o pintor tekton

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A recompensa, se obter sucesso, será sua própria vida...

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O PINTOR

TEKTON

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L U I G I L O N G O

O PINTOR

TEKTON

S Ã O P A U L O 2010

ColeçãoNOVOS TALENTOS DA LITERATURA BRASILEIRA

Page 6: O pintor Tekton

Impresso no Brasil

Printed in Brazil

Direitos cedidos para esta edição à Novo Século Editora

Rua Aurora Soares Barbosa, 405 – 2º andar

CEP 06023-010 – Osasco – SP

Tel. (11) 3699-7107 – Fax (11) 3699-7323

www.novoseculo.com.br

[email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Produção Editorial Equipe Novo Século

Diagramação Equipe Novo Século

Capa Carlos Eduardo Gomes

Preparação de Texto Giacomo Leone

Revisão Juliano Domingues

Rodolfo Ortiz

Longo, Luigi

O Pintor Tekton / Luigi Longo. -- Osasco, Sp :

Novo Século Editora, 2011. -- (Coleção Novos

Talentos Da Literatura Brasileira)

1. Ficção Brasileira I. Título. Ii. Série.

10-12920 CDD-869.93

Índices para catálogo sistemático:

1. Ficção : Literatura brasileira 869.93

Copyright © 2010 by LUIGI LONGO

Page 7: O pintor Tekton

Aos eclesiásticos italianos Dom Hugo e Dom Baduino,

ao meu amigo Padre Carlos e ao guia Silvio Blau em Jerusalém,

que me ajudaram tanto com ensinamentos, palavras quanto

nas pesquisas deste livro.

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NOTA DO AUTOR

Esta é uma obra de ficção. Todo o enredo, bem como os

personagens, são fictícios. Os locais citados são reais e serviram

como cenário para a história apresentada.

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PARTE 1

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CAPÍTULO I

ARLEQUIM

ESTOCOLMO, SUÉCIASexta-feira, 28 de fevereiro de 2003, 20h30

Monsieur Pasquim estava apreciando a bela vista que ti-

nha da sacada da suíte Nobel do Grand Hotel de Estocolmo;

avistava o centro antigo, o harbour e o Palácio Real iluminados.

Era um cenário de cinema, pensava ele. Quem diria, estava hos-

pedado com todo aquele requinte no famoso hotel que durante

o período do Prêmio Nobel servia de hospedagem aos ilustres

convidados. E desta vez era ele quem estava hospedado numa

das suítes.

Pasquim já estava há mais de quarenta minutos tragando

um ótimo Cohiba, novo hobby que havia adquirido para com-

pensar o vício do cigarro, abandonado há pouco mais de três

meses. Estava admirando a bela paisagem e refletindo como sua

vida mudara radicalmente em tão pouco tempo...

Desde o incidente da captura do maior ladrão de obras de

arte de todos os tempos, O Pintor, em Munique, na Alemanha,

em junho do ano passado, no chamado dossiê Bushido de Ouro,

nomeado assim em virtude do objeto roubado ser o código de

honra dos samurais que estava em posse da máfia japonesa.

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Aquele final trágico, inclusive com a morte do Pintor em

Munique, pôs um ponto-final em seu passado infeliz e frustrante,

na ânsia e desafio constantes de capturá-lo.

Nesses oito meses passados, sua vida tinha mudado por

completo. Estava tudo diferente, ele era um novo homem.

Deixara seus vícios de lado, estava fazendo ginástica, fazia a barba

regularmente, se alimentava melhor, saía mais cedo do trabalho,

se vestia adequadamente, não usava mais aquelas roupas bregas

amassadas, vivia bem menos estressado, ele estava aproveitando

melhor seus 47 anos de idade.

