festas religiosas

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Festas Religiosas Expressões de Memória, Identidade e Simbolismo Religioso Maria A. Leonardo - Relatório de Tese de Doutoramento

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Tese de doutoramento em antropologia

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Page 1: Festas Religiosas

Festas ReligiosasExpressões de Memória, Identidade e Simbolismo Religioso

Maria A. Leonardo - Relatório de Tese de Doutoramento

Page 2: Festas Religiosas

Indice1Índice ........................................................................................................................... 01

1. Introdução ............................................................................................................... 02

2. Caracterização da Investigação ................................................................................ 03

3. Estrutura Cronológica da Investigação ..................................................................... 04

4. Estrutura da Tese ...................................................................................................... 05

5. Primeira Etapa: Pesquisa Bibliográfica ..................................................................... 07

6. Segunda Etapa: Aproximação Historiográfica .......................................................... 08

7. Terceira Etapa: Pesquisa de Terreno ........................................................................ 10A Dimensão Social, Cultural e Cosmológica das Festas Religiosas

8. Quarta Etapa: Pesquisa de Terreno .......................................................................... 15A Influência das Festas Religiosas na Construção, Afirmação eReprodução de Identidades

9. Considerações sobre as Festas Religiosas e Etapas Finais......................................... 32

7.1 O Cotidiano da Histórica Sabará ............................................................................ 107.2 Relatório dos 12 primeiros meses .......................................................................... 117.3 O Processo Ritual da Semana Santa ..................................................................... 12

8.1. Festas Religiosas: Lugar de Representação de Identidades.................................... 178.2. Festas Religiosas: Lugar de Experiência Religiosa ................................................. 208.3. Festas Religiosas: Lugar de Força Experiencial do Rito Religioso ......................... 228.4. Festas Religiosas: Lugar de Emoção e Encantamento ........................................... 248.5. Festas Religiosas: Lugar de Memória, Imaginário e Tradição ............................... 268.6. Festas Religiosas: Lugar de Expressão, Ritual e Peformance ................................. 288.7. O Eixo Relacional-estético das Festas Religiosas ................................................... 30

Page 3: Festas Religiosas

1. Introdução2Este relatório de actividades diz respeito a uma interpretação antropológica das festas religiosas como

fonte de construção, afirmação e reprodução de identidades religiosas, resultado de um trabalho de terreno

que se estendeu por 30 meses consecutivos desde julho 2010 a dezembro 2012 na cidade de Sabará (MG) e na

Igreja Batista da Lagoinha em Belo Horizonte (MG).

A linguagem teórica da tese é desenvolvida na primeira etapa da investigação em duas subáreas

antropológicas, a saber, o estado da arte da Antropologia da Religião e da Antropologia das Festas; e também na

segunda etapa onde evidencia o estado da arte do Catolicismo Popular e do Protestantismo no Brasil. E a

linguagem empírica é desenvolvida nas etapas seguintes em dois capítulos dedicados ao processo ritual da

Semana Santa e interpretação das festas religiosas em oito eixos/categorias de análise: social, cultural,

cosmológico, experiencial, ritual, emocional, performativo e relacional estético.

A segunda etapa de investigação é demonstrada no capítulo 3 da tese, Historiografia e Desenvolvimento

do Catolicismo Popular e do Protestantismo no Brasil, e é marcada pelo modelo monográfico ancorado em uma

orientação teórico-metodológica de abordagem qualitativa de investigação focada em bibliografia e recurso

documental para esboçar o desenvolvimento do catolicismo popular no Brasil e o desenvolvimento social do

protestantismo no Brasil. E, a Historiografia de Sabará e da Igreja Batista da Lagoinha é construída mais

especificamente em História Oral e depoimentos em sua variante etnobiográfica reconstruindo o legado

histórico e memória coletiva.

O capítulo 4 da tese, terceira etapa da pesquisa de terreno, é uma etnografia apoiada em descrição

densa da sequencia ritual da Semana Santa. Esta etapa da investigação reúne as observações do catolicismo

popular investigando a celebração como um espaço de representações sociais e culturais. Aqui a ênfase recai no

aspecto como a prática religiosa local está relacionada ao cotidiano, à vida social e cultural e que resultam em

forte identidade local apoiada na imagem barroca da cidade e no cerimonial da Semana Santa. Indaga-se,

portanto, a função social da celebração, as manifestações culturais e como a cosmovisão religiosa é revelada no

contexto.

A quarta etapa é uma etnografia de modelo comparativo apoiado em profunda observação participante

para acurada interpretação das festas religiosas. Neste capítulo 5 da tese, a ênfase empírica recai no aspecto da

influência das festas religiosas na construção, afirmação e reprodução de identidades religiosas. Em

Antropologia da Religião, identidades religiosas são importante objeto de estudo, como fenômeno relevante e

contemporâneo, tendo o espaço religioso como lugar de representação de identidade. Para melhor

argumentação das relações de influência foi criado o diagrama Pentágono Identitário das Festas Religiosas para

delimitar a influência das festas religiosas sob cinco óticas: ritual, experiencial, emocional, performativo,

relacional-estético.

As considerações finais serão apresentadas na quinta etapa, capítulo 6 da tese de doutoramento em

antropologia, seguindo a matriz, ora construida, para mensurar em qual intensidade cada um dos fenômenos

em seus respectivos eixos de análise influencia na construção, afirmação e reprodução da identidade religiosa.

Esta investigação partirá ainda para uma sexta etapa em período pós doutoral, que consiste em

antropologia aplicada e investigação-ação, nas outras cidades históricas mineiras em parceria com o Instituto

Ethnic, do Museu Observatório de Antropologia da Religião em Lagoa Santa Minas Gerais e apoio da Revista

Ultimato e da Revista Povos.

Page 4: Festas Religiosas

2.Caracterização da Investigação3Área:

Especialidade:

Título

Objeto de estudo

Tema

Problematização

Tese (argumento central)

Delimitação do tema

Objetivo da Investigação

Terreno da Investigação

Antropologia da Religião

Religião, Ritual e Performance

FESTAS RELIGIOSAS – Expressões de Memória, Identidade e Simbolismo Religioso.

As festas religiosas.

A influência das festas na construção, afirmação e reprodução da identidade religiosa.

Qual é a influência das festas na construção, afirmação e reprodução da identidade religiosa?

A comunicação simbólica das festas e celebrações religiosas influencia diretamente na construção, afirmação e

reprodução da identidade, na rica interface da tradição e inovação, resultando em múltiplas identidades religioso-

culturais.

Esta investigação constitui em uma análise das práticas culturais, religiosas, comportamentais e sociais no contexto

religioso contemporâneo, no ambiente cultural das festas e celebrações religiosas.

O objetivo geral desta pesquisa é investigar as festas e celebrações religiosas como fonte de construção, afirmação e

reprodução da identidade, resultando em múltiplas identidades religiosas.

A festividade da Semana Santa foi escolhida por ser considerada a festa por excelência da religiosidade católica, e será

investigada no contexto histórico-cultural da histórica Sabará, MG, reconhecida como a tradição religiosa mais

católica do Brasil. O outro terreno de campo, são as celebrações da Igreja Batista da Lagoinha, por ser consirada uma

igreja protestante evangélica de referência em todo país. Estes dois terrenos específicos serão exemplos para a

abordagem comparativa entre a cosmologia católico-romana e a protestante-evangélica.

Page 5: Festas Religiosas

3.Estrutura Crononógica da Investigação4

ETAPA 02

ETAPA 03

ETAPA 04

ETAPA 05

ETAPA 06

REDAÇÃOCapítulo 4 da Tese

A Dimensão Social, Cultural eCosmológica das Festas Religiosas

REDAÇÃOCapítulo 5 da Tese

A Influência das Festas na Construção,Afirmação e Reprodução de

Identidades Religiosas

Pesquisa de Terreno

Período de 6 Meses: 11/2010 a 04/2011Aproximação Historiográfica

Pesquisa de Terreno

Período de 12 Meses:11/2010 a 05/2012O Processo Ritual da Semana Santa

Pesquisa de Terreno

Período de 12 Meses:01/2012 a 12/2012Interpretação das Festas Religiosas

Período pós-DoutoramentoAmpliar a Pesquisa de Terreno p/

outras cidadades Históricas de MG

T

Interpretação das Festas Religiosas

rabalho ligado ao Instituto Ethic e aoMuseu de Antropologia, Lagoa Santa-MGPeríodo de 18 Meses:08/2013 a 12/2014

Páginas 8 e 9

Páginas 10 a 14

Páginas 15 a 31

ETAPA 01

REDAÇÃOCapítulo 2 da Tese

O Estado da Arte da Antroplogia daReligião e da Antropologia das Festas

Pesquisa BibliográficaPeríodo de 8 Meses: 07/2010 a 02/2011

Página 7

Conclusão: fevereiro/2011

Conclusão: abril/2011

Conclusão: maio/2011

Conclusão: dezembro/2012

Conclusão Prevista: junho/2013

Enviado para Análise em:10/05/2011

Enviado para Análise em:03/12/2011

Enviado para Análise em:12//2012

FASE FINALAvaliação Preliminar: 02//2013

Ajustes Finais: 03/2013Redação Final: 04/2013

Impressão e Entrega: 05/2013Defesa: 06/2013:

REDAÇÃOCapítulos 1 e 6 da TeseCapítulo 1: IntroduçãoCapítulo 6: Conclusão

Avaliação e Ajustes Finais

REDAÇÃOCapítulo 3 da Tese

Historiografia e Desenvolvimento doCatolicismo Popular e doProtestantismo Brasileiro

Região 1: Caeté, Cata Altas, Lagoa Santa,Sabará, Santa Bárbara.

Região 2: Congonhas, Diamantina,Mariana, Ouro Preto,S. João del Rei, Tiradentes

Page 6: Festas Religiosas

4.Estrutura da Tese5A tese está estruturada em seis capítulos como a seguir

2.1 O Processo Ritual das Festas Religiosas: fenomenologia da ritualidade

2.2. Fundamentos Teóricos da Antropologia das Festas Religiosas

2.3. Considerações sobre a aplicação do Estado da Arte ao objeto da pesquisa - As Festas Religiosas.

3.1. Desenvolvimento do Catolicismo Popular no Brasil

3.2. Desenvolvimento Social do Protestantismo no Brasil

3.3. Institucionalização da Santa Ceia e da semana santa

3.4. Historiografia da Igreja Batista da Lagoinha

3.5. Historiografia de Sabará

4.1. A Alma do Local: Cotidiano da Histórica Sabará

4.2. Processo Ritual da Semana Santa

1. INTRODUÇÃO

2. O ESTADO DA ARTE DA ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO E DA ANTROPOLOGIA DAS FESTAS

3. HISTORIOGRAFIA E DESENVOLVIMENTO DO CATOLICISMO POPULAR E DO PROTESTANTISMO NO BRASIL

4. A DIMENSÃO SOCIAL, CULTURAL E COSMOLÓGICA DAS FESTAS RELIGIOSAS

3.6. A Dimensão Cosmológica do Catolicismo Popular e do Protestantismo Brasileiro

4.2.1. Sexta-feira das Dores (15 abril 2011/30 março 2012)

4.2.2. Sábado da Paixão (16 abril 2011/31 março 2012)

4.2.3. Domingo de Ramos (17 abril 2011/01 abril 2012)

4.2.4. Segunda-feira Santa (18 abril 2011/01 abril 2012) – Procissão de Depósito

4.2.5 Terça-feira Santa (19 abril 2011/03 abril 2012): Procissão do Encontro

4.2.6 Quarta-feira Santa (20 abril 2011/04 abril 2012): O Sermão da Soledade.

4.2.7 Quinta-feira Santa (21 abril 2011/05 abril/2012):

4.2.8 Sexta-feira Santa (22 abril 2011):

4.2.9 Sábado Santo (23 abril 2011/07 abril/2012): vigília pascal

4.2.10 Domingo de Páscoa (24 abril 2011/08 abril/2012): Domingo da Ressurreição

4.2.11 O Domingo da Ressurreição na Igreja Batista da Lagoinha

.2.

Page 7: Festas Religiosas

4.Estrutura da Tese65. A INFLUÊNCIA DAS FESTAS RELIGIOSAS NA CONSTRUÇÃO, AFIRMAÇÃO E REPRODUÇÃO DE IDENTIDADES

RELIGIOSAS.

