fisiologia das emoÇÕes: os torcedores fanÁticos de...
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA
ALINE MARQUES COLARES CAMURÇA
FISIOLOGIA DAS EMOÇÕES: OS TORCEDORES FANÁTICOS DE FUTEBOL
CAMPINAS
2019
ALINE MARQUES COLARES CAMURÇA
FISIOLOGIA DAS EMOÇÕES: OS TORCEDORES FANÁTICOS DE
FUTEBOL
Tese apresentada à faculdade de Educação Física da
Universidade Estadual de Campinas como parte dos
requisitos exigidos para a obtenção do título de doutora
em Educação Física, na área de Educação Física e
Sociedade.
Orientadora: Profª. Drª. HELOISA HELENA BALDY DOS REIS
ESTE TRABALHO CORRESPONDE A
VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA
PELA ALUNA ALINE M. COLARES
CAMURÇA E ORIENTADA PELA PROFª.
DRª. HELOISA HELENA BALDY DOS REIS
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Faculdade de Educação Física
Dulce Inês Leocádio - CRB 8/4991
Colares-Camurça, Aline Marques, 1983-
C67f ColFisiologia das emoções : os torcedores fanáticos de futebol / Aline Marques
Colares Camurça. – Campinas, SP : [s.n.], 2019.
ColOrientador: Heloisa Helena Baldy dos Reis.
ColTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de
Educação Física.
Col1. Fisiologia. 2. Emoções. 3. Futebol-Torcedores. I. Reis, Heloisa Helena
Baldy dos. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação
Física. III. Título.
Informações para Biblioteca Digital
Título em outro idioma: Physiology emotions : the fanatic fans of football Palavras-
chave em inglês:
Physiology
Emotions
Football-Fans
Área de concentração: Educação Física e Sociedade
Titulação: Doutora em Educação Física Banca
examinadora:
Heloisa Helena Baldy dos Reis [Orientador]
Carlos José Martins
Jose Irineu Gorla
Mariana Zuaneti Martins
Ricardo de Figueiredo Lucena
Data de defesa: 03-07-2019
Programa de Pós-Graduação: Educação Física
Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a) - ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0001-9825-1307 - Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/1488826961133851
COMISSÃO EXAMINADORA
Profa. Dra. Heloisa Helena Baldy dos Reis
Orientadora
Prof. Dr. Carlos José Martins
Prof. Dr. Jose Irineu Gorla
Profa. Dra. Mariana Zuaneti Martins
Prof. Dr. Ricardo de Figueiredo Lucena
A Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da Unidade
Dedico este trabalho às entidades de luz
guardiãs do mundo e àquelas que me guardam
e me regem, sem elas nada disso seria possível.
Dedico também à professora Heloisa Reis.
AGRADECIMENTOS
No meu primeiro dia de aula no doutorado da Unicamp, eu conheci um indivíduo, também
estudante de doutorado da Educação Física, filho de militar que me disse o seguinte: “Os
estudantes de humanas estudam o sexo dos anjos, eu gostaria de transferir o meu cérebro para
um chip e viver eternamente como máquina, os homens de ‘barbona’ e as mulheres de ‘saiona’
não fazem “ciência.” Eu estava de ‘saiona’. Naquele momento eu não acreditei que tinha saído
da minha terra natal, viajado mais de 3 mil km e transformado minha vida para produzir
conhecimento com este tipo de vertente. Semanas depois, em minha primeira reunião discente
eu ouvi o então representante discente defender a exclusão da área de humanas do programa de
pós-graduação da Educação Física da Unicamp. Mais uma vez eu fiquei perplexa. Até que, ao
trabalhar com a seleção brasileira de basquetebol feminino eu ouvi: “Se você quer ganhar
olimpíadas, esqueça que são humanas.” Tudo isso foi se juntando dentro de mim como uma
bomba propulsora para me afastar desse lugar. Eu não faço ciência para máquinas, eu não trato
estudantes como clientes, tampouco quero integrar o universo da ciência que tem como
prioridade o artigo científico e a unificação massificada dos pensamentos. Porém, eu só tenho
a agradecer a essas pessoas e a essas situações. Sem elas eu não estaria onde estou agora, não
voaria para Bélgica para apresentar este tema de forma inédita. Não teria a consciência da
resistência ativa que é necessária dentro do meio acadêmico. Não teria encontrado e sido
acolhida pela professora Drª. Heloisa Reis. De longe, a melhor orientadora que já conheci. A
mais humana, a mais excluída, a mais resistente. Professora, a você eu agradeço imensamente.
É uma grande honra apresentar este trabalho com você como suporte.
Agradeço a minha esposa, Aline Marques, por cada gota de amor que você me ensina a
experienciar, pelos aprendizados em conjunto, pela jovem família que iniciamos, pela
esperança de tempos melhores que compartilhamos a cada troca afetiva de olhares, pelo mundo
que vamos descobrir juntas. Você é meu quartzo rosa do reino animal.
Agradeço a minha mãe de sangue, Maria Paz Colares, por todo apoio e ensinamentos nem
sempre fáceis, assim como por todas as batalhas compartilhadas.
Agradeço ao meu pai, André Camurça, pela nossa trajetória.
Aos meus irmãos de sangue, Arturo Emanuel, Alessandra Russo, Audrey Miranda e André
Camurça Filho, por existirem.
Agradeço a minha mãe de santo, Tatiana Rocha, por todas as conversas, pelo amor gratuito,
pela firmeza e caridade.
Agradeço a amiga e madrinha de casamento, Elaine Bezerra, por ter me mostrado o lado bom
da Unicamp e por todo o mais que nós vivemos.
Agradeço à Luciana Bittencourt, ao Fernando Rosch e ao Ivan Bonfante pela simpatia, atenção
e disponibilidade. Ciência não se faz sozinha.
Agradeço a professora Claudia Cavaglieri por sempre me receber de forma harmônica e pela
grande contribuição na qualificação deste projeto.
Ao professor José Irineu Gorla e a professora Mariana Zuaneti Martins pelo apoio e pelas
intervenções sempre engrandecedoras.
Agradeço a Simone Malfatti pela disponibilidade de sempre.
Agradeço a cada um dos fanáticos torcedores do Corinthians voluntários dessa pesquisa.
Agradeço a Karime Ribeiro e a Barbara Germano pela ajuda fraternal.
Agradeço aos meus afetos e desafetos, todas (os) essenciais ao meu desenvolvimento pessoal e
científico.
Agradeço ao Terreiro de Umbanda Mãe de Deus e cada um (a) dos seus/suas componentes por
ser minha segunda casa, segunda família e por me ensinar muito mais do que posso explicar.
Principalmente agradeço a todas as divindades que se empenham em emanar luz para as nossas
mentes ainda tão jovens e errantes.
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
“Emancipe-se da escravidão mental. Ninguém
além de nós mesmos pode fazer isso.”
Robert Nesta Marley
RESUMO
O futebol foi aceito e transformado em paixão mundial parte por ações estratégicas, parte pelo
seu perfil de dinâmica de tensões capaz de cativar a quem assiste. O torcedor fanático de futebol
vive esta experiencia identitária de uma forma muito mais explicita. Ele se entrega a esta
emoção! A experiência emocional pode significar uma representação cognitiva de estados
globais do organismo, compostos por cadeias de sinalização central e periférica, específicas
para cada tipo e grau de emoção (Ledoux, 2012). Assim, Nossa pesquisa se propôs a iniciar os
estudos sobre a fisiologia das emoções no esporte. Convidamos 6 fanáticos pelo Corinthians,
com idade média de 30 anos (± 7,8) a assistir, pela televisão, ao jogo da final do campeonato
Paulista de futebol 2018 disputado em 8 de abril de 2018 (n=3) e a 24ª rodada (segundo turno)
do brasileirão 2018, disputado em 9 de setembro de 2018 (n=3); ambos aos domingos às 16h,
contra a Sociedade Esportiva Palmeiras. Os jogos foram assistidos em uma sala exclusivamente
preparada para este fim, com temperatura controlada entre 22 e 25ºC, sem ingestão de alimentos
durante o período da partida e com ingestão a vontade de água. Houve coleta de cortisol salivar,
Glicose e PA em cinco momentos do dia do jogo (CF) e de um dia rotineiro (CR). Além disso,
quarenta e cinco minutos antes do início do certame, os voluntários foram convidados a
responder dois inventários (BECK, 1988) sobre presença/ níveis/ ausência de ansiedade e
depressão. Trinta minutos antes da partida foram equipados com o medidor de frequência
cardíaca firstbeat SPORTS team 4.6 performance monitoring system® (Firstbeat techinologies).
A única emoção auto relatada de forma unânime foi a felicidade ao ganhar uma partida.
Relacionados a esta emoção (final do paulistão) foram encontrados, um pico de FC que atingiu
68%, 72% e 86% da frequência cardíaca máxima individual e uma elevação média da
concentração de cortisol salivar para 4.47 ng/mL ao término do jogo. As emoções associadas a
perder um jogo (24ª rodada brasileirão), foram: tristeza, ficar bravo, piorar o dia e o humor.
Nesta experiência emocional, a FC dos voluntários não alcançou 50% da máxima em nenhum
momento e a concentração de cortisol salivar no final do jogo foi de 1 ng/mL. O comportamento
da FC se apresentou muito peculiar entre os jogos, assim como nas ações de cada jogo. Mesmo
quando o tipo de emoção auto relatada se deu de forma análoga, como a felicidade de ganhar
uma partida e a felicidade de ver um gol do Corinthians, o controle da FC diferiu enormemente
em cada situação (média de 75% e 66% da frequência cardíaca máxima, respectivamente).
Desta maneira, este estudo ratifica a hipótese de que, embora seja relatado o mesmo significado
cognitivo para uma emoção, ela se expressa fisiologicamente em dimensões de ativação e
controle distintas. Além disso, sugere que vitórias, derrotas e o contexto específico de cada
jogo, regulam o comportamento fisiológico dos marcadores periféricos avaliados de maneira
particular. Corroborando, assim com a hipótese de Elias e Dunning (1992).
Palavras-chaves: Fisiologia; Emoções; Futebol; Torcedores; Fanáticos.
ABSTRACT
Football has been accepted and converted into world passion, some by strategic actions some
by the attractive tension dynamics. The fanatics fans live this identity experience in a much
more explicitly way, he hands in to this emotion! The emotional experience can mean a
cognitive representation of global organic states, build by specifics central and peripherical
signalizing pathways according to the emotional type and degree (LEDOUX, 2012). Thus, our
search is to start the study in sport´s emotion physiology. We invited 6 Corinthians fanatics fans
to watch, on TV, the final of 2018 Paulista championship, which happened on April 8 and a
Brazilian championship 24º round, which happened on September 9 of the same year. The
games were seen in a specific room, with controlled temperature between 22ºc and 25ºc, without
eating during the game time and water ad libitum. There was salivary cortisol, glucose and
arterial pressure data collect at five time points at a game day and a routine day. Furthermore,
forty-five minutes before the game starts, the volunteers answered a depression and anxiety
inventory (BECK, 1988). Thirty minutes before the game starts, they were equipped with a
heart rate monitor first beat sports team 4.6 performance monitoring system® (first beat
technologies). The only unanimous self-reported emotion was winning a game happiness (the
final of 2018 Paulista championship). Related to this emotion we found a HR individual pick
of 68%, 72% e 86% of maximum heart rate and a cortisol media levels increase to 4.47 ng/ml
at the end of the match. Associated emotions to a lost game (Brazilian championship 24º round)
were sadness, being angry and get worse the day and humor. In this emotional experience, heart
rate didn’t reach 50%HRmax and salivary cortisol concentration was 1 ng/mL. Heart rate
behavior was very singular at all time points including game actions and collect data day. Even
when same emotion was described, as the happiness of winning a game and the happiness of
seeing Corinthians score a goal, heart rate behavior was extremely different between those
situations (75% and 66% respectively HR mean). this research emphasizes the hypotheses that
even the same emotion´s cognitive significance was reported; the organic global state expressed
its different in levels of activation and regulation. Furthermore, we suggest that winnings,
losings and the specific game context regulate the peripherical markers of physiological
behavior analyzed in this research in a particular way as it was said by Elias and Dunning
(1992).
Keywords: Physiology; Emotions; Football; Fans; Fanatics.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Popularidade do futebol ......................................................................................... 24
Figura 2 - 1ª Transmissão ao vivo pela TV ............................................................................. 41
Figura 3A - Identidade clubística ........................................................................................... 45
Figura 3B - “Nosso grupo, grupo deles.” ................................................................................ 45
Figura 4 - A excitação do torcer .............................................................................................. 47
Figura 5 - Caracterização dos torcedores ................................................................................ 50
Figura 6 - Torcedores fanáticos .............................................................................................. 50
Figura 7 - Teoria dos sistemas emocionais organizados em rede ........................................... 55
Figura 8 - Anatomia do sistema límbico ................................................................................. 57
Figura 9 - Via de sinalização da Síndrome de Adaptação Geral – SAG ................................ 59
Figura 10 - Representação do Sistema Nervoso Autônomo em suas vias efetoras simpáticas e
parassimpáticas ....................................................................................................................... 60
Figura 11 – Circuitos de sobrevivência ................................................................................... 63
Figura 12 - Estados globais do organismo .............................................................................. 64
Figura 13 - Gráfico representativo do comportamento da Pressão Arterial ........................... 84
Figura 14 - Comportamento da glicose sérica ........................................................................ 86
Figura 15 A – Análise do cortisol na final do campeonato paulista ....................................... 87
Figura 15 B – Análise do cortisol na 24ª rodada do campeonato brasileiro ........................... 88
Figura 15 C - Cortisol e a comparação entre os dois jogos ..................................................... 89
Figura 16 - Comportamento da frequência cardíaca média durante a vitória ......................... 90
Figura 17 - Comportamento da frequência cardíaca média durante a derrota ........................ 91
Figura 18 - Comparação da média da frequência cardíaca entre vitória e derrota .................. 91
Figura 19 A - Frequência cardíaca de repouso CF (final do campeonato paulista) ................ 92
Figura 19 B - Frequência cardíaca de repouso CR (final do campeonato paulista) ................ 92
Figura 20 A - Frequência cardíaca de repouso CF (24ª rodada do campeonato brasileiro) ... 93
Figura 20 B - Frequência cardíaca de repouso CR (24ª rodada do campeonato brasileiro) ... 93
Figura 21 A - FC durante o gol do Corinthians (tempo regulamentar) ................................... 94
Figura 21 B - FC controle gol do Corinthians (tempo regulamentar) ..................................... 95
Figura 22 A - FC oportunidade de gol perdida (1ª) ................................................................ 96
Figura 22 B - FC controle oportunidade de gol perdida (1ª) .................................................. 96
Figura 23 A - FC oportunidade de gol perdida (2ª) ................................................................ 97
Figura 23 B - FC controle oportunidade de gol perdida (2ª) .................................................. 97
Figura 24 A - FC oportunidade de gol perdida (3ª) ................................................................ 98
Figura 24 B - FC controle oportunidade de gol perdida (3ª) .................................................. 98
Figura 25 A - Comportamento da FC primeiro pênalti ......................................................... 100
Figura 25 B - FC controle primeiro pênalti ........................................................................... 100
Figura 26 A - Comportamento da FC quinto pênalti ............................................................ 101
Figura 26 B - FC controle quinto pênalti .............................................................................. 101
Figura 27 A - Comportamento FC sexto pênalti ................................................................... 102
Figura 27 B - FC controle sexto pênalti ................................................................................ 102
Figura 28 A - Comportamento FC oitavo pênalti ................................................................. 103
Figura 28 B - FC controle oitavo pênalti .............................................................................. 103
Figura 29 A - Comportamento FC no último pênalti e vitória corintiana ............................. 104
Figura 29 B - FC controle no último pênalti e vitória corintiana .......................................... 104
Figura 30 A - Comportamento FC frente ao gol sofrido pelo Corinthians ........................... 105
Figura 30 B - FC controle frente ao gol sofrido pelo Corinthians ........................................ 106
Figura 31 A - Comemoração da vitória pelos voluntários da final do paulistão .................. 106
Figura 31 B - Final do jogo da 24ª rodada do brasileirão ..................................................... 106
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Resumo do delineamento experimental ................................................................. 71
Tabela 2 - Depoimento dos voluntários acerca das suas percepções cognitivas de um estado
orgânico. Emoção autodeclarada ............................................................................................ 79
Tabela 3 - Comportamento da pressão arterial ao longo de cada dia de coleta ...................... 83
Tabela 4 - Níveis séricos de glicose ao longo de ambos os dias de coleta ............................. 85
LISTA DE ABREVIATURAS
ACTH Hormônio Adrenocorticotrófico
ANATORG Associação Nacional das Torcidas Organizadas do Brasil
ANOVA Análise de Variância
BAI Inventário de Ansiedade de Beck
BDI Inventário de Depressão de Beck
CBF Confederação Brasileira de Futebol
CF Coleta Futebol
CND Conselho Nacional de Desporto
CR Coleta Rotineira
CRH Hormônio Liberador de Corticotrofina
ELISA Ensaio de Imunoabsorção Enzimática
FA Football Association
FC Frequência Cardíaca
FCmáx. Frequência Cardíaca máxima
FIFA Federação Internacional de Futebol
HHA Hipotálamo - Hipófise - Adrenal
PA Pressão Arterial
SAG Síndrome de Adaptação Geral
SCCP Sport Clube Corinthians Paulista
SN Sistema Nervoso
SNA Sistema Nervoso Autônomo
SNC Sistema Nervoso Central
SNS Sistema Nervoso Simpático
TCLE Termo de Consentimento Livre Esclarecido
TO Torcida Organizada
USB Universal Serial Bus
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 17
CAPÍTULO I - Futebol, os contextos sociais, e os vínculos clubísticos ................................. 23
Enquanto isso no Brasil... ..................................................................................................... 30
O SCPP e a ascensão do futebol em São Paulo .....................................................................37
CAPÍTULO II - Os torcedores fanáticos de futebol e a fisiologia das emoções no futebol ... 46
Mas afinal, o que é emoção? E como é sua fisiologia na literatura? ................................... 51
CAPÍTULO III - Método da pesquisa de campo, análise dos dados, resultados e discussão . 67
População da Pesquisa ......................................................................................................... 70
Instrumentos para coleta de dados ....................................................................................... 71
Questionário para caracterização socioeconômico e do significado de torcer... .................. 71
Inventário de Ansiedade de Beck (BAI) .............................................................................. 72
Inventário de Depressão de Beck (BDI-I) ............................................................................ 72
Aferição da Pressão Arterial (PA) ........................................................................................ 73
Coleta de Glicose e Cortisol Salivar ..................................................................................... 73
Aferição da Frequência Cardíaca (FC) ................................................................................. 74
Relação da FC com as ações dos jogos ................................................................................. 74
Análise de Dados .................................................................................................................. 75
Resultado e Discussão ........................................................................................................... 75
Caracterização Socioeconômica da População da Pesquisa e Significado de Torcer .......... 75
Inventário de Ansiedade de Beck (BAI) e Inventário de Depressão de Beck (BDI-I) ......... 80
Análise do Comportamento de Marcadores Bioquímicos Periféricos .................................. 82
Pressão Arterial ..................................................................................................................... 83
Glicose Sérica ....................................................................................................................... 85
Cortisol Salivar .................................................................................................................... 86
Frequência Cardíaca ............................................................................................................. 89
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 108
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA .................................................................................... 110
ANEXOS ............................................................................................................................... 118
17
INTRODUÇÃO
A copa do mundo de futebol que aconteceu em junho e julho de 2018 transformou
aproximadamente 3 milhões de pessoas ao redor do mundo em espectadores de futebol (Os
números por trás da Copa do Mundo FIFA 2018. Disponível em:
<https://forbes.uol.com.br/negocios/2018/06/os-numeros-por-tras-da-copa-do-mundo-fifa-
2018/>. Acesso em: 11 ago. 2018.) que se deslocaram de suas casas para os 12 estádios,
reformados ou recém construídos, em regiões da Rússia Europeia e Asiática, durante todo o
torneio que durou 31 dias. No Brasil, a média de público pagante nos estádios durante o
campeonato brasileiro do mesmo ano foi de aproximadamente 18 mil espectadores por jogo, a
maior desde 1987. Um dos maiores clubes de futebol brasileiro, o Sport Club Corinthians
Paulista, apenas em 2018, teve a média de 31,5 mil pagantes em seus jogos; Arrecadou em
torno de R$ 59,3 milhões em vendas de ingressos, ficando atrás apenas do seu “arquirrival”
Palmeiras, também de São Paulo, que arrecadou cerca de R$ 79 milhões de reais, com a média
de ingresso mais caro do campeonato - R$ 67,00. Em 2017 no Brasil, havia cerca de 662 times
de futebol profissional filiados às federações de seus estados e à CBF, porém apenas 128 podem
fazer parte do ranking oficial brasileiro e participam de campeonatos anuais, com certa
visibilidade. Além disso, o futebol brasileiro conta com mais de 100 torcidas organizadas
associadas à Associação Nacional das Torcidas Organizadas do Brasil – ANATORG (Ação no
Congresso Nacional. Disponível em: <https://anatorg.com.br/x/acao-no-congresso-nacional/>.
Acesso em: 05 set. 2018).
Esse impressionante demonstrativo numérico relacionado a torcedores, jogos e
campeonatos futebolísticos em âmbitos nacional e internacional, exemplifica como o futebol é
hoje o esporte mais consumido em todo o mundo. Jornais, revistas, redes sociais, indivíduos
em conversas presenciais informais favorecem e amplificam a comunicação que envolve esta
modalidade esportiva, denominada por Eco (1984) como falação esportiva. A rede de
comunicação televisiva, que utiliza o processo simbólico existente no futebol e sua crescente
transformação em mercadoria1 para contribuir com uma visão fragmentada dos aspectos
constituintes do futebol e, ultimamente a rede mundial de computadores (internet), detém
grande parte das transmissões futebolísticas gerando em si um universo mercadológico quase
autônomo em torno da bola, das quatro linhas e de quem assiste ao futebol espetáculo
contemporâneo.
1Sobre a Mercadorização do futebol ver Martins (2017).
18
O futebol sistematizado e regulamentado surgiu oficialmente na Inglaterra no século
XIX como prática característica das escolas públicas inglesas no plano de formação de
cavalheiros cristãos aptos a cumprir o seu papel na administração e expansão do império
britânico. Este esporte foi exportado para diversos países e aportou no Brasil oficialmente por
volta de 1878 com um jovem descendente de ingleses chamado Charles Miller. A partir de
então a incorporação da sua prática na cultura nacional quase o afirma como propriedade
brasileira. O século XX no país foi o século do futebol e para além de uma paixão, o futebol é
um elemento indissociável da história brasileira recente. Sua prática exacerbada indica acima
de tudo que o povo brasileiro foi moldado para o futebol e que não só o futebol nacional é o
maior e melhor do mundo, como a população brasileira é a que mais entende deste esporte.
Afinal o Brasil é “A pátria de chuteiras”.
Perante a Educação Física, parece que passa despercebido que o marco temporal da
modernidade alterou estruturas de organização social responsáveis por determinar não só as
práticas corporais contemporâneas, mas em sobremaneira as experiências emocionais
vivenciadas pelos seres humanos. Segundo Elias (2011), o ser humano ocidental nem sempre
se portou como se observa na contemporaneidade. A civilização em que vivemos e que
aparentemente nos foi dada irretocavelmente acabada, chega a nós sem que perguntemos como
ela passou a ser nossa posse, nosso costume diário, nossa norma social.
Através de uma viajem no tempo, Elias (2011) nos convida a observar uma série de
figurações desenvolvidas a longo prazo, sem necessariamente uma direção definida, que indica
uma transição do período medieval para a modernidade, responsáveis por estabelecer a estrutura
social que conhecemos hoje em dia e que nos parece tão familiar. Neste contexto, o padrão de
comportamento humano, em atividades elementares, mudou lentamente a forma como os
indivíduos comportam-se e sentem.
A teoria do processo civilizatório tem como diretrizes dois aspectos distintos,
interligados e interdependentes entre si. O primeiro engloba o refinamento das boas maneiras e
dos comportamentos exigidos, assim como o autocontrole emocional no ambiente público em
favor das auto restrições, em prol de um convívio social ‘adequado’. O segundo, evidencia o
aumento das cadeias de interdependência, além de uma pacificação gradual mediada pela
construção e estabilização dos Estados, que tem como forma de governo a tributação e o
monopólio da violência (ELIAS, 2011).
O pensamento de Elias (2011) expõe que imposições externas para o controle social e
individual de atos violentos, assim como a assimilação destas normas sociais por cada pessoa,
são imprescindíveis para o processo histórico de complexificação das sociedades. Existe, neste
19
roteiro, um papel fundamental dos sentimentos de vergonha, delicadeza e culpa, do modo como
a sociedade exige e proíbe. Dos padrões de desagrado e medo socialmente instilados. Neste
sentido, Dunnig (2014), explica que a teoria do processo civilizatório nega o paradigma no qual
os humanos são seres racionais acima da natureza e solitários em relação uns aos outros. Em
contrapartida propõe o entendimento de que os seres humanos são uma espécie animal criadora
de símbolos, dependentes da linguagem, que, comparados a outras espécies, dependem menos
de instintos e mais da transmissão intergeracional de experiências aprendidas. Além disso, os
indivíduos são interligados de forma interdependente, concretizando assim figurações
dinâmicas entre si, constituintes do fato biossocial da vida.
Essas figurações não são apenas amontoados de átomos individuais. As ações de uma
pluralidade de pessoas interdependentes formam propriedades tais como as relações de força,
tensão, sistemas de classe, estratificação, guerras e os esportes (ELIAS, DUNNING, 1992).
No decorrer do século XVIII o conceito de esporte associou-se ao divertimento da
aristocracia e da pequena nobreza bretã, realizado durante o tempo livre. Já no século XIX,
representantes ingleses das classes médias industriais, empresariais e profissionais em
ascensão, passaram a reivindicar a possibilidade de executar este tipo de divertimento e
implementaram as formas mais reguladas da competição atlética (DUNNING, 2014). Assim, o
esporte em qualquer modalidade, refere-se a uma atividade de grupo organizada baseada no
confronto entre duas ou mais partes, que se encontram entrelaçadas de maneira sutil, com
formas de interdependência e cooperação, com regras conhecidas que definem o nível de
violência permitida, capazes de promover o sentimento de “nosso grupo e grupo deles (as)”.
Esta figuração de indivíduos não só facilita as tensões, como também as restringe, o que
gera “grupos de tensão controlada”. A excitação proporcionada pelas atividades esportivas é
dinamizada por meio de criação de tensões que imitam situações de vida cotidiana, porém sem
a presença de um perigo real. Sua manifestação pode ser mais agradável quando compartilhada
com outras pessoas, tendo em vista que os seres humanos têm menos oportunidades de
manifestarem sentimentos intensos em coletividade principalmente nas sociedades mais
desenvolvidas. Ademais, a excitação agradável ativada pela ocupação do tempo livre com
atividades esportivas e a expressão emocional vivenciada nestes espaços, podem ser
consideradas como uma maneira de libertação das tensões cotidianas, preconizando o
enfrentamento com êxito da rotina maçante das sociedades industrializadas e como um
ambiente de produção de tensões específicas que carecem de investigação (ELIAS, DUNNING,
1992).
20
Até os dias de hoje o quadro fisiológico da excitação central e periférica foi estudado
quase inteiramente a propósito da fome, do medo, da raiva e, em geral, como uma reação
específica ao perigo súbito. Porém, o que realmente sabemos sobre a síndrome da excitação
associada ao prazer esportivo? Sobre a excitação espontânea e elementar que provavelmente
tem sido inimiga da vida ordeira ao longo da história humana, o tempero de todas as satisfações
próprias dos divertimentos (ELIAS, DUNNIG 1992).
Para realização desta investigação nos “apropriamos” de uma parte bem definida das
obras de Norbert Elias e Eric Dunnig: O processo civilizador (ELIAS, 2011), Sociologia dos
esportes e os processos civilizatórios (DUNNING, 2014) e A busca pela excitação (ELIAS,
DUNNIG, 1992). Assim como uma gama de estudos fisiológicos acerca das emoções
(CANNON, 1927; PAPEZ, 1937; SELYE, 1950; LeDOUX, 2012). Essa escolha nos
proporcionou uma apreciação teórica sobre o processo civilizatório no ocidente, como este
processo interfere na necessidade de lazer e as formas de concretiza-lo, além de ter nos
fornecido o conhecimento de como os estímulos excitatórios desencadeiam respostas orgânicas
especificas, afim de associar uma emoção percebida e auto relatada, a um estado orgânico
representado por marcadores fisiológicos periféricos.
