ferreira 1985 resenha fiscais e meirinhos 16230

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 .tos tecnoeratas - segundo os quais a dfvida teria sido competentemente administrada - remete-nos, lamenta velmente, a uma longa lista de maze las: transferências I (quidas de recur sos financeiros para o exterior, queda na produção e aumento do desempre go e da inflação, vulnerabilidade ex terna da economia brasileira, perda de autonomia na polftica econômica, além de distorções como investimen tos faraônicos e declfnio na taxa de poupança interna. Quanto ao futuro da d f vida, dois cenários são elaborados segundo os critérios de ruptura e de negocia ção''. A menor probabilidade d o pri meiro é justificada, e as alternativas vinculadas ao segundo são examina das. Completando o quadro, são defi nidos com lucidez alguns dos princf pios que, na opinião do autor, pode riam nortear o processo de nego ciação. É também poss(vel assinalar algu mas lacunas no trabalho, cuja elimi nação em edições futuras contrituiria para aperfeiçoá-lo: por exemplo, a ausência de mais informações a res peito do balanço de pagamentos bra sileiro, e de uma melhor explicação sobre a incoerência pol(tica do go verno Reagan , responsável em grande parte pelas . perversas condi ções internacionais em anos recen tes ; ou ainda pequenas falhas, como a de definir serviço da dfvida depois de tê-lo mencionado em passa gens anteriores. Estes detalhes, porém, de forma alguma diminuem as amplas e inegá veis qualidades da obra, as quais tor- ·nam sua leitura recomendável tanto para as pessoas que queiram conhecer o assunto, quanto para as que, o conhecendo, arcam com a responsa 80 Carlos Ernesto Ferreira Professor no Departamento de Planejamento e Análise Económíca da Escola ~ dministração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas Salgado Graça coord. Fiscais e meirinhos - a administração no Brasil colonial Rio e Janeiro Nova Fronteira/Pró-Memória/ Instituto Nacional do Livro 1985.. 45 p. Conhecer a administração pública durante 300 de lonização pelos quais passamos signi fica iden1;.ificar a formação da cultura b r s i l e i r ~ no sentido mais amplo da palavra, e, também, verificar as ori gens do próprio Estado nacional. A equipe de pesquisa do Arquivo Na cional, desde 1981, vem reconsti tuindo o sistema administrativo brasi leiro nos perfodos colonial, monár quico e republicano, visando organi zar o seu acervo documental e propi ciar, aos estudiosos, meios para res gatar o desenvolvimento do processo histórico brasileiro. O livro Fiscais e meirinhos - a administração no Brasil colonial coordenado por Graça Salgado, lan çado pela Nova Fronteira/Pró-Me mória e Instituto Nacional do Livro cóm 452 páginas, é o primeiro r s u l ~ tado desse empreendimento da equi pe de pesquisa do Convênio Ministé rio da Justiça/Arquivo Nacional/Fun- dação Getulio Vargas. O volume, à primeira vista, parece ser destinado apenas a especialistas da historiografia colon i i brasileira. Porém, com uma leitura mais atenta, nota-se ser um trabalho também aces s(vel a um público mais amplo, prin cipalmente pela forma como está or ganizado. De infcio são apresentados textos de Carmen L. de Azevedo, Edgar Pê- cego, Paulo F Vianna, Regina Hippoli to, Zélia M Barreto, que versam so bre as áreas fundamentais da adminis tração pública no pedodo colonial: Governo responsável direto pela im plementação e controle da pol (tica metropolitana para a Colônia, princi p l m e n ~ no seu ramo administrati vo. Fazenda encarregada da fiscaliza ção e da arrecadação tributária sobre as atividades econômicas, bem como da gerência dos negócios financeiros do Estado. Justiça que tratava d o cumprimento da lei e da aplicação da ordem interna e da proteção contra a concorrência externa. Igreja que geria os assuntos eclesiásticos e zelava pelos aspectos morais da sociedade. relação sistemática de cargos e órgãos, assim como a cronologia pol fico-administrativa, foram elaborados na segunda parte do· trabalho, possi bilitando ao leitor uma visão da com plexa hierarquja da administração co lonial, tanto no seu aspecto tempo- ral, quanto na sua distribuição geo gráfica. Tal hierarquia dos órgãos e dos cargos abrange, no volume, todos os níveis administrativos do Brasil co lonial, desde o governo-geral, passan do pela capitania e chegando até o munic(pio. também, uma série de organo gramas, disposta em anexo no livro, que demonstra claramente as deter minações formais da estrutura polf tico-administrativa do período colo nial brasileiro. Evidentemente que para elaborar organogramas referen- tes ao perfodo estudado, vários pro- ~ . . . blemas surgem · para o pesquisador, decorrentes da própria lógica da orga nização da época. Os autores revelam alguns entraves manifestados durante a efetivação do trabalho, como, por exemplo, cargos com dupla autorida- de, jurisdições · pouco delimitadas e hierarquias obscuras. Buscamos tra- çar uma representação gráfica ideal dentro dos padrões atuais de hierar quia e vínculos administrativos, em bora tendo sempre presente o hiato entre a nossa racionalidade gráfica moderna e a da época. Em um estudo sobre a administra ção do Brasil colônia, sem dúvida al- guma o ponto básico a ser investiga do é a ordem jur(dico-institucional que manteve o Estado absolutista português durante todo o perfodo de colonização na América. À medida que se compreende o corpo de leis vi- gente em uma determinada realidade, percebe-se seu aspecto condicionante e condicionado da mesma realidade, possibilitando captar tanto a forma de organização do poder, quanto a matriz bâsica da estrutura encarrega da de administrá-la. Assim, a Colônia, observam os au tores, como extensão da ordem jurí dico-institucional metropolitana, sub metia-se ~ mesma lógica dos padrões Revista e Administração d e Empresas

