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 UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA: SUA PERTINÊNCIA E A DELIMITAÇÃO DE SUA ABRANGÊNCIA EM FACE DE OUTROS ESTUDOS AMBIENTAIS Luciana Sampaio Orientador: Carlos Bastide Horbach Monografia de Especialização Brasília-DF Abril/2005

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA:

SUA PERTINÊNCIA E A DELIMITAÇÃO DE SUA ABRANGÊNCIAEM FACE DE OUTROS ESTUDOS AMBIENTAIS

Luciana Sampaio

Orientador: Carlos Bastide Horbach

Monografia de Especialização

Brasília-DF

Abril/2005

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SAMPAIO, LUCIANA

Estudo de Impacto de Vizinhança: sua pertinência e delimitação de sua abrangência em facede outros estudos ambientais, 65 p, 297 mm (UnB-CDS, Especialista, Direito Ambiental eDesenvolvimento Sustentável, 2005).

Monografia de Especialização – Universidade de Brasília. Centro de DesenvolvimentoSustentável.

1. Estudo de Impacto de Vizinhança 2. meio ambiente urbano

3. Plano Diretor 4. Estatuto da Cidade

I. UnB-CDS II. Título (série)

É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta monografia e

emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. O autor 

reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta monografia de especialização

 pode ser reproduzida sem a autorização por escrito do autor.

 __________________________________ 

Luciana Sampaio

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À memória de meu pai, Jurandyr Sampaio,

saudoso e querido, cuja integridade de caráter 

esforço-me para espelhar.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, razão e fundamento de vida, fonte de todo o conhecimento;

Aos Membros da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, em

especial, Dra. Sandra Curreau;

Ao orientador Carlos Horbach;

Aos colegas e professores do CDS;

Aos colegas da 4ª CCR;

A Murilo Lustosa;

A Mirtes Duarte e Marco Bichara;

A Valdir Filho e Sheila Meyer;

Aos familiares e amigos, sempre tão presentes,

Pelo suporte, dedicação e troca de experiências,

minha admiração, respeito, carinho e gratidão.

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS...............................................................................................................v

RESUMO.................................................................................................................................viii

ABSTRACT...............................................................................................................................ix

LISTA DE ABREVIATURAS...................................................................................................x

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................1

CAPÍTULO 1 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, O ESTATUTO DA CIDADE E

INSTRUMENTOS PREVISTOS DE PLANEJAMENTO URBANO......................................6

1.1 Estatuto da Cidade ...........................................................................................................6

1.2 Plano Diretor....................................................................................................................8

CAPÍTULO 2 ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA.................................................14

2.1 Descrição e pertinência de aplicação .............................................................................14

2.2 Conceitos .......................................................................................................................15

2.2.1 Vizinhança..............................................................................................................15

2.2.2 Ambiente................................................................................................................16

2.2.3 Impacto ambiental..................................................................................................16

2.3 Propriedades...................................................................................................................17

2.4 Autoria e responsabilidade técnica ................................................................................20

2.5 Aspectos a serem analisados pelo EIV ..........................................................................23

2.5.1 Adensamento populacional ....................................................................................23

2.5.2 Equipamentos urbanos e comunitários...................................................................24

2.5.3 Uso e ocupação do solo..........................................................................................25

2.5.4 Valorização imobiliária..........................................................................................26

2.5.5 Geração de tráfego e demanda por transporte público...........................................272.5.6 Ventilação e iluminação.........................................................................................28

2.5.7 Paisagem urbana e patrimônio natural e cultural ...................................................29

2.5.8 Itens não abrangidos pelo EC.................................................................................31

CAPÍTULO 3 DIFICULDADES NA IMPLEMENTAÇÃO DO ESTUDO DE IMPACTO

DE VIZINHANÇA...................................................................................................................35

3.1 Indefinição de âmbitos...................................................................................................35

3.2 Competências.................................................................................................................353.3 O vínculo do EIV com o Plano Diretor .........................................................................37

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3.4 Cidades desobrigadas pela CF a implementar o Plano Diretor .....................................38

CAPÍTULO 4 EXPERIÊNCIAS DA UTILIZAÇÃO DO EIV................................................43

4.1 Antecedentes..................................................................................................................43

4.2 Cidades com EIV regulamentado ..................................................................................45

4.2.1 São Paulo................................................................................................................45

4.2.2 Rio de Janeiro.........................................................................................................46

4.2.3 Porto Velho ............................................................................................................48

4.2.4 Natal-RN ................................................................................................................49

4.2.5 Manaus ...................................................................................................................50

4.3 Exemplos de atuação do MPF .......................................................................................52

CONCLUSÃO..........................................................................................................................55

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................................58

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RESUMO

O Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) é um instrumento de planejamento urbanoinstituído pela Lei 10.257/2001, denominada Estatuto da Cidade, pela qual todos osmunicípios brasileiros obrigam-se a regulamentá-lo em lei específica, determinando quaisempreendimentos são passíveis do estudo, a fim de desobrigar aqueles cujo impacto é

  praticamente nulo ou pouco significativo. Assemelha-se ao Estudo de Impacto Ambiental(EIA) quanto à avaliação dos impactos, mas diverge significativamente quanto a objetivos. OEIV se destina aos projetos habitacionais, institucionais ou comerciais, públicos ou privados,

 para os quais não há a obrigatoriedade de EIA (quando cabe EIA, dispensa-se o EIV), porémcausam impacto significativo no meio urbano. Avalia-se a repercussão do empreendimentosobre a paisagem urbana, as atividades humanas instaladas, a movimentação de pessoas emercadorias e os recursos naturais da vizinhança. Suas conclusões podem não apenasviabilizar como também impedir empreendimentos que comprometam o meio ambienteurbano. Também é um instrumento de mobilização popular, visto que a comunidade échamada à discussão, evitando-se que empreendimentos sejam erguidos à revelia do interesse

 público. Entretanto, não obstante a importância inegável do EIV, como um dos instrumentosde ordenação territorial urbana e controle de impactos, este ainda é um grande desconhecidodos cidadãos brasileiros. Muitas cidades ainda não definiram os critérios a adotar, o que podedar margem a avaliações de impacto urbano superficiais. É possível que a implementação doEIV nos municípios brasileiros ainda não tenha se efetivado pela dificuldade de definir âmbitos e competências. Mesmos os técnicos cujo objeto de trabalho é o planejamento urbano

não raro vêem-se às voltas com estas indefinições, muitas vezes optando por utilizar outrosinstrumentos de regulação urbana ou ambiental, em detrimento do EIV. Em vista disso,conclui-se que o EIV alcançará visibilidade à medida em que sua importância for reconhecida

  pelos gestores municipais, desmistificando-o e tornando-o acessível aos cidadãos, um primeiro exercício a que esta pesquisa se propõe.

Palavras-Chave:   Estudo de Impacto de Vizinhança; meio ambiente urbano; Estatuto daCidade; Plano Diretor.

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ABSTRACT

The Neighborhood Impact Study (NIS) is an urban planning instrument instituted byFederal Law 10.257/2001, called Statute of City, through which all Brazilians municipalitiesmust regulate it by specific law. It must indicate which buildings or activities shouldelaborate it, in order to dispense those whose impact is practically null or less significative. Itseems to the Environmental Impact Study (EIS) concerning evaluation of impacts, but itdiverges significantly in reference to goals. The NIS is for habitation, institutional or trade

 projects, public or private, that are not obligated to elaborate the EIS (if there's EIS, NIS isn'tnecessary), however they cause significant impact in urban environment. One evaluates therepercussion of the enterprise or the activity on the urban landscape, the human activities, the

 people and products movement and the natural resources of neighborhood. Its conclusions cannot only authorize as also forbid enterprises or activities that compromise the urbanenvironment. Besides, it is a popular mobilization instrument, since the community is calledto its discussion, avoiding implementation of enterprises against the public interest. However,in despite of the importance of NIS, as an instrument of territorial ordinance and control of impact, it is still unknown by Brazilian citizens. Many towns not defined the criteria to adoptyet, and this can allow superficial impacts evaluations. It's possible that the implementation of 

 NIS in the Brazilian municipalities hasn't taken effect yet because of the difficulty to defineranges and competencies. Because of this lack of preciseness, it's not rare that the urban

 planning technicians choose to use other instruments of urban regulation, in despite of NIS.Therefore, one concludes that the NIS will be known each day as the municipal managersunderstand its importance, making it accessible to citizens, a first exercise intended by thisresearch.

Key-words: Neighborhood Impact Study; urban environment; Statute of City; Director Plan

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LISTA DE ABREVIATURAS

4ª CCR ................ 4ª Câmara de Coordenação e Revisão

ACP ................ Ação Civil Pública

CF ................ Constituição Federal

CONDEPHAAT ......... Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico,Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo

CONPRESP ................ Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico

CONAMA ................ Conselho Nacional do Meio AmbienteEC ................ Estatuto da Cidade

EIA ................ Estudo de Impacto Ambiental

EIV ................ Estudo de Impacto de Vizinhança

IAB ................ Instituto dos Arquitetos do Brasil

IBAMA ................ Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

RenováveisIPLANAT ................ Instituto de Planejamento Urbano de Natal

IPTU ................ Imposto Predial e Territorial Urbano

LUOS ................ Lei de Uso e Ocupação do Solo

MPF ................ Ministério Público Federal

 NBR ................ Norma Brasileira

PLANURB ................ Instituto Municipal de Planejamento Urbano

RIMA ................ Relatório de Impacto Ambiental

RIV ................ Relatório de Impacto de Vizinhança

RIVI ................ Relatório de Impacto de Vizinhança

SEMA ................ Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Porto Velho)

UES ................ Unidade de Estruturação Urbana

USP ................ Universidade de São Paulo

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ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA: SUA PERTINÊNCIA E A

DELIMITAÇÃO DE SUA ABRANGÊNCIA EM FACE DE

OUTROS ESTUDOS AMBIENTAIS

INTRODUÇÃO

A importância da sustentabilidade do meio ambiente urbano avulta-se a cada dia, à

medida em que se torna clara a impossibilidade de desassociar cidades e meio ambiente. Aexpansão acelerada e desorganizada do meio urbano, e conseqüentemente das funções a ele

relacionadas, é certamente uma das causas de maior degradação do meio ambiente natural.

A sociedade brasileira, a exemplo do que ocorre internacionalmente, tem se atentado às

questões ambientais e a preocupação com seu resguardo reflete-se na legislação ambiental

disponível. Há muito que se atenta ao meio biótico e físico, por serem os elementos mais

facilmente associados à definição primária de meio ambiente. Questões referentes ao meio

socioeconômico também têm sido abordadas, mas recorrentemente com abrangência aquém

da necessária. Isto porque acostumou-se a enxergar os estudos ambientais como a junção de

  peças avulsas, estudando separadamente cada elemento, pouco considerando suas

interrelações. Observando-se a cidade, é clara a leitura de que o meio ambiente urbano agrega

estas três funções, tendo como principal elemento modificador o próprio ser humano. Meio

físico, biótico e socioeconômico amalgamam-se de tal forma que se torna impossível analisar 

impactos de cada meio isoladamente.

O conceito ecossistêmico que, segundo Franco (1997), pressupõe equilíbrio entre os

 processos naturais, inclusive quanto aos fluxos antrópicos, estende-se à “visão da urbanização

como um ecossistema humano interligado aos ecossistemas naturais, dos quais depende e com

os quais interage”1. Neste contexto, o conceito de conservação ambiental enfatiza a autonomia

e a auto-suficiência de todas as estruturas projetadas para o futuro, minimizando os impactos

ambientais, de modo a não onerar as gerações vindouras.

Surge, portanto, uma nova abordagem na ciência, que se atenta aos conhecimentos

adquiridos e acumulados por milênios de história da civilização, que é a transdiciplinariedade,

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termo concebido pelo físico francês Basarab Nicolescutorna que significa o encontro da

ciência moderna com a tradição, ou transmissão de sabedoria.2 Mais do que

interdisciplinaridade, o termo transdiciplinariedade evoca o conceito do holismo3. Conforme

ensina Alves (2005):

Transdisciplinar é a metodologia pela qual, usando, da inter, da multi

e da pluridisciplinaridade as informações e os resultados da combinação de

informações e metodologias ultrapassa o campo próprio de cada disciplina,

excede o quadro das abordagens metodológicas próprias de cada uma, e

chega a conhecimentos. Inter, multi, pluri e transdisciplinaridade não são,

em si mesmas, divergentes, mas o que podemos afirmar, inicialmente, é que

a transdisciplinaridade sugere um excedente em tudo que as demaismetodologias podem aportar para o conhecimento humano.4

Contudo, vivenciar a transdiciplinariedade é um árduo aprendizado, o qual apenas

começamos a trilhar. Há que se vencer, ainda, o ranço acadêmico herdado de gerações, pelo

qual os membros das equipes técnicas não estão inclinados a modificar ou mesmo abandonar 

seus métodos tradicionais de trabalho.

Em virtude da premência da modificação do paradigma estabelecido, instigada pela

consciência ambiental que temos vivenciado, bem como da necessidade da revisão do

 processo de urbanização e gerenciamento das cidades, torna-se imperativa a discussão quanto

aos estudos ambientais pertinentes que avaliem adequadamente questões relativas às

especificidades urbanas.

É justamente este o escopo desta pesquisa, cuja proposta é analisar o âmbito dos estudos

ambientais praticados no Brasil. Utilizado com maior respaldo, inclusive legal, o Estudo de

Impacto Ambiental e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) há muito

vinha se prestando às análise de impactos de empreendimentos em áreas urbanas. Com o

advento do Estatuto da Cidade, regulamentou-se o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV),

instrumento que, com outra denominação, já era utilizado por alguns municípios como

ferramenta de análise de impactos de empreendimentos e atividades na estrutura urbana.

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Delimitação e relevância do tema

O principal desafio para a pesquisa proposta está associado à dificuldade de definição

de âmbitos e competências relativos a estudos ambientais de intervenções no meio natural ou

modificado, com implicações diretas ou indiretas no meio urbano.

Esta dificuldade tem trazido variadas aplicações e interpretações de leis, com

conseqüente descompensação de rigores, não apenas nas cidades de grande porte, como

mesmo nas pequenas. Isto porque a sociedade brasileira, apesar do louvável crescente

interesse nas questões ambientais, carece da familiaridade da aplicação dos instrumentos

regulamentadores previstos em lei. Este cenário exige um processo de repensar a forma da

regulamentação e aplicação da legislação urbana, de modo a solucionar adequadamente osconflitos gerados pela expansão urbana.

Objetivo geral

A proposta de pesquisa supracitada visa discutir a delimitação da abrangência do EIV,

evidenciando os elementos do campo de conhecimento específico dos planejadores urbanos.

Objetivos específicos  Discriminar os itens que compõem o EIV;

  delimitar a abrangência do EIV em face de outros estudos ambientais, em especial, o

EIA/RIMA;

  analisar criticamente os EIV já implementados;

  facilitar a implementação do EIV nos municípios;

  alargar a discussão em torno do assunto, tornando-o acessível e desmistificado aos

cidadãos, empreendedores e administradores públicos.