Estava namorando Mônica, quem diria, namorar nova-

mente e ainda mais sua colega de trabalho. Apesar de que seria

sua funcionária por pouco tempo, estava tratando de transferi-la

para outro departamento, afinal era um homem muito discipli-

nado e não poderia permitir nenhum comentário negativo a

sua pessoa, tinha que dar o exemplo, era o diretor do departa-

mento. No entanto, o que mais passava em seus pensamentos

era que hoje Jean Pasquim Kalled teria uma noite muito espe-

cial, era a noite em que ele ganharia o prêmio de Melhor

Funcionário do Ano da Interpol, o “Gládio Aurum”, título iné-

dito para alguém do Departamento Internacional de Roubos e

Furtos — o DIRF da Interpol —, nos seus tradicionais vinte e

três anos de premiação.

Pasquim merecia o prêmio, tinha tido um ano profissio-

nalmente espetacular, atingido o nível de 86% dos casos resol-

vidos. Um índice que dificilmente seria repetido, ele sabia disso,

mas certamente o que veio coroar seu ano tinha sido a captura

do Pintor, que para muitos parecia impossível.

Pasquim esteve presente em seis edições do Prêmio Gládio

Aurum, como convidado. Em sua última presença, para ele, o

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evento mais bonito foi o de Roma, na Itália. Cada ano era rea-

lizado num país-membro da Interpol, com seus 186 represen-

tantes. Era o governo do país quem oferecia o evento, com tudo

pago aos convidados, como hospedagens, traslados e o evento

em si. Tudo na maior pompa possível. Chefes de Estado e cele-

bridades proporcionavam, com suas presenças, prestígio e gla-

mour ao evento.

Estarão presentes também, ao evento deste ano, os dire-

tores de todas as filiais dos países-membros da Interpol, cada

qual com suas respectivas esposas, além de toda a parte admi-

nistrativa e diretores dos diferentes departamentos, totalizando

650 convidados.

O prêmio de Funcionário do Ano representa prestígio e

honraria máxima a um funcionário da Interpol, e neste ano um

dos homenageados da noite era justamente ele. Que orgulho!

Apesar de Pasquim não gostar de toda aquela badalação — na

verdade, odiava —, estava muito orgulhoso. Que noite estava

por vir... E depois do jantar, no caminho de volta para o hotel,

iria pedir Mônica em casamento. Essa, sim, seria a grande sur-

presa da noite.

Pasquim mexeu no bolso de seu smoking, lá estava um

anel de brilhantes da Tiffany’s, do jeito que Mônica sempre

contou que sonhava. Ela havia assistido ao filme Bonequinha

de Luxo, com Audrey Hapburn, e desde então sempre sonhou

em ter um anel de noivado da Tiffany’s. Para Pasquim, já estava

decidido, no final do evento, no retorno para o hotel, a pediria

em casamento, e iriam passar as férias num local que ambos

ainda não conheciam: Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.

Eles estavam loucos para visitar a nova coqueluche do turismo

mundial. Que lua de Mel! Tudo isso era fácil para um homem da

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maturidade de Pasquim; o fato, porém, de que pretendia casar-se

de forma muito simples, com meia dúzia de convidados numa

pequena igreja em Paris, na França, cidade de Mônica, e de que

pretendia fazer isso em poucas semanas, seria a parte mais difícil

para convencer Mônica.

Pasquim olhou no relógio, estavam atrasados; Mônica,

como de costume, ainda não estava pronta...

— Mônica, vamos! Estamos atrasados...

Mônica apareceu no terraço da suíte Nobel. Ela estava

maravilhosa, com um vestido azul-marinho, com um pequeno

decote que destacava seus belos ombros, valorizados por um

pequeno pingente de brilhante sobre o colo dos seios.

— Nossa! Como você está linda!

— Tudo isso é para você, meu amor. Só para você!

— Bem, vamos. O motorista já deve estar lá embaixo nos

esperando. Temos que chegar cedo, afinal há todos aqueles pro-

tocolos que vão me passar e tenho que entender todos eles.

Caso contrário, irei fazer feio lá na frente do palco.

— Você fazer feio? Nunca. Vamos.

