felipe simões pires - ratio puta (a evolução de um pensament

Upload: felipe-simoes-pires

Post on 11-Jul-2015

90 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Ratio PutaA evoluo de um pensamento

Os melhores artigos de Felipe Simes Pires

1

ndice

Introduo..................................................................3

Agradecimentos..........................................................3

Textos.........................................................................4

Manifesto....................................................................44

Extras.........................................................................46

2

IntroduoDeu-me grande alegria fazer a edio deste livro. exerccio bastante saudvel reler todos os artigos publicados em meu weblog desde 2003 para selecion-los e acompanhar a evoluo de meu prprio pensamento. interessante como alguns textos tratam de teoria poltica bruta, outros so mero exerccio filosfico, outros so prticos em relao aos problemas brasileiros, outros so comentrios sobre situaes momentneas, enquanto outros so atemporais. Considero minha melhor produo o Por uma Nova Poltica Eclesistica, mas muitos leitores no entenderam o esprito de tal arrazoado, enquanto outros simplesmente preferem outros. Eis a riqueza de expor um pensamento crtica generalizada. O leitor certamente ter o gosto de avaliar quando estive engajado numa posio, decepcionado com uma situao, empenhado em deixar material terico consistente ou apenas expressei incontida indignao. Considero esta obra um limpa-trilhos para a continuidade de meus escritos, aprofundando entendimentos sobre o Brasil e o Mundo, teoria e experincia polticas, alm de apontar alternativas para o futuro. Eis que apresento o presente material como porta de entrada para meu entender. Nada mais sincero que um apanhado involuntrio do que por mim j foi escrito. Inclusive idias das quais divirjo. Desejo a todos uma boa leitura, desde que crtica, em seu sentido mais nobre. Saber ler desarmado para inteligir e pr prova as idias aqui apresentadas, deixando sempre aberta a possibilidade de ser convencido. Saber ler criticamente para, pondo prova meus escritos, saber contrapor argumentos e, eventualmente, apresentar uma discordncia consistente.

AgradecimentosGostaria de fazer uso deste espao para agradecer queles que viabilizaram a construo deste material, seja financeira ou intelectualmente. Agradeo aos meios que veicularam meus textos: website do Movimento Plural (j desativado), Jornal Universitrio Eco (j extinto), jornais Agora (Rio Grande-RS), Gazeta do Sul (Santa Cruz do Sul-RS), A Platia (Santana do Livramento-RS), Dirio Popular (PelotasRS), Centro de Mdia Independente e Mdia sem Mscara. Destaco o fato de o Jornal Agora de Rio Grande ter sido o primeiro a acolher meus materiais, bem como a receptividade da Gazeta do Sul. Agradeo a minha me que, em tempos de dificuldade financeira, foi meu mecenas, acreditando sempre em meu potencial.

3

Agradeo a meus professores Srgio Sardi e Juremir Machado da Silva. Este por incentivarme que continuasse escrevendo e aquele, por auxiliar-me a liberar meu pensamento, embora divirjamos radicalmente em questes polticas. Agradeo a meus companheiros Giuliano Falcetta (PT), Lucas Lazari (PSTU) e membros dos crculos liberais de Porto Alegre, que muito contriburam lapidao de meu pensamento, atravs de debates muitas vezes acalorados e de valoroso recheio intelectual. Por fim, agradeo a minha namorada, Dorit Schulte, que me motivou a conhecer um mundo novo chamado Europa e que muito colaborou na formao de meu atual estgio polticoideolgico e a sua famlia, meus mecenas em meus futuros estudos na Alemanha.

TextosContexto: em agosto de 2003, inauguro o Blog com texto previamente publicado no extinto site do nosso Movimento Plural, ainda, ingenuamente, sem conhecer o quo pior era a situao do movimento estudantil da PUC-RS.

A PUC e os Tempos Em 24 de agosto de 1973, o jornal Zero Hora noticiava que a bancada do MDB na Cmara de Vereadores de Porto Alegre vetara a proposta de concesso do ttulo de cidado portoalegrense ao ento reitor da PUCRS, irmo Jos Oto. O lder da bancada do partido, Glnio Peres, justificou a deciso que censurava um dos maiores empreendedores que o Rio Grande j viu alegando que, aceitando a poltica do governo militar, tornara-se um "elemento de presso sobre os estudantes" e por pretender instituir um estacionamento pago na Universidade. Hoje em dia, ningum mais contesta a importncia que tiveram Glnio Peres e o irmo Jos Oto; a ditadura acabou e Arena e MDB no existem mais alis, seus herdeiros polticos (PP e PMDB) majoritariamente apiam o atual governo juntos; a maior parte da sociedade condena o regime militar e o estacionamento da PUC-RS pago. Nos tempos de democracia, a conduo da poltica da Universidade cada vez mais centralizada (tome-se como exemplo a conduo da questo da Reforma Pedaggica, afastada dos alunos), o establishment do "movimento estudantil" na PUC-RS mais resistente que nos tempos da ditadura (haja vista que, freqentemente, os estudantes do MDB derrotavam os da Arena em eleies de CAs, DAs e DCE) e as tmidas manifestaes dos alunos so para barrar aumentos do estacionamento, pois j desistiram de fazer o mesmo com as mensalidades. J hora de se reviver o Movimento Estudantil na nossa Universidade, admitirmos o quo valorosa tem sido a gesto do irmo Norberto Rauch nos quesitos estratgicos e de estrutura, mas tambm, tomarmos partido em defesa de ns mesmos, questionando a falta de democracia nas polticas universitrias e colaborarmos para que a PUCRS, que uma das melhores universidades em quesitos tcnicos, tambm o seja em quesitos que vo alm do meramente tangvel.

4

Contexto: a Cmara Federal aprova em primeiro turno a Reforma da Previdncia proposta pelo Governo Lula

O Governo vence a Primeira Enfim, a proposta de Reforma da Previdncia passou em primeiro turno na Cmara, com uma maioria expressiva de votos, dando incio a um processo nefasto de satanizao da classe mdia-baixa e ocultando os verdadeiros viles. Nas eleies presidenciais, os dois candidatos que chegaram ao segundo turno repetiam exaustivamente que eram "a favor das reformas que o Pas tanto precisa". Ora, evidente que o Brasil precisa de reformas, mas definir quais so as que realmente precisa vai muito alm de repetir um clich e deve passar pela anlise criteriosa da situao atual e suas causas. No caso especfico da Reforma da Previdncia, todos reconhecem que h um rombo e que existe um prejuzo constante. Porm, apenas algumas vozes isoladas apontam que o rombo se deve ao emprego do dinheiro da Previdncia em outras reas por sucessivos e governos e que o recolhimento, da parte do prprio Estado, no feito de maneira correta. Tambm so esparsas as vozes que indicam que s h dficit por a Previdncia no ser desvinculada, pois a prpria, isoladamente, superavitria. Comeam a surgir, ento, as incoerncias, quando, na mesma semana em que a base aliada aponta que os atuais inativos tm um dbito real para com a Previdncia e se prope a cobrla, alardeia as benesses das aposentadorias rurais daqueles que nunca contriburam. Se justo (e eu penso que ) que aqueles que trabalharam a vida inteira no campo, mas nunca contriburam, tenham direito aposentadoria sem que ningum lhes cobre a "dvida para com a Previdncia" , uma falcia a taxao dos inativos. Decide-se, pois, por retirar a aposentadoria integral que deveria ser direito de todos os trabalhadores daqueles "privilegiados" que so os servidores pblicos. o velho e pssimo costume brasileiro de nivelar por baixo. Enquanto os prprios polticos tm direito a aposentadorias aps exercerem um ou outro mandato (dependendo do cargo), com ganhos astronmicos, ficam com seus benefcios intatos, os servidores que ultrapassarem R$ 2.400,00 tero de fazer fundos complementares. Entendo que seja justo que os magistrados, que transpuseram diversos obstculos rduos (ao contrrio dos mandatrios, precisam concluir uma faculdade, prestar concurso e trabalhar por anos a fio) at chegarem a essa funo essencial ao Estado, progridam na carreira e se aposentem com vencimentos bastante acima da mdia dos trabalhadores. Todavia, na hora de negociar a Reforma, o Governo manteve-se intransigente com os servidores que ganham pouco mais de R$ 2.400,00, mas cedeu s presses do Judicirio. Isso apenas demonstra o carter dessas mudanas, que no so as que o Pas tanto precisa", mas aquelas que mantm os privilgios dos que realmente ganham muito e cassam os direitos daqueles que ganham um pouco acima da mdia, exatamente o contrrio da propaganda estatal.

Teoria Poltica no Campus Certa feita, como exerccio para um livro que ainda pretendo escrever, divagava sobre a correspondncia adequada entre as grandes teorias polticas e instituies sociais quando

5

transpostas ao mbito acadmico e, em um exerccio dialtico, conclu por parte do que segue. No entrando em teorias especficas essas devero tomar-me alguns captulos na futura obra , a maioria dos autores concorda ao afirmar que o Estado surgiu de um pacto, onde o ser humano reuniu-se em um grupo comum, delegando atribuies e poderes a outro(s) semelhante(s), pela necessidade de uma organizao capaz de defend-lo de si mesmo e dos perigos que o cercavam. Partindo-se desse ponto-de-vista quase unnime, encontrar-se- a possibilidade perfeitamente aceitvel de traar-se um paralelo entre a constituio do Estado e a gnese das organizaes representativas dos estudantes. Dentro de um mundo artificial, que a universidade, sentiram-se os homindeos (estudantes) englobados em uma estrutura autnoma de vida, com seus perigos, benesses e predadores. Sentiram-se, tambm, impotentes sozinhos ante o modo como a bios funcionava e decidiram ento por unir-se. Da mesma forma que os australopitheci reuniam-se em bandos para serem mais fortes e poderem enfrentar os desafios da savana e que os povos mesopotmicos viram na gerncia de suas atividades uma organizao legtima para suas atividades, o estudante reproduziu, na Universidade, o molde de delegao de atribuies, para alguns semelhantes, imbudos da responsabilidade de propiciarem o bem de todos, criando as organizaes representativas, como DCEs, centros e diretrios acadmicos. Mas, de que importa tudo isso? Importa, enquanto ilustrativo, que, da mesmssima maneira que os pacturios da sociedade do hoje as costas poltica que nada mais deveria ser do que a extenso de suas necessidades assim o fizeram os alunos em relao a suas agremiaes. Assim como o alienado poltico esquiva-se das decises e acaba submetendo-se s mesmas decises tomadas por outros, o aluno que no age em defesa do que acredita para sua faculdade finda por sujeitar-se a um modelo concebido pelos outros. Inevitavelmente. Portanto, bem como a poltica deve ser feita por todos, diariamente, a poltica estudantil que muito mais recente e imatura uma construo constante, que deve contar com a participao de todos, para o seu prprio bem, participando ativamente, quer seja da situao, da oposio ou da pura manifestao de idias.

Rouba mas Faz Cada vez mais, temos acompanhado uma tendncia, motivada pela descrena no sistema poltico e em suas figuras representativas, de condescendncia para com falhas de carter em nossos polticos. Em uma sociedade onde impera a "Lei de Grson", comum que se faa "vista grossa" a atitudes como desrespeitar a faixa de segurana, apossar-se do troco excedente ou contratar um funcionrio sem assinar-lhe a Carteira de Trabalho.