5.1. O Universo das Representações de Identidades Religiosas

5.2 Festas Religiosas: Lugar de Representações de Identidades

5.3 Festas Religiosas: Lugar de Experiência Religiosa

5.4 Festas Religiosas: Lugar de Força Experiencial do Rito Religioso

5.5 Festas Religiosas: Lugar de Emoção e Encantamento

5.6 Festas Religiosas: Lugar de Memória, Imaginário e Tradição

5.7 Festas Religiosas: Lugar de expressão, ritual e performance

5.8 O Eixo Relacional-Estético das Festas Religiosas

6. CONSIDERAÇOES FINAIS

BIBLIOGRAFIA

5.2.1 Categorias de Análise das Identidades

5.2.3 Identidade e Catolicidade em Sabará, MG

5.2.4 Identificação e Ética Protestante: Percepções da Igreja Batista da Lagoinha

5.2.5 Discussão, Retorno à Teoria e Abordagem Comparativa

5.3.1 A força da experiência na cosmologia protestante-evangélica

5.4.1 A força da ação simbólica em forma de “memorial” na cosmologia protestante-evangélica

5.5.1 A representação emocional da experiência na cosmologia protestante-evangélica.

5.5.2 Antropológica do espelho das festas religiosas..

5.6.1 Fatores de Revitalização e Re-invenção da Religiosidade Mineira

5.6.2 Lendas que compõem o imaginário popular

5.6.3 A força da ação simbólica em forma de “celebração” na cosmologia protestante-evangélica

5.7.1 Ritual e Performance de Cenas Abertas da Paixão em Sabará.

5.7.2 Performance e Representação: Cantata da Pascoa na Igreja Batista da Lagoinha.

5.8.1 O universo relacional-estético da devoção

5.8.2 O fenômeno relacional-estético das benzedeiras de Sabará

5.8.3 O fenômeno relacional-estético da koinonia na Igreja Batista da Lagoinha

Page 8: Festas Religiosas

5.Primeira Etapa: Pesquisa Bibliográfica7A primeira etapa da investigação foi dedica à pesquisa bibliográfica, leitura e a aplicação do Estado da Arte ao objetoda pesquisa. Esta etapa teve a duração de 8 meses (de julho/2010 a fevereiro de 2011). A pesquisa bibliográfica foidesenvolvida em cinco blocos de conhecimento, como a seguir:

1. A aplicação do Estado da Arte ao objeto da pesquisa - As Festas Religiosas

2. O Desenvolvimento do Catolicismo Popular no Brasil

3. O Desenvolvimento Social do Protestantismo No Brasil

4. Institucionalização da Santa Ceia e Da Semana Santa

5. Historiografia de Sabará e da Igreja Batista da Lagoinha

Tendo em vista que o objeto empírico desta investigação é a festa religiosa, a teoria clássica das festas abre seu lequede conhecimento para investigar e delimitar a Semana Santa como objeto de estudo por ser a festa por excelência dacristandade ocidental, o eixo do ciclo comemorativo. Os clássicos da antropologia fornecem uma messe deconhecimentos antropológicos à partir das religiões primitivas que são, nesta investigação, orientadores do eixocosmológico. O Estado da Arte abordou os fundamentos antropológicos de Frazer, Malinowski, E-Pritchard, Lévy-Bruhl, Lienhardt, Durkheim, e também as obras contemporâneas de Brubaker, Leal, Geertz. A antropologia das festasrecorreu a fundação teórica de, Turner, Vangenap, Caillois, Isambert , Sanchis, Boissvain, Terrin, e Perez.

O Estado da Arte do Catolicismo Popular no Brasil passou pelo referencial teórico de Alves, Isidoro (1980; Berger,Peter (1971); Brandão, Carlos (1985, 1986, 2005, 2010); Cavalcanti, Maria Laura (1994, 1999); Durkheim (1912);Freire, Gilberto (1933); Passos, Mauro (2002); Pierucci & Prandi, (1996); Turner (1968); Zaluar, Alba (1983).

O Estado da Arte do Protestantismo no Brasil passou pelo referencial teórico de Alencar, Gedeon (2010); Cavalcanti,Carlos (2010); Cunha, Magali (2007) DaMatta, Roberto (1980); Mariano, Ricardo (1995, 2005); Niebuhr, Richard(1992); Prandi & Souza (1996, 2000); Weber, Max (1920).

A celebração da Santa Ceia foi instituída por Jesus Cristo no ano 33 da era cristã e passou a ser festejada pelosprimeiros cristãos acompanhada de e confraternização. Na historiografia do protestantismo brasileiro acelebração da primeira Ceia foi em 21 de março de 1557, e é a celebração máxima das igrejas protestante-evangélicas.

procissão acontecem desde 1834 e é tradicionalmente conhecida em todopaís.

koinonia

A Semana Santa foi instituída pelo Concílio de Nicéia, regida pelo Papa Silvestre I e celebrada pela primeira vez no anode 1682, quando os ensinamentos da doutrina católica tornaram-na como religião oficial do Império Romano. EmSabará, a festividade da semana santa e

Sabará é uma das primeiras vilas do ouro, assentada no Arraial de Nossa Senhora da Conceição em 17 de julho de1711. Era uma das primeiras e mais ricas áreas das Minas Gerais colonial no clico do ouro. Surgiu no fim do século XVII,transformada em Freguesia em 1907, municio em 17/07/1711 com o nome de Vila Real de Nossa Senhora daConceição do Sabará. Veio a ser cidade em 1838, tendo as palavras e suas duas fortes marcas.

A Igreja Batista da Lagoinha foi fundada em 20 de dezembro de 1957 com a presença de 30 evangélicos, sendo a sextaigreja batista da capital mineira, sediada bem alí, em Lagoinha no coração da cidade. Ainda em 1958 esta tradicionalhistórica igreja batista passou pelo processo de renovação espiritual que a trouxe para a plataforma de “igrejarenovada” e cosmologia neopentecostal.

ouro igreja

Page 9: Festas Religiosas

8

Esta aproximação historiográfica teve a duração de

5 meses (de novembro/2010 a março de 2011).

Esta etapa de investigação sobre a

, apoiou-se em

análise bibliográfica e etnobiográfica, procedimento

documental, história oral e depoimentos, tendo o

objetivo de fazer uma interpretação antropológica do

valor do legado histórico como parte das identidades

religiosas.

O fator histórico é de importância vital para a

compreensão do catolicismo popular e do

protestantismo no Brasil, por ser o cristianismo, uma

religião histórica. Dado que o cristianismo possui

roupagem histórica e adornos das culturas,

compreender, pois, a história e seu contexto, ajuda na

compreensão do mundo. O vetor histórico abre,

portanto, as janelas para a compreensão dos amplos

aspectos nos quais as festas religiosas estão

relacionadas com a identidade religiosa.

Para investigar e validar os aspectos sobre

como o legado histórico e memória coletiva

participam como fonte de construção, afirmação e

reprodução de identidades, foram ouvidas 50 pessoas

com idade superior a 60 anos e que residem no Centro

Histórico de Sabará a mais de 40 anos; e várias

histórias orais e pequenos depoimentos foram

colhidos de pessoas que visitam ou trabalham no

Centro Histórico. Inicialmente, percebeu-se que a

cultura material é tida como evidência da identidade

católica em Sabará. Esta religiosidade católica está

Historiografia e Desenvolvimento do Catolicismo

Popular e do Protestantismo no Brasil

Em que aspectos o legado histórico e

memória coletiva participam como fonte de

construção, afirmação e reprodução de identidades?

PESQUISA DE TERRENO: HISTORIOGRAFIA E DESENVOLVIMENTODO CATOLICISMO POPULAR E DO PROTESTANTISMO NO BRASIL

presente nas marcas do tempo gravadas na

arquitetura barroca e memória coletiva recontada

pela história de Sabará. A análise etnobiográfica por

meio de relatos das 50 pessoas com idade superior a

60, e por historiadores locais representa um

instrumento privilegiado da recolha de dados na

histórica Sabará e permitiu maior conhecimento da

sociedade e da ligação entre

A interpretação antropológica neste item de

investigação em terreno confirma que em Sabará, o

legado histórico é parte da identidade religiosa. Da

observação participante e conversas ao por-do-sol,

percebe-se que história e identidade religiosa se

misturam no conceito popular, não sendo possível

definir precisamente as fronteiras de uma e outra.

Desta forma, o legado histórico participa da

construção, afirmação e reprodução da identidade

religiosa. Mas, em qual escala de valor esse

fenômeno ocorre? Seguramente, o centro de vida da

histórica Sabará é a sua identidade histórico-

religiosa; a influência da igreja e do fenômeno

religioso foram muito importante para o processo de

urbanização de Sabará e continua sendo para o seu

desenvolvimento sócio-econômico. Grande parte de

seus roteiros turísticos são os templos e capelas

católicas, e nesse sentido os setores do turismo,

secretaria de cultura, mídia local e poder eclesiástico

se encarregam de reproduzir esta identidade

religiosa-cultural. Esse fenômeno religioso-cultural é

altamente valorizado e movimenta a vida e economia

da cidade.

história – memória –

tradição e identidade religiosa.

6 Segunda Etapa: Aproximação Historiográfica

Page 10: Festas Religiosas

9Grande ênfase recai na relação entre tradição e

identidade. Dona Terezinha Caldeiras (79 anos) e Sr José(74) dizem preferir a maneira tradicional católica decelebrar a Semana Santa, e consideram a tradição comoalgo essencial. Ana e Carmem declaram que Sabará éconhecida por como uma cidade católica, “está é a nossaidentidade”, declaram. “A maioria da vizinhançapermanece católica e vive próximo da igreja”. Mas, duassenhoras que moram bem atrás da igreja afirmaram,“prefiro não responder às suas perguntas, porque já fazmuitos anos que não somos mais católicas –pertencemos à Igreja Universal do Reino de Deus e temosmuito pouco a contribuir sobre o tema”.

Por outro lado, a histórica Sabará passa porprocessos de mudanças, inovações e modernizações quecomprometem a sua tradição histórica. Esta geraçãohistórica está bem reduzida! Dados indicam que aterceira idade e velhice representam apenas 6,3% dapopulação; desta forma, estes anciãos que contam ahistória em breve não estarão mais por aqui. Ou seja, emcada cem pessoas, apenas seis são encarregados detransmitir as tradições. A maioria das pessoas acima dos60 anos declarara não mais acompanhar as procissõespor motivos de saúde e capacidade física, pois istodemanda muitas horas de caminhada.

Dona Vanda e Dona Alice ressaltam que adiminuição do número de pessoas que atendem asprocissões vem caindo drasticamente nos últimos anos.“A vida aqui é bem diferente, minha filha – antes os baresficavam fechados e havia total silêncio na cidade. Hoje éuma grande barulheira, e os bares ficam abertos à noitetoda durante a Semana Santa”. Também houve aumentode urgias e criminalidades durante a Semana Santa,“Olha, vou lhe dizer uma coisa, vários trechos de ruas sãoconhecidos por pessoas que bebem muito, usam drogas,e são trechos perigosos. Minha amiga já foi assaltada, eeu também quase fui. Hoje nós temos medo de sair àsruas” (Dona Adélia). Outro ponto de mudança éreferente à tradição familiar. Evidentemente, no início eem dias passados tudo girava em torno das famílias, asirmandades eram formadas por famílias; mas houve umdeslocamento como afirma o Sr. Biler: “no passado asirmandades eram formadas por famílias muito dedicadasà uma igreja, e estes a mantinham; mas hoje esta ideia defamília foi substituída por comissões [...] e para bemdizer a verdade, nem entendo mais como as coisasfuncionam”. Sob a ótica destes relatos orais, as coisastêm mudado muito e não há mais o engajamento dasfamílias como havia antes. As pessoas estão a cada diamais diferentes, e a modernidade tem alterado os estilose práticas religiosas.

Na visão dos historiadores locais, a história éum patrimônio, e definitivamente consideram oaspecto histórico como um dos fatores da identidadereligiosa sabaraense. “A maioria da população écatólica, e nossa história muito influi para estaidentidade religiosa [...] os rituais que a igrejaproporciona e principalmente a abertura do sepulcroque é tradicional – isto é Sabará, nossa história, nossacultura e identidade” (Monica Granja).

Outro fator de valorização do legadohistórico e identidade é o fato da PrefeituraMunicipal de Sabará ter financiado o “PROJETORESGATANDO HISTÓRIAS, com o objetivo de envolvê-las de forma coletiva e participativa na preservaçãoda cultura, história e do patrimônio do município.Esse engajamento do setor público revilatizou asmúltiplas manifestações culturais e da oralidade queconta e re(conta) as histórias, estórias e memórias doimaginário popular, e desta forma, foi possível(re)construir, (re)interpretar, e (re)descobrir aidentidade cultural que enriquece a história deSabará. Por esta medida institucional, o fatorhistórico revitalizou as relações sociais nos últimoscinco anos, a partir de 2007, quando o projeto foiimplantado.

Desde o início de nossa história, a religião estava lá efoi transmitida por nossos avós e bisavós.

Minha filha, esta é a nossa palma barroca, nossahistória, nossa vida ... artesanato religioso produzido

com nossas mãos, perpetualizando nossa identidade.

