupação, não há estruturação nestes locais. Outra consequência

é a falta de padronização para a construção destas, tanto em termos funcionais (diferentes

níveis de altura, causando desconforto físico para o usuário; largura variável e muitas vezes

insuficiente; mobiliário urbano predominando sobre o espaço do pedestre), quanto em

termos estéticos (sombreamento, embelezamento), o que poderia tornar o passeio

convidativo, incentivando o deslocamento não motorizado. A apropriação do espaço do

passeio público para a deposição de materiais também se torna um problema à medida que

força o pedestre a transitar pela rua, definido como o espaço do veículo motorizado.

Exemplos destas ocorrências podem ser vistos na figura 34 e se distribuem pelos diferentes

caminhos que podem ser percorridos para se chegar à área de estudo.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 71

Figura 37 – Registro fotográfico das calçadas da Rua Manoel Rodrigues e Rua do Golfinho,

respectivamente

Fonte: Google Street View, 2014 e acervo da autora, 2015

A sequência de imagens na figura 35 apresenta algumas visuais do espaço público

localizado na esquina da Rua Pedro Golfinho com a Rua Augusto Severo, visto a partir de

diversos ângulos. Trata-se de um espaço livre de edificações bem vegetado, sem muro ou

cerca que consistam em empecilhos à entrada do público.

Figura 38 – Visuais do espaço livre sem muros ou cerca

Fonte: acervo da autora, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 72

Fonte: acervo da autora, 2015

Já os lotes pertencentes à CAERN podem ser vistos nas figuras 36 e 37. Esta

primeira demonstra o interior do lote murado mais próximo do espaço livre acima. O acesso

visual a este pode ser feito pela Rua da Tilápia, através de um portão gradeado. Nota-se

novamente uma área arborizada, embora não densamente, no qual parte do território é

utilizado para que a companhia de águas e esgoto realize seus serviços para com a

sociedade. Já a figura 37 demonstra a visão da lagoa de captação e estação elevatória de

esgotos também de posse da CAERN, um grande território cercado com pequena porção

deste ocupada por edificações, como será visto na próxima parte desta seção.

Figura 39 – Visual interna do espaço livre murado

Fonte: acervo da autora, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 73

Figura 40 – Lagoa de captação e estação elevatória de esgotos da CAERN

Fonte: acervo da autora, 2015

4.3.3 Apropriações sob o ponto de vista dos vestígios comportamentais

Como já citado, as formas de observar os vestígios comportamentais humanos se

englobam em duas categorias: a deposição (quando algo é colocado) ou a erosão (quando

algo é retirado, como por exemplo, quando um novo caminho é criado devido ao tráfego). A

figura 41 demonstra a espacialização dos vestígios encontrados.

Figura 41 - Mapeamento dos vestígios comportamentais observados no lote 4

Fonte: elaboração própria, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 74

O mais evidente foi a trilha criada em meio à vegetação (figura 42), que foi visto

sendo utilizado em diferentes momentos durante as visitas in loco. Observou-se também a

deposição de lixo nas bordas do terreno que possuem passeio não estruturado paralelo à

estas.

Figura 42 – Criação de trilha por erosão na vegetação

Fonte: acervo da autora, 2015

Além disso, de outras maneiras é observada a deposição, através da colocação de

entulhos, ou pela colocação de uma placa – que pode ser vista na figura 43 – no qual este

útlimo sugere certo cuidado com o ambiente em questão. Ademais, o comportamento de

utilizar a área para descansar foi visto em uma ocasião de visita, embora a área não

disponha de bancos ou assentos de qualquer tipo.

Figura 43 – Deposição através da colocação de uma placa indicativa de comportamento

Fonte: acervo da autora, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 75

5 CONVERSANDO COM A COMUNIDADE

A primeira visita à Vila de Ponta Negra sob o escopo deste trabalho aconteceu no

dia 25 de fevereiro de 2015, no turno vespertino, e tratou-se de uma conversa informal com

Cíntia Fernanda de Lima e Maria das Neves Valentim, duas cidadãs de intensa atividade

social na comunidade. Esta primeira é Presidente do Conselho Comunitário, além de ser

também agente de saúde (o que implica em um maior conhecimento do território e da

comunidade), e ambas residem na Vila de Ponta Negra. Nesta conversa, foi explicado que a

vila tem um histórico, através do Gabinete de Gestão Integrada, de busca pela segurança

através de intervenções urbanas, sob uma perspectiva de prevenção. As próprias cidadãs

reconhecem a carência de espaços públicos para o usufruto da população da Vila de Ponta

Negra, que apesar da existência de diversos espaços livres, estes são de propriedade

privada ou encontram-se sem estruturação suficiente para que possam servir como espaço

de lazer (ver figura 28). Ao tomarem conhecimento das intenções deste trabalho final de

graduação, colocaram os seguintes pontos como necessidades do local:

espaços para que os grupos folclóricos locais – como, por exemplo, os Congos de

Calçola - possam ensaiar, guardar seus materiais, ter reuniões;

espaços de educação ambiental, em compatibilidade com a intenção da CAERN em

realizar tais programas;

uma biblioteca, citando o exemplo de uma biblioteca de rua existente em Brasília,

mantida pela companhia de águas e esgoto de lá;

um eco-ponto, um espaço intermediário na coleta de lixo, que coleta categorias de

resíduos não englobadas na coleta domiciliar;

valorização do convívio social e da expressão cultural da Vila de Ponta Negra

através da realização da feira de artesanato e gastronomia, de organização dos próprios

moradores;

necessidade de resgate de festividades tradicionais que uniam a comunidade

antigamente, como por exemplo o São João, originalmente chamado de Arraiá da

Florestina, que acontecia na Rua da Floresta. O caráter desta festividade era mais

voltado para a celebração da cultura, e se tornou predominantemente comercial, para

fins lucrativos.

Em discussão sobre outros projetos para espaços públicos na vila, foi colocado o

esforço para organizar uma horta comunitária, de interesse dos moradores, além da busca

por equipamentos urbanos como a academ ia da terceira idade. Uma das problemáticas

colocadas pelas moradoras diz respeito à um dos terrenos de intervenção: a lagoa de

captação de águas pluviais e EEE (estação elevatória de esgoto) da CAERN por vezes vaza

e alaga o entorno. Outra questão colocada foi a remoção da Favela do Alagamar no ano de

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 76

2004 da Rua Curimatã, embora posteriormente a área não tenha recebido mais

investimentos como o de pavimentação, tornando-se um local de difícil circulação,

alagamentos devido à chuva (aliado à falta de preparação do solo), e de deposição de lixo.

5.1 ENTREVISTAS

Baseadas no roteiro no apêndice A, as entrevistas foram conduzidas buscando

descobrir o significado da Vila de Ponta Negra para seus moradores, assim como seus

limites, pontos de referência, sensações, e como se dá o uso e a disponibilidade dos

espaços públicos. No total, 19 questionários foram respondidos, cujos resultados são

apresentados a seguir.

Tem-se que 89% das pessoas entrevistadas são do sexo feminino, com idade

predominante entre 35 e 55 anos, com apenas duas respondentes abaixo desta idade.

Apenas um dos entrevistados não reside na Vila de Ponta Negra, sendo esta uma agente de

saúde, uma usuária constante que percorre os caminhos da área, oferecendo uma valiosa

visão de quem visita regularmente. A maioria mora na vila há pelo menos 20 anos, apesar

de haver um equilíbrio entre aqueles que já nasceram lá (descendentes de moradores

originais) e aqueles que mudaram-se para lá, seja de fora do estado do RN ou não.

Quando perguntados o que a Vila de Ponta Negra simboliza, muitos colocaram a

vila como um local bonito, bom para se viver, ressaltando uma saudade dos tempos antigos,

e as modificações pela qual o território tem passado. É importante destacar que quatro dos

entrevistados não gostaram da colocação da comunidade nos termos de “Vila”, alegando

que o território todo é Ponta Negra, sem separação. Para a mesma questão, alguns ainda

remeteram à aspectos negativos, como violência, tráfico ou insegurança.