6

No ambiente poltico, isso no diferente e as pessoas j se acostumaram a denncias de irregularidades em administraes pblicas, ao descaso com o dinheiro do contribuinte e indiferena dos polticos sabidamente imorais para com os que esbravejam contra suas falcatruas. Adotar uma postura passiva diante desses fatos implica na aceitao dessas prticas como legtimas e incentiva sua continuidade, sendo to imoral quanto elas o voto em candidatos simpticos, bonitos ou que roubam, mas fazem. Todavia, um desvio moral que atinge um nmero majoritrio de habitantes de um pas apenas pode ser modificado em sua raiz e os agentes de tal iniciativa somente podem ser em mbito micro os prprios cidados e em um mbito macro os polticos por eles eleitos. Por conseguinte, o apoio do cidado ao poltico antitico significa renncia correo social e o prprio impedimento a uma reforma de costumes no longo prazo. Assim, valendo-se do direito democrtico da escolha, o eleitor pode optar pela mudana ou pela continuidade, mas, pelos mesmos preceitos democrticos, ter que arcar com as conseqncias e assumir a responsabilidade de sua escolha.

Fico e Realidade Outro dia, lendo um texto de Fabrcio Maraschin, que tratava, em linhas gerais, da repercusso do filme Cidade de Deus, me parei a pensar sobre uma frase sinttica do autor, que perguntava "o que choca mais: a fico ou a realidade?". De pronto, algum explicar o efeito do filme com o clich da "banalizao da violncia", mas vai alm. Estamos entrando de cabea em um ps-modernismo, onde situaes do dia-a-dia so to surreais que no so levadas a srio. Ao caminharmos na rua e vermos o pice da degradao humana em uma calada, somos isolados daquela realidade por meio de uma redoma criada para nossa prpria defesa, pois somos fracos. No somos, naturalmente, capazes de ver um semelhante em situaes como as que vemos diariamente e no nos imaginarmos em seu lugar. Surge, ento, para nos proteger, a fico fantasiada de realidade, onde a violncia que se v em "Carandiru" ou "Cidade de Deus" nos choca, enquanto assistimos ao fictcio, confortavelmente sentados em uma poltrona reclinvel e no ar condicionado. A ficamos perplexos. Na sada do cinema, a criana ranhenta que vem, inconvenientemente, suplicar por uma esmola automaticamente repelida, por no ter o talento de um ator e os efeitos visuais de um diretor a ponto de nos despertar qualquer sentimento que no seja a insatisfao por sermos importunados. Ora, percebe-se o que se poderia chamar de inverso de papis, onde a realidade vista como se fosse parte da fico e o que deveria ser entretenimento satisfaz nossa necessidade de ter d. Porm, em vez de trocarem de funo e permanecerem separadas por uma linha divisria, fico e realidade passam a invadir seus domnios mtuos e, impertinentemente, me obrigam a escrever este artigo.

7

Onde esto, enfim, fico e realidade? O que nos provoca emoo real ou o factvel j no se nos apresenta satisfatoriamente como propulsor de sentimentos? Volto questo inicial do Fabrcio: O que choca mais: fico ou realidade?

Um Apelo por Razo No surpreende mais a ningum ouvir algum firmar uma posio e, questionado sobre a mesma, no saber explic-la ou demonstrar um profundo desconhecimento sobre o que fala. Eis um mal generalizado. Estamos vivendo em tempo e espao onde a coisa mais natural que a "opinio" substitua os fatos, os argumentos e o conhecimento de causa. Hoje em dia, qualquer um diz que o cu vermelho e se defende dizendo que essa a sua opinio. Se isso se restringisse a comentrios esdrxulos sobre a cor do cu ou a qualidade de um jogador de futebol, menos mal. Mas essa mentalidade est espalhada por todas as reas, principalmente as que mais deveriam demandar uma boa cincia do assunto sobre o qual se fala. "Eu sou contra" e "eu sou a favor" claro que o primeiro em maior quantidade so as afirmaes definitivas que mais se ouve, ignorando que um pensamento acabado se que isso possvel decorre de uma elaborada idia sobre um assunto, de consultas aos mais diversos pontos-de-vista sobre ele e, por fim, uma anlise crtica e consciente. Mas no, a questo pode ser a mais complexa do Universo que, com ou sem estudo prvio da questo, todo mundo afirmar alguma coisa. contra a reforma da previdncia, a favor da tributria, contra o cercamento da Redeno, a favor do desarmamento e assim por diante. Estudar a questo? Pra qu? preciso entender que todas essas questes tm incontveis nuanas em suas entranhas, exigem constantes questionamentos e reformulaes de raciocnio, s vezes mudando de idia sobre um tema. Admitir que no se domina uma matria ou que no se tem opinio formada muito mais digno honesto para consigo mesmo e para com aquele que se obriga a ouvir nossas incontinncias verbais como "eu no gosto porque eu no gosto" do que ter de admitir, constrangido, que estava a falar bobagem ou insistir na asneira com um clssico "mas isso que eu acho".

Contexto: a Cmara Federal aprova a Reforma Tributria proposta pelo Governo Lula, que nega o aumento da carga tributria.

O Governo vence a Segunda Sobre a reforma tributria, "reformar ou no reformar", me perguntam alguns. Reformar, mas com ressalvas, lhes respondo.

8

Em lados opostos nesta disputa encontram-se o Governo, com sua base aliada, e a oposio, formada basicamente por PSDB, PFL e PP. E normal que se oponham, mas a anlise alm dos interesses polticos essencial para o entendimento da questo. O PFL, um partido liberal, cumpre sua funo natural, opondo-se a um aumento na carga tributria, da mesma forma que o PP que, de certo modo, segue cartilha parecida no que se refere Economia. J o PSDB cumpre seu papel como principal partido de oposio, fazendo o que se espera dele: opondo-se. Do outro lado, o PT, como governo e sabendo que a administrao do Pas no to simples quanto afirmaram com fcil veemncia muitos de seus quadros por anos a fio, busca aprovar a reforma para manter a governabilidade. Parte da sua base, amparada pelo sonho revolucionrio, , por princpio, contra as reformas, mas sabe que a derrota do governo significaria seu enfraquecimento e uma derrota poltica da esquerda. Entramos, ento, na parte tangvel da questo, onde, para alm das belas ideologias liberal e socialista, encontra-se o que inegvel e, como conseqncia, censuram-se ambos os lados. O PFL e o PP que, amparados na sua crena liberal, bravamente se opem reforma tributria e defendem o pobre contribuinte, no utilizaram nem um dcimo dessa energia quando compunham a base de sustentao do governo FH para fazer o mesmo e, ao contrrio, eram favorveis a uma reforma muito semelhante a esta. O PSDB, que julga ter sido escolhido pelo povo para fazer a oposio ao Governo Lula, foi o mais recente constatador da inviabilidade do Estado nas atuais condies e incomensuravelmente irresponsvel ao opor-se pelo simples exerccio da oposio. Mais irresponsvel que o prprio PT, que ainda no havia provado o gostinho de governar um pas endividado e com oramentos surreais quando se opunha s reformas do governo passado. O PT, no governo, segue a mesma lgica dos mandatrios prvios, de constatar que o Estado brasileiro gasta muito e concluir que, por conseguinte, precisa arrecadar muito. Est errado. O Estado, como qualquer empresa, precisa planejar e otimizar seus custos. A questo, assim, gastar menos sem afetar a qualidade dos servios prestados. Sim, instituir "programas de qualidade total" nos rgos pblicos, reduzir o excedente de funcionrios e valoriz-los, precisando arrecadar menos, cobrando menos impostos e impulsionando o crescimento do Pas. No obstante, o momento atual crtico e exige solues imediatas, no podendo ser deixado de lado o imediatismo da demanda por medidas de curto prazo visando viabilidade do Estado brasileiro. E isso se d com reformas e racionalizao dos gastos. Passando ento para a parte pontual da reforma, vlido analisar os pontos que se constituem em solues corretas e racionais e o que no passa de falcia, como o "conto do vigrio" de que no haver aumento da carga tributria. Haver aumento na carga, sim, pela simples lgica matemtica que constata que impostos que no eram cobrados passam a ser e um imposto com extino prevista recebe sobrevida. A contrapartida, que a reduo de certas alquotas, no suficiente para dar um mnimo indcio de estagnao da carga, quanto mais sua reduo.

9

A proposio de que a CPMF, em vez de firmar-se como imposto permanente, seja prolongada at 2007 um alento para quem j temia sua efetivao como imposto permanente. Porm, o contribuinte, que aplaudiu a criao do IPMF (afinal, era para a sade), reclamou da sua converso para CPMF, choramingou com o prolongamento de sua cobrana, hoje se escabela com mais uma "soluo fcil" pesando em seu bolso. A tributao de veculos aquticos e areos, a cobrana de ICMS dos provedores de internet e a instituio do imposto sobre heranas so necessidades naturais de adequao a tempo e espao atuais, sendo realidade na maior parte do Mundo e extremamente vlidos. O fim da "guerra fiscal", a reduo do ICMS sobre medicamentos de uso continuado e alimentos da cesta bsica, a taxao sobre as importaes, regras especiais para micro e pequenas empresas e a criao do imposto sobre grandes fortunas so medidas bem-vindas e que auxiliaro no equilbrio fiscal e social do Pas. O financiamento do "Renda Mnima", bem como "Bolsa Escola" e demais programas assistencialistas, no poderia suceder desvinculado de um programa de planejamento familiar, evitando que o Estado sustente a irresponsabilidade reprodutora, que apenas gera mais excluso social. A desonerao do setor produtivo, a noventena sobre novos impostos e a proibio de regulamentao de matria tributria por medida provisria j rejeitada so medidas que deveriam fazer parte da reforma, mas o Governo reluta em aceit-las. A CIDE, por fim, mais um instrumento de explorao do contribuinte, que j se v responsvel por sustentar uma estrutura obsoleta de Estado, que emprega muito mais gente do que deveria a maioria por critrios polticos , gasta irresponsavelmente e, de tempos em tempos, quando se v enredada em sua prpria armadilha de gastos, institui mais alguma cobrana, fazendo do cidado escravo de sua incontinncia de dispndios.

De Aura Verborum Outro dia estava a raciocinar sobre as palavras e toda aura, que em torno delas enxergamos. Bem como a aura humana, alguns dizem que vem, outros no. Eu, particularmente, ainda no enxerguei uma em um ser humano, todavia as vejo em muitas palavras. Quando copiando em sala de aula, indaguei-me sobre o sentido daqueles traos tribais, simetricamente ordenados, advindos de um artefato esquisito chamado Bic, que se perpetuava em papiros clorados e pautados, senti-me isolado num mundo artificial, onde talvez somente eu compreendesse o que grafava. Ou talvez nem entendesse, mas escrevesse instintivamente. Comecei, ento, a ler e reler, pausadamente, cada palavra, analis-las morfolgica e sintaticamente, esperando que voltassem a fazer sentido e voltei "realidade". Dentro de nossos padres, passei a ver a dita aura dos vocbulos, pronunciados "a la gacha" por mim, desviado da fala lusitana, que desviara a pronuncia do Latim Vulgar, previamente sido Latim Clssico, adotado pelos romanos como sua lngua dos seus vizinhos do Lcio. E isso o que conhecemos.

