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FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS, ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS DE FRANCA FACEF AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO CONTEXTO ECONÔMICO E SOCIAL DA REGIÃO DE FRANCA MÁRIO FRANCISCO CHAGAS FACEF 2000

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FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS,

ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS DE FRANCA

FACEF

AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO CONTEXTO

ECONÔMICO E SOCIAL DA REGIÃO DE FRANCA

MÁRIO FRANCISCO CHAGAS

FACEF

2000

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FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS,

ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS DE FRANCA

FACEF

AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO CONTEXTO

ECONÔMICO E SOCIAL DA REGIÃO DE FRANCA

MÁRIO FRANCISCO CHAGAS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, para obtenção de título de Mestre em Administração, área de concentração Gestão Empresarial, sob orientação do Prof. Dr. Orís de Oliveira

FACEF

2000

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CHAGAS, Mário Francisco As cooperativas de trabalho no contexto econômico e social da região de Franca / Mário Francisco Chagas // Franca: 2000. 123 p. il. Orientador: Dr. Orís de Oliveira Dissertação de Mestrado – FACEF Programa de Mestrado em Gestão Empresarial. 1. Administração de empresas. 2. Cooperativismo de trabalho – Franca SP. 3. Terceirização. 4. Custos. I.T.

CDD 658.1147

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Data: ___/___/___

Banca Examinadora Prof. Dr. Orís de Oliveira Prof. Dr._______________________________________________________ Prof. Dr._______________________________________________________

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Este trabalho é dedicado à minha família.

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AGRADECIMENTOS

A DEUS, pela graça e misericórdia com que tem me distinguido, apesar de

mim mesmo. A SUA presença eu senti, principalmente nos momentos das maiores

dificuldades. Perdão SENHOR, por todos os meus desacertos.

Aos meus pais, ANTÔNIO e ANNA, porque além da vida e do amor,

herdei de vocês o respeito pelas outras pessoas, mesmo que não as entenda. Admiro-vos

pela perseverança e espírito de luta. Amo vocês!

A minha esposa LUCY, pelo amor, pela presença, incentivo, cuidado e

compreensão dedicados a mim nesses anos todos. Você deu nova dimensão à palavra

companheira. Amo você.

Aos meus filhos, EDUARDO HENRIQUE e FELIPE AUGUSTO, pelo

carinho e por compreenderem a minha constante ausência no lar. Tenho certeza que valeu

a pena... Amo vocês!

Aos meus irmãos. Vocês sempre estiveram comigo e são grandes

camaradas. À minha maneira, eu vos amo.

Ao Prof. Dr. ORÍS DE OLIVEIRA, meu orientador e fonte de muito saber.

Pela atenção, incentivo e confiança. Meu respeito e gratidão eternos.

E, ainda, a todos aqueles que, sabendo-o ou não, colaboraram na realização

deste trabalho.

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Dar aos homens livres fé e conhecimento, criar e fortificar seu sentimento de

liberdade e de igualdade pelo conhecimento viril de suas responsabilidades, eis as

primeiras tarefas da educação cooperativa. Tarefas necessárias, mas ainda não

suficientes; Walter Scott relata que, um dia, tendo de utilizar os serviços de um

barqueiro, observou que a palavra ‘Fé’ estava escrita sobre um dos remos e a

palavra ‘Trabalho’ sobre o outro. Solicitado a dar uma explicação, o homem pôs-

se a manobrar vigorosamente o remo que se chamava ‘Fé’ e o barco começou a

girar sem cessar sobre si mesmo. ‘Vêde, agora, disse o barqueiro, que se meu

barco caminha é porque eu utilizo ao mesmo tempo ‘Trabalho’ e ‘Fé’.

O mesmo sucede com o barco cooperativo... Maurice Colombain

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................... 14

CAPÍTULO 1 – UM POUCO DA HISTÓRIA DO COOPERATIVISMO........................ 18

1.1 Considerações iniciais ............................................................................................... 18

1.2 Estrutura do trabalho ................................................................................................. 19

CAPÍTULO 2 – AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO BRASIL........................... 21

2.1 Conceituação ............................................................................................................. 21

2.2 Cooperativismo: gênese e evolução .......................................................................... 22

CAPÍTULO 3 – AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NA REGIÃO DE FRANCA .. 36

3.1 Cooperativismo no Brasil .......................................................................................... 36

CAPÍTULO 4 – AS TERCEIRIZAÇÕES E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO..... 44

4.1 As Cooperativas de Trabalho e a terceirização na região de Franca ......................... 44

CAPÍTULO 5 – AS COOPERATIVAS DE TRABALHO E A REDUÇÃO DE

CUSTOS DE PRODUÇÃO ................................................................................................ 72

5.1 As Cooperativas de Trabalho realmente proporcionam redução de custos para as

empresas?......................................................................................................................... 72

5.2 Mas afinal, o que são as pseudoperativas? ................................................................ 94

5.3 Qual a efetiva participação das Cooperativas de Trabalho na Terceirização? ......... 97

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 116

BIBLIOGRAFIA............................................................................................................... 120

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SUMÁRIO DAS TABELAS

Tabela 1: Quanto Custa o Empregado 57

Tabela 2: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho 58

Tabela 3: Análise Comparativa de Encargos Empresa X Cooperativa de Trabalho 101

Tabela 4: Obrigações Empresário X Cooperado 103

Tabela 5: Relação de Incidência de Impostos Empresas X Cooperativas 105

Tabela 6 – Determinação do Fator K 108

Tabela 7: Componentes do Preço de Venda 109

Tabela 8: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho 112

Tabela 9: Cálculo de Valor de Serviço com Mão- de- Obra Própria 113

Tabela 10: Cálculo de Valor de Serviço com Mão-de-Obra Cooperativada 114

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SUMÁRIO DOS QUADROS

Quadro 1: Características de cada forma de Terceirização ................................................ 52

Quadro 2: Relação Entre Empregado e Cooperado I....................................................... 104

Quadro 3: Relação Entre Empregado e Cooperado II...................................................... 104

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RESUMO O advento de novas tecnologias, aliado à globalização mundial da economia, tem, por um

lado, permitido que muito mais pessoas em todo o mundo, tenham acesso a bens de

consumo que, até então, eram impensáveis. Por outro, tem ocasionado a extinção de postos

de trabalho em todas as áreas. Estes postos de trabalho nem sempre são reabsorvidos pela

economia. Assim, o mundo de maneira geral e o Brasil, em particular, tem experimentado

uma crise de empregos sem precedentes em toda história. O Brasil, premido por

circunstâncias políticas e dirigido, por mais de vinte anos, por governantes que

acreditavam que a reserva de mercado era fator de desenvolvimento interno, além de uma

inflação mensal que, não raro, aproximava-se dos três dígitos, demorou-se mais que os

países com maior grau de desenvolvimento para reagir e, só agora, esforça-se por

acompanhar o ritmo da economia mundial. Necessitando produzir com qualidade e custos

baixos, muitas empresas brasileiras perceberam que, na terceirização, estava a grande

possibilidade da realização desse mister, e, após várias tentativas para conseguir o menor

custo de produção, têm encontrado no cooperativismo de trabalho, uma forma de atingir

esses objetivos. O momento ainda é de transição, no que diz respeito ao ordenamento

jurídico desse relacionamento. Costumes arraigados há muitos anos e uma legislação

trabalhista que, na maioria das vezes, atribui muitos direitos aos trabalhadores, além de

sindicatos que temem perder representatividade e arrecadação, tem feito com que a

implantação do cooperativismo de trabalho, em nosso país, caminhe a passos muito lentos,

além do fato de grande parte do empresariado nacional ainda temer esse tipo de

contratação. Mas, mesmo de forma sutil, as Cooperativas de Trabalho se têm feito presente

em nossa economia, contribuindo para que as empresas que se utilizam de seus serviços

consigam atingir os seus objetivos e se mantenham competitivas nos mercados internos e

externos. Além desse fato, por si só muito importante, as Cooperativas de Trabalho, nas

suas mais variadas formas de atividades e especialidades, têm se apresentado como

alternativa de trabalho e emprego para um número sempre crescente de trabalhadores que

perderam seus postos de trabalho com carteira assinada e que encontram nessas empresas,

a forma de subsistirem e prosperarem. Cabe agora à legislação brasileira se adequar a estes

novos tempos, tornando-se mais flexível a esta realidade e proporcionando uma redução

dos custos do emprego, seja ele representado pelo trabalho formal tradicional, ou seja ele

representado pelo trabalho realizado pelas sociedades cooperativas, como forma de auxiliar

no processo de crescimento e desenvolvimento do nosso país.

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ABSTRACT

The advent of new technologies, in alliance with worldwide economical globalisation, has

been permitting many more people around the world to access consumer goods than it was

thinkable, up to now. On the other hand, it has been causing the extinction of workstations

in all areas. These are not always reabsorbed by the economy. Thus, the world, in a general

manner, and Brazil, particularly, is going through an employment crisis without precedents

in the whole of History. Brazil, pressed by political circumstances and for more than

twenty years, managed by governors who believed that market reserves were an internal

development factor, besides a monthly inflation that, not rarely, surpassed three digits, took

longer than other, more developed countries to react, and now, has to strive in order to

follow the rhythm of world-wide economy. Needing to produce with quality and low costs,

many Brazilian companies realised that putting third parties in charge of production was

the great possibility of accomplishing this task. And, after many attempts to get to the

lowest production costs, they have been finding in labour cooperatives a way of reaching

these goals. It’s still a moment of transition in the juridical organisation part of this

relationship. Decade-old, deep-rooted customs plus a labour legislation which, in most

times, grants too many rights to the workers, and syndicates fearing to lose their “workers’

representative” position and income, are all making the installation of labour cooperatives

very slow; besides, most of the national businessmen are still apprehensive about this form

of contracting. However, even if in a subtle manner, the labour cooperatives are making

themselves present in our economy; helping the companies which employ their services to

accomplish their objectives and keeping themselves competitive in internal and external

markets. Beyond this fact, already very important alone, those cooperatives, in their most

diverse forms of activities and specialities, are presenting themselves as a working

alternative for an always growing number of workers who have lost their registered jobs

and find, in those enterprises, a way of subsisting and prospering. Now it’s up to Brazilian

legislation to adjust itself for this new time, becoming more flexible to reality, causing

employing costs to decrease for registered, traditional employment, and for the one

performed by labour cooperatives as well, in order to help in the growth and development

of our country.

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RESUMEN El advenimiento de nuevas tecnologías, aliado a la globalización mundial de la economía,

por una parte, ha permitido que mucho más personas en todo el mundo, tengan acceso a

bienes de consumo que, hasta entonces, eran indispensables. Por otra parte, ha ocasionado

la extinción de puestos de trabajo en todas las áreas. Estos puestos de trabajo ni siempre

son reabsorbidos por la economía. Así, el mundo de forma general y Brasil, en particular,

tiene experimentado una crisis de empleos sin precedentes en toda la historia. Brasil,

llevado por circunstancias políticas y conducido, por más de veinte años, por gobiernos

que creían que la reserva de mercado era factor de desarrollo interno, además de una

inflación mensual que, no raro, se aproximaba de los tres dígitos, se tardó más que los

países con mayor grado de desarrollo para reaccionar y, solamente ahora, se esfuerza por

acompañar el rítmo de la economía mundial. Necesitando producir con calidad y bajos

costos, muchas empresas brasileñas notaron que, en la tercerización, estaba la gran

posibilidad de la realización de ese mister, y, tras varios intentos para lograr menor costo

de producción, ha encontrado en el cooperativismo de trabajo, una forma de alcanzar esos

objetivos. El momento aún es de transición, con respecto al ordenamento jurídico de ese

relacionamiento. Costumbres arraigadas hace muchos años y una legislación de trabajo

que, en la mayoría de las veces, atribuye muchos derechos a los trabajadores, además de

sindicatos que temen perder representatividad y arrecaudación, ha hecho con que la

implantación del cooperativismo de trabajo, en nuestro país, camine a pasos muy lentos,

además del hecho de gran parte del empresariado nacional todavía tema ese tipo de

contratación. Pero, aunque de forma sutil, las cooperativas de Trabajo se hace presente en

nuestra economía, contribuyendo para que las empresas que se utilizan de sus servicios

consigan alcanzar sus objetivos y se mantengan competitivas en los mercados internos y

externos. Además de ese hecho, por sí sólo muy importante, las Cooperativas de Trabajo,

en sus más diversas formas de actividades y especialidades, tiene presentado como

alternativa de trabajo y empleo para un número siempre creciente de trabajadores que

perdieron sus puestos de trabajo con contrato firmado y que se encuentran en esas

empresas, la forma de que subsistan y que prosperen. Cabe en ese momento a la legislación

brasileña adecuarse a esos nuevos tiempos, volviéndose más flexible a esa realidad y

proporcionando una reducción de los costos del empleo, sea representado por el trabajo

formal tradicional, o por el trabajo realizado por las sociedades cooperativas, como forma

de auxiliar en el proceso de crecimiento y desarrollo de nuestro país.

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INTRODUÇÃO

Limiar do século XXI. O Brasil procura acertar o passo na dança da

economia globalizada, uma vez que se move completamente fora do compasso. A palavra

de ordem é redução dos custos de produção com melhoria sempre crescente da qualidade

dos produtos. Os consumidores passaram de simples figurantes, meros utilizadores das

mercadorias rotuladas de indústria brasileira, premidos que eram pela reserva de mercado

aos produtos nacionais, para os papéis de atores principais, ou de sua alteza, o

consumidor, agora comparados a quaisquer cidadãos de primeira classe, podendo adquirir

bens e serviços made in the world, ou fabricados em qualquer parte do mundo, como se

estes fossem produzidos em suas próprias cidades e que o parque produtivo mundial fosse

apenas uma indústria que ficasse próxima de seu bairro.

Naturalmente isso não se deu em um passe de mágica. As empresas

nacionais que não investiam há dezenas de anos na modernização de seus equipamentos

ficaram, algumas momentaneamente, outras de forma definitiva, completamente fora do

mercado, uma vez que não dispunham de tecnologia própria para competirem com as

similares importadas.

Após experimentar todo tipo de modernidade teórica, ditadas pelos papas da

auto-ajuda às empresas, representada pelos consultores, arautos da reengenharia

empresarial, neurolingüísticas e outros tantos, que com suas formulas milagrosas apenas

acordaram o Brasil para a necessidade de investirem em tecnologia, modernização de seu

parque industrial e requalificação de pessoal, com conseqüente eliminação de postos de

trabalho, o empresariado nacional viu-se em face, além disso, da necessidade de, também,

reduzir o custo com o seu pessoal produtivo.

Na busca de uma solução para o seu alto custo de produção, aqui, na

maioria das vezes, representado pelo custo dos encargos sociais e tributários, o Brasil

conheceu a terceirização, quando, geralmente, ex-empregados constituíam suas empresas

de prestação de serviços e iam prestar serviços, agora na forma de pequenos ou micro

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empresários, aos seus antigos empregadores. A terceirização veio a ser a mãe da

quarterização, como define Queiroz1:

Genericamente e simplesmente intitulada

‘quarterização’, é quando o fornecedor de serviços

terceirizado, seja ele prestador, vendedor ou profissional

autônomo ou ainda uma empresa, terceiriza algumas das

atividades em benefícios de seu tomador. Isso acontece

quando ocorre a contratação de ‘outros’ terceiros, que

passam a fornecer ou executar serviços para, ou, nas

instalações de um determinado tomador, o qual já tem sob

contratação, um terceiro, que contrata e assume a

responsabilidade pela ‘quarterização’.

Essa fórmula tem dado certo até um certo ponto, uma vez que ao

terceirizado ou quarterizado é repassado o ônus do custo dos encargos sociais e tributários

e estes, naturalmente, os repassam aos seus tomadores.

Na busca pela solução desse problema, chegamos aos serviços prestados

pelas Cooperativas de Trabalho, que, com suas isenções legais tributárias, têm se

apresentado como uma alternativa capaz de suprir as necessidades das empresas, de

produzir com qualidade por um custo compatível com o mercado de economia globalizada.

É nesse momento que iniciamos o desenvolvimento de nosso trabalho, que

envolveu, além das pesquisas bibliográficas julgadas necessárias, também pesquisas de

campo, embora empíricas, envolvendo as empresas tomadoras de serviços de Cooperativas

de Trabalho bem como as mesmas e seus Cooperados, numa tentativa de entender como se

desenvolve esse relacionamento, tanto no âmbito das empresas tomadoras quanto no

âmbito das empresas prestadoras de serviços, além de um enfoque nos próprios

cooperados.

O que desperta o nosso interesse pela pesquisa deste assunto são,

especificamente, as Cooperativas de Trabalho. O que nos motiva é saber quanto o advento

dessa modalidade de cooperativismo veio efetivamente trazer de economia de custos para

as empresas utilizadoras de mão-de-obra cooperativada e quanto de alternativas de trabalho

e emprego ela oferece para uma legião de trabalhadores que tiveram e tem tido os seus

1 QUEIROZ, Carlos Alberto R. S. de; Manual de Terceirização, São Paulo: Ed. STS, 1995, p.164.

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postos de trabalhos extintos pelo advento de novas tecnologias e sistemas de produção.

Importa-nos saber qual o comportamento dessas empresas socioeconômicas quando

chamadas a participarem do processo produtivo, mesmo que em escala reduzida à região

que nos propusemos pesquisar e estudar.

Chama-nos a atenção, também, o comportamento e a formação cooperativa

desses novos homens, como são chamados os novos convertidos ao cooperativismo.

Interessa-nos saber suas atitudes e seus pensamentos, enfocando a situação de trabalhador

cooperante, ou seja, a perspectiva de ser o próprio patrão e operando coletivamente. Estará

ele preparado psicologicamente para essa nova fase da vida ou, como os judeus do Êxodo,

sonham com as panelas de carne dos egípcios, representadas pelo postos de trabalho com

carteiras assinadas? Sobre este assunto, certamente, iremos falar adiante e faz parte da

pesquisa que levamos a efeito junto a cooperadores da indústria da construção civil e da

indústria calçadista.

Desenvolvemos nosso trabalho confiados na integridade moral dos

trabalhadores cooperados e seus dirigentes. A todos consideramos probos. Motiva-nos,

sim, saber se as Cooperativas de Trabalho são verdadeiramente geradoras de alternativas

de postos de trabalho e não se, também e apenas e tão somente, elas estão servindo aos

interesses nem sempre claros daqueles que, de uma ou de outra forma, querem se

beneficiar das benesses governamentais com que as cooperativas são, do nosso ponto de

vista, merecedoras. Não pregamos e nem estimulamos o conflito. Não obstante, fazemos

menção a opiniões de pessoas contrárias ao cooperativismo de trabalho, respeitando-lhes

os seus pontos-de-vista.

Acessoriamente objetivamos verificar como elas têm contribuído na criação

de novos postos de trabalho em substituição aos que têm sido extintos nas empresas.

Procuramos ajudar as pessoas que vierem a ter contato com este trabalho a

se situarem no seu contexto e compreenderem a lógica de sua organização. Procuramos

mostrar, ainda, como as atividades de uma Cooperativa de Trabalho, às vezes, se

justapõem e complementam as atividades de uma empresa normal, que não uma sociedade

cooperativa. Não obstante, sempre que possível, buscamos situar o leitor dentro da nossa

lógica de condução do trabalho.

No desenvolvimento de nosso trabalho, a pesquisa bibliográfica transcorreu,

de certa forma, tranqüila, uma vez que a maioria dos historiadores do cooperativismo

bebem da mesma fonte de pesquisa. O mesmo não pode ser dito das pesquisas de campo,

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que demandou entendimentos e trabalhos de convencimento das pessoas envolvidas com a

direção das cooperativas, bem como dos cooperados, que, de maneira geral, num primeiro

momento, se mostraram reticentes quanto a falar de suas atividades. Ao desenrolar das

atividades, no entanto, eles se mostraram bastante comunicativos e não se furtaram, em

geral, de responder as perguntas formuladas.

A pesquisa de campo se desenvolveu, num primeiro momento, com um

trabalho de contato com as Cooperativas de Trabalho e a descoberta de seus tomadores de

serviço. Num segundo momento, desenvolvemos os questionários, tanto das Cooperativas

quanto dos tomadores e, posteriormente, ao passo que recolhíamos os questionários,

complementávamos nosso trabalho com perguntas adicionais e ou colocações que os

mesmos faziam por ocasião do recolhimento dos materiais.

Entendemos que a hipótese formulada, quer seja, a economia de custos

realizada e o comportamento das empresas tomadoras e prestadoras desse serviços foram

contempladas e satisfeitas no seu desenvolvimento.

Enfim, apresentamos nossas conclusões parciais ao fecho de cada capítulo

na tentativa de demonstrar que os nossos objetivos se coadunam com o nosso esforço

metodológico.

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CAPÍTULO 1 UM POUCO DA HISTÓRIA DO COOPERATIVISMO

1.1 Considerações iniciais

As Sociedades Cooperativas, nas suas mais variadas formas de apresentação

e exploração de atividades econômicas, têm se defrontado, no Brasil, de maneira geral,

com seus detratores, com aqueles que, por não se identificarem com sua filosofia ou por

não verem a possibilidade de muitos ganharem um pouco mais, com poucos ganhando

menos, uma forma de se praticar justiça social neste país, ou mesmo por má fé, atendendo

a interesses escusos de determinados segmentos de atividades, distorcem a imagem do

cooperativismo, procurando mostrar essas entidades como subterfúgios de más intenções.

Porém, para aqueles que, com seriedade e retidão de propósitos, vivem ou

estudam o cooperativismo, nele conseguem enxergar uma verdadeira fonte de inspiração

ao bem viver, ao compartilhar, ao responsabilizar pelo todo e pelo que seja comum. No

momento em que o homem consegue deixar de lado o seu eu, para pensar e viver

coletivamente, no exercício da cooperação pura e simples, na medida que a força

manipuladora e individualista do capital, que a muitos tem feito se desviarem de seus

propósitos é subjugada em benefício do coletivo, o homem passa a viver o cooperativismo

em sua forma mais pura.

Entendemos ser importante observar que não vemos o capital como um mal

em si mesmo. O capital é necessário nos nossos dias, aliás, como em todos os outros dias

antes dos nossos, como necessário o são o ar que respiramos, a água que bebemos ou o

alimento que diariamente ingerimos. Nem é nosso propósito fazer digressões sobre o

capital. Apenas o vemos como mola propulsora do mundo a catapultar, na maioria das

vezes, interesses individuais ou de grupos bem organizados e articulados, sobre interesses

coletivos. E como falar sobre cooperativismo sem falar sobre capital é praticamente

impossível, deixamos aqui nossa impressão sobre o mesmo. Aliás, é bom que se frise, a

primeira cooperativa nasceu após um ano inteiro de economia, para se formar o capital

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necessário para a sua constituição e abertura, que fizeram um grupo de vinte e oito tecelões

na temporalmente distante (1844) Manchester, no bairro de Rochdale, distrito de

Lancashire, Inglaterra, batizada com o nome de Rochdale Equitable Pioneers/Society

Limited., ou Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale.

Certamente, aquelas pessoas, por mais que acreditassem em seus propósitos,

jamais poderiam vislumbrar a importância que teriam para a economia mundial no decorrer

dos séculos, podemos assim dizer, o advento do cooperativismo. O que fora idealizado

apenas com a pretensão de oferecer aos seus associados artigos básicos de primeira

necessidade e serviços outros de natureza econômico-social, veio a se transformar na boa

semente do cooperativismo. Mas, sobre isto, discutiremos no decorrer deste trabalho.

1.2 Estrutura do trabalho

Em decorrência dos objetivos que apresentamos, entendemos ser importante

separar este trabalho em cinco capítulos. Os capítulos 2 e 3 estão baseados na revisão da

literatura, quando procuramos, numa visitação histórica, entender as perspectivas das

primeiras pessoas que, voluntária ou involuntariamente, viriam provocar transformações de

vida e procedimentos de milhões de outras pessoas ao longo dos séculos.

O capítulo 4 é resultante de pesquisa e trabalho de campo, onde

apresentamos as cooperativas da região de Franca que atuam no segmento trabalho bem

como empresas que se utilizam da mão-de-obra oferecidas por estas entidades, além de

abordarmos certos aspectos relativos à terceirização da mão-de-obra. No desenvolvimento

dessas pesquisas, foi-nos reconfortante saber que muitas pessoas, mesmos que restritas ao

universo de nossa pesquisa, ainda sonham com aquele cooperativismo de princípios,

norteados na moral e na retidão de propósitos humanos.

No capítulo 5, abordamos, além do aspecto da terceirização e a atuação das

Cooperativas de Trabalho, com vistas a apresentar a redução de custos acarretada pelas

empresas que se utilizam das cooperativas dessa modalidade, os resultados das pesquisas

empíricas, embora de campo, levadas a efeito, bem como falamos a respeito das falsas

cooperativas que atuam no mercado.

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Concluímos este trabalho fazendo uma reflexão final sobre as possíveis

contribuições gerais e específicas que o mesmo pode oferecer, esperando ter, de alguma

forma, realizado alguma contribuição àqueles que se interessarem pelo tema.

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CAPÍTULO 2 AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO BRASIL

2.1 Conceituação

É certo que dificilmente conseguiríamos encontrar palavras que fossem

suficientes para descrever ou para definir o cooperativismo. Ousaríamos dizer que o

cooperativismo, pela sua face eminentemente prática, é a materialização da força na

fraqueza, é a riqueza que nasce da pobreza, é o fazer existir muito a partir do quase nada. É

a materialização da vontade. É a força da fé. É, sobretudo, a filosofia dando lugar à pratica.

Ou, quem sabe, é a coexistência nem sempre harmônica e nem sempre pacífica entre estas

duas grandes forças: filosofia cooperativista x prática do cooperativismo. Esta dificuldade

em definir o cooperativismo, ao invés de se apresentar como um problema, na verdade,

mostra a riqueza do tema em questão. Porém, como este trabalho não tem a pretensão ou a

preocupação de delimitar conceitos e tampouco definições últimas sobre cooperativas e

cooperativismo, vamos nos valer de conceitos preestabelecidos de autores consagrados, do

nosso ponto de vista, no conhecimento das filosofias e práticas cooperativistas.

