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ESTUDOS DIACRÔNICOS DE LÍNGUAS INDÍGENAS BRASILEIRAS: UM PANORAMA DIACHRONIC STUDIES OF THE INDIGENOUS LANGUAGES OF BRAZIL: A PANORAMA ANDREY NIKULIN UNIVERSIDADE DE BRASILIA, Brasil FERNANDO O. DE CARVALHO UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPA, Brasil RESUMO | INDEXAÇÃO | TEXTO | REFERÊNCIAS | CITAR ESTE ARTIGO | O AUTOR RECEBIDO EM 09/04/2019 ● APROVADO EM 13/05/2019 Abstract This study has a two-fold purpose: to provide the reader with a panorama of the state of the art in diachronic studies of the Indigenous languages of Brazil and to promote a rigorous application of known, accepted methods employed by historical linguistics to these languages. We discuss at some length issues such as the proof of language relationship, the internal classification, the phonological and syntactic reconstruction, as well as the philological studies that aim at detecting diachronic changes. Special attention will be given to the comparative method.

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ESTUDOS DIACRÔNICOS DE LÍNGUAS INDÍGENAS BRASILEIRAS: UM PANORAMA

DIACHRONIC STUDIES OF THE INDIGENOUS LANGUAGES OF BRAZIL: A PANORAMA

ANDREY NIKULIN UNIVERSIDADE DE BRASI LIA, Brasil

FERNANDO O. DE CARVALHO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPA , Brasil

RESUMO | INDEXAÇÃO | TEXTO | REFERÊNCIAS | CITAR ESTE ARTIGO | O AUTOR

RECEBIDO EM 09/04/2019 ● APROVADO EM 13/05/2019

Abstract

This study has a two-fold purpose: to provide the reader with a panorama of the state of the art in diachronic studies of the Indigenous languages of Brazil and to promote a rigorous application of known, accepted methods employed by historical linguistics to these languages. We discuss at some length issues such as the proof of language relationship, the internal classification, the phonological and syntactic reconstruction, as well as the philological studies that aim at detecting diachronic changes. Special attention will be given to the comparative method.

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Macabéa – Revista Eletrônica do Netlli | V.8., N.2., JUL-DEZ. 2019, p. 255-305.

Resumo

O artigo possui o duplo objetivo de introduzir o leitor a um panorama do estado da arte em estudos diacrônicos das línguas indígenas brasileiras, além de promover uma aplicação rigorosa dos métodos já consolidados da linguística histórica a essas línguas. Para tanto, abordamos separadamente os problemas de demonstração de parentesco genético entre as línguas, de subagrupamento, de reconstrução fonológica e sintática de proto-línguas e de estudos filológicos que visam a detectar mudanças linguísticas. Atenção especial será trazida ao método histórico-comparativo.

Entradas para indexação

KEYWORDS: Indigenous languages. Historical linguistics. Comparative method. PALAVRAS CHAVE: Línguas indígenas; Linguística histórica; Método histórico-comparativo.

Texto integral

INTRODUÇÃO

Em termos de diversidade linguística, o Brasil é um dos países que mais se destaca no mundo. Estima-se que o território nacional abriga mais de cento e cinquenta2 línguas originárias (isto é, desconsiderando-se aquelas cuja presença no continente deve-se à colonização europeia e a processos migratórios posteriores), subdivididas em pelo menos dezenove unidades genéticas distintas. Entretanto, apesar do alto grau de diversidade linguística do país, os estudos diacrônicos de suas línguas ainda são incipientes em comparação com as línguas de algumas outras regiões, tais como a África ou a Eurásia.

Este artigo possui um duplo objetivo. Em primeiro lugar, o de oferecer um panorama (necessariamente seletivo) dos estudos já desenvolvidos na área da linguística histórico-comparativa das línguas indígenas faladas no Brasil. Em segundo lugar, o de promover uma aplicação mais rigorosa dos métodos clássicos e eficientes, amplamente utilizados nas pesquisas em linguística histórica, às línguas indígenas brasileiras. Para tal fim, discutiremos criticamente uma amostra dos estudos incluídos no nosso panorama, com a atenção focada a aspectos metodológicos de importância central na aplicação do método comparativo.

O restante deste artigo está estruturado da seguinte maneira. Na primeira seção (‘Classificação genética’), abordaremos a classificação genética das línguas indígenas brasileiras, dedicando subseções separadas aos problemas da demonstração da existência do parentesco entre línguas (primeira subseção: ‘Demonstração de parentesco’) e da determinação do grau de parentesco, isto é, da identificação de relações genéticas mais e menos profundas dentro de famílias e troncos já delimitados (também chamada de classificação interna; segunda

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subseção). Trataremos da reconstrução de elementos de proto-línguas na segunda seção (‘Reconstrução de proto-línguas: método comparativo’), discutindo tanto a reconstrução fonológica (primeira subseção) como a reconstrução sintática (segunda subseção). A terceira seção (‘Rastreamento de mudanças linguísticas: método filológico’) trará um panorama dos estudos diacrônicos das línguas indígenas brasileiras baseados em dados filológicos. Concluiremos o artigo com a quarta seção (‘Conclusão’), em que resumimos os pontos principais levantados em seções anteriores.

CLASSIFICAÇÃO GENÉTICA

A tarefa de classificação genética das línguas do mundo consiste na identificação de conjuntos de línguas que possuem uma origem genética comum. Como resultado dessa atividade, a linguística histórica oferece informação diretamente relevante para a investigação da pré-história da humanidade, uma vez que a identificação de uma ancestralidade comum entre línguas permite a inferência de que as populações que as falam partilham também de uma história em comum. Nesse sentido, os estudos em classificação das línguas complementam os resultados de diversas outras disciplinas, da arqueologia e da genética à antropologia e à mitologia comparada.

O problema colocado diante dos linguistas pode ser sintetizado da seguinte maneira: do conjunto de todas as similaridades lexicais (ou seja, aquelas observadas no vocabulário), nos elementos gramaticais, nos padrões fonológicos, morfológicos e sintáticos, das línguas do mundo, quais são indicadoras de que essas línguas possuem um parentesco, uma ancestralidade comum? Quais, por outro lado, resultam apenas de contatos históricos entre seus falantes, quais são meramente fortuitas e quais podem ser atribuídas a regularidades tipológicas na estrutura dos sistemas gramaticais? O linguista histórico tem diante de si a tarefa de discriminar entre os diferentes tipos de similaridades encontradas em função da sua origem provável, identificando aquelas que constituem evidência de uma origem comum.3 A partir dessas evidências, é possível afirmar que determinadas línguas pertencem a um mesmo agrupamento genético (na tradição acadêmica brasileira, os agrupamentos mais profundos e mais diversos são conhecidos como troncos e os menos profundos e menos diversos como famílias, embora a diferença entre esses dois termos não seja rígida).

A linguística histórica não apenas procura estabelecer se há relação de parentesco genético entre determinadas línguas, mas também busca resolver o problema da classificação interna (ou subagrupamento) das unidades genéticas previamente identificadas a fim de reconstruir, no maior detalhe possível, o processo de diversificação das línguas ancestrais (proto-línguas) de tais unidades.

Estudos linguísticos demonstraram que algumas das línguas indígenas brasileiras possuem uma origem comum, formando pelo menos doze famílias e troncos: Macro-Jê, Tupi, Aruak, Caribe, Tukano, Pano-Tacana, Nadahup, Txapakura, Nambikwara, Arawá, Yanomami e Guaicuru (desta última família,

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apenas a língua Kadiwéu é falada no Brasil).4 Outras línguas, tais como o Tikuna e o Pirahã, pertencem a famílias muito pequenas (Tikuna-Yuri e Mura-Pirahã), sendo as ú nicas lí ngúas sobreviventes das mesmas. As relaço es gene ticas externas de algúmas oútras lí ngúas e peqúenos grúpos de dialetos, tais como My ky/Irantxe , Kanoê, Kwazá, Aikanã, Trumai, Arutani e o Maku de Roraima, não foram identificadas até o presente, razão pela qual estas línguas são conhecidas como línguas isoladas. O status de algumas línguas e pequenas famílias ainda é debatido. Por exemplo, de acordo com alguns pesquisadores, as línguas Bororo, Kariri, Yaathê, Guató e Puri integrariam o tronco linguístico Macro-Jê, enquanto outros autores não as incluem neste tronco (para uma discussão, ver RIBEIRO, VOORT, 2010, seção ‘Rastreamento de múdanças lingúísticas: método filológico’). O complexo dialetal Katukina-Kanamari poderia formar parte da família Katukina-Harakmbet (ADELAAR, 2000); contudo, ainda não há consenso quanto à validez dessa proposta.

Nas próximas seções apresentaremos o estado da arte nos estudos relacionados à classificação genética das línguas indígenas brasileiras, abordando a demonstração de parentesco na primeira subseção e o problema de subagrupamento na segunda subseção.

DEMONSTRAÇÃO DE PARENTESCO

As primeiras hipóteses relacionadas à classificação genética das línguas da América do Sul remontam ao trabalho de Gilij (1780–1784), que identificou duas famílias importantes do continente: a família Maipure (hoje conhecida como Aruak) e a família Caribe. Desde Gilij até a primeira metade do século XX, o problema da classificação das línguas sul-americanas foi abordado por diversos oútros aútores, tais como Lúcien Adam, Paúl Rivet, Čestmír Loúkotka e J. Alden Mason (ver ADAM, 1890; RIVET, 1924; LOUKOTKA, 1963, 1968; MASON, 1950, entre muitos outros trabalhos). Contudo, esses estudos eram limitados pela extrema escassez da documentação das línguas do continente. Além de serem parcos em quantidade, os registros aos quais os autores supracitados tinham acesso foram, em sua maioria esmagadora, elaborados por viajantes e naturalistas europeus que nunca tiveram a oportunidade de trabalhar detidamente com as línguas em questão, impossibilitando, assim, uma análise fonológica, morfológica e sintática segura dos dados por eles registrados. Esses fatores, naturalmente, constituíram um impedimento incontornável para as pesquisas em linguística histórica.

A situação se reverteu com os avanços na documentação das línguas indígenas sul-americanas na segunda metade do século XX, e deveu muito ao trabalho pioneiro de Aryon Dall’Igna Rodrigues. Dois dos principais agrupamentos linguísticos presentes exclusiva ou majoritariamente no Brasil, as famílias Tupi e Macro-Jê, tiveram as suas primeiras caracterizações mais explícitas no trabalho deste aútor, qúe os definia como “troncos lingúísticos”.5 Utilizando métodos mais confiáveis do que aqueles empregados por outros pesquisadores, como a

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“comparação múltilateral” de Joseph Greenberg (ver RANKIN, 1992; MATISOFF, 1990; CAMPBELL, 1988 para críticas deste procedimento), e baseando-se em mais e melhores dados do que aqueles disponíveis, por exemplo, para a classificação de Loukotka (1968), Rodrigues pôde, ao longo de décadas de trabalho, propor um delineamento básico para os dois troncos em questão.

Qualquer proposta de parentesco genético entre duas ou mais línguas, para ser comprovada, tem de atender aos seguintes critérios:

(1) a identificação de um conjunto de correspondências sonoras (necessariamente recorrentes) entre as línguas a serem comparadas;

(2) a identificação de um conjunto de prováveis cognatos entre as línguas em questão, isto é, de itens lexicais tais que

(a) apresentem as correspondências sonoras supracitadas,

(b) possuam semântica idêntica ou muito próxima,

(c) pertençam ao vocabulário básico (isto é, não cultural);6

(3) a ausência de hipóteses concorrentes mais plausíveis.

Muitos autores que tratam da questão da demonstração de parentesco genético acrescentam a essa lista mais um critério:

(4) a identificação de um conjunto de semelhanças morfológicas (idealmente paradigmáticas).

Em nossa opinião, embora a existência de paralelos morfológicos seja de grande valor para a corroboração das propostas de parentesco, este critério não pode ser considerado universal. Primeiramente, casos de erosão morfológica rápida são bem atestados na história das línguas do mundo (por exemplo, na história recente do inglês, do francês moderno e do africâner), mostrando que sistemas morfológicos complexos podem ser perdidos ou reestruturados em um período relativamente breve. Além disso, o critério morfológico não é aplicável no caso de línguas isolantes (por exemplo, no caso de algumas línguas da família Nadahup) pelo simples motivo de essas línguas quase não possuírem morfologia afixal. Isto é, embora a presença de correspondências morfológicas, em especial quando apresenta organização paradigmática, constitua uma evidência forte para que se reconheça a existência de um vínculo genético entre duas ou mais línguas (ou famílias), a ausência deste tipo de similaridade não indica que as línguas ou famílias sob comparação não possuam tal vínculo, nem servem de indicação de que investigações adicionais que examinem dados, por exemplo, de natureza lexical, estejam necessariamente fadadas ao fracasso. Para uma discussão maior sobre a superioridade do critério lexical em relação ao critério morfológico, referimos o leitor a Dybo e Starostin (2008, p. 124–138).