10

Cada palavra passou a ter uma vida, enriquecida por no mnimo 2800 anos, repetida incontveis vezes, modificadas de acordo com a necessidade do falante, deturpada pela ignorncia de uns, metaforizada pela rebusca de outros. Conversando com um igual e assimilando que a palavra pronunciada "nitxi" corresponde gramaticalmente lisboeta "noite", admito que os tupis-guaranis, espanhis, js e outros adaptaram a palavra que havia sido moldada por mouros, lusitanos e brbaros germnicos na Pennsula Ibrica, aps a sada dos romanos, que falavam "nox", e que, em algum ponto da histria, aparentava-se com a noite grega "nyx". A linha segue ao lembrarmos que jamais existiu um povo Grego, mas povos helnicos, que buscaram influncias dos gentios, fencios e mesopotmicos, que como africanos so considerados descendentes diretos dos primeiros homindeos. Sendo os gregos e latinos lingisticamente indo-europeus, ho de ter sofrido influncias mais concretas dos povos daqueles lados, que podem ter-se expandi do para os lados da sia Menor, aceitos como colonizadores da Amrica, da at chegar aos... tupis-guaranis e js! Aps essa reflexo, talvez induzida, pus a caneta a traar novamente nosso alfabeto latino, mas agora pesando muito mais. Carregando conscientemente a histria desde a palavra uma vez dita por algum lavrador gacho, que exibia a aura de quando foi bradada diferentemente por algum centurio romano e assim por diante. Bom, as palavras tm aura, mas teriam carma?

A Viagem Certas vezes viajamos. E viajamos. A viagem constitui-se em um processo transcendente que mistura o real e o imaginrio medida que transcorre. Numa viagem ao litoral catarinense, por exemplo, dividimo-nos em sentimento entre nossa sada, o local onde estamos e o destino final, onde j estivemos e j podemos visualizar o caminho. Saber onde realmente estamos relativo, mas mais do que a relao com os lugares que cruzamos sem a menor inteno de parar. Esses so lugares figurativos, inexistentes. So como imagens em um quadro, compem a paisagem visual, porm no so iguais ao mundo que conhecemos. Vemos a Serra do Mar passar pelo nosso flanco visual sem atribuir-lhe qualquer condio de realidade. No cogitamos a possibilidade de l sermos presentes em verdade, seno da forma como podemos enxergar-nos no espao, flutuando. Eis que no temos comprovao de suas existncias, a no ser por uma viso longnqua, mas nada nos impede que possamos imaginar nossa presena por l, fora do real. Ao terminarmos de beber uma latinha de Coca-Cola que, providencialmente, acaba de pr fim a nossa sede, jogamo-la pela janela do carro, rumo, qui, a um universo paralelo, onde

11

certamente tal lata no cair. Atiramo-la ao infinito, fazemo-la desintegrar-se num vcuo, jamais pensando em sua realidade ou seu pouso em um lugar real. Hora depois, por efeito do maldito contedo da lata, que no mais faz parte de nosso mundo, somos compelidos a parar beira da estrada para eliminarmos a Coca, convertida em gua e uria. Nesse momento, os carros convertem-se em figurantes e passam por ns sem qualquer coeficiente do real, pois a realidade agora transferiu-se para a vala lateral da via, o matinho onde fazemos nossa necessidade fisiolgica e h, inclusive, uma latinha de Teem, esmagada no asfalto, mas ainda reconhecvel. O odor das araucrias, adiante da cerca que inflige uma qualidade de propriedade ao territrio alm-mijo, tambm real e confirma-nos a existncia daquele cenrio. Embarcamos novamente e no mais vemos a lata de Teem, sendo o cenrio agora pastoril. As raras presenas humanas nas habitaes ao redor apenas ressaltam a vivacidade do quadro buclico de Van Gogh que visualizamos. O tempo, por sua vez, tambm inexiste. , pois, uma abstrao completa, visto que permanecemos encerrados no mesmo ambiente, sem nos movermos. Quem est em movimento o carro em relao a uma paisagem irreal. No h, portanto, referencial de movimento nem tempo. Descendo, enfim, em Floripa, vemos uma cidade que em nada comprova nosso deslocamento real, exceto dar-nos uma idia de perodo imensurvel de tempo vivido em um brinquedo de parque de diverses. O diferente cenrio real onde pisamos assume somente a condio de diferente do cenrio inicial, mas nem tanto. Afinal, j estvamos em Santa Catarina quando partimos.

Contexto: a Enecos (Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicao) e o FNDC (Frum Nacional pela Democratizao da Comunicao) realizam a Semana pela Democratizao da Comunicao. De vis marxista, no acolheram to felizes minha contribuio textual crtica quanto outros textos.

Democratizar a Comunicao Aproxima-se a Semana pela Democratizao da Comunicao sem que ainda se tenha claro o que isso significa. Via de regra, confunde-se o termo com fazer com que os meios de comunicao e suas prticas atinjam o maior nmero de pessoas possvel. Isso no democratizar, sem o sentido pejorativo da palavra vulgarizar a comunicao. idia de democracia intrnseca a execuo do controle, do domnio da populao sobre o modus faciendi e o modus operandi de algo. O mesmo tambm deveria ser considerado quando se fala em comunicao. A democracia seria o poder de deciso e influncia do povo sobre o que produzido e o que vai ao ar pelos meios de comunicao social. Dessa forma, ter-se-ia de concordar que programas dominicais como Gugu e Fausto ou um Dirio Gacho so a vitria da democracia sobre a tentativa de elitizar a comunicao, fazendo com que, autoritariamente, todos tivessem que ser submetidos ao que ns, que no gostamos do Fausto, preferimos ver.

12

No obstante, essa viso simplista que serve para alertar sobre a diferena entre querer vulgarizar o que nos interessa e democratizar, de fato, a comunicao no satisfaz a necessidade de promover essa democracia para alm dos ndices de ibope. Compreendendo que s livre para decidir aquele que tem acesso s diferentes vises sobre uma questo, pressupe-se que a democratizao da comunicao passe, necessariamente, pela vulgarizao do direito a ser informado por diversas vertentes de entendimento sobre os fatos do dia-a-dia. Assim teramos pessoas em condies de refletir e optar pelo que preferirem. A democracia algo alm de fazer o outro pensar como ns, mas propiciar-lhe a condio necessria para dizer que estamos certos ou errados. Se no se tem por certo o que realmente a "democratizao da comunicao", sabe-se que, meramente, espalhar as idias daqueles com quem concordamos antidemocrtico. Alis, autoritrio e totalitarista.

Contexto: utilizo-me de notcia veiculada na imprensa, sobre me de criao que havia roubado seus filhos de suas mes biolgicas, para rebater a defesa da ditadura Pinochet por companheiros em um grupo de discusso.

Pinochet e Dona Vilma Talvez muita gente no entenda o porqu deste ttulo, pois em nada associariam o ditador chileno quela senhora que seqestrou seus "filhos" na maternidade. De fato, pouco h em comum entre eles. Porm, na poca em que o caso da dona Vilma veio tona, houve pessoas que se dispusessem ao debate ridculo sobre ser ou no ser uma pessoa m aquela que rouba filhos dos outros, mas deles cuida com o maior carinho. No faltava quem dissesse "ela roubou, mas sempre foi uma boa me". J no Chile de Salvador Allende que no era nenhum santo , o poder legtimo era do presidente eleito que, embora censurado pelo congresso e desrespeitando a Constituio daquele pas, revestia-se do poder de autoridade mxima nacional. Eis que um militar, travestido de salvador da ptria, roubou a criana de Allende por meio de um golpe militar, passando a comandar o pas com "mo-de-ferro", tudo em nome da proteo do pas. Junto a isso, veio o surgimento da economia mais estvel da Amrica Latina e a construo de um dos melhores lugares para se viver no Continente at hoje. Atualmente, os defensores de Augusto Pinochet exaltam seu regime com base nos feitos econmicos, no lhe obstando a tomada ilegtima do poder e todas as perseguies contra adversrios polticos e as mortes por ele provocadas. E a dona Vilma? Pois bem, valendo-se da coerncia lgica, imagino que essas mesmas pessoas que bajulam o general chileno, diriam que a senhora, que roubou filhos dos outros e os criou com a mesma obstinao com que Pinochet conduziu seu pas, digna dos mesmos louros que tributam ao senhor de farda. Ou, quem sabe, eu apenas fiz uma associao realmente sem sentido.

13

Aspiraes Megalomanacas Notcia publicada no jornal americano The New York Times, neste domingo, merece ateno especial e uma anlise mais ampla. A matria d conta de uma resistncia brasileira a inspees nucleares, aps comunicar a inteno de comear a produzir urnio enriquecido at o ano que vem. Ao que se sabe, o programa nuclear brasileiro um pattico trabalho em cima de reatores e tcnicas ultrapassados. Por que, ento, tal indisposio? Medo de que o resto do Mundo saiba que nada se sabe? Muito dificilmente. Os argumentos tupiniquins para no se abrir a inspees so legtimos. um membro regular de todas as organizaes mundiais e no participa de uma guerra h sculos. Sendo assim, no haveria a necessidade de submeter-se a um "protocolo adicional", como fizeram Iraque e Lbia. Sim, diplomaticamente no h motivos para se discutir a posio brasileira. Porm, hora de se questionarem algumas verdades. Quem tranqilizou o jornalista do NYT, dizendo que o enriquecimento de urnio tem como finalidade abastecer alguns reatores de pequeno porte, foi o Ministro da Cincia e Tecnologia, Roberto Amaral. O mesmo que disse, ao incio de 2003, que o Brasil deveria construir uma bomba atmica. Lula criticou publicamente o Tratado de No-Proliferao Nuclear em campanha. Deve-se pr em dvida, ento, tambm a suposta vocao pacfica do Pas, pois, todas as vezes em sua histria, quando se esgotaram (ou no) as vias diplomticas, o Brasil no pestanejou antes de entrar em uma guerra. Foi assim na expanso de fronteiras, na tomada do Acre, na Guerra do Paraguai e na Segunda Guerra. Ou seja, se o Brasil no entrou em muitas guerras, foi porque no teve muitas oportunidades. Ento, chega-se principal verdade em questo. O Brasil um pas de aspiraes megalomancas. Sempre foi. J nasceu como um imprio, buscando expandir-se sobre os vizinhos. Um tpico caso de imperialismo. Todas as vezes em que se fala sobre os anseios brasileiros, os termos ufanos falam de uma "grande potncia", um "gigante adormecido, um "pas-continente", e assim por diante. O hbito de falar mal do pas entre os nativos, talvez se deva muito mais a um recalque por no ser tudo que sonham do que a um sentimento de pequenez. Nunca passou pela cabea dos brasileiros construir um pas razovel, onde se tivesse uma distribuio de renda adequada e s. No, a vontade sempre de tornar-se um bero de poder, capaz de rivalizar com as grandes potncias, mandar em todo o continente e delrios do tipo. Portanto, no me admira que os Estados Unidos sejam vistos como um vilo imperialista, mas as ingerncias brasileiras em questes de outros pases e a suposta liderana brasileira na Amrica do Sul sejam aplaudidas, bem como o gigantismo da indstria nacional, o PIB de primeiro mundo e tudo isso sem mudar em nada a vida da maior parte da populao.

