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SILVA, V. R. A.. Expansão periférica em cidades médias: nova forma ou reprodução do padrão metropolitano de ocupação do território? - o caso de Petrópolis (RJ). In: II Simpósio Internacional Cidades Médias: Dinâmica Econômica e Produção do Espaço Urbano, 2006, Uberlândia. Anais do II Simpósio Internacional Cidades Médias: Dinâmica Econômica e Produção do Espaço Urbano, 2006.

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II Simpósio Internacional sobre Cidades Médias Universidade Federal de Uberlândia

6 a 9 de novembro de 2006

Anais em CD-ROM. Uberlândia - Minas Gerais - Brasil, nov. 2006. p. 1-10. 1

EXPANSÃO PERIFÉRICA EM CIDADES MÉDIAS: NOVA FORMA OU REPRODUÇÃO DO PADRÃO METROPOLITANO DE OCUPAÇÃO DO

TERRITÓRIO? – O CASO DE PETRÓPOLIS (RJ)

Expansión periférica en las ciudades medianas: nueva forma u reprodución del modelo metropolitano de ocupación del território? – el caso de Petropolis (RJ)

Vânia Regina Amorim da Silva [email protected]

Michelli Kemper Campos Universidade Federal do Rio de Janeiro

RESUMO

Pretende-se, com este trabalho, analisar uma das dimensões do processo de fragmentação do tecido sóciopolítico-espacial da cidade a partir da década de 1970: deslocamento de grupos sociais de alta renda das metrópoles em direção às áreas peri-metropolitanas, verificando-se que o padrão metropolitano de auto-segregação a partir de condomínios exclusivos está sendo reproduzido nestas cidades de destino, em grande parte, cidades médias, estudando especificamente o caso de Petrópolis, localizado no estado do Rio de Janeiro. Este município vem apresentando o mesmo padrão metropolitano de periferização da população de alta renda, notando-se um grande crescimento do distrito de Itaipava, e uma ampliação da auto-segregação, seguindo também o binômio condomínio fechado-shopping center. Estará ocorrendo uma reprodução dos padrões e formas urbanas observadas em metrópoles nestas cidades médias? O modelo de auto-segregação também se constitui como uma característica destas cidades médias? E, Petrópolis, especificamente, como se comporta frente a este turbilhão de mudanças?

Palavras-chave: periferia; auto-segregação; cidades médias.

RESUMEN

Él objetivo de este trabajo es analizar una de las dimensiones de la fragmentación del tejido sóciopolítico-espacial de la ciudad que se intensifica en la década de 1970: el desplazamiento de grupos sociales de alto poder aquisitivo de las metrópolis hasta las áreas “peri-metropolitanas”, donde observaremos lsi hay una reprodución del modelo metropolitano de auto-segregación con los “condomínios cerrados” em las ciudades de destino. Discutiremos particularmente el caso de la ciudad de Petrópolis, en Rio de Janeiro. Petropolis presenta el mismo modelo metropolitano de periferización de la población más rica. Ocurre un grande crescimiento del distrito de Itaipava y uma ampliación de la auto-segregación, com los condomínios cerrados e shopping centers. Entonces, levantamos las seguintes questiones: Ocurre uma reprodución de los modelos e formas urbanas de las metropolis en estas ciudades medias? El modelo de segregación también es constituido como una característica de estas ciudades medianas? E el caso de Petrópolis, como se presenta delante de esos cambios?

Palabras-clave: periferia; auto-segregación; ciudades medias.

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Introdução

A cidade não apenas reflete a estrutura social de uma dada sociedade, mas também

contribui, ela mesma, para perpetuar as desigualdades na distribuição da renda gerada

(HARVEY,1973). Essas desigualdades se materializam no espaço urbano “em razão da localização

residencial e da distribuição desigual dos equipamentos, serviços urbanos, da renda monetária e do

bem-estar social.” (RIBEIRO & JUNIOR, 2003, p.6)

Assim sendo, levando-se em consideração a materialização das desigualdades sociais no

espaço, observa-se a ocorrência de diversos fenômenos a ela relacionados: por um lado, a formação

de loteamentos irregulares e favelas nas cidades, periferização da população de baixa renda; e, por

outro, a auto-segregação dos grupos sociais mais abastados, seja através da opção pelo condomínio

fechado, seja pela migração para áreas peri-metropolitanas. Ocorre, assim, nas palavras de Souza

(2000), uma fragmentação do tecido sócio-político espacial da cidade, através da formação de uma

estrutura dual entre ricos e pobres, engendrada pela “cultura do medo”, tão difundida pela mídia.