Temos uma marca católica que o tempo não podeapagar, são três séculos de história e um patrimônio

histórico-cultural tombado.

Praticamente quase todo patrimônio cultural deSabará tem a ver com religião.... acho que nossahistória e cultura são inseparáveis da identidade

religiosa.

Somos uma cidade católica... é só olhar ao nossoredor. A grande quantidade de igrejas construídas no

início do século XVIII e o fato de possuirmos todo estelegado cultural como patrimônio da humanidade é

uma prova que possuímos uma identidade católica.

Page 11: Festas Religiosas

10

Para conduzir esta etapa da investigação foi

utilizado um conjunto de eficazes ferramentas. A

investigação valeu-se do procedimento documental,

survey, entrevistas, grupos focais, casos e pesquisa de

opinião, das técnicas da observação participante,

estudos de comunidade, workshop, análise biográfica

e etnobiografia por meio das histórias de vida e

história oral. Ampliando ainda os recursos

metodológicos para acurado reconhecimento do

terreno e dos bairros e das regiões, a pesquisadora

utilizou-se de informantes locais, contando

especialmente com assessoria e acompanhamento

do prof. Mozart Justino Vaz, do ex-prefeito Sr. Luiz

Alves, do historiador José Bouzas, da equipe da

Fundação Educacional, Profissionalizante e

Empresarial (FEPESA) de Sabará, e de outros

renomados historiadores e professores.

Esta etapa da investigação reúne as

observações dos rituais e práticas do catolicismo

popular durante a Semana Santa, investigando a

celebração como um espaço de representações

sociais e culturais. Aqui a ênfase recai no aspecto

Por um

lado observa-se a força das representações sociais e

por outro, Sabará é possuidora de um maravilho

Patrimônio Histórico visível em suas igrejas, capelas e

como a prática religiosa local está relacionada ao

cotidiano, à vida social e cultural e que resultam em

forte identidade local apoiada na imagem barroca

da cidade e no cerimonial da Semana Santa.

Capítulo 4. A DIMENSÃO SOCIAL, CULTURAL ECOSMOLÓGICA DAS FESTAS RELIGIOSAS

A pesquisa de terreno, na tese redigida, na

terceira e quarta etapa aconteceu desde o início da

investigação quando a pesquisadora fixou residência

em Sabará, MG no período de novembro/2010 a

maio de 2012.

7. Terceira Etapa: Pesquisa de Terreno

artesanato religioso. Aqui foram explorados os eixos

do social, cultural e cosmológico sob o trinômio

sociedade – cultura e religião. Sabará preserva os

rituais católicos e faz da religião uma combinação de

fé – arte e cultura recriando toda a cena da Paixão em

forma de cerimônias religiosas tradicionais típicas da

religiosidade mineira, reunindo um dos mais belos

espetáculos da cultura e devoção popular. Indaga-se,

portanto, a função social da celebração, as

manifestações culturais e como a cosmovisão

religiosa é revelada no contexto.

O Cotidiano da Histórica SabaráPara abordar o trinômio sociedade – cultura

e religião em Sabará, 12 paginas do capítulo 4 foram

dedicados à interpretação do cotidiano da histórica

Sabará, contendo uma antropologia descritiva da

geografia local, da urbanização e vida nas sete regiões

de Sabará, observando a aparência do local,

arquitetura, tipo de habitação, urbanização,

"morros", classes sociais dos moradores e tipos de

eventos sociais e religiosos que acontecem nestes

bairros que estão distantes do centro da cidade

histórica.

O objetivo desta abordagem é a devida

demarcação social, cultural e religiosa da cidade;

contendo dados estatísticos e demográficos, e

polifonia, ou seja, os relatos orais dos informantes. E

ainda uma descrição da estrutura paroquial, que

conta com bom número de pessoas envolvidas nas

atividades administrativas e religiosas.

Page 12: Festas Religiosas

11Dos dez itens do patrimônio imaterial de

Sabará, cinco estão diretamente ligados às festas

religiosas e duas ao artesanato religioso. Aqueles

ligados às festas religiosas são, o Congado, a Folia de

Reis , as Festas Juninas e Quadrilhas, a Festa do Divino,

a Semana Santa Renda Turca de Bicos (artesanato

desenvolvido originariamente em Sabará; o saber foi

trazido para o Brasil no século XVIII e repassado para

as rendeiras), Palma Barroca (artesanato típico de

Sabará utilizado na ornamentação de altares e

oratórios).

Dados de nosso survey demonstraram que as

festas preferidas são em primeiro lugar a Semana

Santa (58%); segundo, as Festas Juninas (29%);

terceiro, a Folia de Reis (24%); e quarto, a Festa do

Divino (18%).

A fenomenologia da ritualidade da festa

religiosa encontra na performance, na arte, e na

cultura o palco ideal para as representações sociais.

Nesse universo da Semana Santa,

são fatores de

reprodução da identidade religiosa.

Num percurso de 300 anos de repetição e

permanências de uma trama ordenada de

religiosidade, as irmandades, o poder eclesial e o

povo sabaraense reproduzem anualmente a

por meio das celebrações da Semana

Santa. A “reafirmação dos laços sociais e reiteração

periódica da sua identidade como corpo social

unificado reflete-se noutras facetas dos festejos”

(Leal:1994:214), tais como, os homens públicos e

políticos no cortejo das procissões, a centenária

banda de música, as cenas abertas, as figuras vivas e a

abertura do sepulcro. Dessa forma, a “religiosidade

representada anualmente é uma reiteração cíclica

das relações sociais” (Leal:1994:217).

os eixos do social,

do cultural e do cosmológico

tradição

católica de ser

Nos três primeiros meses de novembro -dezembro – janeiro/2011 esteve engajada napesquisa de terreno na cidade de Sabará - MG eparticipou de alguns acontecimentos centrais na vidada cidade e dedicou-se à observação participante emdiversos locais, dias e horários, vivendo eparticipando do cotidiano da histórica comunidadede Sabará. Visitas institucionais e pesquisaexploratória de terreno, seguindo um roteiroinvestigatório. Levantamentos estatísticos noInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística, e naBiblioteca Municipal de Sabará, observando odesenvolvimento populacional, gênero, faixa etária,nascimentos e óbitos. Promovi 6 grupos de discussãosobre o "Diálogo Inter-religioso em Sabará", comprofissionais liberais, professores e alunos; eprocedeu a aplicação de teste do questionárioeletrônico a 50 pessoas, no sentido de testar acompreensão do questionário.

Fevereiro e março/2011 foram dedicados àobservação participante e registro via diário decampo. Entrevistas com 12 historiadores, líderesreligiosos e autoridades locais. Entrevistas tipodepoimentos/história oral sobre o aspecto histórico-religioso da histórica Sabará. Entrevistas tipodepoimentos com organizadores e tambémparticipantes das Figuras Vivas e Cenas Abertas,personagens bíblicos e encenações nos diferentesepisódios da Semana Santa.

Os meses de abril e maio foram bastantesintensivos no que diz respeito à pesquisa de terreno.Durante o mês de março e abril participou de todo oprocesso de organização da semana santa; acelebração da festividade e reuniões de avaliação pósevento. No mês maio e junho prosseguiu realizandoentrevistas com líderes religiosos e autoridadeslocais.

De 31 de agosto a 02 de setembro/2011participou do Grupo de Trabalho "Catolicismo etradições religiosas: narrativas e memória". Foi ummomento muito rico, com a presença de PierreSanchis e várias menções ao seu livro; durante ocolóquio aconteceu a homenagem a Pierre Sanchis.Outro detalhe importante foi a oportunidade dediálogo com vários autores brasileiros (citados noestado da arte) como Maria Laura Cavalcanti e MauroPassos. A Dra Léa Perez, de quem foi faladoanteriormente, é diretora do Centro de Estudos daReligião Pierre Sanchis.

Relatório das atividades da pesquisadora nos primeiros12 meses em Sabará, MG.

Page 13: Festas Religiosas

O Processo Ritual da Semana Santa12

A intenção é analisar os episódios da festa

enquanto a processo ritual (Turner, 1974), sendo a

investigação baseada em observação participante,

entrevistas, depoimentos não-formais e questionário

de apoio. Cada procissão foi devidamente observada

pela participação da pesquisadora na prévia

distribuição das posições no cortejo pela comissão

organizadora, na formação da procissão e no

desenvolvimento processional caminhando meio

percurso no mesmo fluxo e meio percurso no sentido

contrário, observando, gravando, fotografando e

reproduzindo escutas de diálogos entre pessoas, e

ainda, contando o número de pessoas presentes.

Houve coleta de depoimentos pessoais pelo menos

trinta minutos antes do início, perguntas

estruturadas às pessoas nas diferentes posições

dentro das procissões, e após o término no retorno

das famílias para suas casas. Diariamente foram

ouvidas 200 pessoas e produzidas longas horas de

gravação e filmagens.

Além de investigar as celebrações da Semana

Santa como um espaço social ou um palco de

representações sociais, simultaneamente é feito em

cada episódio da celebração uma abordagem da

cosmologia católica vista de dentro da festa,

investigando como os rituais participam da afirmação

e reprodução da identidade religiosa; e como o

católico vê o mundo através das janelas dos rituais da

Semana Santa?

Por meio de análise documental desde o ano

2000 até 2012 constatou-se uma repetição

organizada e sequencial de todos os processos e

episódios da Semana Santa em Sabará, e desta forma

reflete a força da tradição que a sustenta. Como

documentação dos roteiros anuais, a líder da

comissão das mulheres apresentou um caderno

simples no tamanho A4, já com folhas bem

manuseadas e até mesmo danificadas, cujo registro é

todo manuscrito e bem amador do do que

precisa ser feito. Dona Maria reclamou da dificuldade

em entender as caligrafias, ao passo que o presidente

da comissão organizadora ressaltou que “a cada ano

tudo tem sido feito religiosamente da mesma forma

para que possamos manter a nossa tradição”. O que

pesa mais que este registro amador é a memória dos

fatos. Neste sentido, os presentes sempre confirmam

de alguma forma, “o ano passado foi feito assim...”;

“quem saiu como Verônica foi a filha da Dona Rosa,

pois a mãe é uma pessoa muito católica e fiel à

igreja”.

Como foi feita uma

desse processo ritual redigida em 22 páginas no

capítulo 4 da tese: A Dimensão Social, Cultural e

Cosmológica das Festas Religiosas, é difícil aqui

resumí-las. Dado a este fator , este

relatório foca tão somente uma breve síntese

cosmológica redigida no fim de cada um dos 10

episódios sobre como o católico vê o mundo por

meio da janela do episódio. (O capítulo completo já

foi enviado para análise em 03/12/11).

cheklist

descrição densa

O processo ritual da Semana Santa estende-

se desde a Sexta-feira das Dores ao Domingo da

Ressurreição. descrição densa

1. Como o católico vê o mundo através da janela da

Sexta-feira das Dores? Através dos umbrais da Sexta-

feira das Dores a cosmologia católica traz a santíssima

virgem para o centro das celebrações, demonstrando

aqui a reprodução da faceta mais característica da

cosmologia católico-romana que é a devoção aos

santos. Existe especial devoção especial a Nossa

Senhora das Dores, nome da própria Virgem e sua

grande dor pelo sofrimento do filho. Sra Eliana, quem

perdeu o filho de uma maneira trágica afirma: “quem

sente as dores é a mãe – quem sofre é a mãe – quem

chora é a mãe; meu filho partiu, mas eu fiquei com a dor

de sua morte [...] é por este motivo que a Nossa Senhora

d a s D o r e s t e m a m i n h a

Page 14: Festas Religiosas

13sincera devoção [...] neste dia revivo as dores davirgem e a minha própria dor, encontro força paravencer a minha dor relembrando a sua grande dor”.Sua irmã acrescenta que “ninguém entende overdadeiro espirito da Semana Santa sem identificarcom as dores da mãe”.

Por meio do Setenário de NossaSenhora das Dores o católico pronuncia totalveneração e exaltação à Virgem Maria, elementocentral da cosmologia católico-romana. Sua devoçãoé materializada pela sacralização de elementos, eneste dia, o forte apelo visual é a Hóstia Santa. Ela é“santa”, é “o corpo de Cristo”, e a devoção católicatorna-a superior ao próprio Cristo, pois é possível vê-lo somente na hóstia do “Santíssimo Sacramento”.Nesse aspecto, ocorre a transubstanciação, ou seja,após a benzição, o simples pão se transforma nocorpo de Cristo.

Ele o vê pela ótica do elementobento, ou “benzido”, como assim o dizem. Segundoesta crença, existe uma magia, um poder especial,milagroso e curador no objeto bento; tais como aágua, as roupas e documentos pessoais, e nestecontexto, os ramos. A benzição é uma práticaconstante no cotidiano de Sabará, sendo que láhabitam centenas de benzedeiras.

