fichamento.candido

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 Literatura e sociedade. 1 Objetivo central: focalizar aspectos sociais que envolvem a vida artística e literária nos seus diferentes momentos.  A aplicação das ciências sociais ao estudo da arte tem tido consequências frequentemente duvidosas, propiciando relaçõe s difíceis no terreno do método.  O primeiro cuidado em nossos dias é, portanto, delimitar os campos e fazer sentir que a sociologia não passa, neste caso, de disciplina auxiliar; não pretende explicar o fenômeno literário ou artístico, mas apenas esclarecer alguns dos seus aspectos. Questionamentos propostos: Qual a influência exercida pelo meio social sobre a obra de arte? Qual a influência exercida pela obra de arte sobre o meio? Algumas das tendências mais vivas da estética moderna estão empenhadas em estudar como a obra de arte plasma ( dá forma, modela) o meio, cria o seu público e as suas vias de penetração, agindo em sentido inverso ao das influências externas.    Malraux, Étienne Souriau e Mikel Dufrenne. Este estudo abordará de preferência o primeiro aspecto, —  sem desdenhar de todo o segundo,    começando por indagar qu ai s s ã o as possí vei s i n f l u ê n ci as ef eti vas do meio s obr e a obra . “A arte exprime a sociedadeconstitui hoje verdadeiro truísmo Talvez tenha sido Madame de Staél, na França, quem primeiro formulou e esboçou sistematicamente a verdade que a l i ter atu r a é tamm um pr odu to social , e xpr i mi ndo con di ç ões de cada ci vi l i zaç ã o em que ocor r e . Durante o século XIX não se foi muito além desta verificação de ordem geral, [...] Na  prática, chego u-se à posição criticamente pouc o fecunda de ava liar e m que me di da ce r ta for ma de ar te ou certa obr a corre s pondem à re al idade . [...] A segunda tendência é (foi) a de anal i s ar o cont e ú do so cial das ob r as , geral mente com bas e e m m oti vos de or de m m or al ou pol í ti ca  Para o sociólogo moderno, ambas as tendências tiveram a virtude de mostrar que a arte é socia l n os doi s s ent i dos:  1) depen de da ã o d e f at or es do m ei o , que se exprimem na obra em graus diversos de sublimação (exaltação); 2) e pr odu z s obr e os in di du os um efei to p r á tico , modi f i cando a sua condu ta e con ce ã o do mu n do, ou r efor ç an do neles o s e nt i mento dos valor e s s ociai s . Isto decorre da própria natureza da obra [...].  Para a sociologia moderna, porém, interessa principalmente analisar os tipos de r elaç õ es e os fa tos es tr u tu rai s ligados à vida artística, como causa ou consequência.”  Assim, a primeira tarefa é i nves ti gar as in f l nci as concretas e xer cidas pelos fator e s socioculturais . É difícil discriminá-los, na sua quantidade e variedade, mas pode-se dizer que os mais decisivos se ligam à estrutura  social (definição da posição social do CANDIDO, Antonio. A literatura e a vida social. In. Literatura e sociedade. 9ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre azul, 2006, p. 27-49.  

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Literatura e sociedade. 1

CANDIDO, Antonio. A literatura e a vida social. In. Literatura e sociedade. 9 ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre azul, 2006, p. 27-49.

Objetivo central: focalizar aspectos sociais que envolvem a vida artstica e literria nos seus diferentes momentos.A aplicao das cincias sociais ao estudo da arte tem tido consequncias frequentemente duvidosas, propiciando relaes difceis no terreno do mtodo.O primeiro cuidado em nossos dias , portanto, delimitar os campos e fazer sentir que a sociologia no passa, neste caso, de disciplina auxiliar; no pretende explicar o fenmeno literrio ou artstico, mas apenas esclarecer alguns dos seus aspectos.Questionamentos propostos: Qual a influncia exercida pelo meio social sobre a obra de arte? Qual a influncia exercida pela obra de arte sobre o meio?Algumas das tendncias mais vivas da esttica moderna esto empenhadas em estudar como a obra de arte plasma (d forma, modela) o meio, cria o seu pblico e as suas vias de penetrao, agindo em sentido inverso ao das influncias externas. Malraux, tienne Souriau e Mikel Dufrenne.Este estudo abordar de preferncia o primeiro aspecto, sem desdenhar de todo o segundo, comeando por indagar quais so as possveis influncias efetivas do meio sobre a obra.A arte exprime a sociedade constitui hoje verdadeiro trusmoTalvez tenha sido Madame de Stal, na Frana, quem primeiro formulou e esboou sistematicamente a verdade que a literatura tambm um produto social, exprimindo condies de cada civilizao em que ocorre.Durante o sculo XIX no se foi muito alm desta verificao de ordem geral, [...] Na prtica, chegou-se posio criticamente pouco fecunda de avaliar em que medida certa forma de arte ou certa obra correspondem realidade. [...] A segunda tendncia (foi) a de analisar o contedo social das obras, geralmente com base em motivos de ordem moral ou poltica Para o socilogo moderno, ambas as tendncias tiveram a virtude de mostrar que a arte social nos dois sentidos: 1) depende da ao de fatores do meio, que se exprimem na obra em graus diversos de sublimao (exaltao); 2) e produz sobre os indivduos um efeito prtico, modificando a sua conduta e concepo do mundo, ou reforando neles o sentimento dos valores sociais. Isto decorre da prpria natureza da obra [...].

