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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA __VARA CÍVEL DO
FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA
- PARANÁ.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, através
da PROMOTORIA DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE DE CURITIBA, por seu
Promotor de Justiça que ao final assina, no uso de suas atribuições, vem à presença de
Vossa Excelência, com fulcro no artigo 129 da Constituição Federal e com fundamento
nas Leis Federais n. 6938/81 e 7347/85 e demais leis estaduais e municipais pertinentes
a espécie, propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL,
com pedido de liminar
em face do BAR QUINZE ALTA LTDA, pessoa jurídica de direito privado, cadastrada
no CNPJ sob nº. 07.711.918/0001-98, com Inscrição Municipal nº. 12.09.0503774-5 e
Indicação Fiscal nº. 34.102.055, localizado na Rua Itupava, nº. 1.020, bairro Alto da Rua
XV, Curitiba - Paraná, CEP 80.040-000, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir
expostos:
1. FATOS
Em 01 de setembro de 2011, foi protocolado na Promotoria de Justiça de
Proteção ao Meio Ambiente de Curitiba, sob nº. 1718/2011, reclamação de moradores do
bairro Alto da Rua XV acerca da crescente degradação de um agradável espaço de lazer
criado pelo Município de Curitiba, aos moradores do bairro Alto da Rua XV e
imediação, conhecido como Jardim Ambiental, localizado, na Rua Shiller, provocados
por frequentadores de alguns estabelecimentos comerciais da região. Sendo o BAR
QUINZE ALTA LTDA, conhecido como SNOOKER BAR BOLA ROLA, um dos
principais pontos de encontro destes freqüentadores.
Os moradores, reiteradamente, vem colecionando abaixo-assinados e
direcionando-os às autoridades municipais sem, contudo, alcançarem a segurança e a
tranqüilidade tão almejados, não por mero deleite, quiçá o fosse, mas por terem visto
um direito fundamental sendo-lhes subtraído, por pessoas sem o mínimo de urbanidade
e respeito.
A poluição sonora e a perturbação de sossego alheio relatados são
constantes, bem como as queixas dos moradores do entorno que estão tendo suas vidas
cerceadas por pessoas que, sob influência de álcool e drogas, promovem durante a
madrugada atos de vandalismo e algazarras que ameaçam a segurança e a tranqüilidade
de famílias que tem o direito de desfrutar de seu merecido repouso noturno.
Diante dos fatos apresentados, esta Promotoria de Justiça de Proteção ao
Meio Ambiente de Curitiba oficiou as Secretarias Municipais do Meio Ambiente, do
Urbanismo, da Saúde e à Polícia Militar do Paraná, questionando a regularidade do
referido estabelecimento perante os respectivos órgãos.
Em resposta, a Polícia Militar do Paraná, através da Ação Integrada de
Fiscalização Urbana – AIFU, informou que em fiscalização realizada no dia 31 de agosto
de 2012, o estabelecimento foi notificado (Notif. 69008/2012) pela Secretaria Municipal
do Urbanismo – SMU, por desvirtuamento de ramo, “visto que o processo de solicitação de
Alvará de Localização e Funcionamento foi indeferido”, gerando, na ocasião, a paralisação
imediata das atividades do estabelecimento, o qual também foi notificado (Notif.
39104/2012) pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, por não possuir Licença
Ambiental.
Já em posterior indagação à Secretaria Municipal do Urbanismo – SMU
quanto à existência ou não de Alvará de Localização e Funcionamento, constatou-se a
emissão do referido documento sob nº. 1.115.076, com Inscrição Municipal 503.774-5,
para o exercício das seguintes atividades comerciais:
“I.56.1.1-2/02-00 – Bares e outros estabelecimentos especializados em servir
bebidas;
R.93.2.9-8/03-00 – Exploração de jogos de sinuca, bilhar e similares”
Vale ressaltar que em consulta à Guia Amarela fornecida pelo Município
de Curitiba, consta a seguinte observação no campo “Informações Complementares”:
“33264/2010UFI - Local com grande incidência de reclamações referentes a
consumo de bebidas alcoólicas na área de abrangência do posto de combustível e
perturbação de sossego público junto à Polícia Militar. Em sendo o entendimento
do CMU, a liberação de consulta comercial para as atividades pleiteadas pelo
estabelecimento, propomos vincular a liberação após ser ouvida a CIOSP.
