fernanda f
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLNDIA INSTITUTO DE ECONOMIA
DISTRIBUIO DE CRDITO PARA AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO DO PRONAF A PARTIR DE UM
INDICADOR DE DESENVOLVIMENTO RURAL.
FERNANDA FARIA SILVA
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FERNANDA FARIA SILVA
DISTRIBUIO DE CRDITO PARA AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO DO PRONAF A PARTIR DE UM INDICADOR DE
DESENVOLVIMENTO RURAL.
Dissertao apresentada ao programa de Ps-Graduao em Economia da Universidade Federal de Uberlndia, como requisito parcial para a obteno do ttulo de Mestre em Economia. rea de Concentrao: Desenvolvimento Scio - Econmico e Polticas Pblicas.
Orientador: Profa. Dra Vanessa Petrelli Corra
Uberlndia 2006
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Dissertao defendida e aprovada em 27 de outubro de 2006, pela banca examinadora:
________________________________________________________________ Profa. Dra. Vanessa Petrelli Corra (IE/ UFU)
Orientadora
_______________________________________________________________ Prof. Dr. Walter Belik (IE/ UNICAMP)
(Membro)
______________________________________________________________ Prof. Dr. Henrique Dantas Neder (IE/ UFU)
(Membro)
______________________________________________________________ Prof. Dr. Marcelo Dias Carcanholo
Coordenador Pr Tempore do Programa de Ps- Graduao em Economia (IE/ UFU)
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Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
S586d
Silva, Fernanda Faria, 1978- Distribuio de crdito para agricultura familiar : um estudo do PRONAF a partir de um indicador de desenvolvimento rural / Fernanda Faria Silva. - 2006.
250 f. : il. Orientadora: Vanessa Petrelli Corra. Dissertao (mestrado) Universidade Federal de Uberlndia, Programa de Ps-Graduao em Economia.
Inclui bibliografia.
1. Crdito agrcola - Brasil - Teses. 2. Agricultura familiar - Brasil - Teses. 3. Desenvolvimento rural - Brasil - Teses. I. Corra, Vanessa Petrelli. II. Universidade Federal de Uberlndia. Programa de Ps-Graduao em Economia. III. T tulo. CDU: 336.77:338.43(81)
Elaborado pelo Sistema de Bibliotecas da UFU / Setor de Catalogao e Classificao
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Dedico esse trabalho aos meus pais, Francisco e Maria: exemplos de integridade, pacincia e apoio.
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Agradecimentos Essa Dissertao de Mestrado no fruto de um trabalho individual, mas sim um produto gerado a partir de um conjunto de esforos de pessoas que, direta ou indiretamente, contriburam para que esse se concretizasse enquanto trabalho acadmico. Nesse sentido, mesmo ciente de que posso incorrer no risco de omitir injustamente algum nome, quero dividir com esses colabores mais diretos, a minha satisfao quanto ao desenvolvimento e concluso desse trabalho. Primeiramente agradeo a Deus, que alm do dom da vida, tem me concedido muitas benesses. Uma delas a minha famlia. Aos meus pais, Francisco e Maria, que nunca mediram esforos para formar a mim e aos meus irmos em boas instituies de ensino. Sempre presentes (mesmo distncia), deram-me mais do que o apoio necessrio para seguir adiante nas horas difceis: transmitiram-me respeito, integridade e amor. E foi pela confiana a mim conferida, que tive liberdade em optar pela carreira acadmica e prosseguir meus estudos de Ps-Graduao. A vocs, muito obrigada! Aos meus irmos: Guilherme, Henrique e Simone, agradeo e retribuo o carinho, o companheirismo e a presena constante, nos momentos de dvidas e decises, nas conquistas e alegrias. Eu os tenho com muito orgulho e admirao. Nesse trajeto de proximidade com a Academia, a convivncia com minha orientadora: Profa. Dra Vanessa Petrelli Corra, foi fundamental. Ao meu lado, desde os trabalhos de iniciao cientfica, aguou as minhas aptides para este meio e para o domnio da pesquisa acadmica. Certamente um exemplo de mestra que desejo seguir. Estes agradecimentos so extensivos a todo corpo docente do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlndia, em especial, a dois professores envolvidos mais diretamente com esta dissertao: Prof. Dr. Henrique Dantas Neder e Prof. Dr. Antonio Csar Ortega. Ao Prof. Henrique, co-orientador deste trabalho, no poupou esforos, tempo e pacincia na ajuda montagem da base - de - dados, bem como na construo e anlise dos indicadores. Mais do que isto, mostrou-se sempre muito prximo de ns, alunos, como um grande amigo. Ao Prof. Ortega, meu agradecimento pelas contribuies dadas quando defendido o Projeto de Qualificao (que muito enriqueceram este trabalho), como tambm no esclarecimento de dvidas e apoio nos projetos. Neste ensejo, demonstro a minha gratido ao Prof. Dr. Walter Belik, membro da banca, pelo tempo dispensado leitura deste trabalho e certamente pelas suas contribuies. Menciono tambm minha gratido a todo o corpo administrativo do Instituto de Economia da UFU, pela ateno e responsabilidade com que conduz os seus trabalhos. Neste trajeto percorrido desde a Graduao ao Mestrado, conhecer, conviver e aprender com os colegas - dentro e fora da Universidade - permitiu-me guardar boas lembranas e solidificar vnculos de amizade que espero reter por toda a vida.
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No mbito da Academia, agradeo a todos os colegas do Curso de Mestrado. Em especial, Luciana Rosa, Francisca Diana, Andr Luiz e Daniel Caixeta, cuja amizade ultrapassou a sala-de-aula e tornou-se presente em nosso cotidiano (seja nas noites infindveis no Laboratrio, ou na disponibilidade para dividir questionamentos e anseios). No poderia deixar de agradecer Sabrina Souza, Dona Magda e toda famlia, que fizeram com que eu tivesse o apoio de um segundo-lar em Uberlndia. cara amiga Renata Faria, sempre prestativa e paciente, esclareceu-me muitas dvidas quanto montagem da base - de - dados. Aos amigos Jos Borges e Luciene, pelo apoio e confiana em mim depositada. Estendo os meus agradecimentos Olga, Camilla e mais uma vez, minha irm Simone (pela ajuda na organizao dos dados do IBGE); Luciana Rosa (pelo apoio tcnico); Mirella e Karine (pela ajuda com os mapas). Fora da Universidade, agradeo a todas as colegas das repblicas pelas quais passei: em especial: Keila, Daniela, Roziane, Mirella, Fernanda Menegoli e Laila. Obrigada, pelos desabafos, alegrias, discusses, enfim, pelo aprendizado proporcionado pela convivncia. Por ltimo (e no menos importante), agradeo aos meus amigos de longa-data, que acompanham-me intensamente e me fazem crer que, para a amizade, no h tempo nem distncia. Em especial, Gabi e Nice pela compreenso e apoio nos momentos de ausncia. Joyce, pelo constante entusiasmo frente ao meu cansao. Daniella Grossi e Fabiana Ziroldo por j constiturem parte da famlia. Famlia Matilinho pela amizade e incentivo demonstrados a mim e aos meus. Vocs foram muito importantes em todas as conquistas que tive. Muito obrigada!
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Vivendo se aprende, mas o que se aprende mais, s fazer outras
maiores perguntas
O senhor sabe?: no acerto no contar, porque estou remexendo o vivido longe alto. (...) Ou quero enfiar a idia, achar o rumorzinho
forte das coisas, caminho do que houve e do que no houve. s vezes no fcil. F que no
(Guimares Rosa In: Grande Serto: Veredas - 35a edio. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1986:174)
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Resumo: O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) constituiu se um avano na ampliao do acesso e da incluso de agricultores familiares no crdito rural formal, que se direcionava majoritariamente a agricultores de maior porte. Nos anos iniciais de implantao do PRONAF, observou-se forte concentrao de recursos nas regies Sudeste e Sul do Brasil e nos agricultores familiares mais integrados ao mercado. Recentemente, ocorreram algumas mudanas que, teoricamente, estariam alterando o perfil do Programa no sentido de direcionar recursos a um nmero maior de agricultores mais carentes. Alm disso, essas mudanas viriam estimular o desenvolvimento local e incorporar o debate do Paradigma de Desenvolvimento Territorial. Dessa forma, o intuito desta dissertao verificar a lgica recente da distribuio dos recursos do PRONAF, feita pelas duas principais modalidades: Crdito e Infra-estrutura, a fim de verificar o perfil dos agricultores familiares e das localidades que tm recebido recursos nas regies Nordeste e Sul. Para tanto, foi feito um estudo do enquadramento de agricultores familiares e municpios que mais captam recursos dessas modalidades e, em seguida com base no trabalho de Kageyama (2004) , calculado um ndice de Desenvolvimento Rural para se analisarem as dimenses econmicas, de bem-estar social, populacionais e ambientais desses municpios. Por meio das anlises estatsticas dos dados, buscamos averiguar se, mesmo com a alterao recente da legislao, o PRONAF continua atrelado lgica concentradora de recursos, definida pelas exigncias do sistema bancrio; ou seja, se tem prevalecido a lgica concentradora de distribuio de recursos semelhante s das demais linhas de financiamento do Sistema Nacional de Crdito Rural. Palavras - Chave: PRONAF; Crdito Rural; Agricultura Familiar; Desenvolvimento Rural. Abstract: The National Program for the Development of Familiar Agriculture (PRONAF) has brought an advance in terms of increasing the access and inclusion of familiar farmers regarding the formal agricultural credit, which was directed mainly for bigger farmers. During PRONAF early years, one observed that resources were concentrated both in the Brazilian regions of Southeastern and South and in familiar farmers already integrated to the agricultural market. Recently, some changes would modify theoretically the program profile, with resources being directed to a bigger number of lacking farmers. Besides, these changes encouraged the local development and incorporated the debate on the Territorial Development Paradigm. In this regard, this dissertation aims to verify the logic of the recent resource distribution of PRONAF main modalities, Credit and Infrastructure, by evaluating the profile of familiar farmers and agricultural localities that received them in the Northeast and South of Brazil. For that, we studied the inclusion criteria of familiar farmers and cities that collect these modality resources most. Next, based on the paper of Kageyama (2004), an Index of Rural Development was calculated to evaluate the economic development, social welfare and environment, population issues in these municipalities. Through statistical data analysis, we tried to verify if, even with the recent changes the legislation, PRONAF still follows the concentrative logic of resources defined according to the banking system requirements; that is, if the concentrative logic of other funding lines of the National System Agricultural Credit has prevailed. Key words: PRONAF; Family Farm; Rural Credit; Rural Development.