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A Tabela 1 apresenta uma lista, com breves comentários, de trabalhos usualmente apontados como aqueles que primeiro apresentaram evidências de parentesco entre duas ou mais línguas indígenas brasileiras (ou entre famílias inteiras). Além do pioneirismo das contribuições, procuramos selecionar aqueles que mais se aproximam do ideal exposto acima, no que diz respeito ao tipo de evidência e argumentação apresentados em favor da hipótese de parentesco em questão.7

Tabela 1. Seleção de trabalhos que demonstram as relações genéticas entre as línguas indígenas brasileiras

obra línguas ou famílias comparadas

agrupamentos cuja existência é demonstrada

comentário

GILIJ, 1780–1784

Maipure, Guipunave, Avare, Cavere (Cabre), Mojeño

Aruak (parcialmente)

trabalho baseado em línguas Aruak do Orinoco e também no Mojeño, da bacia do Mamoré (atual Bolívia), contém uma comparação cuidadosa de elementos lexicais e gramaticais

Tamanaco, Avaricoto, Pajure, Galibi

Caribe (parcialmente)

trabalho baseado apenas em um subconjunto das línguas Caribe faladas na bacia do Orinoco (atual Venezuela), contém uma comparação cuidadosa de elementos lexicais e gramaticais, incluindo o reconhecimento de correspondências regulares

DE LA GRASSERIE, 1890

Pano, Conibo, Pacavara, Maxuruna, Caripuna, Mayoruna Domestica, Mayoruna Fera

Pano comparação de dados lexicais de campos semânticos diversos (partes do corpo, flora, fauna, parentesco) e de classes lexicais diversas, inclúindo “verbos” e “adjetivos”; o aútor indica ainda a existência de correspondências sonoras regulares (ver OLIVEIRA, 2014 para a reconstrução mais atual e compreensiva do Proto-Pano)

BRINTON, 1891

Arawá, Paumari Arawá (parcialmente)

Brinton (1891) foi o primeiro a falar em um “tronco (stock) lingúístico Arawá”, baseado em dados do Paumari (Pammary) e Arawá (Araua); ver Dixon (2004) para uma reconstrução do Proto-Arawá

ADAM, 1899 Abipón, Mocovi, Toba, Mbayá

Guaicuru embora a existência da família Guaicuru fosse conhecida desde o século XVIII, a compilação produzida por Lucien Adam é a primeira investigação sistemática de similaridades entre as línguas em questão, mais completa do que trabalhos anteriores como, por exemplo, o de Lafone Quevedo (1896)

CRÉQUI- MONTFORT, RIVET, 1913

Tapakura, Kitemoka, Wanyam, Moré, Napeka, Rokorona

Txapakura primeiro trabalho extenso das línguas da família Txapakura (cuja existência já havia sido proposta por Alcide d’Obrigny e Alexander F. Chamberlain); não se aplica o método comparativo, mas as línguas são próximas entre si o suficiente para não deixar dúvida quanto a sua origem comum

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DAVIS, 1966 Apinaje , Kí se dje , Canela, Xavante, Kaingang

Jê primeira demonstração convincente do parentesco entre o Kaingang e as demais línguas Jê (ver NIKULIN, 2019 para uma reconstrução atualizada)

DAVIS, 1968 Jê, Maxakali, Karajá

Macro-Jê (parcialmente)

ver Ribeiro (2012) para maiores evidências em favor da inclusão do Karajá, Nikulin e Silva (2019) para maiores evidências em favor da inclusão do Maxakali

GIRARD, 1971a

línguas Caribe Caribe primeira demonstração formal do parentesco; ver Meira e Franchetto (2005) e Meira et al. (2010) para uma reconstrução atualizada

MIGLIAZZA, 1972

Yanam/Ninam, Sanɨma, Yanomam, Yanomamɨ

Yanomami embora o parentesco entre as línguas/variedades que formam a família Yanomami seja óbvia, o trabalho de Migliazza (1972) oferece a primeira exploração sistemática da diferenciação entre os membros dessa pequena e pouco diversa família; sua divisão em quatro línguas/variedades básicas parece ter se mantido, ao menos como referência, na literatura posterior sobre esse agrupamento

RODRIGUES, 1980

Munduruku, Tupi-Guarani

Tupi (parcial-mente)

primeira demonstração formal do parentesco, confirmando a proposta de Rodrigues (1958)

PAYNE, 1991 24 línguas Aruak Aruak primeira demonstração formal do parentesco entre as línguas Aruak na acepção moderna dessa família (ver MATTESON, 1972 para uma tentativa anterior que envolvia línguas que hoje não são reconhecidas como membros da família)

ADELAAR, 2000

Katukina, Harakmbet

Katukina- Harakmbet

apresenta 40 comparações de elementos lexicais, quase que exclusivamente nominais, alguns dos quais apresentam apenas cognatos parciais; há o apontamento inicial de correspondências segmentais

RODRIGUES, 2002

Tupari, Tupi-Guarani

Tupi (parcial-mente)

primeira demonstração formal do parentesco, confirmando a proposta de Rodrigues (1958)

SEKI, 2002 Jê, Krenak Macro-Jê (parcialmente)

ver Nikulin e Silva (2019) para maiores evidências em favor da inclusão do Krenak

RODRIGUES, 2005, 2007

Tupi-Guarani, Aweti, Mawé, Munduruku, Juruna, Tupari, Arikém, Mondé, Ramarama, Puruborá

Tupi primeira demonstração formal detalhada do parentesco, confirmando a proposta antecipada pelo mesmo autor (RODRIGUES, 1958)

ADELAAR, 2008

Chiquitano, Jê e outras línguas Macro-Jê

Macro-Jê primeira demonstração convincente do parentesco entre o Chiquitano e as demais línguas Macro-Jê

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DIETRICH, 2009

Karitiana, Tupi-Guarani

Tupi (parcial-mente)

primeira demonstração formal do parentesco, confirmando a proposta de Rodrigues (1958)

RIBEIRO, VOORT, 2010

Jabuti, Jê e outras línguas Macro-Jê

Macro-Jê primeira demonstração convincente do parentesco entre a família Jabuti e as demais línguas Macro-Jê, confirmando a hipótese de Nimuendajú (2000 [1935])

EPPS, BOLAÑOS, 2017

Hup, Yuhup, Dâw, Nadëb

Nadahup embora o fato de as quatro línguas Nadahup serem relacionadas tenha sido estabelecido ainda no começo do século XX por Th. Koch-Grünberg, o trabalho de Epps e Bolaños (2017) é o primeiro a demonstrar que não há evidências suficientes para agrupá-las com as língúas Kákúa, Nɨkak, Púinave e Hodɨ, como se fazia em várias classificações anteriores

Quando se trata de unidades genéticas de alta profundidade temporal, torna-se imprescindível a utilização de reconstruções intermediárias (isto é, de reconstruções de subagrupamentos de baixa profundidade, sobre os quais vide a súbseção ‘Classificação interna’) para a demonstração do parentesco: a quantidade das evidências positivas invariavelmente diminui com o aumento da distância temporal por diversas razões (perda lexical, acúmulo de mudanças sonoras, semânticas e gramaticais). Para melhor ilustrar isto, providenciamos na Tabela 2 abaixo alguns dados lexicais das línguas Xavante e Maxakali que, como se sabe hoje, pertencem ao tronco Macro-Jê.

Tabela 2. Alguns dados lexicais das línguas Xavante e Maxakali.

glosa filho dente barriga fome semente cabeça osso cinza

Xavante ’ra /ʔraː/

’wa /ʔwa/

di(’i) /niʔ/

mra(m) /mrʌ m/

nhama/dzö /jʌm/

’rã(i) /ʔrʌ j/

hi /hi/

’ru(i) /ʔrúj/

Maxakali kutok /ktuk/

xox /cuc/

tex /tɛk/

putup /ptɨp/

xap /cap/

putox /ptuc/

kup /kɨp/

putohok /ptuk/

Obs: os dados da Tabela 2 estão listados em sua representação ortográfica e fonológica. Em Xavante, algumas palavras possuem alomorfes diferenciados conforme o contexto prosódico.

É possível observar algumas semelhanças entre os dados dessas duas línguas. Um leitor atento poderia hipotetizar, a partir dos dados apresentados na Tabela 2 acima, que diversas oclusivas do Maxakali (k-, c-, p-) poderiam corresponder a Xavante ʔ- antes de consoantes (ktuk ~ ʔraː, cuc ~ ʔwa, ptuc ~ ʔrʌj, ptuk ~ ʔruj; exceção: ptɨp ~ mrʌm) e buscar explicações para as demais correspondências (Xavante a ~ Maxakali u; Xavante r ~ Maxakali t). Entretanto, se um investigador postulasse uma relação genética entre o Xavante e o Maxakali apenas com base nos dados na Tabela 2, provavelmente sua hipótese não encontraria ampla aceitação na comunidade acadêmica.

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Felizmente, ambas línguas integram famílias relativamente ramificadas (o Xavante pertence ao subramo Central do ramo Cerrado da família Jê; o Maxakali é parte de um mesmo ramo com o Krenak), permitindo uma comparação entre as respectivas proto-línguas. Na Tabela 3, detalhamos a evolução reconstruída das formas apresentadas na Tabela 2 acima (as formas cognatas são destacadas em negrito).

Tabela 3. A evolução de alguns dados lexicais das línguas Xavante e Maxakali.

glosa filho dente barriga fome semente cabeça osso cinza

Xavante ’ra /ʔraː/

’wa /ʔwa/

di(’i) /niʔ/

mra(m) /mrʌm/

nhama/dzö /jʌm/

’rã(i) /ʔrʌj/

hi /hi/

’ru(i) /ʔrúj/

Proto-Jê Central

*kraː *kwa *di(ki) *mrʌ(m) *ɲʌmʌ/*ɟʌ *krʌ(j) *hi (?)

Proto- Cerrado

*kra *jwa *tik *prʌm *cɨm *krʌj *ci *mbrɔ

Proto-Jê *kra *jɔ *tik *prʌm *cɨm *krɨɲ *ci *mbrʌ

Proto- Maxakali-

Krenak

*kruk *juɲ *tɛk *prɨm *jam *krɨɲ *jɛt ~ *jɛk

*proŋ

Maxakali kutok /ktuk/

xox /cuc/

tex /tɛk/

putup /ptɨp/

xap /cap/

putox /ptuc/

kup /kɨp/

putohok /ptuk/

Obs. As reconstruções acima são de Nikulin (2017, para o Proto-Jê Central e o Proto-Cerrado; 2019, para o Proto-Jê) e Nikulin e Silva (2019, para o Proto-Maxakali-Krenak). As reproduzimos aqui com algumas modificações referentes ao sistema de transcrição.

Uma breve inspeção das formas reconstruídas apresentadas na Tabela 3 é suficiente para o investigador perceber o alto grau de semelhança superficial entre as línguas das famílias Jê e Maxakali-Krenak. É fácil ver que, com o aumento da distância temporal, a quantidade das evidências inequívocas de parentesco diminui. Nos primeiros cinco pares de exemplos, isto ocorre em razão do acúmulo das mudanças sonoras (tais como as mudanças *ɔ > *wa em Proto-Cerrado, *jw > *kw em Proto-Jê Central, *k > ʔ em Xavante; *r > t em Maxakali). Nos itens ‘cabeça’ e ‘osso’, o Maxakali sofreú úma perda lexical (os itens *krɨɲ ‘cabeça’ e *jɛt ~ *jɛk ‘osso’ são preservados apenas em Krenak, onde seus reflexos possuem a forma kren, jek, respectivamente). Já a forma *mbrɔ ‘cinza’ do Proto-Cerrado, embora seja preservada em Xavante, sofreu uma mudança semântica: seu reflexo Xavante -pro /-prɔ/ ocorre em palavras compostas e denota súbstâncias sólidas redúzidas a partículas tênues. Portanto, a suposta correspondência entre Maxakali p- e Xavante ʔ-, discutida acima, é fictícia: os dois pares de palavras em que ela se baseava, após uma análise mais detalhada, resultam não serem verdadeiros cognatos.

Finalmente, chamamos a atenção do leitor ao fato de existirem casos em que uma língua passa por uma grande quantidade de mudanças linguísticas, dificultando a identificação da língua como um membro da família já identificada.

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Ao discutir o caso da língua Xetá, Rodrigues (1978, p. 8) atenta para os fatores que contribuíram para que outros pesquisadores (GUÉRIOS, 1959; LOUKOTKA, 1960) duvidassem da classificação dessa língua como um membro do subramo Guarani:

1) mudanças fonológicas que tornaram algumas palavras não

imediatamente reconhecíveis como afins a suas correspondentes em guarani <...>: aˈwãci neblina, em guarani (g.) ɨbiˈti; ˈñoča espécie de palmeira, g. yuˈyɨ; waˈrëke bebida (de coquinho), g. ɨˈba rɨˈkwe suco de fruta; háˈwiča grande, g. hubiˈcya; ˈrãiča frio, g. roˈʔɨˈca;

2) substituição de nomes tabuizados por outras designações, geralmente locuções descritivas; p. ex. ˈhaikã ˈpiritai caça/carne malhada, em lugar de ˈñagwa onça, que corresponde ao guarani yaˈwa(reˈte), ˈhaikã čapeˈai caça/carne que tem casca, em lugar de ˈtato tatu, que corresponde ao g. taˈtu; ˈhaikã ˈhuuai caça/carne que faz huu, em lugar de kaˈpiwai capivara, que corresponde ao g. kapiʔɨˈba;

3) substituição de nomes simples por locuções metafóricas que aludem a fatos míticos; p. ex.: ˈñane ˈčape taˈkië nossa luz, irmão mais velho para o sol, em g. kwaraˈhɨ; ˈñane ˈčape ˈtëwë nossa luz, irmão mais moço para a lua, em g. yaˈcɨ; taˈtɔka aldeia das estrelas para o céu, em g. ɨˈbag; taˈtɔka maˈŋetai introdutor (?) do céu para o gavião, em g. tawaˈto;

4) substituição de nomes simples ou complexos por derivados ou compostos descritivos; p. ex.: haikãˈča (haikã+ečɨ+a) assador de caça/carne, em lugar de ˈata fogo, que corresponde ao g. aˈta; ˈñane ˈtata nossas estrelas, cujo segundo elemento corresponde ao segundo componente do g. yaˈcɨ-tatˈa estrela; ñepraˈka o colhedor (g. yeporaˈkaˈha) para o machado, em g. yɨ; či miˈrata que eu faço andar comigo (g. cye remieroaˈta) para minha esposa, em g. cye remireˈko (literalmente a que eu faço estar/viver comigo); porõˈha o pizador [sic] (g. pɨˈruˈha) para o pé, em g. pi; mãˈha o vedor (g. maˈʔeˈha) para o olho, em g. eˈca; počiˈa o defecador (g. poˈtiˈha) para o ânus, em g. eˈbiˈkwa (literalmente orifício das nádegas); ˈmoi čiˈwaki cobra de braços para o lagarto, em g. teˈyu;

5) substituição de nomes simples ou complexos por outros em conseqüência de extensões semânticas associadas ou não a mudanças culturais; p. ex.: taˈpegwa esteira para dormir, em g. piˈri(peˈmɨ), mas correspondente ao g. tatapeˈkwa abano para o fogo: a mesma peça tem ambas as serventias entre os índios da Serra dos Dourados; ˈtagwa flauta, em g. miˈmɨ, mas correspondente ao g. taˈkwa taquara: as flautas da Serra dos Dourados são feitas de taquara; kaˈnomi homem, em g. kuimaˈʔe, mas correspondente ao g. kunumi menino; ˈñčoi sapo, em g. kuruˈru, mas correspondente ao g. yuˈʔi rã. (RODRIGUES, 1978, p. 8)

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Outras línguas com perfis similares ao do Xetá, isto é, que, em virtude de drásticas mudanças induzidas tanto por fatores internos (mudanças sonoras, perdas de morfemas gramaticais e substituição lexical) ou externos (contato linguístico), tiveram seu parentesco com um dos grandes agrupamentos linguísticos do Brasil colocadas em cheque incluem o Sirionó para a família Tupi-Gúarani, e tanto o Chamicúro qúanto o Yanesha’ para a família Arúak. Embora seja pouco provável que alguma das línguas que atualmente são consideradas como isoladas (não classificadas) pertença, de fato, a um dos troncos linguísticos já delimitados, tendo sido sujeitas a uma combinação destes processos que dificultam a busca por elementos cognatos, tal possibilidade ainda não pode ser definitivamente descartada.