O complexo contexto esportivo quando utilizado como ambiente de coleta de dados na
exploração das relações sociais, tais como competição, conflitos, pertencimento e harmonia,
nos induz a enxergar uma pluralidade de conhecimentos indissociáveis presentes na
constituição humana orgânica-social. A teoria multidisciplinar das emoções a que Elias e
Dunning (1992) se referem, nos incita a identificar o significado do esporte em suas esferas
sociais, psicológicas e fisiológicas, no que diz respeito a busca pelo prazer para a quebra da
rotina, através de um conflito simulado chamado futebol.
O inquérito sobre a estrutura dos fatos que desencadeiam satisfação máxima e mínima,
em associação à dinâmica individual que conduz a um maior ou um menor prazer na
participação dos indivíduos como espectadores futebolísticos, fornece o critério para encontrar
quais e de quais modos os aspectos fisiológicos de prazer e excitação são diferentes perante
jogos de nível ótimo e aqueles que estão no limite oposto da escala (ELIAS, DUNNING, 1992).
“Existem poucos lugares onde o ser humano pode alcançar um estado de excitação
emocional com a própria química do corpo, obtendo as misturas de adrenalina,
endorfinas e catecolaminas.” (BREIVIK,2010 p. 1)
Ao perceber, conscientemente ou não, um estímulo excitatório, também chamado de
estímulo estressor, o ser humano avalia o significado e a relevância deste fenômeno de acordo
com seu contexto, experiencias passadas e cadeias de sinalização especificamente ativadas,
21
promovendo assim um significado cognitivo a este estado global do organismo, sendo então
capaz de auto relatar uma emoção associada (DEAK, 2011; LeDOUX, 2012b).
Um estímulo considerado estressor é usualmente definido como um estado real ou
percebido de ameaça a homeostase, ou seja, aquele capaz de desencadear um conjunto de
repostas, mentais, psicológicas e/ou comportamentais, relacionadas com mudanças fisiológicas,
que acabam resultando em hiperfunção da glândula adrenal e do sistema nervoso autônomo
simpático. Esta vasta associação de respostas é conhecida como resposta ao estresse. Neste
mecanismo, o fator liberador de corticotrofina desempenha papel crucial, atuando na regulação
do eixo Hipotálamo – Hipófise – Adrenal (HHA) o que desencadeia uma cascata regulatória
que culmina na liberação de glicocorticoides do córtex adrenal. O Cortisol é um dos
glicocorticoides humano mais importantes já evidenciado pela ciência (SMITH, 2006), de fácil
coleta, transporte e armazenamento e com relativo baixo custo para análise.
A complexa interação dos eixos Hipotálamo – Hipófise – Adrenal e simpático-adrenal,
recrutada pelo organismo frente a uma situação desafiadora, age conjuntamente para provocar
alterações metabólicas fundamentais na mobilização de substratos energéticos para o sistema
nervoso central (SNC) e tecidos musculares. Induz a glicogenólise, lipólise e proteólise, além
de reduzir a captação de glicose por tecidos não essenciais frente a exposição ao estímulo
estressor com a finalidade de preparar o organismo para uma reação. Diante deste contexto,
ocorre também a modulação do sistema cardiovascular, por meio do aumento da frequência
cardíaca e pressão arterial, além da regulação para vasodilatação e vasoconstrição de acordo
com a necessidade de distribuição sanguínea (SELYE,1950; TANNO, 2002).
As várias ciências permitiram que adquiríssemos incontáveis certezas ao longo da
evolução nos métodos de coleta, organização e análise de dados, porém, igualmente nos
presentearam com inúmeras zonas de incertezas. A desagregação do conhecimento por meio
das disciplinas e especialidades interferiu negativamente na compreensão do que significa ser
humano em nossa individualidade, coletividade, subjetividade, simbolismos, situações
dolorosas e prazerosas. A reunião de conhecimentos dispersos nas ciências naturais, humanas
e filosóficas, evidenciará a identidade complexa e comum de tudo que envolve o que é ser
humano (MORIN, 2011).
Assim, diante da observação das características de tensão-excitação dos jogos de futebol
televisionados e assistidos pelos voluntários, bem como do auto relato acerca das emoções
conscientemente percebidas para situações especificas das partidas e da coleta acerca do
comportamento de marcadores fisiológicos periféricos classicamente associados a fisiologia
22
das emoções, desenvolvemos este estudo no intuito de compreender os aspectos
interdependentes da fisiologia das emoções dos torcedores fanáticos de futebol.
O objetivo geral deste trabalho foi iniciar uma nova linha de pesquisa na área da
Educação Física: A fisiologia das emoções nos esportes. Traçamos como objetivo específico
relatar o significado do torcer e o nível de ansiedade momentâneo dos torcedores fanáticos do
Sport Club Corinthians Paulista, por meio de inventários específicos e medição de marcadores
fisiológicos periféricos, tais como: Pressão arterial, Glicose sérica, Cortisol salivar e Frequência
cardíaca. Para tal, o comportamento destes marcadores relacionados à fisiologia das emoções
foi descrito e a elevação da FC acima de 50% da máxima calculada para cada indivíduo, foi
correlacionada a momentos do jogo, em dois clássicos entre Corinthians e a Sociedade
Esportiva Palmeiras, principal arquirrival dos corintianos, disputados no ano de 2018,
respectivamente nos meses de abril e setembro.
A tese está organizada em Capítulo I denominado de “Futebol, os contextos sociais e os
vínculos clubísticos”, que trata sobre o desenvolvimento da modalidade esportiva futebol no
mundo e sua chegada ao Brasil. A apropriação cultural desta prática no nosso país, a expansão
dessa experiência esportiva, seus significados e associações com a sociedade de indivíduos,
além de relatar um pouco sobre o nascimento do Sport Club Corinthians Paulista e sua história.
Ainda, descreve sobre as relações interpessoais desenvolvidas pelo viés do futebol, os
simbolismos exacerbados pela prática futebolística e as figurações identitárias atreladas a um
clube de futebol.
O capítulo II - “Os torcedores fanáticos de futebol e a fisiologia das emoções no
esporte”, trata sobre a classe de indivíduos denominada torcedores de futebol no Brasil, a
diferença entre os fanáticos e os não fanáticos, culminando nas teorias acerca da fisiologia das
emoções. Neste sentido, o capítulo II apresenta uma revisão bibliográfica sobre esta teoria,
destaca aspectos importantes sobre a resposta a um estímulo excitatório, utiliza o mecanismo
de resposta ao estresse como base teórica para a fisiologia das emoções nos esportes e destaca
os marcadores fisiológicos utilizados na coleta de dados.
O capitulo III – “Método da pesquisa de campo, análise dos dados, resultado e
discussão” apresenta a metodologia utilizada para a coleta dos dados e disserta sobre os achados
da pesquisa relacionando-os com as teorias sociológicas de Elias e Dunning assim como as
teorias fisiológicas que fundamentam este trabalho.
23
CAPÍTULO I
FUTEBOL, OS CONTEXTOS SOCIAIS, E OS VÍNCULOS CLUBÍSTICOS
Sou cearense, torcedora do Fortaleza Esporte Clube desde a adolescência. Fato este
contrário a vontade do meu pai, torcedor do Ceará Sporting Club, mas muito relacionado a
paixão juvenil que senti por um colega de escola, membro da Torcida Uniformizada do
Fortaleza. Ocasionalmente frequento estádios, para assistir não só aos jogos do ‘meu’ time,
afinal gosto da dinâmica de tensões que envolve o confronto esportivo. Em agosto de 2017
encontrei em um templo religioso de Campinas - SP uma soteropolitana de criação, que nasceu
no Rio de Janeiro e passou a residir com toda sua família em salvador aos 3 anos de idade e,
um baiano de nascimento, residente em Juazeiro do Norte, interior da Bahia. Pertencentes a
gerações distintas, nunca haviam se encontrado. Deu-se então o início de uma conversa
introdutória, digna dos começos das relações sociais. Em meio a apresentação das afinidades,
ouvi por alto:
Ah! Você torce para o Bahia?!”
“Claro que sim!”
De forma uníssona, seguiu-se:
“Somos da turma tricolor!
Somos da voz do campeão!
Somos do povo o calor.
Ninguém nos vence em vibração.
Vamos, avante esquadrão.
Vamos, serás o vencedor.
Vamos conquistar mais um tento.
BAHIA! BAHIA! BAHIA!
Ouve esta voz que é teu alento.
BAHIA BAHIA BAHIA!”
(Gargalhadas.)”
Ou seja, declamaram o hino do Bahia, demonstrando a dimensão alcançada pelo futebol.
Nos inimagináveis espaços de convivência interpessoal, a possibilidade da modalidade
esportiva denominada futebol ser trazida como um assunto em algum momento, existe e não é
pequena. O livro clássico de Norbert Elias e Eric Dunning, A busca pela excitação (1992), nos
lembra a afirmação de Laurence Kichin, a qual sustenta a máxima de que o único idioma comum
para além da ciência, é o futebol. À medida que o assunto futebol é estabelecido em alguma das
múltiplas situações sociais, é fácil observar a comoção causada. Alguns defendem a posição de
24
reafirmar o valor desta modalidade esportiva em seus diversos níveis, outras pessoas
argumentam que a vivência que envolve este espetáculo contemporâneo não é tão positiva a
ponto de ser exacerbada. Outros ainda, serão enfáticos em se ausentarem das discussões, que
para tantos são demasiado exaustivas. O fato é: O futebol é um dos, senão o esporte mais
popular do mundo (figura 1) (ELIAS, DUNNING, 1992; MURPHY et al, 1994; MACHADO,
2005; LOPES e REIS, 2014).
Figura 1 - Popularidade do Futebol
Figura 1. Representação da popularidade mundial do futebol moderno. Fonte: Instagram
@Imagens.História.
A Grã-Bretanha, e em parte a Inglaterra, são os países de onde se originaram a maioria
dos esportes modernos. De fato, a origem do próprio termo sport em suas diversas pronuncias
e composições gráficas, pode ser atribuída também a este território, ao passo que o termo sport
se tornou tão intraduzível em outras línguas, quanto outras expressões particulares da língua
inglesa, tais como o termo gentleman. Além disso, por volta do século XIX houve a tentativa
de banir esta expressão na língua francesa, a fim de manter a integridade linguística desta parte
da Europa. Eric Dunning em Sociologia dos esportes e os processos civilizatórios (2014)
apresenta uma elegante discussão sobre a evolução da palavra esporte, suas especificidades e
ao que se relaciona à sua prática, tendo sempre como trama teórica fundamental a sociologia
figuracional de Norbert Elias (2011).
Na teoria apresentada em O processo civilizatório2, Elias (2011) nos convidou, por meio
de uma viagem no tempo, a observar hábitos cotidianos dos indivíduos nas sociedades
ocidentais da idade média e da época moderna (séculos XII ao XVIII). Comparando aspectos
2Para uma compreensão adequada da teoria de Norbert Elias (2011) a tradução para o português de civilizing e
civilizing process deve ser para civilizatório e processo civilizatório (DUNNING, 2014)
25
alimentares, reprodutivos, de higiene e de divertimento, o autor defendeu que os ingredientes
contidos no processo civilizatório valorizam o desenvolvimento da racionalidade em oposição
ao corpo e a emoção. Com uma descrição detalhada, Elias (2011) ilustra a transformação do
alimentar-se, do excretar e do reproduzir-se; o incremento da gentileza, da cortesia e da
urbanidade, como comportamentos exigidos por grupos sociais vistos como mais nobres. Além
de evidenciar o aumento das cadeias de interdependência e de uma gradual pacificação mediada
pela construção, estabilização e monopolização da violência pelos Estados.
O período de transição dos Estados feudais para os Estados dinásticos e para os Estados
Nação urbano industriais, foi vivenciado de maneira conflituosa, a disputa entre a realeza e a
burguesia pelo poder de decisão e controle social se manifestava na política e por meio de.
Durante o conturbado séc. XVII a monarquia Britânica buscava se impor à burguesia sobretudo
no que diz respeito à soberania católica, a reivindicação monarca ao poder absoluto e ao
recolhimento de tributos sem a anuência do parlamento, o que configurou um sério desafio a
autoridade do Estado e deflagrou um ciclo intenso de violência revolucionária e contra
revolucionária (DUNNING, 2014).
No decorrer de dois séculos contudo, o monopólio estatal inglês foi reestruturado sob
condições específicas e a burguesia passou a ter condições de adquirir títulos de nobreza e
desfrutar de uma autonomia sem precedentes. Membros das altas castas da Europa ocidental,
principalmente da Alemanha, França e Inglaterra, se viram pressionados a exercitar o
autocontrole emocional inclusive no embate político. Reis, rainhas, príncipes, duques e os
nobres emergentes espelhavam nas suas relações, os códigos de cortesia, civilidade e civilização
que deveriam ser seguidos e praticados por todos, para que fosse concretizado o que era
outorgado como um bom comportamento pessoal (DUNNING, 2014).
O fato de os seres humanos terem incorporado um padrão de moral e costumes restrito,
considerado adequado aos tempos que se estruturavam e que deveria ser seguido pelos sujeitos
que desejassem se integrar a esta nova forma de se relacionar, principalmente no tocante ao
autocontrole emocional no ambiente público e, as auto restrições em prol de um convívio social
‘adequado’, foi imprescindível para o processo histórico de complexificação de todas as
sociedades ocidentais. Estes aspectos moldaram uma linha curva, sem necessariamente uma
direção previamente definida, que nos trouxeram ao contexto socioeconômico cultural que
vivemos agora (ELIAS, 2011).
Entretanto, esta almejada moralidade não parece ter sido adquirida por outra maneira
senão pelo sacrifício da repressão orgânica, como a adoção de uma postura ereta, a substituição
do sentido do olfato pela visão, ou ainda, transmitida pela noção de punibilidade e do
26
sentimento de culpa, repetida exaustivamente a cada geração que nasce, até que se constituísse
em uma memória coletiva, capaz de marcar cada indivíduo como um programa de atuação,
governando suas ações ao custo da dor de um efetivo domínio das emoções. Toda criança, até
os dias de hoje, passa por este processo de transformação, até que se torne gradualmente
internalizado por um agente mental especial, regulador das suas ações - o superego.
Exclusivamente por esse meio, este novo ser humano se torna um ser moral e social, veículo da
civilização. De fato, também pode ser entendido por civilização, a relação entre o conhecimento
adquirido pelo ser humano de extrair riquezas da natureza a fim de satisfazer seus desejos e
necessidades, bem como a criação de regulamentos para ajustar a distribuição e a manutenção
dessas riquezas. (CARVALHO, 2013; ELIAS, 2011; FREUD, 1969).
Ademais, pode-se entender deste contexto, que a maioria das pessoas teve que se
restringir em suas pulsões primárias para a consolidação desta civilização, que aparentemente
foi imposta a uma maioria resistente, por uma minoria que entendeu como obter a posse dos
meios de coerção. Assim, a civilização, seus regulamentos, instituições e ordens investem
contra a satisfação dos impulsos humanos (FREUD, 1969).
Estas repressões emocionais e expressivas são representantes de uma estrutura particular
de relações humanas que é geradora e gerada por um alicerce social peculiar, onde os
comportamentos são condicionados pelo desejo orgânico de diferenciação e pertencimento a
alguma tradição, além de serem exercitados por uma sociedade de indivíduos que reforça uma
autoimagem específica em suas múltiplas escalas. Neste sentido, na Inglaterra dos sec. XVII e
XVIII integrantes das classes superiores manifestavam seu desejo consciente de superioridade
social por meio de um processo sutil de distinção, impondo ações que almejavam o controle
social e individual de atos violentos, assim como a recomendação de maneiras específicas para
se comportar em público ou não.
À medida que a expressão pública e livre das emoções foi taxada como imprópria, houve
o fortalecimento do uso da argumentação para o embate político e os confrontos físicos para
resolução de conflitos pessoais, assim como as formas de divertimento da elite, passaram a ser
menos impulsivas e mais regradas. Aos grupos sociais em Ascenção, tal qual já era à realeza,
foi permitida a liberdade de associação, o que possibilitou a formação de partidos políticos,
clubes e associações independentes, com grandes reuniões e assembleias, algumas de finalidade
esportivas. Estas atividades se baseavam em regras escritas e procedimentos efetivos de
controle coletivo e individual, principalmente no que se referia a contenção de casos explícitos
de violência, a uma tentativa de equiparação das possibilidades de vitória para cada praticante
ou grupo de participantes e, fundamentalmente, no caso de associações esportivas, a busca pela
27
regulação das apostas vinculadas ao boxe. A ‘esportivização’ dos passatempos ingleses comuns
no século XVIII e o significado deste processo correspondeu a uma importante mudança da
estrutura social Inglesa, correlata a parlamentarização dos conflitos políticos e ao aparecimento
de alternativas menos violentas para os impasses individuais e coletivos (DUNNING, 2014).
De acordo com Dunning (2014), a palavra sport, oficialmente começou a ser utilizada
como característica expressiva e distintiva da aristocracia e da pequena nobreza britânica
(proprietários de terra sem título nobre), nos séculos XVII e XVIII, ao se referirem a quatro
modalidades de divertimento específicas: corridas de cavalo, críquete, boxe e caça à raposa.
Derivada de uma expressão anglo-francesa, o desporter significava distrair-se, deixar-se levar
pelo deleite prazeroso. Durante o século XVIII, caçadores praticantes da caça à raposa passaram
a utilizar a expressão ‘A raposa nos proporcionou um bom esporte esta manhã’ (DUNNING,
2014. p. 171). O significado da palavra esporte passou a definir uma espécie de jogo, um tipo
de divertimento no qual os elementos violentos necessitavam de maior controle. Um hábito
saudável, divertido e socialmente valioso, com função social primordial de produzir, prolongar
e finalmente consumar o prazeroso par: tensão – excitação (DUNNING, 2014).
Desta maneira, esportes são confrontos que envolvem capacidades biomotoras bem
desenvolvidas ou proezas físicas e estratégias do tipo não militar, que incitam nos praticantes
ou naqueles e naquelas que os assistem, a adoção de um tipo de comportamento característico
do ambiente esportivo e ainda a vivência e a expressão intensa, muitas vezes coletiva, das
próprias emoções (situação cada vez mais escassa na civilização moderna ocidental). Além
disso, vários tipos de esportes têm em sua constituição o elemento da competição, marca
característica da sociedade moderna. (DUNNING, 2014).
A título de familiaridade e no intuito de favorecer a aceitação de algo em maior grau,
nós seres humanos, temos a tendência de buscar associações com fatos anteriores. Sendo assim,
é possível facilmente associar a estrutura moderna do futebol a alguns tipos de jogos medievais
conhecidos por inúmeros nomes incluindo uma pronúncia parecida com football. Nestes jogos,
o implemento central do confronto físico coletivo, a ‘bola’, podia ser transportado de diversas
maneiras inclusive pelo chute. Não havia equiparação de participantes, as orientações que
delimitavam a prática eram transmitidas oralmente e acordadas entre os participantes do evento
naquele momento e lugar. Esses ritos eram também uma oportunidade para ingestão demasiada
de bebidas alcoólicas e muitos dos participantes “estavam ostensivamente em busca de
oportunidades de se envolver em brigas” (DUNNING, 2014. p. 189).
Com o passar do tempo, estas formas antigas de passatempos foram se tornando cada
vez mais esporádicas e menos praticadas ao ponto que as formas mais modernas de futebol,
28
mais regradas, foram sendo desenvolvidas e disseminadas principalmente durante o início das
escolas públicas de período integral inglesas – justamente porque o princípio central das
atividades físicas civilizadas foi a diminuição da violência utilizada pelos praticantes.
Estabelecidas inicialmente como instituições de caridade para educação de jovens pobres e
carentes, as escolas públicas inglesas logo se transformaram em ambiente educativo para
estudantes oriundos de famílias abastadas. Deste modo a diferença de classe social entre
professores, pertencentes a classe média, e de seus pupilos, pertencentes às classes ricas,
interferia diretamente na capacidade de controle dos docentes para com seus estudantes. Os
jovens nobres dispunham de um elevado grau de independência estrutural, culminando em uma
intensa falta de disciplina e uma disputa crônica de poder entre docentes e discentes, sem efetiva
supremacia de nenhuma das partes (DUNNING, 2014).
Diante deste contexto, deu-se então uma forma de controle dividido. No intuito de
estabilizar a autoridade docente e certificar um certo poder discente, estabeleceu-se um tipo de
hierarquia entre os estudantes, que era posta prioritariamente pelas diferenças de idade e de
força física. Os estudantes mais velhos passaram a ter certo nível de legitimidade em sala de
aula em troca de reconhecimento do seu direito de “monitor”. Este sistema de ‘sujeição ao
monitor’ teve papel crucial no desenvolvimento inicial do futebol moderno nas escolas públicas
inglesas (DUNNING, 2014).
O confronto esportivo era uma das maneiras pelas quais os estudantes mais velhos
(veteranos) impunham seu domínio sobre os colegas mais jovens (calouros) ou mais
desprovidos de habilidades físicas. Posto que neste estágio todas as formas registradas de
futebol eram brutais, o futebol das public schools ainda era regido por regras orais, muitas vezes
sem consonância no número de participantes, outras vezes com estudantes mais fracos restritos
a atividades de proteção ao gol.
Ainda no século XVIII, as organizações corporativas artesanais e comerciais foram
gradativamente sendo substituídas por novas forças sociais e econômicas: os industriais, uma
classe média e o operariado urbano. O avanço do capitalismo industrial como modo de
produção dominante foi desestruturando tanto os fundamentos da vida material, como as
crenças e princípios religiosos, morais, políticos, jurídicos e filosóficos em que se sustentava o
antigo sistema. A presença de uma nova sensibilidade, atitudes, comportamentos e valores,
provocou intenso êxodo de famílias rurais para as cidades, em busca de trabalho. A área urbana
acenava uma possibilidade de liberdade, proteção e melhores ganhos, embora esta realidade
não fosse para todos. As cidades receptoras desse fluxo contínuo de pessoas foram crescendo
29
acelerada e desordenadamente e, a fábrica moderna criara a cidade industrial (LOPES, 2008;
QUINTANEIRO, 2009).
Houve então, durante o séc. XIX, o segundo momento da apropriação do processo de
surgimento do sport moderno. Os representantes das classes médias industriais, empresariais e
profissionais em ascensão, passaram a disputar o acesso ao esporte com as classes de
proprietários rurais na vanguarda de sua prática. Como no trabalho industrial, no esporte
surgiram as formas mais reguladas de competição atlética. As medições e registros minuciosos
de espaço/ tempo no desempenho esportivo também se tornaram cada vez mais importantes e
as ferramentas desenvolvidas pela ciência moderna na busca pelo conhecimento, se aliaram ao
controle da prática esportiva. Além disso, houve o desenvolvimento inicial dos jogos de bola
tais como rúgbi, hóquei, tênis e futebol.
Aproximadamente entre 1830 a 1860, as classes urbanas industriais passaram a ter mais
poder do que as classes rurais, neste contexto agravaram-se as pressões para a reforma da
educação pública, que viu no sistema de sujeição ao monitor uma ferramenta eficiente na
execução do plano de produzir cavalheiros cristãos aptos a administrar e manter o império
britânico em expansão. Parte da tática era convencer os estudantes mais destacados que o sport
teria propriedades na formação do caráter individual, por tanto, a maneira violenta com a qual
se dava a sua prática, se tornaria inviável diante da nova sociedade que se formava. A
transformação deste esporte para adequação à estratégia da reforma disciplinar no momento
outorgada, contou primeiramente com a criação das regras escritas do futebol em 1845 – por
ex-estudantes das public schools, a mais antiga série de regras sobrevivente ao tempo que se
tem conhecimento (DUNNING, 2014).
Aproximadamente por volta de 1859, os jogos embrionários do futebol começaram a
extrapolar os muros das escolas e das universidades passando a se embrenhar no cotidiano
social britânico. ‘O culto aos jogos da escola pública’ (DUNNING, 2014 p.195) possibilitou a
difusão do futebol no âmbito nacional. Diante desta expansão, tornou-se notória a necessidade
de uma regulamentação única, clara e amplamente divulgada das regras que passaram a reger a
prática esportiva desta modalidade. Em decorrência disto, foi sugerido a criação do ‘parlamento
do futebol’ em 1863 e um conjunto de regras que proibiam carregar a bola ou interceptar o
adversário com as mãos, foi esboçado pelo comitê de estudantes que jogavam futebol na
Universidade de Cambridge. A posteriori, deram-se início aos primeiros encontros da Football
Association (FA), nos quais o argumento do jogo se tornar mais ‘civilizado’, a fim de agradar
os adultos das classes altas ganhou voz, e as regras a priori descritas em Cambridge se tornaram
mais populares.
30
A codificação das regras do futebol, como boa parte de sua história, simboliza um
pensamento único emergente em conjunto com ações que almejavam fortalecer, expandir,
impor e dominar os aspectos do proposto conceito. Segundo Damo (2007), entre os motivos
que levaram a codificação das regras do futebol estavam a necessidade de diferenciação da
prática esportiva dos jovens londrinos, para com as outras práticas no restante do país e, a
também necessidade dos integrantes ou egressos das escolas públicas inglesas se tornarem
referência nesta nova forma de cultura (DUNNING, 2014).
Uma vez regradas e codificadas, as várias maneiras de se praticar esportes transpuseram
características locais e conquistaram adeptos das mais diversas particularidades. A partir desta
incorporação do esporte pela amplitude do território do Reino Unido, houve uma incorporação
da sua prática pelo mundo todo e a partir do final do século XIX e início do século XX algumas
ações foram implementadas a fim de aperfeiçoar as organizações internacionais de futebol. A
Fédération Internationale de Football Association (FIFA) foi formada em Paris no ano de 1904
sem representantes britânicos, que apenas se envolveram com o projeto de internacionalização
do futebol dois anos mais tarde, dando início a uma novela de filiação e desfiliação, que durou
até 1945, quando finalmente a Inglaterra filiou-se permanentemente.
Enquanto isso no Brasil...
Durante o século XIX, houve etapas distintas do processo civilizatório no Brasil. O país
se encontrava em um nível de desenvolvimento social diferente das sociedades do continente
europeu e se caracterizava pela existência de grupos oligárquicos possuidores de grandes
quantidades de terra, de diferentes gêneros agrícolas, com diferentes interesses políticos,
econômicos e sociais, o que formava uma estrutura econômica predominantemente agraria, com
grande parte da população sem participação na política nacional, por serem escravos ou servos
(SAES, 1982).
Em meados deste mesmo século, em meio a abolição da escravatura (1888) e a
proclamação da república (15 de novembro de 1889), houve um longo período de crescimento
das importações do café em detrimento a produção de subsistência do produto, fato que
contribuiu para a diminuição das atividades de economia rural, agrícolas ou manufatureiras.
Por decorrência deste desenvolvimento industrial e do crescimento do transporte ferroviário no
estado de São Paulo, uma nova cidade se moldou. A substituição do trabalho escravo pelo
trabalho ‘livre’, principalmente o do imigrante, a crise do comercio exterior, a diminuição da
capacidade de importação e as tarifas alfandegarias impostas aos produtos importados,
proporcionaram amplo surgimento de fábricas nacionais empenhadas em se apropriar, em parte,
31
da demanda preexistente para consumo de bens industriais, fornecendo a substituição de
produtos advindos das importações, por produtos da nova indústria nacional (SAES, 1982;
LOPES, 2008).
Com isso, houve uma reorganização geográfica e de estratificação social no Brasil,
surgindo as classes médias e populares, situadas em áreas urbanas, relativamente vinculadas às
condições sociais, econômicas e políticas que antecederam às suas consolidações. A população
cresceu exponencialmente, devido principalmente a imigração europeia, no intuito de
embranquecimento da população nacional. Os imigrantes partilhavam das mesmas
circunstâncias do operariado local, com condições rudimentares de desenvolver suas tarefas,
horas de desempenho profissional abusivas e remuneração aquém do necessário para uma
existência saudável. Na moradia, havia, para consolidar uma segregação econômica, uma
separação geográfica entre as residências do operariado e da elite. Os espaços urbanos estavam
sendo hierarquizados e claramente demarcados de acordo com a classe econômico-social a qual
se pertencia. Principalmente a sociedade do sudeste brasileiro estava crescida e vivenciava o
surgimento de novos setores e atores/atrizes sociais (SAES, 1982; LOPES, 2008).