69 - Atividade de risco ao meio ambiente – ouvir a SMMA
84 - 45650/09UFI3-Notif.53377 (04.04.2009)
Comércio irregular (cumprir o disposto no artigo 1º da Lei 11.582/05)
33264/10FI3-Notif. 67069 (10.03.2010)
Comércio noturno irregular
[...]
115 – Poluição ambiental – atividades de risco ambiental sem possibilidade de
renovação automática de alvará de funcionamento.”
Sendo assim, diante dos fatos apresentados, não se vislumbra outra
alternativa senão a da propositura da presente Ação Civil Pública, para que o
estabelecimento seja interditado, retornando a paz e o sossego dos moradores
circunvizinhos ao estabelecimento.
2. DIREITO
Paulo Afonso de Leme Machado1 ao tratar sobre poluição sonora, esclarece
que “o incômodo ou perturbação é geralmente relacionado aos efeitos diretamente exercidos pelo
ruído sobre certar atividades, por exemplo; perturbação da conversação, da concentração mental,
do repouso e dos lazeres. A existência e a dimensão do incômodo são determinadas pelo grau de
exposição física e por variáveis conexas de ordem psicossocial.”
Estudos sobre o assunto revelam que “como efeitos do ruído sobre a saúde em
geral registram-se sintomas de grande fadiga, lassidão, fraqueza. O ritmo cardíaco acelera-se e a
pressão arterial aumenta. Quanto ao sistema respiratório, pode-se registrar dispnéia e impressão
de asfixia. No concernente ao aparelho digestivo, as glândulas encarregadas de fabricar ou de
regular os elementos químicos fundamentais para o equilíbrio humano são atingidas (supra-
renais, hipófise, etc).”2
Sendo assim, o direito ao silêncio corresponde a uma das manifestações
jurídicas mais atuais da pós-modernidade e da vida em sociedade, em que não se pode
retirar de cada cidadão brasileiro o direito de dormir, sossegar e descansar.
1 MACHADO, Paulo Afonso de Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 11 ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2003. 2 Idem.
A cada dia a humanidade busca meios mais adequados para se viver, com
o intuito de preservar o meio ambiente, garantindo dessa forma que futuras gerações
possam usufruir de um meio ambiente sadio, ecologicamente equilibrado, como assim
consagra a Constituição Federal brasileira, no artigo 225:
“Artigo 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
(...)
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados. “
No que tange à legislação ambiental, poluição é definida pelo. 3º, III,
alíneas “a”, e “e”, da Lei n. 6.938/1981, como a degradação da qualidade ambiental
resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde, segurança e
o bem estar da população e que lancem matérias ou energia em desacordo com os
padrões ambientais estabelecidos, repectivamente. No inciso IV deste mesmo artigo
vislumbra-se o conceito de poluidor, o qual corresponde à pessoa física ou jurídica, de
direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade
causadora de degradação ambiental.
A Resolução n. 001 de 1990 do Conselho Nacional do Meio Ambiente -
CONAMA prevê:
“I - A emissão de ruídos, em decorrência de quaisquer atividades industriais,
comerciais, sociais ou recreativas, inclusive as de propaganda política, obedecerá no
interesse da saúde, do sossego público, aos padrões, critérios e diretrizes
estabelecidos nesta Resolução;”
O Estado do Paraná, na edição de sua Constituição, também dedicou
capítulo especial à questão ambiental, garantindo a defesa do meio ambiente e da
qualidade de vida de seus cidadãos, importância esta que se extrai da redação do artigo
207, in verbis:
“Artigo 207 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Estado, aos
Municípios e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as gerações
presentes e futuras, garantindo-se a proteção dos ecossistemas e o uso racional dos
recursos ambientais.