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RESENHA FISCAIS E MEIRINHOS

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  • .tos tecnoeratas - segundo os quais a dfvida teria sido competentemente administrada - remete-nos, lamenta-velmente, a uma longa lista de maze-las: transferncias I (quidas de recur-sos financeiros para o exterior, queda na produo e aumento do desempre-go e da inflao, vulnerabilidade ex-terna da economia brasileira, perda de autonomia na polftica econmica, alm de distores como investimen-tos faranicos e declfnio na taxa de poupana interna.

    Quanto ao futuro da d f vida, dois cenrios so elaborados segundo os critrios de "ruptura" e de "negocia-o''. A menor probabilidade do pri-meiro justificada, e as alternativas vinculadas ao segundo so examina-das.

    Completando o quadro, so defi-nidos com lucidez alguns dos princf-pios que, na opinio do autor, pode-riam nortear o processo de nego-ciao.

    tambm poss(vel assinalar algu-mas lacunas no trabalho, cuja elimi-nao em edies futuras contrituiria para aperfeio-lo: por exemplo, a ausncia de mais informaes a res-peito do balano de pagamentos bra-sileiro, e de uma melhor explicao sobre a "incoerncia pol(tica do go-verno Reagan", "responsvel em grande parte pelas . perversas condi-es internacionais em anos recen-tes"; ou ainda pequenas falhas, como a de s definir "servio da dfvida" depois de t-lo mencionado em passa-gens anteriores.

    Estes detalhes, porm, de forma alguma diminuem as amplas e ineg-veis qualidades da obra, as quais tor-nam sua leitura recomendvel tanto para as pessoas que queiram conhecer o assunto, quanto para as que, j o conhecendo, arcam com a responsa-bilidade de ensin-lo.

    80

    Carlos Ernesto Ferreira

    Professor no Departamento de Planejamento e Anlise Econmca

    da Escola d~ Administrao de Empresas de So Paulo da Fundao Getulio Vargas.

    Salgado, Graa, coord. Fiscais e meirinhos - a administrao no Brasil colonial. Rio de Janeiro, Nova Fronteira/Pr-Memria/ Instituto Nacional do Livro, 1985.. 452 p.

    Conhecer a administrao pblica brasileira durante os 300 anos de co-lonizao pelos quais passamos signi-fica iden1;.ificar a formao da cultura

    brasileira~ no sentido mais amplo da palavra, e, tambm, verificar as ori-gens do prprio Estado nacional. A equipe de pesquisa do Arquivo Na-cional, desde 1981, vem reconsti-tuindo o sistema administrativo brasi-leiro nos perfodos colonial, monr-quico e republicano, visando organi-zar o seu acervo documental e propi-ciar, aos estudiosos, meios para res-gatar o desenvolvimento do processo histrico brasileiro.

