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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - CCHLA DEPARTAMENTO DE ARTES LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS OCIREMA CRISTINA DA SILVA PACHECO DE SOUSA FALA, PINTOR! Ensinar e aprender pintura NATAL 2017

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Page 1: FALA, PINTOR! 2… · OCIREMA CRISTINA DA SILVA PACHECO DE SOUSA FALA, PINTOR! Ensinar e aprender pintura Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Artes

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - CCHLA

DEPARTAMENTO DE ARTES

LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS

OCIREMA CRISTINA DA SILVA PACHECO DE SOUSA

FALA, PINTOR!

Ensinar e aprender pintura

NATAL

2017

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OCIREMA CRISTINA DA SILVA PACHECO DE SOUSA

FALA, PINTOR!

Ensinar e aprender pintura

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

ao Curso de Licenciatura em Artes visuais da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

como requisito parcial para a obtenção do

título de Licenciada em Artes Visuais.

NATAL - RN 2017

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OCIREMA CRISTINA DA SILVA PACHECO DE SOUSA

FALA, PINTOR!

Ensinar e aprender pintura

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

ao Curso de Licenciatura em Artes visuais da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

como requisito parcial para a obtenção do

título de Licenciada em Artes Visuais.

Aprovado em ____ de dezembro de 2017.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________

Prof. Dra. Laís Guaraldo – UFRN

____________________________________________

Prof. Dra. Bettina Rupp

____________________________________________

Prof. Ms. Artur Luiz de Souza Maciel – UFRN

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AGRADECMENTOS

A Deus pela oportunidade de estar mais uma vez no caminho da evolução

intelectual, moral e espiritual.

Ao meu esposo Clésio pelo incentivo constante e companhia incondicional,

nessa caminhada em busca do conhecimento pessoal e profissional.

Às minhas duas filhas, Heloísa e Gabriela e ao meu genro Felipe, pelo

incentivo durante todo esse meu percurso.

Aos meus familiares, mãe, pai (in memória), irmãs, irmãos, sogra, cunhado e

cunhadas pela compreensão.

Aos irmãos espirituais, que, de alguma forma, com a permissão de Deus,

estiveram ao meu lado me inspirando para que eu pudesse alcançar o meu objetivo

nas Artes Visuais.

À professora Dra. Laís Guaraldo, minha orientadora, pela sua sabedoria,

humildade e paciência, ajudando-me e estimulando em todos os momentos deste

trabalho. Sempre segura e confiante em suas orientações.

Aos meus amigos da graduação por compartilharmos dessa empreitada de

desafios e vitórias, a cada semestre concluído em busca do aprender Artes.

Aos meus professores do Curso de Artes Visuais, pelo incentivo que nos

proporcionou durante toda a graduação, mostrando-nos que somos capazes de

irmos à busca de nossos objetivos nessa caminhada do ensino e aprendizagem em

Artes Visuais.

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RESUMO Esse trabalho tem como propósito compreender algumas questões relacionadas à poética da pintura, a partir da análise dos textos e do trabalho pictórico de Henri Matisse e Paulo Pasta. O diálogo entre esses diferentes pontos de vista proporciona uma reflexão sobre diferentes aspectos da pintura e suas formas de expressão. As contribuições desses artistas, mesmo situados em épocas distintas, justificam-se pelo fato de que em seus trabalhos existem uma sintonia de pensamentos no processo criativo da pintura. E também para aprofundar, principalmente, aspectos como a cor e a forma consideradas, em suas poéticas, um dos pontos relevantes na estrutura pictórica. A leitura dos textos dos pintores escolhidos para esse estudo tem como propósito ampliar o entendimento da pintura como recurso expressivo, compreender as questões inerentes a esse recurso apontadas por aqueles que o praticam e analisar as contribuições artísticas e pedagógicas que essas reflexões podem oferecer para o estudante de Ensino Médio e pesquisadores da pintura. A pesquisa pretende também refletir sobre as características da pintura como linguagem, poética e seus recursos expressivos; elencar parâmetros relacionados com a poética pictórica; analisar a contribuição dos discursos dos pintores e críticos para as práticas pedagógicas e suas especificidades para ensino da pintura. PALAVRAS-CHAVE: pintura, processo criativo, poética, cor, forma.

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ABSTRACT

This work aims to understand issues related to the pictorical poetic from the analysis of the texts and pictorical works of Henri Matisse and Paulo Pasta. The dialogue between these different points of view provides thoughts about the different aspects of painting and its forms of expression. The contributions of these artists, even they were in different times, are justified by the fact that in their works there is a line of thoughts in the creative processo of painting. And also to deepen aspects such as the color and form considered, in their poetics, one of the relevant points in the pictorical structure. The purpose of reading texts by the chosen painters is to broaden the understanding about painting as an expressive resource, to understand the ineherent issues of this resources pointed out by those who practice it and analyze the artistic and pedagogical contributions that these thoughts can offer to the high school student and researchers of painting. The researche aims to think about the characteristics of paintig as language, poetry and its expressive resources; to talk about the parameters related to the pictorical poetic; to analyze the contributions to the painters and critics speech to the pedagogical practices and their specificities for the teaching od painting. KEYWORDS: painting, creative process, poetic, color, form.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Usina Estivas S/A, no município de Arês/RN..............................................16

Figura 2: Cartilha Método ABC..................................................................................17

Figura 3: Antiga Tabuada..........................................................................................17

Figura 4: Antigo livro – Programa de Admissão.........................................................17

Figura 5: Casas do interior.........................................................................................22

Figura 6: Natureza morta...........................................................................................22

Figura 7: Rosas no jardim..........................................................................................23

Figura 8: Papoulas.....................................................................................................27

Figura 9: Casas do interior II......................................................................................28

Figura 10: Tulipas.......................................................................................................30

Figura 11: Cactus.......................................................................................................30

Figura 12: Dia ensolarado..........................................................................................30

Figura 13: A Dança.....................................................................................................36

Figura 14: A Música....................................................................................................37

Figura 15: As banhistas com uma tartaruga...............................................................38

Figura 16: Odaliscas.................................................................................................. 40

Figura 17: Menina com as espigas…………………………………….......……............41

Figura 18: Mulher lendo em uma pequena mesa…………………………......................44

Figura 19: S/T.............................................................................................................46

Figura 20: Cruz amarela.............................................................................................47

Figura 21: Paisagem de Mogi.....................................................................................48

Figura 22: S/T.............................................................................................................49

Figura 23: Fachada....................................................................................................49

Figura 24: Algodoeiro com tronco decepados............................................................50

Figura 25: S/T.............................................................................................................51

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Figura 26: S/T.............................................................................................................52

Figura 27: S/T.............................................................................................................53

Figura 28: S/T.............................................................................................................54

Figura 29: S/T.............................................................................................................55

Figura 30: S/T.............................................................................................................55

Figura 31: Place des Lices...............................................................................................58

Figura 32: Canal du Midi............................................................................................59

Figura 33: A Janela azul.............................................................................................61

Figura 34: Harmonia em vermelho.............................................................................62

Figura 35: Anunciação................................................................................................65

Figura 36: Detalhe de Monalisa..................................................................................65

Figura 37: Mulher com o chapéu,...............................................................................67

Figura 38: As Banhistas.............................................................................................70

Figura 39: S/T.............................................................................................................71

Figura 40: S/T.............................................................................................................72

Figura 41: S/T.............................................................................................................72

Figura 42: O Ateliê vermelho......................................................................................74

Figura 43: "Série Canaviais".......................................................................................74

Figura 44: S/T.............................................................................................................75

Figura 45: Alegria de viver..........................................................................................77

Figura 46: S/T.............................................................................................................77

Figura 47: S/T.............................................................................................................78

Figura 48: Cruz amarela.............................................................................................79

Figura 49: S/T.............................................................................................................80

Figura 50: Pombos.....................................................................................................81

Figura 51: S/T.............................................................................................................82

Figura 52: S/T.............................................................................................................83

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Figura 53: S/T.............................................................................................................83

Figura 54: Thira..........................................................................................................85

Figura 55: Cruz vermelha ..........................................................................................85

Figura 56: Aula sobre os fundamentos da pintura......................................................95

Figura 57: Um dos materiais usados para o desenho de observação.......................96

Figura 58: Os alunos na prática do desenho de observação.....................................97

Figura 59: Aluna do ateliê realizando o seu processo na pintura..............................98

Figura 60: Desenho de uma aluna do NAC..............................................................100

Figura 61: Desenho de uma aluna do NAC..............................................................100

Figura 62: Desenho de uma aluna do NAC..............................................................100

Figura 63: Processo da pintura de um aluno do NAC..............................................101

Figura 64: Pintura realizada por um aluno do NAC..................................................101

Figura 65: Processo da pintura de um aluno do NAC..............................................101

Figura 66: Processo da pintura de uma aluna do NAC............................................101

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10

1 PERCORRENDO CAMINHOS PELA PINTURA ................................................... 14

2 A COMPOSIÇÃO E FORMA SINTÉTICA .............................................................. 35

2.1 A SÍNTESE DA COMPOSIÇÃO ....................................................................... 45

3 A COR, UM ASPECTO ESTRUTURANTE NA PINTURA ..................................... 57

3.1 A “PERSPECTIVA DE SENTIMENTO” ............................................................ 64

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 88

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 90

APÊNDICE A: RELATO DE AÇÃO PEDAGÓGICA ................................................ 93

APÊNDICE B: PROCESSOS CRIATIVOS DO DESENHO DE ALUNOS DO ATELIÊ

DO NAC .................................................................................................................. 100

APÊNDICE C: PROCESSOS CRIATIVOS DA PINTURA DE ALUNOS DO ATELIÊ

DO NAC .................................................................................................................. 101

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INTRODUÇÃO

“Se a pessoa tem o coração na ponta do pincel, ela faz o que ela

quiser.”

Dudi Maia Rosa

Esse trabalho tem como propósito compreender com mais profundidade

algumas questões relacionadas à poética da pintura, a partir da análise dos textos e

do trabalho pictórico de Henri Matisse e Paulo Pasta.

A proposta de recorte nesses dois pintores se deu pelo fato de identificarmos

uma proximidade em relação aos seus respectivos projetos poéticos.

Essa proximidade e também a singularidade do trabalho e reflexão de cada

um será objeto de nossa análise

O diálogo entre esses diferentes pontos de vista proporciona uma reflexão

polissêmica sobre vários aspectos da pintura como forma de expressão.

Aliados aos pensamentos desses dois pintores somam-se os estudos de

críticos, pesquisadores da arte, e outros artistas a fim de auxiliar para uma

contextualização e compreensão crítica acerca desse conjunto de conhecimentos da

pintura.

A escolha em trabalhar a partir das contribuições dos artistas Henri Matisse e

Paulo Pasta, mesmo situados em épocas distintas, justifica-se pelo fato de que em

seus trabalhos existem uma sintonia de pensamentos no processo criativo da

pintura. E também para aprofundar, principalmente, aspectos como a cor e a forma

consideradas, em suas poéticas, um dos pontos relevantes na estrutura pictórica. .

A leitura dos textos dos pintores escolhidos para esse estudo tem como

propósito ampliar o entendimento da pintura como recurso expressivo, compreender

as questões inerentes a esse recurso apontadas por aqueles que o praticam e

analisar as contribuições artísticas e pedagógicas que essas reflexões podem

oferecer para o estudante de Ensino Médio e pesquisadores da pintura.

Os apontamentos do pintor, Henri Matisse (1869 -1954), no livro “Escritos e

reflexões sobre a arte”, o autor tece comentários reflexivos a respeito da arte, como

também afirma suas convicções e seus objetivos ao falar da importância da criação

plástica em seus trabalhos. Matisse propõe uma organização pictórica norteada pela

síntese onde cada elemento que faz parte da composição tem sua relevância e não

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existe um mais importante do que outro. Os textos de Matisse apresentam reflexões

sobre percepção e composição e essa pesquisa objetiva compreender essas

questões da pintura.

No contexto brasileiro e contemporâneo, os estudos do professor, desenhista,

ilustrador e pintor Paulo Pasta, doutor em Artes Visuais pela Universidade de São

Paulo, no livro “A educação pela Pintura”, apresentam um conjunto de textos críticos

onde a partir de seus conhecimentos a respeito da pintura, analisa e aponta as

diversas possibilidades de entendimento de questões no aspecto formal e no

aspecto poético relacionadas com a pintura que pode contribuir para o ensino e

aprendizagem da produção pictórica.

As reflexões de Matisse e Paulo Pasta têm relevância para essa pesquisa no

sentido de auxiliar ao estudante do Ensino Médio a compreender a amplitude dos

fundamentos da pintura nos diferentes períodos, transformadas pelo ambiente

cultural e social de cada época.

A pesquisa aqui apresentada não tem a pretensão de dar conta de todos os

aspectos que estruturam a pintura, mas, coloca em evidência a contribuição que a

reflexão desses pintores sobre seus respectivos trabalhos de pesquisa pode

oferecer para a formação do aluno e do jovem artista.

Esse trabalho tem como objetivo refletir sobre algumas contribuições para o

ensino de fundamentos da pintura selecionadas dos textos escritos por pintores e

críticos da arte. Como também refletir sobre as características da pintura como

linguagem, poética e seus recursos expressivos; elencar parâmetros relacionados

com a poética pictórica; refletir sobre os discursos dos pintores e críticos para a

contribuição das práticas pedagógicas e suas especificidades para o ensino da

pintura.

A pintura tem uma estrutura de linguagem e uma poética que lida com

questões específicas as quais foram estudadas e analisadas.

Tomando esses aspectos como referência, o que justifica esta pesquisa é o

fato de que o conhecimento sobre a pintura, nas escolas, é muito fragilizado, pois

não se vê uma aprendizagem significativa no ensino de arte.

Nesse sentido, as abordagens realizadas pelos pintores, pesquisadores e

críticos da arte são relevantes para ensino e aprendizagem do aluno do Ensino

Médio, levando-o a refletir e perceber a utilização e mudanças dos mecanismos da

pintura em seu processo criativo.

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O ensino de pintura leva os educandos e o jovem artista a desenvolverem a

percepção, a sensibilidade, como também adquirir repertório sobre o universo da

linguagem pictórica mesclando com a prática e a teoria.

Essa pesquisa não trata de estilos, de História da Arte, muito menos da vida

do pintor, mas reflete sobre pensamentos sobre a pintura que contribuem para o

ensino da arte.

Para fundamentar as análises desse trabalho, tem-se como base o livro citado

anteriormente, do pintor Henri Matisse (2007) que apontam aspectos relevantes

sobre a expressão, a composição e a cor na composição, afirmando que o artista

pode obter, por meio dessas características, efeitos de harmonia e cada um tem o

seu papel dentro da pintura.

Para aprofundar as reflexões dessa pesquisa, teve como parâmetro, a

contribuição do pintor Paulo Pasta, que fala da busca por uma unidade espacial e

menos fragmentada na pintura, como também uma poética através das relações

cromáticas, formas planas e traços expressivos.

Para contribuir também, para a reflexão sobre o ensino da pintura na arte

foram estudadas as proposições da professora e pesquisadora em educação Ana

Mae Barbosa. Na perspectiva de Barbosa (2014) fazer, apreciar e contextualizar são

palavras-chaves para que o ensino e aprendizagem na disciplina de arte sejam

significativos. Barbosa (2014, p. 33) fala de um conhecimento que está inter-

relacionado ao fazer arte, à apreciação e à contextualização. Para o pintor, a

produção artística é fundamental para o conhecimento da arte e desenvolvimento do

pensamento cognitivo.

Nessa perspectiva, foram consultados sites que continham acervos que falam

sobre os aspectos da pintura. Leitura de livros de outros autores, de artigos, e de

textos de críticos de arte que pudessem somar e proporcionar uma reflexão

aprofundada dos fundamentos da pintura e das suas práticas pedagógicas. A escuta

de vídeos que mostravam depoimentos e entrevistas dos artistas. Pesquisas de

imagens de obras de pintores em que os processos criativos dialogassem com os

trabalhos pictóricos dos artistas Matisse e Paulo Pasta. Como também foi realizada

uma ação pedagógica, em uma instituição não formal NAC - Núcleo de Arte e

Cultura da UFRN, em que foram contemplados aspectos da pintura estudados nesse

trabalho, uma vez que essa pesquisa surgiu da motivação de conhecer e aprofundar

sobre as características da pintura.

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Analisa-se nesse trabalho a contribuição que esses pintores podem

proporcionar para uma reflexão para os fundamentos da pintura, nas suas poéticas

como também nas práticas pedagógicas no ensino e na aprendizagem na disciplina

de arte. Aspectos que serão abordados nos três capítulos dessa pesquisa

O primeiro capítulo faz uma breve análise e diagnóstico do ensino de pintura

em espaços formais e não formais, no Estado do Rio Grande do Norte. Aponta

também algumas especificidades que implicam no desenvolvimento do ensino de

pintura e na formação do aluno.