Relevância da pesquisa

A presente monografia contribui para a discussão teórico-empírica da regulamentação

dos instrumentos da política urbana instituídos pelo Estatuto da Cidade, em especial o Estudo

de Impacto de Vizinhança, ainda muito incipiente nos municípios brasileiros, haja vista ser 

 bastante escassa a literatura nesse particular, além de predominantemente jurídica.

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Todavia, sua importância transcende a mera discussão dos critérios de estudos de

impacto ambiental no meio urbano, pois pretende, talvez com muita ousadia, propor reanálise

onde a legislação mostra-se falha por permitir brechas de interpretação dúbia, bem como

complementos que alinhavem os dispositivos legais existentes acerca da questão ambiental

urbana.

Deste modo, espera-se poder contribuir com o processo democrático da gestão das

cidades, visto que, ante a inevitável expansão urbana, é imprescindível que os municípios

implementem mudanças estratégicas no sentido de adaptarem-se às novas condições

ambientais, visando sobreviver num contexto ambiental cada vez mais hostil.

Métodos e Procedimentos

A pesquisa proposta realizou-se, fundamentalmente, a partir de consulta a material

  bibliográfico, a saber, publicações (livros e periódicos), documentação oficial, apostilas e

apontamentos das aulas ministradas pelo corpo docente do Centro de Desenvolvimento

Sustentável da Universidade de Brasília (CDS/UnB), bem como  sites disponibilizados por 

meio eletrônico. Também foram consultados especialistas em áreas afins, como Direito,

Biologia, Engenharia Civil, Engenharia Sanitária e Geografia, cujos conhecimentos por certo

serviram para a coesão e coerência do texto ora apresentado.

 Não sendo ampla a bibliografia, mormente no que se refere a aspectos que analisem

impactos ambientais no espaço urbano, à pesquisa bibliográfica agregou-se experiência

  própria advinda de análises de Estudos de Impacto de Vizinhança e dos aspectos físicos e

socioeconômicos de Estudos de Impacto Ambiental, preponderantemente de suas implicações

no meio urbano, desenvolvidas na 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério

Público Federal, câmara temática que analisa questões atinentes a meio ambiente e patrimôniocultural.

Utilizando os conhecimentos de Arquitetura e Urbanismo, havidos por dez anos de

efetivo exercício profissional, além dos anos de formação dispensados na Universidade,

 pretendeu-se, portanto, nesta pesquisa, trazer contribuição profissional a este tema, elencando

e discutindo os elementos essenciais ao planejamento urbanístico, com o fim de discriminar as

atividades potencialmente impactantes ao meio urbano.

A monografia encontra-se estruturada em 4 capítulos, além desta seção introdutória econclusão, ao final.

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O Capítulo 1 discorre sobre os instrumentos disciplinadores do planejamento urbano,

instituídos pela Constituição Federal e Estatuto da Cidade, em especial, o Plano Diretor.

Discorre sobre a concepção atual do meio ambiente urbano, função social da propriedade e

 participação popular na gestão e planejamento das cidades.

O Capítulo 2 constitui-se o cerne da pesquisa. Focaliza o Estudo de Impacto de

Vizinhança, trazendo sua descrição, pertinência, conteúdo temático, equipe técnica

responsável e aspectos a serem abordados pelo estudo. Apresenta as diferenças do EIV em

relação ao Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório (EIA/RIMA) e delimita sua

abrangência. Incorpora a análise de elementos urbanos essenciais, não se atendo aos itens

mínimos propostos pela legislação federal.

O Capítulo 3 visa identificar as razões de algumas das dificuldades de implementação

do Estudo de Impacto de Vizinhança nos municípios brasileiros, e propõe soluções. Analisa

alguns conflitos na legislação, inclusive quanto a âmbitos, competências e possíveis

inconstitucionalidades.

O Capítulo 4 traz experiências da utilização do Estudo de Impacto de Vizinhança em

alguns municípios que já contam com o instrumento, ainda que assim não denominados. São

analisados municípios que já possuem-no regulamentado, Rio de Janeiro, São Paulo, PortoVelho, Natal e Manaus, como forma de disponibilizar exemplos práticos das proposições, e

encerra compartilhando atuações do Ministério Púbico Federal em que a análise técnica do

Estudo de Impacto de Vizinhança ou a exigência de sua elaboração foi preponderante para a

solução da questão.

 Na última seção, apresentam-se as conclusões sobre o tema discutido.

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6

CAPÍTULO 1 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, O ESTATUTO DA CIDADE E INSTRUMENTOS

PREVISTOS DE PLANEJAMENTO URBANO

1.1 Estatuto da Cidade

Em 1988, a Constituição Federal, em seus artigos 182 e 183, estabeleceu as diretrizes da

  política urbana nacional, cuja regulamentação só foi instituída mais de 12 anos após, por 

intermédio da Lei 10.257, de 10 de julho de 2001, denominada Estatuto da Cidade. A referida

Lei, em seu art. 1º, explicita sua finalidade principal, que é regular o “uso da propriedade

urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do

equilíbrio ambiental”.5

Poucas leis na história do Brasil foram construídas com tanto esforço

coletivo e legitimidade social. A aprovação do Estatuto da Cidade, é uma

conquista dos movimentos populares, que se mobilizaram por mais de uma

década na luta por sua aprovação. Esta luta foi conduzida a partir da ativa

 participação de entidades civis e de movimentos sociais em defesa do direito

à cidade e à habitação e de lutas cotidianas por melhores serviços públicos e

oportunidades de uma vida digna.

Sem dúvida, estamos diante de uma lei admiravelmente progressista,

inovadora, com vocação democrática, autenticamente voltada para

construção de cidades onde será sempre preservado o bem estar coletivo da

  população. Esta grande vitória na conquista do Estatuto, entretanto, só se

efetivará na medida em que as forças sociais que o construíram busquemtorná-la realidade no cotidiano das práticas administrativas de nossas

cidades. 6

A sustentabilidade das cidades constitui-se o principal objetivo da Lei e está diretamente

associada à nova forma nova forma de apropriação do espaço urbano, baseada na função

social da propriedade. As propriedades e seu uso não mais se restringem ao mero interesse dos

donos. Deve-se atentar para que não gerem poluição, inclusive sonora e visual, trânsito lento,

carência de espaços verdes, áreas de lazer e segurança e demanda excessiva sobre os serviços

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de educação, saúde e transportes. É preservado o direito de todos à cidade, a saber, aos

recursos naturais, aos serviços, à infra-estrutura e à qualidade de vida.

Uma das conseqüências muito bem-vindas de estender os conceitos do Urbanismo 7 à

concepção atual do meio ambiente diz respeito à ampliação do conceito de função social da

  propriedade e à nova compreensão do direito de propriedade. Como observa Leuzinger 

(2002):

Antes tido como um direito absoluto de usar, gozar e dispor da coisa,

o direito de propriedade, com a evolução do conceito de Estado de Direito

Liberal para Estado Democrático de Direito, afigura-se, hoje, conforme

delineado pela Constituição Federal de 1998, como um direito limitado

interna e externamente, seja pela obrigatoriedade de que a propriedade

cumpra sua função social, seja por normas de vizinhança, seja, ainda, pelas

diversas formas de intervenção do Estado na propriedade, dentre as quais se

destacam as limitações administrativas, impostas pelo Poder Público como

expressão de seu poder de polícia administrativa.8

A Lei inova com seu caráter eminentemente progressista e democrático, estabelecendo,

inclusive, a obrigatoriedade da participação popular na gestão da cidade, o que tem tanto

suscitado críticas quanto a sua efetiva implementação, como amealhado defensores esimpatizantes. “Ao dizer que o governo não pode governar sozinho, o Estatuto não está, tão-

só, determinando a necessidade de se ouvir o verdadeiro mandante, mas está pondo limites na

discricionariedade estatal”9, aduz Oliveira (2002).

A esse respeito, Freitag (2001) entende que, para que a lei “funcione”, “a única via seria

a execução de uma política orçamentária participativa em que a própria aplicação da lei, o

desenvolvimento dos planos diretores e o controle da realização das medidas urbanas”

estivesse em mãos dos moradores da cidade, ou seja, “dos efetivamente interessados”. Freitag

ainda menciona algumas cidades gaúchas onde a gestão orçamentária foi implementada com

sucesso. “Somente esse tipo de participação na solução dos problemas do dia a dia de suas

cidades os transformará de moradores passivos em cidadãos ativos.” 10

Maricato (2004) afirma que “as Diretrizes Gerais do Estatuto da Cidade não fogem

muito à marca do discurso pleno de boas intenções presente em muito da nossa legislação mas

apresentam uma virtude: o número de palavras e a dimensão do texto foram muito reduzidos e

objetivados se levarmos em conta a maioria dos projetos de lei que tratam de temas urbanos.”

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8

Discorre ainda: “(...) Dentre os aspectos a serem salientados, as diretrizes gerais prevêem:

Audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de

implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o

meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população. (art. 2º,

XIII)”11

  Não obstante, a considerar a realidade das metrópoles brasileiras, que há muito têm

sofrido com o descaso de governantes e arbitrariedades na condução do planejamento urbano,

é alentador o fato de que o Estatuto da Cidade constitua-se em uma lei progressista, com

vocação democrática, preocupada com o futuro de nossas cidades e das novas gerações que as

habitarão. Entretanto, cabe aqui a observação de Maricato (2004) de que “estamos diante de

uma novidade quando a participação da população interessada, em casos que extravasam a

condição legal da edificação no lote ou gleba, pode dar início a um processo de embate

 político opondo moradores e promotores imobiliários.”12

1.2 Plano Diretor

A Constituição Federal, no capítulo em que trata da política urbana, determina:

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por 

objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e

garantir o bem-estar de seus habitantes.

§ 1º O Plano Diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para

cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da

 política de desenvolvimento e expansão urbana. [grifo nosso]

§ 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às

exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no Plano Diretor.(...)

§ 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei federal específica

 para a área incluída no Plano Diretor, exigir, nos termos da lei federal, do

 proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que

 promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente de:

I – parcelamento ou edificação compulsórios;

II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no

tempo;

III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública (...).”

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9

O Estatuto da Cidade, por sua vez, estende a obrigatoriedade da elaboração do Plano

Diretor a municípios não abrangidos pelo texto constitucional:

Art. 41. O Plano Diretor é obrigatório para cidades:

I - com mais de vinte mil habitantes;

II - integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;

III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos

 previstos no §º 4º do art. 182 da Constituição Federal;

IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico;

V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com

significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.

Este artigo tem suscitado críticas importantes pela sua aparente inconstitucionalidade,visto que apenas o inciso I corresponderia ao texto constitucional. Acerca disto, discorre

Fiorillo (2002), referindo-se à Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente por 

decisão unânime do Plenário, relativa ao caput do art. 195 da Constituição do Estado do

Amapá, que estabelecia a obrigatoriedade do Plano Diretor a municípios com mais de cinco

mil habitantes:

Destarte, devemos reconhecer desde logo que, diante da imposição

estabelecida pela Carta Magna de obrigar somente as cidades com mais devinte mil habitante a ter Plano Diretor, não pode a Lei 10.257/2001 obrigar a

utilização do instrumento ora comentado por parte das cidades em

decorrência de outras hipóteses como aquelas apontadas nos incisos II, III,

IV e V do art. 41. O tema já foi inclusive apreciado pelo Egrégio Supremo

Tribunal Federal onde restou clara a posição de salvaguardar a autonomia

dos municípios.13

Infelizmente, a forma como está instituída a lei deu margem a interpretações diversas da

intenção do legislador, conforme comprova o entendimento de nossa instância jurídica

máxima. A verdade é que a lei resume-se ao que está evidente na letra, de modo que é certo

que intenções não expressas não podem ser consideradas.

Contudo, o que foi entendido como “ameaça” à autonomia dos municípios, de fato,

inexiste. Ao contrário, pretende-se, com a elaboração e implementação do Plano Diretor,

fortalecer a autogestão do município pela prática participativa, o que redunda em tão-somente

resguardar seus interesses. Afinal, a intenção do Estatuto da Cidade ao estabelecer aindispensabilidade do Plano Diretor não foi outra a não ser o fortalecimento dos processos de

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  planejamento e gestão territorial do município, práticas já existentes, porém carentes de

diretrizes regulamentadoras.

A democratização do planejamento das cidades e a implementação de mecanismos

inovadores de gestão, favorecendo a participação e controle da cidadania no desenvolvimento

urbano, segundo Menegassi & Osorio (2002), constitui "uma política urbana de socialização

do poder, de inclusão social e de aumento da eficiência na prestação de serviços públicos"14.

A democratização do planejamento e de sua gestão vem-se consolidando

como uma das mais fortes respostas para o enfrentamento da crise de

governabilidade sobre o padrão de crescimento e renovação das cidades que o

 predomínio da lógica do mercado vem impondo aos governos e à sociedade.

A nova ordem urbanística consagra a autonomia municipal, o papel do poder 

local e da cidadania na construção da cidade em que o Plano Diretor não funcione

mais sob a lógica do mercado (MENEGASSI; OSORIO, 2002)15.

A nova política urbana regulamentada pelo Estatuto da Cidade rompe com os padrões

anacrônicos da gestão conservadora e convencional dos municípios brasileiros,

tradicionalmente voltada ao interesse particular em detrimento do coletivo, e traz o Plano

Diretor não mais como um mero instrumento de controle e uso do solo, mas agora como

instrumento indutor do desenvolvimento sustentável.

Considerando que o cidadão, melhor do que ninguém, detém o conhecimento das

  potencialidades e necessidades locais, ao ser-lhe dada a oportunidade de participar do

 planejamento e gerenciamento urbano, há um saudável enriquecimento da discussão por este

agregar valores que, num outro nível, fatalmente seriam desconsiderados. Impede-se, como

resultado, que práticas importadas de outros municípios, nem sempre adequadas, instalem-se

e comprometam o funcionamento desejado para sua cidade.

Desta forma, não há por que entender como "ameaça à autonomia" ao município,

quando, na verdade, o que se pretende é garantir a implementação de instrumentos que visem

sua organização. Talvez a forma impositiva com que a Lei se mostra, determinando prazos e

exigindo a implementação do Plano Diretor, tenha dado margem a esse entendimento. O

 próprio Estatuto da Cidade, ao recomendar expressamente, no primeiro dos incisos do art. 41,

a elaboração do Plano Diretor às cidades com mais de vinte mil habitantes, naturalmente

reforça a interpretação excludente, embora seja clara sua intenção de abranger maior número

de municípios, haja vista os outros incisos do mesmo artigo.

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Em vista de sua importância, estender a prática da elaboração e implementação do Plano

Diretor a todos os municípios brasileiros, ainda que não "obrigados" por lei, é a intenção do

Ministério da Cidades, que recomenda que todos os municípios brasileiros o façam, em seu

guia para elaboração do Plano Diretor Participativo, de ampla divulgação e distribuição:

Em todos os casos, obrigados pelo Estatuto da Cidade ou não, é

desejável que todos os municípios brasileiros conheçam sua realidade, que se

dediquem a melhorar a qualidade de vida e a buscar o pleno

desenvolvimento sustentável de suas potencialidades. Elaborar e aprovar o

Plano Diretor sempre será a providência indispensável para implementar a

maioria dos instrumentos previstos no Estatuto da Cidade. 16

Visto tratar-se do instrumento básico da política urbana, como pode um município

 prescindir de elaborar e implementar um Plano Diretor? Isso não ocorre mesmo na prática.