CLASSIFICAÇÃO INTERNA

Como já dissemos acima, o problema da classificação interna (ou subagrupamento) consiste em se determinar, dentro de um conjunto de línguas que já se sabe serem relacionadas por uma origem comum, quais entre elas possuem uma relação de proximidade mais íntima. O ponto crucial é o de que não é necessário (e nem suficiente) que se demonstre que duas ou mais línguas são mais parecidas em alguma medida. O que o linguista histórico busca são evidências de um período comum de desenvolvimento, isto é, que mostrem que as línguas em questão são continuações de uma língua ancestral (conhecida como proto-língua intermediária) que se diversificou em um passado mais recente do que a proto-língua de todo o agrupamento genético. Para demonstrar que determinadas línguas tiveram, no passado, um período comum de desenvolvimento, é necessário identificar um conjunto de inovações compartilhadas, ou seja, mudanças linguísticas que ocorreram em um estágio anterior destas (e somente destas) línguas. As inovações se opõem às retenções (isto é, elementos linguísticos que não sofreram mudança no percurso da proto-língua até as línguas em questão), que não possuem valor classificatório.8 É importante observar que para discernir as inovações das retenções, é necessário saber qual é o estado ancestral do fenômeno em questão (isto é, possuir uma reconstrução parcial da proto-língua). Por sua vez, a reconstrução do estado ancestral depende, em grande parte, do subagrupamento da família considerada, resultando em uma certa circularidade do processo. Esse problema não é fácil de se contornar, cabendo ao pesquisador avaliar qual dos possíveis cenários de diversificação é mais compatível com os dados (ver CHACON, LIST, 2015 para uma pioneira tentativa de automatização do processo, em que um dos algoritmos testados alcançou resultados positivos na dupla tarefa de reconstruir a evolução das consoantes das línguas Tukano e de determinar o subagrupamento dessa família linguística).

Em alguns casos a estreita relação entre determinadas línguas é tão transparente que se torna possível agrupá-las de forma preliminar, sem que as inovações que caracterizam o agrupamento sejam identificadas. É desta forma que foram delimitadas as famosas famílias dos troncos Tupi e Macro-Jê.

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Um dos produtos da aplicação do método comparativo da linguística histórica é o estabelecimento de uma cronologia relativa para as mudanças que afetaram uma ou mais línguas. Isso é possível, entre outras razões, porque algumas mudanças que ocorrem em determinado ponto na história de uma língua criam as condições para que mudanças posteriores ocorram. Assim, no Macuxi, membro da família Caribe falado no estado de Roraima, certas mudanças sonoras alteraram encontros consonantais, mudando, por exemplo, -tp- em -ʔp. Para que isso ocorresse, no entanto, foi preciso que, primeiro, esses encontros consonantais fossem produzidos como resultado de uma outra mudança de queda das vogais. Um sufixo como *-tɨpu (passado perfectivo) mudou primeiro para *-tpu, e apenas depois para -ʔpu. A mudança de queda da vogal (no caso, a vogal ɨ do sufixo *-tɨpu) precisou ocorrer antes, para que a mudança do encontro consonantal ocorresse (o leitor pode consultar GILDEA, 1995 para uma interessante discussão desse e de outros processos similares em várias línguas da família Caribe). Temos, assim, uma cronologia relativa em que a mudança vocálica precede historicamente a mudança consonantal.

A cronologia relativa dos eventos de diversificação é comumente vista desde a perspectiva do chamado modelo arbóreo. Esse modelo parte da premissa de que cada língua (exceto os pidgins e as línguas crioulas) descende de exatamente uma língua ancestral, representando o processo de diversificação linguística como uma série de divergências, sem admitir a possibilidade de uma convergência de duas (ou mais) línguas.9 Dessa forma, é possível diagramar a cronologia relativa dos eventos de diversificação em um cladograma, em que cada nó corresponde a uma língua atestada ou a uma língua ancestral de um dado agrupamento no momento de sua dissolução.

Há estudos que objetivam identificar não apenas a cronologia relativa dos eventos de diversificação, mas também sua cronologia absoluta. Em algumas regiões do mundo, tal objetivo pode ser alcançado, em alguns casos, com a utilização de dados extralinguísticos (históricos ou arqueológicos) através da datação dos eventos históricos que subjazem os eventos de diversificação linguística, como, por exemplo, a separação do subramo oriental/balcânico das demais línguas neolatinas pode ser associada com a retirada das legiões romanas em 271 d.C. Entretanto, no caso das línguas indígenas brasileiras não há registros escritos que permitam ancorar os eventos de diversificação linguística (exceto os mais recentes) a eventos históricos, o que implica na necessidade de recorrer a outros métodos de datação. Uma das ferramentas propostas para esse fim é conhecida sob o nome de glotocronologia (SWADESH, 1952, 1955). Ela parte da premissa de que existe uma taxa constante de decaimento (perda) lexical, cujo valor pode ser determinado (calibrado) a partir dos dados das línguas com uma história mais bem documentada. Os estudos produzidos nessa linha incluem os de D’Ans (1973, 1975) para a família Pano e Meira (1998, capítúlo 8) para o súbramo Taranoano da família Caribe, entre outros. No entanto, muitos linguistas não aceitam os resultados dos estudos glotocronológicos como válidos, apontando a alguns problemas nas premissas teóricas envolvidas, bem como à incompatibilidade entre os resultados de aplicação desse método e a realidade histórica em alguns casos específicos.10

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Outros estudos aplicam métodos quantitativos (filogenéticos) sem se comprometerem com a datação absoluta dos eventos de divergência. Tais estudos, via de regra, se baseiam em dados lexicais, embora haja estudos que contemplam níveis linguísticos diferentes, tais como a fonologia. Os estudos filogenéticos se classificam em baseados em distâncias (LIMA-ANGENOT, 1995 para a família Txapakura; DANIËLSEN et al. 2011, para a família Aruak; GALUCIO et al., 2015 para o tronco Tupi) e baseados em caracteres (RIBEIRO, 2006 para a família Pano; WALKER, RIBEIRO, 2011 para a família Aruak; MICHAEL et al., 2015 para a família Tupi-Guarani; CHACON, LIST, 2015 para a família Tukano; BIRCHALL et al., 2016, para a família Txapakura). No entanto, no estágio atual do desenvolvimento da filogenética não há consenso sobre qual dos métodos existentes gera classificações mais confiáveis, e a maioria dos estudos supracitados visa apenas verificar se os métodos filogenéticos neles utilizados dão resultados compatíveis com as classificações obtidas usando métodos mais tradicionais (não filogenéticos). Por fim, vale notar que a correta aplicação de métodos computacionais depende de uma aplicação prévia do método histórico-comparativo, uma vez que os dados de entrada sobre os quais operam tais métodos, como conjuntos de cognatos ou desenvolvimentos diacrônicos na fonologia e a na morfologia (os chamados “caracteres filéticos”), são parte do produto que resulta da aplicação sistemática dos métodos tradicionais. Assim, os métodos computacionais constituem uma ferramenta complementar, que não visa substituir a linguística histórica tradicional e já estabelecida. Essa observação crucial torna mais clara ainda a necessidade de se proceder com cautela ao avaliar os resultados da aplicação destes métodos quantitativos às famílias linguísticas do Brasil e da América do Sul, uma vez que resta ainda muito trabalho a ser feito na aplicação do método histórico-comparativo a esses grupos linguísticos.

Abaixo, a título de exemplo, apresentamos algumas informações acerca do estado atual do conhecimento acerca do subagrupamento de alguns dos grandes troncos brasileiros: Tupi, Aruak e Macro-Jê.

Os estudos mais recentes das línguas do tronco Tupi convergem na classificação apresentada no Quadro 1 (não discutiremos aqui o subagrupamento da família Tupi-Guarani).

Quadro 1. Subagrupamento do tronco Tupi

As famosas dez famílias constituintes (Mondé, Ramarama, Puruborá, Arikém, Tupari, Juruna, Munduruku, Tupi-Guarani, Aweti, Sateré-Mawé) foram delimitadas

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por Aryon Dall’Igna Rodrigúes em razão de súa relativa homogeneidade interna, sem a identificação das inovações que as caracterizassem. Posteriores estudos identificaram nós e bifurcações adicionais, identificados com números entre colchetes no Quadro 1 acima, que detalhamos a seguir.

● [1] Divisão binária da família Mondé em dois subramos: Suruí-Paiter e Mondé Nuclear (MOORE, 2005). Dentro do ramo Mondé Nuclear, a língua Salamãy é a mais divergente (fato não representado no Quadro 1 por motivos gráficos). Esta divisão é contestada por Anonby (2012).

● [2] Uma proximidade estreita entre a família Ramarama e a língua Puruborá é defendida por Galucio e Gabas Júnior (2002).

● [3] Divisão binária da família Tupari em dois ramos: Makurap e Tupari Nuclear (ANDRADE, a sair; GALUCIO, NOGUEIRA, 2011). Um exemplo de uma inovação compartilhada por todas as línguas Tupari menos o Makurap é a extensão do alomorfe *i- do prefixo de terceira pessoa para os temas da chamada classe II, substituindo o alomorfe *c- (> Makurap t-): cf. Proto-Tupari *c-aʔɨp ‘filho dele’ > Makúrap t-aɨp (terceira pessoa de *jaʔɨp ‘filho’), mas Proto-Tupari Nuclear *i-jaʔɨp > Sakurabiat i-taɨp, Tupari i-aʔɨp. A situação em Makurap é claramente conservadora, havendo paralelos exatos em outras línguas do tronco Tupi (Munduruku t-, Sateré-Mawé h-, entre outros cognatos).

● [4] Divisão binária do ramo Tupari Nuclear em dois subramos: Tupari-Wayoró (ANDRADE, a sair) e Sakurabiat-Akuntsu (ANDRADE, a sair; GALUCIO, NOGUEIRA, 2011). O subramo Tupari-Wayoró é caracterizado por claras inovações lexicais, tais como *kiriɲã ‘únha’ e *akop-k-ap ‘fogo’ (substituindo Proto-Tupari *mbo-ape ‘únha’ e *ojat ‘fogo’). O súbramo Sakurabiat-Akuntsu é caracterizado por múltiplas inovações lexicais compartilhadas, tais como *mãʦo ‘noite’ (súbstitúindo Proto-Tupari *ŋgicak) e *kɨcpit ‘peixe’, além de claras inovações fonológicas, incluindo a epêntese consonantal no ambiente i_V (Sakurabiat s; Akuntsu t) e um desenvolvimento peculiar de Proto-Tupari *t, *j (Sakurabiat s, t; Akuntsu ʧ, t).

● [5] Uma proximidade estreita entre a família Tupi-Guarani e as línguas Sateré-Mawé e Aweti (DRUDE, 2006; CORRÊA-DA-SILVA, 2010; MEIRA, DRUDE, 2015), que formam um agrupamento conhecido na literatúra como “Maweti-Gúarani” oú “Mawé-Gúarani”. Há inovações fonológicas e lexicais claras que o caracterizam, tais como a emergência de uma regra sincrônica de palatalização de um segmento coronal reconstruível como *c quando precedido por *i (*cet ‘nome’ → *ui-cet ‘meú nome’) oú a súbstúição de Proto-Tupi *tik ‘múriçoca’ por *watiʔũ, com o mesmo significado.

● [6] Uma proximidade particularmente estreita entre a família Tupi-Guarani e a língua Aweti (DRUDE, 2006; CORRÊA-DA-SILVA, 2010; MEIRA, DRUDE, 2015), evidenciada por inovações fonológicas, tais como os reflexos

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de *c, *c do Proto-Mawé-Guarani entre vogais (em ambos ramos, *-c- > *-∅- em ambientes orais, *-j- em ambientes nasais; *-c- > *-t- em todos os ambientes) ou a mudança semântica dos reflexos de *wup (‘vermelho’ → ‘amarelo’; em Proto-Aweti-Gúarani, o significado ‘vermelho’ era expresso pelo item *piðãŋ11).