Quanto ao que é único e especial daquele local, a maioria das pessoas citou um ou

mais dos seguintes: relação com a natureza (representada pelo Morro do Careca pela

proximidade com a praia), a cultura local (tradição da renda, dos Congos), e o aspecto

interiorano (de calmaria, de convívio na rua, de conhecer a seus vizinhos). Apesar das

transformações decorrentes das novas construções na área, pode-se ver que a tradição

ainda é um elemento forte, em que os moradores reconhecem elementos da cultura local.

Diferentes limites foram colocados quando a pergunta tinha a ver com o “onde

inicia” e “onde acaba” a Vila de Ponta Negra. Alguns colocam que esta começa (limite a

Oeste) a partir da Rota do Sol, da Curva do Vento, da Praça do Cruzeiro, ou até mesmo do

shopping Cidade Jardim, mas concordam que esta se estende até o “pé do morro”.

Entretanto, quase 50% considera o Cemitério de Ponta Negra como o marco que delimita o

início deste território. Quanto ao outro sentido (Norte-Sul, que abrange uma faixa territorial e

outra marítima), cabe ressaltar que alguns entrevistados comentaram que a Rua Erivan

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 77

Franca (adjacente ao calçadão, à beira da praia) não faz parte do território delimitado como

Vila de Ponta Negra, fato este que se atribui a falta de conexão territorial, incompatibilidade

de uso do solo, e a diferença de níveis topográficos, pois sabe-se que não existem muitos

acessos diretamente desta parte de Ponta Negra em relação à praia (MEDEIROS et al,

2014). Já aqueles que alegaram que a Vila não deve ser separada - e sim parte de Ponta

Negra como um todo - não reconhecem sequer a existência de limites.

O que mais chama atenção dos entrevistados em relação a visuais, cheiros ou sons

geralmente também são elementos que remetem à natureza, como árvores (por sua idade

ou estética), assim como seus elementos (o som e o cheiro da folhagem, das flores, das

frutas), além da som e cheiro do mar (que desperta sentimentos de bem-estar em termos de

som agradável ou de ventilação). O segundo grupo mais citado tem a ver com a falta de

acessibilidade representada por calçadas estreitas, locais onde o carro prevalece sobre o

pedestre, e trânsito mais intenso, e são percursos realizados mais próximos da rua principal

por onde trafegam a maior parte das linhas de transporte público urbano (ver figura 31).

Remeteu-se ainda a transformação do bairro como um fator notável pela população, a

reparar nas novas edificações que surgem a cada dia. Isto também tem relação com o

sentimento de saudosismo que é o mais presente no discurso dos moradores, que têm

saudade da infância na vila quando esta era mais pacata, menos urbanizada, na época em

que haviam brincadeiras de rua, em que se percorria longas distâncias a pé. Poucas

pessoas citaram a sensações negativas, como a de insegurança, alegando que esta ocorre

mais no turno da noite.

Quanto à existência de espaços públicos para recreação e socialização, os

entrevistados alegaram que existem poucos direcionados a este propósito, apesar de

encontrarem-se em estado de abandono ou falta de estruturação. São estes: a praça do

Alagamar, a praia de Ponta Negra, e os citados campos de futebol (ABC e Botafogo). A

maior parte desconhece o local onde se pretende propor a intervenção urbanística, ainda

que este se localize nas proximidades de pontos de referência como a praça do Cruzeiro e o

único posto de saúde do bairro. Pela localização dada, julgam que este se enquadra “no

conjunto”, não fazendo parte da vila, embora esteja a duas quadras dos citados pontos de

referência, fato que se atribui à falta de conexão territorial ocasionada pelo traçado viário.

Aqueles que conhecem (aproximadamente cinco pessoas) dizem que a área é deserta e

“esquisita”, local onde ocorrem assaltos, e que evitam trafegar por lá.

Na última questão, os respondentes eram pedidos para desenhar um mapa

esquemático da Vila de Ponta Negra, como se estivessem descrevendo-a para um estranho.

Dos 19 questionários aplicados, 14 mapas foram criados, e ressaltam-se os seguintes

pontos:

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 78

de maneira geral, os pontos de referência citados se reafirmam como tal à medida

que estão presentes também nos mapas, como a praça da igreja/terminal de ônibus,

o Conselho Comunitário, a praça do Cruzeiro, o posto de saúde e o cemitério;

três dos entrevistados não possuem uma imagem mental elaborada em relação á

morfologia urbana da vila, cujos desenhos remetem à elementos naturais, como o

Morro do Careca, ou árvores e flores (figura 44);

Figura 44 - Mapa mental com elementos da natureza

Fonte: entrevistas aplicadas

seis dos respondentes lembram do formato da vila como linear, seguindo a extensão

da rua principal, onde se localizam vários dos pontos de referência citados, com

ligação direta entre si;

5 entrevistados elaboraram mais os mapas, considerando mais de uma quadra,

muitas vezes inserindo nomes de ruas ou outros pontos de referência menos

conhecidos (ou simplesmente menos citados), como escolas, a delegacia, mercados,

ou farmácias.

poucos apontaram a relação da Vila com a praia como, por exemplo, os pontos de

descida para pedestres.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 79

Figura 45 - Morfologia urbana da via como linear, e mais elaborada, respectivamente.

Fonte: entrevistas aplicadas

5.1.1 Considerações gerais

De maneira geral, alguns aspectos devem ser ressaltados em relação às entrevistas

realizadas, pois diferenciam a população e seu conhecimento sobre o local onde moram.

Um fator notável era que alguns dos moradores citavam a história da Vila e se referiam à

momentos específicos (as décadas de 1970 e 1980 quando houve a construção do

conjunto, ou até mesmo à época da doação de uma porção do terreno da Vila para se

transformar na Barreira do Inferno) e à pessoas públicas da política (atribuindo

acontecimentos a determinados mandatos políticos), confirmando a noção de que as

pessoas sabem a história do seu lugar.

Muitas pessoas mencionaram uma característica rural, de comunidade calma, onde

se pode colocar cadeiras nas calçadas e conversar. Três dos entrevistados estavam nesta

situação, e essa foi uma das respostas dadas quando indagado o que é especial e único em

relação à Vila de Ponta Negra. Isto se complementa pelo fato de se observar, durante o

tempo passado no local, o ato de cumprimentar os outros, de conhecer à seus vizinhos, à

quem passa.

Em duas questões distintas – “o significado da Vila de Ponta Negra” e “o que é único

em relação à vila” - o que foi respondido que simboliza a Vila de Ponta Negra é o fato de

“conhecer os moradores da comunidade”. Vale ressaltar também que pelas histórias

contadas em paralelo, subentende-se que os moradores da Vila têm o costume de percorrer

longas distâncias a pé (fator enraizado historicamente, como pode ser visto pelo histórico na

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 80

seção 3.1.1), mantendo o contato com a natureza. Isto é reforçado pelo fato de que, em

mais de metade das entrevistas, foram citadas espécies vegetais, seja através de árvores

antigas que chamam a atenção visualmente, pelo cheiro e pelo som das folhagens, ou por

frutas específicas que também remetem à história do lugar.

5.1.2 Mapa síntese das entrevistas

Como é sabido, a metodologia utilizada nesta etapa foi baseada nos escritos de

Kevin Lynch (1997). Para que possa ser apresentado um mapa síntese com as informações

recebidas, é essencial que se explique brevemente alguns conceitos utilizados por este para

compor o mapa em questão. O autor classifica o conteúdo da imagem da cidade em cinco

elementos:

Vias: Canais de circulação pelos quais os habitantes de uma cidade se locomovem,

observam e se relacionam;

Limites: ‘elementos lineares não usados ou entendidos como vias pelo observador’,

barreiras entre duas fases, que podem separar uma região da outra;

Territórios: regiões de uma cidade dotados de extensão bidimensional, com

elementos reconhecíveis aos olhos do observador, o que o distingue de outros;

Pontos nodais: Áreas de atração, ‘focos intensivos’ para os quais ou a partir dos

quais o observador se locomove, podendo ser conexões ou concentrações;

Marcos: são referências na paisagem, algo que se destaca do entorno. Podem ser

objetos físicos – com os obeliscos, por exemplo, edifícios, e até mesmo elementos

da paisagem natural, como um morro ou montanha.

