filosofia na escola - ensino médio - 3ª série

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JEANN MARCUS GOMES VIEIRA COLÉGIO DINÂMICO Simulacro Editorial

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Page 1: Filosofia Na Escola - Ensino Médio - 3ª Série

JEANN MARCUS GOMES VIEIRA

COLÉGIO DINÂMICO

Simulacro Editorial

Page 2: Filosofia Na Escola - Ensino Médio - 3ª Série

Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 2

Os temas abordados neste Caderno de Filosofia têm a finalidade de conduzir o aluno a perceber o mundo de forma crítica, em busca de explicações reais, percebendo a lógica das relações que o ser humano estabelece no meio social e em contato com o meio ambiente, numa constante reflexão. A Organização das Nações Unidas declarou 2010 como o Ano Internacional da Biodiversidade. O lançamento oficial aconteceu no dia 10 de janeiro em Berlim, na Alemanha. Segundo a ONU o mundo está pouco familiarizado com o papel vital que a biodiversidade desempenha no bem-estar humano e na manutenção do planeta. Vários países do mundo, como Brasil, Canadá, Espanha e Estados Unidos devem apresentar, ao longo do ano, iniciativas nacionais de educação e sensibilização. Dados divulgados no site oficial do Ano Internacional da Biodiversidade mostram que o tema abrange espécies variadas de plantas, animais e microorganismos. Só o turismo baseado na natureza na África (que deve crescer muito a partir da Copa do Mundo de Futebol, em junho) geraria aproximadamente a mesma receita total proveniente da agricultura, silvicultura e pesca na região. Há uma necessidade de equilíbrio nos seres vivos, pois deste equilíbrio depende a nossa sobrevivência e a harmonia no Planeta. Quanto mais conhecemos o nosso meio ambiente, maiores são nossas chances de lutar pela preservação da vida. O equilíbrio consiste em saber exatamente o que fazer em cada situação, melhorando as nossas ações no mundo. O reino animal e o reino vegetal formam a biosfera que em harmonia permite a sobrevivência de todas as espécies. Quebrar esta harmonia pela interferência humana fará com que milhões de espécies entrem em processo de extinção, resultando a médio e longo prazo a própria extinção da espécie humana, de maneira que a manutenção da vida animal e da flora natural é primordial para a manutenção da vida global.

Na natureza, todos os animais lutam pela sobrevivência, mas o ser humano é um dos poucos animais que, de forma estratégica, planeja destruir o seu semelhante, e isso acontece até mesmo nas pequenas coisas da vida, onde se demonstra a intolerância, o preconceito e a falta de educação e valores; o que nos revela o verdadeiro desequilíbrio do homem.

Pensar na necessidade de equilíbrio para o nosso planeta - seja ele ambiental, social, mental, emocional, espiritual, financeiro, orgânico - é refletir acerca do uso de nosso conhecimento e da aplicação dele em favor da vida, já que a vida guarda a sabedoria do equilíbrio e nada acontece sem uma razão justa. Só não podemos cruzar os braços, ficar inertes a tanto desequilíbrio e falta de bom senso. É preciso fazer algo. Como diria o físico alemão Albert Einstein, “viver é como andar de bicicleta: é preciso estar em constante movimento para manter o equilíbrio”.

Jeann Marcus Gomes Vieira Março de 2010

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO 1. FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA

Unidade 1 O Surgimento da Filosofia Unidade 2 O Período Clássico da Filosofia Unidade 3 Filosofia Medieval e Moderna Unidade 4 Filosofia Contemporânea 2. FUNDAMENTOS DE SOCIOLOGIA

Unidade 1 O Estudo Sistemático da Sociedade Unidade 2 Karl Marx e o Materialismo Histórico Unidade 3 Cultura e Sociedade Unidade 4 Os Movimentos Sociais

ALUNO:

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 3

CONTROLE DE PARTICIPAÇÃO BIMESTRAL DO ALUNO FILOSOFIA

ALUNO: _______________________________________ 3° SÉRIE/TURMA: ੦ A ੦ B ੦ C ੦ D ੦ E

1° B

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

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Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

2° B

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

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Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

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Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

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Avaliação Mensal 1

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Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

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MÓDULO TEMÁTICO 1 - FILOSOFIA

O SURGIMENTO DA FILOSOFIA

1. Narrativa Mitológica A narração mitológica envolve basicamente acontecimentos supostos, relativos a épocas primordiais, ocorridos antes do surgimento dos homens (história dos deuses) ou com os "primeiros" homens (história ancestral). O verdadeiro objeto do mito, contudo, não são os deuses nem os ancestrais, mas a apresentação de um conjunto de ocorrências fabulosas com que se procura dar sentido ao mundo. O mito aparece e funciona como mediação simbólica entre o sagrado e o profano, condição necessária à ordem do mundo e às relações entre os seres. Sob sua forma principal, o mito é cosmogônico ou escatológico, tendo o homem como ponto de interseção entre o estado primordial da realidade e sua transformação última, dentro do ciclo permanente nascimento-morte, origem e fim do mundo.

As semelhanças com a religião mostram que o mito se refere - ao menos em seus níveis mais profundos - a temas e interesses que transcendem a experiência imediata, o senso comum e a razão: Deus, a origem, o bem e o mal, o comportamento ético e a escatologia (destino último do mundo e da humanidade). Crê-se no mito, sem necessidade ou possibilidade de demonstração. Rejeitado ou questionado, o mito se converte em fábula ou ficção. Com efeito, são muito freqüentes os mitos que versam sobre a origem dos deuses e do mundo (chamados, respectivamente, mitos teogônicos e cosmogônicos), dos homens, de determinados ritos religiosos, de preceitos morais, tabus, pecados e redenção.

Em certas religiões, os mitos formam um corpo doutrinal e estão estreitamente relacionados com os rituais religiosos - o que levou alguns autores a considerar que a origem e a função dos mitos é explicar os rituais religiosos. Mas tal hipótese não foi universalmente aceita, por não esclarecer a formação dos rituais e porque existem mitos que não correspondem a um ritual.

Nas religiões monoteístas, as mitologias, sobretudo as teogonias, são geralmente repudiadas como exemplos de ateísmo ou politeísmo, pois representariam uma desvirtuação do Deus único e transcendente, à medida que o relacionam a manifestações ou representações de outras criaturas. Entretanto, essas mesmas religiões também recorrem a descrições fantásticas, de caráter simbólico, para explicar a origem do mundo e do pecado, o fim do mundo e a vida ultra-terrena, e não deixam de atribuir a Deus reações e sentimentos humanos. O mito, portanto, é uma linguagem apropriada para a religião. Isso não significa que a religião, tampouco o mito, conte uma história falsa, mas que ambos traduzem numa linguagem plástica (isto é, em descrições e narrações) uma realidade que transcende o senso comum e a racionalidade humana e que, portanto, não cabe em meros conceitos analíticos. Não importa, do ponto de vista do estudo da mitologia e da religião, que Prometeu não tenha sido realmente acorrentado a um rochedo com um abutre a comer-lhe as entranhas, nem que Deus não tenha criado o ser humano a partir do barro.

Os mitos foram muito importantes para as sociedades da antiguidade, pois era essencial ao homem saber suas origens e compreender a origem do mundo. Os mitos, além da função religiosa, representavam uma tentativa de explicar o incompreensível.

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

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O mito abrange maior amplitude de mensagens, desde atitudes antropológicas muito imprecisas, até conteúdos religiosos, pré-científicos, tribais, folclóricos ou simplesmente anedóticos, que são aceitos e formulados de modo menos consciente e deliberado, mais espontâneo, sem considerações críticas.

Na história do pensamento ocidental, a filosofia nasce na Grécia por volta do século VII a.C. Por meio de longo processo histórico, surge promovendo a passagem do saber mítico ao pensamento racional, sem, entretanto, romper bruscamente com todos os conhecimentos do passado. Durante muito tempo, os primeiros filósofos gregos compartilharam de diversas crenças míticas, enquanto desenvolviam o conhecimento racional que caracterizaria a filosofia.

2. Condições Históricas Podemos apontar como principais condições históricas para o surgimento da Filosofia na Grécia: As Viagens Marítimas, que permitiram aos gregos descobrir que os locais que os mitos diziam ser habitados por deuses, titãs e heróis eram, na verdade, habitados por outros seres; e que as regiões dos mares que os mitos diziam ser habitados por monstros e seres fabulosos não possuíam nem monstros nem seres fabulosos. As viagens produziram o desencantamento ou a desmitificação do mundo, que passou, assim, a exigir uma explicação sobre sua origem, explicação que o mito já não podia oferecer; A invenção do Calendário, que é uma forma de calcular o tempo segundo as estações do ano, as horas do dia, os fatos importantes que se repetem, revelando, com isso, uma capacidade de abstração nova, ou uma percepção do tempo como algo natural e não como um poder divino incompreensível; A Invenção da Moeda, que permitiu uma forma de troca que não se realiza através das coisas concretas ou dos objetos concretos trocados por semelhança, mas uma troca abstrata, uma troca feita pelo cálculo do valor

semelhante das coisas diferentes, revelando, portanto, uma nova capacidade de abstração e de generalização; O Surgimento da Vida Urbana, com predomínio do comércio e do artesanato, dando desenvolvimento a técnicas de fabricação e de troca, e diminuindo o prestígio das famílias da aristocracia proprietária de terras, por quem e para quem os mitos foram criados; além disso, o surgimento de uma classe de comerciantes ricos, que precisava encontrar pontos de poder e de prestígio para suplantar o velho poderio da aristocracia de terras e de sangue (as linhagens constituídas pelas famílias), fez com que se procurasse o prestígio pelo patrocínio e estímulo às artes, às técnicas e aos conhecimentos, favorecendo um ambiente onde a Filosofia poderia surgir; A Invenção da Política, esta a principal causa para a origem da Filosofia, já que, até agora, vimos somente a contribuição das técnicas para isso; porém, havia mais recursos técnicos no Oriente que na Grécia, e a Filosofia é uma invenção genuinamente grega, além do Oriente não ter se libertado dos mitos. Note que a palavra política é formada pelo termo grego polis, cujo significado é cidade, cidade-estado, conjunto de cidadãos que vivem em um mesmo lugar e uma mesma lei. E o mais importante: são os cidadãos que faziam suas próprias leis mediante uma assembléia. Esta prática teve início com os guerreiros que, juntos, discutiam o melhor modo de vencer ao inimigo, cada um dos guerreiros tinha o direito de falar, bastando para isso ir ao centro do círculo formado na assembléia; ao final da guerra, outras assembléias eram feitas para dividir o que foi ganho. Isto é, ocorre a prática do diálogo para a decisão, dando a todos o direito de falar e a condição de serem iguais uns aos outros e à lei partilhada entre eles. Aquele que conseguir convencer a maioria de que sua proposta é a que aproxima-se mais da verdade de como vencer aos inimigos, receberá maior número de votos.

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3. Formas de Conhecer O ser humano, ao longo do tempo, encontrou caminhos diversos para conhecer e compreender a si mesmo e o mundo em que vive. O senso comum, o mito, o conhecimento teológico o conhecimento filosófico, as formas de arte e o conhecimento científico foram e ainda são formas que o homem utiliza para compreender o que se apresenta como dúvida, problema, indagação ou simples curiosidade. Assim, não é difícil perceber que a todo momento o ser humano busca ter informações, idéias claras sobre o que se apresenta aos seus sentidos e à sua razão, bem como utilizar (ainda que sem perceber) seus mecanismos perceptivos e sua inteligência para ampliar os conhecimentos que já possui. Se perguntarmos “de que modo o sujeito que conhece pode apreender o real?”, a resposta imediata que nos vem à mente é que o homem conhece pela razão, pelo discurso. Outros conhecimentos são adquiridos em nosso convívio com outras pessoas. Chamamos senso comum ao conhecimento adquirido por tradição, herdado dos antepassados e ao qual acrescentamos aos resultados da experiência vivida na coletividade a que pertencemos. Trata-se de um conjunto de idéias que nos permite interpretar a realidade, bem como de um corpo de valores que nos ajuda a avaliar, julgar e, portanto, agir. O senso comum não é refletido e se encontra misturado a crenças e preconceitos. É um conhecimento ingênuo (não-critico), fragmentário (assistemático) e conservador (resistente às mudanças). Mas nós apreendemos o real também pela intuição, que é uma forma de conhecimento imediato, isto é, feito sem intermediários, um pensamento presente ao espírito. Como a própria palavra indica (tueri em latim significa “ver”), intuição é uma visão súbita. Enquanto o raciocínio é discursivo e se faz por meio da palavra, a intuição é inefável, inexprimível: como poderíamos explicar em que consiste a sensação do obscuro? A intuição é importante por ser o ponto de partida do conhecimento, a possibilidade da invenção, da descoberta, dos grandes “saltos” do saber humano. Partindo de uma divisão muito simplificada, a intuição pode ser de vários tipos:

Intuição Sensível - é o conhecimento imediato que nos é dado pelos órgãos dos sentidos: sentimos que faz calor; vemos que as cores das coisas; ouvimos o som da música. Intuição Inventiva - é a do sábio, do artista, do cientista, quando repentinamente descobrem uma nova hipótese, um tema original. Também na vida diária, enfrentamos situações que exigem soluções criativas, verdadeiras invenções súbitas. Intuição Intelectual - é a que se esforça por captar diretamente a essência do objeto. Por exemplo, a descoberta de Descartes do cogito (eu pensante) enquanto primeira verdade indubitável. 4. Compreensão do Mundo Para compreender o mundo, para “organizar o caos”, a razão supera as informações concretas e imediatas que recebe, organizando-as em conceitos ou idéias gerais que, devidamente articulados, podem levar à demonstração e a conclusões que se consideram verdadeiras. Diferentemente da intuição, a razão é por excelência a faculdade de julgar. Chamamos conhecimento discursivo ao conhecimento mediato, isto é, aquele que se dá por meio de conceitos. É o pensamento que opera por etapas, por um encadeamento de idéias, juízos e raciocínios que levam a determinada conclusão. Para tanto, a razão precisa realizar abstrações. Abstrair significa “isolar”, “separar de”. Fazemos ums abstração quando isolamos, separamos um elemento de uma representação, elemento este que não é dado separadamente na realidade (representação significa a imagem, ou a idéia da “coisa” enquanto presente no espírito). Quando vemos uma caneca, temos inicialmente a imagem dela, uma representação mental de natureza sensível e de certa forma concreta e particular, porque se refere àquela caneca especificamente (por exemplo, de forma cilindrica e de porcelana). Quando abstraímos, isolamos essas características por serem secundárias, e consideramos apenas o “ser caneca”.

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Resulta daí o conceito ou idéia de caneca, que é a representação intelectual de um objeto e, portanto, imaterial e geral. Ou seja, a idéia de caneca não se refere àquela caneca particular, mas a qualquer objeto que sirva para tomar leite quente. Da mesma forma, podemos abstrair da caneca a forma ou a cor, que de fato não existem fora da coisa real. O matemático reduz as coisas que têm peso, dureza, cor, para considerar a quantidade. Por exemplo, qundo dizemos dois, consideramos apenas o número, deixando de lado se são duas pessoas ou duas frutas. Quanto mais tornamos abstrato um conceito, mais nos distanciamos da realidade concreta. Esse artifício da razão é importante enquanto possibilidade de transcendência, para a superação do “aqui e agora” e construção de hipóteses transformadoras do real. O verdadeiro conhecimento se faz, portanto, pela ligação contínua entre intuição e razão, entre o vivido e o teorizado, entre o concreto e o abstrato. A teoria do conhecimento é uma disciplina filosófica que investiga os problemas decorrentes da relação entre sujeito e objeto do conhecimento, bem como as condições do conhecimento verdadeiro.

O QUE É FILOSOFIA? Mesmo os filósofos discordam sobre a natureza e os propósitos da Filosofia, então, vamos colocar de um jeito que se ajuste às diferentes interpretações, capturando a essência do conceito. Para entender o que é Filosofia, é importante entendermos como ela surgiu. A filosofia surgiu na Grécia Antiga com o propósito de libertar o pensamento de suas bases míticas, para dar à vida explicações diferentes daquelas que dependiam de deuses e superstições. Era uma atividade dos homens sábios (philos = amigo ou amante; sophia = sabedoria) que se punham a pensar sobre conceitos estabelecidos, buscando novos entendimentos. Ou seja, a Filosofia tem início quando não mais consideramos as coisas como certas, passando e formular questões sobre elas e a procurar respostas. Faz-se Filosofia colocando perguntas, propondo idéias, argumentando e pensando em possíveis argumentos contrários, procurando saber como funcionam realmente os conceitos, para chegar mais próximo da verdade. Seu objetivo é avançar no conhecimento da vida e de nós mesmos.

PAUSA PARA REFLEXÃO:

Neste momento seria interessante recordar o filme, Helena de Tróia (2003), em que parecem várias cenas mostrando o processo pelo qual os cidadãos gregos criaram algumas instituições que permanecem até hoje: (o voto; a necessidade de argumentação; o direito de defender sua idéia) como na cena em que lançam sorte para decidir quem desposaria Helena; cena essa em que aparece um diálogo importante: “onde já se viu isso acontece?” pergunta um dos personagens, recebendo como resposta: “sejamos os primeiros!” Esse filme pode ser analisado paralelamente à analise do processo de surgimento da filosofia, na Grécia, e da música Mulheres de Atenas, cantada por Chico Buarque. Um bom exercício histórico-filosófico-cultural seria, agora, comparar como duas sociedades gregas, Ateniense e Espartana, tratavam as mulheres; qual era a função da mulher na sociedade Ateniense e na sociedade Espartana? Na música de Chico Buarque as mulheres de Atenas: vivem, sofrem, despem-se, para seus maridos e para eles geram filhos ao mesmo tempo em que temem perdê-los na guerra. Depois de descobrir como os espartanos tratavam suas mulheres, compare-os com a sociedade atual. Qual é o espaço da mulher, na sociedade atual?

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

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LEITURA COMPLEMENTAR

O NASCIMENTO DA FILOSOFIA Na história do pensamento ocidental, a filosofia nasce na Grécia por volta do século VI (ou VII) a.C. Por meio de longo processo histórico, surge promovendo a passagem do saber mítico ao pensamento racional, sem, entretanto, romper bruscamente como todos os conhecimentos do passado. Durante muito tempo, os primeiros filósofos gregos compartilhavam de diversas crenças míticas, enquanto desenvolviam o conhecimento racional que caracterizaria a filosofia. Se considerarmos filosofia a atividade racional voltada à discussão e à explicação intelectualizada das coisas que nos circundam, tem-se o século VI como a data mais provável da origem da filosofia. Nessa época temos a instituição da moeda, do calendário e da escrita alfabética, a florescente navegação, que favoreceu o intenso contato com outras culturas, esses acontecimentos propiciaram o processo de desdobramento do pensamento poético em filosófico.

De acordo com a tradição histórica, a fase inaugural da filosofia grega é conhecida como período pré-socrático. Esse período abrange o conjunto das reflexões filosóficas desenvolvidas desde Tales de Mileto (623-546 a.C.) até Sócrates (468-399 a.C.).

A filosofia é um modo de pensar, é uma postura diante do mundo. A filosofia não é um conjunto de conhecimentos prontos, um sistema acabado, fechado em si mesmo. Ela é, antes de mais nada, uma prática de vida que procura pensar os acontecimentos além de sua pura aparência. Assim, ela pode se voltar para qualquer objeto. Pode pensar a ciência, seus valores, seus métodos, seus mitos; pode pensar a religião; pode pensar a arte; pode pensar o próprio homem em sua vida cotidiana. Até mesmo uma história em quadrinhos ou uma canção popular podem ser objeto da reflexão filosófica.

A filosofia parte do que existe, critica, coloca em dúvida, faz perguntas importunas, abre a porta das possibilidades, faz-nos entrever outros mundos e outros modos de compreender a vida. A filosofia incomoda porque questiona o modo de ser das pessoas, das culturas, do mundo.

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Questiona as práticas política, científica, técnica, ética, econômica, cultural e artística. Não há área onde ela não se meta, não indague. E, nesse sentido, a filosofia é "perigosa", "subversiva", pois vira a ordem estabelecida de cabeça para baixo.Talvez a divulgação da imagem do filósofo como sendo uma pessoa "desligada" do mundo seja exatamente a defesa da sociedade contra o "perigo" que ela representa.

O trabalho do filósofo é refletir sobre a realidade, qualquer que seja ela, redescobrindo seus significados mais profundos. Filósofos diferentes têm posturas diversas com relação à imagem institucional de sabedoria e compreensão.Embora com motivações diferentes, deram a sua importante contribuição para o alargamento das fronteiras.

A filosofia quer encontrar o significado mais profundo dos fenômenos. Não basta saber como funcionam, mas o que significam na ordem geral do mundo humano. A filosofia emite juízos de valor ao julgar cada fato, cada ação em relação ao todo. Assim, filosofar é uma prática que parte da teoria e resulta em outras teorias. Desse modo, embora os sistemas filosóficos possam chegar a conclusões diversas, dependendo das premissas de partida e da situação histórica dos próprios pensadores, o processo do filosofar será sempre marcado pela reflexão rigorosa, radical e de conjunto.

O conceito de filosofia foi muito bem definido por Gerd Bornheim no livro Os filósofos Pré-socráticos: Se compreendermos a Filosofia em um sentido amplo - como concepção da vida e do mundo - poderemos dizer que sempre houve filosofia. De fato, ela responde a uma exigência da própria natureza humana; o homem, imerso no mistério do real, vive a necessidade de encontrar uma razão de ser para o mundo que o cerca e para os enigmas de sua existência.

O PAPEL DO TEATRO NA GRÉCIA ANTIGA

No começo, o teatro grego não era apenas uma narração dramática, era um rito religioso em honra a Dionísio. Os teatros eram auditórios ao ar livre. A hora do início do espetáculo era o amanhecer. Muitas vezes os cidadãos assistiam a três tragédias, uma tragicomédia e uma comédia. O teatro era considerado parte da educação de um grego. Em Atenas, o comércio era suspenso durante os festivais dramáticos. Os tribunais fechavam e os presos eram soltos da cadeia. O preço da entrada era dispensado para quem não pudesse pagar, e até as mulheres, que não podiam participar de quase todos os acontecimentos públicos, eram bem recebidas no teatro. Duas formas do drama grego, a comédia e a tragédia, acabaram por dominar o teatro Dionisíaco, embora as outras formas dramáticas não tivessem morrido. Em Atenas, dois festivais eram dedicados todos os anos à comédia e à tragédia. O festival Dionisíaco da cidade, em março-abril, concentrava-se na tragédia. O festival Lêneo, que tinha esse nome devido ao mês grego (janeiro-fevereiro), tradicionalmente reservado para a celebração de casamento, era dedicado principalmente à comédia. Os teatrólogos apresentavam suas obras a um funcionário chamado Arconte. Se o Arconte aprovasse a peça seria encenada. Era dado aos autores vitoriosos um corego (um cidadão rico para custear as despesas da peça). O corego escolhia então um tocador de flauta e um coro e prosseguia com a encenação. Se o corego fosse generoso, surgia uma produção opulenta. Em cada festival um júri de cidadãos julgava as peças, e os vencedores recebiam a coroa dionisíaca.

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

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MÓDULO TEMÁTICO 2 - FILOSOFIA

O PERÍODO CLÁSSICO DA FILOSOFIA

1. Filósofos Pré-socráticos Primeiros filósofos gregos, os pré-socráticos vivem entre os séculos VII e VI a.C. Eles recebem esta denominação por terem vivido antes de Sócrates (469 a.C. - 399 a.C.), que desloca o foco da reflexão filosófica da natureza para o homem e o mundo das idéias. A característica comum aos pré-socráticos é a preocupação com o mundo natural (physis, em grego), daí serem chamados de fisiólogos. Os pré-socráticos merecem tal denominação porque pensam a natureza como o princípio (arché) de constituição de toda e qualquer realidade. Ao tentar explicar a natureza das coisas reduzindo sua multiplicidade a um único princípio, eles rompem com a forma de pensamento do mundo antigo. Inauguram uma nova mentalidade baseada na razão e, não mais, no sobrenatural e na tradição mítica. Dentre os principais filósofos deste período destacam-se Tales, Pitágoras, Anaxímenes, Heráclito, Parmênides, Empédocles, Anaxágoras e Demócrito. HERÁCLITO Heráclito (544-484 a.C.) nasceu em Èfeso, na Jônia (atual Turquia). A ÁRQUE para ele era o FOGO, sempre vivo, descrevendo-o como inteligência e como a causa do governo do universo. Os demais elementos derivam do Fogo por vários graus de condensação, com a mudança de opostos. Segundo Heráclito: “todas as coisas mudam sem cessar”, e o que temos diante de nós em dado momento é diferente do que foi há pouco e do que será depois: “Sobre aqueles que entram nos mesmos rios, águas sempre diversas fluem. Entramos e não entramos nos mesmos rios, somos e não somos. Pois não é possível entrar duas vezes no mesmo rio, nem substância mortal tocar duas vezes na mesma condição: mas pela intensidade e rapidez da mudança, dispersa e de novo reúne - ou melhor, nem mesmo de novo, nem

depois, mas ao mesmo tempo, compõe-se e desiste, aproxima-se e afasta". Para Heráclito, a única coisa permanente é a mudança. PARMÊMIDES Parmênides (540-470 a.C.) nasceu em Eléia, colônia grega (atual Itália). Segundo Parmênides é absurdo considerar que uma coisa pode ser e não ser ao mesmo tempo. O ser é único, imutável, infinito e imóvel. Para Parmênides, o movimento existe apenas no mundo sensível, e a percepção levada a efeito pelos sentidos é ilusória. Parmênides defendia a existência de dois caminhos para a compreensão da realidade. O primeiro é o da filosofia, da razão, da essência. O segundo é o da crendice, na opinião pessoal, da aparência enganosa. OS SOFISTAS

Os sofistas eram professores viajantes que, por determinado preço, ofereciam ensinamentos práticos de filosofia. Levando em consideração os interesses dos alunos, davam aulas de eloqüência e de sagacidade mental. Ensinavam conhecimentos úteis para o sucesso nos negócios públicos e privados.

Sofismo em Filosofia, é um raciocínio aparentemente válido, mas inconclusivo, pois é contrário às próprias leis. Também são considerados sofismas os raciocínios que partem de premissas verdadeiras ou verossímeis, mas que são concluídos de uma forma inadmissível ou absurda.

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

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Os sofistas de maior destaque foram Protágoras (485-411 a.C.) de Abdera e Górgias (485-380 a.C.) de Leôncio, na Sicília.

Segundo os sofistas a realidade e a lei natural estão acima da capacidade cognoscitiva do homem.

Tudo aquilo que o homem conhece em filosofia e em ética é de sua própria elaboração. Daí a famosa expressão dos sofistas: “o homem é a medida de todas as coisas”.

Protágoras sustentava não haver nenhuma verdade absoluta. “O homem interpreta a seu modo e a seu interesse os dados da sensação."

Górgias avançava relativismo de Protágoras em direção ao ceticismo mais radical, afirmando que “o ser não existe”.

2. Sócrates e o Diálogo Inteligível Quem valorizou a descoberta do homem feita pelos sofistas, orientando-a para os valores universais, segundo a via real do pensamento grego, foi Sócrates. Nasceu Sócrates em 470 ou 469 a.C, em Atenas, filho de Sofrônico, escultor, e de Fenáreta, parteira. Aprendeu a arte paterna, mas dedicou-se inteiramente à meditação e ao ensino filosófico, sem recompensa alguma, não obstante sua pobreza.

Desempenhou alguns cargos políticos e foi sempre modelo irrepreensível de bom cidadão. Combateu a Potidéia, onde salvou a vida de Alcebíades e em Delium, onde carregou aos ombros a Xenofonte, gravemente ferido. Formou a sua instrução, sobretudo através da reflexão pessoal, na moldura da alta cultura ateniense da época, em contato com o que de mais ilustre houve na cidade de Péricles. Inteiramente absorvido pela sua vocação, não se deixou distrair pelas preocupações domésticas nem pelos interesses políticos. Quanto à família, podemos dizer que Sócrates não teve, por certo, uma mulher ideal na quérula Xantipa; mas também ela não teve um marido ideal no filósofo, ocupado com outros cuidados que não os domésticos. Quanto à política, foi ele valoroso soldado e rígido magistrado.

Mas, em geral, conservou-se afastado da vida pública e da política contemporânea, que contrastavam com o seu temperamento crítico e com o seu reto juízo. Julgava que devia servir a pátria conforme suas atitudes, vivendo justamente e formando cidadãos sábios, honestos, temperados - diversamente dos sofistas, que agiam para o próprio proveito e formavam grandes egoístas, capazes unicamente de se acometerem uns contra os outros e escravizar o próximo. Entretanto, a liberdade de seus discursos, a feição austera de seu caráter, a sua atitude crítica, irônica e a conseqüente educação por ele ministrada, criaram descontentamento geral, hostilidade popular, inimizades pessoais, apesar de sua probidade. Diante da tirania popular, bem como de certos elementos reacionários, aparecia Sócrates como chefe de uma aristocracia intelectual.

S

Esse estado de ânimo hostil a Sócrates concretizou-se, tomou forma jurídica, na acusação movida contra ele por Mileto, Anito e Licon: de corromper a mocidade e negar os deuses da pátria introduzindo outros. Sócrates desdenhou defender-se diante dos juizes e da justiça humana, humilhando-se e desculpando-se mais ou menos.

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Tinha ele diante dos olhos da alma não uma solução empírica para a vida terrena, e sim o juízo eterno da razão, para a imortalidade. E preferiu a morte. Declarado culpado por uma pequena minoria, assentou-se com indômita fortaleza de ânimo diante do tribunal, que o condenou à pena capital com o voto da maioria. Tendo que esperar mais de um mês a morte no cárcere - pois uma lei vedava as execuções capitais durante a viagem votiva de um navio a Delos - o discípulo Criton preparou e propôs a fuga ao Mestre. Sócrates, porém, recusou, declarando não querer absolutamente desobedecer às leis da pátria. E passou o tempo preparando-se para o passo extremo em palestras espirituais com os amigos. Especialmente famoso é o diálogo sobre a imortalidade da alma - que se teria realizado pouco antes da morte e foi descrito por Platão no Fédon com arte incomparável.

Suas últimas palavras dirigidas aos discípulos, depois de ter sorvido tranqüilamente a cicuta, foram: "Devemos um galo a Esculápio". É que o deus da medicina tinha-o livrado do mal da vida com o dom da morte. Morreu Sócrates em 399 a.C. com 71 anos de idade.

Método de Sócrates

É a parte polêmica. Insistindo no perpétuo fluxo das coisas e na variabilidade extrema das impressões sensitivas determinadas pelos indivíduos que de contínuo se transformam, concluíram os sofistas pela impossibilidade absoluta e objetiva do saber. Sócrates restabelece-lhe a possibilidade, determinando o verdadeiro objeto da ciência. O objeto da ciência não é o sensível, o particular, o indivíduo que passa; é o inteligível, o conceito que se exprime pela definição. Este conceito ou idéia geral obtém-se por um processo dialético por ele chamado indução e que consiste em comparar vários indivíduos da mesma espécie, eliminar-lhes as diferenças individuais, as qualidades mutáveis e reter-lhes o elemento comum, estável, permanente, a natureza, a essência da coisa. Por onde se vê que a indução socrática não tem o caráter demonstrativo do moderno processo lógico, que vai do fenômeno à lei, mas é um meio de generalização, que remonta do indivíduo à noção universal.

Praticamente, na exposição polêmica e didática destas idéias, Sócrates adotava sempre o diálogo, que revestia uma dúplice forma, conforme se tratava de um adversário a confrontar ou de um discípulo a instruir. No primeiro caso, assumia humildemente a atitude de quem aprende e ia multiplicando as perguntas até colher o adversário presunçoso em evidente contradição e constrangê-lo à confissão humilhante de sua ignorância. É a ironia socrática. No segundo caso, tratando-se de um discípulo (e era muitas vezes o próprio adversário vencido), multiplicava ainda as perguntas, dirigindo-as agora ao fim de obter, por indução dos casos particulares e concretos, um conceito, uma definição geral do objeto em questão. A este processo pedagógico, em memória da profissão materna, denominava ele maiêutica ou engenhosa obstetrícia do espírito, que facilitava o parir das idéias.

Doutrinas Filosóficas

A introspecção é a característica da filosofia de Sócrates. E exprime-se no famoso lema conhece-te a ti mesmo - isto é, torna-te consciente de tua ignorância - como sendo o ápice da sabedoria, que é o desejo da ciência mediante a virtude. E alcançava em Sócrates intensidade e profundidade tais, que se concretizava, se personificava na voz interior divina do gênio ou demônio. Como é sabido, Sócrates não deixou nada escrito. As notícias que temos de sua vida e de seu pensamento, devemo-las especialmente aos seus dois discípulos Xenofonte e Platão , de feição intelectual muito diferente. Xenofonte, autor de Anábase, em seus Ditos Memoráveis, legou-nos de preferência o aspecto prático e moral da doutrina do mestre. Xenofonte, de estilo simples e harmonioso, mas sem profundidade, não obstante a sua devoção para com o mestre e a exatidão das notícias, não entendeu o pensamento filosófico de Sócrates, sendo mais um homem de ação do que um pensador. Platão, pelo contrário, foi filósofo grande demais para nos dar o preciso retrato histórico de Sócrates; nem sempre é fácil discernir o fundo socrático das especulações acrescentadas por ele. Seja como for, cabe-lhe a glória e o privilégio de ter sido o grande historiador do pensamento de Sócrates, bem como o seu biógrafo genial.

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Com efeito, pode-se dizer que Sócrates é o protagonista de todas as obras platônicas embora Platão conhecesse Sócrates já com mais de sessenta anos de idade.

"Conhece-te a ti mesmo" - o lema em que Sócrates cifra toda a sua vida de sábio. O perfeito conhecimento do homem é o objetivo de todas as suas especulações e a moral, o centro para o qual convergem todas as partes da filosofia. A psicologia serve-lhe de preâmbulo, a teodicéia de estímulo à virtude e de natural complemento da ética. 3. Platão e o Dualismo

Diversamente de Sócrates , que era filho do povo, Platão nasceu em Atenas, em 428 ou 427 a.C, de pais aristocráticos e abastados, de antiga e nobre prosápia. Temperamento artístico e dialético - manifestação característica e suma do gênio grego - deu, na mocidade, livre curso ao seu talento poético, que o acompanhou durante a vida toda, manifestando-se na expressão estética de seus escritos; entretanto isto prejudicou sem dúvida a precisão e a ordem do seu pensamento, tanto assim que várias partes de suas obras não têm verdadeira importância e valor filosófico.

Aos vinte anos, Platão travou relação com Sócrates - mais velho do que ele quarenta anos - e gozou por oito anos do ensinamento e da amizade do mestre. Quando discípulo de Sócrates e ainda depois, Platão estudou também os maiores pré-socráticos. Depois da morte do mestre, Platão retirou-se com outros socráticos para junto de Euclides, em Mégara.

Daí deu início a suas viagens, e fez um vasto giro pelo mundo para se instruir (390-388). Visitou o Egito, de que admirou a veneranda Antigüidade e estabilidade política; a Itália meridional, onde teve ocasião de travar relações com os pitagóricos (tal contato será fecundo para o desenvolvimento do seu pensamento); a Sicília, onde conheceu Dionísio o Antigo, tirano de Siracusa e travou amizade profunda com Dion, cunhado daquele. Caído, porém, na desgraça do tirano pela sua fraqueza, foi vendido como escravo.

Libertado graças a um amigo, voltou a Atenas. Em Atenas, pelo ano de 387, Platão fundava a sua célebre escola, que, dos jardins de Academo, onde surgiu, tomou o nome famoso de Academia. Adquiriu, perto de Colona, povoado da Ática, uma herdade, onde levantou um templo às Musas, que se tornou propriedade coletiva da escola e foi por ela conservada durante quase um milênio, até o tempo do imperador Justiniano (529 d.C.).

Platão (428 a.C. - 347 a.C.)

Platão, ao contrário de Sócrates, interessou-se vivamente pela política e pela filosofia política. Foi assim que o filósofo, após a morte de Dionísio o Antigo, voltou duas vezes - em 366 e em 361 - à Dion, esperando poder experimentar o seu ideal político e realizar a sua política utopista. Estas duas viagens políticas a Siracusa, porém, não tiveram melhor êxito do que a precedente: a primeira viagem terminou com desterro de Dion; na segunda, Platão foi preso por Dionísio, e foi libertado por Arquitas e pelos seus amigos, estando, então, Arquistas no governo do poderoso estado de Tarento. Voltando para Atenas, Platão dedicou-se inteiramente à especulação metafísica, ao ensino filosófico e à redação de suas obras, atividade que não foi interrompida a não ser pela morte.

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Esta veio operar aquela libertação definitiva do cárcere do corpo, da qual a filosofia - como lemos no Fédon - não é senão uma assídua preparação e realização no tempo. Morreu o grande Platão em 348 ou 347 a.C, com oitenta anos de idade. Platão é o primeiro filósofo antigo de quem possuímos as obras completas. Dos 35 diálogos, porém, que correm sob o seu nome, muitos são apócrifos, outros de autenticidade duvidosa. A forma dos escritos platônicos é o diálogo, transição espontânea entre o ensinamento oral e fragmentário de Sócrates e o método estritamente didático de Aristóteles. No fundador da Academia, o mito e a poesia confundem-se muitas vezes com os elementos puramente racionais do sistema. Faltam-lhe ainda o rigor, a precisão, o método, a terminologia científica que tanto caracterizam os escritos do sábio estagirita. A atividade literária de Platão abrange mais de cinqüenta anos da sua vida: desde a morte de Sócrates , até a sua morte. A parte mais importante da atividade literária de Platão é representada pelos diálogos - em três grupos principais, segundo certa ordem cronológica, lógica e formal, que representa a evolução do pensamento platônico, do socratismo ao aristotelismo.

Teoria das Idéias

Sócrates mostrara no conceito o verdadeiro objeto da ciência. Platão aprofunda-lhe a teoria e procura determinar a relação entre o conceito e a realidade fazendo deste problema o ponto de partida da sua filosofia. A ciência é objetiva; ao conhecimento certo deve corresponder a realidade. Ora, de um lado, os nossos conceitos são universais, necessários, imutáveis e eternos (Sócrates), do outro, tudo no mundo é individual, contingente e transitório (Heráclito). Deve, logo, existir, além do fenomenal, um outro mundo de realidades, objetivamente dotadas dos mesmos atributos dos conceitos subjetivos que as representam. Estas realidades chamam-se Idéias. As idéias não são, pois, no sentido platônico, representações intelectuais, formas abstratas do pensamento, são realidades objetivas, modelos e arquétipos eternos de que as coisas visíveis são cópias imperfeitas e fugazes. Assim a idéia de homem é o homem abstrato perfeito e universal de que os

indivíduos humanos são imitações transitórias e defeituosas. Todas as idéias existem num mundo separado, o mundo dos inteligíveis, situado na esfera celeste. A certeza da sua existência funda-a Platão na necessidade de salvar o valor objetivo dos nossos conhecimentos e na importância de explicar os atributos do ente de Parmênides, sem, com ele, negar a existência do fieri. Tal a célebre teoria das idéias, alma de toda filosofia platônica, centro em torno do qual gravita todo o seu sistema.

A Metafísica

As Idéias

O sistema metafísico de Platão centraliza-se e culmina no mundo divino das idéias; e estas contrapõe-se a matéria obscura e incriada. Entre as idéias e a matéria estão o Demiurgo e as almas, através de que desce das idéias à matéria aquilo de racionalidade que nesta matéria aparece. O divino platônico é representado pelo mundo das idéias e especialmente pela idéia do Bem, que está no vértice. A existência desse mundo ideal seria provada pela necessidade de estabelecer uma base ontológica, um objeto adequado ao conhecimento conceptual. Esse conhecimento, aliás, se impõe ao lado e acima do conhecimento sensível, para poder explicar verdadeiramente o conhecimento humano na sua efetiva realidade. E, em geral, o mundo ideal é provado pela necessidade de justificar os valores, o dever ser, de que este nosso mundo imperfeito participa e a que aspira. Visto serem as idéias, conceitos personalizados, transferidos da ordem lógica à ontológica, terão conseqüentemente as características dos próprios conceitos: transcenderão a experiência, serão universais, imutáveis. Além disso, as idéias terão aquela mesma ordem lógica dos conceitos, que se obtém mediante a divisão e a classificação, isto é, são ordenadas em sistema hierárquico, estando no vértice a idéia do Bem, que é papel da dialética (lógica real, ontológica) esclarecer. Como a multiplicidade dos indivíduos é unificada nas idéias respectivas, assim a multiplicidade das idéias é unificada na idéia do Bem. Logo, a idéia do Bem, no sistema platônico, é a realidade suprema, donde dependem todas as demais idéias, e todos os valores (éticos,

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lógicos e estéticos) que se manifestam no mundo sensível; é o ser sem o qual não se explica o vir-a-ser. Portanto, deveria representar o verdadeiro Deus platônico. No entanto, para ser verdadeiramente tal, falta-lhe a personalidade e a atividade criadora. Desta personalidade e atividade criadora - ou, melhor, ordenadora - é, pelo contrário, dotado o Demiurgo o qual, embora superior à matéria, é inferior às idéias, de cujo modelo se serve para ordenar a matéria e transformar o caos em cosmos.

As Almas

A alma, assim como o Demiurgo, desempenha papel de mediador entre as idéias e a matéria, à qual comunica o movimento e a vida, a ordem e a harmonia, em dependência de uma ação do Demiurgo sobre a alma. Assim, deveria ser, tanto no homem como nos outros seres, porquanto Platão é um pampsiquista, quer dizer, anima toda a realidade. Ele, todavia, dá à alma humana um lugar e um tratamento à parte, de superioridade, em vista dos seus impelentes interesses morais e ascéticos, religiosos e místicos.

Assim é que considera ele a alma humana como um ser eterno (coeterno às idéias, ao Demiurgo e à matéria), de natureza espiritual, inteligível, caído no mundo material como que por uma espécie de queda original, de um mal radical. Deve, portanto, a alma humana, libertar-se do corpo, como de um cárcere; esta libertação, durante a vida terrena, começa e progride mediante a filosofia, que é separação espiritual da alma do corpo, e se realiza com a morte, separando-se, então, na realidade, a alma do corpo. A faculdade principal, essencial da alma é a de conhecer o mundo ideal, transcendental: contemplação em que se realiza a natureza humana, e da qual depende totalmente a ação moral. Entretanto, sendo que a alma racional é, de fato, unida a um corpo, dotado de atividade sensitiva e vegetativa, deve existir um princípio de uma e outra.

Segundo Platão, tais funções seriam desempenhadas por outras duas almas - ou partes da alma: a irascível (ímpeto), que residiria no peito, e a concupiscível (apetite), que residiria no abdome - assim como a alma

racional residiria na cabeça. Naturalmente a alma sensitiva e a vegetativa são subordinadas à alma racional. Logo, segundo Platão, a união da alma espiritual com o corpo é extrínseca, até violenta. A alma não encontra no corpo o seu complemento, o seu instrumento adequado. Mas a alma está no corpo como num cárcere, o intelecto é impedido pelo sentido da visão das idéias, que devem ser trabalhosamente relembradas. E diga-se o mesmo da vontade a respeito das tendências. E, apenas mediante uma disciplina ascética do corpo, que o mortifica inteiramente, e mediante a morte libertadora, que desvencilha para sempre a alma do corpo, o homem realiza a sua verdadeira natureza: a contemplação intuitiva do mundo ideal.

O Mundo

O mundo material, o cosmos platônico, resulta da síntese de dois princípios opostos, as idéias e a matéria. O Demiurgo plasma o caos da matéria no modelo das idéias eternas, introduzindo no caos a alma, princípio de movimento e de ordem. O mundo, pois, está entre o ser (idéia) e o não-ser (matéria), e é o devir ordenado, como o adequado conhecimento sensível está entre o saber e o não-saber, e é a opinião verdadeira. Conforme a cosmologia pampsiquista platônica, haveria, antes de tudo, uma alma do mundo e, depois, partes da alma, dependentes e inferiores, a saber, as almas dos astros, dos homens, etc.

O dualismo dos elementos constitutivos do mundo material resulta do ser e do não-ser, da ordem e da desordem, do bem e do mal, que aparecem no mundo. Da idéia - ser, verdade, bondade, beleza - depende tudo quanto há de positivo, de racional no vir-a-ser da experiência. Da matéria - indeterminada, informe, mutável, irracional, passiva, espacial - depende, ao contrário, tudo que há de negativo na experiência. Consoante a astronomia platônica, o mundo, o universo sensível, são esféricos. A terra está no centro, em forma de esfera e, ao redor, os astros, as estrelas e os planetas, cravados em esferas ou anéis rodantes, transparentes, explicando-se deste modo o movimento circular deles. No seu conjunto, o mundo físico percorre uma

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grande evolução, um ciclo de dez mil anos, não no sentido do progresso, mas no da decadência, terminados os quais, chegado o grande ano do mundo, tudo recomeça de novo. É a clássica concepção grega do eterno retorno, conexa ao clássico dualismo grego, que domina também a grande concepção platônica.

4. Aristóteles e a Metafísica

Este grande filósofo grego, filho de Nicômaco, médico de Amintas, rei da Macedônia, nasceu em Estagira, colônia grega da Trácia, no litoral setentrional do mar Egeu, em 384 a.C. Aos dezoito anos, em 367, foi para Atenas e ingressou na academia platônica, onde ficou por vinte anos, até a morte do Mestre. Nesse período estudou também os filósofos pré-platônicos, que lhe foram úteis na construção do seu grande sistema. Em 343 foi convidado pelo Rei Filipe para a corte de Macedônia, como preceptor do Príncipe Alexandre, então jovem de treze anos. Aí ficou três anos, até a famosa expedição asiática, conseguindo um êxito na sua missão educativo-política, que Platão não conseguiu, por certo, em Siracusa. De volta a Atenas, em 335, treze anos depois da morte de Platão, Aristóteles fundava, perto do templo de Apolo Lício, a sua escola. Daí o nome de Liceu dado à sua escola, também chamada peripatética devido ao costume de dar lições, em amena palestra, passeando nos umbrosos caminhos do ginásio de Apolo. Esta escola seria a grande rival e a verdadeira herdeira da velha e gloriosa academia platônica. Morto Alexandre em 323, desfez-se politicamente o seu grande império e despertou-se em Atenas os desejos de independência, estourando uma reação nacional, chefiada por Demóstenes. Aristóteles, malvisto pelos atenienses, foi acusado de ateísmo. Preveniu ele a condenação, retirando-se voluntariamente para Eubéia, Aristóteles faleceu, após enfermidade, no ano seguinte, no verão de 322. Tinha pouco mais de 60 anos de idade. A respeito do caráter de Aristóteles, inteiramente recolhido na elaboração crítica do seu sistema filosófico, sem se deixar distrair por motivos práticos ou sentimentais, temos naturalmente muito menos a revelar do que em torno do caráter de Platão, em que,

ao contrário, os motivos políticos, éticos, estéticos e místicos tiveram grande influência. Do diferente caráter dos dois filósofos, dependem também as vicissitudes exteriores das duas vidas, mais uniforme e linear a de Aristóteles, variada e romanesca a de Platão.

Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) Aristóteles foi essencialmente um homem de cultura, de estudo, de pesquisas, de pensamento, que se foi isolando da vida prática, social e política, para se dedicar à investigação científica. A atividade literária de Aristóteles foi vasta e intensa, como a sua cultura e seu gênio universal. "Assimilou Aristóteles escreve magistralmente Leonel Franca todos os conhecimentos anteriores e acrescentou-lhes o trabalho próprio, fruto de muita observação e de profundas meditações. Escreveu sobre todas as ciências, constituindo algumas desde os primeiros fundamentos, organizando outras em corpo coerente de doutrinas e sobre todas espalhando as luzes de sua admirável inteligência. Não lhe faltou nenhum dos dotes e requisitos que constituem o verdadeiro filósofo: profundidade e firmeza de inteligência, agudeza de penetração, vigor de raciocínio, poder admirável de síntese, faculdade de criação e invenção aliados a uma vasta erudição histórica e universalidade

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de conhecimentos científicos. O grande estagirita explorou o mundo do pensamento em todas as suas direções. Pelo elenco dos principais escritos que dele ainda nos restam, poder-se-á avaliar a sua prodigiosa atividade literária". A primeira edição completa das obras de Aristóteles é a de Andronico de Rodes pela metade do último século a.C. substancialmente autêntica, salvo uns apócrifos e umas interpolações. Aqui classificamos as obras doutrinais de Aristóteles do modo seguinte, tendo presente a edição de Andronico de Rodes. I. Escritos lógicos: cujo conjunto foi denominado Órganon mais tarde, não por Aristóteles. O nome, entretanto, corresponde muito bem à intenção do autor, que considerava a lógica instrumento da ciência. II. Escritos sobre a física: abrangendo a hodierna cosmologia e a antropologia, e pertencentes à filosofia teorética, juntamente com a metafísica.

III. Escritos metafísicos: a Metafísica famosa, em catorze livros. É uma compilação feita depois da morte de Aristóteles mediante seus apontamentos manuscritos, referentes à metafísica geral e à teologia. O nome de metafísica é devido ao lugar que ela ocupa na coleção de Andrônico, que a colocou depois da física. IV. Escritos morais e políticos: a Ética a Nicômaco, em dez livros, provavelmente publicada por Nicômaco, seu filho, ao qual é dedicada; a Ética a Eudemo, inacabada, refazimento da ética de Aristóteles, devido a Eudemo; a Grande Ética, compêndio das duas precedentes, em especial da segunda; a Política, em oito livros, incompleta. V. Escritos retóricos e poéticos: a Retórica, em três livros; a Poética, em dois livros, que, no seu estado atual, é apenas uma parte da obra de Aristóteles. As obras de Aristóteles as doutrinas que nos restam - manifestam um grande rigor científico, sem enfeites míticos ou poéticos, exposição e expressão breve e aguda, clara e ordenada, perfeição maravilhosa da terminologia filosófica, de que foi ele o criador. Partindo como Platão do mesmo problema acerca do valor objetivo dos conceitos, mas abandonando a solução do mestre, Aristóteles constrói um sistema inteiramente original.

Na Grécia Antiga, os primeiros filósofos eram especialistas em curar males da alma. Sócrates, por exemplo, costumava sentar-se nas ruas e praças para conversar com as pessoas - muitas vezes em busca de aconselhamento para seus problemas pessoais. Ele já concentrava interesse na problemática do homem, provocando e estimulando o diálogo. Ouvia atentamente, depois levava o seu interlocutor, por meio de perguntas, a construir um significado para as suas questões e para sua vida; sua filosofia era uma filosofia para a vida. Tragédias também eram encenadas nos teatros ao ar livre gregos com o objetivo de exorcizar temores.

PAUSA PARA REFLEXÃO:

No "mito da caverna" de Platão encontra-se, dentre outros problemas, a questão da natureza e do limite do conhecimento. Em outras palavras, uma provocação epistemológica: O que é a verdade? (essência versus aparência). Como se sabe, o idealismo platônico assevera a existência de um mundo onde se localizam as essências - o mundo das idéias - em contraste com seus meros reflexos: o mundo das aparências, aquele que se mostra a nossa consciência imediata, consciência não reflexiva e que, portanto, não pode atingir a "verdadeira" verdade dos seres, verdade esta apenas captável por meio da razão. O "mito da caverna" é uma alegoria sob a qual se vislumbra uma discussão que diz respeito a um ramo clássico da filosofia: a teoria do conhecimento. É possível comparar o mito da caverna com a atual alienação imposta pela mídia em nossa sociedade moderna. De que formas os meios de comunicação na atualidade geram ilusões nas pessoas?

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LEITURA COMPLEMENTAR

OS LIMITES DA CAPACIDADE HUMANA

Muito há a fazer e construir, tantas coisas e idéias para digerir, tantos lugares para olhar e conhecer e, no entanto, o tempo do qual dispomos nas cidades modernas é tão escasso, tão pouco, que por vezes temos a impressão de mal podermos espiar pela janela da vida.

Os sonhos que temos, em sua grande maioria, não representam mais do que metas distantes e quase inalcançáveis. Os homens caminham ombro a ombro por calçadas estreitas e empoeiradas e não se tocam, mal se conversam ou mal se olham. Não é nada difícil demonstrar ou retratar um quadro enegrecido acerca do modelo social dito moderno. Também a comprovação das estruturas neurotizantes que criamos é de fácil visualização por quem quer que seja; basta que olhemos ao redor por um pouco, com o poder de olhos críticos, para admirarmos em cada esquina as manifestações doentias resultantes da diferença entre aquilo que planejamos para o nosso futuro e aquilo em que realmente nos tornamos. Mas ainda assim é obrigatório que observemos aspectos sobre a totalidade da capacidade do homem, ser criador e transformador, buscando resgatar em cada indivíduo a ânsia pelo conhecimento, que possibilita o surgimento, por extensão, do senso crítico e da formação da autonomia. Para tanto, é urgente que tracemos diretrizes e normas, tanto legais como morais, dignas e sérias, no tocante à capacitação do jovem e ainda, que sejamos capazes de direcioná-los à força de vontade e de estabelecer metas verdadeiras, fios condutores que não fiquem à sombra somente, de ditames ou enfeites do texto legal, tornando-o letra morta. A capacidade de construção do homem é tremenda em qualquer sentido que possamos analisá-la, o que por si só nos deve fazer refletir sobre o porquê de estarmos em situação de tanta miséria, de tanta penúria, de tragédias, guerras e crimes. Um dos fatos que arrasta-nos a isso é, com certeza, a dissolução acontecida no interior das famílias e o que isso representa no nível social. O coletivo é sempre um reflexo da ação e das idéias das individualidades que o compõem. Também por extensão, não é difícil captar o sentido de que cada vez mais estamos sós, lutando individualmente, por nós mesmos, com nossas próprias e cada vez mais escassas "armas" e por nosso próprio bem ou interesse. Por isso é chegado o momento de um novo tempo. É chegado o tempo dos novos homens, repletos em seu íntimo de boa vontade e amor, de fé e sabedoria, na direção de modificar os modelos arruinados. É hora do surgimento daqueles que transformarão a face de tudo quanto conhecemos até os dias de hoje, seja por sua atuação, simplesmente, seja por seus exemplos. O tempo dos homens que lutam uns pelos outros e que sejam parte de um todo, antes de individualidades. Talvez alguns digam ser este um pensamento ingênuo, mas não mais ingênuo do que acharmos que há para os males que presenciamos uma solução política ou jurídica. Não é um pensamento menor do que aceitar passivamente o fato de que nossos modelos de atuação social são incapazes de combater ao menos a miséria. Fomentar a idéia do surgimento dos novos homens, aqueles que atuarão em nome da vida, não é menor, sem dúvida, do que esperar eternamente um auxílio externo, uma esmola, a socorrer o possível ponto de ruptura, auxílio este que, de onde deveria vir, nunca chega, ou ainda, quando chega, quase sempre o é tardiamente. Não é algo admissível que as mentes todas, historicamente, muitas vezes unidas em um só esforço, em uma só direção, tenham criado já tantas maravilhas tecnológicas e obras portentosas, sejam incapazes de garantir um mínimo de paz e prosperidade para a totalidade dos indivíduos. Riqueza há para todos, sem dúvida, assim como espaço para coisas primárias como o cultivo. É preciso estabilizar os processos que degeneram o convívio e a ordem social, bem como é de urgência que nos reeduquemos todos no sentido de alimentar o amor e seus derivados, uns para com os outros. Não há nada e nem ninguém maior do que isso. Não há lei e nem governo, não há nada que conheçamos que possa ao amor ser comparado ou equiparado em grandeza, ou mesmo fazer-lhe sombra. Se assim é, com efeito, por que nos permitimos todos, andar por caminhos tortuosos e chegar muitas vezes ao ponto de sermos, nós mesmos, uma ameaça ao nosso próximo, seja porque fazemos algo, seja porque não fazemos nada? É de urgência a chegada dos novos homens. É imperiosa a cristalização do amor pelo próximo e por nós mesmos.

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MÓDULO TEMÁTICO 3 - FILOSOFIA

FILOSOFIA MEDIEVAL E MODERNA

Pensamento Medieval Com a queda do império romano (século V), a religião surge lentamente como elemento agregador dos inúmeros reinos bárbaros formados após sucessivas invasões; seus chefes são poucos a pouco convertidos ao cristianismo, e a igreja se transforma em soberana absoluta da vida espiritual do mundo ocidental. A cultura greco-romana quase desaparece nos períodos mais turbulentos da implantação do modo feudal de produção, mas permanece latente, guarda danos mosteiros. São os monges os únicos letrados em um mundo onde nem os servos nem os nobres sabem ler. No entanto, não devemos considerar todo o período medieval (século V a XV, portanto mil anos) como sendo de obscuridade. Em vários momentos, há expressões diversas de produção cultural, às vezes, tão heterogênea que se torna difícil reduzir o período aquilo que se poderia chamar pensamento medieval. Uma constante se fez notar no pano de fundo desse pensamento: a tentativa de conciliar a razão e a fé. Apesar do risco de simplificação, dividimos a idade media em duas tendências fundamentais: a filosofia patrística e a escolástica ou tomismo. 1. Filosofia Patrística Aureliano Agostinho (354-430) nasceu em Tagaste, província romana situada na África, e faleceu em Hipona, hoje localizada na Argélia. Nesta cidade ocupou o cargo de bispo da Igreja católica. Até completar 32 anos, Agostinho não era cristão. Teve uma vida voltada aos prazeres do mundo. De uma ligação amorosa ilícita para a época, nasceu-lhe o filho Adeodato. Foi professor de retórica em escolas romanas.

Em sua formação intelectual, Agostinho sentiu-se despertado para a filosofia pela leitura de Cícero. Posteriormente, deixou-se influenciar pelo maniqueísmo, doutrina persa que afirmava ser o universo dominado por dois princípios opostos, o bem e o mal, mantendo uma incessante luta entre si. Mais tarde, já insatisfeito com o maniqueísmo, viajou para Roma e Milão, entrando em contato com o ceticismo e, depois, com o neoplatonismo, movimento filosófico do período greco-romano, desenvolvido por pensadores inspirados em Platão, que se espalhou por diversas cidades do Império Romano. Agostinho defendeu a superioridade da alma humana, isto é, a supremacia do espírito sobre o corpo, a matéria. A alma teria sido criada por Deus para reinar sobre o corpo, para dirigi-lo a pratica do bem.

A Filosofia Patrística (Filosofia dos Padres) procurou conciliar as verdades da revelação bíblica com as construções do pensamento próprias da filosofia grega. A maior parte de suas obras foi escrita em grego e latim, embora haja também muitos escritos doutrinários em aramaico e outras línguas orientais.

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Segundo o filósofo, o homem que trilha a via do pecado só consegue retornar aos caminhos de Deus e da salvação mediante a combinação de seu esforço pessoal de vontade e a concessão, imprescindível, da graça divina. Baseando-se no profeta bíblico Isaías, dizia ser necessário crer para compreender, pois a fé ilumina os caminhos da razão, e que a compreensão nos confirma a crença posteriormente. Isso significa que, para Agostinho, a fé revela verdades ao homem de forma direta e intuitiva. Vem depois a razão esclarecendo aquilo que a fé antecipou. 2. Filosofia Escolástica Tomás de Aquino (1226-1274) nasceu em Nápoles, sul da Itália, e faleceu no convento Fossanueva, próximo de sua cidade natal, aos 49 anos de idade. É considerado o maior filósofo da escolástica medieval. Inserida no movimento escolástico, a filosofia de Tomás de Aquino (o tomismo) já nasceu com objetivos claros: não contrariar a fé. De fato, a finalidade de sua filosofia era organizar um conjunto de argumentos para demonstrar e defender as revelações do cristianismo. Assim, Tomás de Aquino reviveu em grande parte o pensamento aristotélico com a finalidade de nele buscar os elementos racionais que explicassem os principais aspectos da fé cristã. Enfim, fez da filosofia de Aristóteles um instrumento a serviço da religião católica. Outro aspecto muito importante da filosofia tomista são as provas da existência de Deus. Em um de seus mais famosos livros, a Suma teológica, Aquino propõe cinco provas da existência de Deus: 1. O movimento; 2. Causa e efeito; 3. Necessidade e possibilidade 4. Os graus de perfeição; 5. A ordem das coisas. Pensamento Moderno A procura da maneira de evitar o erro faz surgir a principal característica do pensamento moderno: a questão do método.

Até então a filosofia tinha uma atitude realista, no sentido de não colocar em questão a existência do objeto, a realidade do mundo. A idade moderna inverte o pólo de atenção, centralizando no sujeito a questão do conhecimento. Se o conhecimento que o sujeito tem do objeto concorda com o objeto, dá-se o conhecimento. Mas qual é o critério para se ter certeza de que o pensamento concorda com o objeto?

3. Racionalismo e Empirismo Racionalismo A partir de Descartes (1596-1650), a preocupação dominante do filósofo não mais diz respeito ao ser, à realidade em si, às causas últimas das coisas, Deus, mas diz respeito ao homem, à sua capacidade de conhecer o mundo e de transformá-lo.

Maiores expoentes: Descartes, Spinoza e Leibnitz.

DESCARTES René Descartes (1596-1650) nasceu em La Haye, França, pertencendo a uma família de prósperos burgueses.

Estudou no colégio jesuíta de La Flèche, na época uma dos mais conceituados estabelecimentos de ensino da Europa. Excetuando a aprendizagem que fez da matemática, decepcionou-se com a educação jesuítica de La Flèche. Confessaria, tempos depois, sua decisão de buscar a ciência por conta própria, esforçando-se por decifrar o “grande livro do mundo”.

Descartes afirmava que, para conhecermos a verdade, é preciso, de início, colocarmos todos os nossos conhecimentos em dúvida, questionarmos tudo para criteriosamente analisarmos se existe algo na realidade de que possamos ter plena certeza. Fazendo uma aplicação metódica da dúvida, o filósofo foi considerando como incertas todas as percepções sensoriais, todas as noções adquiridas sobre os objetos materiais. E prosseguiu assim, cada vez mais colocando em dúvida a existência de tudo aquilo que constitui a realidade e o próprio conteúdo dos pensamentos.

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Finalmente, estabeleceu que a única verdade totalmente livre de dúvidas era a seguinte: meus pensamentos existem. E a existência desses pensamentos se confunde com a essência da minha própria existência como ser pensante.

Disso decorre a célebre conclusão de Descartes: Penso, logo existo.

Empirismo Enquanto filósofos como Descartes e Spinoza encaravam o conhecer humano a partir do modelo das ciências exatas (matemática e geometria), os filósofos ingleses valorizavam a experiência sensível como o verdadeiro caminho para as leis universais.

Segundo o empirismo, o conhecimento procede da experiência.

Maiores expoentes: Bacon, Hobbes e Locke. BACON Nascido em Londres, Francis Bacon (1561-1626) pertencia a uma família de nobres. Desde menino, foi educado para ingressar na carreira política e projetar-se nos cargos públicos. Depois de concluir seus estudos em Cambridge, iniciou, em 1577, sua carreira política, através da qual conquistaria os mais importantes postos do reino britânico.

Apesar de ter mantido discutível conduta moral, Francis bacon realizou uma obra científica de inegável valor. É considerado um dos fundadores do método indutivo de investigação científica. Atribui-se a ele, também, a criação do lema “saber é poder”, que revela sua firme disposição de ânimo de fazer dos conhecimentos científicos um instrumento prático de controle da realidade.

Preocupado com a utilização dos conhecimentos científicos na vida prática, Bacon manifestava grande entusiasmo pelas conquistas técnicas que se difundiam em seu tempo: a bússola, a pólvora, a imprensa. Também revelava sua aversão ao pensamento meramente abstrato, característico da escolástica medieval.

Segundo Bacon, a ciência deveria valorizar a pesquisa experimental, tendo em vista proporcionar resultados objetivos para o homem. Mas, para isso, era necessário que o cientista se libertasse daquilo que Bacon

denominava “ídolos”, isto é, falsas noções, os preconceitos, os maus hábitos mentais. 4. Filosofia das Luzes Corrente de pensamento dominante no século XVIII, que defende o predomínio da razão sobre a fé e estabelece o progresso como destino da humanidade. Seus principais idealizadores são John Locke (1632-1704), Montesquieu (1689-1755), Voltaire e Rousseau. Representa a visão de mundo da burguesia intelectual da época e tem suas primeiras manifestações na Inglaterra e na Holanda. Alcança especial repercussão na França, onde se opõe às injustiças sociais, à intolerância religiosa e aos privilégios do absolutismo em decadência. Influencia a Revolução Francesa, fornecendo-lhe, inclusive, o lema Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

O iluminismo tem origem no Renascimento, o primeiro grande momento de construção de uma cultura burguesa, na qual a razão e a ciência são as bases para o entendimento do mundo. Para o iluminismo, Deus está na natureza e no homem, que pode descobri-lo por meio da razão, dispensando a Igreja. Afirma que as leis naturais regulam as relações sociais e considera os homens naturalmente bons e iguais entre si - quem os corrompe é a sociedade. Cabe, portanto, transformá-la e garantir a todos liberdade de expressão e culto, igualdade perante a lei e defesa contra o arbítrio.

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Quanto à forma de governo para a realização da sociedade justa, uns defendem a Monarquia constitucional, outros a República. Em Ensaio sobre o Entendimento Humano (1689), o inglês John Locke trata a experiência como fonte do conhecimento, que é organizado depois pela razão. Locke defende também o individualismo liberal contra o absolutismo monárquico. O escritor francês Montesquieu propõe na obra Do Espírito das Leis (1751) a independência dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário como garantia da liberdade. Voltaire critica a Igreja e defende a Monarquia comandada por um soberano esclarecido. O suíço Jean-Jacques Rousseau torna-se o iluminista mais radical, precursor do socialismo e do romantismo. No livro O Contrato Social (1762) posiciona-se a favor do Estado democrático, voltado para o bem comum e a vontade geral, que inspira os ideais da Revolução Francesa. É dele a noção do "bom selvagem", que representa o homem nascido bom e sem vícios, mas depois pervertido pelo meio social.

Começando com a desigualdade como um fato irreversível, Rousseau tenta responder a questão do que compele um homem a obedecer a outro homem ou por que direito um homem exerce autoridade sobre outro. Ele concluiu que somente um contrato tácito e livremente aceito por todos permite cada um "ligar-se a todos enquanto retendo sua vontade livre". A liberdade está inerente na lei livremente aceita. "Seguir o impulso de alguém é escravidão, mas obedecer uma lei auto-imposta é liberdade".

Há uma diferença entre o pensamento de Rousseau e o de Locke, que também afirmou a liberdade do homem como base de sua teoria política. Locke admite a perda da liberdade quando afirma que "o homem, por ser livre por natureza não pode ser privado dessa condição e submetido ao poder de outro sem o próprio consentimento", enquanto para Rousseau o homem não pode renunciar à sua liberdade. Esta é uma exigência ética fundamental. Rousseau considera a liberdade um direito e um dever ao mesmo tempo. "Todos nascem homens e livres. A liberdade lhes pertence e renunciar a ela é renunciar à própria qualidade de homem. O princípio da liberdade é direito inalienável e exigência essencial da própria natureza espiritual do homem".

O contrato social para Rousseau é "Uma livre associação de seres humanos inteligentes, que deliberadamente resolvem formar um certo tipo de sociedade, à qual passam a prestar obediência mediante o respeito à vontade geral. O "Contrato social", ao considerar que todos os homens nascem livres e iguais, encara o Estado como objeto de um contrato no qual os indivíduos não renunciam a seus direitos naturais, mas ao contrário entram em acordo para a proteção desses direitos, que o Estado é criado para preservar.

O Estado é a unidade e como tal expressa a "vontade geral", porém esta vontade é posta em contraste e se distingue da "vontade de todos", a qual é meramente o agregado de vontades, o desejo acidentalmente mútuo da maioria. John Locke e outros tinham assumido que o que a maioria quer deve ser correto. Rousseau questionou essa postura, argumentando que os indivíduos que fizeram a maioria podem, na verdade, desejar alguma coisa que está contrária aos objetivos e necessidades do estado, para com o bem comum. A vontade geral é para assegurar a liberdade, a igualdade, e justiça dentro do estado, não importa a vontade da maioria, e no contrato social (para Rousseau uma construção teórica mais que um evento histórico como os pensadores do Iluminismo tinham freqüentemente assumido) a soberania individual é cedida para o estado em ordem que esses objetivos possam ser atingidos.

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LEITURA COMPLEMENTAR

VALORES NO MUNDO CONTEMPORÂNEO Vivemos numa época que aceita como um dado adquirido que os valores estão em crise. Em todas as épocas sempre surgiram vozes manifestando idênticas impressões. A nossa, neste ponto, parece ter assumido que se terá atingido uma crise generalizada. Neste sentido, com certa insistência são feitas duas afirmações similares: a) Não existem atualmente critérios seguros para distinguir o justo do injusto, o bem do mal, o belo do feio; Tudo é relativo, subjetivo. b) Não existem valores. Tudo depende das circunstâncias e dos interesses em jogo. Destas posições facilmente se conclui que os valores que tradicionalmente eram dados como imutáveis, ou foram postos em causa ou abandonados. O que hoje predomina, segundo muitos autores são apenas posições relativistas ou niilistas. Para explicar esta crise de valores que atravessa todos os domínios da sociedade são apontadas entre outras, as seguintes razões: A crítica sistemática que muitos filósofos, como Karl Marx, Nietzsche e Freud fizeram aos valores tradicionais. Karl Marx argumentou que os valores (enquanto produtos ideológicos) não podem ser desinseridos da história e dos contextos sociais. Os valores dominantes numa dada sociedade são sempre aqueles que melhor servem a classe dominante na sua exploração das classes trabalhadoras. Defendeu por isso a necessidade da destruição de todos os tipos de moral dominante (burguesa), substituíndo-a por uma moral dos oprimidos (proletários). Nietzsche afirmou por seu turno que não existiam valores absolutos. Os valores são sempre produto de interesses egoístas dos indivíduos. Os valores estão ligados às condições de existência de certos grupos, justificam as suas hierarquias e mecanismos de domínio, e mudam sempre que as condições de existência se alteram. Considera, por exemplo, que a moral ocidental está assente em valores de escravos, preconizando por isso o aparecimento de um homem novo, completamente livre, e capaz de expressar a sua vitalidade sem limites, para além de valores de arcaicos como o bem e o mal. Freud mostrará que os valores morais fazem parte de um mecanismo mental repressivo formado pela interiorização de regras impostas pelos pais, e que traduzem normas e valores que fazem parte da consciência coletiva. A crise nos modelos e nas relações familiares. A família é onde, em princípio, qualquer ser humano adquire os seus primeiros valores. Ora as estruturas familiares estão em crise, o que se reflete, por exemplo, no aumento da dissolução de casamentos, no aparecimento de novos tipos de uniões. Por tudo isto, muitos pais manifestam cada vez mais dificuldade em elegerem um conjunto de valores que considerem fundamentais na educação dos seus filhos. As profundas alterações econômicas, cientificas e tecnológicas que a nossa sociedade moderna tem conhecido. Estas não apenas estimularam o abandono dos valores tradicionais, mas parecem ter conduzido a humanidade para um vazio de valores. Cinco Exemplos 1. A promessa que surgiu no século XIX de que a humanidade caminhava para um era de progresso moral e civilizacional generalizado, foi completamente posta de parte no século XX, com duas guerras mundiais, dezenas de milhões de mortos e um holocausto meticulosamente planeado. O que a humanidade encontrou foi um progresso limitado, no meio da barbárie. 2. A idéia da ciência como empenhada na verdade e aperfeiçoamento da humanidade, ficou igualmente comprometida no século XIX com o envolvimento de inúmeros cientistas na investigação da armas mortíferas, em cruéis experiências com seres humanos, etc. O lado negro da ciência tem vindo a evidenciar-se em todos os domínios (manipulação genética, construção de armas de destruição maciça, etc.). 3. O desenvolvimento econômico dos países tem sido feito à custa da poluição do ar, contaminação da águas, destruição das florestas, acumulação de lixos, etc. As previsões sobre as conseqüências futuras destas ações são aterradoras: o planeta terra está numa rápida agonia.

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4. A sociedade da abundância está longe de ser uma realidade em todo o planeta. Dois terços da humanidade vivem abaixo do limiar da miséria. Em alguns continentes, como a África, assistimos à destruição de populações inteiras pela fome,guerras, catástrofes naturais, ecológicas, epidemias, etc. Os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres parecem estar condenados à eterna miséria. 5. A globalização trouxe consigo uma maior aproximação entre os povos em termos de informação, fato que aparentemente possibilitaria o desenvolvimento de uma consciência global, desperta para a questão das desigualdades dos recursos e das condições de vida entre os seres humanos. A circulação dos mesmos produtos à escala planetária está a provocar uma rápida uniformização de hábitos, costumes e culturas entre todos os povos. Ora os modelos culturais e comportamentais que estão a ser veiculados pelas grandes potencias mundiais, em particular os EUA, não passam de produtos culturais acríticos, onde se apela apenas ao consumismo e relativismo de valores. Tratam-se de produtos culturais destinados a serem consumidos por populações pouco educadas ou exigentes em termos intelectuais. Este panorama profundamente negro sobre a sociedade que vivemos está longe de ser consensual. Muitos autores afirmam que não existe qualquer "crise", o que se passa é que a sociedade se tornou menos "rígida" e "monolítica", sendo agora mais "aberta" e sensível às diferenças individuais, o que muitas vezes, poderá assumir formas próximas do indiferentismo. Em todo o caso, uma coisa é certa: os valores relativistas (particulares, subjetivos) que sustentam este mundo estão a revelar-se demasiado funestos para a Humanidade no seu conjunto. É por esta razão que se aponta para a necessidade de se estabelecer novos consensos em torno de valores que nos serviam de guia para o nosso relacionamento inter-pessoal e coletivo. Em causa está o nosso futuro comum.

LIBERDADE NA FILOSOFIA

Liberdade, em filosofia, designa de uma maneira negativa, a ausência de submissão, de servidão e de determinação, isto é, ela qualifica a independência do ser humano. De maneira positiva, liberdade é a autonomia e a espontaneidade de um sujeito racional. Isto é, ela qualifica e constitui a condição dos comportamentos humanos voluntários. Não se trata de um conceito abstrato. É necessário observar que filósofos como Sartre e Schopenhauer buscam, em seus escritos, atribuir esta qualidade ao ser humano livre. Não se trata de uma separação entre a liberdade e o homem, mas sim de uma sinergia entre ambos para a auto-afirmação do Ego e sua existência. E na equação entre Liberdade e Vontade, observa-se que o querer ser livre torna-se a força-motriz e, paradoxicamente, o instrumento para a liberação do homem.

PAUSA PARA REFLEXÃO:

Ao defender que todos os homens nascem livres, e a liberdade faz parte da natureza do homem, Rousseau inspirou todos os movimentos que buscaram uma busca pela liberdade. Incluem-se aí as Revoluções Liberais, o Marxismo e o Anarquismo. Sua influência se faz sentir em nomes da literatura como Tolstói e Thoreau. Influencia também movimentos de Ecologia Profunda, já que era adepto da proximidade com a natureza e afirmava que os problemas do homem decorriam dos males que a sociedade havia criado e não existiam no estado selvagem. Para a escritora Cecília Meireles, "Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda." Você considera que nós somos verdadeiramente livres? Ou a liberdade não passa de um sonho?

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MÓDULO TEMÁTICO 4 - FILOSOFIA

FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA

1. Principais Correntes Filosóficas

Positivismo

Corrente de pensamento fundada na França por Augusto Comte (1798-1857). O termo identifica a Filosofia baseada nos dados da experiência como a única verdadeira. O positivismo busca seus fundamentos na ciência e na organização técnica e industrial da sociedade moderna. O método científico é o único válido para se chegar ao conhecimento. Reflexões ou juízos que não podem ser comprovados pelo método científico, como os postulados da metafísica, não levam ao conhecimento e não têm valor.

Entre suas formulações principais, está a que considera que as sociedades humanas passam por três estágios, ao longo de sua evolução. O primeiro é o mitológico, típico das comunidades primitivas. O segundo é o teológico, existente naquelas sociedades que se estruturam em torno de grandes religiões, como a cristandade medieval. O último estágio é o moderno, no qual as organizações sociais ancoram-se sobre bases racionais e científicas, ou positivas, como as sociedades industriais contemporâneas.

Marxismo

Doutrina filosófica, econômica, política e social formulada pelos filósofos alemães Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895), entre 1848 e 1867.

O pensamento marxista tem como fontes principais o idealismo alemão, cujo apogeu é marcado por Friedrich Hegel (1770-1831); o materialismo filosófico francês do século XVIII; e a economia política inglesa do começo do século XIX. Para o marxismo, a característica central de qualquer sociedade está no modo de produção (escravista, feudal ou capitalista), que varia de acordo com a História e determina as relações sociais.

Através do processo produtivo, os homens produzem as próprias condições de sua existência.

A História seria, então, o resultado das lutas contínuas entre os interesses das diferentes classes sociais. Esse conflito só desapareceria com a instalação da sociedade comunista, concebida como igualitária e justa. Nela, o Estado é abolido, não há divisão social nem exploração do trabalho humano e cada indivíduo recebe recompensas de acordo com sua capacidade e necessidade.

Segundo o marxismo, o capitalismo é um sistema no qual a burguesia concentra o capital e os meios de produção (instalações, máquinas e matérias-primas), e explora o trabalho do proletariado, mantendo-o numa situação de pobreza e alienação. Por estar baseado nessa característica contraditória, a de explorar o seu próprio alicerce - a classe trabalhadora -, o sistema prepara o caminho para a sua própria destruição.

O capitalismo levaria a luta de classes a um ponto crítico, em que o proletariado, privado de sua liberdade por meio da contínua exploração, acabaria por se unir.

A derrota da burguesia coincidiria, assim, com a instalação do comunismo.

Manifestantes foram presos na Alemanha, durante a reunião do G-8

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Existencialismo

Termo usado para designar a filosofia de pensadores que se preocupam com a existência finita do homem no mundo, descartando questões metafísicas (ver Metafísica) como a imortalidade e a transcendência. Como é aplicado a filósofos muito diferentes, há quem negue sua existência como escola de pensamento. Os nomes mais identificados com o existencialismo são os dos franceses Jean-Paul Sartre (1905-1980) e Maurice Merleau-Ponty (1908-1961). É um movimento do século XX, mas tem fortes raízes na obra de filósofos de origem alemã do século XIX, como Sören Kierkegaard (1813-1855) e Friedrich Nietzsche (1844-1900). Os existencialistas rejeitam o princípio do cartesianismo de que o homem existe porque pensa. Para eles, o ser humano pensa porque existe. A consciência, para os existencialistas, não antecede a experiência. Ela é parte da existência que, por sua vez, é construída com a vivência, o contato com outras pessoas e objetos. O próprio homem cria essa existência em função de seus sentimentos, desejos e, principalmente, de suas ações. Ele se forma a partir de suas escolhas. Por isso, os existencialistas prezam a liberdade e a responsabilidade e rejeitam o conformismo. Para Sartre e outros autores, essa posição estende-se à política. Depois da 2ª Guerra Mundial (1939-1945), o movimento influencia a Literatura.

2. Totalitarismo

é um regime político baseado na extensão do poder do Estado a todos os níveis e aspectos da sociedade ("Estado Total", "Estado Máximo"). Pode ser resultado da incorporação do Estado por um Partido (único e centralizador) ou da extensão natural das instituições estatais. Geralmente, é um fenómeno que resulta de extremismos ideológicos. Há totalitarismos de direita (Nazismo) e de esquerda (Estalinismo), embora essa catalogação seja redutora. As semelhanças que estes extremos reúnem entre si são justamente os aspectos definidores do regime totalitário. As diferenças que guardam, no entanto, são muitas, e

dizem respeito aos seus fins; o totalitarismo de esquerda (Stalinismo, Maoísmo e variações) representa o controle do poder político por um representante imposto dos trabalhadores, mas pressupõe uma revolução de fato no regime de propriedades, coletivizando os bens de produção e as terras, enquanto o de direita (Fascismo, Nazismo e variações) é essencialmente um artifício do grande capital para assegurar seus interesses de forma violenta. As semelhanças entre os regimes de Stalin ou Mao com os de Hitler ou Mussolini limitam-se aos métodos - por isso não se pode de forma alguma confundir os dois modelos: respectivamente, um coletiviza a propriedade, o outro a mantém para a classe burguesa. Os regimes totalitários são violentamente opressores. O totalitarismo é um regime inserido na 'sociedade de massas', não existindo enquanto tal antes do século XX. São paradigmas na história os regimes totalitários de Adolf Hitler e Joseph Stalin, respectivamente na Alemanha e na União Soviética. O politólogo especialista no Islão Bassam Tibi propôs nos seus livros mais recentes a tese de que o Fundamentalismo islâmico (em alemão "Islamismus") é também um totalitarismo. O Totalitarismo foi objeto de sátira na obra de George Orwell. Foi ainda no decorrer da Primeira Guerra Mundial que começou a nascer o Totalitarismo, fenômeno político que marcou o século XX. Com a necessidade de direcionar a produção industrial para as demandas geradas pela guerra, os governos das frágeis democracias liberais européias tiveram de se fortalecer, acumulando poderes e funções de Estado, em detrimento do poder parlamentar, para agilizar as decisões importantes em tempos de guerra. Quando voltasse a paz, dizia-se, esses poderes seriam retornados à distribuição democrática usual. Mas não foi isso que aconteceu. O Estado com executivo forte e legislativo debilitado que se constituiu durante a Primeira Guerra acabou sendo a semente do modelo de Estado autoritário que surgiria na década seguinte. Das várias monarquias parlamentares européias em 1914 (Reino Unido, Itália, Espanha, Portugal, Holanda, Bélgica, Dinamarca, Suécia, Noruega, Sérvia, Bulgária, Romênia, Grécia, Áustria-Hungria e outras), só a britânica terminou o século sem ter passado por uma ditadura de inspiração fascista.

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3. Fundamentalismo

Fundamentalismo é um movimento que mantém estrita aderência aos princípios fundamentais. No estudo comparativo das religiões, fundamentalismo pode se referir a movimentos anti-modernistas em várias religiões. Em muitos casos, o fundamentalismo religioso é um fenômeno moderno, caracterizado pelo senso de esvaziamento do meio cultural, até mesmo onde a cultura pode nominalmente ser influenciada pela religião dos partidários. O termo pode também se referir especificamente à crença ou convicção de que algum texto ou preceito religioso seja infalível ehistoricamente preciso ainda que contrários ao entendimento de estudiosos modernos.

Peter Huff escreveu no International Journal on World Peace:

"De acordo com Antoun, os fundamentalistas no Judaismo, Cristianismo, e Islamismo, a despeito de suas diferenças de doutrina e prática religiosas, estão unidos por uma visão comum do mundo que ancora toda a vida na autoridade do sagrado e num ‘’ethos’’ compartilhado que se expressa através da afronta ao compasso e extensão da secularização”.

Entretanto, grupos que se auto-intitulam fundamentalistas ou que se descrevem nestas condições, freqüentemente rejeitam o termo por causa das suas conotações negativas ou porque insinua semelhança entre eles e outros grupos cujos procedimentos acham censuráveis .

Isto ocorreu entre os fundamentalistas cristãos que foram os criadores do termo e o assumiram com exclusividade até sua redefinição popular pela mídia na década de 1980 quando reportagens jornalísticas começaram a descrever o Hezbollah e outras facções islâmicas como fundamentalistas, durante os conflitos do Líbano. A partir daí a conotação negativa ficou prevalecendo.

Fundamentalistas Cristãos que geralmente consideram o termo positivo quando referente a eles próprios, freqüente e fortemente

objetam em se colocar numa mesma e única categoria com os fundamentalistas islâmicos e os agrupam em outra categoria. E até mesmo os que aceitam o termo de fundamentalistas islâmicos objetam quando são amplamente rotulados junto com facções que usam seqüestro, assassinato, e atos terroristas para alcançar os seus fins.

Entretanto não há nenhuma objeção para o uso do termo fundamentalista quando usado descrever só grupos Cristãos, e também nenhuma objeções para o uso do termo fundamentalista muçulmano.

Muitos muçulmanos também protestam contra o uso do termo ao se referir grupos Islâmicos, porque o termo ‘’islâmico’’ abrangeria todos os religiosos inerentes ao Corão, e os escritores ocidentais tem usado o termo só para se referir a grupos extremistas.

Além disso, a maioria dos grupos muçulmanos que também foram fortemente rotulados de fundamentalistas objeta ser colocada na mesma categoria com fundamentalistas Cristãos o que eles vêem como religiosamente incorreto, pois não vem distinção teológica entre cristãos fundamentalista e não fundamentalistas.

Distintos grupos de fundamentalistas cristãos ou islâmicos não usam o termo fundamentalista para referirem-se a eles próprios ou reciprocamente.

Embora o termo fundamentalismo popularmente empregado refira-se pejorativamente a qualquer grupo de religioso de infringente de uma maioria, ou refira-se a movimentos étnicos extremistas com motivações (ou inspirações) só nominalmente religiosas, o termo tem um conotação bem precisa . Fundamentalismo é um movimento que objetiva voltar ao que é considerado princípios fundamental (ou vigente na fundação) da religião. Especificamente, refere-se a qualquer enclave religioso que intencionalmente resista a identificação com o grupo religioso maior do qual diverge quanto aos princípios fundamentais dos quais imputa ao grupo religioso maior ter-se desviado ou corrompido pela adoção de princípios alternativos hostis ou contraditórios à identidade original.

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A formação de uma identidade separada é julgada necessária por causa de uma percepção de que a comunidade religiosa perdeu a habilidade de se definir em termos religiosos, julgam que os "fundamentos" da religião foram perdidos por negligência ou desatenção configurando ato de separatismo ou divergência em termos estranhos impróprios e hostis à própria religião.

A comunidade religiosa entretanto vê aos fundamentalistas como dissidentes e a controvérsia por vezes tem sido a razão suficiente para a formação de novas seitas e religiões, mas, freqüentemente são fundados grupos fundamentalistas com o objetivo de manter e guardar fiel e rigidamente os princípios religiosos ditos desnaturados e forçar uma aproximação interna com o mundo moderno atendendo aos referidos princípios fundamentais. Não raro isto se passa individualmente com religiosos mais zelosos e conscientes, que, independentemente da formação de grupos ativos continua a proceder e atender aos princípios fundamentais de modo conservar a doutrina em adotando-a como prática de vida.

Este fenômeno ocorreu e legou o uso do termo dos Fundamentalistas Cristãos que surgiram no início do século XX com o protestantismo dos Estados Unidos, com a publicação do livro Os Fundamentos, livro que foi patrocinado por empresários e escritos por eruditos evangélicos conhecidos da época (recentemente uma tradução des livro foi publicada no Brasil pela Editora Hagnos).

O padrão do conflito entre os Fundamentalistas Cristãos e os Cristãos modernos no cristianismo protestante tem notável aplicação comparativa às outras comunidades religiosas, e em seu uso como uma descrição destes aspectos correspondentes em caso contrário movimentos religiosos diversos o termo "fundamentalista" se tornou mais que só um termo qualquer um de ego-descrição ou de desprezo pejorativo.

Fundamentalismo é então um movimento pelo qual os partidários tentam salvar identidade religiosa da absorção pela cultura ocidental moderna, na qual a absorção tem proporção de um processo irreversível na comunidade

religiosa mais ampla, necessitando da afirmação de uma identidade separada baseada nos princípios fundamentais da religião.

Os fundamentalistas acreditam que a sua causa é de grave e cósmica importância. Eles vêem a si mesmo como protetores de uma única e distinta doutrina, modo de vida e de salvação.

A comunidade, compreensivelmente centrará-se num modo de vida preponderantemente religioso em todos os seus aspectos, é o compromisso dos movimentos fundamentalistas, e atrai então não apenas os que compreendem a distinção mas também outros insatisfeitos e os que julgam que a dissidência é distintiva, sendo vital à formação de suas identidades religiosas.

O muro de virtudes fundamentalista que protege a identidade do grupo é instituído não só em oposição a religiões estranhas, mas também contra os modernizadores com os quais compactuam, continuar numa versão nominal da sua própria religião.

No cristianismo, o fundamentalismo foi uma reação contra o modernismo que estava começando a se espalhar nas igrejas dos Estados Unidos e uma afirmação na inspiração divina e inerrância da Bíblia e ressureição e retorno de Jesus Cristo, doutrinas consideradas fundamentais do Evangelho (daí o nome fundamentalista) que os teólogos modernistas já não criam que eram verdadeiras.

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No islamismo eles são jama'at que em linguagem árabe significam enclaves (religiosos) com conotações de irmandade fechada) ego-conscientemente flertam com o jihad na luta contra a cultura ocidental que suprime o Islam autêntico que implica em submissão ao modo de vida prescrito na (determinação divina) contida na Charia. No judaísmo eles são os judeus Haredi que se julgam os "verdadeiros judeus da Torah" que se alimentam, se vestem e enfim vivem estritamente no modo religioso. Existem equivalentes no hinduísmo e outras religiões mundiais. Estes grupos que insistem na existência de um agudo limite entre eles e os partidários fiéis de outras religiões, e finalmente entre uma "visão sagrada" da vida e do "mundo secular" e da sua "religião nominal". Com suas críticas, os fundamentalista objetivam atrair e converter os religiosos da comunidade maior, tentando convencê-los de que eles não estão experimentando a versão autêntica da religião professada. 4. Filosofia Moral Ética e Cidadania Cidadão é o individuo na plenitude de seus direitos e deveres, que vive em uma sociedade democrática. Participa ativamente da comunidade em que vive, é solidário, consciente, ético e responsável.

O cidadão, consciente de seus atos e deveres, saberá respeitar opinião de outros indivíduos, ainda que discorde dela. Deverá rejeitar qualquer forma de preconceito ou discriminação. A liberdade que todos têm em uma sociedade não implica em invadir a intimidade de outras pessoas. A liberdade de cada um termina aonde começa a liberdade do outro. Além disso, a opinião da maioria deve ser respeitada e acatada, ainda que contrarie interesses individuais.

Ser cidadão também significa respeitar e cuidar do ambiente em que vivemos. No mundo moderno, a poluição do ar, da água, a devastação das florestas, a extinção de espécies animais e vegetais são problemas cada vez mais sérios. É importante que as

pessoas tenham consciência de preservar o nosso planeta.

Os problemas sociais tem sido - há um bom tempo - objeto de analise da maior parte dos pensadores brasileiros da atualidade, como Miguel Reale, Tobias Barreto, Frei Betto, Helio Jaguaribe, Roberto Damatta, Antonio Paim, Caio Prado Junior. Temas como a corrupção, a crescimento desordenado das cidades, a falta de políticas sociais, a ineficácia da saúde publica; mostram que, as preocupações dos pensadores brasileiros em muito se assemelham às dos filósofos gregos do período clássico. Ética e Ciência

A civilização moderna, com seu caráter técnico-científico, confrontou todos os povos raças e culturas, sem consideração de suas tradições morais grupalmente específicas e culturalmente relativas, com uma problemática ética comum a todos. Pela primeira vez na história da espécie humana, os homens foram praticamente colocados ante a tarefa de assumir a responsabilidade solidária pelos efeitos de suas ações em medida planetária, como aconteceu no caso da Guerra Fria.

O uso da ciência torna-se algo delicado quando escapa das mãos dos pesquisadores. É assim, por exemplo, que a física quântica desemboca na fabricação de armas nucleares; a bioquímica na de armas bacteriológicas. Teorias sobre a luz e o som permitem a construção de satélites artificiais - que além de comunicação e informação, servem para espionagem militar e guerras com armas teleguiadas.

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Ética e Saúde (Bioética) A Bioética é a ética das ciências da vida e do cuidado com a saúde. Isto significa que sua preocupação vai além de temas éticos da medicina para analisar assuntos da saúde pública (infecção hospitalar, por exemplo), preocupações com a população (desnutrição, por exemplo), genética (clonagem de órgãos, meio ambiente sanitário, etc.).

Muitos foram os filósofos, biólogos e médicos que tentaram definir o que é a vida. Alguns, em termos metafísicos; outros, encaminharam a questão em termos puramente físicos e químicos. Resta, contudo, uma insatisfação, um vazio, embora saibamos, a grosso modo, distinguir com facilidade um ser vivo de um inanimado. Nas minúcias, porém, aparecem as indefinições com repercussões éticas. Não podemos nos esquecer, por exemplo, que nossa vida depende fundamentalmente da morte. O homem se alimenta de seres que morrem para lhe proporcionar os nutrientes essenciais. A chamada “luta pela vida” deve ser conduzida com cuidados para não desembocar em comportamentos mais emocionais do que racionais. Certamente, não é esse o caminho que leva à verdade, e o mais importante determinante da conduta humana. A ética. Ética e Ecologia A ecologia busca um equilíbrio entre o ser humano e o ambiente em que vive. O que nem sempre é fácil, para os menos favorecidos. Só determinadas parcelas da

população alcançarão, na prática, os direitos de cidadania em sua plenitude, como os de receber os serviços públicos de água encanada e tratada, rede de esgoto, luz elétrica, etc.

No Brasil, a degradação do ambiente e da sociedade, das pessoas e da natureza, constitui os dois lados de uma mesma moeda, de um mesmo estilo de desenvolvimento e da ausência de democracia. Uma sociedade organizada para beneficiar tão poucos, e com tal nível de exclusão, não tem olhos para ver seus próprios habitantes, e seria quase insano esperar que aqueles que não sabem respeitar os direitos de uma criança possam demonstrar interesse pala preservação da fauna e da flora. No Brasil, a defesa do meio ambiente tem de começar pela defesa da própria humanidade, tomando como caminho o da democracia (como acreditavam os filósofos clássicos). O autoritarismo, aqui e em várias partes do mundo, já demonstrou que seu projeto de desenvolvimento não contempla a maioria das pessoas nem o respeito à natureza. Seu fracasso constitui a nossa questão ecológica. Resta o outro caminho, aquele que constrói pontes de solidariedade, igualdade e participação, com respeito à diversidade e à liberdade sob um novo olhar, por que não, uma nova emoção. Afinal, não deve estar tão longe assim o tempo em que olhávamos para o céu em busca de estrelas e de um sentido mais amplo e profundo para nossas vidas.

PAUSA PARA REFLEXÃO: Qual a coisa mais contraditória em nossa sociedade?