Até o presente não foi confirmada a validade da proposta de Rodrigues (2007) referente a uma divisão binária do tronco Tupi, informalmente conhecida como a hipótese Oeste/Leste. De acordo com essa proposta, as línguas Tupari, Arikém, Mondé, Ramarama e Puruborá, por um lado, e as línguas Juruna, Munduruku, Mawé, Aweti e Tupi-Guarani, por outro lado, formariam unidades genéticas. A confirmação ou a rejeição (completa ou parcial) da proposta de Rodrigues crucialmente depende da reconstrução do estado ancestral do tronco; entretanto, atualmente não existe uma reconstrução do Proto-Tupi universalmente aceita. A investigação dos autores em curso identificou evidências plausíveis que permitem agrupar as famílias Tupari e Arikém, bem como as famílias Munduruku e Juruna, embora haja também evidências menos sugestivas que corroborariam a hipótese de Rodrigues referente à divisão binária do tronco Tupi em ramos Oeste e Leste.

Para as línguas Aruak a maior parte das classificações ancoram-se principalmente sobre a proximidade geográfica entre as línguas (esse é o caso de AIKHENVALD, 1999) ou sobre retenções lexicais, isto é, proporções de cognatos compartilhados entre pares de línguas, em geral computados sobre uma lista prévia de ‘significados básicos’ oú de étimos reconstruídos. Essa segunda abordagem é a de Payne (1991), que após reconstruir 203 étimos para o Proto-Aruak propõe uma classificação da família Aruak. No Quadro 2 abaixo, detalhamos os agrupamentos mais bem demonstrados, com base em argumentos propriamente linguísticos, incluindo um compartilhamento de similaridades lexicais e gramaticais que, no entanto, permanecem apenas intuitivamente compreendidos. Na ausência de uma reconstrução confiável para o Proto-Aruak, não é possível, no momento, identificar inovações compartilhadas para os ramos/subgrupos provisoriamente identificados. Em virtude da grande diversidade interna da família, aceita-se, atualmente, que a prioridade para o trabalho histórico consiste em aplicar o método histórico-comparativo para os subgrupos individuais, formados por línguas de relação obviamente próxima, e só então prosseguir, com segurança, para os níveis mais inclusivos, alcançando o Proto-Aruak em última instância. Além disso, é pouco provável que o Proto-Aruak tenha se dividido em 11 línguas/ramos descendentes simultaneamente, porém a existência de agrupamentos mais abrangentes nunca foi formalmente demonstrada, uma tarefa que deverá ser assumida em futuras pesquisas.12

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Quadro 2. Subagrupamento da família Aruak

As propostas de inovações (ou, ao menos, similaridades) que caracterizam os agrupamentos apresentados no Quadro 2 são discutidas a seguir.

● [1] As línguas faladas nas proximidades da costa Caribe e na América Central (e, historicamente, nas ilhas caribenhas), a saber, o Lokono, o Wayuunaiki, o Añun (ou Paraujano), o extinto Taíno e o diversos letos do Caribe Insular, são consensualmente classificados como membros de um subgrupo Caribenho (AIKHENVALD, 1999; CAMPBELL, 1997, 2012). Não existe, no entanto, qualquer demonstração de inovações compartilhadas que definam concretamente este subgrupo, além de indicações genéricas, por exemplo, sobre a perda de *n medial nas línguas em questão (Proto-Aruak *ʧɨna-ru ‘múlher’ > Way(úúnaiki) hié-rɨ, Lok(ono) hia-ro, Car(ibe Insular) hiá-ru; Proto-Aruak *-nene ‘língúa’ > Way -a-jee, Lok -ɨje, Car -ieie; PAYNE, 1991, p. 422, 426).

● [2] O ramo constituído pelas línguas Wayuunaiki e Añun (Paraujano), de um lado, e o Lokono, de outro lado, é caracterizado pelo emprego do prefixo da primeira pessoa do singular *ta- (substituindo o prefixo *nu-, presente em quase todas as línguas Aruak). Carvalho (2016d) reconstrói um elemento *-ja, possivelmente de natureza dêitica, que funciona como base para a derivação de pronomes pessoais independentes nas línguas deste subgrupo, e que esse poderia ser, de fato, uma inovação compartilhada desse ramo. Carvalho (2017c) mostra que o numeral *kabɨnɨ ‘três’ e úma formação particúlar para o númeral ‘qúatro’ são também inovações compartilhadas que permitem diferenciar um subgrupo formado do Lokono, do Wayuunaiki e do Añun.

● [3] A mera inspeção de listas vocabulares parece ser suficiente para indicar que o Wapixana e o Mawayana estariam mais próximos um do outro do que de qualquer dos demais membros da família. No entanto, até o momento, não há qualquer identificação explícita de inovações que caracterize o subgrupo Rio Branco.

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● [4] Ramirez (2001) propõe a existência de úm súbgrúpo “Japúrá-Colômbia” reúnindo nove língúas Arúak do noroeste amazônico. O autor propõe algumas inovações fonológicas que seriam compartilhadas pelas línguas em questão. O primeiro problema é que muitas dessas são encontradas (co-ocorrendo) em diversos outros subgrupos, como o enfraquecimento da velar *k diante de vogais anteriores e a perda da oposição entre *p e *b provisoriamente reconstruída para o Proto-Aruak. De maneira mais séria, no entanto, o trabalho de Ramirez (2001) apresenta um sem número de erros metodológicos e de tratamentos dos dados, o que é suficiente para que todas as suas conclusões sejam encaradas com um grau ponderado de ceticismo (ver MICHAEL, 2009 para uma crítica geral; CARVALHO, 2018b, p. 8–9 para um problema específico no tratamento da fonologia histórica do Resígaro).

● [5] Zamponi (2003) apresenta o que, segundo o autor, seriam evidências de inovações lexicais, e algumas poucas inovações morfológicas, que permitiriam agrupar o Maipure, o Yavitero, o Baniva de Guainia (com seu co-dialeto Warekena do Xié) e o Baré em um mesmo ramo. A maior parte das supostas inovações não são exclusivas desse subgrupo (por exemplo, enfraquecimento de *k precedendo *i; uma forma idêntica ou próxima a -(k)anu para ‘braço’) e não constitúem argúmentos fortes o suficiente para reconhecer esse subgrupo com base em inovações.

● [6] O subgrupo Central, até o momento baseado essencialmente no fator de proximidade geográfica, reuniria o Paresi e o Enawenê-Nawê, que seriam co-dialetos de úma mesma língúa (“Arúak do Júrúena”; CARVALHO e BRANDÃO, 2018; BRANDÃO et al., 2018) com o ramo do Xingu [7].

● [7] O ramo Xingu inclui, por um lado, o Waurá, o Mehináku e o extinto Kustenaú como membros do que parece ser um mesmo complexo dialetal e, por outro lado, o mais diferenciado Yawalapiti (CARVALHO, 2016a). A fusão de *ɨ e *i em i (com posterior *e > ɨ) e a coronalização das labiais *p > r e *m > ɲ no contexto de *i (mas não de i < *ɨ) caracterizam o Yawalapiti unicamente com relação ao Waurá-Mehináku-Kustenaú (CARVALHO, 2016b).

● [8] Tradicionalmente associado a um ramo mais inclusivo, o hipotético “ramo Pré-Andino”, qúe inclúiria também as língúas Campa [9], o subgrupo Purus já foi objeto de algum trabalho histórico-comparativo (FACUNDES, 2000, 2002; BRANDÃO, FACUNDES, 2007). Embora pareça um grupo coeso lexicalmente, não foi ainda estabelecido com base em inovações compartilhadas.

● [9] As línguas Campa (Kampa) formam um subgrupo bastante coeso, compartilhando formas lexicais (*iNʧato “árvore”, *-taki “casca”, *-toNki “osso”, etc.) e mesmo gramaticais qúe não possúem cognatos óbvios em outros ramos da família. A existência de uma oposição de animacidade (além das categorias masculino e feminino), além de um contraste de clúsividade no sistema pronominal (“primeira pessoa + terceira pessoa” vs. “primeira pessoa + terceira pessoa + segúnda pessoa”) são características

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gramaticais distintivas. Esta última característica é em geral apontada como resultado de influência areal de línguas dos Andes, como as variedades Quéchua. Fonologicamente, a presença de um monotongo complexo (ditongo?) *ɨi (MICHAEL, 2011), de alternâncias morfofonológicas *k ~ *g, *p ~ *β e de sequências mediais de oclusivas nasais seguidas de oclusivas orais homorgânicas (*NC) indicam caminhos para investigações que possam apontar inovações fonológicas características deste subgrupo.

● [10] O subgrupo Bolívia-Paraná reúne línguas faladas entre os rios Mamoré e Guaporé, na Bolívia, e ainda o Terena, falado no Brasil próximo ao rio Paraguai (bacia do rio Paraná). Há, aparentemente, evidência para um desenvolvimento contextual *a > *o que seria compartilhado pelas línguas deste ramo (CARVALHO, no prelo), mas, na ausência de reconstruções da proto-língua do subgrupo e de uma melhor compreensão do Proto-Aruak, o fator condicionante deste desenvolvimento não foi ainda identificado. Um fator complicador é a existência, primeiro, de harmonia vocálica e ablaut a ~ o, este último associado a um sistema de expressão da distinção de modo realis/irrealis, e, segundo, de desenvolvimentos posteriores, como a fusão de *a e *o em a no dialeto Ignaciano do Mojeño (CARVALHO & ROSE, 2018), e que tornam as correspondências envolvendo a e o nesse grupo de línguas sensivelmente mais complexas.

● [11] Mais certa, no entanto, é a divisão, interna ao Bolívia-Paraná entre, por um lado, o Baure (e seus co-dialetos, como o Carmelito e o Joaqúiniano), e, por oútro, o ramo provisoriamente chamado de “Achane” (CARVALHO, 2017e), que incluiria o Mojeño, o Paunaka e o Terena. Embora o Terena tenha tradicionalmente sido classificado como mais distante, a exclusão desta língua de um subgrupo formado por Baure, Mojeño e Paunaka justifica-se apenas com base em critérios geográficos. Além de inúmeros itens lexicais compartilhados (CARVALHO, 2018a, 2018d, 2017e, no prelo), outras similaridades incluem: a forma e a distribuição de alguns classificadores, uma forma -VCV para o sufixo de objeto de primeira pessoa plural (CARVALHO, 2017e, p. 82–83), aparentemente única entre as línguas da família, similaridades em domínios lexicais estruturados (CARVALHO, 2018d), e uma alomorfia no sufixo reflexivo, -wo ~ -pu, em que o segundo alomorfe tem sua distribuição restrita ao contexto do morfema de irrealis -a.

● [12] A proximidade maior entre o Mojeño (que inclui os dialetos Trinitário, Ignaciano, Loretano e Javeriano, além do extinto Mojeño Antigo registrado por missionários Jesuítas no final do século XVII) e o Paunaka é sugerida não apenas por inúmeros compartilhamentos lexicais mas também por similaridades gramaticais sem correlatos óbvios em outras línguas da família, como úm “nome relacional” úsado para a posse indireta de nomes alienáveis, e úm prefixo de “terceira pessoa não-específica”, de forma ti-, e que não possui cognatos nos sistemas pronominais de qualquer outra língua Aruak (ver CARVALHO, 2018a).

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Pelo que foi resumido acima, sustentamos que a observação de Campbell (2012: 71) segundo a qual a classificação interna da família Aruak seria bem menos clara do que a de outras grandes famílias da América do Sul permanece válida e atual.

O tronco Macro-Jê compreende as seguintes famílias bem definidas (muitas delas consistem de apenas uma língua): Chiquitano, Jabuti, Rikbaktsa, Ofayé, Karajá, Maxakali, Kamakã, Krenak, Jê. O Quadro 3 detalha o estado da arte dos estudos em subagrupamento deste tronco.

Quadro 3. Subagrupamento do tronco Macro-Jê

A seguir, comentamos a estrutura apresentada acima.

● [1] Divisão binária do Proto-Macro-Jê em Chiquitano e Macro-Jê Nuclear. Uma inovação marcante que caracteriza o ramo que chamamos aqúi de “Macro-Jê Núclear” diz respeito à chamada consoante temática (também conhecida como prefixo relacional), que ocorre em todos os temas cujos cognatos em Chiquitano são iniciados por uma vogal: Chiquitano -otu ‘língúa’ ~ Proto-Macro-Jê Nuclear *ñ-õctək; Chiquitano -eʔe ‘mão’ ~ Proto-Macro-Jê Nuclear *ñ-im. A consoante temática nas línguas Macro-Jê Nucleares pode desaparecer nas formas flexionadas para a segunda e para a terceira pessoa; em outros ambientes, sua ocorrência é obrigatória.

● [2] A proximidade estreita entre a família Maxakali e a língua Krenak é sugerida por Nikulin e Silva (2019). As inovações que caracterizam o ramo em questão incluem a evolução das consoantes do Proto-Macro-Jê (*p, *t > *m, *n em ambientes nasais; *mb, *nd > *p, *t), uma mudança semântica no uso dos verbos *te ‘ir/vir (singúlar)’, *mũ ‘ir/vir (plúral)’ > *mũ ‘ir’, *ne ‘vir’, bem como uma extensão da esfera de uso das orações nominalizadas, que foram reanalisadas como orações independentes em Proto-Maxakali-Krenak (as antigas orações independentes sobreviveram nessas línguas apenas em algumas construções, como, por exemplo, no imperativo). Para a família Kamakã, dispomos de dados muito limitados, que, no entanto, são compatíveis com a classificação do Kamakã como um membro do ramo Maxakali-Krenak.

● [3] A separação antiga do Malali das demais línguas Maxakali é sugerida por algumas retenções fonológicas, tais como a ausência de

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epêntese vocálica nos encontros consonantais do tipo *Cr (> Malali C, Proto-Maxakali Nuclear *Cɨd > Maxakali Cɨt).