Pretende-se, com este trabalho, analisar uma das dimensões deste fenômeno: a origem e a

gênese do processo de deslocamento de grupos sociais de alta renda das metrópoles em direção às

áreas peri-metropolitanas, verificando se o padrão metropolitano de auto-segregação a partir de

condomínios exclusivos está sendo reproduzido nestas cidades de destino, em grande parte dos

casos, cidades médias, estudando especificamente o caso de Petrópolis, localizado no estado do Rio

de Janeiro. Estará ocorrendo uma reprodução dos padrões e formas urbanas observadas em

metrópoles nestas cidades médias? O modelo de auto-segregação também se constitui como uma

característica destas cidades médias? E, Petrópolis, especificamente, como se comporta frente a este

turbilhão de mudanças?

Novas formas de periferização: grupos abastados rumo à periferia

Durante muito tempo, associou-se, no Brasil, o termo periferia a áreas distantes dos grandes

centros ocupadas por grupos sociais menos abastados. No entanto, neste trabalho, o foco é na

periferização da população de alta renda, que vem se intensificando a partir da década de 70. Isto

contraria a idéia tradicional de uma periferia homogênea, marcada pela pobreza, em oposição a um

centro rico.

O modelo de auto-segregação tradicionalmente concebido era o do subúrbio residencial

norte-americano, ligado ao shopping center pelo carro particular. Entretanto, esse fenômeno já é

observado nos países semi-periféricos, dentre eles, o Brasil.

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Os subúrbios, embora não tenham nascido junto com as cidades industriais, irão fazer parte

do processo de expansão urbana que se verifica a partir dos anos 1920 e 1930, sendo que cada

cidade e localidade irá apresentar suas especificidades neste processo de suburbanização. Nesta

época, os chamados suburbs americanos, receberam uma classe média que buscava uma forma de

se refugiar do ritmo de vida corrido e da “degradação” presente nas grandes cidades dos Estados

Unidos; o mesmo não foi observado no Brasil na mesma época época, onde os grupos de alto e

médio poder aquisitivo ocuparam o entorno imediato do centro, considerada a área mais nobre da

cidade, por oferecer amplo acesso à infra-estrutura e meios de transporte.

Desta forma,

simultaneamente, o fato da expansão das infra-estruturas e dos equipamentos de apoio à qualidade de vida dos cidadãos ser muito mais rápida nas aglomerações urbanas reforça o papel das cidades como pólos de prestação de serviços pessoais e sociais.” (FERRÃO, 2000, p.2).

O centro era, então, até a década de 1970, considerado essencial para a promoção do

crescimento econômico devido ao fato de apresentarem vantagens aglomerativas. Por apresentar

atrativos típicos de ambientes urbanos bem equipados de infra-estrutura de transporte e

comunicação, e de serviços públicos de qualidade, além de um comércio variado e abrangente.

Assim, a partir do centro ocorria uma expansão da área urbana, ampliando-se a escala, a

complexidade e a diversificação econômica.

Enquanto isso, a pobreza tomava o subúrbio, onde o preço das terras era mais acessível e a

presença do Estado era praticamente nula se comparada ao investimento nos grandes centros. A

população menos abastada que optou por permanecer no centro passou, então, a ocupar as áreas

menos valorizadas, como as encostas dos morros, levando à formação de diversas favelas.

No entanto, a partir da década de 70, segundo Matos (1995), ocorre uma reversão dos

padrões de concentração verificados anteriormente, contrariando a hipótese de um esvaziamento das

áreas não centrais no interior do país.