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LEITURA COMPLEMENTAR

O CAPITALISMO EDUCA PARA O PARASITISMO SOCIAL A suposição de uma natureza parasitária do ser humano continua atual. Afirmações como a de que a exploração sempre tenha existido, ou de que ela seja uma mera manifestação da natureza humana, continuam sendo usadas para legitimar a expansão da barbárie capitalista. Na Alemanha, a crença numa suposta natureza capitalista da humanidade é expressa tanto pelo senso comum como por alguns intelectuais quando se debate a possibilidade de uma sociedade não-capitalista, sendo apresentada normalmente como explicação para o desmoronamento da experiência soviética nos países do Leste Europeu. Como se pode fundamentar essa argumentação e qual seria mesmo a base do parasitismo social?

Na história do pensamento houve muitas tentativas de afirmar uma natureza do ser humano, geralmente tentando comparar o comportamento humano com o dos animais. Assim, surgem as idéias do ser humano como naturalmente racional, político, social, etc. Na relação com o parasitismo, ou seja, com a situação em que um ser humano vive na condição de parasita de outros, as posições teóricas de Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau são demarcadoras para o debate teórico seguinte. Segundo Hobbes, os seres humanos são como lobos entre si, ou seja, maus por natureza, e seria necessário constituir um Estado forte, um Leviatã, para impedir que a humanidade se destrua a si mesma. Para Rousseau, ao contrário, o ser humano natural seria bom e justamente as instituições políticas, a sociedade civil, o teriam corrompido. Rousseau propõe um contrato social para que, com base na vontade geral, a humanidade possa resgatar sua liberdade e igualdade original. A posição de Hobbes parece ter sido a mais difundida, possivelmente por ter servido melhor aos interesses do liberalismo com o avanço do capitalismo, legitimando a desigualdade realmente existente e servindo à justificação da violência de classe do Estado. Para Rousseau, a tarefa teórica foi muito mais difícil, pois teve que identificar o momento original em que teria se dado a passagem do estado natural para a sociedade civil. Essa origem da desigualdade entre os seres humanos é identificada por Rousseau na instituição da propriedade privada. Ambos os filósofos recorrem à criação de uma realidade imaginária para afirmar uma proposta de Estado e marcam profundamente o surgimento do liberalismo em superação ao absolutismo do fim da Idade Média e começos da Moderna. A identificação com um ou outro paradigma teórico, certamente, conduz a conseqüências frontalmente opostas. A utopia de um outro mundo possível é muito influenciada pela interpretação da história da humanidade, ou seja, a identificação de um período em que não teria havido exploração e desigualdade, poderia aumentar a possibilidade de concretização de uma nova sociedade. A caracterização da desigualdade existente como algo que “sempre existiu”, ao contrário, tende a reforçar uma postura de legitimação que serve de obstáculo à utopia de transformação da realidade social. Como não há provas da existência de um período livre de injustiça, exploração e desigualdade na história da humanidade, a discussão continua no campo imaginário, o que também é a base da utopia. A afirmação de uma natureza humana também é meramente imaginária, motivada por determinadas interpretações do passado e projeções interessadas de futuro. Se afirmamos a existência de um parasitismo social na sociedade capitalista, podemos, entretanto, nos perguntar acerca da sua origem. A resposta nos remete a sociedades anteriores que também se alicerçaram na exploração, como o feudalismo e o escravismo. Mas, também, podemos imaginar a existência de sociedades em que a exploração entre os seres humanos não tenha existido. Em uma situação de abundância natural, na qual os meios de produção, acumulação e armazenamento não estão desenvolvidos, a idéia da apropriação privada perde sua força. Porém, em uma situação de

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escassez e com o desenvolvimento da organização produtiva do trabalho, a competição e a possibilidade de distribuição desigual da produção passam a ser mais prováveis. Com base nessa hipótese, podemos identificar o modo de produção e organização da sociedade como responsável pela existência parasitária de grupos humanos. A história humana registra diferentes modos de produção, demonstrando que a sociedade “nem sempre foi assim” e, por isso, não precisa, necessariamente, “continuar assim”. A exploração e a exclusão são conseqüências da forma como as pessoas se organizam para produzir e distribuir os resultados do trabalho humano. No comunismo primitivo, a ausência da propriedade privada e do excedente econômico permitiam a abundância no acesso aos bens necessários das pessoas que, organizadas em comunidades nômades, viviam basicamente da coleta de frutos da natureza, da caça e da pesca. O fator decisivo para a acumulação privada de bens por parte de uns às custas dos outros é a existência de um excedente econômico, o qual permite a divisão social entre os grupos humanos: uma maioria de produtores, de um lado, e os responsáveis pela organização do trabalho e segurança da comunidade, de outro. Com o desenvolvimento da tecnologia, o surgimento da agricultura e da pecuária, as forças produtivas geraram o excedente, e a sua apropriação por parte de quem não ajudou a produzi-lo, ocasionou a primeira forma de exploração. A divisão social do trabalho e a necessidade de proteger a propriedade e o excedente marcaram as primeiras sociedades de classe na história da humanidade. As guerras entre povos em torno ao acesso à propriedade a ao excedente colocaram os vencedores na condição de senhores sobre os vencidos que, por sua vez, se tornaram escravos. O escravismo, modo de produção decorrente da apropriação privada dos bens coletivos, durou muito tempo até entrar em crise e anunciar a segunda sociedade de classes conhecida pelos seres humanos: o feudalismo. Considerando que a promoção de guerras para trazer novos escravos era custeada pelos cidadãos livres que passaram a negar o pagamento de impostos para esse fim; o alto custo de criação de um escravo até se tornar adulto e propício ao trabalho; e a baixa produtividade dos escravos que começavam a se rebelar contra a ordem imposta, o feudalismo foi uma alternativa para resolver os problemas internos do modo de produção escravista. Agora, os servos (antes escravos) possuíam uma parte das terras necessárias à sua manutenção e reprodução e trabalhavam a maior parte do tempo na terra dos senhores. No entanto, com o desenvolvimento do mercado e a necessidade de constantes trocas de produtos entre os feudos, uma nova classe passou a se constituir como dominante: os mercadores ou burgueses. A acumulação primitiva de capital, através das trocas, fez dos burgueses os “novos senhores”, que começaram a constituir uma nova maneira de organizar a produção: o capitalismo. O capitalismo é o modo de produção mais complexo desenvolvido pela humanidade. Tendo no mercado o centro de sua lógica e na mercadoria a expressão da sua riqueza, os donos dos meios de produção (terras, fábricas, bancos, comércio) exploram os trabalhadores em troca de um salário. A instituição da propriedade privada, do mercado e do Estado, garante a manutenção da exploração e o trabalho passa a ser encarado como mera mercadoria – embora se constitua numa mercadoria especial, ou seja, que tem a capacidade de produzir novas mercadorias e lhes conferir um novo valor, o que assegura o aumento do capital para os seus donos. Como mercadoria, o trabalho passa a ser remunerado de acordo com a lógica do mercado e o desemprego aumenta progressivamente com a incorporação de tecnologia (produzida pelo trabalho) ao processo produtivo. A existência parasitária da classe capitalista se torna objetivamente possível através da propriedade privada dos meios de produção, da divisão social do trabalho assalariado e da lógica do mercado. O Estado, criado para defender os interesses da classe dominante, fornece os instrumentos necessários para manter a ordem social e reprimir em caso de desobediência e revolta por parte dos trabalhadores. Mas, o aparato repressivo dificilmente precisa ser usado, tendo em vista que a existência da ideologia cria as condições subjetivas de controle e dominação da classe explorada. Através da família, da escola, dos meios de comunicação social, do aparato jurídico e das leis, a classe capitalista legitima sua existência parasitária na consciência das pessoas, diminuindo significativamente a probabilidade de reação por parte da classe explorada. O papel legitimador da ideologia, como um conjunto de idéias reproduzidas no interior do Estado e das instituições da sociedade civil, encontra uma base fértil no senso comum das pessoas e serve tanto para a adaptação da classe explorada como para justificar a ação da classe parasitária para si mesma. Tanto a classe capitalista como a classe trabalhadora tendem a assimilar a lógica de dominação em curso, reproduzindo uma visão

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Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 33

de mundo e de ser humano que corresponda aos interesses dos dominadores. É precisamente neste aspecto que a idéia de uma suposta natureza parasitária do ser humano cumpre sua função ideológica, ao conduzir a classe explorada à passividade e à acomodação e ao reforçar, na classe exploradora, a idéia de que sua existência é determinada por uma condição humana imutável, afastando um possível sentimento de culpa e incrementando sua convicção de que sua tarefa é realmente a de coordenar o processo de exploração da melhor forma possível. Diariamente, somos condicionados a competir com os outros, a tirar vantagem de situações e de pessoas, a nos comportar como se estivéssemos em uma permanente luta por recursos escassos. O paradoxo, no entanto, é que a sociedade capitalista gerou a maior abundância da história da humanidade, cuja acumulação concentrada nas mãos de uns poucos obrigam os excluídos a concorrer pelas esmolas do sistema ou pela inclusão no reino da fartura reservado aos poucos. Desde pequenos somos ensinados a participar deste jogo, onde poucos vencem, derrotando a maioria. Alguns denominam esta concorrência como a tentativa de “vencer na vida”, ou mesmo, de “ser alguém na vida”. Os pais se rejubilam de orgulho ao verem os filhos sendo diplomados com cursos universitários; a sociedade celebra a conquista do status quo de uns poucos – muitos dos quais conseguem se constituir em colaboradores dos parasitas, ao servirem à classe capitalista que os recompensa pela sua submissão à lógica do capital. Os vencedores são reconhecidos com honras, enquanto os perdedores passam a ser culpados por não ter conquistado um espaço, já de antemão, reservado para poucos. No “caldo cultural” desta vivência é que muitos vão incorporando, gradativamente, a lógica de funcionamento da sociedade no seu comportamento cotidiano.

O sujeito percebe o mundo através das relações que estabelece com a realidade objetiva, captando o concreto de maneira aparente e fragmentada. Por isso, essa primeira apropriação é alienada, pois o sujeito considera como natural e dado o que se manifesta como fragmentado e condicionado pelo contexto histórico-cultural da humanidade. Sendo a consciência a interiorização das relações vividas, o ser humano tende a generalizar o que percebe como parte e a aceitar essa primeira forma de conhecimento como apropriação do real. Esta é a base para a aceitação da ideologia, das relações materiais concebidas como idéias, através das mais diferentes instituições com que o indivíduo, desde a infância, começa a conviver: a família, a escola, a igreja, o trabalho, etc. Poderíamos chamar isso de natureza humana?

Apesar das tentativas de inúmeros cientistas buscando identificar os genes responsáveis pelo comportamento humano, os seres humanos não são “instintivamente” humanos, pois, ao contrário dos animais, desenvolvem características de acordo com o meio em que vivem. Um exemplo típico disso é o caso das meninas-lobo, encontradas na Índia em 1920 e que não tiveram a oportunidade de se humanizar enquanto viveram com os lobos. Elas não riam, não choravam e não sabiam falar. Isso demonstra que o ser humano depende da cultura humana para se humanizar. Essa “cultura humana” foi desenvolvida por muitos povos durante muitas gerações e constrói o que conhecemos por história. Ao contrário da concepção metafísica de natureza humana, a constatação da cultura como constituinte do humano também nos mostra que, embora haja condicionamento, não existe determinação cega da história.

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 34

CONTROLE DE PARTICIPAÇÃO BIMESTRAL DO ALUNO SOCIOLOGIA

ALUNO: _______________________________________ 3° SÉRIE/TURMA: ੦ A ੦ B ੦ C ੦ D ੦ E

1° B

IMES

TRE

O

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

Carimbo

Avaliação Mensal 1

/

Avaliação Mensal 2

/

Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

2° B

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

Carimbo

Avaliação Mensal 1

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Avaliação Mensal 2

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Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

3° B

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

Carimbo

Avaliação Mensal 1

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Avaliação Mensal 2

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Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

4° B

IMES

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Componente Avaliativo

Data Nota Visto Observação

Carimbo

Avaliação Mensal 1

/

Avaliação Mensal 2

/

Atividades da Apostila

Envolvimento do Aluno

Participação em Sala

Posicionamentos do Aluno

Nota Mensal

Somatório das Atividades

Participação Geral no Bimestre: ੦ Fraca ੦ Regular ੦ Boa ੦ Ótima ੦ Excelente

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 35

MÓDULO TEMÁTICO 1 - SOCIOLOGIA

O ESTUDO SISTEMÁTICO DA SOCIEDADE

1. As Escolas Sociológicas A Sociologia é o estudo científico ou sistemático da sociedade, ou seja, dos fenômenos sociais, padrões de relações sociais ou interações sociais, enfim, e o estudo da cultura humana. Atualmente, as áreas estudadas pela sociologia podem variar da análise de contatos breves entre indivíduos anônimos na rua para o estudo de interação social global. A Sociologia é considerada uma sub-disciplina das Ciências Sociais, juntamente com a Ciência Política, a Antropologia e - de acordo com algumas classificações - também a Economia. A Sociologia não é uma ciência de apenas uma orientação teórico-metodológica dominante. Ela traz diferentes estudos e diferentes caminhos para a explicação da realidade social. Assim, pode-se claramente observar que a Sociologia tem ao menos três linhas mestras explicativas, fundadas pelos seus autores clássicos, das quais podem se citar, não necessariamente em ordem de importância: a)Positivista-Funcionalista, tendo como fundador Auguste Comte e seu principal expoente clássico em Émile Durkheim, de fundamentação analítica; b)Sociologia Compreensiva iniciada por Max Weber, de matriz teórico-metodológica hermenêutico-compreensiva; c)Linha de Explicação Sociológica Dialética, iniciada por Karl Marx que, mesmo não sendo um sociólogo e sequer se pretendendo a tal, deu início a uma profícua linha de explicação sociológica. Estas três matrizes explicativas, originadas pelos seus três principais autores clássicos, originaram quase todos os posteriores desenvolvimentos da Sociologia, levando à sua consolidação como disciplina acadêmica já no início do século XX. É interessante notar que a sociologia não se desenvolve apenas no contexto europeu. Ainda que seja relativamente mais tardio seu aparecimento nos Estados Unidos, ele se dá, em grande medida, por motivações diferentes que as da velha Europa (mas certamente influenciada pelos europeus, especialmente pela sociologia britânica e positivista de Herbert Spencer). A Sociologia, assim, vai debruçar-se sobre todos os aspectos da vida social. Desde o funcionamento de estruturas macro-sociológicas como o Estado, as classes sociais ou longos processos históricos de transformação social ao

comportamento dos indivíduo num nível micro-sociológico. Deixando de lado as profundas diferenças entre os três modelos sociológicos, podemos dizer que é a idéia de que o homem só pode existir na sociedade e que esta, inevitavelmente, lhe será uma "jaula" que o transcenderá e lhe determinará a identidade é consensual a toda escola sociológica. Para compreender o surgimento da sociologia como ciência do século XIX, é importante perceber que, nesse contexto histórico social, as ciências teóricas e experimentais desenvolvidas nos séculos XVII, XVIII e XIX inspiraram os pensadores a analisar as questões sociais, econômicas, políticas, educacionais, psicológicas, com enfoque científico. 2. Surgimento da Sociologia A Sociologia é uma área de interesse muito recente, mas foi a primeira ciência social a se institucionalizar. Antes, portanto, da Ciência Política e da Antropologia. Em que pese o termo Sociologie tenha sido criado por Auguste Comte (1789-1857), que esperava unificar todos os estudos relativos ao homem - inclusive a História, a Psicologia e a Economia, Montesquieu também é considerado como um dos fundadores da Sociologia - talvez como o último pensador clássico ou o primeiro pensador moderno. Em Comte, seu esquema sociológico era tipicamente positivista, e ele acreditava que toda a vida humana tinha atravessado as mesmas fases históricas distintas e que, se a pessoa pudesse compreender este progresso, poderia prescrever os “remédios” para os problemas de ordem social.

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Caderno de Filosofia 2010 Jeann Marcus Gomes Vieira

Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 36

As transformações econômicas, políticas e culturais ocorridas no século XVIII, como as Revoluções Industrial e Francesa, colocaram em destaque mudanças significativas da vida em sociedade com relação a suas formas passadas, baseadas principalmente nas tradições. A Sociologia surge no século XIX como forma de entender essas mudanças e explicá-las. No entanto, é necessário frisar, de forma muito clara, que a Sociologia é datada historicamente e que o seu surgimento está vinculado à consolidação do capitalismo moderno. A Revolução Industrial significou, para o pensamento social, algo mais do que a introdução da máquina a vapor. Ela representou a racionalização da produção da materialidade da vida social. O triunfo da indústria capitalista foi pouco a pouco concentrando as máquinas, as terras e as ferramentas sob o controle de um grupo social, convertendo grandes massas camponesas em trabalhadores industriais. Neste momento, se consolida a sociedade capitalista, que divide de modo central a sociedade entre burgueses (donos dos meios de produção) e proletários (possuidores apenas de sua força de trabalho). Há paralelamente um aumento do funcionalismo do Estado que representa um aumento da burocratização de suas funções e que está ligado majoritariamente aos estratos médios da população. O quase desaparecimento dos pequenos proprietários rurais, dos artesãos independentes, a imposição de prolongadas horas de trabalho, e etc., tiveram um efeito traumático sobre milhões de seres humanos ao modificar radicalmente suas formas tradicionais de vida. Não demorou para que as manifestações de revolta dos trabalhadores se iniciassem. Máquinas foram destruídas, atos de sabotagem e exploração de algumas oficinas, roubos e crimes, evoluindo para a criação de associações livres, formação de sindicatos e movimentos revolucionários. Este fato é importante para o surgimento da Sociologia, pois colocava a sociedade num plano de análise relevante, como objeto que deveria ser

investigado tanto por seus novos problemas intrínsecos, como por seu novo protagonismo político. Junto a estas transformações de ordem econômica pôde-se perceber o papel ativo da sociedade e seus diversos componentes na produção e reprodução da vida social. Esta disciplina marca uma mudança na maneira de se pensar a realidade social, desvinculando-se das preocupações especulativas e metafísicas e diferenciando-se progressivamente enquanto forma racional e sistemática de compreensão da mesma. O surgimento da Sociologia prende-se em parte aos desenvolvimentos oriundos da Revolução Industrial, pelas novas condições de existência por ela criada. Mas, uma outra circunstância concorreria também para a sua formação. Trata-se das modificações que vinham ocorrendo nas formas de pensamento, originada pelo Iluminismo. As transformações econômicas, que se achavam em curso no ocidente europeu desde o século XVI, não poderiam deixar de provocar modificações na forma de conhecer a natureza e a cultura. Sociologia - uma ciência “moderna” Podemos dizer que a Sociologia é “filha” da Modernidade, conseqüência das profundas transformações na Europa do século XIX com as chamadas Revoluções Burguesas. Costuma-se considerar modernidade como o conjunto de experiências históricas ambíguas e conflituosas que marcaram a sociedade européia em meados do século XIX até a atualidade. Um período de profundas transformações sociais, econômicas e políticas. As mudanças na Europa trouxeram 2 aspectos importantes para a sociedade moderna: 1) Desenvolvimento da sociedade burguesa e consolidação de sua hegemonia e valores, com a criação do Estado Burguês. Surge uma nova configuração social e o sistema societal feudal entra em colapso. 2) Consolidação do capitalismo como modo de produção. Didaticamente, podemos compreender o período das revoluções burguesas sobre três aspectos diferentes: econômico, cultural-científico e político. a) Revolução Econômica: corresponde a ao longo processo de superação da economia agrária feudal (assentada sobre a servidão) que desencadeou a chamada Revolução Industrial. Com o desenvolvimento do mercantilismo e a acumulação primitiva de capitais o modo de produção feudal entra em colapso observa-se a expropriação dos terrenos comunais da propriedade feudal (política dos cercamentos) e destruição da agricultura familiar, transformando-se em propriedade privada moderna.

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Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 37

As conseqüências foram à expulsão das famílias rurais para as grandes cidades, que buscavam na indústria emergente a garantia de sua sobrevivência, originando o operariado urbano (proletariado). A velocidade que a expropriação solapava camponeses e artesãos era maior do que a absorção da mão de obra pelas fábricas originando o fenômeno do desemprego, aumentando os índices de miseráveis, mendigos e excluídos. Como conseqüências a Revolução Industrial trouxe: - O fim do produtor independente. - Êxodo rural e explosão demográfica urbana. - Processo de proletarização. - Miséria (doenças, prostituição, suicídios, alcoolismo, violências, etc.). - Primeiras manifestações operárias (ludismo, cartismo). - Criava-se uma sociedade altamente competitiva e individualista. b) Revolução cultural-científica: correspondente ao chamado Iluminismo (França) fruto de um longo processo de separação das concepções teológicas da Igreja Católica (autoridade política da época). Com as transformações do renascimento comercial e urbano surgem intensas transformações culturais e na forma de conhecer do homem (marco inicial com o Renascentismo): - Instala-se um movimento anti-clerical, opondo-se diametralmente ao teocentrismo. - O antropocentrismo inaugura um novo tipo de pensamento voltado para o homem como chave explicativa do mundo. - O conhecimento deixa de ser objeto de revelação divina para ser interpretado pela razão (Ciência). - O racionalismo baseava-se no uso exclusivo da razão e no empirismo. - Derrocada do Teocentrismo como forma explicativa do mundo - Consolidação do Liberalismo - Notório desenvolvimento das Ciências Naturais e Humanas O Iluminismo buscava transformar não só as formas de conhecimento, mas a própria sociedade, implantando os valores do Liberalismo político e econômico. Como, temos a derrocada do teocentrismo (no plano das idéias), a consolidação do Liberalismo (no plano político) e o notório desenvolvimento das Ciências Naturais e Humanas. Como expoentes do Iluminismo, temos Descartes, Newton, Locke, Montesquieu, Voltaire, Rousseau, Diderot e d´Alembert, Adam Smith. c) Revolução Política: correspondente a Revolução Francesa que com os ideais iluministas (liberdade, igualdade e fraternidade) questionaram a monarquia absolutista. Foi um movimento que

contou com forte apoio popular, mas de forte caráter burguês. Suas conseqüências principais foram: - Queda do Estado monárquico e origem do Estado Moderno Burguês (executivo, legislativo e judiciário). - Criação do Estado Laico e fim do predomínio político da autoridade da Igreja Católica. - Burguesia toma o Estado e assume papel hegemônico O conjunto desses processos históricos trouxe não somente progressos como também uma infinidade de problemas sociais que conturbaram a Europa do século XIX. Esse “turbilhão social” faz com que surjam intelectuais preocupados e propostos a por uma “ordem social” oriunda dessas revoluções. Neste contexto é que surge a Sociologia. 3. Principais Precursores da Sociologia a) SAINT-SIMON Claude-Henri de Rourroy, o Conde de Saint-Simon, (1760-1825), nascido em Paris, foi um filósofo e economista francês, um dos fundadores do Socialismo moderno e teórico do Socialismo Utópico. Para este autor, o avanço da ciência determinava a mudança político-social, além da moral e da religião. É considerado o precursor do Socialismo, pois, no futuro, a sociedade seria basicamente formada por cientistas e industriais. O pensamento Saint-simoniano pode ser visto nas obras de 1807 a 1821, com o lema: "a cada um segundo sua capacidade, a cada capacidade segundo seu trabalho". Em um dos seus primeiros livros, Lettres d'un habitant de Genève à ses contemporains, publicado em 1803, ele propõe que os cientistas tomem o lugar dos padres para conduzir a era Moderna. A violência da guerra napoleônica leva-o a se abrigar no Cristianismo, e de uma base Cristã construir as bases para uma sociedade socialista. Previu a industrialização da Europa e sugere uma união entre as nações para acabar com as guerras. Quando Saint-Simon falou sobre a nova sociedade, imaginou uma imensa fábrica, na qual a exploração do homem pelo homem daria lugar a uma administração coletiva. Assim, a propriedade privada não caberia mais nesse novo sistema industrial. Para ele, subsistiria uma pequena desigualdade e a sociedade só seria perfeita depois de reformar o Cristianismo. Um “novo Cristianismo” substituiria o “Cristianismo degenerado”, e teria como imperativo a justiça social, pois o núcleo deveria se consolidar no que seria a fraternidade do homem, resultando num mundo de homens livres.

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Para ele, o homem não seria apenas algo passivo na História, pois sempre procurava alterar o meio social no qual está inserido. Defende também a idéia de uma sociedade hierarquizada, daí a desigualdade natural (no topo estariam os diretores da indústria e de produção, engenheiros, artistas e os cientistas; na parte de baixo estariam os trabalhadores responsáveis pela execução dos projetos feitos pelos inventores e diretores). Tal hierarquia possibilitaria um grau máximo da capacidade de produção. Mesmo sendo um defensor da sociedade industrial, Saint-Simon foi o primeiro a perceber que o conflito de classes estava relacionado com a economia e que seria nas mãos dos trabalhadores que o futuro seria construído. Ao contrário de Marx, entretanto, achava que os trabalhadores não seriam o sujeito das transformações, mas deveriam ser guiados por alguém. Saint-Simon é considerado um dos fundadores da Sociologia, que estaria sendo sustentada por duas forças opostas: orgânicas (estáveis) e críticas (mudam a história). Só a sociedade industrial poderia acabar com a crise que a França passava. Este autor ainda marca a ruptura com o Antigo Regime. Para Saint-Simon, a Política era agora a ciência da produção, porém a Política vê seu fim com a justiça social. A obra principal de Saint-Simon é New Christianity (1825). Nele declara que a Religião tendia a melhorar a condição de vida dos mais necessitados. Ele morreu no ano da publicação desse livro, no dia 19 de maio. Em três anos seus seguidores tinham desenvolvido o que podemos chamar de um culto quase religioso baseado na interpretação das suas idéias, e difundiram as suas idéias através da Europa e América do Norte, influenciando socialistas e outros românticos do início do século XIX, como Sainte-Beuve, Victor Hugo e George Sand. b) AUGUSTE COMTE Isidore Auguste Marie François Xavier Comte (1798-1857) foi filósofo francês, considerado o pai da Sociologia e o fundador do Positivismo. Nascido em Montpellier, no Sul da França, Augusto Comte desde cedo revelou uma grande capacidade intelectual e uma prodigiosa memória. Seu interesse pelas ciências naturais era conjugado pelas questões históricas e sociais. No período de 1817-1824 foi secretário do conde Henri de Saint-Simon (1760-1825), expoente do socialismo utópico; todavia, como Saint-Simon apropriava-se dos escritos de seus discípulos para si e como dava ênfase apenas à economia na interpretação dos problemas sociais, Comte rompeu com ele, passando a desenvolver autonomamente suas reflexões. São dessa época algumas fórmulas fundamentais: "Tudo é relativo,

eis o único princípio absoluto" (1819) e "Todas as concepções humanas passam por três estádios sucessivos - teológico, metafísico e positivo -, com uma velocidade proporcional à velocidade dos fenômenos correspondentes" (1822) (a famosa "lei dos três estados"). A filosofia positiva de Comte nega que a explicação dos fenômenos naturais, assim como sociais, provenha de um só princípio. A visão positiva dos fatos abandona a consideração das causas dos fenômenos (Deus ou natureza) e torna-se pesquisa de suas leis, vistas como relações (abstratas) constantes entre fenômenos observáveis. A lei dos três estados O alicerce fundamental da obra comtiana é, indiscutivelmente, a "Lei dos Três Estados", tendo como precursores nessa idéia seminal os pensadores Condorcet e, antes dele, Turgot. Segundo o marquês de Condorcet, a humanidade avança de uma época bárbara e mística para outra civilizada e esclarecida, em melhoramentos contínuos e, em princípio, infindáveis - sendo essa marcha o que explicaria a marcha da história. A partir da percepção do progresso humano, Comte formulou a Lei dos Três Estados. Observando a evolução das concepções intelectuais da humanidade, Comte percebeu que esta evolução passa por três estados teóricos diferentes: o estado 'teológico' (ou 'fictício'), o estado 'metafísico' (ou 'abstrato') e o estado 'científico' (ou 'positivo'). Estado teológico - neste estágio, os fatos observados são explicados pelo sobrenatural, ou seja, as idéias baseadas no sobrenatural são usadas como ciência. Ainda nesta fase, a sociedade se encontra em uma estrutura militar fundamentada na propriedade e na exploração do solo.

Estado metafísico - neste estágio, já se encontram as idéias naturais (idéias que buscam explicar a natureza através de conceitos e não entidades sobrenaturais), mas ainda há certa presença do sobrenatural nas ciências. A indústria já se expandiu, mas não totalmente, a sociedade já não é francamente militar. Pode-se dizer que este estado serve apenas de intermediário entre o primeiro e o terceiro.

Estado Positivo – neste estágio, ocorre o apogeu do que os dois anteriores prepararam progressivamente. Neste, os fatos são explicados segundo leis gerais de ordem inteiramente positiva. A indústria torna-se preponderante, tendo como atividade única e permanente a produção. Religião da Humanidade Os anseios de reforma intelectual e social de Comte desenvolveram-se por meio de sua Religião da Humanidade. Para ele, "religião" e

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"teologia" não são termos sinônimos: a religião refere-se ao estado de unidade humana (psicológica, espiritual e social), enquanto a teologia refere-se à crença em entidades sobrenaturais. Dessa maneira, grosso modo, a Religião da Humanidade consiste na afirmação radical de um humanismo, com a substituição das teologias pela Humanidade - embora o papel histórico desempenhado por essas teologias seja rigorosamente respeitado e celebrado. 4. Sociologia como autoconsciência da Sociedade Atualmente, a Sociologia procura emancipar o entendimento humano sobre a sociedade desvencilhando-se do senso comum, justamente por possuir discursos e métodos científicos próprios. A sociologia nasce num momento bastante particular da História. Segundo Octavio Ianni (1926-2004), influente sociólogo brasileiro: A sociologia nasce e desenvolve-se com o Mundo Moderno. Reflete suas principais épocas e transformações. (...) A Sociologia não nasce no nada. Surge em um dado momento da história do mundo moderno. Mais precisamente, em meados do séc. XIX, quando ele já está em franco desenvolvimento, realizando-se. (...) Os personagens mais característicos estão ganhando seus perfis e movimentos: grupos, classes, movimentos sociais e partidos políticos; burgueses, operários, camponeses, intelectuais, artistas e políticos; mercado, mercadoria, capital, tecnologia, força de trabalho, lucro, acumulação de capital e mais-valia; sociedade, estado e nação; divisão internacional do trabalho e colonialismo; revolução e contra-revolução. (...) É possível dizer que a Sociologia é uma espécie de fruto muito peculiar desse Mundo. No que ela tem de original e criativa, bem como de insólita e estranha, em todas as suas principais características como forma de pensamento.

Esse momento histórico “exigiu” que a grande particularidade ou especificidade da investigação em Sociologia, tal como noutras Ciências Sociais (a Antropologia ou a Psicologia Social, por exemplo), se firmasse como reflexividade e capacidade de interpretação simbólica por parte dos agentes sociais ou "sujeitos". Reflexidade pode ser entendida, aqui, como a capacidade do homem de pensar criticamente sobre a sua própria existência social. Note também que a expressão sujeito se opõe à noção de objeto (expressão comum das ciências naturais e exatas). A Sociologia, como ciência da autoconsciência da sociedade, não estuda objetos passivos, que não interferem com a sua subjetividade no método e na pesquisa social. São sujeitos ativos e críticos da realidade que os cerca.

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LEITURA COMPLEMENTAR

O NASCIMENTO DA SOCIOLOGIA O século XVIII tornou-se um marco importante para a história do pensamento ocidental tal, dadas às transformações econômicas, políticas e culturais que se aceleraram nesse período e que apresentaram problemas inéditos para as sociedades. A dupla revolução que esse século testemunhou constitui ti dois lados de um mesmo processo: a instalação definitiva da sociedade capitalista. A partir do século XVIII, a economia mundial foi constituída sob a influência da Revolução Industrial ocorrida na Inglaterra, enquanto a política e a ideologia foram constituídas pela Revolução Francesa. O modelo econômico que rompeu com as estruturas tradicionais foi fornecido pela Inglaterra, mas a França forneceu as idéias, o vocabulário do nacionalismo e os tem as da política liberal para a maior parte do mundo. Na França revolucionária, começaram a circular expressões como constituição, nação, eleição, Estado moderno, poder executivo, poder legislativo, poder judiciário, direitos humanos universais. Revolução Industrial A Revolução Industrial não se restringiu à introdução da máquina a vapor e ao aperfeiçoamento dos modos de produção. Ela representou muito mais. Representou o triunfo da indústria, comandada pelo empresário capitalista que, pouco a pouco, concentrou a propriedade das máquinas, das ferramentas e das terras, transformando populações inteiras em trabalhadores despossuídos. A Revolução Industrial trouxe reformas no campo da economia, na forma de trabalho, na organização social, que se iniciaram na Inglaterra e se estenderam para o mundo todo. Um dos fatores de maior significado relacionado com a Revolução Industrial foi, sem dúvida, o aparecimento do proletariado e o papel que ele desempenhava na sociedade capitalista. Num período de aproximadamente cem anos ( 780 a 1880), deu-se a formação de uma sociedade industrializada e urbanizada. Em decorrência dessas transformações, houve uma reordenação na sociedade rural, em ritmo crescente. Desapareceram os pequenos proprietários rurais, os artesãos independentes, e houve a imposição de prolongadas horas de trabalho, o que modificou radicalmente as formas habituais de vida de milhões de seres humanos. Foi a transformação da atividade artesanal em atividade manufatureira e depois em atividade fabril que desencadeou a emigração maciça do campo para a cidade e que engajou mulheres e crianças em longas jornadas de trabalho, sem férias, com um salário de subsistência. Mas, ao lado das novas situações colocadas pela Revolução Industrial, outra circunstância vinha ocorrendo e provocando mudanças nas formas de pensamento: a Revolução Francesa. Revolução Francesa Convidamos você a caminhar um pouco mais com nossas reflexões, porém não se esqueça de que, se a economia mundial a partir do século XVJJI foi constituída sob a influência da Revolução Industrial, a política e a ideologia foram constituídas pela Revolução Francesa. É importante que você saiba que foi a França que forneceu as idéias, o vocabulário do nacionalismo e os temas da política liberal para a maior parte do mundo.

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Diferentemente da Revolução Industrial, ela foi uma revolução social de massa, radical. A Revolução Francesa aconteceu no mais populoso e poderoso país da Europa da época. Ao final do século XVIII, a França contava com uma população de 23 milhões de habitantes, dos quais cerca de 400 mil pessoas pertenciam à monarquia absolutista e usufruíam de muitos privilégios. Em 1789, de cada cinco habitantes europeus, um era francês. A Revolução Francesa não se realizou liderada por homens que desejavam levar adiante um programa nem por um partido ou por um movimento organizado, no sentido moderno; entretanto, apresentou um consenso de idéias gerais de um grupo que lhe deu unidade: esse grupo era a burguesia. As exigências da burguesia foram delineadas na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Tratava-se de um manifesto contra a sociedade hierárquica de privilégios da nobreza, mas não um manifesto a favor da sociedade democrática e igualitária. Embora seu primeiro artigo dite que “Os homens nascem e vivem livres e iguais perante as leis”, ele também prevê a existência de distinções sociais quando defende a propriedade privada e uma assembléia representativa que não era democraticamente eleita. Foram os princípios dessa Declaração que inspiraram a organização da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela resolução 217 da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Uma leitura que não podemos deixar de fazer é que, ao final da Revolução Francesa, os anseios de igualdade social viram-se frustrados, pois a burguesia conservava a hegemonia política e, por esse motivo, impunha os interesses de sua classe social. A igualdade política ficou comprometida, pois os direitos de votar e ser votado ficaram, de fato, restritos à elite econômica. A igualdade política pregada pela Revolução Francesa teve comprometimentos quando o direito de votar e ser votado ficou restrito mediante um modelo que tinha variantes de classificação censitária. Esse modelo de voto censitário se disseminou pelo mundo, inclusive no Brasil, onde o direito de voto não era universal simplesmente porque uma parte enorme da população continuaria por muito tempo atrelada à escravidão, ao analfabetismo ou era representada pelo gênero feminino. O objetivo da Revolução de 1789 foi abolir a antiga forma de sociedade e promover profundas modificações na economia, na política, na vida cultural. Confiscou propriedades da igreja e transferiu para o Estado as funções da educação, que até então eram atribuições da Igreja e da família. Destruiu os privilégios da nobreza e promoveu o incentivo aos empresários. A Revolução Francesa inaugurou uma realidade que provocou impacto e espanto compartilhado entre pensa dores franceses. Émile Durkheim foi um desses pensadores. Como um dos intelectuais fundadores e organizador da sociologia como ciência, identificou na “tempestade revolucionária” a noção de ciência social.

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MÓDULO TEMÁTICO 2 - SOCIOLOGIA

KARL MARX E O MATERIALISMO HISTÓRICO

1. Breve histórico da vida de Karl Marx Karl Heinrich Marx (1818-1883) foi um intelectual alemão, sendo considerado um dos fundadores da Sociologia. Também é possível encontrar a influência de Marx em várias outras áreas, tais como: Filosofia e História, já que o conhecimento humano, em sua época, não estava fragmentado em diversas especialidades da forma como se encontra hoje. Teve participação como intelectual e como revolucionário no movimento operário, sendo que ambos (Marx e o movimento operário) influenciaram uns aos outros durante o período em que o autor viveu. Atualmente é bastante difícil analisar a sociedade humana sem se referenciar, em maior ou menor grau, à produção de Karl Marx, mesmo não sendo simpático à ideologia que foi construída em torno do seu pensamento. Marx nasceu em Tréveris, na Alemanha, numa família de classe média. Aos dezessete anos, Marx ingressou na Universidade de Bonn para estudar Direito, mas, já no ano seguinte, transferiu-se para a Universidade de Berlim, onde a influência de Hegel ainda era bastante sentida, mesmo após a morte (em 1831) do celebrado professor e reitor daquela universidade. Ali, os interesses de Marx se voltam para a Filosofia, tendo participado ativamente do movimento dos Jovens Hegelianos. Doutorou-se em Jena, 1841 com uma tese sobre as "Diferenças da filosofia da natureza em Demócrito e Epicuro". Nesse mesmo ano, concebeu a idéia de um sistema que combinasse o materialismo de Ludwig Feuerbach com a dialética de Hegel. Impedido de seguir uma carreira acadêmica, tornou-se, em 1842, redator-chefe da Gazeta renana. Com o fechamento do jornal pelos censores do governo prussiano, em 1843, Marx emigra para a França. Naquele mesmo ano, casou-se com Jenny von Westphalen. Desse casamento, Marx teve cinco filhos, alguns dos quais morreram na infância, provavelmente pelas péssimas condições financeiras a que a família estava submetida. Marx já havia sido privado da oportunidade de seguir uma carreira acadêmica na Alemanha devido à perseguição do absolutismo prussiano. Com a Revolução de 1848 e o exílio que se seguiu a ela, foi obrigado a abandonar o jornalismo na Alemanha e tentar ganhar a vida na Inglaterra. Lá, como um intelectual estrangeiro desconhecido e com meios de subsistência precários, sofreu a sorte comum destinada pela época às pessoas destituídas de "meios independentes de subsistência" (isto é, viver de rendas).

Durante a maior parte de sua vida adulta, sustentou-se com artigos que publicava ocasionalmente em jornais alemães e estadunidenses, bem como por diversos auxílios financeiros vindos de seu amigo e colaborador Friedrich Engels. Tentava angariar rendas publicando livros que analisassem fatos da história recente, tais como “O 18 Brumário de Luís Bonaparte”, mas obteve pouco retorno com essas empreitadas. Friedrich Engels declamou estas palavras quando da morte de Marx, quinze meses após a perda da esposa: Marx era, antes de tudo, um revolucionário. Sua verdadeira missão na vida era contribuir, de um modo ou de outro, para a derrubada da sociedade capitalista e das instituições estatais por estas suscitadas, contribuir para a libertação do proletariado moderno, que ele foi o primeiro a tornar consciente de sua posição e de suas necessidades, consciente das condições de sua emancipação. A luta era seu elemento. E ele lutou com uma tenacidade e um sucesso com quem poucos puderam rivalizar. (...) Marx foi o homem mais odiado e mais caluniado de seu tempo. Governos, tanto absolutos como republicanos, deportaram-no de seus territórios. (...) Tudo isso ele punha de lado, como se fossem teias de aranha, não tomando conhecimento, só respondendo quando necessidade extrema o compelia a tal. E morreu

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amado, reverenciado e pranteado por milhões de colegas trabalhadores revolucionários - das minas da Sibéria até a Califórnia, de todas as partes da Europa e da América - e atrevo-me a dizer que, embora, muito embora, possa ter tido muitos adversários, não teve nenhum inimigo pessoal. Diversamente, o aspecto e a personalidade de Marx são descritos por um amigo russo de modo bem intuitivo: Ele representa o tipo de homem constituído por energia, força de vontade e convicção inflexível, um tipo que também segundo a aparência era extremamente estranho. Uma grossa juba negra sobre a cabeça, as mãos cobertas pelos pêlos, o paletó abotoado totalmente, possuía, contudo, o aspecto de um homem que tem o direito e o poder de atrair a atenção, por mais esquisitos que parecessem seu aspecto e seu comportamento. Seus movimentos eram desastrados, porém ousados e altivos; suas maneiras iam frontalmente de encontro a toda forma de sociabilidade. Mas eram orgulhosas, com um laivo de desprezo, e sua voz aguda, que suava como metal, combinava-se estranhamente com os juízos radicais que fazia sobre homens e coisas. Não falava senão em palavras imperativas, intolerantes contra toda resistência, que, aliás, eram ainda intensificadas por um tom que me tocava quase dolorosamente e que impregnava tudo o que falava. Esse tom expressava a firme convicção de sua missão de dominar os espíritos e de prescrever-lhes leis. Diante de mim estava a encarnação de um ditador democrático, assim como se fosse em momentos de fantasia. A Crítica a Hegel Desde o início de sua atividade filosófica, Marx insere-se na maior disputa espiritual de seu tempo, determinada pela vultosa figura de Hegel, cujo pensamento ele chama de "a filosofia atual do mundo". Inicialmente, Marx dedica-se a Hegel com paixão para, depois, distanciar-se dele com tanto maior aspereza. Sua crítica inicia-se pela concepção da história do filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831). Para este, a história não é uma mera seqüência casual de acontecimentos, mas um suceder racional que se desenvolve segundo um princípio imanente (interno), ou seja, a dialética. O decisivo nisso é que o verdadeiro sujeito da história (aquele que faz a história) não são os homens que agem. Na história dominaria um espírito que tudo abrange, ao qual Hegel designa como “espírito do mundo” ou “espírito absoluto” ou mesmo “Deus”. Esse, o Deus que vem-a-ser, realiza no curso da história sua autoconsciência. Ele chega, por meio dos diferentes momentos do processo histórico, a si mesmo. Hegel escreveu no Prefácio à Filosofia do Direito: "O que é racional é real; e o que é real é racional." Razão e realidade chegaram portanto, segundo Hegel, finalmente à adequação uma com a outra; elas foram verdadeiramente conciliadas. O espírito

absoluto compreendeu a si mesmo como a realidade total e a realidade total como manifestação sua. Aqui entra o protesto de Marx. Aquele pensamento de Hegel, de que a realidade toda tinha de ser entendida a partir de um espírito absoluto, consiste para ele em um injustificado “misticismo”. A filosofia, entendida dessa forma, se realizaria acima da realidade factual, e não a partir dessa mesma. Em oposição a isso a decidida exigência de Marx - de colocar a filosofia hegeliana de ponta-cabeça, de volta sobre os pés - é que a visão da realidade de Hegel deveria ser invertida. A realidade deste mundo não deve ser explicada com base em uma realidade divina. Contrariamente, o ponto de partida do pensamento tem de ser a realidade concreta. Esse pensamento imprime à filosofia de Marx seu cunho ateísta. “A missão da história é, após o além da verdade ter desaparecido, estabelecer a verdade do aquém.” Quando Hegel afirma que a realidade estaria conciliada com a razão, ele não poderia, segundo Marx, ter em vista a realidade concreta. Em Hegel, tudo se passa no âmbito do mero pensamento. Mesmo a realidade sobre a qual ele fala, é a mera realidade pensada. Para Marx, porém, a realidade factual mostra-se contraditória, inconcebível e, portanto, não conciliada com a razão. Todo o empenho filosófico de Hegel fracassa porque ele não é capaz de incluir essa realidade efetiva em seu pensar, por mais abrangente que esse seja. Para Marx, portanto, a realidade concreta é a realidade do homem. “As pressuposições com as quais iniciamos são os indivíduos reais.” A filosofia como Marx a postula – em contraposição a Hegel e em concordância com Ludwig Feuerbach (1804-1872) – é uma filosofia da existência humana. Para ele, “A raiz do homem é o próprio homem”. Mas o que é o homem? O significativo aqui é que Marx não considera o homem, como o faz Hegel, essencialmente a partir de sua faculdade de conhecer. Ao contrário, trata-se decisivamente da práxis humana, da ação concreta, do seu agir. Na práxis, o homem tem de comprovar a verdade, isto é, a realidade, o poder e a mundanidade de seu pensamento. Parte-se do homem real que age. Numa visão comum dentro do pensamento sociológico, Marx considerava que a ação humana só pode ser compreendida enquanto relação com o outro e nunca como indivíduo isoladamente. Para ele, homem vive desde sempre em uma sociedade que o supera, que condiciona a sua ação: “o indivíduo é o ser social”. Essa natureza social constitui para Marx o ponto de partida para toda reflexão subseqüente. Assim deve-se entender a muito discutida frase: Não é a consciência do homem que determina seu ser, mas é seu ser social que determina sua consciência.

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2. O Pensamento Social de Marx Mas por que meio se constitui a sociedade humana? Marx responde: basicamente, não por meio da consciência comum, mas por meio do trabalho comum. Pois o homem é originariamente um ser econômico. As relações econômicas e particularmente as forças produtivas a elas subjacentes são a base (ou a “infra-estrutura”, como veremos adiante) de sua existência. Ao contrário da visão da época, Marx não acreditava que a mudança da consciência do homem mudava o mundo, mas sim que, a medida que as relações econômicas se modificam, também se desenvolvem os modos da consciência, que representam a “superestrutura ideológica”. Desta superestrutura fazem parte o Estado, as leis, as idéias, a moral, a arte, a religião e similares. Hegel viu no “espírito absoluto” as leis de transformação da Histórica. Marx viu essas leis na base econômica da sociedade. As relações econômicas desdobram-se de modo dialético (contraditório), mais precisamente, no conflito de classes. Por isso, para Marx, a história é principalmente a história das lutas de classes. Até aqui tudo poderia parecer como uma das muitas teorias antropológicas e histórico-filosóficas, apenas mais uma interpretação entre muitas outras. Então, como se explica que seu pensamento tenha determinado tão amplamente o pensamento ocidental? A explicação para isto está no fato de ter sido o primeiro pensador de vulto a não se deter no âmbito do pensamento puro, mas que se põe a trabalhar decisivamente na transformação da realidade: Os filósofos têm apenas interpretado diversamente o mundo; trata-se de modificá-lo.