Para dar continuidade ao relato histórico do cooperativismo e suas

evoluções, buscamos a definição conceitual do termo, entendendo-o suficiente para as

proposições desse trabalho:

Cooperativismo2: - Doutrina que tem por objetivo a

solução dos problemas sociais por meio da criação de

comunidades de cooperação. Essas comunidades seriam

formadas por indivíduos livres, que se encarregariam da

gestão da produção e participariam igualitariamente dos

bens produzidos em comum. Sua realização prática prevê

a criação de Cooperativas de Produção, Consumo e

Crédito.

2SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia, 1987.

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O cooperativismo atual representa uma alternativa

entre o capitalismo e o socialismo, mas sua origem está

nas propostas dos chamados socialistas utópicos (...).

Mais tarde, em lugar de conteúdo socialista, a

cooperativa adquiriu características mais atenuadas de

reforma social, nas formulações de Beatrice Potter Webb,

Luigi Luzzatti e Charles Gide.

Ou de outro modo: grupo de pessoas que trabalham em comum, sem

objetivo de lucro, e não sujeitas à falência.

2.2 Cooperativismo: gênese e evolução

Para introduzir o leitor neste trabalho, que tem como tema o cooperativismo

no contexto socioeconômico da região de Franca, é inevitável remeter-nos ao vocábulo que

origina o termo cooperativismo; - cooperação – termo que a literatura pertinente confirma

a existência nas sociedades humanas desde eras remotas. Significando necessidade e meio

de sobrevivência para aqueles que, trabalhando reciprocamente, socializando idéias

individuais, esforçam-se continuamente para que ações coletivas configurem meios

capazes de alcançar propósitos e objetivos.

A concepção dada ao vocábulo cooperação não é prática dos nossos dias.

Cooperar e colaborar têm o mesmo significado3.

Quando revisitamos a história, identificamos manifestações do espírito de

cooperação vinculadas à condição humana.

3Cooperar: operar ou obrar simultaneamente: trabalhar em comum: colaborar. In FERREIRA, Aurélio

Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988. p 177.

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Em tempos e espaços diferentes, a cooperação sempre existiu nas

sociedades humanas como resultante de necessidades de sobrevivência, configurada como

agrupamento de pessoas que, trabalhando reciprocamente, consensuando idéias e agindo

num esforço coletivo e continuado, realizam seus objetivos.

A dinâmica da vida indígena, nos primórdios do nosso país, revela a prática

de dormitórios comuns e a caça – resultado de ação participativa – transforma-se em

alimentação para a tribo, é exemplo de cooperação mútua. Instigados pela lei da

sobrevivência, a tribo era mantida e evoluía na direção almejada por eles, que unidos,

partícipes, cooperadores entre si, definiam o modo de vida da raça indígena.

Outro exemplo pleno do sentimento de cooperação pode ser observado nas

tréguas nos campos de batalha, quando o soldado solícito se apressa em socorrer o

companheiro ferido em combate.

Assim, pode-se aferir que o sentimento de cooperação é próprio do humano

e se desenvolve no curso dos séculos da existência social consciente da humanidade,

sedimentado pelos milhares de anos de existência, penetrando indelevelmente no domínio

da vida econômica.

Em Benato4, as formas de associações econômicas estruturadas podem ter

inspirado as modernas cooperativas. Tiveram suas origens na antigüidade: os babilônios

teriam organizado associações de arrendamento de terras; os primeiros cristãos, com seus

ágapes, criaram uma forma primitiva de cooperativa de consumidores; os gregos e

romanos instituíram sociedades funerárias e de seguros para os pequenos artesãos sobre a

base de auxílio mútuo: “As organizações econômicas de mosteiros, onde a produção e o

consumo eram comuns, o que economicamente é caracterizado em uma espécie de

cooperativa, foram criadas na Idade Média pelos povos cristãos.”

Na agricultura, o labor se desenvolveu desde os primórdios, fundamentado

pelos preceitos cooperativos praticados pelos povos germânicos. A economia coletiva, o

espaço e a aplicação do espírito coletivo de associação podem ter sua origem no modo de

criação comum do gado, da utilização comunitária das pastagens, da floresta e do grupo de

pescadores organizados em associações de trabalho, nos moldes daquelas existentes nos

dias de hoje, e em vários países. Segundo o autor, foram descobertos vestígios de

camponeses agrupados, trabalhando na transformação do leite desde o princípio da Idade

Média nos Alpes suíços, italianos, franceses, bem como na Inglaterra. Na Armênia, uma

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forma de leiteira cooperativa, que teve origens nos tempos pré-históricos, funciona ainda

hoje.

Assim, é possível depreender que os modelos de cooperativas modernas

podem representar resultado das experiências implementadas por cooperações antigas,

apenas com formas e objetos modificados para atender às necessidades da vida moderna,

contextualizados nos meios de produção capitalista que obrigam o trabalhador a se unir

para enfrentar problemas de mercado.

O marco histórico do movimento cooperativista formal data de 28 de

outubro de 1844, em Rochdale, Inglaterra, quando 27 homens e 1 mulher constituíram a

cooperativa denominada Rochdale Equitable Pioneers Society Limited. Cada cooperado

contribuiu com £ 1 (uma libra), e com esse capital abriram um armazém para fornecimento

dos alimentos. Calcularam que comprando em quantidades maiores, pagariam mais barato,

podendo assim fazer economia e não depender de outros armazéns que cobravam-lhes

muito caro.

A partir do exemplo de Rochdale, outros tipos de cooperativas começaram a

surgir pelo mundo. A título de ilustração, elencamos alguns exemplos, situados

temporalmente5:

1817 – William King organiza a primeira cooperativa de

consumo;

1820 – Organizada a Liga para a Propaganda da

Cooperação;

1830 – Contabilizado um total de 300 cooperativas:

1834 – Criada a Associação Lionesa An Commerce

Veridique, em Lyon - França;

1844 – Advento das primeiras cooperativas de crédito, na

cidade de Delitzsch;

1847 – 1848 – Aparecem as Reiffei seneanas –

Cooperativas de Crédito;

1864 – Criadas as Cooperativas de Crédito, denominadas

Bancos Populares, na Itália;

4 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 121. 5 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 121 et seq.

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1883 – Wilhelm Haas funde as cooperativas de Reiffeisen-

Schulze/Delitzsch, na Alemanha.

A partir de 1883, outros pioneiros formaram outras cooperativas:

Lammenais, Buchez, Saint Simon, Fourier, Helleputte, são alguns deles.

No Brasil, a primeira cooperativa registrada oficialmente surgiu em 1891,

na cidade de Limeira, São Paulo – A Cooperativa dos Empregados da Companhia

Telefônica.

1894 – Criada a Cooperativa Militar de consumo no

Distrito Federal;

1895 – Criada a Cooperativa de Consumo de Camaragibe;

1897 – Criada a Cooperativa dos Empregados da

Companhia Paulista de Estradas de Ferro, em Campinas,

São Paulo;

1932 – Primeira Lei Orgânica do Cooperativismo,

regulamentada pelo decreto n.º 22.239, de 19 de

dezembro;

1946 – Somam 810 mil cooperativas no mundo, reunindo

140 milhões de associados;

1962 – Cerca de 1/3 da população mundial estava

associada em cooperativas.

No Brasil, o cooperativismo começa a ser imprimido, principalmente, no

meio rural no final do século XIX. Os imigrantes alemães, italianos e japoneses que

ocuparam as regiões sul e sudeste do país contribuíram sobremaneira na consolidação do

cooperativismo por aqui.

Hoje, no Brasil, a prática cooperativista é regulamentada por leis especiais e

subordinada à Secretaria Nacional de Cooperativismo – Senacoop – órgão do Ministério da

Agricultura.

Em âmbito mundial, a entidade que coordena o movimento cooperativista é

a Aliança Cooperativa Internacional (ACI), com sede na cidade de Genebra, Suíça. Essa

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associação não-governamental foi criada em 1985, tem por objetivo reunir, representar e

apoiar as cooperativas e suas correspondentes organizações.

Objetiva, ainda, a integração, a autonomia e o desenvolvimento do

cooperativismo. A ACI, pela primeira vez na sua história, é comandada por um

cooperativista não europeu. O brasileiro Roberto Rodrigues foi o primeiro homem da

América Latina a ocupar tão importante cargo no sistema cooperativista.

No contexto do cooperativismo americano, essa representação é feita pela

Organização das Cooperativas da América - OCA – que, fundada em 1963, integra as

representações de vinte países, inclusive o Brasil.

A representação do sistema cooperativista brasileiro cabe à Organização das

Cooperativas Brasileiras. A OCB é o órgão máximo do cooperativismo nacional e sua

função é defender os interesses das cooperativas perante o Estado.

A centralidade temática desse trabalho, o cooperativismo, é caracterizada

pela complexidade e extensão. É tratada, na maioria das vezes, por estudiosos que se

prendem à preocupação em explicar o que a doutrina cooperativista defende; o porquê da

defesa; quais os instrumentos analíticos que usa; e a contribuição da prática cooperativista

na interpretação da realidade socioeconômica, numa perspectiva de correção ou mudança

dessa realidade, ainda é matéria escassa nas obras publicadas que tratam do tema.

Assim, contrapor estudos que observam, decompõem, analisam,

reconstroem e explicam a atividade cooperativa, é tarefa que demanda extensas pesquisas

bibliográficas, reconhecendo ser urgentes e necessárias para a compreensão do papel do

cooperativismo no contexto das diversas economias.

O ideal associativista é forjado no início do século passado, a partir das

tentativas da classe trabalhadora em se livrar das opressões estatal e empresarial, voltadas

para a resolução dos graves problemas socioeconômicos e inspirados pela corrente liberal

dos socialistas utópicos.

Nessa época, generalizou-se a tradição de liberdade propagada por

Descartes, acreditando-se na possibilidade da atuação da vontade humana sobre a evolução

econômica, de tal modo que se poderia corrigi-la ou reformá-la. Àquele tempo, o segmento

intelectualizado difundia os ideais de justiça e fraternidade, embora a esperança na volta à

natureza (metafísica), tenha qualificado uma corrente de diversos pensadores de oposição

aos ideais conseqüentes da Revolução Francesa. O socialismo utópico reflete, ainda, outras

correntes de pensamento da época: o romantismo, a democracia e o naturalismo.

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Neste cenário intelectual, somado às mais variadas conseqüências do

liberalismo econômico do início do século XIX, emerge o cooperativismo, configurando a

utopia e o desejo da classe trabalhadora em superar a miséria pela atitude do auxílio mútuo.

Dentre os socialistas utópicos, que de forma decisiva influenciaram o

cooperativismo, podem-se destacar Owen, Fourier, Buchez e Blanc, conforme descrição da

professora Pinho6, a saber:

Owen considera que o homem é resultado de seu meio

social: não é bom, nem mau por natureza. Para modificá-

lo, torna-se necessário modificar o meio social, mas de

forma pacífica, gradual e moderada, a fim de que

nenhuma parte do corpo político e nenhum indivíduo

sofram com a mudança...

Robert Owen (1771-1858) – de família de artesãos,

nasceu em Newton (País de Gales). Encarregado de

dirigir uma fábrica de fiação, introduziu várias inovações,

destacando-se, de tal forma, que dela se tornou co-

proprietário (firma Charlton Twist Co, em Manchester).

Casou-se com a filha do sócio (Dale). Com a compra de

uma fiação em New Lanarck (Escócia), pela sociedade,

coube a Owen dirigi-la. Realizou tão importantes obra

sociais que New Lanarck tornou-se centro de visitação e

de admiração da Europa, mas seu exemplo não era

imitado. E Owen acabou deixando a sociedade porque

seus sócios achavam suas inovações muito onerosas.

Para Owen, o lucro e a concorrência são os principais responsáveis pelas

injustiças sociais. O lucro supera o preço de custo, nesse sentido, representa perigo

permanente e causa principal das crises de superprodução ou de subconsumo. Na sua

experiência singular, Owen implantou benefícios sociais para os trabalhadores, debateu a

grande questão da distribuição de rendas nas sociedades humanas e defendeu a educação

como meio da promoção do homem.

6 PINHO, Diva Benevides, O Pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro, São Paulo: CNPq,

1982. p. 23.

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François Marie Charles Fourier7 (1772 – 1837) – nasceu

em Besançon (França), filho de um negociante de tecidos.

Perdeu a herança que recebera de seu pai, quando Lyon

foi cercada pelas tropas da Convenção. Condenado à

morte, livrou-se com a queda do regime. Engajou-se no

serviço militar, mas deu baixa por motivo de saúde,

passando a trabalhar em um escritório comercial. Depois

montou um escritório de corretagem. Mais tarde recebeu

herança materna, o que lhe permitiu dedicar-se, por uns

tempos, aos trabalhos intelectuais. Tentou arranjar

capitalista para financiar a prática de suas idéias

associativistas, mas nada conseguiu. Solteirão de hábitos

rígidos, foi mutas vezes interpretado como maníaco.

Parecia não se preocupar com os acontecimentos

políticos da França, dedicando todas as horas de lazer à

reflexão sobre os problemas econômicos e sociais de seu

tempo.

Fourier imagina resolver os males sociais através de

falanstérios, unidades auto-suficientes que permitiriam

reformar toda a sociedade (...) é a peça principal da

reforma do meio social: substituir a onerosa e mesquinha

unidade doméstica ou familiar por grandes serviços

coletivos, (...), cria um ambiente de convívio espontâneo

entre os ricos e pobres, substitui a competição pela

cooperação, institui um microcosmo auto suficiente, etc...

Em Fourier há uma inter-relação entre os interesses do trabalhador, do

capitalista e do consumidor, de forma que cada um possa acumular em sua pessoa, todos os

interesses diversos.

As normas buchezianas, fundamentadas na premissa da constituição de um

capital indivisível e individual da propriedade coletiva dos associados e da valorização

moral das sociedades, estão baseadas na tese defendida por outro importante socialista

7 PINHO, Diva Benevides. Op. Cit. p. 25.

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utópico – Buchez – que defende a associação cooperativa de produtores livres, de forma

pacífica e sem exploração.

Philippe Joseph Benjamin Buchez8 (1796 – 1865) –

jovem ainda, foi condenado à morte por haver sido um

dos fundadores da “Charbonnerie”, na qualidade de

empregado da administração parisiense. Perdoado por ter

pouca idade, dedicou-se aos estudos de Medicina.

Profundamente católico, colaborador do jornal

sansimoniano “Producteur” (1824), autor da História da

Revolução francesa (co-autoria com Roux) foi também

membro e Presidente da Assembléia Francesa.

Fundamentalmente, as cooperativas representariam a reunião de operários

de uma determinada categoria para colocar em comum suas poupanças, obter empréstimos,

produzir em comum, assegurar a todos igual salário e reunir as receitas líquidas em um

fundo comum.

O associativismo de Buchez traz, como marco, o conceito de capital social

inalienável, o que, segundo ele, garantiria a criação de um futuro melhor para a classe

operária. As cooperativas poderiam contratar mão-de-obra de não sócios, pelo prazo de

um ano, e, no final desse período, ficariam obrigadas a admiti-los no quadro de sócios, na

medida do necessário.

Finalmente, Louis Blanc, pensador socialista que tratou da questão social

como sinônimo de questão operária, defendia a intervenção do Estado como condição

necessária para que a associação operária assumisse a condição de transformadora do meio

socioeconômico.

Louis Blanc9 (1812 – 1882) – historiador, jornalista,

orador e político (colocado em evidência pela Revolução

de 1848).

Alguns autores o qualificam de agitador, que

conduziu os operários à Revolução de 1848 e imprimiu à

“questão social” o matiz de questão operária – caráter

8 PINHO, Diva Benevides. Op.cit. p. 27. 9 PINHO, Diva Benevides. Op.cit. p.29

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que muitos consideram unilateral, mas que se conserva

desde esse movimento revolucionário.

Exigia Blanc ampla intervenção do Estado, para

que a associação operária pudesse modificar o meio

sócio-econômico. Condenou a livre - concorrência,

principal responsável pelos males e injustiças sociais,

nociva aos operários e também à burguesia. A livre -

concorrência determinou a separação entre os detentores

dos instrumentos de produção e aqueles que acionam

esses instrumentos com o seu trabalho. Daí, a necessidade

de criação de associações em que cada um seria co-

proprietário dos instrumentos de produção: o atelier

social ou a oficina social, composta de trabalhadores do

mesmo ramo de produção e de moralidade indiscutível.

Blanc entendia ser a livre concorrência a principal responsável pelas

injustiças sociais, porque determina a separação entre os proprietários dos meios de

produção e aqueles que operam esses instrumentos através de sua força de trabalho. O

meio de equacionar esta questão seria a criação do “atelier social ou oficina social”,

empreendimento em que cada sócio se torna co-proprietário dos instrumentos de produção,

compostos por trabalhadores do mesmo ramo de produção e com os mesmos valores

morais.

Em dezembro de 1843, data em que os vinte e oito tecelões do distrito de

Lancashire, na Inglaterra, reuniram-se para discutir e procurar possíveis soluções para os

seus problemas de sobrevivência e acabaram decidindo pela fundação de um armazém

cooperativo, ficou conhecida como o marco histórico do movimento cooperativista e os

objetivos que estimularam a constituição da cooperativa dos tecelões de Rochdale

passaram, ao longo dos anos, a serem fundidos e sistematizados em um contexto de

doutrina social.

A história nos revela que o modelo de cooperativa de consumo de Rochdale

é entendido pelos estudiosos do cooperativismo como símbolo do cooperativismo,

inclusive, permanecendo, como normas, aquelas elaboradas pelos vinte e oito tecelões,

para muitas experiências do mundo moderno.

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O prédio ocupado pelos pioneiros, espaço onde iniciaram suas operações

cooperativistas de consumo, passou a abrigar o Museu da Cooperação, desde 1931.

Na evolução do planejamento cooperativo, desde os primórdios, há uma

difusão maior de contribuições francesas e inglesas, quer na fase precursora, ou na fase de

consolidação do cooperativismo rochdaleano.

Os pensadores desses dois países preocuparam-se com estudos

especulativos e doutrinários, sobre o tema, até a primeira metade do século XIX. Mais

recentemente, autores alemães e escandinavos imprimem um cunho mais pragmático em

suas obras.

O pensamento cooperativo na sua evolução, apresenta grande influência da

Escola de Nimes, de acordo com Pinho (1982, p. 33):

Surgiu casualmente por volta de 1886, em Nimes, pequena cidade ao sul da

França, onde algumas pessoas se reuniam com Charles Gide, jovem professor

universitário de Economia e Política, para discutirem problemas econômicos.

Charles Gide formula a teoria fundamentada na idéia de um cooperativismo

que tem no homem o seu maior objetivo. Para ele, o homem não é apenas o trabalhador,

mas também o consumidor, portanto, o cooperativismo não é exclusivo de trabalhadores e

sim, um movimento para expandir-se e atingir todas as camadas sociais.

Em Gide10, a união de consumidores em cooperativas culminaria com a

absorção de todas as atividades econômicas em três etapas sucessivas:

Constituição de cooperativas de consumo para a

venda de produtos alimentícios, vestimentas, artigo do

lar, etc...;

Do consumo passar-se-ia à fabricação de todas as

mercadorias distribuídas pela cooperativa de

consumo;

Buscar a exploração agrícola como instrumento de

abastecimento às cooperativas de consumo.

10 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 21.

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Verticalizando assim a economia, o pensador Gide vislumbrava a obtenção

do preço justo sem a interferência do lucro, do dividendo e da transferência de

propriedade, variantes responsáveis pelos altos custos do bem ou produto.

O jovem professor de Economia Política da Universidade da França,

Charles Gide, divulgou teses definitivas para o movimento cooperativista. Defendeu a

idéia de que as raízes do cooperativismo são devidas ao pensamento de Fourier; que o seu

objetivo era a abolição da luta de classes, pela via da supressão do salariado, dos

intermediários do comércio e dos padrões de produção.

O II Congresso das Cooperativas de Consumo, realizado em Lyon, na

França, em 1886, aprovou as “doze virtudes” da doutrina cooperativista, enumeradas por

Gide11:

1 – Viver melhor – condição possível se a solução dos

problemas é coletiva;

2– Pagar a dinheiro – para evitar o endividamento que

gera dependência;

3– Poupar sem sofrimento – é prioritário o atendimento

das necessidades dos cooperados, antes de definir

como aplicar as sobras;

4- Suprimir os parasitas – eliminando atravessadores na

compra e venda de produtos e serviços;

5– Combater o alcoolismo – preocupação com a saúde

dos cooperados, incentivando o enfrentamento da

realidade com coragem, evitando os vícios;

6– Integrar as mulheres nas questões sociais –

valorização do conhecimento feminino acerca do

consumo, conseqüência da vivência doméstica;

7– Educar economicamente o povo – a educação como

valor para o desenvolvimento humano;

8– Facilitar a todos o acesso à propriedade através da

união de esforços;

11 PINHO, Diva Benevides, O pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro, São Paulo: CNPq,

1982. p. 33-34-35-36.

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9– Reconstituir uma propriedade coletiva – forma

estratégica para o acesso à propriedade é investir em

um patrimônio coletivo

10– Estabelecer o justo preço – os preços são definidos

sem intenção especuladora; manter remuneração

conveniente para todo trabalhador cooperado;

11– Eliminar o lucro capitalista – materializar a

satisfação das necessidades do homem e não a

obtenção de lucros;

12– Abolir os conflitos – consciência de que todo

associado é dono e usuário da cooperativa.

As diretrizes cooperativistas divulgadas por Gide e aprovadas no II

Congresso das Cooperativas de Consumo, em 1886, pelos participantes, associados,

trabalhadores, professores e estudantes, sintetizam a doutrina cooperativista que

fundamenta e ampara os empreendedores cooperativistas até os nossos dias.

Os Pioneiros de Rochdale representam a síntese de perseverança e sucesso

na aplicação do conceito cooperar. Também influenciaram o desenvolvimento do

pensamento cooperativo da Escola de Nimes. Contudo, não podemos deixar de agregar a

importância da Aliança Cooperativa Internacional – ACI – neste capítulo.

O I Congresso Internacional de Cooperativismo, realizado em Londres, em

1895, fundou a Aliança Cooperativa Internacional – ACI . Desde a sua fundação, que, em

1995, comemorou um século de existência, a ACI reúne associados em todo o mundo para

debaterem sobre importantes questões para o fortalecimento da prática cooperativista.

Reunidos em congressos mundiais, adeptos do associativismo refletem sobre objetivos das

organizações, criam e sistematizam normas, princípios etc.

Todos os modelos cooperativistas, em princípio, obedecem às normas

fixadas pelos pioneiros de Rochdale, que têm a primeira redação datada de 1844, com

modificações posteriores. Hoje, as linhas orientadoras da prática cooperativista podem ser

entendidas assim12:

12 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 24, 25.

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Adesão voluntária e livre;

Gestão democrática;

Participação econômica dos membros;

Autonomia e independência;

Educação, formação e informação;

Intercooperação;

Interesse pela comunidade

O ideal cooperativista está fundado em valores de ajuda mútua,

solidariedade, democracia e participação, traduzidos por princípios tradicionais que

configuram a sociedade cooperativa, quais sejam: o homem é o principal elemento, é

básico e essencial na doutrina cooperativista. Esse homem é sempre sujeito e agente nessa

sociedade. A democracia é exercida pelo voto em assembléia; o controle é essencialmente

dos cooperados que não podem transferir suas cotas a terceiros; não há intermediários; os

associados têm direito aos resultados proporcionalmente às operações; é uma sociedade

aberta a inserção de novos cooperados; valoriza o trabalhador enquanto produtor de bens e

serviços e enquanto ser humano; investe na política de preços justos; defende a integração

entre cooperativas diversas e, finalmente, o princípio da educação permanente tem como

objetivo preparar o homem para a vida e para o exercício da cidadania, capacitando-o para

atuação no mercado com visão empresarial e competitiva.

A adesão e entendimento da doutrina cooperativista nunca é imposta. O

exercício coletivo das normas e preceitos favorecem a absorção do ideário humanista, que

prima pela liberdade econômica, social e democrática.

Enquanto doutrina econômica voltada para o desenvolvimento do ser

humano, das famílias e da comunidade, o cooperativismo destaca fundamentos humanistas,

de liberdade, de igualdade, de solidariedade e de racionalidade.

Coerentemente com a doutrina, o cooperativismo adotou, como imagem

simbólica, a figura composta por um círculo que abraça dois pinheirinhos, numa alusão à

união e à coesão do movimento. O pinheiro representa a imortalidade - capacidade de

sobrevivência em terras inférteis e a fecundidade pela facilidade em multiplicar-se

continuamente, além da imagem de ascendência, pois se projetam para o alto, procurando

subir cada vez mais. O círculo é figura representativa do movimento eterno, não tem

horizonte final, sem começo nem fim.

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Quanto às cores, pode-se resgatar o significado do verde como símbolo da

natureza e o amarelo ouro nos remete ao sol, fonte de energia e calor, retrata o princípio

vital da natureza, aconchegando o movimento ininterrupto da vida, colocada como

centralidade da evolução do homem.

O Congresso da Aliança Cooperativa Internacional13 de 1923 instituiu mais

um símbolo cooperativista, adotando o primeiro sábado de julho de cada ano, como o Dia

Internacional da Cooperação, data em que se comemora a confraternização de todos os

povos ligados ao cooperativismo.

13 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 25.

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CAPÍTULO 3 AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NA REGIÃO DE FRANCA

3.1 Cooperativismo no Brasil

A Organização das Cooperativas Brasileiras, com base em dados

estatísticos de 1996, afirma que existem, no Brasil, cerca de 4000 cooperativas

administradas por aproximadamente 3 milhões de cooperantes, formadas para atender as

mais diversas necessidades e com atuação nos mais variados campos de atividade. A

seguir, citamos apenas as mais representativas14:

Cooperativas do Setor Agropecuário: são formadas por produtores rurais que buscam o

aperfeiçoamento do processo de produção; obtêm melhores preços para os seus

produtos, sem a intervenção do atravessador, vendem diretamente ao consumidor;

Cooperativas de Crédito: são aquelas que se propõem a conceder empréstimos aos seus

associados a juros mais baixos do que aqueles praticados pelas instituições financeiras

oficiais;

Cooperativas Educacionais: são constituídas por pais, alunos e professores que na

qualidade de associados formam escolas e centros de treinamento para terem acesso a

melhores condições de ensino;

Cooperativas de Trabalho: reúnem diversos profissionais para prestação de serviços a

terceiros.

