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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA MM. VARA CÍVEL
FEDERAL DE BRASÍLIA/DF.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS PEQUENAS E MÉDIAS
COOPERATIVAS E EMPRESAS DE LATICÍNIOS – G100 e
ABLV- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE LEITE LONGA
VIDA, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ
sob o nº 06.724.655/0001-99, com endereço em SAUS
Quadra 05, bloco K, Ed. Ok Office Tower, sala 711, CEP
70.070-050, Brasília, DF, e a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
DA INDÚSTRIA DE LEITE LONGA VIDA, Rua Flórida, 1758
- 10º andar - cj 102 - Brooklin Novo, CEP 04565-001, São
Paulo – SP, CNPJ: 00 035 186/0001-14, por seu
representante legal, vem, respeitosamente, à presença de
Vossa Excelência, ajuizar a presente
AÇÃO INIBITÓRIA
PARA O ADEQUADO CUMPRIMENTO DA INSTRUÇÃO
NORMATIVA Nº69/2006 DO MAPA
com PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
contra a UNIÃO FEDERAL, pessoa jurídica de direito público
federal interno, representante legal de seu órgão da
administração direta Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento e de suas secretarias internas, pelos fatos e
fundamentos que passa a expor:
Título I
QUESTÕES PRELIMINARMENTE
CAPÍTULO I
RESUMO DA PRESENTE DEMANDA
A presente demanda pretende impedir que a demandada, através do seu
órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento venha a realizar a
verificação do índice CMP em leites já processados, ditos leite “UHT” (Ultra Alta
Temperatura), uma vez que tal procedimento fere o previsto na Instrução
Normativa nº. 69, da Secretaria de Defesa agropecuária (SDA), do
Ministério da Agricultura (MAPA), expedida em 13 de dezembro de 2006,
vindo a causar prejuízos aos laticínios, visto que a norma se dirige aos produtores
de leite in natura tão somente, como será exposto.
É que o referido índice de CMP tem como principal objetivo denunciar
“possíveis” fraudes no leite, com a inclusão de soro em sua fórmula (o que seria um
dos casos em que resultaria o aumento dos índices de CMP), fazendo aumentar o
seu volume, “rendendo” o leite, assim se caracterizando como uma fraude
econômica visto que o consumidor não estaria adquirindo leite, mas soro de leite
em boa parte, cujo valor de mercado é menor que o do leite.
Ressalta-se que a CMP é a parte hidrossolúvel da cadeia de aminoácido da
proteína láctea k-caseína, inerente à produção de leite quando neste liberado por
hidrólise de k-caseína por proteases de microrganismos psicotróficos, havendo
apenas a medição do mesmo para fins de constatação, ou não, de fraude no leite.
Ocorre que, para fazer a medição da CMP para fins de constatação de
fraude, foram eleitos os índices aceitáveis desta “proteína” através da Instrução
Normativa nº 69/2006 do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento), que determinou que no leite “in natura”, ou no leite concentrado
ou em pó reconstituídos (conforme citado em seu artigo primeiro), portanto, antes
de ser processado, o índice CMP deveria ser inferior a 30 mg/l (miligramas por
litro), ou seja, antes de chegar ao laticínio, no caso do leite “in natura”.
A mesma instrução normativa referida determinou o procedimento para que
fosse feita a medição do índice CMP no leite in natura, sendo importante frisar a
necessidade desta análise no leite in natura, portanto, aquele que ainda não passou
por processos de industrialização.
Entretanto, a correta aplicação da instrução normativa referida (IN
SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006) não vem ocorrendo, sendo que a fiscalização
pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), através de seus
órgãos nos mais diversos Estados da Federação, a aplica também ao leite UHT,
portanto já processado.
O grande problema é que, nos leites “processados” (UHT), o próprio
processo de aquecimento e resfriamento do leite a elevadas temperaturas faz com
que este, ao final da cadeia de produção, possa vir a ter um índice CMP mais
elevado, natural do seu processamento, não havendo que se falar neste caso, de
fraude pela adição de soro, mas sim no aumento do índice de CMP como resultado
NATURAL do processamento do leite e do próprio tempo para que este ocorra,
já que as proteases bacterianas são termoestáveis, resistindo ao
tratamento térmico UHT. Para que haja a correta medição, é necessário que o
material colhido para análise seja o leite cru, ou seja, aquele antes do
processamento.
Entretanto, os produtores de leite UHT estão sendo fiscalizados com base
em índices de CMP constante na IN 69/2006 SDA/MAPA, isto é, no final da cadeia
produtiva, e sendo autuados por suposta fraude (e possivelmente responderão por
crime contra o consumidor) quando na verdade o índice mais elevado de CMP no
leite UHT é o resultado natural do seu processamento, não havendo forma de
reduzir dito índice, senão melhorando a qualidade do leite cru, quando for o caso.
Até mesmo em razão disto, a verificação do índice, de acordo com a IN
SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006, deve ser feita no “leite cru”, ou seja, antes do
seu processamento, o que não vem sendo aplicado pelos órgãos fiscalizadores.
Em razão das diversas ocorrências de autuação dos produtores de leite UHT,
a Autora ajuíza a presente ação inibitória representando seus associados para que,
de acordo com a IN SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006, que regulamenta a
análise da CMP do leite, todo e qualquer teste para tais fins sejam
realizados no “leite cru”, antes de seu processamento, EMITINDO-SE ORDEM
IMPEDITIVA DE REALIZAR TAIS VERIFICAÇÕES, pois inúteis para a sua finalidade
EM LEITES JÁ PROCESSADOS (UHT), sendo requerido, pela delicadeza, importância
e urgência do pedido desta ação, o deferimento de antecipação de tutela para que,
desde já o procedimento correto de verificação da CMP (tendo como amostra o leite
“cru”), venha a ser adotado.
CAPÍTULO II
Do Instrumento Processual Utilizado
Primeiramente, temos que a presente ação versa sobre a obrigação do
agente público em proceder na correta aplicação da Instrução Normativa
SDA/MAPA Nº 69/2006, que tratam da análise dos índices de CMP (Caseino-
Macropeptideos) no leite in natura, concentrado e em pó, reconstituídos, conforme
consta no seu artigo 1º.
É que, conforme será exposto, dita Instrução Normativa determina que a
inspeção e análise para a verificação da existência ou não de fraude no leite por
adição de soro, onde é medido o nível do índice de CMP no mesmo, deve ser
procedida no leite “cru”, realidade esta que não vem sendo respeitada pelos órgãos
fiscalizadores, que procedem as medidas no leite já processado.
Sem querer traçar maiores discussões sobre os termos leite “cru” e “in
natura”, ambos os conceitos são utilizados frequentemente pelo DIPOA/MAPA,
como termos equivalentes, temos que é certo que dito exame não pode ser
realizado no leite “processado”, ou seja, aquele que sofreu a ação de “processos”
para que venha a ser transformado, como o leite UHT que passa por constantes
procedimentos de aquecimento e resfriamento.
É que, como será dito de forma mais detalhada na fundamentação, este
processo pelo qual passa o leite UHT faz com que este possa vir a ter um
percentual de CMP acima do “normal”, o que não significa que tenha ocorrido a
adulteração ou adição de soro, estando perfeitamente apto ao consumo.
Tal fato vem causando graves problemas e constrangimentos aos que
processam o leite UHT, uma vez que a fiscalização, por adotar uma amostra
indevida para realizar seus exames, possui resultados equivocados e acaba
indicando um leite UHT que é perfeito como sendo fraudado, causando prejuízos ao
produtor por ter declarado impróprio um leite próprio ao consumo, e o consumidor,
que recebe uma fiscalização inadequada e ineficiente das autoridades sanitárias.
Não se busca de forma alguma anular ou tornar inválida a Instrução
Normativa IN 69/2006- SDA/MAPA já referida. O que se busca é justamente fazer
com que a autoridade sanitária execute APENAS o que está previsto nas referida
norma.