A Mercantilização das Relações Sociais Marx empreende uma crítica de seu tempo. Observa que em seus dias a verdadeira essência do homem, sua liberdade e independência, “a atividade livre e consciente”, não se podem fazer valer. Por toda parte o homem é “tirado a si mesmo” através do trabalho. Por toda parte perdeu as autênticas possibilidades humanas de existência. Esse é o sentido daquilo que Marx chama de "auto-alienação" do homem. Ela significa uma permanente depreciação do mundo do homem.

Outro significado de “alienação” aparece quando Marx analisa as relações econômicas. A auto-alienação do homem tem sua raiz em uma alienação do trabalhador do produto de seu trabalho: este não pertence àquele para seu usufruto, mas ao empregador. O produto do trabalho torna-se uma “mercadoria”, isto é, uma coisa estranha ou alheia ao trabalhador, que o coloca em posição de dependência, porque ele precisa compará-la para poder subsistir. Da mesma forma também o trabalho se torna “trabalho alienado”. Trabalhar não está ligado mais ao princípio da auto-conservação, mas tem um sentido de trabalho forçado. Esse desenvolvimento atinge sua culminância no capitalismo, no qual o capital assume a função de um poder separado dos homens. A alienação do produto do trabalho conduz também a um terceiro significado de “alienação”: a alienação do homem. Isso não vale apenas para a "luta de inimigos entre capitalista e trabalhador". As relações interpessoais em geral perdem cada vez mais a sua imediação (relações diretas). Elas são mediadas (relações indiretas) pelas mercadorias e pelo dinheiro, “a meretriz universal”. Enfim, os próprios proletários assumem caráter de mercadoria; sua força de trabalho é comercializada no mercado de trabalho (como escravos), no qual se encontra à mercê do arbítrio dos compradores. Seu “mundo interior” torna-se “cada vez mais pobre”; sua “destinação humana e sua dignidade” perdem-se cada vez mais. O trabalhador é “o homem extraviado de si mesmo”; sua existência é “a perda total do homem”; sua essência é uma “essência desumanizada”. Mas, no ápice desse desenvolvimento tem de sobrevir a guinada. Ela se torna possível desde que o proletariado se conscientize de sua alienação. Antes da guinada não há como superar a alienação, mas pelo menos se pode tomar consciência da desumanização.

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Concretamente, segundo os prognósticos de Marx, chega-se a uma concentração do capital nas mãos de poucos, a um crescente desemprego e empobrecimento das massas. Com isso, porém, o capital torna-se seu próprio coveiro. Pois a concentração de capital leva inevitavelmente (determinismo histórico), devido às leis históricas científicas e dialéticas, à subversão e a Revolução. A missão dessa revolução é "transformar o homem [alienado] em homem", para que "o homem seja o ser supremo para o homem". Trata-se de "derrubar todas as relações em que o homem é um ser degradado, escravizado, abandonado e desprezado". Importa realizar "o verdadeiro reino da liberdade", realizar o homem em "toda a riqueza de sua essência" e, com isso, superar definitivamente a alienação. 3. Materialismo Histórico e Dialético Baseado em Demócrito e Epicuro (filósofos da antiguidade grega) sobre o materialismo e em Heráclito sobre a dialética (do grego, dois logos, duas opiniões divergentes), Marx defende o materialismo dialético, tentando superar o pensamento de Hegel e Feuerbach. A dialética hegeliana era a dialética do idealismo (doutrina filosófica que nega a realidade individual das coisas distintas do "eu" e só lhes admite a idéia), e a dialética do materialismo é posição filosófica que considera Ludwig Feuerbach (1804-1872) procurou introduzir a dialética materialista, combatendo a doutrina hegeliana, que, a par de seu método revolucionário, concluía por uma doutrina eminentemente conservadora. Da crítica à dialética idealista, partiu Feuerbach à crítica da Religião e da essência do cristianismo. Feuerbach pretendia trazer a religião do céu para a Terra. Ao invés de haver Deus criado o homem à sua imagem e semelhança, foi o homem quem criou Deus à sua imagem. Seu objetivo era conservar intactos os valores morais em uma religião da humanidade, na qual o homem seria Deus para o homem. Adotando a dialética hegeliana, Marx, rejeita, como Feuerbach, o idealismo, mas, ao contrário, não procura preservar os valores do cristianismo. Na teoria marxista, o materialismo histórico pretende a explicação da história das sociedades humanas, em todas as épocas, através dos fatos materiais, essencialmente econômicos e técnicos.

A sociedade é comparada a um edifício, do qual as fundações, a infra-estrutura, seriam representadas pelas forças econômicas, enquanto o edifício em si, a superestrutura, representaria as idéias, costumes, instituições (políticas, religiosas, jurídicas, etc.). A propósito, Marx escreveu, na obra A Miséria da filosofia (1847) na qual estabelece polêmica com Proudhon:

As relações sociais são inteiramente interligadas às forças produtivas. Adquirindo novas forças produtivas, os homens modificam o seu modo de produção, a maneira de ganhar a vida, modificam todas as relações sociais. O moinho a braço vos dará a sociedade com o suserano; o moinho a vapor, a sociedade com o capitalismo industrial. Tal afirmação, defendendo rigoroso determinismo econômico em todas as sociedades humanas, foi estabelecida por Marx e Engels dentro do permanente clima de polêmica que mantiveram com seus opositores, e atenuada com a afirmativa de que existe constante interação e interdependência entre os dois níveis (infra e superestrutura) que compõem a estrutura social: da mesma maneira pela qual a infra-estrutura atua sobre a superestrutura, sobre os reflexos desta, embora, em última instância, sejam os fatores econômicos as condições finalmente determinantes. Luta de Classes Pretendendo caracterizar não apenas uma visão econômica da história, mas também uma visão histórica da economia, a teoria marxista também procura explicar a evolução das relações econômicas nas sociedades humanas ao longo do processo histórico.

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Haveria, segundo a concepção marxista, uma permanente dialética das forças entre poderosos e fracos, opressores e oprimidos, a história da humanidade seria constituída por uma permanente luta de classes, como deixa bem claro a primeira frase do primeiro capítulo d’O Manifesto Comunista:

Até hoje, a história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de corporação e companheiro, numa palavra, opressores e oprimidos, em constante oposição, têm vivido numa guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada; uma guerra que terminou sempre, ou por uma transformação revolucionária da sociedade inteira, ou pela destruição das suas classes em luta. Nas primeiras épocas históricas, verificamos, quase por toda parte, uma completa divisão da sociedade em classes distintas, uma escala graduada de condições sociais. Na Roma antiga encontramos patrícios, cavaleiros, plebeus, escravos; na Idade Média, senhores, vassalos, mestres, companheiros, servos; e, em cada uma destas classes, gradações especiais. A sociedade burguesa moderna, que brotou das ruínas da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classes. Não fez senão substituir novas classes, novas condições de opressão, novas formas de luta às que existiram no passado. Entretanto, a nossa época; a época da burguesia, caracteriza-se por ter simplificado os antagonismos de classes. A sociedade divide-se cada vez mais em dois vastos campos opostos, em duas grandes classes diametralmente opostas: a burguesia e o proletariado. As classes sociais são “os produtos das relações econômicas de sua época”. Assim, apesar das diversidades aparentes, escravidão, servidão e capitalismo seriam essencialmente etapas sucessivas de um processo único. A base da sociedade é a produção econômica. Sobre esta base econômica se ergue uma superestrutura, um estado e as idéias econômicas, sociais, políticas, morais, filosóficas e artísticas. Marx queria a inversão da pirâmide social, ou seja, pondo no poder a maioria, os proletários, que seria a única força capaz de destruir a sociedade capitalista e construir uma nova sociedade, socialista. Para Marx os trabalhadores estariam dominados pela ideologia da classe dominante, ou seja, as idéias que eles têm do mundo e da sociedade seriam as mesmas idéias que a burguesia espalha. O capitalismo seria atingido por crises econômicas porque ele se tornou o impedimento para o desenvolvimento das forças produtivas. A economia do futuro que associaria todos os homens e povos do planeta, só poderia ser uma produção controlada por todos os homens e povos. Para Marx, quanto mais o mundo se unifica economicamente mais ele necessita de socialismo.

Não basta existir uma crise econômica para que haja uma revolução. O que é decisivo são as ações das classes sociais que, para Marx e Engels, em todas as sociedades em que a propriedade é privada existem lutas de classes (senhores x escravos, nobres feudais x servos, burgueses x proletariados). A luta do proletariado do capitalismo não deveria se limitar à luta dos sindicatos por melhores salários e condições de vida. Ela deveria também ser a luta ideológica para que o socialismo fosse conhecido pelos trabalhadores e assumido como luta política pela tomada do poder. Neste campo, o proletariado deveria contar com uma arma fundamental, o partido político, o partido político revolucionário que tivesse uma estrutura democrática e que buscasse educar os trabalhadores e levá-los a se organizar para tomar o poder por meio de uma revolução socialista. Economia, a Teoria do Valor e a Mais-Valia Marx alterou alguns fundamentos da Economia Clássica, estabelecendo uma distinção entre valor de uso e valor de troca: Valor de Uso: Representa a utilidade que o bem proporciona à pessoa que o possui. Valor de Troca: Este exige um valor de uso, mas não depende dele. Tal como Ricardo, Marx acredita que o Valor de Troca depende da quantidade de trabalho despendida, contudo, a quantidade de trabalho que entra no valor de troca é a quantidade socialmente necessária (quantidade que o trabalhador gasta em média para produção da mercadoria, que obviamente, varia de sociedade para outra).

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Partindo da teoria do valor, exposta pelo economista inglês David Ricardo (1772-1823), Karl Marx, seu principal propugnador, postulou que o valor de um bem é determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário para sua produção. Segundo Marx, o lucro não se realiza por meio da troca de mercadorias, que se trocam geralmente por seu valor, mas sim em sua produção. Os trabalhadores não recebem o valor correspondente a seu trabalho, mas só o necessário para sua sobrevivência. Nascia assim o conceito da mais-valia, diferença entre o valor incorporado a um bem e a remuneração do trabalho que foi necessário para sua produção. Valor do Bem = quantidade de trabalho socialmente necessário para sua produção. Mais-valia = Diferença entre o valor incorporado a um bem e a remuneração do trabalho que foi necessário para sua produção.

Lucro Produção (não na troca) de mercadorias. A mais-valia não é uma característica exclusiva do capitalismo, mas o é a apropriação privada dessa mais-valia. A partir dessas considerações, Marx elaborou sua crítica do capitalismo numa obra que transcendeu os limites da pura economia e se converteu numa reflexão geral sobre o homem, a sociedade e a história. A Mais-Valia O operário só possui sua força de trabalho. Ele a oferece como mercadoria ao burguês (dono dos meios de produção), que a compra por uma determinada quantia em dinheiro (salário) para fazê-lo trabalhar durante certo período de tempo; 8 horas por dia, por exemplo. A partir do momento em que a compra, a força de trabalho do operário passa a pertencer ao burguês, que dispõe dela como quiser. O custo de manutenção da força de trabalho (operário, máquinas) constitui seu valor; a mais-valia é a diferença entre o valor produzido pela força de trabalho e o custo de sua manutenção. Para ficar mais fácil de entender, vamos estudar um exemplo. Suponhamos que um operário seja contratado para trabalhar 8 horas por dia numa fábrica de motocicletas. O patrão lhe paga 16 reais por dia, ou seja, 2 reais por hora, o operário produz duas motos por mês. O patrão vende cada moto por 3883 reais. Deste dinheiro, ele desconta o que gasta com matéria-prima, desgaste de máquinas, energia elétrica, etc.; exagerando bastante, vamos supor que esses gastos somem 2912 reais. Logo, sobram de lucro para o patrão 971 reais por moto vendida (3881 menos 2912 é igual a 971). Se o operário produz duas motos por

mês, ele produz, na verdade 1942 reais por mês (2x971). Se, num mês, ele trabalhar 240 horas, produzirá 8,1 reais por hora (1942 dividido por 240 horas). Portanto, em 8 horas de trabalho ele produz 64,8 reais (8,1x8) e ganha 16 reais. A mais-valia é exatamente o valor que o operário cria além do valor de sua força de trabalho. Se sua força de trabalho vale 16 reais e ele cria 64,8. A mais-valia que ele dá ao patrão é de 48,8 reais. Ou seja, o operário trabalha a maior parte do tempo de graça para o patrão! Das oito horas que o operário trabalha, ele só recebe 2 horas e seis minutos. O resto do tempo ele trabalha de graça para o capitalista. Esse valor que o patrão embolsa é o trabalho não pago. Ao patrão o que interessa é o aumento constante da mais-valia porque assim seus lucros também aumentam. Para fazer isso, o capitalista usa algumas formas básicas: aumentando ao máximo a jornada de trabalho (“mais-valia absoluta”), de modo que depois do operário ter produzido o valor equivalente ao de sua força de trabalho, possa continuar trabalhando muito tempo mais; esta forma de obter maior quantidade de mais-valia é muito conveniente ao capitalista porque ele não aumenta seus gastos nem em máquinas nem em locais e consegue um rendimento muito maior da força de trabalho. Por estes motivos, o estudo da sociedade deve partir, primeiramente, dessas condições materiais da vida, que ele chamava de meios de produção ou relações sociais de produção, e não das idéias dos grandes pensadores. Para Marx, a sociedade era definida pelas relações sociais de produção. Nas relações sociais, há uma interação, um contato (direto ou indireto) entre os indivíduos. Nas relações sociais de produção, o contato entre os indivíduos é determinado por um elemento central: a necessidade de produzir a vida social (riquezas, mercadorias, serviços, lucro, etc.). Basicamente, as relações de produção estão ligadas à atividade do trabalho. Weber, analisa o funcionamento da sociedade a partir de uma ação individual. Para Marx, isso era inconcebível. Não podemos entender uma ação individual sem antes entender todas as condições materiais da sociedade na qual aquele indivíduo está inserido. Na produção social da própria existência, os homens entram em relações determinadas e independentes de sua vontade; estas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A compreensão do processo histórico está ligada à compreensão destas relações sociais, que ultrapassam os indivíduos. Se adotarmos o modo de pensar dos homens de determinada sociedade como o único ponto de partida para entendê-la, não teremos uma compreensão suficiente de todas as suas determinações.

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Assim, para compreender o grau de desenvolvimento de uma sociedade, é necessário investigar suas relações de produção. Segundo Marx, na sociedade capitalista as relações sociais de produção definem dois grandes grupos dentro da sociedade: - De um lado, os capitalistas, que são aquelas pessoas que possuem os meios de produção (máquinas, ferramentas, capital, etc.) necessários para produzir as mercadorias, serviços, etc. - Do outro lado, os proletários (ou trabalhadores), aqueles que não possuem nada, a não ser o seu corpo e a sua disposição para trabalhar. Eles vendem a sua força de trabalho ao capitalista. A produção na sociedade capitalista só existe porque capitalistas e trabalhadores entram em relação. O capitalista paga ao trabalhador um salário fixo para que trabalhe para ele e, no final da produção, fica com o lucro. Para Marx, esse tipo de relação leva a uma exploração do trabalhador pelo capitalista (o que ele chama de alienação).

Charlie Chaplin, no filme “Tempos Modernos”: crítica às modernas técnicas de gerenciamento do trabalho e ao sistema capitalista. Por isso, Marx considerava que há um permanente conflito entre essas duas classes sociais, conflito que não era possível resolver dentro da sociedade capitalista. Muitos seguidores de Marx acreditavam que a única maneira de superar esse conflito e acabar com a exploração capitalista era a revolução proletária, uma revolta dos trabalhadores que transformaria toda a estrutura da sociedade. A ação do indivíduo também é determinada pela classe social à qual pertence. A burguesia age para manter o seu status e a sua condição financeira, assim como os trabalhadores agem para garantir a sua sobrevivência (já que não tem status para garantir). Dessa forma, numa greve, por exemplo, patrão e empregados que podiam até ser amigos, passam para lados opostos, já que têm interesses

diferentes. O indivíduo pode até compartilhar idéias e comportamentos de uma classe diferente da sua, mas nos momentos dos conflitos entre as classes, ficará do lado da classe à qual pertence. Um outro conflito que também determina a vida social é aquele que se dá entre as forças produtivas e das relações sociais de produção. Numa certa etapa de seu desenvolvimento, Marx acreditava que as forças produtivas materiais da sociedade entrariam em contradição com as relações de produção existentes.

Forças produtivas materiais

- o desenvolvimento tecnológico - as fontes de energia disponíveis

- a organização do trabalho coletivo - os processos de produção, etc.

CONTRADIÇÃO

Relações de produção

- o capitalista explora o trabalho do proletariado

(através da mais-valia) - trabalho assalariado

- a propriedade dos meios de produção não é coletiva, mas privada exclusivamente pelo capitalista

(mais-valia) Marx observava que as forças produtivas estava num acelerado processo de desenvolvimento técnico, enquanto as relações sociais de produção acentuavam o processo de exploração do trabalho assalariado. Para Marx, a atual etapa de desenvolvimento histórico das forças produtivas no capitalismo não eram mais motivo de desenvolvimento das relações sociais de produção. Eram, antes, um entrave. A História é constituída pelo movimento das forças produtivas, que entram em contradição, em certas épocas revolucionárias, com as relações de produção. Na contradição existente entre forças e relações de produção, uma classe social está associada às antigas relações de produção que constituem um obstáculo ao desenvolvimento das forças produtivas, enquanto que outra classe representa as novas relações de produção que favorecem o desenvolvimento dessas forças. A burguesia, para Marx, era a classe que constituía esse obstáculo ao desenvolvimento social da sociedade, e apenas uma revolução proletária mudaria essa situação. 4. O Comunismo e o Socialismo Socialismo A História das Idéias Socialistas possui alguns cortes de importância. O primeiro deles é entre os socialistas Utópicos e os socialistas Científicos,

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marcado pela introdução das idéias de Marx e Engels no universo das propostas de construção da nova sociedade. O avanço das idéias marxistas consegue dar maior homogeneidade ao movimento socialista internacional. Pela primeira vez, trabalhadores de países diferentes, quando pensavam em socialismo, estavam pensando numa mesma sociedade - aquela preconizada por Marx - e numa mesma maneira de chegar ao poder. Comunismo Marx considera tudo isso tarefa do movimento comunista. Para ele, havia chegado o tempo do: (...) comunismo como superação positiva da propriedade privada enquanto auto-alienação do homem e por isso como apropriação real da essência humana por meio de e para o homem; por isso, como regresso – perfeito, consciente e dentro da riqueza total do desenvolvimento até aqui –, do homem para si mesmo enquanto homem social, ou seja, humano. Esse comunismo é a verdadeira dissolução do antagonismo entre o homem e a natureza e entre o homem e o homem. A verdadeira solução do conflito entre liberdade e necessidade. Ele é o enigma decifrado da história, a verdadeira realização da essência do homem. Com o comunismo, “encerra-se a pré-história da sociedade humana” e inicia-se a sociedade “realmente humana”. Mas sobre como essa sociedade comunista deve ser, um programa político de como deve ser alcançado e como deve se estruturar a sociedade, Marx não nos dá maiores informações. As idéias básicas de Karl Marx estão expressas principalmente no livro O Capital e n'O Manifesto Comunista, obra que escreveu com Friedrich Engels, economista alemão. Marx acreditava que a única forma de alcançar uma sociedade feliz e harmoniosa seria com os trabalhadores no poder. Em parte, suas idéias eram uma reação às duras condições de vida dos trabalhadores no século XIX, na França, na Inglaterra e na Alemanha. Os trabalhadores das fábricas e das minas eram mal pagos e tinham de trabalhar muitas horas sob condições desumanas.

Marx estava convencido que a vitória do comunismo era inevitável. Afirmava que a história segue certas leis imutáveis, à medida que avança de um estágio a outro. Cada estágio caracteriza-se por lutas que conduzem a um estágio superior de desenvolvimento. O comunismo, segundo Marx, é o último e mais alto estágio de desenvolvimento. Para Marx, a chave para a compreensão dos estágios do desenvolvimento é a relação entre as diferentes classes de indivíduos na produção de bens. Afirmava que o dono da riqueza é a classe dirigente porque usa o poder econômico e político para impor sua vontade ao povo. Para ele, a luta de classes é o meio pelo qual a história progride. Marx achava que a classe dirigente jamais iria abrir mão do poder por livre e espontânea vontade e que, assim, a luta e a violência eram inevitáveis.

O marxismo foi extraordinariamente enriquecido pela experiência da revolução russa, pela criação de um partido de novo tipo e pelo desenvolvimento teórico do marxismo levado a cabo pelo gigantesco trabalho de Lênin, como pensador e como revolucionário, nas novas condições da fase imperialista do capitalismo e das revoluções socialistas triunfantes. Marxismo e leninismo são quase inseparáveis. Incessantemente enriquecido pelas novas experiências e pela constante elaboração teórica do movimento revolucionário, o marxismo-leninismo tornou-se o guia para a ação das forças políticas e sociais determinantes da época atual. De Marx e Lênin até aos dias de hoje, transformações profundas se deram no mundo. Criou-se e alarga-se o campo socialista que desempenha papel determinante na revolução mundial. O desenvolvimento do capitalismo, a construção do socialismo e o processo revolucionário mundial revelaram fenômenos novos e imprevistos, irregularidades e originalidades que exigem cotidianamente uma análise aprofundada.

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LEITURA COMPLEMENTAR

SOCIEDADE DO CONSUMO

Marcello Chamusca

Há pouco tempo atrás, a sociedade brasileira pôde contemplar perplexa um episódio onde a inversão de valores agregada à alienação cultural e ao consumismo imposto pelo capitalismo selvagem nos dias atuais, levou um jovem a um crime hediondo. Para adquirir um par de tênis, um adolescente de classe média, após ter discutido com a sua mãe, a assassinou com uma machadada na cabeça. Ao ser interrogado pelo delegado responsável pelo caso em questão, afirmou que matou a mãe porque ela não concordou em dar os trezentos e vinte reais necessários para matar o seu compulsivo desejo de comprar o objeto de consumo que lhe levaria ao êxtase do prazer naquele momento.

Ao se deparar com fatos como este, a sociedade começa a questionar uma série de valores que agregou a sua cultura ao longo do processo de globalização da economia e da mundialização da cultura, imposta ao mundo nos últimos anos como forma de democratização das informações, dos bens e valores, que desenraiza os cidadãos da sua verdadeira origem, levando-os ao processo de desconstrução da sua identidade e conseqüentemente ao paradigma de pós-modernidade e da serialização dos estilos e comportamentos, que via de regra, determinam a orientação de cada um dentro do seu grupo social ou organização.

Isso também leva antropólogos, sociólogos, psicólogos e estudiosos do comportamento humano em geral a empreenderem pesquisas das mais diversas sobre os possíveis motivos que levam um homem pelo simples prazer de consumir um objeto, matar a sua própria mãe.

Cada dia que passa se desenvolvem técnicas mais refinadas para levar as pessoas a acreditarem que precisam consumir aquilo que elas de fato não precisam. Os profissionais de Publicidade têm levado as pessoas ao consumo exagerado de produtos e/ou serviços dos mais diversos, buscando atingir o centro das suas fraquezas humanas, desestabilizado-as e forçando-as a comprar objetos que em nada acrescentarão ao seu crescimento pessoal, social, cultural e muito menos como cidadão participante de uma comunidade, um grupo, uma sociedade.

É preciso ter muito cuidado para discernir a questão da dimensão do consumo necessário, para garantir a qualidade de vida buscada por todos e o consumismo exacerbado, desnecessário e patológico. Existe uma linha tênue que limita essas duas coisas. O bom senso é com toda certeza a melhor proteção para estas armadilhas do Marketing e da Publicidade, que envolvem as pessoas nos seus teatros da vida real onde “você é a caça e o mercado, o caçador”. O poder de persuasão é tanto, que uma empresa de telefonia celular na sua campanha institucional faz com que acredite que está des-sintonizado do mundo simplesmente por que o seu celular é apenas um celular e não um “OI”, por exemplo. A publicidade é feita para lhe constranger a consumir um produto sob pena de ser banido do grupo social que freqüenta e conseqüentemente ser marginalizado por ele. Neste momento, passa-se a dar importância ao “Ter”, que é símbolo de poder e de destaque em detrimento do “Ser” que deveria ser o norteador das relações humanas, pois é onde a individualidade, a singularidade e a pluralidade do ser humano se tornam visíveis e palpáveis, mas, ao invés disso o que se verifica é exatamente o contrário. Enfatizam-se os padrões impostos pela mídia descriminando grupos de afinidade padronizados como os “mauricinhos”, “pagodeiros”, etc.

A sociedade capitalista se torna cada dia mais feroz e perigosa. São realizadas verdadeiras lavagens cerebrais no público consumidor, levando-o as vezes a relacionar uma marca com o nome do produto. Um exemplo disto é a esponja de aço, que poucas pessoas se referem a ela como esponja de aço e sim como Bom Bril, quando na realidade é apenas uma marca que produz o produto. Outro exemplo é o grampo de cabelo. Quem nunca viu alguma mulher perguntar a outra se tem um Miss para prender o cabelo? ou quando menstruada afirmar que está usando um Modess?, quando na realidade está

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usando um absorvente higiênico de outra marca que não Modess. A água sanitária é também pouquíssimas vezes chamada pelo nome verdadeiro e sim pelo “apelido” de K-Boa, e assim pode-se citar uma infinidade de marcas que povoam o senso e o conhecimento popular apresentando-se como sinônimo do produto que produz.

A globalização da economia é responsável também pela chegada das novas tecnologias, que trazem consigo muitos benefícios e em contraponto muitos aspectos negativos. Como benefícios, as novas tecnologias trazem a automatização e mecanização das atividades profissionais operacionais, que ajuda muito na agilidade, objetividade e qualidade dos mesmos; a informação internacional em tempo real, é possível se saber no Brasil sobre uma notícia do Japão no mesmo segundo que está sendo apresentada lá; na democratização do conhecimento, pois todos, através da Internet têm acesso ao que a comunidade científica está produzindo em todo o mundo, é claro que há o entrave da língua, mas, vencida esta etapa, tudo se torna disponível. Mas, por outro lado, é mais um fator de exclusão e descriminação para boa parte da sociedade, afinal, o uso empírico destas tecnologias torna-se obrigatório para um bom desempenho profissional e pressionado pelos novos conceitos de qualificação determinados pela cultura mundializada da excelência na prestação dos serviços, mas uma vez o cidadão é forçado a consumir. Sejam celulares de ultima geração, micro-computadores, aparelhos DVD ou qualquer outra “engenhoca” do mundo pós-moderno, por mais que as pessoas relutem, terminam por se colocar em situações em que será necessário o uso das suas funções, seja para auxiliar na qualidade do processo produtivo, para acelerar procedimentos profissionais, ou até mesmo para determinar a imagem da empresa ou profissional diante do público alvo, que entende por qualidade, tecnologia de ponta, pois assim foi vinculada ao grande público: tecnologia é igual a qualidade e produtividade.

Todos esses fatores se dão, devido ao mundo hoje estar muito ligado a estética. Os jovens atualmente julgam e são julgados pelo tênis, relógio, celular, roupas e outros acessórios que estão usando. Não se leva em consideração a funcionabilidade dos objetos e sim o status que eles podem representar. Ao comprar um relógio, por exemplo, não se privilegiará a resistência, a durabilidade, as funções práticas daquele objeto e sim a beleza e a grife que ele representa. O detalhe é que independentemente da qualidade, quanto mais caro for aquele relógio mais próximo do ideal para o consumo ele está.

No mercado cultural observa-se questões desta ordem a todo instante. Como a idéia central é vender não importando as conseqüências que o produto daquela venda pode resultar, nota-se cada vez mais o esvaziamento dos conteúdos dos projetos e a ênfase nos conceitos da cultura mundializada, trazendo quase sempre ao cotidiano dos consumidores desta cultura as facilidades do não-raciocínio, do não-compromisso em detrimento da construção de uma formação cultural rica e diversificada, baseada em resgates e ideais históricos da sua sociedade. Conseqüentemente o desenvolvimento humano torna-se subestimado e via de regra é desprezado.

São esses valores, bastante questionáveis, que o mundo capitalista globalizado tem fomentado na sociedade, direcionando suas estratégias e condicionando todas as expectativas de expansão, levando sempre em consideração a busca incessante do ser humano pela utopia da felicidade plena. Essa infindável luta que se constitui na procura de realização dos seus projetos pessoais é objeto de investidas constantes do mercado através do Marketing e da Publicidade.

Para dar conta de toda essa necessidade de construção de um modelo de felicidade que viesse trazer de fato acomodação aos anseios e expectativas da maioria das pessoas, surgiram os shoppings centers. São os “paraísos” do consumo. São ambientes lúdicos, estrategicamente pensados, desenvolvidos e estruturados para seduzirem, instigarem e desestabilizarem o mais seguro dos homens no sentido de levar ao consumo do supérfluo e mais ainda, á idéia de que ser feliz passa necessariamente por gastar o máximo de dinheiro possível na compra dos objetos que o leva a momentos agradáveis, seja sozinho, acompanhado de familiares ou pessoas que ama. Ambiente extremamente propício para o desenvolvimento de patologias com causas muitas vezes desastrosas como o do exemplo citado acima em que um adolescente mata a própria mãe pela necessidade do consumo. Neste momento, percebe-se mais claramente a necessidade de uma intervenção imediata das instituições que participam de forma direta e indireta da formação do caráter e da personalidade das crianças e adolescentes. É necessária uma preocupação precoce da Família no sentido de oferecer orientação em relação aos perigos eminentes do consumismo, bem como a Escola deve ter um papel importantíssimo nesse universo de informações que compõem a formação da criança e do adolescente, dando a sua contribuição de forma efetiva e consistente através de intervenções

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sistemáticas de desestímulos ao consumismo e concomitantemente estímulos ao realismo e conscientização, realizando tudo isso, com sabedoria e inteligência não só em campanhas institucionais, mas introduzindo os temas nos conteúdos programáticos de cada disciplina, levando-os a pensarem e agirem dentro de uma postura politicamente correta, criando assim, positivamente cidadãos voltados as necessidades reais, e conscientes do seu papel dentro da sua comunidade, do seu bairro, seu grupo, enfim, do seu contexto social. Tudo isso ajudaria a resgatar o lugar de formadora de opinião que é sem dúvida um dos principais objetivos da Escola enquanto instituição e que infelizmente em muitos momentos percebe-se um esvaziamento desta essência através da sua ausência dentro deste processo.

Os jovens são sem dúvida as principais vítimas da sociedade capitalista de consumo, mas os estrategistas que fazem parte deste contexto, não deixam brecha em nenhum segmento da sociedade. Existem estratégias comunicacionais para conquista de cada um desses segmentos, que são tratados como nichos mercadológicos. Para esses nichos, através de pesquisas de opinião e de expectativa, são elaborados cuidadosamente e especialmente para serem oferecidos, toda sorte de produtos e serviços que satisfaçam o gosto e o desejo de cada um dos membros deste segmento. Hoje, há peças publicitárias para conquista de idosos, gordos, negros e afro-descendentes, etc. Ninguém está livre de ser acometido por uma febre de consumismo em algum momento da sua vida. Contudo, para que o cidadão esteja livre de uma situação desta natureza, é preciso que esteja atento as suas necessidades reais, buscando com muita clareza definir suas prioridades, estabelecendo parâmetros, definindo o que pra ele significa qualidade de vida e o que é apenas supérfluo, que não agregará valores a sua vida e a vida da sua família, para então, poder traçar uma meta e procurar, dentro da medida do possível segui-la, não deixando brechas para que ondas de consumismo destrua o seu castelo de areia tão bem planejado e construído dentro do mais rigoroso padrão de qualidade, o seu prazer em viver.

Diante de todas essas questões, conclui-se que a busca infinita do homem pela felicidade é a sua maior fraqueza e que a mídia, através das técnicas de Marketing e Publicidade, conseguem aproveitar-se dela trazendo e agregando ao mercado consumidor capitalista não apenas consumidores, mas seguidores, como aqueles fieis das seitas mais radicais, transformando seres humanos em máquinas de consumir e levando o homem a acreditar que alcançará a tão sonhada felicidade plena através do consumo do objeto desejado. Ledo engano dos que pensam que serão felizes através do consumo. Pois, a vida é constituída de momentos, bons e maus, e as oscilações financeiras pelas quais todos atravessam ao longo da sua existência, não podem ser fator condicionante determinante da sua felicidade.

O apelo as instituições formadoras e transformadoras do caráter humano, a Família e a Escola, é neste momento um brado inconsciente da sociedade que pede socorro através da violência urbana e das inversões de seus valores morais e éticos.

Se for necessário ao ser humano uma utopia para viver, que seja ela a de achar que é possível acreditar na união de todas as nações em torno da paz mundial.

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MÓDULO TEMÁTICO 3 - SOCIOLOGIA

CULTURA E SOCIEDADE

1. Cultura e Antropologia A Antropologia é a ciência que promove o estudo do homem como ser biológico, social e cultural. Sendo cada uma destas dimensões por si só muito ampla, o conhecimento antropológico geralmente é organizado em áreas como a “Antropologia Física ou Biológica” (aspectos genéticos e biológicos do homem), “Antropologia Social” (organização social e política, parentesco, instituições sociais), “Antropologia Cultural” (sistemas simbólicos, religião, comportamento) e “Arqueologia” (condições de existência dos grupos humanos desaparecidos). Além disso, podemos utilizar termos como Antropologia, Etnologia e Etnografia para distinguir diferentes níveis de análise ou tradições acadêmicas. Para o antropólogo Claude Lévi-Strauss, a etnografia corresponde “aos primeiros estágios da pesquisa: observação e descrição (trabalho de campo)”. A etnologia, com relação à etnografia, seria “um primeiro passo em direção à síntese” e a antropologia “uma segunda e última etapa da síntese, tomando por base as conclusões da etnografia e da etnologia”. Qualquer que seja a definição adotada, é possível entender a antropologia como uma forma de conhecimento sobre a diversidade cultural, isto é, a busca de respostas para entendermos o que somos a partir da comparação com o “outro”, com o diferente de nós. O Conceito Antropológico de Cultura Por influência do darwinismo, no início da antropologia social, o projeto de dar conta da diversidade cultural levou naturalistas e historiadores a debruçarem-se sobre os relatos de viajantes. Exploradores e administradores coloniais falavam sobre “comportamentos exóticos” das sociedades “inferiores”, mais “simples” e “incivilizadas”. Nesse período, o pesquisador julgava as sociedades pesquisadas como inferiores porque o seu parâmetro de comparação era pautado numa visão industrial da técnica, ou seja, a sociedade era desenvolvida e civilizada se desenvolvesse tecnologia no patamar colocado pelas sociedades capitalistas. O relativo isolamento geográfico destas sociedades e povos também contribuiu para esta visão. Assim, a Antropologia Social ficou vista como “ciência das sociedades primitivas”. Mas com a persistência destas sociedades em resistirem até a atualidade de forma bastante diferente da tradição européia, colocou um

problema crucial para esta visão evolucionista da diversidade humana. Afinal, porque, mesmo em contato com os povos ocidentais, tais culturas não “evoluíram”. O próprio conceito de evolução cultural foi colocado em questão. A partir dos próprios resultados das pesquisas sobre povos com “culturas diferenciadas”, voltaram-se para sub-grupos ou sub-culturas no interior das sociedades “complexas” e “civilizadas”: “comunidades camponesas”, grupos marginalizados nas regiões urbanas e grupos pertencentes às classes populares e altas da sociedade moderna. Tais estudos culminaram por desembocar em crítica da visão de mundo ocidental etnocentrista, pois via que o comportamento dito estranho e exótico existia também dentro da cultura dita superior. A noção de cultura é o que separava o determinismo biológico “racial” das manifestações de comportamento aprendidas pelos indivíduos. Para o determinismo biológico “racial”, a raça determinam o comportamento dos indivíduos de um determinado grupo social. O conceito de “raça” era usado para justificar o domínio sobre escravos, por exemplo, uma vez que se um povo era racialmente inferior, poderia ser escravizado sem problemas.

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Estes aspectos eram considerados então como de ordem “biológico” ou “genético” no debate das relações entre raça e cultura. O antropólogo Edward Tylor (1832-1917) foi um dos primeiros a definir o conceito de cultura fora da visão biologista e geneticista da época, sem considerar o conceito de “raça”:

CULTURA é o todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade. A título de complementação, apresentaremos o seguinte conceito de cultura: CULTURA é todo complexo de interações sociais que inclui hábitos, costumes, valores, crenças, leis, arte e toda capacidade que pode ser adquirida (assimilada) pelo indivíduo na vida social. Esse complexo é transmitido de uma geração à outra e, nesse processo de transmissão, alguns elementos da cultura podem se perder ou simplesmente ganhar novos contornos dados pelas novas gerações. Para o a antropologia atual, cultura é um sistema simbólico. Ela estuda o que considera uma característica fundamental e comum a toda sociedade: atribuir, de forma sistemática e estruturada, significados e sentidos “às coisas do mundo”.

Assim, uma cultura seria diferente de outra porque atribui sentido diferente às coisas e situações sociais. Cada cultura observa, separa, pensa e classifica, atribuindo uma ordem ao mundo, de uma maneira específica. Cabe à antropologia compreender o “sistema simbólico” de cada sociedade e sua diversidade nas sociedades humanas. Um bom exemplo desse conceito pode ser observado no filme “Os deuses devem estar loucos” (1980). Em pleno deserto de Kalahari, no Botswana, junto à África do Sul, um avião sobrevoa tranquilamente os céus africanos. Um dos seus tripulantes lança, inadvertidamente, uma garrafa de Coca Cola – daquelas de vidro, bojudas no meio e estreitas no gargalo e com as letras da marca bem impressas - símbolo da moderna civilização de consumo deste final de século. Por perto, brinca um grupo de crianças. Com a curiosidade que lhes é característica, deslocam-se, rapidamente, ao local, a fim de observarem e apanharem o estranho objeto. De início, a garrafa faz as delícias das crianças e dos adultos: apreciam-na, viram-na, reviram-na, inventam-lhe múltiplas e variadas utilidades para o seu uso, e divertem-se com a sua presença. No entanto, passado algum tempo, esta simples e inofensiva garrafa de Coca-Cola começa a ser disputada e a tornar-se alvo de sérias querelas no seio do grupo, despertando sentimentos de posse e invejas. Para a tribo que a encontra, a garrafa é interpretada como uma mensagem de natureza sagrada. A Interpretação das Culturas O antropólogo estadunidense Clifford Geertz (1926-2006) dedicou sua vida profissional à análise antropológica das dimensões culturais da política, da religião e dos costumes sociais. Para realizar tal análise, Geertz se apoiou em vários exemplos, que vão desde a etnografia da briga de galos Balinense, até a análise dos sistemas de casamento em parentesco europeus medievais. No âmbito destes estudos, percebeu que, como “estrutura estruturante” na organização das sociedades está a cultura. Cultura é definida por Geertz como:

um sistema cultural de organização (e controle) das coletividades, sistema este pautado em um mecanismo de apreensão do poder por meio da posse dos signos de poder (por parte dos que controlam as altas esferas sociais) e da submissão dos membros de uma comunidade política a tais signos.

Para que esta submissão ocorra, a cultura é a mediação entre o poder e o objeto de sua ação. Isto é possível, pelo fato de que, segundo Geertz, na Antropologia o conceito de cultura sofre uma revisão e passa a ser visto como: “um padrão de significados transmitidos historicamente,

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incorporado em símbolos e materializado em comportamentos”. Geertz ainda fez importantes reflexões sobre o impacto da cultura na natureza animal do homem, ou seja, em como a formação cultural do homem alterou seu modo natural de ser. Sobre isso, ele diz: “O crescimento lento, constante, quase glacial da cultura através da Era Glacial alterou o equilíbrio das pressões seletivas para o Homo em evolução, de forma tal a desempenhar o principal papel orientador em sua evolução. O aperfeiçoamento das ferramentas, a adoção da caça organizada e as práticas de reunião, o início da verdadeira organização familiar, a descoberta do fogo e, o mais importante, (...) o apoio cada vez maior sobre os sistemas de símbolos significantes (linguagem, arte, mito, ritual) para a orientação, a comunicação e o autocontrole, tudo isso criou para o homem um novo ambiente ao qual ele foi obrigado a adaptar-se. (...) Somando tudo isso, nós somos animais incompletos e inacabados que nos completamos e acabamos através – não da cultura em geral, mas através de formas altamente particulares de cultura; dobuana e javanesa, Hopi e italiana, de classe alta e classe baixa, acadêmica e comercial”.

GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas.

2. A Escola de Frankfurt A Indústria Cultural impede a formação de indivíduos autônomos, independentes, capazes de julgar e de decidir conscientemente.

Theodor Wiesengrund-Adorno (1903-1969) O Instituto de Pesquisa Social A chamada Escola de Frankfurt era, na verdade, o Instituto para Pesquisa Social de Frankfurt (Institut für Sozialforschung) da Universidade de Frankfurt-am-Main na Alemanha. O instituto tinha sido fundado com o apoio financeiro do mecenas judeu Felix Weil em 1923. Em 1931, Max Horkheimer

tornou-se diretor do Instituto. É a partir da gestão de Horkheimer que se desenvolve aquilo que ficou conhecido como a Teoria Crítica da Sociedade, comumente associada à Escola de Frankfurt. Com a chegada de Hitler ao poder na Alemanha, os membros do Instituto, na sua maioria judeus, migraram para Genebra, depois a Paris e finalmente, para a Universidade de Columbia, em Nova Iorque. A primeira obra coletiva dos frankfurtianos são os Estudos sobre Autoridade e Família, escritos em Paris, onde estes fazem um diagnóstico da estabilidade social e cultural das sociedades burguesas contemporâneas. Nestes estudos, os filósofos põem em questão a capacidade das classes trabalhadoras em levar a cabo transformações sociais importantes. Esta desconfiança, que os afasta progressivamente do marxismo "operário", se consuma na Dialética do Esclarecimento de 1947, publicado em Amsterdã onde o termo marxismo já se encontra quase ausente. Em 1949-1950 publicam os Estudos sobre o Preconceito que representa uma inovação significativa nas metodologias de pesquisa social, embora de pouca significação teórica. Com Erich Fromm e Herbert Marcuse inicia-se uma frente de trabalho que associa a Teoria Crítica da Sociedade à psicanálise. Fromm, precursor desta frente de trabalho, logo se distancia do núcleo da Escola, e este perde o interesse pela Psicanálise até o início dos trabalhos de Marcuse. Marcuse, que permanece nos EUA após o retorno do Instituto para a Alemanha em 1948, foi o mais significativo dos frankfurtianos, do ponto de vista das repercussões práticas de seu trabalho teórico, já que teve influência notável nas insurreições anti-bélicas e nas revoltas estudantis de 1968 e 1969. Adorno continuará o trabalho iniciado na Dialética do Esclarecimento, de reformulação dialética da razão ocidental, em sua Dialética Negativa, sendo considerado ainda hoje, o mais importante dos filósofos da Escola. Com a sua morte, começa o que alguns chamam de segundo período da Escola de Frankfurt, tendo como principal articulador o antes assistente de Adorno e, depois, seu crítico mais ferrenho: Jürgen Habermas. A Indústria Cultural Adorno, em parceria com Horkheimer e outros filósofos contemporâneos, está inserido num trabalho muito árduo: pensar filosoficamente a realidade social vigente na Alemanha. A realidade em que vivia estava sofrendo várias transformações, principalmente, na dimensão econômica. O Comércio tinha se fortalecido após as revoluções industriais, ocorridas na Europa e, com isso, o Capitalismo havia se fortalecido definitivamente, principalmente, com as novas

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descobertas cientificas e, conseqüentemente, com o avanço tecnológico. Tal avanço, para eles, teve como conseqüência trágica a perda da autonomia do homem (uma vez que agora ele dependia enormemente da máquina). Uma outra conseqüência dessa perda de autonomia foi a desumanização da própria humanidade. Em outras palavras, Adorno contemplava uma geração de homens “doentes”. O domínio da razão humana, que no Iluminismo era como uma doutrina, passou a dar lugar para o domínio da razão técnica. Os valores humanos haviam sido deixados de lado em troca do interesse econômico. O que passou a reger a sociedade foi a lei do mercado, e com isso, quem conseguisse acompanhar esse ritmo e essa ideologia de vida, talvez, conseguiria sobreviver; aquele que não conseguisse acompanhar esse ritmo e essa ideologia de vida ficava a mercê dos dias e do tempo, isto é, seria jogado à margem da sociedade. Nessa corrida pelo ter, nasce o individualismo, que, segundo o nosso filósofo, é o fruto de toda essa Indústria Cultural. Segundo Adorno, na Indústria Cultural, tudo se torna negócio. Enquanto negócios, seus fins comerciais são realizados por meio de sistemática e programada exploração de bens considerados culturais.

Um exemplo disso, dirá ele, é o cinema. O que antes era um mecanismo de lazer, ou seja, uma arte, agora se tornou um meio eficaz de manipulação ideológica e emocional. Portanto, podemos dizer que a Indústria Cultural traz consigo todos os elementos característicos do mundo industrial moderno e nele exerce um papel especifico, qual seja, o de portadora da ideologia dominante, a qual outorga sentido a todo o sistema. É importante salientar que, para Adorno, o homem, nessa Indústria Cultural, não passa de mero instrumento de trabalho e de consumo, ou seja, objeto. O homem é tão bem manipulado e ideologizado que até mesmo o seu lazer se torna uma extensão do trabalho. Portanto, o homem ganha um coração-máquina. Tudo que ele fará, fará segundo o seu coração-máquina, isto é, segundo a ideologia dominante. A Indústria Cultural, que tem com guia a racionalidade técnica esclarecida, prepara as mentes para um esquematismo que é oferecido pela indústria da cultura. O consumidor não precisa se dar ao trabalho de pensar, é só escolher entre as opções dadas. É a lógica do clichê. Esquemas prontos que podem ser empregados indiscriminadamente só tendo como única condição a aplicação ao fim a que se destinam.

Um exemplo de esquematismo na TV brasileira são as telenovelas. Apela para esquemas que desobrigam o telespectador de interpretar com mais profundidade o que está assistindo. Tais esquemas são usados: - na caracterização das personagens (identificação imediata do vilão/vilã, do mocinho/mocinha, do oportunista, do inocente, do rico, do pobre, etc.); - na condução da história (no fim, o bem sempre vence; o casamento é a solução natural dos relacionamentos; as pessoas vencem pelo esforço, não pela sorte ou pela procedência; o mal deve ser exemplarmente punido - morrer, ficar louco, ficar pobre, solidão, etc.); Isso não quer dizer que toda novela siga sempre o mesmo esquema (ou mesmo que tais esquemas não mudem com o passar do tempo). Entretanto, a história das telenovelas tem mostrado que produções que fogem desses esquemas consagrados costumam ver a sua audiência (o índice supremo de avaliação de uma programa de televisão comercial) cair sensivelmente.

O consumidor insatisfeito

Nada escapa a voracidade da Indústria Cultural. Toda vida (cultura) torna-se replicante (passível de ser reproduzida, ou seja, copiada e distribuída para milhões). Ao fazer isso, a Indústria Cultural revela sua intenção: obscurecer a percepção de todas as pessoas, principalmente, daqueles que são formadores de opinião. Ela é a própria ideologia. Os valores passam a ser regidos por ela. Até mesmo a felicidade do individuo é influenciada e condicionada por essa cultura industrializada.