§1º Cabe ao Poder Público, na forma da lei, para assegurar a efetividade deste
direito:
[...];
§2º. As condutas e atividades poluidoras ou consideradas lesivas ao meio ambiente,
na forma da lei, sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas:
I - a obrigação de, além de outras sanções cabíveis, reparar os danos causados; ”
No âmbito Municipal, a Lei nº. 10.625/2002, que dispõe sobre ruídos
urbanos, proteção do bem estar e do sossego público, sai em defesa do meio ambiente
preconizando:
“Art. 1º - É proibido perturbar o sossego e o bem estar público com ruídos,
vibrações, sons excessivos de qualquer natureza, produzidos por qualquer forma ou
contrariem os níveis máximos de intensidade, fixados por esta lei.
Parágrafo único – As vibrações serão consideradas prejudiciais quando
ocasionarem ou puderem ocasionar danos materiais, à saúde e ao bem estar
público.”(grifo nosso)
E ainda:
“Art. 12– As atividades potencialmente causadoras de poluição sonora,
definidas em regulamento próprio, dependem de prévio licenciamento
ambiental da Secretaria Municipal do Meio Ambiente para obtenção dos alvarás
de construção e funcionamento.
[...]
Art. 16– As pessoas físicas e jurídicas, de direito público ou privado, que
infringirem qualquer dispositivo desta Lei, seus regulamentos e demais normas
dela decorrentes, ficam sujeitas às seguintes sanções, independente da obrigação de
cessar a transgressão:
I. Notificação por escrito;
II. Multa simples ou diária;
III. Cassação da Licença Ambiental;
IV. Embargo;
V. Interdição parcial ou total;
VI. Perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo
Município.”(grifo nosso)
É relevante mencionar na esfera municipal o disposto na Lei Orgânica do
Município de Curitiba:
“Art. 11 – Compete ao Município prover a tudo quanto respeitas ao seu interesse e
ao bem-estar da população, cabendo-lhe, em especial:
[...]
XII – dispor sobre o controle da poluição ambiental;
[...]”
Desta forma, “por meio do zoneamento, o Poder Público interfere no uso e na
ocupação do espaço, conduzindo o desenvolvimento de atividades e estabelecendo restrições,”3
como medida de controle ambiental sobre os efeitos deletérios provocados por
atividades poluidoras ou potencialmente poluidoras.
Nesse sentido, a Lei Municipal nº. 9.800/2000, que dispõe sobre o
zoneamento, uso e ocupação do solo no Município de Curitiba, proíbe que se
desenvolvam atividades discrepantes com o zoneamento em questão, conforme seus
artigos 36 e 38 dispõem:
“Art. 36 - As atividades urbanas constantes das categorias de uso comercial, de
serviços, e industrial para efeito de aplicação desta lei classificam-se:
[...]
II - quanto à natureza, em:
[...]
incômodas - as que possam produzir ruídos, trepidações, gases, poeiras, exalações
ou conturbações no tráfego que possam causar incômodos à vizinhança;
3 GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Direito Ambiental. 2 ed. São Paulo : Editora Atlas S.A, 2011.
[...].
Art. 38. De acordo com sua categoria, porte e natureza, em cada zona ou setor as
atividades urbanas serão consideradas como:
[...];
IV - proibidas - compreendem as atividades, que por sua categoria, porte ou
natureza, são nocivas, perigosas, incômodas e incompatíveis com as finalidades
urbanísticas da zona ou setor correspondente.”
Assim, conforme se extrai da Guia Amarela expedida pelo Município de
Curitiba, o réu está localizado em Zona Residencial – ZR3 onde, segundo o Quadro V da
Lei 9.800/2000, permite-se os usos de habitação unifamiliar, habitações unifamiliares em
série, habitação coletiva, habitação institucional, comércio e serviço vicinal 1 e 2 e
indústria tipo 1, tolerando-se o uso comunitário 1.
Isso significa dizer, considerando o Decreto nº 183/2000, que regulamenta
o artigo 54, da Lei 9.800/00, que para o referido zoneamento não é permitido atividades
com serviço de música ao vivo ou mecânica.