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Sumrio CAPTULO I ............................................................................................................................23 A NOVA CONFIGURAO DO FINANCIAMENTO AGRCOLA BRASILEIRO NA DCADA DE 1990...................................................................................................................23
1.1) Breve histrico da evoluo do Sistema Nacional de Crdito Rural.....................25 1.2) O novo desenho do financiamento agrcola...........................................................30
1.2.1) As Fontes de recursos do Sistema Nacional de Crdito Rural: Fontes Tradicionais e Novas Fontes...................................................................................30 1.2.2) A nova institucionalidade fora do SNCR: os novos instrumentos financeiros e as fontes semi-formais e informais de recursos...................................................37
1.3) A performance das fontes de recursos do Sistema Nacional de Crdito Rural......... .......................................................................................................................................48
1.3.1) O desempenho do Sistema Nacional de Crdito Rural: a nova composio dos recursos e a queda dos patamares emprestados ...........................49
1.4) A Anlise do perfil das liberaes de recursos do Sistema Nacional de Crdito Rural a manuteno da lgica de concentrao.........................................................59
1.4.1) A concentrao por tipo de produtos, tipo de produtor e regies geogrficas: .................................................................................................................................59
CAPTULO II:..........................................................................................................................66 CRIAO, INSTITUCIONALIZAO, CONFORMAO E AVANOS DO PROGRAMA NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR (PRONAF)................................................................................................................................66
2.1) O Projeto FAO-INCRA e o dimensionamento da agricultura familiar no Brasil. .......................................................................................................................................68
2.2) O surgimento e a conformao do PRONAF........................................................76 2.3) A estruturao do PRONAF: fontes de recursos, modalidades de ao e mudanas recentes na legislao do Programa.............................................................79
2.3.1) A estrutura do PRONAF: a participao das fontes de recursos..................79 2.3.2) A estruturao do PRONAF nas modalidades de recursos..........................86
2.3.3) O PRONAF Infra Estrutura/ Servios Municipais....................................88 2.3.4) O PRONAF Crdito.....................................................................................93
2.4) As liberaes de recursos do PRONAF nos primeiros anos de sua implantao a questo da concentrao e a estagnao dos recursos...................................................98
2.4.1) As liberaes agregadas de recursos do PRONAF Crdito, em sua fase inicial.......................................................................................................................99 2.4.2) As liberaes iniciais de recursos pelo PRONAF Infra -Estrutura................................................................................................................102
2.5) As liberaes agregadas dos recursos do PRONAF no perodo mais recente.........................................................................................................................104
2.5.1) A evoluo total dos recursos.....................................................................104 2.5.2) A evoluo das liberaes agregadas do PRONAF Infra-Estrutura - a questo das liberaes por regies........................................................................107 2.5.3) As liberaes agregadas de recursos para o PRONAF Crdito................109
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CAPTULO III........................................................................................................................123 A IDENTIFICAO DO PBLICO ALVO ABRANGIDO PELO PRONAF, PARTIR DA ANLISE DO INDICADOR DE DESENVOLVIMENTO RURAL.............................123
3.1) Os indicadores sociais como mecanismos de auxlio s anlises de polticas pblicas........................................................................................................................124
3.1.1) A dificuldade de delimitao do meio rural..............................................128 3.2) A formao da base de dados e a especificao da metodologia para a construo dos indicadores............................................................................................................129
3.2.1) Composio e clculo dos Indicadores.......................................................132 3.2.1.1) O ndice de Desenvolvimento Rural (IDR).............................................132 3.2.1.2) O ndice de Fisher....................................................................................138 3.2.1.3) A tendncia de crescimento do PRONAF Crdito..................................141 3.2.1.4) Os procedimentos estatsticos e tcnicas adotadas................................. 142
3.3) O perfil do IDR nas regies Nordeste e Sul do Brasil as liberaes para o PRONAF Crdito e Infra- Estrutura. ..........................................................................143
3.3.1) A classificao dos IDRs e seus sub-ndices...........................................143 3.3.2) A representao grfica do IDR nas regies Nordeste e Sul do Brasil as liberaes para o PRONAF Crdito......................................................................149 3.3.2.1) Anlise dos histogramas para o conjunto dos municpios atingidos pelo PRONAF Crdito..................................................................................................149 3.3.2.2) O perfil das liberaes de recursos do PRONAF Crdito para os maiores e menores municpios captadores Regio Nordeste.............................................152 3.3.2.3) O perfil das liberaes de recursos do PRONAF Crdito para os maiores e menores municpios captadores Regio Sul..................................................... 155 3.3.3) A representao grfica do IDR nas regies Nordeste e Sul do Brasil as liberaes para o PRONAF Infra- Estrutura.........................................................158 3.3.3.1) O perfil das liberaes de recursos do PRONAF Infra-Estrutura para os maiores e menores municpios captadores............................................................160 3.3.4 ) A liberao das modalidades de Crdito e Infra-Estrutura, sob o enfoque do ndice de Desenvolvimento Humano (IDH).........................................................164
3.4) O detalhamento dos dados por meio das Anlises de Correlao.......................168 3.5) A relao das variveis na caracterizao do perfil dos beneficirios uma abordagem da tcnica de Anlise Fatorial de Correspondncias Mltiplas................174
3.5.1) Discusso dos resultados algumas constataes verificadas com a tcnica de Anlise Fatorial de Correspondncias Mltiplas.............................................177
3.6) Clculo das Taxas de Crescimento e a questo da ampliao dos recursos do PRONAF Crdito.......................................................................................................189
CONCLUSO: ......................................................................................................................200 REFERNCIA BIBLIOGRFICA........................................................................................209 ANEXOS................................................................................................................................217
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Lista de Quadros
Quadro 1.1) Fontes de recursos do Sistema Nacional de Crdito Rural...................................33 Quadro 2.1) Nmero e rea dos Estabelecimentos Rurais por Modalidade de agricultura.................................................................................................................................70 Quadro 2.2) Classificao dos Agricultores Familiares.........................................................74 Quadro 2.3) Fontes de recursos do PRONAF..........................................................................80 Quadro 2.4) Principais programas executados mediante depsitos especiais do FAT - exerccios de 2000 a 2005.......................................................................................................84 Quadro 2.5 ) PRONAF: Discriminao dos beneficirios Custeio.......................................95 Quadro 2.6) Principais Enquadramentos e linhas de ao do PRONAF Crdito...................96 Quadro 3.1) Indicadores selecionados para caracterizao dos municpios ndice de Desenvolvimento Rural (IDR):......................................................................................133 - 134 Quadro 3.2) Grupos de Produtos Integrados e No-Integrados por Regio:....................................................................................................................................140 Quadro 3.3) Estatsticas descritivas IDRS e seus Componentes..................................... 145 Quadro 3.4) Estatsticas descritivas IDRS e Componentes Regies NE e SUL.........................................................................................................................................148 Quadro 3.5) Legenda para os histogramas de freqncia dos municpios que (no) obtiveram recursos das modalidades de Crdito e Infra-Estrutura versus IDR.......................................151 Quadro 3.6) Resumo das variveis........................................................................................169
Quadro 3.7) Resumo das variveis Anlise Fatorial de Correspondncias Mltiplas .................................................................................................................................................175
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Lista de Tabelas
Tabela 1.1) Exigibilidade em crdito rural...............................................................................31 Tabela 1.2) Operaes com CPR do Banco do Brasil (em R$ milhes*)................................43 Tabela 1.3) Participao do principais produtos sobre as CPRs do Banco do Brasil.............44 Tabela 1.4) Operaes com CPR do Banco do Brasil (em R$ milhes)..................................46 Tabela 1.5) Financiamento concedido a produtores e cooperativas.......................................50 Tabela 1.6) Crdito agrcola oferecido pelo SNCR: participao percentual das fontes de recursos.....................................................................................................................................51 Tabela 1.7) Subsdios e subvenes econmicas (Operaes Oficiais de Crdito) ................52 Tabela 2.1) Percentual das fontes de recursos PRONAF ....................................................82 Tabela 2.2) Composio percentual (%) do patrimnio do FAT ............................................83 Tabela 2.3) Liberaes do PRONAF Crdito anos iniciais...................................................99 Tabela 2.4). Direcionamento do PRONAF Crdito para as regies.......................................101 Tabela 2.5) Nmero de estabelecimentos familiares e participaes relativas segundo as grandes regies........................................................................................................................102 Tabela 2.6) PRONAF Infra-Estrutura e Servios Municipais - 1997-1999...........................103 Tabela 2.7) PRONAF liberao por linha de ao. Brasil - 1999 a 2004*..........................106 Tabela 2.8) PRONAF Crdito valores anunciado x aplicado..............................................110 Tabela 2.9) Participao sobre o total do PRONAF Crdito (por regies)..........................111 Tabela 2.10) Participao das instituies financeiras no repasse do PRONAF....................114 Tabela 211) Participao percentual do enquadramentos por regies geogrficas.................116 Tabela 2.12) PRONAF: distribuio do crdito de Custeio por principais produtos ...........118 Tabela 3.1) Limites de valores e classificao do IDR...........................................................144 Tabela 3.2) Estatsticas Descritivas IDE .............................................................................147 Tabela 3.3) Anlises de correlao: PRONAF Crdito e Infra-Estrutura..............................170 Tabela 3.4) anlises de correlao: PRONAF Crdito e Infra-Estrutura regio Nordeste...171 Tabela 3.5) Anlises de correlao: PRONAF Crdito e Infra-Estrutura regio Sul...........172 Tabela 3.6) Classificao e intervalos das categorias: Familiar e grupo CDE ............. 176 Tabela 3.7) Freqncias cruzadas de municpios que receberam (ou no) PRONAF Infra-Estrutura e/ ou Crdito regies Nordeste e Sul...................................................................179 Tabela 3.8) Freqncias cruzadas de municpios que receberam (ou no) PRONAF Infra-Estrutura e/ ou Crdito e posio de IDR regies Nordeste................................................180 Tabela 3.9) Freqncias cruzadas de municpios que receberam (ou no) PRONAF Infra-Estrutura e/ ou Crdito e posio de IDR regies Sul.........................................................181 Tabela 3.10) Freqncias cruzadas de municpios que receberam (ou no) PRONAF Infra-Estrutura e/ ou Crdito e posio de IDR regies Nordeste e Sul ......................................182 Tabela 3.11) Evoluo do valores e nmero de contratos negociado pelo PRONAF Crdito regio Nordeste....................................................................................................................191 Tabela 3.12) Taxa de crescimento valores liberado - regio Nordeste...............................192 Tabela 3.13) Taxa de crescimento contratos - regio Nordeste..........................................193 Tabela 3.14) Evoluo do valores e nmero de contratos negociado pelo PRONAF Crdito regio Sul...........................................................................................................................194 Tabela 3.15) Taxa de crescimento valores liberado - regio Sul ....................................195 Tabela 3.16) Taxa de crescimento contratos - regio Sul ................................................196