Novamente, ele vê o mundopela ótica do elemento bento, ou “benzido”, e pelodeslumbramento e veneração da imagem de Cristoque é conduzida pela cidade. O católico devoto teráem sua casa o Perfume Bento, ora milagroso para usá-lo em caso de necessidades. Algumas senhorasdeclaram que o utilizam para perfumar a casa e destaforma, reproduzir o mesmo ambiente da sepulturaungida de Jesus. “A minha casa fica com o cheiro deCristo.... este cheiro significa que Jesus está alicomigo”.

Ele o vê com certo vislumbre eencantamento ao visualizar a Mãe Dolorosaencontrando com o seu filho, portanto esta é acosmologia: a mãe que encontra com o filho;novamente a figura matriarcal no centro dareligiosidade. Também, a materialização da fé, por

2. Como o católico vê o mundo através da janela doSábado da Paixão?

3. Como o católico vê o mundo através da janela doDomingo de Ramos?

4. Como o católico vê o mundo através da janela daSegunda-feira Santa?

5. Como o católico vê o mundo através da janela daTerça-feira Santa?

Pela ótica da Quarta-feira Santao católico identifica-se com o ritual das bênçãos paraos enfermos, e em especial reproduz o sentimento de“soledade” e “tristeza” da mãe, Maria, que percorreas ruas lamentando pelo filho. Desta forma, adevoção católica identifica-se com as lágrimas e a dorde Maria, e novamente esta cosmovisão coloca Mariano centro das festividades.

Em síntese, à luz dos rituaispraticados neste dia, pela janela cosmológica daQuinta-feira Santa o católico busca revalidar sua fépor meio dos rituais do Santo Crisma e da Instituiçãoda Eucaristia, por meio dos quais ele se identificacomo cristão e fiel aos ensinamentos da Igreja. A“santa Igreja” é fortemente reverenciada pelocatólico devoto e fiel. Além do católico ter o “santocrisma” como elemento sagrado, o padre seencarrega de novamente abençoá-lo “ó Deuspoderoso abençoe e santifique este Crisma”. Hoje, oelemento sagrado da benzição e devoção popularmanifestam-se no “óleo bento” que é ungido e usadopara cerimônias religiosas e para cura de enfermos, enos ramos bentos de manjericão que são levadospara as casas e usados como chás curadores e paraproteção contra tempestades. E, acima de tudo,veste-se da couraça da tradição para justificar suascrenças e práticas, a saber, a tradição de presentearcom amêndoa, e a tradição da abertura do sepulcro.Utiliza de importantes rituais simbólicos parareprodução da memória religiosa por meio do ritualde Lava-pés e da identificação com o Cristo Morto emseu velório. Sua cosmologia vê o mundo a seu redorcomo um ambiente de unidade, amor ecomprometimento com o próximo. Em especial, ocatólico mineiro, neste dia vê a sua religiosidadecomo o “ouro de Minas” e orgulha por ser mineiro detradição católica. Demonstra a famosa “hospitalidademineira”, decidindo não deixar o Senhor mortosozinho no sepulcro: “nós mineiros, sabaraenses, nãofaremos isto – estaremos lá durante todo o velório!”As tradicionais famílias mineiras prezam os velórios,como espaços de identificação com as famílias e coma sociedade.

6. Como o católico vê o mundo através da janela daQuarta-feira Santa?

7. Como o católico vê o mundo através da janela daQuinta-feira Santa?

meio das relíquias de Jesus e de Maria, do “santolenho” e do “santo sudário”. Esta cosmologiatransforma os objetos em objetos sacros, santos.

Page 15: Festas Religiosas

148. Como o católico vê o mundo através da janela daSexta-feira Santa?

9. Como o católico vê o mundo através da janela doSábado Santo?

A tradição católica abre as cortinasda janela cosmológica da Sexta-feira Santa emsentimento de luto pela morte do Filho de Deus, e otem como dia de silêncio, jejum e abstinência decarne. Não é feito nenhum trabalho ou esforçoalgum. Faz uma reprodução dos momentos da mortebaseada no luto e na dor, dedicando-sememorialmente ao velório e luto de Cristo. Vê apenitência e o sacrifício como elemento deaproximação do fiel com a divindade, dentre elas, acaminhada, a peregrinação e a procissão. A práticasacrificial é um elemento de encantamento, “umaespécie de rito de purificação da alma através docastigo do corpo” (Pereira, 205:138). Inclui aautoflagelagem e sacrifícios físicos em busca daremissão dos pecados, o pagar promessas ouagradecer pelas bênçãos alcançadas. Isto pode incluirviagem a pé até o local, subir o Morro da Cruzdescalço, subir o morro carregando uma cruz, oucarregando um tijolo ou uma pedra na cabeça. Pormeio dos rituais de purificação e ritos sacrificiais, odevoto relaciona com Deus. A adoração da cruz étambém algo central na devoção católica. Nesseritual de beijar a cruz, a mesma é substancializadacomo elemento de fé e adoração e recebeprerrogativas sagradas. Esta adoração da cruz étransportada para o cotidiano, quando por inúmerasvezes o católico a beija e faz gestos de reverênciaquando a vê. Em contra-partida, para a cosmologiaprotestante evangélica a cruz é apenas um madeirono qual o Senhor Jesus foi crucificado, vista inclusive,como símbolo de maldição e não de adoração. Acosmologia católica vê o mundo dos homens como omundo dos “filhos de Maria”, vendo-a mais que umavirgem, mais que uma santa, contribuindo para umendeusamento da pessoa de Maria. Outras religiõesorientais, inclusive, ao olhar para o cristianismo a vêcomo uma das três pessoas da trindade de acordocom as práticas de adoração católica. O católicoexternaliza o elemento bento de sua fé nos ramos quese tornaram bentos por ocasião do ritual da bênção,na bênção simbólica das espórtulas (esmolas),moedas de R$ 0,01 que voltaram para as carteirascom poder de prosperidade.

Para o católico que esteve no quartoescuro da Quaresma, por meio da janela cosmológicado Sábado Santo, vê a vela do Círio Pascal como umaluz no fim do túnel da morte. Tal como a cruz, a vela étransubstancializada como elemento sagrado da fé.

Está presente nas missas e nos rituais católicos eespecialmente nos ritos de passagem do ser humano,no nascimento (batismo e crisma) e na morte. Asvelas são acesas nos momentos de rezas, nasprocissões e nos funerais. Ela é uma representaçãosimbólica da luz necessária para iluminar a escuridãoda morte, por isto, é importante para o católicoacender pelas encomendando a alma dos mortos. Deacordo com esta envoltura religiosa, as trevas edomínio do mal cobrem a terra por um período dequarenta dias da Quaresma, e à meia-noite doSábado de Aleluia a luz dissipa as trevas e todo reinodo mal, abrindo caminho para a Ressurreição. Emabordagem comparativa, a cosmologia protestanteevangélica vê o Sábado de Aleluia como dia dedescanso, uma ante-sala do milagre da ressurreição

Neste dia o católico mineirocelebra a Páscoa em família, normalmente numerosacom centenas de netos, bisnetos e tataranetos.Momento em que acontece a tradição de presentearovos de Páscoa. Ainda está presente na Missa daRessurreição o suporte dourado da Eucaristia,levantada bem alto em praça pública. Como jáabordado em cada episódio da celebração da SemanaSanta, em cada dia há uma bênção, uma benziçãoespecífica, neste domingo o Santíssimo Sacramento.

O barulho, o som, e a música não permitidosdurante a Semana Santa invadem a praça por meiodos estrondos dos foguetes. Neste ambiente dealegria e cores, todos os figurinistas de Figuras Vivas,como o pessoal das diversas categorias eclesiásticastrajados em cores de sua ordem descem as ladeirasde Sabará em procissão final, a Procissão daressurreição. Qual é a comunicação simbólica dosfogos de artífices? Sabará conserva a tradição deestourar foguetes, que acontecia desde os tempos doimpério, tendo em vista que o “estourar dos foguetesnos céus e os tiros de canhão das fortalezas, queprocuravam anunciar pelo brilho do fogo e os tiros daartilharia a boa notícia da Ressurreição de NossoSenhor” (Jangada Brasil, 2002). O estouro dosfoguetes transmite a mensagem que a Quaresmaterminou e que as alegrias da Páscoa, a Ressurreição,chegaram. Esta última procissão recebe o aspecto de

das Figuras Vivas, dos escalões de funçõeseclesiásticas, e da tradicional Irmandade doSantíssimo Sacramento, a Ordem Terceira do Carmo,exibindo as túnicas vermelhas sobre as camisasbrancas.

10. Como o católico vê o mundo através da janela doDomingo de Páscoa?

Percepções do Domingo de Páscoa

desfile

.

Page 16: Festas Religiosas

15

Neste capítulo a ênfase empírica recai no

aspecto da influência das festas religiosas na

construção, afirmação e reprodução de identidades

religiosas.

Na linguagem teórica da Antropologia da

Religião, identidades religiosas são importantes

objeto de estudo, como fenômeno relevante e

contemporâneo, tendo o espaço religioso como lugar

de representação de identidades, Simon (2004),

Gibson & Ingran (2005), Ammerman (2007) e

Coleman & Collins (2004),

Esta sustentação teórica pontua a identidade

religiosa como uma forma de identificação, uma

marca distintiva, como alguém ou algum grupo deseja

ser definido ou reconhecido, e carrega, ainda, uma

propriedade de distinção e de fazer fronteiras

(Coleman e Collins, 2004).

As celebrações da Semana Santa em Sabará

estão imbuídas de representações do corpo social

reproduzindo e afirmando tradições religiosas

centenárias. Nesta investigação, a construção de

variantes com relações de influência tem em vista

analisar no ambiente contextual das festas religiosas,

os níveis de relações que mais influenciam e

fortalecem a construção, afirmação e reprodução de

identidades religiosas, e estabelecer a proposição

que ligações fortes geram identidades fortes. As

ligações foram testadas em cinco níveis: 1)

Experiência; 2) Emoção e encantamento; 3) Memória

e tradição; 4) Ritual-simbólico; 5) Expressão.

Capítulo 5. A INFLUÊNCIA DAS FESTAS RELIGIOSAS NACONSTRUÇÃO, AFIRMAÇÃO E REPRODUÇÃO DEIDENTIDADES RELIGIOSAS.

A pesquisa de terreno, na tese redigida na

terceira e quarta etapas, aconteceram desde o início

da investigação quando a pesquisadora fixou

residência em Sabará, MG no período de

novembro/2010 a maio de 2012. A partir de

junho/2012 voltou a fixar residencia em Belo

Horizonte para mergulhar no outro terreno: a Igreja

Batista da Lagoinha.

8. Quarta Etapa: Pesquisa de Terreno

Page 17: Festas Religiosas

16Para melhor argumentação das relações de influência foi criado o diagrama Pentágono Identitário das Festas

Religiosas para delimitar a influência das festas religiosas sob cinco óticas: ritual, experiencial, emocional,

performativo, relacional-estético.

Em síntese em cada um dos eixos são abordados os seguintes temas:

é focado a força da experiência em termos de devoção e encontro com Deus.

a força experiencial do rito religioso tendo o ritual como experiência perceptiva e o memorial como

identificação experiencial, e a abordagem sobre a tríade imaginário memória – tradição.

o encantamento da Semana Santa e emoção como expressão da experiência religiosa.

a natureza performativa das festas religiosas em termos de expressão, ritual e performance.

o universo relacional das festas e sobre a sensação de como o fenômeno religioso se

apresenta por meio delas..

Eixo experiencial:

Eixo ritual:

Eixo emocional:

Eixo performativo:

Eixo relacional-estético:

Page 18: Festas Religiosas

17Além da intensa observação participante, para

captar o sentimento de identidade e reconhecimento de

pertença dos católicos em Sabará e dos cristãos evangélicos

na Igreja Batista da Lagoinha, foram realizadas entrevistas

semi-estruturadas, visitas domiciliares, reuniões de grupo,

coleta de pequenos depoimentos, e participação em

eventos ligados às festas religiosas. A análise dos dados foi

processada em três etapas. A buscou uma

compreensão intuitiva do fenômeno através de observação

participante, tanto do objeto como do campo de

primeira

estudo. A

fase representou um contato relacional por meio

de visitas domiciliares,

segunda

Construção de Variáveis de Análise por Escalas de Motivos

Por meio de duzentas pequenas entrevistas diretivas feitas

pela pesquisadora a pessoas de várias faixas etárias, dentre

a multidão que participava da Semana Santa, indagando

sobre o motivo pelo qual estavam participando e o que mais

gostam na festa, foram escolhidos os dez principais motivos

que levavam as pessoas às ruas. Para evitar a contaminação

de opinião, além de abordar todas as faixas etárias, foi feito

uma abordagem em todas as procissões desde o Domingo

de Ramos até o Domingo da Ressurreição. Percebe-se que os

8.1 Festas Religiosas:Lugar de Representações de Identidades

entrevistas e depoimentos, onde foi possível a

percepção a partir da ótica do “outro” e do “mesmo”. Já

a fase buscou a relação fundamental entre

todas as categorias de identificação. As primeiras

categorias trataram, respectivamente, das identidades

religiosas, culturais e sociais presentes nas falas dos

entrevistados, e as seguintes, nos eixos ritual,

experiencial, emocional, performativo e relacional

estético das festas religiosas. A análise de discurso dos

sermões veio a enriquecer cada uma das interpretações

nos devidos eixos centrais.

terceira

Identificação experiencial, por meio da experiência pessoal.