Portanto, vale ressaltar que o réu está em desacordo com a Lei Municipal
de Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo, uma vez que entre os serviços oferecidos pelo
estabelecimento em tela, encontra-se o de música ao vivo, conforme pode ser verificado
em post de divulgação na página do Facebook do Bar Bola Rola (anexo).
Mesmo assim, ainda que tais atividades fossem permitidas pelo
zoneamento, para que haja o exercício dos serviços de música ao vivo ou mecânica,
deve, necessariamente, haver a Autorização Ambiental de Funcionamento pela
Secretaria Municipal do Meio Ambiente – SMMA, conforme dispõe o Anexo III do
Decreto Municipal 1.819/2011, bem como ter a previsão dessas atividades no Alvará
Comercial do estabelecimento.
Ainda assim, mesmo que o réu supostamente estivesse regular perante os
órgãos competentes, isso não lhe concederia o direito de cercear o direito ao sossego, à
saúde, à segurança.
Sobre o alvará, o Código de Posturas do Município de Curitiba – Lei nº.
11.095/2004, assim dispõe:
Art. 34. O alvará de localização e funcionamento será expedido mediante
requerimento ao órgão competente, e atendidas as disposições legais.
§ 1º. O alvará terá validade enquanto não se modificar qualquer dos
elementos essenciais nele contidos e condicionados à sua vigência.
§ 2º. Quando ocorrer o previsto no parágrafo anterior, o interessado deverá
requerer outro alvará de licença, com as novas características essenciais. (grifo
nosso)
Entretanto, não é o que acontece no presente caso. Conforme se verifica
através da notificação nº. 69.008 emitida pela Secretaria Municipal do Urbanismo (fls.
39), por desvirtuamento de ramo, bem como do documento às fls. 58, onde se pode
observar apenas a liberação das atividades de “Bares e outros estabelecimentos
especializados em servir bebidas” e “Exploração de jogos de sinuca, bilhar e similares”,
o BAR QUINZE ALTA LTDA não possui liberação para as atividades de música ao vivo
ou mecânica, o que invalida os referidos alvarás, conforme determina o artigo acima
citado.
Além disso, através da notificação nº. 39.104, emitida pela Secretaria
Municipal do Meio Ambiente (fls. 40), em razão de falta de licenciamento ambiental,
percebe-se que o réu vem descumprindo as determinações legais acima mencionadas
para o exercício de suas atividades.
Menciona-se que existe a previsão de imposição de sanção a quem pratica
poluição sonora, conforme Decreto-lei nº. 3.688/1941 – Lei das Contravenções Penais:
“Art. 42 – Perturbar alguém, o trabalho ou o sossego alheios:
I – com gritaria ou algazarra;
II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições
legais;
III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;
IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que
tem guarda;
Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou multa.”
Vale ressaltar, que conforme informações contidas na reclamação que
desencadeou a presente, bem como nos fatos relatados, a atividades do réu é incômoda
e nociva à segurança, à saúde e ao bem estar dos moradores da região, por ser um dos
principais pontos de encontro de pessoas que promovem a desordem, vandalismo e
algazarras.
Diante da possibilidade de degradação da qualidade de vida da
população, a prevalência do interesse público sobre o particular é medida que se impõe.
Não é possível privilegiar a continuidade de uma atividade privada, a qual polui
sonoramente o meio ambiente e, indiretamente, incita a desordem e promove a
insegurança, em detrimento da privação de toda a coletividade de ter acesso a uma vida
digna, saudável e segura.
Sendo assim, diante dos fatos e do direito apresentados, requer-se a
imediata paralisação das atividades do réu nos moldes em que se apresenta.
3. DANO MORAL AMBIENTAL
O dano moral coletivo, hoje perfeitamente aceito pela nossa doutrina e
jurisprudência, tem como principal aplicação os casos de danos ambientais.
Isso porque, pessoas como o ora requerido, que promovem continuamente
danos ambientais, banalizando a questão, violam os direitos coletivos e
transindividuais.