Como a ação é movida pela entidade G-100 E ABLV, que congrega 100
produtores de pequeno e médio porte de leite e laticínios, não se está discutindo
aqui um caso em concreto no qual teria havido autuação em razão do equívoco no
procedimento de fiscalização do leite (utilizando-se como amostra leite processado
e não leite cru), mas sim temos uma ação da entidade que busca defender casos
generalizados havidos contra seus associados e que estão causando prejuízos
incomensuráveis a estes e aos consumidores destes produtos.
Nesta situação, não é cabível o mandado de segurança contra tais atos, uma
vez que este remédio processual teria cabimento acaso houvesse uma autuação em
concreto contra uma cooperativa ou indústria e esta, após esgotar os recursos
administrativos competentes, buscasse defender seu direito líquido e certo.
Para que se cumpra a Instrução Normativa nº 69/2006, também não é
possível o ajuizamento de uma ação de obrigação de fazer, pois os produtores não
pretendem “obrigar” a administração pública a “fazer” a fiscalização, pois esta é
atribuição do Estado como um todo, apenas o que se busca é que, “ao realizar” a
fiscalização, esta não venha a tomar como amostra leite já processado, mas sim o
leite “cru”, como previsto na IN 69 que aqui esta em foco.
Nesta situação, justifica-se o ajuizamento de ação inibitória, no sentido de
proibir o ente público de realizar testes para aferição de fraude em leite pela adição
de soro, como base na IN nº 69/2006, em leite já processado, utilizando-se, para
tal, o leite “cru”, aquele antes de ser processado, como referido na dita Instrução
Normativa referida.
CAPÍTULO III
APRESENTAÇÃO DAS PARTES AUTORAS
A Autora é Associação que busca defender e congregar os interesses das
pequenas e médias cooperativas e empresas de laticínios no Brasil, inclusive com
objetivo de lutar pela adoção de normas e procedimentos oficiais para o setor de
laticínios sanitários, fiscais e outros que incidam sobre a atividade.
O G-100 congrega hoje tanto laticínios, cooperativas e indústrias de leite do
Brasil, pequenas e médias cooperativas, respondendo por significativa participação
no mercado de leite e laticínios, conforme quadro abaixo:
Recepção Leite (Litros/Dia)
Nº de produtores Empresas/Marcas
2004 % 2004 % G-100 (*) 18.000.000 60,2% 101.000 30,9% DPA (**) 4.134.430 13,8% 6.112 7,6% PARMALAT (**) 2.272.602 7,6% 6.063 7,5% ITAMBÉ (**) 1.966.320 6,6% 21.402 26,4% CCL (**) 927.224 3,1% 4.461 5,5% CENTROLEITE (**) 715.339 2,4% 6.872 8,5% BATÁVIA (**) 692.334 2,3% 2.178 2,7% SUDCOOP (**) 627.767 2,1% 4.920 6,1% DANONE (**) 575.049 1,9% 3.907 4,8% Total 29.911.068 100.00% 80.915 100.00% Fonte: (*) Banco de Dados G-100 Atualizado em out./2007; (**) Site Leite Brasil (Valores adaptados para média diária).
Ainda, os 100 associados do G-100 atuam em todos os estados produtores
de leite e na maioria dos diversos segmentos do leite e laticínios, conforme
demonstra a Tabela abaixo:
PRODUTO N. Associados
PRODUTO N. Associados
Queijos 56 Leite Tipo C 7 Manteiga 31 Leite em Pó 4 Leite Longa Vida 28 Soro de Leite 4 Requeijão 24 Leite Condensado 3 Creme de Leite 19 Leite Desnatado 2 Bebida Láctea 19 Vitaminas 2
Achocolatado 10 Mistura Láctea em Pó
2
Iogurte 9 Leite Tipo B 1 Doce de Leite 9 Margarina / MIX 1
Nesse contexto, pela sua grande representatividade no mercado de
laticínios, o G-100 possui poderes, como enumera o item XIII do artigo 3º de seu
Estatuto, que segue em anexo, de representar seus associados na busca pelos
interesses da classe, sempre resguardando a indústria dos laticínios e a produção
correta e legal dos produtos do gênero.
Por outro lado, a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DE LEITE
LONGA VIDA, é entidade constituída em 1994, a Associação Brasileira da Indústria
de Leite Longa Vida congrega 38 associados que, juntos, totalizam 75% da
produção de leite longa vida no país, o que representa 4,3 bilhões de litros anuais.
Na sua totalidade, o segmento de leite longa vida está presente em 89% dos lares
brasileiros, comercializa 5,7 bilhões de litros anuais e apresenta um valor de
negócios superior a 10 bilhões de reais. O setor é responsável pela captação de
26% da produção brasileira de leite inspecionado e possui indústria em todas
regiões produtoras de leite do país.
Título II
DOS FATOS
A Autora, sendo Associação que representa os interesses de pequenas e
médias cooperativas e empresas do ramo de laticínios, analisa e debate as normas
de fiscalização e de qualificação dos produtos e da produção de seus associados,
possuindo grande interesse em manter o mais rígido controle sobre a produção
bem como zelar pelas normas de qualidade dos produtos de seus associados.
Nesta situação, resguarda a demandante os direitos de seus associados no
que se refere à fiscalização efetuada em seus estabelecimentos, bem como os
critérios utilizados pela Administração Pública a fim de garantir a qualidade dos
produtos e a segurança de consumidores quanto aos laticínios produzidos pelos
seus sócios.
Nesse contexto, a demandante acompanha de perto as indústrias
produtoras de Leite UHT (leite processado), os quais adquirem matéria prima in
natura e realizam o “processamento” do produto para consumo final da população,
transformando o leite “cru” em leite “processado”.
Dessa forma, justamente ao analisar e vivenciar autuações de associados do
ramo acima especificado é que a Autora deparou-se com problemas de legalidade,
proporcionalidade e efetividade de método de fiscalização utilizado pelo
Departamento Nacional de Inspeção de Produtos de Origem Animal – DIPOA, órgão
este vinculado à Secretaria de Defesa Agropecuária, quanto aos índices de CMP
(Caseíno-Macropeptídeo) no leite UHT (processado).
Como já exposto, o referido índice CMP tem como principal objetivo
denunciar “possíveis” fraudes no leite, com a inclusão de soro em sua fórmula (o
que seria um dos fatores de aumento dos índices de aumento de CMP), fazendo
aumentar a presença de soro no leite,“rendendo” o leite, do ponto de vista
economico.
Nesta situação em que há a adição de soro ao leite, há fraude econômica ao
consumidor, porém não há qualquer risco à saúde do mesmo. Sendo assim, o fato
desta conduta não causar problemas de saúde exigirá um tipo de tratamento
diverso daquele concedido aos problemas sanitários. Cabe notar, que não trata o
presente argumento uma forma de legitimar fraudes ao consumidor, mas tão
somente designar os métodos, procedimentos fiscalizatórios e sanções adequadas
para cada conduta.
As ações danosas ao consumidor devem ser combatidas pelo poder público e
sua fiscalização, contudo, com os meios adequados e apropriados à ação, que são
bem diferentes e muito específicos no caso da proteção sanitária.
No caso dos autos, temos que o Poder Público está atuando em
desconformidade com os procedimentos legais instituídos pela Instrução Normativa
nº 69/2006, uma vez que esta, para verificação da existência de fraude no leite de
qualquer natureza (desnatado, semidesnatado, integral, em pó , pasteurizado ou
UHT), determina que a análise seja feita no leite “cru”, antes do seu
processamento, conforme seu artigo 1º.
Ocorre que este não tem sido o procedimento, pois as análises laboratoriais
realizadas estão sendo feitas em amostras de leite já processado, que, por sua
natureza, pode possuir um índice CMP mais elevado, o que não significa que houve
fraude pela adição de soro ou que exista algum dano ao consumidor, uma vez que,
repita-se, no leite UHT é normal a existência de um índice CMP mais elevado.