Pode-se até mesmo denominá-lo de formas diversas, mas certamente cada prefeitura possui

 planos, planejamentos e estratégias para o desenvolvimento do município. Na verdade, o que

o Estatuto da Cidade pretendeu foi disciplinar sua elaboração e implementação, determinando

seu conteúdo mínimo para que sirva de parâmetro, inclusive, para que a população interessada

 possa saber o que deve ser abrangido pelo Plano Diretor.

O Plano Diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal, que também

inclui o plano plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamento anual participativo. Portanto,

os investimentos anuais devem considerar o Plano Diretor, o que, apesar de óbvio, usualmente

não acontece nas cidades brasileiras.

É necessário entender que o Plano Diretor resguarda a cidade de arbitrariedades, haja

vista que o processo participativo e democrático contribui para a organização e acesso ao

espaço urbano infra-estruturado, mitigando a cultura da exclusão social e territorial. “A nova

ordem urbanística consagra a autonomia municipal, o papel do poder local e da cidadania na

construção da cidade em que o Plano Diretor não funcione mais sob a lógica do mercado”.17

O Estatuto da Cidade estabelece o Plano Diretor como o elemento central e decisivo da

 política urbana. Deve englobar todo o município (área urbana e rural) e ser revisto a cada dez

anos. “Há um travejamento, em torno dele, da aplicação dos principais instrumentos

urbanísticos, especialmente aqueles relacionados à função social da propriedade. Ele deve

registrar as áreas que estarão submetidas a, sucessivamente, o parcelamento, edificação ou

utilização compulsórios, ao IPTU progressivo no tempo e à desapropriação com títulos da

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dívida pública. O direito de preempção também dependerá de lei municipal, baseada no Plano

Diretor. O mesmo se aplica à outorga onerosa do direito de construir, às operações urbanas

consorciadas e à transferência do direito de construir” 18 (MARICATO, 2004).

Como anteriormente destacado, o orçamento participativo é obrigatório. O texto ainda

afirma que o Plano Diretor resultará inválido caso não se atente ao disposto no artigo 44

(capítulo IV), que determina aos poderes municipais, executivo e legislativo, garantir a gestão

orçamentária participativa, prevendo:

I- a promoção de debates, audiências e consultas públicas, observando a participação da

 população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;

II- a publicidade, divulgação e o acesso de qualquer interessado aos documentos einformações produzidos;

III- fomento à apresentação de projeto de lei de iniciativa popular, bem como planos,

 programas e projetos de desenvolvimento urbano.

  Nas Disposições Gerais o texto da lei mostra novamente essa intenção clara quando

define que o prefeito incorre em improbidade administrativa quando impedir ou deixar de

garantir a participação de comunidade, movimentos e entidades da sociedade civil em casos

de aplicação da lei com previsão de dispêndios públicos (art. 52-I).

  No entanto, dificilmente a população engajar-se-á no debate de forma espontânea.

Como destaca Compans (2005), integrante do Fórum Popular da cidade do Rio de Janeiro, a

tarefa não é das mais simples: “O Plano Diretor é um tema árido. A ordenação racional do

território é abstrato para uma população que tem demandas imediatas. A melhor forma de

seduzir para este debate é identificar que pontos de discussão do Plano e do Estatuto vão ao

encontro das lutas concretas já existentes”19.

Talvez um dos instrumentos de maior resposta a esta estratégia de mobilização seja o

Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), que deve se amplamente divulgado e discutido com

a sociedade interessada. Suas conclusões podem não apenas viabilizar como também impedir 

empreendimentos, corroborando tecnicamente o argumento do cidadão que não deseja como

vizinho construções e atividades que desfigurem características de seu bairro ou cidade.

Segundo o Estatuto da Cidade, o município, mediante lei específica, determinará os

empreendimentos e atividades institucionais, comerciais e residenciais, públicos ou privados,que dependerão de elaboração de Estudo de Impacto de Vizinhança para obter as licenças e

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autorizações de construção, ampliação ou funcionamento, evitando, portanto, que

empreendimentos sejam erguidos à revelia do interesse público.

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14

CAPÍTULO 2 ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA

2.1 Descrição e pertinência de aplicação

O Estatuto da Cidade, visando corrigir distorções do crescimento urbano, prevê como

um de seus instrumentos o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), cuja regulamentação é

obrigatória para todos os municípios brasileiros. Conforme preconiza o Estatuto da Cidades,

em seus artigos 36 e 37:

Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou

 públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de

impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de

construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público

municipal.

Art. 37. O EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e

negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da

  população residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no

mínimo, das seguintes questões:

I.  adensamento populacional;

II.  equipamentos urbanos e comunitários;

III.  uso e ocupação do solo;

IV.  valorização imobiliária;

V.  geração de tráfego e demanda por transporte público;

VI.  ventilação e iluminação;

VII.   paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.

Diferentemente do EIA-RIMA, que é exigido20 para empreendimentos urbanísticos com

mais de 100 ha, o EIV se destina aos projetos habitacionais, institucionais ou comerciais para

os quais não há a obrigatoriedade de EIA-RIMA (quando cabe EIA-RIMA, é usual dispensar-

se o EIV), porém causam impacto significativo no meio urbano. A Lei dá ao município a

  prerrogativa de determinar quais empreendimentos são passíveis do estudo, a fim de

desobrigar aqueles cujo impacto é praticamente nulo ou pouco significativo. Essa

discriminação, regulamentada por lei específica, enquadrando os casos para os quais é exigido

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15

o EIV, deve interagir com o Plano Diretor do município, aprovado nos termos da Lei. O ideal,

como assim alguns municípios brasileiros já têm feito, é que sua regulamentação conste do

 próprio Plano Diretor.

Busca-se num EIV, preponderantemente, avaliar a repercussão do empreendimento

sobre a paisagem urbana; sobre as atividades humanas instaladas; sobre a movimentação de

 pessoas e mercadorias; e sobre os recursos naturais da vizinhança. O Estatuto da Cidade, em

seu artigo 37, estabelece os aspectos mínimos a serem abrangidos pelo estudo, porém muitas

cidades ainda não definiram os critérios a adotar, o que pode dar margem a avaliações de

impacto urbano superficiais.

Entende-se como imprescindível que o EIV discorra sobre um projeto elaborado,finalizado, ao menos, até a fase de anteprojeto, com sua implantação, volumetria e acessos

definidos. Logicamente, a depender da atividade (por exemplo, uma incompatível com os

usos definidos na lei de uso do solo), sua licença pode ser inviabilizada antes mesmo da

elaboração do projeto preliminar.

Em vista disto, como licenciar ou autorizar construções, caso não haja projeto a ser 

criticado? Não é incomum que a análise de aspectos urbanísticos e suas implicações com o

entorno seja prejudicada pela inexistência do projeto de implantação do empreendimento.Quando não há estudo preliminar da implantação, fica comprometida a compreensão da

integração urbana do empreendimento com o entorno. É necessária a delimitação de áreas e

lotes e a indicação das edificações e demais equipamentos, inclusive os comunitários, para

melhor avaliação dos fluxos de veículos e pedestres, o que reflete em implicações nas

adjacências do terreno, como por exemplo, a localização de corredores de acessos, acessos

viários e pontos de ônibus.

2.2 Conceitos

2.2.1 Vizinhança

Em projetos de menor extensão territorial, é imediata a leitura e definição da área

conceituada como “vizinhança”, normalmente restrita às vias lindeiras e quarteirões vizinhos,

com atenção aos entroncamentos de tráfego mais próximos e outros pólos geradores de fluxo

nas redondezas. Tratando-se de grandes terrenos, é ilógico delimitar como vizinhança os

imóveis lindeiros ao empreendimento. Logicamente, a depender das características da malha

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urbana em que está o terreno está inserido e das atividades pretendidas, um lote de 1 ha talvez

  possa ser considerado perturbador das atividades urbanas estabelecidas na vizinhança.

Considerando características peculiares, como o deslocamento populacional a ser gerado pelo

empreendimento, tanto quando em construção quanto em pleno funcionamento, além de

  particularidades como, por exemplo, parte do terreno constituir-se em área alagadiça

diretamente relacionada ao equilíbrio hidrológico da região, ou constituir-se em habitat de

 população de fauna específica que procuraria abrigo nas redondezas, é imprescindível que o

conceito de “vizinhança” se estenda geograficamente de forma diretamente proporcional aos

impactos causados.

2.2.2 Ambiente

De acordo com a Biologia, o ambiente que inclui organismos em interação com o meio

físico é o ecossistema. Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa:

Ecossistema: s.m. sistema que inclui os seres vivos e o meio ambiente, com

suas características físico-químicas e as inter-relações entre ambos;

 biogeocenose, biossistema, holocenose.21

“Entretanto, nos ecossistemas que abrangem aglomerações de população e atividades

humanas, a energia e as matérias necessárias provém predominantemente do seu exterior”22

(MOREIRA, 1999). Isto explica o interesse na preservação dos recursos naturais, visto que

seu esgotamento pode impor limites a seu desenvolvimento. Segundo Magnoli (1986), o

ambiente é o resultado das interações entre a sociedade humana e a base física e biológica que

a envolve, para sua sobrevivência biológica e espiritual.

2.2.3 Impacto ambiental

Consideramos adequada a definição de Branco (1984) para impacto ambiental como

“poderosa influência que desequilibra um ecossistema”23. Atentemo-nos ao significado de

impacto:

Impacto: adj. 1  (...) 2  (...) s.m. 3 ato ou efeito de impactar; impacção 3.1

choque de um projétil ou de qualquer outro objeto com algo contra o qual foi

lançado 3.2 colisão de dois ou vários corpos, com existência de forças

relativamente grandes durante um intervalo de tempo muito pequeno [foi

terrível o impacto dos aviões em pleno ar] 3.3  p. ext. o impulso transmitido

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17

em ou como se uma colisão 3.4  fig. impressão ou efeito muito fortes

deixados por certa ação ou acontecimento.24

As acepções do substantivo impacto, literal ou figurativa, são convergentes. Todas as

definições não figurativas referem-se a choques entre elementos com grande dispêndio de

energia, o que pode alterar de modo significativo uma situação previamente estabelecida.

Evidentemente, a depender da superfície ou do elemento impactado, é possível que estes não

sofram alteração com o impacto. Ou seja, o resultado do impacto está diretamente relacionado

com a capacidade de suporte e/ou resiliência do meio impactado.

Segundo Moreira (1999) “o que caracteriza o impacto ambiental não é qualquer 

alteração nas propriedades do ambiente, mas as alterações que provoquem o desequilíbrio das

relações constitutivas do ambiente e que excedam a capacidade de absorção do ambiente

considerado”.25

Isto nos leva à conclusão de que, considerando os estudos ambientais, não basta

identificarem-se os impactos, mas é premente a avaliação de sua magnitude, pois é ela quem

dirá se o impacto é muito ou pouco significativo ou pode ser desprezado pela sua pouca

importância.

2.3 Propriedades

É recorrente a confusão quanto ao entendimento de que o estudo ambiental é exigido

somente para empreendimentos urbanos com mais de 100 ha, conforme dispõe a Resolução

Conama nº 1/86 .

Artigo 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e

respectivo relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos à

aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA em caráter supletivo,o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, tais como:

I - (...)

(...)

XV - Projetos urbanísticos, acima de 100 ha ou em áreas consideradas de

relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos municipais e

estaduais competentes;

(...)

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18

Há que se atentar, no entanto, que o estudo em questão não é o EIV, mas o EIA/RIMA,

cujas diferenças de âmbitos e abrangência de conteúdo tentaremos esclarecer. Assemelham-se

quanto à avaliação dos impactos, mas divergem significativamente quanto a sua finalidade. O

EIA/RIMA visa o licenciamento ambiental da atividade, tanto que é aprovado pelo órgão

ambiental respectivo.

O EIA/RIMA destina-se a identificar os recursos ambientais e suas interações tal como

existem, por meio do diagnóstico ambiental da área de influência, considerando os meios

físico, biológico e socioeconômico. Avalia também a melhor alternativa tecnológica, a melhor 

localização, as medidas mitigadoras e compensatórias, além dos propor programas de

monitoramento dos impactos nas fases de implantação e operação, a fim de ter atestada sua

viabilidade ambiental pelo órgão competente. “Neste contexto, o diagnóstico ambiental não é

somente uma das etapas iniciais do EIA/RIMA: ele é, sobretudo, o primeiro elo de uma cadeia

de procedimentos técnicos indissociáveis e interdependentes, que culminam com um

 prognóstico ambiental consistente e conclusivo.”26

O EIV destina-se a empreendimentos de impacto significativo no meio urbano, sem que

haja delimitação da extensão territorial ou de área construída (a não ser que assim lei

municipal o defina), e aborda tópicos corriqueiros em qualquer estudo de planejamento

urbano, por menor que este seja, como tráfego de veículos, infra-estrutura, produção de

ruídos, equipamentos, etc., e não pode ser preterido num empreendimento de grande porte.

Cabe observar que o EIV não é prévio ao projeto. Ele antecede ao licenciamento da

obra, à construção e à autorização de funcionamento. Mas não ao projeto. Um EIV não é feito

 para analisar quais os tipos de atividade seriam adequadas ao terreno escolhido. Isto é função

do zoneamento, discriminado na lei de uso e ocupação do solo, o que reforça a importância da

elaboração do Plano Diretor pelo município. É de se supor que qualquer projeto que chegue aapresentar seu respectivo EIV, na verdade já tenha a aquiescência prévia da administração

municipal para a atividade ali a ser desenvolvida.

Os resultados do EIV, na verdade, vão indicar as “arestas” do projeto que devem ser 

eliminadas. Em outras palavras, o estudo serve para adequar o empreendimento desejado ao

local escolhido para implantá-lo e às expectativas da vizinhança. Muitas vezes, os primeiros

levantamentos já implicarão alterações no projeto que certamente terá algumas versões antes

de chegar-se ao resultado final. E isto nada mais é que o saudável exercício da projetação,

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19

  procedimento corriqueiro no desenvolvimento de qualquer projeto arquitetônico ou

urbanístico.

 Não é possível apresentar-se um EIV de um empreendimento hipotético, para o qual

sequer foi elaborado um anteprojeto arquitetônico. Isto até pode ser admitido em alguns casos

de EIA/RIMA, onde a precisão das dimensões e a forma da edificação pouca importância terá

no contexto, até pela proporção do empreendimento não raro exceder centenas de hectares.

Observe-se, no entanto, que empreendimentos para os quais é exigido EIA/RIMA e que, por 

serem eminentemente urbanos, devem abordar os mesmos tópicos do EIV, necessitam do

anteprojeto para análise dos impactos urbanos.