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É importante frisar que a grande força da Indústria Cultural se verifica em proporcionar ao homem necessidades. Mas, não aquelas necessidades básicas para se viver dignamente (casa, comida, lazer, educação, e assim por diante) e, sim, as necessidades do sistema vigente (consumir incessantemente). Com isso, o consumidor viverá sempre insatisfeito, querendo, constantemente, consumir. E o campo de consumo se torna cada vez maior. Tal dominação, como diz Max Jimeenez, importante comentador de Adorno, tem sua mola motora no desejo de posse constantemente renovado pelo progresso técnico e científico, e sabiamente controlado pela Indústria Cultural. Um bom exemplo desse tipo de controle é o efetuado pela indústria do entretenimento eletrônico, atualmente. A informática (tanto na área dos softwares quanto dos hardwares) cria, incessantemente, novas tecnologias gerando novas necessidades. O consumidor se vê obrigado a consumir novos produtos, novas tecnologias, novas formas de entretenimento. Como o mercado se renova incessantemente e em grande velocidade, o consumo de produtos culturais eletrônicos é, aparentemente, uma fonte inesgotável, proporcionando lucros inimagináveis a esse tipo de indústria. Nesse sentido, o universo social, além de configurar-se como um universo de “coisas” (e não de pessoas), constituir-se-ia num espaço hermeticamente fechado. Ou seja, não teríamos a opção de fugir desse estado de coisas. As alternativas são aderir (virando um consumidor assíduo) ou ser excluído do consumo através da marginalização e miséria econômica. Todas as tentativas de se livrar desse engodo estão condenadas ao fracasso. Tal visão aparentemente “pessimista” da realidade encontra uma saída ou alternativa bem abrangente oferecida por Adorno. Para ele, existe uma saída e esta se encontra na própria cultura do homem: a limitação do sistema e a estética. Na Teoria Estética, obra que Adorno tentará explanar seus pensamentos sobre a salvação do homem, dirá ele que não adiante combater o mal com o próprio mal. Exemplos disso ocorreram no nazismo e em outras guerras. Segundo ele, a antítese mais viável da sociedade industrial selvagem é a Arte. A Arte, para ele, é que liberta o homem das amarras dos sistemas e o coloca com um ser autônomo, e, portanto, um ser humano. Enquanto para a Indústria Cultural o homem é mero objeto de trabalho e consumo, na arte é um ser livre para pensar, sentir e agir. A arte é como se fosse algo perfeito diante da realidade imperfeita. Além disso, para Adorno, a Indústria Cultural não pode ser pensada de maneira absoluta: ela possui uma origem histórica e, portanto, pode desaparecer.

Por fim, podemos dizer que Adorno foi um filósofo que conseguiu interpretar o mundo em que viveu, sem cair num pessimismo. Ele pôde vivenciar e apreender as amarras da ideologia vigente, encontrando dentro dela o próprio antídoto: a arte e a limitação da própria Indústria Cultural. Portanto, os remédios contra as imperfeições humanas estão inseridos na própria história da humanidade. É preciso que esses remédios cheguem a consciência de todos (a filosofia tem essa finalidade), pois, só assim, é que conseguiremos um mundo humano e sadio. Análise da Indústria Cultural A Indústria Cultural é fruto da sociedade industrializada, de tipo capitalista liberal. Mais especificamente, porém, a indústria cultural concretiza-se apenas numa segunda fase dessa sociedade, a que pode ser descrita como a do capitalismo de organização (ou monopolista) ou, ainda, como sendo a sociedade dita de consumo. Considerada ainda como condição para a existência dessa Indústria uma oposição entre a cultura dita superior e a de massa, apesar dos equívocos envolvidos nessa divisão. Admitida essa divisão, pode-se falar na existência de uma cultura superior, outra média (midcult) e uma terceira, de massa (masscult, inferior). A segunda distingue-se da terceira, basicamente, por sua pretensão de apresentar produtos que se querem superiores, mas que são, de fato, formas bem acabadas e aperfeiçoadas daqueles.

No cenário da música brasileira, a cantora Adriana Calcanhoto seria um bom exemplo de Midcult (forma desbastada da Masscult).

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Ao passo que a masscult se contenta com o fornecer produtos sem qualquer pretensão ou álibi cultural. É possível ainda, estabelecer-se uma oposição entre a cultura popular, entendida como soma dos valores ancestrais de um povo, e a cultura dita pop, outra designação de cultura de massa. Os mesmos excessos de valorização da cultura superior, diante da de massa, também são encontrados na defesa da popular diante da pop. Com seus produtos, a Indústria Cultural pratica o reforço das normas sociais, repetidas até a exaustão sem discussão. Em conseqüência, uma outra função: a de promover o conformismo funcional. Indústria Cultural no Brasil A indústria cultural no Brasil apresenta-se marcada pelos traços mais evidentes e grotescos do comercialismo em particular e do capitalismo em geral. Os poucos veículos de massa subtraídos ao mercantilismo, também se caracterizam pela existência de estímulos à atividade crítica. Ao contrário do que ocorre em emissoras de outro países controladas também pelo governo (como as da França, Inglaterra e Itália), as do Brasil não têm nenhuma liberdade de movimentação em relação ao governo que as suporta, e qualquer veleidade no sentido de estimular a reflexão crítica é sumariamente podada. Nossa indústria cultural está bastante voltada para temas, assuntos e culturas estrangeiras, particularmente a norte-americana. No rádio, são as músicas estrangeiras; na TV, os “enlatados” e, na imprensa escrita, as notícias sobre o exterior são veiculadas com grande destaque, enquanto que as nacionais são banalizadas. A dialética nacional x estrangeiro não deve e não pode ser evitada, hoje. O único problema é que deve ser realmente uma dialética - um jogo entre opostos onde ambos os elementos de partida são anulados na direção de um terceiro, novo - e não o predomínio de um sobre o outro. Um desses traços é relativo à homogeneização da cultura através da indústria cultural. No Brasil, porém, a cultura formada pela indústria cultural está longe de ser homogênea. As desigualdades gritantes na divisão da renda nacional impedem que se fale na existência, de uma sociedade de consumo; há bolsões de consumo, em certas regiões, ao lado de grupos voltados para o subconsumo e de outros entregues ao desespero da simples sobrevivência. Assim, mesmo que a indústria cultural tenda a veicular uma cultura só para toda a sua audiência, a disparidade entre os receptores é tamanha que essa cultura, embora tendendo para a uniformidade, não pode deixar de apresentar vertentes diversas. A indústria cultura apresenta,

assim, fatias mais populares, ou popularescas, e fatias mais eruditas, ou “erudicizantes”. De um lado, na TV, são programas como os do “Sílvio Santos, Mega Tom, Raul Gil; e outro, os Concertos Internacionais e os raros programas de entrevistas ou debates, além dos sempre abordados e eternamente retomados “Teatros na TV” A heterogeneidade da indústria cultura brasileira explica outro traço específico seu, que a permanência do grotesco. Diz-se que uma conseqüência da indústria cultura é o fato de ela tender para a eliminação do grotesco das manifestações culturais na medida em que aspira às formas ditas superiores. Entre nós a indústria cultural instalou-se não propriamente eliminando a cultura popular, mas sobrepondo-se a ela, permeando-a – e a cultura popular, no Brasil (mas não somente aqui) é freqüentemente tecida sobre o grotesco, o chulo, o “cafajéstico”. A reação de repúdio do público brasileiro diante do filme nacional – do qual se dizia, e se diz, que era exatamente “grotesco” e “cafajeste “ é um exemplo. Um outro traço da indústria cultura brasileira a ser destacado é o relativo à permeação da cultura dela resultante por elementos de culturas e o conseqüente fato de essa cultura da indústria cultural não tratar, como se afirma, de temas do cotidiano. Em relação a este último ponto, diz-se que a indústria cultural brasileira é, basicamente, a indústria do divertimento, da distração, e não da reflexão sobre o que acontece na vida diária. Deve-se observar ainda que não estamos distante assim dos temas do dia-a-dia e que ela se apresenta mesmo, guardadas as proporções, como instrumento de combate contra aquela parte dela mesma voltada para a cultura estrangeira. Na verdade, é necessário reconhecer que, pôr mais imbecilizantes que possam ser, programas como os das novelas têm tudo para atrair grandes parcelas da população (mesmo as que, nominalmente pelo menos, possuem formação universitária) quando comparados com o cinema, particularmente o estrangeiro. A novela da TV (mas não só ela, o programa do Raul Gil também, e ainda as transmissões esportivas, entre outras) traz sim, os elementos da vida comum. Pode fazê-lo de modo alienado e alienante - e é isto que cabe resolver. Mas importa notar que mesmo uma indústria cultural “colonizada”, como se diz, acaba pôr vincular-se à realidade cultural do país. E isto não pôr idealismo, mas porque ela precisa vender seus produtos e, para tanto, precisa usar como chamariz algo que chegue mais perto das pessoas. E o grau de alimentação com que o faz é bastante variável. Nem sempre é um grau elevado e nem sempre é tão forte. Para a maioria dos estudiosos da indústria cultural, pouco ou nada se pode esperar dela no sentido da libertação do homem. Nem de seus

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veículos isoladamente tomados, como a TV. Para esses, nenhuma modificação resulta positiva (como a reforma da programação da indústria cultural) se não for precedida de ampla reforma ou revolução estrutural da sociedade. O fundamental no problema da comunicação e da indústria cultural não está nem na questão quantitativa, nem na questão da natureza ou conteúdo da mensagem divulgada, mas na estrutura mental e psíquica dos indivíduos receptores dessas informações.

3. Etnocentrismo e Relativismo Cultural Etnocentrismo é uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência. No plano intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como sentimentos de estranheza, medo, hostilidade, etc. No etnocentrismo se misturam a) elementos intelectuais e racionais e b) elementos emocionais e afetivos. Estes dois planos do espírito humano (sentimento e pensamento) vão compondo um fenômeno não apenas fortemente presente na história das sociedades, como também facilmente encontrável no nosso dia-a-dia. O estudo do etnocentrismo, na antropologia, pode ser expresso como a procura de sabermos os mecanismos, as formas, os caminhos e razões, pelos quais existem tantas e tão profundas distorções nas emoções, pensamentos, imagens que fazemos da vida daqueles que são diferentes de nós. Este problema não é exclusivo de uma determinada época nem de uma única sociedade. Talvez o etnocentrismo seja, dentre os fatos humanos, um daqueles de mais unanimidade. Um bom exemplo que ilustra a questão do etnocentrismo é a experiência de um choque cultural. De um lado, conhecemos um grupo do “eu”, o “nosso” grupo, que come igual, veste igual, gosta de coisas parecidas, conhece problemas do mesmo tipo, acredita nos mesmos deuses da mesma forma, empresta à vida significados em comum e procede, por muitas maneiras, semelhantemente. Aí, então, de repente, nos deparamos com um “outro”, o grupo do “diferente” que, às vezes, nem sequer faz coisas como as nossas, a tal ponto que não reconhecemos como possíveis. E, mais grave ainda, este “outro” também sobrevive à sua maneira, gosta dela, também está no mundo e, ainda que diferente, também existe como nós. Este choque gerador do etnocentrismo nasce, talvez, na constatação das diferenças. É uma espécie de mal-entendido sociológico. A diferença

é ameaçadora porque fere nossa própria identidade cultural. É como se pensássemos: Como aquele mundo de doidos pode funcionar (espanto)? Como é que eles fazem (curiosidade perplexa)? Eles só podem estar errados ou tudo o que eu sei está errado (dúvida ameaçadora)! Não, a vida deles não presta, é selvagem, bárbara, primitiva (hostilidade)! Diversidade cultural e relativismo É norma socialmente reconhecida entre nós que devemos cuidar dos nossos pais e de familiares quando atingem uma idade avançada; os Esquimós deixam-nos morrer de fome e de frio nessas mesmas condições. Algumas culturas permitem práticas homossexuais enquanto outras as condenam (pena de morte na Arábia Saudita). Em vários países muçulmanos a poligamia é uma prática normal, ao passo que nas sociedades cristãs ela é vista como imoral e ilegal. Certas tribos da Nova Guiné consideram que roubar é moralmente correto; a maior parte das sociedades condenam esse ato. O infanticídio é moralmente repelente para a maior parte das culturas, mas algumas ainda o praticam. Em certos países a pena de morte vigora, ao passo que noutras foi abolida; algumas tribos do deserto consideravam um dever sagrado matar após terríveis torturas um membro qualquer da tribo a que pertenciam os assassinos de um dos seus. Centenas de páginas seriam insuficientes para documentarmos a relatividade dos padrões culturais, a grande diversidade de normas e práticas culturais que existem atualmente e também as que existiram. Até bem pouco tempo muitas culturas e sociedades viviam praticamente fechadas sobre si mesmas, desconhecendo-se mutuamente e desenvolvendo bizarras crenças acerca das outras. Os europeus que viajaram para as Américas no século XVI acreditavam que iam encontrar gigantes, amazonas e pigmeus, a Fonte da Eterna Juventude, mulheres cujos corpos nunca envelheciam e homens que viviam centenas de anos. Os índios americanos foram inicialmente olhados como criaturas selvagens que tinham mais afinidades com os animais do que com os seres humanos. Paracelso, nunca lá tendo ido, descreveu o continente norte-americano povoado por criaturas que eram meio homens meio bestas. Julgava-se que os índios, os nativos desse continente, eram seres sem alma nascidos espontaneamente das profundezas da terra. O bispo de Santa Marta, na Colômbia, descrevia os indígenas como homens selvagens das florestas e não homens dotados de uma

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alma racional, motivo pelo qual não podiam assimilar nenhuma doutrina cristã, nenhum ensinamento, nem adquirir a virtude

Anthony Giddens, Sociology, Polity Press, Cambridge. Durante o século XIX os missionários cristãos em África e nas ilhas do Pacífico forçaram várias tribos nativas a mudar os seus padrões de comportamento. Chocados com a nudez pública, a poligamia e o trabalho no dia do Senhor, decidiram, paternalistas, reformar o modo de vida dos "pagãos". Proibiram os homens de ter mais de uma mulher, instituíram o sábado como dia de descanso e vestiram toda a gente. Estas alterações culturais, impostas a pessoas que dificilmente compreendiam a nova religião, mas que tinham de se submeter ao poder do homem branco, revelaram-se, em muitos casos, nocivas: criaram mal-estar social, desespero entre as mulheres e orfandade entre as crianças. Se bem que o complexo de superioridade cultural não fosse um exclusivo dos Europeus (os chineses do século XVIII consideraram desinteressantes e bárbaros os seus visitantes ingleses), o domínio tecnológico, científico e militar da Europa, bem vincado a partir das Descobertas, fez com que os Europeus julgassem os próprios padrões, valores e realizações culturais como superiores. Povos pertencentes a sociedades diferentes foram, na sua grande maioria, desqualificados como inferiores, bárbaros e selvagens. O etnocentrismo é a atitude característica de quem só reconhece legitimidade e validade às normas e valores vigentes na sua cultura ou sociedade. Tem a sua origem na tendência de julgarmos as realizações culturais de outros povos a partir dos nossos próprios padrões culturais, pelo que não é de admirar que consideremos o nosso modo de vida como preferível e superior a todos os outros. Os valores da sociedade a que pertencemos são, na atitude etnocêntrica, declarados como valores universalizáveis, aplicáveis a todos os homens, ou seja, dada a sua "superioridade" devem ser seguidos por todas as outras sociedades e culturas. Adotando esta perspectiva, não é de estranhar que alguns povos tendam a intitular-se os únicos legítimos e verdadeiros representantes da espécie humana. Quais os perigos da atitude etnocêntrica? A negação da diversidade cultural humana (como se uma só cor fosse preferível ao arco-íris) e, sobretudo os crimes, massacres e extermínios que a conjugação dessa atitude ilegítima com ambições econômicas provocou ao longo da História. Depois da Segunda Guerra Mundial e do extermínio de milhões de indivíduos pertencentes a povos que pretensos representantes de valores culturais superiores definiram como sub-humanos,

a antropologia cultural promoveu a abertura das mentalidades, a compreensão e o respeito pelas normas. A defesa legítima da diversidade cultural conduziu, contudo, muitos antropólogos atuais a exagerarem a diversidade das culturas e das sociedades: não existiriam valores universais ou normas de comportamentos válidos independentemente do tempo e do espaço. As valorações são relativas a um determinado contexto cultural, pelo que julgar as práticas de uma certa sociedade, não existindo escala de valores universalmente aceite, seria avaliá-los em função dos valores que vigoram na nossa cultura. Cairíamos de novo, segundo a maioria dos antropólogos, nessa atitude dogmática que é o etnocentrismo.

4. O Preconceito e o Mito da Democracia Racial no Brasil

Contrariando o senso comum, que nos ensinou ao longo dos anos que a sociedade brasileira é o resultado da mistura das raças aqui reunidas e nos ajudou a construir a auto-imagem do Brasil como país homogêneo e indiferenciado, as políticas d e ação afirmativa têm suscitado uma grande discussão. A que tem causado a maior polêmica, sem dúvida, é a política de cotas. Isto é, a polêmica só aparece quando as cotas são destinadas aos afro-descendentes e indígenas. Porque as cotas já vêm sendo adotadas em vários segmentos da sociedade. Temos cotas para deficientes, idosos (no transporte rodoviário) e mulheres. Aparentemente o problema não reside na política de cotas em si mesma e sim para quem as cotas estão sendo destinadas. Para DOMINGUES, “a discussão das cotas já tem o mérito de revelar a cara e a voz do nosso racismo.” A inclusão da questão das desigualdades étnico-sociais históricas da sociedade brasileira na agenda pública nacional (e também na internacional) ganhou substância em 2001 quando dos preparativos para Conferência Mundial Contra o Racismo (CMR) na África do Sul, onde o debate público se intensificou. A exclusão do afro-brasileiro já não é mais um mito, as estatísticas não permitem disfarçar que a diferenciação existe. Portanto a democracia racial brasileira tão propalada, através de muita luta do movimento negro, está sendo posta em cheque e o reconhecimento do caráter pluriétnico da sociedade pelo governo. Essa é a essência da questão, a desmistificação da democracia racial brasileira, esta não existe nem nunca existiu e o governo no âmbito dos seus três poderes tem promovido esse reconhecimento através de ações de discriminação positiva.

(Adaptado de O fim do mito da democracia racial brasileira: Sociedade miscigenada x sociedade pluriracial).

Segundo Martiniano Silva, o racismo no Brasil foi implantado através do mito da democracia racial. Alega que tal modalidade de racismo, mascarado de status liberal e democrático, conseguiu efetivar-se com grande eficácia, alcançando, através de sua dissimulação, prestígio interno e externo.

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Carlos Hasenbalg afirma que desde o final do Segundo Império e início da República já se acreditava que o Brasil teria escapado do problema do preconceito racial. Explica que tal concepção tem origem na comparação feita com a situação racial observada no Estados Unidos da América daquela época. Hasenbalg acrescenta que conclusões semelhantes eram tomadas pelas elites de outros países da América Latina, quando comparavam suas realidades com a estadunidense. Entretanto, diferentemente dos padrões raciais encontrados nos Estados Unidos, no Brasil e em outros países latino-americanos, estas parecem possuir dois pontos centrais: O embranquecimento, ou ideal do branqueamento, entendido como um projeto nacional implementado por meio da miscigenação seletiva e políticas de povoamento e imigração européia. O segundo é a concepção desenvolvida por elites políticas e intelectuais a respeito de seus próprios países, supostamente caracterizados pela harmonia e tolerância racial e a ausência de preconceito e discriminação racial. Thomas E. Skidmore entende que a tese do branqueamento baseia-se na presunção da superioridade branca. Afirma que essa corrente vê na miscigenação a saída para tornar a população mais clara, por acreditar que o gene da raça branca prevaleceria sobre as demais e que as pessoas em geral procurariam por parceiros mais claros do que elas. Assim afirmavam que o branqueamento produziria uma população mestiça sadia, capaz de tornar-se sempre mais branca, tanto cultural como fisicamente. Por esse motivo, segundo Florestan Fernandes, o ideal da miscigenação era tido como um mecanismo mais ou menos eficaz de absorção do mestiço. O essencial, no funcionamento desses mecanismos, não era nem a ascensão social de certa porção de negros e de mulatos, nem a igualdade racial, mas, ao contrário, a hegemonia da raça dominante. Refletindo o ideal citado, João Batista de Lacerda, diretor do Museu Nacional, e único latino-americano a apresentar um relatório no I Congresso Universal de Raças, em Londres, no ano de 1911, chegou a afirmar que:

no Brasil já se viram filhos de métis apresentarem, na terceira geração, todos os caracteres físicos da raça branca [...]. Alguns retêm uns poucos traços da sua ascendência negra por influência dos atavismo (...) mas a influência da seleção sexual (...) tende a neutralizar a do atavismo, e remover dos descendentes dos métis todos os traços da raça negra (...) Em virtude desse processo de redução étnica, é lógico esperar que no curso de mais um século os métis tenham desaparecido

do Brasil. Isso coincidirá com a extinção paralela da raça negra em nosso meio. O ideal da miscigenação adquire nova roupagem, segundo Martiniano J. Silva, com a obra “Casa Grande e Senzala”, escrita pelo historiador e sociólogo Gilberto Freyre, passando a ser vista como mecanismo de um processo, o qual tem como fim a democracia racial. Segundo Clóvis Moura, Gilberto Freyre caracterizou a escravidão no Brasil como composta de senhores bons e escravos submissos. O mito do bom senhor de Freyre é uma tentativa no sentido de interpretar as contradições do escravismo como simples episódio sem importância, e que não teria o poder de desfazer a harmonia entre exploradores e explorados durante aquele período. Explica Martiniano Silva que a miscigenação é um velhíssimo processo de enriquecimento racial e cultural dos povos, capaz de gerar civilizações, e que ocorre de forma livre e democrática. Afirma que historicamente a miscigenação de raças no Brasil “nunca foi tratada e nunca existiu como um processo livre, espontâneo, e, portanto, natural, de união entre dois povos.” Ao contrário, como reafirma Silva, a dignidade da mulher negra foi violentada, atingindo sua honra no âmbito moral e sexual, através de uniões mantidas a força, sob a égide do medo, da insegurança, onde as crianças eram concebidas legalmente sem pai, permanecendo no status de escrava, não havendo assim nenhum enriquecimento racial e cultural de civilização alguma. Conclui dizendo que é preciso que não se confunda a descaracterização de um povo pela violência sexual com a hipótese de uma democracia racial. Seduzidos por esse mito da democracia racial no Brasil, relata Sylvio Fleming Batalha da Silveira que os cientistas sociais estado-unidenses Donald Pierson e Marvin Harris, realizaram em 1945 e 1967, respectivamente, estudos sobre as relações sociais no Brasil. Apesar de inicialmente, segundo Silveira, terem constatado a grande disparidade existente entre negros e brancos no que se refere à localização na estratificação social, continuaram, entretanto, alimentando o mito da democracia racial. Como esclarece Silveira, a comparação com os Estados Unidos da América foi a tônica dos estudos dos dois pesquisadores. Ao constatar a inexistência de um sistema racial claramente bipolar, como nos Estados Unidos, Pierson concluiu que praticamente não havia problemas raciais no Brasil. Harris, embora não comungasse da idéia de um “paraíso tropical”, classificou a discriminação existente como de classe e não de raça. Assim, nessa visão, o indivíduo negro ocupava as posições mais baixas na estratificação social, não porque sofresse discriminação de raça,

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mas sim pela condição de pobreza de seus ancestrais. Analisa Silva que tais conclusões tomadas pelos estado-unidenses, se devem ao fato de não disporem de elementos históricos e críticos para avaliarem a realidade brasileira, aceitando, dessa maneira, facilmente a idéia de que predominava no Brasil o preconceito de classe e não o de raça. Assim, segundo o autor, “só acidentalmente, e sem nenhuma relevância, existiria o fato de que o negro e o mulato concentram-se nas classes proletárias ou mais pobres do campo e da cidade, da pequena e da grande aglomeração urbana”. O ideal do embranquecimento, relata Hasenbalg, criou raízes profundas na sociedade brasileira, levando o próprio negro a sua autonegação. Expõe que a hierarquização das pessoas em termos de sua proximidade a uma aparência branca, ajudou a fazer com que indivíduos de pigmentação escura desprezassem a sua origem africana, cedendo assim a forte pressão do branqueamento, levando-os a fazer o melhor possível para parecerem mais brancos. Enfatiza que tais tentativas da população negra de se aproximar tanto quanto possível do extremo branco, levou a uma fragmentação das identidade raciais. Clóvis Moura, apresentando uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE no recenseamento de 1980, verificou que os não brancos, ao serem inquiridos sobre qual seria a sua cor, tiveram dificuldade em assumir sua condição de negros ou mestiços, surgindo nas respostas um total de cento e trinta e seis cores diferentes. Para Moura, tal resultado indica que o brasileiro foge da sua realidade étnica, procurando, através de simbolismos de fuga, situar-se o mais próximo do modelo tido como superior e levanta o seguinte questionamento:

O que significa isto em um país que se diz uma democracia racial? Significa que, por mecanismos alienadores, a ideologia da elite dominadora introjetou em vastas camadas de não-brancos os seus valores fundamentais. Significa, também, que a nossa realidade étnica, ao contrário do que se diz, não iguala pela miscigenação, mas, pelo contrário, diferencia, hierarquiza e inferioriza socialmente de tal maneira que esses não-brancos procuram criar uma realidade simbólica onde se refugiam, tentando escapar da inferiorização que a sua cor expressa nesse tipo de sociedade. Nessa fuga simbólica, eles desejam compensar-se da discriminação social e racial de que são vítimas no processo de interação com as camadas brancas dominadoras que projetaram uma sociedade democrática para eles, criando, por outro lado, uma ideologia escamoteadora capaz de encobrir as condições reais sob as quais os contatos interétnicos se realizam no Brasil. Na mesma linha de pensamento de Moura, Silva complementa dizendo que o mito da democracia racial, construído teoricamente nos argumentos

expostos por Gilberto Freyre em sua obra "Casa Grande e Senzala", introjetou no negro brasileiro a ideologia da culpa por seus imaginados e supostos defeitos, atribuindo-lhe a responsabilidade por seu dito complexo de cor. Dessa maneira, segundo o autor, foi imposta aos negros e seus descendentes a falsa impressão de que eram os únicos culpados por seu baixo nível social, econômico, cultural e político na sociedade brasileira. A realidade revela o mito Não são necessários grandes estudos para perceber o quanto é desigual a distribuição de oportunidades no Brasil, entretanto, quando se pretende uma análise científica sobre as questões sociais brasileiras, torna-se imprescindível que tal afirmação tenha respaldo em dados concretos. No rol das desigualdades, os cidadãos da raça negra parecem estar entre os grandes prejudicados. Segundo dados do Censo de 2000, promovido pelo IBGE, o Brasil possui 169,8 milhões de habitantes, dentre os quais 76,4 milhões são pessoas negras (pardos e pretos), o que corresponde a 45% dos habitantes, o que tem levado à afirmação de que o Brasil seria a segunda maior nação negra do mundo fora do Continente africano, como informa Jaccoud e Beghin, o que tem sido contestado pelo movimento mestiço que entende esta idéia despreza as populações mestiças (pardas) de regiões como a Amazônia, onde os caboclos formam a absoluta maioria dos pardos, e também a auto-identificação dos afro-descendentes.

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LEITURA COMPLEMENTAR

EFEITOS CULTURAIS DA GLOBALIZAÇÃO “Nós vivemos na era da globalização, tudo converge, os limites vão desaparecendo”. Quem não ouviu, no mínimo, uma destas expressões nos últimos anos? A globalização é um chavão de nosso tempo, uma discussão que está na moda, onde opiniões fatalistas conflitam com afirmações críticas, e o temor de uma homogeneização está no centro do debate. Suposições de uma sociedade mundial, de uma paz mundial ou, simplesmente, de uma economia mundial, surgem seguidamente, cujas conseqüências levariam a processos de unificação e adaptação, aos mesmos modelos de consumo e a uma massificação cultural. Mas há que se perguntar: trata-se apenas de conceitos em disputa ou há algo que aponte, de fato, nesta direção? Quais são, afinal, os efeitos culturais da globalização?

O processo de constituição de uma economia de caráter mundial não é nada novo. Já no período colonial houve tentativas de integrar espaços intercontinentais num único império, quando a idéia de “dominar o mundo” ficou cada vez mais próxima. Por outro lado, a integração das diferentes culturas e povos como “um mundo” já foi desejada há muito tempo e continua como meta para muitas gerações. Sob esta ótica, o conceito de globalização poderia ter um duplo sentido, se ele não fosse tão marcado pelo desenvolvimento neoliberal da política internacional.

Conforme o sociólogo alemão Ulrich Beck, com o termo globalização são identificados processos que têm por conseqüência a subjugação e a ligação transversal dos estados nacionais e sua soberania através de atores transnacionais, suas oportunidades de mercado, orientações, identidades e redes. Por isso, ouvimos falar de defensores da globalização e de críticos à globalização, num conflito pelo qual diferentes organizações se tornam cada vez mais conhecidas. Neste sentido, não se trata de um conflito stricto sensu sobre a globalização, mas sobre a prepotência e a mundialização do capital. Esse processo, da forma como ele atualmente vem acontecendo, não deveria sequer ser chamado de globalização, já que atinge o globo de forma diferenciada e exclui a sua maior parte - se observamos a circulação mundial de capital, podemos constatar que a maioria da população mundial (na Ásia, na África e na América Latina) permanece excluída.

Essa forma de globalização significa a predominância da economia de mercado e do livre mercado, uma situação em que o máximo possível é mercantilizado e privatizado, com o agravante do desmonte social. Concretamente, isso leva ao domínio mundial do sistema financeiro, à redução do espaço de ação para os governos - os países são obrigados a aderir ao neoliberalismo - ao aprofundamento da divisão internacional do trabalho e da concorrência e, não por último, à crise de endividamento dos estados nacionais. Condições para que essa globalização pudesse se desenvolver foram a interconexão mundial dos meios de comunicação e a equiparação da oferta de mercadorias, das moedas nacionais e das línguas, o que se deu de forma progressiva nas últimas décadas. A concentração do capital e o crescente abismo entre ricos e pobres (48 empresários possuem a mesma renda de 600 milhões de outras pessoas em conjunto) e o crescimento do desemprego (1,2 bilhões de pessoas no mundo) e da pobreza (800 milhões de pessoas passam fome) são os principais problemas sociais da globalização neoliberal e que vêm ganhando cada vez mais significado.

É evidente que essa situação tem efeitos sobre a cultura da humanidade, especialmente nos países pobres, onde os contrastes sociais são ainda mais perceptíveis. Em primeiro lugar, podemos falar de uma espécie de conformidade e adaptação. Em função da exigência de competitividade, cada um se vê como adversário dos outros e pretende lutar pela manutenção de seu lugar de trabalho. Os excluídos são taxados de incompetentes e os pobres tendem a ser responsabilizados pela sua própria pobreza. Paralelamente a isso, surge nos países industrializados uma nova forma de extremismo de direita, de forma que a xenofobia e a violência aparecem entrelaçada com a luta por espaços de trabalho. É claro que a violência surge também como reação dos excluídos, e a lógica do sistema, baseada na competição, desenvolve uma crescente “cultura da violência” na sociedade. Também não podemos esquecer que o próprio crime organizado oferece oportunidades de trabalho e segurança aos excluídos.

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Embora tenham sido desenvolvidos e disponibilizados mais meios de comunicação, presenciamos um crescente isolamento dos indivíduos, de forma que as alternativas de socialização têm sido, paradoxalmente, reduzidas. A exclusão de muitos grupos na sociedade e a separação entre camadas sociais têm contribuído para que a tão propalada integração entre diferentes povos não se efetive; pelo contrário, isso têm levado a um processo de atomização da sociedade. O valor está no fragmento, de modo que o engajamento político da maioria ocorre de forma isolada como, por exemplo, o feminismo, o movimento ambientalista, movimentos contra a discriminação ética e sexual, etc. Tudo isso sem que se perceba um fio condutor que possa unificar as lutas isoladas num projeto coletivo de sociedade. Nessa perspectiva fala-se de um “fim das utopias”, que se combina com uma nova forma de relativismo: “a verdade em si não existe; a maioria a define”.

No que se refere à educação, cresce a sobrevalorização do pragmatismo, da eficiência meramente técnica e do conformismo. O mais importante é a formação profissional, concebida como único meio de acesso ao mercado de trabalho. A idéia é a de que, com uma melhor qualificação técnica, se tenha maiores possibilidades de conseguir um emprego num mercado de trabalho em declínio. Em conseqüência a isso, a reflexão sobre os problemas da sociedade assume cada vez menos importância; e valores como engajamento, mobilização social, solidariedade e comunidade perdem seus significados. Importante é o luxo, o lucro, o egocentrismo, a “liberdade do indivíduo” e um lugar no “bem-estar dos poucos”. Esses valores são difundidos pelos grandes meios de comunicação e os jovens são, nisto, os mais atingidos. A diminuição do sujeito/indivíduo surge como decorrência, pois o ser humano é cada vez mais encarado como coisa e estimulado a satisfazer prazeres supérfluos. Os excluídos são descartados sem perspectiva e encontram cada vez menos espaço na sociedade que, afinal de contas, está voltada aos consumidores, enquanto o acesso público é continuamente reduzido.

Por outro lado, há reações que se desenvolvem internacionalmente contra essa tendência. A ampliação das possibilidades de comunicação tem contribuído para que protestos isolados pudessem se encontrar e constituir redes. O lema: “pensar globalmente e agir localmente” pôde ser superado, de forma que uma ação global se tornou possível, o que alterou a visão de mundo e os limites de tempo e espaço. Para além das diferenças étnicas, religiosas e lingüísticas dos povos, podemos falar de uma nova divisão do mundo: de um lado, uma minoria que é beneficiada pela globalização neoliberal e, de outro, a maioria que é prejudicada com a ampliação do livre mercado. Esse conflito está no centro do debate atual da humanidade, cujos efeitos caracterizam o espírito do nosso tempo e influenciarão a cultura da humanidade futura. Se a imagem das futuras gerações será fragmentada ou mais homogeneizada ainda não se sabe, mas a possibilidade de uma crescente desumanização é muito grande.

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MÓDULO TEMÁTICO 4 - SOCIOLOGIA

OS MOVIMENTOS SOCIAIS

1. Os Movimentos Sociais Os movimentos sociais são manifestações de caráter popular, cuja ação social é orientada a fim de obter transformações políticas e econômicas. Longe de serem espasmos irracionais da massa, possuem, em geral, algum grau de solidariedade interna e muitos revelam elevados níveis de institucionalização, atuando de maneira tão organizada quanto empresas, partidos políticos e instâncias do Estado. A história tem nos mostrado que os movimentos sociais, seja qual a forma assumem, tem estado presente em quase todos os grupos sociais, onde foram compreendidos como fenômenos inerentes aos processos de mudança. Na Antiguidade, destacam-se os movimentos de escravos e os movimentos religiosos. Na Baixa Idade Média, os movimentos de camponeses-servos. Na Idade Moderna, fase de desagregação da sociedade feudal, houveram os movimentos de mercadores e os religiosos. Já na contemporaneidade, com o Capitalismo já consolidado, destacam-se os movimentos de operários na luta contra as condições de vida nas fábricas e nas cidades, assim como os movimentos de camponeses, inspirados em ideologias socialistas. Na fase atual, do capitalismo industrial monopolista, estão na ordem do dia os chamados “novos” movimentos sociais, entre eles, os ecológicos, pacifistas, feministas, defesa do direito das minorias (negros, homossexuais, deficientes físicos, etc.). A existência dos movimentos sociais costuma ser associada a grandes eventos históricos, como lutas por independência de nações, insurreições socialistas ou comunistas, ações pela reforma agrária e a emancipação dos trabalhadores e revoluções culturais. A partir dos anos 90, o tema globalização ganhou espaço na agenda de lutas. O grande marco fundador de boa parte dos movimentos sociais surgidos nos últimos dois séculos é a expansão do modo de produção capitalista, sobretudo, através de sua vertente industrial no século 19. Seu enorme potencial de geração de riquezas, com base na propriedade privada, no trabalho assalariado e na expansão do mercado livre produziu também uma série de contradições sociais, que atingiram tanto a milenar classe dos camponeses quando a nascente classe dos operários.

Motivação dos Movimentos Sociais a) Conflito - Marx Um dos elementos recorrentes, que pode ser encontrado em todo movimento social, é o conflito. Pelo menos é o que defende a escola histórico-estrutural, de vertente Marxista. Para os autores que defendem essa idéia, consideram que o conflito é a explicitação das contradições sociais. Ou seja, se há movimento social, há conflito, e se há conflito, é porque existe alguma contradição entre interesses, grupos, posições, etc. O conflito faz a contradição aparecer. A sociedade se desenvolve de forma contraditória, uma vez que a produção da vida social é feita de forma coletiva, mas seus “frutos” são colhidos de forma privada. A contradição básica do capitalismo é o que gera os conflitos, que por sua vez, são explicitados nos movimentos sociais.

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b) Desequilíbrio Social - Durkheim A Escola Americana de Sociologia, denominada Escola Neo-positivista (seguidores das teorias de Émile Durkheim), defende a idéia de que os movimentos sociais, através das várias imagens de manifestações, violência, pancadaria, nos mostram que há um desequilíbrio social, e não um conflito. Para essa concepção, não há interesses que se contradigam no interior da sociedade, já que a sociedade é vista como decorrente de um processo natural e, assim, esse tipo de ocorrência é visto como parte de um processo natural de mudanças que independem das ações dos indivíduos. Para os neo-positivistas, não são os indivíduos que agem modificando a sociedade, mas, ao contrário, é a sociedade que age sobre os indivíduos, ensejando novos comportamentos, novos valores, os quais são expressos pelos movimentos sociais. Assim, quando a polícia restabelecesse a ordem, quando o sindicado terminasse a greve, enfim, quando o equilíbrio social fosse restabelecido, a sociedade poderia seguir seu curso e continuar seu processo de desenvolvimento. c) Ação coletiva - Weber A idéia de movimento social como ação social coletiva é claramente inspirada na teoria de Max Weber de “ação social”. Nela, os movimentos sociais são entendidos como uma ação coletiva de indivíduos, conforme uma abordagem que é chamada hoje de “culturalista”. Nessa concepção, o que é importante são os aspectos subjetivos dos fatos, a análise do significado da ação coletiva, a decodificação dos discursos e das representações que os indivíduos fazem de suas práticas. O que importa nos movimentos sociais não são os conflitos ou o equilíbrio da sociedade, mas o significado social das ações dos indivíduos que participam do movimento social. 2. Os Elementos Constitutivos dos Movimentos Sociais a) O projeto Significa a proposta, os objetivos, a meta de um movimento, que pode ser de mudança ou conservação das relações sociais. Todo movimento social possui, implícita ou explicitamente, um projeto. Faz parte do projeto do movimento a definição de uma estratégia, que são os procedimentos adequados para se atingir o sucesso da ação coletiva. b) A ideologia

Corresponde às idéias que os homens fazem da sociedade em que vivem, ou seja, o que eles pensam que querem mudar. A ideologia seria uma espécie de “visão de mundo” de um grupo social. c) A organização Os movimentos sociais pressupõe certa organização hierárquica, que pode ser descentralizada (sem nenhum corpo dirigente fixo ou previamente determinado). Neste caso, a direção e/ou organização pode se dar de forma coletiva, com um permanente revezamento entre os participantes, em que todos são igualmente considerados lideranças. A organização também pode apresentar uma estrutura mais definida, firmada em um corpo de líderes mais ou menos fixo e destacado dos demais participantes do movimento. Esse grupo dirigente teria o papel de liderança, a quem caberia a iniciativa de propostas sobre os passos a serem dados, bem como a palavra final sobre as metas e os objetivos, as formas de condução e a representação permanente do movimento em face de seus interlocutores ou oponentes. 3. O Movimento Operário Nascido a partir da intensificação do processo industrial, a partir do século XIX, o movimento operário foi alimentado pela luta de classes entre burguesia e proletariado nascentes. Sua expressão institucional são os sindicatos, cuja ação muitas vezes foi além da simples defesa do interesse do trabalhador e ajudou a fomentar outros movimentos, como o socialista e o comunista. O movimento operário nasceu sob as condições de trabalho mais degradantes que se possa imaginar: Jornadas de trabalho excessivas, em locais

úmidos, mal-iluminados e sem ventilação;

Exploração do trabalho de mulheres e crianças em funções, muitas vezes, idênticas àquelas exercidas pelos homens, mas com salários ainda menores;

Acidentes freqüentes - devido às condições de

cansaço dos trabalhadores, sempre mal-alimentados - nos quais muitos perdiam a vida ou ficavam inutilizados para o trabalho, com o que não se importavam os patrões, pois a oferta de mão-de-obra era farta.

Enfim, condições aviltantes à dignidade humana, no que se refere a habitação, saúde e alimentação, sem falar na educação, que praticamente inexistia. Sob tais condições, onde

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se observava uma rígida disciplina dentro e fora das fábricas, as diversas categorias de trabalhadores – tecelões, marceneiros, pedreiros, metalúrgicos, mineiros, etc. – foram, em lugares e momentos diversos, se insurgindo contra as condições de vida a que eram submetidos pelo capital.

Condições de trabalho desumanas, além do emprego de crianças nas fábricas, foram umas das condições para a formação do movimento operário na Europa. As lutas, inicialmente isoladas, por melhores salários ou pela redução da jornada de trabalho (que até meados do século XIX, na maioria dos países, não era inferior a catorze horas por dia) foram, pouco a pouco, tornando-se mais freqüentes e organizadas. As greves e a quebra de máquinas e fábricas se constituíram, inicialmente, nos únicos instrumentos de luta dos trabalhadores, num momento em que não tinham nenhum meio de representação para defender seus interesses em face dos industriais e do Estado. Mas, os movimentos sociais implicam também relações de opressão, e assim, contra a onda de quebra-quebras que assolou a Inglaterra na segunda metade do século XVII e início do século XIX (o movimento Ludista), o Parlamento inglês instituiu, em 1769, a pena de morte para destruidores de máquinas. A disseminação da teoria marxista no movimento operário moldou sua atuação. Além de melhorar as condições de vida do trabalhador, sua agenda de lutas almejou conquistas ainda mais amplas a partir da assimilação do ideal revolucionário comunista. As teses de Marx (1818-1883) e Engels (1820-1895) defendiam a organização dos trabalhadores em um movimento que fosse capaz de derrotar os burgueses e criar um mundo de liberdade e igualdade social. Esse ideal do movimento operário foi o mesmo que moldou a atuação de sindicatos, partidos políticos e governos nacionais de orientação comunista ou socialista. Ainda no século 19, o movimento tomou um caráter supranacional através da realização das Internacionais,

fortalecendo a solidariedade e as frentes de luta nacionais dos trabalhadores. Curiosamente, esta ideologia crítica nascida nas cidades ajudou a fortalecer o movimento camponês, que via na socialização dos meios de produção possibilitada por uma revolução a chance de conseguir acesso à terra. Foi essa perspectiva de transformação social através da reforma agrária que impulsionou, por exemplo, a Revolução Mexicana de 1910 e a criação das Ligas Camponesas no Brasil, a partir da década de 1930. Bandeiras como essa são até hoje empunhadas por movimentos sociais camponeses no mundo inteiro, como é o caso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST, no Brasil, e do Exército Zapatista de Libertação Nacional, no México, que guarda também um viés indigenista. Surgimento do Movimento Operário no Brasil O movimento operário brasileiro viveu anos de fortalecimento entre 1917 e 1920, quando as principais cidades brasileiras foram sacudidas por greves. Uma das mais importantes foi a greve de 1917 em São Paulo, em que 70 mil trabalhadores cruzaram os braços exigindo melhores condições de trabalho e aumentos salariais. A greve durou uma semana e foi duramente reprimida pelo governo paulista. Finalmente chegou-se a um acordo que garantiu 20% de aumento para os trabalhadores. A ascensão do movimento operário no Brasil naquele anos finais da década de 1910 relacionava-se diretamente à vitória dos comunistas na Revolução Russa. Vários grupos operários no Brasil e no mundo acreditavam que havia chegado o momento de colocar um fim à exploração capitalista e construir uma nova sociedade. Esse entusiasmo não foi suficiente, no entanto, para que a revolução se disseminasse. Os anos 20, apesar de alguns avanços em termos de legislação social, foram difíceis para o movimento operário, que foi obrigado a enfrentar grandes desafios. O primeiro deles foi a intensificação da repressão por parte do governo. A justificativa apresentada era a de que o movimento operário era artificialmente controlado por lideranças estrangeiras radicais que iludiam o trabalhador nacional. Por conta disso foi aprovada no Congresso, em 1921, a Lei de Expulsão de Estrangeiros que permitia, entre outras coisas, a deportação sumária de lideranças envolvidas em distúrbios da ordem e o fechamento de organizações operárias. O principal alvo dessa lei eram os anarquistas. A expansão do anarquismo foi rápida nas grandes cidades brasileiras nas primeiras décadas do século XX. Suas propostas de

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supressão do Estado e de todas as formas de repressão encontraram receptividade entre os trabalhadores naqueles tempos em que o jogo político era exclusividade das oligarquias e praticamente inexistia qualquer proteção ao trabalho. Governo e patrões eram vistos pelos anarquistas como inimigos a serem combatidos a todo custo. Suas idéias eram difundidas por meio de congressos e por uma imprensa própria e, entre outros, destacaram-se como divulgadores do ideário anarquista José Oiticica, Everardo Dias e Edgard Leuenroth. As correntes anarquistas dividiam a liderança do movimento operário com outros grupos políticos. Particularmente no Rio de Janeiro, era bastante influente uma corrente política moderada, não revolucionária, interessada em obter conquistas específicas como diminuição da jornada de trabalho e aumentos salariais. Esses grupos preocupavam-se ainda em garantir o reconhecimento dos sindicatos por parte do Estado. Ao contrário dos anarquistas, atuavam no espaço político legal apoiando e lançando candidatos. Os grupos revolucionários os chamavam pejorativamente de "amarelos". A partir de 1922, outra corrente se definiu dentro do movimento operário: a dos comunistas. Naquele ano, embalados pela criação do primeiro Estado Socialista na Rússia, militantes brasileiros fundaram o Partido Comunista do Brasil (PCB). Ao contrário dos anarquistas, que viam o Estado como um mal em si, os comunistas o viam como um espaço a ser ocupado e transformado. Essas concepções os levaram, seja na ilegalidade, seja nos breves momentos de vida legal, a buscar aliados e participar da vida parlamentar do país. Uma liderança que os comunistas tentaram atrair em 1927 foi Luís Carlos Prestes, que naquele ano se exilou na Bolívia. Todos esses esforços não foram suficientes para produzir uma mudança significativa na vida material do conjunto da classe trabalhadora no final dos anos 20. A legislação aprovada quase nunca era aplicada. Isso ocorria, entre outras razões, porque o movimento operário encontrava-se ainda limitado e restrito a alguns poucos centros urbanos. Apesar disso, não se pode deixar de reconhecer que foi na década de 1920 que o movimento operário brasileiro ganhou maior legitimidade entre os próprios trabalhadores e a sociedade mais ampla e começou a se transformar em um ator político que iria atuar com maior desenvoltura nas décadas seguintes. 4. Os novos movimentos sociais Os novos movimentos sociais são assim denominados porque apresentam algumas diferenças fundamentais em relação aos

movimentos tradicionais ou clássicos e, em especial, em relação ao movimento operário. Da mesma forma que o movimento operário surgiu e se desenvolveu com as contradições da sociedade industrial capitalista, os novos movimentos surgem e se desenvolvem a partir das contradições do capitalismo em sua fase avançada (lembre-se que os movimentos sociais explicitam as contradições sociais, para a escola histórico-estrutural). O Estado do Bem-Estar Social proporcionou o reequilíbrio do sistema produtivo nos moldes do sistema capitalista, garantindo, entre a década de 40 e de 60, que a acumulação se desenvolvesse sem a ameaça real da ideologia socialista. O Estado criou uma máquina técnico-burocrática imensa para cuidar do planejamento econômico e social. O mundo se desenvolveu extraordinariamente nesse período e os níveis de produtividade se multiplicaram em todos os setores das atividades produtivas, ao mesmo tempo em que se aprofundou a divisão técnica e social do trabalho. A classe operária, em face de todas essas mudanças, teve o seu perfil alterado, com o aparecimento de novas categorias especializadas e elitizadas em diversos setores. Nos países em fase mais adiantada de industrialização, mas de dois terços da população da população viviam nas cidades, em ocupações em indústrias, no comércio e no setor de serviços. A mecanização do campo intensificou o processo de urbanização e muitas cidades assumiram um caráter de metrópole, com seus 2, 4, 6 e até 10 milhões de habitantes. Os meios de comunicação foram se expandindo, os transportes tornaram-se mais rápidos em todos os setores, a criação de satélites revolucionou os meios de comunicação e a TV mudou hábitos, costumes e desejos. O mundo ficou menor. Viveu-se, entre os anos 40 e 60, o sonho da modernidade, com os Estados Unidos simbolizando, no american way of life, a própria modernidade. Mas, já nos anos 70, esse modelo de sociedade começa a entrar em crise. O Estado rapidamente perdeu a sua capacidade de financiar o pleno emprego, e os desequilíbrios entre os setores produtivos voltaram a ameaçar o sistema capitalista. O desemprego em massa põe em questão a viabilidade do modelo de desenvolvimento industrial capitalista, revelando o seu caráter concentrador de renda e a gestão autoritária do Estado. Esse modelo foi incapaz de evitar a contaminação dos rios, do ar, do solo, a possibilidade de esgotamento dos recursos naturais, a corrida armamentista e o perigo constante da utilização de energia nuclear nos artefatos de guerra, como uma ameaça a toda a humanidade.