Em se tratando de direito ambiental a repercussão dos danos se reflete no
cível, no crime e administrativamente. Trata-se de esferas independentes entre si, mas
todas importantes quanto aos objetivos que visam.
No cível a reparação pode ser não apenas dos danos materiais, mas
também morais, estes são compensáveis e aqueles indenizáveis.
Diz-se indenizáveis aqueles danos em que a vítima pode ser restituída ao
estado anterior à ocorrência do dano. Já os compensáveis são aqueles em que a vítima
não tem como ser restituída ao estado em que se encontrava antes, porém, lhe é
entregue certa quantia em dinheiro ou coisa como forma de amenizar o ocorrido.
Na aplicação do dano moral ambiental deve ser considerado e interpretado
de forma sistêmica o artigo 225 da Constituição Federal com o ordenamento jurídico,
pois ocorrendo lesão ao equilíbrio ecológico, este afetará a sadia qualidade de vida e à
saúde da população. Rompido o equilíbrio do ecossistema todos correm risco.
Nesta seara é o ensinamento do ilustre jurista - Dr. Carlos Alberto Bittar:
“A nosso ver, um dos exemplos mais importantes de dano moral coletivo é o dano
ambiental, que consiste não apenas na lesão ao equilíbrio ecológico, mas também na
agressão à qualidade de vida e à saúde. É que esses valores estão intimamente inter-
relacionados, de modo que a agressão ao ambiente afeta diretamente a saúde e a
qualidade de vida da comunidade (CF, art. 225).
[...]
O instrumento processual que se presta por excelência à defesa dos valores
coletivos em geral, na hipótese de dano, é a ação civil pública, em virtude da regra
aberta acolhida pelo artigo 1º, IV, da Lei 7.347/85. Aliás, com a modificação
realizada pela Lei Federal 8.884/94, o artigo 1º, caput, da Lei 7.347/85 passou a
prever, expressis verbis, a possibilidade de propositura de ações de responsabilidade
por danos morais de ordem coletiva. A responsabilidade pela produção do dano
ambiental é objetiva – ou seja, independe da prova de culpa – por duas razões
fundamentais: a) esse dano tem um caráter moral, decorrendo da própria ação
lesiva ao ecossistema; b) no Direito Ambiental, há o princípio do poluidor-pagador,
consagrado em nosso ordenamento jurídico (Lei Federal nº 6.938/81, art. 14, § 3º),
pelo qual é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a
indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por
sua atividade.”
A jurisprudência por reiteradas vezes tem aceitado e concedido a
compensação por danos morais em matéria ambiental.
É o teor dos artigos da Lei 7347/85 - Lei de Ação Civil Pública:
“Art. 3º - A ação civil pública poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o
cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.”
Em comentários ao referido artigo dizem Nelson Nery Júnior e Rosa Maria
de Andrade Nery:
“1. Condenação em dinheiro. A aferição do quantum indenizatório nas ações
coletivas com a finalidade de reparação do dano difuso ou coletivo é questão de
difícil solução. Poderão ser utilizados os critérios de arbitramento ou de fixação da
indenização com base no valor do lucro obtido pelo causador do dano com sua
atividade. É possível a cumulação da indenização por danos patrimoniais e morais
(STJ 37; CDC 6º VI).”
Neste diapasão, verifica-se a possibilidade de se impor ao réu o pagamento
pelos danos morais sofridos até então pela coletividade, uma vez que se trata aqui de
direitos difusos e coletivos.
Os Tribunais têm se manifestado no seguinte sentido:
“POLUIÇÃO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA FORMULADA PELO
MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. POLUIÇÃO CONSISTENTE EM
SUPRESSÃO DA VEGETAÇÃO DO IMÓVEL SEM A DEVIDA
AUTORIZAÇÃO MUNICIPAL. CORTES DE ÁRVORES E INÍCIO DE
CONSTRUÇÃO NÃO LICENCIADA, ENSEJANDO MULTAS E
INTERDIÇÃO DO LOCAL. DANO À COLETIVIDADE COM A
DESTRUIÇÃO DO ECOSSISTEMA, TRAZENDO CONSEQÜÊNCIAS
NOCIVAS AO MEIO AMBIENTE, COM INFRINGÊNCIA, ÀS LEIS
AMBIENTAIS, LEI FEDERAL 4.771/65, DECRETO FEDERAL 750/93,
ARTIGO 2º, DECRETO FEDERAL 99.274/90, ARTIGO 34 E INCISO XI, E A
LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, ARTIGO 477.
