fichamento sobre a questão judaica

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Fichamento – Sobre a Questão Judaica – Karl Marx CIDADANIA E EMANCIPAÇÃO POLÍTICA “[...] a anulação política da propriedade privada não só não leva à anulação da propriedade privada, mas até mesmo a pressupõe. O Estado anula à sua maneira a diferenciação por nascimento, estamento, formação e atividade laboral ao declarar nascimento, estamento, formação e atividade laboral como diferenças apolíticas, ao proclamar cada membro do povo, sem consideração dessas diferenças, como participante igualitário da soberania nacional, ao tratar todos os elementos da vida real de um povo a partir do ponto de vista do Estado. Não obstante, o Estado permite que a propriedade privada, a formação, a atividade laboral atuem à maneira delas, isto é, como propriedade privada, como formação, como atividade laboral, e tornem efetiva a sua essência particular.” (pág. 39-40) Ao operar a partir de noções idealistas como “cidadania” e “igualdade perante a lei” o Estado pretende anular no plano político diferenças materiais entre os indivíduos concretamente existentes, de modo que essas diferenças permanecem “livres” para atuarem e gerarem efeitos na sociedade civil-burguesa. A abstração da realidade traduzida no plano político no seio do Estado moderno busca apagar as diferenças concretas entre as pessoas – diferenças essas que sustentam a sociedade burguesa. “O Estado político pleno constitui, por sua essência, a vida do gênero humano em oposição à sua vida material. [...] Onde o Estado político atingiu a sua verdadeira forma definitiva, o homem leva uma vida dupla não só mentalmente, na consciência, mas também na realidade, na vida concreta; [...] a vida na comunidade política, na qual ele se considera um ente comunitário, e a vida na sociedade burguesa, na qual ele atua como pessoa particular, encara

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A questão judaica

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Fichamento Sobre a Questo Judaica Karl Marx

CIDADANIA E EMANCIPAO POLTICA[...] a anulao poltica da propriedade privada no s no leva anulao da propriedade privada, mas at mesmo a pressupe. O Estado anula sua maneira a diferenciao por nascimento, estamento, formao e atividade laboral ao declarar nascimento, estamento, formao e atividade laboral como diferenas apolticas, ao proclamar cada membro do povo, sem considerao dessas diferenas, como participante igualitrio da soberania nacional, ao tratar todos os elementos da vida real de um povo a partir do ponto de vista do Estado. No obstante, o Estado permite que a propriedade privada, a formao, a atividade laboral atuem maneira delas, isto , como propriedade privada, como formao, como atividade laboral, e tornem efetiva a sua essncia particular. (pg. 39-40)Ao operar a partir de noes idealistas como cidadania e igualdade perante a lei o Estado pretende anular no plano poltico diferenas materiais entre os indivduos concretamente existentes, de modo que essas diferenas permanecem livres para atuarem e gerarem efeitos na sociedade civil-burguesa. A abstrao da realidade traduzida no plano poltico no seio do Estado moderno busca apagar as diferenas concretas entre as pessoas diferenas essas que sustentam a sociedade burguesa.O Estado poltico pleno constitui, por sua essncia, a vida do gnero humano em oposio sua vida material. [...] Onde o Estado poltico atingiu a sua verdadeira forma definitiva, o homem leva uma vida dupla no s mentalmente, na conscincia, mas tambm na realidade, na vida concreta; [...] a vida na comunidade poltica, na qual ele se considera um ente comunitrio, e a vida na sociedade burguesa, na qual ele atua como pessoa particular, encara as demais pessoas como meios, degrada a si prprio condio de meio e se torna um joguete na mo de poderes estranhos a ele. (pg. 40)Na sua realidade mais imediata, na sociedade burguesa, o homem um ente profano. Nesta, onde constitui para si mesmo e para outros um indivduo real, ele um fenmeno inverdico. No Estado, em contrapartida, no qual o homem equivale a um ente genrico, ele o membro imaginrio de uma soberania fictcia, tendo sido privado de sua vida individual real e preenchido com uma universalidade irreal. (pg. 40-41)O Estado constitui e ao mesmo tempo media a tenso entre cidadania, isto , a condio de membro universal da comunidade poltica, que por sua vez enuncia e requer a igualdade entre todos seus membros, e a condio real dos indivduos concretamente existentes na sociedade de classes, em que cada um ocupa um determinado papel nas relaes de produo e reproduo da vida social. Por outro lado, essas diferenciaes concretamente existentes refletem no prprio comportamento do Estado em relao s pessoas concretamente existentes, revelando a ineficincia e a limitao da cidadania (e a emancipao poltica, portanto) enquanto forma definitiva de emancipao humana em geral.A emancipao poltica de fato representa um grande progresso; no chega a ser forma definitiva da emancipao humana em geral, mas constitui a forma definitiva da emancipao humana dentro da ordem mundial vigente at aqui (pg. 41)Apesar das limitaes, a emancipao poltica e a correspondente noo de cidadania so aspectos ou etapas importantes na organizao poltica da luta por emancipao humana em geral.