No período entre 1890 e 1900, a política de desenvolvimento industrial facilitou a
implementação de fábricas em diversos locais no país, além de reforçar o rápido aumento da
população urbana em detrimento às oportunidades de trabalho profissional. Existiu então uma
composição de mercados internos nos centros urbanos emergentes, onde localizavam-se as
atividades culturais (SAES, 1982; LOPES, 2008).
O trabalho profissional moderno, afazer remunerado, cotidiano e regrado, se fortaleceu
como vital para a existência na sociedade urbana, não apenas pela necessidade de algum nível
de participação nos meios de produções destinados a manutenção da própria vida na cidade,
mas sobretudo pela vontade de ascensão socioeconômica e de pertencimento a classe dos
‘merecedores’. Nesta perspectiva, o trabalho foi instituído como um dever moral que nas
sociedades industrializadas, se refere a uma forma específica de ganhar a vida: remunerada,
altamente especializada, com o tempo de execução rigorosamente regulado, que conduz
consigo um juízo de valor muito caro, exaltado e pessoalmente incorporado como uma medida
pela qual as pessoas são predestinadas a salvação (GOMES, 2015, WEBER, 2009).
Desta maneira, a execução do trabalho profissional moderno se interlaçou com a forma
de existir dos indivíduos em sociedade, sendo estrutura fundamental no sistema produtivo, nas
relações interpessoais e nos múltiplos meios de organização dos fluxos e jeitos de vida no
transcorrer do cotidiano. Porém, a esfera do trabalho é apenas uma das dimensões que
reivindicam a subordinação ordenada e equilibrada dos sentimentos pessoais. A rotina global,
32
com suas respectivas restrições, promoveu condições de ordem e segurança socioeconômicas,
seguramente capazes de causar uma pobreza de emoções (SANTOS, 2013; GOMES, 2015;
ELIAS, DUNNING, 1992; WEBER, 2009).
Assim como o manual de comportamento elaborado por Rotterdam na Europa do séc.
XVI (Da civilidade em crianças), o Brasil também desenvolveu seus modelos escritos de boas
maneiras, os quais expandiram suas orientações para além do comportamento social humano e
englobaram também o desenvolvimento físico dos jovens brasileiros. O Compêndio de
Pedologia de autoria do Mons. Pedro Anísio (1937) traça consideráveis diretrizes para a
solidificação da civilidade dos púberes na paraíba do século XX. O termo faz extenso uso do
conhecimento acerca da juventude em suas esferas fisiológicas, higiênicas e comportamentais,
no que diz respeito ao papel de educador dos adultos nas escolas ou no contexto familiar. No
plano de pedagogia integral proposto por Anísio (1937) a formação dos jovens perpassa
indiscutivelmente pela atividade física e pela corporeidade. De forma restritiva e controladora,
o jovem brasileiro ia sendo transformado em agente da civilização por meio da contenção não
só das emoções e dos costumes, mas também e principalmente, da ação motora decorrente dos
estados emocionais. O gesto calculadamente executado passou a ser requerido para aceitação
social do indivíduo (LUCENA, 2016).
O crescimento das economias industrializadas, a criação dos sistemas políticos
modernos e a supervalorização do pensamento científico, assim como da produção tecnológica,
fizeram-se fundamental nas estruturas sociais que hoje desempenhamos (SAES, 1982; LOPES,
2008; SANTOS, 2008). Neste sentido, as exigências da vida moderna acabaram por sujeitar
homens e mulheres à uma frequente situação de conflito, ansiedade e desequilíbrio emocional.
(ARALDI-FAVASSA, 2005).
Diante de uma comunidade social cada vez mais industrializada, modelada pelos hábitos
modernos, pelo monopólio da força detida pelo Estado, com regras explicitas para viver o
cotidiano e pelo autocontrole assimilado tendendo sempre a auto restrição, as transformações
das dinâmicas de tensão se tornaram relativamente paulatinas. Porém, até onde se pode
mensurar, grande parte das sociedades humanas produz algum tipo de medida destinada a
amenizar as pressões geradas por elas próprias, as quais permitem, de maneira geral, a fluência
dos sentimentos de qualidade animadora em diversos níveis. Ou seja, autorizam a excitação
agradável (ARALDI-FAVASSA, 2005; CARVALHO, et al 2013 ELIAS, DUNNING, 1992;
ELIAS, 2011).
Neste sentido, alguns brasileiros entraram em contato com as práticas de lazer trazidas
pelos imigrantes europeus e o uso prazeroso e não obrigatório do tempo livre passou a fazer
33
parte da rotina do trabalhador industrial moderno, possivelmente como uma das formas de
ruptura saudável da rotina (ELIAS, DUNNING, 1992; GOMES, 2015; NEGREIROS, 1992).
Dentro desses modos de aproveitar o tempo livre, a dinâmica de tensão – excitação,
baseada em confronto físico, concebida para a competição – marca da metrópole moderna –
regulamentada para a finalidade de conter a violência e equiparar as possibilidades de vitórias
entre os participantes, que os ingleses denominaram de sport, fez muito sucesso entre os locais.
A priori, revestidos de curiosidade, os cidadãos observavam e praticavam diversas modalidades
esportivas. Posteriormente, caso a atividade produzisse mimeticamente dinâmicas dos níveis
entre tensão e excitação agradáveis o suficiente para determinado grupo de pessoas, poderia se
transformar em moda, atraindo cada vez mais praticantes e espectadores. Por fim, caso
persistisse a prática após algum tempo, poderia se consolidar como atividade de lazer esportivo
(ELIAS, DUNNING, 1992; NEGREIROS, 1992).
Nos periódicos da época, diferentes tipos de discurso defendiam e incentivavam a
prática esportiva como formadora do ‘homem’ em seu mais amplo sentido. Por vezes era
salientado o nível de desenvolvimento dos esportes nos países mais industrializados e mais
civilizados, a fim de servir como exemplo a ser seguido pela população brasileira, paulistana.
Além disso, era amplamente incentivado pelos cronistas e dirigentes esportivos, o intercâmbio
com países que praticavam os esportes a mais tempo. Os brasileiros mais capitalizados, em
visitas ao exterior, se deparavam com centros esportivos bem organizados. Os estrangeiros eram
recebidos com o anseio por aprendizado. A cada nova prática inaugurada, havia o gosto para
explicar detalhadamente os passos necessários para execução do novo jogo através dos meios
de comunicação da época. Contudo, o termo esporte só foi redigido oficialmente em algum
texto de conformidade legal no intuito de fortalecer o Estado Novo, em abril de 1939 na criação
da Escola Nacional de Educação Física e Desportos (RJ) (LUCENA, 2003; NEGREIROS,
1992).
A excitação proporcionada pelas atividades de lazer possui um caráter singular. Em
alguns aspectos mantem semelhança com a excitação causada por situações críticas sérias,
contudo nutrem qualidades específicas como a certeza de que nenhum mal real poderá de fato
acontecer. Além disso, a excitação agradável ativada pela ocupação do tempo livre com
atividades miméticas de lazer, pode ser considerada como uma maneira de criação e libertação
das tensões, preconizando o enfrentamento com êxito da rotina maçante das sociedades
industrializadas (ELIAS, DUNNING, 1992).
A grande variedade de atividades de lazer, em particular os esportes, permite às pessoas
uma diversidade de escolhas de acordo com as necessidades afetivas e emocionais, as quais
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proporcionam distintos graus de prazer e satisfação. Nesse contexto, as atividades de lazer
constituem a chave para o desencadear, aprovado no quadro social, do comportamento
moderadamente excitado em público em espaços determinados, como os estádios por exemplo.
Isto significa que o esporte pode ser estabelecido como um tipo de antídoto ao excesso de
controle e tensão dos indivíduos, fazendo-os liberar suas emoções de maneira aceitável pela
sociedade (CANALE, 2012; ELIAS, DUNNING, 1992).
No mundo do jogo, as leis e convenções da vida cotidiana perdem a validade. Nele, as
pessoas podem desempenhar papeis diferentes e realizarem coisas grandiosas. O jogo é uma
mutação do sentido da realidade. Nele, as coisas se tornam outras, os comportamentos, apesar
de semelhantes a vida cotidiana, adquirem uma significação específica. Ao deixar-se hipnotizar
pelo jogo, o indivíduo se entrega, exterioriza corporalmente sua subjetividade, podendo, assim,
transparecer também atitudes carregadas de construções individuais e sociais, permeadas pela
moralidade institucionalizada. No jogo podemos levar nossas vontades, podemos traduzir em
atos / ações o que está guardado e desta maneira, o lúdico permite que haja uma liberdade de
expressão, que possamos ser espontâneos, verdadeiros (PIAGET, 1977; FREIRE, 2005;
PRODÓCIMO, 2007).
Reis (2006) afirmou que o futebol, dentre todas as modalidades esportivas, teve uma
aceitação tão grande entre os povos do mundo possivelmente porque produz momentos de
cooperação e competição capazes de gerar o sentimento do ‘meu’ e do ‘seu’ grupo; estimula
uma excitação específica desencadeada pela incerteza do alcance do tento, além disso, na sua
forma de conflito, faz uso de uma grande arena a céu aberto que permite uma livre excitação e
expressão emocional. Segundo Damo (2007) o gosto pelo futebol é uma construção social
historicamente datada e culturalmente legitimada. Assim como outros arbitrários culturais, o
futebol poderia ser definido como um consenso de época, legitimado por determinados
públicos, tal qual a gladiadura romana e a tourada aldaluza. Para Brohm (1993), o esporte
enquanto instituição é fruto de uma ruptura histórica marcada pelo modo de produção industrial.
É uma prática de classes, não homogênea, integrado e reprodutor de diretrizes imperialistas que
passou a ser mercantil, no qual o produto a ser vendido é o ser humano.
Jogos similares ao futebol no Brasil foram registrados oficialmente durante o século
XVIII e foram proibidos em 1746 em São Paulo, por uma lei da Câmara Municipal, na qual o
definia como causadores de desordem e agrupamento de vadios. Há ainda relatos de que, o
futebol no Brasil desembarcou com os marinheiros ingleses e holandeses, que praticavam
futebol com a população das cidades portuárias situadas a nordeste do Brasil, por volta de 1878.
Contudo, tornou-se convencional atribuir a Charles Miller, brasileiro, descendente de ingleses,
35
educado na Inglaterra, a importação do futebol para o Brasil em 1894 (SOBRINHO, 2008;
VOSER, 2010).
A partir deste parcial consenso, diversos são os registros que marcaram a presença do
futebol moderno no Brasil. Pode-se propor que o primeiro círculo de rapazes que
registradamente praticaram o futebol trazido por Charles Miller, foram os jogadores do São
Paulo Athletic Club, ao qual Miller se associara após o seu retorno. Fundado inicialmente para
a prática do críquete, o clube reunia altos funcionários ingleses que tiveram o primeiro contato
com os implementos básicos do futebol. Propõe-se também que a primeira partida disputada
em solos tupiniquins, teria ocorrido no mesmo ano da chegada dessa modalidade esportiva,
entre os operários da companhia de gás e os ferroviários da São Paulo Railway, empresa a qual
compartilhava associados com o São Paulo Athletic Club (MARQUES, 2013; TOLEDO 1996).
Impreterivelmente, o futebol no Brasil aportou com o intuito de ser um esporte praticado
pelas elites. O alto custo dos uniformes, herança dos arquétipos franceses, e dos equipamentos
importados, restringira a prática do futebol às classes mais abastadas que tinham pouco tempo
para a sua prática devido as responsabilidades de negócios e /ou estudos. Os pioneiros do
futebol, o jogavam com todas as exigências do padrão europeu, chutões e finalizações de longa
distância, além da utilização de termos incorporados do inglês. Portanto, até mesmo por
desconhecimento dos praticantes, as regras oficiais nem sempre eram seguidas ao pé da letra
(DUNNING, 2014).
O Football Association é o nome dado ao conjunto de regras descrito por um grupo de
londrinos em meados de 1863 e que com poucas variações ainda hoje é disputado em âmbito
mundial em esferas profissionais. No sentido de divulgar e informar a população letrada
nacional, manuais que continham as regras do recém-chegado esporte, assim como a
instrumentalização necessária para a sua prática, eram distribuídos principalmente nos Estados
de São Paulo e no Rio de Janeiro. Porém, em seu percurso territorial e temporal, o futebol, ou
como diria Damo (2007), os futebóis, ainda podem ser jogos improvisados. Ter acordos
específicos e regras adaptadas. Boa parte delas, ansiando a contenção dos níveis de violência e
contando com o reforço da contemporaneidade, a inclusão do maior número de adeptos.
As partidas de futebol se tornaram detentoras de um bem simbólico altamente apreciado
e valorizado. As competições e rivalidades entre os coletivos foram se acentuando à medida
que as partidas eram crescentemente mais frequentadas. A sensação de pertencimento a um
determinado clube de futebol se tornou uma atitude afetiva, um tipo de investimento emocional,
que se tornou hereditária, principalmente no tocante as masculinidades (DAMO, 2007;
FARIAS, 2009; CANALE, 2012).
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O período entre as décadas de 1900 e 1910, devido ao fluente intercâmbio cultural
existente entre as elites brasileiras e as produções e novidades europeias, foi palco de um
extraordinário aumento nas fundações de clubes de futebol no Brasil. Entretanto, têm-se
registro, em 1897, de um time de futebol chamado Nobiling Team, que foi fundado pelo
imigrante alemão Hans Nobiling em Porto Alegre – RS e que provavelmente foi a prática
futebolística organizada que deu início a formação do Sport Club Internacional em 1899. Neste
período, o Remo era o grande evento esportivo social que proporcionava aglomerações de
pessoas nos locais de competição. Porém, clubes com determinada estabilidade financeira
passaram a financiar equipes de futebol no cenário esportivo nacional. A Associação Atlética
Makenzie College, de São Paulo, passou a incorporar o futebol nas suas práticas esportivas,
assim como outros clubes que não se iniciaram pelo futebol, mas passaram a se dedicar quase
que com exclusividade a ele, tais como o Sport Clube Savoia de Sorocaba, a Associação
Atlética Ponte Preta de Campinas, o Clube Atlético Paulistano de São Paulo, o Clube de Regatas
Flamengo, o Clube de Regatas Vasco da Gama e o Vitória da Bahia (SOBRINHO, 2008;
VOSER, 2010; CANALE, 2012).
Em 1902 tem-se registro do primeiro campeonato paulista de futebol, contando com a
participação de pelo menos cinco times. No Ceará o primeiro registro de uma partida de futebol
se deu em 1904, após o jovem estudante suíço, José Silveira, retornar ao país com uma bola e
um livro de regras oficiais. O jogo aconteceu entre integrantes da ‘boa sociedade’ cearense com
ingleses residentes na capital do Estado, em companhia dos ingleses viajantes de um navio
ancorado. Neste mesmo ano, Vitor Serpa fundou o Sport Club em Minas Gerais e em 1905 há
registros da difusão do futebol no Estado de Pernambuco, assim como o primeiro campeonato
carioca (FARIAS, 2009).
Mesmo com a necessidade de investimento financeiro para um desempenho menos
informal e principalmente para a fundação de um clube de futebol, as cidades industriais e os
bairros de operários em particular, passaram a reunir esforços no intuito de estruturar sua prática
futebolística. A partir da iniciativa de pequenos comerciantes e artesãos, equipes e clubes de
classes emergentes, representantes de algumas fábricas e entidades de bairro, foram se
formando. Essa classe social encontrou nos clubes recém fundados, uma nova forma de
sociabilidade e pertencimento. Havia com isso a aproximação dos pares e o enaltecimento das
diferenças e rivalidades. Moradia, origem, especialidade do desempenho profissional, tudo isso
podia ser motivo para exacerbar o estabelecimento no ‘meu’ grupo e do ‘seu’ grupo
(NEGREIROS, 1992).
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Desta maneira, o vínculo identitário com o clube pelo qual se torce faz parte
indissociável das emoções desencadeadas pelo ato de torcer.
O SCPP e a ascensão do futebol em São Paulo
A excursão realizada por uma equipe britânica de nome Corinthians Football Club,
despertou grande entusiasmo nos cafés e teatros da capital paulistana pela forma como jogavam.
Com a cidade ainda em estado de euforia em função da excitante visita do clube inglês, ao mês
de setembro de 1910, foi fundado em São Paulo um clube dedicado mais especificamente as
práticas do jogo de futebol, o Sport Club Corinthians Paulista, SCCP. À primeira vista, um
episódio corriqueiro quando observamos que àquele período, quase todos os dias, era informado
o nascimento de um novo clube na capital paulista ou no interior do Estado. Porém, há um tom
de romance em sua fundação, uma preocupação em mostrar a origem humilde do novo clube,
por meio da qual inegavelmente o tornou um clube aspirante a merecedor de conquistas em
meio a muitas dificuldades e sacrifícios. Na mesma época que eram fundados, em luxuosos
salões os principais clubes de São Paulo, estava o SCCP sendo organizado debaixo de um
lampião de rua, formado principalmente por trabalhadores, inclusive braçais, que também
desejavam praticar o esporte bretão de forma organizada, dignos de serem representantes do
povo perante as elites (NEGREIROS, 1992).
No site oficial do Sport Club Corinthians Paulista (Timão) aparece a descrição de sua
fundação.
“Às 20h30 do dia 1º de setembro (1910), à luz de um lampião, na esquina das ruas
José Paulino e Cônego Martins, no bairro do Bom Retiro, o grupo de operários
formado por Anselmo Corrêa, Antônio Pereira, Carlos Silva, Joaquim Ambrósio e
Raphael Perrone fundaram o Sport Club Corinthians Paulista. Com mais oito rapazes,
foi formada a reunião dos primeiros integrantes e sócio-fundadores do Timão, que
teve seu nome inspirado na equipe inglesa Corinthian-Casuals Football Club, que
fazia excursão pelo Brasil. O presidente escolhido por eles foi o alfaiate Miguel
Battaglia, que, já no primeiro momento, afirmou: “O Corinthians vai ser o time do
povo e o povo é quem vai fazer o time”. Um terreno alugado na Rua José Paulino foi
aplainado, virou campo e foi lá que, já no dia 14 de setembro, o primeiro treino foi
realizado diante de uma plateia entusiasmada, que garantiu: ‘Este veio para ficar!’”.
(Clube – História Conheça a história do SCCP. Corinthians. Disponível em:
<https://www.corinthians.com.br/clube/historia>. Acesso em: 30 ago. 2018.)
Ainda na década de 1910, apesar do futebol em São Paulo apresentar fortes estruturas
informais, cada clube que fomentava sua prática e participava dos jogos e campeonato oficiais,
possuía sede esportiva e social localizada no centro da cidade. Além disso, disputavam partidas
exclusivamente em campos oficiais estabelecidos no Velódromo, no Parque Antártica e na
Chácara da Floresta. A incorporação das festas esportivas, eventos comemorativos nos quais
obrigatoriamente havia uma partida de futebol que fechava o evento, ajudou na popularização
e formalização da modalidade. Nestas festas era comum a presença de atletas campeões de
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outras nacionalidades, além de outros esportes no decorrer do dia. Neste período, deu-se início
a tradição da visita de representantes públicos importantes aos campos esportivos
(NEGREIROS, 1992).
Durante este período foi possível se perceber a febre esportiva que a capital paulista
viveu. O futebol tornou-se uma significativa forma de lazer, marcada por fortes sinais de paixão
e emoção. Com o desenvolvimento desta modalidade esportiva surgiram também os
aficionados pelo esporte, que mesmo sem pratica-lo, acompanhavam o que circundava e o que
compunha o futebol. Essa figura passou a ser chamada, pela imprensa da época, de torcedor. Já
no início do século XX era possível encontrar o torcedor, um indivíduo apaixonado por
determinado clube, um esportista que defende as cores de ‘seu’ clube, assistindo aos seus jogos,
inclusive quando estes se realizavam em outras cidades (NEGREIROS, 1992).
À medida que se popularizava o futebol, urgia o desejo de manter elitizado o esporte e
assim, evidenciara-se conflitos internos e externos entre as pessoas que formavam as entidades
gerenciadoras dos campeonatos. O anseio pelo comando da gestão futebolística paulistana foi
ocasionando divergências e modificações nas estruturas de competição do futebol, assim como
foi dando origem a outras instituições organizadoras do futebol oficial.
Muitas ações causadoras dessas divergências eram executadas para permitir ou negar às
associações esportivas de menor grandeza, o ingresso no futebol oficial. O SCCP trabalhou no
sentido de se tornar o primeiro clube de bairro a ingressar nesses moldes, renegou suas raízes
ao estruturar sua sede no centro da cidade, se comportou como as exigências do futebol elitizado
demandavam. Procurou apoio de políticos locais e fez concessões suficientes para assegurar
seu ingresso na Liga Paulista de Futebol, o que aconteceu em março de 1913. A partir da sua
própria modificação, transformou algumas estruturas do futebol em São Paulo. Pela primeira
vez, um clube da classe trabalhadora participava do futebol oficial e seus campeonatos
(NEGREIROS, 1992).
Em 1914 o SCCP se tornou campeão da Liga Paulista de Futebol, tornando-se um dos
times mais citados nos periódicos esportivos. No intuito de amenizar uma crise financeira que
assolava o clube devido a questões administrativas dos campeonatos, o SCPP em 1915 passou
a excursionar pelo interior paulista e causou grande euforia na população das cidades
percorridas, por ser um time da capital e campeão da Liga. Em 1916 consagrou-se mais uma
vez campeão da Liga Paulista de Futebol. No final dos anos de 1920 o Parque São Jorge se
tornou sede do Sport Club Corinthians Paulista. Já bastante modificado no seu processo de
evolução, o clube visava a formação de uma equipe de futebol competitiva, forte concorrente a
ser a melhor nos campeonatos, conquistar as vitórias que levariam aos troféus e medalhas. Em
39
ascensão, o time de futebol do Corinthians chamava a atenção dos esportistas que não tinham
acesso aos times de elite por causa dos preconceitos estabelecidos. Desta forma, contava não
apenas com jogadores que participaram do seu início bairrista, mas também com aqueles recém
agregados que não apresentavam poder de interferência nas decisões da instituição. “O
Corinthians se tornou imbatível” (NEGREIROS, 1992).
A prática do esporte por “clubes de várzea” tinha suas partidas disputadas com materiais
improvisados, em terrenos desocupados e criminalizadas pelas autoridades. Apesar de
reconhecer uma razoável organização nessas partidas, tais como a do Carmo, uma das mais
estruturadas práticas futebolísticas informais da época e da região, os relatos dos periódicos
eram sempre pejorativos: “dois ‘times ‘anônimos de menores desocupados se empenharam
ontem às três e meia horas da tarde num ‘match’ de ‘futebol’, com entusiasmo belicoso de dois
cães na disputa de um osso” (NEGREIROS, 1992 p.52). Faz-se mister ressaltar que atletas dos
clubes de elite, que treinavam nos dias úteis, no meio da tarde, nunca foram denominados assim
(NEGREIROS, 1992).
Nesses jogos não faltavam palavrões, vaias, agressões físicas e a presença repressiva da
polícia. Uma paixão incontrolável, exatamente o contrário do que deveria ocorrer, ao menos no
entender das elites paulistanas. Não é à toa que no Velódromo, junto à arquibancada, existia um
cartaz com os seguintes dizeres: “É proibido vaiar.” Além disso, neste mesmo estádio, havia a
divisão de lugares entre a elite, que era direcionada a assistir aos jogos na arquibancada e o
proletariado, que era conduzido para a geral. A rivalidade e a disputa, para elite eram
reconhecidas como importantes valores, mas sempre limitadas e controladas, dentro de um nível
de aceitação social ao expressar as emoções.
Os torcedores das classes populares, pessoas que gritam, que escondem seus rostos com
medo que o time adversário possa fazer um gol, que verdadeiramente se emocionam e
expressam sua emoção com os jogos, que sofrem nas derrotas e deleitam-se nas vitórias,
levaram para o campo de disputa outras formas de manifestação, nem sempre caracterizadas
pela educação formal que as elites vivenciavam (NEGREIROS, 1992).
O elenco dos jogos de futebol no período que compreendeu as décadas de 1894 e 1932
era composto prioritariamente por funcionários de níveis elevados das empresas inglesas e uma
elite econômica que se interessava pela modalidade esportiva. Estes certames ficaram marcados
pela ação estritamente voluntária dos participantes em praticar o jogo, além da paixão que
envolvia a disputa. Conhecida como fase do amadorismo, a característica da prática voluntária
e não remunerada, indiretamente limitava a participação da classe trabalhadora pela rotina
operária abusiva que se desenvolvia (HELAL, 2002; LUZ, 2015).
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Ao passo que em alguns momentos o número de jogadores exclusivamente pertencentes
a elite era insuficiente para as contendas, o alto escalão futebolístico do The Bangu Atletic Cub
se viu obrigado a absorver os praticantes do futebol da periferia. De forma expressiva, todos os
relatos apresentados sobre o futebol jogado fora das entidades oficiais têm a massiva
participação da classe trabalhadora, envolvendo profissionais pouco considerados socialmente.
Desta forma, os técnicos britânicos de uma tecelagem do subúrbio carioca passaram a convocar
os operários da empresa para os jogos, baseando-se no comportamento pessoal, desempenho
profissional e tempo de serviço na companhia. Os operários viram nesta transformação uma
oportunidade de expressão e ascensão política, social e econômica (MURRAY, 2000; VOSER,
2010).
Na década de 1920 o futebol brasileiro alcançou a excelência técnica já apresentada por
países como Argentina e Uruguai. Em 1921 houve a proibição de jogadores negros no
campeonato sul-americano realizado na Argentina. Embora a tristeza desse fato, um dos
primeiros heróis do futebol brasileiro foi um mulato – Arthur Friedenreich (El tigre). Filho de
pai alemão e mãe de etnia não identificada, mas com a pele negra, foi aceito pela elite devido a
sua educação europeia e sua vontade de ser considerado europeu. O fluminense, ao convocar
um mulato para titular do seu time, o expôs a um alto grau de preconceito, levando o atleta a
disfarçar a cor da sua pele com pó de arroz quando entrava em campo diante da torcida.
Contudo, um estado de conflito exagerado surgiu em 1923 quando o clube Vasco da Gama
venceu o campeonato carioca com muitos jogadores negros e que não tinham ocupação
empregatícia comprovada. A vitória do Vasco da Gama foi extremamente malvista pela ‘boa’
sociedade que entendia que aquele exemplo não podia ser bom para a mocidade. ‘Desocupados
pretos, campeões? Não!’ Expulsos das competições oficiais, o clube construiu o estádio de São
Januário com capacidade para mais de 30 mil espectadores, o maior estádio do Brasil na época,
glorificando assim seu retorno a liga (MURRAY, 2000; HELAL, 2002; DAMO, 2007).
Em 1925 o então presidente Arthur Bernardes congratulou explicitamente o dedicado
desempenho do Paulistano por sua temporada de jogos na Europa. Em 1927 o presidente
Washington Luiz tentou dissuadir o capitão do time da seleção paulista que havia abandonado
o campo em protesto a uma decisão errada do árbitro, a dar continuidade a partida, mas não foi
atendido. Este capitão era negro. Na década de 1930, o Flamengo, o Bonsucesso, o Vasco e o
América tinham em suas escalações um grande percentual de jogadores de pele negra. Em
meados de 1930, Getúlio Vargas se utilizou da massificação e do desempenho no futebol
nacional como propaganda governamental e almejou a exposição brasileira em âmbito
internacional através do esporte (MURRAY, 2000; MARQUES, 2013).
41
Com a consolidação de um público para o futebol e o clubismo cada vez mais
consistente, em 1930 os clubes passaram a arrecadar dinheiro com as mensalidades cobradas
dos associados. Além disso, deu-se início a cobrança de entrada para assistir as partidas. Assim,
o futebol estava se tornando um esporte suficientemente rentável para financiar um tipo de
recompensa para os jogadores que se destacassem. Este aumento gradativo de dinheiro
introduzido nos clubes tornou possível a aquisição de patrimônio e o investimento no
recrutamento de jogadores. Aqui se dava início a um outro mercado laboral: as pessoas que
praticavam o esporte como profissão ofereceram sua força de trabalho, enquanto os clubes
profissionais vendiam os jogos e campeonatos, o produto de entretenimento.
Em 1933, com o profissionalismo do futebol, a imprensa ampliou os espaços dedicados
a modalidade esportiva, o rádio surgiu como novo meio de comunicação do futebol. Ao
contrário do que se podia pensar, o rádio de forma alguma tirou as pessoas dos estádios,
inversamente, multiplicou o número de espectadores das partidas pois atendia principalmente
àquelas pessoas que não podiam se deslocar até o estádio. Já em 1937 houve a primeira partida
de futebol transmitida ao vivo pela televisão (Figura. 2).