A utilização inadequada de procedimentos e sanções administrativas para
proteger bens jurídicos significa a ofensa ao princípio da proporcionalidade, que
exige que exista adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito
nas ações administrativas.
Ocorre que, como será amplamente demonstrado no presente feito, o
método utilizado pela fiscalização, o qual vem ocasionando diversas autuações
arbitrárias e ilegais de associados da demandante, é método ineficaz para a
constatação de fraude no laticínio, mas tão somente o leite no produtor, produzindo
resultados equivocados, desproporcionais e, portanto, prejudiciais à indústria , pois
leva em consideração “apenas” o aumento do índice do CMP, que é uma fração de
proteína natural do leite e é aumentada pelo processamento do leite, então
transformado em leite UHT, não este o método mais adequado para verificar a
existência de fraude no laticínio.
Veja que, ao ser processado, transformando-se o leite in natura em leite
UHT (processado), existe uma série de procedimentos de aquecimento e
resfriamento do leite, que pode levar ao aumento dos índices da CMP, não havendo
em se falar, neste caso, de fraude pela adição de soro.
O método utilizado hoje, o qual é aprovado e está enumerado na IN
DAS/MAPA nº 69/2006, que está em vigor, deve ser aplicado ao leite in natura,
leite concentrado e em pó, reconstituídos. Mas sua aplicação no leite já processado
pode levar a falsos e impróprios resultados, realidade que vem ocorrendo no ramo
de laticínios, destacando-se o de produção de leite UHT.
Em virtude disso, faz-se necessário o ajuizamento da presente demanda,
buscando-se adequação da análise do leite para aferição do índice CMP de acordo
com a Instrução Normativa nº 69/2006, que determina que esta deva ser feita em
leite “in natura”, e não junto ao leite já processado, evitando-se, assim, danos
irreversíveis aos produtores (que têm declarada adulterada a produção de leite que
na verdade é “processado”) e aos consumidores (que não recebem a correta
fiscalização para o controle de adulteração e fraudes cometidas eventualmente
sobre os produtos lácteos).
Título III
DO DIREITO
CAPÍTULO I
DAS CONSIDERAÇÕES GERAIS
DO DIREITO APLICÁVEL
Trata-se o presente questionamento sobre a inaplicabilidade da INSTRUÇÃO
NORMATIVA Nº 69, DE 25 DE DEZEMBRO DE 2006 ao setor de laticínios ou leite
processados, pelas razões que serão expostas a seguir. Dispõe a IN n. 69/2006:
O SECRETÁRIO DE DEFESA AGROPECUÁRIA, DO MINISTÉRIO DA
AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, no uso da atribuição que lhe
confere o art. 9º combinado com o art. 42, do Anexo I, do Decreto nº 5.351,
de 21 de janeiro de 2005, tendo em vista o disposto no Regulamento da
Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal, aprovado
pelo Decreto nº 30.691, de 29 de março de 1952, e o que consta do
Processo nº 21000.012951/2006-03, resolve:
Art. 1º Instituir critério de avaliação da qualidade do leite in natura,
concentrado e em pó, reconstituídos, com base no método analítico
oficial físico-químico denominado “Índice CMP”, de que trata a Instrução
Normativa nº 68, de 12 de dezembro de 2006.Art. 2º Somente quando o
índice de CMP for de até 30 mg/l (trinta miligramas por litro), o leite de que
trata o art. 1º desta Instrução Normativa poderá ser destinado ao
abastecimento direto.
§ 1º Quando o índice de CMP do leite estiver entre 30mg/l (trinta miligramas
por litro) e 75mg/l (setenta e cinco miligramas por litro), este poderá ser
destinado à produção de derivados lácteos.
§ 2º Os derivados lácteos de que trata o § 1º serão avaliados tecnicamente,
caso a caso, pelo Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal
- DIPOA.
§ 3º Quando o índice de CMP do leite estiver acima de 75 mg/l (setenta e
cinco miligramas por litro), este poderá ser destinado à alimentação animal,
à indústria química em geral ou a outro destino a ser avaliado tecnicamente,
caso a caso, pelo DIPOA.
Art. 3º Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.
GABRIEL ALVES MACIEL (GRIFOU-SE)
A IN 69/2006 aplica-se, pois, ao leite in natura, ou seja, aquele que ainda
não passou por qualquer processo industrial, para a aplicação do método de
fiscalização para análise dos índices de CMP e não no leite processado ou UHT,
como vem ocorrendo junto aos produtores de leite UHT.
DO SISTEMA SANITÁRIO NO BRASIL
O direito à saúde é direito fundamental garantido pela Constituição Federal
Brasileira. Dentro do Estado Democrático-Social em que se vive nos dias atuais, o
Estado, a fim de perpetuação do direito à saúde aos cidadãos residentes no Brasil,
preocupa-se, de um lado, com a disponibilização de serviços de saúde
principalmente através do Sistema Único de Saúde, e, de outro, com a fiscalização
dos agentes privados que possam trazer riscos à Saúde Pública (Dec. nº
7.127/2010, Portaria nº 428/2010, Lei nº 9.784/1999 – legislação aplicável a tal
propósito).
Nesse contexto, ao analisar a pirâmide Sociedade-Estado-Saúde, percebe-se
no artigo 15 da Lei nº 8.080/90 (Lei que criou o Sistema Único de Saúde) que
União, Estados e Municípios têm poderes para definir as instâncias, os mecanismos,
assim como a fiscalização das ações e serviços de saúde, incluindo a fiscalização
através do poder de polícia sanitária.
No entanto, ainda no ano de 1974, foi criado, através do Decreto-Lei nº
73.747/74, o Departamento Nacional de Inspeção de produtos de Origem Animal, a
fim de que fosse resguardada a segurança e saúde pública na fabricação de
produtos de origem animal, como, no caso em foco, onde tratamos da produção de
leite.
Toda a produção de leite e de seus derivados é normatizada e fiscalizada até
a sua industrialização pela DILEI/DIPOA/SDA/MAPA e leite e seus derivados
QUANDO SE ENCONTRAREM NO MERCADO A DISPOSIÇÃO DOS CONSUMIDORES
podem a qualquer momento ser fiscalizados pela ANVISA. Desse modo, cabe
ressaltar a repartição de competências administrativas estabelecida no atual
sistema nacional entre a fiscalização até o momento da industrialização, de
competência da DILEI/DIPOA/SDA/MAPA e quando das operações dirigidas ao
consumidor, que serão objeto de fiscalização da ANVISA.
No presente caso iremos tratar tão somente dos casos de competência
DILEI/ DIPOA/SDA/MAPA.
Dentro do já mencionado Estado Democrático-Social de Direito vivido
no Brasil, no qual há misto de um Estado Liberal com um Estado Intervencionista, a
intervenção na iniciativa privada, deve ocorrer dentro dos ditames da Lei, assim
como respeitando os princípios norteadores da Administração Pública. Compete à
SDA/MAPA, por meio de seu departamento especifico de fiscalização, no caso, o
DILEI/DIPOA da fiscalização do setor produtivo do leite e de seus derivados, nos
termos da competência atribuída aos departamentos da Secretaria Nacional
Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA.
Nesse contexto, passa-se à análise dos princípios que norteiam o
trabalho desempenhado pelo DILEI/DIPOA/SDA/MAPA, assim como de todos os
órgãos atrelados ao MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e à
proteção da saúde pública.
PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO ADMINISTRATIVO E DE DIREITO SANITÁRIO
A Secretaria de Defesa Agropecuária, secretaria esta do Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA - e suas divisões, tais como
DILEI/DIPOA, na condição de órgãos da administração direta da União Federal
devem respeitar em sua atividade os princípios basilares da administração pública
em geral, assim como os princípios próprios do direito sanitário, os quais, em
grande parte, são os mesmos.