● [4] A divisão família Jê em dois ramos, Cerrado e Jê Meridional, é evidenciada por claras inovações em ambas proto-línguas (tais como o desenvolvimento de Proto-Jê *ɔ > Proto-Cerrado *wa, Proto-Jê Meridional *a, entre muitas outras inovações fonológicas e lexicais, ver NIKULIN, 2019); a língua Ingain, já extinta (não representada no Quadro 3), é a mais divergente entre as línguas Jê Meridionais, apresentando várias retenções do Proto-Jê, tais como os reflexos de Proto-Jê *ket ‘pedra’ e *mbɨt ‘astro’.

● [5] A divisão binária do Proto-Cerrado em dois ramos (Jê Setentrional e Jê Central) se justifica pela existência de inovações nas duas proto-línguas, tais como a nasalização *am, *um, *ɨm > *ãm, *ũm, *ɨm em Proto-Jê Setentrional e a reorganização do sistema vocálico e consonantal em Proto-Jê Central (NIKULIN, 2017).

● [6] A separação antecipada do Panará do Proto-Jê Setentrional é evidenciada por algumas inovações lexicais, tais como a substituição de *kakũm ‘estação seca’ (refletido como Panará akũŋ, cf. Proto-Jê Central *wahum) por *aŋgrʌ.

● [7] Após a separação do Panará, o Proto-Jê Setentrional (stricto sensu) sofre úma divisa o bina ria em dois ramos, Timbira e Trans-Tocantins (inclúindo o Apinaje , o Me be ngo kre, o Kí se dje e o Tapayúna). O Proto-Timbira e o Proto-Trans-Tocantins são caracterizados por múltiplas inovações compartilhadas, tais como *c > h em Proto-Timbira ou a substituição de *a-mbʌ ‘comer (intransitivo)’ por *ap-ku em Proto-Trans-Tocantins. A estrutura de cada um desses ramos não é indicada no Quadro 3, mas há evidências que permitem identificar alguns pequenos súbramos dentro deles, tais como Pykobje -Krikati, Canela-Kraho oú Kí se dje -Tapayuna (ver NIKULIN, SALANOVA a sair).

Para concluir, ressaltamos que entre as limitações dos trabalhos que tratam da classificação das línguas indígenas brasileiras, uma das mais sérias é a escassez de reconstruções adequadas de nível intermediário, isto é, para os ancestrais comuns dos subgrupos ou ramos destas famílias. Essa limitação contribui para uma baixa resolução nas classificações internas, além da produção de padrões muitas vezes erráticos de correspondência e de etimologias com muitos elementos não explicados, como é o caso do trabalho de Payne (1991) sobre as línguas Aruak, já discutido em alguns pontos acima. É de se esperar que futuras pesquisas privilegiem uma abordagem bottom-up, dando uma devida atenção à reconstrução das proto-línguas intermediárias, à topologia das árvores filogenéticas e à distribuição das inovações dentro de cada agrupamento genético.

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RECONSTRUÇÃO DE PROTO-LÍNGUAS: MÉTODO COMPARATIVO

Uma vez que a constituição de um determinado agrupamento linguístico é estabelecida (ainda que parcialmente), é possível proceder à reconstrução de sua língua ancestral. Por motivos de espaço, nesta seção abordaremos apenas a reconstrução da fonologia e da sintaxe das proto-línguas, não discutindo, portanto, os estudos em reconstrução semântica ou morfológica.

RECONSTRUÇÃO FONOLÓGICA

O método central para a reconstrução da fonologia de protolínguas é o método comparativo. Uma vez que um grupo de línguas tenha sido reconhecido como geneticamente válido e que um conjunto de prováveis elementos cognatos tenha sido identificado (ver súbseção ‘Classificação interna’), súa aplicação consiste, grosso modo, em duas etapas: (1) a identificação das correspondências sonoras entre as línguas que estão sendo comparadas e (2) a interpretação diacrônica dessas correspondências, ou seja, a atribuição de segmentos (sequências de segmentos, elementos suprassegmentais) específicos reconstruídos para cada uma das correspondências em casos de contraste entre as correspondências, e a identificação dos desenvolvimentos condicionados (os chamados splits) quando as correspondências estiverem em distribuição complementar.13 Dessa forma são estabelecidas as mudanças sonoras no percurso da protolíngua reconstruída às línguas modernas. A tarefa do linguista histórico é a de propor um cenário plausível para o desenvolvimento dos sons da protolíngua em todas as línguas descendentes, minimizando, na medida do possível, a necessidade de recorrer a mudanças sonoras tipologicamente incomuns.

É de boa praxe começar a reconstrução pelas protolínguas de baixa profundidade temporal, procedendo, sucessivamente, à reconstrução das línguas ancestrais dos agrupamentos cada vez mais abrangentes (dito isso, é necessário frisar que o uso dos dados externos na reconstrução intermediária não é excluído de forma categórica, sendo que esses dados podem ser determinantes em casos onde há múltiplas opções viáveis de reconstrução). Embora na atualidade haja um consenso quanto à importância desse procedimento (conhecido também como reconstrução bottom-up), ele não tem sido amplamente adotado nos trabalhos referentes à reconstrução das protolínguas de grandes famílias ou troncos sul-americanos, com algumas notáveis exceções.

Outro ponto importante é a relevância do subagrupamento da família cuja proto-língua está sendo reconstruída para as decisões reconstrutivas. Consideremos o seguinte exemplo imaginário. Suponhamos que uma determinada família compreende três línguas (denominadas X, Y, Z), havendo entre elas uma correspondência diacrônica X a : Y o : Z o. Considerando que a mudança sonora a > o é tão plausível quanto o > a, qual segmento deveríamos reconstruir para a protolíngua? A resposta dependerá da configuração topológica da árvore

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filogenética da família. Os cenários mais econômicos para cada uma das três possíveis configurações estão apresentados no Quadro 4 abaixo.

Quadro 4. Subagrupamento e reconstrução

Se o subagrupamento da família não envolve nenhum nó intermediário (ou seja, se as línguas X, Y e Z são mutuamente equidistantes; opção (a) no Quadro 4), a solução mais plausível seria reconstruir *o para a protolíngua, visto que nesse caso teríamos que postular apenas uma inovação (*o > a na língua X) e não duas inovações paralelas, que seriam necessárias caso reconstruíssemos *a para a protolíngua (observe que este último cenário também não pode ser descartado e deve ser preferido, por exemplo, se existe uma correspondência concorrente X o : Y o : Z o). Se as línguas X e Y são mais estreitamente relacionadas uma à outra, formando um nó na árvore filogenética da família (opção (b) no Quadro 4), a solução mais econômica é reconstruir *o tanto para a protolíngua da família inteira, como para a protolíngua intermediária de X e Y: nesse caso é necessário postular apenas uma inovação, sendo que qualquer cenário alternativo exigiria, no mínimo, duas inovações. Já no caso de uma proximidade especial entre as línguas Y e Z (opção (c) no Quadro 4) é possível propor reconstrução sólida apenas para a protolíngua intermediária de Y e Z (*o, sem nenhuma mudança nas línguas-filhas). Para decidir se a protolíngua apresentava *a ou *o neste caso, teremos que recorrer a informações adicionais (sistêmicas ou externas), já que qualquer uma dessas opções exigiria apenas uma inovação na família (seja em X, seja em proto-Y-Z).

Em certos trabalhos influentes sobre a reconstrução das protolínguas das famílias linguísticas brasileiras, o subagrupamento dessas famílias tem sido ignorado, levando os autores a postularem reconstruções pouco prováveis de alguns segmentos. Uma das reconstruções que sofre, de forma sistemática, desse vício é a reconstrução das consoantes do Proto-Tupi de Rodrigues (2007). Examinemos a correspondência atribuída por esse autor a Proto-Tupi *c(ˀ)/*č(ˀ):14 Suruí-Paiter n-/-t- : Mondé t : Karo t : Puruborá d (n em ambientes nasais) : Karitiana t : Makurap t : Tupari t (s diante de i) : Wayoró t : Sakurabiat s : Akuntsu ʧ : Yudjá t-/-d- : Xipaya ʧ-/-d- : Munduruku ʧ-/-ʤ- (ʃ diante de i) : Kuruaya ʧ-/-ɖ- (ʧ-/-n- em ambientes nasais, ʤ diante de i) : Proto-Tupi-Guarani *ʦ/*ʧ : Aweti t : Sateré-Mawé t. Para maior clareza, reproduzimos essa mesma correspondência na árvore genética do tronco Tupi no Quadro 5 abaixo.

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Quadro 5. Subagrupamento e reconstrução

Damos alguns exemplos na Tabela 3.

Tabela 3. Alguns conjuntos de cognatos nas línguas Tupi

glosa sair,

chegar ir morder

tomar banho

veado pesado lua mãe muri- çoca

Suruí-Paiter

(?) iʧi-ab patiga ŋati-kat ni/-ti nig

Mondé i(ː)tiː gati ti

Karo to itɨ piʔti tik

Puruborá ane m-a ɨdɨ

Karitiana tãm ‘voar’,

otãm otɨ pɨti oti ti tik

Makurap ʧ-ato-a ɨtɨː poti ti

Tupari toko-a ‘mascar’

ato-a posi si sik

Wayoró togo

‘macaxeira mascada’

ato-a ɨtɨː poti ti tik

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Sakurabiat sogo-a aso-a ɨsɨː posi si

Akuntsu ʧog-a aʧo-a (?) ɨtɨː ti tik

Yudjá ʧa e-ʧuku padetu ʤa

Xipaya ta e-tuku padetu diã

Munduruku ʧe m,

aʤe m ʧə aʤok poʃi ˀʃi ʃik

Kuruaya ʧe m ʧɨ aɖok iʤi waʤi ʤi(ʔ) ʤik

Proto-Tupi-

Guarani

*ʧe m,

*w-aʧe m *ʦo *ʧúʔú *aʧuk *poʦɨj *jaʧɨ *ʧɨ

Aweti te m to túʔú atuk tɨ-wapat potɨj tatɨ tɨ

Sateré-Mawé

te m to túʔú ɨtɨː potɨj watɨ -tɨ

Obs: Omitimos aqui a marcação de tons nas línguas tonais.

Podemos observar que quase todos os descendentes imediatos do Proto-Tupi (com a exceção do Proto-Munduruku e do Proto-Juruna) apresentam o reflexo (*)t, sugerindo fortemente que a consoante em questão deve ser reconstruída como Proto-Tupi *t. Além das famílias Munduruku e Juruna (que, a princípio, poderiam formar um ramo), as línguas que possuem outros reflexos que não (*)t (excetuando-se os ambientes específicos, tais como _i) são: Puruborá, Sakurabiat, Akuntsu e Proto-Tupi-Guarani. Entretanto, todas essas línguas pertencem a agrupamentos mais abrangentes (Ramarama-Puruborá, Tupari e Mawé-Guarani, respectivamente), em que todas as demais línguas apresentam, de fato, o reflexo t, permitindo reconstruir *t para o Proto-Ramarama-Puruborá, Proto-Tupari (ANDRADE, a sair) e Proto-Mawé-Guarani (MEIRA, DRUDE, 2015).

Dessa forma, a reconstrução de *c(ˀ)/*č(ˀ) de Rodrigues (2007) não é corroborada pelos dados das línguas Tupi se levarmos em consideração a estrutura interna desse tronco. Críticas semelhantes podem ser estendidas a outras consoantes coronais (e algumas não coronais) reconstruídas por esse autor.15

Os resultados da aplicação do método comparativo podem ser verificados e/ou complementados através de reconstrução interna.16 Este método consiste na

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análise minuciosa dos fenômenos internos a uma língua (tais como alternâncias morfofonológicas, padrões alofônicos e lacunas distribucionais) que sugerem uma origem diacrônica dos mesmos. Uma limitação importante da reconstrução interna é que esse método (a não ser quando combinado com o método comparativo) não dá nenhuma informação sobre a cronologia das mudanças que ele revela, exceto por sua cronologia relativa. Por exemplo, aplicando o método de reconstrução interna a uma determinada alternância observada em Proto-Tupi-Guarani, é impossível dizer (sem considerar dados adicionais) se a mudança sonora que deu origem a essa alternância ocorreu na história independente de Proto-Tupi-Guarani, Proto-Aweti-Guarani, Proto-Mawé-Guarani ou até mesmo na história do Proto-Tupi. Para uma aplicação metodologicamente correta da reconstrução interna, referimos o leitor ao trabalho exemplar de Picanço (2005), que analisa as alternâncias, os padrões de alofonia e as lacunas distribucionais em Munduruku e Kuruaya (ambas da família Munduruku), chegando a conclusões sólidas referentes a mudanças sonoras ocorridas nessas duas línguas. Para tanto, a autora distingue entre diversos níveis cronológicos (Munduruku, pré-Munduruku, Proto-Munduruku, pré-Proto-Munduruku). Entre outras coisas, Picanço (2005) reconstrói a evolução do segmento que continua Proto-Tupi *t (ver discussão acima) na língua Munduruku (Quadro 6).

Quadro 6. Evolução de Proto-Tupi *t na família Munduruku (PICANÇO, 2005, p. 189)

A fim de ilustrar como funciona a aplicação do método comparativo aos dados de línguas reais, trazemos um exemplo, extraído de um trabalho de Meira (2005), que diz respeito à reconstrução do Proto-Bakairi, a proto-língua de dois dialetos da língua Bakairi (família Caribe, Mato Grosso), o Oriental (doravante L, Área Indígena Bakairi) e o Ocidental (doravante W, Área Indígena Santana).

No Quadro 7, representamos as correspondências não biunívocas entre os dois dialetos do Bakairi (isto é, aquelas em que um segmento em um dialeto pode corresponder a múltiplos segmentos do outro) identificados por Meira (2005).