CONDENAÇÃO A REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS
CONSISTENTES NO PLANTIO DE 2.800 ÁRVORES, E AO
DESFAZIMENTO DAS OBRAS. REFORMA DA SENTENÇA PARA
INCLUSÃO DO DANO MORAL PERPETRADO A COLETIVIDADE.
QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL AMBIENTAL RAZOÁVEL E
PROPORCIONAL AO PREJUÍZO COLETIVO. A IMPOSSIBILIDADE
DE REPOSIÇÃO DO AMBIENTE AO ESTADO ANTERIOR JUSTIFICAM
A CONDENAÇÃO EM DANO MORAL PELA DEGRADAÇÃO
AMBIENTAL PREJUDICIAL A COLETIVIDADE. PROVIMENTO DO
RECURSO.” (TJRJ - 2.ª Câmara Cível - Apelação Cível n.º 2001.001.14586 - Rel.:
Desa. Maria Raimunda T. de Azevedo - J. 07/08/2002)(grifo nosso).
É claro e evidente o descaso com que o assunto foi tratado para com os
moradores do entorno. O sono perdido, o medo, a insegurança, são fatores irreparáveis,
sendo, portanto, o dano moral ambiental, medida que se impõe.
4. DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
A inversão do ônus da prova é perfeitamente cabível no caso em discussão.
O artigo 21 da Lei 7.347/85 determina que aplicam-se à defesa dos direitos e interesses
difusos, coletivos e individuais, no que tenha cabimento, os dispositivos do Código de
Defesa do Consumidor.
O artigo 6º, inciso VIII da Lei 8.078/90 é expresso ao admitir a inversão do
ônus da prova em causa fulcrada no Código de Defesa do Consumidor, na medida em
que hipossuficiente o autor, segundo as regras comuns da experiência como bem
esclarece o texto legal, in verbis:
“Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da
prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do Juiz, for verossímil a
alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de
experiência;
(...)”
Tal dispositivo certamente tem aplicação, também, no âmbito de proteção
ao meio ambiente, pois em matéria ambiental a hipossuficiência e a verossimilhança são
requisitos para uma inversão do ônus da prova. Segundo Clóvis da Silveira4, a
hipossuficiência pode se dar sob várias perspectivas:
a) Hipossuficiência econômica: quando em um dos pólos, figuram “pequenas
associações desprovidas de recursos ou o MP, que também não poderia comprometer
seu orçamento institucional com o custeio de dispendiosas perícias” (SILVEIRA, 2004);
b) Hipossuficiência informativa: quando os demandantes em matéria
ambiental “não possuem, em regra, acesso às informações necessárias para comprovar o
nexo de causalidade que permite responsabilizar o poluidor” (SILVEIRA, 2004);
c) Hipossuficiência técnica: “considerando que os autores da ação civil
pública obtivessem acesso aos referidos dados, que não são informados a priori, não
saberiam manipulá-los ou deles obter significado que possa ser traduzido em provas”
(SILVEIRA, 2004);
d) Hipossuficiência decorrente do caráter do interesse tutelado: “a
hipossuficiência decorre, pois, do fato de que o empreendedor recolhe os benefícios da
produção, cirando riscos inerentes à atividade, enquanto o ambiente é degradado,
lesado-se o direito de todos” (SILVEIRA, 2004);
e) Hipossuficiência decorrente de Lei: “A própria Lei reconhece,
implicitamente, a hipossuficiência dos co-legitimados, pelo fato de estarem agindo em
interesse da coletividade, isentando-os do adiantamento de despesas e ônus de
sucumbência” (SILVEIRA, 2004).