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Lista de Grficos e Histogramas
Grfico 1.1) Distribuio da CPR por regio geogrfica ........................................................45 Grfico 1.2) Valores liberados para o crdito rural - 1969 a 2004..........................................49 Grfico 1.3) Desempenho das Fontes Tradicionais de Recursos.............................................54 Grfico 1.4) Desempenho das Novas Fontes no crdito rural.................................................56 Grfico 1.5) ) Desempenho do crdito versus produo agrcola...........................................58 Grfico 1.6) Desempenho do crdito rural para culturas com baixo grau de integrao ao mercado.....................................................................................................................................61 Grfico 1.7) Desempenho do crdito rural para culturas com alto grau de integrao ao mercado ....................................................................................................................................61 Grfico 1.8) Distribuio dos recursos do crdito rural por regies geogrficas......................63 Grfico 2.1) Dimensionamento das modalidades de recursos / PRONAF............................105 Grfico 2.2) Dimensionamento das modalidades de recursos (PRONAF Infra Estrutura).................................................................................................................................108 Grfico 2.3) Evoluo dos recursos liberados por regies geogrficas PRONAF Crdito .................................................................................................................................................112 Grfico 2.4) Dimensionamento da participao das instituies financeiras no PRONAF Crdito.....................................................................................................................................113 Grfico 2.5) Dimensionamento da participao dos enquadramentos no PRONAF Crdito .................................................................................................................................................115 Grfico 3.1) Histograma da participao do IDR frente aos municpios do Nordeste que no receberam (0) e receberam (1) recursos do do PRONAF Crdito..........................................151 Grfico 3.2) Histograma da participao do IDR frente aos municpios da regio Sul que no receberam (0) e receberam (1) recursos do PRONAF Crdito...............................................152 Grfico 3.3) Histograma dos 25% dos municpios que mais captam recursos do PRONAF Crdito regio Nordeste.......................................................................................................153 Grfico 3.4) Histograma dos 25% dos municpios que menos captam recursos do PRONAF Crdito regio Nordeste ......................................................................................................154 Grfico 3.5) Histograma dos 25% dos municpios que mais captam recursos do PRONAF Crdito regio Sul .............................................................................................................156 Grfico 3.6) Histograma dos 25% dos municpios que menos captam recursos do PRONAF Crdito regio Sul................................................................................................................157 Grfico 3.7) Histograma da participao do IDR frente aos municpios do Nordeste que no receberam (0) e receberam (1) recursos do PRONAF Infra Estrutura................................158 Grfico 3.8) Histograma da participao do IDR frente aos municpios da regio Sul que no receberam (0) e receberam (1) recursos do PRONAF Infra Estrutura.................................159 Grfico 3.9) Histograma dos 25% dos municpios que mais captam recursos do PRONAF Infra Estrutura regio Nordeste ........................................................................................160 Grfico 3.10) Histograma dos 25% dos municpios que mais captam recursos do PRONAF Infra Estrutura regio Sul.................................................................................................161 Grfico 3.11) Histograma dos 25% dos municpios que menos captam recursos do PRONAF Infra Estrutura regio Nordeste ......................................................................................162 Grfico 3.12) Histograma dos 25% dos municpios que menos captam recursos do PRONAF Infra Estrutura regio Sul.................................................................................................163
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Grfico 3.13) Histograma da participao do IDH frente aos municpios do Nordeste que no receberam (0) e receberam (1) recursos do PRONAF Infra - Estrutura.................................164 Grfico 3.14) Histograma da participao do IDH frente aos municpios do Nordeste que no receberam (0) e receberam (1) recursos do PRONAF Infra - Estrutura.................................166 Grfico 3.15) Histograma da participao do IDH frente aos municpios do Nordeste que no receberam (0) e receberam (1) recursos PRONAF Crdito....................................................166 Grfico 3.16) Histograma da participao do IDH frente aos municpios do Nordeste que no receberam (0) e receberam (1) recursos do PRONAF Crdito ..............................................167 Grfico 3.17) Diagrama bi-plot para a representao dos atributos em duas dimenses com variveis de Crdito, Infra-Estrutura e IDR regio Nordeste ..............................................185 Grfico 3.18) Diagrama bi-plot para a representao dos atributos em duas dimenses com variveis de Crdito, Infra - Estrutura e IDR regio Sul......................................................186 Grfico 3.19) Diagrama bi-plot para a representao dos atributos das variveis em duas dimenses com categorias: Infra - Estrutura, IDR, grupo familiar (FAMPO) regio Nordeste...................................................................................................................... 187 Grfico 3.20) Diagrama bi-plot para a representao dos atributos das variveis em duas dimenses com categorias: Infra - Estrutura, IDR, grupo familiar (FAMPO) regio Sul...........................................................................................................................................188 Grfico 3.21) Taxa de Crescimento dos valores liberados para o PRONAF Crdito regio Nordeste .................................................................................................................................190 Grfico 3.22) Taxa de Crescimento dos valores liberados para o PRONAF Crdito para os estados da regio Nordeste .....................................................................................................192 Grfico 3.23) Taxa de Crescimento dos contratos liberados para o PRONAF Crdito estados da regio Nordeste .....................................................................................................193 Grfico 3.24) Taxa de Crescimento dos valores liberados para o PRONAF Crdito regio Sul...........................................................................................................................................194 Grfico 3.25) Taxa de Crescimento dos contratos liberados para o PRONAF Crdito regio Sul...........................................................................................................................................195 Grfico 3.26) Taxa de Crescimento dos contratos liberados para o PRONAF Crdito regio Sul...........................................................................................................................................196
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Anexo
Anexo I: Condies de Crdito do PRONAF Modalidades e Grupo Anexo II: Histogramas Composio do ndice de Desenvolvimento Rural (IDR) Anexo III: Tabelas de Anlise Fatorial de Correspondncias Mltiplas Anexo IV: Mapas Anexo V: Lei da Agricultura Familiar
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Siglas
ACC: Adiantamento de Contrato de Cmbio
AFCM:Anlise Fatorial de Correspondncia Mltipla
AGF: Aquisies do Governo Federal
BACEN: Banco Central do Brasil
BASA: Banco da Amaznia
BM&F: Bolsa de Mercadorias e Futuros
BNDES: Banco Nacional de Desenvolvimento e Social
BNB: Banco do Nordeste
CMDR: Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural
CNA: Confederao Nacional da Agricultura
CNAE: Cdigo Nacional de Atividades Econmicas
CODEFAT: Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador
CONDRAF: Conselho de Desenvolvimento Rural e Sustentvel da Agricultura Familiar
CPR: Cdula de Produto Rural
DER: Depsitos Especiais Remunerados
DIR: Depsitos Interfinanceiros Rurais
EGF: Emprstimos do Governo Federal
ESALQ: Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz
FAE: Fundo Extra-Mercado
FAF: Fundo de Aplicaes Financeiras
FAO: Food and Agricultural Organization (Traduo: Organizao das Naes Unidas para
Agricultura e Alimentao)
FAT: Fundo de Amparo ao Trabalhador
FCO: Fundos Constitucionais do Centro-Oeste
FIF: Fundo de Investimento Financeiro
FND: Fundo Nacional de Desenvolvimento
FNE: Fundos Constitucionais do Nordeste
FNO: :Fundos Constitucionais do Nordeste
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IBES: Indicador de Bem-Estar Social
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IDE: Indicador de Desenvolvimento Econmico
IDH: ndice de Desenvolvimento Humano
IDR: ndice de Desenvolvimento Rural
IGP-DI: ndice Geral de Preos Disponibilidade Interna
IMA: Indicador de Meio Ambiente
INCRA: Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria
IPOP: Indicador de Populao
LEADER: Ligaes entre Aes de Desenvolvimento da Economia Rural
MAARA: Ministrio da Agricultura, Abastecimento e Reforma Agrria
MCR: Manual do Crdito Rural
PNUD: Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento
NTN: Notas do Tesouro Nacional
OGU: Oramento Geral da Unio
OOC: Obrigaes Oficiais de Crdito
PAM: Pesquisa Agrcola Municipal
PEA: Populao Economicamente Ativa
PESA: Programa Especial de Financiamento de Ativos
PGPM: Programa de Garantia de Preo Mnimo
PMDRS: Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentvel
PROCERA: Programa Especial de Crdito para a Reforma Agrria
PROGER: Programa de Gerao de Emprego e Renda
PRONAF: Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PSH: Programa de Subsdio Habitao de Interesse Social
RECOR: Registro Comum de Operaes Rurais
RMB: Renda Monetria Bruta
RT: Renda Total
SAF: Secretaria da Agricultura Familiar
SDT: Secretaria de Desenvolvimento Territorial
SIAFI: Sistema Integrado de Administrao Financeira do Governo Federal
SIDRA: Sistema IBGE de Recuperao Automtica dos Dados
SNCR: Sistema Nacional de Crdito Rural
STN: Secretaria do Tesouro Nacional
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UTC: Unidade de Trabalho Contratado
UTF: Unidade de Trabalho Familiar
VBP: Valor Bruto da Produo
VCO: Valor do Custo de Oportunidade
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Introduo
O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF)
constituiu-se num importante avano em termos da ampliao do acesso e de incluso dos
agricultores familiares no crdito rural formal, que at ento, era direcionado
majoritariamente para os agricultores de maior porte. Nos anos iniciais da implantao do
PRONAF, observou-se uma forte concentrao de recursos nas regies Sudeste e Sul do
Brasil, como tambm nos agricultores familiares mais integrados ao mercado.