Figura 2 - 1ª Transmissão ao vivo pela TV
Figura 2. Primeiro jogo de futebol televisionado ao vivo, entre o Arsenal e o Arsenal reservas, Londres,
1937. Fonte: @Imagens.História.
O futebol foi causando afeição aos espectadores de todas as classes sociais, o que
aparentemente desagradava os praticantes e admiradores mais nobres e ricos do esporte. Porém,
os indivíduos ‘donos’ da prática futebolística paulistana se deparavam com uma nova situação:
a paixão de uma sociedade hierarquizada, interligada e interdependente pelo esporte.
No final da década de 1940, os abusos de dirigentes para com jogadores de futebol
geravam desconfortos e conflitos no âmbito desta prática. Eram negados os direitos básicos de
42
reivindicação sindical, o que gerou uma greve da classe futebolística internacional. Em 1941
foi criado o Conselho Nacional de Desportos (CND), com o objetivo de fiscalizar e incentivar
a prática esportiva nacional. Em 1942 os clubes de futebol brasileiros passaram a ser vinculados
ao Governo Federal até 1988, quando o CND foi extinto e a estrutura organizacional do futebol
brasileiro passou a ser supervisionada e regida pela Confederação Brasileira de Desportos,
posteriormente chamada de Confederação Brasileira de Futebol (CBF) (HELAL, 2002).
De 1930 a 1950 o futebol brasileiro caminhou a passos largos na sua trajetória de
popularização e ascensão fenomenológica. Isso se deu em grande parte por causa da
profissionalização dos futebolistas, da atuação das camadas intelectualizadas da sociedade,
assim como dos setores da imprensa, que passaram a compor a área do jornalismo esportivo e,
por meio desta transformar a prática futebolística em um espetáculo de massa, artefato da
cultura popular. Por este meio, o jornalista Mario Filho fomentou incessantemente eventos
públicos em torno do futebol, passou a descrever, em suas crônicas esportivas, as disputas
futebolísticas como eventos épicos, símbolos dos pleitos acerca dos valores humanos e não
apenas do futebol. Obstinado defensor da profissionalização, advogava a respeito da ascensão
social por meio do futebol, acreditava na emancipação dos negros por meio desta modalidade
esportiva e entendia que a miscigenação no futebol podia ser vista como um mecanismo de
democratização das relações sociais. Em 24 de junho de 1950 houve o primeiro jogo oficial no
estádio do Maracanã. O estádio com capacidade para 200 mil torcedores, construído
excepcionalmente para a copa do mundo de futebol no Brasil, capaz de simbolizar e exaltar o
amor do brasileiro pelo futebol, foi palco da vitória da seleção brasileira sobre a seleção do
México por 4 x 0 (MURRAY, 2000; HELAL, 2002; RODRIGUES, 2004).
Na década de 1970, sob a ação da ditadura civil-militar (1964-1984), o Brasil caminhava
em busca do desenvolvimento econômico, descompromissado com as camadas sociais menos
favorecidas. Neste período vários estádios de futebol, tais como o Morumbi em São Paulo, o
Rei Pelé em Maceió e o Castelão no Ceará, foram construídos. Com capacidade entre 70 e 100
mil pessoas, essas construções podiam representar o otimismo econômico que regia os ideais
da época. Os militares, ao induzir o futebol à “paixão nacional”, se aproveitaram do triunfo
brasileiro na copa do mundo do México e asseguraram um instrumento de amortecimento ao
subjugo em que viviam os compatriotas neste período. Providenciaram uma estrutura cultural
e política em torno de uma bola, quatro linhas, praticantes e espectadores. A Copa do Mundo
de Futebol tornou-se um momento de “patriotismo” supremo. Desta maneira a transformação
do futebol em esporte nacional foi produto de um processo histórico, cultural, político,
econômico e esportivo, no qual seus alicerces foram construídos a partir de uma forte
43
intervenção do Estado brasileiro e do avanço de ideias nacionalistas (HELAL, 2002;
MARQUES, 2013).
A partir da década de 1990, período que as políticas neoliberais mercantis de incentivo
a privatização se fortaleceram no contexto político nacional, os governos brasileiros e as
administrações de estádios investiram em uma série de medidas para a (re)elitização e
financiamento da indústria futebolística, dentre estas a diminuição da capacidade de público
nos estádios, extinção de setores populares das arquibancadas e aumento do valor dos ingressos
(MERCADANTE, 1998). Diante desta conjuntura, se fez presente o objetivo da seleção de
torcedores desejáveis, representados por um público potencialmente consumidor, capaz de
financiar a indústria futebolística.
“Para nós, não interessa o torcedor que junta centavos para ir a um jogo de futebol,
pois este não tem condições de consumir no interior do estádio. Nós queremos aquele
que tem condições de ir a todos os jogos e consumir” (membro da diretoria do Clube
Atlético Paranaense apud HANSEN, 2007, p.75).
“Sei que é politicamente e absolutamente incorreto o que eu vou dizer, mas uma das
soluções que eu vejo imediata é proibir, terminantemente, o futebol com portões
abertos; futebol de massa nem pensar, porque é a senha para bandidos tomarem conta
do estádio. Cobrar o ingresso e cobrar caro, cada vez mais caro, com cadeiras em
todos os setores do estádio. Tornar o futebol um esporte para a elite, vão lá 40 mil
abençoados por Deus, da alta classe média desse País” (KFOURI apud PIMENTA,
1997, p. 109-110).
Porém, o consumo que é almejado pelos empresários do futebol é um consumo
sustentado por toda uma carga emocional que envolve torcedores e time. A compra de
mercadorias é apenas um dos múltiplos estágios que engloba a experiência de consumo em sua
totalidade. Esta complexa vivência de consumo futebolístico tem sua fundação na busca pelo
prazer, pela satisfação, pelas sensações aprazíveis ocasionadas pelas dinâmicas de tensão –
excitação geradas pelas figurações de competição e cooperação que o futebol deixa tão claras.
“Os seus sócios são pessoas normais que gostam de futebol, do “barato” promovido
pelas “organizadas” e vão aos estádios de futebol atraídos pela diversão, pela viagem,
pela bebida, pela excitação do “jogo” e, até, pelo prazer de atos de violência”
(PIMENTA, 2003).
O futebol mundialmente foi convertido em um dos maiores fenômenos socioculturais e
econômicos dos últimos séculos. Responsável pela movimentação e reunião de milhões de
pessoas, foi transformado em espetáculo, o que envolve além da prática, o consumo. Sendo
assim, transmutado em um entretenimento grandioso, cheio de efervescência e significado,
envolvendo rivalidades, dramas, encenações, músicas, cerimônias e rituais, a máxima aceitação
do futebol em muitos países, tornou-o o esporte espetáculo mais assistido e o principal exemplo
do telespetáculo esportivo em todo o mundo (ELIAS, DUNNING 1992; REIS, 2006 a e b).
44
Apesar das políticas globalizantes, em sobremaneira o clube é um emblema da
comunidade que o cerca, é deste aglomerado social próximo a estrutura clubística que seus
torcedores são formados, nutrem uma certa afeição por seus representantes e se sentem
vinculados socialmente ao grupo. Esse amor clubístico e a identificação com o time de futebol
pode ser expandido pelas relações sociais de afeto, familiares ou não, com um evidente apelo a
um tipo específico de masculinidade, que tem significado na vida dos sujeitos. Ainda, este lugar
de pertencimento honroso pode se consolidar diante do desempenho do time e da entrega dos
jogadores, comissão técnica e gestão administrativa do clube em prol de grandes conquistas.
Apoiar o clube é uma responsabilidade ímpar na identidade do sujeito enquanto torcedor.
De pronto, a prática do futebol aparece como um espaço marcado de sociabilidade e
lazer apto a fazer uma ruptura saudável no cotidiano. Para além de mera forma de
entretenimento é um dispositivo que produz significados, estabelece distinções e gera
categorias de pertencimento e identificação (Figura. 3A). Envolve formas de conflitos que se
encontram entrelaçadas, de maneira sutil, com formas de interdependência, de cooperação e
com a formação do “nosso grupo e do grupo deles” e relações de rivalidade em um grupo
futebolístico (Figura 3B).
45
Figura 3A - Identidade Clubística
Figura 3A. Símbolos de identificação e pertencimento clubístico. Fonte: Arquivo Pessoal.
Figura 3B - “Nosso grupo, grupo deles.”
Figura 3B. Formação explicita do nosso grupo e do grupo deles. Fonte: Ficheiro: República P
Corinthians.jpg
46
CAPÍTULO II
OS TORCEDORES FANÁTICOS DE FUTEBOL E A FISIOLOGIA DAS
EMOÇÕES NO FUTEBOL
No Brasil o hábito de assistir aos jogos de futebol profissional em estádios é crescente
desde o século XX.
“Segundo Dunning (1999), o grande interesse, que os espectadores têm por esse
esporte moderno ainda nos dias de hoje, deve-se à necessidade que povos de todo o
mundo têm em buscar atividades de lazer que lhes propiciem um tipo de excitação
que eles não encontram mais nas sociedades atuais” (REIS, 2003).
Para Reis (1998), existem quatro categorias para o público de futebol: os espectadores,
os torcedores, os torcedores uniformizados e os torcedores organizados. Para esta autora, o
espectador desempenha o papel apenas de assistir ao espetáculo esportivo e se deleitar com o
embate físico apresentado pelas equipes. Já o torcedor é um indivíduo que além de assistir aos
jogos de futebol, tem sua preferência por um time específico, é torcedor dele e manifesta sua
torcida durante as partidas. O torcedor uniformizado é aquele que usa a camisa da sua equipe,
expressando também na vestimenta a sua preferência por um time de futebol. Já o torcedor
organizado é o sujeito que faz parte de uma agremiação torcedora que tem uma estrutura
organizacional burocrática, independente do clube para qual ele torce.
No país, os relatos sobre a organização de torcedores em agremiações de torcidas para
times de futebol, começaram a ser datados a partir de 1940, no Rio de Janeiro (Clube de Regatas
Flamengo) e em São Paulo (São Paulo Futebol Clube). Estes grupos podiam ser caracterizados
por organizar as ações nas arquibancadas, em jogos do seu time, onde quer que fosse o jogo. O
sentimento de pertencimento ao grupo era motivado exclusivamente pelo amor ao time de
futebol pelo qual se escolhia torcer. Havia também os “torcedores ícones”, indivíduos com
grande prestígio midiático que eram o ‘porta voz’ da torcida. Atualmente, as torcidas
organizadas ampliaram um movimento que era restrito aos estádios e o expandiram para a vida
sócio cultural das regiões. A Torcida Organizada (TO) “Gaviões da Fiel” foi fundada em
01/07/1969 com o objetivo de fiscalizar e apontar os erros dos dirigentes do SCCP (PIMENTA,
1997; PIMENTA, 2003; LOPEZ, 2010; MARQUES, 2013).
A palavra torcer (contorcer) indubitavelmente nos remete a uma carga preestabelecida
de dor, a experiências e expressões emocionais geralmente ligadas a comportamentos de
lamentação ou reclamação (MACHADO, 2005). A prerrogativa básica de todo torcedor é que
seu time vai ganhar. A partir deste pressuposto a pessoa torce para que os lances da partida
confirmem sua ânsia, porém, os lances de êxito são muito mais raros. No ato de torcer estão
47
presentes as tensões miméticas, que imitam as tensões do dia a dia, com a certeza de que
nenhum perigo real vai acontecer. Pode haver a aflição de perceber a pressão do ataque
adversário à defesa de seu time, a raiva ao ver seu time sofrendo um gol, as diversas reações a
uma falta injustamente marcada, ao erro do ‘seu’ jogador, a bola que passou muito próxima a
trave e a inúmeras outras situações do jogo. Além disso, a determinação das equipes em marcar
o gol decisivo provavelmente incita outro tipo de tensão em quem torce, tanto pela incerteza do
êxito, quanto pela intensificação da sensação mimética de entrega, de luta. Se o jogo for de final
de campeonato ou eliminatório pode-se supor que o grau de tensão deve ser ainda de uma
grandeza muito maior (MACHADO, 2005; ELIAS, DUNNING, 1992).
Neste sentido, parece claro que as pessoas procuram nas suas atividades miméticas de
lazer, um tipo específico de tensão em detrimento à busca em atenuá-las. Este tipo de tensão
conduz a uma excitação crescente e a um clímax de sentimentos de êxtase, muitos graus de
prazer, aspectos de frustração e decepção (Figura. 4). Contudo, um jogo muito excitante pode
ser perdido pela sua equipe, outro jogo muito bom pode terminar em empate, ou ainda, uma
equipe com habilidades conjuntas muito superior a outra pode proporcionar um confronto sem
nuances notáveis na dinâmica tensão-excitação da partida. Nestes casos as pessoas continuarão
a levar para a sua casa o gosto da excitação agradável da disputa, mas sem o jubilo da vitória,
ou seja, sem o gatilho para a liberação da excitação alcançada (ELIAS, DUNNING, 1992).
Figura 4 – A excitação do torcer
Figura 4. Imagens de torcedores expressando emoções durante as partidas de futebol no estádio.
Fonte: Adaptado de Machado (2005).
Com o aparecimento e o fortalecimento da transmissão televisiva do futebol, emissoras
de TV e detentores do poder esportivo passaram a compartilhar interesses. O tempo destinado
as práticas esportivas e aos comentários sobre os eventos futebolísticos na mídia televisiva
48
estabelece uma nova relação entre esportistas e torcedores. As chamadas ‘mesas redondas’
acontecem geralmente após as rodadas dos fins de semana e tem o poder de maximizar o jogo
em si, por corroborar com a ‘falação’ esportiva. Nestas discussões reúnem-se as opiniões de
aspecto frio e técnico dos especialistas e profissionais do futebol, que buscam em sobremaneira
estabelecer um grande grau de distância entre os que entendem do assunto e a torcida, confusa
por suas emoções. Os programas são muitas vezes estruturados por imagens televisivas
afastadas ou não, correspondentes em sua totalidade com a realidade ocorrida dentro do estádio
e desenvolvidos artificialmente para manter um certo grau de informalidade e exaltação dos
apresentadores e convidados, meticulosamente organizados para desempenhar papeis onde os
torcedores possam se identificar e, assim, serem cooptados na manutenção da assistência destes
entretenimentos (ESCHER e REIS, 2012).
O hábito de falar sobre o que aconteceu na partida de futebol faz ecoar por mais tempo
a sensação de vivenciar o esporte e a torcida se sente mais perto dos praticantes profissionais.
Entrevistas sobre o dia a dia dos jogadores, produtos associados as personalidades esportivas,
fofocas sobre a vida pessoal dos jogadores, especulações sobre o futuro dos jogadores, tudo
isso cria uma atmosfera autônoma sobre o futebol. Ainda, devido a hipermercantilização do
futebol como um super produto midiático, Reis e Escher (2006b; 2012) acrescentaram ao
escopo de categorias do público de futebol, o telespectador, indivíduo que se relaciona com o
futebol por meio de novas tecnologias e se aproxima do seu clube por meio da tv e/ou da internet
mas ainda mantêm a paixão e a identificação clubística.
A participação mais efetiva dos espectadores/torcedores/telespectadores nos
acontecimentos esportivos pode representar uma interrupção no manto habitual das restrições
rotineiras. O ato de torcer por um time de futebol no Brasil, passou de uma singela atividade
vivenciada aos finais de semana, para atos identitários e competitivos capazes de desencadear
paixões. Os rituais do torcer reforçam valores, rivalidades, comportamentos e autoimagens
coletivas. Reconhecem a honra do passado e almejam a perpetuação dos múltiplos níveis do
patrimônio do seu clube no futuro. Os torcedores anseiam compartilhar os momentos de dor e
alegria do seu time juntos. Esse é o sentimento que os une na vida e no dia do jogo, seja na sede
da agremiação, seja no caminho do estádio, dentro dele ou em frente à televisão (KOCH, 2015).
Para Giullianotti (2012), atualmente existem quatro categorias em que se pode
classificar os torcedores quanto ao tipo de identificação dos sujeitos com os clubes. Sua
proposição é alicerçada em oposições binárias básicas entre os quadrantes quente-frio e
tradicional-consumidor. O eixo tradicional-consumidor mede a base do investimento pessoal
para com o clube escolhido; quanto mais tradicional o torcedor, mais longa será a identificação
49
sociocultural com o clube. Em contrapartida, a relação do torcedor consumidor com o clube é
mercadológica, centrada no consumo de produtos do clube. O eixo vertical quente-frio,
representa o nível de centralidade do clube na formação do sujeito. Formas quentes de
interrelação enfatizam tipos intensos de identificação em oposição ao grau frio de torcer. Na
figura 5 é possível encontrar os quatro quadrantes capazes de representar as categorias de tipos-
ideais dos torcedores em consumidor/frio; consumidor/quente; tradicional/frio e
tradicional/quente, o fanático.
Os torcedores tradicionais/quentes, também descritos pelo autor como fanáticos, se
enxergam como membros dos clubes, identificados fortemente como doadores de um
investimento pessoal de longo prazo na relação com determinada associação futebolística.
Organizam seus horários e sua vida em função da sua devoção, participam de rituais próprios
capazes de promover a interrelação entre comunidade e a estrutura clubística, assim como entre
os próprios torcedores. Estão conectados culturalmente com aquele espaço, comprometidos
conscientemente e quase que obrigatoriamente em mostrar solidariedade e apoio, inclusive
financeiro ao clube, sem nunca o abandonar. “o emblema do clube é tatuado... O estádio
fortalece sua solidariedade com outros fanáticos” (GIULIANOTTI, 2012 p. 16).
O torcedor passa a ser fanático quando se autodenomina desta forma sem receio e muitas
vezes, com orgulho de sê-lo. Quando o objeto de sua devoção domina suas atitudes, quando se
recusa a aceitar críticas e vislumbra a possibilidade de violar normas sociais pelo seu grau de
envolvimento com o clube. Os fanáticos são os guardiões do futebol! Apoiar o clube é uma
ocupação identitária importante para o sujeito. Ir aos jogos disputados em casa é um hábito que
organiza seu tempo livre. Conhecer os cânticos e hinos que representam seu clube é
engrandecedor. O clube pode até mudar seus jogadores, mas seu campo será sempre sua “casa”.
O emblema do clube é tido como símbolo de honra e o corpo se torna veículo chave para a
expressão e comunicação das emoções (Figura. 6). Neste sentido, o investimento emocional do
fanático no clube é recompensado por meio do jogo bem jogado, da entrega dos seus jogadores
como participantes de um duelo físico, com regras conhecidas e com um determinado grau de
violência permitida e, em sobremaneira, pela vitória alcançada com glória (ELIAS, DUNNING,
1992 REDDEN e STEINER 2000; GIULIANOTTI, 2012). Assim, os torcedores e claramente
os torcedores fanáticos, estarão dispostos a entregar-se ao desempenho ótimo de seu papel de
‘décimo segundo jogador’ no auxílio à conquista da contenda.
50
Figura 5 - Caracterização dos Torcedores
Figura 5. Representação das quatro categorias (tipo-ideais) de torcedores proposta por Giulianotti (2012).
Figura 6 - Torcedores Fanáticos
Figura 6. Representação do envolvimento emocional do torcedor fanático. Fonte: arquivo pessoal.
É sabido que em todas as formas de desporto há a propensão para desencadear emoções,
para evocar uma excitação proficiente em romper o adestramento emocional social outorgado.
No entanto, no futebol televisionado, ou seja, aquele considerado de elite, é possível ver, pelo
menos em traços gerais, um tipo de configuração de jogo apto a proporcionar o prazer ótimo,
no qual trata-se de um confronto prolongado, em um espaço amplo e aberto, quase que como
um campo de batalha entre duas equipes bem preparadas em seus aspectos técnicos, táticos e
51
no que diz respeito as capacidades biomotoras. Além disso, consiste em um jogo que oscila em
momentos claros de ataque e defesa, conta com momentos inesperados de contra-ataque, nem
tão rápidos a ponto de serem perdidos de vista, nem tão demorados que percam sua
configuração de surpresa. A forma dinâmica do ritual futebolístico evidencia um continnum
interligado de sensações associadas aos padrões de frustração e de realização. Assim, os lances
que ocorrem durante a partida de futebol são fatos desencadeadores de algum nível de adaptação
orgânica relacionadas as nuances dessas experiencias emocionais.
Ainda, no torcedor fanático, esses fatos desencadeadores encontram acolhimento e
expressão de maneira acentuada, permitindo-nos uma observação mais clara das emoções
despertadas pelo confronto esportivo.
Mas afinal, o que é emoção? E como é sua fisiologia na literatura?
Em geral entende-se por emoção um estado, movimento ou condição que provoque nas
espécies animais, incluindo a humana, a percepção do alcance ou importância que determinada
situação tem para sua vida, suas necessidades e/ou seus interesses (ABBAGNANO, 2007).
Desde o início da era comum e durante os séculos iniciais foi-se instruído que as
emoções estão estreitamente relacionadas com a satisfação das necessidades e/ou desejos, além
de se fundamentarem quase que exclusivamente no fato ou na tentativa de atrair o bem e afastar
o mal. Muitos filósofos e pensadores concordavam que as emoções eram propriedades
sensíveis, ou seja, atributos da alma, embora fossem acompanhadas de alterações físicas
(ABBAGNANO, 2007).
No período que compreendeu os séculos XVI e XVII, os teóricos das emoções
reconheceram marcadamente a presença e a importância do corpo biológico em sua teoria. As
emoções eram consideradas como originárias da difícil situação em que o espírito vital e o
corpo físico se encontram no mundo. O corpo, envoltório do espírito, não consegue protegê-lo,
por vezes permitindo que se canse ou se enfraqueça. Neste sentido, o espírito precisa perceber
e entender as forças de todas as outras coisas para que possa estabelecer meios de manter a
própria existência. Além disso, é necessário que sinta prazer quando estes meios estão a sua
disposição. Assim, o prazer e a dor foram estipulados, neste período, como os dois polos das
experiencias emotivas. Graças a alegria, a alma adverte ao corpo o que é útil. O mesmo acontece
quando o ódio avisa algo nocivo à experiencia do corpo. Neste caso, as emoções faziam parte
dos princípios invisíveis do movimento do corpo humano. Estes princípios precederiam as
ações visíveis (ABBAGNANO, 2007).
52
A partir do final do século XIX houve um notório aprofundamento na busca sobre os
processos neuropsicológicos envolvidos nas emoções. Darwin (1890) foi o primeiro autor a
sistematizar suas ideias na obra ‘The expression of the emotions in man and animals’. O estudo
assumiu a expressão muscular e comportamental de diversas espécies animais como
marcadores da experiencia emocional – uma resposta ‘física’ para uma sensação ‘mental’-
como afirma o prefácio da republicação da 2ª edição do livro, pela Universidade de Cambridge
em 2009. O pesquisador defendeu em sua tese que um sistema básico de emoções era inato aos
seres humanos, ou seja, hereditariamente transmitido e ainda, filogeneticamente conservado,
pois características faciais semelhantes indicavam que as mesmas sensações eram vivenciadas
entre as espécies. A raiva (anger), o medo (fear) e o prazer ou a alegria (joy) faziam parte deste
escopo primário de estímulos que provocam significado adaptativo ou funcional no individuo
em relação ao ambiente.
Darwin (2009) suscitou ainda a ideia de três princípios básicos que poderiam regular as
expressões e gestos involuntários, usados por seres humanos e outros animais em resposta a
uma experiencia emocional. O primeiro princípio discorreu sobre a capacidade de estados
mentais específicos regularem ações e comportamentos que almejam aliviar, gratificar ou saciar
desejos e vontades. Assim, a cada momento que um determinado estado mental se repete, há
uma tendência habitual de reproduzir os mesmos movimentos e assim atingir a mesma
finalidade. Este é o princípio de ‘hábitos úteis associados’ (serviceable associated habits). A
partir deste postulado, Darwin (2009) nos guiou para o oposto disso, o segundo princípio: a
antítese (Antithesis). Assim, no caso de um estado mental oposto a uma determinada cadeia de
sinalizações e ações previamente experienciada satisfatoriamente, haveria uma tendência
natural dos animais em regular seus movimentos na direção contrária àqueles que foram
associados ao primeiro estado mental.
O terceiro e último princípio instruído pelo autor nesta obra, indicou a ocorrência de
uma forte excitação dos receptores sensoriais. A sinalização desta percepção acontece em uma
direção específica, que é dependente das conexões celulares e da capacidade energética corporal
e independente da vontade ou do hábito. Como é o caso do tremor muscular (trambling of the
muscle) e do rubor facial (blushing). Este é o princípio das ações que acontecem devido a
constituição do sistema nervoso.
Na mesma época, William James (James- Lange theory) se apoiou no princípio das
ações devido a constituição do sistema nervoso e o personalizou, reduzindo sua complexidade.
Escreveu que as experiencias emocionais seriam idênticas aos ‘sentimentos corporais’ (bodily
feelings), um processo orgânico, no qual um ‘fato’ estimula um ou mais órgãos sensitivos, em
53
que impulsos aferentes são transmitidos ao córtex e correntes sinalizadoras chegariam
principalmente aos músculos e as vísceras alterando-os de múltiplas e complexas maneiras.
Assim, as comunicações desses órgãos alterados de volta ao córtex transformariam aquele fato
simplesmente existente em um fato emocionalmente sentido (REISENZEIN, 2014;
CANNON,1927).
Sua sugestão dissertou que as emoções eram desencadeadas de forma reflexa pela
percepção ou imaginação de uma situação em seu contexto geral, em detrimento de um processo
avaliativo do organismo que ocorreria no córtex sensorial. Neste caso, para cada tipo de emoção
sentida por uma pessoa em um determinado tempo e espaço, haveria um tipo de sensação
corporal anterior e específico relacionado, o ‘sentimento corporal’, ativado como ondas difusas
que integrariam alterações orgânicas periféricas, em especial nas vísceras e nos músculos. Um
caminho não psicológico para a experiencia emocional. Uma rota exclusivamente
neurofisiológica na qual o córtex motor seria a área onde os programas neurais para alterações
corporais se comunicariam, de forma inata ou por reflexos aprendidos. De acordo com sua
teoria, as emoções que evidentemente se apresentavam acompanhadas de modificações
corporais eram: a raiva (anger), o medo (fear), o amor (love), o ódio (hate), a alegria ou prazer
(joy), o luto (grief), a vergonha (shame) e o orgulho (pride). Outras emoções, por ele chamadas
de moral ou sentimentos mentais, poderiam sim ter alterações periféricas associadas, mas não
tão evidentes quanto as primeiras; ou ainda, não seriam emoções e sim julgamentos intelectuais
(REISENZEIN, 2014; CANNON,1927).
Sugeriu ainda que as impressões percebidas pelos sentidos deveriam ser fortes o
suficiente para ativar o centro vasomotor humano, de outra maneira, não seriamos capazes de
sentir nenhum tipo de emoção, pois a percepção subjetiva não seria em sobremaneira confiável,
tendo em vista que o sujeito seria capaz de discernir os elementos e as intensidades dessas
alterações, para expressar o seu sentimento emocional, mas não de diferenciar a origem
anatômica e fisiológica do estímulo (REISENZEIN, 2014; CANNON,1927).
Desta maneira, sua teoria defendeu que a percepção das mudanças corporais como elas
ocorrem, eram as emoções. Além disso, chamou a atenção para o debate entre a emoção e a
sensação e advertiu a comunidade cientifica sobre a existência das diferentes intensidades e
qualidades do fenômeno emoção.
O pesquisador Cannon (1927) realizou um exame crítico, ponto a ponto, sobre a teoria
que antecedia seus achados e escritos. Para o pensamento emergente, a expressão emotiva
residente e desencadeada principalmente pela ativação e regulação da área visceral, circulatória
e motora do ser humano, estava equivocada. Nas suas pesquisas, Cannon e cols. (1915)
54
removeram cirurgicamente todas interferências viscerais dos canais simpáticos de comunicação
e observaram ainda a presença de comportamentos de medo e raiva em seus modelos animais.
Além disso, seu estudo evidenciou a inervação e consequente sinalização difusa dos neurônios
do SNA. Simpático nos músculos lisos assim como a uniformidade de ação das mudanças
viscerais em múltiplos estados, sugerindo que sem o fator subjetivo do significado emocional,
restaria apenas um aglomerado de alterações orgânicas.