Estudando-se os princípios do direito sanitário, encontra-se a primeira
semelhança com os princípios de direito administrativo: a segurança jurídica. As
entidades privadas que exercem atividades que despertem o interesse da “Saúde
Pública” devem estar cientes e seguras das regras impostas pelas legislações que
normatizam a atividade produtiva do leite e seus derivados a fim de adequar seus
produtos e serviços ao interesse da coletividade, realidade esta conhecida pelos
associados da Autora.
A segurança jurídica não passa somente pela ideia de que as regras devem
ser previamente estabelecidas e publicadas, mas também que tais regras estejam
corretamente dispostas e possam efetivamente assegurar à sociedade a idoneidade
dos produtos e serviços prestados. É preciso que haja prévio conhecimento, no
presente caso, pelos associados G-100 E ABLV, principalmente pelos laticínios que
processam leite tipo UHT.
Ocorre que a proteção à saúde pública não pode servir como cláusula geral
que admita exageros por parte do Estado, devendo o mesmo interpretar a máxima
de forma sistemática, ou seja, também analisando os demais princípios invocados e
aplicáveis ao direito sanitário e suas funções, sob pena de causar grave dano aos
seus cidadãos.
É com base nestes princípios que esta demanda demonstrará que os
métodos de avaliação do leite UHT utilizados pela administração pública,
especialmente, a utilização do índice de CMP – Caseíno-Macropeptídeo - e sua
utilização para punição de empresas processadoras de produtos lácteos, sob a
alegação de que os produtos destas as empresas apresentam indícios de fraudes
por adição de soro ao leite e nos produtos processados, encontram-se equivocados
e em desacordo com a Instrução Normativa nº 69/2006.
É que, como já exposto, a autoridade pública está realizando inspeções nos
produtores de leite UHT quando o produto in natura já foi industrialmente
processado, ao passo que a Instrução Normativa que regulamenta o procedimento
técnico determina que esta análise deva ser feita em leite “in natura”, ou seja,
antes do seu processamento, onde é transformado em leite UHT.
Esses questionamentos, os quais recebem resposta analítica negativa
quando analisados em relação aos métodos utilizados para a análise do leite
industrializado (quais sejam os da Eletroforese Capilar e da Espectroscopia
de Massas, aprovados pela Instrução Normativa MAPA nº 07/2010) e de
eventual fraude do leite com a adição de soro em sua fórmula, demonstram
claramente a impropriedade no seguimento da Instrução Normativa exarada (IN
SDA/MAPA nº 69, de 13.12.2006), o que justifica o ajuizamento da presente
demanda inibitória.
DEPARTAMENTO DE INSPEÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL
Conforme já referido, o DIPOA/SDA/MAPA é um órgão competente no MAPA
no que se refere à inspeção de produtos de origem animal (no caso dos presentes
autos dando-se destaque ao leite processado UHT), fazendo parte da administração
pública direta.
Suas atribuições, mencionadas no seu regimento interno, que segue ora
anexado, são de inspeção industrial e sanitária de carne e derivados, inspeção
industrial e sanitária de leite e derivados, dentre outros ramos, assim como a
padronização e classificação de produtos e realização de análises de exames
laboratoriais para fins de registro e controle de sanidade e qualidade de produtos,
destacando, no presente caso, a fiscalização e classificação de laticínios.
Na formação interna do DIPOA, há a divisão específica destinada ao leite,
chamada Divisão de Inspeção de Leite e Derivados – DILEI. Dentro de cada divisão,
há a prerrogativa de baixar normas e instruções a fim de adequar a produção
advinda de origem animal aos interesses de saúde da população consumidora.
A colheita do material diretamente nas indústrias é feita, via de regra, pela
DILEI/DIPOA, sendo o material enviado para ser analisado pela CGAL/SDA/MAPA,
divisão da SDA, que coordena a rede de LABORATÓRIOS OFICIAIS DO MAPA,
sendo, dependendo do resultado, aplicadas multas ou, ainda mais grave, inutilizado
o produto supostamente inadequado quanto aos padrões sanitários estabelecidos,
isto tudo sem prejuízo de possíveis sanções criminais por possível crime de
consumo.
Tais penalidades vêm sendo aplicadas irrestritivamente, ilegalmente e
indevidamente a associados da demandante em razão da não observância, pelo
órgão fiscalizador, do método adequado de análise da CMP do leite que, ao invés de
ser analisado em seu estado “in natura” (como é determinado pela Instrução
Normativa nº 69/2006), está sendo analisado após o seu processamento e
transformação em leite UHT, quando o percentual de CMP pode ficar mais elevado,
o que, no caso em tela, não significa a existência de fraude.
A colheita de produtos no mercado é de responsabilidade da ANVISA, que
remete ao DIPOA os resultados obtidos de suas análises para que, posteriormente,
providências cabíveis sejam tomadas, como por exemplo, a autuação ou mesmo a
apreensão de mercadorias que supostamente seriam objeto de fraude.
A forma como a fiscalização vem ocorrendo, com a coleta de material para
análise após o seu processamento (ao invés de leite cru, a amostra que segue para
análise é de leite processado), contrariando o disposto na IN nº 69/2006, vem
trazendo prejuízos de grande monta a produtores de leite UHT, prejuízos estes
tanto de ordem material quanto de ordem moral, frente à acusação de fraudadores,
quando, na realidade, as análises estão sendo feitas em leite já processado que,
naturalmente, pode possuir elevado percentual de CMP, o que não significa, de
forma alguma, que há adulteração do produto.
Assim, o exercício de fiscalização ou polícia sanitária é atividade típica do
DILEI/DIPOA/SDA/MAPA, adentrando no direito administrativo sancionador, ao
impor multas e outras espécies de penalidades, sendo que deve seguir a legalidade
e propriedade de métodos de fiscalização, o que não vêm fazendo os órgãos,
desrespeitando ditame da IN 69/2006, em pleno vigor.
Ao fiscalizar o processo de produção, inclusive ao estabelecer normas e
padrões sobre limites de contaminantes, resíduos tóxicos, dentre outros (níveis de
CMP nos produtos processados, sobretudo no leite UHT), nos produtos, caso haja
irregularidades, pode levar à aplicação de multas e, inclusive, reter os produtos e
retirá-los do mercado, como já referido.
DO PODER ADMINISTRATIVO SANCIONADOR
Conforme ilustra Fábio Medina Osório:
“Consiste a sanção administrativa, portanto, em um mal ou castigo, porque
tem efeitos aflitivos, com alcance geral e potencialmente pro futuro, imposto
pela Administração Pública, materialmente considerada, pelo Judiciário ou
por corporações de direito público, a um administrado, jurisdicionado,
agente público, pessoa física ou jurídica, sujeitos ou não a especiais relações
de sujeição com o Estado, como consequência de uma conduta ilegal,
tipificada em norma proibitiva, com finalidade repressora ou disciplinar, no
âmbito de aplicação formal e material do Direito Administrativo.”1
Fazendo análise do texto acima e da atuação do DILEI/DIPOA/SDA/MAPA,
1 Direito administrativo Sancionador, pg. 104.
principalmente no que diz respeito à fiscalização imposta aos processadores de leite
e seus derivados, sobretudo de Leite UHT quanto ao índice de CMP, para que possa
ser imposta uma sanção administrativa, seja de qual natureza forma, é necessário
que haja autoridade competente, além de conduta ilegal por parte do agente.
Ora, no momento em que os métodos utilizados pelo
DILEI/DIPOA/SDA/MAPA para a fiscalização de certo produto notadamente não
atendem aos procedimentos previstos em sua própria Instrução Normativa, mais
especificamente a IN SDA/MAPA nº 69/2006, inviabilizando a constatação de fraude
ou alteração no leite, uma vez que este já foi processado, já estaria excluída a
sanção frente à impossibilidade de afirmação categórica da existência de conduta
ilegal.
O órgão fiscalizador, ao utilizar método de análise próprio para exame de
matéria in natura em matéria já processada industrialmente (no caso o leite UHT),
foge da legalidade e da própria eficiência, características típicas do administrador
público, adentrando na malha da ilegalidade e abusividade, o que faz desaparecer
seu poder sancionador.