A demografia cooperativista brasileira mostra a predominância desse tipo de

cooperativa nas regiões sul e sudeste. Até 1965, os trabalhadores cooperados

caracterizavam-se por mão-de-obra semi-qualificada ou operários braçais: transportadores

de carga, motoristas de caminhão, artesãos, pescadores artesanais e trabalhadores em

edifícios.

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A partir de 1965, é possível identificar a presença de outros profissionais,

inclusive técnicos especializados que se reuniram em cooperativas, buscando solucionar os

principais problemas do mercado de trabalho.

Pode-se exemplificar o modelo de cooperativa de trabalho pela forte

presença das UNIMED’s – Cooperativa de Serviços Médicos e Hospitalares, que, desde

1967, quando foi realizada a primeira experiência, em Santos/SP, vem obtendo sucesso

empresarial, reunindo grande número de profissionais da área da saúde e ampliando,

sistematicamente, a abrangência e número de usuários.

Com as transformações do mercado de trabalho, conseqüência de fatores

como globalização, a descentralização produtiva, a informática e a automação dos meios

de produção, verifica-se uma explosão das taxas de desemprego estrutural, da eliminação

de inúmeras profissões em decorrência do incremento tecnológico, principalmente. A

tendência é aumentar o índice de natalidade das cooperativas de trabalho, como alternativa

de emprego produtivo e requalificação do trabalhador.

Interessante observar que, na área rural, a cooperativa de trabalho não tem

conseguido mobilizar a população, não obstante a sua importância para a melhoria da

qualidade de vida dos trabalhadores volantes, a partir do pressuposto da ajuda entre

cooperativistas. Pinho15 enumera dois fatores responsáveis pelo número reduzido de

cooperativas de trabalho na zona rural:

Primeiro, a instabilidade geográfica dos

trabalhadores volantes, muitas vezes, determinada pelo

próprio tipo de trabalho que define sua localização para

atender as demandas das safras e entressafras, somadas

às adversidades climáticas dificultam a inserção em

qualquer tipo de associação; em segundo lugar, a não

qualificação da mão-de-obra exige um processo de

mudança programada capaz de criar condições de auto-

sustentação das cooperativas de trabalho.

14 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo – 1994. p. 103 et seq. 15 PINHO, Diva Benevides, O Pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro, São Paulo: CNPq,

1982. p. 146.

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Alexandre Nery de Oliveira16, eminente jurista, Juiz do Trabalho e

Presidente da 1a. Junta de Conciliação e Julgamento de Brasília/DF, à época, (1998) assim

se posiciona quanto a definição de Cooperativas de Trabalho:

As Cooperativas de Trabalho detêm, como

associados – cooperativados, trabalhadores que,

dispensando a intervenção de terceiro qualificados como

patrões, dispõem-se a contratar determinados serviços

relacionados a suas profissões ou ofícios, em razão do

conjunto, seja por trabalho de todos, seja por trabalho de

grupos, em prol do bem comum geral. Neste sentido, seria

efetivamente ilógico imaginarmos a caracterização dos

associados – cooperativados como empregados da

cooperativa, eis que, numa caracterização social de

empresa, é exatamente aquela em que os patrões são os

próprios trabalhadores, em repartição dos benefícios e

dos prejuízos da associação, em modo similar às

sociedades comerciais, mas, em distinção a estas,

baseando-se o produto aferido no próprio trabalhador e

não no trabalho de outros (empregados).

O próprio Aurélio, limitando-se ao enfoque do verbete, salienta ser

cooperativa a “sociedade ou empresa constituída por membros de determinado grupo

econômico ou social, e que objetiva desempenhar, em benefício comum, determinada

atividade econômica.

• Cooperativas de Produção : são aquelas que se propõem a organizar a produção dos

bens, tarefas que não podem prescindir da participação dos cooperantes, em todo

processo administrativo, técnico e funcional da empresa.

• Cooperativas de Saúde: O atendimento pertinente à área da saúde é valorizado por um

grupo de cooperados que também pode ser formado por usuários desses serviços, tendo

como meta prestar atendimento à população a preços mais acessíveis que aqueles

oferecidos pela iniciativa privada.

16 Revista Ponto de Encontro, in Cooperativas de Trabalho, Abril/Maio 1998, p. 4.

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• Cooperativas de Consumo: são aquelas organizadas para garantir melhores condições

de compras de alimentos, roupas, medicamentos etc...

A análise sobre sobrevivência e prosperidade dessa modalidade de

cooperação tem demonstrado que, no Brasil, o índice de mortalidade dessas associações é

elevado, acompanhado pelas cooperativas do setor de crédito cooperativo. As cooperativas

brasileiras de consumo apresentaram certa prosperidade até o início da década de 60.

Declinaram logo em seguida, em conseqüência da supressão do benefício tributário de que

gozavam, representado pela isenção do ICM; à rápida descapitalização provocada pela

inflação acentuada nos períodos entre 63 a 79 e 79 a 81; e, mais recentemente, a grande

disseminação das grandes redes de supermercados que operam com grandes recursos

financeiros, modernas técnicas de marketing, racionalização administrativa e linhas

especiais de crédito, tornando a concorrência com as cooperativas de consumo,

insuportável.

Cooperativas Habitacionais: organizadas para viabilizar a compra ou construção da

casa própria, a estrutura cooperativista habitacional representa um segmento estanque

no contexto cooperativista brasileiro, graças ao seu caráter transitório, de duração

limitada, já que as experiências vividas até aqui, na sua grande maioria, focam a sua

ação até a entrega das chaves das unidades habitacionais construídas. Sua finalidade

seria preenchida, se após o recebimento da unidade, as cooperativas permanecessem

com vistas a administrar os conjuntos habitacionais, a organizar a vida comunitária de

seus moradores no que diz respeito ao consumo, lazer educativo, ajuda solidária e

outros.

Assim, essas cooperativas têm deixado de lado o caráter educativo no

sentido coletivo dos seus associados.

Criadas com base na legislação que reformulou a organização bancária e

instituiu o BNH – Banco Nacional da Habitação – em 1964 - as cooperativas habitacionais

vivem na dependência de recursos financeiros para que possam executar suas metas, além

de terem, de alguma forma, de se ajustar para atender a pressupostos das políticas públicas

de habitação. Em média, mantêm suas atividades no período que varia entre dois e quatro

anos.

Cooperativas de Mineradores: torna sócios trabalhadores que executavam a extração, a

manufatura e a comercialização de minérios, garantindo-lhes alternativa de trabalho

autônomo.

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Cooperativas de Prestação de Serviços : caracterizadas por aquelas que prestam as mais

diversas formas de serviços de acordo com o interesse e a necessidade dos seus

associados.

Esses campos de aplicação e atuação do ideário cooperativista,

apresentados anteriormente, demonstram a absorção das diretrizes determinantes da

doutrina em áreas específicas. No entanto, existem associações cooperativistas

denominadas especiais, ou seja aquelas que podem manter, no seu quadro de associados,

crianças, adolescentes, portadores de deficiências ou outros grupos que precisam ser

tutelados e têm como meta o desenvolvimento e a integração social de seus associados.

No Brasil dos anos 50, aparecem as primeiras iniciativas de coesão e

representação necessárias à aglutinação de interesses comuns com a constituição da

UNASCO – União Nacional das Associações Cooperativas. No entanto, divergências

entre grupos internos da UNASCO, resultaram na criação da ABCOOP – Associação

Brasileira de Cooperativas.

Essa divisão foi mantida até 1969, quando representantes governamentais

empenharam-se na instalação de diálogo em todos os níveis e em todo país, visando à

integralização das duas correntes representadas pelas duas entidades. O resultado desse

movimento está na criação da OCB e OCEs – Organização das Cooperativas Brasileiras

e Organização das Cooperativas Estaduais, respectivamente. A OCB tem como missão

reunir todas as tendências cooperativistas, no desempenho de suas atribuições; foi

concretizada oficialmente durante o VI Congresso de Cooperativismo, realizado entre 2 e

6 de dezembro de 1969, em Belo Horizonte/MG.

A Lei 5 764 de dezembro de 1971 implanta juridicamente o Sistema OCB,

sua sede definitiva em Brasília foi instalada em meados de 1972. A referida Lei estabelece

que vinte pessoas ou mais podem constituir uma cooperativa singular em qualquer

segmento econômico, ou seja, em qualquer atividade humana. Três ou mais cooperativas

singulares podem constituir uma central ou uma federação de cooperativas, entendidas

como de segundo grau, nas quais cada cooperativa singular tem um voto, independente do

capital integralizado, admitindo-se o voto proporcional.

Todas as cooperativas singulares, centrais, federações e confederações têm

direito a voto e elegem a diretoria e o conselho fiscal da Organização das Cooperativas do

Estado – OCE -, considerando-se o voto proporcional na eleição. Cabe a OCE representar

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todos os segmentos do cooperativismo no seu Estado e prestar serviços às filiadas, de

acordo com os interesses e necessidades das mesmas.

As Organizações das Cooperativas do Estado, OCEs, órgãos de

representação do cooperativismo estadual, devem ser filiadas à Organização das

Cooperativas Brasileiras – OCB -, órgão técnico consultivo, sem finalidade lucrativa,

estruturado pela Lei n.º 5 764/71, com os seguintes atribuições17:

manter a neutralidade política e indiscriminação racial, religiosa e social;

integrar todos os ramos das atividades cooperativistas;

manter registro de todas as sociedades cooperativas que integram a OCB;

manter serviços de assistência geral ao sistema cooperativista quanto à

estrutura social, aos métodos operacionais e à orientação jurídica, através de

pareceres e recomendações;

denunciar práticas nocivas ao desenvolvimento cooperativista;

opinar em processos que lhe sejam encaminhados;

organizar setores consultivos especializados para atender às demandas do

cooperativismo;

fixar política da organização com base nas proposições de seus órgãos

técnicos;

exercer outras atividades inerentes à sua condição de órgão representativo e

de defesa do sistema cooperativista e;

manter relações de integração com as entidades congêneres do exterior e

suas cooperativas.

A OCB coordena e presta serviços no âmbito nacional, visando apoiar o

movimento cooperativista nas seguintes áreas18:

Banco de Dados – dispõe de informações básicas para defesa dos interesses

da base;

Educação/Capacitação Cooperativista – através de processos reflexivos

permanentes que levem a decisões conscientes e democráticas;

Treinamento – busca capacitação profissional para todos os envolvidos no

Sistema Brasileiro de Cooperativismo;

17 PINHO, Diva Benevides – O Pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro – São Paulo: CNPq,

1982. p. 160. 18 BENATO, João Vitorino Azolin – O ABC do Cooperativismo – São Paulo: ICA, 1994. p. 111.

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Audiconsultoria – assessorar e instrumentalizar dirigentes, conselheiros,

fiscais e associados;

Comunicação – divulgar as políticas, as diretrizes e as metas do

cooperativismo brasileiro, assim como as novas experiências no setor e

difundir propostas e conquistas para o público, em geral, visando ao

reconhecimento do cooperativismo como instrumento com condições de

ajudar nas soluções de problemas sociais e econômicos;

Assessoria Jurídica – orientar-se e as OCEs sobre assuntos relacionados à

legislação em vigor;

Assessoria Parlamentar – subsidiar representantes políticos na defesa dos

interesses do sistema cooperativista.

Além das organizações criadas especificamente para defesa do sistema,

existem, no país, instituições universitárias que vêm contribuindo no desenvolvimento de

recursos humanos especializados, inclusive em nível de pós-graduação, como na

UNISINOS em São Leopoldo/RS. Cursos de Graduação em Contabilidade e

Administração de Empresas que têm em seu currículo a disciplina de Contabilidade de

Sociedades Cooperativas são bastante comuns no Brasil, bem como em cursos técnicos

equivalentes a segundo grau. A cidade de Franca, os possui nos dois níveis, ou seja,

acadêmico e escola técnica.

Historicamente, o cooperativismo, desde sua implantação no Brasil, contou

com o apoio do governo que manifestou seu amparo através da legislação. O primeiro

decreto que mencionava o cooperativismo é de 6 de janeiro de 1903, de n.º 799,que

permitia, aos sindicatos a organização de caixas rurais de crédito e cooperativas de

produção e consumo.

A utilidade das cooperativas é reconhecida pelo decreto n.º 1 637 de

05/01/1907. Em 19 de dezembro de 1932, o Decreto 22 239 apresenta as características

das cooperativas e consagra as postulações doutrinárias do sistema cooperativista.

Revogado em 1934, foi restabelecido em 1938, novamente revogado em 1943, ressurgiu

em 1945, permanecendo em vigor até 1966.

A partir de 1966, o cooperativismo foi submetido ao centralismo estatal,

disposto em decretos, o que causou a perda de muitos incentivos fiscais e estado de

liberdade já conquistados.

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A Lei n.º 5 764 de 16 de dezembro de 1971, que define o regime jurídico

das cooperativas, sua constituição e seu funcionamento, além do sistema de representação

e órgãos de apoio, constitui, até hoje, o amparo legal para viabilização do sistema

brasileiro de cooperativismo.

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CAPÍTULO 4 AS TERCEIRIZAÇÕES E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO

4.1 As Cooperativas de Trabalho e a terceirização na região de Franca

A cidade de Franca se localiza na região nordeste do Estado de São Paulo.

Município com cerca de 300 mil habitantes (dados da Prefeitura Municipal), conhecido

internacionalmente, num primeiro momento, pela exploração da mão-de-obra infantil na

execução dos trabalhos das fábricas de calçados e produtos afins, sua principal mola

propulsora econômica.

Num segundo momento, ficou conhecida pela capacidade de engajamento

de sua população no combate e conseqüente eliminação do trabalho infantil. Esta bandeira

tem sido hasteada e defendida por uma instituição não governamental formada e dirigida

por empresários da cidade ligados ou não à área calçadista, denominada Instituto Pró-

Criança. Esta organização serve hoje de modelo para o Brasil. Outras cidades paulistas já

utilizam este modelo de engajamento e de trabalho na modalidade de franquia do nome

para levar a filosofia de trabalho e os ideários do Instituto Pró-Criança a outras regiões do

Estado. Paralelamente a isso, diversos segmentos da sociedade se envolvem na tentativa

árdua da prevenção e da eliminação dos riscos a que estão sujeitas crianças de e em

situação de rua, procurando evitar o uso de drogas e a prostituição infantil. Louvem-se,

nesse segmento, os trabalhos desenvolvidos pelo Conselho Municipal dos Direitos da

Criança e do Adolescente de Franca, que têm sido utilizados como modelo e referencial

para instituições semelhantes.

Outro importante segmento econômico da cidade e da região de Franca é a

agricultura, que se baseia, principalmente, na cultura do café e pecuária de leite,

representando, esta, a segunda bacia leiteira do estado e, aquela, a principal fonte de cafés

do tipo exportação do estado e uma das mais importantes do Brasil.

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Como poderemos observar, no transcorrer deste capítulo, o surgimento das

Cooperativas de Trabalho em Franca foi uma decorrência natural da necessidade de as

fábricas se ajustarem aos novos tempos, à era da economia globalizada, em que o preço de

venda não era mais o custo de produção acrescido dos impostos e da margem de

contribuição do fabricante e sim, o menor custo de produção possível, comparado com o

preço da concorrência.

Consideramos importante deixar registrado o que entendemos por custo,

segundo os conceitos utilizados e definidos por alguns autores. Sá19 define Custo como

“investimento para que se consiga um bem de uso ou de venda; o mesmo que gasto,

despesas; aplicação de meios para a produção”. Ainda nesta sua obra, citando outras

definições e outros autores, temos as seguintes definições para o termo:

“Por custo se entende o conjunto dos valores gastos

por uma empresa para advir a venda de um produto, de

uma mercadoria de serviço”. (Masi apud Sá,1983, p.

101).

“O custo é ‘um produto de despesas efetivamente

suportadas e variadamente reunidas em ordenado

complexo’”. (Zappa apud Sá,1983, p. 101).

“Tem-se a noção geral do custo dos produtos,

mercadorias ou serviços, quando se pensa na quantidade

daqueles produtos, mercadorias e serviços”. (Onida apud

Sá, 1983, p.101).

“Com a palavra custo designa-se, ordinariamente,

no campo contábil, o total dos ônus ou despesas

sustentadas para obtenção de um dado produto ou

serviço”. (Amodeu apud Sá, 1983, p. 101).

“Custos são gastos (a vista ou a prazo) com serviços

ou mercadorias destinados à obtenção de um lucro”.

(Jackson apud Sá, 1983, p. 101).

19 SÁ, Antônio Lopes de; Dicionário de Contabilidade, São Paulo: atlas,1983, p. 106-107.

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“O custo aziendal de produção é aquele que se

determina na azienda: esse é, necessariamente, um custo

monetário, uma soma, isto é, de preços despendidos para

obter a oferta dos serviços, dos esforços e de quanto é

necessário para a atuação do processo produtivo”

(D’Ippolito apud Sá, ano, p.101).

Os autores são mais ou menos concordes na

definição de custo, situando-o sempre como dispêndio;

“doutrinariamente, isto não é absolutamente correto

porque o conceito de despesa se confunde com o de saída

numerária e nem todo custo se opera mediante saída de

dinheiro”. (Sá, 1983, p. 101).

Como podemos verificar, não há discordância entre os conceitos defendidos

pela Escola Italiana de Contabilidade e o consagrado autor nacional Antônio Lopes de Sá,

discípulo daquela escola. Este buscou apenas complementar os pensamentos daquela,

enriquecendo ainda mais o tema. Em sua obra, são citados mais de 100 tipos de custos,

variando conforme suas aplicações. De maneira particular, interessa-nos sua definição de

Custo de Produção:

Momento do custo que reúne o custo das matérias

diretas, o custo da mão-de-obra direta, o custo das

despesas gerais da produção.

É o custo que alguns autores denominam Custo

Contábil; tal custo não está capacitado a produzir todos

os informes de que uma empresa necessita para a sua

administração; todavia, forma sua base.

O custo de produção reúne elementos especiais ou

diretos e gerais ou indiretos.

Os especiais são: matéria-prima e mão-de-obra

(diretos). Os gerais são as despesas gerais de produção,

que podem ser fixas e variáveis.

O controle do custo de produção depende da

Organização dos Armazéns (de matérias), da

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Organização do Pessoal (Serviço de Pessoal e lotação

certa por serviço), Organização da Produção (seções

definidas e anotações em todas as frases), Organização

Administrativa etc”.(Sá, 1983, p. 106-107).

Semelhantemente a outras atividades econômicas, as fábricas de calçados

têm sofrido, ao longo dos últimos anos, a concorrência dos produtos importados, não só no

mercado interno, mas também nos mercados internacionais, onde historicamente,

predominavam os consumidores europeus e norte-americanos.

Os produtos originários da Ásia, principalmente, forçaram os empresários

francanos a se modernizarem, como aliás têm feito com outros produtos e em outras

regiões, como por exemplo, os têxteis na região paulista da cidade Americana, que fizeram

os empresários do setor aposentarem teares com mais de quarenta anos de uso em favor de

teares eletrônicos e equipamentos de alta tecnologia, devolvendo, dessa forma, o tecido

brasileiro ao mercado interno e internacional.

Com a cidade de Franca não foi diferente. Depois de perderem os mercados

internos e externos para calçados de fabricação chinesa, o empresariado francano se

mobilizou na tentativa de se contextualizar com as novas regras de mercado ditadas pela

globalização da economia mundial.

Assim, baixar custo a qualquer preço e aumentar a qualidade final de seus

produtos têm sido a tônica nos últimos cinco anos no setor calçadista de Franca. Nesse

sentido, merece registro o esforço envidado pela Associação Comercial e Industrial da

cidade, promovendo palestras, seminários, workshops e outros com vistas a manter o

empresariado local no mesmo diapasão dos mercados mundiais quanto às técnicas de

produção e à comercialização.

Guardadas as peculiaridades de cada caso, o mesmo acontece na agricultura,

na área de construção civil, educação etc. Cada segmento econômico procura ajustar-se aos

novos tempos.

Através de pesquisas empírica e informal que levamos a efeito junto aos

sindicatos representativos das classes patronal e dos trabalhadores, pudemos apurar que, no

caso específico da indústria de calçados, a mudança de mentalidade tem sido drástica.

Empregados com vinte e cinco ou trinta anos de trabalho foram e têm sido

sistematicamente demitidos e orientados a prestarem serviços a estas mesmas fábricas às

quais serviram por longos períodos de suas vidas.

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As atividades fabris, no todo ou em parte, foram terceirizadas e estes

funcionários orientados no sentido de constituírem empresas de prestação de serviços, as

chamadas bancas, que são contratadas, às vezes formalmente, para prestarem os serviços

que, antes, faziam com suas carteiras assinadas.

Sobre o assunto, Faria20, assim se manifesta:

Seja qual for a perspectiva adotada com o impacto

da globalização, o fato é que está em curso uma nova

etapa de internacionalização do capitalismo, onde as

culturas nacionais indicam uma cultura, movida pela

aproximação entre povos e civilizações, vinculada ao

aperfeiçoamento da tecnologia e da economia.

As grandes corporações mundiais praticamente

passaram a operar em todos os países, decidindo sobre

quase tudo o que afeta a vida do ser humano, mudando a

forma de trabalho – de localizado para globalizado, onde

não existem mais fronteiras. Isso leva a compra de

matéria-prima em qualquer lugar do mundo, onde ela seja

melhor a um menor custo, à instalação de fábricas nos

países onde a mão-de-obra seja mais barata e os impostos

cobrados sejam menores, não importa qual o lugar do

planeta, é a venda da mercadoria para o mundo inteiro.

Na cidade de Franca, no que diz respeito à adoção da prática da

terceirização, no momento em larga escala, diferentemente do mencionado na obra de

Rinaldi (Apud Faria, 1999, p.131), que discorrendo acerca do façonismo, aborda a

experiência da fábrica Samello. Hoje, o sistema de prestação de serviços tem sido

amplamente aceito e utilizado. Num primeiro momento, houve um certo velado regozijo

por parte dos fabricantes. Acreditavam alguns terem reinventado a roda das relações do

trabalho, transferindo para seus terceirizados todo o ônus dessas relações, mesmo que estes

mesmos ônus estivessem incluídos no valor da fatura emitida pelas empresas terceirizadas

20FARIA, Maria Ester Braga, A experiência cooperativa dos sapateiros francanos: um desafio para o futuro,

1999, Unesp, p. 32.

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de seus ex-funcionários. O não ter que tratar com o pessoal da fábrica gerava um certo

conforto.

No caso de Franca, o termo banca, está perfeitamente definido por Faria21

“É importante esclarecer que a expressão banca,

para a indústria calçadista, refere-se à instância

subcontratada pela fábrica para realizar frações do

processo de produção do calçado, principalmente a

costura mecânica (pesponto) e a costura manual das

partes superiores. Desta forma, a expressão banqueiro(a)

é o(a) proprietário(a) da banca.

A boa convivência durou até a primeira ação trabalhista movida pelos

empregados das bancas. Um bom número de fabricantes não atentaram para o que a justiça

denomina responsabilidade solidária. Como não dispunham de meios para saldar suas

obrigações trabalhistas (muitas bancas contratavam sem registro em carteira), os

fabricantes tomadores do trabalho dessas empresas foram chamados à responsabilidade,

envolvendo-se na lide como utilizadores deste trabalho em suas atividades - fins, ou seja, o

fabrico e a comercialização de calçados. As duas Juntas de Conciliação e Julgamento da

Delegacia do Tribunal Regional do Trabalho, em Franca, acumularam muitos processos

trabalhistas, envolvendo o mesmo tipo de demanda. Isto pode ter sido decorrente de

projetos mal elaborados de terceirização, quem sabe ocasionado por uma falta de mudança

de mentalidade administrativa, conforme preconiza Queiroz22:

Para iniciar qualquer projeto de terceirização, as

empresas precisam mudar o seu comportamento e sua

postura empresarial e também a sua estratégia, nas

futuras atitudes.

Esta mudança vai proporcionar uma evolução,

permitindo o desenvolvimento empresarial com

prosperidade e segurança na perenização dos negócios.

Sem as mudanças para a modernidade as

organizações fenecem e desaparecem.

21 FARIA, Maria Ester Braga, A experiência cooperativa dos sapateiros francanos: um desafio para o futuro,

1999, Unesp, p. 131.

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Não é nossa intenção, neste trabalho, discorrer sobre este assunto

especificamente. Mas consideramos importante deixar registrado este fato porque ele

denota quanto o fabricante francano, de modo geral e dado ao seu próprio perfil, de ex-

empregado de fábrica, estava despreparado para este novo tipo de relacionamento. Ainda,

neste tópico, e para facilitar o entendimento dos leitores que vierem a tomar contato com

este trabalho e como forma de enriquecê-lo, trazemos algumas definições e impressões

acerca de terceirização, até a inclusão da prestação de serviços por parte das Cooperativas

de Trabalho, como forma de serviços terceirizados. Queiroz23 assim define terceirização:

É uma técnica administrativa que possibilita o

estabelecimento de um processo gerenciado de

transferência, a terceiros, das atividades acessórias e de

apoio ao escopo das empresas que é a sua atividade-fim,

permitindo a estas concentrarem-se no seu negócio, ou

seja, no objetivo final.

É uma metodologia de motivação e fomento à

criação de novas empresas, possibilitando o surgimento

de mais empregos.

Incentiva o surgimento de micro e médias empresas

e ainda o trabalho autônomo, possibilitando também a

melhoria e incremento nas empresas existentes no

mercado, com ganhos de especialidade, qualidade e

eficiência.

É o processo da busca de parcerias, determinado

pela visão empresarial moderna e pelas imposições do

mercado. Não mais poderemos passar para os preços os

elevados custos. Isto tem feito com que os empresários se

preocupem com a qualidade, competitividade, agilidade

de decisão, eficiência e eficácia que acabam resultando

na manutenção dos clientes e consumidores.

22 QUEIROZ, Carlos Alberto R. S. de, Manual de Terceirização, São Paulo: STS, 1995, p. 03 23 QUEIROZ, Carlos Alberto R. S. de. Op. cit., p. 31.

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Considera o autor que a terceirização possibilita a desburocratização,

proporciona um alívio à estrutura organizacional da empresa, melhora a qualidade na

prestação de serviços, contribuindo, de maneira decisiva, para a melhoria do produto final,

trazendo especialização na prestação de serviços.