Nos ltimos cinco anos, ocorreram algumas mudanas que, teoricamente, estariam
alterando o perfil do Programa, no sentido de direcionar os recursos a um nmero maior de
agricultores mais carentes. Alm disso, essas mudanas estimulariam o desenvolvimento
local, incorporando, inclusive, o debate do Paradigma de Desenvolvimento Territorial.
O objetivo geral deste estudo analisar a lgica recente da distribuio dos recursos
do PRONAF, feita pelas duas principais modalidades: Crdito e Infra-Estrutura, no sentido
de constatar o perfil dos agricultores familiares e das localidades para os quais esto sendo
direcionados esses recursos. O foco de nossas anlises ser nas duas regies geogrficas
brasileiras que congregam o maior nmero de agricultores familiares: o Nordeste e o Sul.
Para possibilitar o levantamento das caractersticas desses municpios, foi construdo
um Indicador de Desenvolvimento Rural, adaptado do trabalho de Kageyama (2004). O
intuito do clculo desse ndice o de permitir uma melhor caracterizao dessas localidades/
regies, em termos de relevantes dimenses relacionadas com o desenvolvimento das
mesmas, quais sejam: econmicas, de bem estar social, populacionais e ambientais.
Esse trabalho apresenta como hipteses principais o fato de que as liberaes de
recursos efetuadas via PRONAF Crdito que concentra a maior parte dos recursos desse
Programa seguiriam a lgica bancria, que historicamente tm prevalecido no Brasil: no
sentido de incorporar majoritariamente aqueles grupos de agricultores enquadrados como de
maior renda mdia e de maior integrao econmica ao mercado. Por outro lado, o PRONAF
Infra-Estrutura, teria uma lgica de atuao diferenciada, no sentido que estaria mais
diretamente articulado conformao de um capital social, privilegiando principalmente
aquelas regies rurais com maior nmero de agricultores familiares e com baixos nveis de
desenvolvimento.
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Seguindo as nossas hipteses, supe-se que ambas as modalidades, por atenderem
um pblico alvo diferenciado, no apresentam integrao entre si. Ademais, espera-se um
maior impacto entre os municpios que tm recebido esses repasses e o aumento da
participao relativa dos produtos mais e menos integrados. Essa verificao ser feita
mediante anlise de correlao entre os valores repassados para ambas as modalidades e o
ndice de Fisher.
Em termos da estruturao desse trabalho, alm dessa breve introduo, a dissertao
foi organizada em trs captulos. No primeiro deles, foi apresentado o funcionamento e a
composio do Sistema Nacional de Crdito Rural, que, a partir de 1990, adquiriu uma nova
configurao. Segundo Corra (1998), esse novo desenho apresentou como caractersticas
centrais: (i) a queda abrupta dos volumes de recursos ofertados pelas Fontes Tradicionais, em
especial, dos Recursos do Tesouro Nacional; (ii) a no recomposio dessa queda por parte
das Novas Fontes de Recursos, que no conseguiram deslanchar; (iii) a forte concentrao de
recursos em alguns produtos e nas regies economicamente mais favorecidas do pas (Sudeste
e Sul). A idia vincular esse cenrio fortemente desfavorvel para o financiamento agrcola,
com o surgimento do PRONAF, que um Programa voltado para a agricultura familiar.
J no segundo captulo ser detalhado o surgimento, a conformao e os primeiros
indcios de distoro na liberao agregada de recursos do PRONAF. Conforme destacado
em nossas hipteses, presume-se que, principalmente a modalidade de Crdito apresente uma
lgica de liberao muito parecida com as demais linhas do Sistema Nacional de Crdito
Rural (SNCR). Ou seja, que os recursos tm sido majoritariamente liberados para os grupos
de agricultores familiares situados nas regies mais dinmicas do ponto de vista econmico,
enquadrados como de maior renda mdia e cuja produo tem voltado para culturas de maior
nvel de integrao ao mercado. Por outro lado, o PRONAF Infra-Estrutura, tenderia a seguir
uma lgica mais descentralizada, no sentido de atingir as regies geogrficas com a maior
concentrao de agricultores familiares, caracteristicamente mais carentes.
Em seguida, no terceiro captulo, traaremos mais pormenorizadamente o perfil das
liberaes de recursos. Ser feita uma anlise mais desagregada dos dados, a partir dos
municpios e dos enquadramentos de agricultores familiares dessas regies. O propsito
desse captulo associar a liberao dos recursos provenientes das modalidades de Crdito e
Infra-Estrutura, com os perfis de agricultores que majoritariamente seriam favorecidos, alm
de caracterizar as localidades mais fortemente beneficiadas. Isso ser feito por meio um
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indicador de Desenvolvimento Rural, que congrega as quatro importantes dimenses j
citadas para se identificar a dinmica dessas localidades (econmica, de bem-estar social,
populacional e de meio ambiente).
Com isso, alm de caracterizar de forma mais completa, o perfil das localidades que
seriam contempladas pelas modalidades em questo, poder ser identificado um pblico que
potencialmente poderiam ser enquadrados ao Programa e que ainda no esto sendo
abarcados por nenhuma dessas linhas. Por fim, guisa de concluso, sero apresentadas as
consideraes finais desse estudo, na ltima seo.
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Captulo I:
A nova configurao do financiamento agrcola brasileiro na dcada de 1990.
O objetivo geral deste captulo o de mostrar as mudanas ocorridas no mbito do
financiamento agrcola no Brasil, particularmente na dcada de 1990, no intuito de
verificarmos de que forma essas mudanas afetaram a oferta de crdito e a insero dos
agricultores (principalmente aqueles menos integrados e alijados dos Programas Oficiais; bem
como o agricultor do tipo familiar).
A idia fazermos o levantamento das principais modificaes constatadas na
legislao recente, identificarmos as mudanas mais elementares e o desempenho das
principais fontes de recursos que subsidiam as atividades agrcolas no Brasil: as Fontes
Tradicionais e as Novas Fontes. Essas constataes se fazem importantes para
compreendermos o contexto no qual o PRONAF o principal objeto desse estudo foi criado
e se conformou enquanto linha de financiamento especfica para a agricultura familiar.
A escolha do perodo em questo, tem a ver com o fato de que a economia brasileira
passou por profundas transformaes decorrentes da intensificao do processo de
liberalizao comercial e financeira, da desregulamentao dos mercados e da presso dos
organismos internacionais, para que os pases em desenvolvimento fizessem o ajuste
estrutural, conforme preconizado no Consenso de Washington1.
Dessa forma, mudou-se o enfoque acerca do papel do Estado no que se refere s
polticas pblicas e aos seus Programas. Conseqentemente, isso gera impactos nos diversos
setores da economia, especialmente no setor agrcola. No plano poltico, o Estado Brasileiro,
aps anos de atuao mais centralizada, voltou-se para o ajustamento ao padro liberalizante,
o qual previa que o mercado deveria assumir o papel de agente regulador das polticas sociais,
agora mais focalizadas e articuladas com o setor privado.
No bojo dessas transformaes, a questo do financiamento agrcola tambm passou
por acentuadas mudanas. Parte delas, foram decorrentes da paulatina retirada do Estado na
definio e implementao de polticas para o setor em questo. Nesse sentido, pde ser 1 O Consenso de Washington uma expresso cunhada por John Willianson para designar o conjunto de pontos referentes poltica econmica, que deveriam ser adotados pelos pases da Amrica Latina e Caribe, de acordo com a viso das Agncias Multilaterais. Entre esses pontos esto: a disciplina e reformas fiscais, competitividade real via mercado, abertura de mercado, ampliao das exportaes e restrio do papel do Estado agente regulador. Para maiores detalhes, ver: Willinson, J. The Washington Consensus revisited In: EMMERIJ, L (ed). Economic and social development into XXI century, 1997.
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constatado o decrscimo do volume de recursos e mudanas na composio das suas fontes;
como tambm o aumento da participao de mecanismos privados no mercado (novos ttulos,
mudanas no sistema financeiro, intensificao do uso de mecanismos de hedge, entre outros),
para os quais o acesso mais seletivo. Ou seja, o uso desses novos mecanismos est restrito
aos produtores menos integrados ao mercado.
Percebe-se que a lgica adotada para o financiamento agrcola articulou-se poltica
de liberalizao comercial e financeira e idia de que o "mercado" deveria ser o principal
supridor de recursos para o setor. A perspectiva levantada pelo Governo, na poca, foi a de
que deveria trabalhar com uma economia aberta e que a agricultura teria que se ajustar a essa
nova realidade, sendo introduzidos novos instrumentos, que alteraram as bases da poltica
agrcola, no sentido de torn-la mais moderna e menos dependente de mecanismos de
crdito tradicionais.
Diante desse cenrio, abriu-se um novo desenho do financiamento agrcola brasileiro.