O segundo capítulo trata da questão da composição e da forma como

recursos importantes nas obras de Matisse e Paulo pasta. Apresenta como ambos

se utilizam ao longo de seus processos artísticos a composição e a forma como

aspectos relevantes no campo plástico da pintura, proporcionando ao espectador ter

um olhar mais investigativo e contemplativo.

O terceiro capítulo fala do aspecto da cor nos trabalhos de Matisse e Paulo

Pasta como recurso estruturante da obra. Comenta que a cor adquire autonomia no

processo criativo dos artistas, e esse recurso não se trata apenas de representação

da realidade, mas, transmite em suas poéticas emoções e sentimentos.

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1 PERCORRENDO CAMINHOS PELA PINTURA

“A tarefa da pintura é definida como a tentativa de tornar visíveis

forças que não são visíveis.”

Gilles Deleuze

Nesse capítulo, apresento um relato sobre os caminhos que me trouxeram

para o curso de Artes Visuais da UFRN, indicando a maneira como desejo de

compreender a pintura que fez parte da minha trajetória até aqui. Essa motivação

encontrou momentos de alegria e satisfação, e também escassez, dificuldades.

Farei aqui uma breve análise da minha trajetória com a intenção de registrar as

dificuldades de uma jovem interessada pela pintura, nas décadas de 80, 90 e início

do ano 2000, no estado do Rio Grande Norte.

A intenção de apresentar esse relato tem como propósito lançar uma

contribuição para um entendimento da situação do ensino de arte na cidade e o

papel que os espaços não formais acabam adquirindo na formação de muitos jovens

que procuram a informação e a experiência artística.

Pretende-se, portanto, fazer uma reflexão acerca das práticas pedagógicas

nos espaços formais e não formais da educação, para contribuir, de alguma forma,

para o aprimoramento de práticas significativas do ensino da pintura.

Segundo a proposta dos PCNs - Parâmetros Curriculares Nacionais, a Arte,

na escola, deveria ser tão importante quanto os demais componentes curriculares no

processo de ensino e aprendizagem.

A educação em arte propicia o desenvolvimento do pensamento artístico e da percepção estética, que caracterizam um modo próprio de ordenar e dar sentido à expressão humana: o aluno desenvolve sua sensibilidade, percepção e imaginação, tanto ao realizar formas artísticas quanto na ação de apreciar e conhecer as formas produzidas por ele e pelos colegas, pela natureza e nas diferentes culturas. (BRASIL, 2001, p. 19)

Sabe-se que ainda há muito o que fazer para melhorar a realidade do ensino

da arte na escola, e é inegável a sua importância no processo de ensino e

aprendizagem.

A arte, além de estimular o lado intelectual, é por si só humanizadora, pode

contribuir com o desenvolvimento da percepção e da imaginação que contribuem

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para captar a realidade que nos cerca e assim aguçar a capacidade criativa do

indivíduo possibilitando-o para a transformação do mundo em que vive.

Nesse sentido, a intenção desse capítulo é contribuir para um diagnóstico da

precariedade do ensino de arte nas escolas em nosso Estado e a decorrente

escassez de acesso a repertório imagético de qualidade.

A pintura sempre foi, para mim, um recurso expressivo com o qual sempre me

identifiquei. Tenho com ela uma relação de descoberta de mim mesma. Essa

linguagem desde cedo foi uma atividade que esteve presente ao longo da minha

vida. No entanto, o acesso à informação sobre suas técnicas (utilização dos

materiais e a forma como são aplicados) e poéticas eram muito escassos na época

e nos lugares onde passei a minha infância e juventude.

Se por um lado o contexto educacional foi desolador, por outro lado a vontade

de encontrar informação e formação sobre essa área através de cursos e educação

não formal, fez com que uma jovem procurasse, mesmo sem saber ao certo o que

está procurando. E é para essa jovem que um dia eu fui que esse trabalho pretende

contribuir.

Como disse certa vez, Pablo Picasso: “eu não procuro eu encontro”. Talvez

diferente dele, meus encontros foram frutos de muita procura.

Percebo que ao longo da minha trajetória, na busca pelo conhecimento da

pintura, a nossa região ainda continua, praticamente, com a mesma precariedade.

Não se vê galerias nem museus que proporcionem esses momentos de

aprendizagem, tanto para o público interessado em conhecer, fazer e apreciar arte

como para o público visitante. No capítulo “Ensinando critica nos museus” do livro,

Arte-Educação: leitura no subsolo, Robert William Ott afirma que,

O ensino de arte em museus constitui um componente essencial para a arte-educação: a descoberta de que a arte é conhecimento. A arte pode assumir diversos significados em suas várias dimensões, mas como conhecimento proporciona meios para a compreensão do pensamento e das expressões de uma cultura. (OTT, 2013, P. 149)

Aprender arte, através dessa prática educativa, possibilita ao aluno ver

diversas formas de expressão artística, desenvolve a aprendizagem, a percepção e

compreensão da arte como expressão.

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A minha iniciação no aprendizado escolar se deu em uma cidade do interior

do Rio Grande Norte. Até os meus onze anos de idade, morei na Usina Estivas

(Figura 1) município do RN.

Figura 1: Usina Estivas S/A, no município de Arês/RN (foto atual do lugar)

Fonte: www.google.com.br/search?q=foto+da+usina+estivas+arez+rn&source=lnms&tbm

Nesse período, quando criança, no interior, era muito observadora e gostava

de criar, fazer trabalhos manuais que via à minha frente, porém, de maneira muito

rudimentar. Catava, no quintal de minha casa, materiais alternativos para reproduzir

os brinquedos de crianças ”ricas”.

Na infância, mesmo gostando de criar, quando estudava o primário, não tive

na escola, nada que remetessem à representação visual e menos ainda à arte. As

poucas imagens visuais das quais me recordo eram as que continham nas capas

das cartilhas Método ABC, a Tabuada e o livro Programa de Admissão, (Figuras 2, 3

e 4). Dentro das cartilhas não havia figuras que relacionassem à escrita com a

imagem, com exceção do livro Programa de admissão com pouquíssimas imagens.

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Figura 2: Cartilha Método ABC Figura 3: Antiga Tabuada

Fonte: https://br.pinterest.com/pin Fonte: http://www.harpyaleiloes.com.br

Figura 4: Antigo livro – Programa de Admissão

Fonte: https://sebodomessias.com.br/livro/pedagogia/programa-de admissao.aspx

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18

Nesse período da minha infância, não havia ao meu redor qualquer

imagem que representasse trabalhos de artistas como natureza morta, figuras

humanas, paisagens e outros. As únicas iconografias que existiam eram as imagens

de santinhos de igrejas, em forma de retratos.

Em 1974, vim morar em Natal para dar continuidade aos meus estudos.

Mesmo assim, nessa época, as coisas ainda não eram tão fáceis.

A educação, nesse período, passava por momentos de grandes mudanças e

acontecimentos. Era o período da Ditadura Militar. Nesse contexto histórico e

político, o ensino estava voltado somente para a formação profissionalizante, com o

objetivo de incrementar a economia do país. Ao aluno era exigida a realização de

atividades que focassem na formação para a atuação no mercado de trabalho,

compreendendo esse lugar no mercado como um lugar desprovido de subjetividade.

Com a imposição do militarismo sobre a educação, a escola não tinha

preocupação no sentido do aluno desenvolver as suas singularidades e habilidades

individuais. Dessa forma, nesse período o ensino de arte foi bastante marcado pela

repressão e censura à expressão de pensamento e opinião.

Em detrimento de uma educação voltada exclusivamente para o trabalho, a

minha formação escolar se deu praticamente com a ausência da disciplina de arte. A

pouca oportunidade que eu tive foi com desenho geométrico inserido na disciplina

de Desenho. Ao meu ver era um estudo mecânico que ficava só no nível do

conhecimento de reta, quadrado, círculo e tipos de triângulo, sem uma

fundamentação teórica para questões como abstrato ou expressão artística.

Ana Mae Barbosa (2014, p. 2) avalia que “desde o século XIX que desenho

na escola é apenas desenho geométrico, destituído de compreensão e

aplicabilidade”. Não existia, portanto, um pensar crítico sobre o que se propunha a

desenhar. “A disciplina Desenho, apresentada sob forma de Desenho Geométrico,

Desenho do Natural e Desenho Pedagógico, era considerada mais por seu aspecto

funcional do que uma experiência em arte” (BRASIL, 2001, P. 25).

Esse conhecimento diretamente atrelado à qualificação para o trabalho

compreendia o aluno apenas como um mero recebedor de informações passadas

pelo professor que detinha o conhecimento. E hoje vejo que esse conhecimento

escolhido para a transmissão era bastante limitado em relação ao patrimônio cultural

da humanidade.

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Os PCN’s concorda que o ensino de arte tem uma função social de extrema

importância para o aprendiz.

Uma função igualmente importante que o ensino de arte tem a cumprir diz respeito à dimensão social das manifestações artísticas. A arte de cada cultura revela o modo de perceber, sentir e articular significados e valores que governam os diferentes tipos de relações entre os indivíduos na sociedade. A arte solicita a visão, a escuta e os demais sentidos como portas de entrada para uma compreensão mais significativa das questões sociais. [...]. (BRASIL, 2001, p. 19)

No entanto, mesmo com toda essa escassez de informações, foi na

adolescência que meu interesse pela arte, e, em especial a pintura, passou a ser

uma questão bastante forte dentro de mim.

Apesar de não haver a disciplina de arte nas escolas que estudei, durante os

meus estudos no ginásio via um colega que desenhava e pintava, ao meu ver, muito

bem. Todas as vezes que eu o via criando os seus desenhos, ficava fascinada,

vinha uma vontade enorme de fazer as mesmas composições. Na visão de Ana Mae

Barbosa, a arte é socialmente necessária para estimular no aluno o fazer artístico e

a apreciação estética.

Não é possível uma educação intelectual, formal ou informal, de elite ou popular, sem arte, porque é impossível o desenvolvimento integral da inteligência sem o desenvolvimento do pensamento divergente, do pensamento visual e do conhecimento presentacional que caracterize a arte. (BARBOSA, 2014, p. 5)

A arte é essencial para desenvolver a percepção e a imaginação para

entender a realidade e nesse sentido estimular a criatividade inerente em qualquer

pessoa.

Mesmo que não atendesse aos meus anseios, o gosto pela pintura fazia com

que buscasse sozinha pintar as minhas camisetas com tinta para tecido, sem

nenhuma orientação. De acordo com as cores, os degradês, os claros e escuros

representados nas figuras das revistas que serviam de referências para os meus

exercícios, eu tentava copiar para ficar igual. Uma das referências eram os

personagens de História em Quadrinhos da turma do Tio Patinhas, que eram

“recheados” de detalhes. Quanto maior o grau de dificuldade dos desenhos, no

momento da pintura, mais eu apreciava esse fazer. Passava a ser um desafio e a

dificuldade e detalhamento da imagem era o meu parâmetro de qualidade.

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Na mesma época da adolescência, colegas nossas levavam para a escola

bonecas feitas de papel. Era muito curiosa, comecei a desenhar, junto com a minha

irmã Oracilda, protótipos de bonecas e depois recortá-las para brincarmos.

Sem saber, estávamos nos iniciando nos mecanismos da linguagem visual

gráfica. Fazíamos desenhos de vestidos de todos os tipos, pintávamos com lápis de

cor para depois recortá-los, deixando no ombro e na cintura das roupas de papel

uma dobradura que aderia a roupa às bonecas. Às vezes, tirávamos cópias de

revistas de modas para costureira ou criávamos os nossos próprios modelos.

As bonecas eram feitas com um papel de uma gramatura mais resistente. Já

os vestidos eram feitos com qualquer tipo. Com o tempo, à medida que brincávamos

e manuseávamos, as bonecas e os vestidos iam se rasgando, e assim produzíamos

outras bonecas.

Nesse fazer o que importavam eram os modelos de vestidos que

conseguíamos criar para mostrar as nossas habilidades artísticas. Vejo que essa

brincadeira proporcionava, na verdade, um contato com o mundo da pintura e a

experimentação de alguns recursos expressivos cor, forma, textura, linhas e outros.

Cursando o primeiro ano Científico, em 1978, escutei uma colega falando

sobre uma senhora, da qual não me lembro do nome, que dava aulas de pintura no

bairro de Areia Preta/Natal/RN. Essa seria a oportunidade tão desejada de aprender

a pintar. Porém, foi uma frustração, porque a professora queria que já chegássemos

a ela com uma noção do saber pintar, e não era o meu caso. Um fator importante

nesse contato, foi que, pela primeira vez, conheci os materiais tradicionais básicos

que se utilizavam em uma pintura, como a tinta a óleo, os pincéis, a tela e até

mesmo a espátula. Ela pintava muito bem, mas não tinha uma didática adequada

para ensinar. Cheguei a pintar somente umas duas telas com as temáticas de

casario e marinha através de fotografias, que, infelizmente, não as tenho mais.

Depois de um longo período sem ter contato com a pintura, foi no ano de

1998 que retomei as aulas de pinturas, novamente em espaço de educação não

formal: o atelier de Zuíla, no bairro de Barro de Tirol/Natal/RN.

Na introdução de um artigo sobre a função dos espaços formais e não formais

na educação, Neves esclarece a diferença entre esses dois tipos:

A instância formal (escolar) e a não formal (educação social) comungam o atributo da organização e sistematização e, consequentemente, o caráter metódico. A educação formal, portanto, ocorrendo no seio dos

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estabelecimentos escolares, requer tempo, aprendizagem de conteúdos, habilidades e competências específicas, resultados e avaliações regulados por normas decorrentes da administração competente, visando à obtenção de graus e títulos. A educação social, por sua vez, conta com objetivos explícitos de aprendizagem ou formação. Entretanto, ela se realiza fora do marco institucional da escola, rompendo com muitas das determinações que caracterizam esta última. Portanto com escasso limite legal e burocrático, favorecendo maior capacidade de adaptação a mudanças de forma possivelmente mais hábil, flexível, versátil e dinâmica que na instância formal. (NEVES apud, NEVES, LEMES, CAMPOS, 2013, p. 71-72)

Nessa época, frequentando o espaço não-formal da educação na pintura, foi

quando realmente tive uma noção, mesmo que superficial, da técnica da pintura,

pois a própria professora Zuíla não tinha muita segurança em ensinar alguns

aspectos que dizem respeito aos recursos expressivos dessa linguagem. D. Zuíla

dizia que fazia tempo que não exercitava a pintura. Eu percebia que ela se

mostrava consciente de que precisava praticar para poder ensinar.

A respeito dessa consciência do ser inconcluso diante do aprendizado, o

educador e pedagogo Paulo Freire (1921 – 1997), no livro Pedagogia da autonomia,

reflete dizendo que, “é na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a

educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis

na medida em que se reconheceram inacabados”. (FREIRE, 1996, p. 58)

Para o meu aprendizado, como referência, ela apresentava as revistas sobre

pinturas compradas em bancas para que eu pudesse copiar e fazer o trabalho

artístico. Mesmo com todas as deficiências nesse ensino, aprendi pintar paisagens,

florais, casarios e natureza morta (Figura 5, 6 e 7).

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Figura 5: Casas do interior I, 1998

Foto: Ocirema Pacheco

Figura 6: Natureza morta, óleo sobre tela, 1998

Foto: Ocirema Pacheco

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Figura 7: Rosas no jardim, óleo sobre tela, 1999

Foto: Ocirema Pacheco

Ao longo dessas experiências de aprendizagem o aspecto técnico e

operacional era o único ensinado. Aspectos expressivos e poéticos eram então

ignorados.

A professora não tinha uma preocupação com o fazer artístico, como lidar

com as questões que envolviam os aspectos formais e poéticos da pintura. Acerca

do significado de poética artística, a escritora Icleia Cattani, em um ensaio com o

título de “Poiéticas e poéticas da mestiçagem”, do livro Mestiçagens na arte

contemporânea, diz que:

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A poética pode ser considerada como tudo o que constitui a obra em si mesma, a partir do momento de sua instauração. Trata-se da obra na sua fisicalidade própria, com suas formas, materiais, técnicas, suportes, ou seja, todos os elementos utilizados na sua constituição pelo artista. Mas, trata-se também de seus múltiplos sentidos e significados, os quais escapam, em parte, ao desejo, à intenção e até mesmo ao controle do seu criador. É a obra na sua integridade enquanto corpo no mundo, com sua autonomia relativa, [...]. (CATANNI, 2007, P. 13)

Cattani ainda acrescenta que a poética das obras artísticas é uma questão

metodológica que leva à realização da arte. Ou seja, para Cattani (2007, p. 13) “é a

obra em sua trajetória própria que leva, através do tempo e do espaço, a acumular

sentidos novos e plurais”.