Devido à escala da análise e a frequência de aparecimento, poderão ser

visualizados no mapa (figura 46) os seguintes elementos:limites, pontos nodais e marcos.

Não foram citados muitos pontos de referência. Acredita-se que isto se dá ao fato

dos vizinhos se conhecerem, pois a resposta dada era que os encontros acontecem nas

próprias casas. Os principais pontos nodais relacionados, por ordem de frequência, foram:

a praça da Igreja Católica, que também possui um terminal de ônibus e algumas

cigarreiras e bares, como a Tapiocaria da Vó. De acordo com os entrevistados, este

local costumava ser um ponto de encontro cultural, onde haviam shows e era o local

da boemia;

o centro de cultura de Ponta Negra;

a própria Praia de Ponta Negra;

a praça do Cruzeiro, que também reúne os usuários do transporte público por ter

uma parada de ônibus em sua área;

o Conselho Comunitário, onde ocorrem reuniões periódicas da comunidade.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 81

Ademais, o Morro do Careca foi o único a ser categorizado como marco, de acordo

com o diálogo com a comunidade.

Figura 46 - Mapa síntese das entrevistas

Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 82

5.2 O ENVOLVIMENTO DA COMPANHIA DE ÁGUAS E ESGOTO DO RIO GRANDE DO

NORTE - CAERN

Como já apresentado, um dos lotes englobados pela área-projeto pertence à

Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (lote 2), e possui em seu território

um passeio de serviço, e um poço. Devido à aproximação desta proposta com a realidade

da comunidade, viu-se como essencial debater com esta instituição a possibilidade de

implantação do projeto, levando-se em consideração também que a posição geográfica do

lote o eleva à peça chave na formação de um sistema de espaços livres de pequena escala:

este se localiza de forma central entre os outros lotes, e é a única forma de conexão

possível atualmente, devido ao traçado existente na área.

A primeira visita à empresa aconteceu no dia 16 de abril, no turno da manhã, e o

contato foi feito com o Gerente do setor de Patrimônio da CAERN, João Carvalho. Nesta

visita, foi esclarecido que a lagoa de captação (lote 1) pertencia à prefeitura, e se destinava

à captação de águas pluviais, e que a CAERN só se utilizava de uma parcela deste território

para a operação de uma estação elevatória de esgoto. Percebe-se que o lote 2 encontra-se

em situação similar, mas que a posse é da CAERN, e que no território remanescente ao

redor do poço existente, não há utilização. De acordo com João Carvalho, a área restante é

uma reserva para futura expansão, e não pode ser ocupada por usos públicos. Foi

esclarecido nesta ocasião que a CAERN é uma empresa de capital misto, conhecida como

instituição pública, mas com funcionamento de empresa privada, motivo pelo qual a área é

patrimônio da empresa, e não pode funcionar em prol da coletividade. Apesar disto, existe a

sugestão de que eventos itinerantes – que se utilizassem do terreno por tempo determinado

– seriam bem aceitos.

Além disso, a instituição possui programas ambientais compatíveis com as

pretensões para a intervenção urbana proposta. Em conversa com Marineida de Oliveira,

educadora ambiental da CAERN, foram descritos os principais programas de educação

ambiental:

Agente do saneamento: capacitação dos agentes de saúde relacionando as

questões do saneamento básico com as práticas de saúde coletiva;

Água é vida: o público alvo é composto por professores, indicando como inserir na

didática o ensinamento de questões relacionadas à água, apontando uma

abordagem lúdica;

CAERN nas Escolas: se realiza no próprio terreno da CAERN central, onde se

localiza uma mini-estação que simula e explica para alunos do ensino fundamental o

que é e como são realizados os serviços prestados, além de tocar na temática de

preservação da água;

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 83

Gestão água: direcionado para empresas, no tocante à sensibilização quanto ao

consumo de água, buscando a preservação.

Devido à junção de terrenos que lidam diretamente com água na forma de

abastecimento (lote 2) ou de acumulação e tratamento (lote 1), a proposta pensada através

deste trabalho fornece terreno fértil para a realização de ações de educação ambiental junto

à CAERN, e a mesma representa uma possível apoiadora da proposta. Logo, a intervenção

no lote em questão foi minimizada, respeitando na medida do possível as condições

colocadas.

6 REBATIMENTOS

Nesta etapa, é necessário sumarizar o que foi visto, apontando os principais

quesitos que influenciaram nas decisões relacionadas à proposta de intervenção

urbanística.

É importante enfatizar o fato de que o bairro de Ponta Negra surgiu a partir da vila,

que antes de se transformar em área de segunda residência e de turismo, seus residentes

viviam da pesca, da renda e da agricultura de subsistência, nas quais as duas primeiras

tradições são mantidas até os dias atuais. Há uma tentativa de retomar esta última em

menor escala, expressa através da vontade dos moradores de implantarem um projeto de

horta comunitária.

Resultante de diferentes momentos de consolidação, a configuração urbana do

bairro, primeiramente marcada pelo traçado orgânico já instalado e base para o

desenvolvimento do bairro não foi apagada pela chegada de novas subáreas com traçados

ortogonais, e sim acrescentou a qualidade da diversidade a este traçado urbano.

Apesar do desenvolvimento turístico e dos investimentos que a área recebeu, pôde-

se ver que de aproximadamente 55% de cobertura vegetal existente no bairro, poucos são

os espaços que são aproveitados para a coletividade, que de fato receberam estruturação

para desempenhar importantes funções na cidade, como a de formar um cinturão verde,

desempenhando tarefas ecológicas e proporcionando mais conforto ao pedestre. Além de

serem poucos (ver figura 28), concentram-se fora da Vila de Ponta Negra, onde o número

de espaços deste tipo são ainda menores. Além disso, o massivo investimento no setor do

turismo se concentrou na região diretamente adjacente à orla, deixando de valorizar a

riqueza cultural e histórica que a origem do bairro de Ponta Negra – a vila – oferece. Então,

reforça-se a necessidade de um espaço que tire proveito das várias funções que pode

desempenhar, dado que a especulação imobiliária que age sobre o território elevou o preço

do m² em cerca de 10 vezes, em um curto período de 3 anos. De forma a corroborar isto, o

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 84

discurso da própria população aponta a falha distribuição dos espaços de lazer, deixando a

vila a mercê de poucos espaços para desempenhar diversas funções.

Pelo mesmo motivo, e devido à grande quantidade espaços livres privados, uma

abordagem de intervenção pode ser a de parcerias público-privado, como foi visto em um

dos estudos de referência (Parque Discovery Green), como forma de tornar disponíveis à

comunidade os terrenos que não estão cumprindo a função social da propriedade. Por outro

lado, aponta-se também a possibilidade de uso dos instrumentos de gestão e intervenção

urbanística presentes no Estatuto da Cidade para que essa função seja cumprida, usando

de instrumentos como o aumento progressivo do IPTU, etapa intermediária para que

aconteça a desapropriação, ou ainda a transferência de potencial construtivo, apesar deste

não ter ainda regulamentação definida para a cidade de Natal.

Apesar de sua extensa área, o bairro não possui infraestrutura para suportar

aumentos populacionais e suas consequências (impermeabilização do solo, alta produção

de dejetos, a exemplo da produção de lixo e de esgoto), o que ocasionou em 2006 a

suspensão das licenças para novas construções. Ainda assim, o rápido aumento

populacional e a rotatividade de pessoas na área resultaram numa infraestrutura que não

acompanha este desenvolvimento. No momento atual, essa produção de dejeto não tem

local de tratamento específico, e muitas vezes é lançada diretamente no ecossistema

marítimo. Deste modo, “[...] os recursos cênicos litorâneos [...] ao serem ocupados e

transformados, têm muitas vezes totalmente eliminadas as características que geraram sua

ocupação, com uma grande e definitiva perda de suas qualidades paisagísticas iniciais”

(MACEDO e PELLEGRINO, 1999).