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Surgiram, nesse contexto, os novos movimentos sociais, sendo os primeiros deles os movimentos ecológicos, com suas correntes ambientalistas e conservacionistas. A primeira, se voltava para um desenvolvimento controlado e equilibrado quanto à utilização dos recursos naturais. A segunda, mais radical, negava a utilização de tecnologias que põem em perigo o meio ambiente, optando por soluções alternativas. Mas ambas explicitaram claramente as contradições de desenvolvimento autodestrutivo. Por outro lado, a cultura, no que diz respeito aos valores tradicionais, como a família e seus princípios hierárquicos, a fé religiosa e seus dogmas, foi revolucionada por valores da modernidade, trazidos pela impossibilidade e intensidade da vida na metrópole, desestabilizando as relações humanas. Surgem novos comportamentos: a presença feminina na vida social, econômica, política e cultural se torna mais visível; o casamento deixa de ser um fim em si mesmo; as mulheres, especialmente da classe média, vão para as universidades, qualificam-se nas mais diversas profissões e passam a competir no mercado de trabalho; a pílula anticoncepcional proporciona à mulher a liberdade de dispor do próprio corpo. Os tabus vão sendo derrubados e surgem, assim, os movimentos feministas pelo fim das descriminações e pelo direito de igualdade com os homens. A juventude, de um modo geral, se rebela contra os padrões tradicionais da moral burguesa tradicional, considerada por eles como envelhecida. Os jovens se manifestam através da música - especialmente das baladas e do rock de Elvis Presley, dos Beatles e dos Rolling Stones. O movimento hippie surgem como a própria negação da sociedade de consumo e da educação tradicional. Os movimentos estudantis eclodem por toda parte, simbolizados pelo movimento do maio de 1968, em Paris, contestador dos currículos escolares na França. A autoridade e a ideologia nacionalistas são criticadas, mediante as marchas pacifistas, nos Estados Unidos e em países da Europa, contra a Guerra do Vietnã.

O movimento Hippie foi um radical contestador dos valores da sociedade de consumo. Os problemas urbanos se avolumam nos diversos países do mundo desenvolvido, revelando um decréscimo gradativo da qualidade de vida. Surgem os movimentos sociais urbanos, reinvidicando melhorias nos setores dos transportes, da saúde, de habitação, de segurança, etc. Em todos os novos movimentos, quer sejam eles pertinentes a problemáticas específicas - movimento negro, indígena ou feminista - quer sejam pertinentes a problemas mais gerais - movimento ecológico ou pacifista - o que se observa é que, em geral, esses movimentos têm em comum não só a crítica ao Estado burocrático e autoritário dos países de socialismo real e dos países capitalistas, mas também a crítica ao dogmatismo revolucionário do movimento operário tradicional. A prática desses novos movimentos não é voltada, como no movimento operário, para a tomada de poder do Estado. Por isso, sua estrutura de poder é mais horizontalizada, não hierárquica e igualitária. E, com efeito, suas práticas não significam apenas a negação de valores tradicionais, mas a própria afirmação de novas formas de vida, de uma nova cultura, como parte fundamental de uma nova sociedade.

O movimento estudantil no Brasil teve contribuições importantes em alguns momentos históricos como: a luta O Petróleo é Nosso, pelo ingresso do Brasil na Segunda Guerra Mundial, a luta contra a ditadura, nas "diretas já", no Impeachment do Presidente Collor. Porém, as primeiras organizações estudantis surgiram com uma estrutura vertical e centralizada. No dia 24 de Março de 2003, centenas de estudantes organizados pelo MEPR em protesto contra a guerra imperialista atacaram o Consulado dos Estados Unidos no Rio de Janeiro.Foi a primeira demonstração de violência revolucionária da juventude brasileira desde as manifestações da época do regime militar.

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LEITURA COMPLEMENTAR

PERSPECTIVAS PARA O TRABALHO E O TEMPO LIVRE Domenico de Masi

Nos últimos séculos, muitos países no mundo passaram por uma tríplice transformação. Uma primeira fase, muito longa, foi caracterizada pela produção rural. O centro do sistema social foi ocupado pela produção rural e o poder estava nas mãos dos proprietários de terra. Esta fase, em alguns países, como a França e a Inglaterra, como a Alemanha e, depois, os Estados Unidos, terminou por volta do fim do século XVIII e ao longo do século XIX. Em outros países, ao contrário, a fase rural perdura até hoje. No Brasil, por exemplo, a porcentagem de trabalhadores na agricultura é ainda muito alta. Na China esta porcentagem ainda representa quase 60%. Pensem que, na Inglaterra no início do século, a porcentagem de trabalhadores na agricultura já era de apenas 9%. A partir do fim do século XVIII, e durante todo o século XIX, em muitos países desenvolveu-se um segundo tipo de sociedade que hoje chamamos de sociedade industrial. A sociedade industrial foi caracterizada pelo fato de ter em seu epicentro não mais a produção dos bens rurais, mas a produção de bens industriais de grande escala. O poder, então, passou das mãos dos proprietários de terra às mãos dos proprietários das industrias. A sociedade industrial não deixou de usar os produtos rurais, pelo contrário, os consumiu ainda mais do que a sociedade rural. A sociedade industrial não absorveu a mão-de-obra dos camponeses e os substituiu pelos adubos químicos e pelas máquinas automáticas. A sociedade industrial durou só duzentos anos, enquanto a sociedade rural durou aproximadamente sete mil anos. Isto significa que as longas ondas da história, como dizia Fernand Braudel, tornam-se sempre mais curtas. Enquanto a sociedade rural precisou de sete mil anos para produzir a sociedade industrial, a sociedade industrial precisou de somente duzentos anos para produzir a sociedade pós-industrial. O que entendo por sociedade pós-industrial? Entendo que é uma sociedade em cujo epicentro não existe mais a produção de bens materiais em grande escala, mas sim a produção de bens imateriais em grande escala, ou seja, a produção de serviços, de informação, de estética, de símbolos e de valores. Portanto, também o poder está passando das mãos dos proprietários dos meios de produção material às mãos dos produtores de bens imateriais. Da mesma forma que a sociedade industrial absorveu os bens rurais, mas não absorveu a mão-de-obra camponesa, a sociedade pós-industrial está absorvendo os bens industriais, mas não absorve a mão-de-obra dos operários, os empregados e, em parte, até mesmo os executivos, substituindo-os pelos computadores e pelos robôs. E, em parte, substitui os robôs quando transfere suas fábricas para o terceiro mundo. Por isso, quando novas fábricas são instaladas em um determinado país, isto não quer dizer que este país está-se modernizando. Simplesmente quer dizer que os países ricos transferem para os países pobres aqueles tipos de atividades que não querem mais fazer. O que determinou esta grande transformação? Esta grande transformação foi determinada por alguns fatores. O primeiro fator é o desenvolvimento tecnológico, o desenvolvimento científico. Desenvolvimento tecnológico e científico não significam somente informática. Significam também novos materiais, o laser, as fibras óticas, a biotecnologia, a farmacologia, a medicina. Na história da humanidade, o processo tecnológico não foi uniformemente acelerado. Até a Mesopotâmia, isto é, até sete mil anos atrás, o progresso tecnológico foi extremamente lento. E da mesma forma foi o progresso científico. Depois, quase que de repente, em uma zona muito pequena do mundo, entre os rios Tigre e Eufrates, em poucos anos foi descoberta e inventada a roda, foi descoberta a astronomia, foi descoberta a moeda, foi descoberta a escrita, foi descoberta a escola, foi descoberta a cidade, foi inventada a cidade. O progresso foi tão rápido e impressionante que, por muitos séculos, de cinco mil anos antes de Cristo até os séculos XI ou XII depois de Cristo, todos os nossos ancestrais estavam convencidos de que todo o tipo possível de progresso já tivesse sido alcançado. Aristóteles, no primeiro livro da metafísica, diz: "Tudo aquilo que deveria ter sido descoberto para o bem estar material e para a melhoria da vida quotidiana do homem já foi descoberto. A partir de agora, então, vamos nos dedicar à descoberta do espírito". E assim os gregos dedicaram todas as suas forças à política, à filosofia, à literatura, à arte. E descuidaram-se totalmente da tecnologia. Ou melhor, em seus mitos, puniram todos os tecnólogos e todos os engenheiros. Ulisses era em engenheiro naval e teve um fim triste. Ícaro era um engenheiro aeronáutico e também teve um fim triste. E a mesma coisa aconteceu com todos os outros, com Sísifo, com Prometeu, quase como uma maneira de dizer aos jovens para que, quando crescessem, não freqüentassem uma universidade tecnológica, para que não se inscrevessem na universidade de engenharia. No ocidente, o ódio pela tecnologia durou até o século XII depois de Cristo. E pode-se explicar porque: porque os gregos já tinham a tecnologia mais perfeita que poderia existir no mundo. Eles tinham os escravos. Na Atenas de Péricles havia quarenta mil homens livres, vinte mil estrangeiros e trezentos e cinqüenta mil escravos. Isto é, cada grego, até mesmo o mais pobre, tinha em média oito escravos. Portanto, tinha quase o que tem hoje uma dona de casa moderna com sua máquina lava-louças, com sua geladeira e sua máquina de lavar roupas. Calcula-se que, hoje em dia, cada um de nós tenha à disposição trinta e três escravos mecânicos. Porém,

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são escravos mecânicos e eles não tem cérebro. Mas os escravos o tinham. Quando a disponibilidade de escravos esgotou-se, por volta do século XII depois de Cristo, também por causa de outros fatores, como o Cristianismo, por exemplo, os seres humanos redescobriram a tecnologia e no século XII foi descoberta a energia hidráulica com o moinho de água, a barda moderna dos cavalos, que veio a aumentar significativamente sua capacidade de tração, os óculos, a pólvora, a bússola, uma série de tecnologias extraordinárias que permitiram a substituição dos escravos, ou seja, do esforço humano, da força motriz humana. Todos estas grandes descobertas tecnológicas não se teriam desenvolvido, não se teriam difundido se, contemporaneamente, não tivesse ocorrido uma grande descoberta teológica: a descoberta do purgatório. Pois saibam que o purgatório não existia antes do século XII. O purgatório foi uma grande descoberta, talvez maior do que a descoberta da América, pois trata-se de uma área de transição entre o paraíso e o inferno e é também uma área de transição entre o céu e a terra. A religião católica é a única religião do mundo que tem o purgatório. O purgatório permite que os vivos ajudem os mortos através do pagamento de dízimos à Igreja. Isto é um fato histórico e permitiu as primeiras acumulações capitalistas. Os grandes bancos, principalmente os italianos, os bancos florentinos, por exemplo, que foram os primeiros e os maiores do mundo, têm nome de Banco do Santo Espírito, Pio Monte de Piedade, Banco de São Paulo, ou seja, são bancos que administraram os grandes capitais que foram se acumulando nos arredores dos santuários graças à descoberta do purgatório. E no ano que vem, no ano 2000, nós, os italianos, ainda vamos fazer um jubileu e vocês irão a Roma e levarão para lá tanto dinheiro por causa do medo que vocês têm de ir para o inferno! Então, o conjunto, a união daquilo que os economistas chamam de acumulação primária, ou seja, a grande capitalização dos séculos XII e XIII e as novas tecnologias, mais as novas viagens, que foram possíveis por causa da bússola e, portanto, a descoberta de novos mundos, como por exemplo, a América do Sul e depois a América do Norte, o conjunto de tudo isto, permitiu o início da sociedade industrial. Bacon, que é o grande pai ideológico da sociedade industrial, junto com Descartes, começa o seu livro, Novum Organum, com esta frase, que é o oposto da frase de Aristóteles: "Tudo o que deveria ser descoberto para a melhoria do espírito foi descoberto. Então, de agora em diante, vamos nos dedicar ao progresso material do homem e ao melhoramento de sua vida quotidiana". Com esta frase foi decretado o fim do tempo livre! O que acontece daquele momento em diante? Acontece que o progresso tecnológico aumenta continuamente de velocidade. Eu li há poucos dias atrás um livro de Georges Simenon que me impressionou, pois foi escrito em 1938, ano no qual eu nasci há sessenta anos atrás. Neste livro, especialmente uma frase me marcou: "Diante de minha janela", diz o protagonista, "os carros, os automóveis correm a setenta quilômetros por hora". Setenta quilômetros por hora, há sessenta anos atrás. Hoje, os automóveis podem atingir muito mais do que o dobro desta velocidade. Mas é muito ou é pouco ter dobrado a velocidade? Pensem que em 1971 foi descoberto o micro processador, o chip. A potência do chip não é redobrada a cada sessenta anos, como acontece com a potência dos automóveis, mas é redobrada a cada dezoito meses. Em 1971, o primeiro chip tinha possibilidade de realizar vinte mil operações por segundo. Hoje, o chip chega a realizar um bilhão de operações por segundo. A mesma coisa vale hoje para os relógios. Os relógios mecânicos, aqueles que eram usados quando eu era pequeno e que ainda são mantidos por alguns como um vezo tecnológico, tinham um oscilador que, no melhor dos casos, oscilava aproximadamente quatro vezes por segundo. Hoje, qualquer relógio a quartzo tem um oscilador que oscila pelo menos um bilhão e oitocentos milhões de vezes por segundo. Os relógios a césio oscilam nove bilhões de vezes por segundo. Portanto, cada relógio é pelo menos duzentas vezes mais preciso do que o necessário para um alemão e, conseqüentemente, muito mais preciso do que o necessário para um italiano ou para um brasileiro. Além do progresso tecnológico, que tem uma velocidade fortemente acelerada, o outro grande fator de mudança foi o progresso organizacional. A partir de Taylor, no final do século XIX em Filadélfia, a partir de Ford, no início do século XX em Detroit, as ciências organizacionais deram importantes passos à frente. E nós começamos a organizar cientificamente, em primeiro lugar, o trabalho, depois a escola, a sociedade e agora o tempo livre. De alguma maneira todos vocês estão aqui para tornarem-se uma espécie de Taylor do tempo livre. E este é um fato monstruoso. Creio que as ciências organizacionais tenham dado uma grande ajuda no processo de transformação da sociedade industrial em sociedade pós-industrial. Um terceiro fator, além do progresso tecnológico e do progresso organizacional é, sem dúvida, a globalização. Isto é, graças aos meios de comunicação de massa, graças à escolarização, graças ao progresso industrial, o mundo torna-se cada vez mais conhecido. E, cada vez menos, é possível irmos a lugares diferentes daquele no qual vivemos. A grande dificuldade para os operadores de turismo é criar diversidades; é prometer aos turistas algo diferente daquilo que fazem todos os dias. A cada hora, no mundo, são vendidas trinta e dois milhões de garrafas de Coca-Cola. Isto significa que, no mundo, a cada hora, trinta e dois milhões de paladares sentem o mesmo gosto. Junto da globalização política, segundo a qual há, portanto, um só país que administra todo o universo, há a globalização dos gostos. Nosso ouvido foi globalizado com a música que é sempre a mesma. Antes de dar início à conferência, eu escutava música americana. Música americana até mesmo em um país como o Brasil que, sem dúvida nenhuma, tem a música mais linda de todos os tempos. E esta é a globalização do ouvido, mas depois há a globalização da vista com a televisão, as telenovelas e a CNN. E há ainda a globalização do olfato: todos os aeroportos

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do mundo têm o mesmo cheiro. Todos os hotéis do mundo têm o mesmo cheiro. E há também a globalização do tato, como também nos ensinou Bill Clinton. Logo, a globalização constitui um fator a mais de transformação. Todas estas transformações determinaram um grande conflito entre dois regimes políticos: de um lado o capitalismo e, de outro, o comunismo. No final das contas estes dois regimes estão demonstrando que o comunismo é capaz de distribuir a riqueza, mas não é capaz de produzi-la, enquanto que o capitalismo é capaz de produzir a riqueza, mas não é capaz de distribuí-la. Este problema determina que o comunismo perdeu, mas que o capitalismo não ganhou. Encontramo-nos em uma crise de passagem, pois é necessário criar um terceiro modelo que não seja nem o comunismo, baseado somente na solidariedade, nem o capitalismo, baseado somente na competitividade. E é necessário criar um modelo que não se baseie no trabalho, mas que esteja baseado no tempo livre. Então, o problema não é administrar o tempo livre. Antes de administrar o tempo livre é necessário criar um modelo de vida baseado no tempo livre e este modelo ainda não existe. E se não temos um novo modelo, baseado no tempo livre, não é possível administrar bem o tempo livre. Devemos fazer hoje pelo tempo livre aquilo que Taylor e Ford fizeram, no início do século, pelo tempo de trabalho, ou seja, um novo projeto global do trabalho, do estudo e da vida. Quais foram as conseqüências principais da industrialização que nos levaram ao mundo pós-industrial? A primeira conseqüência é o aumento da longevidade, isto é, os seres humanos aprenderam a viver mais. Nossos bisavós, na Itália, viviam trezentas mil horas em média e trabalhavam cento e vinte mil horas. Hoje, na Itália, vivemos aproximadamente setecentas mil horas, setenta e seis anos os homens e oitenta e dois anos as mulheres. Na Itália hoje existem oitocentos mil viúvos e dois milhões e setecentas mil viúvas. E é praticamente assim no mundo inteiro. O homem paga por sua eficiência gerencial morrendo muito antes de infarto. E bem feito! Além da característica da longevidade, a sociedade industrial propicia à sociedade pós-industrial um bem estar maior. Porém, é um bem estar com forte discriminação. Em 1997, o Produto Interno Líquido per capita, a renda per capita de um cidadão suíço foi de vinte mil dólares, de um cidadão americano, quinze mil dólares, de um cidadão italiano, treze mil dólares, em média, de um cidadão indiano, oitocentos e sessenta dólares, de um cidadão da Somália, sessenta dólares por ano. Isto significa que quando um americano convida um casal de amigos para jantar, é como se convidasse cento e quarenta indianos. A Índia gasta com alimentação o equivalente ao que os Estados Unidos gastam com os invólucros nos quais colocam os seus alimentos. Uma outra conseqüência importante é o aumento exponencial da população. Em 1700, a população mundial era de seiscentos milhões de habitantes. Hoje, a população mundial é de 6 bilhões de habitantes. E, nos dias de hoje, é registrado que o número de habitantes dos grandes centros urbanos supera 50% da população mundial. Mas, como vocês devem saber, a população também não é igualmente distribuída no globo. Há zonas desertas e vazias e há áreas super povoadas. Como dizia Bacon, o tempo, assim como o espaço, tem os seus desertos e suas solidões. Um físico americano, Stone, calculou que, se todos os chineses combinassem e, ao mesmo tempo, dessem um pulo de um metro, isto provocaria uma onda telúrica que, cinqüenta minutos depois, destruiria a Califórnia com um terremoto de grau 8 da escala Mercalli. Uma outra conseqüência da passagem da sociedade industrial à sociedade pós-industrial é constituída pelo que os economistas americanos chamam de jobless growth, isto é, desenvolvimento sem trabalho. Neste momento, em seis bilhões de habitantes, cinco bilhões não trabalham, condenados a um tipo de ócio permanente. Um bilhão de pessoas trabalha muito. Porém, também este bilhão de pessoas, que estão nos Estados Unidos, na Alemanha, no norte da Itália, em São Paulo, todas estas pessoas estão aterrorizadas pela possibilidade de não encontrar mais trabalho. Então há no mundo cinco milhões de pessoas que não trabalham, um milhão que trabalha e, neste milhão, o número de pessoas que trabalha é sempre menor. O desemprego é uma decorrência do fato que aprendemos a produzir sempre mais com cada vez menos trabalho humano. Na Fiat, em Turim, na Itália, para produzir um automóvel, há dez anos atrás, eram necessárias quatorze pessoas. Hoje é necessária uma pessoa só. E isto vale também para os computadores, para os aviões, para todos os nossos produtos. Graças à tecnologia e as ciências organizacionais aprendemos a produzir cada vez mais trabalhando cada vez menos. Ora, se vocês pensarem bem, este foi sempre um grande objetivo da espécie humana. Os seres humanos sempre sonharam viver o maior tempo possível, sofrer o menos possível e trabalhar o menos possível. Posso dar uma demonstração disto, do fato de que os seres humanos sempre sonharam não trabalhar. Antes, falei a respeito do purgatório; agora vou falar a respeito do paraíso. Como vocês sabem, existe um paraíso, ou melhor, muitos paraísos, descritos pelos teólogos da Igreja Católica. Existem também paraísos descritos pelos grandes teólogos protestantes. O próprio Lutero, em uma carta que escreveu à sua sobrinha, descreveu como é o paraíso. Mas o paraíso cristão é muito diferente do paraíso maometano. Não posso descrever como é o paraíso maometano, senão vocês se converteriam imediatamente ao maometanismo. E há os paraísos hindus, os paraísos dos vários ritos espíritas. Li várias histórias do paraíso e cheguei à conclusão de que existem dezoito paraísos. Existem várias histórias do paraíso ... Bem, em alguns paraísos se reza, em alguns paraísos se canta, em alguns paraísos se medita. Nos paraísos maometanos fazem-se coisas que não posso mencionar aqui. Mas em nenhum paraíso se trabalha. Em nenhum paraíso se trabalha! Então, tenha o paraíso sido criado por Deus, tenha sido inventado pelos homens, se o trabalho fosse um valor positivo, no paraíso se trabalharia. Parece-me que seja claro. De fato, o trabalho

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é uma grande invenção industrial. Até a chegada da sociedade industrial, sempre se trabalhou pouco. Mesmo os escravos não trabalhavam mais de cinco horas por dia. Os artesãos nunca trabalharam mais do que quatro horas por dia, antes da industrialização. O dia cheio de trabalho, que começava de madrugada e terminava no final da tarde, é uma invenção industrial que nasceu no final do século XVIII. Ontem fui visitar a cidade de Ouro Preto. Lá, no século XIX, existiam minas das quais os escravos não saiam nunca. Se entravam, só saiam quando estivessem mortos. Este é um tipo de vida totalmente industrial na qual, em uma primeira fase, se estuda - os poucos que podem estudar, em uma Segunda fase se trabalha e, em uma terceira fase, espera-se pela morte por inércia. Este é um modelo que foi importante para desenvolver a riqueza de alguns países e para determinar a passagem da sociedade industrial à sociedade pós-industrial. Acredito que sejam parênteses de duzentos anos, no âmbito de uma trajetória milenar, que vai do trabalho ao não trabalho, da dor ao prazer e, possivelmente, da morte prematura à longevidade. Isto modifica completamente todas as hierarquias das atividades humanas. Enquanto que na sociedade industrial a maior aspiração era o trabalho, e o luxo consistia na acumulação de coisas e no consumismo, hoje o luxo consiste em uma coisa completamente diferente. Hoje o luxo é caracterizado por ser raro. Uma coisa é de luxo se é rara. Mas o que é raro em Nova York? O que é raro em São Paulo, que é uma imitação feia de Nova York? Em Nova York, assim como em São Paulo, é raro o silêncio, é raro o espaço, é rara a autonomia, é rara a segurança social, é rara a criatividade. Estes serão os grandes luxos do século XXI. Isto porque são modificados completamente os valores. Os valores da sociedade industrial eram o racionalismo e a produtividade. E a produtividade era obtida através da padronização, da especialização, da sincronização, da concentração de todos nas grandes cidades e nos locais de trabalho. E o racionalismo da sociedade industrial era um racionalismo completamente destorcido em relação ao racionalismo que quiseram os iluministas. Os iluministas, no final do século XVI, contrapunham a razão humana à completa falta de uma pesquisa científica, à magia. Na indústria, porém, o racionalismo iluminista foi aplicado de uma maneira destorcida. Quando as indústrias falam de racionalismo querem dizer isto: tudo o que é bom é racional; tudo que é racional é masculino; tudo que é masculino tem a ver com a produção e tudo o que tem a ver com a produção é feito nos locais de trabalho. Contrariamente, tudo o que é emotivo é negativo; tudo que é emotivo é feminino; tudo o que é feminino tem a ver com a reprodução e tudo o que tem a ver com a reprodução é feito em casa. Por isso, a indústria separou nitidamente os locais de vida e os locais de trabalho; o tempo de trabalho do tempo livre. E quando termina o trabalho, todos voltam para casa na mesma hora. E quando começa o trabalho, todos devem ir para o escritório na mesma hora. E quando chegam as férias, todos tiram ao mesmo tempo. Um escritor italiano diz que, nas horas de pico, até o adultério é impossível! Tudo é complicado. Ora, a tudo isto a sociedade pós-industrial contrapõe uma situação completamente diferente. Os valores da sociedade pós-industrial são de outro tipo. A sociedade industrial apreciava a executividade acima de tudo, a obediência, a ductilidade, a conformidade. A sociedade pós-industrial aprecia, sobretudo a flexibilidade e a criatividade. A sociedade industrial apreciava, sobretudo a prática. A sociedade pós-industrial, a estética. Se um relógio é duzentas vezes mais preciso do que o necessário, qual a necessidade de aperfeiçoá-lo ainda mais, do ponto de vista prático? Aquilo que hoje distingue dois relógios não é a prática, mas sim o design. A estética é um dos grandes valores da sociedade pós-industrial. E um outro valor é a emotividade, que é conjugada com a racionalidade. Não mais só a racionalidade, não mais a emotividade como um fator negativo, mas a emotividade como um fator importantíssimo da alma humana. E a sociedade pós-industrial aprecia ainda a subjetividade. Não mais somente coisas de massa, consumo de massa, política de massa, sindicato de massa, tempo livre de massa, mas cada um quer ser apreciado como único. Como indivíduos únicos. Kirkegaard dizia: "Gostaria que sobre meu túmulo estivesse escrito: Aqui jaz aquele único". Ora, emotividade, subjetividade e estética são três valores tipicamente femininos, dos quais os homens descuidaram durante os duzentos anos da sociedade industrial e que só as mulheres continuaram a cultivar. Por isso, junto com a criatividade, a flexibilidade, a emotividade, a estética, um outro valor importante é a feminilização. Isto é, a sociedade pós-industrial não é nem homem, nem mulher: é andrógina. É uma sociedade na qual são apreciados tanto os valores tipicamente femininos, como os valores tipicamente masculinos. E cada homem descobre que tem em si mesmo uma parte feminina, da mesma forma que as mulheres descobrem que têm em si mesmas certas capacidades que eram típicas dos homens. As sociedades que ainda não perceberam a feminilização são sociedades bárbaras. Infelizmente, acredito que no próximo século não existirá a paridade entre o homem e a mulher, mas que as mulheres serão superiores por um pequeno detalhe: porque as mulheres podem ter filhos sem ter um marido enquanto que os homens não podem ter filhos sem ter uma mulher. Um outro valor da sociedade pós-industrial constituído pela desestruturação do tempo e do espaço. Graças à rádio, graças à televisão, graças ao telefone, graças ao fax, graças ao correio eletrônico e à Internet, hoje tornou-se quase indiferente o lugar e o tempo nos quais é feita grande parte de nossas atividades. Por exemplo: já que o sadismo dos organizadores deste congresso os condena a escutar sem falar, então tudo isto poderia ter sido feito pelo rádio ou pela televisão. Esta é a desestruturação do tempo e do espaço. E creio que cada vez mais estamos nos dirigimos para o tele-trabalho, isto é, um número crescente de pessoas fará em casa os trabalhos que hoje faz nos escritórios. E ir ao escritório hoje, para

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muitos, não é uma exigência prática de trabalho, mas um rito, determinado não pelo amor ao trabalho, como os homens procuram fazer crer, mas pelo ódio à família. Fugir de casa e permanecer no escritório o maior número de horas possível com a desculpa que precisa trabalhar. Há homens que permanecem duas, três, quatro horas a mais que o necessário no escritório, sem serem remunerados por isso, só pelo prazer de ficar no escritório fazendo companhia ao próprio chefe. Até agora falei de trabalho e gostaria de pedir desculpas a vocês por isso. Agora procurarei dizer algo a respeito do ócio. Como disse, nossos antepassados, nossos bisavós, viviam cerca de trezentas mil horas e trabalhavam cerca de cento e vinte mil horas. Hoje, nós vivemos cerca de setecentas mil horas e mesmo aqueles que trabalham oito horas por dia, dos vinte aos sessenta anos de idade, trabalham, no máximo, oitenta mil horas. Isto significa que nossos bisavós trabalhavam quase que a metade de suas vidas. Nós trabalhamos um décimo de nossas vidas. Mesmo os executivos mais eficientes, aqueles que dedicaram suas vidas à carreira, não trabalham mais de oitenta mil horas na vida. Façamos os cálculos rapidamente: aqueles de vocês que tem quarenta anos, segundo as estatísticas, deverão viver ainda cerca de trezentas e cinqüenta mil horas, deverão trabalhar ainda quarenta mil horas. Cento e trinta mil horas serão necessárias para realizar aquelas atividades que os ingleses chamam de care, de cuidados, dormir, comer, etc., e cento e oitenta mil horas de tempo serão livres. Então, uma pessoa de quarenta anos, qualquer um de vocês com aproximadamente quarenta anos de idade, deverá viver trezentas e cinqüenta mil horas, deverá trabalhar quarenta mil horas e terá cento e oitenta mil horas de tempo livre. O problema é que, dado que todos nós fomos preparados para o trabalho, tanto na família como na escola, na universidade, ninguém nunca nos preparou para o tempo livre e muitos de nós sabem trabalhar, mas não sabem administrar o tempo livre. O tempo livre é difícil de ser administrado porque, como eu disse, ainda não existe um modelo de vida e de sociedade que se baseie no tempo livre. Todos os modelos ocidentais de vida e de sociedade baseiam-se no tempo de trabalho. São uma exceção alguns países, muitos países orientais, muitas áreas do terceiro mundo, como por exemplo Salvador, na Bahia, e acredito que estes serão os modelos do futuro, não Nova York. E o que é uma loucura é que os brasileiros que perseguem o modelo de futuro baseado no tempo livre estão destruindo este modelo a favor de outros modelos americanos que estão baseados no tempo de trabalho. Isto é um genocídio, como foi um genocídio o que aconteceu com os escravos. Agora, nos quinze minutos que me restam, vamos falar um pouco a respeito do ócio. Hoje, principalmente nas grandes cidades pós industriais, frenéticas, hiperativas, temos vários tipos de trabalhadores. Há trabalhadores hiperativos alienados, que estão contentes por trabalhar sempre mais e quando conversam conosco nos dizem: "é, infelizmente o meu trabalho não me permite tirar férias". São pessoas perigosíssimas! Não tão perigosas para si mesmas, mas muito mais para os outros. São pessoas para as quais existe um só remédio: aconselhar e induzir ao suicídio. Porque, trabalhando muito, fazem trabalhar as pessoas que trabalham com elas e tornam-se escravistas de tipo moderno. Existem ainda os trabalhadores hiperativos que se queixam, aqueles que, quando falam a respeito de seu trabalho, dizem: "Infelizmente, infelizmente, sou obrigado a trabalhar muito", mas nunca mudam o seu modelo de vida. Finalmente, existem os hiperativos arrependidos, isto é, aqueles poucos managers que deixam o trabalho e dão início a uma nova vida, levando um tipo de vida mais introspectivo, mais humano. O problema é que nós incorporamos a idéia que o trabalho é um dever e o ócio é um pecado. Bertrand Russell, que escreveu um livro delicioso sobre o ócio, que se chama Elogio ao Ócio, escreveu: "Historicamente, o conceito de dever foi um meio encontrado pelos homens de poder para induzir outros homens a viver pelos interesses de seus patrões em vez de viver por seus próprios interesses". É isto que diz Bertrand Russell. Acredito que a grande sabedoria do ano 2000 será conseguir viver bem o próprio tempo. Na década de 20, um amigo de Herman Hesse que se chamava Erick Shouerman, descobriu que uma tribo nas ilhas de Samoa, por medo de ser colonizada pelos brancos, não sabendo como os brancos viviam, mandou um membro da tribo a Paris para que analisasse como viviam os brancos, os cidadãos evoluídos, que em sua língua chamam-se papalagi. O enviado, quando retornou às ilhas, fez um relatório a seus companheiros de tribo no qual descreve muito bem a vida dos brancos e o que o impressionou mais é que os brancos nunca têm tempo. Disse que os brancos, mesmo quando caminham, vão com os braços apressados, como se estivessem na água em uma canoa, para caminhar o mais depressa possível. No entanto, o tempo a eles destinado já existe na vida, não há nada a ser feito. É inútil acelerá-lo. E este maravilhoso antropólogo às avessas diz: "para nós, o maior perigo que vai resultar da colonização branca é que eles nos imponham os ritmos de seu tempo". O que depois aconteceu, como vocês podem ver aqui em São Paulo. Mas, por que os papalagi, isto é, nós, não temos tempo? Porque nós lançamos mão de certos artifícios. Eu listei sete. O primeiro, contraproducente para nós, é o mau uso do tempo. Temos fases sobrecarregadas de trabalho e outras sem trabalho, como as férias, por exemplo. O outro artifício é que, para evitar que saiamos dos locais de trabalho para ir ao bar ou ao restaurante, o bar e o restaurante foram levados para dentro da empresa de modo que não saiamos mais porque, fora, há a vida e a vida pode contagiar o trabalhador. Um terceiro artifício são as defasagens entre os horários de trabalho. Por exemplo, há mulheres que trabalham de dia e maridos que trabalham de noite e, portanto, encontram-se fugazmente só no elevador, dando vida a amores rapidíssimos, sem paixão. Depois há a sincronização, pela qual os filhos estão na escola enquanto os pais estão trabalhando e é impossível que possam viver juntos. Há também a

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hostilidade em relação ao tele-trabalho que, como falei anteriormente, há a possibilidade tecnológica de trabalhar em casa. Depois há a ilusão de que poderemos recuperar, quando nos aposentarmos, todas as alegrias que perdemos quando estávamos trabalhando. Por isso cada um de nós junta livros e não os lê e diz: vou ler estes livros quando estiver cego. Ou acumula discos e não os escuta e diz: vou escutá-los quando estiver surdo. E ainda há o fato de que o trabalho permite que nos libertemos de nosso pecado mortal. Esta é a maior balela que existe! O fato que um meu antepassado distante, que eu não conheço, não sei nem mesmo se existe, um belo dia, em vez de comer mamão papaia, em vez de comer uma manga, tenha comido uma maça, e que eu, por causa disso, milhares de gerações depois, devo trabalhar para libertar-me, acho uma loucura total. É difícil entender quem tenha podido ter criatividade para inventar um Deus assim tão terrível. É mais difícil ainda entender quem acredita nisso! Resta o fato de que a encíclica Populorum Rerum Novarum, de 1891, reforça que nós estamos condenados a comer o pão com o suor de nosso rosto, que as mulheres são obrigadas a sofrer na hora do parto porque são tristes e culpáveis as conseqüências do pecado, literalmente, as quais, gostemos ou não, nos acompanharão até a morte. Este Papa era um sádico! Leão XIII, naturalmente. Era um sádico a quem os cardeais, naturalmente, devem ter contado coisas erradas porque, em um certo ponto diz, sempre entres aspas: "Hoje, especialmente, com tanto ardor e desenfreada cobiça, é necessário conduzir a plebe com rédeas curtas", assim está escrito na Rerum Novarum. Tinham contado ao Papa que a plebe, isto é, o proletariado, os pobres, freqüentavam cassinos, que gastavam milhões, que cometiam pecados terríveis, que tinham iates, coisas terríveis. E de tudo isso nasceu a Rerum Novarum. Este castigo pelo qual o ócio é, por si mesmo, um fato negativo. Observei quais são as principais acusações contra o ócio. Em primeiro lugar, o ócio é o pai dos vícios. Ou seja, do ócio resultam só vícios. Assim que vocês ficarem sem fazer nada, logo começarão a usar drogas, começarão a cometer violência sexual, começarão a estuprar. Então, o ócio é perigosíssimo! Vocês nunca devem ficar sem fazer nada, senão imediatamente irão se tornar delinqüentes. Secunda acusação: do ócio vem a anarquia. Se as pessoas não fazem nada, não é mais possível governá-las. Terceira acusação: do ócio resultam as crises econômicas, as quedas nas bolsas. As pessoas que não fazem nada consomem sem produzir, portanto são perigosíssimas para a economia. As pessoas ociosas, ainda, quando às vezes trabalham, exigem uma alta remuneração. Estas são as principais acusações contra o ócio. Por isso, se procurarem nos dicionários por um sinônimo da palavra ócio perceberão que, quase sempre, encontrarão significados negativos. Eu contei que, dentre 74 sinônimos da palavra ócio em um dicionário italiano, somente 23 têm significados quase positivos, como alívio e repouso, por exemplo; 13 têm um significado neutro, como trégua; e 38 têm um significado negativo, como dissipação, traição, periculosidade. Naturalmente, o ócio é uma arte. Quase todos sabem trabalhar. Pouquíssimos são os que sabem ficar sem fazer nada. E isto é devido ao fato que todos nos ensinaram a trabalhar, mas ninguém, como eu já disse, nos ensinou a ficar sem fazer nada. Para ficar sem fazer nada são necessários os lugares certos. Vocês não podem ficar sem fazer nada em São Paulo. Podem criar estes grandes centros, mas nestes centros descansamos como se estivéssemos trabalhando. Estamos sempre frenéticos. Creio que muitos de vocês tiveram, nos livros de história, aquele lindo retrato de Napoleão montado em um cavalo desenhado pelo pintor David. Quando David desenhou este quadro perguntou a Napoleão: "Majestade, como gostaria de ser retratado?" E Napoleão respondeu: "Sereno, montado em um cavalo desgovernado". Os cidadãos de cidades como São Paulo ou como Nova York são exatamente o contrário. São desgovernados em cavalos serenos. Não há nenhum motivo para sermos frenéticos, mas nós nos damos a frenesis. Acredito que a sociedade industrial nos deixou como herança, a nós, homens da sociedade pós-industrial, muitos instrumentos que nos permitem viver bem o nosso tempo livre que, nos dias de hoje, corresponde a 9/10 da vida humana. Existem máquinas que nos permitem economizar tempo, como o telefone e o avião. Existem máquinas que nos permitem enriquecer o tempo, como o rádio que pode ser escutado no carro ou enquanto realizamos os nossos afazeres domésticos. Existem máquinas que nos permitem programar o tempo, como as agendas eletrônicas. E existem máquinas que nos permitem estocar o tempo, como por exemplo, as secretárias eletrônicas. Logo, nós herdamos uma tecnologia extremamente sofisticada que nos permite fazer sempre mais produtos com sempre menos esforço físico. O problema é que nós somos portadores de dois blocos de necessidades. De um lado, temos as necessidades de tipo alienado, que são as necessidades de poder, a necessidade de dinheiro, a necessidade de consumismo, de acumulação de coisas. Estas são necessidades quantitativas, que nunca são satisfeitas, pois quanto mais dinheiro temos, mais dinheiro queremos, mais poder temos, mais poder queremos. Junto deste grupo de necessidades, a socióloga Agnes Seller que as estudou coloca um outro grupo de necessidades que não são alienadas, não são quantitativas, mas são necessidades radicais que têm a ver com as raízes do ser humano. São necessidades qualitativas. E estas são a necessidade de introspecção, a necessidade de amizade, a necessidade de amor, a necessidade de brincadeira, a necessidade de convivência. Estas necessidades não são quantitativas, são qualitativas. E não requerem dinheiro para que sejam satisfeitas. É necessário educação mental para satisfazê-las. Eu, quando ligo meu computador, aparece uma frase que é um provérbio espanhol que diz: ombre que trabaja perde tiempo precioso, homem que trabalha perde tempo precioso.

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QUESTÕES DE VESTIBULAR

Filosofia 1º BIMESTRE 1º Sobre a passagem do mito à filosofia, na Grécia Antiga, considere as afirmativas a seguir. I. Os poemas homéricos, em razão de muitos de seus componentes, já contêm características essenciais da compreensão de mundo grega que, posteriormente, se revelaram importantes para o surgimento da filosofia. II. O naturalismo, que se manifesta nas origens da filosofia, já se evidencia na própria religiosidade grega, na medida em que nem homens nem deuses são compreendidos como perfeitos. III. A humanização dos deuses na religião grega, que os entende movidos por sentimentos similares aos dos homens, contribuiu para o processo de racionalização da cultura grega, auxiliando o desenvolvimento do pensamento filosófico e científico. IV. O mito foi superado, cedendo lugar ao pensamento filosófico, devido à assimilação que os gregos fizeram da sabedoria dos povos orientais, sabedoria esta desvinculada de qualquer base religiosa. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e II. b) II e IV. c) III e IV. d) I, II e III. e) I, III e IV. 2º “Há, porém, algo de fundamentalmente novo na maneira como os Gregos puseram a serviço do seu problema último - da origem e essência das coisas - as observações empíricas que receberam do Oriente e enriqueceram com as suas próprias, bem como no modo de submeter ao pensamento teórico e casual o reino dos mitos, fundado na observação das realidades aparentes do mundo sensível: os mitos sobre o nascimento do mundo.” Com base no texto e nos conhecimentos sobre a relação entre mito e filosofia na Grécia, é correto afirmar: a) Em que pese ser considerada como criação dos gregos, a filosofia se origina no Oriente sob o influxo da religião e apenas posteriormente chega à Grécia. b) A filosofia representa uma ruptura radical em relação aos mitos, representando uma nova forma de pensamento plenamente racional desde as suas origens. c) Apesar de ser pensamento racional, a filosofia se desvincula dos mitos de forma gradual. d) Filosofia e mito sempre mantiveram uma relação de interdependência, uma vez que o pensamento filosófico necessita do mito para se expressar.

e) O mito já era filosofia, uma vez que buscava respostas para problemas que até hoje são objeto da pesquisa filosófica. 3º Os poemas de Homero serviram de alimento espiritual aos gregos, contribuindo de forma essencial para aquilo que mais tarde se desenvolveria como filosofia. Em seus poemas, a harmonia, a proporção, o limite e a medida, assim como a presença de questionamentos acerca das causas, dos princípios e do porquê das coisas se faziam presentes, revelando depois uma constante na elaboração dos princípios metafísicos da filosofia grega. Com base no texto e nos conhecimentos acerca das características que marcaram o nascimento da filosofia na Grécia, considere as afirmativas a seguir. I. A política, enquanto forma de disputa oratória, contribuiu para formar um grupo de iguais, os cidadãos, que buscavam a verdade pela força da argumentação. II. O palácio real, que centralizava os poderes militar e religioso, foi substituído pela Ágora, espaço público onde os problemas da polis eram debatidos. III. A palavra, utilizada na prática religiosa e nos ditos do rei, perdeu a função ritualista de fórmula justa, passando a ser veículo do debate e da discussão. IV. A expressão filosófica é tributária do caráter pragmático dos gregos, que substituíram a contemplação desinteressada dos mitos pela técnica utilitária do pensar racional. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e III. b) II e IV. c) III e IV. d) I, II e III. e) I, II e IV. 4º O mito é essencialmente uma narrativa que não se define apenas pelo tema ou objeto da narrativa, mas pelo modo de narrar. O modo de narrar característico do pensamento mítico pode ser corretamente definido como uma forma que recorre: a) à fantasia somente para descrever o sobrenatural. b) ao mágico para descrever o mundo e o homem. c) à experimentação para explicar a natureza. d) à descrição para compreender o progresso histórico. e) à experimentação para descrever o mundo e a história.

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5º Considere o texto. O verdadeiro substrato do mito não é de pensamento, mas de sentimento. O mito e a religião primitiva não são, de maneira alguma, totalmente incoerentes, nem destituídos de senso ou de razão; mas sua coerência depende muito mais da unidade de sentimento que de regras lógicas. Analise as proposições sobre o conhecimento mítico, procurando identificar a que não esteja em consonância com as idéias que o autor tem em relação ao mito. a) O mito é uma forma de se situar no mundo, isto é, de encontrar o seu lugar entre os demais seres da natureza. b) Apesar de primitivas, as narrativas mitológicas possuíam uma logicidade coletivamente aceita. c) O pensamento mítico tem como fundamento o racionalismo, isto é, a confirmação do real. d) O mito nasce do desejo de dominação do mundo, para afugentar o medo e a insegurança. e) O mito é sempre um pensamento individual, que vira uma história ou uma lenda particular, com final trágico. 6º Sobre a Filosofia podemos afirmar: a) Originou-se da inquietação gerada pela curiosidade humana em compreender e questionar os valores e as interpretações comumente não aceitas sobre a sua própria realidade. b) Originou-se da inquietação gerada pelo sentimento humano de grandeza e questionador sobre os valores e as interpretações comumente aceitas sobre a sua própria realidade. c) Originou-se da inquietação gerada pela curiosidade humana em compreender e questionar os valores e as interpretações comumente aceitas sobre a sua própria realidade. d) Originou-se do comodismo e da fase da curiosidade humana em compreender e questionar os valores e as interpretações comumente aceitas sobre a sua própria realidade. e) Nenhuma das alternativas acima. 7º O mito: I. É uma narrativa tradicional com caráter explicativo e/ou simbólico, profundamente relacionado com uma dada cultura e/ou religião. II. Procura explicar os principais acontecimentos da vida, os fenômenos naturais, as origens do Mundo e do Homem por meio de deuses, semideuses e heróis (todas elas são criaturas sobrenaturais). III. É uma primeira tentativa de explicar a realidade. IV. O termo "mito" é, por vezes, utilizado de forma pejorativa para se referir às crenças comuns (consideradas sem fundamento objetivo ou científico, e vistas apenas como histórias de um universo puramente maravilhoso) de diversas comunidades.