Para a sociologia moderna, porm, interessa principalmente analisar os tipos de relaes e os fatos estruturais ligados vida artstica, como causa ou consequncia.Assim, a primeira tarefa investigar as influncias concretas exercidas pelos fatores socioculturais. difcil discrimin-los, na sua quantidade e variedade, mas pode-se dizer que os mais decisivos se ligam estrutura social (definio da posio social do artista, ou configurao de grupos receptores), aos valores e ideologias (forma e contedo da obra), s tcnicas de comunicao (feitura e transmisso).

Eles marcam, em todo o caso, os quatro momentos da produo, pois: a) o artista, sob o impulso de uma necessidade interior, orienta-o segundo os padres da sua poca;b) escolhe certos temas; c) usa certas formas e;d) a sntese resultante age sobre o meio.

No convm separar a repercusso da obra da sua feitura, pois, sociologicamente ao menos, ela s est acabada no momento em que repercute e atua, porque, sociologicamente, a arte um sistema simblico de comunicao inter-humana, e como tal interessa ao socilogo.

Todo processo de comunicao pressupe:a) um comunicante, (artista);b) um comunicado, (a obra); c) um comunicando, (o pblico a que se dirige);

Graas a isso define-se o quarto elemento do processo, isto , o seu efeito.

Justamente porque uma comunicao expressiva, a arte pressupe algo diferente e mais amplo do que as vivncias do artista.

Arte de agregao (se inspira principalmente na experincia coletiva e visa a meios comunicativos acessveis. Procura, neste sentido, incorporar-se a um sistema simblico vigente, utilizando o que j est estabelecido como forma de expresso de determinada sociedade.)

Arte de segregao. (se preocupa em renovar o sistema simblico, criar novos recursos expressivos e, para isto, dirige-se a um nmero ao menos inicialmente reduzido de receptores, que se destacam, enquanto tais, da sociedade.)

Fenmenos sociais de:Integrao - o conjunto de fatores que tendem a acentuar no indivduo ou no grupo a participao nos valores comuns da sociedade. Diferenciao - ao contrrio, o conjunto dos que tendem a acentuar as peculiaridades, as diferenas existentes em uns e outros.

So processos complementares, de que depende a socializao do homem; a arte, igualmente, s pode sobreviver equilibrando, sua maneira, as duas tendncias referidas.

........................................

Os trs elementos fundamentais da comunicao artstica:

autor (como a sociedade define a posio e o papel do artista?); obra (como a obra depende dos recursos tcnicos para incorporar os valores propostos?); pblico (como se configuram os pblicos?).

1 A POSIO DO ARTISTA.

A sociedade essencialmente estratificada (ou seja, disposta em camadas, em estratos) sendo, portanto, a posio social um aspecto inerente a sua estrutura.

A obra exige necessariamente a presena do artista criador.

Os elementos individuais adquirem significado social na medida em que as pessoas correspondem a necessidades coletivas e estas, agindo, permitem por sua vez que os indivduos possam exprimir-se, encontrando repercusso no grupo.

As relaes entre o artista e o grupo:

1. H necessidade de um agente individual que tome a si a tarefa de criar ou apresentar a obra;2. Ele ou no reconhecido como criador ou intrprete pela sociedade, e o destino da obra est ligado a esta circunstncia;3. Ele utiliza a obra, assim marcada pela sociedade, como veculo das suas aspiraes individuais mais profundas.

A obra fruto da iniciativa individual ou de condies sociais?Na verdade, ela surge na confluncia de ambas, indissoluvelmente ligadas.

A arte pressupe um indivduo que assume a iniciativa da obra.