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Quadro 7. Correspondências não triviais entre os dialetos Bakairi (MEIRA, 2005, p. 5)

Meira (2005) analisa cada uma dessas correspondências a fim de estabelecer se elas devem ser atribuídas a segmentos (ou sequências de segmentos) da proto-língua que deixaram de existir nos dialetos atuais (exemplificando os chamados mergers) ou se elas resultam de desenvolvimentos condicionados dos segmentos da proto-língua (os chamados splits). Em casos ambíguos, o autor recorre a dados externos de outras línguas da família Caribe (Hixkaryana, Makuxi, Ikpeng), bem como aos registros de Steinen (1892; ver seção ‘Rastreamento de múdanças linguísticas: método filológico’, para úma discússão sobre a aplicação do método filológico às línguas indígenas). Os resultados de Meira (2005) são resumidos na Tabela 4.

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Tabela 4. Reconstrução de alguns segmentos do Proto-Bakairi (PB) segundo Meira (2005)17

PB L W exemplos

*s s s L pəsega/W pəsega ‘porco’, L sagunu/W sagunu ‘areia’, L se/W se ‘paú’

*ʔs s ʔ L ise/W iʔe ‘partícúla de fútúro’, L ʃigəsedə/W ʃigəʔedə ‘eú o chamei’, L iməsedo/W iməʔedo ‘grande’

*ʃ ʃ ʃ L ʃeu/W ʃeu ‘qúati’, L ãgaʃeɾi/W agaʃeɾi ‘teú cérebro’, L ʃogo/W ʃogo ‘pai!’

*ʔʃ ʃ ʔ L odaʃi/W odaʔi ‘adentro’, L seʃi/W seʔi ‘deixa eú ver’

*ʔh h ʔ L tuhu/W tuʔu ‘pedra’, L taho/W taʔo ‘faca’, L poɾoho/W poɾoʔo ‘raposa’

*z z

∅ padrão

geral L kozekə/W koekə ‘esp. de veado’, L tutuze/W tutue ‘saber’, L ize/W ie ‘vontade’

h antes de a L azagə/W ahagə ‘dois’, L meza/W meha ‘esp. de peixe’, L mazagə/W mahagə ‘esp. de múriçoca’

*ʒ ʒ ∅ L pɨaʒi/W pəai ‘pajé’, L oɾoʒi/W oɾoi ‘cajú’, L moʒi/W moi ‘aranha’

ɾ

∅ entre

V nasais L pəɾe/W pəe ‘piranha’, L põɾã/W põã ‘colar, miçanga’, L kɨɾiwi/W kiwi ‘beija-flor’, L peɾə/W peə ‘mel’

ɾ

padrão geral

L paɾu/W paɾu ‘ágúa, rio’, L igɨɾɨ/W igiɾi ‘espinho’, L oɾoʒi/W oɾoi ‘cajú’, L eɾa/W eɾa ‘martim-pescador’

∅ em sílabas pretônicas

L ʃimukə/W ʃiɾimukə ‘estrela’, L pɨenaɾe/W pəɾenaɾe ‘paca’, L kamɨkə/W kaɾaməka ‘carrapato’

*i i

i

L aki/W aki ‘cútia’, L ikila/W ikila ‘barro’, L pili/W pili ‘esp. de túcano’, L iwɨ/W iwə ‘montanha’

*ɨ ɨ

padrão geral

L ədɨ/W ədi ‘o qúê?’, L ɨkɨ/W iki ‘dormir’, L egɨ/W egi ‘xerimbabo’, L igɨɾɨ/W igiɾi ‘espinho’

ə

após C labiais

L wɨdɨ/W wədi ‘esposa’, L mɨtu/W mətu ‘mútúm’, L pɨɾəu/W pəɾəu ‘flecha’, L tãwɨ/W tãwi ‘fúmo’

*ə ə L wəgə/W wəgə ‘sobre’, L əpa/W əpa ‘macaxeira’, L əgɨ/W əgi ‘qúem?’

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Meira (2005) ainda aplica o método de reconstrução interna, avaliando a possibilidade de reconstruir apenas uma fricativa para o pré-Proto-Bakairi, que teria sofrido um split condicionado (**s > *s, *ʃ, *h, *z, *ʒ). O autor conclui por apresentar uma amostra do léxico Proto-Bakairi, incluindo tanto as formas reconstruídas como seus reflexos no dialeto Oriental, no dialeto Ocidental e nos registros de Steinen (1892).

Terminamos esta seção com uma lista das referências mais importantes na reconstrução de proto-línguas das famílias linguísticas brasileiras (Tabela 5).

Tabela 5. Seleção de trabalhos sobre a reconstrução fonológica

família (tronco)

agrupa- mento

obras e comentários

Tupi tronco inteiro

Rodrigues (2005, 2007) apresenta uma primeira proposta de reconstrução do Proto-Tupi, seguida também por Corrêa-da-Silva (2010). Essa proposta tem enfrentado críticas por não seguir os princípios bottom-up (MEIRA, DRUDE, 2015; ANDRADE, a sair); ver também a discussão acima sobre os problemas na interpretação diacrônica das correspondências. Não houve propostas reconstrutivas alternativas.

Mondé Não há propostas reconstrutivas, embora Anonby (2012) discuta alguns processos diacrônicos internos à família Mondé.

Tupari Moore e Galucio (1993) apresentam uma proposta inicial da reconstrução do Proto-Tupari, posteriormente desenvolvida por Galucio e Nogueira (2011) e Andrade (a sair).

Juruna Fargetti e Rodrigues (2008) apresentam uma proposta reconstrutiva para as consoantes do Proto-Juruna. Uma proposta alternativa, para as oclusivas, é apresentada em Carvalho (a sair). O mesmo autor está atualmente envolvido em uma reconstrução fonológica, morfológica e lexical do Proto-Juruna.

Munduruku Aspectos importantes da reconstrução do Proto-Munduruku são discutidos por Picanço (2005, 2010, 2013). Mendes Junior (2007) constata as correspondências entre o Munduruku e o Kuruaya, reunindo alguns pares de cognatos, mas não apresenta uma proposta reconstrutiva.

Mawé- Guarani

A única proposta reconstrutiva que segue os princípios bottom-up é a de Meira e Drude (2015). Os autores observam que a reconstrução de Corrêa-da-Silva (2010) é idêntica, em termos fonológicos, à reconstrução do Proto-Tupi de Rodrigues (2005, 2007) e não pode ser representativa do Proto-Mawé-Guarani, embora o trabalho de Corrêa-da-Silva (2010) reúna uma grande quantidade de conjuntos de cognatos.

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Tupi- Guarani

As propostas reconstrutivas de Lemle (1971), Jensen (1989) e Mello (2000) convergem em muitos aspectos. Schleicher (1998) apresenta algumas críticas, em especial quanto à reconstrução de uma oposição entre duas africadas *ʦ e *ʧ, que ele argumenta ser desnecessária, e aplica o método de reconstrução interna.

Macro- Jê

Jê A proposta reconstrutiva mais recente é a de Nikulin (2019). Ela difere substancialmente daquela de Davis (1966), sendo baseada em dados sincrônicos de maior qualidade e de maior quantidade de línguas. Isto foi possível graças a importantes avanços na documentação e na descrição das línguas Jê nas últimas duas décadas.

Cerrado O único trabalho dedicado à reconstrução do Proto-Cerrado é o de Nikulin (2017).

Jê Seten- trional

Nikulin e Salanova (a sair) apresentam uma proposta reconstrutiva mais elaborada do que aquela de Nikulin (2016).

Jê Meri- dional

Aspectos da reconstrução fonológica do Proto-Jê Meridional são discutidos por Wiesemann (1978), D’Angelis (2008) e Jolkesky (2010). Jolkesky (2010) apresenta ainda um grande número de conjuntos de cognatos com as respectivas reconstruções; Nikulin (2016) defende importantes modificações na reconstrução das vogais do Proto-Jê Meridional.

Maxakali-Krenak

O único trabalho dedicado à reconstrução do Proto-Maxakali-Krenak é o de Nikulin e Silva (2019).

Jabuti Voort (2007) apresenta uma reconstrução do Proto-Jabuti, embasado em dados significativamente mais numerosos do que Oliveira e Cabral (2015).

Aruak família inteira

Há uma proposta de Payne (1991). Embora preliminar, é superior àquela de Matteson (1972), que inclui línguas não relacionadas (como se sabe hoje) na comparação. O trabalho de Payne (1991) deve, no entanto, ser tratado com cautela, por conter etimologias de abrangência duvidosa, julgamentos de cognação questionáveis e admitir muita irregularidade na postulação de correspondências.

Lokono-Wayuunaiki

Há uma proposta reconstrutiva de Captain (2005).

Campa Heitzman (1973) apresenta uma reconstrução das consoantes do Proto-Campa, porém quase toda baseada em dados do contínuo dialetal Asháninka-Ashéninka. Michael et al. (2010) e Michael (2011) propõe uma reconstrução detalhada da fonologia segmental do Proto-Campa, mas, como Heitzman (1973), não apresentam uma reconstrução lexical.

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Purus Aspectos da reconstrução fonológica e lexical do Proto-Purus são discutidos por Facundes (2000, 2002) e Brandão e Facundes (2007).

Bolívia- Paraná

Jolkesky (2016) propõe uma reconstrução para a proto-língua deste subgrupo (qúe ele chama de “Mamoré-Gúaporé”). Um problema de ordem geral com a proposta é a exclusão do Terena (ver a discussão do quadro 2 na subseção ‘Classificação interna’). Questões mais específicas sobre as propostas reconstrutivas de Jolkesky (2016) são abordadas por Carvalho (2018a) e Carvalho & Rose (2018). O primeiro analisa as correspondências entre o Paunaka, o Mojeño e o Terena (CARVALHO, 2018a), com um foco na fonologia histórica do Paunaka, mas não chega a propor uma reconstrução de proto-formas. Carvalho e Rose (2018) apresentam uma reconstrução detalhada da fonologia do Proto-Mojeño.

Caribe família inteira

A proposta pioneira de Girard (1971a) é aperfeiçoada por Meira e Franchetto (2005) e Meira et al. (2010).

Taranoano Meira (1998) apresenta uma reconstrução exaustiva da fonologia e da morfologia flexional do Proto-Taranoano, língua ancestral do subgrupo formado pelas línguas Tiriyó, Akuriyó e Karihona.

Bakairi Meira (2005) apresenta uma reconstrução exaustiva da fonologia do Proto-Bakairi.

Tukano família inteira

A proposta reconstrutiva mais recente e completa é a de Chacon (2015). Propostas anteriores, baseadas em dados menos numerosos e de qualidade mais baixa, incluem as de Waltz e Wheeler (1972) e de Malone (1986).

Pano- Takana

Pano Após uma proposta pioneira de Shell (1965), que incluía dados de apenas alguns ramos da família, houve uma proposta atualizada de Oliveira (2014), que leva em consideração também os dados do Kaxarari e do ramo Mayoruna.

Takana Há propostas de Key (1968) e de Girard (1971b).

Txapakura família inteira

Há propostas de Lima-Angenot (1997), Angenot e Lima-Angenot (2000) e Birchall et al. (2016).

Nadahup família inteira

Martins (2005) apresenta uma reconstrução do Proto-Nadahup, porém Epps e Bolaños (2015, p. 475, nota 11) apontam a graves erros metodológicos nesse trabalho. As autoras ainda apresentam algumas formas do Proto-Nadahup reconstruídas por elas de forma tentativa, observando que um estudo comparativo mais detalhado só poderá ser elaborado com um avanço na documentação do Nadëb.

Nambikwara família inteira

Há propostas reconstrutivas de Price (1978) e Costa e Wetzels (2008). Além disso, aspectos de reconstrução do Proto-Nambikwara foram abordados por Stella Telles (UFPE) em uma série de apresentações.

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Bororo família inteira

Camargos (2013) apresenta uma proposta reconstrutiva preliminar.

Guaicuru família inteira

Há uma proposta de Viegas Barros (2013).

Arawá família inteira

Dixon (2004) apresenta uma reconstrução da fonológica e lexical do Proto-Arawá. Dienst (2005) reavalia a reconstrução do inventário de fricativas, e trata de desenvolvimentos específicos do ramo Madihá (Deni-Kulina).

Além dos trabalhos supracitados, é de nosso conhecimento que atualmente estão sendo elaboradas reconstruções atualizadas das seguintes proto-línguas:

● Tupi: Proto-Tupari (Rafael Andrade, USP), Proto-Juruna (segundo autor), Proto-Tupi (ambos autores);

● Aruak: Proto-Purus e Proto-Achané (segundo autor);

● Macro-Jê: Proto-Timbira (Nandra Ribeiro, UFPA), Proto-Jabuti e Proto-Macro-Jê (primeiro autor);

● Proto-Bororo (primeiro autor).

RECONSTRUÇÃO SINTÁTICA

Os estudos em reconstrução sintática ganharam destaque na linguística apenas recentemente. As premissas teóricas e epistemológicas de uma das abordagens mais promissoras nesta área, a Gramática de Construções Diacrônica, são discutidas em detalhe por Barðdal e Gildea (2015). Os autores observam que as unidades sintáticas, ao serem representadas dentro do paradigma da Gramática de Construções (CROFT, 2001), tornam-se passíveis de aplicação do método comparativo (e também do método de reconstrução interna), permitindo uma reconstrução. Quando se trata do método comparativo, o procedimento envolve a identificação de construções cognatas; no caso da reconstrução interna, o pesquisador deve identificar isomorfias entre diferentes construções que assinalam uma reanálise ocorrida num estágio anterior da língua. As mudanças sintáticas diacrônicas envolvem três mecanismos:

● reanálise, ou seja, uma mudança estrutural sem mudanças na superfície;

● extensão (incluindo o nivelamento paradigmático);

● empréstimo.