Debaixo do Vu Semana passada, o presidente francs, Jacques Chirac, entregou a seu parlamento projeto de lei que probe o uso de smbolos religiosos como vus e quips em salas de aula do pas. A

14

deciso foi um misto de ignorncia e imprevidncia sobre um assunto que no se esgotar na subscrio lei. A lei, respaldada pelos cristos da centro-direita francesa, propunha-se a desempenhar um papel de inibidor de manifestaes poltico-religiosas nas escolas e, tambm, mandar um recado negativo aos fundamentalistas. Em um pas onde grande parte da populao de imigrantes vem de pases muulmanos, como Arglia e Marrocos, a deciso acendeu a chama da polmica, deu maior campo de atuao aos extremistas e acabou atingindo os aliados do Governo cristos e judeus. A partir de uma anlise simplista, baseada na constatao de que estudantes no-islmicos trajavam smbolos da religio como forma de protesto s ocupaes da Palestina e do Iraque, creram os polticos franceses que a vedao lhes bastaria. No obstante, o uso de algum tipo de cobertura cabea nas religies judaica e muulmana uma orientao a ser seguida pelos praticantes e no, como no caso dos crucifixos tambm proibidos, se em "grandes dimenses" , uma mera demonstrao pblica de f. Um devoto de uma dessas religies do Oriente Mdio que no se traje adequadamente, estar infringindo uma determinao religiosa e, por meio desse impedimento, o Estado passa a interferir em questo restrita Religio e rompe com a tradio ocidental de separao entre Igreja e Estado. No demorou para que surgissem reaes intempestividade dos polticos franceses. Lderes religiosos iraquianos j recomendaram boicote a produtos franceses em decorrncia da deciso e extremistas j manifestaram sua indignao por meio de ameaas. Em um momento delicado de terrorismo no Mundo, o Governo Francs deveria ter sido mais cauteloso ao, em um s golpe, atrair a insatisfao de secularistas e fundamentalistas, judeus, cristos e muulmanos.

A Imprensa no Bolso Os boatos que pairam sobre a imprensa rio-grandense sobre uma provvel demisso de seu colunista poltico, Jos Barrionuevo, apontam para o perigoso risco de a imprensa ser "encampada" pelo Governo Federal. Sempre foi gritante a antipatia que os principais grupos de comunicao brasileiros tinham para com o PT, chegando a seu pice no famoso episdio do debate entre Lula e Collor em 1989. No Rio Grande do Sul, representantes desse antipetismo eram os principais comentaristas da Rede Brasil Sul (RBS) e sobre isso no restava dvida. Eis que, recentemente, a esquerda toda tem ficado perplexa pelo surto de simpatia e corte feita pela grande mdia ao partido governante. A posio da Rede Globo, durante o perodo eleitoral, e principalmente aps as eleies, tornou-se amplamente favorvel ao Governo e seus personagens. Por qu?

15

Analistas comentam que mesmo as maiores empresas de comunicao do Pas no tm, hoje, autonomia financeira para emitirem apenas opinies prprias. As dvidas do setor so imensas e o jornalismo est refm de seus patrocinadores. Pois, ento, surge o Governo, misteriosamente, com uma espcie de Proer para ajudar as redes de comunicao a sarem do poo. Benevolentemente, so oferecidos fundos para a recuperao dessas redes, sendo que, a mais endividada de todas , claro, a maior delas. Acontece que tudo tem um preo. Quando os meios de informao de um pas tm de pensar duas vezes antes de divulgarem uma informao contra seus governantes, h privao de informao. Isso no compatvel com um regime democrtico, onde o acesso s informaes deve ser garantido a todos os nacionais. Todavia, o pior desse quadro olhar para trs no tempo e no restar dvidas de que a maior parte das grandes empresas de comunicao no Brasil poderiam ser coniventes com qualquer ao do Governo em troca de favorecimentos. Olho aberto!

A Reforma Universitria Pouco se sabe sobre as bases do sigiloso projeto de reforma universitria proposto pelo ministro Cristovam Buarque, mas do pouco que tem falado imprensa, foi possvel pinar um ponto muito interessante e frtil para o debate, que levar em conta a necessidade do profissional ser formado gratuitamente. Antes de tudo, um debate ideolgico, como disse o ministro, "lindssimo". Apesar de sabermos que a deciso final ficar a cargo dos dirigentes governistas, se o assunto for trazido pauta de debates da sociedade, veremos os mais puros debates ideolgicos calcados em vises de Estado. H sentido em o Estado custear a formao de um profissional que abunda no mercado de trabalho? Esse dinheiro no deveria ser realocado na busca de profissionais que tragam maior retorno ao pas? Se as universidades particulares j do conta da oferta de vagas procura por cursos como Medicina e Direito, no deveria o Estado entregar-lhe esses cursos e cuidar de outros? Essas so as indagaes do Ministro e delas que partem as argumentaes. Poder-se-ia tomar como base para o debate as vises de tamanho do Estado e perguntar: a iniciativa privada deve agir onde o Estado incapaz, o Estado deve agir onde a iniciativa privada incapaz, s a iniciativa privada deve agir nessa rea ou o s o Estado deve agir nessas reas? Apesar de serem pontos-de-partida bastante antagnicos, dogmticos, possvel apontar relevos da realidade do assunto. Fato que a Universidade Pblica agoniza h anos, est muito longe de suprir a demanda por vagas e o ensino pblico extremamente dispendioso para os cofres pblicos. Tambm verdade que, graas sua viso de mercado, as universidades particulares suprem com folga e qualidade a demanda por essas vagas, mas seu custo elevadssimo para os alunos. Dentro da lgica capitalista, nunca faltaro vagas para esses cursos no ensino pago. Enquanto houver demanda para pagar mil, dois mil reais por ms para se formar em um curso que j

16

tem um mercado abarrotado de profissionais, sempre haver abertura de vagas nessas universidades. Numa viso global da sociedade, visvel que a "superproduo" de profissionais em certas reas gera um exrcito de desempregados. O Estado, para isso, teria como ferramentas de interveno o fechamento de cursos pagos o que seria uma medida arbitrria e ilegal , que acarretaria em perdas gigantescas para a economia, ou poderia fechar seus cursos, com desafogo de recursos e sem dficit na formao de profissionais da rea. No caso de setores que demandem um aumento no nmero de formados como o magistrio, por exemplo , s a abertura de vagas, sem a melhoria das condies de trabalho, no ser a soluo, mas inegvel que a oferta de cursos gratuitos aumentar a procura. Por exemplo, o fim do vestibular para medicina levaria a uma migrao de estudantes para reas afins, mais carentes de alunos. claro, os liberais rechaariam a idia de interveno estatal, os socialistas exigiriam uma ampliao do sistema de ensino para acolher a todos, mas do debate podem fluir novas perspectivas, que sero muito teis sociedade brasileira. E esta uma discusso que est apenas comeando.

A Posio do PDT O PDT publicou, enfim, sua deciso de deixar a base do Governo Lula. Era mais do que esperado, era sabido por todos. O PDT assume, novamente, sua posio preferida. Volta a ser oposio sem responsabilidade. O momento histrico que vive o partido de Leonel Brizola de dar d. H anos que a sigla vive de prometer mundos e fundos, perder em primeiro turno, aliar-se aos vencedores e saltar do barco aps alguns meses. O PDT se sente mais confortvel criticando do que propondo. Sob o relho do ex-governador, que fez fama por suas medidas controvertidas, o PDT se arrasta desde a ditadura como um partido que no concorda com nada e critica tudo. Foi assim com os militares, com Jos Sarney, com Fernando Collor e Fernando Henrique. O maior obstculo agradvel condio de garantir "mandatos permanentes" de oposio, foi o fato de, nos ltimos 20 anos, o PT ter tomado o lugar de "partido oficial das crticas a tudo que a est". Brizola teve de dividir palanque com Lula para gritar "fora Collor" e satanizar "esse neoliberalismo do Fernando Henrique". O mesmo aconteceu em nvel estadual, salvo quando bagunou o sistema de Educao do Rio Grande do Sul no governo Collares. Bastou um ano no Governo Lula para que o velho caudilho vislumbrasse a possibilidade de tomar o lugar da tmida e deslegitimada oposio de PSDB e PFL. Os artigos de Brizola publicados nos jornais de todo o Pas j indicavam que o discurso seria o mesmo. Se trocssemos o nome Lula por Fernando Henrique pensaramos ser um discurso antigo. Agora, de volta macia poltrona de oposicionista, o PDT se apronta para 2004. Esperamos que, ao invs de simplesmente bradar frases surradas e sem sentido, o partido possa contribuir para a organizao de uma oposio legtima, que faa bem ao pas. D outro modo, teremos dois PTS disputando o ttulo de "adolescentes da poltica".

17

O Rei est Nu s vezes preciso que algum de fora nos aponte o bvio, o evidente, mas que poucos se do conta. Mais que um defeito, isso uma caracterstica natural do ser humano. Quantas vezes j no se compreendeu melhor uma situao pessoal quando vista de fora? Pois em recente seminrio sobre segurana pblica que participei, o nico palestrante estrangeiro do evento indicou um dos grandes problemas do Rio Grande do Sul no trato com seus problemas na rea. Apontou como entrave a priso mental de nossos governantes ao trabalho sob uma viso de "marco Brasil" e apontou o abismo de particularidades do Estado para convidar-nos a tratar nossas questes diferentemente, na condio de pas. Eu iria alm. No apenas na rea de Segurana Pblica que podamos nossa capacidade de progresso por atermo-nos a modelos nicos brasileiros. O Rio Grande uma regio em constante crise de identidade; sempre foi. Agimos como gachos, mas nos vemos brasileiros; sentimos como gachos, mas pensamos como brasileiros. Independentemente da condio poltica, deveramos desatarmo-nos das amarras psicolgicas que nos impedem de trabalharmos com autonomia, sob o eterno medo de parecermos separatistas. s favas com as aparncias! O Rio Grande tem necessidades prprias, como Amazonas tambm tem. Se no possvel que apliquemos frmulas iguais para o Sul e o Norte do Estado, como obteremos xito copiando frmulas do Eixo Rio-So Paulo? Urge, pois, uma nova conscincia em nossos administradores, de pensar polticas pblicas em nvel de Rio Grande e aplic-las como tal. A Federao Brasileira pode at nos tachar de prepotentes, auto-suficientes ou at separatistas. Porm, no ser onerada de nossa (enorme) contribuio em impostos e ser presenteada com iniciativas paradigmticas. Ns, em contrapartida, estaremos tratando mais adequadamente nossos cidados.

Contexto: a BBC publica matria contra Tony Blair, com desmentido subseqente e demisso dos responsveis.