DIREITOS HUMANOSEsses direitos humanos so em parte direitos polticos, direitos que so exercidos somente em comunho com outros. O seu contedo constitudo pela participao na comunidade, mais precisamente na comunidade poltica, no sistema estatal. Eles so classificados sob a categoria da liberdade poltica, sob a categoria dos direitos do cidado [...]. (pg. 47)Marx diferencia a categoria dos direitos humanos em direitos do cidado, isto , os direitos polticos (de participao no sistema estatal basicamente votar e ser votado), e os direitos do homem. Posteriormente no texto, vai se referir aos direitos do homem como direitos humanos.Os droits de lhomme, os direitos humanos, so diferenciados como tais dos droits du citoyen, dos direitos do cidado. Quem esse homme que diferenciado do citoyen? Ningum mais ningum menos que o membro da sociedade burguesa. (pg. 48)Marx associa os direitos do cidado (direitos polticos) ao Estado (ao sistema estatal enquanto tal), e os direitos humanos sociedade burguesa, ao homem que atua na vida social independentemente da abstrao da cidadania.[...] os assim chamados direitos humanos, os droits de lhomme, diferentemente dos droits du citoyen, nada mais so que os direitos do membro da sociedade burguesa, isto , do homem egosta, do homem separado do homem e da comunidade. (pg. 48)Marx cita o art. 2. da Constituio francesa de 1793, que determina que esses direitos naturais e imprescritveis so: igualdade, a liberdade, a segurana e a propriedade (privada). Como definio de liberdade, cita o art. 6. da mesma constituio e o art. 4. da Declarao dos direitos do homem e do cidado de 1791, que em sntese definem liberdade como sendo o poder de fazer tudo que no prejudica os direitos do prximo.A liberdade equivale, portanto, ao direito de fazer e promover tudo que no prejudique a nenhum outro homem. O limite dentro do qual cada um pode mover-se de modo a no prejudicar o outro determinado pela lei [...]. Trata-se da liberdade do homem como mnada isolada recolhida dentro de si mesma. (pg. 49)A liberdade enunciada na Declarao dos direitos do homem e do cidado de 1791 e na constituio francesa de 1793, portanto, equivale liberdade do homem individualmente considerado, liberdade essa estabelecida nos termos e limites da lei, interligando-se ao clssico princpio da legalidade (ningum poder ser obrigado a fazer ou deixar de fazer algo seno em virtude da lei).A aplicao prtica do direito humano liberdade equivale ao direito humano propriedade privada.Em que consiste o direito humano propriedade privada? (pg. 49)Marx cita o art. 16 da constituio francesa de 1793, que dispe que o direito de propriedade aquele que pertence a todo cidado de gozar e dispor vontade de seus bens, rendas, fruto de seu trabalho e de sua indstria.O direito humano propriedade privada, portanto, o direito de desfrutar a seu bel prazer ( son gr), sem levar outros em considerao, independentemente da sociedade, de seu patrimnio e dispor sobre ele, o direito ao proveito prprio. Aquela liberdade individual junto com esta sua aplicao prtica compem a base da sociedade burguesa. (pg. 49)A galit [...] nada mais que igualdade da libert acima descrita, a saber: que cada homem visto uniformemente como mnada que repousa em si mesma (pg. 49)A segurana o conceito social supremo da sociedade burguesa, o conceito da polcia, no sentido de que o conjunto da sociedade s existe para garantir a cada um de seus membros a conservao de sua pessoa, de seus direitos e de sua propriedade. [...]Atravs do conceito da segurana, a sociedade burguesa no se eleva acima do seu egosmo. A segurana , antes, a assegurao do seu egosmo. (pg. 50)A noo de segurana como direito um dos principais fundamentos da sociedade burguesa, no sentido de que cada um tem direito de ser egosta e ser proprietrio de seus bens sem ser importunado ou atrapalhado na sua prpria ganncia.Portanto, nenhum dos assim chamados direitos humanos transcende o homem egosta, o homem como membro da sociedade burguesa, a saber, como indivduo recolhido ao seu interesse privado e ao seu capricho privado e separado da comunidade (pg. 50)Os direitos humanos enunciados nas cartas polticas dos sculos XVIII e XIX retratam os direitos do homem burgus em viver livremente sua vida, adquirindo propriedade e explorando a fora de trabalho dos demais.