Para levantar esse novo perfil, ser descrito, neste captulo, qual essa nova configurao do
Sistema Nacional de Crdito Rural e as fontes alternativas de recursos fora do referido
sistema (fontes semi-formais e informais de recursos). A seguir, ser feita uma anlise das
fontes que compem o Sistema Nacional de Crdito Rural (as chamadas fontes formais). O
objetivo o de mostrar que esses recursos que, teoricamente, possibilitariam um acesso mais
amplo dos agricultores ao crdito, apresentaram, na verdade, as seguintes caractersticas: (i)
apresentaram um forte declnio nas magnitudes liberadas, tendo em vista a queda da
participao do Tesouro Nacional; (ii) houve uma expanso restrita de Novas Fontes,
determinadas efetivamente pelo mercado; (iii) e, por ltimo, esses recursos continuam
fortemente concentrados a determinados produtos, produtores mais integrados e regies
geogrficas economicamente mais favorecidas.
No intuito de verificar o desempenho do crdito rural, no mbito do SNCR, foram
utilizados os dados do Anurio Estatstico do Crdito Rural, publicado pelo Banco Central do
Brasil (vrios anos). Por meio deste Anurio, puderam ser obtidos os dados que captam a
evoluo das fontes de recursos que compem as Fontes Tradicionais e as Novas Fontes. A
partir da, foi possvel classificar as liberaes por fontes de recursos, produtos e regies.
Esses dados foram levantados anualmente, em cada relatrio. A idia foi fazer a
compilao, principalmente entre o perodo de 1994 at 2003 (data do ltimo Anurio
disponibilizado). Para o ano de 2004, foram utilizados os dados do Ministrio da Agricultura,
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obtidos no site2. Os valores correntes foram transformados em valores constantes de 2005, no
intuito de tecer comparaes intertemporais. O deflator utilizado pelo Departamento de
Informaes Financeiras do Banco Central (responsvel pela publicao do Anurio) o IGP-
DI3 mdio centrado, calculado pela Fundao Getlio Vargas. Esse ndice representa a mdia
geomtrica do IGP-DI do ms corrente ao seguinte (ou seja, reflete a mdia do meio do ms).
No que se refere aos dados das fontes informais e semi-formais de recursos, h uma
certa dificuldade de mensur-las corretamente, visto que muitos contratos, devido aos altos
custos cartorrios, no so fechados formalmente. Assim, fica difcil quantificar precisamente
esses valores. De tal forma, recorremos especialmente s consultas feitas no Banco do Brasil e
em jornais (citados na bibliografia). Como trataremos mais especificamente do caso das
Cdulas de Produto Rural (CPRs), os dados foram coletados no Banco do Brasil, e as
estimativas dos valores foram retiradas dos mesmos jornais, j referidos.
Antes de ser detalhado o conjunto de elementos que caracterizam o novo desenho do
financiamento agrcola brasileiro, ser apresentado um breve histrico acerca da constituio
do Sistema Nacional de Crdito Rural e a forma como est estruturada esta institucionalidade.
1.1) Breve histrico da evoluo do Sistema Nacional de Crdito Rural
O SNCR foi criado por meio da Lei no. 4.829 e regulamentada pelo Decreto no.
58.380, de 10 de maio de 1966. Alm do comprometimento pela demanda por crdito, era
funo do SNCR prover condies de pagamento compatveis com as especificidades do setor
rural, mediante taxas de juros favorecidas. O objetivo era viabilizar a rentabilidade rural,
mediante uma lgica da insero da agricultura brasileira aos padres da Revoluo Verde.
Apesar de a criao do SNCR ter se dado em 1966, sua organizao institucional foi
efetivamente montada pela Resoluo 69 do Conselho Monetrio Nacional, de 22 de setembro
de 1967, que tornou obrigatrio o direcionamento de 10% dos depsitos vista no sistema
bancrio, para a concesso de crdito ao setor agrcola.
A partir da implementao das reformas financeira e tributria, em fins da dcada de
1960, o crdito para o setor agrcola aumentou, tendo havido uma forte expanso dos
depsitos vista. Cumpre salientar que esse movimento se explica pela forma operacional de
funcionamento do Sistema Bancrio Nacional. Em situao de inflao e da prtica de 2 Dados retirados no site: http://www.agricultura.gov.br. 3 A sigla IGP-DI significa ndice Geral de Preos - Disponibilidade Interna.
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cobrana de juros reais positivos, o que se verificou foi um movimento de forte expanso de
agncias para captar o mximo possvel de depsitos vista (uma vez que estes no eram
remunerados), enquanto qualquer aplicao destes implicaria remunerao positiva. Alis, o
elevado ganho obtido com a prtica de oferecer crditos com juros reais positivos, mais que
compensava os altos custos operacionais envolvidos (Corra, 1999).
Dessa forma, pode-se afirmar que, nas dcadas de 1960 e 1970, houve um crescimento
do volume de crdito agrcola no Brasil, orientado para a modernizao da agricultura
brasileira, fundamentado nas exigibilidades dos Bancos Comerciais e complementados com
os programas de incentivo ao setor, bancados pelo Tesouro Nacional e liberados por
intermdio do Banco do Brasil (Servilha, 1994).
Apesar de o crdito rural ter tido um papel basilar quanto constituio dos
complexos agroindustriais no Brasil, no sentido de constituir-se num elo soldador do capital
financeiro agricultura, possibilitando a disseminao desse padro tecnolgico,
importante ressaltar que o processo de modernizao conservadora disseminado pela
Revoluo Verde, acentuou ainda mais a excluso de uma grande gama de produtores
agrcolas (notadamente de agricultores familiares), que ou no conseguiam manter-se como
produtores, ou o faziam sob grande dificuldade, restringindo a sua participao frente aos
produtores mais capitalizados.
O crescimento da oferta de recursos sempre esteve sujeito a certas particularidades:
desde o incio, os emprstimos foram altamente seletivos, no somente no que se refere ao
benefcio dos agricultores de maior porte, como tambm para determinados produtos, e nas
regies economicamente mais dinmicas (particularmente o Sudeste e Sul). Ou seja, desde a
sua constituio, a clientela preferida pelo Sistema Financeiro era composta por:
um grupo restrito de operadores, contando com massas de lucro apreciveis a negociar com os bancos, podendo even-tualmente gozar dos benefcios financeiros da reciprocidade, obtendo taxas de juros diferenciadas, prazos, condies outras no acessveis ao pequeno tomador (Delgado, 1985:125).
Particularmente em fins da dcada de 1970, a situao de todos os produtores, de uma
forma geral, foi alterada tendo em vista que a expanso do crdito foi interrompida, em
decorrncia da queda dos depsitos vista sobre o total dos depsitos bancrios, o que
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prejudicou a captao de recursos via exigibilidades. No intuito de suprir essa queda, os
recursos para crdito rural foram compensados pelo aumento dos recursos do Tesouro. A
partir da, o percentual de obrigatoriedade dos bancos comerciais foi modificado vrias vezes
(Servilha, 1994). No entanto, medida que a poltica econmica do pas se alterava, a
elevao dos percentuais das exigibilidades quase que eram neutralizadas.
No incio da dcada de 1980, o crdito rural foi inserido dentro da lgica de um
sistema financeiro geral, tornando-se atrativo para outros setores, como o financeiro e o
bancrio, o que favoreceu a integrao de capitais (Delgado, 1985). A economia brasileira
passara por perodos de instabilidade interna e internacional, em conseqncia do Segundo
Choque do Petrleo e do aumento das taxas internacionais de juros, o que culminou na
acentuao do dficit pblico brasileiro e do processo inflacionrio. Sob presso do FMI, o
Estado iniciou uma poltica econmica restritiva, elevando as taxas de juros internas,
reduzindo subsdios financeiros, iniciando, assim, o processo de desonerao do sistema de
crdito formal, sinalizando para um relativo aumento da participao do crdito privado no
financiamento agrcola. No mbito do agricultor, a retrao do crdito, somada ao aumento
dos custos, levaram a diminuir seus lucros e a aumentar o endividamento (Servilha, 1994).
Ou seja, em decorrncia do crescimento da inflao nessa poca, somado ao aumento
das possibilidades de ganhos especulativos, os intermedirios financeiros passaram a
concentrar seus passivos em vrias outras modalidades de captaes alternativas, em
detrimento dos depsitos vista (tradicional forma de captao bancria). O que se verifica,
portanto, a queda da participao dos depsitos vista sobre o total dos passivos bancrios.
Ressalte-se a captao via fundos, que possibilitava altos ganhos de floating (Corra, 1999).
Quanto aos intermedirios financeiros pblicos, estes assumiram o papel de destaque
na concesso de crditos em perodos de desacelerao, uma vez que continuaram
responsveis pelos financiamentos de longo prazo, como tambm para aqueles setores ditos
mais arriscados (como o agrcola). Paralelamente, as autoridades monetrias aumentaram
compensatoriamente a sua participao na oferta do crdito rural, pela forma de subsdios. Por
outro lado, os intermedirios financeiros privados direcionaram-se para o movimento de
desintermediao financeira. Assim, progressivamente, a participao das exigibilidades
(fonte de recursos no inflacionria) foi decrescendo no total do crdito agrcola.
medida que a participao dos bancos comerciais foi se reduzindo, a estatizao do
crdito rural foi acentuada, principalmente por meio dos emprstimos do Banco do Brasil,
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com recursos do Tesouro Nacional, o que gerou maiores presses sobre a base monetria. O
potencial inflacionrio da poltica agrcola baseada nos subsdios pressionou o governo a
buscar novas fontes para o financiamento dessa atividade, menos inflacionrias e menos
dependentes dos Recursos do Tesouro Nacional.
Diante desse contexto, comearam a surgir modificaes no SNCR, no sentido de criar
as Novas Fontes de recursos, que, juntas s Fontes Tradicionais, constituiriam a
institucionalidade do SNCR. Segundo Gasques & Conceio (2001):
A principal mudana no crdito rural pode ser identificada com relao s fontes de recursos. Vrios trabalhos (...) iden-tificaram um esgotamento dos mecanismos tradicionais de financiamento que se apoiavam pesadamente nos recursos do Tesouro. Esse processo implicou em alteraes profundas na forma de atuao do governo, representando tanto o redirecionamento dos recursos quanto mudana na sua forma de atuao. Um dos resultados mais visveis da mudana no padro de atuao do governo foi o aumento da importncia relativa das fontes alternativas de financiamento. Gasques & Conceio (2001:100)
A partir da, iniciava a paulatina retirada do Governo no financiamento agrcola, que
passou a transferir uma parcela cada vez maior do crdito rural para a incumbncia privada,
principalmente incentivando mecanismos de mercado, alm de reduzir abruptamente a
concesso de subsdios.