Assinale a alternativa correta: a) I, apenas b) II e III, apenas c) III e IV, apenas d) I e IV, apenas e) I, II, III e IV 8º Analise a figura a seguir.

A imagem nos mostra uma cena extraída da mitologia grega, o conhecido duelo entre Teseu e o Minotauro, alegorias como essa eram muitas vezes utilizadas pelos gregos com a finalidade de demonstrar as origens de muitas instituições e costumes daquele povo, construindo desta forma uma grande variedade de narrativas que eram reproduzidas nos espaços públicos e privados por diversas gerações. A respeito da religião e da religiosidade entre os gregos, considere as seguintes proposições: I. A Religião grega não apresentava Dogmas ou valores maniqueístas, tendo sua aplicação voltada para as atividades práticas, uma vez que os gregos não a destinavam para a salvação das suas almas. II. Os deuses gregos eram vistos como titãs, associados completamente aos elementos da natureza e completamente distantes das características físicas e psicológicas dos homens. O panteão grego ressalta a noção de politeísmo da cultura pagã clássica, envolvendo uma grande variedade de deuses, semideuses, heróis e entidades como sátiros e ninfas. III. Os deuses gregos eram diferenciados dos seres humanos devido ao fato de serem imunes ao tempo e as feridas, serem capazes de se tornarem invisíveis, percorrerem longas distâncias

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quase instantaneamente e terem o poder de falar com os seres humanos sem o conhecimento destes. IV. Os gregos preocupavam-se com a oferenda periódica de sacrifícios animais aos deuses olímpicos com a finalidade de buscar a proteção destes contra a ida para o Tártaro (Mundo dos mortos, governado por Hades), uma espécie de inferno para onde os condenados eram enviados depois da morte. Estão corretas: a) II e V b) I, II e IV c) I, II, III e IV d) II, III, IV e V e) I, II, III e V 9º As circunstâncias históricas do Mundo Antigo certamente contribuíram para as discussões do pensamento filosófico da Grécia Antiga foram: a) Arqueduto, Pirâmides, Moeda, Matemática e Metalurgia. b) Navegações, Moeda, Política, Calendário e Polis. c) Calendário, Arqueduto, Moeda, Matemática e Pirâmides. d) Matemática, Navegação, Pólis, Metalurgia e Calendário. e) Nenhuma das alternativas acima. 10º “Zeus ocupa o trono do universo. Agora o mundo está ordenado. Os deuses disputaram entre si, alguns triunfaram. Tudo o que havia de ruim no céu etéreo foi expulso, ou para a prisão do Tártaro ou para a Terra, entre os mortais. E os homens, o que acontece com eles? Quem são eles?” O texto acima é parte de uma narrativa mítica. Considerando que o mito pode ser uma forma de conhecimento, assinale a alternativa correta. a) A verdade do mito obedece a critérios empíricos e científicos de comprovação. b) O conhecimento mítico segue um rigoroso procedimento lógico-analítico para estabelecer suas verdades. c) As explicações míticas constroem-se de maneira argumentativa e autocrítica. d) O mito busca explicações definitivas acerca do homem e do mundo, e sua verdade independe de provas. e) A verdade do mito obedece a regras universais do pensamento racional, tais como a lei de não-contradição.

QUESTÕES DISCURSIVAS: “O bom senso é a coisa mais bem repartida entre os homens, pois cada qual pensa estar tão bem provido dele, que mesmo os que são mais difíceis de contentar em qualquer outra coisa não costumam desejar tê-lo mais do que o têm. E não é verossímil que todos se enganem a tal respeito; mas isso antes testemunha que o poder de bem julgar e distinguir o verdadeiro do falso, que é propriamente o que se denomina o bom senso ou razão, é naturalmente igual em todos os homens. E, desse modo, a diversidade das opiniões não provém de sermos uns mais racionais do que outros, mas de conduzirmos nossos pensamentos por vias diversas e não considerarmos as mesmas coisas. Pois não é suficiente ter o espírito bom, o principal é aplicá-lo bem. [...] Quanto a mim, jamais presumi que meu espírito fosse em nada mais perfeito do que os do comum; e amiúde desejei ter o pensamento tão rápido, ou a imaginação tão nítida e distinta, ou a memória tão ampla e presente quanto a de outras pessoas. No que diz respeito à razão ou bom senso, posto que é a única coisa que nos torna homens e nos distingue dos animais, quero crer que existe inteiramente em cada um de nós, e seguir nisso a opinião comum dos filósofos, que dizem que só há mais e menos no que respeita aos acidentes, e não entre as formas ou naturezas dos indivíduos da mesma espécie.”

René Descartes Segundo texto acima: 1º O que todos os homens têm em comum? 2º Por que, segundo Descartes, os homens têm opiniões diversas? 3º O que distingue os homens entre si? 4º Na parte final do Discurso do Método, Descartes sugere que o seu método filosófico poderia colaborar para produzir uma medicina mais útil e sólida do que aquela existente em seu tempo. Segundo ele, “poderíamos livrarmo-nos de uma infinidade de moléstias, quer do espírito, quer do corpo, e talvez mesmo do enfraquecimento da velhice, se tivéssemos bastante conhecimento de suas causas e de todos os remédios de que a natureza nos dotou.” Considerando o projeto cartesiano, redija um texto respondendo, do seu ponto de vista, a seguinte questão: Pode a ciência vencer a morte?

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QUESTÕES DE VESTIBULAR

Filosofia 2º BIMESTRE 1º Leia o enunciado apresentado a seguir e identifique a afirmação correta. Os filósofos pré-socráticos quiseram compreender as lições da Natureza. Todo o espetáculo dramatizado diariamente pela Natureza era fantástico o suficiente para suscitar indagações. Por exemplo: como eram possíveis seres marinhos, como a terra produzia rochas e árvores e grãos? Como uma substância podia se transformar em algo completamente diferente? Todos os fenômenos naturais eram misteriosos. Além disto, havia poucas palavras no vocabulário dos idiomas falados para designar fenômenos observáveis. I. Os primeiros filósofos tinham uma coisa em comum: eles acreditavam que uma determinada substância básica estava por trás de todas as transformações. II. Ao observar a natureza, os filósofos pré-socráticos buscavam respostas na tentativa de identificar leis naturais que fossem eternas. III. Filósofos pré-socráticos como Tales, Anaximandro, Anaxímenes, Pitágoras e Heráclito deram início ao pensamento científico, partindo da indagação, seguindo-se a investigação, depois a experimentação e, por fim, o registro do fenômeno observado. IV. As indagações dos filósofos daquele tempo eram incipientes e pouco contribuíram para a ciência. O legado de Sócrates, Platão e Aristóteles é que deve ser considerado para obter conhecimentos sobre os fenômenos da natureza. A seqüencia correta é: a) As assertivas I, II e IV estão corretas. b) As assertivas I, II e III estão corretas. c) Apenas a assertiva III está correta. d) Apenas as assertivas III e IV estão corretas. e) Apenas as assertivas I e III estão corretas. 2º Os pioneiros do pensamento ocidental anteriores a Sócrates, de um modo geral, observavam a natureza. À noite segue o dia. As estações do ano sucedem-se uma à outra. As plantas e os animais nascem, crescem e morrem. Diante desse espetáculo cotidiano da natureza, o homem manifesta sentimentos variados - medo, resignação, incompreensão e espanto. E são precisamente esses sentimentos que acabam por levá-lo à filosofia. O espanto inicial traduz-se em perguntas intrigantes: O que é essa natureza, que apresenta tantas variações? Ela possui uma ordem ou é um caos sem nexo?

A partir do assunto abordado no texto acima e considerando o pensamento de filósofos pré-socráticos, assinale a opção correta. a) Parmênides é o filósofo pré-socrático que do seu tempo destoava dos outros filósofos por sua abordagem da temática antropológica ao estudar o agir do homem e fundar, desse modo, a ética. b) Pitágoras considerava tudo relativo na medida em que percebia o inter-relacionamento de todas as coisas. c) Para Heráclito, o mundo era um eterno fluir, como um rio em que seria impossível banhar-se duas vezes na mesma água. d) Para Anaxímenes, tudo se origina na água e toda a natureza teria como único princípio esse elemento natural. e) Nenhuma das alternativas apresentadas. 3º No mito da caverna, Platão ilustra seu pensamento sobre a tarefa do filósofo: a) O filósofo é aquele prisioneiro que se soltando das amarras, dirige-se para o fundo da caverna a fim de ver melhor os contornos das sombras, após volta-se para os outros prisioneiros a fim de libertá-los. b) O filósofo é aquele prisioneiro que soltando-se das amarras, dirige-se para fora da caverna e após conhecer as coisas como elas são, regressaria à caverna a fim de libertar os outros prisioneiros, mesmo correndo o risco de não ser entendido ou até mesmo ser assassinado por eles. c) O Filósofo é aquele prisioneiro que se soltando das amarras dirige-se para fora da caverna, passa a contemplar as coisas e assim deixa de viver das aparências. d) O filósofo conjuntamente com os outros prisioneiros, soltam-se das amarras e dirigem-se para fora da caverna, não precisando voltar, pois todos têm a capacidade de entender e conhecer as coisas como elas são. e) O filósofo não necessita soltar-se das amarras. Ali dentro da caverna, vislumbrando as sombras das coisas, ele consegue conhecer as coisas como são e por sua vez explicar aos outros prisioneiros. 4º Aristóteles foi o mais famoso discípulo de Platão e dele se diferenciou por estabelecer uma teoria do conhecimento que não separa o grau primeiro - a sensação - do conhecimento intelectual. Enquanto Platão se dedicou preferencialmente a fazer desenhos de construções sociais imaginárias, utópicas, a fazer projeções sobre qual o melhor futuro da humanidade, Aristóteles estudou política, ética,

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linguagem e retórica, física, biologia, fundamentando-se em uma minuciosa observação da organização das cidades, da sociedade, dos homens e sua linguagem, da natureza, classificando as coisas do mundo segundo suas semelhanças e diferenças. De acordo com o texto, podemos afirmar, que Platão, em relação a Aristóteles: a) Não imaginava que seu discípulo pudesse atingir tal grau de organização. b) Manteve-se mais na esfera do ideal, do imaginário, do inatingível. c) Era mais novo em idade e, portanto, muito mais utópico e idealista. d) Era mais velho em idade, mas possuía uma visão mais jovial e realista. e) Era mais artístico, chegando às artes plásticas com seus desenhos de construções. 5º Na perspectiva do pensamento de Platão, as relações humanas deveriam ser calcadas pelo valor supremo do bem. Desse modo, o ideal que todos os homens deveriam tentar atingir estaria em uma condição fundamental. Essa condição seria: a) Os homens deveriam seguir apenas a razão, desprezando os instintos ou paixões. b) O homem deveria levar em conta tudo aquilo que ele tem de racional e de instintivo. c) O homem, sem os instintos e sem as paixões, não consegue agir para o bem. d) O homem de ação boa é todo aquele que sabe dosar paixão e razão. e) Nenhuma das alternativas acima. 6º O método filosófico de Sócrates consiste em: a) afastar-se do mundo, para meditar melhor a respeito das idéias, que são a realidade fundamental da natureza. b) ver, em todos os seres, a união indissolúvel da matéria unida à forma, tomando a natureza e os seus reinos como objetos de estudos. c) alegar a própria ignorância para, na interlocução com os que julgam saber mais, descobrir a verdade. d) enxergar o mundo a partir de uma amálgama de matéria e forma, denominada por ele de substância. e) duvidar de toda a realidade para, então, a partir do próprio pensamento, construir um sistema de conhecimento que considere correto, tendo, por conseqüência, a convicção da própria existência. 7º Escolha a alternativa que apresenta os quatros períodos da filosofia antiga na Grécia: a) Antigo, Medieval, Moderno e Helenístico. b) Clássico, Medieval, Moderno e Contemporâneo. c) Homérico, arcaico, clássico e Helenístico. d) Clássico, helenístico, Moderno e Medieval.

e) Pré-socrático, Socrático, existencialista e hermenêutico. 8º Assinale a alternativa correta. No livro VI da República Platão apresenta sua teoria do conhecimento mediante o esquema da "linha dividida". A exposição de sua teoria do conhecimento neste diagrama ilustra a célebre separação platônica entre o mundo sensível e o mundo inteligível, cada qual com seus modos de conhecer, hierarquicamente distribuídos. Sobre o diagrama da “linha dividida", ou seja, sobre a teoria do conhecimento platônica, podemos afirmar que: a) Platão apresenta os modos do conhecimento distribuídos em uma "linha dividida" em duas partes desiguais, isto é, uma delas é maior do que a outra. A primeira parte dita inferior é chamada de visível e é menor que a parte dita superior, chamada de invisível. Esta divisão permite falar em graus de conhecimento, indo do mais baixo para o mais alto, havendo, portanto, passagem de um para outro. b) Platão apresenta os modos do conhecimento distribuídos em uma "linha dividida" em duas partes iguais: a parte dita inferior é chamada de visível e a parte dita superior é chamada de invisível. A distribuição dos modos de conhecer permite falar em modos de conhecimento e não em graus do conhecimento, pois não há passagem de um ao outro. c) Podemos afirmar que está ausente da teoria do conhecimento platônica a matemática, a qual é substituída pela dialética, método científico por excelência da filosofia platônica. d) O quarto e último modo ou grau de conhecimento é a dianóia, isto é, raciocínio discursivo. Este nível, o mais alto, é o que conhece as essências, é ele que permite a Platão afirmar que a alma não participa da natureza do objeto conhecido, sendo pura essência, ela é separada na natureza das coisas em si. e) A teoria do conhecimento platônica afirma, pela primeira vez na história do pensamento filosófico ocidental, que a alma não conhece por meio do corpo. Por isso, a República enfatiza o caráter estático do conhecimento, ou seja, não há passagem de um grau para outro na "linha dividida", o mundo sensível está separado do mundo inteligível, não havendo correspondência entre ambos. 9º Aristóteles, em sua teoria do conhecimento, afirmava que cada ser ou objeto tem sua própria substância e seus acidentes. Para este filósofo, a substância: a) consiste nos elementos físicos que constituem a coisa. b) é o propósito, o objetivo, a finalidade do ser específico.

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c) é aquela que não altera a essência daquilo que um ser ou objeto é. d) é o conjunto de todas as características fundamentais, como dimensão, qualidade, matéria etc. e) Nenhuma das alternativas apresentadas. 10º Interpretando o Mito da Caverna de Platão, qual o instrumento que liberta o prisioneiro rebelde e com o qual ele deseja libertar os outros prisioneiros? a) A luz da verdade. b) A realidade. c) A Filosofia. d) As coisas que percebemos. e) A coragem.

No filme Matrix a realidade é forjada por uma espécie de inteligência artificial (A Matrix), que funciona como um "útero" universal ao qual dentro estão todos os seres humanos, vivendo em uma realidade virtual ou falsa. Analisando o filme sobre um prisma filosófico, em especial a partir do mito da caverna de Platão, qual das reflexões a baixo seria mais adequada. a) A Matrix, sobre uma perspectiva platônica é a caverna a qual todos os indivíduos habitam, sendo esta a única e filosófica realidade que os seres humanos estão inseridos. b) Os nossos sentidos conseguem sempre constatar a realidade tal como ela é . c) É a partir da credibilidade inquestionável nas idéias do senso comum que damos o primeiro passo ruma a reflexão filosófica. d) A caverna na concepção platônica assemelha-se a Matrix, pois ambas representam o mundo de aparências e preconceitos ao qual vivemos alienados da realidade, sendo impossível nos libertar sem a filosofia, que propõe a reflexão do próprio pensamento. e) Platão critica através do mito da caverna, o homem grego descrente dos deuses, e propõe que o ser humano deve agir de acordo com a vontade dos deuses.

INTERPRETAÇÃO:

Platão referia-se aos seus contemporâneos, com suas crenças e superstições. O filósofo era qual um fugitivo capaz de fugir das amarras que prendem o homem comum às suas falsas crenças e, partindo na busca da verdade, consegue apreender um mundo mais amplo. Ao falar destas verdades para os homens afeitos às suas impressões, não seria compreendido e seria como tomado por mentiroso, um corruptor da ordem vigente. O mito da caverna é uma metáfora da condição humana perante o mundo, no que diz respeito à importância do conhecimento filosófico e à educação como forma de superação da ignorância, isto é, a passagem gradativa do senso comum enquanto visão de mundo e explicação da realidade para o conhecimento filosófico, que é racional, sistemático e organizado, que busca as respostas não no acaso, mas na causalidade. Segundo a metáfora de Platão, o processo para a obtenção da consciência abrange dois domínios: o domínio das coisas sensíveis (eikasia e pístis) e o domínio das idéias (diánoia e nóesis). Para o filósofo, a realidade está no mundo das idéias e a maioria da humanidade vive na condição da ignorância, no mundo ilusório das coisas sensíveis, no grau da apreensão de imagens (eikasia), as quais são mutáveis, corruptiveis, não são funcionais e, por isso, não são objetos de conhecimento.

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QUESTÕES DE VESTIBULAR

Filosofia 3º BIMESTRE 1º A substituição de moedas por cheques foi feita pela primeira vez pelos Cavaleiros Templários, uma ordem formada por monges guerreiros, criada para defender Jerusalém dos chamados "infiéis", que matava e pilhava em nome de Deus. Com o tempo, os Templários foram adquirindo grandes riquezas, sendo alvo constante de roubos e ataques durante suas viagens. Para proteger seu patrimônio, eles criaram um documento que poderia ser trocado por moeda corrente com os companheiros de outras cidades: o cheque. De acordo com o texto, e em última análise, o cheque foi criado para: a) Em nome de Deus, proteger Jerusalém dos Cavaleiros Templários. b) Proteger os bens de guerreiros assassinos. c) Facilitar o transporte de grandes quantias sem o inconveniente do peso. d) Ser utilizado como forma de pagamento de mercenários para a defesa de Jerusalém. e) Servir para pagamento dos companheiros de outras cidades para lutarem contra os “infiéis”. 2º Quando você observa o movimento das estrelas no céu, tem a sensação de que você está no centro do universo e que todos os astros giram ao redor da Terra. Essa impressão fez com que os povos antigos acreditassem no chamado sistema geocêntrico, ou seja, a Terra seria o centro do universo, e ao redor dela girariam todos os planetas, o Sol, a Lua, os cometas e outros corpos celestes. No sistema geocêntrico, a Terra ocupa o centro do universo, ao redor do qual orbitam todos os planetas, o Sol, a Lua e todos os demais astros celestes. Nicolau Copérnico (1473-1543) era um religioso polonês que ensinava Astronomia em uma universidade da Itália. Estudando textos gregos, descobriu que um antigo astrônomo chamado Aristarco de Samos acreditava que os planetas giravam ao redor do Sol. Segundo Aristarco, era o Sol que ocupava o centro do sistema solar, e não a Terra. Ele acreditava no chamado sistema heliocêntrico (Sol no centro). Baseado no que leu, Copérnico escreveu um livro chamado “A revolução dos corpos celestes”, no qual defende o sistema heliocêntrico. Sabendo das enormes conseqüências que seu livro traria, Copérnico somente permitiu que o livro fosse publicado no fim de sua vida. A repercussão foi realmente enorme. A Igreja, que dominava o pensamento da época na Europa, passou a perseguir aqueles que defendiam o sistema heliocêntrico. O próprio Galileu passou por um processo de julgamento. Seus livros foram

colocados na lista negra da Igreja, e ele foi condenado a passar o resto de seus dias preso em sua casa, com limitação até de papel para escrever. Por onze anos, até a data de sua morte, Galileu pagou por ensinar que a Terra gira ao redor do Sol, como Copérnico apregoara. Analisando o texto apresentado, assinale a alternativa que, com certeza, pode ser afirmada sobre as informações expostas: a) Copérnico sabia que a mudança de referencial iria desagradar a Igreja, fato que Galileu sentiu em sua pele. b) Aristarco de Samos também foi punido em sua época e é por isso que ninguém havia visto seus textos até serem encontrados por Copérnico. c) Copérnico, na verdade, não descobriu nada em sua vida - ele se aproveitou de idéias dos outros. d) Copérnico tinha como única intenção desafiar o sistema dominante, ou seja, a Igreja - por isso resolveu publicar seu livro no final de sua vida. e) Gutemberg ficou preso durante onze anos, até a data de sua morte, por ter impresso o livro com a teoria do movimento heliocêntrico. 3º O trecho que segue foi extraído das Confissões, de Santo Agostinho: "Quem nos mostrará o Bem? Ouçam a resposta: está gravada dentro de nós a luz do vosso rosto Senhor. Nós não somos a luz que ilumina a todo homem, mas somos iluminados por Vós." A partir dos seus conhecimentos sobre as filosofias de Santo Agostinho e Tomás de Aquino, identifique qual das afirmações abaixo está CORRETA: a) As cinco vias de Tomás de Aquino são argumentos diretos e evidentes da existência de Deus. Partem de afirmações gerais e racionais sobre a existência, para chegar a conclusões sobre as coisas sensíveis, particulares e verificáveis sobre o mundo natural. b) Os argumentos de Santo Agostinho que provam a existência de Deus denotam a influência direta que ele teve do pensamento de Aristóteles, principalmente da Metafísica. c) Para Santo Agostinho, a irradiação da luz divina faz com que conheçamos imediatamente as verdades eternas em Deus. Essas verdades eternas e necessárias não estão no interior do homem, porque seu intelecto é mutável e contingente.

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d) Tomás de Aquino construiu uma argumentação para provar a existência de Deus à luz das idéias de Platão e de vários fragmentos da Bíblia. e) Para Santo Agostinho, a irradiação da luz divina atua imediatamente sobre o intelecto humano, deixando-o ativo para o conhecimento das verdades eternas. Essas verdades, necessárias e imutáveis, estão no interior do homem. 4º Durante a Idade Média, a questão dos universais foi um dos grandes problemas debatidos pelos filósofos da época. Realismo, conceitualismo e nominalismo foram as soluções típicas do problema. Outra preocupação da época foi o da possibilidade ou impossibilidade de conciliar fé e razão. Santo Agostinho, sobre a relação fé e razão, protagonizou uma tese que se pode resumir na frase: "Credo ut intelligam" (Creio para entender). A partir dos seus conhecimentos sobre a questão dos universais e da filosofia medieval, identifique as proposições verdadeiras: I - O apogeu da patrística aconteceu no século XIII com Santo Tomás de Aquino (1225-1274), que, retomando o pensamento de Platão, fez a síntese mais bem elaborada da filosofia com o cristianismo durante a Idade Média. II - O pensamento filosófico medieval, a partir do século IX, é chamado de escolástica. A filosofia escolástica tinha por problema fundamental levar o homem a compreender a verdade revelada pelo exercício da razão, contudo apoiado na Auctoritas, seja da Bíblia, seja de um padre da Igreja. III - Para os nominalistas, o universal é apenas um conteúdo da nossa mente, expresso por um nome. O que significa dizer que os universais são apenas palavras, sem nenhuma realidade específica correspondente. IV - No conceitualismo de Pedro Abelardo, os universais são conceitos, entidades mentais, que não existem na realidade, nem são meros nomes. V - De acordo com a teoria da iluminação de Santo Agostinho, o ser humano recebe de Deus o conhecimento das verdades eternas. Tal como o sol, Deus ilumina a razão e torna possível o pensar correto. Em verdade, Santo Agostinho não conflita a fé com a razão, sendo esta última auxiliar e subordinada da fé. Assinale a alternativa que contém as afirmativas verdadeiras: a) I, II e III b) I, III e V c) II e V d) I, II e IV e) II, III, IV e V 5º É amplamente conhecido, na história da filosofia, como Descartes coloca em dúvida todo o

conhecimento, até encontrar um fundamento inabalável; uma espécie de princípio de reconstituição do conhecimento. Neste processo, Descartes elege uma regra metodológica que o orientará na busca de novas verdades. A regra geral que orientará Descartes na busca de novas verdades é: a) a possibilidade do mundo externo. b) a possibilidade de unirmos corpo e alma. c) a clareza e distinção. d) a certeza dos juízos matemáticos. e) a idéia de que corpo e alma são entidades distintas. 6º Leia o seguinte texto de Descartes: [...] considerei em geral o que é necessário a uma proposição para ser verdadeira e certa, pois, como acabara de encontrar uma proposição que eu sabia sê-lo inteiramente, pensei que devia saber igualmente em que consiste essa certeza. E, tendo percebido que nada há no “penso, logo existo” que me assegure que digo a verdade, exceto que vejo muito claramente que, para pensar, é preciso existir, pensei poder tomar por regra geral que as coisas que concebemos clara e distintamente são todas verdadeiras. Com base no texto e nos conhecimentos sobre o pensamento cartesiano, é correto afirmar: a) Para Descartes, a proposição “penso, logo existo” não pode ser considerada como uma proposição indubitavelmente verdadeira. b) Embora seja verdadeira, a proposição “penso, logo existo” é uma tautologia inútil no contexto da filosofia cartesiana. c) Tomando como base a proposição "penso, logo existo", Descartes conclui que o que é necessário para que uma proposição qualquer seja verdadeira é que ela enuncie algo que possa ser concebido clara e distintamente. d) Descartes é um filósofo cético, uma vez que afirma que não é possível se ter certeza sobre a verdade de qualquer proposição. e) Tomando como exemplo a proposição "penso, logo existo", Descartes conclui que uma proposição qualquer só pode ser considerada como verdadeira se ela tiver sido provada com base na experiência. 7º Segundo Francis Bacon, “são de quatro gêneros os ídolos que bloqueiam a mente humana. Para melhor apresentá-los, lhes assinamos nomes, a saber: Ídolos da Tribo; Ídolos da Caverna; Ídolos do Foro e Ídolos do Teatro”. Com base nos conhecimentos sobre Bacon, os Ídolos da Tribo são: a) Os ídolos dos homens enquanto indivíduos. b) Aqueles provenientes do intercurso e da associação recíproca dos indivíduos.

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c) Aqueles que imigraram para o espírito dos homens por meio das diversas doutrinas filosóficas. d) Aqueles que chegam ao espírito humano por meio de regras viciosas de demonstração. e) Aqueles fundados na própria natureza humana. 8º Unamo-nos para defender os fracos da opressão, conter os ambiciosos e assegurar a cada um a posse daquilo que lhe pertence, instituamos regulamentos de justiça e de paz, aos quais todos sejam obrigados a conformar-se, que não abram exceção para ninguém e que, submetendo igualmente a deveres mútuos o poderoso e o fraco, reparem de certo modo os caprichos da fortuna. De acordo com o texto e com os conhecimentos sobre o tema, assinale a alternativa que reproduz a relação que Rousseau estabelece entre as idéias de Contrato Social e Desigualdade. a) O Contrato Social, uma imposição do soberano sobre seus súditos, elimina a liberdade natural e faz aumentar a fortuna dos fortes e opressão sobre os fracos. b) O Contrato Social, obrigações impostas pelos fortes para serem cumpridas pelos mais fracos, amplia a desigualdade e a discórdia social. c) O Contrato Social, regulamento aplicado a todos, divide igualmente a riqueza e as posses dos fortes entre os mais fracos para poder promover a igualdade social. d) O Contrato Social, um pacto legítimo, permite aos homens, em troca de sua liberdade natural, a vida em concórdia, ao estabelecer obrigações comuns a todos e equiparar as diferenças que a sorte fez favorecer a uns e não a outros. e) O Contrato social, um pacto de defesa dos mais fracos, elimina a desigualdade, ao submeter os ricos ao poder dos fracos e assim permite que as posses sejam igualmente distribuídas. 9º “Poder-se-ia [...] acrescentar à aquisição do estado civil a liberdade moral, única a tornar o homem verdadeiramente senhor de si mesmo, porque o impulso do puro apetite é escravidão, e a obediência à lei que se estatui a si mesma é liberdade”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre a liberdade em Rousseau, é correto afirmar: a) As leis condizentes com a liberdade moral dos homens devem atender aos seus apetites. b) A liberdade adquire sentido para os homens na medida em que eles podem desobedecer às leis. c) O homem livre obedece a princípios, independentemente de eles também valerem para a sociedade. d) O homem afirma sua liberdade quando obedece a uma lei que prescreve para si mesmo.

e) É no estado de natureza que o homem pode atingir sua verdadeira liberdade. 10º “Se todos os homens são, como se tem dito, livres, iguais e independentes por natureza, ninguém pode ser retirado deste estado e se sujeitar ao poder político de outro sem o seu próprio consentimento. A única maneira pela qual alguém se despoja de sua liberdade natural e se coloca dentro das limitações da sociedade civil é através do acordo com outros homens para se associarem e se unirem em uma comunidade para uma vida confortável, segura e pacífica uns com os outros, desfrutando com segurança de suas propriedades e melhor protegidos contra aqueles que não são daquela comunidade”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre o contrato social em Locke, considere as afirmativas a seguir. I. O direito à liberdade e à propriedade são dependentes da instituição do poder político. II. O poder político tem limites, sendo legítima a resistência aos atos do governo se estes violarem as condições do pacto político. III. Todos os homens nascem sob um governo e, por isso, devem a ele submeter-se ilimitadamente. IV. Se o homem é naturalmente livre, a sua subordinação a qualquer poder dependerá sempre de seu consentimento. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e II. b) I e III. c) II e IV. d) I, III e IV. e) II, III e IV.

Jean-Jacques Rousseau é um dos filósofos mais importantes da filosofia política do liberalismo. Tal filosofia pressupõe uma concepção de “natureza humana”, afirmando-nos que o homem é, por natureza, livre. A liberdade aparece como um “direito natural” do homem, de modo que toda a discussão passa a ser a seguinte: como conciliar a liberdade e os direitos individuais, concebidos como inerentes à própria natureza humana, com as exigências da vida em comunidade e, portanto, com os direitos do outro, imprescindível para o equilíbrio da vida social? O ponto de partida da filosofia de Rousseau é a concepção segundo a qual o homem é, em seu estado de natureza, bom e livre, remetendo-nos, com isso, para a figura do “bom selvagem”. Para Rousseau, é a sociedade quem corrompe e aprisiona o homem. No entanto, Rousseau não abre mão de pensar uma sociedade ideal, justa e igualitária, que procurasse reaproximar, ao máximo, o homem do seu estado de natureza “bom e livre”. Surge, então, a teoria do “contrato social”. Para Rousseau, a soberania política pertenceria ao conjunto dos membros da sociedade. O caminho para a sociedade ideal passaria por esse contrato, uma espécie de “pacto social” por meio do qual os homens se comprometeriam a abrir mão de sua vontade particular, de seus interesses específicos, em prol da “vontade geral”, aqui entendida não como um somatório das “vontades individuais”, mas sim, como uma vontade a partir da qual se priorizaria o coletivo, o bem comum, em detrimento de interesses particulares.

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QUESTÕES DE VESTIBULAR

Filosofia 4º BIMESTRE 1º Leia o texto a seguir: [...] Em toda parte renasce e se revigora o mau-olhado, a política do julgamento adverso à primeira vista, por meio da qual os países ricos se defendem contra aqueles que procedem de países que entraram no índex político da seleção natural: virtude humana é o dinheiro, uma virtude detergente que branqueia quem vem do mundo subdesenvolvido. Na verdade, o migrante entra no país de destino pela porta de saída, modo de permitir-lhe permanecer como se estivesse todo o tempo da permanência a caminho da saída, algo que concretamente ocorre com os muitos que na Alemanha ou nos Estados Unidos aguardam na prisão a deportação. [...] Estamos em face de uma multiplicação de recursos ideológicos para barrar a entrada de migrantes nos países de destino. Até 11 de setembro [de 2001] funcionava o estereótipo de traficante (uma cara de índio latino-americano era perfeita para barrar passageiros no desembarque) e o estereótipo de desempregado (a condição de jovem tem sido perfeita para discriminar) ou o estereótipo de prostituta (jovem e mulher vinda do Terceiro Mundo), e terrorista (cara de árabe ou barbudo ou mesmo bigode à moda do Oriente-médio). Agora, estamos vivendo o momento mais interessante de reelaboração dos estereótipos, com o predomínio do temor ao terrorista sobre os estereótipos usados até aqui. Registros e denúncias dos últimos meses indicam que o novo estereótipo abrange também pessoas com aparência de ricas [...]. [...] De fato, os aeroportos internacionais dos países ricos tornaram-se o teatro do medo e da intimidação. [...] O critério da discriminação visual do migrante nem mesmo pode detectar sua principal motivação para migrar que é hoje o trabalho. [...] Os agentes do mau olhado portuário e aeroportuário não podem ver esse conteúdo substancialmente específico da migração por um motivo simples: os migrantes são pessoas que em boa parte já foram socializadas no mesmo registro sociológico daqueles que devem e esperam barrá-los. São expressões da sociedade moderna que se difundem através da globalização. As medidas de segurança nacional voltadas para a interdição do acesso de migrantes aos países ricos são o corolário da globalização em seus efeitos não só econômicos, mas também culturais e sociais. De acordo com o texto, é correto afirmar que depois do 11 de setembro de 2001:

a) a globalização continuou ampliando as fronteiras entre os povos ricos e pobres, diversificando os processos de migrações. b) os processos de migrações puderam ser harmonizados em função da desburocratização nos aeroportos dos países ricos. c) os mecanismos de segurança, nas fronteiras dos países ricos, foram amenizados como tática para detectar os terroristas e impedir suas ações. d) a entrada de pessoas ricas nos países ricos, oriundas dos países pobres, tem sido facilitada como estratégia de atração de divisas de capital. e) os estereótipos e as formas de discriminação foram ampliados no processo de migração de pessoas dos países pobres para os países ricos. 2º “O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer isto é meu e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não pouparia ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: ‘Defendei-vos de ouvir esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém!’”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre o pensamento político de Rousseau, é correto afirmar: a) A desigualdade é um fato natural, autorizada pela lei natural, independentemente das condições sociais decorrentes da evolução histórica da humanidade. b) A finalidade da instituição da sociedade e do governo é a preservação da individualidade e das diferenças sociais. c) A sociabilidade tira o homem do estado de natureza onde vive em guerra constante com os outros homens. d) Rousseau faz uma crítica ao processo de socialização, por ter corrompido o homem, tornando-o egoísta e mesquinho para com os seus semelhantes. e) Rousseau valoriza a fundação da sociedade civil, que tem como objetivo principal a garantia da posse privada da terra. 3º Um professor, ao planejar uma situação de aprendizagem, destaca ações a serem realizadas pelos alunos nos seguintes termos:

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• Entrevistar idosos da família e da vizinhança residencial sobre as dificuldades vividas por eles durante o período da 2ª. Guerra Mundial. • Sistematizar dados, informações e observações possíveis de serem extraídas das entrevistas. • Produzir relatório escrito a partir de sistematização das entrevistas. • Expor para a classe conteúdo do relatório. • Emitir oralmente para a classe juízo crítico sobre conteúdos das entrevistas. A situação de aprendizagem em questão pressupõe que os alunos mobilizem competências, habilidades e conteúdos do saber de algumas disciplinas prioritariamente. Assinale a alternativa que melhor indica essas disciplinas: a) Sociologia, Filosofia, Língua Portuguesa, Matemática e Arte. b) Sociologia, História, Filosofia, Química e Língua Portuguesa. c) História, Geografia, Sociologia, Matemática e Língua Portuguesa. d) Geografia, Filosofia, Matemática, Arte e Língua Portuguesa. e) Física, Química, Matemática, Biologia e Sociologia. 4º "A razão especulativa é, em sua essência, alheia aos métodos. Sua função é desvendar as razões gerais, que se situam acima das razões restritas, compreender todos os métodos como coordenados numa natureza de coisas que só é compreensível transcendendo-se a todos os métodos. Esse ideal infinito nunca será atingido pela limitada inteligência humana. Entretanto, o que distingue o homem dos animais, e alguns homens dos outros, é a presença, em sua natureza, ainda que de uma forma hesitante e vaga, de um elemento perturbador, que é a busca do inatingível. Esse elemento é aquele toque de infinito que impulsionou os povos para a frente, muitas vezes ao encontro de sua própria destruição. É um tropismo pelo facho de luz que acena ao longe - pelo sol que viaja em direção à finalidade última das coisas, e pelo sol que ressurge sempre de sua origem. A razão especulativa se volta para leste e para oeste, para o começo e para o fim, como que espreitando para além das fronteiras do mundo." Segundo o raciocínio do autor, seria ERRADO afirmar que: a) Ao contrário dos animais, todos os homens têm a presença do elemento perturbador que é a busca pelo inatingível. b) O toque de infinito da busca do inatingível, presente nos seres humanos, nem sempre pode ser considerado benéfico. c) Em última instância, o objetivo da razão especulativa é inatingível.

d) A razão especulativa não se pauta pelos métodos, mas transcende a estes buscando compreendê-los. e) A razão especulativa persegue constantemente o inatingível. 5º "Todo mundo sabe que os bebês possuem essa capacidade. Depois de alguns meses na barriga da mãe, eles são empurrados para uma realidade completamente diferente. Mas depois, quando crescem, parece que esta capacidade vai desaparecendo. Como se explica isso?" Jostein Gaardner, autor de O Mundo de Sofia, fala da "única coisa de que precisamos para nos tornar bons filósofos", ou seja, da capacidade humana de: a) espantar-se com o mundo. b) estudar a história da filosofia. c) criticar as diferentes teorias filosóficas. d) refletir sobre a ciência e o conhecimento. e) entender os princípios da ética e da moral. 6º Três estudantes de Filosofia - Lucas, Márcia e Antônio - fizeram um curso de formação, promovido pelo Centro Acadêmico de Filosofia da UFAL, sobre uma importante teoria filosófica. Após o curso, os estudantes fizeram os seguintes comentários: Lucas - As formas existem independentes de nossas mentes. Tanto é assim, que chegamos ao mundo, ao nascermos, e vamos embora, ao morrermos, e as formas continuam aqui independentes de nós. Márcia - Se for assim, as formas existem de forma perfeita e estática num outro mundo. Por isso, podemos reconhecer o mundo que habitamos em suas contínuas transformações. Antônio - Então, existem dois mundos? O mundo das formas e o mundo das aparências? Eu não entendo como esta teoria explica a relação de um mundo com o outro. De acordo com a conversa acima, conclui-se que: a) o Centro Acadêmico promoveu um curso sobre a teoria das idéias de Platão. b) os estudantes fizeram um curso sobre o empirismo de Hume. c) os estudantes conversam sobre o existencialismo humanista de Sartre. d) Márcia compreendeu a moderna teoria das transformações sociais. e) Lucas não entendeu a teoria aristotélica sobre experiência e conhecimento. 7º A filosofia e a ciência são formas de conhecimento humano que se distinguem fundamentalmente, mas que também se aproximam, em maior ou menor grau quando emitimos juízos sobre a realidade.

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Desse modo, é correto afirmar: 1 - A filosofia exige fundamentação teórica e livre crítica, cujo conhecimento sistemático se volta para o ser e para o valor das coisas. Mas, a ciência procura objetivamente as estruturas universais e necessárias das coisas investigadas. 2 - A filosofia se caracteriza por um conhecimento quantitativo, pois busca medidas, padrões, critérios de comparação e de avaliação para coisas que parecem ser diferentes. Mas, a ciência é um conhecimento reflexivo e lógico que exige o despertar da consciência crítica de si e do outro. 3 - A filosofia é conhecimento racional, e essa racionalização se caracteriza por pretender alcançar uma adequação entre pensamento e realidade, isto é, entre explicação e aquilo que se procura explicar. Mas, a ciência é conhecimento homogêneo, sobretudo por buscar as leis gerais de funcionamento dos fenômenos, que são as mesmas para fatos que nos parecem diferentes. 4 - Na filosofia, os modos da consciência se encontram geralmente emaranhados de tal forma que suas noções se caracterizam por uma aglutinação acrítica e ametódica de juízos. Mas, a ciência é conhecimento particular e metódico, por delimitar o seu objeto de investigação e realizar experimentações com precisão e técnica. São corretas as afirmativas: a) 1, 2, 3 e 4. b) 1, 2 e 3. c) 2 e 4, somente. d) 1 e 3, somente. e) 2 e 3, somente. 8º Há várias formas de compreensão do sentido da educação na realidade social, todavia, há uma concepção de educação que pode ser expressa como um meio de transformação da sociedade. Assim, é correto afirmar que a tendência transformadora: a) propõe uma ação pedagógica otimista, do ponto de vista político, acreditando que a educação tem poderes quase que absolutos sobre a sociedade. b) é crítica em relação à compreensão da educação na sociedade, porém pessimista, não vendo qualquer saída para ela, a não ser submeter-se aos seus condicionantes. c) propõe compreender a educação dentro de seus condicionantes, desvendar e utilizar-se das próprias contradições da sociedade, para trabalhar criticamente pela emancipação do homem social. d) pretende "curar" a sociedade de suas mazelas, adaptando os indivíduos ao modelo ideal de sociedade, conforme os interesses dominantes.

e) reconhece que o capitalismo educa para o parasitismo social e de que não é possível ao homem emancipar-se ou tentar mudar o mundo. 9º Na educação a filosofia faz um questionamento que é muito forte, tem muitas respostas, serve de orientação para a prática educacional, mas, que se resume em uma só pergunta que é: a) O que devo fazer? b) O que posso conhecer? c) O que é permitido esperar? d) O que é o homem? e) Quem é Deus? 10º Imagine-se em um centro urbano, observando pessoas que estão indo e vindo de diferentes lugares, cada uma movida por múltiplas razões. Pode-se, entre outros aspectos, identificar que cada pessoa é impulsionada a realizar características que a distinguem de outros animais. Cada uma dessas características pode afirmar o homem como: I. ser histórico. II. ser religioso. III. ser que produz cultura. IV. ser de conhecimento. V. ser que se realiza pelo trabalho. Estão corretas: a) I e II, apenas. b) III e IV, apenas. c) II, III e V, apenas. d) I, II, III, IV e V. e) I e V, apenas.

O TRABALHO NA CONTEMPORANEIDADE:

Em relação ao mundo do trabalho na contemporaneidade é correto afirmar que: a) as novas tecnologias de comunicação e de transporte estabelecem um mercado de trabalho mais homogêneo e dinâmico em suas estruturas; b) o sistema fordista não é mais o paradigma dominante de organização das empresas e das relações de trabalho; c) a indústria e a produção em larga escala, agora global, ainda respondem pela maior parte dos fluxos de capitais na atualidade; d) a dinâmica capitalista atual está cada vez mais calcada na padronização da produção e na formação técnica do trabalhador; e) o desemprego crescente na atualidade já pode ser considerado como estrutural apenas nos países periféricos da economia-mundo.

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QUESTÕES DE VESTIBULAR

Sociologia 1º BIMESTRE 1º A Sociologia nasce sob a influência de duas Revoluções: a Industrial e a Francesa. Que aspectos da Revolução Industrial mais influenciaram a formulação de problemas e conceitos pela Sociologia? a) A situação da classe trabalhadora, a transformação da propriedade, a cidade industrial, a tecnologia e o sistema fabril. b) O crescimento do radicalismo, a situação da classe trabalhadora, a religiosidade popular e o conservadorismo. c) O sistema fabril, o conservadorismo, o individualismo e a situação dos trabalhadores rurais. d) A religiosidade, as mudanças na família, o individualismo e a transformação da propriedade. e) O desenvolvimento da ciência, a situação da classe trabalhadora, a religiosidade popular, a tradição e o racionalismo. 2º Considerando a discussão sociológica sobre o conceito de integração, pergunta-se: o quê pode levar à integração de um grupo? a) O fato de que todos têm a mesma nacionalidade. b) A aceitação quase irrestrita das regras do grupo. c) A submissão às lideranças políticas. d) A ausência da anomia. e) O controle social exercido pela sociedade. 3º Para Durkheim, o que as representações coletivas traduzem é a maneira pela qual o grupo se enxerga a si mesmo nas relações com os objetos que o afetam. O que ele pretende dizer com isso? a) Que o grupo está constituído por indivíduos. b) Que para compreender a natureza da sociedade é preciso considerar a maneira como os indivíduos se percebem no grupo. c) Que é os fatos sociais não diferem dos fatos individuais. d) Que para compreender a maneira pela qual a sociedade se vê a si mesma e ao mundo que a rodeia é preciso considerar a natureza da sociedade e não a dos indivíduos. e) Que os fatos sociais diferem dos fatos psíquicos apenas em qualidade. 4º Por socialização entendemos o processo: a) Por meio do qual o indivíduo aprende a ser um membro da sociedade. b) De divisão da riqueza social produzido pelos homens. c) De construção de laços de afetividade.

d) De constituição de grupos sociais. e) De transformação da comunidade em sociedade. 5º A Sociologia é uma ciência moderna que surge e se desenvolve juntamente com o avanço do capitalismo. Nesse sentido, reflete suas principais transformações e procura desvendar os dilemas sociais por ele produzidos. Sobre a emergência da sociologia, considere as afirmativas a seguir. I. A Sociologia tem como principal referência a explicação teológica sobre os problemas sociais decorrentes da industrialização, tais como a pobreza, a desigualdade social e a concentração populacional nos centros urbanos. II. A Sociologia é produto da Revolução Industrial, sendo chamada de “ciência da crise”, por refletir sobre a transformação de formas tradicionais de existência social e as mudanças decorrentes da urbanização e da industrialização. III. A emergência da Sociologia só pode ser compreendida se for observada sua correspondência com o cientificismo europeu e com a crença no poder da razão e da observação, enquanto recursos de produção do conhecimento. IV. A Sociologia surge como uma tentativa de romper com as técnicas e métodos das ciências naturais, na análise dos problemas sociais decorrentes das reminiscências do modo de produção feudal. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e III. b) II e III. c) II e IV. d) I, II e IV. e) I, III e IV. 6º Por socialização entendemos o processo: a) Por meio do qual o indivíduo aprende a ser um membro da sociedade. b) De divisão da riqueza social produzido pelos homens. c) De construção de laços de afetividade. d) De constituição de grupos sociais. e) De transformação da comunidade em sociedade.