Saíram da suíte Nobel e foram em direção ao lobby do

hotel, que estava já com grande movimento. Muitos eram os

convidados esperando para entrar na fila do shuttle (traslado)

que os conduziria à prefeitura de Estocolmo, local do evento.

Menos Pasquim, que, como convidado especial, possuía uma

limusine aguardando-o. O chofer, ao avistar Monsieur Pasquim

com Mônica na recepção, foi recepcioná-los, conduzindo-os

para seu traslado especial.

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NEW ORLEANS, EUASexta-feira, 28 de fevereiro de 2003, 12h45

Apesar de o carnaval de New Orleans começar tecnica-

mente no dia 6 de janeiro todos os anos, é durante os quinze dias

que antecedem a terça-feira gorda que a festa começa de fato.

Os foliões estavam agitados, New Orleans estava uma

loucura, uma multidão brincando pelas ruas, turistas espalhados

por toda a cidade; muitas pessoas bebendo diferentes misturas

alcoólicas, shows diversos em todo o Mississippi. Muitos beads,

colar de bolinhas plásticas, nas cores verde, amarelo e roxo, co-

res-símbolo do Mardi Gras, representando fé, poder e justiça.

As pessoas buscavam acumular o maior número de beads possí-

vel. Parecia uma brincadeira sem graça, pensava Jack, mas certa-

mente com dúzias de beads se conseguia muitas coisas em New

Orleans nesta época do ano.

Numa mistura incrível de ritmos e instrumentos, a mul-

tidão era guiada esperando o final do carnaval que ocorre ofi-

cialmente quatro dias antes da terça-feira gorda. Todos os anos

a tradição se repete, às 16 horas, no French Quarter, na Bourbon

Street, passa um cortejo anunciando o final do carnaval, ao som

triste do jazz de funeral onde todos caminham até que “Jester”,

o curinga-símbolo do carnaval de New Orleans, ordena com o

apito que a festa continue por mais quatro dias, quando ocorre-

rão as principais e maiores festas e desfiles. Ao som do jazz dixie

When the Saints go Marching, inicia-se essa grande festa que só

termina na quarta-feira de cinzas.

Jack estava sentado fazendo um belo brunch creole no tra-

dicional restaurante The Court of two Sisters, na rua Royale,

travessa da Bourbon Street. Uma banda cajun animava o jardim

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aconchegante, repleto de bexigas coloridas, penduradas nas

parreiras de uvas, que se estendiam sobre as mesas tomadas do

típico restaurante. O local estava muito gostoso, bem animado.

Jack estava sentado sozinho, numa mesa ao lado do char-

moso poço que ficava no meio do jardim, estava curtindo a

festa local, admirando aquele dia que, apesar de frio, estava com

um belo céu azul e uma atmosfera inigualável. Fazia tempo que

ele não sentia esse ar de liberdade e de festa.

Estava ansioso, iria entrar em ação depois de oito meses

parado. Depois de tantas situações que ocorreram e que trans-

formaram sua vida de cabeça para baixo. Ele lebrava bem das

palavras de seu padrinho, quase pai, Dom Carmelo, que sempre

dizia: “A vida é uma gangorra”. Uma mistura de impaciência

com motivação corria em suas veias. Assim que o cortejo do

funeral passasse, para ele seria o momento mais especial e im-

portante daquele carnaval.

ESTOCOLMO, SUÉCIAPrefeitura, 21 horas

Os convidados estavam todos no coquetel do surpreen-

dente salão azul, menos Pasquim, que estava nos bastidores,

atrás do palco, recebendo as últimas instruções de como iria

ocorrer o evento e todo protocolo que teria que seguir. Às

21h30, iriam dar início ao jantar no salão dourado no piso su-

perior.

Mônica estava sozinha, bebendo uma taça de champanhe,

quando Pasquim chegou.

— Tudo bem, Mônica?

— Tudo bem, já estava sentindo sua falta.

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— Imagino... Agora estou aqui ao seu lado.

— Como foi com os organizadores? Muitas instruções

para entender?