Um dos percursos mais bem estudados de evolução de construções sintáticas, o qual diz respeito à transformação de orações nominalizadas em orações independentes através de uma reanálise (GILDEA, 2008). Nas línguas

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indígenas brasileiras, este tipo de desenvolvimento diacrônico foi reconstruído para uma série de línguas Caribe (GILDEA, 1998), para a língua isolada Trumai (GUIRARDELLO, 1999), para algumas línguas Jê Setentrionais (CASTRO ALVES, 2010) e para o Maxakali (NIKULIN, SILVA, a sair). Em todas essas línguas, as orações independentes para as quais é possível reconstruir este percurso de evolução tipicamente apresentam as seguintes características:

● um padrão ergativo-absolutivo de alinhamento morfossintático;

● a mesma morfossintaxe é utilizada para a codificação do argumento absolutivo — isto é, o único argumento (sujeito) dos verbos intransitivos ou o objeto dos verbos transitivos — e do possuidor de nomes (posse inalienável);

● o argumento ergativo (isto é, o sujeito dos verbos transitivos) é expresso por um sintagma posposicional ou por um sintagma nominal em um caso oblíquo;

● o verbo ocorre em uma forma especial que muitas vezes pode ser identificada com uma nominalização (no sentido etimológico), tipicamente apresentando pouca morfologia flexional.

No caso da língua Trumai, Guirardello (1999) recorre à reconstrução interna (uma vez que as relações externas dessa língua ainda não foram identificadas) e hipotetiza que todas as orações independentes do Trumai provêm de orações nominalizadas em construções clivadas, baseando-se em isomorfias morfossintáticas entre os sintagmas nominais e sintagmas verbais (em orações independentes ou subordinadas), bem como no fato de os verbos possuírem pouca morfologia flexional (como é esperado no caso das nominalizações). Em (1), reproduzimos o percurso diacrônico reconstruído por Guirardello (1999, capítulo 5) para as construções não clivadas do Trumai.

(1) estágio I oblíquo Cop (ka/chï) [SN V-Nmlz]

estágio II oblíquo Cop (ka/chï) Foc (in) [SN V-Nmlz]

alternativamente analisável como

A/DAT Cop (ka/chï) Foc (in) [O/S V]

estágio III A/DAT Foc/T (ka in/chï in) [O/S V]

Cop = cópula, Foc = foco, Foc/T = foco e tempo, A = agente de verbo transitivo, O = objeto de verbo transitivo, S = único argumento de verbo intransitivo, V = verbo, DAT = dativo, SN = sintagma nominal, Nmlz = nominalização.

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Por motivos de espaço, não podemos discutir em maior detalhe os trabalhos que abordam outros aspectos da reconstrução sintática ou morfossintática. Referimos o leitor às obras de Jensen (1990, 1998) para a reconstrução morfossintática do Proto-Tupi-Guarani, de Birchall (2015) para uma análise diacrônica da marcação de pessoa em verbos nas línguas Tupi, de Goergens (2011) e de Durand (2016) para uma análise diacrônica do alinhamento morfossintático nas línguas Aruak.

RASTREAMENTO DE MUDANÇAS LINGUÍSTICAS: MÉTODO FILOLÓGICO

O método filológico, que consiste na análise minuciosa de registros históricos de estágios anteriores das línguas modernas (ou de línguas que não são faladas na atualidade) tem sido fundamental para a compreensão dos mecanismos que subjazem as mudanças linguísticas e para a verificação da validade dos demais métodos utilizados na linguística histórica.

Contrariamente ao que acontece na África e na Eurásia, a aplicabilidade do método filológico às línguas da América do Sul é limitada, visto que anteriormente à invasão europeia a transmissão de informação se dava por outros meios que não a escrita nesse continente. Por este motivo, os materiais linguísticos mais antigos referentes às línguas originárias da região remontam somente ao século XVI. Além disso, a quase totalidade dos registros dos séculos XVI–XIX foi produzida por falantes não nativos (e, em grande parte, por pessoas sem treinamento linguístico e nem proficiência na língua do registro), resultando na qualidade relativamente baixa dos dados dessa época, com raríssimas exceções.

Entretanto, mesmo com as limitações existentes alguns desses materiais possuem um grande valor para a linguística histórica,18 pois eles viabilizam um rastreamento das mudanças linguísticas que ocorreram em determinadas línguas.

Um caso interessante diz respeito à língua falada pelos Kayapó do Sul, que ocupavam um vasto território no Brasil Central e tiveram um histórico conflituoso de contato com as frentes de colonização entre os séculos XVII e XX. Este povo era tido como extinto pela sociedade não-indígena até o trabalho de Heelas (1979), que levantou a hipótese de que os indígenas do povo Panará (Terra Indígena Panará) poderiam ser descendentes diretos dos Kayapó do Sul. Estudos posteriores (ver VASCONCELOS, 2013 e referências) confirmaram a hipótese; Vasconcelos (op. cit.) ainda constata que a língua Panará compartilha uma inovação fonológica importante (*r > j em alguns ambientes) com as variedades do Kayapó do Sul outrora faladas em Santana do Paranaíba (MS) e no Triângulo Mineiro, divergindo neste sentido da variedade do Kayapó do Sul que era utilizada em Mossâmedes (GO) (ver também CARVALHO, 2016c).

Embora sejam colhidos em uma época relativamente recente, os dados das variedades Kayapó do Sul que provavelmente representam um estágio anterior do Panará possuem algumas características arcaicas que não estão presentes no Panará tal como é falado hoje. Embora a aplicação do método comparativo permita reconstruir a história fonológica dessa língua em algum detalhe sem que seja

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necessário recorrer aos dados do Kayapó do Sul (NIKULIN, 2016, p. 170–171; 2017, p. 149–150), a análise desses dados não apenas corrobora as hipóteses reconstrutivas já existentes, mas também permite determinar a cronologia de certas mudanças linguísticas.

Por exemplo, graças ao método comparativo é sabido que em algum momento da história do Panará a vogal a foi nasalizada antes de consoantes pós-oralizadas (tais como mp, nt, ns, ŋk), processo que foi acompanhado de epêntese de n- no começo das palavras (NIKULIN, 2017, p. 149).19 No entanto, seria impossível determinar a cronologia absoluta dessa mudança sonora se não fosse pelos registros do Kayapó do Sul. Comparem-se as seguintes formas reconstruídas para o Proto-Jê Setentrional (PJS) com seus respectivos reflexos em Kayapó do Sul (dialeto mineiro, BARBOSA, 1918)20 e com seus reflexos Panará.

(2) Nasalização de *a e epêntese de n-

a. PJS *kaŋgro ‘qúente’ > Kayapó do Sul aŋkjo > Panará nəŋkjo

b. PJS *kaŋə ‘cobra’ > Kayapó do Sul aŋə > Panará nəŋkə

c. PJS *kambrô ‘sangúe’ > Kayapó do Sul ampjô > Panará nəmpju

d. PJS *aŋgrô ‘caitetú’ > Kayapó do Sul aŋkjô > Panará nəŋkjô

e. PJS *aŋgə ‘miçanga’ > Kayapó do Sul n/d > Panará nəŋkə

Os dados em (2) evidenciam que no percurso do Proto-Jê Setentrional para o Kayapó do Sul já haviam ocorrido algumas das mudanças sonoras próprias ao Panará, tais como a queda de *k- antes de -a-, o ensurdecimento das nasais pós-oralizadas e, somente nos dialetos meridionais do Kayapó do Sul, a mudança *r > j diante de vogais posteriores (CARVALHO, 2016c; NIKULIN, 2016, 2017). Por outro lado, há não menos de três mudanças sonoras, também características do Paraná, que aparentemente ainda não haviam ocorrido no estágio dessa língua atestado por Barbosa. Trata-se das seguintes mudanças:

● a mudança sonora ŋ > ŋk (NIKULIN, 2017, p. 149), como em PJS *kaŋə ‘cobra’, *ŋrõ ‘túcano’ > Panará nəŋkə, iŋkjõ-pepeti; observe que o Kayapó do Sul conserva ŋ neste primeiro item;

● a nasalização a > ə precedendo consoantes pós-oralizadas (esta mudança é necessariamente posterior a ŋ > ŋk; em caso contrário, o desenvolvimento esperado seria PJS *kaŋə > *aŋkə e não nəŋkə);

● a epêntese de n- no início de palavra precedendo ə.

Os dados de Kayapó do Sul, portanto, oferecem evidências importantes que permitem atribuir as três mudanças sonoras acima ao período mais recente (século XX) da história da língua Panará.

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Para as línguas da família Aruak, Carvalho (2017a, b) e Carvalho e Rose (2018) baseiam-se em transcrições deixadas por missionários, antropólogos e viajantes para complementar compreensão dos processos de mudança fonológica aos quais essas línguas se submeteram. No caso do Terena, por exemplo, língua de um povo Aruak do Mato Grosso do Sul, cujos ancestrais falavam uma língua docúmentada sob o nome de “Gúaná”, Carvalho (2017a) mostra qúe evidências puramente internas à língua, em especial alternâncias morfofonológicas entre uma fricativa glotal h e fricativas coronais s ou ʃ, permitem inferir a operação de um processo diacrônico de debucalização, *s, *ʃ > h. Esse desenvolvimento teve como alvo os alofones desvozeados destas fricativas coronais, que possuem reflexos com constrição oral (não-debucalizados) na língua moderna apenas em contextos de vozeamento espontâneo induzido por nasalidade contextual (háʔa ‘pai dele/dela’, nʒáʔa ‘meú pai’, em qúe a nasalidade marca o possúidor de primeira pessoa do singular). No entanto, a presença de fricativas coronais s e ʃ no Terena moderno (em elementos que não podem ser explicados como empréstimos, como o nome ʃâne ‘gente’ e o verbo sîmo ‘ele/ela chega’) poderia ser vista, em princípio, como úm problema para esta análise, uma vez que a aplicação de uma mudança sonora regular de debucalização nos levaria a esperar a ausência completa de tais segmentos do estrato lexical herdado, isto é, Aruak, dessa língua. A análise de documentos produzidos, por exemplo, pelo etnólogo alemão Max Schmidt (1903) e pelo engenheiro e militar brasileiro Alfredo Taunay (1875) mostra que quando a mudança em questão operou na língua o Terena possuía, além das fricativas s e ʃ que passaram a h, um par de segmentos africados, ʦ e ʧ. Esses últimos seriam, assim, a fonte das fricativas do Terena moderno, como mostramos na Tabela 6.

Tabela 6. Comparação dos dados de Schmidt (1903) com os do Terena moderno

glosa Schmidt (1903) Terena moderno correspondências

avó <ootsé> ôse <ts> : s

mandioca <tšupú> ʃúpu <tš> : ʃ

peixe <šooé> hôe <š> : h

amarelo <siaiti> hijáʔiti <s> : h

A comparação entre os dados do Terena moderno e os dados documentais tomados da língua como falada na passagem entre os séculos XIX e XX mostra, entre outras coisas, que o processo de debucalização que afetou as fricativas da língua foi, de fato, um processo de mudança sonora, regular, já que as fricativas ainda presentes no Terena moderno são em realidade reflexos de africadas (ver CARVALHO, 2017a, b para detalhes).

É muito importante ressaltar que qualquer aplicação do método filológico aos registros antigos deve ser precedida não apenas por uma análise grafêmica,21 mas também por uma análise crítica do sistema de transcrição neles utilizado, com uma atenção especial às limitações dos autores desses registros (ver MEIRA, 2005, 11–19 para um tratamento exemplar dos dados desse tipo). Em particular, é

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primordial entender que os dados que provêm de tais fontes não podem ser facilmente convertidos em representações fonológicas e devem ser decodificados com base em informações externas ao próprio registro para se chegar aos valores fonéticos dos grafemas utilizados. Se esse cuidado não é tomado, o pesquisador incorre em diversos riscos, tais como a identificação de correspondências fictícias.

CONCLUSÃO

Neste trabalho fizemos uma tentativa de apresentar um panorama do estado da arte nos estudos em linguística histórica referentes às línguas indígenas brasileiras. Para tanto, buscamos dar um enfoque maior aos trabalhos mais recentes, que por motivos cronológicos não são contemplados em trabalhos anteriores tidos como referência (RODRIGUES, 1986; URBAN, 1998).

Na primeira seção (‘Classificação genética’), além de apresentar os trabalhos que tratam da classificação das línguas indígenas brasileiras, procuramos demonstrar que essa tarefa depende crucialmente dos estudos em reconstrução. Por sua vez, na subseção ‘Reconstrução fonológica’ não apenas apresentamos os trabalhos que tratam da reconstrução de proto-línguas, mas também destacamos a importância dos estudos em subagrupamento para a aplicação do método comparativo e dos princípios de reconstrução bottom-up. Uma breve discussão acerca da reconstrução sintática encontra-se na subseção ‘Reconstrução sintática’. Na terceira seção (‘Rastreamento de mudanças linguísticas: método filológico), discutimos as possíveis contribuições da aplicação do método filológico aos estudos em diacronia das línguas indígenas, apesar das limitações existentes. Por motivos de espaço, não pudemos abordar diversos tópicos interessantes, discutidos na literatura existente, tais como as hipóteses de parentesco distante, reconstrução morfológica ou a classificação interna da família Tupi-Guarani. No entanto, as respectivas referências são ubíquas nos trabalhos que citamos aqui, e o leitor interessado não terá dificuldade em encontrá-las.

Notas

1 Agradecemos a Mário André Coelho da Silva pelas sugestões que contribuíram para o aprimoramento deste texto. O primeiro autor agradece também à CAPES pelo apoio financeiro.

2 Em razão da inexistência de critérios universais que poderiam distinguir entre línguas e dialetos, não é possível determinar este número com precisão. Crevels (2012, p. 179), citando um documento da FUNAI de 2005, apresenta o número de 180 línguas, que por sua vez é questionado como sendo excessivo por Moore et al. (2008), para quem 150 é um número “dificilmente últrapassável” caso levemos em consideração o critério da inteligibilidade mútua para reconhecer dialetos/variedades de uma mesma língua. Galucio et al. (2018) estimam esse número em 150–160.