Como decorrência da implantação dos projetos de terceirização, as empresas

obtêm ganhos variados, iniciando-se na eficácia empresarial, com aumento de sua

flexibilidade, agilidade decisória e administrativa, simplificando a organização, além de

incrementar a produtividade. Destaca o autor que um dos principais ganhos para as

empresas se situa na economia dos seguintes recursos: humanos, materiais, instrumental,

de equipamentos, econômicos e financeiros.

Outros ganhos empresariais citados pelo autor estariam no melhor

gerenciamento de seu fornecedores, agora especializados, na administração da qualidade

dos serviços prestados, uma estrutura básica leve e ágil, permitiria a reutilização produtiva

dos espaços, os investimentos seriam carreados para a atividade-fim, os trabalhos de

supervisão estariam mais envolvidos no produto e preocupada com a qualidade,

proporcionando resultados competitivos.

Comentando sobre os efeitos da globalização e a concorrência mundial

sobre a indústria calçadista francana, quando esta se depara com a sua pior crise e ao fato

de esta indústria não ser diversificada, assim se posiciona, Faria (1999, p. 13, 14):

Esse processo de terceirização apresenta várias

formas e/ou estratégias de associações para

externalização de atividades que visam redução de custos,

via precarização das condições de emprego, mesmo

comprometendo a qualidade do serviço prestado. Com o

avanço da terceirização, vê-se, hoje, o surgimento, em

grande escala, de ‘cooperativas de trabalho’ (grifo

nosso), onde trabalhadores se unem e montam uma

cooperativa, porque eles sabem fazer e têm a tecnologia

de como fazer.

Várias são as formas de terceirização, cada uma envolvendo variado grau de

risco na sua implantação e execução. O quadro a seguir demonstra algumas delas:

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Quadro 1: Características de cada forma de Terceirização

Forma Atuação Tecnologia Resultado Execução Funções da Exclusividade Posição do Riscos legais Atividade-fim tomador trabalhistas Desverticalização Fora do Criação e De- Produto Independente Passa, exceto a tec- Somente de produto Avalia a qualidade Nenhum

Tomador senvolvimento Próprio do tomador nologia básica

Prestação de Serviço Dentro do Execução Somente Depende de Não pode passar Não pode depender Avalia o resultado Se exclusivo,

Tomador Serviços Instruções sim

Venda de Serviços Fora do Processo e Somente Depende de Passa, exceto a tec- Somente de tipo de Avalia a qualidade Se exclusivo,

Tomador Operação Serviços Especificações nologia básica Serviço sim

Nomeação de Fora ou Execução Somente Depende de Dentro não, fora sim Não pode depender Avalia o resultado Se exclusivo, sim

representante Dentro Serviços Instruções

Concessão de marca Fora do Execução e Somente Depende de Passa, exceto a tec- Somente da marca Avalia o resultado Nenhum

Tomador venda Serviços Especificações nologia básica e audita a operação

Locação de mão-de-obra Dentro do Não tem Não tem Supervisão do Não pode passar Não pode depender Supervisiona a Se exclusivo ou

Tomador Tomador mão-de-obra + 3 meses, sim

Franquia Fora do Execução e Somente Depende de Passa, exceto a tec- Somente da marca Avalia o resultado Nenhum

Tomador venda Serviços Orientação e nologia básica e produto e audita a operação

Treinamento

Fonte: Queiroz, 1994, p. 45.

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Comentando sobre os estágios da terceirização no Brasil, Faria (1999)

destaca o fato de o Brasil ainda centralizar o seu processo de terceirização nas atividades

mais simples e está erroneamente enfocada para a redução nos custos, redução no quadro

de funcionários e diminuição dos benefícios, diferentemente de outros países, onde o que

se busca é a aliança estratégica entre empresas, objetivando obter flexibilidade e

especialização, aliadas à economia de escala e à sinergia dos recursos. Nesse caso, as

empresas, juntas, conseguem fazer mais com menos, gerando mais oportunidades com

recursos menores.

O empresariado nacional, no que diz respeito à terceirização, esta focado no

estágio conhecido como dumbsourcing, ou seja, estágio preliminar do processo, onde as

atividades se concentram nas mais tradicionais e mais fáceis de serem passadas para

terceiros. Como exemplo, cita Faria (1999): serviços administrativos gerais (refeitório,

segurança, manutenção, limpeza, algumas áreas tradicionais de recursos humanos, serviços

médicos, jurídicos etc.). Em outros países, o processo de terceirização já se encontra num

estágio bem mais avançado, entendido como smartsourcing, onde a aliança estratégica é o

objetivo, juntando-se os esforços e recursos tecnológicos, para manufatura de produtos

com melhor qualidade, gerando a competitividade necessária para concorrer no mercado

consumidor.

Segundo o autor, a terceirização, no Brasil, começa a sair do estágio

preliminar, mas muito lentamente, porque ainda prevalece o interesse exclusivo, das

empresas, em terceirizar para economizar. O desafio que se apresenta às empresas

brasileiras, caso queiram ter sucesso numa economia globalizada, será, sem dúvida,

caminhar do atual estágio para o smartsourcing, onde a estratégia é o interesse, a sinergia

de recursos é um meio e a competitividade é o objetivo e isto somente será alcançado

através de um processo de planejamento, onde a terceirização esteja incluída como uma

das formas adequadas no processo econômico do mundo moderno.

Produzindo com pessoal próprio, os custos operacionais do tomador

relativos à mão-de-obra, no caso o empresário que ainda não terceirizou suas atividades,

são, basicamente, os seguintes, segundo Queiroz (1994, p. 125, 129):

• Salário diretos

• Encargos

• Legais

• Sociais

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• Salários indiretos

• Alimentação subsidiada

• Transporte subsidiado

• Assistência médica subsidiada

• Seguro de vida subsidiado

• Auxílios sociais diversos

• Rotatividade da mão-de-obra

• Demissão

• Admissão

• Recrutamento

• Seleção

• Treinamento

• Acidentes de Trabalho

• Estabilidade da Lei 8 213/91 – Art.118

• Socorro médico emergência

• Perda de qualidade

• Perda de produtividade

• Perda material

• Danos a equipamentos e instrumentos

• Remuneração dos primeiros 15 dias de afastamento

• Segurança do trabalho

• EPI

• EPC

• Uniformização

• Controles administrativos de pessoal

• Tempo de supervisão

• Ociosidade da mão-de-obra

• Imobilizados

• Sucateamento de equipamentos e instrumentos

• Instalações físicas

• Seguros gerais

• Materiais de consumo

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• Energia

• Absenteísmo

• Justificativas médicas

• Justificativas por mérito

• Contencioso trabalhista

• Acréscimo de mão-de-obra para substituições

• Ausências generalizadas

• Ausências por acidente no trabalho

• Folgas

• Saída antecipada

• Atrasos

• Descanso legal

• Custos gerais invisíveis

• Apoio à burocracia

• Status funcionais

• Embutidos

Assim, quando terceiriza, o tomador pretende transferir para o parceiro

terceirizado os seguintes custos:

• Quando implantada a terceirização

• Acidentes no trabalho

• Remuneração dos 15 dias iniciais de afastamento

• Estabilidade da Lei 8 213/91 – Art. 118

• Socorro médico emergencial

• Recrutamento

• Seleção

• Admissão

• Demissão

• Treinamento

• Supervisão

• Segurança no trabalho

• EPI

• EPC

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• Uniformização

• Controles administrativos de pessoal

• Ociosidade da mão-de-obra

• Acréscimo de mão-de-obra – substituições

• Materiais de consumo

• Absenteísmo

• Mão-de-obra para picos de trabalho

• Equipamentos

• Instrumentos

• Ferramentas

• Custos invisíveis

Existe diferença entre os autores nacionais quanto ao custo efetivo da mão-

de-obra no Brasil. Para fins de comparação, ilustramos com os quadros a seguir:

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Para de Queiroz (1999, p. 130-131) o quadro abaixo representa

adequadamente o custo do empregado no Brasil.

Tabela 1: Quanto Custa o Empregado

QUANTO CUSTA O EMPREGADO % sobre a folha de salários Grupo A – Encargos Sociais básicos Discriminação das verbas Horista % Mensalista % 1 – Previdência Social 20,00 20,00 2 – Salário Educação 2,50 2,50 3 – Incra 0,20 0,20 4 – Sesi 1,50 1,50 5 – Senai 1,00 1,00 6 – Seguro Acidentes 3,00 3,00 7 – FGTS 8,00 8,00 8 – Sebrae 0,60 0,60 Total Grupo A 36,80 36,80 Grupo B – Custo extra-salarial que sofre incidência do Grupo A 1 – Repouso Semanal Remunerado 17,64 2 – Feriados e Dias Santificados 3,73 3 – Férias 13,33 13,35 4 – Auxílio/Acidente de Trabalho 1,57 1,57 5 – Licença Paternidade 0,18 0,18 6 – Licença Maternidade 0,86 0,86 7 – Gratificação de Natal 11,22 8,95 8 – Aviso Prévio Trabalhado 1,13 1,13 Total grupo B 49,66 26,04 Grupo C – Custo extra-salarial que não sofre incidência do Grupo A 1 – Indenização de 40% do FGTS 4,78 4,03 2 – Aviso Prévio Indenizado 2,23 2,23 Total Grupo C 7,01 6,26 Grupo D – Incidências cumulativas Horista Grupo B (49,66) x Grupo A (36,80) = 18,27 Mensalista Grupo B (26,04) x Grupo A (36,80) = 9,58 Totais 111,74 78,68 Fonte: Queiroz, 1994, p. 130.

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Os índices de custos da construção civil, no Brasil, divulgados pela Revista

Construção24, estão apresentados na tabela seguinte:

Tabela 2: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho

Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho (%) Horistas(1) Mensalistas(2) A1 Previdência Social 20,00 20,00 A2 Fundo de Garantia por Tempo de Serviço 8,00 8,00 A3 Salário Educação 2,50 2,50 A4 Serviço Social da Indústria (Sesi) 1,50 1,50 A5 Serviço Nacional de Aprendizagem Indústrial (Senai) 1,00 1,00 A6 Serviço de Apoio a Pequena e Média Empresa (Sebrae) 0,60 0,60 A7 Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) 0,20 0,20 A8 Seguro contra os Acidentes de Trabalho (INSS) 3,00 3,00 A9 Seconci Serviço Social da Indústria da Construção e do Mobiliário (aplicável a todas as empresas constantes do lll grupo da CLT - art.577) 1,00 1,00 A Total dos Encargos Sociais Básicos 37,80 37,80 B1 Repouso Semanal e Feriados 22,90 B2 Auxílio-enfermidade (*)0,79 B3 Licença Paternidade (*)0,34 B4 13o. Salário 10,57 8,22 B5 Dias de chuva / Faltas justificadas/acidentes de trabalho/ Greves/falta ou atraso na entrega de materiais ou serviços na obra/outras dificuldades (*)4,57 B Total dos Encargos Sociais que recebem as incidências de A 39,17 8,22 C1 Depósito por despedida injusta 40% sobre [A2 + (A2xB)] 4,45 3,46 C2 Férias (Indenizadas) 14,06 10,93 C3 Aviso Prévio (Indenizado) (*)13,12 (*)10,20 C Total dos Encargos Sociais que não recebem as incidências Globais de A 31,63 24,59 D1 Reincidência de A sobre B 14,81 3,11 D2 Reincidência de A2 sobre C3 1,05 0,82 D Total das Taxas das Reincidências 15,86 3,93 Vale transporte (**) C.N-(S.0,06).100 S Refeição Mínima (café da manhã) (**) (C.N)-(((S/30).22).0,01.100 S Refeições (**) C.N.0,95.100 S Seguro de vida e acidentes em grupo (**) C.100 S Percentagem Total 124,46 74,54

24 Encargos Sociais in Construção São Paulo, nº. 2735, 10/07/2000, p. 142.

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Notas:

(*) Adotado

(**) Itens que devem ser calculados segundo o

critério de cada empresa. As fórmulas consideram os

seguintes itens: C = Custo médio de condução (unit) ou

refeição (unit) ou seguro (custo mensal); N = Número

médio de conduções ou refeições (mês); S = Salário médio

nominal (mês).

Vale Transporte: Considerada dedução de 6%

sobre o salário mês, pois os empregadores obrigam-se a

custear apenas o excedente a esse percentual;

Refeição Mínima: Considera dedução de 1% sobre

o salário/hora por dia útil trabalhado, relativo ao custeio da

refeição mínima por parte do trabalhador;

Refeições: Considerado um limite mínimo de 95%

para os custos subsidiados pelos empregadores;

Dias úteis: foram considerados 22 dias por mês.

Observações:

1) As taxas de leis sociais e riscos do trabalho

para horistas estão consideradas e calculadas de modo a

exprimir as incidências e reincidências dos encargos

sociais e a percentagem total é a adotada em nossas tabelas

de composições de preços para orçamentos (TCPO), ou

seja, é a taxa que incide sobre as horas normais

trabalhadas (de produção).

2) As taxas de leis sociais e riscos do trabalho

para mensalistas estão consideradas e calculadas de modo

a exprimir as incidências e reincidências dos encargos

sociais e percentagem total adotada incide sobre a folha de

pagamento.

3) Após o cálculo dos custos diretos, há

necessidade de uma previsão dos custos indiretos

envolvidos na administração do negócio da empresa

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executante. Tal previsão geralmente é feita com base na

aplicação da taxa de BDI - Benefícios e Despesas

Indiretas.

Como vemos, esses diferenciais são representativos, em especial num

momento em que redução de custos e aumento de qualidade nas atividades econômicas são

uma exigência do cada vez maior do mercado globalizado. Assim, essas diferenças

percentuais, quando se trata de otimizar custos, podem representar fator decisivo nas

concorrências e tomadas de preços não só na área da construção civil, mas das atividades

econômicas em geral.

Centramos o nosso trabalho no custo da indústria da construção civil, que,

por ser uma atividade que recebe um grande volume de trabalhadores dos quais não se

exige necessariamente muita qualificação, envolve um grande número de pessoas,

distribuídas nas diversas atividades próprias desse tão importante segmento econômico,

tais como pedreiros, serventes, eletricistas, encanadores e outros afins e cuja atividade é,

também, uma catalisadora de demandas trabalhistas.

Em nossas pesquisas e também decorrente de nosso labor profissional,

observamos que, na atividade da construção civil, a terceirização é bastante comum. Os

contratos fechados entre construtores e tomadores são repassados para empreiteiros, e

muitas vezes, para subempreiteiros que, normalmente, são os executores dos trabalhos de

construção. Quanto mais se abre o leque na distribuição dessas responsabilidades, maiores

as dificuldades de uma fiscalização eficiente por parte dos tomadores, bem como maiores

são as possibilidades da contratação de trabalhadores sem carteira de trabalho assinada,

abrindo-se as portas para as ações trabalhistas verificadas no decorrer da execução das

obras e, principalmente, ao final delas.

Queiroz, (1994, p. 137) alerta para os aspectos de como a terceirização se

encaixa na legislação brasileira, principalmente aqueles relacionados com a elaboração dos

contratos de prestação de serviços, pois mais valem os pressupostos que cercam a relação

do que os eventuais documentos assinados a respeito. Recomenda o autor que se evite a

subordinação aos terceiros, sendo este o principal fator com o qual deveremos nos

preocupar. Para assegurar-se, será necessário definir o tipo de contrato a ser estabelecido

com o parceiro, como segue:

• Prestação de serviços

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• Concessão

• Trabalho temporário

• Venda de serviços

• Representante

• Franquia

Uma vez definida a forma da relação, a preocupação deve ser centrada na

forma a ser adotada na gestão do contrato e como o tomador vai relacionar-se com o

prestador na administração dos serviços. Devem-se redobrar os cuidados para se evitar a

supervisão do prestador. Caso se configure a direção ou fiscalização fica caracterizada a

subordinação e, com ela, o vínculo empregatício é presumido. Explica Queiroz (1994, p.

138):

Para evitar essa conotação é necessário que o

tomador se conscientize de que deve apenas e tão-somente

avaliar os resultados qualitativos e quantitativos dos

serviços prestados e nunca controlar a execução.

Perante a legislação trabalhista, o tomador de

serviços prestados é subsidiariamente responsável para os

recolhimentos previdenciários e trabalhistas. Poderá,

entretanto, evitar assumir diretamente a responsabilidade,

dependendo do seu comportamento na administração do

contrato.

Todo o cuidado deve ser tomado visando evitar problemas na contratação da

terceirização dos serviços. Outra recomendação de Queiroz (1994, p. 139) é:

Que no contrato de prestação de serviços conste

apenas indicação de quais são os serviços a serem

executados, onde e quando devem ser desempenhados.

Jamais defina como eles devem ser feitos.

Que o reajuste do preço no contrato não seja

baseado em índices salariais ou outros utilizados pelo

tomador para administrar os seus negócios.

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Diz-nos, ainda, o autor em uma referência à Constituição Federal em seu

artigo 5.º, inciso XXXVI, que assim se expressa: A Lei não prejudicará o direito

adquirido, ou ato jurídico perfeito e a coisa julgada; que “o contrato perfeito forma um ato

jurídico legal”. Os trabalhos realizados pelas empresas prestadoras de serviços são lícitos e,

portanto, podem ser contratados, conforme previsto no artigo 1 216 do Código Civil, que

sumariamente diz, todas as espécies de serviços ou trabalho lícito, material ou imaterial

pode ser contratado mediante retribuição.”

Os arts. 442 e 444 da CLT citam: “o contrato individual de trabalho é um

acordo correspondente a uma relação empregatícia “ e “as relações de trabalho podem

ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo que não contravenham à

legislação trabalhista”.

O art. 3o da CLT “considera empregado toda pessoa física que prestar

serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante

salário”.

O art. 2o.da CLT diz que “considera-se empregador a empresa que assume

riscos econômicos, assalaria, admite e dirige a prestação pessoal de serviços”. No seu

parágrafo 2o, diz que “a empresa de prestação de serviços que estiver subordinada a um

grupo industrial, comercial ou outros, a relação de emprego se estabelece com a empresa

principal”.

O art. 461 da CLT define que “somente haverá a equiparação salarial se a

diferença ocorrer dentro da mesma empresa e localidade”.

Art. 461. CLT – Equiparação salarial – empregado de prestadora de

serviço de mão-de-obra – paradigma – “mesmo empregador – não configuração”.

Equiparação salarial. Empregado de prestadora de serviços. Torna-se

passível de rescisão, a sentença que defere a empregado de empresa prestadora de mão-

de-obra equiparação salarial com empregado da tomadora dos serviços. O trabalho não

pode ser considerado como prestado à mesma empresa, como exige o citado Art. (Ac do

2o. Gr do TRT – R – MV no mérito AR 23/91 – Rel. Juiz Elio Eulálio Grisa – J. 27.11.91.

Requerente: Montreal Engenharia Ltda – ementa oficial.

O art. 5o da Constituição Federal, no item XXXVI, diz que “a lei não

prejudicará ato jurídico perfeito”. O art. 170 do mesmo diploma legal assegura a livre

iniciativa, livre concorrência, a busca do pleno emprego e o livre exercício de qualquer

atividade econômica independente de autorização de órgãos públicos”.

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A Lei 5 085 de 27/08/66 reconhece ser possível a contratação de mão-de-

obra avulsa, quando o trabalhador estiver vinculado a entidade de classe, como:

sindicatos, associações reconhecidas e cooperativas,(grifo nosso). A entidade é

intermediadora da mão-de-obra, sendo aquela que deverá ser contratada, para colocar a

mão-de-obra à disposição do contratante, (tomador de serviços), sendo também quem

recebe do tomador a remuneração do trabalhador vinculado, repassando-lhe o valor

devido. Esta é a única alternativa na área das empresas privadas, para a locação de mão-

de-obra fora a Lei 6 019/74.

O Decreto 357 de 07/12/91, reconhece o trabalhador avulso como

contribuinte da previdência social e, naturalmente beneficiário do INSS.

O art.82 do Código Civil preceitua que “o ato jurídico é válido quando há o

agente capaz, objeto lícito e forma prevista na lei, ou que esta não proíba”.(Queiroz,

1994. p. 139 -140)

A taxa de natalidade das Cooperativas de Trabalho tem crescido

significativamente nos últimos anos. É difícil não encontrarmos uma atividade em que a

mão-de-obra cooperativada não esteja presente. Apenas a título de ilustração, temos hoje,

no Brasil, serviços que são prestados em áreas totalmente distintas, que vão desde aqueles

requeridos por Resorts luxuosos até hotéis mais simples, de trabalhos prestados na

agricultura a trabalhos realizados por cooperativas de jornalistas.

Existem registros de cooperativas formadas por professores que prestam

serviços às escolas onde antes eram funcionários registrados. As cooperativas de trabalho

na construção civil são bastante comuns, sendo que uma delas serviu de referência para

este nosso trabalho como um estudo de caso. Uma atividade bastante conflituosa na área

trabalhista e que hoje também utiliza mão-de-obra de trabalhadores contratada das

Cooperativas de Trabalho é o segmento de Consórcios.

No Estado de São Paulo, conhecemos dois casos e que, embora recentes,

demonstram o sucesso da idéia dos Pioneiros de Rochdale. Sediada no município de São

Paulo, a Coopecon, segundo seu diretor Alexandre Janciauskas, em entrevista à revista

Sistema de Consórcios25, a Cooperativa está intensificando os trabalhos de vendas de cotas

de consórcio da marca Ford, atua no Estado de São Paulo em 18 pontos-de-venda e já

possui cerca de 200 cooperados. Nelson Botter, sócio da Copervenco, que atua no mesmo

segmento, e em entrevista à mesma revista, disse que, através da cooperativa, tem

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condições de oferecer um trabalho diferenciado de venda de cotas de consórcio porque

consegue manter a fidelidade dos vendedores, que são, em última análise, patrões de si

mesmos.

A mesma iniciativa já esta sendo implementada em Franca. Existe um

movimento formado por vendedores de cotas de consórcios, ligados, por prestação de

serviços, na modalidade de vendedores autônomos, a três administradoras, duas com sede

na cidade e uma com escritório de representação, no sentido de constituírem a sua

cooperativa e, assim, desenvolverem o seu trabalho de forma mais segura, tanto para eles

próprios quanto para os seus tomadores. Temos acompanhado e orientado o

desenvolvimento desse trabalho no que diz respeito ao seu ordenamento jurídico e a sua

constituição e quanto à instrução aos associados em potencial, procurando conscientizá-los

quanto aos aspectos legais de uma cooperativa, seus direitos e, sobretudo, os seus deveres.

Há uma expectativa, por parte dos mesmos, de que, até o final do ano 2000, a sua

cooperativa esteja constituída e em pleno funcionamento.

O que não queremos ver repetida é a experiência malograda da Arco-Íris –

Cooperativa Francana de Produção de Calçados Ltda., motivo do trabalho apresentado

por Faria (1999) e já citado neste nosso trabalho, quando deixa bastante clara a falta de

educação para o cooperativismo, tanto por parte dos associados, quanto por parte do

presidente da Arco-Íris.

Em Franca e região, área que delimita este trabalho, existem, pelo menos,

oito cooperativas de trabalho em atividade em áreas bastantes distintas, daí excluídas a

Unimed, Uniodonto e Cooperativa de Taxistas, sejam de carros ou motocicletas. Para

exemplificar, citamos o exemplo da Arco-Íris – Cooperativa Francana de Produtores de

Calçados, mencionada no parágrafo anterior, formada por maioria de ex-funcionários de

uma grande e tradicional fábrica de calçados de Franca e que, após meses seguidos de

prestação de serviços àquele tomador, os seus associados, insuflados por um ex-diretor, à

época, e orientados por advogados do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de

Calçados da cidade, segundo declarações de um ex-cooperado e que não quis fazer parte da

ação, por, ainda segundo palavras do mesmo, acreditar no sistema cooperativo, houve por

bem entrar com uma reclamação trabalhista coletiva contra o seu contratante, reclamando

verbas como, diferenças de salário, férias, décimo terceiro salário e demais reflexos, numa

clara afronta à legalidade.

25 Sistema de Consórcios, in Cuidados com a terceirização, Maio-Junho/2000, p. 16.

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Pior para o cooperativismo, pois suas pretensões lograram êxito, mesmo que

parciais, conforme cita Faria (1999, p. 151.)

A princípio nem todos os cooperados aceitaram

acionar a empresa, por não confiar na causa. No entanto,

aos poucos, o número foi aumentado, chegando a totalizar

22 (vinte e duas) pessoas. O processo foi iniciado e, antes

de completar um ano, ainda sem uma decisão final da

justiça, a empresa chamou os sapateiros cooperados e fez

a eles uma proposta de acordo, onde pagariam 50% do

valor da causa. Nesse momento, eles aceitaram o acordo e

cada um recebeu um valor variável entre R$ 2 500,00 e

R$ 3 000,00.

A legislação trabalhista do Brasil, no entendimento do julgador desta ação,

deu-lhes acolhimento e considerou legítimas as pretensões dos autores da ação. Como diz a

máxima no meio jurídico, de que todo bom acordo é melhor que uma boa demanda, a

empresa, pagou, através de acordo, parte das pretensões dos cooperados sapateiros.

O cooperativismo de trabalho na área de calçado, especificamente, sofreu

um duro golpe, caindo no mais completo descrédito e ainda hoje sofre os reflexos dessa

insana atitude, ao nosso entendimento.

A Coopershoes - Cooperativa Francana de Shoemakers, criada à mesma

época para prestar serviços na área de produção de calçados, só há poucos meses iniciou as

suas atividades. A Cooperativa de Técnicos Agropecuários e Afins da Região de Franca –

UNIATA – que como seu nome sugere, destina-se à prestação de serviços à área de

agricultura em geral, encontra-se em atividade. A Cooperativa do Trabalhador Autônomo

de Franca desenvolve uma atividade mais genérica, ou não especializada. Presta todo tipo

de serviço de que se tenha necessidade, inclusive o de movimentação de carga,

conservação e manutenção de edifícios, em geral, serviços de pedreiro e eletricista e afins.

A Cooperativa Regional dos Trabalhadores Rurais Autônomos e de Serviços Avulsos –

COOPEI – também presta serviços à agropecuária. Existe em Franca, ainda, a Cooperativa

da Costureiras de Calçados e Afins.