Portanto é claro, que o Ministério Público ao ajuizamento de Ações Civis
Públicas, encontra-se em franca desvantagem perante o demandado.
4 SILVEIRA, Clóvis Eduardo Malinverni da. Aspectos Processuais do Direito Ambiental. Orgs. LEITE, José Rubens Morato; DANTAS, Marcelo Buzagio. 2 ed. Rio de Janeiro : Forense Universitária, 2004.
Assim entende a jurisprudência dominante:
“O instituto da inversão do ônus da prova, independentemente do título em que
esta disposto no Código de Defesa do Consumidor, pode ser aplicado nas ações civis
publicas, desde que as circunstancias fáticas assim o autorizem.” (TJPR, Processo:
334622-7/01, Agravo Regimental Cível, Órgão Julg.: 5ª. Câmara Cível, Relator:
Desembargador Leonel Cunha, 22.05.2006).
No que tange à responsabilidade pelo demandado ao pagamento das
respectivas custas, manifestou-se a jurisprudência:
“7.3.2. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E A ATRIBUIÇÃO DOS
CUSTOS DA PERÍCIA PELO DEMANDADO. Admissibilidade nas
demandas que envolvam a proteção ao meio ambiente. Ministério Público
e demais co-legitimados ao ajuizamento de ações civis públicas que estão
em franca desvantagem perante os demandados.
Ementa: Tratando-se de demanda que envolva a proteção ao meio ambiente, é
cabível a inversão do ônus da prova e a atribuição dos custos da perícia, pois o
Ministério Público e demais co-legitimados ao ajuizamento de ações civis públicas
estão em franca desvantagem perante os demandados. Edcl 70002338473 - 4ª Cam.
Civil. - TJRS - j. 04.04.2001 - rel. Des Wellington Pacheco Barros.5
E ainda:
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. PROVA PERICIAL. INVERSÃO DO ÔNUS.
ADIANTAMENTO PELO DEMANDADO. DESCABIMENTO.
5 Revista de Direito Ambiental, Coordenação: Antônio Herman V. Benjamin e Édis Milaré. Editora Revista dos Tribunais. Ano 6, n. 23, julho-setembro de 2001.
PRECEDENTES.
I - Em autos de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Estadual
visando apurar dano ambiental, foram deferidos, a perícia e o pedido de inversão do
ônus e das custas respectivas, tendo a parte interposto agravo de instrumento
contra tal decisão.
II - Aquele que cria ou assume o risco de danos ambientais tem o dever de reparar
os danos causados e, em tal contexto, transfere-se a ele todo o encargo de provar
que sua conduta não foi lesiva.
III - Cabível, na hipótese, a inversão do ônus da prova que, em verdade, se dá em
prol da sociedade, que detém o direito de ver reparada ou compensada a eventual
prática lesiva ao meio ambiente - art. 6º, VIII, do CDC c/c o art. 18, da lei nº
7.347/85.
IV - Recurso improvido.” (STJ. REsp 1049822/RS. Rel. Min. Francisco Falcão.
Primeira Turma. Julg: 23/04/2009).
Assim, “pertence ao demandado, a partir de então, o ônus da prova, para que
comprove inexistência do nexo de causalidade que se lhe atribui entre ação e dano. Uma vez que o
agente criou as condições (riscos) par que o dano ocorresse, nada mais lógico que a ele pertença tal
encargo”6
Conclui-se, portanto, pelo cabimento da inversão do ônus da prova.
5. PEDIDO LIMINAR
Como acima mencionado, o Réu vem exercendo suas atividades, sem
licença ambiental além de estar desvirtuamento o ramo das atividades liberadas, em
total desrespeito à legislação vigente.
6 SILVEIRA, Clóvis Eduardo Malinverni da. Aspectos Processuais do Direito Ambiental. Orgs. LEITE, José Rubens Morato; DANTAS, Marcelo Buzagio. 2 ed. Rio de Janeiro : Forense Universitária, 2004.
Conforme autorizado pelo artigo 12 da Lei n. 7347/85 o juiz poderá
conceder liminar com ou sem justificação prévia.