Um dos elementos mais centrais das mudanças é, inegavelmente, a radical alteração dos fluxos migratórios, contrariando tendências históricas de concentração espacial, a favor de um padrão desconcentrador. Esse novo padrão responde às mudanças que se vão desdobrando no interior da economia, e está provavelmente associado às deseconomias de aglomeração que as atividades produtivas passam a experimentar nas áreas centrais (a exemplo da atividade industrial) e à simultânea difusão de externalidades positivas na periferia. (MATOS, p.33-34)

Durante diversas décadas, a migração predominante era das áreas rurais para as cidades e,

em seguida, para os subúrbios destas cidades. No entanto, a partir desta época, surgiram novos

padrões de migração, constatando-se, por exemplo, um crescimento populacional de pequenas e

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médias cidades superior aos das metrópoles, assinalando um movimento de saída de população das

segundas em direção às primeiras.

Além disso, da migração para pequenas e médias cidades, outros fenômenos decorrentes

dos problemas gerados pela concentração urbana passam a ocorrer nas cidades brasileiras, como a

construção de condomínios fechados, reflexo, no espaço urbano, de uma estrutura cada vez mais

dualizada entre ricos e pobres. Assim, coloca-se a hipótese de uma possível

mudança do modelo socioespacial da "cidade cordial", caracterizada por mecanismos dissimuladores das distâncias sociais e pela vigência de mitos integradores, substituído pelo da "cidade partida" no qual a segregação, a agregação seletiva e a desagregação da vida política são sinalizadas por parte da literatura (RIBEIRO & JUNIOR, 2003, p.2)

O uso do automóvel teve um papel primordial nesta desconcentração populacional, uma vez

que permitiu que um distanciamento maior entre os locais de residência e de trabalho, além de

garantir o acesso a uma multiplicidade de locais e atividades diferentes, e mesmo a possibilidade de

viajar de férias ou a trabalho para locais mais longíquos. Inicialmente restrito à elite (exceto nos

Estados Unidos), a massificação do automóvel, no Brasil, a partir dos anos 1950 e 1960, veio

acompanhada por um grande investimento estatal na construção de estradas, confirmando o caráter

rodoviarista da política de transporte.

Neste sentido, Brasileiro (org.) (1999) coloca que, em termos de políticas urbanas e de

transportes, o século XX em vias de findar foi marcado por três fenômenos inter-relacionados: a

hegemonia do rodoviarismo enquanto política dominante, sobretudo nas cidades dos países em

desenvolvimento; um processo de urbanização acelerado e desordenado com a chegada de milhões

de pessoas do interior para as periferias urbanas sem que estas estivessem dotadas de infra-

estruturas básicas; a emergência e consolidação do automóvel, mito e sonho de milhões de pessoas

que o vêem como símbolo de ascensão social e como modo de deslocamento sem concorrentes, em

função do conforto e comodidade que oferece e, acima de tudo, como veículo privado, expressão

máxima do individualismo capitalista, favorecendo a expansão para bairros periféricos. Enquanto

isso, as autoridades municipais se comprometiam com uma política de transporte voltada para o

veículo particular e para a concentração dos investimentos em grandes avenidas, garantindo a

difusão do uso do automóvel.

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Mudanças associadas ao escapismo das elites

Segundo Sabatini (org.) (2001, p.7),

la segregación residencial puede definirse, en términos generales, como el grado de proximidad espacial o de aglomeración territorial de las familias pertenecientes a un mismo grupo social, sea que éste se defina en términos étnicos, etarios, de preferencias religiosas o socioeconómicos, entre otras posibilidades.

Ainda segundo este autor, a segregação residencial tem três dimensões principais: (1) a

tendência de grupos sociais a se concentrar em algumas áreas da cidade; (2) a conformação de

áreas ou bairros socialmente homogêneos; e (3) a percepção subjetiva que os residentes têm da

segregação “objetiva”. Ou seja, a idéia que este termo traz é a de reunião em uma determinada

porção do espaço de “iguais”.

E a década de 1970, o Brasil e outros países da América Latina foram marcados por

mudanças sócio-espaciais nas cidades como a auto-segregação das camadas superiores, expansão

do mercado imobiliário da cidade e diversificação dos espaços periféricos, que recentemente têm

recebido grupos de alta renda. E, por outro lado, de acordo com Ribeiro & Junior (2003), nos antigos

espaços populares são criados “bolsões” de miséria, e o surgimento de novas favelas caracterizadas

por um alto grau de precariedade.

Souza (2000, p.197) aponta os fatores que contribuem para a formação e consolidação da

auto-segregação das camadas altas e médias da população: “1.