Nesse sentido, o objetivo das Novas Fontes de Recursos seria a recomposio da
queda drstica das magnitudes de crdito despedidas via Fontes Tradicionais. No entanto, o
que se percebeu foi que, alm de no recomporem as magnitudes decrescidas das Fontes
Tradicionais, muitas das Novas Fontes foram extintas.
Apesar de muitas das Novas Fontes no terem conseguido deslanchar, algumas delas
tiveram um papel importante. A principal foi a Poupana Rural. No ano de sua constituio,
a Poupana Rural foi a maior fonte supridora de recursos para os crditos concedidos ao setor
agropecurio, superando os recursos advindos das exigibilidades dos bancos comerciais.
Conforme ser visto adiante, essa fonte de recursos deixou de crescer, ao fim do processo
inflacionrio, e, assim como muitas das demais Novas Fontes, no conseguiram deslanchar
e, portanto, compensar a queda de recursos das Fontes Tradicionais.
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Na dcada de 1990, foi acentuada a queda do patamar de crditos liberados, sendo
que esta foi aprofundada em 1995/1996. Desses anos at o final da dcada, no se pde
verificar um crescimento mais significativo na liberao dos valores ofertados pelo Sistema
Nacional de Crdito Rural. Essa constatao est articulada a toda uma concepo que o
Governo de Fernando Henrique Cardoso teve no tratamento da Poltica Agrcola. A lgica
adotada era de que fossem criadas novas formas de financiamentos, sendo que a perspectiva
levantada pelo Ministrio da Agricultura foi a de que se trabalhava com uma economia aberta
e que a agricultura brasileira teria que se ajustar a essa nova realidade, tornando-se mais
eficiente4. Neste sentido, comearam a ser introduzidos novos instrumentos de
financiamento, com o propsito de alterar as bases da poltica agrcola, fazendo com que esse
setor se modernizasse e se tornasse menos dependente de mecanismos de crdito tradicionais.
Dessa forma, os recursos direcionados deveriam ser mais determinados pelo mercado.
Diante dessa perspectiva, que foi estimulado o estabelecimento de mecanismos
semi-formais e informais de recursos, fora das fontes bsicas do SNCR, como tambm o
desenvolvimento de mecanismos que envolviam esquemas de hedge (que no constituem
fontes de financiamento), sendo formas de proteger as operaes ligadas, principalmente, ao
esquema de Bolsas de Mercados e Futuros, minimizando o risco de perdas decorrentes de
variaes de preos e cmbio.
importante destacar que mesmo o surgimento das fontes informais e semi-formais
de recursos, conforme ser visto no item a seguir, no conseguiu recompor a perda de
recursos e a abrangncia em termos de ampliao do acesso dos produtores ao crdito rural.
Ainda, at os dias atuais, apesar de os patamares de recursos anunciados nos dois ltimos
Planos de Safra (2004 / 2005 e 2005/ 2006) terem tido acrscimos, os volumes de recursos
no conseguem chegar queles anteriormente disponibilizados. A partir da discusso baseada
em Corra (1999), referente ao surgimento de novas fontes fora da institucionalidade do
SNCR, da queda dos volumes de recursos facilitados pelas fontes oficiais, e do aumento da 4 Percebe-se que o discurso implcito na questo da desonerao do Estado, quanto ao tratamento de polticas pblicas, tem como pano de fundo o discurso neoliberal das agncias multilaterais, no sentido de que a participao do Estado deveria-se ater a polticas de monitoramento, controle e garantia dos direitos de propriedade, sem interferir diretamente na concesso de crdito. Na interpretao do Governo de Fernando Henrique Cardoso, os subsdios direcionados para a agricultura (via crdito rural) so considerados ineficientes, uma vez que tendem a gerar distores, ou seja, ao invs de promover maior equidade e reduzir as desigualdades, provocariam maior concentrao de renda. A estratgia adotada para corrigir essa distoro consistiu em reduzir os subsdios para a agricultura e direcionar o crdito mediante novas modalidades de financiamento mais determinadas pelo mercado(Corra & Silva, 2004: 2). Ainda a despeito desta questo, essa ordem propunha como foco a idia de que, ainda que se fizesse qualquer forma de interveno, esta deveria priorizar os segmentos tidos como mais competitivos, o que exclua uma gama considervel de agricultores menos integrados e alijados dos programas especiais, dentre eles, muitos daqueles tipicamente familiares.
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procura por mecanismos de proteo contra variaes de preos, que se caracteriza a nova
configurao do financiamento agrcola brasileiro a partir da dcada de 1990, objeto de estudo
do item em seguida.
1.2) O novo desenho do financiamento agrcola
Conforme visto no item anterior, na dcada de 1990, houve mudanas significativas
que desencadearam na alterao do perfil do financiamento agrcola brasileiro. Nesse sentido,
vimos tambm que a nova configurao do financiamento agrcola, na atualidade, deve
abranger uma institucionalidade mais ampla, que no passa somente pelas fontes de recursos
inseridas dentro do Sistema Nacional de Crdito Rural (SNCR), mas tambm pelas fontes
semi-formais e informais (que esto fora dessa institucionalidade do SNCR) e os mecanismos
de hedge, negociados nas Bolsas, que afetam os custos e riscos dos financiamentos. Ou seja,
quando examinamos a questo, temos que levar em considerao um universo mais amplo de
anlise, percebendo uma nova institucionalidade engendrada fora do SNCR. O item a seguir
trata do desenho bsico dessa institucionalidade.
1.2.1) As Fontes de recursos do Sistema Nacional de Crdito Rural: Fontes Tradicionais e Novas Fontes.
No que tange composio do Sistema Nacional de Crdito Rural, este formado por
duas categorias de fontes de recursos: as Fontes Tradicionais, criadas a partir de 1965, e as
Novas Fontes, que comearam a ser institudas no decorrer da dcada de 1980, no sentido de
aumentar a participao privada no financiamento da agricultura.
As Fontes Tradicionais so compostas pelos Recursos Obrigatrios (MCR 6-2) e
pelos Recursos Livres (MCR 6-8) e Recursos do Tesouro Nacional. Ser destacado, agora, o
detalhamento de cada uma destas fontes de recursos, iniciando pelas Fontes Tradicionais.
A primeira fonte a ser tratada refere-se aos Recursos Obrigatrios, que consistem em
aplicaes compulsrias em financiamento agrcola, nas condies fixadas pelo SNCR, de um
percentual dos depsitos vista nos Bancos Comerciais. Uma vez que os depsitos em conta
corrente tm custo muito baixo para os bancos, foi possvel orientar parte desses recursos a
emprstimos subsidiados sem qualquer nus para o Tesouro ou para os bancos comerciais,
posto que, teoricamente, as exigibilidades formam parte do recolhimento compulsrio que no
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so liberadas pelo Banco Central, a no ser para um fim especfico. O percentual da
exigibilidade definido pelo Banco Central do Brasil segundo as necessidades de recursos e a
poltica monetria vigente. A tabela abaixo ilustra o movimento do percentual exigido ao
longo dos anos 1995 a 1997. O percentual definido em 25%, a partir de janeiro de 1997,
corresponde ao valor vigente atualmente.
Tabela 1.1 Exigibilidade em Crdito Rural
Fonte Ano Percentual (%) Documento
DER 1995/97 70 Res. 2108
FAE 1995/97 70 Res.2108
1995/97 65 Res.1898
1998 40 Res.2473 Poupana Rural
A partir de 2004 65 Res. 3224 07/94-07/95 25 Res.2086 08/95-07/96 17
Ago. 96 18 Set. 96 19 Out. 96 20 Nov. 96 21 Dez. 96 22
Res.2182 MCR 6-2 (Recursos Obrigatrios)
A partir de Jan.de 97 percentual atual * 25 Res.2293
Nota:* esta percentagem permanece atualmente (2006). As instituies financeiras so obrigadas a manter 25 % do saldo mdio dirio das rubricas contbeis de recursos vista sujeitos ao recolhimento compulsrio em aplicaes de crdito rural, sendo que, no mnimo 28% dos recursos obrigatrios devem ser aplicados em crditos com valor de at R$60.000,005. Fonte: Banco do Brasil:UEN RURAL/GETER Adaptado de Gasques & Conceio (2001:106).
O histrico das captaes via exigibilidades aponta para uma srie de oscilaes
durante a dcada de 1990. Esta rubrica apresentou uma queda at 1993, sendo que, em 1994,
comeou a recompor-se devido volta dos depsitos vista, aps o fim do perodo
inflacionrio. A partir de 1996, o percentual exigido aumentou, o que segurou os Recursos
Tradicionais, fazendo com que as liberaes por meio desse mecanismo passassem a ser a
principal fonte de captao de recursos para o crdito rural.
A segunda fonte corresponde aos Recursos Livres. As aplicaes por intermdio dos
Recursos Livres so realizadas, em sua maior parte, pelo Banco do Brasil. Porm esta 5Retirado do Manual do Crdito Rural, disponvel em http://www.pronaf.gov.br/home/MCR_05-06_jul_05.doc. Acesso em Dezembro/ 2005.
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instituio financeira tem diminudo a sua participao na concesso do crdito agrcola em
razo das tentativas de ajustar-se s imposies do Acordo da Basilia6. Durante a dcada de
1990, aps o fim do processo inflacionrio, foi observado um aumento relativo na
participao dos bancos privados no financiamento agrcola, graas ao retorno das aplicaes
em depsitos vista o que, conseqentemente, aumentou o volume das exigibilidades. Porm,
esse aumento da participao dos bancos privados no foi acompanhado pela ampliao dos
montantes de Recursos Livres concedidos por meio dessas instituies financeiras no crdito
agrcola.