— Não, foi tudo fácil com o pessoal da organização do

evento. Os caras aqui são muito profissionais. Foi mais tranquilo

do que eu pensava. Eu estive em outros eventos, é sempre a mes-

ma coisa. Tenho que fazer o discurso, não pode ser mais que

vinte minutos. Daí entregam o diploma feito com detalhes em

ouro, numa moldura de bronze, toda trabalhada. Acho a moldu-

ra mais bonita que o diploma. Entregam também um relógio de

ouro, muito bacana, Patek Philippe, feito sob encomenda, é uma

produção especial.

— Uau, que honraria. Mas e se algum contemplado ga-

nhar o prêmio mais de uma vez, ele ganha o mesmo relógio duas

vezes?

— Ahahah, não sei Mônica. Nunca vi acontecer isso antes.

Mas, e aí, o que achou do famoso salão Azul (Blå Hallen) da

Prefeitura? É nesta sala que fazem o jantar do Prêmio Nobel,

sabia?

— Eu sei. Mas não entendo por que o denominam de

“Salão Azul”. Aqui não tem nada de azul. As paredes da sala são

todas de tijolos...

— Ahahah. É verdade. Mas eu sei o porquê desse nome.

O arquiteto quando fez este salão, no projeto inicial, era para as

paredes serem pintadas de azul, na cor do escudo da família real

sueca, mas quando o salão ficou pronto, com toda a parede co-

locada, essa parede de tijolos na cor vermelha ficou tão bonita,

tão impressionante, que resolveram manter como está, desta

forma.

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— De fato, é mesmo impressionante. Que teto maravilhoso,

que alto... E o órgão, você viu que lindo? — Nesse momento,

foram interrompidos por um dos diretores da Interpol, o audi-

tor-chefe Peter MCcain.

— Monsieur Pasquim. Que alegria estarmos aqui nesta

tão bela festa.

— É verdade. Que alegria...

— Deixe-me falar baixo para ninguém escutar. Eu não

pensaria em ninguém melhor que você para receber esse prêmio.

Ninguém! Meus parabéns, nos falamos depois... — Peter MCcain

saiu andando com sua espetaculosa esposa que revelava com o

enorme decote seus vastos seios.

— Quem é ele?

— Esse aí? Um idiota, jovem arrogante. Na frente, é todo

gentil; e, pelas costas, fala mal de todo mundo...

— Calma, Pasquim! Pare! Hoje é seu dia. Não vá ficar

irritado por causa desse cara. Vamos aproveitar. — Outras pessoas

os interrompiam constantemente para cumprimentá-lo.

O jantar seguiu conforme o protocolo. À mesa de Pasquim

estavam outros três casais, todos premiados do ano. Eram qua-

tro premiados todos os anos pelos méritos realizados. Para a

maioria dos convidados era uma surpresa, menos para os dire-

tores de algumas filiais e para os contemplados que uma semana

antes sabiam quem seriam os premiados.

“Gládio Aurum” recebia este nome devido ao símbolo da

Interpol ser uma espada dourada cravada num globo terrestre

azul, sobre uma balança que representa a justiça no mundo. O

Prêmio Gládio Aurum representa esse símbolo. “Gládio” trata-se

de um tipo de espada mais curta usada na Idade Média, e aurum

significa “ouro” em latim.

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Um dos convidados da mesa, Pheter Lios, da Interpol,

Departamento de Antiterrorismo, Bahamas, brincou que deve-

riam receber o prêmio no Salão Azul, onde fora o coquetel, e

não no Salão Dourado, onde estava sendo realizado o jantar. À

mesa todos riram do comentário de Pheter. Pasquim pensou

consigo como era idiota aquele homem, um local tão belo como

aquele salão, todo de mosaico banhado a ouro, certamente,

nunca mais poderia fazer um jantar ali, ainda mais sendo um

dos homenageados da noite. E percebeu que Pheter Lios só fa-

zia piadinhas o tempo todo e nem apreciava o lugar. Além do

que eram estúpidas suas intervenções, totalmente sem graça.