Para fim de exemplicação, uma situação fictícia de EIA/RIMA: apresenta-se uma áreaonde se pretende construir um porto, na qual há previsão para aterro, cais, docas, estaleiro,

dentre outros. Só que o estudo comprovou a existência de uma área ambientalmente sensível,

 por exemplo, área de mangue, a qual deve ser preservada, não podendo receber intervenção

alguma. Identificada a área e seus afastamentos, isto passa a ser uma linha mestra do projeto a

ser feito. Até então, são admitidos estudos preliminares. Ou então, um outro exemplo: tem-se

a pretensão do aproveitamento de uma área para determinada atividade, mas não se tem idéia

alguma das propriedades do terreno, em especial, solo e subsolo. É feita então uma pesquisa

geológica que comprova a incompatibilidade do terreno com a atividade pretendida. O

EIA/RIMA, portanto, vai inviabilizar aquela área. Por isso a importância das alternativas

locacionais no EIA/RIMA.

O EIV não trabalha com alternativas locacionais. Não é um pressuposto do EIV. É feito

“sob medida” para um empreendimento ou atividade estabelecido numa área determinada. E

  para onde serão feitos os estudos de “vizinhança”, diferentemente do EIA/RIMA, que

extrapola a esfera do ambiente urbano. O EIV trabalha com a escala humana. A cidade é ohabitat do homem.

O EIV vai estudar um exato empreendimento, já com seu anteprojeto evidenciando

situação, implantação, elevações, estudos volumétricos e paisagísticos, para compreensão da

sua inserção na malha e paisagem urbanas. O memorial descritivo do anteprojeto deve trazer o

sistema construtivo, a área construída, a área impermeabilizada; o sistema de coleta de águas

  pluviais, esgotamento sanitário, tratamento do esgoto, abastecimento d’água, telefonia,

eletricidade; fluxos de pessoas e veículos; população permanente, população temporária; viasde acesso para veículos e pedestres; produção de ruído, produção de calor; emissão de gases

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20

tóxicos; produção de resíduos sólidos. Evidentemente, tudo em contraponto à vizinhança e à

capacidade das redes de infra-estrutura e/ou concessionárias de serviço público do município.

A superposição dos estudos pode até mesmo permitir a dispensa do EIV, em razão da

análise aprofundada dos impactos urbanos passar a ser assumida pelo EIA/RIMA. Ou seja,

caso haja a indicação dos dois instrumentos para a análise de um empreendimento, é possível

a incorporação do conteúdo do EIV pelo EIA/RIMA, desde que este considere, para cada

alternativa locacional, projetos em fase de detalhamento.

2.4 Autoria e responsabilidade técnica

Quanto à autoria dos estudos ambientais, o Decreto 99.274/1990, art. 17, § 2º,estabelece que “o Estudo de Impacto Ambiental-EIA será realizado por técnicos habilitados e

constituirá o Relatório de Impacto Ambiental-RIMA, correndo à conta do proponente do

 projeto”. Este decreto substituiu o art. 7º da Resolução CONAMA 1/86, o qual frisava:

Art. 7º O Estudo de Impacto Ambiental será realizado por equipe

multidisciplinar habilitada, não dependente direta ou indiretamente do

  proponente do projeto que será responsável tecnicamente pelos resultados

apresentados.

O artigo foi revogado pela Resolução CONAMA 237/97, por pressão de grupos

  privados e entidades paraestatais que queriam atribuir a execução do EIA/RIMA a seus

subordinados.

Com a revogação do artigo, passou-se a admitir que a equipe multidisciplinar 

elaboradora do EIA/RIMA poderia ser subordinada diretamente ao proponente do projeto,

como por vínculo empregatício. Em parte, a decisão foi bastante acertada e veio sanar A

título de exemplo, considere-se uma empresa fictícia, de tecnologia de ponta, única nodeterminado segmento, polarizadora de mão-de-obra altamente especializada, necessitando

formar uma equipe técnica a fim de elaborar um EIA/RIMA referente a um de seus

empreendimentos. Além de ser ilógico não utilizar a experiência de seus próprios técnicos,

detentores do conhecimento técnico específico exigido, por escassearem no mercado

especialistas fora da empresa, esta teria que contratar técnicos menos qualificados para

 prestação dos mesmos serviços, com o agravante da pouca familiaridade com as atividades

 potencialmente poluidoras da empresa.

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21

A revogação do art. 7º também veio a afastar uma prática um tanto hipócrita, porém

 bastante recorrente, que consistia na elaboração do EIA/RIMA por profissionais diretamente

ligados ao empreendedor, cujos créditos não apareciam no estudo.

Entretanto, o mesmo artigo revogado também determinava que o EIA/RIMA seria

"realizado por equipe multidisciplinar habilitada" e que também seria “responsável

tecnicamente pelos resultados apresentados”. Com a sua supressão, não restou na Resolução

artigo que fizesse menção tanto à equipe multidisciplinar quanto à responsabilidade técnica

dos autores do EIA/RIMA.

Revogado o art. 7º, aplica-se o Decreto 99.274/90, art. 17, § 2º, que diz que o "Estudo

de Impacto Ambiental-EIA será realizado por técnicos habilitados e constituirá o Relatório deImpacto Ambiental-RIMA, correndo as despesas à conta do proponente do projeto". O artigo

não evidencia a necessidade de equipe multidisciplinar.

Em vista disso, atentando à brecha deixada na Resolução, opina Machado (2003): “É

um grave retrocesso na legislação ambiental brasileira. A interdependência da equipe

multidisciplinar nunca foi total diante do empreendedor, que a contratava e a pagava. Deveria

ter sido tentado seu aperfeiçoamento, não a sua extinção.”27

O jurista ainda entende que a partir da Resolução CONAMA 237/97, em vigência desde

22 de dezembro de 1997, a responsabilidade pela elaboração do EIA/RIMA não recai sobre os

técnicos autores do estudo, mas, sim, sobre o empreendedor, o qual responde criminalmente

 pela idoneidade das informações:

  No regime da responsabilidade civil objetiva ou sem culpa da Lei

6.938/81 (art. 14, § 1º) não interessa apurar se os técnicos agiram com dolo

ou com negligência, imperícia ou imprudência na elaboração do estudo.

Pelas omissões e erros do Estatuto de Impacto e de seu Relatório respondecivilmente, de forma direta, o empreendedor ou o proponente do projeto.28

Machado (2003) expressa sua interpretação de como deve ser entendida a versão atual

Resolução Conama 1/86. Entretanto, a afirmativa constitui-se numa novidade e causa

estranhamento a quem lida com a legislação ambiental. A responsabilidade técnica não pode

ser preterida em circunstância alguma, caso contrário, não haveria sentido em utilizar 

conhecimentos específicos de profissionais credenciados pelos Conselhos de Classe

respectivos.

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22

Estudos, consultorias e demais atividades realizadas para fim de elaboração de estudos

ambientais devem ser acompanhados da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART)

respectiva, a qual discrimina o serviço prestado, o contratante, os honorários, dentre outros,

além de atestar a habilitação exigida do profissional. Logicamente, também respalda o

contratante quanto à responsabilidade técnica do profissional por aquilo que afirma no estudo.

As mesmas questões quanto à multidisciplinaridade da equipe e sua responsabilidade

técnica aplicam-se ao EIV.

O Estatuto da Cidade não se manisfesta quanto à autoria do EIV, se equipe técnica ou

mesmo individual. É fato que o currículo do curso de Arquitetura e Urbanismo engloba todos

os aspectos exigidos em lei para a elaboração do EIV, sendo, portanto, um único arquiteto eurbanista tecnicamente capaz e respaldado para executá-lo. A formação profissional do

urbanista não apenas qualifica-o a estudar tais questões como obriga-o, inclusive cabendo-lhe

a responsabilidade técnica por conseqüências da implantação inadequada de empreendimentos

em meio urbano já consolidado. Isto, por certo, também implicaria celeridade na elaboração

do estudo e redução de custos ao empreendedor. Todavia, a considerar a multi e

interdisciplinaridade, é desejável que se constitua equipe técnica, formada por profissionais

cuja especialização seja o planejamento urbano, sem necessariamente constituir-se apenas de

arquitetos. Logicamente, cada profissional terá formação específica relativa aos tópicos que

lhes coube analisar.

Sugestão para composição da equipe técnica:

•  arquiteto e urbanista;

•  engenheiro civil, com especialização em Engenharia de Tráfego;

•  engenheiro eletricista;

  geógrafo;•  economista;

•  antropólogo.

Quanto à subordinação por contrato de trabalho da equipe técnica ao empreendedor, da

mesma forma que o EIA/RIMA acima comentado, entende-se plausível, desde que a

responsabilidade técnica do documento elaborado seja dos profissionais envolvidos, até para

efeito de controle da qualidade técnica do que foi produzido. Dessa forma, qualquer erro ou

omissão grave por imperícia, negligência ou imprudência será, então, comunicado aoconselho de classe profissional respectivo.

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23

Outras soluções têm sido propostas. Entendendo que a subordinação por vínculo

empregatício compromete a imparcialidade do EIV, tramita hoje na Câmara Municipal de

Campo Grande projeto de lei que regulamenta o uso do instrumento, obrigando o proponente

a recolher taxa em favor do município para cobrir a execução do estudo.29

2.5 Aspectos a serem analisados pelo EIV

 Não é sem prejuízo que se implanta um novo pólo gerador de fluxos num bairro de uma

cidade já estabelecida. A inserção de equipamentos de grande porte, em regiões de alta

densidade demográfica, certamente gera interferências  no contexto urbano, em maior ou

menor grau conforme a capacidade de absorção de impactos do núcleo urbano em que foi

implantado.

Deve-se, portanto, demonstrar a compatibilidade do empreendimento com a capacidade

das redes de infra-estrutura urbana, por meio de estudo de ligação realizado pelo agente

  público controlador do serviço ou pela concessionária do serviço público. Carece de estudo

aprofundado o tráfego viário, bem como apresentação de alternativas viáveis de acessos pelos

  bairros adjacentes. As ruas de acesso ao empreendimento devem ser avaliadas quanto a

comportar o alargamento, visto que normalmente isto implica demolições e possíveis

desapropriações. Em cidades históricas, o cuidado deve ser redobrado, para preservar não

apenas o núcleo tombado, como também as relações humanas preestabelecidas, muitas vezes

centenárias. Deve-se demonstrar a compatibilidade do empreendimento com os recursos

naturais remanescentes da urbanização - como solo, ar, água, silencio, clima, vegetação e

fauna.

2.5.1 Adensamento populacional

Este item está diretamente relacionado à provisão de equipamentos e serviços públicos e

ao uso que deles faz a população. Há que se observar o dimensionamento das redes e serviços,

atentando-se à pouca ou à superutilização, até mesmo sua insuficiência. Menegassi e Osorio

(2002) tratam desta questão:

Um dos principais desafios no controle do uso e ocupação do solo

  passa por estabelecer melhor equilíbrio da ocupação territorial, evitando

vazios urbanos e a periferização subutilizada (ou precária) dos serviços

urbanos. Certamente o objeto de análise do impacto de vizinhança se refere

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ao adensamento que gera sobrecarga à infra-estrutura, mas também aos

incômodos da maior animação urbana, com suas movimentações e fluxos

(quer por população provisória originária de atividades de serviços ou

comércios; quer por acréscimo de população permanente decorrente do usoresidencial). (MENEGASSI & OSORIO, 2002)30

Quanto ao estudo de implantação do projeto, importa mensurar seu impacto na malha

urbana, o que implica análise do desenho urbano, análise do uso e ocupação do solo e das

tendências do desenvolvimento urbano, inclusive aspectos socioeconômicos como migração

de mão-de-obra e impacto no comércio local e regional.

Cabe analisar a capacidade de geração de fluxos interbairros e atração de novos

moradores para a região, em virtude da proximidade do emprego e/ou da atividade ali

desenvolvida.

Alguns empreendimentos induzem alterações inclusive na conformação do bairro. Um

 bairro pacato, distante do centro, com características bucólicas, pode ter seu modo de vida

abruptamente modificado pela instalação, por exemplo, de um   shopping center ou de um

centro de diversões noturnas, empreendimentos que atraem fluxos interbairros e equipamentos

de apoio que naturalmente se instalarão nas imediações.

2.5.2 Equipamentos urbanos e comunitários

Outro item estritamente relacionado à função social da propriedade. A avaliação do

impacto do empreendimento deverá estudar a necessidade da inclusão de equipamentos não

existentes ou não previstos para o local, conforme estipulado pela lei de zoneamento.

Áreas institucionais podem vir a ser demandadas pela atividade proposta pelo

empreendimento. Caso não haja a previsão, com reserva de área institucional na área de

influência do empreendimento, cabe o estudo da contrapartida do proponente do projeto. Por 

exemplo, caso um hipermercado instale-se em região eminentemente residencial, polarizando

a mão-de-obra feminina residente do local, é interessante que o empreendedor proponha e

construa creche, até mesmo cedendo área de seu terreno para esse fim.

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25

2.5.3 Uso e ocupaç ão do solo

O EIV deve informar a adequação do empreendimento ao uso do solo preestabelecido e

indicar os usos e ocupações previstos para os terrenos vizinhos.

A ordenação territorial do município pauta-se por instrumentos variados, que pretendem

disciplinar não apenas a distribuição espacial dos lotes e logradouros como estabelecer regras

  para o desenvolvimento das atividades urbanas, sejam comerciais, residenciais ou

institucionais.

O primeiro dos instrumentos é o zoneamento, contido na Lei de Ocupação e Uso do

Solo (LUOS), que se constitui na organização planificada da cidade, onde definem-se as

atividades urbanas e rurais por área, dimensionam-se os lotes e estabelece-se seu usoadequado, implantam-se as vias arteriais e são indicados os equipamentos proporcionalmente

necessários e áreas institucionais. Identifica também as glebas para as quais são traçadas as

áreas de expansão urbana e diretrizes para sua ocupação.

Outro instrumento é o Código de Obras e Edificações, que objetiva disciplinar a

construção individualizada. São leis que dispõem os parâmetros adotados para edificações,

como por exemplo desde as dimensões de afastamento lateral e frontal de uma edificação,

quantidade de pavimentos e cotas de altura e soleira, até regras para obtenção de licenças e

alvarás, contratação de profissionais e aprovação de projetos.

E, ainda, há o Código de Posturas, que disciplina o uso e apropriação do espaço urbano

  pelos cidadãos, preceituando condutas e procedimentos, regulando as operações de

construção, conservação e manutenção da propriedade pública ou particular, em especial do

logradouro público.  Estabelece, por exemplo, desde normas para implantação de

equipamentos urbanos variados, como telefones públicos, placas de sinalização,

semaforização, arborização, etc. e obrigações ao proprietário como a de construir, manter e

conservar a calçada na testada do lote, até procedimentos de conduta, como o respeito ao

silêncio em imediações de hospitais e clínicas e após 22:00h, em áreas residenciais.

 Não se presume, portanto, que o Estudo de Impacto de Vizinhança venha estabelecer 

normas de ordenamento espacial urbano. Para isto, já existem instrumentos. Por certo,

qualquer incompatibilidade do projeto proposto com as leis vigentes, inviabiliza o

empreendimento numa instância inferior ao EIV.