Uma paisagem urbana crescentemente marcada pela pobreza e pela informalidade, inclusive nas

áreas centrais e nos bairros residenciais privilegiados mais tradicionais; 2. a deterioração das

condições gerais de habitabilidade e qualidade ambiental nos bairros residenciais privilegiados

tradicionais, devido a congestionamentos, poluição do ar, etc.; 3. a busca por uma maior

‘exclusividade’ social; 4. eventualmente, a procura de novos espaços residenciais que apresentassem

amenidades naturais; 5. o aumento objetivo da criminalidade violenta e de problemas associados a

estratégias de sobrevivência ilegais (...) e também a ‘sensação de insegurança’ vinculada, com maior

ou menor dose de realismo, à criminalidade objetiva”.

Assim, estes grupos mais abastados procuram lugares cada vez mais distantes do centro

degradado. E, além disso, ao se sentirem ameaçadas, procuram, de alguma maneira, proteger-se

através do isolamento. A sensação de insegurança, aliada à imagem de um espaço público perigoso,

reforçada pela mídia, e relações citadinas desgastadas, justifica o escapismo das elites, que busca

um espaço privado envolto por uma segurança artificialmente criada, tradicionalmente representado

pelos condomínios exclusivos e shopping centers. Neste sentido, Ribeiro & Junior (2003, p.9) atenta

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para “a crescente estigmatização dos territórios de concentração da pobreza, sobretudo em razão da

difusão da "cultura do medo" , sobretudo pelas classes médias em sua sociabilidade”.

Os territórios ocupados pelos grupos menos abastados têm sido diretamente associados à

violência urbana. Este sentimento de insegurança e desconfiança em relação aos vizinhos tem

influenciado fortemente a organização sócio-espacial das cidades, influenciando os grupos de média

e alta renda a se auto-segregarem em condomínios fechados e/ou procurarem locais distantes dos

centros urbanos, onde estariam protegidos do “mundo exterior”.

Entre os moradores destes espaços observa-se a tentativa de criação de uma unidade para

os que ali vivem, estabelecendo uma comunidade (mesmo que artificialmente), uma identificação que

os distingue do “mundo exterior”. Preserva-se a idéia, reforçada pela mídia, de uma cidade suja,

perigosa. E, assim, mantém-se no interior do condomínio uma seletividade social, vendendo-se a

idéia de uma vida calma, saudável, segura.

Tomando como modelo as metrópoles do Rio de Janeiro e São Paulo, tem-se que nos anos

1970 e 1980, o centro da cidade foi sendo esvaziado de investimentos, surgindo a associação desta

parte da cidade a uma lugar degradado e perigoso. Os promotores imobiliários passaram a investir, a

partir daí, em centros comerciais menores, shopping centers e condomínios exclusivos direcionados à

classe média e que atendiam os requisitos mínimos de segurança. Assim, através dessas atitudes

escapistas das elites, ocorre a formação de enclaves territoriais, levando ao que Souza (2000)

denomina fragmentação do tecido sóciopolítico-espacial da metrópole.

A partir de 1970, no Brasil, o poder público passou a facilitar a parceria com grupos privados

para atender a demanda por moradia das classes média e alta. O Estado, a mídia e os

empreendedores imobiliários tiveram forte influência sobre este processo de fragmentação

sóciopolítico-espacial (SOUZA, 2000).

Na vida cotidiana, começam a passar despercebidas as práticas separatistas. Ribeiro &

Junior (2003: 15) colocam que

aparatos imobiliários, muros, regras institucionais e valores culturais separam crescentemente a população em shopping-centers, ‘camelódromos’, ‘condo-mínios fechados’, ‘favelas’, ‘bairros’, ‘baixadas’, etc. Categorias espaciais servem cada vez mais à construção de uma linguagem que, classificando e estigmatizando os grupos sociais, produz um efeito naturalizador das diferenças e das práticas discriminatórias de apropriação dos territórios da metrópole.