O fazer artístico, portanto, era intuitivo nas tentativas de dar certo ou não. Não

havia um conceito por trás do que estava se realizando, ampliação de repertório

estético, análise de pinturas consagradas. O propósito do processo criativo era

apenas por um suposto conceito de “belo”, sem um pensar crítico dos parâmetros

inerentes à expressão. A preocupação em fazer um trabalho artístico era limitada

aos problemas plásticos da pintura. A única competência valorizada era a

capacidade de representação naturalista.

No livro, “A Cor dos Meus Sonhos”, o pintor Joan Miró (1992, p. 63) declara

numa entrevista ao jornalista Georges Raillard, que, “Klee me fez sentir que havia

algo mais do que a pintura-pintura em toda expressão plástica, que era preciso ir

além, para atender zonas de maior emoção e profundidade”.

Esse “ir além” em relação ao recurso dessa linguagem era um tanto difícil

nessas minhas experiências pela educação não formal e praticamente autodidata.

Não havia naqueles ambientes de transmissão de saberes técnicos uma prática de

ensino que pudesse pensar sobre o papel desempenhado na construção de sentido

das diferentes pinceladas, texturas, a paleta de cores, a composição do trabalho em

execução. O que era proposto era a cópia de imagens e a observação de algumas

revistas que continham o passo a passo da pintura. A técnica da pintura era

dissociada da sua poética e da sua filosofia. A prática das técnicas da pintura era

apenas no aspecto do fazer, sem nenhuma apreciação de referências estéticas e

relação entre o fazer e a poética, e a ampliação de leitura do mundo.

Uma aprendizagem significativa do fazer pintura é importante para que o

aluno ganhe autonomia no seu processo criativo. Sendo assim, a produção, a

apreciação e a contextualização de uma obra contribuem de forma significativa tanto

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para o crescimento pessoal na criatividade dos jovens artistas como também para

sua experiência estética. Barbosa (2014, p. 33), afirma que, “quando falo de

conhecer arte, falo de um conhecimento que nas artes visuais se organiza inter-

relacionando o fazer artístico, a apreciação da arte e a história da arte”. É importante

que o conhecimento sobre artes se efetive nessas três propostas, a experimentação,

a decodificação e a informação. Dessa forma, o fazer pintura exige que seja de

forma consciente e informada para que a aprendizagem seja possível e tenha

sentido para o jovem artista.

Barbosa (2014, p. XXVIII) declara que “se atuamos apenas no fazer, sem

reflexão ou só na leitura alheia ao fazer, quebra-se aí o princípio da aprendizagem

significativa”. Além da técnica, é importante conhecer e entender a poética que está

imbuída de sentidos, possibilitando o ensino-aprendizagem significativo da

expressão pictórica.

Algum tempo depois, no bairro de Barro Vermelho/Natal/RN, aprendi com

outra professora de nome Zenaide, aspectos da pintura que nos outros cursos não

havia aprendido. Em alguns aspectos, ela utilizava a mesma metodologia de dona

Zuíla. Porém, ela tinha uma segurança maior na hora de transmitir o conhecimento

acerca da pintura e um domínio no desenho, nas relações das cores, tons e

texturas. Entretanto, também ali o conhecimento transmitido se dava somente no

nível da técnica. A professora Zenaide tinha uma leveza quando pegava o pincel

para colocar a tinta na tela. Isso me fascinava e cada vez mais a vontade de pintar.

Durante o tempo que passei aprendendo com a professora Zenaide, veio-me a

curiosidade de saber como ela havia aprendido a pintura. Disse que tinha sido no

tempo de colégio com uma freira que se chamava Irmã Miriam. Hoje analisando

essas questões, penso que era uma espécie de projeção que eu fazia ao vê-la

pintar. No entanto, devido, ao custo do material e da mensalidade, passei pouco

tempo aprendendo pintura com essa professora.

Aprender pintura com D. Zenaide se restringiu também à execução da

técnica. Na escolha de uma temática para pintar, por exemplo, uma paisagem, ela

dizia que observasse a linha do horizonte, pois esta teria que ser bem “retinha”. Não

havia uma reflexão sobre a localização da linha do horizonte e as consequências

para a composição. Sobre esse detalhe, passei a entender melhor, quando paguei a

disciplina Desenho I, II, III no Curso de Artes Visuais da UFRN.

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Durante as aulas, a professora Zenaide dizia que eu andasse com um

caderninho para que anotasse as coisas que ela fosse falando sobre a pintura.

Passei a anotar as observações dela em um pequeno bloco de rascunho.

Diante do aprendizado que fui adquirindo na graduação do curso de

Artes/URFN, entendi que esse caderninho que a professora pedia para conduzir

comigo é o caderno do artista, o “diário de bordo”, “diário gráfico”, cadernos de

artista que os professores das disciplinas de Pintura, Desenho e Expressão Visual

do curso de arte visuais da UFRN, tanto incentivam que os alunos façam anotações

das suas pesquisas e processos.

Em seu artigo “A diversidade de processos nos cadernos de criação”, a

professora e pesquisadora Laís Guaraldo reflete sobre o caderno de criação:

O que caracteriza um caderno é a sua função de suporte para o registro verbal ou visual de informações. É folheável, discreto, de pequeno formato, e se fecha. Essa natureza introvertida, portátil e ágil dos registros feitos em cadernos é, provavelmente, aquilo que mais desperta a atenção e interesse entre aqueles que se dedicam a confeccionar um caderno ou pesquisá-lo. É considerado um “ateliê de bolso” pelos artistas, ou um companheiro, pelos viajantes, um suporte para anotações, para qualquer estudante ou profissional. (GUARALDO, 2012, p. 654)

Os cadernos de anotações podem ser um instrumento importante para o

processo de criação do artista. A professora reforçava sempre a ideia de que era

importante fazer as anotações sobre as “dicas”, porque durante o processo artístico,

poderiam ser consultadas e aplicadas nos trabalhos. Porém, o caderno que a

professora pedia para que fosse anotando as considerações que ela fazia durante

as aulas, era mais no sentido de um caderno escolar.

Nos meus cadernos dessa época, fazia anotações das cores que se utilizam

em montanhas, nas águas de um rio, do mar, do céu, as folhagens das árvores e

das plantas. Falava dos aspectos da luz e sombra nos objetos, nas coisas, entre

outros fatores que exigissem a percepção do artista.

Em relação às cores das montanhas em uma paisagem, explicava que, na

composição, os elementos que ficassem mais próximos do observador, no primeiro

plano, seriam as cores mais escuras e os que ficavam mais distantes se aplicavam a

cores mais claras, porque davam a impressão de estar longe. Para isso tínhamos

que usar o azul cobalto ou azul da prússia, misturado com um pouco de sombra

natural. Quanto à cor do céu, seria com os tons de azul misturado ao branco. Dizia

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que para pintar o céu seria mais claro na parte de baixo e mais escuro na parte de

cima de quem observa o quadro.

Essa técnica denominada de Perspectiva aérea, aprendi com as disciplinas

de História da arte, de Desenho e de Pintura. É uma forma de representar, na

pintura, os elementos que estão distantes do olhar do observador.

A professora explicava como fazer as folhas de uma composição de flores.

Falava que pintar folhas para demonstrar certa naturalidade não era um trabalho

simples. Dizia que eu tinha que ser bastante observadora para internalizar as cores

que percebia nas coisas, nos objetos, na natureza, exemplos desse exercício,

(Figura 8 e 9). Ou seja, fazia parte do processo, aguçar a percepção para o mundo.

Figura 8: Papoulas, óleo sobre tela - 2002

Foto: Ocirema Pacheco

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Figura 9: Casas do interior II, óleo sobre tela, 2002

Foto: Ocirema Pacheco

Ostrower (2013, p. 57) comenta que a percepção: “envolve um tipo de

conhecer, que é um apreender o mundo externo junto com o mundo interno, e ainda

envolve, concomitantemente, um interpretar aquilo que está sendo apreendido”. Ou

seja, tudo acontece ao mesmo tempo.

Observar as coisas que estavam à minha volta para aplicar na pintura passou

a ser uma prática constante. A partir da orientação da professora, passei a observar

mais as plantas, a paisagem, a natureza, as coisas do mundo em geral.

Até aqui discorri sobre as contribuições e especificidades do ensino não

formal da pintura experienciada por mim, na minha formação. Não havia, em toda

essa experiência relatada, a referência à reflexão que os pintores realizam a respeito

da pintura. Como se tratava de aprendizado ainda no nível do tradicional, sobretudo,

o da técnica da pintura, um exemplo clássico de pensamento a esse respeito são as

reflexões de Leonardo da Vinci.

Leonardo da Vinci chama a atenção para as técnicas gráficas do desenho

com uso excepcional da luz e sombra na construção das formas:

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A enorme graça das sombras e das luzes atinge os olhares dos que atravessam as portas daquelas habitações escuras, e os olhos do observador veem a parte sombreada de tais visões ser escurecida pelas sombras da habitação, e veem a parte iluminada da própria visão atingir a clareza que lhe dá o esplendor do ar. O aumento das sombras ou das luzes tem grande importância para o olhar [...] que adquire uma enorme beleza. (DA VINCI, 2011, p. 94)

Percebe-se uma forte consciência e preocupação em relação à luz como

elemento expressivo e uma investigação sobre a percepção desse fenômeno no

mundo e as possibilidades de representação daquilo que é volátil, sem contornos,

mas que está presente.

A primeira intenção do pintor é fazer com que uma superfície plana se torne um corpo e destacado com relevo. Aquele que em tal arte ultrapassa os demais merece maior louvor. Esse resultado nasce das sombras e luzes ou, melhor dizendo, do claro e do escuro. (DA VINCI, 2011. p. 132)

Em 2008, tornei-me aluna dos cursos de Desenho e Pintura no atelier do

NAC/UFRN por dois anos. Tinha ali uma estrutura física melhor, um espaço maior,

possibilitando que todos tivessem a oportunidade de trabalhar de forma mais

prazerosa.

No atelier do NAC, conheci a técnica da pintura com acrílico em tela, (Figuras

10, 11 e 12). O aprendizado desse material foi bastante relevante, porque pude ver a

diferença que existia entre a tinta acrílica e a tinta óleo.

Entretanto, com essa nova pintura, a acrílica, senti dificuldade em aplicá-la no

suporte da tela, pois estava acostumada com a pintura a óleo, mesmo elas

apresentando semelhanças em sua plasticidade, mas, ao mesmo tempo, tinham

aspectos bastante distintos como a secagem. Por ser uma tinta plástica e diluente

em água, então a secagem se faz mais rápida, diferentemente da tinta a óleo que

demora a secar por não ter as mesmas características em sua composição química.

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Figura 10: Tulipas, acrílico sobre tela - 2008 Figura 11: Cactus, acrílico sobre tela - 2008

Foto: Ocirema Pacheco Foto: Ocirema Pacheco

Figura 12: Dia ensolarado, acrílico sobre tela, 2008

Foto: Ocirema Pacheco

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Em busca de aprofundar o meu conhecimento sobre as características da

pintura, pensei que nesse novo lugar, o NAC, seria diferente. Mas não foi. A

metodologia aplicada pelo professor não era integrada com a apreciação crítica e a

contextualização da pintura.

Apesar de o professor ser um estudante/bolsista de Artes Visuais, presumia-

se, portanto, ter certa bagagem sobre a pintura, mas a didática era a mesma das

professoras anteriores. Não havia um objetivo, um plano de aula, um projeto que

utilizasse estratégias para mediar o aprendizado dos alunos.

Não havia um pensar sobre a pintura como forma expressiva, como poética,

as estruturas da pintura como linguagem. Novamente estava no nível da intuição.

A vivência e experiência com essa expressão artística, a pintura,

desenvolvem a percepção e senso estético para a compreensão do processo

criativo. Nesses aspectos é importante que o professor utilize estratégias

pedagógicas que estimulem a capacidade do aluno, fazendo-o refletir sobre o fazer

arte. Isso levará o estudante a construir sua subjetividade enquanto explora a sua

poética, levando-o a uma ação significativa, uma nova visão sobre o seu entorno

para poder interagir de forma crítica com o seu mundo.

Conforme Ostrower (2013, p. 93), “ao apreciarmos uma obra de arte,

procuramos entender seu conteúdo expressivo a partir da forma global da imagem”,

ela é constituída de possíveis significados e interpretações dependendo da vivência

e cultura de cada um.

A partir dessa consciência estética sobre a pintura, pode-se ter a noção de

que o belo, o realismo, ou a técnica não são os aspectos mais importantes de uma

obra de arte. A pintura, com suas características, propõe, segundo Miés (2013) “uma

série de processos poéticos particulares constituídos no embate entre tintas e tela...”

nessa proposição envolve a cor, a textura, o campo visual, as relações de figura e

fundo entre outros. A exemplo disso, Matisse (2011, p. 56) diz que encontra: “o uso

da cor como simples instrumento de expressão do sentimento, e não como o meio

de construção de um espaço”. É importante para o artista desenvolver o seu

processo artístico, para que permita se expressar e que sua arte provoque a

reflexão.

Cabe ao educador buscar se aprofundar e conhecer os fundamentos da

pintura, para entender e assim melhor ensinar de forma a auxiliar nas práticas

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pedagógicas do ensino da pintura. Quanto a esse pensamento da busca constante

pelo conhecimento, os PCN’s em Artes afirma que:

A educação em artes visuais requer trabalho continuamente informado sobre os conteúdos e experiências relacionados aos materiais, às técnicas e às formas visuais de diversos momentos da história, inclusive contemporâneos. Para tanto, a escola deve colaborar para que os alunos passem por um conjunto amplo de experiências de aprender e criar, articulando percepção, imaginação, sensibilidade, conhecimento e produção artística pessoal e grupal. (BRASIL, 2001, P. 61)

Pensar e planejar o ensino de pintura, tomando como base esses parâmetros,

é fundamental para a aprendizagem e para a formação do aluno.

No contexto do campo formal da pintura, em relação à cor, ouvia falar

somente nas primárias e secundárias, mas não tinha uma reflexão sobre “Teoria da

cor”, nem tampouco do círculo cromático.

Quanto ao suporte que era utilizado para a pintura, restringia-se somente à

tela. Não havia o conhecimento acerca das possibilidades de se pintar em papel ou

materiais alternativos. Foi na graduação que tive a noção de se trabalhar em papéis

específicos e com gramaturas adequadas para cada tipo de processo que fosse

realizar.

Como o meu desejo era conhecer de fato o que eu fazia e ampliar

efetivamente o conhecimento sobre pintura, no final de 2013, submeti-me à prova do

ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio. Em 2014, ingressei no Curso de

Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

No Curso de Licenciatura em Artes Visuais (CLAV) comecei a ter uma noção

sobre as disciplinas História das Artes, Expressão Visual, Fundamentos da

Linguagem Visual, Pesquisa em arte, Crítica de Artes, Estética Filosófica, Desenho,

Pintura, entre outras que fazem parte da grade curricular do CLAV.

Estudar essas disciplinas abriu para mim um leque de possibilidades no

ensino e na aprendizagem da pintura. Oportunidades bastante significativas como

entender sobre as características da linguagem pictórica e, sobretudo, compreender

o que seria os elementos constituintes da linguagem visual, também utilizados na

pintura. Como também participar de projetos, palestras, exposições, oficinas,

projetos de extensão do Grupo Universitário de Aquarela e Pastel – GUAP/UFRN e

de projeto de pesquisa à Iniciação Científica, tanto na qualidade de bolsista como de

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voluntária que, consequentemente, contribuíram para ampliar a minha visão e

repertório sobre as artes visuais.

A tomada de consciência sobre o processo de criação, também é fundamental

para o desenvolvimento do processo do artista. Ostrower (2013, p. 27) afirma que, “a

criatividade, como entendemos, implica uma força crescente; ela se reabastece nos

próprios processos através dos quais se realiza”. Isto quer dizer que a criatividade

está sempre em refazimento. O processo de criação na pintura não se esgota, ao

contrário, amplia-se.

Conhecer o meu processo criativo contribuiu para refletir a respeito das

minhas práticas antes e depois de iniciar o curso de artes visuais. O ensino formal

de arte proporcionou para mim o conhecimento e um olhar de forma diferente para

as pinturas que fazia e as pinturas atuais. Matisse

Sente muito intensamente o laço que une minhas telas mais recentes às que pintei outrora. No entanto, hoje não penso exatamente o mesmo que pensava ontem. Ou melhor, a essência de meu pensamento não mudou, mas meu pensamento evoluiu e meus meios de expressão o acompanharam. Não repudio nenhuma tela minha, e não há nenhuma que eu faria de outra maneira se tivesse de refazê-la. Busco sempre o mesmo fim, mas calculo de modo diferente meu caminho para chegar até ele. (MATISSE, 2007, p. 37)

Nesses aspectos, o aprendizado, de forma geral, influencia na prática, na

visão de mundo, de crenças e de representações que irão determinar o

desenvolvimento do pensamento artístico. O artista, quando toma consciência de um

modo próprio de ordenar e dar sentido às suas experiências, tem condições de

estabelecer relações mais amplas dentro do seu fazer como a sensibilidade, a

percepção e a imaginação, seja no processo de criação ou na apreciação de outros

trabalhos.