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Cumpridas e obedecidas as normas, o EIV traz uma novidade: a participação popular. É

imprescindível que seja ouvida a vizinhança, quanto às expectativas geradas pelo

empreendimento. Muitas vezes, a atividade que o zoneamento permite não interessa à

 população vizinha, ou inspira cuidados para sua implantação. O uso comercial permitido para

o lote vizinho a uma escola primária certamente vai sofrer restrições de ordem acústica.

Há que atentar, contudo, que o Estudo de Impacto de Vizinhança não venha impedir a

implantação de alguns empreendimentos de importância para o município. É quase certo que

cemitérios, aterros sanitários, terminais rodoviários e outros empreendimentos fundamentais

 para qualquer cidade serão repudiados onde quer que sejam instalados. O grande desafio no

caso do Estudo de Impacto de Vizinhança, portanto, é conseguir chegar a uma equação

satisfatória entre os ônus e os benefícios do empreendimento, visando a sua vizinhança

imediata, sem deixar de considerar o conjunto da cidade.

A exigência de Estudos de Impacto de Vizinhança embute também o risco de abuso por 

 parte da própria sociedade civil. Algumas sociedades de bairro, principalmente em regiões de

elite – historicamente beneficiadas pelas restrições na legislação urbanística – podem

instrumentalizar de forma perversa esse tipo de recurso. Um exemplo recente é de um

conjunto de edifícios a ser construído no Alto de Pinheiros, bairro de São Paulo. Neste caso, a

sociedade de amigos do bairro protestou contra o empreendimento, sob o argumento

excludente de que ele “popularizaria” o bairro. Como um dos resultados da pressão, o

empreendimento reduziu o número de unidades e aumentou sua metragem, evitando assim

uma suposta ameaça à qualidade de vida do bairro, decorrente da chegada de moradores de

 padrão econômico supostamente mais baixo. 31

2.5.4 Valorização imobiliária

O EIV deve deixar explicitado como se dará a valorização ou desvalorização imobiliária

do entorno, e indicar as transformações urbanísticas induzidas pelo empreendimento, que

advém de conhecer as atividades vizinhas: sua natureza, seu porte, seus fornecedores e sua

clientela, com impacto direto sobre o valor dos imóveis da vizinhança.

Este item ainda reforça o aspecto do cumprimento da função social da propriedade,

conforme discorre Menegassi & Osorio (2002):

Mais um importante aspecto da verificação do cumprimento da funçãosocial da propriedade, a valorização imobiliária, especialmente a decorrente

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do investimento público ou da sua regulação (capacidade construtiva), tem

no impacto de vizinhança um instrumento capaz de avaliar se investimento

  público e valorização privada estão em conformidade com o princípio da

redistribuição de renda urbana e do uso social. 32

Também traz à tona a questão da estratificação social e do fenômeno da favelização,

 bastante recorrente nos municípios brasileiros. Cabe estudar a probabilidade de desenvolver-

se um cinturão de pobreza nas imediações do empreendimento, formado pela migração em

massa de população de baixa renda, atraída pela oportunidade de ocupação decorrente da

atividade ali instalada, como, por exemplo, catação de materiais recicláveis, como papel,

 plástico e latas de alumínio.

2.5.5 Geração de tráfego e demanda por transporte público

Ao considerar a implantação do empreendimento, por certo preocupam ao planejador 

urbano os desdobramentos na malha urbana da cidade, o incremento do fluxo de veículos em

suas imediações, a reformulação viária necessária à adequação ao tráfego e, em conseqüência,

as possíveis desapropriações imobiliárias nas áreas lindeiras.

Certamente, o grande desencadeador deste impacto é o tipo de atividade a ser desenvolvida no e/ou pelo empreendimento. Conforme Menegassi e Osório (2002), os

impactos de vizinhança não decorrem apenas da geração de tráfego, mas também da

adequação da acessibilidade local, incluídos aí os incômodos das modificações viárias.

A depender do número de funcionários e do público estimado para o empreendimento, a

demanda por transporte público exigirá a implementação de linha específica de transporte

 público, além dos equipamentos urbanos necessários, como paradas de ônibus, semaforização

específica e sinalização viária.

A avaliação dos possíveis impactos causados no sistema viário deve considerar o estudo

de soluções técnica e economicamente viáveis e o aprimoramento das ações de controle e

fiscalização das obras, com o mínimo de interferências nos meios físico e social.

As ruas de acesso ao empreendimento devem ser avaliadas quanto a comportar 

alargamento, visto que normalmente isto implica demolições e possíveis desapropriações.

Também é de interesse a previsão dos transtornos causados pelas modificações viárias, quanto

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à acessibilidade, partículas em suspensão, poluição sonora e atmosférica decorrente do

maquinário utilizado na fase de implantação e demais incômodos.

Em razão da indução de vibrações no solo motivada pelo aumento do tráfego viário

após a implementação do empreendimento, bem como pela movimentação de veículos

  pesados durante a execução das obras, deve-se analisar a estabilidade das construções

vizinhas, em especial as mais antigas, detentoras de interesse histórico, a fim de avaliar as

restrições de tráfego necessárias.

2.5.6 Ventilação e iluminação

Trata-se das condições de ventilação, insolação e luminosidade preexistentes no local edas possíveis interferências causadas pelo empreendimento no microclima da vizinhança,

extrapolando o espaço privado do empreendimento e sua respectiva construção.

A adoção dos princípios bioclimáticos para o desenho urbano requer uma avaliação

climática da região, que pode ser feita a partir de variações diuturnas de temperatura do ar, da

amplitude destas variações, das precipitações, da intensidade da radiação difusa e direta,

umidade relativa do ar, nebulosidade, ventos, altitude e localização geográfica.

Um empreendimento pode interferir significativamente no curso de uma corrente de ar,

responsável pelo arrefecimento dos logradouros e edificações vizinhos. Muitas vezes, a

corrente de ar é desviada, coletada e afunilada, favorecendo o aparecimento de constantes e

incômodas rajadas de vento em pontos isolados, como nos ângulos das construções, aberturas

entre barreiras perpendiculares à direção do vento e em estrangulamentos de construções

 projetadas num ângulo aberto ao vento.

O aproveitamento das correntes de ar para a ventilação urbana nos climas das regiões

tropicais é fundamental e vai depender do meio que pode alterar as características próprias do

vento dominante (ROMERO, 1988). O movimento de ar numa escala microclimática afeta

especificamente os pedestres e as edificações. Existe relação direta entre o movimento de ar 

no meio urbano e as massas edificadas, sua configuração, suas dimensões e sua justaposição.

É fundamental que o aproveitamento das brisas considere a variação da direção dos

ventos nas estações frias e quentes, atentando-se para que os anteparos utilizados no inverno

não dificultem ou impeçam o fluxo das brisas no verão.

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29

Também é possível que, a depender da técnica construtiva e dos materiais de

revestimento utilizados na edificação, um empreendimento cause aumento nos níveis de calor 

da vizinhança imediata. A supressão de arborização existente no terreno também pode

 provocar o mesmo.

A minoração dos efeitos da reflexão da radiação solar num espaço densamente ocupado

  passa pela utilização de materiais e cores pouco refletivos, fachada irregular, coberturas

vizinhas não planas e vegetação adequada, que absorva a radiação e aumente os níveis de

umidade do meio.

Outra questão de interesse refere-se à insolação, que é a exposição à radiação direta dos

raios solares. Ainda que as normas do Código de Obras e Edificações permita a livre locaçãodo edifício no terreno, inclusive permitindo gabarito que venha a prejudicar a insolação dos

terrenos vizinhos (o limite de altura é o referencial mais problemático nas áreas adensadas),

certamente a melhor disposição da edificação no lote considerará a orientação solar mais

favorável e a menor interferência nas edificações adjacentes. O sombreamento excessivo de

um terreno é prejudicial, favorecendo o desenvolvimento de fungos, podendo até mesmo

interferir na saúde física e psíquica de seus usuários.

A resolução de problemas de geometria da insolação de edifícios isolados, ou integradosem arranjos urbanísticos, pode realizar-se a partir de desenhos de anteprojeto (plantas e

cortes) desde que se conheçam, para o lugar de implantação, as coordenadas horizontais do

Sol a diversas horas de diferentes dias do ano (SILVA & MALATO, 1969)33.

2.5.7 Paisagem urbana e patrimônio natural e cultural

O EIV também deve contemplar a compatibilidade do empreendimento com a paisagem

urbana da vizinhança, por semelhança com as atividades humanas vizinhas e/ou com avolumetria dos edifícios vizinhos. Deve demonstrar que a volumetria do empreendimento não

é impactante à paisagem urbana, à medida em que não interfere na sua legibilidade nem se

constitui num elemento obstaculizador da paisagem descortinada, natural ou modificada.

A paisagem não é entendida como o que se vê, a partir, ou do próprio empreendimento,

mas compreende o conjunto dos elementos, incluindo-se a nova edificação proposta. Por esta

razão, são imprescindíveis os estudos tanto volumétrico , quanto das escalas envolvidas.

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30

É comum que algumas áreas específicas, como as situadas à orla marítima de cidades

turísticas, sofram pressões da especulação imobiliária para aumento de gabarito das projeções.

Fora as questões óbvias de barreira às brisas marinhas, sombreamento nos arredores e

impedimento à visibilidade, é questionável implantar-se um gigantesco equipamento

  justamente na orla, quando a tendência atual é abrir as cidades para suas linhas d’água,

garantindo ao cidadão o direito à “leitura” do mar, rios e lagoas.

Deve-se atentar à poluição visual causada por letreiros, banners, painéis, luminosos, ou

mesmo cores vibrantes incompatíveis com o contexto da vizinhança.

Tratando-se de núcleos históricos, há que se atentar não apenas aos impactos diretos,

visíveis, sofridos pelos bens tombados, mas de que forma os desdobramentos impactantesrepresentariam risco à preservação da memória. Eis uma tarefa difícil, pela sutileza de ambas

as partes: o desdobramento de um impacto pode não deixar claro o causador do dano e a

definição da memória renderia páginas de argumentações e seus rebatimentos.

Intervenções urbanas importantes requerem uma abordagem completa e não superficial

das questões referentes ao patrimônio cultural urbano. É comum que estudos ambientais

limitem-se a uma listagem de bens móveis tombados, tomados isoladamente, não

  prevalecendo uma visão do conjunto dos bens. Muitas vezes, sequer é exposto rápidohistórico da evolução da ocupação urbana que, sabe-se, em muito explica questões culturais

de relevância. Cabe analisar a importância histórica das imediações da área tencionada para a

implantação do empreendimento e identificar conjuntos ou mesmo edificações isoladas que,

mesmo não detendo o tombamento, tenham agregado valor histórico e cultural.

Para os edifícios, áreas e conjuntos tombados, deve ser observado o distanciamento, de

modo a preservar a ambiência e a legibilidade do bem. Algumas cidades estabelecem

dimensões mínimas a observar, como o município de São Paulo, que estabeleceu o raio de300 m a partir do bem, como sua área de influência direta, exigindo que qualquer projeto de

construção ou reforma necessariamente submeta-se ao órgão de preservação patrimonial,

como condicionante ao alvará de construção.

Também importa atentar-se ao patrimônio imaterial. Muitas manifestações culturais têm

relação direta com o espaço urbano em que se realizam. Se, porventura, houver alguma festa

  popular ou ajuntamento religioso de características culturais, cabe a análise das possíveis

interferências do empreendimento e das ações por ele desencadeadas.

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31

2.5.8 Itens não abrangidos pelo EC

O conjunto dos itens mencionados acima não representa a totalidade de uma análise de

fatores impactantes no meio urbano. São apenas “requisitos mínimos”, como bem expressa a

Lei. Sendo o Estudo de Impacto de Vizinhança um estudo de impacto ambiental, está sujeito à

regulamentação federal sobre a matéria, de modo que seu conteúdo básico inclui a avaliação

de impactos significativos (Decreto Federal 99.274/94). A análise, portanto, deve ser 

estendida a elementos não considerados no art. 37, incisos I a VII, do Estatuto da Cidade, que

constituem-se em fatores de impacto de importância. Ao regulamentarem seus instrumentos

de análise de impacto de vizinhança, os municípios devem atentar-se aos itens seguintes:

a) redes de infra-estrutura

O histórico nada favorável dos serviços de saneamento dos municípios brasileiros dá

conta de que as intervenções em rede de infra-estrutura urbana são invariavelmente

implantadas com atraso e de forma inadequada. Certamente, tal ineficiência ocorre não apenas

em função da rapidez e do desordenamento da expansão urbana, bem como escassez de

recursos e investimentos em redes de infra-estrutura. Deve-se também ao despreparo dos

administradores públicos e da falta de iniciativa, controle e participação sociais. Nestecontexto, é muito bem-vinda a avaliação do EIV pela população interessada. Sabendo-se que

o empreendimento trará às redes de coleta e serviços públicos demanda e contribuição em

volume de importância, o cidadão, ao discutir as soluções ambientais apresentadas pelo

empreendedor, desperta também para sua responsabilidade no âmbito de sua casa, sua rua, seu

 bairro.

O EIV deve demonstrar a compatibilidade do empreendimento com a capacidade das

redes de infra-estrutura urbana, por meio de estudo de ligação realizado pelo agente públicocontrolador do serviço ou pela concessionária do serviço público. Não deve simplesmente

traçar uma estimativa e indicar volumes e demandas. Isto é atribuição do memorial descritivo

do projeto arquitetônico. O EIV deve contrapor a situação atual às projeções de expansão

urbana, indicando o impacto a médio e a longo prazo.

Assim sendo, quanto a abastecimento d’água, o EIV deve não apenas indicar a

disponibilidade hídrica da região e seu respectivo tratamento para consumo humano ou sua

utilização para a produção industrial, como também avaliar as projeções demográficas e acapacidade de suporte do meio ambiente.

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32

São muito bem-vindos projetos ecologicamente responsáveis, que prevêem o

recolhimento e a utilização de águas pluviais para usos em que é desnecessária a potabilidade

da água (p. ex.: irrigação de jardins, hortas e pomares; descarga sanitária; lavagem de pisos;

etc.).

Também deve demonstrar a compatibilidade do sistema de drenagem com o aumento do

volume e da velocidade de escoamento de águas pluviais, gerado pela impermeabilização da

área de intervenção. Deve indicar os picos de vazão e as medidas adotadas para retardar o

escoamento superficial, como melhoria e facilitação do armazenamento e fluxo subterrâneo.

Deve indicar quais os efeitos negativos da impermeabilização do solo pelas construções serão

reduzidos pela implantação de medidas como, por exemplo, o uso de pavimentação que

facilite a infiltração no solo, a captação de água de chuva e os reservatórios de acumulação.

Havendo características especiais de drenagem e retenção de águas apresentadas pela área, é

imprescindível que o projeto de implantação suceda o plano de drenagem da região.

O estudo deve apresentar a demanda gerada pelo empreendimento quanto ao consumo

de energia elétrica, inclusive iluminação pública, caso seja necessária, e à rede de

telecomunicações. Apresentar propostas de redução de consumo e formas alternativas de

energia.