Finda essa análise inicial dos aspectos jurídicos e atribuições da
Administração, passa-se à análise do caso da fiscalização das empresas de
processamento de leite e produtos lácteos, sobretudo de Leite UHT no que se refere
aos índices de Caseíno-Macropeptídeo (CMP).
CAPÍTULO II
Da Produção de Leite UHT
Importante iniciar o teor técnico da presente demanda esclarecendo o que é
o leite processado, sobretudo leite UHT, por ter sido até o momento o produto
escolhido mais comumente para ser analisado sob a ótica da IN/SDA/MAPA nº
69/2006, instrução normativa cujo método de análise vem sendo utilizado de forma
indevida pelos órgãos de fiscalização, situação que se busca corrigir com a presente
demanda.
O Leite UHT é leite industrialmente processado. Para sua produção, passa
por um complexo e RELATIVAMENTE LONGO período de tempo até seu consumo,
compreendendo as seguintes etapas:
• Procedimento de ordenha;
• Refrigeração do leite cru na propriedade rural (em tanques individuais
ou em tanques coletivos), por no máximo 3:00 horas;
• Estocagem preliminar, na fonte de produção ou em estabelecimento
intermediário em média por 48:00 horas;
• Coleta a granel percurso diário do caminhão graneleiro entre as
diversas propriedades rurais: média de 15:00 horas;
• Transporte do leite cru refrigerado na propriedade rural ou em postos
de resfriamento até o seu destino (período de tempo incluído no
tempo registrado no item imediatamente superior);
• (Possível) Transferência do leite cru refrigerado para distantes
regiões do país;
o Estocagens sucessivas em carros-tanques e silos de estocagem;
• Descarregamento no destino (manutenção em estocagem até o
momento propício para seu processamento: média de 6:00
horas, podendo exceder as 24:00 h);
• Processamento UHT (Ultra High Temperature) – processo de
ampliação e diminuição de temperatura;
• Manutenção do leite UHT em quarentena (média: até 07 dias);
• Distribuição pelo mercado nacional (processo de distribuição pode
levar até 07 dias, dependendo da região geográfica a alcançar
e as condições de trânsito rodoviário);
• Colocação à disposição do consumidor (no ponto final de venda, o
produto pode levar meses em estocagem, até ser
comercializado).
Portanto, o leite UHT passa por complexo processo industrial, em nada
podendo ser comparado com o leite in natura, ou seja, aquele que ainda não sofreu
qualquer interferência industrial (que é o objeto da IN nº 69/2006).
Estudos recentes, realizados na Universidade Federal de Goiás, mostram
significativo aumento no teor de CMP em amostras de leite UHT, imediatamente
após esse tratamento térmico, em relação aos valores obtidos imediatamente antes
do referido processo industrial. As causas desse súbito aumento de CMP (em torno
de 6% ou ligeiramente superiores, no atual estágio das investigações científicas)
ainda não foram inteiramente estudadas nessa pesquisa.
Entretanto, pode-se concluir desse estudo, preliminarmente, que o simples
processamento UHT do leite poderia ser suficiente para retirar uma matéria-prima
da condição de apta ao processamento UHT do leite da condição de apta ao
processamento para abastecimento público (<30 mg CMP/L), destinando-o à
produção de derivados lácteos (>30 mg _< 75 mg CMP/L), ou, pior, dessa última
classificação para a total inadequação do leite UHT como alimento humano (>75
mg CMP/L). Essa condenação, aliás, é despropositada e desprovida de base
científica. Não há absolutamente nada no leite QUE APRESENTA ÍNDICE de CMP
com mais de 75,0 mg/L que o torne impróprio para consumo humano. Qualquer
produto lácteo fermentado (como queijos e iogurtes) apresenta um nível de
proteína hidrolisada (= “quebrada”) por enzimas bacterianas ou de outras fontes,
muitas vezes superior ao do leite com esse teor de CMP.
Destaquemos:
• A Instrução Normativa n° 69, de 13 de dezembro de 2006, utilizada pelo
Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) não contempla análise
de leite UHT. Em seu artigo 1° é clara: “Instituir critério de avaliação da qualidade
do leite in natura,...”. (grifou-se)
• O Índice de CMP deveria ser medido exclusivamente em amostras colhidas
na fábrica por fiscais do MAPA antes do processamento UHT.
• A amostra deve ser coletada em volume adequado (ou seja, cerca de 100 ml
de amostra) ao seu rápido congelamento e à realização do teste.
• O procedimento fiscal adotado para a coleta de amostras de leite UHT,
colocando suas embalagens cartonadas de 1 litro em caixa(s) de isopor contendo
algumas pedras de gelo comum, onde aí permanecem (às vezes por dias) até o
retorno do fiscal a sua base ou sede, além de ser ilegal, como já dito, é
extremamente falho em termos técnicos. Tal procedimento seguramente acarreta
aumento do CMP depois da amostra ter sido oficialmente coletada. Nesse
procedimento, a única possibilidade de prejuízo cabe à industria de onde foi colhida
a amostra, que terá sua produção retida, ao tempo em que a amostra colhida pode
estar sendo alvo de ação proteolítica por um período de tempo não controlado
(enquanto não estiver completamente congelada) e ao sabor das conveniências ou
da programação de trabalho do agente responsável pela coleta.
• A freqüente falta de correlação entre valores de CMP, obtidos nas análises
de contraprova comparativamente aos dados da análise fiscal, pode ser
parcialmente debitada a falhas técnicas observadas na coleta das amostras, tanto
para sua análise fiscal quanto para perícias de contraprova da indústria ou da
fiscalização.
• De acordo com declarações de técnicos ou peritos contratados por indústrias
para acompanhar perícias de contraprova, alguns laboratórios oficiais analisam o
teor de CMP através de “otimização da curva de calibração”, procedimento usado
para economizar o caro e cada vez mais raro padrão analítico de CMP. Não se tem
registro da validação técnica e da divulgação oficial desse procedimento; portanto,
constitui modificação ilegal do método analítico oficialmente adotado. Outros
laboratórios, trabalhando ou não com a “otimização” acima descrita, somente
analisam contraprova em poder do fabricante. Se esta apresentar problema técnico
(como coagulação) ao sofrer descongelamento, a fiscalização imediatamente
suspende a perícia em andamento, registrando, no relatório, que prevalecerão
como oficialmente válidos apenas os resultados da análise fiscal inicial.
Ou seja, a própria fiscalização desconsidera a necessidade de dar integral
atendimento ao que estabelecem o Decreto – Lei n° 986, de 21.10.1969 e a Lei n°
6.437, de 20.8.1977, ao claramente prescrever a realização, no curso de um único
procedimento fiscal, de nova perícia com a 2ª amostra de contraprova
rotineiramente colhida, assegurando-se, dessa forma, pleno direito de defesa à
interessada.
Ora, percebe-se, portanto, que muitas incongruências vêm ocorrendo quando
da aplicação da IN nº 69/2006 pelos órgãos fiscalizadores, que utilizam os métodos
nessa norma estabelecidos em leite processado, quando deveria ocorrer somente
em leite in natura, assim como a forma de coleta e armazenagem também fere os
princípios da legalidade e eficiência, o que é combatido no presente feito.
Da Fiscalização Atual acerca de Fraude do Leite
A DILEI/ DIPOA/SDA/MAPA, atualmente, tem aplicado sanções e multas às
indústrias processadoras de leite e derivados, sobretudo as produtoras de leite
UHT, sob a alegação de que estariam os mesmos “fraudando” o produto, sendo tal
“fraude” constatada pela presença do chamado soro, medida pela aferição do índice
de CMP, índice este já referido.
A prática fraudulenta de produção de laticínios deve ser combatida, uma vez
que a colocação de produtos nocivos à saúde ou mesmo sem um padrão de
qualidade adequado deve ser incansavelmente reprimida, sendo que a demandante
concorda e cobra a fiscalização por parte do poder público.