Quanto à área-de-estudo, enfatiza-se que em um raio de 500 metros, pode-se notar

mudanças na tipologia das casas e do tecido urbano. Há a interseção entre ruas tortuosas -

cujas quadras em formato irregular comportam edificações menores - e ruas com um

traçado ortogonal, cujas quadras são subdivididas em lotes regulares que comportam

residências maiores. É relevante para a proposta perceber os equipamentos urbanos

existentes na área, a exemplo da escola e do posto de saúde. Este primeiro equipamento é

compatível com a proposta de um espaço público multifuncional, aliando estes dois usos

tanto pela viés do lazer, quanto pelo viés da educação ambiental. O posto de saúde possui

movimento intenso, pois é o único da área, e se localiza a aproximadamente 300 metros da

área-projeto. Porém, a falta de ligação entre as ruas faz com que as áreas não se conectem.

De aproximadamente 84 linhas que percorrem a cidade de Natal, viu-se que apenas 6

conectam a Vila de Ponta Negra ao resto da cidade, e 60% destas percorrem o mesmo

itinerário, utilizando-se da rua principal (Rua Manoel Coringa de Lemos) para alcançar as

proximidades do morro. Esta rua, além de não possuir infraestrutura adequada –

atualmente, esta apresenta largura insuficiente, curvas com raio inadequado para o tráfego

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 85

de veículos maiores como os ônibus - fica sobrecarregada por ser rota única de transporte

público.

Através do uso do solo, pode-se notar a presença do serviço hoteleiro na área-de-

estudo, apesar de que na área existem pousadas, um tipo de acomodação diferente dos

grandes hotéis que ocupam a orla. Ainda assim, o uso majoritário é o residencial, pois os

usos comerciais e de serviço se concentram mais nas proximidades da orla. O gabarito na

área é predominantemente térreo, não obstante a presença de alguns prédios de meia

altura ou com mais de 20 andares, com a paisagem composta predominantemente pelo

ambiente construído. No mais, a legislação aplicável na área define todo o território como

zona de adensamento básico (com coeficiente de aproveitamento de 1,2) e área de

operação urbana. Apesar de ter um coeficiente de aproveitamento mais baixo do que outros

bairros da cidade (geralmente entre 2 e 3,5), isto não se torna um problema quanto ao

conjunto construído pretendido, pois o caráter multifuncional pretendido diminui a

necessidade quantitativa de área construída. Além disso, o fato da área ser definida como

de uma operação urbana facilita a intenção real de implantação da proposta.

Já a área-projeto é definida por quatro lotes, dos quais apenas um é público, a área

a ter maior aprofundamento da proposta. Os demais possuem restrições quanto à sua

utilização, demonstrando a necessidade de uma intervenção em etapas, em que os espaços

possuam uma identidade, mas que a implantação de cada um possa ocorrer em momentos

separados, respeitando as condições de intervenção como colocada por cada um dos atores

com quem se teve contato.

De maneira geral, a chegada à área-projeto é conturbada, pois o mobiliário urbano

e a arborização – que em teoria deveriam ser parte do passeio público sem impedir a

passagem do pedestre – se tornam um obstáculo à livre circulação por estar mal

posicionado. O próprio terreno onde haverá um maior detalhamento da proposta não possui

atualmente estruturação alguma, exigindo um planejamento do início, e devido à situação do

entorno, intervenções pontuais em maior escala se fazem necessárias para que se obtenha

a noção de unidade para o conjunto. Apesar de não possuir estruturação, o terreno possui

vestígios comportamentais da ação humana, a exemplo da deposição de resíduos (lixo ou

material de construção), além da criação de trilhas por erosão e uso do espaço para

repouso.

Porém, foi somente ao falar com a população que se pode ter respostas

diretamente relacionadas às suas necessidades. No primeiro encontro, estas necessidades

já se tornaram evidentes, e ajudaram a compor o programa de necessidades. Ficou evidente

também nesta etapa do trabalho que os moradores da Vila de Ponta Negra cultivam uma

relação especial com o local, demonstrando conhecer seus momentos históricos e as

pessoas que os promoveram, ainda que os limites colocados para o início da vila sejam

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 86

fluidos. Outro fator que ficou evidente foi o reconhecimento e valorização da natureza,

alguns em busca desta, outros já acostumados com a sua presença, o que influencia na

relação entre o natural e o construído no feitio do projeto.

Apesar de conhecerem bem a área, muitos não têm familiaridade com a área-

projeto, e não possuem, portanto, relação com o local. Atribui-se isto à falta de

conectividade territorial, o que demanda também ações em maior escala para reconectar

áreas outrora relacionadas. De forma a relacionar os problemas encontrados com as

soluções propostas, os esquemas da figura 47 foram feitos:

Figura 47 - Esquemas relacionando problemas encontrados e soluções propostas

Fonte: elaboração própria, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 87

Logo, o programa de necessidades foi concebido com base nas soluções propostas

aos problemas encontrados, sob a perspectiva do efeito da intervenção urbanística tendo

rebatimento nos âmbitos social, cultural e educativo. Somado a isto, as necessidades

colocadas pela própria população foram a mais rica fonte de informações para que a

proposta fosse tecida. Este é composto pelos seguintes elementos:

Ecoponto;

Biblioteca;

Salas de educação ambiental;

Oficinas de capacitação profissional

Depósito para guarda de materiais;

Banheiros;

Espaço para ensaios e apresentações culturais;

Playground;

Horta comunitária;

Academia ao ar livre;

Parede de escalada;

Espaço turismo

Espaço para exposições itinerantes

Parada de ônibus.

É importante salientar que pelo caráter do projeto – da busca por espaços que

sirvam para mais de um propósito e que permitam vários usos – o programa de

necessidades foi composto com base naquelas atividades que podem se desenvolver no

local, não havendo a obrigação de fixar aquele uso em certo espaço definido. Neste ponto

jaz o desafio da composição projetual permissiva, cujas premissas utilizadas serão

abordadas na seção a seguir, juntamente ao memorial descritivo do projeto.

6.1 PARTIDO URBANÍSTICO

Tendo como base as análises realizadas no decorrer do trabalho, as considerações

presentes na seção anterior levaram à elaboração das seguintes premissas:

1 Integração territorial e social da área-de-estudo, atualmente sem conexão com os

principais pontos de referência (como a Praça do Cruzeiro, e o posto de saúde) e

vias do entorno (como a Rua Vereador Manoel Sátiro) através de ações que

concernem os âmbitos do desenho urbano, da mobilidade urbana e da aplicação de

instrumentos de gestão territorial:

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 88

a. Conexão entre espaços livres, disponibilizando para a população um espaço

público de qualidade e um percurso que atravessa e está no cerne da área-

de-estudo;

b. Tratamento urbanístico e paisagístico de determinados trechos que se

conectem com as principais rotas da área-de-estudo, aumentando o alcance

territorial desta área;

c. Possibilidade de futura integração dos novos percursos criados com rotas

cicláveis.

d. Redirecionamento de linhas de ônibus por um novo percurso, gerando uma

maior penetração na área-de-estudo;

e. Redução e controle da função de estacionamento em ruas que concentram

estabelecimentos de atratividade turística e vida noturna, visando a retomada

desta como um espaço para o pedestre, e prevendo a possível integração

com a nova rota de ônibus sugerida;

f. Aplicação de transferência de potencial construtivo no único lote de posse

privativa.

2 Estruturação de um espaço público que sirva como espaço de manifestação cultural,

de educação ambiental, e vários outros tipos de apropriação:

a. Manutenção da vegetação existente;

b. Proposição de novos percursos com continuidade pela paginação de piso e

pelo nível de altura;

c. Proposição de uma edificação que agregue ambientes de múltiplo uso, desde

espaços para exposição da produção da vila até salas de educação

ambiental e capacitação profissional;

d. Interferência mínima em lote de posse privativa, não sujeito à aplicação de

instrumentos de desapropriação – terreno de posse da CAERN para

operação de serviço de abastecimento de água.

3 Promoção da permeabilidade visual, da integração física e simbólica entre as partes,

e da implantação de mobiliário urbano sob a perspectiva da busca pela segurança

através de intervenções urbanas:

a. Substituição de muros por grades ou guarda-corpos em determinados

trechos;

b. Permissividade de novos percursos antes inexistentes;

c. Oferecimento de espaço para personalização do espaço público através da

grafitagem.