Datam do fim desta década os primeiros condomínios exclusivos implantados pela empresa

Alphaville no município de Barueri, na Grande São Paulo, inaugurando um modelo de

suburbanização no Brasil comparada a dos suburbs norte-americanos, com enormes extensões de

casas sem muros e que atraíram investimentos e serviços como hospitais, escolas, universidade,

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imobiliárias e até serviços especializados, possuindo um centro comercial e um shopping center,

dotando-o de uma certa autonomia com relação ao centro do município de São Paulo. No Rio de

Janeiro, também nesta ocasião, passou-se a investir em condomínios exclusivos, dessa vez verticais,

na Barra da Tijuca, mantendo as mesmas características dos demais, como muros, um forte aparato

de segurança, o apelo à natureza, e a necessidade do automóvel. O shopping Barrashopping,

inaugurado em 1981, correspondia ao desejo de exclusividade e isolamento, completando o sucesso

desses empreendimentos.

Nesses empreendimentos,

A população é cuidadosamente prevista, impossível de ultrapassar, já que as construções obedecem a regras pré-fixadas. O número de moradias condiciona a oferta de infra-estrutura e dimensiona os equipamentos. Completando tudo, há o muro, a cerca com entradas vigiadas. (SANTOS, 1981: 22)

Segundo Sabatini (org.) (2001), o aparecimento de shopping centers e outros tipos de

megaprojetos fora do centro tradicional da cidade é outro componente desta fragmentação espacial.

O primeiro shopping center no Brasil foi o Iguatemi, em São Paulo, que surgiu em 1966. Na década

de 1980, foi construído o Rio Sul e o Barrashopping, que tinham como público-alvo as classes média

e alta. Sendo assim, estes “templos do consumo”, de certa maneira, complementariam ao lado dos

condomínios exclusivos o processo de auto-segregação. Estes, em sua maioria, somente acessíveis

àqueles que, além de possuírem renda para consumir, tinham acesso ao automóvel, delimitando mais

ainda os grupos sociais que freqüentavam estes locais e garantindo a exclusividade.

O maior interesse, com este trabalho, é investigar a expressão desses fenômenos de

autosegregação e periferização da população de alta renda nas cidades médias, e, mais

especificamente, no município de Petrópolis (RJ), comparando com o que vem ocorrendo nas

grandes cidades.

Breve caracterização geral da área de estudo

Petrópolis é um município de porte médio, situado a aproximadamente 60 Km ao norte da

cidade do Rio de Janeiro, na Serra do Mar. Ele está dividido em cinco distritos: 1º distrito – Petrópolis,

2º distrito – Cascatinha, 3º distrito – Itaipava, 4º distrito – Pedro do Rio, 5º distrito – Posse, dispostos

no sentido sul-norte, seguindo o curso do principal rio do município – o Piabanha -, um dos afluentes

do rio Paraíba do Sul.

Segundo o Censo Demográfico de 2000 do IBGE, a população do município era de 286.537,

sendo que 94,46% moram na área urbana, e 5,54% na área rural, marcada pela olericultura e

produtos “orgânicos”. Como pode ser observado abaixo no gráfico 1, mais de 50% da população do

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município está concentrada no distrito sede, seguido de Cascatinha, que tradicionalmente já era o 2º

distrito mais populoso, no entanto, o que vem chamando atenção atualmente é o enorme crescimento

dos demais distritos, especialmente Itaipava.

O clima ameno proporcionado pela altitude, a tranqüilidade e as extensas áreas verdes1

conferem a Petrópolis uma qualidade de vida não observada nas metrópoles nacionais. Em 1998, o

município ocupava o 6º lugar no ranking no IQM – Índice de Qualidade dos Municípios. Se bem que,

atualmente, problemas característicos de grandes cidades, como engarrafamento, poluição sonora

etc já são verificados no Centro Histórico de Petrópolis; isso poderia ser um elemento que estaria

influenciando o crescimento populacional nos outros distritos.

Além do turismo garantindo pelo vasto patrimônio histórico e cultural que a cidade abriga,

Petrópolis apresenta diversos fatores atrativos tais como a boa acessibilidade, garantida pela rodovia

BR-040, que liga o Rio de Janeiro (RJ) até Belo Horizonte (MG) e se constitui no principal acesso à

cidade. Também a duplicação da rodovia Washington Luiz e a inauguração das Linhas Vermelha e

Amarela nos anos 90 facilitou o acesso ao Aeroporto Internacional e uma rápida comunicação com a

zona oeste da cidade do Rio de Janeiro.