A educação dos sentidos e da percepção amplia o nosso conhecimento de mundo, o que vem reforçar a ideia de que a arte é uma forma de conhecimento que nos capacita a um entendimento mais complexo e de certa forma mais profundo das coisas. (ZAMBONI, 2001, p. 21)

Nessa perspectiva, o fazer artes, por meio de um estudo mais apurado,

possibilita que se compreenda o mundo de forma mais poética e prazerosa. É

possível também transformar-se, ter flexibilidade diante das coisas que se

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apresentam diante de si, logo o conhecimento e o criar são aspectos que se

interligam, fazendo conexões no processo da aprendizagem, e, sobretudo, no

desenvolvimento sensível do indivíduo.

A consciência de ser sempre um aprendiz, para mim foi relevante iniciar o

curso de formação em artes. Conforme Zamboni (2001, p. 20), “tanto a arte como a

ciência acabam sempre por assumir um certo caráter didático na nossa

compreensão de mundo [...]”. Entender esse processo anterior, que aqui chamo de

intuitivo, através do ensino metodológico formal é significativo para entender a arte.

Como afirmam Camozzato e Costa (2023, p.163), “temos a noção de educação

como um processo que se dá no tempo, como algo que vai sendo esculpido através

do cotidiano da ação de um educador”. Com base nessas ideias, o aprendizado

através da educação vai moldando o indivíduo conforme as suas ações constantes.

Hoje percebo a arte como uma forma de valorizar o ser humano, por meio de

diversas manifestações que levam o aluno a se relacionar com o meio em que vive

de modo prazeroso e integrado socialmente.

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2 A COMPOSIÇÃO E FORMA SINTÉTICA

O pintor passa por diversas ações no seu trabalho de dar formas as suas

aspirações. Ações como a depuração de seus processos criativos e a elaboração de

uma organização formal da composição que se transforma à medida que a

superfície da tela é coberta.

Uma preocupação exposta por Matisse em seus escritos se deva no sentido

de buscar uma composição onde o olhar do observador não fixasse em um ponto

somente do quadro, levando-o a um estado de calma e contemplação da pintura.

Matisse (2007, p. 41) reflete que, “para isso, estudo meus meios de maneira muito

rigorosa”.

Percebe-se nos escritos de Matisse uma recorrente atenção em relação ao

tema da ordenação formal do seu trabalho. Sobre esse pensamento, Matisse (2007,

p. 43) é incansável em dizer que “se há no quadro muita ordem, muita clareza, é

porque desde o começo essa ordem e essa clareza existiam no espírito do pintor ou

o pintor tinha consciência da necessidade delas”.

Matisse tinha uma preocupação para que na sua obra, o observador pudesse

contemplar e, ao mesmo tempo, aguçar o olhar.

Há em comum nos projetos poéticos de Matisse e Paulo Pasta uma

elaboração compositiva estruturada a partir de formas simplificadas estruturadas

pela cor. Nesse capítulo, esse aspecto será analisado à maneira como se dá a

organização formal do trabalho de Matisse e posteriormente de Paulo Pasta.

Também atento às questões relacionadas com a ordenação formal, Paulo

Pasta realiza uma série de experimentações compositivas, através de um fazer

reflexivo e cauteloso, e busca a uniformidade das formas que se materializam em

outras formas com o uso das cores. Pasta (2012, p. 109), em relação às formas,

esclarece “surgiam quando eu removia a última ou penúltima camada de tinta, nas

cores das camadas anteriores”.

O crítico de arte, Giulio Carlo Argan analisa a pintura “A dança” de Matisse,

(Figura 13) da seguinte maneira:

A arte (parece ele dizer) ainda pode penetrar as verdades supremas do ser, as infinitas harmonias do Universo ─ é talvez a única atividade humana que ainda pode fazê-lo [...]. O quadro tem um significado mítico-cósmico: o solo é o horizonte terrestre, a curva do mundo, o céu tem a profundidade azul-

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turquesa dos espaços interestelares, as figuras dançam como gigantes entre a terra e o firmamento. (ARGAN, 1992, p. 259)

Figura 13: Matisse, A Dança, 1910

Fonte: http://leisepaim.blogspot.com.br/2013/02/matisse-da-pintura-colagem.html

A relação entre o aspecto da forma das figuras com a tonalidade e a cor é

uma atenção recorrente nos escritos de Matisse. “Há uma proporção necessária dos

tons que pode me levar a alterar a forma de uma figura ou a modificar minha

composição”. (MATISSE, 2007, p. 46).

Porém, se ele não consegue esses tons no momento em que está pintando,

continua procurando até encontrar uma relação que considera equilibrada em seu

conjunto. Para Matisse forma e cor andam juntas, é um casamento de relações

harmônicas e de equilíbrio compositivo. Em “A Música” é possível observar esses

aspectos. (Figura 14).

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Figura 14: Henri Matisse, A Música, 1910 Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Music_(Matisse)

Nota-se nesses trabalhos formas planas e simplificadas, cor chapada, sem

marcação de volume ou luz, limitada por contornos escuros. Observa-se na pintura

“A Música” linhas que contornam as figuras, num grafismo que se assemelha a um

desenho infantil. Não se vê um realismo clássico nas figuras, mas, enquanto formas

proporcionam um equilíbrio à composição.

No trabalho de Matisse, não é necessário que a forma seja reforçada com

luzes intensas, pois a forma se faz presente na pintura quando entra em

concordância com um fundo da superfície. No entanto, a cor e a forma conjugam

aspectos expressivos a partir dessa relação estrutural da pintura. Matisse trabalha

com o azul, verde e vermelho gerando nas formas uma harmonia entre elas. Sobre

esse processo, Matisse descreve:

Com essas três cores eu tinha o meu acorde luminoso e a pureza de tom. Uma característica: a cor era proporcional à forma. A forma se modificava conforme as reações das vizinhanças coloridas. Pois a expressão vem da superfície colorida que o espectador capta em sua inteireza. (MATISSE, 2007, p. 93-95)

Na distorção das formas, Matisse simplificava-as com a intenção de exaltar a

relação entre as cores, como também delimitar o espaço e sugerir planos. Em suas

pinturas como em “Banhistas com uma tartaruga”, usava formas curvas com certo

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exagero (Figura 15). Realçava a expressão com elementos compositivos da pintura

buscando sempre a pureza da forma, da linha e das cores.

Matisse não se prendia às ideias preconcebidas pela tradição e nem aos

detalhes que pudessem dar à forma um caráter naturalista. No entanto, proporciona

no campo plástico da pintura um controle das formas, um equilíbrio que, por meio

dos contrastes e semelhanças ganha uma leveza e placidez. A forma como as mãos

da figura que está em pé entre as outras duas personagens, dá ao espectador a

ideia de ternura, compadecimento ao ver o animal.

Outro aspecto utilizado pelo artista é o uso da horizontalidade na disposição

dos elementos, céu, água e plantas pelo uso das cores frias: o azul e o verde, e a

utilização de uma linha preta que separa esses elementos da natureza. Percebe-se

que essas características contribuem, de forma harmônica, todo o cenário da

pintura, e também proporciona uma estabilidade na composição. Deixa claro que há

uma relação formal no campo visual e harmonização na composição.

Figura 15: Henri Matisse – Banhistas com uma tartaruga - 1908

Fonte: http://pt.wahooart.com/@@/8XY7K8-Henri-Matisse-Banhistas-com-uma-tartaruga

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Em seus trabalhos, Matisse tinha a intenção de reforçar o aspecto plano da

pintura com a redução das cores e imagem sintética. O contorno com uma linha

preta nas figuras apresenta estabilidade na composição.

Matisse declara que a expressão na pintura tem que ser baseada nas

sensações. Para Gaston Diehl (2007, p. 17), condensação, estabilidade, ordem e

clareza, na pintura de Matisse, são fatores que determinam disciplina para chegar a

essa arte de equilíbrio, pureza e harmonia. Matisse propõe a busca pela expressão

quando diz que:

A expressão, para mim, não reside na paixão que refulge num rosto ou se afirma num movimento violento. Ela está em toda a disposição de meu quadro: o lugar que os corpos ocupam, os vazios em torno deles, as proporções, tudo isso tem seu lugar. A composição é a arte de arranjar de maneira decorativa os diversos elementos de que dispõe o pintor para exprimir seus sentimentos. Num quadro, cada parte será visível e desempenhará o papel que lhe cabe, principal ou secundário. Tudo o que não tem utilidade no quadro é, por isso mesmo, prejudicial. Uma obra comporta uma harmonia de conjunto: qualquer supérfluo ocuparia, no espírito do espectador, o lugar de outro detalhe essencial. (MATISSE, 2007. P. 39).

Nesse sentido, tudo que faz parte de uma pintura tem o seu valor, seja

principal ou secundário, e será visível, porque existe nela uma harmonia de

conjunto.

O detalhamento analítico das figuras não era importante para a pesquisa

plástica de Matisse, mas a síntese formal, sim. Quanto a esse aspecto da forma,

como na pintura “Odaliscas” (Figura 16) não se prendia a detalhar todos os traços do

rosto. Não pintava dentro de uma exata perspectiva anatômica. Matisse tinha

preocupação com a silhueta do rosto, com os movimentos das mãos.

A artista e escritora Françoise Gilot (1992, p. 175) em seu livro “Matisse e

Picasso” diz que Matisse “nunca procurava beleza nas modelos, mas as feições

bem-equilibradas e até mesmo enérgicas”. Ele buscava captar a expressão através

da emoção, como se pode observar a mão da mulher que está sobre a testa. Nessa

obra Matisse se preocupou apenas no movimento e o que isso pode transmitir.

Nessa pintura, a mão da mulher, junto à cabeça, segue a mesma forma do

encosto da cadeira, e do mesmo modo, percebe-se que a perna do mesmo lado do

braço segue uma angulação em que ambos, mesmo apresentando certa

dinamicidade no espaço pictórico, equilibram-se. O corpo da mulher se apresenta na

diagonal, em que o braço e a perna esquerda estão estendidos numa mesma

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posição, seguindo a mesma direção. Existem na cena três faixas que aparecem na

vertical do espaço pictórico, apresentando estabilidade e equilíbrio ao espaço visual.

Na parede predomina os detalhes decorativos que harmonizam o ambiente através

das cores chapadas.

Fica claro que a harmonização se faz em todo o campo plástico do quadro.

Mesmo não trabalhando com as questões que envolviam os aspectos plásticos da

pintura no período clássico, Matisse cria no espaço uma profundidade e a ilusão de

tridimensionalidade, a partir da faixa preta que faz uma sombra ao lado da mesa que

fica por trás da cadeira em que está a mulher, como os objetos que estão sobre a

mesa também.

Nessa escolha da disposição da forma, os elementos na composição se

equilibram formando um todo harmônico.

Os elementos visuais que entram na composição, formando uma imagem, receberão qualificações de acordo com sua posição no plano. Terão valores diferentes, tanto em termos de estrutura de espaço como em termo de expressividade. Se uma forma visual estiver colocada no alto do plano, as várias qualidades formais que porventura já existam (por exemplo, diagonalidade, sequências rítmicas, cores claras) serão reforçadas no sentido de maior leveza e movimentação [...] (OSTROWER 2013, p. 72)

Figura 16: Henri Matisse, Odaliscas, 1922

Fonte: https://www.google.com.br/search?q=mulheres++DE+MATISSE&tbm=isch&imgil

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Em outra passagem, Matisse (2007, p. 97), reflete que “simplesmente o

estado de nosso problema plástico não nos permitia chegar à perfeição dos

detalhes”. Ainda, Matisse (2007, p. 97) acrescenta que, “Renoir pintava as mãos

seguindo sua emoção, sensação por sensação”.

O quadro de Renoir “Menina com as espigas” (Figura 17) apresenta uma

organização espacial e uma relação das formas bem equilibradas no campo visual.

Mesmo não sendo adepto das convenções clássicas, o que se vê em sua pintura é

um rigor formal ainda muito atrelado aos detalhes naturalistas como a centralidade

da figura no plano pictórico, características muito utilizadas nessa época. Porém,

quanto às mãos da menina, Renoir representa nela o que Matisse enfatiza, ou seja,

permite que se veja a expressão do movimento dos dedos, uma sutiliza e ao mesmo

tempo uma vivacidade das mãos.

Figura 17: Pierre Auguste Renoir. Menina com as espigas, 1888

Fonte: http://masp.art.br/masp2010/acervo_detalheobra.php?id=267

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A preocupação de Matisse e Renoir era com o todo da obra, o conjunto

plástico. Matisse tinha apenas o intuito de decifrar, só interessava a ele o ritmo, o

movimento das mãos. Não interessava os detalhes que se apresentavam no corpo

das modelos que ele tinha como parâmetro para suas pinturas, e sim suas intenções

no processo criativo.

Gilot esclarece que Matisse, “só procurava decifrar, sem nunca tentar imitar, a

verdade duradoura que havia por trás da miragem das aparências variáveis. Lutava

com a natureza sem se submeter a ela”. (GILOT, 1992, p. 165)

Matisse tinha o desejo de realizar um trabalho que manifestasse um conteúdo

expressivo relacionado com paz, equilíbrio, e simplicidade. Uma arte que não

perturbasse o olhar do espectador. Com esse ideal, Matisse revela que,

Sonho com uma arte de equilíbrio, de pureza, de tranquilidade, sem temas inquietantes ou preocupantes, uma arte que seja, para qualquer trabalhador cerebral, quer o homem de negócios, quer o homem cultivado, por exemplo, um lenitivo, um calmante mental, algo como uma boa poltrona onde ele pode relaxar o cansaço físico. (MATISSE, 2007, p. 47)

Essa busca pela simplicidade pode ser compreendida quase que de maneira

budista. Não se trata de um olhar rápido, descuidado, superficial sobre o mundo.

Mas de uma compreensão e desejo por uma essência equilibrada que pode haver

entre as coisas.

Matisse buscava uma arte que fosse acessível para qualquer pessoa,

independente de status, o intuito era que o observador sentisse uma leveza e

serenidade ao apreciar as suas pinturas. O professor e escritor Antonio Costella

(2010, p. 24) salienta que: é o artista, com sua competência, que consegue induzir

no observador um sentimento escolhido e habilmente desencadeado.

Como parte desse projeto poético relacionado com simplicidade das formas e

relação equilibrada entre forma e cor, identificamos uma forma recorrente em suas

composições, que são os arabescos. Essas formas dão ênfase a esses valores.

Matisse (2007, p. 178) enfatiza a ideia de que, “os enfeites ou arabescos

nunca sobrecarregam meus desenhos feitos a partir de modelos, porque esses

enfeites e arabescos fazem parte de minha orquestração”. Em sua obra os

diferentes padrões decorativos dos arabescos dão ritmo e movimento a superfície

pictórica.

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Matisse (2007, p. 227) diz que a partir das miniaturas persas é que se

mostrou toda a possibilidade de exprimir as suas sensações. Afirma que “Com seus

acessórios, essa arte sugere um espaço mais amplo, um verdadeiro espaço

plástico”. Sobre esse aspecto da arte decorativa, Françoise Gilot em seu livro

“Matisse e Picasso” discorre acerca do percurso de Matisse no seu processo criativo

em relação ao recurso utilizado pelo pintor em suas poéticas, e que, quando ao

visitar uma exposição de arte islâmica o comoveu pela serenidade e espiritualidade.

Ficou particularmente interessado pela encantadora idealização das antiguidades persas, moghal e indianas e percebeu que os orientais tinham uma natureza mais artística que os ocidentes. Achava que, quando as nações ocidentais envelheciam, sua arte ficava complicada e demasiadamente calma. Começou então a procurar por uma forma de expressão mais espontânea e jovem aceitando de bom grado os sacrifícios necessários para trabalhar livremente. (GILOT,1999, p. 166)

A arte decorativa de Matisse mostrava que o artista tinha uma consciência a

respeito do seu processo criativo, através da utilização de ornamentos orientais e

islâmicos, instigando cada vez mais a sua percepção, o seu olhar e a sua

sensibilidade.

Em suas composições, Matisse apresentava os padrões decorativos dos

tapetes harmonizando com a composição plástica da superfície pictórica. Os

ornamentos da parede envolve a figura da mulher de forma que o quadro “Mulher

lendo em uma pequena mesa” apresenta um equilíbrio e estabilidade (Figura 18). O

formato da mesa mostra a noção de perspectiva clássica, com a ideia de

tridimensionalidade do objeto mesa. O jarro com flores se harmonizam nessa

relação de forças opostas.

Nessa imagem, as faixas brancas de tintas em formas verticais na parede se

contrapõem com as formas decorativas pintadas com tons azuis e a sinuosidade da

mesa. As pinceladas diagonais do livro e a linhas sinuosas que acompanham o

ângulo do braço esquerdo da mulher e da mesa se harmonizam. As linhas da saia

da mulher com formatos que se aproximam aos dos arabescos dialogam com as

faixas horizontais.