Algumas destas cooperativas operam com mais atividades que outras, como

é o caso, citando agora um exemplo muito positivo, da Coopertraf –Cooperativa de

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Trabalho de Profissionais em Carga e Descarga de Mercadorias e Trabalhadores Braçais

de Franca. Opera com atividades de movimentação de cargas, em geral, e agrega cerca de

trinta associados,junto aos quais tivemos oportunidade de desenvolver parte de nossos

trabalhos de pesquisa de campo. Incluímos esta cooperativa em nosso trabalho de campo

porque, além de ser a que desenvolve maior volume de atividades durante o ano, pareceu-

nos, segundo nosso entendimento, ser administrativamente melhor estruturada e a coleta de

dados e informações fluiu com facilidade e muita transparência, o que, do ponto de vista

administrativo, é fator de credibilidade não só para a Cooperativa, mas também, para sua

diretoria.

Esta Cooperativa foi constituída em 28 de setembro de 1998 e, na opinião

de seus cooperados, ela representa o sustentáculo de suas atividades profissionais não só

por dela fazerem parte, mas, sobretudo, porque, segundo suas opiniões, as empresas

tomadoras de seus serviços, com o passar do tempo, foram perdendo o medo de contratar

esta prestação, de estarem incorrendo no risco da vinculação trabalhista.

Anteriormente à existência da cooperativa, os trabalhadores, auto-

denominados chapas, iam para os pontos oferecerem o seu trabalho a quem deles lograsse

mister. Era muito comum o trabalhador passar dias sem desenvolver nenhuma atividade e,

consequentemente, obter algum dinheiro para seu próprio sustento e o de sua família.

Segundo suas próprias palavras, eram dias de intensas dificuldades. Não que elas não

existam mais, pelo simples advento da Cooperativa. O que ocorreu é que, com a

Cooperativa, não existe mais aquela competição entre os trabalhadores pelo melhor ponto

e, mesmo no ponto, a competição por ver quem conseguiria pegar este ou aquele caminhão

que parasse no local e que estivesse precisando dos serviços de um chapa.

A conseqüência disso, como já mencionamos, era que, muitos trabalhadores

não conseguiam trabalhos por dias a fio, acarretando dificuldades financeiras e de

sobrevivência para os envolvidos e seus familiares.

Outra conseqüência danosa era o uso da bebida alcoólica, freqüente e

bastante comum entre os trabalhadores dessa categoria, segundo os mesmos. “Como não

conseguia trabalho, batia o desespero e uma branquinha sempre aparecia um amigo para

pagar”, confessa meio sem jeito, Pedro (nome fictício), no decorrer de nossa entrevista. E

ele continua: “A mulher não podia nem olhar para a gente. Os filhos olhavam e já saiam

de perto, por medo de apanhar. A tristeza por não ter, muitas vezes, o que comer e o que

dar para os filhos, aumentavam o desespero. Aí a gente saía outra vez e ia para o boteco

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perto de casa, na esperança de encontrar quem pagasse mais uma para podermos

esquecer aquilo tudo. Bebia mais uma ou duas, voltava para casa e batia na mulher. Nos

filhos também, se chorassem ou reclamassem de alguma coisa”.

Este depoimento pode ser bastante comum, mas, infelizmente, reflete o que

acontece, ainda hoje, em muitos lares e muitas famílias, não só no Brasil.

Muitos dos entrevistados, nesta cooperativa, têm depoimentos semelhantes.

O que os aliviava, de certa forma, segundo alguns dos entrevistados, era a cesta básica de

alimentação que alguns recebiam de instituições beneficentes, normalmente ligados a

igrejas evangélicas e seitas espiritualistas, bastante comuns e atuantes em Franca.

Quando perguntados sobre o que mudou, com a abertura da Cooperativa,

muitos são enfáticos: “Tudo”. Respondem. E um detalhe que nos chamou a atenção está

novamente voltado para o uso de bebida alcoólica. “Aqui na Cooperativa, apareceu com

cheiro de cachaça, não trabalha. Volta para casa e, só no dia seguinte quando estiver bom

e se tiver serviço, trabalha”.

Segundo o Sr. José Abrile, Presidente da Coopertraf, eles realizam uma

espécie de rodízio na distribuição do trabalho, de modo que, havendo serviço, todos

possam trabalhar o maior número de dias possíveis na semana. É um sistema semelhante

ao adotado pelo Sindicato dos Movimentadores de Carga, não só de Franca, mas de outras

localidades onde existem e operam a locação de mão-de-obra. Entendem que é uma forma

justa e democrática de efetuarem a distribuição de serviço entre seus membros e

associados.

Quando perguntados sobre o relacionamento com a família, muitos se

emocionam às lágrimas. Pedro, muito desembaraçado agora, fala com entusiasmo. “A

mulher agora está mais feliz. Não apanha mais. Os filhos nos olham sem medo no rosto.

Como ela também costura sapatos (em Franca é muito comum a costura manual domiciliar

de calçados, quando, muitas vezes, toda a família se envolve na atividade), fica mais fácil

tocar a vida e cuidar dos meninos”. Pedro tem quatro filhos, entre 3 e 10 anos de idade.

No período em que desenvolvemos este trabalho, entre os meses de maio e

junho de 2000, a cidade de Franca atravessava relativa calmaria na área de produção de

calçado. Por calmaria, deve-se entender que as fábricas estavam com seus setores

produtivos em franca atividade. A conjugação desses fatores, segundo nosso entendimento,

pode estar proporcionando este aspecto favorável, não só no relacionamento entre os

cooperados, mas, inclusive, nas atividades da Cooperativa.

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Informa-nos o Sr. José Abrile, da Coopertraf, que o rendimento mensal

médio dos associados é de cerca de dois salários mínimos, hoje algo por volta de trezentos

reais. Considerando-se que é uma época de pouco trabalho, em que a cafeicultura,

importante atividade econômica da região se encontra em trabalho de preparo para

colheita, o rendimento é considerado satisfatório, pela maioria deles. Aliado à renda

familiar, aqueles associados que quiseram responder a esta parte do questionário disseram

que sobrevivem com cerca de quinhentos reais mensais.

Como medida reguladora de suas atividades e relacionamento internos, a

Coopertraf possui um Regulamento Interno, que, entre outras, regulamenta a ingestão de

bebidas alcoólicas por parte de seus associados, em período de serviços, o qual, de forma

sucinta, transcrevemos26:

1. A Cooperativa, para efeitos jurídicos, passou a

funcionar a partir de 28/09/1998;

2. Não existe vínculo empregatício entre os Cooperados

e a Cooperativa, portanto, se o Cooperado vier a sair

ou a ser desligado da Cooperativa, nem a Cooperativa

deverá pagar nada a ele, tampouco ele deverá pagar

nada à Cooperativa;

3. O Cooperado só será escalado para o trabalho, desde

que a Cooperativa tenha recebido propostas de

trabalhos;

4. Se não existir proposta de trabalho para a

Cooperativa, também não existirá nenhum

impedimento para que o Cooperado seja livre;

5. Haverá um critério de escala de serviços por parte da

Cooperativa, procurando não deixar nenhum

Cooperado prejudicado, desde que haja serviços no

decorrer da semana;]

6. Não será aceito nenhum Cooperado trabalhar em

nome da Cooperativa, depois de haver ingerido

bebidas alcoólicas;

26 COOPERTRAF, Regulamento Interno, Franca/SP.1998. p. 2.

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7. Será mantido junto à Cooperativa, um livro de pontos

para que todo o Cooperado possa assinar no horário

de chegada e saída;

8. Sempre que as normas da Cooperativa não forem

seguidas corretamente, será convocada, através da

Diretoria, uma Assembléia Geral Extraordinária, na

sede da Cooperativa, para os devidos ajustes.

Este documento é assinado por todos os associados que venham a ingressar

na Cooperativa, de modo que no futuro não aleguem ignorância quanto aos procedimentos

internos da Cooperativa.

Para que possa desenvolver suas atividades, a Cooperativa conta com uma

sede, localizada em ponto bastante favorável na cidade e que foi cedida pela Prefeitura, na

modalidade comodato, inclusive com telefone instalado. O compromisso dela para com a

municipalidade é a manutenção do local em condições de uso e higiene, devendo ser

evitado o uso de palavreado não condizente, já que as proximidades do local é área de

intenso trânsito de pessoas. Existe um acordo verbal com a prefeitura de que, a qualquer

tempo em que esta precisar das instalações, a Cooperativa deverá devolvê-las nas mesmas

condições em que a encontrou, razão pela qual o Sr. Abrile disse não efetuar grandes

melhorias no recinto. Parte dessas instalações são usadas como refeitório pelos associados,

que trazem suas refeições pela manhã, de modo que possam esquentá-las e tomá-las em

um local com um mínimo de privacidade e conforto.

Como medida de divulgação e marketing, mesmo que institucional, a

Coopertraf, segundo seu Presidente, Sr. Abrile, num primeiro momento, desenvolveu um

trabalho do tipo boca a boca, junto às empresas para as quais prestavam serviços na

condição de avulsos, os chamados chapas. Com a sua constituição e instalação, este

trabalho passou a ser feito por telefone e através da entrega de panfletos junto às empresas.

A Coopertraf, hoje, tem uma posição relativamente tranqüila. Possui uma

carteira de clientes que a procura sempre que tem necessidade de seus trabalhos. Nem por

isso descansa na conquista. Segundo sua diretoria, a Cooperativa está sempre em contato

com seus clientes e procura sempre descobrir clientes potenciais. São clientes da

Coopertraf empresas tradicionais da cidade de Franca, algumas muito conhecidas em todo

Brasil, como faz questão de frisar o Sr. Abrile, numa demonstração clara de que as

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empresas, em geral, e os sindicatos, em particular, já não vêem com tanta reserva a atuação

das cooperativas de prestação de serviços.

Mencionamos aqui os sindicatos porque, segundo informação da

Cooperativa, estes têm se mostrado contrários ao surgimento e à implantação das

Cooperativas de Trabalho, segundo seus entendimentos, por eliminarem contribuições

financeiras e representatividade que os sindicatos julgam ser de sua alçada.

Como remuneração à Cooperativa, cada cooperado, por ocasião do

recebimento de sua prestação de serviços, tem descontado de seu pagamento uma parcela

correspondente a vinte por cento de seus vencimentos e que são destinados ao custeio das

despesas com a estrutura administrativa da Cooperativa, permitindo, assim, a sua

manutenção e sobrevivência. A maioria dos associados concorda com este percentual.

Sabem que ele é necessário para a sobrevivência da Cooperativa e para as suas próprias.

No que diz respeito a benefícios, a Coopertraf ainda não os proporciona aos

seus associados. Sua diretoria entende que, no mínimo, as contribuições ao INSS deveriam

ser pagas pela Cooperativa ao Associado, mas isto ainda não foi possível. Um plano de

saúde mais abrangente, como Plano de Saúde UNIMED, no momento é apenas uma meta

que esperam atingir. Pretendem, com a consolidação da Cooperativa, que parte do valor

retido pela mesma seja utilizada como um pagamento ou distribuição de sobra ao final do

ano, numa clara alusão ao décimo terceiro salário, ainda enraizada no inconsciente de

todos.

Em geral, a Cooperativa consegue trabalho todos os dias, mesmo que não

para todos os associados. Aqueles que não trabalham em um determinado dia, fazem parte

de uma lista preferencial para o dia seguinte, conforme já mencionado, fazendo-se

funcionar, então, o sistema de rodízio. Mesmo assim, a maioria daqueles que não

conseguem trabalho no dia, permanece nas instalações da Cooperativa, na esperança de vir

a trabalhar e/ou para conversar, estar à disposição e ser visto. Naturalmente, isso não é

obrigatório.

Todos registram suas presenças em um Livro de Presença mantido em local

de fácil acesso, nas instalações da Cooperativa. Aqueles que optam por não permanecerem

na Cooperativa e que, se eventualmente conseguem algum trabalho de natureza dos

oferecidos pela Cooperativa, fazem questão de trazerem os 20% cobrados pela mesma,

como se o trabalho fora oferecido por esta. Do nosso ponto de vista, dá-se aí o que

chamamos de fidelidade do cooperado para com a sua cooperativa.

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Em média, cada associado trabalha três dias por semana, nesta época do

ano em que as atividades não são intensas. Segundo os cooperados da Coopertraf, hoje, em

razão da existência da Cooperativa e por dela fazerem parte, em média, eles trabalham

50% mais dias que quando faziam ponto, na condição de chapas, em variados locais da

cidade e nas rodovias que dão acesso à cidade. Desse modo, consideram a Cooperativa

como muito importante para suas vidas, mas entendem que ela ainda pode melhorar muito

sua condição de agenciadora de trabalho para os cooperados, otimizando sua prestação de

serviços através de maior divulgação da mesma.

Entendem também que as falsas cooperativas, denominadas fraudoperativas

ou gatoperativas, têm prejudicado o desenvolvimento e o trabalho das Cooperativas

verdadeiras. Sobre estas pseudo-cooperativas falaremos num tópico à parte.

Os cooperados têm esperança de que as empresas, com o passar do tempo,

percam o receio de contratar os seus serviços e esperam ainda que as empresas deixem de

fazê-lo apenas para aqueles trabalhos de natureza eventual (atividades meio), passando a

fazê-lo também nas suas outras tarefas diárias (atividades fim), como acontece, por

exemplo, entre outras, na Coopercivil – Cooperativa de Trabalhadores na Construção

Civil de Ituverava, que faz parte de nossa pesquisa de campo e de quem falaremos

oportunamente.

Um dado que nos chamou muito a atenção foi o fato de nenhum cooperado

ter demonstrado interesse em fazer parte do quadro de funcionários ou ser contratado por

quaisquer das empresas para as quais prestam serviços ou outras. A maioria dos que se

manifestaram sobre este assunto disse que se sente mais à vontade trabalhando na

Cooperativa ou mesmo que, se nelas não estivessem, não se dariam bem como empregados

registrados.

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CAPÍTULO 5 AS COOPERATIVAS DE TRABALHO E A REDUÇÃO DE CUSTOS

DE PRODUÇÃO

5.1 As Cooperativas de Trabalho realmente proporcionam redução de

custos para as empresas?

Em nossos contatos com as empresas tomadoras dos serviços da Coopetraf,

separamos as empresas pesquisadas em dois grupos, considerando os seus portes, para os

padrões de Franca. Consideramos, para os fins a que se destinam este trabalho, os seus

faturamentos e número de empregados. Assim, empresas com mais de 100 funcionários e

cujo faturamento se situa acima de R$ 1 800 000,00, foram consideradas como de grande

porte. As, com faturamento e número de funcionários inferiores, foram consideradas como

de pequeno porte.

No grupo de empresas de pequeno porte, após a tabulação dos dados obtidos

em nossa pesquisa, pudemos verificar que, em média, o custo, na contratação da mão-de-

obra cooperativada não é levado em conta como fator de tomada de decisão. O que conta,

efetivamente, é a necessidade de a tarefa ser realizada. Se a empresa necessita efetuar uma

entrega de mercadoria comercializada, ou o caminhão precisa ser carregado ou

descarregado, ela telefona para a Cooperativa e pede um número de trabalhadores de

acordo com a necessidade e o volume do serviço a ser realizado. Como o valor do serviço,

normalmente, é tabelado, essas empresas apenas se preocupam em que a tarefa seja

executada adequadamente.

Quando inquiridas sobre a qualidade do trabalho realizado pelo pessoal da

cooperativa, responderam que é boa, mas que não têm muita preocupação com isso porque

sempre contratam a cooperativa e o trabalho, além de não interferir em seus negócios, é

bom. Nenhuma empresa declarou indicar este ou aquele trabalhador cooperativado para

realizar suas tarefas. Confiam esta responsabilidade à própria Cooperativa. Todos os

trabalhos realizados são na área de produção.

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Inquiridos sobre se e quanto suas empresas estavam reduzindo custo, três

empresas não souberam ou não quiseram responder. Duas entendem que a redução de

custo na área específica é da ordem de até 5% e que, em termos globais de redução de

custos, disseram que até 2%.

Disseram ainda que os trabalhadores da Cooperativa são eficientes e

dedicados e que, em média, são mais dedicados que o pessoal próprio da empresa. Não se

registraram conflitos ente o pessoal próprio e o da Cooperativa, quando da realização de

tarefas conjuntas, na empresa ou fora dela. Apenas uma empresa mostrou interesse na

contratação e efetivação de pessoal da Cooperativa para seus próprios quadros, quando e se

houver necessidade, e nenhuma delas realiza supervisão direta das tarefas realizadas pelos

trabalhadores cooperativados. 60% delas tomam o serviço da cooperativa até duas vezes

por semana.

Nenhuma das empresas disse acompanhar a remuneração desses

trabalhadores por parte da Cooperativa e nenhuma delas teve problemas trabalhistas

relacionados com esta tomada de serviços, mas todas declararam já ter tido este tipo de

problema com outros trabalhadores eventuais, não ligados à Cooperativa. Todas esperam

que a legislação trabalhista brasileira se adeqüe a esta nova modalidade de relacionamento

capital x trabalho e que, com a sua popularização, ele seja amplamente aceito.

Nenhuma das empresas teve quaisquer questionamentos civis ou trabalhistas

decorrentes dessa tomada de serviços, sendo assim, concluímos que talvez tenha sido este

o motivo de todas recomendarem este tipo de prestação de serviços para outras empresas,

além de, no futuro, aceitarem discutir este tema novamente.

A conclusão dessa pesquisa com empresas de pequeno porte é que, embora

elas sejam tomadoras assíduas de mão-de-obra cooperativada e não ter a redução de custos

como fator determinante dessa contratação, elas o fazem também porque, necessitando de

mão-de-obra de natureza eventual e não precisando ter um ou mais funcionários ociosos

aguardando o momento de realizá-las, contratar a Cooperativa é fator de tranqüilidade

quanto a possíveis questões trabalhistas, o que normalmente acontece quando se contrata

trabalhadores avulsos, de caráter eventual. Estas empresas tomam esta prestação de

serviços porque se sentem, de certa forma, seguras quanto ao fato de não estarem

incorrendo em algum ilícito penal.

A seguir, transcrevemos os resultados das pesquisas levadas a efeito junto às

empresas de grande porte de Franca e, como já apresentamos, neste trabalho, assim

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consideradas aquelas com número de funcionários a partir de 100 e/ou faturamento a partir

de R$ 1 800 000,00.

Os números apresentados por estes tomadores também são significativos,

uma vez que esta opção pode implicar, muitas vezes, a redução de seu quadro de

funcionários. Nenhuma das empresas pesquisadas admitiu, abertamente, haver estimulado

seus ex-funcionários a se organizarem em Cooperativas de Trabalho ou aventado a

hipótese de, em estes se organizarem em Cooperativas, voltarem a prestar serviços para a

empresa, mas sabemos, pela leitura do trabalho de Faria: (1999, p. 133)

Os sapateiros francanos foram estimulados, através

do Sindicato da Indústria de Calçados de Franca, (grifo

nosso) a optar por trabalhos cooperativos, da mesma

forma que aconteceu no ‘Vale dos Sinos’ – no Rio Grande

do Sul. Assim, no início de 1996, deu-se o começo de um

movimento na cidade, com a finalidade de organizar e

instalar duas Cooperativas de Trabalho – ‘Arco Iris

Cooperativa de Calçados Ltda.’ e a Cooperativa

Francana de Shoemakers, conforme noticiado no jornal

‘Diário da Franca’, de 25 de abril de 1996, p. 51.

Destacando que elas (as cooperativas) seriam constituídas

por ex-funcionários e/ou sapateiros desempregados.

Como o Sindicato da Indústria é o órgão representativo da classe patronal,

podemos inferir que tal fato tenha acontecido. No entanto, queremos deixar observado que

as Cooperativas, objeto de nosso trabalho, não prestam serviços à industria de calçados em

suas atividades-fim, portanto, o que afirma Faria pode realmente não ter acontecido nessas

empresas.

Como resultado das pesquisas nessas empresas, temos informações bastante

próximas às de pequeno porte. Destaque-se o fato de que estas empresas estão

profundamente preocupadas em reduzir custos e, mesmo sendo a contratação de mão-de-

obra da Cooperativa destinada às suas atividades meio e terem caráter eventual, sempre

que podem, negociam com a Cooperativa uma redução no valor do serviço a ser

desenvolvido.

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Todas as empresas pesquisadas consideraram a qualidade do serviço

prestado, como muito bons e dentro de suas expectativas. Como nas empresas de pequeno

porte, nenhuma disse indicar este ou aquele trabalhador para realizar determinadas tarefas.

Igualmente confiam às mesmas ao bom senso das pessoas encarregadas dessa distribuição,

por parte da Cooperativa.

No aspecto de redução de custo, mesmo considerando a eventualidade da

prestação, essas empresas nos informaram que têm os seus custos específicos reduzidos em

cerca de 12%. Como o custo operacional dessas atividades influem diretamente no valor de

seus estoques, quando do recebimento de matérias-primas e nas despesas com vendas,

quando da realização do negócio, disseram que, a economia global de custos na atividade é

de cerca de 2,5 a 3,0%.

Como podemos observar, estes números são bastante próximos aos das

empresas de pequeno porte. No entanto, há que se considerar que aquelas não têm uma

preocupação acentuada com o fator custo, enquanto estas exercitam um controle mais

efetivo e rigoroso sobre este item.

As tarefas, na maioria dos casos, são realizadas no ambiente das empresas.

Este fato, segundo suas declarações, não causam embaraços no relacionamento com os

funcionários da empresa, mesmo quando da sua realização conjunta. Nenhuma delas

demonstrou interesse em contratar empregados oriundos da Cooperativa, quando e se

houver necessidade de contratação.

Estas empresas declararam não efetuar supervisão direta dos trabalhos

desenvolvidos pela Cooperativa, mas declararam que, ao término das tarefas, verificam a

qualidade dos serviços realizados e todas tomam os serviços da Cooperativa pelo menos

duas vezes por semana.

Com exceção de uma empresa, as demais declararam jamais ter tido

problemas de ordem trabalhista com a utilização de mão-de-obra cooperativada e todas,

como as de pequeno porte, esperam que a legislação brasileira pertinente ao assunto seja

flexibilizada para que as atividades das Cooperativas de Trabalho possam ser expandidas.

Perguntadas sobre se indicariam este tipo de prestação para outras empresas, nenhuma se

mostrou contrária a fazê-lo.

A empresa que teve problemas com esta contratação junto à Justiça do

Trabalho, segundo suas declarações, foi obrigada a firmar junto ao Tribunal Regional do

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Trabalho da 15ª Região, sediado em Campinas (SP) um Termo de Compromisso, onde se

comprometia a não mais contratar trabalhadores pelo sistema de Cooperativas de Trabalho.

A conclusão a que chegamos, analisando-se os dados fornecidos pelas

empresas de grande porte não foi diferente das de pequeno, a não ser pelo detalhe da

preocupação com a redução de custo na área de produção, mesmo que o trabalho

desenvolvido pelos cooperados da Coopertraf o sejam em atividades meio. Estas empresas,

no entanto, demonstraram maior conhecimento das implicações legais e mesmo

administrativas dessa contratação e têm a redução de custos como fator principal na

contratação da mão-de-obra cooperativada.

Importante notar que todas essas empresas, as de pequeno e grande portes,

citadas nos parágrafos imediatamente anteriores, não utilizam a mão-de-obra cooperativada

em suas atividades-fim. Antes de trazermos e comentarmos os resultados obtidos com as

empresas que se utilizam dessa prestação nas suas atividades fim, queremos abrir um

espaço, neste trabalho, para comentarmos sobre as Cooperativas de Trabalho abertas com

a finalidade específica de fraudar a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

Para que não restem dúvidas sobre Cooperativas de Serviços e Trabalho, se

é que dúvidas ainda restem, vamos voltar à definição do que seja Cooperativa de Trabalho,

seus objetivos, surgimento no Brasil, sua formação e organização social e administrativa.

Vamos também compará-las com outras empresas não cooperativas, com destaque aos

aspectos dos encargos sociais para as empresas, além de outros temas relevantes e que,

esperamos, venham enriquecer este trabalho.

Desde sua gênese, passaram-se cerca de 156 anos em que o cooperativismo

cresce e se consolida, nos mais diversos aspectos da atividade humana, notadamente em

seu sentido econômico. A antiga idéia e os ideais que nortearam os Pioneiros continuam os

mesmos desde a fundação da primeira Cooperativa, em Rochdale, Inglaterra, em 1844.

Sabemos que os 28 artesãos que haviam perdido os seus postos de trabalho para as

primeiras máquinas modernas da nascente revolução industrial (tudo a ver com as

modernas técnicas robóticas de nossos dias), e por essa mesma revolução, foram

incentivados a buscar alternativas que lhes permitissem sobreviver, criaram a primeira

Cooperativa que se tem notícia no mundo e sua atividade era focada na atividade têxtil.

Como bem define Queiroz27

27QUEIROZ, Carlos Roberto S.R. de, Manual da Cooperativa de Serviço e Trabalho, 1997. P. 14.

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A iniciativa tinha bom fundamento: o da

participação de todos para o bem comum deles. Foi

criada uma entidade para assistir os seus sócios e

intermediar as suas profissionalidades, negociando as

suas atividades com os eventuais tomadores de serviços.

Depois de alguns anos, a primeira Cooperativa já contava

com 1.400 associados.

O crescimento foi vertiginoso. Na Europa, em 1881,

já existiam aproximadamente 1.000 Cooperativas com

mais de 550.000 associados.

Tem-se notícia de que a primeira Cooperativa de

Serviços e Trabalho surgiu na França, também

influenciada pelo mesmo motivo que levaram os ingleses

de Rochdale a formar a sua Cooperativa.

Queiroz (1997, p. 14) nos historia o Cooperativismo de Trabalho

escrevendo que este aportou na América nas primeiras décadas do século XX e que,

especificamente, no Brasil, em 1932. O Decreto Federal n.º 22 239/32 o consolidou em

nosso país. Assim é que o artigo 24 desse Decreto definia bem o que era, naquela época,

Cooperativa de Trabalho:

“Cooperativa de Trabalho aquelas que, constituídas

entre operários de uma determinada profissão ou ofício,

ou de ofícios vários de uma mesma classe, têm como

finalidade primordial melhor os salários e as condições de

trabalho pessoal dos seus associados e, dispensado a

intervenção de um patrão ou empresário, se propõem a

contratar obras, tarefas, ou serviços públicos ou

particulares, coletivamente por todos ou por grupos de

alguns”.