Piada para americano, pensava ele. Como aquele ignorante po-

deria estar recebendo uma homenagem pela Interpol, era do

Depar-tamento de Antiterrorismo, diretor da região das

Bahamas, mas que terrorismo alguém pode querer fazer nas

Bahamas? Que desperdício de prêmio...

— Pasquim?

— Oi, Mônica.

— Tudo bem? Está calado?

— Estou concentrado. Está chegando o momento da ce-

rimônia, e você sabe que detesto falar em público.

— Calma, vai dar tudo certo.

O mestre de cerimônias estava no palco, a música parara

de tocar, era o momento de aquela baboseira começar, pensou

Pasquim. O mestre de cerimônias começava a fazer um belo

discurso. Chamou o diretor da Interpol da Suécia, em seguida

o Diretor-Geral da Interpol, chefe de Pasquim, mr. Nigel Waxler,

e por último o Secretário-Geral da ONU, mr. Ronald Gabble.

Todo protocolo ocorria como o esperado. Agora era a vez

de subir ao palco Judy Esper, diretora de Recursos Humanos da

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Interpol. Pasquim tinha um bom relacionamento com ela.

Muito cordial. Ela era quem iria anunciar os quatro homenagea-

dos da noite, e o terceiro da ordem era Pasquim. Faria um dis-

curso, depois iria para o lado esquerdo do palco, esperaria o

último homenageado, seu discurso e os quatro voltariam para

uma foto junto com o Diretor-Geral da Interpol e o Secre-

tário-Geral da ONU, seguindo com a premiação.

O Cerimonial ocorreu conforme o combinado, tudo não

passou de uma hora, como era para ser, discursos rápidos, o

Diretor-Geral da Interpol, Nigel Waxler, detestava que as ceri-

mônias demorassem, Pasquim também.

Pasquim falou pouco, estava nervoso gaguejou por dois

momentos, mas nada que o comprometesse. Acabou usando

palavras bonitas, sábias, agradando a todos.

Depois que serviram a sobremesa, estavam começando a

servir chás e cafés, muita gente já estava se despedindo, passa-

vam à mesa dos homenageados, cumprimentavam-nos e iam

embora. Pasquim sempre achou esse jantar algo muito monótono,

frio, não tinha nenhum show, nada para animar o evento. Era

sempre a mesma coisa. Serviam o jantar, com um excepcional

catering, elaborado por um chef de cozinha famoso. Antes da

sobremesa, pausa para os discursos, anúncio dos vencedores,

sobremesa, café e pronto, acabou... E a emoção?, pensava ele.

Nada disso. Era frio, rápido. Sem animação nenhuma. Tudo

muito elegante, porém chato. Um tremendo jantar, mas era isso

somente o jantar, nada de mais. Coisa de suíço, objetivo com o

mínimo necessário. Para ele, tinham que contratar uma empresa

terceirizada, uma inglesa, americana, francesa, melhor ainda,

italiana; os italianos sabem fazer festas.

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NEW ORLEANS, EUABourbon Street,16h10

Jack pagou a conta, levantou-se e foi até o banheiro do

restaurante. Com ele havia uma mochila bege, tirou de dentro

uma fantasia colorida com losangos em amarelo e azul. Colocou

por cima da roupa preta que estava vestindo. Trocou o tênis por

um sapatênis branco. Ainda pegou uma máscara branca e fixou-a

no rosto. E, por último, faltava o chapéu preto, tipo Napoleão.

Agora sim, parecia um arlequim legítimo. Saiu do restaurante e

caminhou em direção ao enorme cortejo ao som do jazz funeral

que caminhava pela Bourbon Street. A rua estava impossível de

se caminhar. Os hotéis e restaurantes estavam com seus terraços

lotados por curiosos à espera do momento em que o curinga

Jesper aparecesse. Todos atentos para o início do carnaval de

2003, que permaneceria pelos próximos dias.