O fumus boni iuris, que é a existência e ocorrência do direito substancial
invocado por quem pretende a segurança, está cabalmente demonstrado pelos
documentos que acompanham a presente e, pela legislação citada.
Por outro lado, se for possibilitado ao Requerido que continue com sua
atividade danosa enquanto perdurar o processo estar-se-á permitindo a continuação de
uma atividade comprovadamente irregular e danosa, em prejuízo da saúde e do bem-
estar de um número indeterminado de pessoas que vivem no entorno do
estabelecimento. Aí reside o periculum in mora.
Disso resulta a necessidade da concessão da medida liminar, inaudita
altera pars, sem necessidade de justificação prévia, determinando-se que o
estabelecimento BAR QUINZE ALTA LTDA, seja totalmente interditado com a
cassação do alvará, com base no Art. 11 da Lei 7.347/85, com a imposição de multa
diária a ser arbitrada por este juízo, pelo descumprimento do preceito; tendo em vista
que o Réu não possui documentação regularizada e principalmente porque produz
poluição sonora de forma indireta, posto que em razão da atividade noturna ora
desenvolvida, seus freqüentadores causam algazarras e perturbações do sossego ao se
deslocarem na entrada e saída do bar.
Requer-se ainda a Vossa Excelência, em concedendo a liminar, que
determine que ao Comando Geral da Polícia Militar do Paraná que fiscalize o
cumprimento da ordem, apontando ao juízo eventuais violações para a apuração de
multa diária e a requisição de força policial, se necessário.
6. DEMAIS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
I - a concessão da liminar nos moldes anteriormente delineados e sua
confirmação;
II - a citação do Réu, na pessoa do seu representante legal, com o
permissivo do artigo 172, parágrafo 2º, do CPC, para querendo, responder e
acompanhar os termos da presente, sob pena de serem considerados como verdadeiros
os fatos nesta alegados;
III – a condenação do Réu em obrigação de não fazer, sob pena de multa
diária em valor a ser arbitrado por Vossa Excelência e devidamente recolhido ao
Fundo Estadual do Meio Ambiente - FEMA - consistente em se abster de desenvolver a
atividade nos moldes atuais, na modalidade de música ao vivo e/ou mecânica, que
provoque a perturbação do sossego público e poluição sonora, no lote de Inscrição
Imobiliária 05.0.0008.0088.00-3 e Indicação Fiscal 34.102.055, principalmente no horário
destinado ao repouso noturno compreendido entre 22h e 7h, com a inclusão de tal
condicionante na Guia Amarela do respectivo lote, a fim de dar publicidade e evitar,
assim, futuros prejuízos tanto aos moradores do entorno, como a possíveis
empreendedores.
V - que todas as intimações do Ministério Público sejam feitas
pessoalmente, na pessoa do Promotor de Justiça em atividade na Promotoria de
Proteção ao Meio Ambiente, na Rua Marechal Deodoro, n. 1028, 10º andar, Centro,
Curitiba - Paraná, conforme dispõe o art. 236, §2º, do CPC;
VI - protesta-se ainda por todos os meios de prova em direito admitidas,
inclusive depoimento pessoal dos representantes legais do Réu, prova pericial,
documental e testemunhal;
VII - a procedência da ação em todos os seus termos, condenando-se o
Réu ao pagamento das despesas processuais e verbas honorárias de sucumbência, cujo
recolhimento deste último deve ser feito ao Fundo Especial do Ministério Público do
Estado do Paraná, criado pela Lei Estadual n. 12.241, de 28 de julho de 1998 (DOE n.
5302, de 29 de julho de 1.998), nos termos do artigo 118, inciso II, alínea “a”, parte final,
da Constituição do Estado do Paraná.
VIII - a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros
encargos, nos termos do artigo 18 da Lei n. 7.347/85.
Atribui-se à causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais)
Termos em que, pede deferimento.
Curitiba, 24 de abril de 2013.
Sérgio Luiz Cordoni Promotor de Justiça