Cidades médias: nova forma ou reprodução do padrão metropolitano de ocupação de território?

A partir da década de 1980, a tendência à concentração em níveis elevados no 1º e 2º

distritos permanece, de acordo com o Censo 1996 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

No entanto, o que chama a atenção é o crescimento populacional dos demais distritos.

Além do aspecto populacional, observamos que atividades que antes ocupavam o Centro

Histórico passam a se relocalizar. Ou seja, a partir de meados da década de 80, assiste-se a uma

multiplicação e diversificação de áreas de concentração de atividades comerciais e de serviços, como

os bairros de Araras e Nogueira, e os distritos de Pedro do Rio e, especialmente Itaipava. Estas

áreas, anteriormente consideradas periferias do Centro Histórico passam a apresentar atividades e

serviços tipicamente centrais, mas de forma especializada. Estas novas áreas oferecem também

diversas opções de lazer como hotéis-fazenda, uma gastronomia refinada (espacialmente no bairro

de Araras e no distrito de Itaipava), a “Feirinha de Itaipava”, shopping centers e diversos outros

serviços, que atendem aos segmentos de maior poder aquisitivo, em grande parte dos casos

moradores do município do Rio de Janeiro e que mantêm casas de veraneio no município de

Petrópolis, e que aos poucos passa a abandonar o comércio e os serviços do Centro Histórico.

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A acessibilidade também favorece a descentralização em virtude da melhoria das vias de

ligação com e no interior do município de Petrópolis. A privatização da BR-040 proporcionou uma

melhoria nas condições dos eixos de ligação com Petrópolis, na qual a proximidade com a capital

fluminense ocasionou a atração de uma parcela da população carioca para o município em busca de

amenidades naturais e sociais. Além disso, a acessibilidade favoreceu o desenvolvimento do turismo

na região e até a transferência da primeira residência para o município de Petrópolis, tendo em vista

o grande número de condomínios e loteamentos fechados surgidos nos últimos anos.

As amenidades foram outro fator que contribuiu para a formação deste tipo de estrutura

urbana. Muitos moradores do Rio de Janeiro buscavam alguns elementos naturais que Petrópolis

proporcionava (clima ameno, montanhas, queda d’ água, entre outros), sem contar os próprios

moradores do Centro Histórico, cansados dos intermináveis congestionamentos, ou seja, do

surgimento dos primeiros indícios dos males urbanos das grandes cidades. As amenidades sociais

estão relacionadas com este processo através da disponibilização de certas atividades terciárias

localizadas em áreas não-centrais, como no caso do distrito de Itaipava, onde a presença de um Pólo

Gastronômico, de um shopping center, de boates e de um parque de exposições, atraem alguns

segmentos da população.

Assim, com o avanço deste processo de periferização da população de alta renda,

caracterizado pelo crescimento de condomínios fechados e shopping centers afastados do Centro

Tradicional de Petrópolis, observa-se um tipo de segregação residencial muito semelhante à que vem

ocorrendo nas metrópoles. Desta forma, ressalvadas suas especificidades, nota-se, em Petrópolis,

uma reprodução de padrões e formas urbanas observadas nas metrópoles brasileiras em algumas

cidades médias.

Considerações finais

A partir deste trabalho, procurou-se analisar de que forma as relações centro-periferia foram

se modificando ao longo do tempo, imprimindo um novo conteúdo à periferia. Se antes, esta era

sempre vista como homogênea, ocupada por grupos desprovidos de recursos, a partir dos anos

1970, esta passa a ser ocupada por grupos mais abastados, uma vez que passa a ser difundida a

imagem de um centro degradado e inseguro.

Foram analisadas, assim, as principais mudanças associadas ao escapismo das elites, sendo

os condomínios fechados e os shopping centers, os símbolos máximos deste processo de auto-

segregação. Ocorre, então, uma fragmentação do tecido sóciopolítico-espacial das cidades. E,

atualmente, cidades médias como Petrópolis vem apresentando o mesmo padrão metropolitano de

periferização da população de alta renda, notando-se um grande crescimento do distrito de Itaipava, e

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uma ampliação da auto-segregação, seguindo também o binômio condomínio fechado-shopping

center.

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1 Petrópolis já foi inclusive denominada por alguns europeus de cidade jardim.