Deve ainda estimar a produção e identificar o tipo de resíduos sólidos e explicar como

se dará sua coleta, destinação e tratamento.

b) poluição sonora

A preocupação com a poluição sonora é tema recorrente, visto tratar-se de um dos males

que maior incômodo causa à vizinhança, especialmente se for residencial. A observância das

normas de vizinhança quanto ao controle acústico evidencia comportamento de urbanidade e

cortesia, essenciais na convivência diária.

Qualquer atividade que se pretenda instalar numa zona cujo uso seja

 predominantemente diverso, deve adequar-se ao uso majoritário da área. Neste sentido, bares,

igrejas, clubes e demais atividades localizadas em zonas residenciais que reproduzam músicas

com vibrações sonoras acima dos decibéis tolerados, geram poluição sonora e, destarte,

devem sofrer restrições.

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33

Um ambiente urbano ecologicamente equilibrado também será

saudável se for respeitado o uso dos imóveis de acordo com sua finalidade,

com as restrições legais, em condições e horários determinados, implicando,

no mais das vezes, conforto aos que residem no entorno. Uma das  preocupações atuais dos habitantes das zonas urbanas refere-se à poluição

sonora ou aos ruídos urbanos, causados principalmente quando o uso não

respeita o lugar adequado e/ou o momento certo para seu exercício34

(FREITAS, 2001).

A Resolução CONAMA nº 01/90 e a NBR 10.152 dispõem sobre padrões de emissão de

ruídos e fornecem os níveis de conforto acústico. Os municípios podem e devem legislar 

sobre o assunto e adotar padrões ainda mais rigorosos que os estabelecidos na legislaçãofederal. Além disso, devem estabelecer horários para o funcionamento de empreendimentos

 produtores de ruídos e para atividades como carga e descarga, obras de construção civil e

realização de eventos públicos.

c) medidas mitigadoras e compensatórias

Finalmente, entende-se que o EIV deva “conquistar” o público que o analisa. É

interessante para o empreendedor que seu projeto seja aprovado com presteza, porque,certamente, trata-se de investimento vultoso ainda sem o retorno financeiro esperado. Para o

município também é interessante, visto que passará a contar com mais um equipamento

urbano de qualidade, com abertura de novos postos de trabalho, além do recolhimento de

impostos. Todavia, deve se atentar à possível animosidade da população para com o

empreendimento. Muitas vezes, a expectativa da vizinhança já foi minada por anseios e

angústias advindos de empreendimentos similares. Em vista disso, é de se esperar que o

empreendimento traga voluntariamente medidas socioambientais em contrapartida para avizinhança. É interessante para o empreendedor, sob todos os aspectos, contar com a simpatia

e aquiescência da população da vizinhança.

Assim entende o arquiteto Cymbalista (2004), Mestre em Estruturas Ambientais

Urbanas pela USP:

As conclusões do Estudo de Impacto de Vizinhança poderão aprovar o

empreendimento ou atividade, estabelecendo condições ou contrapartidas

 para seu funcionamento, ou impedir sua realização.

(...)

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34

O Estudo de Impacto de Vizinhança poderá também exigir alterações no

 projeto do empreendimento, como diminuição de área construída, reserva de

áreas verdes ou de uso comunitário no interior do empreendimento,

alterações que garantam para o território do empreendimento parte dasobrecarga viária, aumento no número de vagas de estacionamento, medidas

de isolamento acústico, recuos ou alterações na fachada, normatização de

área de publicidade do empreendimento, etc.

(...)

A contrapartida a ser oferecida pelo empreendimento, em troca da

 possibilidade de sua realização, pode ser de várias ordens, relacionando-se à

sobrecarga que ele provocará: no caso de adensamento populacional,

  poderão ser exigidos áreas verdes, escolas, creches ou algum outro

equipamento comunitário; no caso de impacto sobre o mercado de trabalho,

  poderão ser exigidos postos de trabalho dentro do empreendimento, ou

iniciativas de recolocação profissional para os afetados; no caso de

empreendimento que sobrecarregue a infra-estrutura viária poderão ser 

exigidos investimentos em semaforização e investimentos em transportes

coletivos, entre outros. 35

Em análise de Estudos de Impacto de Vizinhança, constata-se, porém, a práticarecorrente de considerar as adequações infra-estruturais urbanas decorrentes do

empreendimento como de responsabilidade do Poder Público. Entretanto, indo de encontro a

esse entendimento, alguns dos condicionantes constituem-se, na verdade, medidas

compensatórias, de responsabilidade do empreendedor, como a implantação de passarelas,

semáforos e faixas de pedestres nas avenidas lindeiras. O município não pode arcar com

custos que outro empreendimento, talvez com características diversas do primeiro, não

demandaria. Caso pretenda-se uma atividade cujo afluxo de pessoas e veículos seja incomum

  para aquela vizinhança, as alterações viárias constituem-se responsabilidade do

empreendedor, visto que de outra forma, o incremento na movimentação não existiria.

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35

CAPÍTULO 3 DIFICULDADES NA IMPLEMENTAÇÃO DO

ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA

3.1 Indefinição de âmbitos

 Não obstante a importância inegável dos instrumentos de ordenação territorial urbana e

controle de impactos, dentre os quais o EIV, este ainda é um grande desconhecido dos

cidadãos brasileiros. É possível que a implementação do EIV nos municípios brasileiros ainda

não tenha se efetivado pela dificuldade de definir âmbitos e competências. Mesmos os

técnicos cujo objeto de trabalho é o planejamento urbano não raro vêem-se às voltas com

estas indefinições, muitas vezes optando por utilizar outros instrumentos de regulação urbana

ou ambiental, em detrimento do EIV.

A regulamentação do EIV pelo município independe do Plano Diretor. Todavia, é

desejável que os dois instrumentos sejam implementados, se possível, concomitantemente,

 pela complementaridade que há entre ambos. Tentaremos trazer à tona um pouco da discussão

travada acerca da competência do município em legislar sobre matéria urbanística e da

extensão da obrigatoriedade da elaboração do Plano Diretor às cidades descritas nos incisos II

a V do art. 41 do Estatuto da Cidade.

3.2 Competências

A CF, em seu art. 24, delimita a competência legislativa relativa às questões ambientais

(em destaque, os trechos que também podem ser relacionados, direta ou indiretamente, a meio

ambiente urbano):

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar 

concorrentemente sobre:

I – direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;

(...)

VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e

dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

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36

VII –    proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e

 paisagístico;

VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens

e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (grifonosso).

Discorrendo acerca da legislação da União e dos Estados-membros, Moreira Neto

(1998) observa que “ocupam espaços definidos e a dos Estados será, em regra, complementar 

e, apenas ocasionalmente, supletiva”, ou seja, “a União e os Estados legislam limitadamente:

a União devendo limitar-se a baixar ‘diretrizes’, ‘normas fundamentais’ ou ‘normas gerais’ e

os Estados, as ‘normas específicas’ e ‘de aplicação’.”36

“A situação dos Municípios, no âmbito da competência concorrente, exige ainda maior 

reflexão”, discorre Leuzinger (2002). “Com efeito, a Constituição Federal não atribuiu aos

Municípios competência para legislar sobre as matérias elencadas no art. 24. Assim sendo, os

municípios, em uma primeira análise, não poderiam editar leis sobre tais questões.” E ainda:

Ocorre que os incisos I e II do art. 30 da Constituição de 1988

determinam serem os entes municipais competentes para legislar sobre

assuntos de interesse local, bem como suplementar a legislação federal e a

estadual, no que couber.37

(...)

A exclusão dos Municípios do rol do art. 24 não significou lhes ter 

sido negado o direito de legislar sobre aquelas questões, desde que

observadas as condições estabelecidas pela própria Constituição Federal,

quais sejam: tratar-se de assuntos de interesse local e respeitar o disposto nas

legislações estadual e federal.38

(...)

De fato, a competência legislativa dos Municípios, estabelecida nos

incisos I e II da Carta Federal, circunscreve o âmbito de competência

exclusiva, relativo às questões de interesse local, e o de competência

concorrente, revelado na possibilidade de suplementação da legislação

federal e estadual, no que couber, ou seja, na esfera, mais uma vez, do

chamado interesse local.39

Aduz Silva (1990) que:

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37

A Constituição não situou os municípios na área de competência

concorrente do art. 24, mas lhes outorgou competência para suplementar a

legislação federal e estadual no que couber, o que vale possibilitar-lhes

disporem especialmente sobre as matérias ali arroladas e aquelas a respeitodas quais se reconheceu à União apenas a normatividade geral.40

Conforme anota Almeida (1991):

(...) como adverte, de outra parte, Celso Bastos, as competências

expressas no artigo 30 ‘não devem estimular uma visão exageradamente

grandiosa da autonomia municipal’, porque ‘diversas matérias aí explicitadas

sofrem a restrição de uma normatividade superior’. (...) É também o caso do

inciso VIII, relativo à ordenação do território, que deverá respeitar os planosnacional e regionais sobre a matéria.41

As vantagens da regulação municipal referem-se fundamentalmente à própria

capacidade fiscalizadora e orientadora de que dispõem a estrutura administrativa local,

viabilizando a rápida tomada de decisões, evidentemente não sendo excluídas as

competências constitucionalmente asseguradas aos Estados e à União Federal.

3.3 O vínculo do EIV com o Plano Diretor

Muitas das questões aqui colocadas trazem à tona a necessidade de concatenação entre a

 proposta da instituição do EIV e as diretrizes traçadas, ou ainda a serem, no Plano Diretor,

observada a legislação urbanística e ambiental em vigor. Para que haja ações concretas no que

diz respeito à efetivação do EIV, é urgente a implementação das diretrizes de uso e ocupação

do solo, estabelecidas pelo Plano Diretor, e aprovação do Código de Obras pela câmara

municipal. São instrumentos de ordenamento territorial que devem anteceder, e

consequentemente impedir, a expansão urbana desordenada. Assim, torna-se possível a

imposição de condições para a elaboração do EIV.

Estudando-se a cidade, a leitura dos usos antrópicos, focalizando sistema viário,

ocupação urbana, valor da terra e saneamento resulta no diagnóstico de uso e ocupação do

solo, que subsidiará a aprovação do zoneamento. O zoneamento deve disciplinar a ocupação,

observando áreas ambientalmente frágeis ou fragilizadas. Portanto, para que haja coerência no

  processo, o zoneamento deve anteceder a definição dos empreendimentos e atividades

merecedoras de EIV.

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38

Qualquer processo de aprovação de edificações e atividades urbanas tem por função

verificar sua conformidade com as normas vigentes para a área, cujos uso do solo e os limites

de ocupação do terreno estão definidos no zoneamento urbano, o que faz da pretensão de

instituir-se o EIV imediatamente antes da implementação da lei de uso e ocupação do solo

insensata.

3.4 Cidades desobrigadas pela CF a implementar o Plano Diretor

Conforme discorrido no capítulo I deste trabalho, item 1.2, o Estatuto da Cidade, em seu

artigo 41, ao estabelecer a obrigatoriedade do Plano Diretor para alguns municípios,

automaticamente dispensou uma grande maioria que, não obstante as vantagens advindas de

sua elaboração e implementação, por estar desobrigada a fazê-lo, acomoda-se em seu modelo

gestão convencional

Além disso, dificuldades referentes a possíveis inconstitucionalidades, enfraquecem a

determinação de que seja implementado. Apesar do Estatuto da Cidade constituir-se em lei

federal, ao sobrepor-se a Constituição Federal, muitas cidades são respaldadas quanto à

desobrigação da elaboração do Plano Diretor , o que, portanto, compromete a implementação

adequada do EIV.Os itens a seguir discriminam os casos para os quais o Estatuto da Cidade determina a

instituição do Plano Diretor, e discorre-se sobre as razões que justificam sua aplicação nos

referidos municípios, apesar da não estarem obrigados pela CF.

a) cidades com menos de vinte mil habitantes

Embora a Constituição Federal determine como obrigatório o Plano Diretor apenas para

cidades com mais de vinte mil habitantes, de acordo com o Estatuto da Cidade, será

obrigatório também para os municípios com menos de vinte mil habitantes quando estes

forem integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, de áreas de interesse

turístico, ou inseridos na área de influência de empreendimentos ou atividades com

significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional, com base nos incisos II, IV e

V do artigo 41.

Apesar de recomendável a implementação de Planos Diretores nestes municípios,

conforme anteriormente explanado, como fortalecimento do processo democrático de gestão

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39

  popular, em vista do que determina a Constituição Federal, a legislação encerra quaisquer 

 pretensões nesse sentido.

Em conseqüência disto, muitas cidades têm se privado dos benefícios advindos da

correta implementação e regulamentação do EIV, instrumento que, em conjunto com as

diretrizes dos demais instrumentos regulamentados pelo Plano Diretor, certamente evitaria

transtornos ao espaço urbano e às relações sociais nele estabelecidas, pela garantia da

 participação da população interessada.

 Não é outra a recomendação do Ministério das Cidades:

A adoção do Plano Diretor é a medida mais adequada para os

Municípios poderem implementar uma política urbana em consonância comos preceitos constitucionais e as diretrizes desta política estabelecidas no

Estatuto da Cidade, bem como para respeitar as normas de parcelamento do

solo urbano estabelecidas na lei n° 6.766/79 alterada pela lei n° 9.785/99,

independente da obrigatoriedade constitucional, em especial pelos

Municípios com menos de vinte mil habitantes.

b) cidades integrantes de áreas de especial interesse turístico

Considerando o grau de atração turística de muitos municípios com menos de vinte mil

habitantes e os cerceamentos que hoje se fazem a sua expansão, é fundamental a definição de

diretrizes quanto a seu crescimento e ao impacto da visitação nos recursos naturais, na infra-

estrutura urbana e nas relações socioeconômicas estabelecidas. Importa observar que ações

impeditivas do crescimento urbano certamente redundarão em especulação imobiliária com

conseqüente expulsão da população local de baixa renda.

Além disso, áreas com interesse turístico causam forte atração populacional, em virtudeda oferta, muitas vezes sazonal, de postos de trabalho que surgem com a demanda gerada

 pelas atividades turísticas, ou a elas relacionadas, e dos novos moradores que procuram maior 

qualidade de vida. Com isso, tendem a expandir seu núcleo urbano com rapidez vertiginosa,

nem sempre acompanhada de planejamento urbano adequado e políticas sociais de

arregimentação e capacitação de mão-de-obra.

O Plano Diretor é, portanto, desejável a fim de especificar planos e ações neste sentido,

visando minimizar os impactos sociais negativos decorrentes do crescimento acelerado donúcleo urbano. Além disso, o impacto do incremento da visitação tem de ser melhor avaliado,

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40

e não apenas visto como forma de obter lucro, haja vista que um dos pontos críticos mais

observados em locais de forte atratividade turística sem o devido manejo ambiental é a

degradação dos próprios recursos naturais.

Exemplo bastante emblemático é o caso da vila São Jorge, distrito pertencente ao

município de Alto Paraíso de Goiás, localizado à entrada do Parque Nacional da Chapada dos

Veadeiros, cuja expansão acelerada trouxe à tona problemas socioambientais de vulto, que

hoje estão sendo minimizados pela implementação de plano de gestão ambiental, seguindo

diretrizes do Plano Diretor do município.