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7º Sobre o surgimento da sociologia como ciência só não podemos afirmar que: a) a sociologia, diversamente de outras ciências, lida com a realidade social e as interpretações que são feitas sobre essa realidade. b) a sociologia se defronta apenas com o que vagamente chamamos de realidade e baseia-se no fato. c) o conhecimento científico da vida social não se baseia no fato, mas na concepção do fato e na relação entre a concepção e o fato. d) a sociologia nasce e se desenvolve como um dos florescimentos intelectuais mais complexos das situações de existência nas modernas sociedades industriais e de classe. e) a sociologia surge no momento de consolidação da sociedade capitalista. 8º Qual das idéias abaixo não corresponde à Escola Positivista. a) Os fatos sociais têm, como características, a exterioridade, anterioridade e a coercitividade. b) O suicídio é um fato social. c) Os fatos sociais são classificados por Durkheim como coisas. d) O pensamento médio pode ser considerado como sinônimo de consciência coletiva. e) O poder pode ser classificado em: tradicional, carismático e técnico racional. 9º De acordo com Florestan Fernandes: “A concepção fundamental de ciência, de Emile Durkheim (1858-1917), é realista, no sentido de defender o princípio segundo o qual nenhuma ciência é possível sem definição de um objeto próprio e independente.” Assinale a alternativa que descreve o objeto próprio da Sociologia, segundo Emile Durkheim: a) O conflito de classe, base da divisão social e transformação do modo de produção. b) O fato social, exterior e coercitivo em relação à vontade dos indivíduos. c) A ação social que define as inter-relações compartilhadas de sentido entre os indivíduos. d) A sociedade, produto da vontade e da ação de indivíduos que agem independentes uns dos outros. e) A cultura, resultado das relações de produção e da divisão social do trabalho. 10º “Socialização significa o processo pelo qual um indivíduo se torna um membro ativo da sociedade em que nasceu, isto é, comporta-se de acordo com seus folkways e mores [...]. Há pouca dúvida de que a sociedade, por suas exigências sobre os indivíduos determina, em grande parte, o tipo de personalidade que predominará. Naturalmente, numa sociedade complexa como a nossa, com extrema heterogeneidade de padrões, haverá consideráveis variações. Seria, portanto,

exagerado dizer que a cultura produz uma personalidade totalmente estereotipada. A sociedade proporciona, antes, os limites dentro dos quais a personalidade se desenvolverá”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é correto afirmar: a) Existe uma interação entre a cultura e a personalidade, o que faz com que as individualidades sejam influenciadas de diferentes modos e graus pelo ambiente social. b) Apesar de os indivíduos se diferenciarem desde o nascimento por dotes físicos e mentais, desenvolvem personalidades praticamente idênticas por conta da influência da sociedade em que vivem. c) A sociedade impõe, por suas exigências, aprovações e desaprovações, o tipo de personalidade que o indivíduo terá. d) O indivíduo já nasce com uma personalidade que dificilmente mudará por influência da sociedade ou do meio ambiente. e) São as tendências hereditárias e não a sociedade que determinam a personalidade do indivíduo.

QUESTÃO DISCURSIVA: “O Brasil é um país de desiguais, e é importante que ele (o Brasil) permaneça desigual porque esses desiguais sempre vão servir aos interesses de outros. Trabalhar para os outros. Serem explorados. Não dizerem a sua palavra. E isso automaticamente faz com que se perpetue um grupo de privilegiados. A distribuição de renda vai levar a maior participação das pessoas. Participação nos benefícios e também na construção da cidade, que é dizer a palavra no momento de se decidir como eu quero a minha Nação, como eu quero a minha cidade. Todo mundo diz: o cidadão já participa quando vota. Até certo ponto. Não excluo a democracia representativa, mas ela está muito mal das pernas. O melhor é a democracia participativa, onde as pessoas são chamadas a dizerem sua palavra. Dizer sua palavra como? Expressando suas prioridades e se reunindo.É impressionante como a informação é dada pela metade. É informado só o que interessa. Se seleciona a informação, se colocam adjetivos terríveis, fazem muito isso com o movimento dos sem-terra. Toda a comunicação trabalha com conotações, com ideologia. Se constrói a representação social de um presidente da República, dos líderes. Hoje em dia temos uma coisa escandalosa que é a criminalização dos movimentos populares. Ou não são dadas as notícias ou são dadas notícias contra.”

Pedrinho Guareschi

Qual o papel da mídia em um regime democrático?

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Ensino Médio - 3ª Série Simulacro Editorial 90

QUESTÕES DE VESTIBULAR

Sociologia 2º BIMESTRE 1º Segundo Karl Marx, a acumulação primitiva é: a) O processo de separação entre dinheiro e capital. b) O processo de valorização do capital. c) O processo histórico de separação entre o produtor e os meios de produção. d) O surgimento da grande indústria. e) A separação entre artesanato e atividade agrícola. 2º Analise a figura a seguir.

A figura ilustra, por meio da ironia, parte da crítica que a perspectiva sociológica baseada nas reflexões teóricas de Karl Marx (1818-1883) faz ao caráter ideológico de certas noções de Estado. Sobre a relação entre Estado e sociedade segundo Karl Marx, é correto afirmar: a) A finalidade do Estado é o exercício da justiça entre os homens e, portanto, é um bem indispensável à sociedade. b) O Estado é um instrumento de dominação e representa, prioritariamente, os interesses dos setores hegemônicos das classes dominantes. c) O Estado tem por finalidade assegurar a felicidade dos cidadãos e garantir, também, a liberdade individual dos homens. d) O Estado visa atender, por meio da legislação, a vontade geral dos cidadãos, garantindo, assim, a harmonia social. e) Os regimes totalitários são condição essencial para que o Estado represente, igualmente, os interesses das diversas classes sociais. 3º Segundo Karl Marx a máquina comanda: a) O salário do operário. b) A oferta do produto no mercado. c) O corpo do operário.

d) A extração da mais-valia. e) A divisão social do trabalho. 4º Sobre a exploração do trabalho, segundo a teoria de Karl Marx (1818-1883), é correto afirmar: a) A lei da hora-extra explica como os proprietários dos meios de produção se apropriam das horas não pagas ao trabalhador, obtendo maior excedente no processo de produção das mercadorias. b) A lei da mais valia consiste nas horas extras trabalhadas após o horário contratado, que não são pagas ao trabalhador pelos proprietários dos meios de produção. c) A lei da mais-valia explica como o proprietário dos meios de produção extrai e se apropria do excedente produzido pelo trabalhador, pagando-lhe apenas por uma parte das horas trabalhadas. d) A lei da mais valia é a garantia de que o trabalhador receberá o valor real do que produziu durante a jornada de trabalho. e) As horas extras trabalhadas após o expediente constituem-se na essência do processo de produção de excedentes e da apropriação das mercadorias pelo proprietário dos meios de produção. 5º A formação do capitalismo pressupõe a existência de meios de produção e de reprodução. Em que consistem esses meios? a) Na propriedade da terra, no capital, e nos instrumentos de trabalho. b) Na força de trabalho, na matéria prima, e nos meios de trabalho. c) Na propriedade da terra, nos instrumentos de trabalho e no processo de trabalho. d) Na propriedade da terra, nos objetos de trabalho e na mais-valia. e) Na força de trabalho, no trabalho humano e na matéria prima. 6º No capitalismo, os trabalhadores produzem todos os objetos existentes no mercado, isto é, todas as mercadorias; após havê-las produzido, entregam-nas aos proprietários dos meios de produção, mediante um salário; os proprietários dos meios de produção vendem as mercadorias aos comerciantes, que as colocam no mercado de consumo; e os trabalhadores ou produtores dessas mercadorias, quando vão ao mercado de consumo, não conseguem comprá-las. [...] Embora os diferentes trabalhadores saibam que produziram as diferentes mercadorias, não percebem que, como classe social, produziram todas elas, isto é, que os produtores de tecidos, roupas, alimentos [...] são membros da mesma

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classe social. Os trabalhadores se vêem como indivíduos isolados [...], não se reconhecem como produtores da riqueza e das coisas. Com base no texto e nos conhecimentos sobre alienação e ideologia, considere as afirmativas a seguir: a) A consciência de classe para os trabalhadores resulta da vontade de cada trabalhador em superar a situação de exploração em que se encontra sob o capitalismo. b) É no mercado que a exploração do trabalhador torna-se explícita, favorecendo a formação da ideologia de classe. c) A ideologia da produção capitalista constitui-se de imagens e idéias que levam os indivíduos a compreenderem a essência das relações sociais de produção. d) As mercadorias apresentam-se de forma a explicitar as relações de classe e o vínculo entre o trabalhador e o produto realizado. e) O processo de não identificação do trabalhador com o produto de seu trabalho é o que se chama alienação. A ideologia liga-se a este processo, ocultando as relações sociais que estruturam a sociedade. 7º Leia o texto a seguir: Os partidos socialistas, com o apoio das classes trabalhadoras em expansão de seus países, e inspirados pela crença na inevitabilidade histórica de sua vitória, representavam essa alternativa na maioria dos Estados da Europa. Aparentemente, só era preciso um sinal para os povos se levantarem, substituírem o capitalismo pelo socialismo, e com isso transformarem os sofrimentos sem sentido da guerra mundial em alguma coisa mais positiva: as sangrentas dores e convulsões do parto de um novo mundo. A Revolução Russa, ou mais precisamente, a Revolução Bolchevique de outubro de 1917, pretendeu dar ao mundo esse sinal. Tornou-se portanto tão fundamental para história [do século XX] quanto a Revolução Francesa de 1789 para o século XIX. Com base no texto de Eric Hobsbawm e nos conhecimentos sobre o tema, é correto afirmar que a Revolução Russa de 1917 é fundamental para a história do século XX porque: a) alterou radicalmente a organização da sociedade, da economia e do Estado, através da mobilização de milhares de pessoas, camponeses e operários, que ocuparam o governo e iniciaram novas experiências de organização e participação política, tornando-se referência para outros países que realizaram suas revoluções. b) produziu uma inversão no sentido das mudanças sociais, imprimindo um ritmo mais lento ao processo de organização dos operários,

camponeses e oprimidos, que ocuparam os espaços culturais, regionais e civis, tornando-se modelo para as contra-revoluções pacíficas e comunistas. c) mudou a mentalidade do operariado, que passou a lutar mais pelas mudanças de direitos individuais e menos pelos direitos universais e corporativos, levando os movimentos radicais a disputarem os cargos dos governos em uma clara concordância com o “jogo democrático burguês”. d) ajudou a criar estruturas de personalidades tolerantes com o curso do capitalismo que levaria todos à igualdade social na proporção em que as agitações comunistas influenciassem os operários e camponeses. e) proporcionou a crença no direito positivo, na propriedade privada e nos processos de convulsão social do mercado estratificado que, à semelhança da Revolução Francesa, estimularia a mobilidade e ascensão social das burguesias pactuadas com os operários e camponeses. 8º “A casa não é destinada a morar, o tecido não é disposto a vestir, o pão ainda é destinado a alimentar: ele tem de dar lucro. Mas se a produção apenas é consumida, e não é também vendida, porque o salário dos produtores é muito baixo quando é aumentado, já não vale mais a pena mandar produzir a mercadoria, por que alugar mãos? Elas têm de fazer coisas maiores no banco da fábrica do que alimentar seu dono e os seus, se é que se quer que haja lucro! Apenas: para onde com a mercadoria? A boa lógica diz: lã e trigo, café e frutas e peixes e porcos, tudo junto é sacrificado ao fogo, a fim de agüentar o deus do lucro! Montanhas de maquinaria, ferramentas de exércitos em trabalho, estaleiros, altos fornos, lanifícios, minas e moinhos: tudo quebrado e, para amolecer o deus do lucro sacrificado! De fato, seu deus do lucro está tomado pela cegueira. As vítimas, ele não vê.[...] As leis da economia se revelam como a lei da gravidade, quando a casa cai em estrondos sobre as nossas cabeças. Em pânico, a burguesia atormentada despedaça os próprios bens e desvaira com seus restos pelo mundo afora em busca de novos e maiores mercados. (E pensando evitar a peste alguém apenas a carrega consigo, empestando também os recantos onde se refugia!) em novas e maiores crises burguesia volta atônita a si. Mas os miseráveis, exércitos gigantes, que ela, planejadamente, mas sem planos, arrasta consigo, atirando-os a saunas e depois de volta a estradas geladas, começam a entender que o mundo burguês tem seus dias contados por se mostrar pequeno demais para comportar a riqueza que ele próprio criou”. Os versos acima fazem parte de um poema inacabado de Brecht (1898-1956) numa tentativa de versificar O Manifesto do Partido Comunista de

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Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). De acordo com o poema e com os conhecimentos da teoria de Marx sobre o capitalismo, é correto afirmar que, na sociedade burguesa, as crises econômicas e políticas, a concentração da renda, a pobreza e a fome são: a) Frutos da má gestão das políticas públicas. b) Inerentes a esse modo de produção e a essa formação social. c) Frutos do egoísmo próprio ao homem e que poderiam ser resolvidos com políticas emergenciais. d) Fenômenos característicos das sociedades humanas desde as suas origens. e) Oriundos da inveja que sentem os miseráveis por aqueles que conseguiram enriquecer. 9º A teoria social de Karl Marx sustenta que a alienação (ou estranhamento) no capitalismo relaciona-se: a) a uma dimensão inelutável de toda e qualquer sociedade humana, uma vez que o trabalho alienado é condição natural do homem. b) estritamente à esfera econômica, não comportando desdobramentos sobre os outros momentos da totalidade social. c) fundamentalmente ao fenômeno do Estado, porque este cria o fetichismo da mercadoria. d) como primeira manifestação, à separação entre o produtor direto e estas dimensões: o produto do trabalho, o processo do trabalho, os outros produtores diretos, o Gênero humano. e) Nenhuma das alternativas apresentadas. 10º A idéia de trabalho não é a mesma para todas as sociedades. Algumas sociedades tribais, por exemplo, desconhecem o trabalho como um valor em si separado de outras coisas. Nessas sociedades que desconhecem a divisão do trabalho, prevalece, segundo Durkheim, a solidariedade mecânica. Karl Marx, por sua vez, considera que com a separação entre trabalho manual/material e trabalho espiritual/intelectual é a divisão do trabalho que possibilita o surgimento: a) da força de trabalho. b) da mercadoria. c) do valor de uso. d) do valor de troca. e) da ideologia.

“Pela exploração do mercado mundial a burguesia imprime um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países. Para desespero dos reacionários, ela retirou à indústria sua base nacional. As velhas indústrias nacionais foram destruídas e continuam a sê-lo diariamente. (...) Em lugar das antigas necessidades satisfeitas pelos produtos nacionais, nascem novas necessidades, que reclamam para sua satisfação os produtos das regiões mais longínquas e dos climas mais diversos. Em lugar do antigo isolamento de regiões e nações que se bastavam a si próprias, desenvolve-se um intercâmbio universal, uma universal interdependência das nações. E isso se refere tanto à produção material como à produção intelectual. (...)Devido ao rápido aperfeiçoamento dos instrumentos de produção e ao constante progresso dos meios de comunicação, a burguesia arrasta para a torrente da civilização mesmo as nações mais bárbaras.” Com base no texto de Karl Marx e Friedrich Engels, publicado pela primeira vez em 1848, aponte o que for correto. 01) Desde o início, a expansão do modo burguês de produção não fica restrita às fronteiras de cada país, pois o capitalista não é conservador quanto às inovações tecnológicas e conquista de novos mercados 02) O processo de universalização é uma tendência do capitalismo desde sua origem, já que a burguesia precisa de novos mercados, de novas mercadorias e de condições mais vantajosas de produção. 04) A expansão do modo capitalista de produção em escala mundial encontrou empecilhos na mentalidade burguesa apegada aos métodos tradicionais de organização do trabalho. 08) Na maioria dos países não europeus, a universalização do capital encontrou barreiras alfandegárias que impediram sua expansão. 16) A dificuldade de comunicação entre os países, devido ao baixo índice de progresso tecnológico, adiou para o século XX a universalização do modo capitalista de produção.

SOMA: ________

QUESTÕES DISCURSIVAS: 1º Que relação existe entre trabalho e cultura? 2º Explique por que, no tocante a produção, a relação das sociedades tribais com os recursos naturais é classificada como sustentável. 3º Em que medida o trabalho escravo, praticado entre os gregos e os romanos, contribuiu para o desenvolvimento da cultura?

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QUESTÕES DE VESTIBULAR

Sociologia 3º BIMESTRE 1º A partir da constatação de que todos os seres humanos são membros de uma mesma espécie, as diferenças de comportamento entre os grupos é justificado pela antropologia como: a) O ser humano é, entre os animais, o ser mais evoluído, razão pela qual é superior aos demais. Esta superioridade implica na padronização dos comportamentos humanos. b) As diferenças de comportamento entre os grupos humanos se deve a diferenciação dos padrões culturais produzidos pela humanidade. c) Não é correto separar aspectos naturais dos aspectos culturais do ser humano. A humanidade só pode ser compreendida pela sua unidade biológica, que tende a padronizar os comportamentos. d) As diferenças de comportamento entre os grupos humanos é uma evidência de que não se trata de uma espécie única. As diferentes etnias surgiram em épocas e locais distintos, por isso é possível afirmar que alguns grupos evoluíram mais que outros. e) A humanidade é composta de diversas espécies em diferentes etapas de desenvolvimento do processo evolutivo. Deste modo, cada sociedade pode ser classificada e inserida em um contínuo, que vai das mais atrasadas e simples às mais adiantadas e complexas. 2º “O homem político poderia ser ele mesmo. Autenticamente. Ele prefere parecer. Ainda que lhe seja preciso simular ou dissimular. Compondo um personagem que atraia atenção e impressione a imaginação. Interpretando um papel que é por vezes um papel composto. De modo que, recorrendo a um vocabulário colhido no teatro, fala-se em ‘vedetes’, outrora em ‘tenores’, sempre em ‘representação política’”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre os temas Indústria Cultural e Política, é correto afirmar: a) Na atualidade, a arte de dissimular dos políticos está cada vez menos evidente e, com base nela, os eleitores escolhem seus candidatos. b) Através da imagem construída pelo candidato se pode distinguir claramente sua ideologia. c) Na era das comunicações, o indivíduo torna-se cada vez mais informado, portanto, mais imune à propaganda, inclusive à propaganda política. d) No Brasil, a indústria cultural torna manifestações como o teatro, a literatura, a música popular e as artes plásticas, livres de

qualquer traço de mediocridade por ter conotação ideológica. e) A indústria cultural repousa sobre a produção de desejos, imagens, valores e expectativas, por isso somos cada vez mais suscetíveis à propaganda política. 3º “A indústria cultural vende Cultura. Para vendê-la, deve seduzir e agradar o consumidor. Para seduzi-lo e agradá-lo, não pode chocá-lo, provocá-lo, fazê-lo pensar, fazê-lo ter informações novas que perturbem, mas deve devolver-lhe, com nova aparência, o que ele sabe, já viu, já fez. A ‘média’ é o senso-comum cristalizado que a indústria cultural devolve com cara de coisa nova [...]. Dessa maneira, um conjunto de programas e publicações que poderiam ter verdadeiro significado cultural tornam-se o contrário da Cultura e de sua democratização, pois se dirigem a um público transformado em massa inculta, infantil, desinformada e passiva”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre meios de comunicação e indústria cultural, considere as afirmativas a seguir. I. Por terem massificado seu público por meio da indústria cultural, os meios de comunicação vendem produtos homogeneizados. II. Os meios de comunicação vendem produtos culturais destituídos de matizes ideológicos e políticos. III. No contexto da indústria cultural, por meio de processos de alienação de seu público, os meios de comunicação recriam o senso comum enquanto novidade. IV. Os produtos culturais com efetiva capacidade de democratização da cultura perdem sua força em função do poder da indústria cultural na sociedade atual. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e II. b) I e III. c) II e IV. d) I, III e IV. e) II, III e IV. 4º“A diversão é o prolongamento do trabalho sob o capitalismo tardio. Ela é procurada por quem quer escapar ao processo de trabalho mecanizado, para se pôr de novo em condições de enfrentá-lo. Mas, ao mesmo tempo, a mecanização atingiu um tal poderio sobre a pessoa em seu lazer e sobre a sua felicidade, ela determina tão profundamente a fabricação das mercadorias destinadas à diversão,

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que esta pessoa não pode mais perceber outra coisa senão as cópias que reproduzem o próprio processo de trabalho”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre trabalho e lazer no capitalismo tardio, em Adorno e Horkheimer, é correto afirmar: a) Há um círculo vicioso que envolve o processo de trabalho e os momentos de lazer. Com o objetivo de fugir do trabalho mecanizado e repor as forças, o indivíduo busca refúgio no lazer, porém o lazer se estrutura com base na mesma lógica mecanizada do trabalho. b) Apesar de se apresentarem como duas dimensões de um mesmo processo, lazer e trabalho se diferenciam no capitalismo tardio, na medida em que o primeiro é o espaço do desenvolvimento das potencialidades individuais, a exemplo da reflexão. c) Mesmo sendo produzidas de acordo com um esquema mercadológico que fabrica cópias em ritmo industrial, as mercadorias acessadas nos momentos de lazer proporcionam ao indivíduo plena diversão e cultura. d) Tanto o trabalho quanto o lazer preservam a autonomia do indivíduo, mesmo nos processos de mecanização que caracterizam a fabricação de mercadorias no capitalismo tardio. e) As atividades de lazer no capitalismo tardio, como o cinema e a televisão, são caminhos para a politização e aquisição de cultura pelas massas, aproximando-as das verdadeiras obras de arte. 5º Sobre a “indústria cultural”, segundo Adorno e Horkheimer, é correto afirmar: a) Desenvolve o senso crítico e a autonomia de seus consumidores. b) Reproduz bens culturais que brotam espontaneamente das massas. c) O valor de troca é substituído pelo valor de uso na recepção da arte. d) Padroniza e nivela a subjetividade e o gosto de seus consumidores. e) Promove a imaginação e a espontaneidade de seus consumidores. 6º Ao receber um convite para uma festa de aniversário, é comum que o convidado leve um presente. Reciprocamente, na festa de seu aniversário, este indivíduo espera receber presentes de seus convidados. Do mesmo modo, se o vizinho nos convida para o casamento de seu filho, temos certa obrigação em convidá-lo para o casamento do nosso filho. Nos aniversários, nos casamentos, nas festas de amigo-secreto e em muitas outras ocasiões, trocamos presentes. Segundo o sociólogo francês Marcel Mauss, a prática de “presentear” é algo fundamental a todas as sociedades: segundo ele, a relação da troca, esta obrigatoriedade de dar, de receber e de retribuir é mais importante que o bem trocado.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, considere as afirmativas a seguir. I. O ato de presentear instaura e reforça as alianças e os vínculos sociais. II. A troca de presentes cria e alimenta um circuito de comunicação nas sociedades. III. O lucro obtido a partir dos bens trocados é o que fundamenta as relações de troca de presentes. IV. O presentear como prática social originou-se quando da consolidação do modo capitalista de produção. Estão corretas apenas as afirmativas: a) I e II. b) I e III. c) III e IV. d) I, II e IV. e) II, III e IV. 7º “A indústria cultural não cessa de lograr seus consumidores quanto àquilo que está continuamente a lhes prometer. A promissória sobre o prazer, emitida pelo enredo e pela encenação, é prorrogada indefinidamente: maldosamente, a promessa a que afinal se reduz o espetáculo significa que jamais chegaremos à coisa mesma, que o convidado deve se contentar com a leitura do cardápio. [...] Cada espetáculo da indústria cultural vem mais uma vez aplicar e demonstrar de maneira inequívoca a renúncia permanente que a civilização impõe às pessoas. Oferecer-lhes algo e ao mesmo tempo privá-las disso é a mesma coisa”. Com base no texto e nos conhecimentos sobre indústria cultural em Adorno e Horkheimer, é correto afirmar: a) A indústria cultural limita-se a atender aos desejos que surgem espontaneamente da massa de consumidores, satisfazendo as aspirações conscientes de indivíduos autônomos e livres que escolhem o que querem. b) A indústria cultural tem um desempenho pouco expressivo na produção dos desejos e necessidades dos indivíduos, mas ela é eficiente no sentido de que traz a satisfação destes desejos e necessidades. c) A indústria cultural planeja seus produtos determinando o que os consumidores desejam de acordo com critérios mercadológicos. Para atingir seus objetivos comerciais, ela cria o desejo, mas, ao mesmo tempo, o indivíduo é privado do acesso ao prazer e à satisfação prometidos. d) O entretenimento que veículos como o rádio, o cinema e as revistas proporcionam ao público não pode ser entendido como forma de exploração dos bens culturais, já que a cultura está situada fora desses canais. e) A produção em série de bens culturais padronizados permite que a obra de arte preserve

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a sua capacidade de ser o suporte de manifestação e realização do desejo: a cada nova cópia, a crítica se renova. 8º Desde Platão se discute a função sociocultural da arte, o que confere à sua autonomia uma certa relatividade. Recentemente, com a Escola de Frankfurt, cunhou-se para a determinação social da arte termos como “indústria cultural” e “cultura de massa”, porque, como diz Theodor Adorno, no regime econômico capitalista sacrifica-se “o que fazia a diferença entre a lógica da obra [de arte] e a do sistema social.” Com relação à interpretação de Adorno sobre a função social da arte no regime capitalista, considere as afirmativas abaixo: I Na sociedade capitalista, o desenvolvimento técnico-industrial conduziu à padronização do gosto em beneficio do mercado. II Não há gozo da arte, na sociedade liberal, se a criação for massificada. III Ao sacrificar a lógica da obra às determinações do sistema, o artista está garantindo não só seu lucro como a própria sobrevivência da arte, já que a nossa economia é capitalista. IV Com a indústria cultural, ocorre a perda completa da idéia de autonomia da arte. V Adorno não concorda com Platão quanto à idéia de que a experiência estética, como acontece hoje em dia, necessita de um nexo funcional para cumprir seu papel na vida social e política do homem. Estão corretas as afirmativas: a) I e II b) II e V c) I e IV d) II, III, V e) I, III, IV e V 9º A indústria cultural tem sido objeto de intensos debates na sociedade e nas ciências sociais, marcados por duas posições básicas e divergentes. Há os que a consideram uma das bases do totalitarismo moderno, promovendo a alienação do homem, que se torna incapaz de analisar racionalmente seus produtos seriados, repetitivos e deteriorados, tais como os filmes de enredos violentos, a música popular massiva, as notícias curtas e superficiais. De outro lado, há os que a defendem como sistema que democratiza a cultura, por permitir a todos o acesso à informação e ao consumo de produtos simbólicos em geral, combatendo, portanto, a mesma alienação. Tendo em vista essas divergências, considere as alternativas que as expressam, tendo como referência o atual gênero musical popular funk no Brasil.

I) O funk é, dentre outras coisas próprias da indústria cultural, resultado de uma estratégia de marketing da indústria fonográfica, que impõe o seu consumo sem nenhum senso crítico. II) O funk tornou-se um aliado de grupos sociais marginalizados por facultar-lhes a presença na mídia. III) O funk expressa cabalmente a identidade cultural da juventude em geral, não merecendo qualquer crítica dos que não o apreciam. IV) O funk, nascido espontaneamente nas periferias das grandes cidades, não necessitou do apoio da indústria cultural para tornar-se um gênero musical de consumo massivo. Assinale a alternativa correta. a) O argumento da alternativa II critica a indústria cultural e o da alternativa III não tem sentido. b) As alternativas I e II traduzem as posições teóricas divergentes sobre a indústria cultural. c) Os argumentos das alternativas I e III defendem a indústria cultural. d) Os argumentos das alternativas I e IV não são contraditórios. e) Os argumentos das alternativas II e III são favoráveis à indústria cultural. 10º “Todo sistema cultural tem a sua própria lógica e não passa de um ato primário de etnocentrismo tentar transferir a lógica de um sistema para outro.” Considerando o texto acima, marque a alternativa correta acerca das afirmações abaixo. I) As sociedades tribais são tão eficientes para produzir cultura quanto qualquer outra, mesmo quando não possuem certos recursos culturais presentes em outras culturas. II) As sociedades selvagens são capazes de produzir cultura, mas estão mal adaptadas ao meio ambiente e, por isso, algumas nem sequer possuem o Estado. III) As chamadas sociedades indígenas são dotadas de recursos materiais e simbólicos eficientes para produzir cultura como qualquer outra, faltando-lhes apenas uma linguagem própria. IV) As chamadas sociedades primitivas conseguiram produzir cultura plenamente, ao longo do processo evolutivo, quando instituíram o Estado e as instituições escolares. a) I e II estão corretas. b) Apenas I está correta. c) I e III estão corretas. d) I e IV estão corretas. e) Apenas I, II e IV estão corretas.

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QUESTÕES DE VESTIBULAR

Sociologia 4º BIMESTRE 1º Nas diferenças no acesso à educação e na distribuição desigual de rendas estão as marcas da discriminação social. A que segmentos da população essa afirmação se refere? a) Imigrantes. b) Migrantes nordestinos. c) Brancos durante o Império. d) Jovens. e) Afro-descendentes. 2º “Era a manhã ensolarada do dia 1º de maio de 1980, e as pessoas que haviam chegado ao centro de São Bernardo do Campo para a comemoração da data se depararam com a cidade ocupada por 8 mil policiais armados, com ordens de impedir qualquer concentração. Já desde as primeiras horas daquele dia as vias de acesso estavam bloqueadas por comandos policiais que vistoriavam ônibus, caminhões e automóveis [...]. Pela manhã, enquanto um helicóptero sobrevoava os locais previstos para as manifestações, carros de assalto e brucutus exibiam a disposição repressiva das forças da ordem” Com base nos conhecimentos sobre a história recente do Brasil, é correto afirmar que, nesse episódio, o autor se refere ao: a) Movimento estudantil, que lutava contra a reforma universitária de perfil privatista, implantada pelo governo João Figueiredo. b) Movimento operário, que lutava contra a ditadura militar, contra o arrocho salarial e pela democratização do país. c) Movimento das panelas vazias, que, apesar de o país já se encontrar plenamente democratizado, restringia sua luta à reposição das perdas salariais devido ao arrocho imposto na década anterior pelo regime militar. d) Movimento dos desempregados, constituído no processo de abertura política, e que sustentava a bandeira do pleno emprego. e) Movimento camponês, que, embora se constituísse numa força política emergente dos escombros do regime militar, mostrava grande capacidade de mobilização das classes médias urbanas. 3º Leia os depoimentos a seguir: • Sou um ser livre, penso apenas com minhas idéias, da minha cabeça, faço só o que desejo, sou único, independente, autônomo. Não sigo o que me obrigam e pronto! Acredito que com a força dos meus pensamentos poderei realizar

todos os meus sonhos, e o meu esforço ajuda a sociedade a progredir. (Jovem estudante e trabalhadora em uma loja de shopping). • Sou um ser social, o que penso veio da minha família, dos meus amigos e parentes, gostaria de fazer o que desejo, mas é difícil! Às vezes faço o que quero, mas na maioria das vezes sigo meu grupo, meus amigos, minha religião, minha família, a escola, sei lá... Sinto que dependo disso tudo e gostaria muito de ser livre, mas não sou! (Jovem estudante em uma escola pública que trabalha em empregos temporários). • Sinto que às vezes consigo fazer as coisas que desejo, como ir a raves, mesmo que minha mãe não permita ou concorde. Em outros momentos faço o que me mandam e acho que deve ser assim mesmo. É legal a gente viver segundo as regras e ao mesmo tempo poder mudá-las. Nas raves existem regras, muita gente não percebe, mas há toda uma estrutura, seguranças, taxas, etc. Então, sinto que sou livre, posso escolher coisas, mas com alguns limites. (Jovem estudante e Office boy). Assinale a alternativa que expressa, respectivamente, as explicações sociológicas sobre a relação entre indivíduo e sociedade presentes nas falas. a) Solidariedade mecânica, fundada no funcionalismo de E. Durkheim; individualismo metodológico, fundado na teoria política liberal; teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx. b) Teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx; sociologia compreensiva, fundada no conceito de ação social e suas tipologias de M. Weber; teoria organicista de Spencer. c) Individualismo, fundado no liberalismo de vários autores dos séculos XVIII a XX; funcionalismo, fundado no conceito de consciência coletiva de E. Durkheim; sociologia compreensiva, fundada no conceito de ação social e suas tipologias de M. Weber. d) Sociologia compreensiva, fundada no conceito de ação social e suas tipologias de M. Weber; teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx; funcionalismo, fundado no conceito dos três estados de Augusto Comte. e) Corporativismo positivista, fundado em Augusto Comte; individualismo, fundado no liberalismo de vários autores dos séculos XVIII a XX; teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx. 4º “Em geral, o feminismo veio demonstrar que a opressão tem muitas faces, uma das quais é a

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opressão das mulheres por via da discriminação sexual. Ao privilegiar a opressão de classe, o marxismo secundarizou e, no fundo, ocultou a opressão sexual e, nessa medida, o seu projeto emancipatório ficou irremediavelmente truncado. [...] Se para as feministas marxistas, a primazia explicativa das classes é admissível desde que seja articulada com o poder e a política sexual, para a maioria das correntes feministas não é possível estabelecer, em geral, a primazia das classes sobre o sexo ou sobre outro fator de poder e de desigualdade e algumas feministas radicais atribuem mesmo a primazia explicativa ao poder sexual.” De acordo com o texto, é correto afirmar: a) A teoria marxista das classes, como explicação das relações de gênero, é o fundamento dos movimentos feministas. b) Ao priorizar a opressão de classe, o marxismo eclipsou a opressão feminina, destituindo-a de sua relevância social. c) As feministas marxistas defendem a primazia do poder sexual sobre a de classes. d) O feminismo radical, ao explicitar a discriminação sexual como forma de opressão, fortaleceu o entendimento marxista da sociedade. e) O projeto emancipatório das feministas teve significativo impulso após a adoção do marxismo enquanto modelo explicativo da opressão feminina. 5º Quando analisamos a reestruturação produtiva tendo em conta a questão de gênero, observamos que: a) Os índices de desemprego, do crescimento do trabalho informal e das formas precárias de trabalho são maiores entre as mulheres do que entre os homens. b) As mulheres apresentam índices mais altos de aceitação no mercado de trabalho formal do que os homens. c) As mulheres passaram a ocupar postos de direção e ampliaram as suas perspectivas profissionais mais do que os homens. d) Os índices de desemprego, de requalificação profissional e de crescimento do trabalho formal são maiores entre as mulheres do que entre os homens. e) As implicações da reestruturação produtiva atingem homens e mulheres na mesma proporção. 6º “Se a pobreza é questão de direitos e conquista de cidadania, o que parece hoje estar em jogo é a possibilidade de que, neste país, se dê a construção democrática de uma noção de bem público, de interesse público e de responsabilidade pública que tenham como medida os direitos de todos. Sabemos muito bem que é esse o nó cego da tradição brasileira, construída em uma história regida por um

privativismo selvagem que faz da vontade privada a medida de todas as coisas, recusa a alteridade e obstrui, por isso mesmo, a dimensão ética da vida social pela obliteração de um sentido de responsabilidade pública e obrigação social. Sabemos também que o pouco que, nessa história, o país foi capaz de construir está se erodindo por conta de uma crise do Estado, que desestrutura as referências nas quais, durante décadas, para o bem ou para o mal, se projetaram esperanças de progresso.” Com base no texto de Vera da Silva Telles e nos conhecimentos sobre cidadania, é correto afirmar: a) A crise do Estado favorece a efetivação da cidadania, por desestimular o privativismo e acentuar o caráter público das instituições. b) A tradição brasileira favorece a construção da cidadania, visto que esta, como igualdade de direitos, sobrepôs-se socialmente. c) A cidadania é um artefato humano e, como tal, precisa ser construída e assegurada por quaisquer meios que os indivíduos julgarem válidos. d) No Brasil, a pobreza, enquanto evidência da desigualdade social, tem sido abordada por meio da consolidada noção de responsabilidade pública. e) A falta de ações públicas que respeitem os direitos de todos constitui o que é denominado de “nó cego da tradição brasileira”. 7º “As reformas de base, a grande bandeira unificada dos anos cinqüenta e sessenta, que se amplifica extraordinariamente na década do Golpe [de 1964], significavam o questionamento da repartição da riqueza, unificando também categorias diversas de trabalhadores urbanos, classes médias antigas e novas, profissionais de novas ocupações, agora autonomizados e, em geral, tendo invertido sua velha relação com o populismo. O grande debate sobre a educação colocou num novo patamar a questão da escola pública, da produção científica e tecnológica, o papel dos cientistas que, nessa nova relação, tornavam-se ‘intelectuais orgânicos’ da política, sem que estivessem necessariamente ligados a partidos. Mas talvez a amplificação mais notável da política tenha ocorrido mesmo no lado do campesinato e dos trabalhadores rurais. As Ligas Camponesas, menos pelo seu real poder de fogo, medido do ponto de vista de travar uma luta armada com os latifundiários - quando ela ingressou por essa via seu verdadeiro potencial revolucionário se exauriu - deram a fala, o discurso, capaz de reivindicar a reforma agrária e de dessubordinar o campesinato, após longos séculos, da posição de mero apêndice da velha classe dominante latifundiária.”

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Com base no texto e nos conhecimentos sobre movimentos sociais no Brasil, é correto afirmar: a) Os movimentos que lutaram pelas “reformas de base” foram significativos, porque mostraram, além da importância e da legitimidade de suas demandas, a sua capacidade de politizar problemas fundamentais da sociedade brasileira. b) As Ligas Camponesas, ao potencializarem sua ação revolucionária por meio da luta armada, lograram a superação da dominação do latifúndio. c) As relações populistas foram fundamentais como forças impulsionadoras dos movimentos pelas reformas de base. d) As reformas de base resultaram da unificação dos trabalhadores urbanos e rurais e das suas demandas, promovida pelos intelectuais orgânicos brasileiros. e) No debate sobre as reformas educacionais, nos anos que antecederam a 1964, prevaleceu a pauta ditada pelos interesses do mercado. 8º “No passado, quando se falava em redistribuição de renda, sempre se argumentava que os pobres, com o crescimento de sua renda, tenderiam a consumir mais e, portanto, a taxa de poupança cairia. Hoje, o paradoxo é que os ricos brasileiros é que têm uma altíssima propensão a consumir. A renda não se concentra para aumentar a taxa de poupança, e sim para aumentar o consumo dos mais ricos. É escandalosa a distância, no Brasil, entre o consumidor popular e o consumidor médio e rico. Sem lugar a dúvida, essa defasagem é das maiores do mundo. Na Índia, os 20% mais ricos têm em média uma renda quatro vezes maior que a dos 20% mais pobres; no Brasil essa relação é de um para trinta e três vezes. Por outro lado, o abuso do consumo contamina as classes mais pobres, que gastam em produtos nem sempre necessários.” Com base no texto de Celso Furtado e nos conhecimentos sobre desigualdade social no Brasil, é correto afirmar que: a) Na última década, o índice de desigualdade vem crescendo constantemente no Brasil. b) Na última década observa-se, no Brasil, um aumento constante da taxa de crescimento econômico impulsionado pelo aumento do índice de desigualdade. c) Apesar de permanecer entre os mais altos do mundo, nos últimos 15 anos observa-se, no Brasil, uma queda do índice de desigualdade. d) Nas duas últimas décadas o índice de desigualdade no Brasil permanece rigorosamente igual. e) Existe uma correlação estreita entre taxa de crescimento econômico e distribuição de riqueza. 9º “A proteção e a promoção dos direitos humanos continuaram a se situar entre as principais

carências a ser enfrentadas pela sociedade civil. [...] A enumeração das principais áreas de intervenção das organizações da sociedade civil soa como demandas de séculos passados: a ausência do estado de direito e a inacessibilidade do sistema judiciário para as não-elites; o racismo estrutural e a discriminação racial e a impunidade dos agentes do Estado envolvidos em graves violações aos direitos humanos. Como vimos, a nova democracia continuou a ser afetada por um ‘autoritarismo socialmente implantado’, uma combinação de elementos presentes na cultura política do Brasil, valores e ideologia, em parte engendrados pela ditadura militar, expressos na vida cotidiana. Muitos desses elementos estão configurados em instituições cujas raízes datam da década de 30.” Em relação à violência, analise o texto anterior e selecione a alternativa que corresponde à idéia desenvolvida pelo autor: a) A democracia brasileira é fortemente responsável pelo surgimento de uma cultura da violência no Brasil. b) Muito mais do que os traços culturais, é o desenvolvimento econômico que acarreta o desrespeito aos direitos humanos no Brasil. c) Com a democratização, as não-elites brasileiras finalmente tiveram pleno acesso ao sistema judiciário e aos direitos próprios do Estado de Direito. d) Historicamente, o desrespeito aos direitos humanos afeta de modo igual a brancos e negros, ricos e pobres. e) A violência no Brasil expressa-se na vida cotidiana e, para ser superada, depende de ações da sociedade civil. 10º Segundo Antônio Cândido: “[...] o caipira não vive como antes em equilíbrio precário, segundo os recursos do meio imediato e de uma sociabilidade de grupos segregados; vive em franco desequilíbrio econômico, em face dos recursos que a técnica moderna possibilita. [...] O desenvolvimento da economia baseada na exportação dos gêneros tropicais acentuou a diferenciação dos níveis econômicos, que foram aos poucos gerando fortes distinções de classe e cultura. Quando este processo avultou, o caipira ficou humanamente separado do homem da cidade, vivendo cada um o seu tipo de vida. Mas em seguida, [...] graças aos recursos modernos de comunicação, ao aumento da densidade demográfica e à generalização das necessidades complementares acham-se frente a frente homens do campo e da cidade, sitiantes e fazendeiros, assalariados agrícolas e operários - bruscamente reaproximados no espaço geográfico e social, participando de um universo social que desvenda dolorosamente as discrepâncias econômicas e sociais”.

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De acordo com o texto e os conhecimentos sobre o tema, é correto afirmar: a) Grupos sociais rurais e urbanos foram separados no Brasil em decorrência da diferenciação cultural, resultado do desequilíbrio econômico e do uso de técnicas modernas de produção. b) Grupos sociais rurais são segregados culturalmente e, desta forma, a cultura urbana não consegue aproximar-se dos homens do campo, resultando em aumento do desequilíbrio econômico no campo. c) A aproximação entre homem do campo e o homem rural ocorre nos momentos em que os grupos sociais rurais deixam de segregar a cultura urbana e aceitam as melhorias tecnológicas advindas dos modernos meios de comunicação. d) Os desequilíbrios econômicos dos grupos sociais rurais são conseqüência da segregação feita pelo homem da cidade. e) Os grupos sociais rurais viviam em uma situação de equilíbrio precário quando isolados da cidade e passaram a viver em desequilíbrio econômico quando se reencontraram com a vida urbana, devido à modernização e à expansão demográfica.

QUESTÃO DISCURSIVA:

As ciências humanas, e em especial as ciências sociais, se caracterizam como um campo científico distinto dos demais devido a ênfase atribuída ao subjetivismo - embora nem sempre seja reconhecido desta forma, até mesmo em seu interior. Subjetividade esta determinada pela relação particular entre sujeito e o objeto. Ao contrário do que ocorre em outras ciências, o cientista social, ao estudar um determinado fenômeno, é capaz de conceituá-lo e abstraí-lo a ponto de relacionar essa experiência ao seu modo de vida, proporcionando, em maior ou menor grau, uma reflexão crítica de sua posição na sociedade.

A Sociologia é uma ciência que se constituiu na modernidade e tem como objeto o estudo dos processos e das relações sociais que marcam a vida em sociedade. O sociólogo é o sujeito dotado da competência científica para a explicação e a compreensão crítica da vida social.

Por que um dos requisitos fundamentais para o sociólogo exercer sua capacidade de análise crítica da vida social é que ele possa estranhar-se e estranhar a sociedade na qual está inserido?

A FILOSOFIA PODE NOS AJUDAR A EVITAR O ABISMO QUE NOS ESPERA

Com os recursos técnicos, financeiros e com a infra-estrutura material já criada pela globalização, teríamos condições de socializar um modo de vida sustentável para todos. A Terra, colocada sob o descanso sabático, poderia se autorregenerar e sustentar a todos. Viveríamos mais com menos. Mas como somos culturalmente bárbaros e eticamente sem piedade, não tomamos essa decisão política. Preferimos tolerar que milhões morram do que mudarmos de rumo. E assim gaiamente continuamos a consumir, sem consciência de que logo aí na frente um abismo nos espera. Podemos e merecemos um destino melhor. E esse não é apenas possível, mas necessário. E é aqui que os filósofos podem nos ajudar. Há dezenas de anos, muitos deles vêm afirmando que a excessiva utilização da razão em função do lucro e da mercantilização de tudo, à custa da pilhagem da Terra, nos levou à crise atual. Para resgatar a sanidade da razão, precisamos enriquecê-la com a razão sensível, estética e cordial na qual se funda a ética e uma visão solidária da vida. Ela é a mais adequada à nova fase do encontro das culturas e da unificação da história humana. Ou então prosseguiremos por um caminho trágico e sem retorno.

Leonardo Boff

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"Sucesso, reconhecimento, fama, glória... Muitos de nós lutamos por motivos assim. Mas, não se constrói um bom nome da noite para o dia. É preciso trabalhar muito, ainda que haja tropeços e quedas. É preciso superar os obstáculos. É preciso ter motivação, perseverar, insistir. A vida é uma sucessão de batalhas. Emprego, família, amigos: todos nós temos um status atual. E temos também expectativas com relação ao futuro. No entanto, as reviravoltas do destino nos surpreendem. Nem sempre dá para se fazer só o que gostamos. Mas, aquele que gosta do que faz e sente orgulho de fazer melhor, a cada dia vai mais longe. Há momentos de calmaria e há momentos agitados, decisivos, em que a boa intenção não basta. É quando a vida nos cobra coragem, arrojo, criatividade e um inabalável espírito de luta. A verdade é que os problemas e os reveses ocorrem com maior freqüência do que gostaríamos. Os tempos mudam. Surgem novos desafios e novos objetivos. Os guerreiros olham nos olhos do futuro sem medo e sem arrogância, mas com a confiança de quem está pronto para o combate. Viver é também estar preparado para as situações difíceis. O modo como encaramos as dificuldades é que faz a diferença. Às vezes nos perguntamos: como enfrentar as mudanças radicais que se apresentam diante de nós? Como atuar num novo cenário, onde coisas que fazíamos tão bem precisam ser reaprendidas? Como lutar sem deixar para trás valores fundamentais? E mais: como saber a medida exata a ser tomada no momento certo? O incrível é que justamente diante das situações adversas, muitos redescobrem o que têm de melhor. A ética, a amizade, a capacidade de criar novas estratégias, fundamentadas na experiência; o talento para promover alianças positivas. O espírito de liderança, a consciência da força que reside no verdadeiro trabalho em equipe. Tudo isso aflora quando as circunstâncias exigem, quando se sabe que existe um objetivo maior a ser alcançado. Claro que não é fácil abandonar hábitos, costumes... Não é fácil se adaptar-se aos novos meios, ou usar recursos com os quais não estamos familiarizados. Mas todo guerreiro sabe que pessimismo e insegurança, nessa hora só atrapalham. Ainda que a ameaça venha de vários lados, com agilidade, força e determinação podemos alcançar o resultado. A combinação de energia e inteligência, assim como o equilíbrio entre a razão e a emoção, são fundamentais para o sucesso. É uma sensação extremamente agradável chegar ao fim de uma etapa com a consciência do dever cumprido, e obter a consagração, o respeito de todos, o reconhecimento dos colegas, a admiração das pessoas que amamos. Ouvir o próprio nome com orgulho. Aquele orgulho de quem viu nos obstáculos a oportunidade de crescer. Orgulho de quem soube enfrentar as turbulências da vida e vencer. Orgulho de ser um vencedor que não abriu mão dos seus valores fundamentais.” Texto do vídeo motivacional “Gladiador” - DVD “Filosofia na Escola 2007”

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“A vida só pode ser entendida olhando-se para trás. Mas só pode ser vivida olhando-se para frente.”

(Søren Aabye Kierkegaard)

FILOSOFIA NA ESCOLA

A filosofia é bem maior do que imaginamos, e pode ser estudada de diversas formas. Ela é a base da ética e do auto-conhecimento humano.