Durante o trajeto, milhares de pessoas brincaram com

ele, jogando beads, pedindo beijos, fazendo gracinhas, mas ele

manteve-se sempre focado. Assim que o grande cortejo chegou

à Jackson Square, com sua enorme praça rodeada por prédios

antigos creole, no lugar dos pintores e vendedores habituais, en-

contrava-se uma multidão à espera da chegada de outro bloco de

cortejo que vinha da direção oposta. Estavam agora os dois cor-

tejos posicionados, esperando apenas o curinga Jesper aparecer.

Jesper, o curinga-símbolo do carnaval, como um maestro

com suas mãos, determinou que ambas as bandas de jazz funeral

parassem. Um silêncio se estendeu com a multidão de quase

um milhão de pessoas. Ao som do apito de Jesper, as duas grandes

bandas começaram a tocar When the Saints Go Marching. O povo

agora acompanhava cantando abraçados com apitos, jogando

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para o alto muitas beads. Era o início de uma grande festa.

Jack aproveitando-se daquela confusão e euforia, cami-

nhou em direção ao museu de história da cidade, o Museu

Cabildo, num belo prédio branco formado por arcos, era a antiga

sede do governo espanhol. Avistou dois policiais ao lado de uma

típica viatura azul com uma faixa amarela onde estava escrito

“State Trooper” , encostada logo na frente do museu. Como todos

os dias, a mesma viatura estava estacionada, só que desta vez com

aquela multidão, os dois policiais estavam distraídos, entretidos

com a magnífica festa. Estavam tomando cappuccino num copo

grande, rindo com os engraçados personagens que transitavam.

Num dos terraços do museu, de frente para a Jackson

Square, ao lado direito, estavam também quatro seguranças de

plantão assistindo ao movimento da rua.

Jack direcionou-se ao lado oposto do terraço aberto, no

lado esquerdo do museu que não possuía vista para a praça,

subiu em uma das grades escuras que formavam o muro do

museu, fingiu que era um dos espectadores procurando uma

melhor vista da parada, como outros que estavam fazendo o

mesmo, e, em fração de segundos, usou de apoio a grade sobre

o muro e subiu pelo parapeito para o único terraço com janela

do lado esquerdo.

Jack estava muito nervoso, sentia o coração bater cada vez

mais rápido. Sua respiração estava ofegante, transpirava muito,

parecia que ele voltava ao começo de sua carreira, em seus pri-

meiros roubos. Estava um pouco inseguro.

Como havia previsto, estavam todos os seguranças, os

quatro de plantão, assistindo à parada. Portanto, como estavam

no terraço com a janela aberta, o alarme provavelmente estava

desligado.

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Jack pegou o macaco hidráulico de dentro de sua mochi-

la bege, regulou-o, com muito esforço, procurando arrombar a

janela do terraço delicadamente a fim de evitar um barulho

maior. Mas estava com dificuldade, estava sem força suficiente

para fazê-lo. Transpirava muito. Já estava cansado. Tentou for-

çar o máximo possível, até que com insistência conseguiu abri-

la, comprovando que o alarme estava mesmo desligado.

Agora, dentro do museu, Jack não teve muita preocupação

com as câmeras, afinal estava fantasiado, não importava se o

filmassem, pois ninguém estava monitorando as câmeras de vi-

gilância naquele momento, os quatro seguranças de plantão es-

tavam preocupados com outra coisa, e era com a festa, com as

várias moças que mostravam os peitos em troca de miçangas.

Que facilidade!, pensou ele. Caminhou até a sala principal do

segundo andar, chamada de Fontainebleau, local onde estavam

expostos moedas e mapas franceses de época, eram vários ma-

pas presos em displays na parede.

Jack conhecia precisamente o local – havia estado lá dias

antes, observando-o detalhadamente –, indo objetivamente

atrás do que buscava. Com a ajuda de um alicate, tirou da pa-

rede um pequeno mapa antigo na cor sépia com destaque do

continente europeu que estava preso num display de vidro.