 Não é sem razão que o Estatuto da Cidade estende a obrigatoriedade do Plano Diretor às

cidades com interesse turístico. Todavia, uma vez que a Constituição estabelece aobrigatoriedade da execução do Plano Diretor apenas para cidades acima de vinte mil

habitantes, muitas cidades turísticas de projeção internacional e, portanto, de crescimento

acelerado, ainda permitem-se privar da regulamentação dos instrumentos instituídos pela Lei.

  No entanto, para gerar a obrigatoriedade da elaboração e implementação do Plano

Diretor aos municípios integrantes de áreas de especial interesse turístico, é preciso conjugar 

essa característica com as previstas no artigo 182 da Constituição e no artigo 41 do Estatuto

da Cidade. Não havendo a sobreposição, não se pode exigir sua elaboração.

c) cidades onde o Poder Público penaliza a não utilização ou subutilização do solo

urbano

Caso o município, ainda que não enquadrado no art. 41, pretenda utilizar os

instrumentos da edificação ou parcelamento compulsório, do imposto sobre a propriedade

 progressivo no tempo e a desapropriação para fins de reforma urbana, bem como a outorga

onerosa do direito de construir, com base no inciso III do mesmo artigo, neste caso, obriga-sea elaborar o Plano Diretor.

Cumpre observar que o art. 41 do Estatuto da Cidade, em seu inciso III, ao se referir a

“solo urbano subutilizado”, necessariamente refere-se às cidades que já tenham Plano Diretor 

aprovado por lei específica, visto que o critério de aproveitamento mínimo dos lotes urbanos

deve estar instituído no Plano Diretor ou em legislação dele decorrente, conforme explicitado

no art. 5º da mesma lei, § 1º.

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41

d) cidades integrantes de regiões metropolitanas

Em 1967, a Constituição Federal já estabelecia, no seu artigo 157, § 10: “A União,

mediante lei complementar, poderá estabelecer regiões metropolitanas constituídas por Municípios que, independentemente de sua vinculação administrativa, integrem a mesma

comunidade socioeconômica, visando à realização de serviços de interesse comum.” Em

1967, o dispositivo converteu-se em artigo autônomo (art. 164).

As grandes conurbações constituídas pelas regiões metropolitanas são um fenômeno

urbanístico que não pode ser desconsiderado no planejamento e gestão urbana. As

administrações modernas, tanto da cidade centralizadora, quanto dos municípios que em torno

dela gravitam e dispõem-se na sua região geoeconômica, não podem omitir suas interrelaçõesno planejamento regional. Uma vez que compõem uma única unidade socioeconômica, com

recíprocas implicações nos seus serviços e equipamentos urbanos e interurbanos, estes deixam

de ser de exclusivo interesse local, pelo vínculo constituído com toda a comunidade

metropolitana. Justamente por isso, devem ser planejados e executados em conjunto por uma

administração unificada e autônoma, que represente todos os municípios da região.

Pelo inciso II do artigo 41, é estabelecida a obrigatoriedade para os municípios

integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas ter Planos Diretores. De acordo

com o artigo 25 da Constituição Federal, os Estados poderão, mediante lei complementar,

instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões constituídas por 

agrupamento de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a

execução de funções públicas de interesse comum.

A elevada densidade demográfica e a necessidade de executar funções públicas de

interesse comum, presentes nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, geram a

necessidade dos municípios agrupados nestes grandes núcleos urbanos de promoverem o

  planejamento e a política urbana de forma articulada e integrada. Para promover este

  planejamento visando a uma integração da política urbana que será implementada nos

municípios por iniciativa própria, podem constituir um consórcio ou um comitê sobre política

urbana, a exemplo da gestão compartilhada da política de recursos hídricos, nos moldes do

que ocorre com os comitês de bacia hidrográfica.

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42

e) cidades em área de influência de atividades com impacto ambiental

Cidades inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades de

significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional devem condicionar a

aprovação destes empreendimentos às exigências fundamentais de ordenação da cidade

expressas no Plano Diretor. A comunidade local deve ter assegurado o direito de definir sua

  política urbana sem a interferência econômica de grandes empreendedores, tanto do setor 

 privado como do próprio setor público.

Estes empreendimentos e atividades devem portanto ser analisados pelo Poder Público

municipal e demais órgãos competentes com base no Plano Diretor, ficando condicionada a

aprovação do empreendimento e da atividade aos critérios e exigências previstos.  Nos termos do § 1° do artigo 41, no caso da realização de empreendimentos ou

atividades de significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional, os recursos

técnicos e financeiros para a elaboração do Plano Diretor devem estar inseridos entre as

medidas de compensação adotadas.

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43

CAPÍTULO 4 EXPERIÊNCIAS DA UTILIZAÇÃO DO EIV

4.1 Antecedentes

O processo de aprovação do Estudo de Impacto de Vizinhança favorece o diálogo entre

empreendedores e municípios, permitindo que estes tenham como exigir contrapartidas em

decorrência dos impactos causados no meio urbano. Apesar de mostrar-se inovadora a lei que

institui o instrumento, em alguns municípios brasileiros o princípio do impacto de vizinhança

  já era aplicado a uma série de empreendimentos e atividades, baseando-se em outros

instrumentos já vigentes, como a regulamentação de Pólos Geradores de Tráfego e os Estudosde Impacto Ambiental, e também considerando a pressão direta de moradores das redondezas

de futuros empreendimentos, conforme expõe Cymbalista (2004) nos exemplos a seguir:

a) Shopping Center Aricanduva, São Paulo-SP; início da década de 1990

Partindo do fato de o empreendimento produzir um imenso impacto na circulação de

veículos na região, a Prefeitura Municipal utilizou-se do instrumento dos Pólos Geradores de

Tráfego (PGT). Na negociação, obteve uma série de contrapartidas dos empreendedores,

como a instalação de semáforos, a construção de uma ponte e a duplicação de uma avenida.

Além disso, a compreensão de que a gleba seria objeto de parcelamento – ainda que se

tratasse de um único grande empreendimento – permitiu a exigência de que se deixasse 30%

do terreno permeável e sem pavimentação.

b) Shopping Center Higienópolis, São Paulo-SP

Empreendimento construído em vizinhança típica de alta renda, cuja população,

 bastante organizada em função da defesa da qualidade de vida do bairro, sob o argumento da

 preservação de dois casarões situados no terreno do empreendimento e do impacto de tráfego

que o shopping center geraria, obteve do empreendedor uma série de contrapartidas

relacionadas à qualidade paisagística (restrições a anúncios publicitários, manutenção de áreas

verdes próximas, restauração dos casarões, recuo em relação às ruas), às características do

  próprio empreendimento (diminuição do número de garagens e do tamanho do

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empreendimento), aos sistemas circulatórios (automação da semaforização, garantia de

 prioridade aos pedestres, implementação de linhas de microônibus de apoio ao público).

c) empreendimentos comerciais com área superior a 2 mil m2, Porto Alegre-RS

Empreendimentos cuja área de vendas seja superior a 2 mil metros quadrados são

obrigados a realizar um Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU), de responsabilidade do

empreendedor, e entregá-lo à Secretaria Municipal de Planejamento. O Estudo de Viabilidade

Urbanística é prévio à aprovação do empreendimento, e deve apresentar os impactos do futuro

empreendimento sob três aspectos: biológico, físico e socioeconômico. Esse estudo é enviado

à Secretaria do Planejamento, que o encaminha a um colegiado técnico, a Comissão deAnálise Urbanística. Essa Comissão pode exigir estudos mais aprofundados para fundamentar 

sua decisão e, no caso de impactos ambientais importantes, podem ser exigidas contrapartidas

do empreendedor.

Em um episódio de negociação entre a Prefeitura e a rede de hipermercados Carrefour ,

que planejava instalar uma grande unidade no bairro Passo D’Areia, o município obteve

contrapartidas em diversas áreas: no sistema viário (criação de uma nova avenida); na

 proteção ao pequeno agricultor (estabelecimento de uma cota dos produtos a serem vendidosna loja, beneficiando a produção agrícola local); no pequeno comércio local (aumento no

número de lojas no interior do empreendimento para os comerciantes locais); na reciclagem

  profissional (recursos para requalificação daqueles cujos negócios seriam afetados pelo

empreendimento e reserva de parte dos empregos na loja para pessoas acima de 30 anos); nos

equipamentos sociais (construção de uma creche); na reciclagem de resíduos (o hipermercado

responsabiliza-se pelo transporte dos materiais recicláveis para galpões de separação e do lixo

orgânico para uma usina de compostagem). No total, calcula-se que as negociações tenhamresultado em cerca de R$ 43 milhões de contrapartidas – revelando a capacidade dos grandes

empreendimentos de gerar recursos para ressarcir as cidades de seus impactos.

d) Rodoviária de Campo Grande-MS

A cidade conta com o Guia de Diretrizes Urbanísticas (GDU) que vai além do escopo

dos relatórios para licenciamento ambiental. O GDU é necessário para a aprovação de grandes

empreendimentos e é gerido pela PLANURB, o instituto municipal encarregado do planejamento urbano. A PLANURB determina, se necessário, diretrizes de reformulação do

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sistema viário e de infra-estrutura urbana do local do empreendimento, propondo obras de

adequação a serem pagas pelo proprietário.

Em casos polêmicos, geralmente relacionados a grandes investimentos públicos, a

PLANURB pode solicitar uma audiência pública para a aprovação do mesmo. O projeto de

implantação de uma nova rodoviária em Campo Grande, cujo custo de investimento

demonstrava ser muito oneroso para a Prefeitura, não foi aprovado em audiência pública. De

acordo com o GDU do projeto, o custo do investimento era muito alto, e – embora a

Prefeitura já tivesse concedido o uso da área para uma empresa concessionária que faria a

obra – o projeto foi vetado.

4.2 Cidades com EIV regulamentado

4.2.1 São Paulo

A cidade de São Paulo conta com a regulamentação deste instrumento desde 1994,

quando foi instituído o Decreto nº. 34.713, que dispõe sobre o Relatório de Impacto de

Vizinhança- RIVI. Verifica-se a objetividade da regulamentação:

Art. 1º- São considerados como de significativo impacto ambiental ou

de infra-estrutura urbana os projetos de iniciativa pública ou privada,referentes à implantação de obras de empreendimentos cujo uso e área de

construção compatível estejam enquadrados nos seguintes parâmetros:

I - industrial - igual ou superior a 20.000 m2 (vinte mil metros

quadrados);

II - institucional - igual ou superior a 40.000 m2 (quarenta mil metros

quadrados);

III - serviços / comércio - igual ou superior a 60.000 m2 (sessenta mil

metros quadrados)

IV - residencial - igual ou superior a 80.000 m2 (oitenta mil metros

quadrados)

(...)

Art. 3º O Relatório ele Impacto de Vizinhança (RIVI) deverá ser 

apresentado à Secretaria da Habitação e Desenvolvimento Urbano - SEHAB,

instruído com os seguintes componentes:

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1 - dados necessários à análise da adequação do empreendimento às

condições do local e do entorno: a) localização e acessos gerais; b)

atividades previstas; e) áreas, dimensões e volumetria; d) levantamento

 planialtimétrico do imóvel; e) mapeamento das redes de água pluvial, água,esgoto, luz e telefone no penetro do empreendimento; f) capacidade do

atendimento pelas concessionárias das redes de água pluvial, água, esgoto,

luz e telefone para a implantação do empreendimento; g) levantamento dos

usos e volumetria de todos os imóveis e construções existentes localizados

nas quadras limítrofes à quadra ou quadras onde o imóvel está localizado; h)

indicação da zonas de uso constantes da legislação de uso e ocupação do

solo das quadras limítrofes, à quadra ou quadras onde o imóvel está

localizado; i) indicação dos bens tombados pelo CONPRESP ou pelo

CONDEPHAAT, no raio de 300 (trezentos) metros, contados do perímetro

do imóvel ou dos imóveis onde o empreendimento está localizado.

II - dados necessários à análise das condições viárias da região: a)

entradas, saídas, geração de viagens e distribuição no sistema viário; b)

sistema viário e de transportes coletivos do entorno; e) demarcação de

melhoramentos públicos, em execução ou aprovados por lei, na vizinhança;

d) compatibilização do sistema viário com o empreendimento; e) certidão dediretrizes fornecida pela Secretaria Municipal de Transportes - SMT.

III - dados necessários à análise de condições ambientais específica do

local e de seu entorno: a) produção e nível de ruído; b) produção e volume

de partículas em suspensão e de fumaça; d) destino final do entulho da obra;

e) existência de recobrimento vegetal de grande parte no terreno.

4.2.2 Rio de Janeiro

Por sua vez, o município do Rio de Janeiro apresenta uma regulamentação muito rígida

do instrumento. Exige o Relatório de Impacto de Vizinhança para casos em que este não

caberia, mas, sim, instrumentos simples de planejamento urbano, como o Código de Obras ou

o zoneamento. E, ainda, traz a implicação dos órgão públicos pelo estudo, que serão

responsabilizados pela “veracidade das informações contidas nos respectivos pareceres”, o

que, naturalmente, provoca muitas críticas. Carece, portanto, de modernização e atualização

conforme o Estatuto da Cidade, a Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, aprovada em5 de abril de 1990, que dispõe em seu art. 445:

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47

Art. 445 - Qualquer projeto de edificação multifamiliar ou destinado

à empreendimentos industriais ou comerciais, de iniciativa privada ou

 pública, encaminhado aos órgãos públicos, para apreciação e aprovação, será

acompanhado de relatório de impacto de vizinhança, contendo, no mínimo,os seguintes aspectos de interferência da obra sobre:

I - o meio ambiente natural e construído;

II - a infra-estrutura urbana relativa à rede de água e esgoto, gás,

telefonia e energia elétrica;

III - o sistema viário;

IV - o nível de ruído, de qualidade do ar e qualidade visual;

V - as características socioculturais da comunidade.

Parágrafo único - Os órgãos públicos afetos a cada item que compõem o

relatório de impacto de vizinhança responsabilizar-se-ão pela veracidade das

informações contidas nos respectivos pareceres.

Em seu artigo imediatamente anterior, explana os casos nos quais realmente cabe a

aplicação de EIV:

Art. 444 - A autorização para implantação de empreendimentosimobiliários e industriais com a instalação de equipamentos urbanos e de

infra-estrutura modificadores do meio ambiente, por iniciativa do Poder 

Público ou da iniciativa privada, será precedida de realização de estudos e

avaliação de impacto ambiental e urbanístico.

§ 1º - A responsabilidade administrativa para a realização do estudo,

contratado após licitação, é do órgão a que compete a autorização, cabendo o

ônus do contrato a quem postular.

§ 2º - O relatório será submetido à apreciação técnica da

administração.

§ 3º - É garantido o direito de acesso ao relatório, em audiências

  públicas, e de sua contestação às entidades representativas da sociedade

civil.