4 Valorização da cultura local: Adaptação dos elementos mais representativos nas

entrevistas e conversas informais para a linguagem plástica ou representativa.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 89

Logo, na elaboração da proposta buscou-se trabalhar com os interesses não só dos

moradores, mas também sob a perspectiva do turista que não conhece uma importante área

do desenvolvimento de Ponta Negra, valorizando também o uso do solo do entorno. Deste

modo, se torna mais fácil que o entorno imediato (composto também por pousadas de médio

porte) se envolva mais no feitio da intervenção urbana proposta. Além das apropriações

cotidianas, visa-se também o envolvimento com ações de educação ambiental, além de

promover espaço de manifestações da cultura popular e manifestações sociais.

7 MEMORIAL DESCRITIVO

7.1 TRATAMENTO URBANÍSTICO DAS VIAS VISANDO A INTEGRAÇÃO FÍSICO-

TERRITORIAL DA PROPOSTA

Como pode ser visto na prancha 01 do caderno de pranchas em anexo neste

trabalho, foram sugeridas algumas modificações no sistema viário da área-de-estudo para

fins de integração físico-territorial, retomando uma conexão que deveria existir de forma a

valorizar as outras partes de Ponta Negra fora a orla marítima. Uma destas modificações é a

estruturação de um trecho da Rua Curimatã, na adjacência imediata da área-projeto. Este

trecho abrigava uma favela, que foi removida em meados do ano de 2004, mas que nunca

recebeu a pavimentação devida após esta ação de remoção.

A proposta apresentada pode ser tomada como base e adaptada para a

reestruturação das demais ruas apontadas na prancha 01. É sugerido que a estruturação da

própria via seja feita em bloco intertravado, por este apresentar um baixo índice de

impermeabilização do solo, além do que o baixo movimento de veículos na área não implica

em um grande tráfego que venha a exigir uma estruturação mais resistente, porém mais

agressiva ambientalmente, como a cobertura asfáltica. O espaço reservado para a calçada

(já existente) foi alargado, para que pudesse ser implantada uma faixa de serviço (local

onde se localiza o mobiliário urbano sem que este se torne um obstáculo à livre circulação

do pedestre. Quando se pensa neste propósito juntamente ao fato de que as instituições e

empresas (de abastecimento de água, de energia, de drenagem urbana) geralmente

implantam este mobiliário sem um padrão pré-estabelecido de localização, têm-se a

seguinte idéia: criar um módulo que agregue o local da arborização (que gera

sombreamento), do recolhimento de resíduos sólidos, definindo uma faixa cujo alinhamento

definirá o limite da implantação de mobiliário como postes, por exemplo. A implantação do

módulo pode ser vista através das figuras 48 e 49.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 90

Figura 48 - Esquema de implantação do módulo de mobiliário urbano

Fonte: elaboração própria, 2015

1,2

0m

1

,70

m

6,0

0m

2

.90

m

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 91

Figura 49 - Perfil proposto para a Rua Curimatã

Fonte: elaboração própria, 2015

De acordo com o Manual de implantação de mobiliário urbano, feito pela Prefeitura

do Rio de Janeiro, a criação deste tipo de infraestrutura – chamada ilha de serviços –

proporciona não só conforto ao usuário, mas também redução nos custos de implantação e

manutenção por parte da gestão e das concessionárias devido ao agrupamento do

mobiliário.

Porém, enfatiza-se que o alargamento da calçada não resultou em uma perda para

a via, visto que sugere-se aqui que neste trecho de nova estruturação, a via promova o

escoamento de veículos em um só sentido, melhorando o fluxo de veículos maiores como

os ônibus (de acordo com a rota sugerida nesta mesma proposta), havendo ainda uma

reserva de espaço para uma futura incorporação de rota de bicicleta em ambos os sentidos.

Já na Rua Aristides Porpino Filho, se localizam diversos estabelecimentos de

atratividade turística e que movimentam a vida noturna, necessitando, além da

reestruturação, um maior controle do estacionamento na rua. Desta forma, a rua poderia ser

retomada como um espaço de convivência, onde haveria mais espaço para o pedestre do

que para o veículo motorizado. Uma opção pode ser a localização de estacionamentos em

um dos espaços livres do entorno, de onde sairia um transporte público de maior

capacidade de passageiros (como uma van, por exemplo) de onde haveria o embarque e

desembarque ao invés do estacionamento. Esta iniciativa não é inédita e já é

comprovadamente eficiente, presente em Recife, por exemplo. Vale salientar ainda que a

1,70m 1,20m 6,00m 2,90m

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 92

rua como um local para o pedestre em uma área de vida noturna tão movimentada pode ser

incorporada aos roteiros turísticos, fazendo parte da imagem da cidade.

7.2 ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO USO

Do conjunto proposto, composto por quatro lotes, apenas um (lote 4) teve um maior

desenvolvimento das ideias pensadas para a área, dada a extensão da área-projeto. Porém,

o conjunto é apresentado de forma geral, com todos os usos atribuídos a cada um dos lotes.

Para a apresentação desta seção, algumas partes estarão presentes no corpo do trabalho

escrito, e aquelas que dizem respeito à representação gráfica serão apresentadas em forma

de pranchas arquitetônicas em anexo.

7.2.2 Evolução da proposta

A primeira etapa adotada no processo foi o zoneamento de acordo com o programa

de necessidades resultante das considerações apresentadas no início desta seção, tendo

em mente também as diretrizes de intervenção tecidas. Logo, a proposta de estruturação do

lote 4 acompanhou algumas das premissas adotadas para se obter a integração entre os

quatro lotes: a manutenção do mesmo nível de altura entre os passeios, a manutenção da

vegetação existente e a continuidade do passeio através de elementos em comum, como a

paginação de piso e o tratamento paisagístico.

Nesta primeira etapa, procurou-se relacionar os diferentes usos em toda a área (o

que resultou na composição de um funcionograma, que pode ser visto na figura 50), de

forma a criar áreas que agregassem funções similares.

Figura 50 – Funcionograma criado a partir do programa de necessidades

Fonte: elaboração própria, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 93

Desta forma, na primeira proposta do zoneamento, à lagoa de captação foram

atribuídos usos como em um espaço público alagável, a ser utilizado em época de estiagem

(figura 51).

Figura 51 - Primeira proposta de zoneamento

Fonte: elaboração própria, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 94

Esta contaria com uma pista para skate, quadra poliesportiva e áreas de

convivência, todos feitos em materiais com altos índices de permeabilidade, de forma a não

comprometer a função de drenagem da lagoa. Além disso, nesta área também foi proposta

a parede de escalada, e um passeio perimetral em deck de forma a viabilizar o passeio

público atualmente tomado pela arborização e pelo mobiliário urbano. Nos lotes 2 e 3, as

intervenções seriam menos impactantes – devido às limitações da área como colocado -

mas teriam a atribuição principal de conectar o todo, concentrando edificações pelo qual o

passeio principal que conecta os espaços passaria dentre elas. O lote 4 teria o ecoponto

como espaço central, relacionado diretamente ao uso de horta e compostagem, e ao espaço

zen, que poderia ser utilizado também como espaço de educação ambiental. Toda esta

porção do terreno estaria diretamente conectada com a edificação, cujo propósito seria o de

ter salas multiuso onde poderiam ocorrer aulas sobre educação ambiental e capacitação

profissional. Este zoneamento resultou em uma primeira proposta de traçado, que pode ser

vista na figura 52.

Figura 52 - Primeira proposta de traçado (nomear espaços)

Fonte: elaboração própria, 2015

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 95

Porém, nas primeiras tentativas foram identificados os seguintes conflitos:

Foi detectado, em conversas com moradores e com a ARSBAN (Agência

Reguladora do Saneamento Básico de Natal), que a lagoa de captação não tem

capacidade de vazão o suficiente para que a água captada seja levada para as

galerias, o que faz com que na maior parte do ano, a lagoa esteja cheia, portanto,

não sujeita a se portar como um espaço público alagável. Logo, os usos propostos

tiveram que ser realocados, ou adaptados aos outros espaços, visto que a lagoa de

captação era o lote de maior área.