Esse Decreto, especificamente o seu artigo 24, vigorou incólume até 1966,

quando definitivamente revogado pelo advento do Decreto-Lei de n.º 59/66. A Lei 5 764

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promulgada em 16/12/71 disciplina a formação de Cooperativas, sejam quais forem as suas

naturezas, até hoje.

As Cooperativas têm crescido e se desenvolvido em todo o mundo,

procurando sempre as melhorias profissionais e sociais dos trabalhadores. Ainda segundo

Queiroz (1997), dados computados desde 1936 mostravam que, naquela época, elas eram

cerca de 236 000 e se desenvolviam rapidamente de tal forma que 30 anos depois, em

1966, já eram 575 000, num crescimento de 140%. Após 27 anos, num crescimento de

47%, em 1993, passaram a ser 850 000. Hoje já passaram de 1 000 000.

Existem, no Brasil, mais de 1 700 Cooperativas de Serviços e Trabalho e

que congregam mais de 1 500 000 Cooperados. O Estado de São Paulo detém cerca de

53% do total dessas Cooperativas. Mais de 60% das Cooperativas em atividades e 77% do

número de Cooperados desenvolvendo atividades de fornecimento de serviços

especializados.

Estes números, informados por Queiroz (1997), são bastante significativos,

principalmente nesse delicado momento pelo qual a economia de nosso país atravessa,

sendo obrigado, por força da globalização mundial da economia, a ofertar produtos com

ótima qualidade a custos baixos, uma tendência mundial, portanto, mas que, por força do

fechamento da economia e do mercado, que nos foram impostas pelos governantes

militares de 1964 a 1985, fez com que o Brasil perdesse competitividade, mercados e,

podemos até dizer, esqueceu-se de produzir com qualidade a custos competitivos.

O autor divulga os resultados de uma pesquisa levada a efeito no Brasil com

500 empresas, na região centro-sul do país, que se utilizam de mão-de-obra de

trabalhadores cooperativados. Os resultados obtidos publicados na imprensa foram os

seguintes:

• 92,5% vêem como uma boa opção para terceirizar

• 12,2% afirmam que reduz o investimento na mão-de-obra

• 19,1% observaram um aumento na qualidade dos serviços

• 9,3% acham que é uma boa opção para quem procura trabalho

• 8,6% opinam que desenvolvem serviços especializados com

profissionais capacitados

• 5,8% observaram que não há os encargos trabalhistas tradicionais

• 5,8% afirmaram que aumentou a produtividade

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• 65,4% observaram que vai crescer a terceirização com

Cooperativas.

Normalmente, as Cooperativas são contratadas para desenvolverem a

terceirização na área de serviços de apoio.

Atualmente, das Cooperativas constituídas em São Paulo, 70% são de

Serviços e Trabalho.

Poderíamos entender os objetivos das Cooperativas de Serviços e Trabalho

pela sua própria definição. Mas entendemos ser insuficiente tal definição pela alta nobreza

dos objetivos verdadeiramente alcançados. Assim, tomamos por empréstimo a definição de

objetivos propostos por Queiroz (1997, p. 28, 29)

a) Melhoria da renda de seus associados

conseguindo valorizar o trabalho e obtendo melhor

negociação com referência à remuneração. Atuando como

um todo, o sistema cooperativo fiel aos seus princípios,

desenvolve o excedente gerado pelo trabalho coletivo aos

seus associados, na mesma proporção da quantidade e da

qualidade do trabalho prestado. As sobras não

privilegiam o capital, mas o trabalho na medida correta

da sua contribuição. Essas sobras se caracterizam como

uma remuneração adicional aos cooperados.

b) Incrementos nas condições do trabalho na

medida em que a cooperativa transforma trabalhadores

em empresários determinando, em conjunto e de forma

democrática, as regras da atuação da cooperativa. Os

direitos são garantidos pelo estatuto de tal forma que

garante ao associado a possibilidade da ação civil,

quando qualquer direito estatutário tiver sido violado. A

assembléia Geral é o órgão cooperativo decisor dos

destinos da Cooperativa. Os direitos sociais são

estatutários visando resguardar a predominância do

trabalho sobre o capital.

c) Melhorar a promoção dos trabalhadores, pois

estes ao adquirirem o “status” de empresários tornam-se

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auto gestores de suas próprias atividades. A praxe

solidária demanda a restrita obediência aos princípios

cooperativos, sendo o mais importante o da “livre

adesão”. Esta deverá ser consciente, voluntária, sem

constrangimentos ou pressões, sob pena de não existir a

caracterização da sociedade cooperativa. Os cooperados

precisam conhecer os seus direitos e deveres e terem uma

clara noção das obrigações associativas.

O autor ainda destaca a importância de os Cooperados estarem motivados

para o desenvolvimento de determinada atividade cooperada para um tomador, para que os

trabalhos sejam prestados de forma eficiente e com resultados eficazes, e isto somente será

possível se não houver interrupção ou a flutuação da mão-de-obra cooperada.

Ensina-nos Ferreira28 que as cooperativas surgiram há mais de 150 anos na

Inglaterra, formada por pessoas com recursos financeiros escassos e que se reuniam, sem

objetivar lucros mas, juntando seus esforços, procuravam satisfazer suas necessidades

básicas.

Outra importante definição é de Mendonça29, que assim define as

cooperativas:

São institutos modernos, tendentes a melhorar as

condições das classes sociais, especialmente dos pequenos

capitalistas e operários. Elas procuram libertar essas

classes da dependência das grandes indústrias por meio

da união das forças econômicas de cada um; suprimem

aparentemente o intermediário, nesse sentido, as

operações ou serviços são realizados ou prestados aos

próprios sócios e é exatamente para esse fim que se

organiza a empresa cooperativa: diminuem despesas, pois

que, representando o papel do intermediário, distribuem

os lucros entre a própria clientela associada; em suma,

28 FERREIRA, Waldemar, Tratado de Direito Comercial, Saraiva: São Paulo, 1960, p. 503. 29 CARVALHO de Mendonça, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, Freitas Bastos: Rio de Janeiro,

1959, vol. 4, título 7, p. 241.

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concorrem para despertar e animar o hábito da economia

entre os sócios.

Muito vigorosa a definição de Carvalho de Mendonça. Se o autor nos

permitisse, apenas faríamos um pequeno reparo em sua brilhante citação: substituiríamos o

termo lucro, que em Cooperativas não se aplica, pelo termo sobra, que é o que se verifica

nas sociedades cooperativas, que, sendo uma sociedade de pessoas e não de capital, não

objetivam o lucro. Mais que semântica, esta é uma questão conceitual.

Discorrendo sobre o objetivo da Cooperativa, assim se manifesta Cavalcante

Júnior30:

O objetivo da cooperativa é, através da união de

esforços e capital, propiciar benefícios aos cooperados,

mediante a distribuição de lucros na proporção do

trabalho prestado pelos sócios, dentro do espírito de

mútua ajuda. Há nas sociedades cooperativas uma

duplicidade nas funções de empregado e patrão, porque

ambos realizam simultaneamente o trabalho de execução

e de direção com repartição dos lucros entre os sócios.

Novamente a idéia de lucro, segundo o nosso entendimento, utilizado de

forma diferenciada. Bem sabemos que a intenção do autor quanto a essa referência, é que

se tratam de sobras, mas reiteramos e estendemos a Cavalcante Júnior, a observação que

fizemos a Carvalho de Mendonça quanto à utilização do termo. Destaca Cavalcante Júnior

que a primeira normalização das cooperativas no Brasil se deu com a promulgação da Lei

1 637, em 1907, que em seu artigo 10 disciplinava:

As sociedades cooperativas que poderão ser

anônimas, em nome coletivo ou em comandita, são

regidas pelas leis que regulam uma dessas formas de

sociedades, com as modificações estatuídas na presente

lei”, o que foi regulamentado pelo Decreto n.º 22 239/32.

30 CAVALCANTE JÚNIOR, Ofhir, A Terceirização das relações laborais, LTr: São Paulo, 1996, p. 64.

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Sabemos que, hoje, as sociedades cooperativas são regidas pela Lei

n.º 5 764/71. Muito já se falou sobre essa lei, neste trabalho, mas retornamos ao seu artigo

4º, para novamente falarmos sobre a definição de cooperativas: “sociedade de pessoas,

com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência,

constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades

pelas seguintes características:”. A seguir, a Lei elenca onze itens que caracterizam as

sociedades cooperativas, os quais entendemos ser importante transcrevermos:

I – adesão voluntária, com número ilimitado de

associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de

serviços;

II – variabilidade do capital social, representado

por quotas-partes;

III – limitação do número de quotas-partes do

capital para cada associado, facultado, porém, o

estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se

assim for mais adequado para o cumprimento dos

objetivos sociais;

IV – inacessibilidade das quotas-partes do capital a

terceiros, estranhos à sociedade;

V – singularidade de voto, podendo as cooperativas

centrais, federações e confederações de cooperativas, com

exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo

critério da proporcionalidade;

VI – “quorum” para o funcionamento e deliberação

da Assembléia Geral baseado no número de associados e

não no capital;

VII – retorno das sobras líquidas do exercício,

proporcionalmente às operações realizadas pelo

associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia

Geral;

VIII – indivisibilidade dos fundos de Reserva e de

Assistência Técnica, Educacional e Social;

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IX – neutralidade política e indiscriminação

religiosa, racial e social;

X – Prestação de assistência aos associados, e,

quando prevista nos estatutos, aos empregados da

cooperativa;

XI – área de admissão de associados limitada às

possibilidades de reunião, controle, operações e prestação

de serviços.

Como podemos perceber através do item VII das características das

sociedades cooperativas, o termo utilizado é sobras e não lucros, como insistem alguns

autores.

SAAD (Apud Cavalcante Júnior, 1996, p. 681) destaca que a “atividade

centenária das sociedades cooperativas é largamente utilizadas em países de estágio

econômico avançado, estando plenamente incorporados à realidade jurídica, social e

econômica desses povos .“

A presença desse elemento novo nas relações laborais no Brasil criou

celeumas de toda sorte. Poderes de vida e de morte sobre o trabalho a ser executado que

eram atribuídos aos patrões foram, a partir da entrada em cena das Cooperativas de

Trabalho, delegadas aos empregados, agora travestidos de empregadores, ou de patrões,

como bem podemos dizer, uma vez que donos de seus próprios negócios. Criou-se uma

relação triangular envolvendo a sociedade, o cooperado e o cliente. Assim se manifesta

Cavalcante Júnior (1996, p. 65) quanto a esse relacionamento:

Essa triangularização, nem sempre bem utilizada e

às vezes mal-interpretada, tem sido objeto de críticas e até

mesmo de decisões judiciais preconceituosas porque

partem da premissa, equivocada, de que há fraude no

momento em que antigos empregados de empresas

desvinculam-se destas para formar cooperativas e prestar

serviços ao antigo empregador, o que não pode ser

adotado como verdade absoluta e muito menos como

regra, pois haverá necessidade de, em cada caso,

examinar a situação verificando a existência de fraude.

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O que não se pode admitir é que haja o

engessamento da economia e o comprometimento de

postos de trabalho pela resistência, muitas vezes

injustificada, de certo segmento doutrinário e da

jurisprudência, que, contrariamente à tendência mundial

da desconcentração das atividades empresariais, continua

preso ao mito do emprego típico.

A Lei 8 949/94 é o ordenamento jurídico que regulamenta a terceirização da

prestação de serviços por parte das sociedades cooperativas. Essa Lei acrescentou ao artigo

442 da CLT, o seguinte parágrafo: “Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade

cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e

os tomadores de serviços daquela.”

Uma parte do Poder Público, aqui representado pelo Ministério do Trabalho,

observando a necessidade de impor disciplina e fiscalizar a contratação de mão-de-obra por

parte das empresas tomadoras de serviços de sociedade cooperativas, editou a Portaria

GM/MTb n.º 925, de 28/09/95 (DOU 29/09/95), que, em total desrespeito à Lei 5 764/71 e

à Carta Magna de 1988, avocou para si o direito e a competência a seus fiscais de

realizarem levantamentos físicos com a finalidade de detectar a existência de requisitos da

relação de emprego entre a empresa tomadora e os cooperados, nos termos do artigo 3º da

CLT.

Destacamos, novamente a opinião de Cavalcante Júnior (1996, p. 66) quanto

a esta postura do Poder Público:

Com efeito, a Portaria em tela é de uma ilegalidade

que, para dizer o mínimo, assusta qualquer operador do

Direito, primeiro porque se arreda da missão institucional

do órgão administrativo conferindo poderes aos fiscais do

trabalho de, examinando a situação, decidir acerca da

existência de relação de emprego, matéria da exclusiva

alçada do Judiciário trabalhista (At 114, CF) e segundo

porque tenta, em verdade, revogar a Lei, onde está dito,

com todas as letras, inexistir vínculo de emprego entre as

cooperativas e seus associados, o que não pode ser aceito.

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O procedimento do Ministério do Trabalho

demonstra que há segmentos do Poder Executivo que

laboram contra o desenvolvimento econômico, apeando-se

em premissas falsas para editar Portarias ilegais que

prejudicarão em sem-número de iniciativas no sentido de,

através da terceirização das relações de trabalho, criar

novos empregos.

Como podemos ver, a idéia do Cooperativismo de Trabalho não é recente.

Não se trata aqui de definir modismos ou aventuras, mas, apenas, de reafirmar uma idéia e

a existência de uma instituição que existe e funciona sesquicentenariamente. Se é que se

necessite de alguma reafirmação. Abusos existem, não os podemos negar. Mas considerar

as Cooperativas de maneira geral, fraudulentas, nos parece um abuso de poder e de

autoridade que vai além do permitido à magistratura. Benato31, aborda este assunto ao

criticar, de forma veemente, a ingerência do Poder Judiciário na vida das Cooperativas de

Trabalho. Diz-nos o autor:

...Há uma Lei datada de Dezembro de 1971, a 5 764,

que disciplina, orienta e determina o ‘modus operandi’

das cooperativas.

Não é uma Medida Provisória, não é um Decreto-

Lei, não é uma simples Portaria. É uma LEI. Sancionada

em 16 de dezembro de 1971 pelo então Presidente Emílio

Garrastazú Médici. A própria Constituição promulgada

em 1988 não a anulou; pelo contrário, comprometeu mais

ainda o Poder Público através do § 2º do Art. 174.

A Justiça do Trabalho, no entanto, bem como alguns

magistrados do Ministério Público entendem ser a C.L.T.

- Consolidação das Leis do Trabalho – a única verdade

intransigente de defesa do trabalhador. Ora, bem o

sabemos, que o trabalhador não é apenas o assalariado.

Trabalhador é, também, quem contrata o assalariado.

31 BENATO, João Vitorino Azolin, Cooperativa de Trabalho, o Gigante Acorda, 1997. P. 39-42.

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A C.L.T. não entende e não compreende esta

bilateralidade. Outorga ao assalariado todos os

benefícios e ao trabalhador empregador o ônus e as

obrigações.

O autor continua em sua sanha defensiva das Cooperativas de Trabalho,

citando o fato que, a partir da década de 80, com o início do processo de globalização da

economia, em que as empresas buscaram a produtividade através da tecnologia e muitos

trabalhadores perderam seus empregos e, a partir desse episódio, valem-se da experiência

de cooperativistas militantes no desenvolvimento profissional individual para a

implantação das Cooperativas de Trabalho, citando exemplos de Unimed’s, Uniodontos,

Unipsicos, Processamento de Dados, Condutores de Veículos e outras, tanto urbanas

quanto rurais. Ele continua:

O volume assustou os detentores da verdade

celetista e aos sindicatos, que até então, nada faziam aos

seus filiados. Entenderam eles que tal crescimento viria

prejudicar interesses comuns, bem como dificultar a

aplicação do dogma celetista. Movimentaram-se e outros

oportunistas se agregaram ao movimento, principalmente,

advogados trabalhistas, juizes classistas e outros juizes

trabalhistas.

Criaram o anti-cooperativismo desprezando a Lei

número 5 764/71 e a Carta Magna.

A eles pouco valia tem que mais de 30% (trinta por

cento) dos assalariados brasileiros não possuem carteira

profissional. A eles pouco valia tem que o mercado

informal mantém ativados 45% (quarenta e cinco por

cento) da população ativa brasileira. A eles pouco valia

tem que 80% (oitenta por cento) dos trabalhadores

brasileiros percebem um salário mínimo pelo seu

trabalho.

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Benato (1997,p. 40) faz outros comentários. Segundo ele, sindicatos e

advogados, bem como certo juizes, são contra as Cooperativas de Trabalho porque estas

confrontam os sindicatos inoperantes e alienantes, neutralizando a indústria das demandas

trabalhistas. O autor cita como relevante o fato de as Cooperativas existirem muito antes

dos sindicatos e da C.L.T. e que esta conduta de oposição ocasionou e tem ocasionado

prejuízos a milhares de famílias, principalmente as da zona rural, teoricamente mais

influenciáveis. Segundo suas palavras, ... nem Stalin e Hitler em seus desmandos

praticaram tanta arbitrariedade. E o Poder Executivo, o solidário e co-responsável

constitucional pelo incremento do cooperativismo, cruza os braços e prefere

emudecer.(Benato, 1997, p. 40-41) Diz o autor, que a arbitrariedade dos ‘defensores’ do

assalariado chegou ao ponto de o Ministério do Trabalho editar um Manual de

Cooperativas, que o contribuinte pagou, em que os erros cometidos pela autora vão da

citação de artigos suprimidos da Lei 5 764/71, através da Constituição de 1988, a apelos

contidos no Artigo 24º, do Decreto 22 239/22, já revogado. Ainda segundo Benato (1997,

41-42), nesse emaranhado de conceitos e indagações contidos no Manual, a autora, Dra.

Ruth Beatriz V. Vilela, Secretária da Fiscalização do Trabalho à época, 1997, outorga

poderes de Agente de Inspeção do Trabalho para verificar se a Cooperativa atende a todos

os requisitos da Lei 5 764/71, dentre os quais destaca que o agente deverá observar:

“1) Se a Cooperativa atende ao princípio da Dupla Qualidade

preconizados pelo artigo 4º da Lei 5 764/71;

2) Se a Cooperativa atende ao Princípio da Redistribuição Pessoal

Diferenciada.

O autor zomba do Manual de Cooperativas quando diz que “será necessário

editar um novo Manual para explicar e interpretar o Manual de Cooperativismo editado

pelo Ministério do Trabalho” Pede ainda que o Poder Público fiscalize com firmeza e

personalidade os desvios da Lei e que unam competência e capacidade para atender os três

vocábulos que imprimem a vinculação trabalhista, citando:

Subordinação: Não queirais estatui o conceito que

em sendo o sócio da cooperativa um trabalhador

autônomo, não poderá ele ter subordinação para com a

sociedade. Sua subordinação não é individual e, sim,

coletiva por ser a sociedade, uma sociedade de pessoas.

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Não poderá haver subordinação do cooperado ao

tomador do serviço.

Pessoalidade: Individualidade profissional do sócio

que pode executar o trabalho.

Eventualidade: Há contratos que dispensam o

período de trabalho. Nem sempre, portanto, a

eventualidade é sintoma de vínculo.

A existência destas três situações, senhores agentes

do Ministério do Trabalho, é suficiente para constatar o

vínculo empregatício.

A ausência de uma delas, descaracteriza o vínculo.

Esta expressão é milenar e persiste quando se quer

identificar a verdade e relegar a mentira”.

O assunto é controverso. Se por um lado, temos que uma parte do Poder

Público incentiva a organização e a criação de Cooperativas, de outro temos que, alguns

legisladores entendem o assunto de maneira diferente e são manifestamente contra a

atuação das Cooperativas como agenciadoras de trabalho profissional. A Constituição de

1988, em seu art.174, parágrafo 2.º, apoia a criação de Cooperativas, vejamos:

Art.174 – Como agente normativo e regulador da

atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da Lei,

as funções de fiscalização, incentivo e planejamento,

sendo neste determinante para o setor público e indicativo

para o setor privado.

Parágrafo 2.° - A Lei apoiará e estimulará o

cooperativismo e outras formas de associativismo.

Podemos observar, então, que há uma clara tendência a se conceder às

Cooperativas um tratamento, no mínimo, diferenciado, para não dizermos preferencial.

Existem notícias de que, em razão da reforma administrativa perpetrada pelo governo

federal, algumas entidades do governo têm incentivado seus ex-funcionários a organizarem

Cooperativas de Serviços e Trabalho.

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A Constituição do Brasil exige Leis a favor do cooperativismo. Alguns

Estados da Federação, notadamente os da região sul, já desenvolvem ações específicas de

incentivo ao Cooperativismo há muito tempo. A Constituição do Rio Grande do Sul, em

seu artigo 163, diz o seguinte:

Art. 163 – incumbe ao Estado a prestação de

serviços públicos, diretamente ou através de licitação, sob

o regime de concessão ou permissão, devendo garantir-

lhes qualidade.

Parágrafo Primeiro – Na hipótese de privatização

de empresas públicas e as sociedades de economia mista,

os empregados terão preferência em assumi-las sob a

forma de Cooperativas.

Como contrários às Cooperativas de Trabalho, além de parte do Poder

Público e como já dissemos, temos uma parte da mídia, no caso a escrita, que comumente

volta ao assunto quando se trata da divulgação e dados negativos relacionados ao

cooperativismo. A título de ilustração, o jornal Folha de São Paulo32,, em publicação de 18

de janeiro de 1998, critica de forma bastante expressiva a perda, por parte dos

trabalhadores, dos benefícios garantidos pela C.L.T., em razão de estarem fazendo parte de

Cooperativas de Trabalho e não mais estarem trabalhando com suas carteiras assinadas.

O articulista desenvolveu o seu trabalho de reportagem nas cidades de Fortaleza, no Estado

do Ceará, Brasília/DF e em Araraquara, Estado de São Paulo. Diz o autor na introdução de

sua reportagem:

Há uma esperteza perversa sendo cometida contra

os direitos trabalhistas de uma multidão de brasileiros.

Entre 2,5 milhões e 3 milhões de cidadãos, pouco menos

de 10% da população economicamente ativa do país, já

trocaram o trabalho assalariado com carteira assinada e

direitos trabalhistas consagrados – como repouso

semanal remunerado e as férias ao final de 12 meses

32 Folha de São Paulo: Cooperativas deixam 2,5 mi sem direitos. 18/01/98 p.12 e13.

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ininterruptos de trabalho – por vínculos autônomos com

empresas intermediados por ‘cooperativas de ocasião’.

Estas cooperativas são fundadas com o fim

específico de servir a determinadas empresas. Criadas sob

a Lei das Cooperativas, que transforma os sócios destas

entidades em autônomos, tais “cooperativas de ocasião”

são contratadas por empresas, por prefeituras do interior

e até por hospitais para prestar serviços específicos.

Contratando-as, as empresas ou prefeituras não

pagam impostos ou contribuições sociais sobre o salário

de seus funcionários – transformados em cooperados –

nem estão obrigadas a respeitar princípios fundamentais

da legislação trabalhista como as férias após 12 meses de

trabalho, repouso semanal remunerado, licenças

maternidade e paternidade ou depósito no Fundo de

Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

A reportagem cita a região nordeste do Estado de São Paulo, onde 45 mil

trabalhadores nas colheitas de laranja foram obrigados a se dobrar aos contratos de

trabalho por meio de Cooperativas, não podendo contar, então, com os direitos trabalhistas

descritos pelo autor, segundo o qual, na região sudeste do Brasil existem mais de 100 mil

trabalhadores da indústria da construção civil nestas condições.

O autor assim se expressa, quando se refere às Cooperativas e Trabalho da

região nordeste do Brasil:

No Nordeste, a novidade está mais disseminada. Na

Paraíba e em Alagoas tenta-se reerguer o parque

industrial têxtil e ali criar pólos de fabricação de sapatos

tendo por base a contratação de trabalhadores por

cooperativas. No Ceará, tais contratações são de uma

naturalidade absurda. (grifo nosso) O maior hotel

“resort” do litoral cearense, o “Praia das Fontes Park

Hotel”, não tem nenhum empregado na sua folha de

pagamentos. Todos os seus funcionários pertencem a uma

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cooperativa criada sob medida para os serviços do

empreendimento.

A cooperativa que serve ao hotel cearense, chamada

Coosert (Cooperativa dos Profissionais em Serviços

Turísticos do Ceará), cresceu tanto que há uma semana

assinou um contrato com a prefeitura de Beberibe (a 80

km de Fortaleza) onde fica o hotel: seus cooperados serão

responsáveis pelo serviço de limpeza urbana e de

ajardinamento do município e pela manutenção do

hospital municipal.

Assim, o tesouro de Beberibe exime-se de fazer

concurso público para contratar funcionários e passa a

ter servidores sem direito a férias, a 13.º salário, a

repouso semanal remunerado ou a recolhimento do FGTS.

Todo um polo de indústrias de calçados no Ceará, cujos

produtos são destinados à exportação, foi montado sob o

regime das cooperativas de trabalho. Outros municípios,

além de Beberibe, já se preparam para contratar

funcionários públicos por meio de “cooperativas de

ocasião”.

“Isto é uma perversidade absurda. Foi um erro

imperdoável do Congresso aprovar uma lei explicitando

na C.L.T. (Consolidação das Leis Trabalhistas) que o

trabalhador contratado por uma empresa sob o guarda-

chuva de uma cooperativa não teria vínculos com seu

empregador”, protesta Almir Pazzianotto, Ministro do

Tribunal Superior do Trabalho (TST). ‘Ou foi pouco caso

com a legislação trabalhista ou foi pura

irresponsabilidade’, diz.

O atual Ministro do TST já foi Ministro do Trabalho do Brasil em governos

anteriores e quando se refere à nova redação do artigo 442 da C.L.T., quer enfatizar o fato

de que trabalhadores contratados pelas empresas, através de Cooperativas de Trabalho, não

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têm nenhum vínculo empregatício, tampouco direitos trabalhistas, com a Cooperativa ou

com as empresas que as contratam.

Esta nova redação do artigo 442 da C.L.T. foi elaborada a pedido do M.S.T.

Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, em razão do grande número de ações

trabalhistas que passou a sofrer por parte de ex-militantes que alegavam vínculo de

trabalho e emprego com o movimento, pleiteando o pagamento de direitos trabalhistas pelo

trabalho desempenhado nos assentamentos em regime de cooperativas.