Por fim, a terceira fonte que compe os Recursos Tradicionais refere-se aos Recursos
do Tesouro, que so as transferncias de recursos efetuadas diretamente do Oramento do
Tesouro Nacional. J na dcada de 1990, o fato de as autoridades monetrias terem
alcanado, num primeiro momento, a estabilizao monetria, no impediu que ocorresse a
queda nos volumes de recursos ofertados por essa fonte. A queda dos volumes dessa fonte
est ligada poltica da liberao dos recursos via Operaes Oficiais de Crdito (OOC).
Desde o incio da sua instituio at 1994, esses recursos foram alocados para o
financiamento direto de operaes de custeio agropecurio. Devido conteno de gastos
oramentrios impostos pelo Plano Real, essa rubrica teve a dotao oramentria diminuda
(Corra & Silva, 2004). Aps essa data, grande parte de tais recursos foi utilizada para
equalizar encargos financeiros, ocasionando uma queda brusca nos emprstimos para custeio,
reduzindo os recursos para a Aquisio do Governo Federal (AGF) e Emprstimo para o
Governo Federal (EGF).
No que tange s Novas Fontes, estas comearam a ser constitudas quando as Fontes
Tradicionais j entravam num processo de decrscimo da oferta de recursos. Nesse sentido, a
concepo inicial da criao das Novas Fontes versava sobre o aumento da atuao privada no
crdito agrcola, porquanto a participao das fontes formais (principalmente os recursos do
Tesouro) decrescia abruptamente. O quadro abaixo tipifica as Fontes do SNCR, indicando
aquelas que no se implantaram ou que foram extintas7:
6 Documento internacional firmado pelo Brasil em 1988, no qual foram definidos os princpios fundamentais de superviso bancria, adicionados de diretrizes, padres e recomendaes que deveriam ser seguidos pelas instituies financeiras internacionais. Aps este Acordo, principalmente, os bancos privados tornaram-se mais seletivos para efetuar emprstimos. 7 Para um melhor detalhamento das fontes de recursos que compem o SNCR e das fontes fora destas institucionalidade (fontes informais e semi-formais de recursos), ver CORRA (1999).
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Quadro 1.1- Fontes de recursos do Sistema Nacional de Crdito Rural.
Ano de criao Fontes de financiamento 1965 Recursos Livres (MCR 6-8) - Fonte Tradicional 1965 Recursos Obrigatrios (MCR 6-2)- Fonte Tradicional 1965 Recursos do Tesouro Nacional Fonte Tradicional 1985 Programa Especial de Crdito para Reforma Agrria (Procera) 1986 Caderneta de Poupana Rural 1989 Fundos Constitucionais 1990 Sociedades de Crdito Imobilirio e Bancos Mltiplos 1990 Fundos de Aplicaes Financeiras (FAF) 1990 Depsitos Intrafinanceiros Rurais (DIR) 1990 Depsitos Especiais Remunerados (DER) 1990 Fundos de Commodities 1991 Recursos externos (63 rural) 1991 Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) 1994 Recursos Extramercado (FAE) 1995 Adiantamentos sobre Contratos de Cmbio (ACC) 1995 Finame agrcola
Fonte: Corra (1999) Novos caminhos do financiamento agrcola e as suas distores.
Do total das Novas Fontes criadas, algumas no foram implementadas e outras ainda
no podem ser consideradas como sendo determinadas pelo mercado, pois envolvem
mecanismos de captao compulsria. Quanto s Fontes que envolvem a captao
compulsria, citamos:
i)Fundos Constitucionais de Financiamento Foram criados com a Constituio de
1988, tendo como fonte o percentual de 3% dos 47% da arrecadao do IPI e do IR para
aplicao nas regies Norte, Nordeste, e Centro-Oeste. Tais fundos, regulamentados pela Lei
7.827, de 27/09/89, visavam priorizar os pequenos produtores/ empresrios rurais e
industriais. Os Fundos Constitucionais das regies Nordeste (FNE), Norte (FNO) ficaram a
cargo do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) e do Banco da Amaznia (BASA),
respectivamente. J na regio Centro-Oeste (FCO), eles ficaram a cargo do Banco do Brasil,
em decorrncia da falta de um banco de desenvolvimento nessa regio (Massuquetti, 1999).
Esses fundos trabalham com taxas de juros mais baixas, controladas pelo Governo e so
constitudos como fontes compulsrias de recursos.
ii)Finame Agrcola - Foi institudo pela Circular 95 do BNDES e pela Carta-Circular
10/95, ficando sob a responsabilidade do Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e
Social (BNDES). O Finame constitudo por recursos do Fundo PIS/PASEP e do Fundo de
Amparo ao Trabalhador (FAT) e tem o objetivo de financiar as aquisies de mquinas e
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implementos agrcolas novos, de fabricao nacional. O Finame agrcola gerenciado pelo
BNDES, e seu direcionamento est voltado para o crdito de investimento. Essa fonte
monitorada por instituies financeiras credenciadas, sem limite de valor, com garantias a ser
negociadas com o cliente. O encargo financeiro composto pelo custo financeiro (taxa de
juros de longo prazo) + spread bsico + spread de risco (negociados com as instituies
financeiras e o cliente). O prazo de carncia varia de 12 a 18 meses, sendo que o prazo
mximo do emprstimo de 5 anos.
Essa, tambm, uma fonte compulsria de recursos. As dificuldades decorrentes da
liberao de recursos por essa fonte refere-se ao fato de que os bancos repassadores esto
exigindo garantias cada vez mais pesadas aos candidatos a emprstimos, e a rentabilidade das
operaes do BNDES menor que a mdia conseguida pelos bancos no mercado.
iii) O FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e seus programas para a agricultura.
O FAT um fundo contbil, de natureza financeira, vinculado ao Ministrio do
Trabalho e Emprego MTE, que foi institudo por meio da Lei n 7.998, de 11 de janeiro de
1990, por ocasio da regulamentao do art. 239 da Constituio Federal (BRASIL, 2006).
Conforme estabelecido no art. 11 da Lei n 7.998/1990, constituem recursos do FAT: (i) o
produto da arrecadao das contribuies devidas ao PIS e ao PASEP; (ii) o produto dos
encargos devidos pelos contribuintes, em decorrncia da inobservncia de suas obrigaes;
(iii) a correo monetria e os juros devidos pelo agente aplicador dos recursos do Fundo,
bem como pelos agentes pagadores, incidentes sobre o saldo dos repasses recebidos; (iv) o
produto da arrecadao da contribuio adicional pelo ndice de rotatividade, de que trata o
4, do art. 239, da Constituio Federal; (v) outros recursos que lhe sejam destinados.
O FAT uma fonte compulsria de recursos presente nos programas que apresentam
oferta de recursos com taxas controladas. Esses programas foram criados, teoricamente, como
alternativas lgica de mercado nas operaes de crdito tradicionais. por meio dos
chamados Depsitos Especiais8, que so destinados os recursos ao financiamento de projetos
com potencial de gerao de trabalho, emprego e renda, como por exemplo, o Programa de
Gerao de Emprego e Renda Rural (PROGER), o Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (PRONAF), o PROEMPREGO, o FAT-HABITAO, FATINFRA-
ESTRUTURA, dentre outros.
8 Os Depsitos Especiais so disponibilidades financeiras do FAT aplicadas nas instituies financeiras oficiais federais nos termos do que determina a Lei n 8.352, de 28 de dezembro de 1991.
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Dentro do PROGER, est includa a modalidade PROGER RURAL foi institudo e
normatizado em 1995, com o objetivo de conceder financiamentos que visem ao
desenvolvimento de atividades rurais dos micros e pequenos produtores, de forma individual
ou coletivamente, associadas a programas de qualificao, assistncia tcnica e de extenso
rural. As maiores liberaes de recursos so efetuadas por intermdio do Banco do Brasil e
Banco do Nordeste .
Em agosto de 1995, foi lanado o PLANAF (Plano Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar) e transformado em PRONAF em junho de 1996. O PRONAF foi criado
para dar condies de financiamento agricultura familiar, visto que opera com taxas de juros
abaixo das vigentes no mercado. Os recursos do FAT so os principais, mas este programa
tambm conta com montantes advindos dos Fundos Constitucionais e das exigibilidades (aps
a incorporao do PROCERA). Esse Programa o objeto de estudo deste trabalho, logo, ser
tratado de forma mais detalhada nos captulos que se seguem.
Um ponto interessante de ser destacado, no que tange esta fonte de recurso, o fato
da criao de uma linha de crdito aprovada no incio de junho/ 2005. Por meio desta, passar
a ser destinado cerca de R$ 1 bilho dos recursos do FAT para refinanciamento de dbitos
privados em bancos, tradings e indstrias de agrotxicos, adubos e mquinas (Zanatta,
2005a). Alm disso, est prevista, inclusive, a criao de uma linha adicional de recursos do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES) para refinanciamento da
dvida dos produtores rurais com seus fornecedores privados (cerca de R$ 3 bilhes)9.
iv) Poupana Rural A Caderneta de Poupana Rural foi Instituda em 05 de
setembro de 1986 e operacionalizada em 12 de fevereiro de 1987. Tem como fonte os
depsitos do Banco do Brasil, Banco Nacional de Crdito Cooperativo, Banco da Amaznia e
do Banco do Nordeste do Brasil. , de conformidade com as normas aplicveis aos depsitos
de poupana do Sistema Brasileiro de Poupana e Emprstimo (SBPE). Atualmente
(2006), os recursos desta fonte esto sujeitos ao seguinte direcionamento: (i) 20% em
encaixe obrigatrio no Banco Central do Brasil; (ii) mnimo 65%, a partir de 1/9/2004, para
operaes de crdito rural,como tambm para a comercializao, beneficiamento ou
industrializao de produtos de origem agropecuria (ou de insumos utilizados nessa
atividade) e para a aquisio, diretamente de seu emitente, de Cdulas de Produto Rural
9 Zanatta (2005b)
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(CPR). Por meio desta fonte de captao, gera-se, ento, uma oferta de recursos para o setor,
com juros controlados pelo Governo (8,75% ao ano, segundo o Plano de Safra 2005/ 2006).
v) PROCERA (Programa Especial de Crdito para a Reforma Agrria). um
instrumento de incentivo aos assentados no processo de reforma agrria. Os beneficirios
desse programa so os pequenos produtores rurais assentados em projetos de Reforma agrria
criados ou aprovados pelo INCRA. Foram efetuados financiamentos para custeio e
investimento, com taxas fixadas pelo Governo, sendo que, no ano de 1999, junto unificao
das polticas agrcola e agrria promovida pelo Governo FHC, o PROCERA foi incorporado
ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar PRONAF (constituindo o
Grupo PRONAF PLANTA BRASIL)10.