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3 Entre as diversas causas/fatores que explicam as similaridades encontradas entre duas ou mais línguas, a herança comum (parentesco) e o contato linguístico, esse último consistindo na transmissão de material linguístico entre duas ou mais línguas não necessariamente relacionadas por parentesco, são usualmente descritas como os fatores históricos por trás de similaridades entre línguas, e são, ambos, objetos de investigação na linguística histórica. Duas outras causas de similaridades são chamadas de fatores não-históricos, a saber: a mera convergência acidental e fortuita entre línguas, e as similaridades explicadas por regularidades tipológicas. Uma parcela significativa dos métodos da linguística histórica consiste de meios para efetuar a delicada tarefa de distinguir entre esses tipos de causas de similaridades interlinguísticas.

4 Não mencionamos aqui, por limitações de espaço, as famílias presentes no Brasil historicamente mas cujas línguas deixaram de ser utilizadas na atualidade no território brasileiro em decorrência do processo colonizatório. Essa lista inclui a família Bora-Muinane, à qual pertence a língua ancestral do povo Miranha (ainda utilizada na Colômbia; os Miranha brasileiros passaram a falar português), e algumas pequenas famílias do leste brasileiro, tais como a família Kariri e a família Puri.

5 Além da expressão família linguística, de uso generalizado e não-controverso para se referir a grupos de línguas que possuem um ancestral em comum, termos como tronco linguístico (tradução proposta para o inglês stock) e mesmo filo (inglês phylum) tornaram-se correntes na linguística brasileira, em especial para nomear os troncos Tupi e Macro-Jê. A diferença entre família e tronco seria de inclusividade filogenética, o tronco contendo mais subgrupos/línguas ou incorporando um grupo mais heterogêneo de unidades, com maior diversidade lexical e gramatical. O uso dessa nomenclatura foi introduzido no país por Aryon D. Rodrigues, baseado em convenções similares adotadas pelo linguista norte-americano Morris Swadesh. Em virtude dessa tradição já estabelecida, empregaremos aqui o termo tronco em adição ao termo família.

6 É de conhecimento geral que em todas as famílias linguísticas bem estabelecidas há conjuntos de prováveis cognatos que violam as correspondências sonoras conhecidas, possuem semântica divergente e/ou não pertencem ao vocabulário básico. Tais cognatos, entretanto, não devem ser usados como evidência para uma demonstração inicial de parentesco e devem ser abordados somente após a apresentação da evidência central. Via de regra, uma vez que a reconstrução por meio do método histórico comparativo avança, esses conjuntos de prováveis cognatos são eventualmente rejeitados como apenas cognatos aparentes, ou são explicados em função de outros fatores, como mudanças sonoras adicionais, alterações analógicas, empréstimos dialetais e mudanças semânticas menos óbvias.

7 Não incluímos na Tabela 1 os trabalhos que, apesar de possuírem o propósito de demonstrar o parentesco entre duas (ou mais) línguas ou famílias, não apresentam uma discussão das correspondências sonoras (RODRIGUES, 1958 para o tronco Tupi; RODRIGUES, 1966 para a língua Cinta-Larga e a família Mondé em geral) ou que contêm graves erros metodológicos, tais como segmentações morfológicas não justificadas, reconstruções fantasiosas (GUDSCHINSKY, 1971 para a relação entre a língua Ofayé e a família Jê; BOSWOOD, 1973 para a relação entre o Rikbaktsa e a família Jê; ver RIBEIRO, 2005; RIBEIRO, VOORT, 2010, p. 548, nota 32 para uma crítica) ou padrões erráticos de correspondências (MARTINS, 2011 para a relação entre a língua Guató e o tronco Macro-Jê).

8 Pode-se dizer que o problema da classificação interna de línguas já reconhecidas como aparentadas é muitas vezes mais complexo do que o problema da classificação externa, isto é, o de discernir as relações entre línguas ainda não reconhecidas como aparentadas.

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Se, como já discutido, no caso de hipóteses de parentesco precisamos distinguir entre quatro explicações possíveis para as similaridades notadas entre línguas (herança comum, contato, acidente ou convergência acidental, e similaridades tipológicas), no caso da classificação interna temos que distinguir ainda entre propriedades herdadas do ancestral comum de toda a família (propriedades que não tem relevância para estabelecer uma classificação interna) daquelas que são herdadas do ancestral comum intermediário, isto é, do ancestral comum do subgrupo ou ramo que pretendemos demonstrar. Essas últimas são a evidência crucial para uma classificação interna.

9 Alguns autores argumentam que o modelo arbóreo não representa adequadamente a diversificação das línguas, principalmente em situações de contato intenso entre línguas geneticamente relacionadas, e propõem utilizar outros modelos, tais como o modelo de ondas ou de modelo de linkages (ver FRANÇOIS, 2014). Outros autores defendem a aplicabilidade do modelo arbóreo a esse tipo de situações (para uma discussão crítica, ver JACQUES, LIST, 2019). Além disso, o modelo arbóreo, por definição, não é aplicável a modalidades linguísticas de origem não genética, isto é, aos pidgins e às línguas crioulas (tais como o Karipúna, língua crioula de base lexical francesa falada no extremo norte do Amapá).

10 Alguns autores têm apresentado soluções técnicas para os problemas identificados nas aplicações anteriores da glotocronologia. Entre outras coisas, tem-se atentado para a importância do discernimento entre as mudanças lexicais internas à língua (a chamada deriva) e aquelas ocasionadas pelo contato linguístico (ver STAROSTIN, 2013 para uma discussão).

11 Preferimos reconstruir Proto-Mawé-Guarani e Proto-Aweti-Guarani *ð (em vez de *r, como fazem Meira e Drude (2015)) para a correspondência Sateré-Mawé n : Aweti l : Proto-Tupi-Guarani *r; os próprios autores apontam a algumas dificuldades em sua proposta, relacionadas à reconstrúção do item com o significado ‘amargo’ (*rõp segundo Meira e Drude, com uma nasalidade inexplicavelmente perdida em todas as línguas-filhas; *ðop segundo a presente proposta).

12 As língúas Palikúr, Yanesha’ (também chamada de Amúesha) e Chamicúro são sem sombras de dúvidas as de mais difícil classificação dentro da família. Uma combinação ainda pouco compreendida de mudanças sonoras erosivas somada ao impacto do contato com línguas não-Arawak torna bastante difícil a tarefa de identificar elementos cognatos entre essas línguas e os demais membros da família.

13 Dois pontos merecem comentário. Em primeiro lugar, note que uma hipótese provável de parentesco funciona como premissa usual na aplicação do método, que, assim, não é aplicado a esmo às línguas, mas somente àquelas que já suspeitamos, com base em alguma evidência, terem uma origem comum. Esse fato é importante, uma vez que há uma opinião, ao nosso ver, errônea, porém popular, de que uma reconstrução fonológica extensa é necessária para qúe úma hipótese de parentesco entre língúas seja “levada a sério” (embora não haja dúvidas de que a existência de uma reconstrução adequada seja evidência suficiente). Em segundo lugar, o leitor perceptivo pode ter notado, mesmo com essa breve síntese, a similaridade entre o procedimento de reconstrução fonológica e os procedimentos de análise fonológica sincrônica. Correspondências em contraste indicam proto-fonemas distintos, enquanto correspondências em distribuição complementar são analisadas como desenvolvimentos contextuais de um único proto-fonema. As similaridades entre os dois procedimentos são enfatizadas nos clássicos trabalhos de Henry Hoenigswald, aos quais o leitor é referenciado (HOENIGSWALD, 1950, 1960).

14 Rodrigues (2007) reconstrói a distinção entre *c(ˀ) e *č(ˀ) a fim de explicar os reflexos distintos apenas em um subramo de uma família do tronco Tupi, o subramo Guarani. Para

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uma crítica, ver Schleicher (1998) e Meira e Drude (2015). Quanto à reconstrução das consoantes glotalizadas, as evidências apresentadas por Rodrigues (2007) para substanciar a reconstrução de *cˀ e *čˀ provêm de conjúntos de cognatos qúe não instanciam a correspondência aqúi examinada (‘grosso’, ‘remédio’, ‘corda’, ‘olho’, ‘rio’).

15 Ao mesmo tempo, é necessário reconhecer que as correspondências identificadas por Rodrigues (2005, 2007) são, via de regra, corretamente identificadas; o problema principal de sua reconstrução jaz na interpretação diacrônica das mesmas.

16 Outra maneira interessante de verificar as reconstruções obtidas através do método comparativo é a análise dos empréstimos antigos: como línguas diferentes sofrem mudanças sonoras diferentes, uma análise da evolução fonética de empréstimos pode revelar importantes fatos referentes à história fonológica tanto da língua-fonte, como da língua-recipiente. O contato entre fases anteriores de línguas indígenas brasileiras, entretanto, não tem sido suficientemente bem investigado, havendo apenas poucos trabalhos que tratam dessa questão (como, por exemplo, RODRIGUES, 1985, que discute as camadas cronológicas de contato linguístico entre as línguas das famílias Tupi-Guarani e Caribe; CARVALHO, 2017d sobre o contato entre línguas Tupi-Guarani e línguas Aruak meridionais e CARVALHO, 2018c sobre o contato entre o Terena, língua Aruak do Mato Grosso do Sul, e o Mbayá/Kadiwéu, língua da família Guaicuru).

17 Não incluímos na Tabela 4 a reconstrução de *n em sílabas pretônicas, a qual não é recuperável pelo método comparativo, uma vez que *n foi perdido em ambos os dialetos nesse ambiente) e foi possível apenas graças à aplicação do método filológico aos dados de Steinen (1892) (ver MEIRA, 2005, p. 13, 15).

18 Não discutimos aqui a importância desses materiais para as demais áreas da linguística, que é particularmente alta no caso de línguas que deixaram de ser faladas em algum momento após a data do registro. Limitamo-nos a mencionar o caso das línguas Kipeá e Dzubukuá (família Karirí), para as quais foi possível elaborar descrições fonológicas e morfossintáticas relativamente detalhadas (AZEVEDO, 1965; QUEIROZ, 2008, 2012) com base na gramática de Mamiani (1699) e nas catequeses de Mamiani (1698) e Nantes (1709), apesar de essas línguas não serem utilizadas na atualidade, e o caso da língua Patxohã, revitalizada pelo povo Pataxó a partir das listas de palavras registradas por viajantes no século XIX, entre outras fontes (BOMFIM, 2017).

19 Lapierre (em preparação) considera que o processo de epêntese de n- é sincronicamente ativo em Panará.

20 Os dados de Barbosa (1918) foram coletados por Alexandre de Souza Barbosa em 1911 na Aldeia da Água Vermelha, próximo de São Francisco de Sales (MG). As formas em (2) foram transcritas por ele como ⟨a(n)kió⟩, ⟨ampiô⟩, ⟨anhán⟩, ⟨ankiô⟩, respectivamente. Quanto à nossa interpretação da forma ⟨anhán⟩ como aŋə, baseamo-nos na seguinte nota de Barbosa: “Nh leia-se como em portuguez, excepto em anhán, onde representa modificação vocal que em nossa língúa não existe”.

21 Embora a maioria dos pesquisadores estejam cientes de que os registros deste tipo frequentemente (mas não sempre) fazem uso de convenções de transcrição que replicam algumas particularidades da ortografia da língua materna do autor (normalmente alemão, português ou francês), infelizmente, há também trabalhos que chegam a conclusões errôneas por ignorarem essa possibilidade. Por exemplo, Braggio (2005), ao discutir as diferenças entre os dados do Xerente (língua Jê Central da família Jê, tronco Macro-Jê) registrados por Francis de Castelnau e publicados por Martius (1863, p. 139–141; Braggio erroneamente atribui a autoria desses dados ao próprio Martius), identifica equivocadamente as seguintes mudanças sonoras na história da língua Xerente:

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● monotongação de ai → e, ou → u (⟨poucouanai⟩ → ponkwane ‘dois’, ⟨croboudi⟩ → krbu-di ‘sedento’)

● apagamento de g em final de palavra (⟨kouacong⟩ → wakõ ‘qúati’);

● assimilação regressiva da nasalidade da consoante nasal alveolar em final de palavra pela vogal precedente e apagamento da consoante nasal alveolar (⟨kouacong⟩ → wakõ ‘qúati’, ⟨dicran⟩ → da-krã ‘cabeça’, ⟨noron⟩ → nrõ ‘palmeira’), entre outras.

Está claro que nesses casos não se trata de mudanças diacrônicas, mas sim de um sistema de transcrição baseado na ortografia do francês. Este equívoco poderia ter sido evitado caso uma análise grafêmica tivesse sido aplicada a esse registro.

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Para citar este artigo

NIKULIN, A., CARVALHO, F. O. de. Estudos diacrônicos de línguas indígenas brasileiras: um panorama. MACABÉA – REVISTA ELETRÔNICA DO NETLLI, CRATO, V. 8., N. 2., 2019, p. 255-305.

Os Autores

Andrey Nikulin é especialista em Linguística Teórica e Aplicada pela Universidade Estatal de Moscou (2015) e doutorando pela Universidade de Brasília (UnB). Tem experiência nas áreas de linguística teórica (com ênfase em linguística histórico-comparativa e fonologia) e aplicada, atuando principalmente nas seguintes áreas: línguas Macro-Jê, língua Chiquitana, reconstrução fonológica, linguística histórica, linguística descritiva, fonologia areal, sintaxe diacrônica.

Fernando O. de Carvalho é pesquisador/professor da área de Linguística na Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Pós-doutor pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Setor de Linguística – MN/UFRJ/2014–2016). Possui doutorado em Linguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2014), com estágio de doutorado no Departamento de Linguística do Max Planck Institut für Evolutionäre Anthropologie (MPI/EVA, Leipzig, Alemanha) e mestrado em Linguística pela Universidade de Brasília (UnB). Tem experiência na área de Linguística, com ênfase em linguística histórica, fonética/fonologia e morfologia, atuando principalmente nos seguintes temas: linguística histórica, línguas indígenas, línguas africanas, teoria linguística, fonologia/fonética e morfologia.