José Carlos de Souza, Promotor de Justiça na cidade paulista de Catanduva

(a 350 km de São Paulo) diz, na reportagem citada da Folha de São Paulo:

Quem contrata mão-de-obra barata das

cooperativas precisa se cuidar melhor. O vínculo

empregatício não ocorre apenas pelo contrato de

trabalho, mas sim por diversos tipos de relação: Quem

paga o salário? Quem dá ordens no empregado? Quem

determina o ritmo da atividade produtiva do funcionário?

Quando fica caracterizado que se falsifica uma

cooperativa apenas para burlar o Direito do Trabalho e

não recolher direitos sociais, impostos e taxas sobre

trabalho assalariado, o contratador da cooperativa terá

que pagar como um empregado normal.

O repórter menciona o Deputado Aloysio Nunes Ferreira que, tendo votado

favoravelmente ao projeto em 1995, considera agora que cometeu um erro e já redigiu,

apresentou e aprovou na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei retirando da C.L.T. o

artigo 442. Apresenta ainda declarações de vários trabalhadores que se dizem prejudicados

por terem que adotar o regime de trabalho através das Cooperativas de Trabalho, como se

de fato, fossem obrigados a tal proceder.

Mas nem todos os tomadores de mão-de-obra preferem a utilização da mão-

de-obra cooperativada. A Grendene, dona de sete fábricas de calçados somente no Estado

do Ceará, diz achar o sistema de mão-de-obra cooperativada desleal e que prefere pagar os

direitos dos trabalhadores a contrata-los através das cooperativas. Sua sede em Farroupilha

(RS) tem 600 funcionários e a empresa diz ter recebido incentivos do governo do Ceará

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para sua transferência para aquele Estado. A reportagem não menciona quanto recebem os

trabalhadores com registro em carteira no Rio Grande do Sul e quanto recebem seus

patrícios cearenses. Na opinião de Rudimar Dalonder, Diretor de Produção Geral da

Grendene, que responde pelas unidades fabris do Ceará, esse tipo de relacionamento não

vai dar certo:

Não acredito na lisura das cooperativas que estão

servindo aos nossos concorrentes no Ceará. Preferimos

pagar os direitos trabalhistas de todos os empregados,

mesmo onerando a folha de pagamento em 100%, a

depender de cooperativas de trabalho formadas por

ocasião. Isso vai dar errado. Acho desleal concorrer com

indústrias que recorrem ao modelo de cooperativas. Elas

acabam tendo um custo menor que o nosso.

Dalonder faz menção a várias outras empresas no Ceará que utilizam mão-

de-obra das cooperativas, conseguindo, por conseqüência, oferecer produtos com custos

mais baixos que os seus. No Estado do Ceará, somente para atender ao setor calçadista,

existem cerca de 3 500 trabalhadores cooperativados.

A Justiça Trabalhista brasileira, inicialmente, considerava a empresa

tomadora dos serviços como responsável, a priori, pelos recolhimentos dos encargos legais

trabalhistas, no que diz respeito aos empregados das empresas prestadoras. Assim, caso as

empresas prestadoras de serviço deixassem de recolher os encargos sociais de sua

responsabilidade, decorrentes do labor de seus empregados, estes, em uma lide trabalhista,

viriam a ser cobrados das empresas tomadoras dos serviços.

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5.2 Mas afinal, o que são as pseudoperativas?

As cooperativas verdadeiras são aquelas constituídas, operacionalizadas e

fundamentadas na Lei 5 764/71.

Queiroz (1997, p. 69) reconhece haver um certo abuso na interpretação do

art. 442 da CLT e assim se manifesta:

‘O art. 442 – § único da CLT diz que qualquer que

seja o ramo da atividade e não qualquer que seja o modo

de execução dos serviços. O entendimento correto desta

afirmativa é fundamental para avaliarmos qual seria a

atitude correta na relação entre Cooperativa e Cooperado’.

Todas aquelas cooperativas que se valem da lei, mas, na prática, funcionam

ou operam ao arrepio da Lei, são consideradas como pseudocooperativas. Em outras

palavras, o modo como a cooperativa opera é o fator determinante de sua legalidade. Os

serviços que vierem a ser executados por essas Cooperativas devem ser de tal modo que

não deixem dúvidas quanto à lisura e à legalidade da cooperativa.

Utilizando-nos de uma definição de Queiroz (1997, p.119), Fraudoperativa:

É a Cooperativa criada anomalamente, ou seja,

organizada única e exclusivamente com a intenção de

simular uma situação pseudolegalizada, apenas para se

aproveitar de uma oportunidade, para tirar vantagens

econômicas de uma determinada ocasião’.

O autor destaca ser a típica cooperativa formada de maneira impositória,

compulsória, na maioria das vezes, conduzidas por pessoas sem quaisquer escrúpulos que,

por força do convencimento, induzem os trabalhadores a fazerem parte de uma cooperativa

de trabalho, mas não lhes desvendam o que seja realmente uma cooperativa, seus direitos e

obrigações. Na verdade, esses trabalhadores são induzidos a assinarem muitos papéis e

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documentos dos quais não têm conhecimento ou são incapazes de discernir sobre suas,

importâncias, e grau de riscos que correm, a partir daí.

Geralmente, são prepostos de tomadores dos serviços da Cooperativa que

estão por trás dessas organizações, os quais, segundo temos notícias, assumem o papel de

procuradores dos cooperados e por eles decidem segundo seus próprios interesses e os de

seus tomadores. São os chamados donos da Cooperativa, perpetuando-se na sua direção, na

intenção de controlá-las sempre e manterem as suas fontes de rendimento e o interesse dos

tomadores.

Outra forma de Cooperativa fraudulenta são aquelas denominadas

Gatoperativa ou Coopergato. São Cooperativas de altíssimo risco, muito parecidas com as

Fraudoperativas. Geralmente constituídas por chefes de turma, atendem aos interesses dos

mesmos e dos tomadores dos serviços. São mais atrevidos e não dissimulam suas

condições. Existem aqueles que se consideram donos da Cooperativa e nela colocam seus

próprios nomes, como por exemplo CooperDaniel, CooperCarlos etc.

O trabalho de convencimento dos trabalhadores para que dela participem é

feito por processo de dissimulação e ilusão da boa fé dos trabalhadores, aos quais são feitas

promessas que, certamente, não serão cumpridas. Esses gatos não esclarecem

suficientemente os associados no momento de seus ingressos e estes acabam assinando

documentos dos quais, também, não conhecem o teor ou a finalidade. Quando descobrem

que caíram em armadilhas, já estão de tal forma envolvidos que, muitas vezes, mal

conseguem voltar aos seus locais de origem.

Estas Cooperativas normalmente contratam esses trabalhadores fora de seus

locais de atuação, transportando-os para os locais onde os trabalhos serão desenvolvidos,

acomodando-os em situações subumanas. Queiroz (1997, p. 122) também as cita em seu

trabalho:

As ‘fraudoperativas’, as ‘gatoperativas’ e as

‘coopergatos’ surgem com mais freqüência na área

agrícola, onde a simplicidade e a desinformação do

trabalhador é mais comum. São também encontradas nas

áreas urbanas, principalmente nos projetos de

terceirização das áreas mais simples.

Tanto na ‘fraudoperativa’, quanto na

‘gatoperativa’, os trabalhadores não são informados a

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respeito de seus direitos e obrigações como Cooperados,

proprietários quotistas das sociedade que formaram. Não

sabem o que é ser Cooperado, nem o que é uma

Cooperativa de Trabalho.

Em uma como em outras, os ‘donos’ das

Cooperativas de risco controlam as atividades dos

Cooperados e a sua remuneração. Dessa relação

procuram tirar a maior vantagem possível, pagando aos

trabalhadores cooperados nos limites que lhes interessam,

embolsando a maior parte da remuneração.

Certamente, nessas Cooperativas, os cooperados não exercem os seus

direitos de votar e serem votados, que são os direitos básicos do cooperativismo, quanto

mais participarem do rateio das sobras e outras vantagens próprias do sistema.

Normalmente, tudo é feito de forma a que não questionem os destinos da sociedade, que na

verdade, são ditados e dirigidos ao sabor do interesse dos tomadores e dos gatos que os

arregimentam e induzem.

No desenvolvimento deste nosso trabalho, no contato com as diversas

Cooperativas de Trabalho, pudemos verificar que, de maneira geral, os seus dirigentes

estão sinceramente imbuídos de boas intenções, no que diz respeito à legalidade e ao

funcionamento dessas Cooperativas.

O que eles buscam, de maneira geral, é o bem estar de seus associados e

possibilidades de mantê-los com trabalho a maior parte dos dias.

Esta também é a razão pela qual optamos por escolher, para estudo de caso e

a finalidade a que nos propomos neste trabalho, a Coopertrataf e a Concivil, uma vez que,

segundo nosso próprio entendimento, eles se nos apresentaram com transparência,

facultando-nos o acesso aos seus livros fiscais e contábeis, bem como facilitando as

entrevistas com os demais associados não diretores.

Dizer que as demais Cooperativas da cidade e região, abrangidas por nossa

pesquisa são ou não arremedos de Cooperativa ou têm finalidade precípua de burlar a

legislação e escapar da carga tributária fiscal e social imposta às demais empresas não

Cooperativas, está além do nosso alcance e foge dos objetivos a que nos propomos.

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É muito provável que das Cooperativas que entrevistamos, existam aquelas

que se prestam a tais torpezas, mas não emitiremos aqui juízo de valor no que diz respeito

às mesmas. Ficaremos com o exemplo já mencionado neste trabalho, da Cooperativa Arco-

Íris, que tendo, segundo nossa compreensão, e por termos prestado assessoria profissional

aos seus associados quando de parte do seu funcionamento, em princípio entendemos ser

ela uma Cooperativa cujos componentes eram probos e que os mesmos não se desviariam

dos princípios estabelecidos no cooperativismo. Do nosso ponto de vista, sentimos que

houve injustiça para com o tomador de seus serviços, que teve que se curvar à imposição

da Lei, que o obrigou a reconhecer o vínculo trabalhista, impondo, ainda, sanção

pecuniária ao tomador em favor dos cooperados da mesma.

Reiteramos aqui o fato de que nem todos os cooperados foram favoráveis a

tal procedimento. Lamentamos muito a atitude tomada pelos cooperados e a decisão

proferida pela Justiça, mas entendemos que esta julga segundo a Lei e que aquele era um

momento, ainda que bastante recente tal fato, desfavorável ao cooperativismo e que o

julgador julgou segundo lhe pareceu correto e devido.

5.3 Qual a efetiva participação das Cooperativas de Trabalho na

Terceirização?

Já vimos, neste trabalho, que, no Brasil, existem mais de 1 700

Cooperativas de Serviços e Trabalho e que estas congregam mais de 1 500 000

Cooperados. Desse montante, o Estado de São Paulo detém aproximadamente 53% dessas

Cooperativas. Sabemos, ainda, que mais de 60% das Cooperativas e 77% do número de

Cooperados desenvolvem atividades de fornecimento de serviços especializados.

Estes números, por si só muito expressivos, não representam,

verdadeiramente, o número de cooperativas existentes e, conseqüentemente, o número de

trabalhadores envolvidos. Estimativas não oficiais da Organização das Cooperativas do

Estado de São Paulo – OCESP - dão como certa a existência de um número pelo menos

15% maior que os do registro oficial, uma vez que muitas cooperativas, uma vez

constituídas, não realizam o seu registro junto àquele Órgão.

Na região de Franca, nosso universo de estudo e pesquisa, constatamos a

existência de 8 cooperativas de Trabalho, excetuando-se, como já dissemos, a Unimed,

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Uniodonto e as de Taxistas, de carros ou motocicletas. Destas, apenas 4 se encontram em

situação regular junto à OCESP. Se extrapolarmos esse número para todo o Estado,

observaremos que o resultado será diferente. Como sabemos que nem todos os municípios

do território do Estado contam com Cooperativas de Trabalho, vamos manter os números

estimados pela OCESP, por uma questão de conservadorismo.

Também vimos que a taxa de natalidade das Cooperativas de Serviço e

Trabalho apresenta uma tendência muito forte de crescimento. Mas esse crescimento

somente se realizará com a flexibilização de mão-de-obra na prestação de serviços

qualificados. Não que a fórmula tenha se esgotado, ou seja, que a prestação de serviços não

qualificados tenha se exaurido pelo excesso de Cooperativas nesse segmento. O que

pudemos verificar é que as empresas, ainda receosas da contratação, aguardam uma maior

definição da lei, no que diz respeito ao risco de estarem infringindo algum preceito legal ou

mesmo quanto à responsabilidade solidária, respeitante ao recolhimento de impostos.

Chegamos a essa conclusão com base em pesquisa informal que levamos a efeito junto a

10 empresas do setor de calçados e construção civil na cidade de Franca. Destas, as

empresas ligadas à construção civil são as mais receosas. Quanto à flexibilização, cita

Queiroz (1997, p. 132, 133):

Existem algumas condições favoráveis em termos

operacionais e econômicos, na flexibilização da mão-de-

obra, valendo-se das Cooperativas. Uma delas é a

possibilidade de alternância, na substituição de

trabalhadores cooperados, sem que a atividade sofra a

solução de continuidade e também sem os

comprometimentos da eficiência do processo operacional.

Ou seja, substitui-se um trabalhador por outro, que vai

desempenhar as atividades com a mesma eficácia. Ocorre

mais agilidade na movimentação da mão-de-obra.

Considerando-se que a atividade cooperada tem

relação civil e não trabalhista, a remuneração do

trabalhador cooperado poderá ser maior do que a do

empregado, uma vez que não existem os encargos normais

de uma vinculação empregatícia. Assim sendo, o

numerário que deveria ser deslocado para pagar as

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contribuições trabalhistas, poderá gerar melhor

remuneração do Cooperado prestador de serviço. As

Cooperativas de Serviços e Trabalho apenas recolhem

para a previdência social a alíquota de 15% sobre o

montante da remuneração paga ao Cooperado, ou poderá

optar pelo índice de 20% sobre o salário-base de

contribuição.

Na verdade, o INSS, através da Ordem de Serviço n.º 209/99, alterou estes

dispositivos. Hoje, o tomador de serviços das Cooperativas de Trabalho tem que recolher,

a título de encargos incidentes sobre a mão-de-obra dos trabalhadores cooperativados, o

percentual de 15% sobre o valor do serviço prestado, ou seja, sobre o valor da Nota Fiscal

emitida pela Cooperativa, o tomador recolhe, em Guia da Previdência Social – GPS –

específica, este percentual, onerando um pouco mais o valor de sua contratação. Isto,

porém, não afeta significativamente os custos da empresa, se comparamos com outro tipo

de terceirização, quer seja, aquele realizado por empresas outras não Cooperativas,

mormente porque aquelas incluem no valor de suas prestações, todos os impostos que lhe

são impingidos pela atual legislação, a saber, ISS, PIS, COFINS, Contribuição Social e

Imposto de Renda.

Acrescente-se, a isso, o valor do encargos sociais para aquelas que possuem

empregados e temos aí a inviabilização da terceirização via sociedade não cooperativa.

O fato de o Cooperado não fazer parte de sindicatos facilita, em muito, as

negociações de valores no momento da contratação ou mesmo de renovação de contratos,

sendo que estas podem ser conduzidas diretamente pela Cooperativa, que os representa.

Não há aqui nenhuma preocupação com Convenção ou Acordo Coletivo a que se deva

obedecer.

Na verdade, o Cooperado recebe proporcionalmente ao volume dos serviços

que venha a executar para a Cooperativa. Em geral, segundo opinião expressa pelas

empresas tomadoras, a mão-de-obra da cooperativa é melhor qualificada e especializada

que a da própria empresa. Isso se explica pelo fato de, sendo o Cooperado um trabalhador

autônomo, ele precisa estar sempre melhor preparado para ser competitivo na sua

atividade. As Cooperativas, além disso, lançam mão do FATES (Fundo de Assistência

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Técnica, Educacional e Social) para fazer o treinamento e a requalificação de seus

Associados. Esta é a opinião de Queiroz (1997).

Os tomadores de mão-de-obra das Cooperativas entendem que existe uma

sensível otimização econômica e financeira, uma vez que o dispêndio para remunerar a

mão-de-obra via terceirização em Cooperativas é menor e não ser esta uma relação regida

pela CLT e sim, pelo Código Civil, dispensando o tomador dos recolhimentos tradicionais

de uma relação trabalhista.

A respeito deste assunto, Queiroz (1997, p. 134) opina:

Entretanto, e lamentavelmente, temos observado

muitas interpretações nas atividades das Cooperativas,

completamente equivocadas, imaginando que estas são

sociedade mútuas de profissionais que se prestam para

serem utilizadas com meios para obter-se economia de

curto prazo, nas folhas de pagamento e como forma para

apenas reduzir os encargos legais e sociais. Engana-se,

redonda e rotundamente, aqueles que assim pensam.

Considerar as Cooperativas de Serviços e Trabalho

apenas como instrumento para serem usadas com essa

finalidade pelos tomadores dos seus serviços é um risco

enorme para estes, em termos operacionais e legais,

podendo inviabilizar os resultados de um processo

terceirizada e ainda levar as empresas tomadoras às

barras dos tribunais trabalhistas, devido a

comportamentos inadequados e incoerentes que os

tomadores assumem nessas condições.

A seguir, apresentamos quadros comparativos de encargos sociais legais

incidentes sobre as empresas, em geral, e sobre as empresas cooperativas, para que

tenhamos a oportunidade de verificar as vantagens e as desvantagens, do ponto de vista da

economia de tributos, e, por conseqüência, a economia de custos na contratação de serviços

terceirizados junto àqueles tipos de sociedades.

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Tabela 3: Análise Comparativa de Encargos Empresa X Cooperativa de Trabalho

Tipo Empresa Cooperativa Diferença Encargos Legais % % % INSS 20,00 0,00 5,00 Salário-Educação 2,50 0,00 2,50 INCRA 0,20 0,00 0,20 SESI/SESC 1,50 0,00 1,50 SENAI 1,00 0,00 1,00 Seguro Acidente 3,00 0,00 3,00 FGTS 8,00 0,00 8,00 SEBRAE 0,60 0,00 0,60 Total do Grupo A 36,80 0,00 36,80 Encargos Provisionais Férias 8,33 0,00 8,33 Abono de 10 dias 2,75 0,00 2,75 1/3 Constitucional 2,75 0,00 2,75 Auxílio Acidente do Trabalho 1,67 0,00 1,67 Licença Paternidade 0,18 0,00 0,18 Licença Maternidade 0,86 0,00 0,86 13º Salário 8,33 0,00 8,33 Aviso Prévio Trabalhado 1,13 0,00 1,13 Total do Grupo B 26,00 0,00 26,00 Custos de Quitação Multa do FGTS - 40% 4,03 0,00 4,03 Aviso Prévio Indenizado 2,23 0,00 2,23 Total do Grupo C 6,26 0,00 6,26 Incidência Cumulativa Grupo B x Grupo A 9,56 0,00 9,56 Custos Adicionais Taxa de Administração Cooperativa 20,00 -20,00 Total Custos Adicionais 20,00 -20,00 Total Geral Final 78,62 20,00 58,62 Fonte: Queiroz, 1997, p. 53, 54.

Observações

a) As cooperativas retêm encargos de 20,00%.

b) A diferença favorável às cooperativas é de 58,62%.

c) Nas cooperativas, a renda é melhor.

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Podemos notar que existe uma vantagem considerável para o sistema

cooperativo quando analisamos os custos de encargos incidentes sobre a folha de

pagamento em comparação com as empresas não cooperativas. A simples observação

visual do quadro apresentado nos permite vislumbrar que as empresas Cooperativas levam

grande vantagem sobre as demais empresas. Isto, de certa forma, é até natural, uma vez

que as sociedades Cooperativas operam com seus próprios associados, que, nesse

momento, são, se é que podemos assim dizer, seus próprios empregados, eis que trabalham

para a sociedade das quais, em última análise, são proprietários.

Não podemos nos esquecer, entretanto, de que, caso a Cooperativa venha a

ter funcionários registrados, os encargos sociais que se obrigará a recolher serão

exatamente os mesmos das empresas em geral. Claro que não se justificaria que a

Cooperativa tivesse empregados registrados, a não ser aqueles, se for o caso, que prestam

serviços de natureza administrativa à sociedade, ou trabalhos outros que fujam à

especialidade da Cooperativa. Nada obsta, porém, que mesmos estes profissionais façam

parte do quadro associativo.

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Tabela 4: Obrigações Empresário X Cooperado

Empresário paga Cooperado paga

PIS 0,65% PIS 0,00

INSS pró-labore 20,00% INSS remuneração 0,00

ISS integral 3,00% INSS autônomo 20,00%

IRPF acima de R$ 1800,00

27,50% IRPF acima de R$ 1800,00

27,50%

Empresário paga Cooperado paga

IRRF integral 1,50% IRRF diluído Variável

Outros 15,00% Outros 0,00

INSS de Empregados 20,00% INSS de Empregados 0,00

Empregado (piso sindical) Cooperado (remunerado geralmente

em 30% a mais) Remuneração 500,00 Remuneração 650,00 INSS 9,00% 45,00 INSS Autônomo 20% na

classe 05 132,83

UFM 0,00 01 UFM anual: 12 12,50 IFR 0,00 IRRF diluído Recebe R$ 455,00 Recebe R$ 504,67

Observação: A tabela foi elaborada pelo autor, porém com dados extraídos do livro

Manual da Cooperativa de Serviços e Trabalho. Queiroz, 1997, p. 57-58.

Exemplo em que o Empregado recebe R$ 500,00 e o Cooperado R$ 650,00.

Naturalmente, a contribuição do Cooperado para com o INSS é livre. Ele não se obriga a

efetuar a sua contribuição na classe 5, aqui citada apenas para se manter a paridade entre

os valores recebíveis e descontos efetuados.

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Quadro 2: Relação Entre Empregado e Cooperado I

Desvantagens Vantagens o empregador controla a mão-de-obra é valorizada é remunerado no piso é melhor remunerado é subordinado é sócio da cooperativa e independente não tem participação tem a sua quota valorizada recebe e cumpre ordens tem o arbítrio das suas ações

Fonte: Queiroz, 1997. p. 56-57.

As Cooperativas cobram uma taxa de administração que incide sobre o valor

da remuneração paga a cada um dos seus Cooperados, em razão da prestação de serviços

por parte destes à sociedade, cujo percentual é variável e estabelecido em Assembléia

Geral. Esse valor é necessário para fazer face às despesas a que a Cooperativa se obriga em

razão de sua própria sobrevivência, que poderíamos chamar de Despesas Administrativas e

são representativas do custo de sua estrutura operacional.

Caso a Cooperativa possua algum setor que, além de prestar serviços aos

Cooperados, também o faça para terceiros, por decisão da Assembléia Geral, a renda

auferida poderá ser destinada ao custeio da estrutura operacional. Isto ocorrendo, o

Cooperado não precisará pagar à sua Cooperativa a taxa de administração. O normal é que

o resultado das operações com terceiros seja integralmente destinado ao FATES.

Queiroz (1997) enumera algumas outras vantagens entre ser empresário ou

cooperado:

Quadro 3: Relação Entre Empregado e Cooperado II

Cooperado Empresário Cooperativa administra Administra sozinho Cooperativa desenvolve Desenvolve sozinho Cooperativa investe Investe sozinho Cooperativa compra equipamentos Compra sozinho Cooperativa treina via FATES Desenvolve treinamento sozinho Cooperativa busca clientes Procura clientes sozinho Não vai à falência. É dissolvida Vai à falência Responsabilidade diluída com demais Assume responsabilidade total Atua em Cooperação Atua sozinho Cooperativa gera renda Busca renda sozinho

Fonte: Queiroz, 1997, 57-58.

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A Lei 5 764/71 dispõe, em seus artigos 11, 12 e 13 sobre o montante da

responsabilidade dos cooperados para com a sociedade e perante terceiros. O Estatuto

Social da Cooperativa deve prever este montante. Em caso de omissão por parte do

Estatuto, entende-se que a responsabilidade dos sócios é ilimitada. Não obstante, em

havendo dolo no procedimento da Cooperativa, a Justiça poderá determinar que essa

responsabilidade seja aumentada, obrigando aos sócios que respondam pelo dano causado

a terceiros ou à sociedade, bem como sua indenização.

Não poderíamos encerrar este tópico sobre comparativos sem abordarmos o

aspecto dos impostos federais e municipais incidentes sobre as empresas prestadoras de

serviços e as Cooperativas de Trabalho. Assim, apresentamos, a seguir, um quadro em que

são demonstrados os valores de impostos incidentes sobre estas e aquelas empresas:

Tabela 5: Relação de Incidência de Impostos Empresas X Cooperativas

Tabela comparativa de Impostos incidentes para as Empresas em geral e para as Sociedades Cooperativas Imposto Incidente Empresas em Geral Sociedades Cooperativas % sobre faturamento % sobre faturamento PIS 0,65 0,00 Cofins 3,00 0,00 Contribuição Social 1,08 0,00 Imposto de Renda 4,80 0,00 ISS 3,00 0,00 Total 12,53 0,00 Observação: Tabela elaborada pelo autor.

Cremos não haver dúvidas sobre o que seja mais interessante para o

tomador de serviços, através de terceirização, mas, se alguma dúvida ainda persistir com

relação ao assunto, cremos que a tabela acima, combinada com as demais, deixa o mais

céptico dos empresários convencido de que realmente o sistema cooperativo é mais

econômico, do ponto de vista de se economizar custos de produção, quando se pretende

terceirizar partes ou o todo de uma atividade econômica.

Não estamos, evidentemente, querendo induzir o leitor a acreditar que o

cooperativismo só possui vantagens, ou que o sistema represente uma panacéia a curar

todos os males das relações de trabalho existentes no Brasil. Isso ele deduzirá por si. Ou,

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até, eventualmente, o seu contrário. O que nós concluímos, em decorrência de nossas

pesquisas de campo e observações efetuadas, é que quem se utiliza dos serviços prestados

pelas sociedades Cooperativas, consegue obter uma significativa redução de seus custos de

produção.