Ainda quanto s Novas Fontes, interessante comentar aquelas que esto mais ligadas
captao de recursos externos, vistas como as que poderiam ter grande potencial de
expanso dentro do SNCR. Segue, abaixo, um breve comentrio sobre essas fontes.
vi) Recursos externos - Existe mais de uma modalidade de captao de recursos
externos voltados para o financiamento agrcola. A Resoluo do Banco Central n. 1.872, de
25/09/91, regula a captao desses recursos com a finalidade de financiar os exportadores no
custeio e na comercializao de produtos para exportao. A resoluo 2.148 (set./91) regula
a captao desses recursos com a obrigatoriedade de dirig-los ao financiamento rural.
Conhecida como "63 caipira", esta fonte envolve a captao de recursos a taxas de juros
internacionais e sob correo cambial.
vii) Adiantamentos sobre Contratos de Cmbio Na verdade, esta no uma fonte
de recurso; uma modalidade de financiamento feita por uma fonte externa. Sua forma de
operar envolve uma particularidade: o adiantamento para contratos internacionais j
pactuados. Esses recursos so tomados pelos produtores que representam antecipaes
parciais ou totais de vendas a termo para o mercado internacional. Por constiturem
adiantamentos a termo, ao ser realizada a captao, o pagamento ser feito em produto, com
preo estabelecido na data do contrato.
Essa particularidade faz com que o ACC atinja exportadores/ importadores que j
tenham a sua exportao/importao contratada. Mediante esse contrato, o banco adianta os
recursos da venda/ compra estabelecida (pode adiantar total ou parcialmente), tendo como
garantia o contrato de entrega entre os contratantes (teoricamente no h problema de 10 Informao retirada do site: http://www.incra.gov.br/estrut/ativ9599.htm
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demanda efetiva, pois a venda j est garantida). Tendo em vista ser um contrato de
financiamento de vendas/ compras internacionais j firmadas, o banco pode cobrar juros mais
correo cambial para esse tipo de emprstimo. Dada esta perspectiva, a fonte de recursos que
alavanca o ACC so os recursos de curto prazo, captados nos mercados financeiros
internacionais, que sero pagos pelo banco tomador com correo cambial mais juros.
Mediante essa modalidade, o exportador recebe os recursos antecipadamente e, muitas vezes,
repassa-o ao produtor rural, comprando seu produto de forma antecipada (Souza, Marques &
Caffagni, 1998: 94-4).
Ainda no que tange aos recursos ofertados via SNCR, foram tentadas flexibilizaes
quanto ao pagamento dos financiamentos e, neste caso, citamos o Sistema de Equivalncia
Produto, estabelecido pela Lei Agrcola. Por esse sistema, admite-se que os produtores
agrcolas possam utilizar sua produo como forma de pagamento dos financiamentos
agrcolas do SNCR. A correo dos valores dos emprstimos estaria vinculada evoluo dos
preos dos produtos financiados. No entanto, conforme ressaltam Arajo & Almeida (1997),
uma das razes para as dificuldades desse sistema foi a escolha do preo de referncia a ser
utilizado no valor do emprstimo, seja este valor pautado em preos mnimos, preos de
mercado ou mdias mveis de preos de mercado.
1.2.2) A nova institucionalidade fora do SNCR: os novos instrumentos financeiros e as fontes semi-formais e informais de recursos.
A discusso acerca do novo desenho do financiamento agrcola na atualidade, deve
abarcar tambm a questo das fontes alternativas de recursos, inseridas fora dessa
institucionalidade. Tais fontes surgiram na dcada de 1990, no contexto de restrio da
participao das fontes formais de recursos.
No mbito dos grandes proprietrios, cada vez mais comum recorrerem a esse tipo
de financiamento, alm de poderem contar com recursos prprios, quando h falta de
financiamento por parte dos Programas Oficiais. No mbito do governo, tendo em vista a
diminuio da sua participao nas polticas pblicas voltadas para a agricultura, a cada Plano
de Safra, tem sido comum o incentivo para que se faa uso de novos instrumentos financeiros
no sentido de capitalizar o setor agrcola, principalmente para aqueles segmentos voltados
para o agronegcio. A justificativa de que a falta de recursos formais leva o Governo a
estimular a busca de recursos privados. Essa foi uma estratgia verificada no Plano de Safra
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2004/ 2005; quando foi incentivado o lanamento de Fundos Privados para a comercializao
da safra (DESER, 2005a). A idia lanar ttulos lastreados pela garantia de entrega dos
produtos agropecurios que seriam negociados pelo mercado.
Um desses ttulos de crdito o Certificado de Recebveis do Agronegcio (CRA).
Destina-se a atrair poupana interna para o agronegcio, emitido por empresas de
securitizao, sociedades de propsito especfico para esse fim. Outro mecanismo de captao
de recursos de investidores estrangeiros, por meio da emisso de um commercial paper ou
equivalente, refere-se ao ttulo Letra de Comrcio Agrcola (LCA), emitido por instituies
financeiras e cooperativas de crdito.
Alm disso, outro instrumento foi lanado: o Certificado de Direitos Creditrios do
Agronegcio (CDCA), voltado para cooperativas e empresas ligadas ao agronegcio, que
atuem em armazenamento, comercializao, beneficiamento ou industrializao de produtos e
insumos agropecurios, bem como no setor de mquinas e implementos agrcolas.
O CRA, a LCA e o CDCA sero os ttulos representativos desses direitos creditrios
dos principais recebveis, como CPR, CPRs de gaveta, duplicatas e Nota do Produtor Rural
(NPR), contratos de fornecimento e exportao, entre outros. Os direitos creditrios
vinculados aos ttulos podero ser cedidos em custdia a uma instituio financeira, que far
as cobranas e os recebimentos. Os papis podero ser negociados na BM&F, em bolsas de
valores e em mercados de balco, autorizados pela Comisso de Valores Mobilirios.
Com o intuito de captar recursos no Exterior, a Secretaria de Poltica Agrcola tambm
formatou a Nota Comercial do Agronegcio (NC-a), que tende a ficar mais conhecida como
Agrinote. Estas so as principais caractersticas desse ttulo: renda fixa, emisso por
sociedade annima (aberta ou fechada), classificao do emissor, lastro opcional de outras
garantias reais ou financeiras, prazo de vencimento mnimo de 90 dias e mximo de 360, com
regime tributrio simplificado e incentivo tributrio (RESENHA, 2004).
Outro instrumento de captao de recursos voltado para o setor privado foi divulgado
no Dirio Oficial da Unio, em outubro de 2004, por meio da Medida Provisria 221. Esta
Medida regulamentou os novos instrumentos de crdito do agribusiness: o Certificado de
Depsito Agropecurio (CDA) e o Warrant Agropecurio (WA). Os novos ttulos podero ser
utilizados de forma casada, serviriam de suporte comercializao da safra 2004/ 2005.
A perspectiva do Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento (MAPA) que
a flexibilidade na operao deva atrair mais recursos para o campo. A inteno captar parte
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da poupana dos fundos de investimento para o agronegcio, que contam, atualmente, com
patrimnio lquido de R$530 bilhes11.
O CDA e o WA so papis emitidos pelos Armazns Gerais Certificados e consistem
em uma espcie de moeda. Embora no transfiram a propriedade da mercadoria a cada
negociao, para se capitalizar, o agricultor poder negociar o certificado como se vendesse o
produto, pois o CDA um ttulo de crdito que representa a promessa de entrega de produto
agropecurio depositado em armazm. Assim, no necessrio emitir notas fiscais, uma vez
que esto registradas todas as caractersticas e condies da mercadoria e do depsito, de cujo
papel no consta valor no prprio papel. A negociao equivaler de produtos sem
incidncia de ICMS12, que ficar para a ltima etapa de comercializao.
Na operao com CDA e WA, o produtor entrega a lavoura colhida no armazm de
sua confiana e solicita do depositrio a emisso simultnea dos papis. O comprador adquire
o direito de assumir a propriedade da mercadoria. Ser obrigatrio o registro do negcio em
sistemas autorizados pelo Banco Central (CETIP, BOVESPA, BM&F), nos quais ficaro em
custdia. A negociao dos ttulos ser eletrnica. Alm disso, podem ser garantidos por aval
bancrio ou seguro, o que confere credibilidade aos ttulos, blindados ainda pela fiscalizao
do Ministrio.
O comprador do CDA que desejar retirar a mercadoria dever liquidar o WA ou
depositar o valor correspondente na clearing do sistema eletrnico. O Warrant Agropecurio,
por sua vez, permitir que se levantem emprstimos com mais simplicidade, pois um ttulo
de crdito que confere direito de penhor sobre o produto descrito no CDA correspondente. O
comprador apenas do WA fica como credor do emprstimo do CDA. No pode exercer o
direito de ficar com a mercadoria, mas tem direito de penhor sobre ela.
Segundo a Revista RESENHA (2004), na prtica, tais ttulos tomam o papel dos
bancos, que, quando efetuavam emprstimos, acolhiam os ttulos em cauo, na chamada
warrantagem. Para o caso da venda do CDA, depois de vendido o WA, o comprador
adquire o direito de assumir a propriedade da mercadoria, desde que quite ou deposi