Um dos pontos da revisão de Cannon (1927) sobre a teoria de James-Lange foi o fato
de que, ao assumir que as emoções são resultado de ativações e comunicações periféricas,
esperar-se-ia que uma experiência química exógena e induzida por um modelo experimental,
geraria impulsos simpáticos efetivos para produzir emoções. Assim, o autor foi buscar na
literatura da época como robustecer seus questionamentos. Ao citar Marañon (1924) em seu
trabalho, dissertou sobre a exposição de estudantes a adrenalina exógena e suas reações: “Era
como se eu fosse chorar sem saber porque”, “Eu me senti como se com medo”, “Como se eu
estivesse esperando uma grande alegria” (CANNON,1927. p.113). Embora o fator
subjetividade tenha sido abordado, Cannon (1927) não admitiu estes relatos subjetivos como
experiencias emocionais concretas, decorrentes da comunicação e sinalização instigada pela
experiência química exógena. Não aceitou como “verdadeiro sentimento” (true feeling) as
descrições dos estudantes, ignorou que os estímulos periféricos podem sim causar respostas
centrais a um nível muito parecido com as emoções, “como se eu estivesse com muito medo,
mas estou calmo” (CANNON,1927. p.113) e que talvez, a dúvida que os relatos transparecem
seja exatamente a falta de significado para aquele estado orgânico, característico da emoção.
Entretanto, o pesquisador assumiu que as mudanças corporais ocasionadas pela
adrenalina exógena incitariam, nos seres humanos, mudanças corporais parecidas com as
sensações. Considerou também que as posições e tensões musculares específicas poderiam
interferir na diferenciação emocional, porém, enalteceu que os arranjos neurais para a expressão
emocional residiriam nos processos talâmicos subcorticais em detrimento ao controle visceral
cortical. Para Cannon (1915 e 1927) um estímulo externo interagiria com receptores
específicos, acionando-os para emanar impulsos elétricos para o córtex, onde os neurônios
corticais excitariam os processos talâmicos em combinações especiais de acordo com uma
determinada expressão emocional. Ainda de acordo com o autor, ao passo que as descargas no
tálamo aconteceriam, as modificações corporais também ocorreriam quase que
simultaneamente com a experiência emocional.
Dez anos depois, James Papez (1937) publicou sua hipótese aliando uma possível
conexão anatômica à integração fisiológica de sinalização emocional. Para ele, a reciprocidade
55
conectiva entre hipotálamo, giro cingulado e hipocampo poderia oferecer um importante
circuito de informações com o córtex. Assim, o que ele chamou de córtex do giro cingulado
seria a área da experiencia emocional ativada e regulada pelos impulsos provenientes da região
hipotalâmica. O tálamo e suas conexões facilitariam o processo emocional fisiológico e a
função psicológica da emoção, ao atuar como um receptor genérico de estímulos provenientes
dos receptores periféricos, ao mesmo tempo que agiria como distribuidor de sinais para cada
via de sinalização específica: a rota dos pensamentos, aportando no córtex lateral e no corpo
estriado, sendo transformadas em percepções, pensamentos e lembranças. A rota dos
movimentos, chegando a porção dorsal do tálamo e aos corpos estriados e a rota dos
sentimentos, transmitidas do tálamo ao hipotálamo e ao giro cingulado, proporcionando as
reações corporais pertinentes a cada emoção. (Figura. 7).
Figura 7 - Teoria dos sistemas emocionais organizados em rede
Figura 7. Esquema representativo da teoria de James Papez (1937)
Papez (1937) deslocou o caminho da teoria das emoções de centros reguladores
hierarquizados para sistemas emocionais organizados em rede, com funções mediadoras,
interligadas e interdependentes entre si. Sugeriu que a experiencia emocional é diferente da
expressão emocional e evidenciou a importância da subjetividade na constituição do que
significa emoção.
Em um contínuo progresso científico acerca da função animal chamada de emoção, um
modelo anatômico mais robusto foi descrito por MacLean em 1949. Sua teoria sugere que a
experiencia emocional integra as sensações do mundo externo com as informações corporais e
a parte anatômica responsável por esta integração é o ‘cérebro visceral’; assim denominado pela
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disposição estratégica de algumas estruturas anatômicas e sua estreita ligação com o controle
das funções vegetativas. Em sua pesquisa, o autor observou que a estimulação do rinencéfalo
por meio de odores de predadores, que supostamente desencadeariam a emoção do medo,
geraria reações autonômicas de regulação na pressão arterial, frequência respiratória e cardíaca
(DALGLEISH, 2004; ROXO, 2011).
Em ordem de designar um sistema funcional e não apenas um sistema anatômico, o
sistema límbico (Figura. 8), ficou conhecido como o circuito neuronal que regularia o
comportamento emocional e as forças motivacionais do ser humano. Nesta tese, o hipocampo
desempenharia função primordial como núcleo regulatório e, ao sugerir que a comunicação
hipotalâmica com todos os outros níveis do sistema límbico acontece por três vias: (1)
descendente em direção ao tronco cerebral → mesencéfalo, ponte e bulbo → nervos periféricos
do sistema autônomo; (2) ascendente em direção as áreas superiores do diencéfalo, tálamo e
áreas límbicas do córtex e (3) em direção ao hipotálamo no intuito de controlar as funções
secretórias da hipófise; esta teoria aponta o hipotálamo como principal estrutura de controle
deste complexo sistema de comunicação emocional (ROXO, 2011; GUYTON, 2006).
De acordo com LeDoux (2012a), o sistema límbico surgiu no intuito de explicar todas
as emoções com um único conceito anatômico que definiu áreas corticais e subcorticais como
geradoras das emoções humanas. Assim, precipitadamente, concluiu uma certeza acerca de sua
sinalização global, como é marco da ciência positivista.
Embora a ideia do sistema límbico ainda seja extremamente utilizada por pesquisadores
das experiências emocionais, também tem sido bastante criticada principalmente por três
aspectos: o primeiro é que a teoria presume que apenas mamíferos possuem as estruturas
indicadas no sistema límbico. Porém, neuroanatomistas tem descartado esta possibilidade ao
encontrar estruturas correspondentes em pássaros e repteis. Em segundo plano, a teoria do
sistema límbico argumenta que as células do hipocampo são inadequadas para o processo
cognitivo. Todavia, atualmente o hipocampo é uma área chave relacionada as funções
cognitivas superiores. Por último, não há evidências sólidas de que o sistema límbico atue de
forma integrada na mediação de todas as emoções, em seus múltiplos níveis e intensidades
(LeDOUX, 2012 b).
Neste sentido, LeDoux (2000, 2003,2012a,2012b) e Pfaff (2008) têm incessantemente
apresentado a função da amigdala na regulação dos sentimentos de medo e raiva em detrimento
de todo escopo anatômico fisiológico estrutural do sistema límbico para a regulação destes
estados emocionais, sugerindo um grau de especificidade na ativação das estruturas nervosas
centrais em relação a um estado emocional particular.
57
Figura 8 - Anatomia do sistema límbico
Figura 8. Sistema límbico (GUYTON, 2006).
Em toda a história do estudo sobre o significado e repercussão do estímulo emocional
no ser humano, o conceito de emoção foi correlacionado aos estados de atração e repulsa à
objetos e situações para a manutenção da existência do ser que a sente. Mesmo na modernidade
e na contemporaneidade, onde as pesquisas sobre o processamento das emoções têm sido
realizadas em diversas áreas e grandes avanços sobre a ativação, regulação e atuação dos
sistemas têm sido apresentadas, principalmente quando relacionados à cognição (LeDOUX,
2000; DEAK, 2011), a memória (LeDOUX, 1994; LeBAR, 2006) e às patologias (CANNON,
1927; NORIYUKI, 2001; MESQUITA, 2014); fica claro que o conceito de emoção nos remete
ao princípio fisiológico de ‘luta ou fuga’ e há a busca, muitas vezes ingênua, por uma unificação
na sua sinalização.
Neste sentindo, Hans Selye (1950) nos indicou uma série de ações fisiológicas
periféricas que enormemente nos auxiliam a descrever, como o próprio autor se expressa,
pontes entre as muitas vias de sinalização interconectadas na natureza. A chave destas
interconexões é que todo organismo vivo responde a um estímulo externo em busca da
harmonia. Quando este estímulo põe em risco a vida do ser, é denominado stress e desencadeia
uma adaptação generalizada básica em todos os organismos, sempre relacionada a mecanismos
de defesa ou danos.
Na Síndrome de Adaptação Geral (SAG) (SELYE, 1950) existe uma reação adaptativa
integrada, estreitamente relacionada a respostas internas independentes da especificidade do
estímulo externo estressor. Esta síndrome se desenvolve em três estágios: (1) reação de alarme,
com características de catabolismo tecidual, hipoglicemia e descargas de secreção advindas do
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córtex adrenal; (2) estágio de resistência, onde essas sinalizações fisiológicas desaparecem e,
(3) estágio da exaustão onde as alterações orgânicas da reação de alarme regressam. Porém, o
autor enfatiza que a especificidade do estímulo desencadearia reações próprias e estas não
fazem parte da SAG.
De acordo com Selye (1950) o sistema de medidas defensivas do ser humano estaria
diretamente ligado a regulação hipofisária e os centros vegetativos hipotalâmicos ativados pelos
receptores periféricos nervosos ou hormonais. Consequentemente, estes dois grandes sistemas
de comunicação orgânica se alterariam frente a um estímulo estressor. Na sinalização eferente
(Figura. 9), estímulos nervosos partiriam do hipotálamo para nervos autonômicos e órgãos
periféricos. A medula adrenal seria ativada para liberação de hormônios adrenérgicos
(adrenalina e noradrenalina) no sangue, o que induziria a contração da musculatura lisa,
provocando vasoconstrição, aumento da resistência periférica e elevação da pressão arterial.
Haveria ainda evidências da intensificação da ação colinérgica, uma concorrente ativação de
sistemas efetores agonistas e antagonistas no intuito de estabilizar os órgãos alvos frente ao
estímulo e a regulação do metabolismo de água e da glicose. Estas alterações estão associadas
em parte dos resultados da ativação do eixo Hipotálamo – Hipófise – Adrenal (GOLDSTEIN e
KOPIN, 2009).
Selye (1950) afirmou que as respostas orgânicas a estímulos estressores têm o objetivo
específico de tentar reverter os efeitos do estressor, contudo, em adição a respostas especificas,
há uma síndrome não especifica ‘do estresse’. Chrousos (1992) adicionou à proposta de Selye,
que deveria haver o limiar de intensidade para diferenciar o tipo de resposta orgânica ao
estresse; acima deste limiar, a síndrome não específica poderia ser ativada.
59
Figura 9 – Via de sinalização da Síndrome de Adaptação Geral – SAG
Figura 9. Desenho original da publicação de Hans Selye (1950) sobre a síndrome geral da adaptação sem
a regulação do metabolismo de água e açúcar (SELYE, 1950).
O sistema nervoso autônomo é a porção do sistema nervoso central responsável pela
regulação da maioria das funções viscerais do organismo. É ativado principalmente por núcleos
dispostos na medula espinhal, tronco cerebral, hipotálamo e centros de comunicação
interligados em algumas áreas do córtex. Uma das características mais marcantes do SNA é a
rapidez e a intensidade que ele pode mudar as funções viscerais. Para tanto, os sinais autônomos
eferentes são transmitidos aos órgãos do corpo por meio de duas grandes vias: O sistema
nervoso simpático e o sistema nervoso parassimpático (Figura 10) (GUYTON, 2006).
60
Figura 10 – Representação do Sistema Nervoso Autônomo em suas vias efetoras
simpáticas e parassimpáticas
Figura 10. Esquema representativo das funções dos sistemas nervoso simpático e parassimpático. 3Fonte:
Endereço eletrônico Anatomia do Corpo
Diante de um estímulo estressor, o sistema nervoso regula da concentração de glicose
plasmática, muscular e hepática, responsável ainda pelo redirecionamento do fluxo sanguíneo
para os músculos ativos, atividade mental elevada, incremento do metabolismo celular,
aumento dos níveis de glicocorticoides e das catecolaminas (epinefrina, norepinefrina e
dopamina), que por sua vez, inicia uma cadeia de sinalização que proporciona o aumento dos
níveis séricos de hormônios produzidos pelo córtex. Além de ser também responsável pela
regulação da pressão arterial através da contração organizada das arteríolas para aumento da
3 Disponível em: <https://www.anatomiadocorpo.com/sistema-nervoso/autonomo-simpatico-parassimpatio/>.
Acessado em: 03 ago. 2018
61
resistência periférica ao fluxo sanguíneo, da contração forte dos grandes vasos, principalmente
das veias no intuito de elevar o volume sanguíneo nas câmaras cardíacas e de aumentar o
bombeamento cardíaco, o que consequentemente provoca um incremento da frequência
cardíaca em até três vezes mais que o normal, em um intervalo de tempo de três a cinco
segundos (GUYTON, 2006, SELYE, 1950).
Para a elevação da FC, o sistema nervoso simpático e sua vasta inervação do músculo
cardíaco, aumenta a frequência de descargas elétricas no nodo sinusal, bem como a
excitabilidade e a velocidade de condução do impulso em todas as porções do coração. Além
disso, aumenta a força de contração do músculo cardíaco e induz à liberação de norepinefrina
pelas terminações nervosas. Que por sua vez, possivelmente, regula a permeabilidade das fibras
aos íons de sódio e cálcio (GUYTON, 2006).
Além da regulação da PA e da FC o hipotálamo participa do eixo HHA com importante
desempenho na sinalização hormonal. Assim, dentro deste contexto, o sistema endócrino teria
importante função nos mecanismos de defesa do ser humano, principalmente no que diz respeito
a diminuição da secreção de somatotrofinas, gonadotrofinas e tirotrofinas, por não serem
essenciais à manutenção da vida e em contrapartida, provocar a secreção do hormônio
adrenocorticotrófico, ACTH.
O hormônio liberador de corticotrofina (CRH) em situações não estressantes é liberado
de acordo com o ciclo circadiano, agindo na regulação da ação hipotalâmica e no eixo
Hipotálamo Hipófise Adrenal, a fim de iniciar uma cascata de sinalização que também regula
a liberação do ACTH e do cortisol, seus efetores finais. A ativação do sistema do stress como
Charmandari and cols. (2005) denominaram o conjunto de estruturas e sinalizações
interconectadas na parte central e na parte periférica do organismo em resposta a um estímulo
estressor, tem como principais funções a secreção do CRH, das catecolaminas e dos
glicocorticoides. Pode levar a alterações físicas e comportamentais como aumento da excitação
generalizada, melhoria da cognição, euforia, aumento de analgesia, elevação da temperatura
corporal e inibição das funções vegetativas de apetite e reprodução. Além disso outras
características metabólicas como lipólise e gliconeogênese também são encontradas. A
depressão representa um típico exemplo da desregulação generalizada da resposta ao stress.
Indivíduos acometidos por esta desarmonia apresentam hipersecreção de CRH,
consequentemente uma elevação dos níveis de cortisol (CHARMANDARI, 2005; SMITH,
2006; MAGIERA, 2018).
Em continuidade ao percurso das pesquisas sobre a experiencia e expressão emocional,
cientistas da contemporaneidade têm se dedicado na busca de circuitos específicos para cada
62
situação emocional em detrimento de uma única macro associação anatômica que seja
responsável por toda a gama de sentimentos. No entanto, as vias de sinalização ativadas por
estímulos que causem alegria/prazer/felicidade, são em grande medida desconhecidas no meio
científico. Em parte, pela subjetividade envolvida em todos os estados emocionais e em parte
pelos circuitos específicos que cada tipo de alegria, prazer ou felicidade podem desencadear. O
prazer de se alimentar pode regular vias de comunicação distintas do prazer relacionado a
procriação, assim como a alegria de rever um ente querido pode ativar circuitos de sinalização
diferentes da alegria proporcionada pelo alcance da vitória pelo seu time de futebol (LeDOUX,
2012 b).
Desta maneira, o foco das teorias emocionais voltadas para a subjetividade de um
conceito singular de emoção ou convertendo em uma única palavra (medo, alegria, prazer...)
diversos estados mediados por diferentes tipos de circuitos, pode estar negligenciando detalhes
do processo emocional. Destarte, ‘os circuitos de sobrevivência’, ganham evidência no auxílio
à elucidação dos caminhos escolhidos pelo organismo em resposta a um estímulo interno ou do
ambiente. Estes circuitos contribuem para organização das funções cerebrais, priorizando
específicos tipos de resposta e inibindo atividades que são irrelevantes para uma dada situação
(LeDOUX, 2012 b).
Os circuitos de sobrevivência (Figura. 11) são dispositivos sensório motores integrados
que servem para propósitos adaptativos específicos. São acionados frente a situações
desafiadoras, comumente chamadas de ‘situações emocionais’ e utilizam esta informação para
controlar respostas comportamentais e ajustar fisiologicamente o organismo, no intuito de
trazer um desfecho positivo a situação; um retorno aos índices habituais da busca pela
homeostase (LeDOUX, 2012 b).
Quando um estímulo emocional aciona o circuito, respostas comportamentais, respostas
do sistema autonômico e resposta hormonais são enviadas como feedback ao cérebro. O sistema
neuromodulador inicia a regulação de excitabilidade e neurotransmissão pelo cérebro. O
comportamento dirigido a objetivos é acionado pelo sistema motivacional. Os sistemas
sensoriais, cognitivos e de memória são regulados para direcionar a atenção ao estímulo
relevante, o que forma uma memória sobre a interação estímulo /resposta corporal (LeDOUX,
2012 b).
Nesta teoria, dois estágios são encontrados diante de uma situação desafiadora: A
excitação cerebral e a excitação generalizada (general arousal). A excitação cerebral pode ser
caracterizada pela regulação de neurônios que sintetizam e liberam aminas biogênicas
(norepinefrina, dopamina, serotonina ou acetilcolina) e peptídeos. A chamada excitação
63
generalizada ocorre pela ativação dos sistemas endócrinos periféricos na sinalização e liberação
hormonal na circulação sanguínea (PFAFF, 2008).
Figura 11– Circuitos de Sobrevivência
Figura 11. Consequências da ativação dos circuitos de sobrevivência adaptado de LeDoux (2012 b).
Para LeDoux (2012 b) estes estados orgânicos são chamados de ‘estados globais do
organismo’ e incluem circuitos específicos de sobrevivência, assim como componentes gerais
de motivação, que regulam o comportamento e a excitação generalizada do cérebro e do corpo.
A ideia proposta pelo autor é que sentimentos conscientemente percebidos por seres
humanos estão relacionados com a representação cognitiva dos estados globais do organismo.
Os componentes destes estados incluem um estimulo desencadeador, a percepção de aspectos
físicos e sociais do ambiente do estímulo, a especificidade de circuitos que o referido estimulo
ativa, a excitação específica do sistema nervoso central (SNC), o feedback expresso pelo corpo
e memórias de longo prazo relacionadas ao estímulo e sobre o estado que se resulta dele (Figura
12).
Os estados de excitação descritos por LeDoux (2012 b) e Pfaff (2008) são muito
similares a reação de alarme descrita por Selye (1950) durante a SAG - Síndrome Geral da
Adaptação. Desta forma, tanto nos circuitos de sobrevivência como na SAG, há a presença de
um estímulo responsável por suscitar respostas centrais e periféricas específicas no organismo
a fim de adaptar-se a uma nova situação que se concretiza em um dado momento (SELYE,
1950; LeDOUX, 2000; LeDOUX, 2003; CHARMANDARI, 2005; PFAFF, 2008;
CHROUSOS, 2009; LeDOUX ,2012 a; LeDOUX, 2012 b).
64
Figura 12 – Estados Globais do Organismo
Figura 12. Esquema sobre os estados emocionais conscientemente percebidos e os componentes dos
estados globais do organismo para a sua representação cognitiva.
Fonte: Adaptado de Depositphotos, 2018.
Em seu texto “sobre seres humanos e suas emoções: um ensaio sob a perspectiva da
sociologia dos processos”, Elias sugere que nenhuma emoção de uma pessoa adulta é um
padrão reativo geneticamente fixado ou filogenicamente preservado de maneira intacta.
Segundo o autor, os impulsos emocionais não aprendidos estão sempre relacionados a uma auto
regulação aprendida. Além disso, propõe que a emoção humana é constituída por três aspectos
distintos e complementares: um componente comportamental (expressão emocional), um
componente fisiológico e um componente sensível (sentimentos auto percebidos). Mesmo na
resposta ‘automática’ de luta ou fuga, na qual encontramos o componente fisiológico na
regulação orgânica, o componente comportamental na tomada de decisão e o componente
sensível na descrição do sentimento auto percebido geralmente de medo ou raiva, existe em
alguma extensão, o compartilhamento do padrão da experiencia emocional com animais não
humanos, porém, no caso de humanos há uma capacidade muito maior de diversificação desta
resposta em relação a situações e experiências aprendidas (GEBARA, WOUTERS, 2009).
Elias afirma ainda, que os seres humanos são naturalmente preparados para o
aprendizado e se vinculam uns aos outros por meio de uma linguagem, variações emocionais e
consciência aprendidas, deixando explicito o engate entre a evolução biológica e o
desenvolvimento social (GEBARA, WOUTERS, 2009).
65
Neste sentido afirmamos que não é fácil lidar cientificamente com sentimentos
humanos. Porém, parece claro para os autores apresentados, que as vias de sinalização
desencadeadas pelos estímulos emocionais, sejam estes prazerosos ou ameaçadores, passam
pelos mediadores naturais e aprendidos a fim de regular ações posteriores de finalidade muitas
vezes desprezada, além de caracterizar um estado emocional específico. Desta maneira,
aspectos fisiológicos indiretos, acionados frente a estados emocionais específicos, com
descrições subjetivas sobre a experiencia emocional podem nos indicar os caminhos
percorridos, desde a percepção da variação no meio ambiente até a regulação comportamental
dos indivíduos.
Decerto as emoções não são, em sobremaneira, exclusivamente primitivas, respostas
instintivas ou tampouco desassociadas das complexas funções intelectuais e cognitivas como
afirmava Descartes (1983) em suas reflexões. A experiência emocional tem uma extraordinária
plasticidade de engates fisiológicas e sociais. Assim como a percepção e a ação, a emoção é
parte de uma rede intrincada de conexões de circuitos nervosos, acompanhada por respostas
autonômicas, endócrinas, motoras e sensíveis, capazes de adaptar o ser humano ao estímulo ao
qual se é exposto, seja este agudo ou crônico (LIU, 1997; SANCHEZ, 2009; ESPERIDIÃO -
ANTÔNIO, 2008; DAMÁSIO, 1994; TOMAZ, 1997; DESCARTES, 2000).
Em alguns casos o estímulo emocional pode ser agradável e prazeroso. Portanto, uma
partida de futebol, na qual são experienciadas situações miméticas de confronto físico, euforia
e frustração, sem necessariamente o risco à vida, tem a possibilidade de ativar o sistema do
stress. Assim, hormônios de fácil, rápido e relativo baixo custo de analise, como o cortisol,
liberado pelo córtex adrenal, regulado pelo eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, característicos da
excitação generalizada e feedback periférico frente a estímulos emocionais, alterações
metabólicas na síntese, liberação e direcionamento de substratos energéticos tais como a
glicose, além da regulação autonômica do fluxo sanguíneo pela frequência cardíaca e pressão
arterial, podem ser considerados como marcadores periféricos da ativação emocional (TANNO,
2002; DALGLEISH, 2004; CHROUSOS, 2009; JORGE, 2010; CAMPOS, 2014)
desencadeada por ações de uma partida de futebol.
O delineamento experimental focado nos eventos externos captados pelos receptores
periféricos tem sido apresentado como a alternativa mais completa de observar as funções e
conexões orgânicas de circuitos inicialmente moldados pela experiência vivida. LeDoux (1994,
2000, 2003 e 2012a) descreve os caminhos transcorridos pela sinalização cérebro-corporal a
partir da detecção de uma ameaça até o sentimento do medo. Nossa hipótese é que uma partida
de futebol gera tensões nos torcedores que estimulam os circuitos de sobrevivência e
66
proporcionam os estados globais do organismo através do mimetismo. Desta maneira, o
estímulo seria percebido por receptores sensoriais adequados à qualidade e intensidade do
estímulo dado, em seguida os neurônios aferentes transportariam este influxo para o SNC, onde
seria processado e desencadearia uma cascata de sinalização típica, em resposta a determinada
ação dentro da partida.
Para tal apresentamos no próximo capítulo a metodologia de coleta destes marcadores,
assim como os resultados da pesquisa desenvolvida, no intuito de identificar as peculiaridades
da fisiologia das emoções nos torcedores fanáticos de futebol.
67
CAPÍTULO III
MÉTODO DA PESQUISA DE CAMPO, ANÁLISE DOS DADOS,
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Esta pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética sob o nº. de protocolo 2.338.140 (Anexo
A). Trata-se de um estudo com uma abordagem qualitativa, de natureza aplicada, com objetivos
exploratórios e com procedimento de estudo de caso.
Foram contatados mais de 20 torcedores da Sociedade Esportiva Palmeiras e do Sport
Club Corinthians Paulista durante o primeiro semestre de 2018. Esta escolha se deu pela
grandiosidade nacional dos dois times, pela evidente rivalidade histórica na capital paulistana,
pelo fato da torcida do Corinthians ser considerada uma das maiores do Brasil e uma das mais
fanáticas pelo seu time.
O contato inicial se deu prioritariamente a partir de jogos de futebol televisionados ou
por conversas em ambientes sociais compartilhados. No primeiro caso, ao perceber homens
torcedores atentos a jogos específicos do Corinthians ou do Palmeiras, uma pergunta
introdutória era feita: “para qual time você torce?”, em seguida o fluir do convívio social em
diálogos futebolísticos norteava a conversa. Porém, uma pergunta em algum momento da
conversa era intencionalmente feita: “você se considera um torcedor fanático?”. À medida que
a resposta era positiva, e o torcedor era fanático pelo Corinthians ou pelo Palmeiras, maiores
explicações sobre a pesquisa eram apresentadas e ao final desta conversa informal, o convite
para a participação da pesquisa era oficialmente realizado. No segundo caso, contato iniciado
em outros ambientes sociais que não o futebolístico, à medida que o assunto futebol se
estabelecia nas rodas de conversa o mesmo roteiro era seguido. A investigação pelo time de
preferência e pelo nível de entrega ao ato de torcer, para que assim se desse o convite formal
para a participação na pesquisa.
Inúmeras histórias sobre as vivências futebolísticas destes voluntários em potencial
poderiam ilustrar uma grande revista em quadrinhos. Tantas emoções compartilhadas
conduziram a uma mudança de visão desta pesquisa sobre o torcedor fanático de futebol. Ainda,
outros contatos foram feitos com torcedores organizados ícones ou não, conhecidos local e/ou
nacionalmente por sua atuação frente as torcidas organizadas de seus times. Estes últimos,
quase todos com algum tipo de doença cardíaca, tiveram que ser excluídos do estudo.
Durante o processo de execução desta pesquisa, passamos por diversos encontros de
aprimoramento do seu desenvolvimento. Em um desses momentos estivemos em um congresso
internacional sobre as teorias de Norbert Elias, no estado do Paraná, onde diversos
68
pesquisadores de diferentes nacionalidades se encontraram. Um desses pesquisadores, um
alemão também intrigado pelas questões futebolísticas escolheu a camisa do Corinthians para
ser souvenir de sua viagem. Neste momento pude vislumbrar o alcance deste símbolo.
A priori a proposta de coleta era unir torcedores fanáticos de ambos os times, na final
do campeonato paulista de 2018, para simular o que acontece em alguns estádios do Brasil nos
quais não há a imposição de torcida única4. Este tipo de convite a priori não atraiu a nenhum
dos sujeitos. As justificativas por menos explicitas que fossem, afirmavam ser impossível não
brigar com homens desconhecidos ou conhecidos, torcedores do time rival, em uma final de
campeonato. Este fato por si só, de acordo com Redden e Steiner (2000), comprova o fanatismo
da população estudada. Os autores indicam que alguém fanático pode reagir violentamente com
alguém de opinião contrária.
Passou-se então a segunda estratégia, comparar jogos de magnitude diferentes com
torcedores de um mesmo time. Fizemos então a coleta da final do campeonato paulista 2018
apenas com torcedores fanáticos pelo Corinthians. Para isto, observamos atentamente a tabela
de jogos de todos os campeonatos que o Corinthians participava no referido ano. A partida do
segundo turno do brasileirão 2018, novamente com o Palmeiras se encaixou perfeitamente nos
pré-requisitos para a comparação. O jogo se deu no mesmo horário e dia da semana que a final,
entre os mesmos times, em um contexto completamente diferente do primeiro jogo.