Identidades essenciais, motivadas por valores e crenças.

Identidades existenciais, motivadas na natureza de “filiação” divina.

Identidades simbólicas, motivadas por representações e práticas religiosas.

Identidades comunitárias, motivadas pela festa e envolvidas pelos laços sociais.

Identidades culturais, motivadas por associação étnico-cultural.

Identidades pessoais, motivadas por interesses individuais na religiosidade.

Identificação relacional, motivadas pelos laços relacionais.

CATEGORIAS DE ANÁLISE DE IDENTIDADES

Identificação por pertença, por meio da declaração de pertença, papéis, herança familiar.1

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9

seis motivos principais giraram em torno da apreciação

da festa em si, tais como a beleza, tradição, desfile,

espetáculo, folclore e conjunto artístico-cultural. Dois

motivos se destacaram pela declaração de não ser uma

pessoa religiosa, contudo gosta de ver a festa, e aqueles

que declararam estarem apenas acompanhando outra

pessoa. Mas, há dois motivos que revelam o sentimento

de pertença, que por sinal são os dois últimos em escala

decrescente, a saber, os “religiosos praticantes” e

aqueles que vão para “fazer ou pagar promessas”.

Grelha 01. Construida pela pesquisadora

10 Identidades pessoais, motivadas em situar-se como ponto de referência no evento social.

Page 19: Festas Religiosas

18

A identidade religiosa é também cristalizada

por meios dos motivos e pelo que as pessoas mais

gostam nas festividades da Semana Santa. Nosso

survey aponta os principais motivos em escala

decrescente de 47% a 20%, e estes resultados

demonstram que a multidão é sim, arrastada pela

força da festa, destacando-se a beleza da encenação

(47%), o aspecto cultural (43%), o aparato visual da

festividade (35%), o aspecto festivo (31%), a arte sacra

(25%), e a importância social da festa (20%). (Grelha

03, p.19).

Ainda segundo o survey, 59% do universo dos

1650 entrevistados se manifestaram a favor que a

participação nas celebrações da Semana Santa

reforça o “sentimento de ser católico”, portanto, sob

esta ótica, as festas religiosas são importantes fatores

para a afirmação da identidade religiosa.

Cabendo ressaltar, que os entrevistados declararam

a seguinte pertença religiosa: 29% católico

praticante, 37% católico não praticante, 19%

evangélicos; 12% pertencentes a outras religiões; e

3% sem religião.

A análise de resultados conduz um retorno à

fundamentação teórica, que afirma,

A identidade do grupo é afirmada por meio das

representações e que “os ritos são meios pelos quais o

grupo social se reafirma periodicamente” (Durkheim,

2003:417; 422).

A ação simbólica em forma de ritual acontece para

fortalecer a identidade social e solidariedade grupal

(Cohen (1985:50,70).

ESCALAS DE MOTIVOS

Pela tradição religiosa e tradição familiar

Pela encenação: o conjunto artístico dos nazarenos, os andores, as cenas vivas,

Pela beleza da festa: um belo desfile, porque é bonito.

Porque atuo no quadro de cenas vivas.

Porque é folclore: cultura popular.

Porque é um evento no calendário nacional.

Não sou religioso: venho somente para ver a festa.

Somente sou acompanhante de outra pessoa

Porque sou religioso praticante e pertenço a uma paróquia.

10 Para fazer ou pagar uma promessa.Grelha 02. Fonte: construída pela pesquisadora a partir de pré-investigação de campo realizada de26/março a 05/abril/2010.

1

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Page 20: Festas Religiosas

19

Enquanto na religiosidade católica a

identificação é afirmada essencialmente em forma de

identificação por pertença, identidades culturais,

identidades comunitárias, identidades simbólicas, e

identidades referenciais reafirmando o sentimento que

“sou católico”, percebe-se que na cosmologia religiosa,

ora interpretada nos bastidores da Igreja Batista da

Lagoinha, as principais marcas identitárias são a

identificação experiencial, as identidades essenciais

motivadas por valores e crenças, e as identidades

existenciais motivadas pela natureza da “filiação divina”.

Após seis meses de intensa observação

participante conduzida em todas as reuniões de culto e

reuniões sociais segmentadas para adolescentes,

jovens, homens, mulheres, empresários e líderes de

células, ressalta-se que lances desta observação

apontam para a forte ênfase da identidade existencial

focada no indivíduo como “filho de Deus”.

Totalmente apoiada em identificação experiencial

por filiação como filhos de Deus, a ética protestante

cria uma membrasia por identificação, e somente por

esta porta, o individuo, ora feito Filho de Deus, entra

para o reino de Deus e consequentemente para a

igreja. Considera-se, portanto, que a identificação por

experiência, por filiação, e relacional cristã são

elementos constantes da identidade e ética

protestante evangélica. Assim é a alma do lugar

chamado Igreja Batista da Lagoinha... o discurso em

forma de sermões inspiradores e intensas dinâmicas

relacionais que se cristalizam nos amplos espaços de

convivência, espelham a identidade dos sujeitos que

nela vivem e se encarregam da reprodução da

identidade cristã.

MOTIVOS E PREFERÊNCIAS %

1 A beleza da encenação, as cenas abertas, os dramas, as figuras vivas, as coreografias ebeleza da festa.(Identidades culturais: as pessoas motivadas pelo aspecto cultural, tendo a cultura comodistintivo do grupo).

47%

2 Pela tradição religiosa e da família.(Identificação por pertença, por meio da declaração de pertença, papéis, herançafamiliar).

47%

O aspecto folclórico, por ser cultura popular e parte da história da cidade.(Identidades culturais: as pessoas motivadas pelo aspecto cultural, tendo a cultura comodistintivo do grupo).

43%

O aspecto religioso da procissão, as velas acesas, as rezas e as músicas líricas cantadas.(Identidades pessoais, motivadas por interesses individuais na religiosidade).

35%

O aspecto festivo do cortejo, da banda de música, e grupos da cidade.(Identidades comunitárias, pessoas motivadas pelo espírito da festa e envolvidas pelanatureza do laço social).

31%

Os objetos sacros utilizados durante as procissões, vestimentas, catracas, incenso, etc.(Identidades simbólicas, motivadas por representações e práticas religiosas).

25%

Porque é uma festa importante, a cidade toda vai estar lá.(Identidades referenciais: as pessoas são motivadas em situar-se no evento social comoponto de referência).

20%

Grelha 03. Motivos e preferências

3

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6

7

Page 21: Festas Religiosas

20Nesta categoria de análise a construção empírica

da influência das festas religiosas na construção,

afirmação e reprodução de identidades religiosas foca no

a força da experiência religiosa,

conduzindo à argumentação sobre em que aspectos a

experiência influencia a construção, afirmação e

reprodução de Identidades? De que forma as

representações do corpo social age afirmando e

reproduzindo tradições religiosas centenárias? E, como é

a relação de influência

Esta tese toma emprestado de Durhkeim (2003: 238, 459)

a noção de , defendendo, portanto, a hipótese de

que a identificação experiencial construída por meio de

uma prática significante fortalece a afirmação e

reprodução da identidade religiosa. Nas respectivas

cosmologias, esta identificação experiencial acontece em

forma de devoção ou encontro com Deus.

Bruner (1986) faz distinção entre realidade (o

que é real); experiência (como a realidade se apresenta ao

indivíduo); expressão (como a experiência individual é

moldada e articulada). Conforme Dilthey (1976:161),

“realidade somente existe para nós sob os fatos de

consciência gerados por experiência interior”. Desta

forma, a experiência pessoal é o trampolim para a

construção da realidade. Indivíduos vivem experiências e

as partilham.

Esta investigação aponta o perfil cosmológico dos

dois gigantes da fé, onde a experiência religiosa é

marcada por meio da devoção e do encontro com Deus,

destacando o peso da experiência para ambas as

cosmologias, a católico-romana e protestante-evangélica.

Constatou-se que o termo “experiência” tem mais peso

para o protestante-evangélico que para o católico-

romano, ao passo que o termo “devoção” é mais

distintivo do católico.

Ao serem indagados se “alguma vez você sentiu

que sua fé foi reavivada durante as procissões da Semana

eixo experiencial

experiência-identidade religiosa?

força

Santa?” Ou “você já teve alguma experiência

religiosa mais profunda durante as procissões da

Semana Santa?”, do universo dos 1650 entrevistados

por nosso survey, 65% afirmaram nunca ter tido uma

experiência religiosa mais profunda ou ter tido a fé

aumentada durante as procissões da Semana Santa,

e 20% apenas algumas vezes. Portanto, apenas 15%

tiveram uma experiência religiosa mais profunda.

Por outro lado, a experiência religiosa em

forma de devoção foi bem perceptível, dado ao fato

que 95% dos entrevistados associaram a participação

nas procissões à devoção a um santo (a) favorito (a).

Em relação à devoção a um santo, a maioria

das pessoas declarou ainda, que a razão de

“acompanhar uma procissão” é: para fazer uma

penitência, fazer uma promessa ou pagar uma

promessa ao santo de sua devoção.

A observação participante traduz a

impressão que a característica daqueles que

caminham alinhados pela procissão era marcada

pela devoção. Nem todos carregam terços ou velas,

mas é visto grande número de pessoas conduzindo

alguma imagem, principalmente a da Virgem.

Quando questionados sobre qual a procissão mais

gostam de participar, afirmaram: “Nossa Senhora das

Dores”, “Nossa Senhora da Piedade”, “Nosso Senhor

dos Passos”. Confirmadamente, a maioria das

pessoas se identifica com a Semana Santa de acordo

com o santo de sua devoção.

A tese desemvolve detalhada análise de

conteúdo de duas entrevistas, que pelas lentes

paradigmáticas da devoção, foca a forma de ver o

mundo por um devoto e por um padre.

8.2.Festas Religiosas:Lugar de Experiência Religiosa

Page 22: Festas Religiosas

21E n q u a nto a o bs e r va çã o p a r t i c i p a nte

interpretava os devotos compenetrados em suas

procissões, destas e de episódios rituais dentro das

igrejas hospedeiras das procissões foram captados casos

de profunda devoção.

Pode-se assim concluir que na cosmologia

católico-romana o peso da experiência pessoal é

materializado e externalizado em forma de devoção

pessoal aos santos. Desta forma, a forte ligação entre

devoção e prática religiosa se encarrega de cristalizar a

experiência religiosa em termos de dedicação íntima e

especial veneração, ainda mesmo que experiências

pessoais mais profundas não sejam perceptíveis. A forte

relação de influência, é que a procissão possui esse poder

de reproduzir uma identidade religiosa centrada na

devoção aos santos.

Neste feriado de Páscoa, a Igreja Batista da

Lagoinha reuniu mais de 20 mil pessoas inscritas para o

13º Congresso de Louvor e Adoração Diante do Trono (05

a 07 de abril de 2012). Enquanto na cosmologia católico-

romana o fator experiencial é vivenciado via devoção, a

experiência na cosmologia protestante-evangélica é

construída, afirmada e reproduzida por meio do Encontro

com Deus. A observação participante enxerga uma

multidão que se agita, dança, aplaude e chora, e desta

forma, demonstra íntima e pessoal experiência com

Deus. Enquanto esta investigação nomeia este item como

“Festas religiosas: lugar de experiência com Deus”, o

pastor Gustavo Bessa veementemente afirma que “a

Igreja é esse lugar”. Lugar de busca de Deus, lugar de

comunhão com Deus e com os outros, lugar onde Deus os

chama para viver os princípios do Reino de Deus, lugar de

reunião de pessoas das mais diversas origens, perfis e

classes sociais, lugar de bênção, lugar de pessoas

transformadas por Jesus (Análise/ dircurso de sermões).

“Tenho muita devoção e cumpro a promessa de vir todos os anos.”

“Venho com grande devoção, toco a imagem e faço uma oração, nacerteza que nossa senhora faz uma graça para nós.”