No fui Eu Interessante o caso envolvendo a absolvio de Tony Blair no caso Kelly e a demisso de funcionrios da BBC como conseqncia. Permite-nos reavaliar alguns pontos e fazer comparaes e conjeturas. O cientista que teria afirmado emissora londrina que Tony Blair tinha conhecimento de Saddam Hussein no ser o perigo que alardeava e que se suicidou logo em seguida foi motivo de muita especulao envolvendo o nome do primeiro-ministro ingls. Uma investigao parlamentar se seguiu para apurar o grau de envolvimento de Blair no caso, sendo totalmente inocentado no chamado Relatrio Hutton. Revelada a apurao, as primeiras medidas tomadas pela televiso inglesa foram as destituies do jornalista que fez as acusaes e do diretor da programao que as veiculou. Convm neste momento ressaltar o profissionalismo da BBC. A emissora estatal (um dos ltimos ranos do poder do Estado sobre os indivduos ingleses) teve uma postura isenta

18

diante dos fatos, sendo capaz de veicular acusaes contra seu chefe-mor. Dadas como falsas, no titubeou e puniu os responsveis por elas. Apesar de alguns oposicionistas ingleses creditarem a absolvio de Blair a presses polticas, a exonerao de Dyke foi mais prejudicial imagem do premi, cuja renncia era mais desejada pela opinio pblica do que a queda do carismtico editor. Num caso semelhante, como procederiam as emissoras brasileiras? Em iguais dimenses, apenas conjetura-se, mas possvel lembrar dos episdios Fernando Collor e Ibsen Pinheiro, absolvidos pela Justia comum, sem uma palavra de retratao nos meios de comunicao que veicularam suas culpas. No cabe discutir se eram ou no culpados. A Justia declarouos inocentes. Entretanto, a maior rede de televiso brasileira, protagonista central da queda do expresidente, insiste em atribuir ao povo o carter revolucionrio de sua derrubada. De um jornalismo que produz pseudo-heris como Tim Lopes o jornalista fazendo o papel da polcia, sem o devido treinamento para tanto e zombando do poderio dos criminosos at que lhe mostrem quem realmente manda poder-se-ia esperar reao semelhante ao caso britnico? Ou ser que veramos (novamente) a omisso dos nomes ou a exaltao dos reprteres?

Contexto: o Brasil eliminado do Pr-Olmpico no Chile. A derrota da seleo, tida como superior e que vinha de timos resultados, surpreende o pas.

Argentina, Uruguai e Paraguai. D-lhe. Nada mais lindo que outra eliminao brasileira no futebol. Um pas que ainda no aprendeu que o futebol evoluiu e tornou-se algo srio, disputado e ganho pelo que mais se dispuser a ganh-lo, realmente merece perder sempre. Belos tempos de Garrincha e Pel, onde as equipes jogavam com quatro, cinco atacantes e ganhava o que tivesse maior habilidade. poca em que o futebol "profissional" era uma mera pelada. Passados 46 anos do primeiro ttulo mundial conquistado pelo Brasil, o futebol tornou-se um esporte altamente profissionalizado, onde no h espao para displicncia, amadorismo ou puro "futebol-arte". Apesar dos ttulos conquistados com selees equilibradas taticamente (70, 94 e 2002), o brasileiro ainda no aprendeu que reunir peladeiros de habilidade no ganha ttulo. A cada eliminao brasileira de algum campeonato, o diagnstico sempre igual: o time brasileiro tecnicamente superior, faz belssimas jogadas, marca preguiosamente, d dribles adicionais desnecessrios, ganha de meia-dzia de mortos e perde para um time que joga com corao, dedicao, marcao e objetividade. Mas o brasileiro no aprende. Uma seleo que tem Robinho e assemelhados garantia de um futebol bonito, de chapeuzinho na lateral do campo, de drible no crculo central, de belas jogadas e de goleadas contra equipes de fraca capacidade ofensiva. Porm, deixar o adversrio jogar, no saber como se comportar diante da catimba, marcar distncia e montar agrupamentos (ao invs de equipes) de jogadores habilidosos a garantia de derrotas "surpreendentes", de cartes

19

desnecessrios e eliminaes. O brasileiro, ao contrrio do gacho, foi brindado com uma natureza de jogadores espetacularmente habilidosos, mas sem nenhuma noo de coletividade. Seguro de sua superioridade, para ganhar, apenas entra em campo. Simultaneamente, a maioria dos pases sul-americanos carece de craques, mas - exatamente por isso - tem conscincia de sua limitao e dispe-se a dar sangue por uma vitria. Foi o que vimos, mais uma vez, no Chile. Apesar de contente com mais um fracasso do amadorismo futebolstico brasileiro, no tenho esperanas de que (mais) esta lio mude o modo que os brasileiros concebem o futebol. Continuaro acreditando que futebol profissional e pelada so a mesma coisa, que futebol objetivo desprezvel por que feio, que dedicao violncia e que habilidade (sem garra) ganha campeonato.

Contexto: Lula criticava a possibilidade de renovao de acordo com o FMI enquanto o mesmo era ratificado.

Tergiversando Durante os anos 8 a 1 a.L. (antes de Lula), ou seja, sob a dinastia Cardoso, costumava-se rir dos aplausos efusivos que o ex-presidente Fernando Henrique recebia em seus habilidosos discursos em viagens internacionais, atacando as desigualdades e contando como fazia por aqui. O motivo dos risos era, obviamente, a constatao de que a fala de FHC no correspondia s expectativas internas do Pas e que seu jargo sociolgico servia apenas para agradar europeus que se sentiam culpados em relao pobreza terceiro-mundista. J atravessamos 25% do mandato de Lula, sem que se possa dizer que suas aes no governo tenham sido condizentes com seu discurso. Porm, a cada viagem nacional ou internacional (ultrapassando o criticado nmero de seu antecessor), o atual presidente repete seu discurso de campanha, de posse, do Frum Social Mundial (todos), do Frum Econmico de Davos e todos os outros realizados anteriormente. Por que ningum ri? Talvez estejamos ainda inebriados pela overdose de propaganda (ou seria publicidade?) realizada em campanha, e continuada aps a posse, ou tambm anestesiados pela recente simpatia dos grandes meios de comunicao pelo ex-operrio. Seja como for, quem no se ativer apenas aos releases da assessoria de imprensa do Governo Federal, ao discurso de seus membros ou a seus programas de rdio e televiso, constatar que estamos frente a uma gesto que vive to-somente do carisma do presidente. Em linguagem futebolstica como gostaria nosso chefe maior , trata-se de um time ruim, onde o "craque" joga para a torcida, driblando e perdendo gols, mas fazendo a alegria dos aficionados. Aps um ano no comando do Pas, j possvel contabilizar uma srie de exemplos, nos quais a "parte suja" do servio era feita pelos serviais do Governo, enquanto o camisa 10 dava janelinhas lateral do campo. Se perguntarmos "torcida", quem so os pernas-de-pau do time, a escalao sair de cor (Berzoini, Benedita, Palocci, Dirceu, Genoino...), mas, ao contrrio do que pensa o senhor

20

presidente, este no um jogador que pode ficar alheio ao que faz o resto do time. o treinador. possvel que o comandante mximo da Nao discorde da poltica econmica de Palocci, com a viagem de Benedita (autorizada por ele), das medidas anunciadas por Berzoini, da mo-de-ferro de Dirceu e Genoino? Ou estaramos diante de mera tergiversao? No sei, mas enquanto o representante do Governo (Jos Dirceu) anunciava o acordo com o FMI, Lula discordava em outro continente. Ao final, o acordo foi ou no firmado?

Contexto: a imprensa explora as falhas de investigao da polcia aps a priso de ru confesso de abuso e assassinato de vrios menores no norte do Rio Grande do Sul.

Retratos da Insegurana Cena inusitada: venho pela calada quando avisto uma viatura policial, quase em frente sinaleira, parando com um problema no cmbio. s pessoas que passam, vendo a cena, abrem um discreto sorriso. Um policial desce do carro para empurr-lo. Ningum esboa qualquer movimento no sentido de auxiliar, como talvez fizesse caso isso ocorresse com um cidado comum. Eis como vista a polcia. H indcios copiosos de que a populao enxerga as instituies policiais como meras foras repressoras, jamais como um aliado. Situao acentuada em regies de periferia. Tenha-se em mente tambm que uma quantidade absurda de crimes ocorridos sequer comunicada s autoridades competentes. *** Outra desateno. A opinio pblica surpreende-se com as falhas na investigao dos crimes de Soledade, quando, na verdade, a repercusso do caso apenas serve para expor dificuldades dirias, repetidas em centenas de outros casos que no ganham manchetes nacionais. Fruto de dificuldades financeiras, descaso ou o que for, as condies de trabalho que envolvem a Justia so precarssimas. Em um pas onde um total nfimo de crimes solucionado, as luzes sobre o caso do manaco no norte do Estado evidenciam os motivos e os passos que conduzem ausncia de soluo dos delitos. A falta de profissionais indispensveis (exemplificada na demora com os exames de material gentico recolhido), a falta de coordenao entre as unidades (sendo Adriano da Silva suspeito de crimes em vrias cidades), a carncia de efetivo policial (com a priso obtida apenas quando de uma mobilizao policial extraordinria) e diversos outros entraves eficcia dos meios de que dispe a sociedade. Outrossim, convm recordar que algumas das crianas tornaram-se vtimas por estarem permanentemente nas ruas, desguarnecidas, atrs de esmolas ou programas sexuais. Isso chama ateno a outro ponto fraco da sociedade, que vitimou esses meninos e muitos outros que a falta de polticas sociais eficazes. No todo dia que aparece um serial killer para trazer luz um sem-nmero de falhas do Estado. Faz-se mister ento, que o fato seja analisado de forma ampla, servindo de exemplo

21

para a soluo do assalto padaria na esquina at novos adrianos. Ou, fatalmente, estaremos repetindo estas mesmas queixas daqui a um tempo.

Contexto: os EUA passam a exigir que cidados de diversos pases (Brasil entre eles) sejam identificados e fichados ao ingressarem no Pas. A Justia Federal brasileira exige que se faa o mesmo com os estaduindenses.

Qual o problema? Notcia que vem repercutindo na imprensa brasileira e mundial, o fichamento recproco de cidados estadunidenses e brasileiros em ambos os pases no pode ser visto da maneira que vem sendo. No estamos tratando apenas de uma questo de egos. Se o governo dos Estados Unidos no excluiu o Brasil da lista de pases cujos nacionais deveriam ser identificados com maior cuidado, no foi por acaso. Os analistas que vm defendendo que no h explicao para tal ao so desinformados ou omissos. sabido que o passaporte brasileiro o mais valorizado no mercado negro, pelo fato de qualquer pessoa poder passar-se por um, dada a caracterstica multirracial do pas. No bastasse isso, h anos que sabemos que existe, de fato, o livre trnsito de terroristas na regio da Trplice Fronteira, mas, irresponsavelmente, insistimos em negar, quando o correto seria agir com firmeza na fiscalizao e no deixar margem para pas algum pr em dvida a segurana na regio. H tambm o aspecto poltico, visto que o governo Lula vem cortejando seguidamente naes que contam com pouca simpatia do governo norte-americano, mas, principalmente, que possuem um histrico de patrocnio ou apoio ao terrorismo, como Lbia, Cuba e a prpria luta palestina. Sem contar que a negativa de Lula em considerar as FARC grupo terrorista ainda no foi digerida. Razes, portanto, abundam para a preocupao ianque, ainda mais depois que o chefe dos assessores do presidente, Marco Aurlio Garcia, numa declarao infeliz e desnecessria, ofereceu asilo a Saddam Hussein. Provocaes infantis, de criana birrenta, resultaram na incluso brasileira, muito mais justificada que a da frica do Sul, por exemplo, tambm integrante da lista. O que passvel de discusso que pases como Alemanha, Frana e Espanha, com srios problemas com terrorismo, estejam fora. No entanto, a sentena da Justia Federal, que devolve na mesma moeda a atitude estadunidense que vingana, sim, e no reciprocidade diplomtica tambm justificvel. Se um pas suspeita dos habitantes de outro, por que a recproca no pode ser verdadeira? Se os brasileiros so constrangidos ao desembarcarem nos EUA, qual seria o argumento para que no o fossem os americanos aqui desembarcados? No final, ganham os americanos, prevenindo-se de eventuais terroristas e ganhamos ns, em termos de segurana. Afinal, o pas do norte no tem um histrico de produzir terroristas, mas serial killers...