Na final do campeonato paulista de 2018, o Corinthians havia perdido o primeiro jogo
da disputa, precisava marcar um gol para decidir o campeonato nos pênaltis, ou vencer por dois
gols de diferença para arrematar o campeonato no tempo regulamentar. No segundo jogo, o
time do Corinthians havia sido desmontado, como é de praxe no futebol brasileiro quando é
aberta a janela de contratação internacional. O Palmeiras estava em melhor campanha e não era
um jogo decisivo em nenhuma hipótese. Mesmo assim, era uma partida considerada clássica.
Quando selecionados, os voluntários assinaram o termo de consentimento livre e
esclarecido (Anexo B), informado anteriormente ao início de qualquer procedimento. A
identificação das amostras coletadas foi numeral e não nominal, garantindo assim a
confidencialidade e a privacidade dos indivíduos analisados, tendo estas sido identificadas de
acordo com o dia de coleta (CF ou CR) e ao momento no qual a coleta foi realizada (1, 2, 3, 4,
4 Implantada pela Secretaria da Segurança Pública desde abril de 2016, vigora no estado de SP a política de
torcida única nos estádios. Em jogos entre dois dos maiores clubes do estado (Corinthians, Palmeiras, São Paulo
e Santos) apenas quem tem o mando de campo pode receber seus torcedores nas arquibancadas.
Fonte: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/03/23/O-que-%C3%A9-a-pol%C3%ADtica-de-torcida-
%C3%BAnica-e-por-que-h%C3%A1-quem-queira-acabar-com-ela
69
5). Os resultados dessa pesquisa foram divulgados por meio de apresentação de trabalho como
comunicação oral no ‘2018 Elias conference Brussels’ e por meio de um artigo científico
submetido à revista IRSS - Internacional Review for Sociology in Sport. Um termo de liberação
de imagens também foi assinado (Anexo C) permitindo assim a exemplificação de expressões
emocionais corporais nesta tese e nas publicações.
Os instrumentos de coleta foram utilizados em três encontros, com no mínimo 48 horas
de intervalo entre um e outro (Tabela. 1). Em suma, o primeiro encontro com os voluntários
teve o objetivo de explicar os procedimentos, colher a assinatura no termo de consentimento
livre e esclarecido (TCLE), preencher o questionário sobre a caracterização socioeconômica
dos torcedores e o significado do torcer, além de entregar o instrumento de coleta de cortisol
salivar referente às medidas CF1 e CR1. O questionário aplicado (Anexo D), no intuito de
caracterizar os torcedores avaliados, foi elaborado pela equipe de pesquisa e revisado por uma
equipe de especialistas quanto ao seu conteúdo e aparência (TERRA, 2010).
O segundo encontro, coleta futebol (CF), aconteceu em duas etapas: a primeira em 8 de
abril de 2018, final do campeonato paulista de futebol e a segunda em 9 de setembro de 2018,
durante o segundo turno do campeonato brasileiro de futebol. Ambas as partidas foram
disputadas entre o Sport Clube Corinthians Paulista e a Sociedade Esportiva Palmeiras, as
mesmas ocorreram em domingos e tiveram seu início às 16 horas.
Nas duas etapas do segundo encontro, os participantes foram reunidos em uma sala
reservada para os fins de coleta desta pesquisa, na faculdade de Educação Física da UNICAMP,
com temperatura controlada entre 22 e 25 graus, água a vontade e televisor com transmissão do
jogo pela rede aberta de televisão (Globo). A priori, os voluntários passaram por um período de
familiarização com o ambiente. Em seguida foram convidados a preencher o inventário sobre
ansiedade assim como sobre a presença/intensidade de depressão e, só então, foi colocado o
equipamento para coleta de frequência cardíaca (firstbeat SPORTS team 4.6®). Neste mesmo
dia foram feitas as coletas de cortisol salivar, glicose sérica e pressão arterial em cinco
momentos distintos: imediatamente após o despertar (CF1 – pelo próprio voluntário – tendo
sido este previamente orientado pela pesquisadora), 30 minutos antes do início da partida (CF2),
durante o intervalo do jogo (CF3), imediatamente após o termino do jogo (CF4) e 40 minutos
após o fim da partida (CF5). Todos os horários que aconteceram cada coleta foram anotados
para serem replicados na coleta rotineira (CR).
O terceiro encontro com os sujeitos/voluntários, denominado de coleta rotineira (CR),
aconteceu no mesmo horário e período de duração do jogo que o voluntário assistiu, em um dia
70
rotineiro, de forma individual, sem jogo do Corinthians por pelo menos 24h antes ou depois do
dia de CR, de acordo com a disponibilidade de cada participante.
Os inventários de ansiedade e presença/intensidade de depressão de Beck foram
aplicados pela psicóloga (CRP -06/110928) Luciana Bittencourt (Anexo H) que ofereceu
suporte à equipe durante todo o processo de coleta e análise de dados, obedecendo assim, a
exigência da Casa do Psicólogo.
População da Pesquisa
A amostra foi composta por seis homens (n=03 em cada jogo) a partir de 18 anos de
idade, sem histórico de doença neurológica, cardíaca ou metabólica, que não fizessem uso de
esteroides e, que se autodenominaram torcedores fanáticos5 de futebol. Os indivíduos foram
orientados a não consumir álcool6 ou doces nos dias das coletas, tampouco se alimentarem ou
escovarem os dentes imediatamente antes de cada coleta no intuito de preservar a fidedignidade
dos dados coletados.
5 Aquele indivíduo que assume que se altera quando assiste a um jogo. 6 muitos dos participantes convidados, demonstraram insatisfação e até impossibilidade de participação devido a
necessidade de não ingestão de álcool no dia da partida.
71
Tabela 1 - Resumo do delineamento experimental
Instrumentos para coletas de dados
Questionário para caracterização socioeconômico e do significado de torcer
Este questionário (Anexo D), de nossa autoria, contém 25 perguntas, abordando as
variáveis: idade, crença religiosa, estado civil, renda familiar mensal, número de filhos, tipo de
moradia, nível de escolaridade, regime de trabalho, tabagismo, consumo de bebida alcoólica,
doenças, uso de medicamentos, experiência pessoal em estádios de futebol, relação emocional
com seu time de futebol, significado pessoal do torcer, frequência de acompanhamento dos
jogos e experiência pessoal sobre descontrole no ato de torcer.
O modelo de coleta de dados por meio de questionário possibilita medir o que se deseja
com exatidão, tendo em vista que a resposta das questões é realizada pelo próprio informante,
devendo ter a natureza impessoal, ser limitado em sua extensão e finalidade (CERVO e
BERVIAN, 2002).
72
Este instrumento foi submetido a um processo de refinamento (validação de aparência),
no intuito de verificar o alcance do objetivo traçado, a clareza, a objetividade e a abrangência
em relação ao que se propõe verificar (GALDEANO, 2007).
Para esta validação, o questionário foi encaminhado a dois docentes/pesquisadores,
especialistas no estudo sobre torcedores de futebol, junto com um formulário contendo questões
avaliativas sobre a forma de apresentação, facilidade de leitura, clareza e conteúdo, assim como
espaço para sugestões de modificação (Anexo E).
Inventário de Ansiedade de Beck (BAI)
Este instrumento fornece informações sobre as propriedades psicométricas através de
uma escala construída no auto relato (Anexo F). O inventário foi traduzido para o português e
validado no Brasil por Cunha (2017) e estabelece uma diferença precisa com os aspectos
depressivos. Este inventário não tem como propósito revelar um diagnóstico, mas sim, refletir
somaticamente, afetivamente e cognitivamente os sintomas característicos da ansiedade (BECK
et al, 1988; CUNHA, 2017).
A escala do tipo likert (4 pontos) é constituída por 21 itens afirmativos descritivos sobre
a ocorrência de incomodo por cada um dos sintomas durante a semana que passou, refletindo
os níveis de gravidade dos sintomas. O escore total é o resultado da soma dos escores de cada
item e pode variar de 0 a 63. As indicações de interpretação do resultado são: 0 a 10- ansiedade
mínima; 11 a 19 – ansiedade leve; 20 a 30 – ansiedade moderada; 31 a 63 – ansiedade grave
(BECK et al, 1988; CUNHA, 2017).
Inventário de Depressão de Beck (BDI-I)
Este instrumento (versão brasileira, GOERENTEIN e ANDRADE, 1996) é aprovado
pelo Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos/ Conselho Federal de Psicologia, com
autorização do The Psychological Corporation e, apoio da Casa do Psicólogo (PINTON, 2006).
Ele avalia as manifestações comportamentais que indicam a intensidade da depressão,
caso esta exista. É um instrumento estruturado no auto relato, composto de 21 categorias de
sintomas e atitudes (Anexo G) que descrevem manifestações cognitivas, afetivas e somáticas
da depressão.
As categorias contêm quatro alternativas que expressam níveis de gravidade dos
sintomas da depressão, sendo sua pontuação por categoria entre 0 e 3, onde zero indica ausência
de sintomas e 3 a presença dos mais intensos. Os itens não foram escolhidos para refletir
qualquer teoria sobre a depressão (TERRA, 2010).
73
Para este estudo foi adotada a recomendação de Cunha (2017) para pontos de corte. Até
15 escores para população sem diagnóstico de depressão; 16 a 20 para o grupo com disforia ou
depressão leve; 21 a 29 para o grupo com depressão moderada e, 30 ou mais, para depressão
grave.
Este instrumento foi selecionado para este estudo por ter a depressão, uma relação direta
com os níveis de cortisol, por ser de fácil aplicação e por ser considerado referência padrão na
avaliação da depressão (CUNHA, 2017). O objetivo da utilização deste instrumento neste
estudo é tão somente identificar a situação emocional em que o indivíduo se encontrava para,
se necessário, comparar com os marcadores periféricos coletados, no intuito de obter uma
qualidade mais acurada da descrição da expressão fisiológica emocional de cada indivíduo no
momento da coleta.
Aferição da Pressão Arterial (PA)
A aferição da PA foi efetivada por meio do medidor de pressão arterial automático de
braço Deluxe HEM 7113 (Omron®) que realizou medidas de pressão sistólica, diastólica e de
pulso.
Para uma aferição fidedigna foi solicitado a cada participante não ingerir álcool ou
exercitar-se pelo menos 30 minutos antes do início da coleta. O indivíduo foi requisitado a
sentar-se com os pés apoiados no chão e repousar o braço sobre uma mesa, previamente
preparada para a aferição. A braçadeira foi colocada no braço esquerdo de acordo com as
indicações do fabricante.
Coletas de Glicose e Cortisol Salivar
As amostras de glicose foram coletadas por uma gota de sangue retirada da ponta do
dedo indicador das mãos, alternadamente 1 a 5 de cada dia (CF e CR). Para tanto, foi utilizado
o aparelho Glicosímetro accu-chek connect® (Roche) e suas respectivas lancetas descartáveis.
A coleta de cortisol salivar ocorreu por meio de tubo específico (salivette®), nos
momentos 1 a 5 de cada dia (CF e CR). Em suma, o voluntario posicionou o algodão
armazenado no tubo debaixo de sua língua por 60 segundos e em seguida, com o algodão
umedecido de saliva, o reposicionou novamente dentro do tubo, fechando-o bem. Para a coleta
CF1 e CR1, após acordar o voluntário acionou a pesquisadora que foi ao seu encontro para
coletar a pressão arterial, a glicose e acondicionar adequadamente o tubo contendo a saliva.
Para transporte e armazenamento, as amostras foram acondicionadas a -20ºC de acordo com as
recomendações do fabricante do kit de análise (Salivary cortisol ELISA kit-Salimetrics ®). O
material coletado permaneceu adequadamente armazenado por até 6 meses e para a extração e
74
análise do cortisol proveniente da saliva, as amostras foram centrifugadas a 3000 x g, em
temperatura ambiente por 5 minutos no intuito de remover as mucinas. O sobrenadante foi
coletado para a análise de acordo com as orientações do kit. Em seguida ao processo de extração
do analito, foi confeccionada uma curva padrão de diluições do cortisol contendo as
concentrações finais de 0, 0.1, 0.5, 1.5, 4.0, 10 e 30 ng/mL, a fim de normalizar o resultado
final das amostras. Para análise em ELISA, a placa foi montada com poços contendo uma
concentração padrão de cortisol, um poço para controle de contaminação sem conter cortisol e
as amostras teste em duplicata. A leitura de absorbância foi a 450nm.
Os cálculos de concentração foram feitos pela média de absorbância das amostras teste
em relação a curva de diluição.
Aferição da Frequência Cardíaca (FC)
O comportamento da frequência cardíaca e a frequência cardíaca máxima (FC máxima)
foram mensurados, em tempo real, através do equipamento firstbeat SPORTS team 4.6
performance monitoring system ® (Firstbeat techinologies). Para tanto, foi necessário aferir
previamente o peso e a altura dos voluntários, assim como indicar o momento que se deu o
início de cada tempo do jogo e suas ações.
Foram utilizadas cintas (individuais) de monitoramento cardíaco conectados ao
software, identificados e específicos para cada voluntário, em concordância com os dados de
altura e peso previamente anotados e inseridos no programa. Os medidores foram acionados
através do receptor USB apropriado, de acordo com as instruções do fabricante e, o momento
de início da coleta de dados foi anotado para posterior comparação entre os outros parâmetros
coletados.
Relação da FC com as ações dos jogos
Para a análise de comportamento da frequência cardíaca durante os jogos de futebol, foi
estabelecida a FC máxima e os valores correspondentes a 50% e 70% da FC máxima de cada
indivíduo, como ponto de corte. O início do jogo foi considerado o momento do apito do árbitro
e este tempo foi indicado como tempo zero, desta forma todas as ações subsequentes puderam
ser identificadas no momento do jogo que aconteceram e relacionadas com sua correspondente
FC. No intuito de sincronizar o comportamento da FC com as ações do jogo, foram extraídas
da coleta total dos sujeitos as medidas de FC que se igualavam ou ultrapassavam os valores de
75
corte estabelecidos, para então serem associadas as ações do jogo. Cada partida foi assistida
posteriormente pela internet.7
Análise de Dados
Para organização, descrição e análise de observações dos dados, foram utilizadas as
escalas de medida nominal, ordinal e de razão, descritas por média e desvio padrão quando
necessário.
A análise das características socioeconômica e do significado de torcer foram feitas de
forma qualitativa e o comportamento dos parâmetros bioquímicos, mesmo com uma quantidade
de sujeitos reduzida, foi feita de forma quantitativa, utilizando a média aritmética como medida
de posição de tendência central. A análise de variância foi feita por meio do ANOVA (2way)
quando os grupos e os momentos de coleta influenciavam a análise. Quando apenas os grupos
em sua totalidade e não o momento da coleta estava sendo avaliado foi utilizado o teste T para
amostras independentes. A representação gráfica está exibida em colunas e barras assim como
em gráfico de linhas.
A análise do comportamento da FC foi feita de maneira descritiva em comparação às
ações do jogo e apresentado em gráficos de linha.
Resultados e Discussão
Os resultados expostos a partir deste momento serão informados seguindo a
apresentação metodológica. Quando o bloco de dados não tiver sofrido interferência da
dinâmica da partida será exposto em conjunto, como a caracterização socioeconômica dos
torcedores e o significado de torcer. Informações bioquímicas, de estado emocional ou qualquer
variável afetada diretamente pela dinâmica de tensão-excitação dos jogos, serão expostas
separadamente evidenciando sempre as peculiaridades das ações do jogo que desencadearam
determinada sinalização.
Caracterização Socioeconômica da População da Pesquisa e Significado de Torcer
Todos os voluntários (n=6) eram homens, com uma idade média de 30 anos (± 7,8),
renda familiar mensal que variou entre R$ 1.200,00 e R$ 15.000,00, com o ensino superior em
andamento ou completo e de crenças religiosas diversas. Todos torcedores se
autodenominaram fanáticos pelo Corinthians, assistem a todos os jogos que podem,
71º jogo – final do campeonato paulista 2018 08/04/2018 – 16:00 - https://www.dailymotion.com/video/x6hjm6v
1ºtempo; https://www.dailymotion.com/video/x6hk7cu 2ºtempo; https://www.dailymotion.com/video/x6hk7cv
pênaltis. 2º jogo – 24ª rodada do campeonato brasileiro de 2018 09/09/2018 – 16:00 -
https://www.dailymotion.com/video/x6tdd74 1ºtempo; https://www.dailymotion.com/video/x6tdd73 2ºtempo.
76
independente do campeonato. Metade deles estava desempregado no período da coleta, solteiro
e praticante de atividade física diária. Sessenta e seis por cento destes torcedores residem em
casa alugada e 44% desempenham carga semanal de trabalho próxima a 40 horas. Somente um
dos voluntários afirmou fumar cigarros regularmente (aproximadamente 10 unidades por dia)
e ele foi o único que assegurou não consumir bebidas alcoólicas com frequência. Todos os
outros participantes fazem uso de bebida alcoólica, sendo quatro deles semanalmente e um com
frequência de consumo quinzenal. Nenhum dos voluntários apresentou algum tipo de doença
crônica e apenas um se referiu a consumo diário de medicamentos para ansiedade.
Quando perguntados sobre o motivo da escolha do Sport Club Corinthians Paulista para
time do coração, 4 dos 6 voluntários indicaram a influência dos parentes como fator
determinante. Dos seis entrevistados citados, apenas dois tinham filhos. Estes informaram que
seus filhos também gostam de futebol, mas apenas em um dos casos o filho segue a tradição
familiar de torcer para o Corinthians.
Um dos voluntários respondeu que a escolha por torcer pelo Corinthians foi uma opção
de criança e que sua primeira vivência no estádio foi com seu irmão, fanático por outro time da
capital paulista em um jogo deste time. Relatou ainda que durante a mesma semana desta
experiencia, foi ao estádio para um jogo do Corinthians e nesta ocasião teve a certeza que este
era o seu time de futebol favorito. “Foi em um jogo do São Paulo com meu irmão que também
é fanático, mas, são paulino. Foi um misto de surpresa (pelo novo) com tensão, pois estava
torcendo pelo time de fora, dentro da torcida da casa. Contudo, na mesma semana fui ao
primeiro jogo do Corinthians e tive a certeza que era o meu time. A minha paixão.” (Voluntário
4)
Os relatos sobre a primeira ida a um estádio de futebol sempre destacam o fator
emocionante e marcante da experiencia, mesmo que em jogos ruins ou que não eram do
Corinthians. “Foi no ano de 2010 Guarani e Palmeiras. Fui com amigos palmeirenses, mas
fiquei na torcida do Guarani. Foi um jogo ruim, xôxo. [...] Mesmo o jogo sendo ruim, ir ao
estádio foi muito bom. Assistir jogos em estádios é uma experiencia marcante. Muito diferente
de ver em casa. A atmosfera é vibrante.” (Voluntário 1). ‘Foi fantástico, sensação única. Pude
perceber o significado de emoção, empolgação, sentir a entrega por tanta emoção.”
(Voluntário 5)
Apenas um dos voluntários relatou não ter feito nenhuma loucura pelo seu time. Todos
os outros já ultrapassaram as regras sociais outorgadas em prol do seu fanatismo. Um já se
envolveu em brigas por causa do Corinthians, outro já realizou apostas malsucedidas, um
terceiro saiu abraçando pessoas desconhecidas no meio da madrugada após a vitória da copa
77
Libertadores da América pelo seu time, além de soltar bombas nas janelas das casas de
torcedores palmeirenses. Na comemoração deste mesmo título, outro voluntário disse que foi
loucura feita por amor ao time, ir para quadra da torcida organizada Gaviões da Fiel, enquanto
um outro disse ter sido loucura ter transposto o alambrado do estádio para se juntar a referida
torcida organizada para assistir a um jogo.
Os sujeitos se sentem, em suas palavras “representados”, “orgulhosos”, “felizes”, “em
casa” e “bem”, quando estão em outro Estado do Brasil e se deparam com uma camisa do
Corinthians. Em alguns casos se sentem contemplados pela escolha por este time, mesmo com
a presença de clubes locais.
No intuito de compreender um pouco mais o que significa ser torcedor, o que um
torcedor fanático espera de torcedores do seu time e o que cada um sente em determinadas ações
da partida ou diferentes tipos de jogo, nós claramente perguntamos. O que significa ser
torcedor? Nas respostas encontramos as seguintes afirmativas:
“Significa se aproximar dos valores do time. Representação identitária. Me identifico
com o símbolo do time e com minha vida pessoal. É participar sem participar. É torcer/sofrer
sem ser ouvido. Sofrer sem uma razão lógica. É viver uma ilusão e um momento de que você
fez parte daquilo, mas que no fim você é só mais um.” (Voluntário 1)
“Orgulho de cada dificuldade e superação da história do glorioso Corinthians. Acima
de tudo, em nenhuma hipótese, deixar de amar esse time. É minha segunda religião.”
(Voluntário 2)
“Significa torcer, rezar e amar o time independente da situação. Significa defender a
história, as cores do time perante a de um rival. Significa se juntar a pessoas diferentes pelo
motivo de torcer pelo seu time.” (Voluntário 3)
“Significa sentir amor/paixão por algo que não se tem qualquer laço sanguíneo, ou
relação social previa que, por conseguinte torna esse sentimento o mais espontâneo possível.”
(Voluntário 4)
“Ter uma paixão por uma camisa. Um clube, algo que transforma, ter amor, por torcer
é ser torcedor.” (Voluntário 5)
“Despejar um pouco das dificuldades do dia a dia em algo.” (Voluntário 6)
Claramente cada fala corrobora com a teoria apresentada. Fica evidente e inegável o
vínculo do indivíduo com o clube de futebol da sua escolha, no caso, o “glorioso Corinthians”.
Os três primeiros voluntários ressaltaram o sentimento de pertencimento e identificação com
ambiente material e imaterial do clube, no sentido que indicam em suas falas a importância de
ter orgulho da história do time, defender estes duelos assim como os símbolos e cores perante
78
os rivais, além de citarem ter a ilusão de fazer parte de um determinado momento do time tão
valoroso para si e isto ser motivo de união entre diferentes.
Por vezes, esse vínculo afetivo foi dito como sem propriedade racional explícita ou
conhecida capaz de explicar como este significado cognitivo, denominado de paixão ou amor
pelo time, representativo de estados orgânicos globais experienciados ao torcer em jogos do
Corinthians, pode nortear comportamentos, inclusive de transgressão das regras sociais
estabelecidas, como descrito a seguir.
As falas ainda corroboram com o entendimento do conceito de torcer como experiencia
mimética de dinâmicas de tensão-excitação, na busca de uma excitação específica pressuposta
por um nível de sofrimento que satisfaz um desejo, seja de pertencimento, de glória pela vitória
ou de honra pelo envolvimento.
Apenas um voluntário expressou o significado do torcer como uma válvula de escape
para as tensões rotineiras.
Em resposta à pergunta “O que você espera de um torcedor?” Encontramos um perfil
que demonstra a busca por um ideal de individuo estruturado por uma masculinidade guerreira,
honrada, leal e dedicada. Persistente em sua busca por vitória.
“Lealdade e apoio ao time. Mas quando o time deixa de representar, não tem como
este se mostrar fixo.” (Voluntário 1)
“Que seja fiel.” (Voluntário 2)
“Respeito, fanatismo e apoio sempre maior do que as críticas.” (Voluntário 3)
“Que seja uma pessoa com garra na vida. Que não desiste fácil, que nunca abandona
a luta.” (Voluntário 4)
“Que tenha orgulho, paixão, que se entregue pelo time, que o apoie e o defenda sobre
todas as coisas.” (Voluntário 5)
“Que goste de raça, justiça e seja humilde. O Corinthians é o hino da democracia,
importante lembrar.” (Voluntário 6)
No intuito de investigar o conceito subjetivo aplicado para descrever uma determinada
experiencia emocional, os sentimentos conscientemente percebidos e expressos foram
interrogados como apresenta a Tabela 2.
Ao comparar as emoções autodeclaradas durante ações especificas do jogo, a única
situação em que um mesmo estado emocional foi descrito é a felicidade quando o time ganha
uma partida. Todos os voluntários autodeclararam sentir-se felizes quando o Corinthians vence
um duelo esportivo. Emoção parecida com a do momento do tento alcançado pelo time. Nesta
ação do jogo, três voluntários declararam sentir-se felizes quando o Corinthians faz um gol,
79
enquanto as emoções “alegria”, “vibrante” e “muito bem” também foram citadas como
representações cognitivas de um estado global do organismo desencadeado pelo ato do time do
Corinthians fazer um gol no adversário. Ambas as experiências foram vivenciadas na 1ª etapa
da nossa coleta CF, na final do campeonato paulista de 2018. A emoção associada ao estado de
perder uma partida variou de “triste” para “bravo”, “nervoso”, “humor muda para pior” e “meu
dia fica ruim”. Esta situação foi vivenciada pelos voluntários que assistiram ao jogo da 24ª
rodada do brasileirão, 2ª etapa da nossa coleta CF. Estas três situações terão o comportamento
da FC para cada uma das situações descrito a posteriori.
Tabela 2 - Percepções Cognitivas do estado Orgânico
Todas estas percepções emocionais podem descrever graus de prazer e frustração em
relação ao desempenho dos atores da disputa em campo. Sobre isso Elias e Dunning (1992)
sugerem:
“Se colocarmos os fatos miméticos ao longo de uma escala, em um de seus polos
estará o prazer ótimo em outro o fracasso” p.134 “O maior ou menor prazer da
participação como atores ou espectadores de um fato de lazer, fornece o critério para
distinguir aqueles que são bem-sucedidos daqueles que são um fracasso. Ao mesmo
tempo pode-se encontrar quais e de quais modos os aspectos fisiológicos de prazer e
excitação são diferentes perante jogos de nível ótimo e aqueles que estão no limite
oposto da escala.” p.135
Como você se
sente quando
seu time faz um
gol?
Como você se
sente quando
seu time sofre
um gol?
Como você se
sente quando
seu time perde
uma
oportunidade de
gol?
Como você se
sente quando
seu time ganha
uma partida?
Como você se
sente quando
seu time perde
uma partida?
Como você se
sente quando
seu time empata
uma partida?
Voluntário 1 Normalmente
feliz
Depende Normalmente
chateado
Feliz de maneira
geral
Triste de maneira
geral
Indiferença e
raiva se era uma
partida ganha.
Voluntário 2 Muita felicidade Com raiva Solto vários
palavrões
Feliz demais Fico bravo Dependendo do
desempenho fico
tranquilo
Voluntário 3 Feliz, satisfeito Conformado,
bravo
As vezes perde a
voz de tão
nervoso.
Se a partida for
dificil, feliz. Se for
facil, indiferente.
Bravo,
conformado.
Varia a situação.
Voluntário 4 Explosão de
alegria e alivio
Depende do
contexto. As
vezes, mais ou
menos nervoso.
Ansioso pela
proxima
Muito feliz Nervoso Frustrado
Voluntário 5 Vibrante Puto da vida Puto da vida Muito feliz, o
humor muda
muito.
Humor muda pra
pior.
As vezes
compreendo
Voluntário 6 Muito bem Mal Nervoso Feliz Meu dia fica ruim Nada
80
Inventário de Ansiedade de Beck (BAI) e Inventário de Depressão de Beck (BDI-
I)
Os voluntários 2 e 5, participante do jogo da final do paulistão e participante da partida
na 24ª rodada do brasileirão, respectivamente, apresentaram ansiedade leve nos dois dias de
coleta (CF e CR). O voluntário 3, participante da final do paulistão, apresentou ansiedade leve
apenas em CF. Os outros voluntários se mantiveram na escala de ansiedade mínima (escores de
0 a 10) em ambos os dias de coleta.
Ambos os voluntários que apresentaram ansiedade leve nos dois dias de coleta
(voluntários 2 e 5), apesar de uma renda familiar distinta, possuem filhos e são casados, ou seja,
embora esta pesquisa apenas tenha almejado uma caracterização da população estudada, não
podemos relevar a similaridade destas situações no que tange as características de vida dos
sujeitos que buscam a excitação através da torcida em jogos de futebol. Ambos os voluntários
possuem um estilo de vida bastante incentivado na modernidade e contemporaneidade (HINTZ,
2001) e apresentam graus significativos de ansiedade em seu dia rotineiro, assim como no dia
de jogo de futebol. Parece coerente então, ressaltar a ligação direta do estilo de vida moderno
com algum grau de ansiedade na população estudada.
A seguir, para que possamos compreender de forma menos superficial a qualidade de
seus componentes, será apresentado o detalhamento dos aspectos presentes neste estado de
ansiedade momentânea.