Dobrou-o delicadamente, guardando-o num saco plástico e

colocou-o na mochila.

Olhou para o lado e avistou uma cadeira no final da sala,

arrastou-a para o lado dos mapas pendurados, tirou sua fantasia

e o chapéu de Napoleão, porém continuou com a máscara.

Ajeitou na cadeira a fantasia como se o arlequim estivesse sen-

tado nela, deixando o chapéu de Napoleão pendurado na parte

superior da cadeira. Pegou um pedaço de papel escrito com caneta

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de tinta azul, colocou com destaque sobre a cadeira. Saiu da sala

calmamente.

Pela mesma janela que entrou, saiu, quando estava des-

cendo pelo parapeito, um deslize, acabou perdendo a firmeza

em sua perna direita, vindo a escorregar... Mas por sorte conse-

guiu se recuperar a tempo, sua mochila bege caiu na rua. Parou

por uns segundos, deu um suspiro de alívio, estava com a respi-

ração bem ofegante. Que susto!, pensou consigo. Depois, desceu

rapidamente para a rua, pegando sua mochila novamente.

Da rua, avistou os seguranças da sacada e os dois policiais

que estavam ainda entretidos com a festa, nem haviam mudado

de posição. Saiu andando para o meio da multidão, perdendo-se

de vista naquela confusão.

Caminhou em direção ao Rio Mississippi, distanciando-se

da multidão do carnaval que se fazia no French Quarter. No

local combinado no píer, estava seu oponente e parceiro, Said,

esperando por ele. Jack embarcou na lancha que estava a sua

espera. Saíram de lá em alta velocidade.

ESTOCOLMO, SUÉCIAPrefeitura, 1h30

Pasquim e Mônica entraram no carro, o motorista nova-

mente fez todo o ritual para acomodá-los na limusine. Pasquim

estava calado, bastante nervoso, iria pedir a mão de Mônica em

casamento naquele momento, ergueu o vidro escuro isolando o

ambiente do motorista e abriu a garrafa de champanhe.

— Nossa! Vamos fazer um brinde a você querido? Dom

Perignon...

— Negativo, vamos fazer um brinde a nós!

Page 27: O pintor Tekton

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— Que bom! Claro...

Mas antes de fazer o brinde, Pasquim pegou a caixinha de

cor verde com laços brancos. Só de olhar o pequeno invólucro,

Mônica já sabia que era da Tiffany’s. Pasquim olhou em seus

olhos, Mônica calada lacrimejava de emoção.

— Você aceita... — Antes de terminar a frase, Mônica se

antecipou.

— Claro que aceito, meu amor.

Ambos se beijaram, abraçaram-se num grande momento

de felicidade e emoção. Pasquim havia solicitado ao motorista

para fazer um city tour à noite na cidade de Estocolmo, e com

cem euros conseguiu facilmente o serviço extra do solícito ho-

mem.

Durante o trajeto, ambos degustando o saboroso cham-

panhe, Pasquim informou Mônica que a data já estava reserva-

da, era dia 18 de agosto. Por estranheza dele, ela aceitou tudo,

até o fato de se ter pouquíssimos convidados, somente parentes

próximos. E que depois a lua de mel seria em Dubai, nos

Emirados. Mônica nem acreditava, iria se casar com o homem

que aprendera a admirar tanto, o homem de sua vida.

O momento era de muita emoção, quando o vidro que

dava acesso ao motorista abaixou.

— Pois não — comentou Pasquim, à espera do motivo

que levara o motorista e interrompê-los.

— Senhor, telefone. Estão ligando em meu celular insis-

tentemente. É um tal de Hoogan, de Nova York.

— Ok, passe para mim. O que será que ele quer? Deve

ser algo muito importante... — Pasquim pegou o celular.

— Desculpe, Monsieur, sei que hoje é um dia muito es-

pecial para o senhor, mas...

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— Fale logo, deve ser algo muito importante para...