A forma de locação do conjunto edificado não favorecia a conexão do passeio

existente, de forma que este sofresse a mínima intervenção, como colocado pela

instituição de posse do terreno;

No zoneamento do lote 4, o ecoponto foi posicionado de forma central, enquanto os

pátios para realização de eventos ficaram em segundo plano, de menor tamanho.

Em primeiro lugar, vale salientar que com esta distribuição, os espaços que

poderiam ser complementares (como forma de expandir a área disponível à eventos

de diversos tamanhos) ficam fragmentados devido à localização de um ecoponto

entre eles. Além disso, este é um tipo de uso que pode vir a gerar certo incômodo

aos demais usuários, por tratar de resíduos da atividade humana (lixo domicilar,

entulho, óleo de cozinha), não sendo o ideal que este seja alocado de forma central

em um espaço público onde outras atividades poderiam ser realizadas.

A taxa de impermeabilização do solo em uma área verde estava muito alta, a notar-

se pela quantidade de áreas pavimentadas na figura 52.

7.2.3 Proposta final

Considerando os conflitos colocados, uma nova distribuição dos espaços levou à

proposta atual (ver pranchas 02, 03 e 04).

Uma das premissas adotadas que marcam a diferença entre a primeira e a última

proposta é a largura dos passeios. Pensa-se que, se o espaço há de ser multifuncional, que

seus passeios também possuam largura útil para que sejam utilizados de diferentes

maneiras, não só como espaço de circulação. Logo, o espaço nesta proposta é bem menos

subdividido e mais conectado.

Como um dos propósitos do projeto é o oferecimento de um espaço robusto e

flexível, pátios sem estruturação fixa são os espaços-chave desta proposta. Porém, a

vontade de manter a vegetação existente diferencia as possibilidades de uso para estes

espaços. No espaço denominado bosque do aprendizado, existe uma densa vegetação ao

redor deste cuja copa se inicia a aproximadamente 3 metros, fazendo com que este seja um

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 96

espaço sombreado e com um plano de teto (copa das árvores) bem próximo do observador.

Deste modo, destina-se o mesmo à atividades de relaxamento – como a prática de ioga e

meditação – ou à atividades em grupo – como aulas coletivas de dança ou alguma outra

modalidade fitness. Por sua proximidade com o espaço de compostagem e com o ecoponto,

pode também ter função de espaço de educação ambiental, pois também é propósito deste

espaço ceder lugares onde a prática se alie a teoria no processo ensino-aprendizagem. Por

outro lado, o espaço cultura e ação tem um caráter de receber eventos itinerantes, como

feiras gastronômicas ou de artesanato, além de eventos como ensaios de grupos de dança

culturais – como os Congos de Calçola da própria vila de Ponta Negra – abrigando também

as apresentações. Isto é dito porque, por não haver arborização na área, o largo fica

disponível para a montagem de tendas, de palcos ou de barracas, sem limitação de altura.

Este espaço foi pensado para ser ampliado em caso de necessidade, podendo utilizar-se da

faixa de rua elevada – seria o caso de interromper o fluxo de veículo por algumas horas – ou

do próprio passeio na adjacência para realizar eventos maiores.

O ecoponto foi posicionado no limite do terreno, ainda que preserve a sua conexão

com a rua – para permitir a entrada de veículos que venham despejar resíduos – com a área

de compostagem – relacionando a temática do lixo como algo reciclável – e com a parada

de ônibus, cuja rotatividade de pessoas ajudaria a promover o conhecimento sobre este

equipamento tão importante, porém pouco conhecido. Ao locar o ecoponto em um espaço

público que lida com a temática de educação ambiental, busca-se mudar a própria intenção

de uso do equipamento: ao invés de somente receber materiais que não são contemplados

pela coleta domiciliar, a ideia é que estes materiais possam servir de matéria prima para a

produção artesanal, dando um destino produtivo para o que antes seria somente objeto de

despejo.

Atribui-se as aulas sobre educação ambiental ao conjunto edificado a ser projetado,

que contaria com salas de aula multiuso – para o propósito supracitado e para oficinas de

capacitação profissional – depósito para guarda de materiais (incluindo os que seriam

utilizados para ensaios, apresentações, estruturação do espaço adjacente), banheiros, e

espaços para exposições. A este espaço foi dado o nome de Espaço de Múltiplo Uso Dona

Maria Rendeira, fazendo referência a uma das pessoas mais antigas na comunidade, que

perpetua uma tradição local que nunca foi abandonada durante o tempo.

Já o espaço movimente-se e espaço aventura e natureza foram pensados como um

lugar de atividades para a família, visto que são espaços adjacentes que englobam

atividades como a escalada na parede, o cultivo de temperos e vegetais na horta, o

playground e a academia ao ar livre. Pela variedade de atividades oferecidas, pode entreter

os que desejam se ocupar, e ao mesmo tempo, oferece espaços de permanência com

bancos para aqueles que preferem observar o desenrolar dos exercícios oferecidos.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 97

No novo espaço público, reserva-se também o espaço do turismo, como forma de

compatibilizar o novo local com um uso do solo frequente na área-de-estudo. O espaço

contém não só caráter informativo, mas também se situa adjacente ao largo projetado para

manifestações da cultura local, como ensaios e apresentações, externando mais esta

cultura para o turista que atualmente, na maioria das vezes, só desfruta da praia, não

conhecendo as ricas manifestações culturais que ocorrem no interior da Vila.

O lote topográfico tem baixa inclinação (aproximadamente 5%, como pode ser visto

na figura 53), o que permitiu um passeio contínuo sem batentes ou escadas, nem rampas,

fator desejado não somente para ajudar o percurso de pessoas com dificuldade de

locomoção, mas do visitante de uma forma geral. É importante salientar que os perfis

apresentados nas pranchas de desenho técnico são perfis esquemáticos, considerando a

implantação ideal da proposta. Ainda assim, a projeção da topografia do terreno – conforme

as curvas de nível do material obtido – é colocada quando necessário. É valido dizer ainda

que esta topografia já foi modificada por ações anteriores a esta proposta, se tornando mais

suave, como pode ser visto pelas fotografias presentes neste trabalho. Porém, a projeção

apresentada parte da base de dados mais atualizada, sendo propícia a sua utilização como

referência futura, quando necessários o desenvolvimento e a adaptação da proposta.

Figura 53 - Curvas de nível no lote 4

Fonte: elaboração própria, 2015

Para valorizar e fazer referência à característica de espontaneidade na qual o

tecido urbano obteve expansão, foi dado preferência às curvas ao invés da ortogonalidade,

embora as primeiras encontrem a segunda no trecho da lagoa de captação, retratando toda

a mistura do tecido urbano de Ponta Negra.

Feita uma descrição geral dos espaços criados, as ideias específicas para cada um

deles são descritas a seguir, relacionando também materiais e mobiliário urbano.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 98

7.2.3.1 Espaço Cultura e Ação

Por ser uma espécie de largo destinado ao recebimento de atividades itinerantes –

como apresentações culturais, ensaios, feiras – a pavimentação desta área deve ser mais

resistente, pois enfrentará tráfego intenso e cargas maiores. Outro fator a se considerar é

que este espaço é o ponto mais baixo do terreno (ver figura 53), para onde a água seria

direcionada. A soma desses fatores exige uma pavimentação resistente, com um alto

coeficiente de atrito (para não se tornarem escorregadios quando molhados), ainda que não

impermeabilize o solo totalmente (também ressalta-se a importância de um eficiente sistema

de drenagem). Recomenda-se, portanto, o uso do piso drenante de concreto, pois possui

características semelhantes às desejadas, enfatizando-se o seu alto coeficiente de

infiltração da água. A textura pode ser vista na figura 53, e o piso drenante vem em placas

de 40 cm x 40 cm, formando uma superfície contínua se assentado com peças lado a lado.