As percepções subjetivas mais relatadas foram o sentir-se nervoso e a incapacidade de
relaxar. Em onze dos doze momentos de coleta (91%), os voluntários se autodeclararam
sentirem-se nervosos em diversos graus. Em dez, dos doze momentos de coleta (83%) os
indivíduos afirmaram se sentir incomodados em algum grau pela incapacidade de relaxar. Sobre
este tema Elias e Dunning (1992) afirmam:
“Em geral pode-se dizer que o tipo de socialização característico das sociedades
altamente industrializadas tem como resultado uma interiorização mais forte e mais
firme do autocontrole individual, resultando em uma armadura do autodomínio, a qual
opera de forma relativamente harmoniosa e, em comparação, de maneira moderada,
mas sem muitas saídas em todas as esferas da vida.” (p. 166)
Ainda sobre o quesito ‘incapacidade de relaxar’, apenas o voluntário 3, em CF e o
voluntário 6 (24ª rodada brasileirão) em CR, afirmaram que em absoluto se sentem
incomodados por não conseguirem relaxar. Ao observar o comportamento da FC média dos
dois voluntários encontramos que este parâmetro do voluntário 3, no momento em que ele
afirma que em absoluto se sente incapaz de relaxar (CF), é mais elevada do que em seu controle
81
(CR) onde ele se encontra levemente incomodado pela incapacidade de relaxar, assim como
mais alta do que a de seus pares voluntários em quaisquer outra situação. Este mesmo voluntário
foi o único que relatou o medo de perder o controle durante a CF da final do paulistão. Diante
disso, Elias e Dunning (1992) indagam:
“Em vez de condenar as tensões como algo que prejudica, não se deveria antes
explorar as necessidades que as pessoas revelam por uma certa dose de tensão [...]?
[...] distinguir com maior clareza entre tensões que são sentidas como agradáveis e
tensões que são sentidas como desagradáveis?” (p.143)
“Que gênero de tensão é este que é contrabalanceada através de outro tipo de tensão
e encontra uma resolução [...]?” (p.162)
Seguindo adiante, nenhum dos voluntários, em nenhum momento da coleta total,
afirmou se sentir trêmulo ou com o rosto afogueado. Porém, o voluntário 3 relatou tremores
especificamente nas pernas, moderadamente em CF e levemente em CR e tremores
especificamente nas mãos em CR. Assim como o voluntário 1 (final do paulistão) que relatou
tremores especificamente nas mãos em CF. O voluntário 3 ainda relatou sensação de calor
moderadamente em CF e levemente em CR, e suor (não devido ao calor) em CF. A sensação
de calor e o suor não devido ao calor foram citados em 66% (8) dos momentos de coleta. Estes
sintomas aparentemente contraditórios ou, no mínimo confusos, podem se robustecer em uma
base teórica remota para se apresentarem. De acordo com Darwin (2009), o tremor muscular e
o rubor facial acontecem segundo o princípio da constituição do sistema nervoso e independente
da vontade do ser. Ainda, a teoria de Selye (1950) aprimorada por Chrousos (1992) indica a
necessidade de um limiar excitatório para uma síndrome inespecífica da resposta a um estímulo
que afete a harmonia orgânica. Neste sentido, parece claro propor que um grau específico de
excitação foi acionado em cada situação e para cada indivíduo, causando tremores em locais
particulares e não de forma generalizada no corpo. Além disso, a teoria de Cannon (1915 e
1927) ressalta a maneira difusa como o sistema autônomo sinaliza suas regulações, por isso a
negação de que a emoção seja posterior a uma ativação deste sistema. Porém, existe a
possibilidade de o sujeito ser capaz de discernir os elementos e as intensidades dessas
alterações, mas não de diferenciar a origem anatômica e fisiológica do estímulo, o que causaria
a percepção do suor sem diretamente uma ligação à sensação de calor.
Ainda, foram relatados pelo voluntário 5, em ambos os dias de coleta (CF e CR), um
estado moderado de se sentir assustado e de medo de acontecer o pior, com percepções leves
de falta de equilíbrio, de sentir-se aterrorizado e sensação de calor e suor (não devido ao calor),
além do medo moderado de perder o controle. As sensações de sufocação e de dificuldade de
82
respirar em CR se apresentaram em grau moderado e em CF, em grau leve e inexistente,
respectivamente. Para este voluntário o medo de morrer se apresentou exclusivamente em CR.
O voluntário 2 apresentou nos dois dias de coleta (CF e CR) leves sintomas de
dormência e formigamento, tontura ou atordoamento. Grave sensação de calor e suor (não
devido ao calor). Além disso, também foram relatadas experiencias de palpitação e dificuldade
de respirar de grau leve em CF e moderada em CR, assim como sensação de desmaios em CF
e indigestão em CR.
Diante do exposto, fica claro que os tipos de ansiedade experienciados por cada sujeito,
no dia de jogo do Corinthians e em seu dia rotineiro, ativam estados orgânicos globais
diferentes, desencadeando sinalizações específicas que culminam em respostas corporais
particulares e representações cognitivas subjetivas próprias, as quais carecem de maior
investigação, no intuito de desvendar os caminhos acionados diante de um estímulo emocional
e seu estado orgânico periférico.
O inventario de depressão de Beck (BDI) apresenta itens cognitivo-afetivos, queixas
somáticas e de desempenho que, pelos itens assinalados, revela uma configuração específica do
estado emocional do sujeito.
Neste caso, o voluntário 5 apresentou depressão moderada nos dois dias de coleta e os
voluntários 3 e 6 apresentaram depressão leve apenas no dia CF. No entanto, nenhum deles em
momento algum apresentou qualquer ideia suicida, tampouco alteração no apetite. O item mais
assinalado foi a presença de autocrítica em relação as próprias fraquezas e erros. Apenas o
voluntário 6 relatou que não se sentia, em hipótese nenhuma pior do que outras pessoas (CR).
Em seguida, os itens mais citados foram a preocupação com problemas físicos referentes a dores
no corpo, indisposição estomacal e constipação, assim como o fato de ficar irritado mais fácil
do que antes. Relatos sobre dificuldades em dormir apareceram em três voluntários (2, 4 e 6),
todos em CF. Outros itens assinalados foram: o desânimo com o futuro, a percepção que o
sujeito fracassou mais que uma pessoa comum, a decepção consigo mesmo, a presença do
choro, a perda de interesse por outras pessoas, a preocupação em estar parecendo velho e sem
atrativos e, a presença do sentimento de culpa em grande parte do tempo.
Análise do comportamento de marcadores bioquímicos periféricos
A seguir estão apresentados os resultados referentes ao estado orgânico momentâneo
dos marcadores periféricos de algumas vias de sinalização relacionadas às experiencias
emocionais. Faz-se imprescindível informar que por motivos pessoais, o voluntário 5 não
realizou a coleta controle (CR).
83
Pressão Arterial
Uma das mais importantes funções do controle nervoso simpático da circulação
sanguínea no organismo é a regulação da PA. Durante o medo extremo é possível observar a
elevação de até 100% deste marcador em apenas poucos segundos. Isto acontece principalmente
durante a reação de alarme da SAG, no intuito de suprir o aporte sanguíneo em caso de luta ou
fuga (SELYE, 1950; GUYTON, 2006).
Nosso estudo aferiu a PA em cinco momentos distintos de um dia com jogo de futebol
(CF) e de um dia rotineiro (CR). A Tabela 3 apresenta os valores das PA sistólica e diastólica
durante toda a coleta. As curvas de comportamento deste marcador não exibem diferenças
significantes na sua composição.
Tabela 3 - Comportamento da pressão arterial ao longo de cada dia de coleta
Com o objetivo de aprofundar a compreensão da sua estrutura de atuação no tocante as
dinâmicas de tensão especificas de cada jogo, as curvas representativas da PA sistólica estão
apresentadas na figura 13.
CLOLETA 1
sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica sistólica diastólica
Voluntário1 122 71 112 59 128 63 110 62 117 63 112 60 121 61 106 59 111 63 110 62
Voluntário2 133 83 108 74 128 82 123 79 127 78 130 69 134 79 123 83 121 82 125 75
Voluntário3 106 64 112 71 106 68 116 74 115 76 128 83 124 66 113 72 115 66 126 71
média coleta 1 120 73 111 68 121 71 116 72 120 72 123 71 126 69 114 71 116 70 120 69
desv. pad. 14 10 2 8 13 10 7 9 6 8 10 12 7 9 9 12 5 10 9 7COLETA 2
Voluntário 4 122 69 110 63 130 64 135 71 121 58 121 49 117 59 114 77 115 77 112 63
Voluntário 5 121 79 - - 112 69 - - 117 68 - - 127 70 - - 115 70 - -
Voluntário 6 117 75 118 76 117 64 112 65 115 69 110 71 115 62 122 75 113 67 120 75
média coleta 2 120 74 114 70 120 66 124 68 118 65 116 60 120 64 118 76 114 71 116 69
desv. pad. 3 5 6 9 9 3 16 4 3 6 8 16 6 6 6 1 1 5 6 8
CR2
CR2
CR3 CR4 CR5CF1 CF2 CF3 CF4 CF5CR1
CR3 CR4 CR5CF1 CF2 CF3 CF4 CF5CR1
84
Figura 13 – Gráfico representativo do Comportamento da Pressão Arterial
Figura 13. Gráfico de Linhas representativo das Curvas da PA ao longo dos dias de coleta CF (P>0,05).
Fonte: Análise da Amostra
Note que, embora sem significância estatística, o comportamento da PA ao final de cada
jogo apresenta uma pequena discrepância, imediatamente após o término da final do paulistão,
a média pressórica desta população visualmente está mais elevada. Como será apresentado na
fig. 27 A, neste mesmo momento a frequência cardíaca destes voluntários se encontrava acima
de 50% da FCmáx. Enquanto os valores de FC observados na partida da 24ª rodada do
brasileirão, na qual os torcedores do Corinthians experienciaram a derrota para o Palmeiras,
não alcançou os 45% da FCmáx.
Neste sentido, Carter (2008) também encontrou discrepâncias no controle simpático ao
avaliar a PA e a FC de voluntários em resposta ao estresse emocional e mental. Ele utilizou a
observação de imagens neutras e negativas para o estímulo emocional do estresse e realizou
testes amplamente conhecidos como estressores mentais. Nestes últimos, houve uma clara
elevação da FC e da PA. Porém, no que disse respeito ao estresse emocional não houve
alterações significantes. O autor sugere que o estresse emocional desempenhado pelas imagens
negativas não teve magnitude suficientemente percebida para promover adaptação neural e
cardiovascular nos sujeitos. O autor indica que baixos níveis de estresse emocional percebido
não alteram o controle cardiovascular.
Assim, este resultado aponta a possibilidade de um final de jogo mais excitante
(decidido nos pênaltis) e um menos excitante (‘derrota anunciada’) promoveram ativações do
sistema nervoso simpático, em níveis e graus diferentes, no que diz respeito principalmente ao
85
débito sistólico e à complacência da árvore arterial. Porém para confirmação dessa hipótese
novos estudos almejando o aumento da população investigada serão necessários.
Glicose Sérica
As concentrações de glicose sérica nas situações vivenciadas nesta pesquisa não
apresentam diferenças significantes entre si como exposto na tabela 4 e figura 14.
Tabela 4 - Níveis séricos de glicose ao longo de ambos os dias de coleta
Os eventos controlados pela atividade simpática do sistema nervoso autônomo no intuito
de regular a liberação de glicose pelo fígado, glicogenólise hepática e muscular, culminando
em elevação da glicose sérica, que muitas vezes são associados a situações que desencadeiam
uma experiencia emocional, não puderam ser verificadas neste experimento.
Isto pode sugerir que este tipo e intensidade de lazer mimético tenha outras regulações
estresse-dependentes que não estão diretamente associadas ao controle metabólico da glicose
circulante.
CLOLETA 1 CF1 CR1 CF2 CR2 CF3 CR3 CF4 CR4 CF5 CR5
Voluntário1 87 79 98 125 94 108 93 90 96 91
Voluntário2 97 92 95 99 99 109 97 98 95 94
Voluntário3 90 89 107 131 92 100 105 96 97 96
média coleta 1 91 87 100 118 95 106 98 95 96 94
desv. pad. 5 7 6 17 4 5 6 4 1 3
COLETA 2 CF1 CR1 CF2 CR2 CF3 CR3 CF4 CR4 CF5 CR5
Voluntário 4 101 84 129 80 117 82 105 80 105 66
Voluntário 5 100 - 91 - 107 - 87 - 99 -
Voluntário 6 82 95 121 88 92 91 84 93 83 94
média coleta 2 94 90 114 84 105 87 92 87 96 80
desv. pad. 11 8 20 6 13 6 11 9 11 20
86
Figura 14 – Comportamento da Glicose Sérica
Figura 14. Gráfico de linhas representativo do comportamento individual das curvas glicêmicas durante
os dois jogos (CF) (P>0,05). Fonte: Análise da Amostra
Cortisol Salivar
A literatura demonstra que a elevação das concentrações de cortisol no organismo está
diretamente ligada a alterações de humor, incluindo o estado de euforia (ABERCROMBIE,
2005). Neste estudo, os indivíduos relataram sentir-se felizes quando seu time vence uma
partida, situação vivenciada na final do paulistão 2018 (Figura 15A).
Nesta coleta, houve significância estatística na concentração de cortisol salivar
imediatamente após acordar (CF1) e no intervalo de jogo (CF3). A aferição da concentração
de cortisol matinal tem sido tema de inúmeros estudos (FEDERENKO, 2004; WILLIAMS,
2005) com resultados inconclusivos sobre a hora do acordar (cedo ou tarde) e as respostas
subsequentes ao estresse. Schmidt – Reinwald (1999) sugere que em delineamentos
experimentais com a comparação de concentrações entre os mesmos voluntários existe uma
estabilidade teste-reteste à resposta do cortisol ao despertar. Desta maneira, nós assumimos que
este momento, embora possa ter influenciado as concentrações de cortisol em CF1 e CR1, por
serem relativas aos mesmos sujeitos, estão de fato representando a atividade do eixo HHA, sem
o viés da hora de acordar de cada voluntário.
87
Figura 15 A – Análise do cortisol na final do campeonato paulista
Figura 15A. Gráfico de linhas representando o comportamento do cortisol na final do paulistão (CF) e em
seu respectivo dia rotineiro (CR). (P< 0,05) Fonte: Análise da Amostra
Desta maneira, pode-se sugerir que os voluntários da primeira etapa da coleta iniciaram
seu dia CF (coleta futebol), com uma maior excitação periférica do que em CR (coleta
rotineira). Assim como, estavam mais excitados no intervalo de jogo (CF3), momento o qual o
Corinthians vencia por 1x0, do que às 15:30h do dia rotineiro (CR3).
Na segunda etapa da coleta (24ª rodada do brasileirão e seu respectivo dia rotineiro)
(Figura 15B), o time do Corinthians estava completamente desmontado e sem expectativas
concretas de vitória sobre o arquirrival. Talvez pela característica de menor importância desta
partida, o comportamento do cortisol destes voluntários não tenha apresentado nenhuma
significância estatística com seu respectivo dia de rotina. O contexto do jogo atua como um dos
componentes dos estados globais do organismo: a percepção dos aspectos físicos e sociais do
ambiente do estímulo (LeDOUX, 2012). Portanto fator de importante influência para regulação
da experiencia e expressão emocional. Neste caso específico, pode ter agido como um fator
atenuante de excitação, nos quais os fatos miméticos da disputa já estão quase claramente
preestabelecidos.
88
Figura 15 B – Análise do cortisol na 24ª rodada do campeonato brasileiro
Figura 15B. Gráfico de linhas representando o comportamento do cortisol na 24ª rodada do brasileirão
(CF) e em seu respectivo dia rotineiro (CR) (P>0,05). Fonte: Análise da Amostra
Desta maneira, os resultados encontrados podem corroborar com a hipótese de Elias e
Dunning (1992), na qual os autores sugerem que há níveis de tensão para cada disputa. Há
partidas nas quais a excitação se aproxima do clímax e, se sua equipe faz o gol decisivo, esta
excitação se resolve na felicidade do triunfo. Neste caso, há então o gatilho para a liberação
desta tensão, seguida de um alívio do conflito de tensões, esta liberação se faz através da
transmissão do que se sente por intermédio dos movimentos, incluindo aqueles necessários a
expressão oral. Porém, no futebol como em todos os fatos miméticos, existem os insucessos e
estes estariam no polo oposto da escala de satisfação alcançada pela vivência de uma dinâmica
de tensão-excitação futebolística, provocando outro tipo de expressão fisiológica emocional.
Na figura 15 C está exposta a comparação entre os dois jogos e os respectivos estados
de excitação dos voluntários representados pelas concentrações de cortisol.
89
Figura 15 C – Cortisol e a Comparação entre os dois jogos
Figura 15C. Gráfico de linhas representando o comportamento do cortisol dos voluntários em comparação
nos jogos representados nas figuras 15 A e 15 B (P<0,05). Fonte: Análise da Amostra
Mais uma vez parece evidente que o contexto do jogo pode ser um fator de grande
influência na regulação fisiológica das emoções desencadeadas principalmente no tocante as
concentrações de cortisol salivar. Além disso, de acordo com este resultado, a análise do cortisol
se apresenta como método acessível para a observação do feedback corporal decorrente de um
estresse mimético desencadeado pelo ato de torcer durante uma partida de futebol. A exposição
deste feedback, associada aos sentimentos auto percebidos e auto relatados e à expressão
comportamental nos momentos dos jogos, podem significar um vislumbre do engate no
caminho de sinalização emocional aprendido e natural das experiências vivenciadas pelos
torcedores fanáticos de futebol.
Frequência Cardíaca
A FC é amplamente conhecida como um marcador de atividade do sistema nervoso
autônomo e do eixo HHA devido sua interação com as catecolaminas da medula adrenal
(MAGIERA, 2018). Neste sentido, as figuras abaixo (16 a 30) almejam descrever as
características da FC em relação aos dias de coleta e as ações específicas do jogo de futebol.
Neste aspecto é importante relacionar este achado com os resultados encontrados no
BAI. Note que o voluntário 3 apresenta uma média de FC mais baixa no dia rotineiro (CR) do
que no dia com o jogo de futebol (CF), no entanto, o mesmo individuo relatou estar incomodado
com a incapacidade de relaxar em CR. Neste dia sua FC esteve apenas 4% do tempo de coleta,
acima de 50% FC máxima. Ao contrário, em CF, sua FC permaneceu 25% do tempo de jogo
90
superior a 50% FC máxima, e nesta situação o voluntário 3 foi o único que relatou não estar
incomodado com a incapacidade de relaxar e ainda declarou o medo de perder o controle.
O voluntário 2 apresentou uma média de FC em CF menor do que em CR. Neste mesmo
dia (CR), o voluntário 2 acrescentou sintomas de indigestão e dificuldade de respirar ao seu
BAI, que esteve dois escores mais elevado do que em CF, todavia, mantendo-se no grau de
ansiedade leve. Parece adequado afirmar que em ambos os casos, o estado de ansiedade leve
demonstrado pelo escore alcançado no inventario de ansiedade de Beck (1988) pode estar
momentaneamente diretamente interligado com o controle da FC.
Figura 16 - Comportamento da Frequência Cardíaca Média Durante a Vitória
Figura 16. Gráfico representativo Média da frequência cardíaca dos voluntários nos dias de jogo (final do
paulistão 2018) e sem jogo (CR). Fonte: Análise da Amostra
Mais uma vez a teoria multidisciplinar das emoções de Elias e Dunning (1992) é
reafirmada neste ponto. As atividades da vida cotidiana promovem um certo aspecto tensional
que precisa ser aliviado, mas que diferem em termos fisiológicos e subjetivos da experiência
emocional desencadeada pela dinâmica tensão-excitação do lazer ao torcer pelo seu time de
futebol no tocante ao comportamento da FC.
91
Figura 17 - Comportamento da Frequência Cardíaca Média Durante a Derrota
Figura 17. Gráfico representativo da média da frequência cardíaca nos dias de jogo (24ª rodada do
brasileirão 2018) e sem jogo (CR). Fonte: Análise da Amostra
Figura 18 - Comparação da média da frequência cardíaca entre vitória e derrota
Figura 18. Gráfico representativo da média da frequência cardíaca dos voluntários em comparação entre
os dois jogos. Fonte: Análise da Amostra
As figuras 19 (A e B) e 20 (A e B) representam o comportamento da frequência cardíaca
durante o período de familiarização com o equipamento e procedimento de coleta em ambos os
dias configurando assim a FC repouso.
92
Figura 19 A- Frequência cardíaca de repouso CF (final do campeonato paulista)
Figura 19 A. Gráfico representativo do comportamento da FC dos voluntários que assistiram a final do
campeonato paulista durante o período de familiarização ao ambiente de coleta. Fonte: Análise da
Amostra
Figura 19 B- Frequência cardíaca de repouso CR (final campeonato paulista)
Figura 19 B. Gráfico representativo do comportamento inicial da FC dos voluntários que assistiram a
final do campeonato paulista durante o período de coleta rotineira. Fonte: Análise da Amostra
93
Figura 20 A - Frequência cardíaca de repouso CF (24ª rodada do campeonato
brasileiro)
Figura 20 A. Gráfico representativo do comportamento da FC dos voluntários que assistiram a
24ª rodada do brasileirão durante o período de familiarização ao ambiente de coleta. Fonte: Análise da
Amostra
Figura 20 B - Frequência cardíaca de repouso CR (24ª rodada do campeonato
brasileiro)
Figura 20 B. Gráfico representativo do comportamento inicial da FC dos voluntários que assistiram a 24ª
rodada do brasileirão durante o período de coleta rotineira. Fonte: Análise da Amostra
94
Em seguida, a figura 21A apresenta o comportamento da FC, desde o início da jogada
que culminou com o gol do Corinthians durante o tempo regulamentar, descrito como um
momento de felicidade pelos voluntários, até 20 segundos depois de ter sido concretizado o gol.
Note que, exceto pelo voluntario 2, a FC sofre um leve decréscimo no início da jogada que leva
ao gol corintiano. Nestes momentos o marcador palmeirense se aproxima do atacante corintiano
que se desvencilha da marcação e executa o cruzamento. Essa associação de controle cardíaco
com a ação do jogo pode indicar a relação entre a percepção do ambiente do estímulo e as
características de excitação central e periférica do organismo humano. Quando o lançamento
acontece e a possibilidade de gol se aproxima, há um acréscimo da FC que continua na hora do
gol e chega ao seu pico em aproximadamente 9 segundos depois do tento, em todos os
voluntários, para em seguida decair novamente. Comportamento este completamente diferente
do mesmo período da CR (Fig.21B).
Figura 21 A - FC durante o gol do Corinthians (tempo regulamentar)
Figura 21A. Gráfico representativo do comportamento da FC dos voluntários na jogada do gol corintiano
em tempo regulamentar. Fonte: Análise da Amostra
95
Figura 21B - FC controle gol do Corinthians (tempo regulamentar)
Figura 21 B. Gráfico representativo do respectivo momento controle, com cada momento das ações do
jogo igualmente assinalados. Fonte: Análise da Amostra
Estes achados ilustram um refinado controle simpático-parassimpático da bomba
cardíaca em resposta a um estresse mimético, seguido da liberação por meio da expressão
emocional pelo comportamento, da tensão desencadeada pela ação de torcer; possivelmente
relacionados com a emoção auto relatada de felicidade.
Os gráficos de 22 a 24 apresentam o comportamento da FC nos momentos de
oportunidades perdida de gol, nos quais as emoções auto relatadas são a de nervosismo,
chateação e “puto da vida”.
96
Figura 22A - FC oportunidade de gol perdida (1ª)
Figura 22A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante a primeira oportunidade de gol perdida.
Fonte: Análise da Amostra
Figura 22B - FC controle oportunidade de gol perdida (1ª)
Figura 22B. Gráfico representativo do respectivo momento controle, com cada momento das ações do jogo
igualmente assinalados. Fonte: Análise da Amostra.
97
Figura 23A - FC oportunidade de gol perdida (2ª)
Figura 23A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante a segunda oportunidade de gol
perdida. Fonte: Análise da Amostra
Figura 23B - FC controle oportunidade de gol perdida (2ª)
Figura 23B. Gráfico representativo do respectivo momento controle, com cada momento das ações do
jogo igualmente assinalados. Fonte: Análise da Amostra
98
Figura 24A - FC oportunidade de gol perdida (3ª)
Figura 24A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante a terceira oportunidade de gol
perdida. Fonte: Análise da Amostra
Figura 24B - FC controle oportunidade de gol perdida (3ª)
Figura 24B. Gráfico representativo do respectivo momento controle, com cada momento das ações do
jogo igualmente assinalados. Fonte: Análise da Amostra
Perceba que a maioria das situações apresentadas pelas figuras 22A, 23A e 24A
demonstra uma elevação da FC que antecede o momento do ataque, ou seja a finalização da
99
jogada. Isto também foi observado no momento do lançamento para o gol (21A). Assim, parece
coerente sugerir que acontece uma ativação do sistema nervoso simpático estimulada pela
incerteza do desfecho da jogada e pela expectativa de concretização da ânsia de todo torcedor,
o êxito no lance. Esta elevação da atividade simpática conta com a ação dos receptores
periféricos associados à visão, à audição e ao sistema ortostático. Caso a expectativa pela
‘felicidade’, ‘alegria’ e ‘vibração’ do gol seja concretizada (figura 21A), sugere-se então, que a
ativação persiste por determinado período diretamente associado à duração do estímulo,
podendo elevar-se de acordo com a importância deste êxito em relação ao desfecho da
partida/campeonato ou ainda em relação ao contexto subjetivo do torcedor. Ademais, quando a
análise do sujeito acerca do desfecho da jogada estabelece o estado emocional auto denominado
como ‘nervoso’ ou ‘puto da vida’ desencadeado pela oportunidade de gol perdida (figuras 22A,
23A e 24A), a ativação via sistema nervoso simpática diminui.
A final do campeonato paulista estava envolta por uma atmosfera de tensão, o Palmeiras
havia ganho a primeira partida da disputa pelo título estadual e se encontrava a um empate da
derradeira conquista. O Corinthians precisava de uma vitória por 2 gols de diferença para ser
campeão no tempo regulamentar ou de 1 gol de diferença para levar a disputa para os pênaltis.
Foi o que aconteceu.
A seguir estão dispostas as figuras em gráficos referentes aos momentos das penalidades
que estimularam o controle cardíaco a elevar a FC acima de 50 % da FC máxima.
100
Figura 25A - comportamento da FC primeiro pênalti
Figura 25A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante a defesa do primeiro pênalti Fonte:
Análise da Amostra
Figura 25B - FC controle primeiro pênalti
Figura 25B. Gráfico representativo do momento controle da defesa do primeiro pênalti Fonte: Análise da
Amostra
101
Figura 26A - Comportamento FC quinto pênalti
Figura 26A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante a defesa do quinto pênalti Fonte:
Análise da Amostra
Figura 26B - FC controle quinto pênalti
Figura 26B. Gráfico representativo do momento controle da defesa do quinto pênalti Fonte: Análise da
Amostra
102
Figura 27A - Comportamento FC sexto pênalti
Figura 27A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante a defesa do sexto pênalti Fonte:
Análise da Amostra
Figura 27 B - FC controle sexto pênalti
Figura 27B. Gráfico representativo do momento controle da defesa do sexto penlati Fonte: Análise da
Amostra
103
Figura 28A - Comportamento FC oitavo pênalti
Figura 28A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante o pênalti perdido pelo Corinthians
Fonte: Análise da Amostra
Figura 28B - FC Controle oitavo pênalti
Figura 28B. Gráfico representativo do momento controle do pênalti perdido pelo Corinthians Fonte:
Análise da Amostra
104
Figura 29A - Comportamento FC no último pênalti e vitória corintiana
Figura 29A. Gráfico representativo do comportamento da FC durante o último pênalti cobrado pelo
Corinthians com realização do tento e consagração da vitória do campeonato paulista 2018. Fonte: Análise
da Amostra
Figura 29 B - FC controle no último pênalti e vitória corintiana
Figura 29 B. Gráfico representativo do momento controle do último pênalti cobrado pelo Corinthians.