— Sim, senhor; é que teve um roubo em New Orleans

hoje no final da tarde, faz pouco tempo, no Museu Cabildo, e...

— E o que é que tem isso? Que eu saiba, aí nos Estados

Unidos, a CIA é quem cuida de seu território, não participam a

Interpol nunca, você sabe bem disso, o que nós podemos fazer...

— Bem, é que tem uma mensagem que foi deixada para

o senhor...

— Como!? Impossível!!! Como assim? O que tem nessa

mensagem?

— Trata-se de um anagrama, sei lá. Não dá para entender

direito.

— Mande para mim, abro meu e-mail e...

— Senhor, tem mais um detalhe...

— Que detalhe?

— As características do autor do roubo batem muito com

as do...

— Com quem?

— Com as do Pintor, senhor.

— O quê? O cara está morto! Você deve estar me passando

um trote. Parecido como? Não estou entendendo? Quantos

roubos interceptamos que eram ladrõezinhos de merda tentando

imitá-lo passando por ele. Uns cinco, penso eu, caralho! - A voz

de Pasquim foi mudando, ficando mais acelerada, irritada e

nervosa. Mônica parecia que pressentia o ocorrido, fitava a rea-

ção de Pasquim. Estava surpresa com ele. Pasquim não falava

mais tantos palavrões com a mesma frequência de antes, e agora,

de repente, estava voltando a fazê-lo.

— Concordo, senhor; mas acho melhor o senhor vir aqui

dar uma olhada.

Page 29: O pintor Tekton

27

— Hoogan, se eu for para aí e... Pasquim desligou em

silêncio o telefone, comunicou ao motorista para acabar com o

tour e dirigir-se ao hotel.

— Mônica, não podemos passar este fim de semana mais

aqui. Sinto muito. Amanhã temos que retornar para Lyon com

urgência.

— Entendo, não tem problema...

— Não me pergunte nada, amanhã, no voo para Lyon,

falaremos a respeito.

NOVA YORK, ESTADOS UNIDOSDias atuais, 9h26

— Zé, quer dizer então que o Pintor não morreu? Ele

está vivo? Foi ele quem fez o roubo do Museu Cabildo?

— Isso mesmo. Mas não entendi o porquê desta sua per-

gunta? Esta é a segunda parte da trilogia “O Pintor”, não é

mesmo?

— Sim, claro, tem razão. É que fiquei tão empolgada

com o começo da história que...

— Eu entendo, mas, por favor, não me interrompa mais.

Preciso me concentrar onde paramos. Esta segunda parte é a mais

dinâmica das três; se eu me distrair, posso perder a sequência...

— Claro, Zé, sem problemas. Desculpe mesmo. Mas te-

nho uma dúvida, como ele conseguiu escapar vivo de Munique?

Onde ficou esse tempo todo, os oito meses que estava desapare-

cido? E por que o Said estava esperando por ele na lancha?

— Chega. Calma! Você saberá logo, assim que retomar-

mos a história, contarei o que aconteceu com ele nesse período,

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todos os detalhes, e você vai ver em que trama ele se meteu. Não

só ele, mas o próprio Pasquim, o Said e...

— Tem razão. Vamos logo então. Pode começar. Estou

pronta para digitar.

— Ok. Então vamos lá. Digite o nome deste segundo

capítulo, “Pesadelo”. Coloque “Chinatown, NY, primeiro de

março”.

— Ahã. Prossiga...

Page 31: O pintor Tekton

Luigi Longo é advogado, formado em Direito

pela FMU, pós-graduado em Administração con-

tábil pela FAAP, atua na área de relacionamento e

produção de eventos. Tem realizado com sucesso

grandes produções e eventos em diversos países,

dos cinco continentes.

Esta experiência adquirida é aplicada na des-

crição nos diversos lugares do planeta, como em

restaurantes, hotéis, cenários mundialmente co-

nhecidos já visitados por ele.

Este é o segundo livro do autor. O primeiro é

O PINTOR em Bushido de Ouro.

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ISBN - 978-85-7679-416-5