Por que el Che no me apetece comum ver pelas ruas, dezenas de jovens socialistas, trajados com camisetas estampadas com a mais clebre das fotos do rebelde comunista Ernesto Guevara. Alguns por mero

22

impulso capitalista de fashion ter uma camiseta do Che, vou comprar, alguns por reverncia ao lado vitorioso (?) de uma causa fracassada e outros por motivos que Freud h de haver compreendido. Digo que, apesar de ser um jovem e ex-socialista, o Che no me atrai. O que temos de fatos concretos da vida desse to-admirado argentino no nada admirvel. Um rastro de sangue em vrios pases, incluindo sua mania de fuzilar os companheiros que dele discordassem. Alm de alguns (bons) poemas, isso que o homem Guevara legou de tangvel para a humanidade. Dentre as razes daqueles que lhe rendem homenagens mil excetuando-se a necessidade psicolgica por dolos est o culto a uma personalidade. E bem possvel que um homem que pregou que se endurecesse sem perder a ternura, tivesse algo de belo por dentro, que visse no matar apenas um dever, que se identificasse no outro. Todavia, quem, de perto, no um pouco bom e um pouco ruim? Heris e dolos no passam de pessoas normais com um plus que outros julgam digno de louvor. Mesmo alguns dos maiores facnoras da Histria foram reconhecidos por aqueles que com eles conviviam como pessoas maravilhosas; bem como grandes personalidades morreram odiadas por seus familiares. Indago-me quem seria mais merecedor de seu sucesso entre seus fs, se um assassino que pregava ou se um cantor de sucessos pop? Guevara nos deixou uma bela lio do que o fanatismo capaz e alguns belos poemas. A..., citemos, Britney Spears, nos deixa diversas msicas de qualidade duvidosa, mas no fez mal a ningum. Eu, pessoalmente, acho a Bit-bit mais bonitinha... Por fim, h quem veja em Che, o mrito de algum que se doou plenamente quilo em que acreditava. Vocs pensam nisso como um mrito? Eu no. No posso exaltar um fantico que pressupe que sua causa justa o suficiente para legitimar a morte de semelhantes. Todo fanatismo s pode tornar-se prejudicial queles que no compartilham de suas idias, sejam quais forem. Como disse Nietzsche, a maior inimiga da verdade no a mentira; mas a convico.

Contexto: em meio a denncias de corrupo na gesto de Lula, a base governista desvia a ateno pblica culpando o sistema poltico e oferecendo como soluo uma reforma poltica onde o Estado custeie as campanhas e o voto seja em listas de candidatos escolhidos pelos partidos.

Financiamento pblico e lista? Comigo no! Ano vai, ano vem e as bravatas na poltica continuam as mesmas. Eu j vi algum criar uma taxa PROVISRIA sobre as movimentaes financeiras para ajudar a sade e cri. J vi algum dizer que o dinheiro das privatizaes sanaria parte da dvida e cri. J vi algum pregar que representava a moral e a tica na poltica e cri. Chega de ser idiota! Depois do recente episdio da Reforma Tributria, onde se dizia que ela desafogaria todo mundo, s vi os bolsos do senhor Waldomiro Diniz desafogados. O Estado do Rio Grande do Sul, que estava em estado pr-falimentar, foi definitivamente bancarrota. E a reforma que centralizou mais ainda a arrecadao contribuiu com isso. Agora, alm da proibio dos bingos que alm de causar um desemprego imediato de centenas de milhares de pessoas, certamente no acabou nem acabar com as operaes de

23

lavagem de dinheiro aparecem mais duas solues mgicas para o Pas, que seriam o financiamento pblico das campanhas e a votao por lista. Em um pas onde a arrecadao de impostos beira o assalto ao contribuinte, defende-se a idia de que usar o dinheiro pblico (algum falou de onde sair?) para custear campanhas eleitorais resolveria o problema das irregularidades nas mesmas. Anos atrs, talvez cresse que, pela providncia divina, dar mais dinheiro queles que o desviam os faria pensar que j tm o suficiente e no valeria a pena desviar mais. Hoje no. Se grande parte do dinheiro arrecadado, diz-se, desviado para caixas 2, ou omitido de prestaes de contas, por que a sangria haveria de ser estancada pelo simples recebimento de dinheiro pblico? Estamos pressupondo um respeito pelo dinheiro do contribuinte? No me parece que o dinheiro levantado pelo senhor Diniz tenha constado nas prestaes de contas dos candidatos para quem arrecadou. Quanto votao em listas, no deveria nem ser debatida em um pas que diz viver sob uma democracia. Trata-se, simplesmente, de negar ao eleitor o direito de votar no candidato que preferir, passando s cpulas de dirigentes partidrios o poder de deciso sobre elas. At prova em contrrio, creio na diferena entre os seres humanos e que essa diferena seja o grande propulsor dos avanos da humanidade. Restringir as candidaturas a ordens burocrticas que devem passar pelo cunho da convenincia partidria significa relevar a segundo plano a importncia que podem ter as idias prprias e a identificao que essas possam ter junto ao eleitorado. Em suma, entre escolher dentre as propostas de um candidato (que so variadas entre candidatos de um mesmo partido), serei obrigado a optar pela legenda que menos me desagrade, caso nenhuma me agrade, e ela decidir qual candidato merece meu voto.

Contexto: Lula prope a criao de um conselho de controle externo ao Poder Judicirio.

Controle Externo no Executivo? Quando era guri, minha me me contou uma estorinha sobre dois homens que carregavam seus defeitos em mochilas. O que ia atrs, apavorava-se com a quantidade de defeitos do que ia frente, mas no podia ver os seus prprios s costas. Ao que parece, a senhora Da Silva nunca contou essa alegoria ao seu filho Luisinho, ou, se contou, deve estar morrendo de vergonha dele. O ex-candidato presidncia, o mesmo que criticou continuamente a falta de vontade poltica daquele que viria a ser seu antecessor, merece dura reprimenda. Pois, se criticava com propriedade, padece do mesmo mal; se no, foi irresponsvel ao olhar apenas para a mochila de Fernando Henrique. Pois, esta semana, na abertura dos trabalhos do Judicirio, o chefe mximo da nao voltou a utilizar sua viso privilegiada sobre os defeitos alheios. A mesma que vem falhando freqentemente na hora de analisar a maioria das reas do Governo. Baseado na estria supracitada, seria conveniente meditar sobre os argumentos presidenciais para o tal controle externo do Judicirio.

24

verdade que h muita burocracia nesse poder? claro que . Exatamente como no mais burocrtico dos poderes, aquele que no apenas a pratica como a incentiva e, agora, est dando inveja ao falecido Stalin pelo que est fazendo com os cargos pblicos do Pas. O Executivo. verdade que muitos juzes se enchem de arrogncia e cegueira em virtude do cargo? Naturalmente. Eis uma triste conseqncia do poder em todas as suas formas. Como no ser com aquele que o homem mais poderoso do Brasil? H corrupo no Judicirio? Infelizmente, h. Ao que sei, em nvel absurdamente menor aqui no Rio Grande. Mas pensem em qual poder vocs acham que h, tradicionalmente, mais corrupo, se no Judicirio, no Legislativo ou no Executivo. J est na hora de algum denunciar a batalha travada pela Presidncia da Repblica para enfraquecer os demais poderes e centralizar decises nas mos da Santssima Trindade (Lula, Dirceu e Palocci), como fizeram essa semana as associaes que representam o setor eltrico. Um pas onde o Parlamento est na mo do Executivo, por meio de trocas imorais por cargos, e os juzes estaro sob um controle de sei-l-quem (provavelmente mais alguns companheiros que paguem dzimo ao Partido), o que temos ditadura.

Nem desonestidade Em qualquer pas do Mundo, seria um escndalo. No Brasil, passa despercebido. Comovente caso apresentado no Jornal Nacional de quinta-feira, onde um faxineiro encontrou dez mil dlares no banheiro do aeroporto e fez questo de devolv-los a seu dono, um turista suo. A recompensa do honesto brasileiro foi conhecer seu presidente, onde recebeu o mauexemplo: primeiro, Lula perguntou se muitos brasileiros fariam o que ele fez, dando a entender que no haja muitos cidados honestos no Pas; depois, disse que se viesse a ficar com o dinheiro, nem seria desonestidade. Ora, em que lugar do mundo apropriar-se do dinheiro alheio no desonesto? Ou, pior, em que lugar do mundo o presidente d uma demonstrao de fraqueza moral e menospreza a maioria de seus eleitores num mesmo dia e nada se comenta no seguinte? Convm lembrar que Lula e seu partido ascenderam ao poder, sob o manto da tica na poltica e a defesa da honestidade. Tambm em seu governo, Waldomiro Diniz era o braodireito do brao-direito do governante-mximo. Se nosso presidente no considera desonesto pegar dinheiro alheio para melhorar de vida como dito , que confiana pode ter o povo em seu mandatrio? Se o chefe-maior da Nao duvida da integridade daqueles a quem governa, s posso concordar com ele, na medida em que foram os prprios que lhe confiaram o governo de suas vidas.

25

Apaixonado Depois de ler e escutar muitos comentrios sobre o polmico filme de Mel Gibson, A Paixo de Cristo, tive enfim a felicidade de assisti-lo. E ainda no entendi por que foi qualificado como polmico. O filme, de teor emocional arrebatador, de um primor nos detalhes e de compromisso histrico incontestvel, o que se percebe quando uma obra to sria a ponto de ser produzida nas lnguas faladas por seus personagens. No conheo aramaico, mas as falas em Latim me pareceram bem apropriadas para os personagens e a poca. Extremamente fiel aos evangelhos e aos relatos histricos formais ou da tradio oral , no apresenta uma mnima falsificao do que se conhece da trama, encaixando adequadamente frases e passagens da saga de Cristo nos momentos apropriados. No fcil segurar o espectador por quase duas horas em uma histria que todos j conhecem, sem adicionar elementos novos e tratando apenas dos momentos finais de Jesus. Aos que tacharam Mel Gibson de cristo fundamentalista pela produo da pelcula, s posso dizer que nada conhecem do Novo Testamento. Aos que encontraram anti-semitismo na obra, apenas o poderiam fazer com uma mente perturbada e desonesta. Mesmo que tentassem a todo custo, no encontrariam nada que justificasse isso, no estando presente nos textos sagrados do cristianismo. S consigo entender como uma tentativa de criar conflito gratuito. No por acaso, as pessoas crists ou no tm sado transtornadas, afetadas pelo filme. Uma produo que no poupa as partes feias e cruis da trajetria do Cristo, da priso cruz, extremamente chocante e real. No h como no se identificar com a pessoa que l sofre. Ainda mais, partindo-se do pressuposto que aquilo realmente aconteceu a algum. impossvel ficar indiferente Paixo de Cristo. um reencontro com a face humana daquele que foi o fundador do Ocidente e base da nossa maneira de ver o mundo. Fiquei maravilhado. Apaixonado.