Matisse cria uma planificação da pintura, unindo parede e piso

simultaneamente, por uma linha tênue. Um dos pés da mesa se confunde com as

manchas escuras de tintas do piso como se estivesse dando continuidade a essa

superfície. O uso da cor branca em algumas formas da composição dá ao

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observador a sensação de muita luz e clareza ao ambiente. Observa-se formas

repetidas na decoração da parede, um dos recursos bastante utilizados por Matisse.

Dessa forma, Matisse estabelece uma relação de equilíbrio entre os elementos

tridimensionais em primeiro plano e os bidimensionais. Ostrower (2013, p. 98)

colabora dizendo que “ao olharmos o quadro, nós também procedemos de modo

intuitivo. E, ao compreendermos, fazemos as nossas sínteses”.

Figura 18: Henri Matisse, Mulher lendo em uma pequena mesa – “cerca de 1923

Fonte: https://www.google.com.br/search?q=pinturas+de+Matisse+com+arabescos&rlz

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2.1 A SÍNTESE DA COMPOSIÇÃO

Paulo Pasta também propõe uma arte pura, da tranquilidade e do equilíbrio

por meio da realização de um processo que busca trabalhar não só a cor e a linha,

mas também a forma como recurso expressivo da composição pictórica. Do mesmo

modo que Matisse, Pasta não se preocupava com o objeto em si, também não se

limitava a formas lineares.

No Prefácio do livro ”A Educação pela pintura” de Paulo Pasta, Antonio

Gonçalves Filho observa que Pasta pinta pensando “na emoção que sua imagem

provoca, recapturando o frescor do inaudito, daquele primeiro olhar sobre o mundo”.

Assim como Matisse, Paulo Pasta não dissocia a forma da cor. Mas de

maneira diferente de Matisse vem desenvolvendo em sua trajetória um progressivo

desaparecimento da forma.

O formato dos elementos nas pinturas de Paulo Pasta foi se expandindo, de

modo que foram se apresentando novos elementos com figuras distintas em seu

processo artístico, e, ao mesmo tempo, dando lugar a cor. Além disso, pela

dimensão desses objetos, a superfície do quadro exige que se trabalhe com pincéis

maiores para conseguir um campo visual mais plano e uniforme.

A partir das formas mais simplificadas, Pasta comenta que “as sucessivas

camadas de óleo com cera foram apagando as imagens, tornando-as assim

vestígios de imagens”. (PASTA, 2012, p. 108). Nesse processo, sua pesquisa

pictórica investiga as possibilidades múltiplas da forma e estruturação do espaço.

A relação entre a cor e a forma é analisada por Pasta (2012, p. 116) da

seguinte maneira: “quando penso na cor, também penso na forma”.

A partir da disposição das formas com aspecto de colunas (Figura 19), outras

modelos vão surgindo pela a variação de cores. Nessa passagem de uma cor para

outra a composição assume uma leveza que remetem a uma sensação de equilíbrio

e harmonia. O espaço pictórico se organiza de modo a articular uma sintonia entre

figura e fundo. Ostrower (2013, p. 97) diz que “a ordenação formal que é dada a uma

obra, deve ser entendida como única maneira possível de objetivar uma experiência

subjetiva”.

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Figura 19: Paulo Pasta, S/T

Fonte: http://gravuracontemporanea.com.br/index.php/2016/02/04/artista-paulo-pasta/

Na pintura “Cruz amarela” de 2008 (Figura 20), Pasta deixa de lado os

recursos expressivos da sombra, contorno e perspectiva. E observa que em

detrimento de uma técnica anterior, essas novas formas abriram campo para outras

maneiras de trabalhar em seu processo artístico.

Consegui com elas uma ativação maior do espaço, tornando-o mais plano e definido. Abandonei também uma construção apoiada somente na mão e no pincel: se antes construía as formas livremente, à “mão livre”, hoje tenho a ajuda de fitas adesivas para obter maior precisão. (PASTA, 2012, p. 121-122).

A planaridade também é um aspecto recorrente nas pinturas de Paulo Pasta.

Nessa imagem, a construção de elementos em forma de cruzes repetidas se

apresentam no mesmo espaço e outras formas são constituídas pela variação de

tons e cores. A síntese da forma é trabalhada de modo que a superfície cria uma

harmonia e equilíbrio na expressão pictórica. Na medida em que as partes

horizontais das cruzes se encontram na superfície da tela aparecem nos espaços

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vazios outras formas: formas quadradas e retangulares, figura e fundo se

relacionam. Formas geométricas que, na junção ou combinação com as outras,

estabelecem uma integração dos elementos na composição.

Figura 20: Paulo Pasta, Cruz amarela, 2006. Óleo e pastel sobre tela, 150x180 cm.

Fonte: http://www.galeriamillan.com.br/pt-BR/ver-obras/13

Forte influência também na trajetória de Paulo Pasta foi o pintor italiano

Alfredo Volpi (1896 – 1988). Assim como Pasta, Volpi gostava de criar e

experimentar novas formas para aplicar em seus trabalhos. Nos trabalhos de Volpi

são recorrentes também as repetições de formas simplificadas. O jogo espacial e a

poética do quadro são estruturados pelas cores.

Ao longo dos anos, as pinturas de Volpi foram tomando novos formatos, no

mesmo caminho como as de Paulo Pasta. Podem-se analisar essas características

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nas (Figuras 21, 22 e 23). Formas geométricas vão surgindo no lugar de formas

orgânicas.

A imaginação do artista não inventa arbitrariamente as formas das coisas. Mostra-nos essas formas em sua verdadeira figura, tornando-as visíveis e reconhecíveis. Escolhe um determinado aspecto da realidade, mas esse processo de seleção é, ao mesmo tempo, de objetivação. Uma vez que entramos em sua perspectiva, somos forçados a olhar o mundo com seus olhos. (GIANNOTTI, 2009, p. 15)

Percebe-se que Volpi, ao longo do seu processo vai desmaterializando a

proposta de uma pintura mais naturalista. Progressivamente os seus trabalhos vão a

partir dos primeiros tomando uma abstração mais particular no percurso do processo

criativo e ganhando uma autonomia na relação formal da pintura.

Figura 21: Alfredo Volpi - Paisagem de Mogi.

Fonte: http://www.espacoarte.com.br/obras/6791-alfredo-volpi

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Figura 22: Alfredo Volpi, S/T

Fonte: http://valiteratura.blogspot.com.br/2010/12/alfredo-volpi.html

Figura 23: Alfredo Volpi, Fachada, têmpera sobre tela,

Fonte: http://studiorobertoreis.com.br/alfredo-volpi-o-artista-das-bandeirinhas/

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Paulo Pasta compara os trabalhos de Volpi com os do pintor brasileiro José

Antonio da Silva (1909 – 1996), quando diz que, “suas soluções formais obedecem

ao espaço planar do quadro, tem autonomia e não são subservientes ao assunto”

(PASTA, 2012, p. 81 - 82). Como Volpi, Silva trabalha com repetição e abstração

das formas (Figura 24). A pintura, “Algodoeiro com tronco decepados” apresenta

elementos que remetem ao campo, mas do mesmo modo que Matisse não se

preocupava com a representação detalhada das formas, nas composições de Silva,

nota-se também claramente essas características. Ou seja, destaca-se a expressão

entre figura e fundo por meio da utilização das cores.

Pasta comenta sobre as características apresentadas na pintura de João

Antonio da Silva: “ele serializa e repete alguns elementos da pintura, carregando-as

de um sentido ambiguamente abstrato” (PASTA, 2012, p. 80). Partindo desse

princípio, pode-se concluir que assim como Volpi, Matisse e o próprio Paulo Pasta,

experimentam uma autonomia plástica das formas quando transforma os elementos

figurativos em formas mais sintetizadas, proporcionando um caráter expressivo em

sua composição.

Figura 24: João da Silva, Algodoeiro com tronco decepados

Fonte: http://www.espacoarte.com.br/obras/6025

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Em suas experimentações com a pintura e a busca pela ampliação do espaço

e de uma estruturação mais ordenada na ordenação da pintura, Pasta (2012, p. 104)

tem plena consciência de que, “a superfície pictórica, a fatura, sempre foi o elemento

que parecia unir minha sensação ao mundo”.

Nas pinturas de Pasta, não somente as cores, mas também as formas só

adquirem significado se entendidas no interior do seu contexto. Uma forma qualquer,

por exemplo, um retângulo pode se assemelhar a uma janela, sugerir o formato de

uma porta. O uso da cor e da forma passa por constante transformação no processo

artístico de Paulo Pasta (Figuras 25 e 26).

Percebe-se nessas pinturas ranhuras que rasgam a camada grossa de tinta

na superfície, dando à composição um aspecto meio desgastado de um material

velho, antigo. Ranhuras que dão a forma de ogivas. Pasta, em uma entrevista em

vídeo “Paulo Pasta – Encontros”, compara as ranhuras e os rasgados em sua

pintura com “signos culturais” quando diz que “parece signos culturais riscados

numa carteira de escola” (PAULO PASTA – Paulo Pasta, Encontros, vídeo), para ele

é como se tivesse fazendo riscos na madeira da carteira da escola.

Figura 25: Paulo Pasta. S/T, 1987 óleo e cera sobre tela

Fonte: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9809/paulo-pasta

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Figura 26: Paulo Pasta. S/T, 1990, óleo e cera sobre tela

Fonte: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra7284/sem-titulo

A pintura para Pasta, na fase em que foi influenciado pela metafísica, fez com

que ele fizesse uma escolha apurada dos temas, de objetos a serem pintados,

porque pensava que havia uma necessidade de manter o sentido das coisas. No

entanto, ao longo de suas experiências com as múltiplas possibilidades dos

procedimentos técnicos, como a escolha dos materiais, hoje vê que não precisa

mais continuar mantendo essa “simbologia”, como ele mesmo declara.

Em vídeo “Paulo Pasta – Encontros”, Pasta afirma numa entrevista que no

processo de sua pintura “a vontade é de afirmar as coisas, colocar diferenças no

quadro, romper com o monocromático, incorporar coisas, abrir para conteúdos

novos”. Em suas poéticas é perceptível essa busca por novas questões relacionadas

com a ordenação formal da pintura, através das formas, das cores. A cor

acompanha a forma que é pretexto para criar o espaço formal da pintura.

Novamente, não se vê nas formas contorno, sombra, perspectiva (Figura 27).

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Figura 27: Paulo Pasta. S/T, 1992, óleo sobre papel

Fonte: https://www.escritoriodearte.com/artista/paulo-pasta/sem-titulo/7865/

Giannotti (2009, p. 65) ressalta que “a escolha de alguns materiais em

detrimento de outros reflete a opção de uma determinada linguagem e define a

postura do artista em relação ao mundo”. E ainda a respeito do processo criativo e

das relações formais na pintura de Paulo Pasta, o crítico de arte Alberto Tassinari,

em um artigo, na Folha de São Paulo, com o título “Notas sobre a pintura de Paulo

Pasta”, acrescenta que.

Há uma atenção, na sua pintura, em não comunicar nem mais nem menos do que o motivo exige. Sua pintura é exuberante mas também serena. Como Braque, Paulo Pasta gosta de emoção corrigida pela regra. E basta, para comprová-lo, olhar suas magnificas pinturas como motivos arquitetônicos básicos, com arcos, colunas, pilastras e lajes, que se encontram e se desencontram, formam cruzes e as desformam, para avaliar o quanto o motivo arquitetônico conduz sua pintura e a eleva. (TASSINARI, 2016, Folha de São Paulo)

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Pasta trabalha com formas bastante diversificadas, no seu processo artístico.

Diante disso se constata que seus trabalhos apresentam idas e vindas em relação

às formas. Observa-se tanto pinturas de paisagens, como trabalhos mais abstratos,

(Figuras 28, 29 e 30) mesmo não se considerando um pintor de pinturas abstratas,

porque diz que sempre está pintando um lugar, em que a cor ajuda a construir esse

lugar e afirma que “a cor é o lugar e o lugar é a cor”. Na exposição, “Fábula da

paisagem – Paulo Pasta”, realizada pelo Instituto Figueiredo Ferraz, em 2013, em

vídeo, diz que isso acontece, pois faz, ao mesmo tempo, paisagens e o trabalho

“normal”, como ele denomina. Afirma que um ajuda o outro, porque busca conexões

entre um e outro.

.

Figura 28: Paulo Pasta 2013 - S/T - Óleo sobre papel

Fonte: http://www.iff.art.br/exposicoes/fabula-da-paisagem/

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Figura 29: Paulo Pasta. S/T, 1989, óleo e cera sobre tela

Fonte: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra15541/sem-titulo

Figura 30: Paulo Pasta, S/T, 1999, Óleo sobre tela

Fonte: https://br.pinterest.com/pin/543739354984350824/

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Existe em Pasta uma autonomia na capacidade de criar e desenvolver as

formas. Nas diversas possibilidades da forma estruturada pela cor, ele busca uma

estabilidade, uma unidade espacial menos fragmentada. Uma pintura mais

condensada e mais definida pelo aparecimento dos elementos que também vão se

modificando ao passo que as cores e tons vão variando no processo da sua poética.

Portanto, nessa busca por novas experiências com a pintura, Matisse e Paulo

Pasta refletem o tempo todo sobre as questões da cor e a síntese da forma no

espaço pictórico. Consideram as relações dos elementos da linguagem no espaço

plástico da pintura como uma característica importante para o equilíbrio formal da

pintura. Em seus trabalhos esses aspectos sempre foram cruciais para a realização

da ordenação formal em suas poéticas.

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3 A COR, UM ASPECTO ESTRUTURANTE NA PINTURA

No capítulo anterior analisamos a maneira como os dois pintores aqui

estudados trabalham na organização espacial de suas pinturas orientadas no

sentido de uma síntese formal e arranjo cromático. Nesse capítulo aprofundaremos

a maneira como a cor é pensada e experimentada em suas reflexões e obras. Em

seus trabalhos a cor adquire autonomia, e não é tratada como um recurso somente

de representação de uma realidade, mas como tradutora de emoções e sentimentos.

No capítulo “Notas de um pintor”, Matisse (2007, p. 39) declara que, “pode-se

obter com as cores efeitos de plena concordância apoiando-se no parentesco ou nos

contrastes entre elas”.

Observamos na pintura Place des Lices (Figura 31) que o “parentesco” e os

“contrastes” entre as cores à que Matisse recorre são organizados a partir de uma

paleta de cores que é trabalhada com a sobreposição e justaposição de cores puras,

mas atenuadas com o uso da cor branca.

É evidente nesse quadro, o uso de cores análogas, como o roxo, azul e o

verde nas folhas das árvores e, ao mesmo tempo, o uso do amarelo intenso

apresentando uma luz da própria cor nas casas e na copa da árvore,

proporcionando um estado de calma e tranquilidade. Percebe-se características de

uma pintura que apresenta a utilização dos recursos formais da pintura clássica,

como sombra e a perspectiva. A sombra feita com um tom de cor mais escuro está

bem claro no portão da casa, no tronco da árvore e também na lateral da parede

abaixo das telhas. A perspectiva se dá desde a posição do tronco da árvore do lado

direito, em primeiro plano e por sua verticalidade se contrapondo com a

horizontalidade bem delimitada por uma linha preta que divide a rua com a casa.

Isso cria na pintura uma profundidade em detrimento da utilização desses recursos.

Um aspecto que se diferencia das caraterísticas clássicas é o uso de cores puras

sem uma preocupação com as cores apresentadas pelo que se diz real.

Foram trabalhadas as pinceladas soltas e, ao mesmo tempo, pinceladas

curtas que apresentam modulações estabelecendo um equilíbrio entre as cores frias

e quentes, como também a harmonia cromática para chegar à expressão.

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Figura 31: Henri Matisse, Place des Lices, 1904, óleo sobre tela

Fonte: https://www.wikiart.org/en/henri-matisse/place-des-lices-st-tropez

Matisse (2007, p. 42) afirma que “encontradas todas as minhas relações de

tons, deve resultar um acorde cromático vivo, uma harmonia análoga à de uma

composição musical”. A proposta de Matisse era pintar o que realmente via

conforme as sensações, e não seguir os padrões ditados pela tradição clássica.

Estruturava a pintura partindo do equilíbrio formal da composição, pois tudo isso

vinha de um estudo meticuloso pelas inúmeras experimentações que realizava em

seu processo criativo no plano pictórico.

Matisse faz uso de tons puros sem misturar com outros tons. Sempre procura

trabalhar com liberdade de criar livremente o que sente no momento do processo

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criativo, sem se importar com a representação tal qual se apresenta os objetos ou

elementos da realidade. Na obra “Cana du Midi” (Figura 32), as superfícies planas

se pautam pelas cores da sua sensação sem a preocupação de adicionar sombra e

luz no sentido de apresentar uma profundidade ilusória em suas pinturas.