    O livro Fiscais e meirinhos - a administrao no Brasil colonial, coordenado por Graa Salgado, lan-ado pela Nova Fronteira/Pr-Me-mria e Instituto Nacional do Livro cm 452 pginas, o primeiro resul~ tado desse empreendimento da equi-pe de pesquisa do Convnio Minist-rio da Justia/Arquivo Nacional/Fun-dao Getulio Vargas.

    O volume, primeira vista, parece ser destinado apenas a especialistas da historiografia colon i ai brasileira. Porm, com uma leitura mais atenta, nota-se ser um trabalho tambm aces-s(vel a um pblico mais amplo, prin-cipalmente pela forma como est or-ganizado.

    De infcio so apresentados textos de Carmen L. de Azevedo, Edgar P-cego, Paulo F. Vianna, Regina Hippoli-to, Zlia M. Barreto, que versam so-bre as reas fundamentais da adminis-trao pblica no pedodo colonial: Governo, responsvel direto pela im-plementao e controle da pol (tica metropolitana para a Colnia, princi-palmen~ no seu ramo administrati-vo. Fazenda, encarregada da fiscaliza-o e da arrecadao tributria sobre as atividades econmicas, bem como da gerncia dos negcios financeiros do Estado. Justia, que tratava do

    cumprimento da lei e da aplicao da ordem interna e da proteo contra a concorrncia externa. Igreja, que geria os assuntos eclesisticos e zelava pelos aspectos morais da sociedade.

    A relao sistemtica de cargos e rgos, assim como a cronologia pol (-fico-administrativa, foram elaborados na segunda parte do trabalho, possi-bilitando ao leitor uma viso da com-plexa hierarquja da administrao co-lonial, tanto no seu aspecto tempo-ral, quanto na sua distribuio geo-grfica. Tal hierarquia dos rgos e dos cargos abrange, no volume, todos os nveis administrativos do Brasil co-lonial, desde o governo-geral, passan-do pela capitania e chegando at o munic(pio.

    H, tambm, uma srie de organo-gramas, disposta em anexo no livro, que demonstra claramente as deter-minaes formais da estrutura polf-tico-administrativa do perodo colo-nial brasileiro. Evidentemente que para elaborar organogramas referen-tes ao perfodo estudado, vrios pro- ~ ... blemas surgem para o pesquisador, decorrentes da prpria lgica da orga-nizao da poca. Os autores revelam alguns entraves manifestados durante a efetivao do trabalho, como, por exemplo, cargos com dupla autorida-de, jurisdies pouco delimitadas e hierarquias obscuras. "Buscamos tra-ar uma representao grfica ideal dentro dos padres atuais de hierar-quia e vnculos administrativos, em-bora tendo sempre presente o hiato entre a nossa racionalidade grfica moderna e a da poca."

    Em um estudo sobre a administra-o do Brasil colnia, sem dvida al-guma o ponto bsico a ser investiga-do a ordem jur(dico-institucional que manteve o Estado absolutista portugus durante todo o perfodo de colonizao na Amrica. medida que se compreende o corpo de leis vi-gente em uma determinada realidade, percebe-se seu aspecto condicionante e condicionado da mesma realidade, possibilitando captar tanto a forma de organizao do poder, quanto a matriz bsica da estrutura encarrega-da de administr-la.

    Assim, a Colnia, observam os au-tores, como extenso da ordem jur-dico-institucional metropolitana, sub-metia-se ~ mesma lgica dos padres

    Revista de Administrao de Empresas

  • administrat:11os peculiares ao Estado absolutista. Entretanto, o Brasil pos-su(a sua -realidade especffica. E, desta forma, um vasto elenco de leis espe-ciais foi elaborado para regular os in-teresses da metrpole na Colnia. Dentre essas, destacam-se o grande nmero de regimentos, destinados a instruir os funcionrios em suas res-pectivas reas de atuao, bem como determinar as atribuies, as obriga-es e a jurisdio dos diversos cargos e rgos incumbidos de gerir a admi-nistrao colonial; os alvars, limita dos durao de um ano; os vrios ti-pos de cartas-rgias, sesmarias, forais, patentes e provises - com diversas finalidades e determinaes especiais para regular vrios campos de admi-nistrao;.e os decretos e as leis. Den-tre esses vrios diplomas legais, os au-tores derarn nfase aos regimentos, por consider-los os mais importantes atos definidores da conduo jurdi-co-administrativa dos negcios colo-niais, permitindo traar a estrutura da hierarquia funcional e ~s distintas jurisdies.