Conforme pontua Gustavo Bessa, o que

sustenta e fortalece a Igreja é tão somente a

experiência com Jesus, “esta experiência com Jesus é

o fundamento da fé”. Na etapa conclusiva do sermão,

o apelo direto repercutia ao som de solene fundo

musical: “você já teve um encontro com Jesus? Ele já

se tornou a razão de sua vida? É Ele aquele por causa

de quem você vive? Ele já se tornou o fundamento

sobre o qual você edifica a sua vida e toma as suas

decisões? Você quer ter hoje este encontro com

Jesus?”. Este discurso reafirma o postulado de

Durkheim (1915) que a cerimônia produz uma

justificação experimental das práticas religiosas, e

assim sendo, esta cosmologia prioriza o encontro

com Jesus como base da experiência com Deus. Isto

demonstra os depoimentos abaixo,

Contra fatos não há argumentos, Deus é real – eu oexperimentei e o experimento em minha vida.

Deus é real e poderoso, a prova que te dou Ele mudou omeu viver.

Cristo não está morto, ele está vivo. Eu sinto em minhasmãos, sinto em meu corpo, sinto em todo o meu ser.

Quando o senhor Jesus me tocou livrou-me daescravidão... gosto de sentir o seu toque em cadamomento de adoração.

Na cosmologia protestante-evangélica a

relação de influência experiência-identidade

religiosa, a experiência individual via encontro com

Deus constitui-se como a porta de entrada para o

Reino de Deus e como aceitação social para a

membrasia da igreja (experiência inclusiva). O

encontro com Deus vem a produzir uma justificação

experimental com força centrípeta para construir,

afirmar e reproduzir a identidade cristã.

Page 23: Festas Religiosas

22

As festividades da Semana Santa compõe uma

trama ordenada das ações simbólicas do rito que

articulam a circulação de experiências no espaço

religioso. Mas, em que aspectos a ação simbólica do rito

contribui para a construção, afirmação e reprodução de

identidades religiosas? Duas hipóteses se encarregam

desta resposta. Primeira, o rito organiza a comunicação

simbólica e promulga experiência perceptiva no processo

ritual das representações; segunda, o rito organiza a

experiência, decodifica a invisibilidade da fé e evidencia a

sustância católica. Esta abordagem foca o eixo ritual como

espaço de experiência perceptiva e de identificação

experiencial.

A 'catolicidade', segundo Sanchis (Teixeira e

Menezes, 209:181-206) é vigorosamente sustentada pelo

universo ritual, pelo universo mítico e pelo universo

simbólico, e por assim dizer, a experiência humana do

divino passa pelas vias próprias da ação simbólica do rito

religioso. A antropologia do rito de Terrin (1999) tem

especial contribuição para a fenomenologia da

ritualidade em termos de pragmática transcendental

simbólica. Portanto, tendo em vista maior valorização

antropológica do rito, Terrin (1999) propõe a sublinhar o

caráter pragmático do rito em seus aspectos

comunicativos pragmáticos, por ele chamado de

“pragmática transcendental”. A ação simbólica do rito é

todo um composto cerimonial dotado de história,

tradição, dogmas e cultura. Reafirmando, segundo Terrin

(2004), a ação simbólica organiza a experiência de sentido

religioso do homem e com base neste pressuposto, a

observação participante acompanhou o processo ritual

das cerimônias e ritos religiosos para argumentar sobre a

força do universo mítico, da ação simbólica, e do universo

ritual para a afirmação e reprodução de identidades.

8.3.Festas Religiosas:Lugar de Força Experiencial do Rito Religioso

Para desenvolver a argumentação neste

ítem de investigação foram selecionados sete casos

situacinais que exemplificam cada uma das sete

dimensões da ação simbólica do rito.

humanas

e esfera das atividades e ambiente da festa religiosa.

A construção simbólica do cenário procura

reorganizar os espaços simples de forma a

proporcionar uma experiência religiosa do rito.

Mónica é uma turista francesa que por muitas

sucessivas vezes vem passar a Semana Santa no

Brasil, mas o destino é sempre o mesmo: as cidades

históricas de Minas Gerais. Da primeira vez Monica

veio só, mas nas vezes seguintes passou a trazer

consigo um pequeno grupo de amigos. Mónica

explica o por que da preferência.

São cinco as cores da carga simbólica

reproduzida nos rituais da Semana Santa presentes

na decoração e vestuário dos figurinos e imagens

barrocas. Percebe-se que em cada episódio do

processo ritual das procissões há a predominância

das cores, sendo que o roxo é fortemente usado

desde a semana do Setenário e vai-se acrescentando

o preto e o vermelho até a sexta-feira da Paixão. No

sábado a noite começa acontecer uma mudança de

tonalidades e no domingo de manhã os cenários e

figurinos são inundados pelas cores da ressurreição,

o branco e amarelo.

Primeira dimensão: a ação simbólica do rito

- o espaço como cenário das experiências

Segunda dimensão: a ação simbólica das

cores.

Caso: Turistas em Cidades Mineiras do Barroco.

Caso: Homens de Preto

Page 24: Festas Religiosas

23Nesta esfera, dado ao apelo

sensorial das cerimônias simbólicas, as emoções e

experiências ora contornadas pelos cinco órgãos

sensoriais de percepção, a saber, a visão, o tato, o olfato, a

audição e o paladar, produzem forte apelo sensorial para

identificação religiosa, especialmente no que tange a

representação e reprodução. Em Sabará, o imaginário

mais presente nas recordações pessoais é de ordem

sensorial, os cheiros, o barulho, a penumbra, o incenso, a

água benta, as cores litúrgicas e imagem sensorial.

O cheiro de manjericão é uma marca sensorial da Semana

Santa em Sabará. Senhor Paulo, membro da comissão

organizadora, é responsável pela colheita de ramos e do

manjericão que serão utilizados na decoração e para

perfumar a Igreja de São Francisco no ritual da Abertura

do Sepulcro e celebrações da Sexta-feira da Paixão.

nesse sentido a

contribuição simbólica do barroco é essencial, visto que

este se encarregou de reproduzir os corpos das imagens

religiosas como estética barroca do catolicismo e herança

material para a humanidade.

A imagem barroca do Senhor Morto é uma valiosa peça

utilizada no ritual do velório do Senhor Morto. Por volta

das 15h, os fiéis chegam para a abertura do sepulcro do

Senhor morto, cerimônia única no país, que retrata a

morte de Jesus na quinta-feira santa, um dia antes,

portanto, da sexta-feira da Paixão, quando os católicos

relembram a crucificação de Jesus.

Destaca-se que o latim é a língua do

catolicismo. Nos rituais litúrgicos, o uso do latim e os

cantos líricos conduzem a uma identificação com o estilo

católico-romano de processar a religião. Os rituais

Terceira dimensão: as ações simbólicas do rito

são altamente sensoriais.

Quarta dimensão: experiência perceptiva

intimamente ligada ao corpo,

Quinta dimensão: reprodução dos rituais

litúrgicos.

Caso: Envoltura Sensorial dos Rituais da Semana Santa

Caso: O Corpo do Senhor Morto

litúrgicos estão presentes em todos os dez episódios

da Semana Santa.

A cenografia da Paixão na praça da Câmara Municipal

reproduz o encontro de Maria com seu filho

(Procissão do Encontro). Esta é a procissão mais

numerosa de Sabará. No momento quando as duas

procissões se encontram acontece o tradicional e

ritual cântico da Verônica.

Seguindo o marco conceptual da

antropologia dos objetos (Appadurai, 1986; Hall,

1997), averígua-se que os objetos sacros participam

da reprodução das identidades religiosas, um

espetáculo barroco presente em todos os cortejos

procissionais.

Na esfera

da ação simbólica vivenciada na tríade memória –

tradição – ritual em forma de rituais de fé, o rito

organiza a experiência, decodifica a invisibilidade da

fé e evidencia a substância católica. Como assim

percebido por meio de histórias orais em diferentes

episódios rituais, nesse processo de decodificação da

invisibilidade da fé, a crença popular encontrou

subterfúgios imaginários para apoiar a crença em

milagres.

Caso: O Canto de Verônica

Caso: Tradição e Objetos Sacros em Sabará

Caso: Milagres da Fé no Ritual de Adoração da Cruz

Sexta dimensão: a força da ação simbólica

dos objetos sacros.

Sétima dimensão: os rituais da fé.

O ritual é uma reprodução do imaginário popular em

regiões de Sabará e Caeté, onde existe forte ênfase na

crença em milagres que acontecem durante o ritual de

adoração da cruz. A crença prescreve que adoração da

santa cruz possui poderes miraculosos.

Page 25: Festas Religiosas

24

Considerando que as festas religiosas são

também espaço de emoção e encantamento, esta

argumentação em do das festas religiosas

foca dois aspectos. Por um lado a emoção enquanto a

exaltação coletiva e por outro a representação emocional

da experiência. Cada um dos cinco itens retoma o

questionamento central devidamente aplicado a cada

categoria de análise, portanto, aqui questiona-se em que

aspectos a emoção e encantamento influenciam na

construção, afirmação e reprodução de identidades? De

qual forma a emoção e o encantamento servem para

fortalecer a identidade religiosa? Em qual intensidade a

emoção e encantamento associado à experiência

religiosa vivenciada no ambiente da festa religiosa

contribuem para a afirmação e reprodução da identidade

religiosa? Possíveis respostas a estes questionamentos

encontram-se ancoradas nas hipóteses que: 1) a emoção

e encantamento associados à experiência religiosa

figuram como molas mestras junto ao processo simbólico

e imaginário na construção, afirmação e reprodução de

identidades religiosas; 2) experiências validadas

emocionalmente pelos cinco órgãos sensoriais de

percepção que são a visão, tato, olfato, audição e paladar,

produzem forte apelo sensorial para afirmação da

identidade e reprodução da cultura religiosa.

Importante técnica de investigação ora

acrescentada nesta categoria de análise é a abordagem

comparativa pela antropologia do espelho do 'mesmo e

do outro', demonstrando como as duas cosmologias

interpretam a emoção e encantamento e quais são os

possíveis pontos de conflito? Técnica também chamada

de “dupla face das identidades”, “imagens espelhadas”,

ou identificação “pelo outro” ou “para si”. Investigando,

portanto, “o modo como nos vemos através dos outros e

como imaginamos ser por eles vistos”.

eixo emocional

Partindo para a demonstração empírica,

segundo nosso survey, 95% dos entrevistados

declararam que as representações da Semana Santa

possuem alto poder de encantamento e

desencadeiam fortes emoções. Seguindo a esta pista,

bem ao lado das câmeras da Rede Globo de Televisão

e da Rede Alterosa foram captadas cenas

espetaculares de pessoas que externalizaram suas

emoções em forma de encantamento.!Estou surpresa com a beleza e encanto das cores dadecoração nas sacadas dos casarões.

É um espetáculo de encenação, estoutremendamente admirada.

É uma oportunidade muito bonita ver uma SemanaSanta assim, cheia de cores, ramos e figuras vivas.

Fico de queixo caído diante de tanta beleza... estoua fotografar tudo para não esquecer nenhum destesdetalhes.

É uma coisa muito linda... linda... linda e mexe como sentimento da gente

É uma verdadeira arte popular, é um show debeleza, magia e encanto; é de se surpreender comoque uma festa religiosa é capaz de reproduzir algo tãolindo.

A representação da Paixão de Cristo encanta eemociona – ver é reviver.

!

!

!

!

!

!

Lucio e Lucia são turistas que vieram delonge atraídos pela curiosidade e sonho de um dia vera festa mineira de perto, trazendo consigo suascâmeras e uma economia de todo um mês detrabalho para ver a festa. Lucio declara que precisouaté pedir ao patrão um adiantamento do salário domês seguinte para poder vir à festa, e acrescenta: “Naverdade não sou católico praticante, mas a sementeda devoção fica dentro de nós”. Já dona Lúciaexpressa: “Estou encantada pela festa”, “a fotoeterniza a imagem e com certeza irei levar umarecordação para sempre deste momento em Sabará”.

8.4.Festas Religiosas:Lugar de Emoção e Encantamento

Page 26: Festas Religiosas

25A representação emocional da experiência na cosmologiaprotestante-evangélica.

Antropológica do espelho das Festas Religiosas

Pela forma pentecostal de ver o mundo

espiritual, de alguma forma a personalidade humana

exala a sua experiência humana do divino. Conforme

argumenta o Pr Márcio Valadão, o povo que adora está

totalmente imerso na presença de Deus, “os rostos das

pessoas estão lavados pelas lágrimas e o mover de Deus é

muito grande neste lugar”. Nesta perspectiva, as lágrimas

são uma das formas de representar as emoções, e a

expressão mais visível na maioria das pessoas presentes.