Tomando-se a Tabela 5, isoladamente, que trata da incidência de impostos

sobre as atividades das empresas prestadoras de serviços, podemos observar que a carga de

impostos incidentes diretamente sobre o faturamento das empresas não cooperativas pode

significar fator de decisão entre empresas uma e outra, quando concorrentes à prestação de

serviços. Os 12,53% (Doze Inteiros e Cincoenta e Três Centésimos por Cento) a que as

Cooperativas não estão sujeitas, definitivamente as credenciam a ter melhores preços que

as demais empresas.

Se, por outro lado, considerarmos a parte incidente sobre a folha de

pagamento, conforme demonstrado na Tabela 3, que é o comparativo Empresa x

Cooperativa de Trabalho, ou seja, os 58,62% (Cincoenta e Oito Inteiros e Sessenta e Dois

Centésimos por Cento) que as empresas Cooperativas têm como vantagem sobre as

demais, poderemos verificar, então, que terceirizar, via Cooperativas de Trabalho, é a

solução mais racional e econômica que se poderia encontrar.

Numa demonstração bastante simples de composição de preço de venda,

podemos notar a significância dessa economia. Vamos imaginar, por hipótese, duas

empresas, sendo uma Cooperativa de Trabalho e a outra uma empresa não cooperativa, que

estejam concorrendo à mesma prestação de serviços e a cuja prestação, do ponto de vista

da qualidade técnica, número de pessoas envolvidas no processo e prazos de execução,

sejam equiparadas. A execução das tarefas se dá no estabelecimento do tomador, o que

implica a não incidência de outros gastos gerais de fabricação, como energia elétrica, água,

depreciações de equipamentos, entre outros.

Neste exemplo, utilizaremos o conceito de Mark Up ou coeficiente K na

determinação do Preço de Venda desse serviço, amplamente aceito na área administrativa e

de larga utilização pelas empresas. Apenas para compreensão do leitor, temos, por

definição, que coeficiente K ou Fator K, é um fator multiplicador que, aplicado sobre o

custo do produto ou serviço, gera o respectivo preço final.

Também queremos deixar registrado que, neste contexto, existem três

elementos: o preço final, o custo e o Fator K. Como o preço final resulta da multiplicação

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do custo pelo fator ou coeficiente K, todos os elementos constitutivos do preço final

estarão embutidos no custo do serviço ou no Fator K.

A mensuração de custo e o estabelecimento do Fator K, em empresas de

serviços, envolvem fundamentalmente os mesmos conceitos e procedimentos utilizados

nas indústrias. Desse modo, temos que o mark up é um índice multiplicador que, aplicado

ao custo do produtor, fornece o Preço de Venda, sendo que normalmente integram o mark

up os seguintes elementos: PIS, COFINS, ICMS, Comissões, Despesas Administrativas,

Custos Fixos de Fabricação (quando se utiliza o sistema de Custeio Direto) e Lucro.

Estabelecemos, para efeitos deste trabalho e até porque de uso consagrado

na administração, as seguintes premissas na determinação da expressão para o cálculo do

Fator K:33

a) o preço de venda engloba o custo e todos os elementos que integram o mark up;

b) O custo é estabelecido em quantidade de unidades monetárias;

c) Os elementos que integram o mark up são estabelecidos em termos de porcentagem do

preço de venda;

d) O custo, em termos de porcentagem do preço de venda, corresponde à diferença entre

100% (preço) e a porcentagem dos elementos do mark up.

Assim, temos, por definição, que o custo é determinado pelo preço de

venda, deduzidos todos os elementos, em termos percentuais, que fazem parte do mark up,

a saber:

CUSTO = PV – PIS – COFINS – ISS – COM – DA – DF – DV – DI – L

Onde:

CUSTO= Porcentagem do custo sobre o PV

PV= 100% do preço de venda

PIS= Porcentagem desse tributo sobre o PV

COFINS= Porcentagem desse tributo sobre o PV

ISS= Porcentagem desse tributo sobre o PV

COM= Porcentagem de comissões sobre o PV

33 Revista IOB, Temática Contábil e Balanços, 1999.

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DA= Porcentagem de Despesas Administrativa sobre o PV

DF= Porcentagem de Despesas Financeiras sobre o PV

DV= Porcentagem de Despesas Fixas de Vendas sobre o PV

DI= Porcentagem de Custos Fixos de Fabricação sobre o PV

L= Porcentagem de Lucro desejado sobre o PV

A partir dessas premissas, o K é deduzido facilmente:

% Custo X R$ PV = R$ Custo

PV = R$ Custo dividido pelo % Custo

PV = R$ Custo x 1 dividido por % Custo

Ou seja,

K = 1 dividido por % Custo

Exemplo de determinação do Fator K aplicável à situação proposta:

Tabela 6 – Determinação do Fator K

Elementos Porcentagem sobre o PV Preço de Venda 100,00% (-) ISS 3,00% (-) PIS/COFINS 3,65% (-)IRPJ/Contrib.Social 5,88% (-) Desp. Administ./Financeiras 5,00% (-) Lucro 10,00% (-)Custo 72,47% Fator K (1/0,7247) 1,3799 Fonte: Tabela elaborado pelo autor, com dados extraídos da Revista IOB, Temática Contábil e

Balanços, 1999.

No nosso exemplo, citamos as despesas e tributos próprios das atividades de

prestação de serviços, não considerando eventuais retenções pela fonte pagadora incidentes

sobre a Nota Fiscal, para apenas considerá-la no final. As Despesas Administrativas e

Financeiras, bem como o Lucro, foram definidos de forma aleatória. O Custo foi

encontrado por eliminação, subtraindo-se, de 100,00% (PV), os valores percentuais

correspondentes às despesas e aos impostos.

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Passando agora, definitivamente, para os aspectos de aplicação prática desse

critério de determinação do Preço de Venda, temos a tabela, a seguir, que pretende

demonstrar, de forma comparativa, as vantagens proporcionadas pelas empresas

cooperativas sobre as empresas não cooperativas decorrentes da diferente forma de

tributação entre umas e outras. Entendemos ser importante esta demonstração porque,

numa tomada de decisão por parte da empresa tomadora, em que se leve em conta apenas o

fator preço, já que as demais condições são idênticas, fique demonstrado em quais

elementos componentes de custo e preço de venda as cooperativas efetivamente levam essa

pretendida vantagem:

Tabela 7: Componentes do Preço de Venda

Tabela Comparativa de Elementos que compõem o Preço de Venda de Serviços com utilização do Fator K Empresas em Geral x Cooperativas de Trabalho

Elementos Empresas em Geral Cooperativas de Trabalho Preço de Venda 100,00% 100,00% ISS 3,00% 0,00% PIS/COFINS 3,65% 0,00% IRPJ/Contrib.Social 5,88% 0,00% Despesas Adm/Financ. 5,00% 5,00% Lucro/Sobra 10,00% 10,00% Custo 72,47% 85,00% Fator K 1,37988133 1,176470588 Preço de Venda 24 647,44 18 352,94 ISS 739,42 0,00 PIS/COFINS 899,63 0,00 IRPJ/Contrib.Social 1 449,27 0,00 Despesas Adm/Financ. 1 232,37 917,65 Lucro/Sobra 2 464,74 1 835,29 Custo 17 862,00 15 600,00 Observação: Quadro elaborado pelo autor.

Como podemos observar, em tese, a empresa Cooperativa, mantendo-se o

atual regime de tributação desse tipo de sociedade, sempre oferecerá o melhor Preço de

Venda, que, no caso do tomador de serviços, inverte-se, passando a ser o seu Custo de

Produção.

No exemplo em tela, a Cooperativa remunera os seus Associados com um

valor 30% maior que a empresa não cooperativa, mantendo-se, dessa forma, o critério

estabelecido na tabela 4. Além disso, a Cooperativa manteve os mesmos 10% de Sobra que

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a empresa não cooperativa, proporcionando, com isso, um incremento nos rendimentos do

Cooperado, mesmo se considerarmos que em números comparativos, 10% de R$ 24

647,44 será sempre maior que 10% de R$ 18 352,94.

Não podemos nos esquecer de que o Lucro, no caso da empresa não

cooperativa, vai para o proprietário, ou empreendedor, palavra designativa do detentor do

capital nas empresas, de uso recente na Ciência da Administração de Empresas, enquanto

na Cooperativa, as Sobras vão ser distribuídas aos associados na proporção direta da

fruição dos serviços prestados.

Por outro lado, o valor atribuído ao Custo dos Serviços na Tabela 7, já

contempla o diferencial remuneratório das partes envolvidas, quer sejam, os valores que

serão recebidos pelos Cooperados e pelos funcionários, que, no caso, receberão R$ 10

000,00, decrescidos da contribuição ao INSS descritos na Tabela 3. Sobre esta base de

cálculo, incidirão os encargos sociais descritos no Tabela 3, elevarão o Custo da folha de

salários da empresa prestadora para R$ 17 862,00.

Na Cooperativa, este valor é representado por R$ 15 600,00, que

representam os R$ 10 000,00 acrescidos de 30% que a Cooperativa remunera a mais que a

empresa não cooperativa, acrescidos dos encargos incidentes sobre as atividades das

empresas Cooperativas, também descritos na Tabela 3.

Vale lembrar que sobre o valor da Nota Fiscal de Prestação de Serviços,

emitida pela Cooperativa, incide, de acordo com a OS-209/99, do INSS, 15% a título de

contribuição à Seguridade Social, que vão onerar os custos do tomador de serviços. Este

fato faz com que os custos do tomador, até então no valor de

R$ 18 352,94, se elevem em R$ 2 752,94, passando a R$ 21 105,88.

Em termos percentuais, a economia de custos na mão-de-obra realizada

contratando-se uma empresa Cooperativa será de 14,37% sobre uma empresa não

cooperativa.

Isto posto, trataremos a seguir, daquelas empresas que se utilizam da mão-

de-obra cooperativada em suas atividades-fim. Das também dez empresas contatadas,

apenas duas quiseram falar sobre o assunto. Ambas atuam no segmento da construção

civil, apesar de trabalharem nichos diferentes desse mercado. Enquanto uma atua na

construção de quaisquer tipos de edificações, como casas residenciais, edifícios comerciais

e galpões para indústrias, a outra se especializou na construção e incorporação imobiliária

de condomínios, habitacionais ou não. Importante salientar que nenhuma delas executa

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obras de grande porte, assim entendido a construção e manutenção de rodovias, viadutos,

hidroelétricas, portos e aeroportos.

Como exercem suas atividades na mesma região, isto implica que, na

maioria das vezes, contratam mão-de-obra de uma mesma Cooperativa e, como suas

atividades são bastantes similares, escolhemos a empresa mais antiga e com maior volume

de metros quadrados construídos, além de possuir o maior valor de faturamento anual, para

este nosso estudo de caso.

Esta empresa, até a adoção da contratação de mão-de-obra cooperativada,

adotava um critério misto de contratação, ou seja, parte de seus trabalhadores eram

funcionários próprios, com registros em carteira e parte eram contratados junto às

empreiteiras de mão-de-obra.

Assim, a empresa contratava pedreiros, azulejistas, eletricistas, encanadores,

pintores e demais serviços especializados junto às empreiteiras. Os serventes (mão-de-obra

não especializada) eram de seu próprio quadro de pessoal.

Com o advento da mão-de-obra cooperativada, a contratação continua sendo

mista, porém, agora, a empresa não trabalha com pessoal de empreiteiras e sim, com

pessoal da Cooperativa, além de seus próprios serventes.

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Tabela 8: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho

Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho A Encargos Sociais Básicos (%) A1 Previdência Social 20,00 A2 Fundo de Garantia por Tempo de Serviço 8,00 A3 Salário Educação 2,50 A4 Serviço Social da Indústria (Sesi) 1,50 A5 Serviço Nacional de Aprendizagem Indústrial (Senai) 1,00 A6 Serviço de Apoio a Pequena e Média Empresa (Sebrae) 0,40 A7 Instituto Nacional de Colon. e Reforma Agrária (Incra) 0,20 A8 Seguro contra os acidentes de trabalho (INSS) 3,00 A9 Seconci Serviço Social da Indústria da Construção e do Mobiliário (aplicável a todas as empresas constantes do lll grupo da CLT – art. 577) 1,00 Total de Encargos Sociais Básicos 37,60 B Encargos Sociais que recebem as incidências de A B1 Repouso semanal e feriados 22,53 B2 Férias 14,74 B3 Auxílio Enfermidade (*)0,83 B4 Licença Paternidade (*)0,36 B5 13º Salário 11,08 Total de Encargos Sociais que recebem as incidências de A 49,54

C Encargos Sociais que não recebem incidências globais de A C1 Depósito por despedida injusta 10% sobre [A2 + (A2xB)] 4,78 C2 Aviso Prévio Indenizado (*)13,75 Totais Encargos Sociais que não recebem incidências globais de A 18,53

D Taxas das Reincidências D1 Reincidência de A sobre B 18,63 Total das Taxas das Reincidências 18,63 E Dias de chuva e outras dificuldades E1 Dias de chuva e outras dificuldades 1,50 Total Dias de chuva e outras dificuldades 1,50 PERCENTUAL TOTAL 125,80 Fonte:TCPO9, 1993, p. 10.

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Com dados fornecidos pela empresa, elaboramos Tabelas demonstrativas

comparativas da economia de custos realizada com a utilização desse tipo de contratação.

Para efeitos de fornecimento de orçamentos e determinação do preço de venda, a empresa

se utiliza da tabela TCPO934, de uso consagrado por parte das empresas do ramo de

construção civil, cuja tabela de composição das Taxas de Leis Sociais e Riscos do

Trabalho estão contidas no Tabela 8 e transcritas na página anterior, para melhor

entendimento do leitor:

Num exemplo prático de cálculo de custo de partes de uma construção,

podemos observar a economia realizada, utilizando-se diferentes contratações de mão-de-

obra. Nesse exemplo, trata-se da execução de Bandejas Salva-vidas c/ tábuas de pinho e

temos a seguinte composição de custos para sua execução:

Tabela 9: Cálculo de Valor de Serviço com Mão- de- Obra Própria

Tabela de cálculo de custo para execução de bandeja salva-vidas por metro e total - mão-de-obra própria

Código Descrição de Aplicações Unid Qtde. Vlr. Unit Vlr.Total Necessidade de Aplicação 125 01.01.11 Mão-de-Obra de Carpinteiro H 3,00 1,92 5,76 01.01.12 Mão-de-Obra de Ajudante de Carpinteiro H 2,50 1,59 3,98 Soma de Mão-de-obra 9,74 02.10.26 Viga de Peroba de 6x12cm M 3,50 3,68 12,88 02.10.37 Tábua de Pinho de 1x12cm de 2ª M2 1,60 10,40 16,64 02.10.38 Pontalete de pinho de 3x3cm de 2ª M 3,50 2,05 7,18 02.65.02 Chumbador de 3/8 PÇ 3,00 0,86 2,58 02.65.69 Prego 18x27 KG 0,40 2,14 0,86 Soma de Materiais 40,13 Leis Sociais 125,80% 12,25 Sub-Total 62,11

CUSTO TOTAL 7.764,08

Fonte: TCPO9

34 TCPO9, Tabelas de composições de preços para orçamentos. Ed. Pini. São Paulo, 1993.

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Tabela 10: Cálculo de Valor de Serviço com Mão-de-Obra Cooperativada

Tabela de cálculo de custo para execução de bandeja salva-vidas por metro e total – mão-de-obra cooperativada

Código Descrição de Aplicações Unid Qtde. Vlr. Unit Vlr.Total Necessidade de Aplicação 125 01.01.11 Mão-de-Obra de Carpinteiro H 3,00 2,50 7,50 01.01.12 Mão-de-Obra de Ajudante de Carpinteiro H 2,50 1,59 3,98 Soma de Mão-de-obra 11,48 02.10.26 Viga de Peroba de 6x12cm M 3,50 3,68 12,88 02.10.37 Tábua de Pinho de 1x12cm de 2ª M2 1,60 10,40 16,64 02.10.38 Pontalete de pinho de 3x3cm de 2ª M 3,50 2,05 7,18 02.65.02 Chumbador de 3/8 PÇ 3,00 0,86 2,58 02.65.69 Prego 18x27 KG 0,40 2,14 0,86 Soma de Materiais 40,13 Leis Sociais - parte da empresa 125,80% 5,00 Leis Sociais - parte da cooperativa 15,00% 1,72 Sub-Total 58,33

CUSTO TOTAL 7 290,98 Observação: tabela adaptada, elaborada pelo autor, com base em tabela da TCPO9

A análise comparativa das Tabelas 09 e 10 permitem visualizar a economia

de custos realizadas pela empresa quando da realização de uma determinada tarefa, que, no

caso, não integrará o produto final da construção, mas que onera sensivelmente estes

mesmos custos.

Neste exemplo, mantivemos o critério utilizado no Tabela 7, no que diz

respeito à remuneração de 30% pagos a mais para os trabalhadores cooperativados, além

dos 15% de encargos sociais que, no caso, incidem sobre o valor da Nota Fiscal de

Prestação de Serviços emitida pela Cooperativa. A economia verificada, em termos

percentuais, foi de 6,09%.

Quando aplica este mesmo critério para a prestação de serviços, por parte

das empreiteiras, a empresa consegue melhorar um pouco mais o seu desempenho, uma

vez que, caso viesse a contratar mão-de-obra das empreiteiras, sobre o valor da prestação

que estas lhe fariam, iriam acrescentar ao valor do serviço, a sua rentabilidade e os

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impostos incidentes sobre a Nota Fiscal, que, de acordo com a Tabela 7, é de 27,53%.

Assim, combinando as Tabelas 5, 10 e 13, temos que a economia de custos total realizada

será da ordem de 21,44.

O efetivo gerenciamento da composição de custos realizado pela empresa

permitiu que esta tomasse a decisão pela utilização da mão-de-obra cooperativada em

razão, sobretudo, da economia oferecida por esta relação de trabalho, que tem lhe

permitido oferecer imóveis com preços mais acessíveis aos seus clientes e/ou, melhorar a

sua margem de rentabilidade.

A empresa considera que este sistema de relacionamento tem melhorado o

seu desempenho global e, como as empresas que utilizam a prestação de serviços em suas

atividades meio, também espera uma maior flexibilização da legislação para terceirizar

completamente as suas atividades via Cooperativas de Trabalho.

Entendemos que, caso as empresas façam um bom gerenciamento eficaz de

seus centros de custos, como define Iudícibus35

É a menor fração de atividade ou área de

responsabilidade para a qual é feita a acumulação de

custos (Horngren, 1972, p. 691).

Centros de Custo podem coincidir com

Departamentos, mas em alguns casos um departamento

pode conter vários centros de custo. Por exemplo, um

departamento de beneficiamento pode ter apenas um

supervisor, mas podem existir várias linhas de

beneficiamento. Para cada linha poderíamos criar um

centro de custo à parte e avaliá-lo separadamente.

A noção inicial de contabilidade por

responsabilidade dimensionou os centros de custo com a

maior ou menor facilidade de ser responsável em poder

controlar os custos de seu centro de custo.

35 IUDÍCIBUS, Sérgio de. Contabilidade Gerencial. 6ª ed. São Paulo: Ed. Atlas, 1998, p.267.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao iniciarmos o estudo que levamos a efeito, neste trabalho, tencionávamos

alcançar dois objetivos, que classificamos como principal e acessório. O objetivo principal,

era mensurar quanto o advento das Cooperativas de Trabalho proporcionam de redução de

custos de produção aos seus tomadores e o objetivo acessório era saber sob que condições

os Cooperados participantes das Cooperativas de Trabalho se agregavam para esse tipo de

relacionamento.

No desenvolvimento do nosso trabalho, tivemos oportunidade de conhecer o

pensamento e a motivação dos Pioneiros do Cooperativismo, formado por tecelões

desempregados da comunidade de Rochdale, cidade de Manchester, Inglaterra, por volta

dos anos de 1843, 1844. Vimos que estes trabalhadores perderam seus postos de trabalho

para os modernos teares a vapor da época, que proporcionavam maior produtividade às

tecelagens a um custo muito mais competitivo.

Pudemos acompanhar, mesmo que de maneira superficial, o

desenvolvimento do cooperativismo pelo mundo, o pensamento das diversas correntes

ideológicas do cooperativismo e o entendimento de seus mentores quanto a esta nova

modalidade de relacionamento socioeconômico. Vimos aí que o cooperativismo não

nasceu unânime. Por mais que os seus pensadores acreditassem na idéia do

desenvolvimento via cooperação mútua, cada um tinha, em geral, a sua própria forma de

ver e entender esse nascimento e desenvolvimento.

Este fato, ao invés de enfraquecer a nascente doutrina, pelo contrário,

pudemos ver que proporcionou o seu fortalecimento e ampliou o seu entendimento.

Inglaterra e França, no cooperativismo de consumo, Alemanha e Itália com o

cooperativismo de crédito, países com culturas díspares e com convivência nem sempre

harmoniosa, no caso específico de Inglaterra e França, puderam então desenvolver as suas

sementes do cooperativismo, calcados em suas próprias culturas. O que prevaleceu foi a

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idéia, foi a intenção cooperadora, foi o sentido de união e fortalecimento através dessa

idéia.

No Brasil, o cooperativismo só chegou bem mais tarde. Apenas no final do

século XIX, através de uma elite pequena pensante que a considerava que o

cooperativismo seria uma forma de se alavancar o progresso, agora sem contar com a mão-

de-obra escrava e uma forma de equilíbrio entre patrões e empregados.

Vemos aí que os motivos de criação e implantação do cooperativismo se

deram por motivos muito diferentes: enquanto na Europa o cooperativismo surge como

uma reação da classe operária aos problemas socioeconômicos criados pelo capitalismo e

pela nascente modernização industrial e como uma reação à livre concorrência, em nosso

país a motivação foi praticamente inversa, numa tentativa da classe dominante de impor

um novo tipo de relacionamento que lhes proporcionasse, já naquela época, estarem, de

certa forma, sendo mantidos pelo governo, em substituição à mão-de-obra escrava,

recentemente abolida pela Princesa Isabel e sua Lei Áurea, sobejamente conhecida de

todos nós brasileiros.

Se quiséssemos encontrar a razão para as dificuldades que o cooperativismo

sempre encontra em nosso país, quem sabe não esteja aí um fato bastante significativo: o

de as Cooperativas de Trabalho no Brasil muitas vezes nascerem para atender a interesses

de segmentos econômicos e/ou de pessoas ou grupos interessados apenas em seu próprio

bem estar.

Na região de Franca, área do nosso objeto de estudo, o cooperativismo de

trabalho nasceu pelas mesmas vias tortas da imposição. Sutil e velada, mas imposição. É

interessante ressaltar que mesmo não tendo sido a forma adequada, prevaleça a intenção

mater dos Probos Pioneiros de Rochdale e que o cooperativismo de trabalho possa

definitivamente aqui se estabelecer e proporcionar desenvolvimento social e econômico

para todas as partes envolvidas.

Com as pesquisas e os estudos de casos que realizamos, encontramos, em

Franca, o cooperativismo de trabalho em uma situação ainda um tanto quanto incerta, do

ponto de vista dos trabalhadores cooperativados, quanto à sua sobrevivência e

consolidação. Se por um lado, os participantes acreditam na idéia e, dos entrevistados, não

houvesse quem manifestasse desejo de voltarem às panelas de carne egípcia representados

pelas carteiras de trabalho assinadas, que fizemos menção no intróito do nosso trabalho,

por outro prevalecem costumes como férias e décimo-terceiro salário, que sempre eram

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citados pelos mesmos, numa clara demonstração, do nosso ponto de vista, de que muitos

deles, mesmo não se manifestando, prefeririam a segurança de, ao final do mês, contar com

o seu pagamento. Muitos têm consciência de que este tipo de relacionamento está

caminhando para a inexistência.

Do ponto de vista da conscientização para o cooperativismo, observamos

que este é um fator que não os preocupa tanto neste momento, mas estamos certos de que,

tal qual ocorreu na Cooperativa Arco-Íris, objeto de estudo de Faria, já mencionado em

nosso trabalho, com o tempo, esta conscientização virá, em decorrência de seus

crescimentos e amadurecimentos para o cooperativismo e, a partir daí, a preocupação com

o exercício pleno de suas prerrogativas e obrigações.

De parte dos tomadores dos trabalhos das Cooperativas, há, de maneira

geral, um certo temor de estarem incorrendo em ilícitos, causado pelo posicionamento

inconstante da Justiça do Trabalho no que diz respeito à atividade cooperativa. Se, de um

lado, à Justiça compete zelar pela aplicação das leis, de outro, está a possibilidade de

impedir ou, de certa forma, atrapalhar o desenvolvimento econômico das empresas e, por

conseqüência, do país, no entendimento amplo, geral e irrestrito de que todas as

Cooperativas de Trabalho são inidôneas. Assim, entendemos que cada caso deva ser

analisado e julgado isoladamente, como acreditamos verdadeiramente fazer a Justiça.

O estudo de caso que levamos a efeito permitiu-nos verificar que às

empresas, em maior ou menor grau, variando-se conforme os seus portes e ao destino que

dão à utilização do trabalho cooperativado, é proporcionada a possibilidade de realizarem

redução de custos e/ou despesas operacionais.

Esta economia de custos não está perfeitamente quantificada para as

empresas de pequeno porte, que, no geral, apenas estimam o seu percentual, com base na

empiria. As empresas de grande porte, mesmo não utilizando os trabalhos da Cooperativa

em suas atividades-fim, conseguem mensurar suas economias de forma sistemática, em

razão dos efetivos controles que exercem sobre os seus centros de custos e resultados,

conforme definidos por Iudícibus e já mencionados neste trabalho.

Apesar do caráter eventual dessa prestação, de maneira geral, há uma

esperança de um consolidar desse relacionamento, dependendo, conforme constatado, do

posicionamento da Justiça do Trabalho quanto ao entendimento desse assunto.

As empresas de construção civil, que utilizam a mão-de-obra cooperativada

em suas atividades-fim, conseguem, conforme demonstrado através das Tabelas

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comparativas de encargos e das declarações das mesmas, realizar uma economia

significativa de custos. Essa economia, se por um lado não aumenta, num primeiro

momento, a oferta de emprego, até porque não se aumenta o número de empregados na

realização de uma tarefa pelo simples fato de a mão-de-obra ser mais barata, por outro, tem

proporcionado às empresas a possibilidade de produzirem com custos mais acessíveis,

oferecer imóveis a preços mais convidativos ou, em última análise, aumentarem as suas

margens de contribuição, ou os seus lucros.

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