As camadas grossas de cores justapostas e sobrepostas como o branco, o

roxo formam blocos de nuvens no céu e são trabalhadas também de modo a criar

volumes. O uso do azul cria uma distância entre o céu e a água, em que esses

elementos são separados por densa camada de tinta escura sobreposta e pelas

cores amarelo e vermelho. A paisagem apresenta profundidade com o uso de duas

linhas diagonais que vão se encontrar com a linha horizontal que formam as

montanhas no centro do quadro, permitindo que se tenha dinamicidade ao mesmo

tempo em que existe na composição um equilíbrio formal. O uso de cores

contrastantes e semelhantes carregadas de espessas camadas de tintas estrutura a

superfície do quadro. O volume feito com pinceladas oblíquas de tintas com as cores

azul e branco dá movimento ao fluxo de água, e também uma precisão e equilíbrio

ao quadro. O barco no meio do quadro traz uma carga de simplicidade ao campo

visual da pintura

Figura 32: Matisse, Canal du Midi, 1898

Fonte: https://www.museothyssen.org/en/collection/artists/matisse-henri/canal-du-midi

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Não vendo nas cores um aspecto puramente científico, Matisse dizia que as

cores surgem das sensações. “A escolha de minhas cores não se apoia em

nenhuma teoria científica: está baseada na observação, no sentimento, na

experiência de minha sensibilidade” (MATISSE, 2007, p.46). O pintor expressava as

suas sensações através da cor sem os recursos intelectuais preconizados pela

pintura tradicional.

A “sensação” é uma palavra recorrente nos textos de Matisse, quando se

refere à cor:

Se numa tela branca espalho sensação de azul, verde, vermelho, à medida que vou acrescentando pinceladas, as anteriores perdem sua importância. Vou pintar um interior: tenho em frente um armário, ele me dá uma sensação de vermelho bem vivo, e ponho um vermelho que me satisfaz. Estabelece-se uma relação entre esse vermelho e o branco da tela. Digamos que eu ponha ao lado um verde, que eu use um amarelo para o assoalho, e ainda haverá entre esse verde ou esse amarelo e o branco da tela relações que me satisfarão. Mas esses diferentes tons se diminuem mutuamente. (MATISSE, 2007, p. 42)

Matisse supunha que a própria teoria das cores complementares não era

absoluta, ou seja, não há restrições quanto ao uso das cores que se mostram

contrastantes na pintura, pois o pintor é livre para criar e experimentar o que quiser.

Não havendo, na visão de Matisse, um pensamento científico na feitura de seus

trabalhos, é pela cor que ele constrói o espaço, que estrutura o quadro com a

utilização de cores puras e um extremo contraste entre elas. Com isso, percebe-se

que Matisse trabalha com pouca variação de cores e domínio da predominância de

uma matiz, em alguns de seus trabalhos. Como na obra “A Janela Azul” (Figura. 33).

Vemos aqui cores que proporcionam uma planaridade à superfície do quadro.

O uso de cores vivas, os tons de azul predominam em toda tela, sendo algumas

partes do quadro delimitadas por uma linha preta a qual distingue o interior da casa

com alguns objetos decorativos e o exterior com a folhagem da árvore em forma de

balões e uma casinha que fica por trás das árvores, e entre as montanhas. Pode-se

ver a simplificação dos elementos com uso da cor chapada. Horizontalidade e

verticalidade se equilibram dentro do quadro. As cores harmonizam as formas

geométricas dos objetos, sem profundidade, valorizando o bidimensional na

ordenação formal da composição.

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Figura 33: Henri Matisse, A Janela azul,1911

Fonte: http://www.abcgallery.com/M/matisse/matisse46.html

Nas telas de Matisse, as matizes fortes e intensas não são tratadas de

maneira naturalista. O arranjo cromático promove contrastes intensos e cores

primárias rebaixadas com o branco, com a diminuição da saturação.

No quadro “Harmonia em vermelho” (Figura 34), Matisse pinta áreas com

faixas de cores fortes. As cores puras preenchem a superfície plana com certa

organização cromática dos contrastes. O vermelho cobre quase todo o espaço

pictórico. O azul dá um destaque aos arabescos e os que estão em primeiro plano

deixam uma marcação bastante sutil acompanhando o vínculo da mesa, e dessa

forma proporcionam estabilidade ao quadro. Na janela, duas faixas de tintas, uma

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laranja na vertical e outra amarela na horizontal criam perspectiva no ambiente e

separa o interior da casa com o lado externo. Uso dos arabescos decora todo o

espaço, os quais criam uma dinamicidade no campo plástico. O contorno preto na

parte lateral do assento da cadeira delimita a geometria da mesa. Observa-se

profundidade na superfície da tela por meio de uma linha preta bem suave que

demarca a parede da mesa. A relação das cores cria um espaço harmônico. Esse

conjunto de elementos mostra um rigor na ordenação formal na pintura.

Matisse (2007, p. 43) diz: “o lado expressivo das cores impõe-se a mim de

maneira puramente instintiva”, suas cores não provêm de estudos científicos, pois

são elementos que estão baseadas na observação, no sentimento e na experiência

da própria sensibilidade do artista.

Figura 34: Henri Matisse, Harmonia em vermelho, 1908

Fonte: https://twitter.com/franceculture/status/825252072123662336

Havia nessa poética uma busca por relações cromáticas complexas. Matisse

usava o máximo das cores saturadas em seus trabalhos para dar efeitos de cor

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pura, ou seja, a cor usada sem a adição de outras cores. Nesses aspectos, Matisse

é categórico quando chama a atenção de que para se obter uma organização

cromática na composição é necessário que “em matéria de cor, ordem em primeiro

lugar”. (MATISSE, 2007, p. 68)

A fim de conseguir um resultado harmônico a partir dos recursos expressivos

da pintura, principalmente em relação à cor, Matisse reflete, “sinto por meio da cor,

de modo que é sempre por meio dela que organizo minha tela. Mas convém que as

sensações sejam condensadas e que os meios utilizados sejam levados à sua

expressão máxima”. (MATISSE, 2007, p. 219)

Matisse afirma que tudo está na concepção de como se vê as coisas, porque

é preciso ter uma visão clara do conjunto que dará a sua totalidade. A respeito da

valorização cromática nas pinturas, Pasta analisa que para Matisse.

[...] Uma cor só existiria em relação a outra, o que pediria a cada uma delas o máximo de si. Isso também elucida o seu sistema pictórico, no qual as cores funcionariam como um contínuo, uma servindo como suporte à outra, para, no final, todas juntas formarem o conjunto da expressão. Ele não queria diminuir o poder de nenhum dos elementos da pintura. Queria promover o todo com a participação íntegra de todas as partes. Para conseguir isso, tinha de submeter sua pintura a inúmeras modificações. (PASTA, 2012, p. 21)

Sobre o processo criativo de Matisse, o poeta francês Pierre Reverdy (1889-

1960), no livro “Escritos e Reflexões sobre arte”, também declara que:

[...], qualquer que seja a paixão que Matisse parece sempre ter nutrido pela cor, é mais do que evidente que ele não se detém nela. Vai além. Pela cor ele chega à luz e, passando pelos olhos do espírito, é toda a sua arte que, sob suas mãos, se torna deslumbrante, pois essa luz está por toda parte em Matisse. [...] (REVERDY, 2007, p. 28)

Pela cor e a busca ao máximo da intensidade das cores, Matisse traduz em

seu processo criativo, a essência das coisas. A suntuosidade e valorização da sua

pintura atingem sua plena expressão.

Pode-se criar luz com a invenção de camadas de cores lisas, como se faz com os acordes em música. Usei a cor como meio de expressão de minha emoção, e não de transcrição da natureza. Utilizo as cores mais simples. Não sou eu que as transformo, são as relações que se encarregam disso. Trata-se apenas de valorizar diferenças, de apontá-las. (MATISSE, 2007, p. 227).

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3.1 A “PERSPECTIVA DE SENTIMENTO”

Também podemos perceber nessa organização de cores, uma perspectiva

que Matisse (2007, p. 179) vai chamar de “perspectiva de sentimento, em

perspectiva sugerida”, a partir dos objetos que são trabalhados em diferentes

planos, ou seja, da disposição de elementos grandes e pequenos na composição do

quadro. Um exemplo desse recurso utilizado por Matisse está em “Harmonia em

vermelho”. Nessa imagem, os objetos grandes dão ideia de estarem próximos ao

observador e os menores sugerindo estarem mais distantes aos olhos de quem vê a

pintura. Como também a distinção dos planos verticais e horizontais por meio de

uma linha tênue que possibilita percebermos o que é mesa e o que é parede. Os

contornos dos objetos pela cor preta estabelece um contraste entre a cor vermelha

usada com muita intensidade. Esse recurso expressivo possibilita ao observador

fazer uma leitura mental e visual da pintura.

O efeito usado por Matisse com as cores para indicar a noção de “perspectiva

de sentimento”, não se trata de uma perspectiva calculada, racional e matemática,

isto é, a técnica que foi muito explorada pelos grandes mestres da pintura

renascentista, também chamada de perspectiva linear e perspectiva atmosférica ou

aérea.

A perspectiva linear representa a três dimensões de espaço em uma

superfície plana criando, portanto, a ilusão de profundidade.

Já a perspectiva atmosférica ou aérea dá ao observador a impressão de uma

profundidade, espaço e distância ilusórios, através do uso de linhas, luz e sombra e

que dá margem ao pintor representar objetos ou coisas tridimensionais em um plano

bidimensional.

Esse recurso foi bastante utilizado pelo pintor renascentista Leonardo da Vinci

(1452-1519), que buscava se aprofundar na técnica da pintura a partir das buscas

contínuas de novas experiências. Essas experiências partiam do estudo minucioso

para mostrar que a sua arte vinha de um processo analisado por meio da ciência.

Não é pretensão, nesse trabalho, fazer apologias aos trabalhos de Leonardo

da Vinci, mas apenas tecer um comparativo entre o pensamento de Da Vinci acerca

do tipo de perspectiva utilizado em seus trabalhos e a visão que Matisse tinha a

respeito da perspectiva no seu processo criativo.

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Um das categorias da pintura que Leonardo da Vinci se apropriou para criar a

perspectiva em suas pinturas é o recurso do chiaroscuro, técnica que se define pelo

domínio dos contrastes de luz e sombra na representação pictórica. Essa técnica

está evidente na obra “Anunciação” de Leonardo da Vinci (Figura 35), e requer do

artista, a noção de perspectiva, efeitos de luz nas superfícies, e cor. Como também

dá a impressão de volume e de uma ilusão da tridimensionalidade da figura

representada.

Figura 35: Leonardo da Vinci (1472 – 1473), Anunciação

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/A_Anuncia%C3%A7%C3%A3o_(Leonardo_da_Vinci)

Isso possibilitou a Leonardo da Vinci, de acordo com as suas pesquisas, a

descoberta da técnica do sfumato, recurso expressivo que o artista pode utilizar na

pintura, suavizando os contornos existentes nas figuras. Isso se percebe

perfeitamente, no quadro “Monalisa”, como mostra a (Figura 36). Essa técnica

permite que uma forma se misture com outras e deixa sempre algo alimentar a

imaginação do espectador, criando possibilidades de ampliar a ambiguidade

expressiva da composição pictórica.

Figura 36: Leonardo da Vinci (1503 – 1513) Detalhe de Monalisa,

Fonte: http://belyoung.com.br/anunciacao-leonardo-da-vinci/

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No livro da coleção Grandes Mestres, José Ruy Gandra (2011, p. 13) fala que

“um aspecto marcante dos primeiros trabalhos de Leonardo da Vinci é a grande

atenção que o artista dedica ao mundo natural e a sua extraordinária habilidade ao

representá-lo”.

Diante dessa reflexão pode-se perceber que Matisse não se utilizava do

recurso da perspectiva linear para dar ideia de tridimensionalidade, pois a marcação

espacial se dá por meio das cores.

Com estilo solto e com o domínio da linguagem expressiva da cor, Matisse

realiza as suas pinturas com uma organização plástica, as quais apresentam leveza

e suavidade aos olhos do observador.

Na pintura “Mulher com chapéu” (Figura 37), é visível que Matisse não se

prende às cores preestabelecidas pela tradição. As variações de cores frias e

quentes são trabalhadas de forma a contribuir para o equilíbrio e organização do

espaço pictorial. No entanto, percebe-se que esses contrastes permitem em certos

locais do rosto da mulher, como o nariz e abaixo do chapéu, algumas nuances de

sombra e luz determinados por essas cores. Utiliza-se também da cor branca

suavizando os detalhes da vestimenta da personagem na mesma medida em que

explora a cor preta criando sombra e luz em toda a composição. Dentro desse

processo, as pinceladas grossas de tintas por meio de modulações vão criando uma

organização cromática, uma construção do ato de pintar. As formas são diluídas

pelas manchas de cores intensas. A relação figura e fundo é valorizada com o uso

de cores complementares e cores análogas, criando uma estabilidade ao quadro.

Observa-se que uma ampliação de liberdade através do processo pictórico em que

se vê um desprendimento das convenções clássicas.

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Figura 37: Henri Matisse, Mulher com o chapéu, 1905

Fonte: http://virusdaarte.net/matisse-mulher-com-chapeu/

Greenberg, (apud, MIÉS, 2013) diz que a cor, a forma e a superfície são

caraterísticas importantes da expressão pictórica e considera esses aspectos, “a

essência da pintura como arte”. Diferentemente da abordagem renascentista sobre

pintura, o modernismo convida o observador a criar uma ilusão de espaço instigando

o deslocamento do olhar. Um olhar que não se fixa em um só aspecto da pintura,

mas que vai dar conta de tudo que se apresenta em um quadro, na composição

pictórica.

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Com isso, vê-se a importância dos valores pictóricos e fala-se das novas

possibilidades expressivas como o suporte, a linha, textura, cor, as veladuras, as

pinceladas. Giannotti considera que no movimento modernista,

[...] o artista se vê livre das convenções clássicas que ele pode pensar na especificidade do seu meio de expressão: o fato de uma pintura ser feita sempre em uma superfície bidimensional, de que seus instrumentos básicos são desenho e cor. (GIANNOTTI, 1998)

Além desses aspectos, na arte moderna, os pintores não se restringem mais

ao estudo de uma pintura que represente de forma mimética a natureza. Inicia-se

um distanciamento por parte dos artistas, quando se trata de trabalhar com as

opções de cores dispostas na paleta do artista, para operacionalizar a produção

pictorial.

No livro, Clement Greenberg e o debate crítico, Clement Greenberg, crítico da

arte moderna, destaca que:

As limitações que constituem os meios de que a pintura se serve ─ a superfície plana, a forma do suporte, as propriedades das tintas ─ foram tratadas pelos grandes mestres como fatores negativos, que só podiam ser reconhecidos implícita ou indiretamente. Sob o modernismo, as mesmas limitações passaram a ser vistas como fatores positivos, e foram abertamente reconhecidas. (GREENBERG, 1997, p. 102).

Nesse período, a pintura passa a ter uma abordagem diferenciada, os

pintores começam a refletir sobre a expressão poética, a essência da linguagem

pictórica para encontrar possíveis soluções no que tange aos problemas técnicos

dessa linguagem.

Os temas recorrentes nos textos de Matisse tratam da busca pelos próprios

meios de expressão, através da utilização da cor, da linha e da forma. O uso desses

meios expressivos, sobretudo o da cor, enfatiza a organização compositiva do

quadro.

O pintor, se for sensível, não pode dispensar a contribuição da geração anterior, pois ela está dentro dele quer queira que não. No entanto, ele precisa se desprender dela para poder oferecer, por sua vez, uma coisa nova e de inspiração fresca. (MATISSE, 2007, p. 222)

Com o pensamento de colocar sempre as ideias em ordem antes de começar

uma pintura, compara o seu fazer artístico com os de Cézanne, quando analisa os

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quadros do pintor, observando que “tudo está tão bem combinado que, a qualquer

distância e com qualquer número de personagens, distinguimos nitidamente os

corpos e compreendemos a qual corpo se liga tal ou qual membro”. (MATISSE,

2007, p. 43).

Com uma paleta reduzida de cores, Cézanne, no quadro “As Banhistas”

(Figura 38) trabalha com pinceladas moduladas em que se percebe uso dos tons de

azul e verde, amenizadas pelo branco. Cores justapostas e sobrepostas na

organização espacial são realizadas de forma a dar um equilíbrio à pintura. O

amarelo dá a sensação de luz em toda paisagem. As faixas horizontais são

demarcadas pela cor amarelo ocre que representa a areia onde as banhistas estão e

a cor azul da água. Na composição, os troncos das árvores se encontram na parte

superior da tela e formam um triângulo que se contrapõem com as faixas

horizontais, criando profundidade no espaço formal, como também propõe

estabilidade a superfície planar. Os troncos sendo cortados pelo limite da tela dá a

sensação de continuidade. As figuras que estão em sentidos opostos, uma à direita

e a outra à esquerda do quadro, estão em harmonia seguindo a mesma posição dos

troncos das árvores, ou seja, seguem a mesma direção dos troncos inclinados. O

uso da cor clara e do escuro nos corpos das figuras proporciona contraste e volume.