“Está acontecendo um banho de lagrimas e

quebrantamento na presença de Deus”, afirma o repórter

da Rede Super de Televisão.

Já a entrevista com a Pra Salete Fileto deixa bem

claro o seu posicionamento sobre a forma pentecostal de

demonstrar as emoções, alegando que necessariamente

o cristão precisa de alguma forma colocar para fora os

seus sentimentos e experiências,

Percepções no espaço da diferença e pertença

comum são interpretadas pela “antropológica do

espelho”, como nos vemos e como somos vistos por eles.

Por meio das percepções coletadas, confirma-se a

hipótese que as experiências validadas emocionalmente

pelos cinco órgãos sensoriais de percepção que são a

visão, tato, olfato, audição e paladar, produzem forte

apelo sensorial para afirmação da identidade e

reprodução da cultura religiosa.

Acho impossível o cristão ter uma experiência profunda com

Deus e não demonstrar isto de alguma forma, seja por meio

de gritar aleluia, chorar ou até mesmo dar gargalhadas [...]

como a pessoa pode ficar estática e seca na presença de

Deus? É preciso fazer até mesmo algum movimento ou

dançar na presença de Deus [...] do meu modo de ver, se a

pessoa sentiu a presença de Deus, ela vai demonstrar isto de

alguma forma.

Constata-se, conforme indicado no diagrama

03 e o box Antropológica do espelho 01, que no

catolicismo popular a natureza da emoção é mais

contemplativa e a experiência é caracterizada pela

exaltação coletiva fortemente evidenciada pelo

encantamento, pelo folclore, pela beleza das

representações e pelo imaginário popular.

Foram construidos três níveis de abordagem

por imagens espelhadas (Como o católico vê a si

mesmo; como o protestante-evangélico vê o

catolicismo; como o católico vê as crenças do

protestante-evangélico nas festividades da Semana

Santa).

E s t a s a b o r d a g e n s p e r m i t e m u m a

comparação sobre como as duas cosmologias

interpretam o significado e o eixo emocional das

festas. Como constata-se, existem pontos de conflito

entre elas. Mas, em ambas as formas de ver o mundo,

a emoção e encantamento associados à experiência

religiosa figuram como molas mestras junto ao

processo simbólico e imaginário. Esta abordagem

qualitativa da representação emocional da

experiência aponta para o fato de que as emoções

vivenciadas no espaço das celebrações religiosas,

além de serem importante do ponto de vista pessoal

da religiosidade é uma forma de identificação

experiencial, que consequentemente, conduz à

afirmação e reprodução de identidades. Cada qual à

sua maneira, são molas mestras no processo. Em qual

intensidade isto ocorre? Percebe-se que na cosmologia

católica a intensidade é acentuada na força da

coletividade e representação social em contexto.

Page 27: Festas Religiosas

26Neste item de investigação a argumentação

explora que aspectos a estreita relação entre

memória imaginário – tradição contribui para a

formação de identidades religiosas fortes. A tese é

que a forte comunicação simbólica do imaginário,

memória e tradição age como fonte de construção,

afirmação e reprodução de identidades religiosas,

são consequentemente de igual força, pressuposto

que ligações fortes geram identidades fortes.

Primeiro, a ação simbólica age na construção da

identidade como motora geratriz de formação da

memória, e desde então passa a agir na afirmação e

reprodução de identidades religiosas fortes.

Assim como forte são o imaginário do

catolicismo popular e a memória coletiva

reproduzida no rico espaço da religiosidade mineira,

seguramente, são de grande importância para

afirmação da cultura local e da cultura religiosa. A

tradição, o legado imaginário, elementos folclóricos e

a própria arquitetura barroca estão associados aos

valores culturais e no potencial turístico da região que

funcionam como locais de representação e afirmação

da identidade, e de devoção religiosa.

O que leva as famílias e a sociedade à

aglomeração e exaltação coletiva das festividades da

Semana Santa?

Indagações à aproximadamente duzentas

pessoas por dia nos diferentes dias e episódios da

Semana Santa de alguma forma apontam que a

massa católico-romana é arrastada pela tradição.

“Tradição e ritual andam juntos, é preciso refazer

todos os passos de Jesus até o calvário para purificar

nossos pecados; nossa fidelidade em manter esta

tradição mantem viva a nossa devoção". “Todos os

anos sigo religiosamente as procissões, isto é tradição

de família”.

P o r o u t r o l a d o , a r e s p o s t a a o

questionamento “o que trazem e mantêm estas

dezenas de milhares de pessoas nos cultos da Igreja

Batista da Lagoinha?”, é clara, “seguramente, sem

quaisquer sombras de dúvida, é a celebração – o

povo é atraído pela maravilhosa celebração ali

proporcionada”. “Venho de longe para celebrar...

chego logo às seis horas da manhã e fico até o início

da tarde”. “Viemos do sul do Brasil para desfrutar

destas maravilhosas celebrações, chegamos às 9

horas da manhã e participamos de todos os cultos até

aquele das 21 horas: não podemos perder nada”.

Destes dois fatores resulta a dialética tradição e

celebração em ambas as cosmovisões.

A tríade imaginário – memória – tradição,

nesta categoria de análise, deve ser investigada à luz

do rito e da memoria para melhor compreensão do

que tradição significa para o catolicismo e celebração

para o protestante evangélico. A argumentação

comparativa de Da Matta (1980:24) sobre os cortejos

do carnaval, das paradas e das procissões enfatiza

que os rituais servem para promover a identidade

social e construir seu caráter e busca explicitar

valores, atitudes e sistemas de ideias que moldam a

identidade, e desta forma, “o rito dá asas ao plano

social e inventa, talvez, sua mais profunda realidade”

(Da Matta, 1980:31).

8.5.Festas Religiosas:Lugar de Memória, Imaginário e Tradição

Page 28: Festas Religiosas

27Mesmo que o enfoque seja tradição,

memória e imaginário faz-se necessário interpretar

esta tríade associada aos fatores revitalização e re-

invenção. Seguindo o pressuposto de Boissvain

(1992) que a revitalização de celebrações públicas

marca o reconhecimento de identidades e

realinhamento de fronteiras; e da propriedade de

distinção e de fazer fronteiras

Segundo os diretores de Cenas Abertas, o

caminho perfeito para a revitalização das festividades

é por meio das encenações que acontecem na Praça

do Rosário, visto que multidões são arrastadas para

assistir a encenação. Crianças ficam de olhos fixos na

apresentação, idosos se comovem, e a multidão

segue o percurso desde o pretório, e do fórum até o

local da crucificação. “Já arrebanhamos mais de

10.000 pessoas ali na praça”. Acrescenta o pessoal da

Secretaria de Cultura e da Secretaria de Turismo de

Sabará que a prefeitura investe bastante dinheiro

para manter viva esta principal festividade e tradição;

pois se encarrega do policiamento, apoio de saúde,

logística de palco, som, luz e holofotes, bem como da

publicidade impressa e midiática. Em alguns

momentos parece mais ser uma festividade

organizada pela prefeitura do que pela igreja.

Segundo a opinião dos informantes a

cobertura das festividades da Semana Santa, em rede

nacional de televisão, é um dos principais fatores de

revitalização, no sentido de manter viva uma

tradição.

Cuidadosa análise do crescimento da Igreja

Batista da Lagoinha procedida em parceria com a

Revista Ultimato, indica que a IBL está em constante

processo de inovação e revitalização, criando novas

p e r s p e c t i v a s e p r o j e t a n d o c a m i n h o s

contemporâneos que atraem multidões. É preciso

sim, revitalização, para manter em pleno vigor os

mais 250 ministérios de serviço a Deus e à sociedade.

Enquanto a festividade maior do catolicismo

romano é reproduzida e sustentada pela tradição, tal

qual na interpretação bíblica, a Igreja Batista da

Lagoinha se propõe a romper a estrutura da tradição

religiosa e proclama uma mensagem de revitalização

e dinâmica de vida cristã, neste ano de 2012 sob o

tema “Odres Novos – Vinho Novo”. A palavra que

marca o compasso da música e efervescência

emocional na Igreja Batista da Lagoinha não é outra,

senão, <celebração>.

A ação simbólica da memória por meio da

celebração foi devidamente validada pela

observação participante e do resultado de análise

situacional em 81 principais celebrações da Igreja

Batista da Lagoinha, sendo três por domingo, às 10

horas, 18 e 21 horas, no período de seis meses (abril a

setembro de 2012). Nesse amplo leque situacional

pontua-se que cada celebração é marcada por

entusiasmo, alegria, inovação, criatividade e

reinvenção de diferentes formas de louvar, adorar e

cultuar. Contando com diferentes grupos de louvor,

multiforme estilo de dança e outras expressões

artísticas, inclusive com renomados preletores

nacionais e internacionais. Assim argumentam, “cada

celebração é uma novidade, uma maneira singular de

adorar a Deus”, “aqui não vemos nenhuma rotina”, “a

cada dia tudo se faz novo e nossa fé é sempre

renovada”.

A dialética tradição x celebração permitiu

uma compreensão do grau de intensidade que cada

cosmologia se encaixa e observa o mundo ao seu

redor, deixando escapar a ideia que cada qual se

fecha em sua esfera paradigmática defendendo o

ponto de vista que a tradição ou celebração

representa tudo para si. Conduzindo assim ao

estereótipo que o católico é somente movido pela

tradição e o protestante-evangélico pela celebração,

consequentemente gerando forças antagónicas.

Page 29: Festas Religiosas

28Nesta categoria de análise a construção

empírica foca no eixo performativo a força da

expressão religiosa, questionando de que forma a

performance associada à carga simbólica influencia

na construção, afirmação e reprodução de

identidades religiosas. Qual é a relação de influência

entre performance-identidade religiosa? Esta tese

defende a hipótese que a identificação em contexto

construída por meio de mecanismos da comunicação

simbólica intensifica o processo de fortalecimento e

afirmação. Nesta categoria de análise, cabe fazer uma

proposição sobre a natureza da performance

religiosa (religious performance): a religião possui

natureza performativa que se apresenta por meio de

seus performers nas cenas da vida real, no palco da

vida e do sagrado, e para tal fim, apropria de

representações capazes de afirmar e reproduzir a

identidade religiosa.

O grupo de teatro Cena Aberta atua por mais

de trinta anos e é composto por quase 100

personagens. Dedica-se exclusivamente à encenação

da Paixão de Cristo, que tem a duração de

aproximadamente 3 horas recebe subsídio do

Governo Federal para a Fundação Casa da Cultura.

A encenação é caracteriza como um

espetáculo, e nesse sentido concorda tanto o povo,

como a atitude profissional dos atores envolvidos e

quando o espetáculo começa a multidão se concentra

atentamente nas cenas. Dona Rebeca declara que “é

um espetáculo imenso, muito rico, rico mesmo”.

Mesmo assim, Dona Terezinha Caldeiras (79 anos) e

Sr José (74) afirmam que a maior mudança referente

à Semana Sana em Sabará são as Cenas Abertas. Eles,

e muitas pessoas idosas não gostam das cenas ao vivo

Ritual e Performance de Cenas Abertas da

Paixão em Sabará.

alegando que por mais que seja uma encenação bíblica, é

puramente um teatro e transmite uma visão muito secular

e teatral da Semana Santa, portanto, preferem a maneira

tradicional católica de celebrar.

Com grande força a encenação pública da Semana

Santa contribui para a reprodução de uma religiosidade

cívica marcada pela tradição, onde o processo ritual da

encenação tem a função de revitalizar um fato histórico,

manter uma tradição e reproduzir a imagem do Cristo

histórico. Religiosidade cívica é aqui conceituada como

uma religião marcada pelo calendário oficial como

festividade pública, tendo a participação do poder público

para a sua realização. A análise de discurso destacou as

expressões que mais aparecem nas entrevistas com atores

do grupo Cena Aberta, a saber, tradição, cultura da cidade,

encenação, reviver, fé, religião.

Seguindo esta análise, questiona-se em que

aspectos a performance de Cena Aberta da Paixão de Cristo

participa no processo de construção, afirmação e

reprodução da identidade religiosa?

A encenação comunica ao povo uma mensagem

simbólica e proporciona uma representação e expressão da

fé alicerçada no tríduo pascal, e desta forma a performance

participa da afirmação e reprodução da identidade religiosa

de uma forma bem interativa com a audiência.

Cena Aberta reproduz uma tradição sabarense e reforça

o ditado popular “a tradição norteia – a festividade nos

une”.

A performance cria um elo entre história – tradição –

realidade. Ela revitaliza os fatos históricos.

!

!

!

8.6.Festas Religiosas:Lugar de Expressão, Ritual e Performance

Page 30: Festas Religiosas

29Representação e Performance: Cantata da

Pascoa na Igreja Batista da Lagoinha.