Ocorre que, primeiramente, a presença de soro não se mostra
comprovadamente nociva à saúde. Além disso, mesmo não sendo nocivo à saúde
do consumidor, visto que o soro por si só não é prejudicial, deve haver a
fiscalização da presença de soro (fraude por métodos adequados, o que não vem
sendo aplicado pelos órgãos de fiscalização hoje em dia).
Atualmente, para a verificação da chamada “fraude do leite”, que possui a
natureza de “fraude econômica”, os servidores do DILEI/DIPOA usam a Instrução
Normativa SDA MAPA nº 69/2006, que instituíu o índice de CMP (Caseíno-
Macropeptídeo), classificando o leite em três faixas, que permite, ou não, o
consumo do produto pelos consumidores, quais sejam:
• Até 30 miligramas (mg) / Litro de leite (L);
• De >30mg a 75,0 mg / L e
• Acima de 75,0 mg / L.
A grande preocupação da ora demandante é quanto à forma como essa
fiscalização vem sendo operada pelos servidores do DILEI/DIPOA, os quais utilizam
e aplicam a IN SDA/MAPA nº 69/2006 de forma equivocada e atécnica, o que traz
enormes prejuízos para as associadas da Autora. Para demonstrar a impropriedade
da utilização do método exposto na IN nº 69/2006 ao leite processado (enquanto a
aplicação deve ser dar no leite “in natura”) vejamos como se procede no Direito
comparado.
Novamente, cabe ressaltar que entendemos que todas as ações danosas ao
consumidor devem ser combatidas pelo poder público e sua fiscalização, contudo,
com os meios adequados e apropriados à ação, que são bem diferentes e muito
específicos no caso da proteção sanitária. Deve-se respeitar o princípio da
proporcionalidade que exige a utilização adequada de procedimentos e sanções
administrativas para proteger bens jurídicos.
HISTÓRICO DA METODOLOGIA UTILIZADA ATUALMENTE PELO DIPOA NO BRASIL
Por volta da 2ª metade da década de 1980, a comunidade acadêmica e o
setor laticinista já se preocupavam, no Brasil, com a fraude do leite pela adição de
soro lácteo.
O método analítico cromatográfico (por HPLC) foi estudado, adaptado e
divulgado por pesquisador da Universidade Federal de Viçosa (Prof. Dr. S. C. C.
BRANDÃO, X° Congresso Nacional de Laticínios, 1988) às condições operacionais de
laboratórios universitários e oficiais brasileiros (HPLC com filtração em gel), uma
vez que, originalmente, o método se baseava no emprego de HPLC com fase
reversa, (uma sofisticação tecnológica praticamente indisponível no Brasil, na
época).
O Brasil adotou essa “variante”, oficialmente, em 1991 (Portaria Ministerial n°
124, de 23.9.91, republicada no D.O.U. em 20.11.91), juntamente com o método
qualitativo do ácido siálico. Essa Portaria Ministerial foi revogada em 2007, em
razão da instituição do Índice de CMP, no ano anterior.
Desde que o método cromatográfico foi oficializado no Brasil, alguns
pesquisadores vêm advertindo que resultados falsamente positivos podem ser
obtidos, como decorrência de “CMP” produzido por bactérias psicrotróficas, entre
outras fontes, o que foge absolutamente da idéia de fraude ou adulteração do leite.
Essas bactérias psicrotróficas são causadoras de deterioração e podem contaminar
o leite em consequência das más práticas de produção desse produto. Essas más
práticas de produção respondem por significativa parcela da produção de leite em
todo o país.
Apesar das advertências, sanções vêm sendo aplicadas aos produtores de leite
UHT baseadas única e exclusivamente pela análise do índice de CMP, análise e
fiscalização esta objeto da instrução normativa DAS nº 69/2006, cuja forma de
aplicação pela fiscalização é absolutamente equivocada. Tal método não faz a
distinção entre CMP obtido com renina (ou seja, oriundo de soro de queijo obtido
por coagulação enzimática adicionado ao leite - FRAUDE) e CMP de origem
proteolítica bacteriana ou de outras origens (plasmina e outras), o que não
configura fraude.
Resumidamente, o que se demonstra pelos estudos técnicos da matéria é que
o método utilizado não consegue discernir a presença de fraude no leite (colocação
dolosa e inadequada de soro na composição do leite processado) ou se houve
aumento de enzimas em virtude do próprio processamento do leite, que se dá pela
mudança de temperaturas. Por motivo de argumentação poder-se-ia até aceitar o
uso de um método que privilegiasse a precaução na proteção da saúde pública,
mas tão somente na ausência de métodos mais adequados, no presente caso é
possível e viável apresentar um método mais adequado e necessário ao presente
propósito.
Por esse motivo, mostra-se absolutamente desmedida a forma de fiscalização
preconizada pela IN SDA/MAPA nº 69/2006 no que se refere ao Leite UHT, uma vez
que o método foi criado e estabelecido na norma referida para exame de leite in
natura, jamais o leite que passou por processo industrial.
DA IMPROPRIEDADE DO MÉTODO ANALÍTICO PARA AVERIGUAÇÃO DE FRAUDE NO LEITE
PROCESSADO
No método analítico para pesquisa de CMP, substitui-se o soro (usado para
“calibrar” ou dar uma “referência” os resultados analíticos) por massas crescentes
de CASEÍNO-MACROPEPTÍDEO (CMP), que, uma vez obtido de soro lácteo
produzido em laboratório, é purificado, desidratado e, em seguida, comercializado.
Após muitos estudos realizados a partir da adoção pelo Brasil do método
analítico, diversas dúvidas surgiram no meio acadêmico e industrial sobre a REAL
capacidade, do método analítico oficial de HPLC, em identificar apenas o leite
fraudado com soro, separando as interferências naturais do processo de
industrialização do leite.
Afinal, a pesquisa de fraude do leite por soro, pelo método HPLC consistia
na separação de um fragmento de proteína, detentor de determinadas
características físicas.
No entanto, no leite existem ou podem existir inúmeros outros fragmentos
protéicos, produzidos por enzimas proteolíticas (ou seja, que provocam a “quebra”
de proteínas) as mais diversas:
• Enzimas naturais do leite cru;
• Enzimas produzidas por células somáticas;
• Enzimas produzidas por processo inflamatório do úbere das vacas em
lactação;
• Enzimas produzidas por bactérias contaminantes do leite e chamadas de
PSICROTRÓFICAS (por se desenvolverem em baixas temperaturas), entre
outras fontes.
A ação dessas enzimas, particularmente das bactérias psicrotróficas, que
será tanto mais intensa quando se trabalha com leite cru de má qualidade sanitária,
causa interferência no resultado analítico obtido pelo método oficial de HPLC.
Portanto, mesmo sem haver qualquer fraude, há o resultado aumentado de
enzimas psicrotróficas no leite.
Essas interferências podem produzir um resultado FALSO POSITIVO para
soro, já que também produzem fragmentos de proteína praticamente iguais aos
fragmentos produzidos pela ação da renina sobre o leite.
Essas evidências acabaram por levar o MAPA a instituir o Índice de CMP,
através da Instrução Normativa (IN) SDA MAPA nº 69/2006.
Sem querer almejar tautologia, novamente descreve-se o Índice classifica
o leite em 03 (três) faixas de CMP:
• Até 30 miligramas (mg) / Litro de leite (L);
• De >30mg a 75,0 mg / L e
• Acima de 75,0 mg / L.
Com o Índice de CMP, buscou-se evitar que problemas de contaminação do
leite, decorrentes de más práticas de produção, pudessem ser confundidos com
fraude do leite.
O método analítico hoje usado para determinação do índice de CMP não faz
distinção entre CMP obtido com renina e CMP de origem proteolítica bacteriana, ou
seja, não faz a distinção entre o leite fraudado e o leite que sofreu modificações em
razão de enzimas que se desenvolveram em razão do método UHT.