Contexto: texto irnico ( preciso ressaltar isso neste livro, visto que muitos leitores no entenderam) sobre as crticas da CNBB (Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil) poltica econmica do Governo Lula.

Por uma Nova Poltica Eclesistica As missas no esto sendo bem conduzidas. No tenho como acreditar em um padre que se veste com aquelas roupas, nem que segue um roteiro como o costumeiro para a celebrao. Para comear, no concordo que s haja padres homens. O sacerdcio deveria ser permitido tambm para as mulheres. A explicao bvia. As mulheres so mais simpticas e, se as madres fossem bonitas, aumentariam o nmero de fiis nas igrejas.

26

A cerimnia ento deveria ser totalmente reformulada. O tempo decorrido do incio ao fim muito longo, torna-se enfadonho. Se fosse reduzido para uns 15 minutinhos, tornar-se-ia muito mais agradvel. Poder-se-ia, tambm, modificar a ordem de seus elementos. Primeiramente, far-se-ia a consagrao, com bastante vinho e sanduche. Com os fiis altos e de barriga cheia, comearia o sermo. A Igreja cumpriria, assim, sua obrigao para com a caridade, por meio do lanchinho. Aposto que todos concordam que ficar falando de Jesus, uma cara de dois mil anos atrs tambm no l muito interessante. Poder-se-ia falar sobre Che Guevara e Fidel (que, segundo o Frei Betto, implantou um regime quase cristo em Cuba), que so exemplos muito mais recentes. De repente, at sobre Lula e sua histria de vida. Com palestrantes semanais. Se pensarmos que o lugar tambm no colabora, deveramos transformar as igrejas em algo mais colorido, com uma permanente msica ambiental e dividi-la em salas, com oficinas religiosas para cada tipo de gosto. Alm, claro, de tirarmos aquela imagem desagradvel de um sujeito quase nu, coberto de sangue e numa cruz. Em nome da democracia, desceramos o padre do altar, organizaramos os bancos em forma de seminrio e todos poderiam interromper a celebrao para expressarem seu ponto-devista sobre o Evangelho. Seria a Liturgia Participativa, que brevemente seria copiada como modelo de gesto democrtica da religio. Humildemente, exponho meu manifesto por uma nova Poltica Eclesistica. Como estudante de jornalismo, estou no meu direito de opinar sobre a Igreja, tanto quanto os bispos da CNBB podem dar palpite sobre a poltica econmica do Governo Federal. E o fao com embasamento muito semelhante.

Nostramarx Tive um professor que dava sua aula com vrias pausas entre vrgulas, nas quais dizia: como Marx j previa. Achei que ele confundia Marx e Nostradamus que, dizem, previa tudo. Enganei-me. H uma evidente relao nos comportamentos em relao a ambos. Karl Marx leu muito, interpretou mais ainda e sentiu-se capaz de prever as relaes humanas, sociais, econmicas e, para no perder a viagem, o fim da Histria. Simples assim. Michel de Nostradamus sentou-se frente de sua bacia, viu imagens e sentiu-se capaz de prever diversos acontecimentos futuros, entre eles, todos aqueles que acontecessem. Tudo em linguagem cifrada. Os seguidores do adivinho francs atribuem-lhe a previso de quase todos os fatos relevantes que se nos mostram. Primeira, segunda e terceira guerras, 11 de setembro, o que for. Ao belprazer da interpretao. Se houver uma frase que se assemelhe a algum detalhe comum ao evento, l est o cdigo no qual Nostradamus o previu. J para os seguidores do cientista poltico alemo, o processo muito semelhante. Se uma empresa est bem financeiramente, confirma a previso da mais-valia, explorao do trabalhador etc.; se uma empresa quebra, confirma que o capitalismo incapaz de regular necessidades do prprio mercado e de proteger os trabalhadores da mesma.

27

Exemplo cabal dessa propenso a acreditar em previses de Marx, de forma passional e sem qualquer anlise que no a partir dos dogmas marxistas, a Crise de 1929. Vasto material explicita que, devido s leis imutveis do mercado, o boom da dcada anterior, custeado por emprstimos irresponsveis feitos a esmo e com dinheiro inexistente, associado a fatores da economia internacional (perodo ps-Primeira Guerra) foi a causa bvia e natural da recesso. Exatamente como previsto na cincia das relaes humanas no mercado e no, n O Capital. No obstante, abraados s previses de seu guru intelectual/espiritual, a superproduo capitalista parece ter-se confirmado. Esses vibram, felizes porque conseguiram ver na situao exatamente aquilo que queriam ver. Se fosse s, bastava. Mas no . Com comportamento digno de religiosos fundamentalistas, discutem a obra de Marx e sua interpretao de forma teolgica, buscando aproximar-se da verdade do escritor. Partem ento para a interpretao pura, no melhor estilo dos seguidores de Nostradamus, decidindo o que Marx queria ou no dizer. A interpretao cabe a vocs. Como Deus, Marx para quem acredita. Est dentro de ns e no, no livro. Basta querer encontr-lo e l ele estar. Na Crise de 29, no fim da crise, no governo Lula, talvez at neste meu artigo que se utiliza dos meios de produo dos burgueses e da explorao do proletariado para ser vendido e dar lucro ao porco capitalista do dono do jornal, que vai fazer a empresa crescer ou quebrar, mas confirmando o que Marx j previa.

A Extino do Macho O jornal sueco Dagens Nyheter noticiou na quarta-feira (21/4) o nascimento da primeira rata de laboratrio, filha de duas mes e nenhum pai. Kaguya, como foi batizada, o resultado de uma pesquisa desenvolvida por cientistas japoneses e coreanos, muito significativa para a humanidade. A partir desse feito, j nos possvel imaginar uma sociedade unigenrica, mais ou menos como aquela pela qual suspiravam alguns atenienses, que suportavam suas esposas apenas pelo incmodo fato natural de precisarem delas para a reproduo da espcie. Mas as mulheres que podem sonhar agora. O que h algum tempo j se temia, com previses assustadoras, pode estar virando realidade. No por escolha da natureza, mas por conseqncia histrica. Em breve, os homens tero a utilidade de uma vitrola, um calgrafo ou um lampio. Ou seja, quando no forem meras peas de decorao, sero extravagncia de algum extico. Depois de respirar fundo, contudo, a idia no parece das piores. Uma transio para a sociedade unigenrica ser algo indolor, com embries gerados a partir de pares femininos at que no reste nenhum dos incmodos exemplares masculinos. E tudo para bem do progresso. No preciso queimar fusveis cerebrais para imaginar um mundo sorridente s de mes, com sensibilidade e sabedoria femininas, porm pragmticas e boas administradoras domsticas, o capricho, o fim da resoluo das disputas pela fora bruta...

28

Em pouco tempo, parece, as mulheres podero mostrar todas as habilidades que vm demonstrando j h muito em todas as reas da sociedade, a despeito das resistncias encontradas em decorrncia de uma cultura milenarmente centrada na figura masculina. Interessante como o mundo d voltas... Acontece que, da mesma forma, surgiro os problemas imprevistos. Mulheres havero de assumir as funes masculinas onde nunca tiveram interesse de disputar com eles, como estivador e mecnico entre outras. Sem contar no que seriam duas presidentes discutindo questes diplomticas em TPM. No fundo, acredito que, rapidamente, a cincia (ento dominada por mulheres) descobriria a cura da tenso pr-menstrual e eu no estaria mais aqui para agentar. Enfim, tirando aspectos cmicos ou emocionais, no h mais justificativas para garantirmos o seguimento do nosso gnero masculino na Terra.

Ora, quem gacho? Tenho lido, ultimamente, alguns textos tradicionalistas incrivelmente absurdos. Artigos made in Brazil, ou de cetegistas muy lejos da Campanha. Como filsofos da gauderice, chegam a questionar at mesmo se temos o direito de reivindicar apenas para ns a possibilidade de ser gacho. Est na hora de se colocarem os pingos nos is. A nica coisa que o tal tradicionalismo tem feito de bom para a cultura gacha sua divulgao como pea de mostrurio. E, ao contrrio de preserv-la, apressa seu desaparecimento. tarefa inglria, mas necessria, fazer a distino entre gachos e rio-grandenses. Os gachos SO (e no, foram) o povo que legou a este Estado toda sua herana cultural, identidade e razes. Se, ao longo dos anos, muitas cidades do Rio Grande abandonaram o jeito-de-ser dos crioulos, no deixaram de ser rio-grandenses. O gacho ainda existe e muda, ao contrrio da idealizao de museu feita com o gacho legtimo, apresentado pelo tradicionalismo. Enquanto legislam sobre o comprimento da manga da camisa, h pees de cala vaquero (jeans) e manga curta, ignorando os manuais do MTG. Os gachos no esto em uma reserva indgena; so personagens vivos da histria. Se crissemos um CTI (Centro de Tradies Indgenas), reproduzssemos mini-tabas pelo mundo afora, fizssemos fandangos com msicas tpicas semanalmente, vestidos a carter, no seramos ndios mesmo assim. E enquanto decidissem qual material aceito na confeco da tanga do cacique-patro do CTI, a indiada j estaria andando de calo e camiseta pelas aldeias verdadeiras. O tradicionalismo s reflete a realidade gacha para quem no a conhece. E para esses muito importante saber onde aprender sobre nossas histria e cultura. S no me venham dizer que viraram guascas porque compraram uma fantasia de gacho e leram sobre nossos heris. Hay lugares no Brasil, onde ser gacho virou uma opo, como ser surfista, punk ou mdico. No o . Assim como para muitos rio-grandenses, que decidiram resgatar suas razes

29

(o que j pressupe que as tenham perdido), ser gacho ainda muito diferente de ter nascido no Rio Grande ou ter decorado a nossa histria em algum pago lejano. Como, hace poco, uma amiga minha, prenda e danarina de CTG, mostrou-se incapaz de entender um paisano argentino que, descontando os devidos castelhanismos, falava um espanhol que poderia muy bem ser confundido com o de um xiru do Alegrete. E, ela no sabia, um hermano correntino ou uruguaio tambm gacho. Alis, muito ms que ela (que nunca respirou o ar do Pampa) ou qualquer desses outros que reivindicam agora que abramos mo do privilgio de ser gacho.