    Outro fator importante, que a nosso ver deve ser mencionado neste trabalho, diz respeito aos vrios cor-tes cronolgicos feitos no perfodo enfocado . No livro foi seguida a pe-riodizao tradicional de nossa histo-riografia, apresentando cinco fases distintas que compreendem os anos de 1 530 a 1808. Assim, os vrios te mas que a obra an ai isa so investiga-dos dentro de uma periodzao mar cada pelas profundas alteraes pol r-ticas que se verificaram em 300 anos de histria brasileira, vinculadas a acontecimentos metropolitanos e a questes prprias da Colnia. Ou se-ja, as modificaes administrativas que aqui se processavam refletem o quadro pol(tico da relao de poder entre Portugal e Brasil naquela poca. Tais alteraes - e o livro apresenta-as minuciosamente - manifestavam-se por intermdio dos vrios diplo-mas legais, alternando o sistema de cargos e rgos em que estava estru-turado o aparelho administrativo co-lonial.

    Fiscais e meirinhos - A admns-traa-o no Brasil colonial um traba-lho que possibilita ao leitor verificar aspectos gerais e particulares da es-trutura burocrtica colonial at o ano de 1808, apresentando uma pesquisa pormenorizada e profunda sobre o

    Resenha Bibliogrfica

    exerdcio do poder da coroa lusitana, no Brasil, mediante os vrios instru-mentos e canais aqui instituconaliza-dos, desde 1 530.

    Srgio Amad Costa

    Professor no Departamento de Cincias Sociais da Escola de

    Administrao de Empresas de So Paulo da Fundao Getulo

    Vargas, da Faculdade de Engenharia Industrial (FEl) e das Faculdades

    Metropolitanas Unidas (FMUJ, em So Paulo . Autor de livros e vrios

    trabalhos na rea de sociologia e po!ftica.

    Rago, Luzia Margareth & Morei-ra, Eduardo F.P. O quetay/o-rismo. 2. ed. So Paulo, Brasili-ense, 1985. 105 p. (Coleo Primeiros Passos, 112}.

    Os estudiosos de cincias humanas em geral (e, mais especificamente, os de administrao e sociologia do tra-balho) acabam de ser presenteados com este estudo de Luzia Rago e Eduardo Moreira acerca da introdu-o das tcnicas tayloristas de traba-lho, concentradas inicialmente na es-fera da produo industrial. Aos pou-cos, o taylorismo foi ganhando terre-no e se estendendo a todas as ativida-des da vida social. "Mtodo de racio-nalizar a produo, logo, se possibi litar o aumento da produtividade do trabalho 'economizando tempo', su-primindo gestos desnecessrios e comportamentos suprfluos no inte-rior do processo produtivo, o sistema Taylor aperfeioou a diviso social-do trabalho introduzida pelo sistema de fbrica, assegurando definitiva-mente o controle do tempo do traba-lhador pela classe dom in ante" (p.1 O). Alm disso, em mltiplos campos da sociedade, como por exeiT}plo nos es-portes, no lazer e nos trabalhos do-msticos, "(. . . ) procura-se obter o mximo rendimento do tempo no raro obedecendo-se s regras e instru-es ditadas por bulas e guias 'cient(, ficos' de racionalizao do agir, do sentir e do pensar {. . . ) A importn-cia do taylorismo ( ... } advm funda-mentalmente do fato de concretizar de forma exemplar a noo de 'tem-po til' que a sociedade do trabalho introjetou no corao de cada um de ns: h muito tempo guard-amos um relgio moral que nos pressiona con-tra o cio ... " (p.11).

    Aps uma introduo muito bem escrita (iniciando-se com "Orao ao tempo", de Caetano Veloso), Luzia e Eduardo expem, ao longo de sete captulos e das ''Indicaes para I e i-tura'', os princpios fundamentais do taylorismo, a resistncia- operria introduo desse processo de raciona-lizao nos EUA e na Frana, bem como o relativo sucesso obtido na Itlia fascista e na Alemanha nazista.

    I Completa o livro um cap(tulo intitu-lado O heri do trabalho na URSS, 81