O memorial da Pascoa é representado

anualmente na Igreja Batista da Lagoinha já por

algumas décadas, unindo arte e fé na Cantata da

Páscoa em uma cerimônia com duas horas de

duração. O cenário é simples, porém, bem

comunicativo, ou seja, uma linda obra de arte pintada

em painel de 6 metros de largura por 16 de altura

posicionado no altar da igreja, agora transformado

em palco da performance. Ali duas cruzes estão

pintadas no cenário gólgota em tonalidades de

laranja, vermelho e marrom. A arquitetura circular

interna de quatro galerias permitiu que esta obra de

arte fosse bem focalizada no centro das atenções.

Cabe aqui fazer uma descrição, não do processo ritual

(Turner, 1982) propriamente dito, mas sim, um

processo cerimonial conforme afirmam os

evangélicos.

Nesse processo cerimonial, todas as músicas

de louvor e adoração entoadas por quarenta minutos

eram vibrantes e proclamantes da ressurreição de

Cristo. “Onde está ó morte a tua vitória? Jesus

ressuscitou. Ressuscitou, ressuscitou, Jesus

ressuscitou. Cristo não é morto Ele está vivo! Porque

Ele vive posso crer no amanhã”. A p ó s i n t e n s o

momento de louvor e adoração a igreja rompeu-se

em aplausos quando o Pastor Marcio Valadão

veemente convocou ao microfone: “Aplauda-O,

aplauda-O, aplauda-O, Rei dos reis e Senhor dos

senhores”. Neste momento a performance interage

com a audiência (Goffman, 1975), quando um elenco

de aproximadamente cem pessoas entra pelos

corredores rumo ao calvário (ali no altar da igreja)

usando túnicas imitando as cores de traje do exército.

Cores estas que destacaram muito bem com o painel

do calvário de 16 metros de altura. O vestuário traz

em si uma tremenda comunicação simbólica, sendo

as cores e estilo da época de Jesus, em tonalidades

de marrom, bege e laranja.

À guisa comparativa, assim como, com grande

força a encenação pública da Semana Santa contribui

para a reprodução de uma religiosidade cívica

marcada pela tradição, onde o processo ritual da

encenação tem a função de revitalizar um fato

histórico, manter uma tradição e reproduzir a

imagem do Cristo histórico; o Memorial da Pascoa na

cosmologia protestante evangélica contribui para a

afirmação e reprodução de identidade cristã

marcada pela ident i f i cação exper ienc ia l

impulsionada pela força da ação simbólica em forma

de memorial. Neste item de análise questiona-se em

que aspectos a performance de Cantata da Páscoa

participa no processo de construção, afirmação e

reprodução da identidade religiosa? Considera-se

que,

Essencialmente a Cantata da Páscoa é a

performance de identidades. Participa da construção

da identidade cristã criando um elo memorial entre

fato histórico/bíblico – representação – realidade –

expressão, e revitaliza os fatos bíblicos como fonte

essencial de formação da identidade cristã.

A Cantata da Páscoa com sua encenação

pantomima comunica ao povo uma ação simbólica

memorial proporcionando uma estreita relação do

performer com a audiência que passa a interagir de

forma participativa e expressiva da vida cristã,

conduzindo-o à afirmação de sua identidade cristã.

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Page 31: Festas Religiosas

30No eixo relacional-estético encontram-se

alocadas as investigações sobre o universo relacional

das festas e sobre a sensação de como o fenômeno

religioso se apresenta por meio delas. Neste sentido,

conhecer a estética religiosa pelas janelas das festas

possibilita manter o foco na riqueza, na amplitude, na

profundidade, na singeleza e na beleza das festas

religiosas. No campo da filosofia estética, Rosenfield

(2006) “ 'Estética' vem do grego Aísthesis, que

significa sensação, sentimento. Diferentemente da

poética, que á parte de gêneros artísticos

constituídos, a estética analisa o complexo das

sensações e dos sentimentos [...] debruçando-se

sobre as produções de sensibilidade, como fim de

determinar suas relações com o conhecimento, a

razão e a ética”. Com base em Verdade e Método,

Hermann (2005) enfatiza que “a verdade obtida pela

consciência estética como um modo lúdico de

apresentação (que) modifica quem a vivencia e

permite ver o mundo sob uma nova luz” (grifos

nossos).

Neste item de análise, a investigação é

procedida em torno da dimensão relacional e estética

da festa, do universo relacional-estético da devoção,

do fenômeno relacional-estético das benzedeiras, e

uma interpretação da coesão, eficiência e eficácia da

festa, e dos modos de incorporação da sociedade,

avaliando em que aspectos estes fatores influenciam

na afirmação e reprodução de identidades religiosas.

Como pressuposto, aqui ocorre a 'identificação em

contexto' relacional como modos de identificação ao

longo da história coletiva e pessoal. Nesse aspecto o

conjunto das identidades pessoais incorporadas pela

sociedade como crenças populares e tradições

centenárias representa a estética de uma identidade

religiosa marcada pela tradição e pela coesão.

Na esfera pessoal, o povo sabaraense

incorpora esta estética religiosa marcada por alto

grau de devoção, referenciados como povo muito

católico e famoso por suas benzedeiras. A eficiência e

eficácia da festa é claramente percebida por meio do

engajamento público na tarefa de projetar uma

estética religiosa marcada pelo turismo religioso e

sustentabilidade, e pelo patrimônio histórico e

cultural da humanidade. E, a mídia se encarrega de

projetar a estética religiosa de Sabará no contexto

relacional das cidades históricas mineiras. Pode

assim dizer que a principal marca estética de Sabará é

a sua 'tradição centenária' em fazer a Semana Santa.

A devoção aos santos proporciona o

surgimento de espontâneas marcadas

pela devoção à mesma entidade, e organiza e alinha

as multidões nos dias das festividades. Além da

devoção à santa padroeira da cidade, os devotos

partilham relacionamentos e identidade centrada no

acento colocado na semelhança de sua devoção

(identificação por semelhança). A identificação

“devoto de .... [entidade específica]” contém

propriedade de distinção e de fazer fronteiras,

realinhando as fronteiras relacionais em torno desta

devoção. Desta forma a esfera relacional destes

devotos possuem endereços certos: devotos de São

Francisco (na Igreja de São Francisco); devotos de

N.S.do Rosário (Igreja do Rosário), devotos de N.S.

das Dores (na Igreja de N.S.das Dores), e assim

sucessivamente. Em que aspectos essa imagem

identitária de devotos influencia na afirmação e

O universo relacional-estético da devoção

communitas

8.7. O Eixo Relacional-estético dasFestas Religiosas

Page 32: Festas Religiosas

31reprodução da identidade religiosa do catolicismo

popular? Nesta perspectiva, quanto mais forte é a

identidade religiosa coletiva, menos importante é a

pessoal; e desta forma, o corpo de devotos, ora

alinhados em communitas apresenta uma estética

uniforme de veneração onde as diferenciações vão

perdendo formas para a memória coletiva de

religiosidade. Percebe-se que a devoção aos santos é

relacional – ou seja, acontece em amplo contexto

relacional onde a fama do santo se propaga.

Cabe ainda ressaltar nesta categoria de

investigação do aspecto relacional-estético das

festividades religiosas, o fenômeno das benzedeiras

de Sabará dado ao fato delas ocuparem um lugar de

destaque no cotidiano da religiosidade mineira; elas

são consideradas relíquias culturais da crença

popular. A esfera relacional-estética das benzedeiras

está na interface da religião e da crença popular,

sempre revitalizada nas relações sociais e religiosas

nas pequenas cidades. Elas invadem o cotidiano e

desafiam o tempo mantendo uma tradição de

centenas de anos; e criam um ponto de contato

mítico e imaginário entranhado nas relações sociais

da comunidade onde seus poderes parecem estar

acima da medicina e da igreja. Suas casas são

totalmente abertas para receber o grande número de

pessoas que as procuram solicitando suas rezas e

benzeções. Muitas delas possuem capela própria no

terreno de sua casa para receberem as pessoas,

rezarem por elas e as benzerem, e também viabilizar

o pagamento de promessas. Os turistas que chegam

para as festividades da Semana Santa aproveitam a

oportunidade para visitar uma benzedeira.

As benzedeiras são conhecidas e respeitadas

como aquelas criaturas mágicas e poderosas que

O fenômeno relacional-estético das

benzedeiras de Sabará

vivem para fazer o bem e curar de todo tipo de mal.

Normalmente é uma pessoa mais velha e bem católica,

que faz uso da fé, da devoção, e principalmente das

ervas para fazerem as benzeções. São tidas como

estarem acima da acessibilidade aos postos de saúde, da

medicina - que é um artigo de luxo, das farmácias, das

rezas comuns da igreja, e acima, até mesmo das bênçãos

dos padres. Todos na cidade sabem seus endereços, e

elas estão sempre ali, prontas para ajudarem as pessoas.

Duas importantíssimas estruturas de

relacionamentos são os congressos específicos que

acontecem com frequência para públicos segmentados

e a organização da membrasia da igreja em células.

“Aqui todo rebanho é nutrido e pastoreado em células”,

e assim comprovam os líderes de células”. O fato é que a

Igreja Batista da Lagoinha já é uma cidade, ou seja, uma

comunidade cristã do porte de uma pequena cidade.

Possui em 2012 uma membrasia de 60 mil membros,

número bem próximo a toda população urbana de

Sabará. A dimensão relacional-estética desta

comunidade é bem planejada com uma praça de

alimentação com 7.000 assentos e dezenas salas de

convivência. Ambição relacional percebida na frase

“Aqui em Lagoinha o povo vem para cultuar e também

para se relacionarem”; “quando você está só, você é

apenas um cristão, mas quando você se reúne em dois

ou três em o nome de Jesus, ali, você é o corpo de Cristo

e Deus derrama as suas bênçãos e unção”, existindo,

portanto, uma bênção especial reservada ao

ajuntamento.

O fenômeno relacional-estético da koinonia

na Igreja Batista da Lagoinha

Page 33: Festas Religiosas

32

As considerações sobre as festas religiosas

ainda estão sendo produzidas, mas de antemão,

considera-se no estágio final desta investigação que,

além de dinâmicas, culturas religiosas são poderosas

e possuem grande influência na construção,

afirmação e reprodução da identidade religiosa. Esse

rico escopo religioso contemporâneo mapeia que a

memória atua mais fortemente como fonte de

construção da identidade, que se afirma nas

expressões em contexto, e o simbólico na reprodução

de identidade.

Mas em que aspectos e em qual

intensidade? As considerações finais seguirão a

matriz ora construída para mensurar em qual

intensidade cada um dos fenômenos influencia na

construção, afirmação e reprodução de identidade.

Um olhar antropológico da influência das festas

religiosas permitiu interpretar os efeitos e influência

das festas e sua relação identitária em nove

categorias de análise propostos nesta investigação.

Festas religiosas – expressões de

memória, identidade e simbolismo religioso.

Neste arranjo interpretativo, a influência das

festas religiosas é interpretada em nove espelhos,,

refletindo assim, acurada imagem deste objeto de

estudo: A FESTA RELIGIOSA.

À guisa de conclusão, propor-se-a uma síntese

cosmológica dos principais perfis de ambas as

cosmologias, a católica-romana e a protestante-

evangélica.

9. Considerações sobre as FestasReligiosas

Page 34: Festas Religiosas

33 ETAPAS FINAIS

ETAPA 04

REDAÇÃOCapítulo 5 da Tese

A Influência das Festas na Construção,Afirmação e Reprodução de

Identidades Religiosas

Pesquisa de Terreno

Período de 12 Meses:01/2012 a 12/2012Interpretação das Festas Religiosas

Páginas 15 a 31

Conclusão: dezembro/2012Enviado para Análise em:12//2012

ETAPA 05Conclusão Prevista: junho/2013

FASE FINALAvaliação Preliminar: 02//2013

Ajustes FinaIs: 03/2013Redação Final: 04/2013

Impressão e Entrega: 05/2013Defesa: 06/2013:

REDAÇÃOCapítulos 1 e 6 da TeseCapítulo 1: IntroduçãoCapítulo 6: Conclusão

Avaliação e Ajustes Finais

ETAPA 06

Período pós-DoutoramentoAmpliar a Pesquisa de Terreno p/

outras cidadades Históricas de MG

T

Interpretação das Festas Religiosas

rabalho ligado ao Instituto Ethic e aoMuseu de Antropologia, Lagoa Santa-MGPeríodo de 18 Meses:08/2013 a 12/2014

Região 1: Caeté, Cata Altas, Lagoa Santa,Sabará, Santa Bárbara.

Região 2: Congonhas, Diamantina,Mariana, Ouro Preto,S. João del Rei, Tiradentes