Ademais, convém destacar que a Administração, ao oficializar a IN SDA nº
69/2006, sabiamente inseriu, no seu Art. 1º: “Instituir critério de avaliação da
qualidade do leite in natura, concentrado e em pó, reconstituídos...”.
Ora, pela própria análise da produção do leite UHT feita acima, percebe-se
que este não pode ser considerado ou confundido com leite in natura, uma vez que,
da ordenha até a comercialização, longo período e diversos processos são
efetuados, o que permite a formação e desenvolvimento de proteases bacterianas
que podem adulterar o resultado do índice de CMP.
Sendo termorresistentes, as referidas proteases terão suportado e vencido a
ação desnaturante do tratamento térmico UHT a que forem expostas, continuando
com sua atividade proteolítica.
Certamente por essa razão, a IN ora questionada, ao dirigir o foco de sua
atenção para o leite in natura, tenha sinalizado claramente para o objetivo a ser
perseguido pela fiscalização: sanar o problema onde ele deve ser sanado: na
origem, jamais nos produtores de leite UHT. Aplicar o método analítico ao leite
UHT, primeiramente é procedimento ilegal, pois fere dispositivo claro da IN SDA nº
69/2006, segundo porque não é método eficiente para constatação de “fraude no
leite”.
Uma vez que resta amplamente comprovado pela doutrina especializada que o
processo UHT pode ser indiferente ao desenvolvimento, à estabilidade
química e à capacidade funcional de proteases bacterianas, mesmo apesar das
altas temperaturas aplicadas, o que certamente elevará os índices de CMP2, resta
evidente que o método utilizado não se presta para a averiguação de fraude no
leite. Ademais, não resta exagerado reiterar que a própria Instrução Normativa
2 “Proteases produzidas por bactérias psicrotróficas agem sobre a caseína de forma semelhante à
quimosina, liberando o caseinomacropeptideo – CMP, porém apresentam menor especificidade” (DATTA, N.; DEETH, H.C. Age gelation of UHT Milk.- A review. Institution Chemical of Engineers, v. 79, p.197-210. 2001). “No leite tratado pelo sistema UHT, o problema com enzimas torna-se mais comum. O leite apenas pasteurizado parece ser mais resistente à proteólise do que o leite UHT. O uso de altas temperaturas durante o processamento (UHT) pode expor novos sítios moleculares das proteínas à ação das proteases” (McKELLAR, R.C. Development of off-flavours in ultra high temperature and pasteurizad milk as a function of proteolysis. J. of Dairy Sci., v.64, n° 11, p.2138-2145. 1981)”. “Segundo ARAÚJO (1995), (citado na dissertação de mestrado de LORENZETTI, D. K. “Influência do
tempo e da temperatura no desenvolvimento de microrganismos psicrotróficos no leite cru de dois
Estados do sul do Brasil, UFPR, 2006), “a desnaturação das proteínas causada pela temperatura elevada utilizada durante o processo UHT, altera várias propriedades importantes das proteínas, do ponto de vista da tecnologia de alimentos. A proteína desnaturada é, geralmente, menos solúvel ou até mesmo insolúvel, promovendo aumento na viscosidade do alimento e tem a reatividade de seus grupos laterais intensificada. ARAÚJO (1995, op. cit.) cita ainda que a proteína desnaturada é mais sensível à hidrólise por enzimas proteolíticas produzidas por psicrotróficos”.
(69/2006) enumera claramente que o objeto de exame é o leite in natura ou cru,
jamais o leite processado como tem ocorrido na realidade da fiscalização sanitária
no Brasil.
Dessa forma, pode-se concluir dos estudos realizados, preliminarmente, que o
simples processamento UHT do leite poderia ser suficiente para retirar uma
matéria-prima da condição de apta ao processamento para abastecimento público
(<30 mg CMP/L), destinando-o à produção de derivados lácteos (>30 mg ≤ 75 mg
CMP/L), ou, pior, dessa última classificação para a total inutilização do leite UHT
como alimento humano (>75 mg CMP/L).3
A condenação de inutilização de leite UHT com elevado índice de CMP não
detém qualquer base científica. Não há comprovação de que o leite com teor de
CMP com mais de 75,0 mg/L seja impróprio para consumo humano. Qualquer
produto lácteo fermentado (por exemplo, queijos) apresenta um nível de proteína
hidrolisada por enzimas bacterianas ou de outras fontes, muitas vezes superior ao
do leite com esse teor de CMP, sendo mesmo assim um produto de comercialização
permitida. Onde fica o princípio da impessoalidade?
Portanto, absolutamente ineficiente o método utilizado para averiguação de
fraude no leite, ou mesmo da habilitação do produto para consumo humano, o que
denota a necessidade da correta aplicação da Instrução Normativa SDA nº
69/2006, que aplica o método analítico de exame ao leite in natura, jamais ao leite
processado industrialmente.
Necessária se faz, dessa forma, o ajuizamento da presente demanda, para a
correta aplicação da IN SDA nº 69/2006 pelos órgãos fiscalizadores.
CAPÍTULO III
DOS PREJUÍZOS AOS ASSOCIADOS DA DEMANDANTE: PRODUTORES DE LEITE UHT
Diversos têm sido os prejuízos impostos aos produtores de Leite UHT,
conforme se irá demonstrar abaixo.
IMPOSSIBILIDADE DE INVESTIMENTOS
Atualmente no mercado brasileiro há cerca de 80 fabricantes de leite UHT,
3 Parecer elaborado pelo Dr. José de Moura, Tecnólogo me Laticínios.
os quais representam cerca de 80% ou mais do disponibilizado do produto aos
consumidores.
O investimento destes produtores em equipamentos pelo método HPLC que
façam a medição de CMP do leite in natura, além de muito alto, poderia ser
ineficaz, inadequado e desnecessário, ofendendo ao princípio da proporcionalidade,
pois é de conhecimento público, inclusive já oficial frente à publicação no Diário
Oficial da União de 03 de março de 2010, através da IN nº 07 do Ministério da
Agricultura, pecuária e Abastecimento, que outros métodos de avaliação, como a
Eletrofrese Capilar e a Espectometria de Massas do Leite são, em tese, métodos
eficientes para fiscalização do leite processado.
É curioso, cabe destacar, que tanto a SDA/MAPA, assim como o seu
departamento, o DIPOA, têm absoluta ciência de que o método hoje utilizado não
serve para averiguar fraude ou não no leite processado (UHT em destaque), que
vem investindo em pesquisas para encontrar um método efetivamente seguro para
análise do leite processado (lembre-se que o método analítico da IN SDA nº
69/2006 deve ser aplicado ao leite “in natura”).
DA IMPROPRIEDADE DA FISCALIZAÇÃO EFETUADA
Conforme amplamente demonstrado, usar a IN SDA/MAPA nº 69, de
13.12.2006 fazer a análise do índice de CMP no leite processado, sobretudo no leite
UHT, ou seja, o leite já industrializado e que passou por diversas etapas de
oscilação de temperatura, é forma absolutamente equivocada de buscar o
aprimoramento de qualidade do leite in natura.
Ao contrário do que vem ocorrendo hoje, nas indústrias, sobretudo de leite
UHT, a amostra deve ser retirada antes do processamento via oscilação de
temperatura, a fim de que seja possibilitada a avaliação do leite ainda não
processado. O método enumerado pela IN SDA nº 69/2006, como bem colocado
em seu artigo 01º, é método de análise do leite “in natura”, não do leite já
processado.
Ademais, houve, posteriormente, através de um ofício do Diretor do DIPOA a
criação do regime especial de fiscalização (“REF”) para a fábrica de leite UHT com
valor de CMP superior a 75 mg/L, simultaneamente à divulgação do nome da
indústria como produtora de produtos com “indícios de fraude por adição de
soro”, e portanto da empresa como suspeita de praticar a fraude por adição de
soro, por sítio eletrônico do CQUALI4.