Figura 54 - Piso drenante em concreto na cor grafite

Fonte: http://tinyurl.com/nh8usnt

Ainda devido ao caráter de múltiplo uso deste espaço, recomenda-se que o

mobiliário seja passível de ser mudado de lugar, ainda que pesado o suficiente para que não

seja apropriado e levado por quem desejar. Foi escolhido então o carretel de madeira (figura

55), também conhecido como “bobina de madeira” para ser utilizado como mesa, tanto

como uma forma de reutilizar algo que iria virar resíduo, quanto pela possibilidade do

mesmo se tornar um elemento do mobiliário resistente. Este possui tamanhos padrão,

pesando de 35 a 690 kg. Recomenda-se que seja lixado e pintado com verniz ou esmalte.

Já as cadeiras que ficam ao redor da mesa teriam estética similar às apresentadas na figura

55, resguardadas as adaptações ergonômicas necessárias para ser compatível com a altura

da mesa. Recomenda-se que estas sejam feitas em um material pesado e resistente às

intempéries, tal como o material do Enzo (figura 18).

Figura 55 - Mobiliário urbano sugerido para o Espaço Cultura e Ação

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 99

Fonte: http://tinyurl.com/og85tyb

7.2.3.2 Espaço Movimente-se

Este espaço é composto pelo playground e pela academia ao ar livre. Esta última é

assim nomeada neste trabalho porque a vontade de implantá-la não partiu da classe da

terceira idade, e sim de mulheres da comunidade, na idade predominante das entrevistas

(de 35 a 55 anos). Porém, os equipamentos seriam os padronizados para uma academia da

terceira idade (ATI), com uso por diversas classes de idade. Esta área seria revestida em

piso emborrachado para áreas externas, na cor bege.

O playground foi estruturado de forma a fazer referência a um símbolo da história

da Vila de Ponta Negra: o barco (figura 56). A criação de um playground temático pode ser

mais proveitosa por dar a este ambiente uma unidade visual, e um símbolo conhecido pela

comunidade pode se tornar mais atrativo. A base do espaço seria a cobertura em areia fina,

simulando a típica caixa de areia de playgrounds, evitando o risco de machucados em caso

de queda das crianças. O píer criado (ver prancha 03) também faz referência à elementos

da praia, e pode ser utilizado na parte de cima como escorregador, ou na parte de baixo,

com altura de 1,20 m. Por sua proximidade com o espaço Cultura e Ação, pode ser utilizado

como espaço da plateia durante a realização de eventos. O playground seria feito em

madeira de demolição tratada para resistir às condições climáticas.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 100

Figura 56 – Exemplo de playground temático sugerido

Fonte: http://revista.zapimoveis.com.br/leve-um-playground-para-dentro-da-sua-casa/

7.2.3.3 Espaço Mobilidade e Informação

Este espaço agrega duas áreas divididas pelo passeio público. Através da

colocação de uma baia de embarque e desembarque, dá-se a oportunidade de acesso para

pessoas com dificuldade de locomoção, e também é um espaço que pode ser utilizado na

ocasião de necessidade de ampliação do espaço pela montagem de estruturas efêmeras,

retomando a rua como um espaço de democracia.

Além disso, do outro lado do passeio são sugeridos os mobiliários presentes na

figura 57, como o banco que margeia as árvores existentes e o bicicletário.

Figura 57 - Mobiliário sugerido para o Espaço Mobilidade e Informação

Fonte: http://mateussz.blogspot.com.br/2009/01/banco-piano.html

Fonte: http://tinyurl.com/nqo4oyo

Reserva-se aí o espaço necessário para futura inserção de abrigos para parada de

ônibus, onde pretende-se recomenda-se o uso de totens informativos sobre as linhas de

ônibus, e informações sobre o local. O abrigo poderia ser feito de concreto e madeira, e

sugere-se que este contenha paradas com nomes que remetam à cultura local, para ajudar

também na orientação das pessoas que não estão familiarizadas com o bairro.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 101

Este espaço também se localiza no início do passeio que conecta todo o lote

longitudinalmente. Propõe-se que este percurso seja pavimentado em piso intertravado na

cor vermelha, com posicionamento como demonstrado na figura 58, estruturação também

proposta para o passeio público no perímetro do espaço proposto, garantindo continuidade

visual.

Figura 58 - Piso intertravado retangular vermelho

Fonte: http://tinyurl.com/nf864rb

7.2.3.4 Espaço Turismo

O espaço do turismo tem uma função compatível com o uso do solo da região,

formado por diversas pousadas. Serviria para prover informações básicas de

direcionamento, e ainda cumpriria o propósito de valorização e divulgação da cultura local

para o turista. Este foi pensado para ser, ao invés de uma barreira – como uma cabine de

informações ou um veículo - uma escultura, um ponto focal, onde seriam escritos na

vegetação ou nas floreiras poemas sobre o bairro de Ponta Negra, fatos da história do bairro

ou direcionamentos, função normalmente atribuída às placas. Exemplos do descrito podem

ser vistos na figura 59.

Figura 59 - Exemplo de estruturação sugerida para o espaço turismo

Fonte: https://www.pinterest.com/pin/117586240247182444/

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 102

7.2.3.5 Espaço Bosque do Aprendizado

Esta área funciona ao mesmo tempo como passeio e como espaço de

permanência, possuindo uma largura maior do que passeios comuns. Resulta, quando

interseccionada com o passeio longitudinal, em duas áreas diferentes, mas de

características similares: local sombreado, e com vegetação imponente e distribuída ao

redor. Compõe o percurso que se estende até a lagoa de captação, integrando a área-

projeto. Sua pavimentação deve ser feita em piso intertravado retangular em diversas cores,

como nos croquis da figura 59. Quanto ao encontro com o deck proposto para a lagoa de

captação, sugere-se que este tenha estética similar: dispondo diferentes cores de piso

intertravado em tons terrosos, e com o deck em diferentes cores (nos mesmos tons), de

acordo com a figura 60. A última imagem na figura é um deck plástico que simula a

aparência da madeira, porém possui uma resistência maior à água (levando em

consideração a sua implantação na lagoa de captação). Estes espaços possuem

estruturação mínima, a considerar os bancos formando áreas de permanência à sombra das

copas das árvores.

Figura 60 - Esquema de paginação no passeio que abrange os quatro lotes

Fonte: https://tecparpavimentos.wordpress.com/tag/piso-intertravado/page/3/

http://www.lulusoso.com/products/Deck-Tile-Plastic.html

7.2.3.6 Espaço Aventura e Natureza

Composto pela horta comunitária e pela parede de escalada, este espaço possui

pavimentação mista. Neste último uso, considera-se mais seguro utilizar uma vegetação de

forração para incrementar a segurança da atividade realizada, no caso de quedas, além de

ajudar a manter o solo permeável nesta área. O muro seria trabalhado com réguas de

madeira de demolição e teria uma planta trepadeira (cuja espécie vegetal não teria

espinhos) subindo no mesmo sentido daqueles que se aventurarem nesse exercício.

Já na área da horta, deseja-se ter canteiros elevados para cultivo, proporcionando

mais conforto a seus utilizadores. É desejável que a estrutura desta horta seja em concreto

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 103

pintado de diversas cores (preferencialmente tons de azul e vermelho, cores do grupo

cultural Congos de Calçola, da Vila de Ponta Negra), e que seu desenho permita a utilização

por parte de cadeirantes, como mostrado na figura 61. Por este mesmo motivo, o piso deve

ser pavimentado em piso drenante, ao invés de vegetação.

Figura 61 - Horta suspensa em concreto

Fonte: http://jornaltribunadonorte.net/noticias/alunos-da-apae-sao-protagonistas-na-sociedade/

7.2.3.7 Demais áreas e considerações gerais

De maneira geral, não houve inserção de novos tipos de vegetação diretamente no

solo, a não ser em forma de horta e floreiras, todos presentes em elementos móveis, como

vasos, jarros, caixotes de feira – em consonância com o caráter mutável e adaptável do

projeto. Nos canteiros, preconiza-se uma forração em seixo rolado, ou em brita, para efeitos

estéticos, formando composições paisagísticas, como pode ser visto na figura 62.