Fonte: Análise da Amostra
105
Note que as situações onde houve elevação da FC acima de 50% da máxima, foram as
ações de defesa do goleiro, a realização do gol e a perda da oportunidade de fazer gol. Mais
uma vez a expectativa do desfecho da jogada se mostra eficiente em estimular um aumento de
ativação específica no que diz respeito ao controle da FC. Neste caso principalmente quando
relacionado a defesa do goleiro corintiano às investidas do time palmeirense. O fato de ter um
jogador capaz de impedir o êxito do adversário no momento decisivo da partida, se apresenta
como situação desencadeadora de uma excitação periférica aguda.
Além disso, a excitação alcança um grau muito mais elevado quando a vitória é
conseguida. Isto pode se dar pelo fato de, neste momento, a expressão emocional pelo
comportamento quase livre ser permitida, duradoura e retroalimentada pelos companheiros de
torcida, replays das jogadas e estimulação midiática através dos efeitos televisivos para
congratulações e o tipo de narração no momento da conquista.
No segundo jogo da coleta, a partida estava envolta em uma atmosfera de pouca tensão.
Comentários informais caracterizavam a disputa como o clássico estadual, porém no meio de
um campeonato longo, com o time do Palmeiras em melhor campanha que o time do
Corinthians nos últimos jogos.
A figura 30A apresenta o comportamento da FC frente ao gol sofrido na 24ª rodada do
brasileirão. Conforme em outros momentos, as emoções auto relatadas referentes a sofrer um
gol (raiva, ‘puto da vida’ nervoso e mal), ou perder uma partida (triste, bravo, nervoso) parecem
ter baixos índices de estimulação simpática para elevação da FC, assim como para uma
expressão emocional corporal como um todo (Figura 31B).
Figura 30A - Comportamento FC frente ao gol sofrido pelo Corinthians
Figura 30 A. Gráfico representativo da FC no momento em que o Corinthians sofre o gol durante a 24ª
rodada do brasileirão. Fonte: Análise da Amostra
106
Figura 30 B - FC controle frente ao gol sofrido pelo Corinthians
Figura 30 B. Gráfico representativo da FC controle no momento em que o corinthians sofre o gol durante
a 24ª rodada do brasileirão. Fonte: Análise da Amostra
Figura 31A - Comemoração da vitória pelos voluntários da final do paulistão
Figura 31A. Expressão emocional diante da vitória. Fonte: Arquivo Pessoal
Figura 31 B – Final do jogo da 24ª rodada do brasileirão
Figura 31 B. Expressão emocional diante da derrota. Fonte: Arquivo Pessoal
No tocante as diferenças nas dinâmicas de tensão-excitação vivenciadas por jogo de
futebol distintos, Elias e Dunning (1992) enfatizam:
107
“A respeito dos jogos-desporto tais como o futebol é possível ver, pelo menos em
traços gerais, que tipo de configuração de jogo proporciona o prazer ótimo: é um
confronto prolongado no campo de futebol entre duas equipes bem preparadas em
técnica e força. Um jogo que oscila de um lado para o outro no qual as equipes estão
bem equilibradas entre si e a determinação das equipes em marcar o gol decisivo
cresce à medida que o tempo passa... A tensão do jogo comunica-se visivelmente aos
espectadores. A sua excitação crescente comunica-se em contrapartida aos jogadores
até que a tensão atinge um ponto em que apenas se pode suportar e conter, no limite.”
(ELIAS, DUNNING, 1992 p. 133 e 134
Desta maneira, para uma pesquisa sobre os prazeres do lazer, é imprescindível estudar
o caráter daquelas práticas que proporcionam uma satisfação ótima e também o caráter
distintivo dos fracassos. A análise destes dois extremos serve como um estudo piloto para a
identificação da relação entre diferentes tipos miméticos de lazer futebolistico, e a produção de
um tipo particular de tensão (ELIAS, DUNNING, 1992), refinadamente regulada por graus
específicos de ativação e interação dos estados globais do organismo. Esses ajustes apresentam-
se dependentes de cada situação do jogo, sendo o ato de comemorar a vitória do Corinthians, o
estímulo mais capaz de induzir uma excitação periférica. Essa excitação parece estar
diretamente relacionada com a emoção autodenominada felicidade.
108
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O contexto específico de torcedores de futebol é de fato um campo capaz de despertar
uma experiência emocional e principalmente de permitir uma expressão clara e livre dessa
experiência. Seja em aspectos fisiológicos ou sociais, o ato de torcer por um time de futebol
promove um estímulo desencadeador de uma excitação agradável que parece óbvio, ser
indispensável para uma ruptura saudável da rotina.
Esta excitação agradável também pode ser denominada de estresse mimético, já que ao
ser experienciada, requer ajustes fisiológicos específicos no que diz respeito às vias efetoras
periféricas reguladas pelo sistema nervoso autônomo. De acordo com a análise dos nossos
resultados conseguidos por meio das respostas ao questionário, do comportamento da FC e da
concentração de cortisol, a condição de estresse mais eficiente em induzir uma excitação
periférica foi a felicidade de vencer o arquirrival em uma partida. Além disso, nossos resultados
confirmam parte da teoria de Norbert Elias e Eric Dunning (1992) na qual os autores sugerem
que jogos mais disputados, como por exemplo a final de um campeonato, trazem consigo uma
característica de tensão-excitação muito maior que um jogo sem essa qualidade de disputa.
Porém, um dos limites involuntários dessa pesquisa foi o número reduzido de
voluntários. A impossibilidade de ingerir bebidas alcoólicas no dia da coleta reduziu a adesão
de participantes, assim como, a falta de financiamento adequado restringiu a quantidade de
análises que poderiam ser desenvolvidas. Esta pesquisa se apresenta como marco inicial nos
estudos sobre a fisiologia das emoções nos esportes. Para investigações mais acuradas, existe a
possibilidade de analisar minuciosamente o contexto do estímulo desencadeador, ou seja, as
características específicas de cada lance responsável por elevar a FC, em cada indivíduo. Nosso
desejo é que outras pesquisas surjam para reproduzir este modelo experimental, podendo assim
engrandecer o conhecimento sobre o comportamento dos marcadores periféricos regulados pela
partida de futebol em torcedores fanáticos. Desejamos ainda, que mais estudos se desenvolvam
no intuito de extrapolar este modelo para outras modalidades e contextos esportivos. Ademais,
é possível expandir o delineamento metodológico para sinalizações centrais e conexões
orgânicas inteiras, utilizando o tomógrafo ou equipamentos portáteis de eletroencefalograma,
reduzindo as dificuldades de avaliação in loco da pesquisa emocional, como é o caso do
internacional Emotiv. Este tipo de análise associada a uma investigação subjetiva, ao
comportamento periférico de marcadores clássicos ou não, de pontos diferentes das vias de
sinalização, dos sistemas de ativação e regulação emocional, podem ampliar enormemente os
conhecimentos sobre as vias de sinalização relacionadas a excitação agradável desencadeada
pelo futebol e por todos os confrontos esportivos, conforme sugerido por Elias e Dunning
109
(1992), assim como o desenvolvimento de estratégias e possibilidades de coletas de dados no
interior dos estádios com os espectadores diretamente assistindo ao jogo. Por vários limites,
infelizmente essa pesquisa não pode realizar a coleta em estádios. O que nos leva a sugerir para
novas pesquisas esse tipo de mudança metodológica.
110
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118
ANEXOS
ANEXO A – PARECER COMITÊ DE ÉTICA
119
120
121
122
123
124
125
126
ANEXO B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO –
SUJEITOS AVALIADOS
Você está sendo convidado a participar, como voluntário, da pesquisa intitulada
Fisiologia das emoções: Os torcedores de futebol, conduzida pela doutoranda Aline Marques
Colares Camurça e orientada pela Profª. Drª. Heloisa Helena Baldy dos Reis. Este documento,
chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, visa assegurar seus direitos como
participante.
Você foi selecionado por indicação de especialistas na área da busca pela excitação no
contexto do futebol. Sua participação não é obrigatória. A qualquer momento, você poderá
desistir de participar e retirar seu consentimento.
Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas dúvidas. Se
houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá esclarecê-las com a
pesquisadora. Se preferir, pode levar este Termo para casa e consultar seus familiares ou outras
pessoas antes de decidir participar. Não haverá nenhum tipo de penalização ou prejuízo se você
não aceitar participar ou retirar sua autorização em qualquer momento.
Justificativa e Objetivos
Este estudo tem por objetivo avaliar o comportamento de marcadores periféricos
(cortisol salivar, glicose e lactato sanguíneos, pressão arterial e frequência cardíaca) durante
uma partida de futebol do seu time, assim como em um dia de sua rotina habitual.
Procedimentos
Sua participação nesta pesquisa consistirá em assistir a um jogo de futebol do seu time,
na sua casa, em companhia das pesquisadoras que farão a coleta e aferição dos marcadores
periféricos (cinco vezes durante o dia, durante o tempo de uma partida de futebol). Ainda, será
pedido a cada participante a permissão para serem acompanhados, pelo tempo da duração de
um jogo de futebol oficial, na mesma hora que os mesmos acontecem, em um dia rotineiro
para as mesmas coletas. Será explicado como fazer as coletas de cortisol, glicose e lactato,
para que os participantes possam fazer as coletas matinais em cada dia de avaliação. Além
disso, serão realizadas anotações sobre as características do jogo e sobre as atividades do
cotidiano durante o período estabelecido para a coleta.
Desconfortos e Riscos
127
Você não deve participar do estudo caso seja menor de 18 anos, tenha algum tipo de
doença cardíaca, metabólica ou neurológica; ou ainda, faça uso de algum tipo de esteroide.
Deixamos claro que não há riscos previsíveis envolvidos na pesquisa e que a mesma
não é remunerada, e ainda, que não haverá despesas por parte dos participantes.
Benefícios
Não há benefícios diretos ao voluntário. Porém com o estabelecimento das
características fisiológicas da excitação agradável no ato de torcer, será possível ter
argumentos científicos da importância dessa forma de lazer para a sociedade e assim fomentar
melhores diretrizes para os projetos públicos, assegurando o necessário para que esta prática
aconteça de forma acessível e segura.
Acompanhamento e Assistência
O acompanhamento da equipe de pesquisa acontecerá em dois dias distintos agendados
previamente. Um dia de jogo de futebol e um dia de rotina regular.
Deverá haver, ainda, um encontro entre o voluntário e a pesquisadora, anterior aos dias
de coleta para a explicação sobre as coletas; principalmente sobre as de cortisol salivar, glicose
e lactato sanguíneo. Isso se dá porque a primeira coleta de cada dia (30 minutos após acordar)
será realizada sem a presença da pesquisadora.
Sigilo e Privacidade
Os dados obtidos por meio desta pesquisa serão confidenciais, sendo coletados sem
identificação nominal, visando assegurar o sigilo de sua participação.
A pesquisadora responsável se comprometeu a tornar públicos nos meios acadêmicos
e científicos os resultados obtidos de forma consolidada sem qualquer identificação de
indivíduos participantes.
Ressarcimento e Indenização
A pesquisa será realizada sem atrapalhar sua rotina, em local de sua escolha; sem
acarretar qualquer despesa ao voluntário. Dessa forma não haverá ressarcimento de despesas
nessa pesquisa. O voluntário terá a garantia ao direito à indenização diante de eventuais danos
decorrentes da pesquisa.
Caso você concorde em participar desta pesquisa, assine ao final deste documento, que
possui duas vias, sendo uma delas sua, e a outra, da pesquisadora responsável / coordenadora
128
da pesquisa. Em caso de dúvidas sobre a pesquisa, seguem os telefones e o endereço
institucional da pesquisadora responsável.
Contatos
Contatos da pesquisadora responsável: Aline Marques Colares Camurça; estudante de
doutorado; Faculdade de Educação Física, departamento de ciências do esporte, UNICAMP.
55 19 997433203 /
Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação e sobre questões éticas
do estudo, você poderá entrar em contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa
(CEP) da UNICAMP das 08:30hs às 11:30hs e das 13:00hs as 17:00hs na Rua: Tessália Vieira
de Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936 ou (19) 3521-
7187; e-mail: [email protected].
O Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)
O papel do CEP é avaliar e acompanhar os aspectos éticos de todas as pesquisas
envolvendo seres humanos. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), tem por
objetivo desenvolver a regulamentação sobre proteção dos seres humanos envolvidos nas
pesquisas. Desempenha um papel coordenador da rede de Comitês de Ética em Pesquisa
(CEPs) das instituições, além de assumir a função de órgão consultor na área de ética em
pesquisas.
Consentimento Livre e Esclarecido
Após ter recebido esclarecimentos sobre a natureza da pesquisa “Fisiologia das
emoções: os torcedores de futebol.”, seus objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais
riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito participar e declaro estar recebendo uma
via original deste documento assinada pelo pesquisador e por mim, tendo todas as folhas por
nós rubricadas:
Nome do participante:___________________________ Contato telefônico: ______________
e-mail (opcional): ____________________________________________________________
Campinas, ____ de ____________ de _____
Assinatura do participante: _________________
Responsabilidade do Pesquisador
129
Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares
na elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento ao participante. Informo
que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi apresentado e pela CONEP,
quando pertinente. Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa
exclusivamente para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento
dado pelo participante.
Campinas, ____ de __________ de _____. Assinatura da pesquisadora: _____________
ANEXO C – TERMO DE LIBERAÇÃO DE IMAGENS
TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM - Pessoa maior de 18 anos.
Neste ato, e para todos os fins em direito admitidos, autorizo expressamente a utilização da
minha imagem, em caráter específico para divulgação de resultados acadêmicos, constante em
fotos e filmagens decorrentes da minha participação no projeto de doutorado a seguir
discriminado: Programa de pós-graduação em Educação Física – UNICAMP título do projeto:
Fisiologia das emoções: os torcedores fanáticos de futebol. Pesquisadora: Aline M. Colares
Camurça. Orientadora: Heloisa Helena Baldy dos Reis.
Objetivos Principais
Evidenciar a possibilidade de uma nova linha de pesquisa para o campo de estudos da
Educação Física. Descrever o significado do torcer e o estado emocional do fanático torcedor
no dia do jogo; Relatar o comportamento de marcadores fisiológicos periféricos relacionados a
fisiologia das emoções; correlacionar o comportamento da frequência cardíaca com as ações
decorridas no jogo. As imagens, editadas ou não, serão exibidas: na tese final do referido
projeto, na apresentação audiovisual do mesmo e em publicações e divulgações acadêmicas.
Não haverá associação de caráter explicito com os resultados encontrados na pesquisa. Ou seja,
mesmo com o uso da imagem, estará preservado o anonimato dos resultados.
Por ser esta a expressão de minha vontade, nada terei a reclamar a título de direitos conexos a
minha imagem e esta pesquisa, em tempo algum.
Campinas, _____________ de _______________________ de 2018
______________________________________
Assinatura
Nome:______________________________________________________________________
RG.:_______________________________ CPF:____________________________________
130
Telefone1: ( ) ______________________ Telefone2: ( ) ___________________________
Endereço: ___________________________________________________________________
ANEXO D - INSTRUMENTO PARA COLETA DE DADOS
SOCIOECONÔMICOS E SIGNIFICADO DO TORCER
Questionário
1) Idade (em anos): ___________
2) Crença religiosa:
2.1) ( ) católica
2.2) ( ) espírita
2.3) ( ) evangélica
2.4) ( ) sem religião
2.5) ( ) outra (especificar): _____________________________________________________
3) Estado civil:
3.1) ( ) casado
3.2) ( ) mora com companheiro (a)
3.3) ( ) solteiro
3.4) ( ) divorciado
3.5) ( ) viúvo
3.6) ( ) outro (especificar):
4) Renda Familiar mensal: R$_____________________________________________________
5) Você tem filhos? Quantos? _____________________________________________________
6) Tipo de moradia:
6.1) ( ) casa própria
6.2) ( )casa alugada
6.3) ( ) outra (especificar):_____________________________________________________
7) Estudos:
7.1) ( ) nenhum
7.2) ( ) alfabetização a 8ª série (9º ano)
7.3) ( ) ensino médio completo (1º, 2º e 3º)
7.4) ( ) ensino superior completo
7.5) ( ) Ensino Superior Cursando
7.6) ( ) Pós Graduação
8) Situação trabalhista:
8.1) ( ) empregado
8.2) ( ) desempregado
8.3) ( ) empresário
8.4) ( ) autônomo
131
9) Carga horária de trabalho semanal:
9.1) ( ) variável
9.2) ( ) ≤ 20horas
9.3) ( ) ≤ 40 horas
9.4) ( ) > 40 horas
10) Com relação a prática de exercícios físicos você se considera:
10.1) ( ) sedentário
10.2) ( ) pratica raramente
10.3) ( ) pratica semanalmente
10.4) ( ) pratica diariamente
10.5) ( ) atleta
11) Você fuma cigarros?
11.1) ( ) sim quantos cigarros por dia?____________________________________________
11.2) ( ) não
12) Você consome bebida alcoólica?
12.1) ( ) sim
12.2) ( ) não
13) Se sim, qual a frequência do consumo no último mês?
13.1) ( ) uma vez
13.2) ( ) semanalmente
13.3) ( ) diariamente
13.4) ( ) outro (especifique):____________________________________________________
14) Você possui alguma doença crônica?
14.1) ( ) sim. Qual?___________________________________________________________
14.2) ( ) não.
15) Você consome algum medicamento diário?
15.1) ( ) sim. Qual? __________________________________________________________
15.2) ( ) não.
16) Você torce para algum time de futebol?
16.1) ( ) sim.
17.2) ( ) não.
17) Qual time de futebol que você torce? _____________________________________________
18) Por que você torce para este time? _______________________________________________
19) Se você tem filhos, eles gostam de futebol?
19.1) ( ) sim
19.2) ( ) não
20) Se você tem filhos e eles gostam de futebol, eles torcem para o mesmo time que você?
20.1) ( ) sim.
132
20.2) ( ) não.
21) Você já foi assistir a jogos em estádio?
21.1) ( ) sim.
21.2) ( ) não.
22) Como foi sua primeira vez em um estádio? ________________________________________
___________________________________________________________________________
23) Quais os jogos do seu time que você assiste?
23.1) ( ) todos os jogos.
23.2) ( ) todos os que passam da tv.
23.3) ( ) exclusivamente do campeonato brasileiro.
23.4) ( ) exclusivamente do campeonato estadual.
23.5) ( ) exclusivamente clássicos.
23.6) ( ) alguns jogos independente da competição.
23.7) ( ) outro (especifique): ___________________________________________________
24) Como você se sente quando o seu time faz um gol? __________________________________
___________________________________________________________________________
25) Como você se sente quando o seu time sofre um gol? ________________________________
___________________________________________________________________________
26) Como você se sente quando o seu time perde uma oportunidade de gol? _________________
___________________________________________________________________________
27) Como você se sente quando o seu time ganha uma partida? ___________________________
___________________________________________________________________________
28) Como você se sente quando seu time perde uma partida? _____________________________
___________________________________________________________________________
29) Como você se sente quando seu time empata uma partida? ____________________________
___________________________________________________________________________
30) O que você sente ao ver a camisa do seu time em alguém em outro estado? _______________
___________________________________________________________________________
31) O que significa ser torcedor? ___________________________________________________
___________________________________________________________________________
32) O que você espera de um torcedor do seu time? _____________________________________
___________________________________________________________________________
33) Você já fez alguma loucura pelo seu time de futebol?
33.1) ( ) sim. Qual? _________________________________________________________
33.2) ( ) não.
133
34) Você se considera um torcedor fanático (que se altera durante uma partida)?
34.1) ( ) sim.
34.2) ( ) não.
ANEXO E - FORMULÁRIO DE AVALIAÇÃO DOS ESPECIALISTAS
(VALIDAÇÃO DE APARÊNCIA E CONTEÚDO)
Este formulário foi utilizado como instrumento de validação para o questionário
socioeconômico e sobre o significado de torcer, a ser aplicado na coleta de dados realizada pela
pesquisa Fisiologia das emoções: os torcedores fanáticos de futebol. Como especialista em
sociologia do esporte, você está sendo convidado a contribuir para otimização deste instrumento
de coleta. Ao avaliar cada item, pedimos que você escreva suas sugestões refletindo se: a) O
instrumento apresenta-se de forma didática e com boa apresentação/formato? b) Os itens do
instrumento estão coerentes com o tema investigado e permite alcançar o objetivo do
instrumento? c) Os itens do instrumento possuem uma linguagem de fácil leitura e
compreensão?
Itens do Questionário Sugestão
1) Idade (em anos):
2) Crença religiosa:
( ) católica
( ) sem religião
( ) espírita
( ) evangélica
( ) outra (especificar):
3) Estado civil:
( ) casado
( ) divorciado
( ) mora com companheiro (a)
( ) viúvo
( ) solteiro
( ) outro (especificar):
4) Renda Familiar mensal:
5) Você tem filhos? Quantos?
6) Tipo de moradia:
( ) casa própria
( ) casa alugada
( ) outra (especificar):____________
7) Estudos:
( ) nenhum
( ) alfabetização a 8ª série (9º ano)
( ) ensino médio completo (1º, 2º e 3º anos)
134
( ) ensino superior completo
( ) ensino superior cursando
( ) pós graduação
8) Situação trabalhista:
( ) empregado
( ) desempregado
( ) empresário
( ) autônomo
9) Carga horaria de trabalho semanal:
( ) variável
( ) ≤ 20horas
( ) ≤ 40 horas
( ) > 40 horas
10) Com relação a pratica de exercícios físicos,
você se considera:
( ) sedentário
( ) pratica raramente
( ) pratica semanalmente
( ) pratica diariamente
( ) atleta
11) Você fuma cigarros?
( ) Sim. Quantos cigarros por dia?_______
( ) não
12) Você consome bebida alcóolica?
( ) sim
( ) não
13) Se sim, qual a frequência de consumo no
último mês?
( ) uma vez
( ) semanalmente
( ) diariamente
( ) outro (especifique):
14) Você possui alguma doença crônica?
( ) sim. Qual?______________
( ) não.
15) Você consome algum medicamento diário?
( ) sim. Qual?______________
( ) não.
16) Você torce para algum time de futebol?
( ) sim.
( ) não.
17) Qual o time de futebol que você torce?
18) Por que você torce para este time?
19) Se você tem filhos, eles gostam de futebol?
( ) sim.
( ) não.
20) Se você tem filhos e eles gostam de futebol,
eles torcem para o mesmo time que você?
135
( ) sim.
( ) não.
21) Você já foi assistir a jogos em estádio?
( ) sim.
( ) não
22) Como foi sua primeira vez em um estádio?
23) Quais os jogos do seu time que você assiste?
( ) todos os jogos.
( ) todos os que passam da tv.
( ) exclusivamente do campeonato
brasileiro.
( ) exclusivamente do campeonato estadual -
( ) exclusivamente clássicos.
( ) alguns jogos independente da
competição.
( ) outro (especifique):
24) Como você se sente quando o seu time faz
um gol?
25) Como você se sente quando o seu time sofre
um gol?
26) Como você se sente quando o seu time perde
uma oportunidade de gol?
27) Como você se sente quando o seu time ganha
uma partida?
28) Como você se sente quando seu time perde
uma partida?
29) Como você se sente quando seu time empata
uma partida?
30) O que você sente ao ver a camisa do seu time
em alguém em outro Estado?
31) O que significa ser torcedor?
32) O que você espera de um torcedor do seu
time?
33) Você já fez alguma loucura pelo seu time?
( ) sim. Qual?______________
( ) não.
34) Você se considera um torcedor fanático (que
se altera durante uma partida)?
( ) sim.
( ) não.
136
ANEXO F – INVENTÁRIO DE ANSIEDADE DE BECK
Abaixo está uma lista de sintomas comuns à ansiedade. Por favor, leia cuidadosamente
cada item da lista. Identifique o quanto você tem sido incomodado por cada um dos sintomas
durante a última semana, incluindo hoje, colocando um X no espaço correspondente, na
mesma linha de cada sintoma.
ANEXO G – INVENTÁRIO DE DEPRESSÃO DE BECK
137
Este questionário consiste em 21 grupos de afirmações. Depois de ler cuidadosamente
cada grupo, faça um círculo em torno do número (0, 1, 2 ou 3) próximo à afirmação, em cada
grupo, que descreve melhor a maneira como você tem se sentido na última semana, incluindo
hoje.
138
139
ANEXO H - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO –
PARTICIPAÇÃO DA PSICÓLOGA.
Você está sendo convidada a participar, como parte da equipe pesquisadora, na função
de psicóloga apta a aplicar os inventários de ansiedade e depressão (BECK,1988), da pesquisa
intitulada Fisiologia das emoções: Os torcedores de futebol, conduzida pela doutoranda Aline
Marques Colares Camurça e orientada Pela Profª.Drª. Heloísa Helena Baldy dos Reis.
Por favor, leia este termo de consentimento com atenção e calma, aproveitando para
esclarecer suas dúvidas. Se houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá
esclarecê-las com a pesquisadora. Se preferir, pode levar este Termo para casa e consultar
seus familiares ou outras pessoas antes de decidir participar. Não haverá nenhum tipo de
penalização ou prejuízo se você não aceitar participar ou retirar sua autorização em qualquer
momento.
Justificativa e objetivos
Este estudo tem por objetivo avaliar o comportamento de marcadores periféricos
(cortisol salivar, glicose e lactato sanguíneos, pressão arterial e frequência cardíaca) dde
voluntários durante uma partida de futebol do Sport Clube Corinthians Paulista, assim como
em um dia de sua rotina habitual.
Procedimentos
Sua participação nesta pesquisa consistirá em aplicar os inventários de ansiedade e
depressão (BECK,1988) a voluntários durante um jogo de futebol do Sport Clube Corinthians
Paulista, assim como em um dia de suas rotinas e posteriormente analisá-los quanto aos seus
resultados.
Desconfortos e riscos
Deixamos claro que não há riscos previsíveis envolvidos na pesquisa e que a mesma
não é remunerada, e ainda, que não haverá despesas por de sua parte.
Benefícios
Não há benefícios diretos.
Acompanhamento e assistência
140
O acompanhamento da equipe de pesquisa acontecerá em dois dias distintos agendados
previamente. Um dia de jogo de futebol e um dia de rotina regular.
Sigilo e privacidade
Os dados obtidos por meio desta pesquisa serão confidenciais, sendo coletados sem
identificação nominal, visando assegurar o sigilo da participação de cada voluntário.
A pesquisadora responsável se comprometeu a tornar públicos nos meios acadêmicos
e científicos os resultados obtidos de forma consolidada sem qualquer identificação de
indivíduos participantes.
Ressarcimento e indenização
A pesquisa será realizada sem custos para você, dessa forma não haverá ressarcimento
de despesas nessa pesquisa. Você terá a garantia ao direito à indenização diante de eventuais
danos decorrentes da pesquisa.
Caso você concorde em participar desta pesquisa, assine ao final deste documento, que
possui duas vias, sendo uma delas sua, e a outra, da pesquisadora responsável / coordenadora
da pesquisa. Em caso de dúvidas sobre a pesquisa, seguem os telefones e o endereço
institucional da pesquisadora responsável.
Contatos
Contatos da pesquisadora responsável: Aline Marques Colares Camurça; estudante de
doutorado; Faculdade de Educação Física, departamento de ciências do esporte, UNICAMP.
55 19 997433203 /
Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação e sobre questões éticas do
estudo, você poderá entrar em contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)
da UNICAMP das 08:30hs às 11:30hs e das 13:00hs as 17:00hs na Rua: Tessália Vieira de
Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936 ou (19) 3521-7187;
e-mail: [email protected].
O Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)
O papel do CEP é avaliar e acompanhar os aspectos éticos de todas as pesquisas
envolvendo seres humanos. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), tem por
objetivo desenvolver a regulamentação sobre proteção dos seres humanos envolvidos nas
141
pesquisas. Desempenha um papel coordenador da rede de Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs)
das instituições, além de assumir a função de órgão consultor na área de ética em pesquisas.
Consentimento livre e esclarecido
Após ter recebido esclarecimentos sobre a natureza da pesquisa “Fisiologia das
emoções: os torcedores de futebol.”, seus objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais
riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito participar e declaro estar recebendo uma
via original deste documento assinada pelo pesquisador e por mim, tendo todas as folhas por
nós rubricadas:
Nome do participante:____________________________________________________
Contato telefônico: ______________________________________________________
e-mail (opcional): _______________________________________________________
Campinas, ____ de _________________ de _____
Assinatura do participante: ________________________________
Responsabilidade do Pesquisador
Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares
na elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento ao participante. Informo
que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi apresentado e pela CONEP,
quando pertinente. Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa
exclusivamente para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento
dado pelo participante.
Campinas, ____ de _________________ de _____.
Assinatura da pesquisadora: _____________________________