Essa prática não tem provimento legal. O chamado REF não está previsto
na legislação sanitária federal, nem mesmo em qualquer outra legislação. Sua
implantação está sendo conduzida através da divulgação de um Ofício circular,
baseado em legislações amplas, genéricas, difusas, divulgado pelo DIPOA/SDA/
MAPA, o que fere amplamente os princípios da legalidade e publicidade, ambos
impostos tanto ao direito administrativo como ao direito sanitário.
Pelo próprio princípio da legalidade (basilar no direito administrativo,
principalmente quando da aplicação do poder de polícia), adotar o método de
analogia para a interpretação e aplicação de sanções é inviável. O REF deveria ser
medida cautelar (de emergência), porém atualmente, mais de três anos depois de
sua adoção, permanece sendo indevidamente utilizado e defendido pela
Administração Pública, não podendo o G-100 E ABLV corroborar com tal
entendimento. Não se está tratando de violação a direito adquirido ou ato jurídico
perfeito, mas sim no princípio da legalidade que rege o direito administrativo.
O poder de decisão do Diretor do DIPOA, referido no Art. 951 do Dec. nº
30.691/1952 não dá poderes ao senhor Diretor de editar normas e formas de
fiscalização, como vem ocorrendo quando da fiscalização do leite UHT pelo REF,
realizada com base em oficios.
Além da impropriedade jurídica quanto à adoção do Regime Especial de
Fiscalização, os métodos utilizados, ao contrário do aduzido, são ineficientes e
desprovidos de base científica, como amplamente aventado na presente ação.
O uso de sanções e regimes especiais exige norma específica e não admite o
uso de cláusulas gerais, conceitos indeterminados, normas sancionatórias em
branco, analogia ou mesmo interpretação extensiva contra o cidadão.
Por mais essa razão, mostra-se absolutamente equivocada a IN combatida e
a forma como os órgãos de fiscalização vêm adotando suas especificações.
DA FALTA DE INCENTIVOS AOS PRODUTORES DE LEITE
4 www.cquali.gov.br
Com a IN nº 69/2006, a Administração Pública tenta repassar ao industrial
do leite atribuição que lhe cabe: dar condições ao produtor rural de leite produzir
um produto de qualidade dentro das normas de higiene e saúde estabelecidas.
Em muito, atualmente, restam ineficazes os incentivos do Governo ao
pequeno produtor, que não recebe auxílio técnico ou mesmo financeiro para
adequar sua produção de leite ao padrão exigido pela IN MAPA nº 51/2002, que em
31 de janeiro de 2011 teve sua entrada em vigor e seu teor normativo alterado
pela IN 62/2011/MAPA para dar tempo ao setor produtivo primário se adequar aos
seus parâmetros revisados de forma mais condizente com a realidade do produtor e
com a oferta de infraestruturas de estradas, de energia e educação técnica,
disponibilizadas pelos poderes públicos municipal, estadual e federal em por todo o
território nacional.
Resta claro que há problemas quanto aos investimentos do Estado com o
desenvolvimento da fase rural da produção do leite. Estradas vicinais, eletrificação
rural compatível com os equipamentos necessário para refrigeração do leite, essas
sim são medidas que podem ser determinantes na qualidade do leite no Brasil,
medidas estas que parecem estar esquecidas.
Título IV
DOS PEDIDOS DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
Capítulo I
DA CESSAÇÃO DOS EFEITOS DA EXIGÊNCIA DE APLICAÇÃO DO MÉTODO
CMP, PREVISTO IN Nº 69/2006
A parte Autora busca como antecipação de tutela seja, desde já, suspensa a
utilização do método CMP, previsto in nº 69/2006, pelos órgãos de fiscalização do
leite UHT em virtude da incongruência e inexatidão dos métodos aplicados para a
fiscalização.
Muitas empresas do ramo de leite processado vêm sofrendo autuações
equivocadas, sendo taxadas de fraudadoras quando, na realidade, as enzimas
encontradas no leite derivam do método de processamento, inexistindo qualquer
ato culposo ou doloso pelos laticínios. Cargas têm sido apreendidas e multas a
plicadas, todas essas medidas baseadas em métodos de fiscalização tecnicamente
incompatíveis com o exame efetuado.
No caso, encontram-se presentes os pressupostos para a
concessão da liminar:
I. HÁ FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL,
pois o só fato de taxar os produtores de leite UHT,
associados da demandante, como fraudadores de leite já
demonstra a gravidade de existir Instrução Normativa que
adote método cientificamente ineficaz para fiscalização do
leite. Cada vez que há autuação, ou notícia por parte dos
órgãos públicos de que houve fraude (colocação de soro) no
leite por um produtor, a imagem do segmento e do produtor
ficam maculadas, além da oferta de leite ficar reduzida, o
que vem a trazer prejuízos de grande monta á população em
geral;
II. HÁ PROVA INEQUÍVOCA E VEROSSIMILHANÇA,
uma vez que a longa narrativa demonstra que há clara
inexatidão do método de fiscalização em leite processado
UHT adotado pela IN DAS nº 69/2006 objeto da presente
demanda, sendo ineficaz para a aferição da existência ou não
de fraude no leite UHT pela inserção de soro.
Muitas já foram as decisões liminares no sentido de
suspender efeitos de autuações baseadas nos índices de CMP no leite UHT através
do método analítico, conforme documentos em anexo.
Assim, demonstrada a prova inequívoca e a verossimilhança
e do perigo de eventual demora na efetivação do pleito antecipatório de urgência,
impõe-se a concessão da tutela antecipada, na forma do artigo 273, inciso II, do
CPC, para que sejam suspensos os efeitos da IN SDA/MAPA nº 69/2006 até o
julgamento da presente demanda, o que requer desde já por ser medida de Direito
e Justiça.
Título III
DOS PEDIDOS E REQUERIMENTOS
Ante o exposto, REQUER:
EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA:
a) Sejam oficiados os órgãos de fiscalização, a fim de que
suspendam a utilização do método enumerado na IN
SDA/MAPA nº 69/2006, art. 1º, com base para fiscalização
do Leite UHT, no que se refere à ocorrência de fraude, até
que haja o julgamento definitivo da presente demanda;
COMO PEDIDOS DE MÉRITO:
1) A citação do requerido para que, querendo, conteste a
presente ação sob a pena de revelia;
2) Seja julgada a presente Ação TOTALMENTE PROCEDENTE,
sendo DECLARADO Impedida a demandada, através do seu
órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
de realizar a verificação do índice CMP em leites já
processados, ditos leite “UHT” (Ultra Alta Temperatura) pelo
método analítico disposto na IN SDA nº 69/2006, uma vez
que tal procedimento vem causando prejuízos aos laticínios,
visto que a norma se dirige aos produtores de leite in natura
tão somente, afastando a sua exigência dos associados do G-
100 e da ABLV.
3) Condene o Réu ao pagamento dos honorários do perito
judicial, assistente, custas processuais e honorários
advocatícios, na forma da lei;
4) Protesta provar o alegado por todos os meios em direito
admitidos, em especial a documental e pericial.
5) Requer seja deferido o prazo de 15 dias para juntada de
procuração e demais documentos necessários ao feito.
DOCUMENTOS EM ANEXO
1. INSTRUMENTOS DE PROCURAÇÃO
2. ESTATUTO DO G-100 E ABLV
3. ATA DE ELEIÇÃO DA DIRETORIA DO
G-100 E ABLV
4. REQUERIMENTOS AO MAPA
5. RESPOSTA DO MAPA AOS
REQUERIMENTOS
6. LAUDO TÉCNICO
Atribui-se à presente causa o valor de R$ 1000,00.
Termos em que,
Pede Deferimento.
Brasília, 19 de janeiro de 2012.
Paulo Caliendo
OAB/RS 33.940
Rafael Fernandes Estevez
OAB/RS 45.863
Wesley Rocha
OAB/DF 31.271