Observa-se o uso da perspectiva através da disposição de elementos maiores como

as pessoas que estão em primeiro plano e as duas pessoas em escala menor no

fundo da tela e uma torre pequena entre as matas.

Nessa paisagem, a construção de formas pelo uso das cores está equilibrada

e se vê contornos definidos que permitem ao quadro uma ordenação formal na

distribuição dos elementos.

Em relação ao estudo cuidadoso da pintura de Cézanne, Argan diz que:

Seus esforços são inteiramente dedicados a manter a sensação viva durante um processo analítico de pesquisa estrutural, que certamente é um processo do pensamento; durante o processo, a sensação não só se mantém, como ainda torna-se mais precisa, organiza-se, revela toda a coerência e a complexidade de sua estrutura. A operação pictórica não reproduz, e sim produz a sensação: não como dado para uma reflexão posterior, mas como pensamento, consciência em ação. (ARGAN 1992, p. 110)

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Figura 38: Paul Cézanne, As Banhistas, 1898

Fonte: https://modernarthistoryfall2012.wordpress.com/2012/10/16/35/

Paulo Pasta, em sua trajetória, teve Matisse como uma referência e uma

presença muito forte em sua reflexão sobre pintura. Assim como Matisse, Pasta vê

as possibilidades de autonomia expressiva da cor. Elas se apresentam em seu

trabalho como empastes (Figura 39) uma técnica em que o pintor utiliza camadas

grossas de tintas com o recurso de espátula ou do pincel. Formando densas

camadas de tintas e a sobreposição das cores.

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Figura 39: Paulo Pasta, S/T, 2015 óleo sobre papel

Fonte: http://galeriamillan.com.br/pt-BR/exposicoes?page=3

Apesar de ter utilizado no início de seu processo, a tinta guache para a

realização de algumas pinturas, Pasta (2012, p. 106) afirma que “buscava uma tinta

à base de água, que fosse fosca e que também não guardasse o aspecto muitas

vezes artificial da tinta acrílica”, (Figura 40). No entanto, no decorrer de seu

processo com a pintura, Pasta deu preferência a trabalhar com a tinta óleo em que a

partir das suas experimentações passou a acrescentar a cera de abelha, como ele

explica: “um meio também chamado de verniz de cera, ou encáustica fria” (PASTA,

2012, p. 108) enfatiza que “a cera dá uma lentidão para a cor”. (Figura 41).

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Figura 40: Paulo Pasta. S/T, 1985. Guache sobre papel 80x100cm

Fonte: http://bomlero.blogspot.com.br/2016/12/pintores-brasileiros-9-arte-de-paulo.html

Figura 41: Paulo Pasta, S/T, 1991. Óleo e cera sobre tela

Fonte: http://revistapercurso.uol.com.br/index.php?apg=artigo_

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Pasta utiliza o óleo e a cera de abelha com a intenção de eliminar o brilho da

tinta óleo a fim de obter uma luz opaca e turva na cor. Giannotti (2009, p. 66) diz

que, no Brasil, Paulo Pasta é um exemplo na pintura com o uso desse material,

“com admirável habilidade, consegue uma vibração cromática a partir da relação

entre óleo e o verniz de cera que coloca a estrutura formal na maioria das vezes

arquitetônica, em suspensão”. Nos trabalhos de Pasta, a cor se apresenta como

uma realidade matéria bruta, sem transparências.

[...] voltei a usar tinta óleo, agora com o acréscimo da cera de abelha (um

meio também chamado de verniz de cera, ou encáustica fria), o que abriu novas possibilidades expressivas no meu trabalho. Esse veículo deu ao óleo uma luz mais turva, arrefeceu as passagens entre as cores e, se posso dizer, criou uma temporalidade distinta ao retardar a luz, ao fazê-la menos brilhante. (PASTA, 2012, p. 108)

Como podemos observar, na obra “O ateliê vermelho” (Figura 42), Matisse se

utiliza dos contrastes e de cores puras, em que se vê uma dominância da cor

vermelha que se harmoniza com vários elementos decorativos com cores opostas e

vizinhas. Linha branca que demarca a parede do chão na superfície da tela. A

cadeira, a mesa e alguns objetos contornados por essa mesma linha branca

proporcionando equilíbrio ao ambiente pictórico.

Já nas pinturas de Pasta, percebemos uma paleta de cores em que aparece

degradês de uma mesma tonalidade com os tons de azul e verde. Essa distinção é

analisada na obra "Série Canaviais" (Figura 43). Além de uma predominância dos

tons de azul, (Figura 44), percebe-se ligeiras passagens de camadas de amarelo

cortando a superfície da tela na horizontal e na vertical, como também alguns tons

de verdes que proporcionam ao campo visual uma espécie de jogo tonal, em que os

tons e as pinceladas obedecem ao equilíbrio da obra. O objetivo de Pasta (2012, p.

111) “é a busca por uma unidade espacial e menos fragmentada” como ele mesmo

afirma.

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Figura 42: Henri Matisse, O ateliê vermelho, 1911

Fonte: https://theartstack.com/artist/henri-matisse/l-atelier-rouge

Figura 43: Paulo Pasta, "Série Canaviais", 1984

Fonte: https://alinehannun.blogspot.com.br/2014/05/paisagem-e-redescoberta-na-obra-

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Figura 44: Paulo Pasta, S/T, 1990

Fonte: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9809/paulo-pasta/obras

No entanto, da mesma forma que Matisse buscava uma arte pura através da

harmonia e do equilíbrio com os efeitos das cores puras, simplificação dos volumes

sem perspectiva, formas planas e traços expressivos, em Paulo Pasta também se vê

pensamento sobre a construção e organização da sua pintura. Seus trabalhos

buscam uma poética através das relações cromáticas e pesquisas relacionadas com

a cozinha da pintura.

Em “Alegria de viver” (Figura 45), é enfática a valorização das relações

cromáticas com uso dos contrastes e semelhanças. Nesse quadro, é como se as

cores chapadas de tinta estivessem diluídas, mas não se misturam umas com as

outras, apenas se apresentam justapostas. Como bem diz Pasta (2012, p. 21), “[...]

as cores funcionariam como um contínuo, uma servindo como suporte à outra, para,

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no final, todas juntas formarem o conjunto da expressão”. O amarelo é visto em

quase toda superfície do quadro, em que se constata o uso intenso de luz criado

pelas cores quentes. Os galhos das árvores simulam os arabescos decorativos de

Matisse. Linhas de contornos pretas bem espessas nas figuras humanas e nos

elementos que representam a paisagem. E também uma linha diagonal que separa

os personagens que estão em primeiro plano dos personagens que estão em

segundo plano. As cores reforçam o estado de espírito que personagens estão

vivendo, em contato com a natureza, com a alegria de viver em harmonia. Para

Matisse o que está em jogo é a liberdade de realizar o trabalho por meio da cor para

se chegar a expressão.

[...] a expressão da alegria é tão expressão quanto à expressão da dor de viver, e pode-se expressar a alegria de viver sem representar a vida. Matisse não traz ao quadro o equilíbrio, a simetria da natureza. Seu procedimento é inteiramente aditivo: cada cor sustenta, impulsiona, acentua as outras num interminável crescendo. Cada cor, no contexto, é muito mais do que seria isoladamente, como puro matiz, e o quadro só se completa quando todas as cores alcançaram o limite do espectro e concordam entre si em seus valores máximos. São zonas lisas, luminosas, expandidas; a fronteira entre as zonas não é limite e sim novo arremesso, de forma que todas as cores colorem por si todo o espaço, somando-se umas as outras; as linhas não são contornos, mas arabescos coloridos que asseguram a circulação, a irradiação cromática de todo o tecido pictórico. É um discurso sem verbos nem substantivos, apenas adjetivos; todavia não é retórico, porque os adjetivos não são elogio às coisas (que não existem), e sim efusão da alma. (ARGAN, 1992, p. 236)

No trabalho de Paulo Pasta (Figura 46), há um equilíbrio tonal em toda

superfície visual intensificado pela cor amarela, estabelece assim uma harmonia

com os outros elementos que, por sua vez, cria-se uma relação cromática. O

segundo elemento com formato de coluna que está por trás do primeiro elemento

que fica à direita do quadro, dá a impressão de que está desaparecendo da

superfície da tela, em consequência da cor que vai desaparecendo também. Não

existe contorno nas formas, cria-se assim uma ambiguidade na ordenação formal.

O vermelho, o verde, ou qualquer outra cor podem vir a ter significados múltiplos e até bem diversos, uma vez que a expressividade da cor dependerá das funções que desempenhe. Quando entra em combinação com outras cores (quer seja com tonalidades da mesma gama ou até com um fundo branco), cada cor recebe, dessa combinação, determinadas funções espaciais, sendo redefinida a cada nova relação. [...], de acordo com as relações colorísticas, a mesma cor pode definir o espaço de maneira diferentes. (OSTROWER, 2013, p. 179)

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Figura 45: Henri Matisse, Alegria de viver, 1905

Fonte: https://viciodapoesia.com/2011/05/28/matisse-e-a-alegria-de-viver/

Figura 46: Paulo Pasta, S/T, óleo e cera sobre tela,1996

Fonte: http://gravuracontemporanea.com.br/index.php/2016/02/04/artista-paulo-pasta/

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Mesmo Pasta sendo um grande admirador dos trabalhos de Matisse, ele

chega à conclusão de que trabalhar os contrastes e as cores vivas não passavam de

um ideal. Nesse sentido, Pasta segue o seu próprio caminho e em uma entrevista

“Paulo Pasta – Encontros”, declara que a cor que ele usa “não é a cor das coisas,

não é a cor do mundo, da realidade, e sim uma cor da memória”. Com isso,

experimenta e cria novas cores a partir da mistura de camadas de tinta. Pasta (2012,

p. 112) ressalta que as cores, ao longo de seu processo, “puderam então variar”.

Isso é perceptível na (Figuras 47) e em “Cruz amarela” de 2006 (Figura 48).

Figura 47: Paulo Pasta, S/T, 1989

Fonte: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9809/paulo-pasta/obras

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Figura 48: Paulo Pasta, Cruz amarela, 2006. Óleo e pastel sobre tela, 150x180 cm.

Fonte: http://www.galeriamillan.com.br/pt-BR/ver-obras/13

Outro artista que também é uma referência no percurso de Paulo Pasta é o

pintor italiano Giorgio Morandi (1890 – 1964) conhecido pelos seus trabalhos com

naturezas-mortas (Figura 49) Pasta compara a sua paleta de cores com as utilizadas

por Morandi, quando ressalta que “muitas delas parecendo cores desidratadas, de

um mundo esvaído”. (PASTA, 2012, p. 106).

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Figura 49: Morandi, S/T

Fonte: http://lounge.obviousmag.org/arxvis/2012/03/giorgio-morandi.html

Paulo Pasta trabalha com cores que também se assemelham à paleta de

cores do pintor belga Luc Tuymans (1958-), isso se pode ver na obra “Pombos”

(Figura 50). Pasta faz referência a esse artista contemporâneo, tomando como base

uma análise meticulosa de livros e fotos do processo criativo de Tuymans na pintura,

Sua paleta é quase monocromática e bastante reduzida. Suas cores, assim, servem bem a essa imagem de um mundo desidratado que ele quer representar. Usa quase sempre tonalidades de cinza, onde o branco tem um papel principal. (PASTA, 2012, p. 71)

Mesmo sendo uma cor enigmática, Pasta destaca que Tuymans faz uso do

branco com muita propriedade em seus quadros. A cor em Tuyman traz uma carga

emocional que de certa forma, reflete em seus trabalhos de acordo o jogo de cores:

tons claros e tons mais escuros, acinzentados e uma simplificação cromática.

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Essa cor monocromática com aspecto desidratado, a paleta de cores bastante

resumida e simplificada é comum também nas pinturas de Paulo Pasta (Figura 51).

Percebe-se uma tonalidade de cor pálida, apagada, silenciosa, que faz o observador

imaginar que a figura está desaparecendo da superfície da tela. São tons que

remetem a uma tranquilidade. As áreas vazias são preenchidas com um tom

acinzentado que se transformam em outras formas, que Pasta diz se parecer com

um “pé de elefante” ou mesmo com “ampulhetas”. Apesar disso, nota-se uma luz

mais intensa na cor azul que preenche o elemento da esquerda do quadro. Como

também não existe uma competição das cores, pois todas são importantes

igualmente. A síntese na paleta de cores é muito bem resolvida, propiciando uma

construção harmônica dentro da pintura. Pasta em Vídeo-Enciclopédia Itaú Cultural,

a respeito desse processo, declara que “tudo que eu quero é resolver a pintura” e

“eu acho que a pintura é justamente o momento que essa coisa se embaça um

pouco, se condensa”. E é pela cor que os elementos da composição ganham vida,

pois a cor traduz o que o artista quer expressar.

Figura 50: Luc Tuymans, Pombos, 2001

Fonte: http://arteseanp.blogspot.com.br/2011/05/luc-tuymans-paints-st-croce.html

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Figura 51: Paulo Pasta, S/T, óleo sobre tela, 2006

Fonte: http://www.galeriamillan.com.br/pt-BR/ver-obras/13

Observa-se que a pintura de Pasta em um dado momento era figurativa e

metafísica. Posteriormente, Pasta constrói uma nova poética, através da mistura de

poucos números de cores e formas. Busca então uma pintura voltada para uma

composição mais simplificada e abstrata (Figura 52). Figuras que se apresentam

geometricamente, tanto na vertical como na horizontal, valorizadas pela cor. Os tons

de azul predominando em todo espaço formal da pintura com uma estrutura

ordenada.

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Figura 52: Paulo Pasta S/T, 2006

Fonte: http://gravuracontemporanea.com.br/index.php/2016/02/04/artista-paulo-pasta/

Pasta em sua poética consegue uma vibração cromática a partir da mistura

do óleo e da cera de abelha (Figura 53). Sendo assim, adquire na composição

pictórica uma estrutura com formas geométricas como se fosse uma pintura

arquitetônica. As passagens tonais são construídas pelo acréscimo sucessivo de

camadas de tinta que a partir da relação da cor nos espaços negativos vão tomando

outras formas no plano pictórico

.

Figura 53: Paulo Pasta, S/T, óleo e cera sobre tela, 1992

Fonte: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9809/paulo-pasta

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Diante das reflexões de Matisse e Paulo Pasta quanto ao recurso da cor,

Marco Giannotti reflete sobre a importância desse aspecto como elemento

estruturante do processo pictórico, salientando que a cor e o espaço são

características importantes na construção pictórica.

Giannotti, em seu livro “Breve História da Pintura Contemporânea”, diz que o

pintor americano Brice Marden (1938 - 1978) se utiliza do mesmo recurso da

utilização da tinta óleo e a cera, que Paulo Pasta usa em sua pintura.

Giannotti (2009, p. 23-24) explica que há nas pinturas de Marden “um jogo

sutil de cores que só pode ser percebido com o tempo. Os pigmentos são

misturados com uma base de óleo e cera, de modo que a cor deve vencer a

opacidade da cera para aparecer” (Figura 54), o uso de cores vibrantes e primárias

através de camadas grossas de tintas, nas formas geométricas, dá ao quadro uma

estabilidade e equilíbrio à pintura. O preenchimento de cores escuras como o preto e

o marrom nos espaços retangulares no sentido vertical, remetem a janelas e a

portas. Há uma valoração no espaço cromático.

O mesmo processo é visível no trabalho “Cruz vermelha” de Paulo Pasta

(Figura 55). Na relação figura e fundo, percebe-se uma luz intensa pelo efeito que a

cor vermelha transmite no vazio do quadro, contrapondo-se com os tons de

vermelho nas cruzes que dão a impressão que a do lado esquerdo de quem observa

o quadro está se apagando. Mas, imediatamente, para equilibrar esse jogo de cores

tonais na vertical da cruz ao lado direito do quadro, a cor lilás se sobressai diante da

outra cruz. É um jogo de tons de uma mesma cor, em que o trabalho com a luz

também tem a sua importância na composição. Tudo se encaminha para se obter no

campo plástico uma ordenação formal harmônica. Se fixar os olhos por muito tempo

no quadro, percebe-se outras cruzes pelo efeito que a cor resulta na retina. É como

se fosse o reflexo dos elementos que se apresentam na tela.

A artista plástica Leda Catunda, em um depoimento a respeito do uso que

Paulo Pasta faz das cores, diz que, “poucos artistas trabalharam essas matizes com

tanta especificidade cobrindo superfícies largas e criando contrastes. Os trabalhos

vibram. Isso faz dar força na poética que ele se propõe a pintar” (VÍDEO, O

SILÊNCIO É MORADIA DA COR, DE PEDRO PAULO MENDES, 9:21, 2016).