COMUNIDADE POLTICA (CIDADANIA) X SOCIEDADE BURGUESAFato deveras enigmtico ver um povo que mal est comeando a se libertar, a derrubar todas as barreiras que separam os diversos membros do povo, a fundar uma comunidade poltica [...] proclamar solenemente a legitimidade do homem egosta, separado do semelhante e da comunidade [...]. Esse fato se torna ainda mais enigmtico quando vemos que a cidadania, a comunidade poltica, rebaixada pelos emancipadores condio de mero meio para a conservao desses assim chamados direitos humanos e que, portanto, o citoyen declarado como servial do homme egosta; quando vemos que a esfera em que o homem se comporta como ente comunitrio inferiorizada em relao quela em que ele se comporta como ente parcial; quando vemos, por fim, que no o homem como citoyen, mas o homem como bourgeois assumido como o homem propriamente direito e verdadeiro. (pg. 50)[...] a vida poltica se declara como um simples meio, cujo fim a vida da sociedade burguesa. (pg. 51)O Estado (a comunidade poltica), local em que o homem visto como cidado, como ente comunitrio, compreendido, na viso liberal ps-revolucionria, como um meio para garantir a plena realizao do homem verdadeiro e propriamente dito: o homem burgus. A comunidade poltica e a poltica em si se subjugam realizao da sociedade burguesa.Contudo, Marx aponta uma contradio entre a teoria liberal dos direitos humanos e prtica. Segundo ele, na prtica, os direitos humanos so rapidamente violados para garantir a perpetuao da ordem (dominao) poltica. Na teoria, a forma poltica instituda como meio para alcanar um fim, que seria realizao plena do ser humano atravs dos direitos humanos, porm, esses mesmos direitos humanos, caso levados s suas ltimas consequncias, so abafados em defesa da ordem poltica imposta. No fim, a defesa dos direitos humanos o fundamento de legitimidade da ordem poltica instituda, porm a realizao plena desses direitos no pode implicar na contestao da ordem poltica (e consequentemente da dominao poltica).Marx explica a essncia da teoria liberal dos direitos humanos a partir da formao do Estado poltico e da sociedade burguesa:A constituio do Estado poltico e a dissoluo da sociedade burguesa nos indivduos independentes cuja relao baseada no direito, assim como a relao do homem que vivia no estamento e na guilda era baseada no privilgio se efetiva em um s e mesmo ato. O homem, na qualidade de membro da sociedade burguesa, o homem apoltico, necessariamente se apresenta ento como o homem natural. Os droits de lhomme se apresentam como droits naturels, pois a atividade consciente se concentra no ato poltico. [...] A revoluo poltica decompe a vida burguesa em seus componentes sem revolucionar esses mesmos componentes nem submet-los crtica. [...] Por fim, o homem na qualidade de membro da sociedade burguesa o que vale como o homem propriamente dito, como o homme em distino ao citoyen, porque ele o homem que est mais prximo de sua existncia sensvel individual, ao passo que o homem poltico constitui apenas o homem abstrado, artificial, o homem como pessoa alegrica, moral. (pg. 53)