E comea a Guerra Antes da invaso, calculava-se a quantidade de tropas leais a Saddam Hussein, previa-se resistncia atroz e dificuldades severas para o exrcito da coalizo. Mas as primeiras semanas de combates desmentiram todos aqueles que, ao invs de tecer comentrios realistas, torciam. Com sucesso total na empreitada inicial, os Estados Unidos depuseram o ditador iraquiano, libertaram o Iraque, pulverizaram a exaltada Guarda Republicana e tiveram tempo de planejar a administrao interina do Pas, enquanto saques e pilhagens aconteciam. Alguns torcedores ficaram entusiasmados com as foras da resistncia, (meia-dzia de gatos pingados terroristas) com ataques esparsos contra os ocupantes. Porm, a operao ainda parecia uma daquelas que os israelenses fazem de vez em quando na Palestina. Alguns atiram pedras, outros prometem vingana e as tropas passam indiferentes. Agora, contudo, desenha-se uma situao bastante diferente: a guerra parece tomar seus contornos iniciais, assustadores para quem esperava uma rpida transio. Os ataques terroristas e as raras ofensivas guerrilheiras passam a ser substitudas por guerrilhas permanentes e confrontos diretos. Comeam a ser identificados os grupos resistentes e seus lderes, sendo que xiitas e sunitas lutam guerras separadas, sem articulao comum, tornando-se uma dificuldade a mais para os EUA. Aps o recente ataque pblico e brbaro a soldados americanos, em Fallujah (tringulo sunita), acontece o maior choque entre tropas americanas e iraquianas desde o incio da guerra. E, como conseqncia de uma ordem de priso contra o lder xiita al-Sadr, formouse um bolso de resistncia para proteg-lo, onde todos esto dispostos a lutar at a morte. A cada medida corretiva, visando soluo de um problema, parece ser criado outro. Em um pas sem a mnima tradio de democracia, a sua instituio no um apelo convincente, para os locais, da necessidade de prolongar a ocupao. Em bom portugus: como fruto de sua obsesso, George W. Bush embananou-se e no sabe como sair da confuso. Talvez o governo estadunidense esteja com muita vontade de livrar-se do abacaxi, mas est enredado no dilema entre se render aos fundamentalistas e deixar o trabalho pela metade (perdendo a oportunidade histrica de revolucionar a poltica no Oriente Mdio) ou seguir em frente em uma guerra cada vez mais desgastante em termos militares, polticos e religiosos.

30

Da PUC para a Histria Poltica queles que estranharam esses dois meses que passei sem escrever um nico artigo, esclareo que estava pondo em prtica as j muitas palavras ditas neste espao. A quem no pde acompanhar pela TV, rdio ou jornais estaduais, participei do movimento de oposio s eleies ao DCE da PUC-RS. Recorro a esse acontecimento, que no de conhecimento de todos, pois vem ao encontro de tudo aquilo que se discute perenemente sobre poltica em teoria, mas que vista de perto beira o absurdo, o inacreditvel. E aqui menciono apenas fatos consumados, provados e incontestveis, nem chegando ao que se pode especular. O Movimento Estudantil , por vezes, relegado a uma condio de insignificncia, ignorando no apenas o papel fundamental que ocupa em termos de representatividade poltica, mas como cerne formador dos futuros cidados e dos futuros polticos. Pois os estudantes da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul demonstram a mesma apatia, da qual se reclama em nvel macro, que os demais eleitores. H poucos alunos que depositam nos polticos estudantis da Universidade maior confiana do que a generalidade o faz em relao aos governantes. A manuteno de um mesmo grupo poltico h mais de dez anos frente da entidade , certamente, um desses motivos. Felizmente, em nvel majoritrio, no vivemos mais uma ditadura, sendo portanto mais latente a esperana de mudana na poltica real, do que dentro da PUC. Quando confrontados, os militares do DCE reagiram da mesma forma que os ditadores ameaados: fizeram valer a represso, com ataques fsicos e verbais constantes, devidamente registrados em ocorrncias policiais, registros da imprensa e independentes. A questo tornou-se uma disputa entre a institucionalidade e a marginalidade, levada at os ltimos meios. A cada atitude marginal e ilegal de represso, ameaa ou agresso, a sociedade era acionada, por meio da opinio pblica, Ministrio Pblico, Poder Judicirio, Poder Legislativo e Poder Executivo. At o momento, perante a omisso do Poder Judicirio (a demora de mais de um ms para julgar LIMINARES ocasionou a perda dos prazos), a velha-nova gesto tomou posse, corre uma ao judicial, formou-se uma Subcomisso Mista na Assemblia Legislativa e o Ministrio Pblico prepara-se para entrar em ao. Quando at a Universidade apontada como partcipe de um sistema bem-engendrado, que protege uma mfia estabelecida no poder, a despeito do histrico de denncias e aes judiciais, quem sair vencedor? Ser o triunfo e a mostra de incorruptibilidade das instituies ou a glria daqueles que zombam da lei, da democracia e de qualquer regra de bom-comportamento? Independentemente da resposta, teremos um episdio que orientar a formao poltica de cerca de 30 mil alunos da PUC, que sairo de l para a vida real com crdito ou descrdito s instituies e s possibilidades de mudana na poltica.

31

Contexto: o governador do RS, Germano Rigotto, no recebendo repasses devidos pelo Governo Federal, envia Assemblia Legislativa proposta de aumento de impostos.

Presente de Natal O Governo Rigotto, que vinha se destacando por sobreviver em meio a uma situao catica do Estado em estgio pr-falimentar, o pice de uma situao de crescente crise, sempre descurada por nossos mandatrios , deu um tiro no prprio p e fez o que de pior poderia ser feito. Garantiu um aumento irrisrio ao funcionalismo pblico custa de um aumento oneroso ao setor produtivo e sociedade rio-grandense em geral. conveniente ressaltar o esforo realizado pela gesto de Germano Rigotto para evitar esse aumento, buscando a renegociao de dvidas tributrias e a caa aos sonegadores desde o princpio do mandato, mas seu resultado fracassado jogou-o eterna pergunta de nossos governantes (aumentar ou no aumentar?) e, infelizmente, j corriqueira resposta. lamentvel que a absoluta maioria de nossos administradores opte por estrangular seus cidados como medida-estanque incompetncia administrativa, adiando mais um pouco a bancarrota do Estado e potencializando seus efeitos. J no incio do Governo Lula, fomos brindados com uma reforma tributria que acrescentou ao fardo dos contribuintes mais alguns pontos percentuais para pagar o inchao do Estado e seus cargos de confiana. Com alguma demora, o Governo Rigotto segue o caminho e ataca aqueles que mantm nossa economia viva, a despeito da deprimente situao financeira do setor pblico. Indiquem-se, pois, os motivos disso: a farsa do pacto federativo brasileiro (onde h uma gigantesca concentrao de poder e recursos no Governo Federal), a pura nomeao poltica para cargos que demandam conhecimentos de administrao e a conduo desse trabalho da mesma forma. Em meio a essa hecatombe, surge dos empresrios desesperados a melhor sugesto que se ouviu entre tantas sandices. Um projeto estratgico de longo prazo, para otimizar os gastos e coordenar de forma eficiente o trabalho do Estado. Se pensarmos no Rio Grande que queremos para o futuro, certamente ser uma unidade federativa com autonomia, com uma indstria mais forte e capaz de gerir seus fundos de forma responsvel, sem que se necessite onerar mais ainda o povo gacho. No obstante, o que podemos projetar na atual conjuntura o agravamento da situao financeira do Estado, o enfraquecimento do mbito privado e, como soluo, mais aumentos de impostos.

Sabia que no seria to fcil Todos aqueles que esperavam ansiosamente que o Governo Lula comprovasse sua incompetncia administrativa foram contemplados com os resultados do primeiro ano do mandato. Muitos esto boquiabertos com os nmeros positivos ao final deste ano, mas no devem iludir-se.

32

A inexperincia administrativa, o despreparo da equipe de governo e a nomeao de inmeros losers companheiros foram o suficiente para um incio catico, apesar da existncia de um consistente projeto de poder. As peripcias de alguns ministros como Ricardo Berzoini e Jos Graziano davam indcios de um final glorioso para aqueles que no gostariam de ver o Brasil novamente nas mos do PT. Brigas internas, inflao em alta, desemprego crescendo e banqueiros felizes apontavam para o fim. Eis que a indstria se recupera, o desemprego cai e os empresrios comeam a reclamar. Sinais de um governo popular de sucesso? Absolutamente no. Os efeitos superficiais de recuperao podem ser facilmente explicados opostamente ao senso comum, mas o clima de euforia generalizada que se constitui no elemento mais preocupante. A retomada econmica facilmente explicvel pela teoria de ciclos econmicos e era previsvel. Quer dizer que a indstria brasileira, apesar de estrangulada, ainda consegue fazer bom uso das oportunidades conjunturais. As queixas do setor produtivo devem-se justamente a esse estrangulamento. Ao mesmo tempo, o Governo Federal lana mo de uma forte campanha de propaganda ufanista (e nisso eles so bons), que serve para encobrir novas trapalhadas, conflitos internos, amoralidade e desmascaramentos das demagogias desta administrao. Recentemente, o enterro do Fome Zero e as irregularidades do Bolsa Famlia, junto com a pesquisa do IBGE que desvelou a falcia da m alimentao dos pobres (que, em novo jogo de manipulao semntica, o governo batizou-a de fome gorda), foram preteridos em favor do maior crescimento dos ltimos dez anos (possvel pelo mnimo de sensatez que h na conduo da poltica econmica em um clima de fundo do poo). Por fim, surge a possibilidade de um novo golpe poltico (a exemplo do que fez FHC com a reeleio para si mesmo) atravs do prolongamento do mandato do Presidente. , no estamos lidando com amadores... Mas o Governo de todo ruim? Nem tanto. Graas esquizofrenia patritica e a megalomania partidria, o Brasil tem ocupado algumas posies de relevo no cenrio internacional, que podem vir a ser interessantes no futuro.

Discutindo o qu? Essa semana, a Assemblia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro votou a proposio de um deputado a respeito do financiamento pblico para tratamentos de sade que visem converso de homossexuais ao heterossexualismo. Muito alm do resultado da votao, interessante discutir o que o homossexualismo, a possibilidade de sua reverso e a responsabilidade do Estado na cobertura dos custos desse processo. Discusso antiga, que j mudou de rumo diversas vezes, a definio do homossexualismo como doena, opo sexual ou desvio de conduta, indefinida e no apresenta qualquer segurana sobre a veracidade de tais proposies. Portanto, no possvel tomar qualquer um dos conceitos como definitivo ou acurado. Quanto possibilidade de cura do homossexualismo, h igualmente verses conflitantes

33

sobre a eficcia dos tratamentos, tornando-se muito mais um debate ideolgico entre laicos e religiosos do que de cincia propriamente dita. No obstante, a necessidade de terapia psicolgica no pode ser vista da mesma forma. Pode-se considerar digno de anlise qualquer sentimento que provoque desconforto ou insatisfao quele que o sofre. Isso no excluiria o fato de sentir-se atrado por pessoas do mesmo sexo, como afirmam os homossexualistas. Ao invs de apoiar uma escolha sexual (muito mais como luta poltica do que levando em considerao o prprio indivduo), se uma pessoa se sente incomodada por tal realidade, tem todo o direito de buscar auxlio profissional para resolver seu conflito de forma frutfera, seja isso passar a faz-lo sem culpa ou corrigir sua orientao. No entanto, o papel do Estado nesse tipo de procedimento deve ser igual aos demais procedimentos relacionados rea mdica. Havendo a opo de tratar-se em alguma instituio conveniada rede pblica de sade, eis a contribuio financeira a ser feita pelo Governo, sem haver discriminao. Algum que se sinta mal por ser gay ou por achar que Elvis vive tem o mesmo direito de procurar auxlio psicolgico dentro do que j oferecido a todos os cidados. Ao invs de dar continuidade poltica de achaque ao Estado, realizada por meio do eterno mal de criar leis para tratar de assuntos especficos desnecessariamente, uma viso panormica dos mecanismos j presentes na legislao simplificaria o trabalho dos legisladores e impediria