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Figura 54: Brice Marden, Thira, 1979 -1980

Fonte: http://losvalientesduermensolos.blogspot.com.br/2010/08/brice-marden.html

Figura 55: Paulo Pasta, Cruz vermelha, óleo e cera sobre tela. 2008

Fonte: http://www.galeriamillan.com.br/pt-BR/ver-obra/cruz-vermelha

A partir do expressionismo abstrato, Marco Giannotti (2009) comenta que a

cor parece transcender à tela, a expandir-se pelo espaço e interagir com o

espectador, pelo formato que a tela começa adquirir. Partindo desse pressuposto,

Giannotti (2009, p. 33) considera que “a pintura cria um campo de experiência, um

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espaço existencial; não cabe mais ao artista descrever um mundo dado, mas

transformá-lo a cada instante”.

O que se percebe é que tanto as pinturas de Paulo Pasta como as de Matisse

têm muito nítidas a busca pela expressão através das constantes experimentações.

O uso ordenado das cores permite que eles cheguem a um estado de condensação,

estabilidade, tranquilidade por meio da pintura. A síntese das cores e das formas vai

se desenvolvendo na medida em que o processo acontece.

Nesse sentido, Matisse pesquisou e experimentou diversas técnicas e

materiais, buscando resultados em seu processo criativo com uso de cores puras e

intensas com as quais interpretava a natureza de maneira livre. Em seus trabalhos,

a composição era trabalhada sem a preocupação com os detalhes e efeitos

tridimensionais, optando essencialmente pela forma mais plana. Matisse não só via

questões técnicas, mas também estéticas, isto é, relações de harmonia na

ordenação formal do espaço plástico. A pretensão de Matisse era que o observador

ao ver a pintura pudesse chegar a um estado de tranquilidade. Matisse transformou

a pintura, libertando a cor dos conceitos preestabelecidos pela pintura tradicional, ou

seja, do seu caráter naturalista.

Paulo Pasta também, em sua trajetória, faz incessantes e crescentes buscas

pelas pesquisas e experimentações. Seu fazer artístico é acompanhado de

mudanças constantes com a utilização da cor. Isso é visto, por exemplo, a partir do

procedimento da raspagem em suas obras, em que surgem novos elementos

através da cor. Têm momentos de sua pintura que ele deixa de lado essa estratégia

das ranhuras e passa a acrescentar mais tinta na superfície da tela. Com o

surgimento de novos elementos vão também surgindo ao longo das experiências

novas formas de se trabalhar com as cores. Objetivo de dar um equilíbrio ao espaço

formal da pintura. No entanto, não são os elementos que vão aparecendo que

interessa a Pasta, mas sim a cor. É a cor quem estrutura a construção do espaço

formal nas suas pinturas. É comum ver telas do pintor com o mesmo traço, no

entanto com tons e cores variadas. Observa-se nessas variações, que em algumas

pinturas, a passagem de uma cor para outra se dá lentamente. Já em outras, a

marcação é bem visível com o uso de camadas grossas de tintas. As pinturas de

Pasta faz referência ao campo da memória.

Portanto, nas pinturas de Matisse e Pasta, o recurso expressivo da cor está

sempre presente. Com isso, na concepção deles, uma obra de arte deve ser

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harmoniosa em sua totalidade objetivando chegar a uma arte que seja para todos.

Pasta e Matisse consideram que uma pintura de qualidade tem como resultado as

relações dos elementos no espaço formal. Nesse sentido, observa-se nas obras

desses dois pintores uma composição ordenada de forma compreensível e refletida.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa pesquisa, partimos de um relato pessoal abordando como foi a busca

pela aprendizagem sobre a pintura por experiências de educação não formal, com a

intenção de resgatar o valor do trabalho desses profissionais, que proporcionam a

experiência da pintura a tantas pessoas que buscam intuitivamente informações

sobre as práticas pictóricas. O relevo teve a intenção de fornecer dados para um

diagnóstico sobre o ensino formal e não formal de Natal nas décadas passadas a

partir do ponto de vista da experiência pessoal, pessoa interessada em aprender

pintura desde a adolescência.

Mas também analisamos as limitações dessas experiências em relação a uma

inserção nas questões de natureza estética que são inerentes aos pintores de todos

os tempos.

Com a intenção de conhecer e aprofundar reflexões que tratam do processo

criativo da pintura e suas elaborações poéticas, selecionamos dois pintores, Henri

Matisse e Paulo Pasta, que no nosso entender realizam uma reflexão que

compartilha de muitos pontos de contato, assim como também apresenta suas

singularidades.

Buscamos trazer contribuições para as práticas pictóricas e pedagógicas

analisando o que esses dois pintores pensam e como eles trabalham o ato de pintar.

A análise de seus escritos e obras resultou em uma proposta de agrupamento

de suas reflexões em temas recorrentes (que conversam entre si): a questão da

organização formal dos elementos, a síntese formal e a cor como elemento

estruturante da composição.

Vemos que com Matisse um jovem pintor pode refletir sobre a pintura como

forma de expressão que apresenta uma solução de construção espacial por meio da

utilização das cores e formas para a ordenação formal no espaço pictórico. Com isso

Matisse nos faz entender que na pintura o que importa é a expressão, não existem

características mais relevantes que outras. As relações, em uma combinação

harmoniosa, proporcionam à composição pictórica equilíbrio e estabilidade ao

campo plástico.

Com Paulo Pasta um jovem pintor pode refletir sobre a pintura como forma de

expressão e um meio que apresenta a ideia de temporalidade por meio das várias

maneiras de se trabalhar com a cor e a forma para a construção do campo visual.

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Isso se dá constantemente, através das experimentações e inúmeras possibilidades

que a linguagem da pintura oferece. Paulo Pasta também propõe, nesse processo

criativo, uma estruturação na ordenação formal na busca pelo equilíbrio, harmonia e

estabilidade na composição plástica.

Escritos e obras de outros pintores certamente poderão trazer novas

questões. Esse trabalho apresenta os resultados dessa escolha e apresenta uma

contribuição para que as práticas pedagógicas da arte se aproximem das reflexões

dos artistas. Porque no nosso entendimento a prática artística é por si só uma

reflexão estética. Mas os artistas que deixam registros de seus pensamentos deixam

evidente a natureza da reflexão que parte dessa prática.

Buscamos mostrar, portanto a importância das contribuições que esses

artistas trazem para as práticas artísticas e pedagógicas e a relevância que os seus

trabalhos artísticos podem trazer para o estudante do Ensino Médio e pesquisadores

da pintura.

O intuito da pesquisa foi mostrar que a pintura, como meio de expressão, é

campo aberto de experimentação que não lida apenas com representação, mas

também com reflexão sobre diferentes aspectos da vida e da própria pintura. O

artista faz reflexões históricas, e também leituras críticas do fazer artístico.

O artista precisa ousar, ser um transformador de si mesmo. E deixar de lado

qualquer visão literal do processo artístico. A investigação no campo da pintura é um

a questão que precisa ser problematizadora o tempo todo.

As observações feitas nesse trabalho foram de fundamental importância para

o meu aprendizado e para a minha prática como futura professora do ensino de

artes, como também para o processo criativo da pintura. Tudo isso me fez rever

conceitos da pintura que antes era apenas no nível da tradição clássica.

Hoje tenho a convicção de que o meu olhar em relação à pintura é mais

investigativo, problematizador e questionador, porque já não vejo o meu processo

criativo e também processo outros como a pintura pela pintura. Diante disso, tenho a

consciência de que essa pesquisa não é um estudo acabado e nem tampouco se

esgotará aqui nessas poucas linhas. Novos artistas trarão novas questões e sempre

contribuirão para mudança do meu olhar.

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93

APÊNDICE A: RELATO DE AÇÃO PEDAGÓGICA

Ação Pedagógica

Essa ação, relacionada ao Trabalho de Conclusão de Curso, pretende

mostrar a importância e a aplicabilidade de alguns fundamentos básicos da pintura

aos alunos da turma de pintura com acrílica do ateliê do NAC/UFRN. A ação teve

duração de 8h de atividades, divididas em três dias subsequentes.

A ação pedagógica aconteceu no mesmo período em que estava realizando o

TCC I (2017.1). Na ocasião estava finalizando o processo de Estágio Curricular em

Artes Visuais III, ministrada pela professora Arlete Petry, e iniciando a orientação da

professora Laís Guaraldo. A experiência relatada apresenta, portanto, uma prática

pedagógica anterior à pesquisa aqui apresentada.

JUSTIFICATIVA

O projeto para a ação pedagógica surgiu a partir de observações feitas

durante as aulas de estágio/docente, em que se constatou a necessidade de

abordar alguns aspectos da linguagem pictórica. Muitos alunos não tinham a noção

de como trabalhar cor, luz e sombra na composição da pintura.

PLANO DE AULA

TEMA: Os fundamentos básicos da pintura: cor, luz, sombra e composição.

LOCAL: Atelier de Artes do NAC - Núcleo de Arte e Cultura da UFRN, localizado no

Campus Universitário (UFRN) – Centro de Convivência, Lagoa Nova, Natal – RN.

PÚBLICO ALVO: alunos acima de 45 anos.

DURAÇÃO: 8 horas.

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OBJETIVO GERAL

Mostrar maneiras de como os elementos da linguagem visual proporcionam

ordenações formais na superfície do quadro.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

Entender a participação dos elementos da linguagem visual bidimensional na

composição pictórica;

Trabalhar a cor na composição de sombra e luz;

Ampliar as várias possibilidades de reprodução de cores tonais;

Promover o fazer artístico através da análise crítica da produção pictórica

consagrada.

MATERIAL DE APOIO

Lápis grafite

Borracha

Papel ou tela como suporte para o processo criativo,

Recipientes para água e mistura de tinta,

Livros e revistas para referências.

Pincéis de vários tamanhos

Tintas

METODOLOGIA

A Ação pedagógica foi realizada em três encontros, através de aula expositiva

e debate sobre os fundamentos da linguagem pictórica, e também sob a mediação

do professor durante os processos artísticos dos alunos motivando-os para que eles

aplicassem os conhecimentos adquiridos durante a exposição.

Nessa abordagem foi dado um enfoque ao estudo da cor, composição,

sombra e da luz na pintura como recurso que auxiliarão para a profundidade e

volumes da pintura, mostrando a relevância desses recursos visual no desenho e na

pintura.

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DESENVOLVIMENTO DO PROJETO

Para a realização da Ação Pedagógica, foram utilizados em sala de aula

slides para demonstração de algumas imagens de pinturas de artistas (Figura 56).

Primeira proposta: um desenho de observação de jarros, copos, xícaras

pratos e esculturas; e também frutas naturais e artificiais.

Objetivo: realizar uma composição com esses objetos.

Para ilustrar o assunto foi utilizado um abajour que em alguns momentos ficou

ligado para que eles pudessem observar a sombra natural e a sombra projetada

produzida nos objetos.

Figura 56: Aula sobre os fundamentos da pintura

Foto: Joselita - aluna/bolsista do NAC

No primeiro dia da ação pedagógica, inicialmente, foi colocado para os alunos

o objetivo de se estar realizando esse projeto com o tema “Fundamentos básicos da

pintura”. Disse que se tratava de um assunto que estava atrelado ao objeto da minha

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pesquisa no TCC. E como estava estagiando justamente em turma de pintura, então

para mim seria muito importante realizar o trabalho com eles, uma vez que seria

também uma forma de contribuir com os meus conhecimentos sobre esses aspectos

da pintura para o ensino e aprendizagem.

Terminada essa fala, mostrei alguns slides sobre os conceitos básicos de cor,

luz, sombra e composição. Como eram utilizados, o que significavam esses

aspectos dentro de uma composição pictórica e em seguida apresentei alguns

artistas pintores como Leonardo da Vinci, Matisse, Caravaggio, entre outros que

faziam uso na pintura. Fiz uma explanação sobre como o uso da cor interfere na

composição de uma pintura. Cores mais claras e mais escuras proporcionam o

aparecimento de luz e sombra, criando perspectiva e volume nas figuras.

Ainda na primeira aula, para que os alunos pudessem praticar os

fundamentos da cor, luz e sombra na pintura, foi proposta uma atividade prática, a

realização de um desenho. Depois para instigar a percepção, foi colocado para eles,

em uma mesa um abajour ligado que pudesse refletir a luz e provocar a sombra nas

frutas naturais e artificiais. (Figuras 57 e 58)

Figura 57: Um dos materiais usados para o desenho de observação.

Foto: Ocirema Pacheco

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Figura 58: Os alunos na prática do desenho de observação.

Foto: Ocirema Pacheco

Para o segundo momento, foi pedido que os alunos trouxessem tela ou papel

de gramatura acima de 200, tintas e pincéis para que realizassem uma produção

utilizando o que foi estudado na aula anterior. Foi sugerido que trouxessem uma

imagens de fotografias, de revistas, de uma pintura ou que eles ficassem à vontade

utilizando até mesmo objetos do próprio atelier como referência para o trabalho que

iriam produzir (Figura 59). A partir das referências escolhidas pelos alunos, iriam

produzir uma pintura observando os elementos como a cor, sombra e luz que

criavam volume e perspectiva na composição, utilizando o estilo de cada um.

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Figura 59: Aluna do ateliê realizando o seu processo na pintura

Foto: Ocirema Pacheco

Nesse início do processo da pintura, apesar de alguns deles já estarem ali há

algum tempo, ainda demonstraram certa dificuldade em utilizar as cores. Diziam que

não sabiam pintar.

No terceiro e último momentos, demos continuidade ao processo criativo dos

alunos. Uns concluíram as suas atividades, mas outros não finalizaram. Os que não

conseguiram concluir, no tempo “determinado”, continuaram o processo durante as

aulas no ateliê e continuei dando o meu apoio motivando-os para que eles não

desistissem.

Os alunos apresentavam os seus questionamentos diante das explanações

que foram realizadas, durante as aulas teóricas e práticas. Considerei isso um

aspecto bastante válido e construtivo. No momento da produção, eles externavam

as suas dificuldades e assim pude auxiliar para que eles percebessem o quanto

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estavam evoluindo no processo criativo da pintura. Interessante que alguns deles já

mostravam diante da técnica ensinada o seu próprio estilo.

Alguns deles já mostravam as suas tendências, mesmo sem saber do que

realmente se tratava. Uns se pronunciavam dizendo gostar mais do tipo abstrato, e a

maioria pelo naturalista. Dessa forma procurei mostrar também para eles os diversos

estilos de pinturas.

Alguns alunos buscam o curso de pintura por estarem com auto-estima baixa,

e estão ali apenas para uma atividade terapêutica, orientadas pelos médicos deles.

Então, às vezes dificultava o processo de aprendizagem e criação. Já outros,

mesmo dentro dessas condições, levavam a sério o processo criativo querendo

fazer da melhor forma possível, aceitando que se fizesse a mediação do ensino da

pintura.

Apesar de se tratar de pessoas adultas, conscientes de seu papel naquele

momento, o desafio não foi nada fácil. Por isso foi importante criar estratégias de

ensino/aprendizagem através de projetos que pudessem contribuir e desenvolver

nesses alunos, de forma prazerosa, a criação de produções artísticas e

compreender que a arte tem um significado na nossa existência.

Os alunos diante do aprendizado foram adquirindo autonomia com a técnica

da pintura. Paulo Freire (1996, p. 91), no livro Pedagogia da autonomia diz que, “é a

segurança que se expressa na firmeza com que atua, com que decide, com que

respeita as liberdades, com que discute suas próprias posições, com que aceita

rever-se”. Ou seja, um ensino democrático em que as falas e subjetividades são

respeitadas e acatadas dentro de uma coerência.

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APÊNDICE B: PROCESSOS CRIATIVOS DO DESENHO DE ALUNOS DO ATELIÊ DO NAC

Nesse exercício Figura foi proposto que a partir de objetos e coisas da

realidade de cada um ou dos que já existiam no atelier, os alunos pudessem fazer

um desenho observando os elementos como a cor, luz e sombra.

Figura 60: Desenho de uma aluna do NAC Figura: 61: Desenho de uma aluna do NAC

Foto: Ocirema Pacheco Foto: Ocirema Pacheco

Figura: 62: Desenho de uma aluna do NAC

Foto Ocirema Pacheco

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APÊNDICE C: PROCESSOS CRIATIVOS DA PINTURA DE ALUNOS DO ATELIÊ DO NAC

Figura 63: Processo da pintura de um aluno do NAC Figura 64: Pintura realizada por um aluno do

Foto: Ocirema Pacheco Foto: Ocirema Pacheco

Figura 65: Processo da pintura de um aluno

do NAC

Figura 66: Processo da pintura de uma aluna

do NAC

Foto: Ocirema Pacheco Foto: Ocirema Pacheco