Figura 62 - Composição paisagística com pedras como forração

Fonte: http://freitaspedrasdecorativas.com.br/website/?page_id=173

O mobiliário nas demais áreas tira proveito do concreto e da madeira como um

conjunto, a exemplo da figura 63, e é preferível que sua forma acompanhe o traçado curvo

dos canteiros. Porém, na área de permanência central, preferiu-se a organização dos

bancos de forma a criar uma espécie de sala de estar, com a ressalva de que os bancos

localizados próximos à passagem de pessoas não tenham encosto, sendo escolha do

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 104

usuário sentar-se de costas ou de frente para o passeio. O mobiliário fixo poderia ser

também feito de troncos de madeira de demolição, como também é demonstrado na figura

62.

Figura 63 - Exemplo de mobiliário sugerido para as demais áreas

Fonte: https://www.pinterest.com/pin/479140847832758223/

Acervo pessoal de Verônica Lima

Vale salientar ainda que, visto que existe um favorecimento do pedestre quanto ao

nível do passeio de forma contínua, exigindo uma área de elevação do nível da rua para

igualar-se, recomenda-se o uso de grandes floreiras (figura 64) situadas em locais de

conexão com a rua, evitando que o veículo reivindique este espaço para si. É preferível que

estas não sejam de material cerâmico para evitar a depredação, e sim em concreto ou em

madeira.

Figura 64 - Sugestão de floreiras para guiar fluxos

Fonte: Acervo pessoal de Verônica Lima

Por fim, considera-se a iluminação no espaço público proposto com diferentes

sugestões, a depender da massa vegetativa e do grau de intervenção. No interior do lote, é

preferível que se tenha postes como o da figura 65, cuja baixa altura (em relação ao poste

convencional de calçada) permite a iluminação por debaixo das copas das árvores.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 105

Figura 65 - Posteamento sugerido para o interior dos lotes

No passeio público, considera-se postes com duas pétalas em diferentes alturas, de

preferência cumprindo também a função de orientação através da colocação de placas,

como pode ser visto na figura 66.

Figura 66 - Exemplo de poste para o passeio público

Fonte: http://www.mapenergia.com.br/content/gravia

Ainda, no terreno da CAERN e em alguns pontos de vegetação densa, recomenda-

se a utilização de balizadores como demonstrado na figura 67, cujos modelos tem uma

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 106

altura de aproximadamente 50 cm. Para efeitos estéticos, estes teriam suas bases pintadas

na cor vermelha.

Figura 67 - Diversos modelos de balizadores para iluminação

Fonte: http://www.aecweb.com.br/emp/p/vit-iluminacao_3602_1

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 107

CONCLUSÃO

Este trabalho teve um propósito de provocar na uma reflexão acerca do elemento

norteador da proposta: a multifuncionalidade, vista sob a ótica de apropriação da cidade.

Através do esclarecimento dos conceitos, viu-se que a definição em comum de espaço

público na fala de diversos autores tem a ver com acessibilidade, seja física ou simbólica.

Logo, vê-se na possibilidade de prover um espaço multifuncional uma oportunidade para pôr

em prática o ato de “permitir”. Permitir passar, permitir utilizar, não restringir, o que se

relaciona diretamente com o sentido de acessibilidade. Porém, isto não implica que este

seja um modelo melhor do que os outros, pois a herança cultural de traçados e formas -

sejam em forma de jardins suspensos, praças monumentais – existe, necessitando de

adaptação para a realidade local, sendo a falta desta a maior crítica tecida no uso de

modelos “importados”.

Por conseguinte, pelo teor de realidade presente na proposta – visto que a

comunidade tem interesse em implantá-la - a futura arquiteta e urbanista pôde se aproximar

dos possíveis obstáculos que aparecem no caminho de toda intervenção urbana, a exemplo

da resistência das partes envolvidas em novas ideias, ou em ceder seus territórios em prol

da coletividade, além da limitação imposta pelos materiais existentes em detrimento da

localização do espaço público proposto. Além disso, as preocupações que atingem todos

aqueles que se propõem a projetar para espaço público também se fizeram presente no

decorrer desta proposta, como a possibilidade de depredação, ou até mesmo a apropriação

indevida, exposta aqui pela possibilidade de se trabalhar com um mobiliário flexível e

transportável, mas que precise ainda de algo que o prenda naquele local.

Devido às peculiaridades da cidade contemporânea – a exemplo da convivência em

novos espaços de acessibilidade restrita, causa e consequência da sensação de

insegurança no meio urbano – encara-se como um desafio qualquer projeto que se

proponha a retomar a cidade e convide seus moradores a apropriar-se dela. Logo, o

trabalho foi visto como um exercício de projeto, onde havia a liberdade de projetar, de expor

ideias, de se utilizar da criatividade, mas com certa cautela, levando em consideração todos

os fatores que um arquiteto e urbanista deve pesar quando no feitio de um projeto: o

aspecto social, cultural, econômico, a ergonomia, as características plásticas de um

material, assim como as de durabilidade e manutenção.

Esse desafio se torna maior ainda quando o projeto é feito para um bairro tão

distinto quanto Ponta Negra, levando em consideração a quantidade de atores que

convivem no bairro – sejam moradores, sejam hóspedes de alta rotatividade – e

principalmente, levando em consideração a morfologia urbana de um bairro que consolidou

cada uma das suas partes em diversos momentos, e carrega o ônus e o bônus de ser um

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 108

bairro ícone de turismo, que faz parte da imagem da cidade de Natal e do estado do Rio

Grande do Norte. Desafios à parte, o desenvolvimento do trabalho foi muito proveitoso para

a autora, pois além de se constituir de exercício projetual, demonstrou dificuldades e

limitações do modo de trabalho a serem exploradas buscando melhorias na vida

profissional.

No final, o anteprojeto proposto permaneceu sendo nomeado como “espaço

público” de fato porque percebeu-se que cada um dos tipos de espaços públicos explorados

– praças, parques, pátios, jardins - carregam um estigma e uma função, um modelo espacial

pré-definido, o que acaba por limitar as suas contribuições como parte da infraestrutura da

cidade.

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 109

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 114

APÊNDICE A

Roteiro para entrevista

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE TECNOLOGIA – DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA

TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO

PESQUISA ACERCA DA VILA DE PONTA NEGRA COM VISTAS À ELABORAÇÃO

DE PROJETO URBANÍSTICO DE UM ESPAÇO PÚBLICO MULTIFUNCIONAL

VIVIANE GOMES MEDEIROS

1. Nome:__________________________________________________________

2. Gênero:

a. Feminino b. Masculino

3. Faixa de idade:

a. Menos de 15 anos b. 15-25 anos c. 25-35 anos

d. 35-45 anos e.45-55 anos f. Mais de 55 anos

4. Reside na Vila de Ponta Negra? Em que local?

5. Há quanto tempo reside na Vila de Ponta Negra? Seus pais residiram/residem

na Vila?

6. O que vem a mente quando você ouve a expressão “Vila de Ponta Negra”? O

que a Vila simboliza para você?

7. Quais são os limites da Vila para você? Em que ponto esta começa e em que

ponto acaba?

8. Para você, o que é especial em relação à Vila? O que é único e particular desta

área?

9. Descreva as direções completas de um dos caminhos que você normalmente

faz pelo território da Vila (indo trabalhar, indo à escola ou à casa de um amigo).

Favor incluir o que atrai a sua visão, se existe algo que aguça a audição, ou o

seu olfato.

10. Você sente alguma emoção específica no tocante as diferentes partes desse

caminho? (ex: traz lembranças, ansiedade, medo ou insegurança?)

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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 115

11. Onde você costuma encontrar seus amigos ou parentes na Vila de Ponta

Negra? Existe algum ponto de encontro?

12. Quais são os espaços geralmente usados para atividades de recreação (jogar

bola, conversar com os amigos, brincar com crianças)?

13. Você conhece a área verde próxima ao terreno da CAERN, localizada na Rua

do Golfinho? Qual a sua opinião sobre a área? O que aquela área lembra, o

que significa para você?

13. Desenhe um mapa esquemático da Vila de Ponta Negra, como se estivesse

fazendo uma rápida descrição para um estranho.