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48

4.2.3 Porto Velho

Em 2001, a Lei Complementar nº 138 instituiu o Código Municipal de Meio Ambiente

que, dentre outros assuntos, trata do EIV:

Art. 60. A autorização ambiental fica condicionada a apresentação do

Relatório de Impacto de Vizinhança – RIVI, nos seguintes casos:

I – empreendimentos para fins residenciais, com área construída

computável maior ou igual a 40.000 m2 (quarenta mil metros quadrados);

II – empreendimentos, públicos ou privados, destinados a outro uso,

com área superior a 20.000 m2 (vinte mil metros quadrados);

III – empreendimentos classificados como “Pólo Gerador de Tráfego”

de acordo com o Código de Obras e Edificações ou de Posturas do

Município.

Parágrafo único. A critério da SEMA, o RIVI poderá ser exigido de

outros empreendimentos não constantes deste artigo, visto que toda

iniciativa, pública ou privada, que interfira significativamente com o meio

em que será inserida, deverá ser submetida à apreciação ambiental desse

órgão.

(...)

Art. 80. Impacto de vizinhança é a alteração significativa no entorno

imediato, causada por atividade ou empreendimento que represente

sobrecarga na capacidade da infra-estrutura urbana, na rede de serviços

 públicos e/ou altere a paisagem urbana.

§ 1º Os empreendimentos e atividades são identificados como

impactantes em função da natureza, do porte, da localização, da área

ocupada, dos níveis de adensamento e dos riscos deles decorrentes.

§ 2º Presumem-se geradores de impacto de vizinhança, entre outros,

os empreendimentos e atividades:

I – sujeitos a apresentação de EIA/RIMA e, portanto, com os impactos

de vizinhança já devidamente considerados;

II – que possam interferir no bom desempenho do sistema de

transporte, de trânsito e viário;

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49

III – que representem sobrecarga aos sistemas de drenagem, água,

energia elétrica, telecomunicações, esgoto e outros elementos de infra-

estrutura urbana.

Art. 81. Os Estudos de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto

Ambiental ou de Vizinhança serão realizados por equipe técnica

multidisciplinar habilitada, responsável legal e tecnicamente pelos resultados

apresentados.

Parágrafo único. A SEMA poderá, em qualquer fase de elaboração ou

apreciação do EIA/RIMA ou do RIVI, declarar a inidoneidade da equipe

multidisciplinar ou de técnico componente, recusando, se for o caso, os

levantamentos ou conclusões de sua autoria.

4.2.4 Natal-RN

A Lei Complementar nº 07, de 05 de agosto de 1994, que institui o Plano Diretor de

 Natal-RN, trata, em seus artigos 35 a 38, dos empreendimentos de impacto e estabelece o RIV

(Relatório de Impacto de Vizinhança) como um dos estudos pertinentes. Vale observar a

responsabilidade do empreendedor em realizar  obras ou adotar medidas no sentido de atenuar,

compensar ou neutralizar o impacto previsível.

Art. 35 – Empreendimentos de Impacto são aqueles, públicos ou privados,

que, quando implantados, venham a sobrecarregar a infra-estrutura urbana

ou, ainda, que tenham uma repercussão ambiental significativa, provocando

alterações nos padrões funcionais e urbanísticos da vizinhança ou ao espaço

natural circundante.

Art. 36 – São considerados Empreendimentos de Impacto:

I – os empreendimentos sujeitos à apresentação de RIMA – Relatório de

Impacto do Meio Ambiente, nos termos da legislação ambiental federal,

estadual ou municipal em vigor;

II – os empreendimentos sujeitos a licenciamento especial, nos termos

dos arts. 31 e 33 da Lei 4.100 de 19 de junho de 1992;

III – aqueles com capacidade de reunião de mais de 300 pessoas

simultaneamente;

IV – aqueles que ocupam mais de uma quadra ou quarteirão urbano;

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50

V – qualquer empreendimento, exceto o uso residencial, cuja área construída

ultrapasse 2º (dois por cento) do estoque de área edificável prevista para o

uso pretendido, constante da Lei, para o bairro onde está localizado.

§ 1º - Os empreendimentos de que trata este artigo deverão apresentar Relatório de Impacto de Vizinhança – RIV – para análise da concessão do

alvará da construção, nos termos deste artigo.

§ 2º - Os empreendimentos enquadrados nos incisos I a IV deste artigo

deverão apresentar projeto de tratamento local dos seus efluentes.

Art. 37 – O Relatório de Impacto de Vizinhança deverá, obrigatoriamente,

informar sobre:

I – a demanda de serviços de infra-estrutura urbana;

II – a sobrecarga na rede viária e de transportes;

III – os movimentos de terra e produção de entulho;

IV – a absorção de águas pluviais;

V – as alterações ambientais e os padrões funcionais e urbanísticos da

vizinhança.

Art. 38 – O IPLANAT, ao classificar um empreendimento como de

impacto, deverá elaborar parecer técnico para análise do empreendimento

  pelo CONPLAM, devendo indicar as exigências a serem feitas ao

empreendedor para que, às suas expensas, realize obras ou adote no sentido

de atenuar, compensar ou neutralizar o impacto previsível.

4.2.5 Manaus

É interessante que se observe no Plano Diretor de Manaus a sua minuciosidade. Por não

constar a metragem mínima balizadora, alguns itens podem ser questionados, entendendo-se

como atividades de impacto pouco significativo e, que, portanto, não caberia EIV, comocentros culturais e comerciais de reduzidas dimensões. Também questiona-se a imposição do

instrumento a equipamentos administrativos e de segurança pública, por terem sua

regulamentação por meio de outros instrumentos, que não o EIV, como o zoneamento e o

Código de Obras.

VI - ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA*

O Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança (EIV), nos termos da Lei

Federal nº 10.257/01, se aplica aos Projetos Especiais e às atividades a seguir relacionadas, por suas especificidades, mesmo quando sua implantação

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constar como permitida na UES ou no Corredor Urbano considerado, para

obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou

funcionamento.

Sujeitam-se ao EIV, as seguintes atividades:

•  atividades especiais

•  casas noturnas com área computável igual ou superior a 200m2

•  centro comercial e shopping center 

•  centro cultural

•  clube

•  comércio atacadista e depósitos com área computável igual ou

superior a 2.000m2

•  comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância

de produtos alimentícios, com área computável igual ou superior a 1.000 m2

•  comércio varejista e atividades de prestação de serviços com área

computável igual ou superior a 5.000m2

•  depósitos ou postos de revenda de gás

•  equipamentos administrativos

•  equipamentos de segurança pública

•  estabelecimentos de ensino de 1o, 2o e 3o graus

•  estação de radiodifusão

•  estação de telefonia

•  estação de televisão

•  estacionamento coberto ou descoberto para mais de 100 carros

•  funerária

•  garagem geral (lotação, ônibus, outros veículos similares)

•  hospital

•  hotel com área de terreno igual ou superior a 1.000 m2

•  indústria tipo 2, tipo 3, tipo 4 e tipo 5

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•   posto de abastecimento

•  templo e local de culto em geral

O EIV será executado atendendo as exigências do artigo 37 da Lei nº10.257/01, além de necessariamente analisar:

•  a compatibilização do estabelecimento ou empreendimento com

as diretrizes de uso e atividades indicadas para a UES ou Corredor Urbano

no qual será implantada.

•  a manutenção e valorização do Patrimônio Ambiental, natural ou

cultural na UES ou no Corredor Urbano no qual será implantado ou no seu

entorno.

•  a adequação à estrutura urbana, sobretudo quanto ao sistema

viário, fluxos, segurança, sossego e saúde dos habitantes e equipamentos

 públicos comunitários.

•  a adequação ao ambiente, em especial quanto à poluição.

•  a adequação à infra-estrutura urbana.

•  a adequação à paisagem natural ou construída.

Será dada publicidade aos documentos integrantes do EIV, que ficarão

disponíveis para consulta no órgão competente do Poder Público municipal,

 por qualquer interessado, nos termos da Lei nº 10.257/01.

A elaboração do EIV não substitui a elaboração e a aprovação do

Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EIA), requerido nos termos da

legislação ambiental.

* minuta do projeto de lei submetido à aprovação em 2001.

4.3 Exemplos de atuação do MPF

A atuação do Ministério Público Federal tem se pautado pela defesa do meio ambiente

urbano de qualidade, exigindo o cumprimento da legislação vigente, reivindicando a

implementação e regulamentação dos instrumentos definidos em Lei. Também intervém para

que instituições organizadas para estudo e defesa da cidade e suas relações sejam

efetivamente ouvidas e respeitadas pelo seu conhecimento técnico, tais como o Instituto dos

Arquitetos do Brasil-IAB, os Conselhos Regionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia-

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CREA's, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN e Faculdades de

Arquitetura e Urbanismo, dentre outros.

O MPF possui Câmara específica para assuntos atinentes a meio ambiente e patrimônio

cultural, em que os Membros contam com assessoria técnica para análise de estudos urbano-

ambientais, havendo, entre outros profissionais, arquitetos, engenheiros, geógrafos, biólogos e

antropólogos. A experiência da Câmara dá conta que são poucos os EIV analisados, refletindo

a pouca produção do estudo nos municípios brasileiros. É fato que muitas das vezes o

conteúdo do EIV está abrangido pelo EIA/RIMA, porém não são raras análises superficiais

das questões relativas a meio ambiente urbano.

A título de exemplo, cabe citar a atuação do MPF quanto ao empreendimentodenominado Sapiens Parque, na cidade de Florianópolis. Trata-se de um megaprojeto de

implantação de um centro tecnológico em um terreno de 450 hectares, na região norte da ilha

de Florianópolis, localizado na vizinhança imediata de área de urbanização consolidada, com

impactos importantes sobre a malha urbana e as relações sociais constituídas. Os

empreendedores focalizaram aspectos preponderantemente econômicos na decisão da

implantação do projeto, sem avaliar corretamente os impactos socioeconômicos decorrentes

do empreendimento, em especial, a expansão urbana acelerada na região e seu impacto na

infra-estrutura existente.

As audiências públicas convocadas para apresentação do EIA-RIMA respectivo

evidenciou grande mobilização e capacidade de articulação da população atingida, que

reivindicava, dentre outros, estudo mais aprofundado das questões urbanas, em especial da

revisão do Plano Diretor para a região. O Ministério Público foi ao encontro do anseio da

 população e técnicos do Instituto dos Arquitetos do Brasil-IAB, trazendo à mesa de discussão

as questões por eles abordadas. Da forma como foi apresentado, o EIA/RIMA foi consideradoinsuficiente pelo Ministério Público, decisão que motivou aplausos acalorados da audiência

 presente.

Em Fortaleza, em 2002, o Governo do Estado empenhou-se na implementação do

Centro Multifuncional de Feiras e Eventos do Ceará – CMFECE. Trata-se da implantação de

um grande complexo de centro de convenções, restaurantes, teatro e marina, localizado no

centro da cidade. A insuficiência de espaço disponível para empreendimentos de tal porte

motivou a proposta de um aterro de grandes dimensões na praia de Iracema. Além disso, aárea escolhida para a implantação do empreendimento situa-se próxima ao núcleo histórico de

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Fortaleza, destacando-se aí as primeiras construções do que é conhecido como o nascedouro

da cidade, cujo fato de não ter sido tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico

  Nacional não desmerece sua importância cultural. Entretanto, os empreendedores

desconsideraram sumariamente a relevância histórica do local, atraindo com seu projeto

impactos e fluxos incompatíveis com a preservação do local. Nada foi analisado quanto à

interferência na paisagem urbana, à alteração do microclima, obstaculização da ventilação,

luminosidade e incidência solar, fatores essenciais a uma qualidade urbana desejável.

Após reiteradas manifestações sem sucesso, o IAB-CE, o Sindicato dos Engenheiros do

Ceará, o Instituto dos Geólogos, puderam fazer-se ouvir por intermédio da atuação do

Ministério Público.

Outro exemplo de interesse, bastante recente, diz respeito à ACP movida pelo MPF

conjuntamente com o IPHAN, acerca de um empreendimento imobiliário na vizinhança

imediata do centro histórico de Tiradentes, em Minas Gerais. Trata-se de um parcelamento de

solo, de aproximadamente 30 hectares, para implantação de condomínio residencial, destinado

a clientela de alto poder aquisitivo. Além de apresentar estrita ligação com o núcleo histórico

tombado e ser de grande sensibilidade ambiental, a área está inserida entre núcleos urbanos

consolidados, de forma que se faz necessário maior estudo das relações infra-estruturais

urbanas, antes de se concluir pela sua viabilidade.

Apesar de ter recebido a aprovação da Prefeitura, o projeto não foi submetido ao

IPHAN nem aos órgãos ambientais competentes, tornando imprescindível a atuação do MPF

na questão, que determinou a elaboração de EIV para o empreendimento.

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CONCLUSÃO

A preocupação com questões ambientais é crescente no Brasil, e diuturnamente vê-se a

sociedade posicionar-se perante o Poder Público, exigindo deste postura ambientalmente

responsável, inclusive quanto à implementação de mecanismos coercitivos à degradação

ambiental. A importância da preservação e da recuperação do meio ambiente tem motivado a

elaboração de legislação específica sobre o assunto, bastante ampla, que denota grande

  preocupação com os impactos advindos de atividades potencialmente danosas ao meio

ambiente. A fim de avaliar corretamente os riscos embutidos no desenvolvimento dessas

atividades, instituíram-se os estudos de impacto ambiental, em distintas esferas eaplicabilidades.

Mais recentemente, refletindo a consciência de que o meio urbano é o ambiente com o

qual os seres humanos mais interagem, evidenciou-se que a qualidade de vida nas cidades está

diretamente associada ao controle das atividades nelas desenvolvidas. É possível reverter 

cenários desfavoráveis pela implementação de mecanismos de gestão urbana. Um destes

instrumentos é o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV). Trata-se de um instrumento

contemporâneo, que tem sua matriz no cumprimento da função social da propriedade, mas

cuja regulamentação depende de lei municipal específica.

Muito embora a elaboração de estudos de impacto ambiental seja uma prática bastante

recorrente, pouco se questionando sua aplicabilidade e finalidade, o EIV ainda é um grande

desconhecido, e muitas dúvidas pairam sobre sua elaboração. Não é incomum que estudantes

do Direito e planejadores urbanos não tenham familiaridade com este instrumento de

importância para a saúde do ambiente urbano e das relações sociais nele desenvolvidas. O

EIV carece da visibilidade de outros estudos ambientais, em especial o EIA/RIMA, até para

que fique evidente sua abrangência, delimitação e adequabilidade.

Ainda que a sensibilidade acerca de meio ambiente urbano seja crescente e que

instrumentos semelhantes de estudo e controle de impactos no meio urbano já tenham sido ou

mesmo venham sendo utilizados em alguns municípios brasileiros, e que, portanto, não se

constitua o escopo do EIV uma novidade, é expressivo o desconhecimento sobre funções

urbanas por parte dos administradores municipais, o que resulta na freqüente falta de

concatenação entre propostas de órgãos diversos para intervenções no espaço urbano.

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A regulamentação do EIV é não só necessária como também urgente. Muitos

municípios submetem-se à degradação de seu espaço ambiental urbano pela implantação de

empreendimentos inadequados, pelo simples fato de ainda não terem regulamentado o

instrumento.

Apesar de obrigatório para todos os municípios, a verdade é que o ranço do passado, ou

talvez o medo da novidade, faz com que a questão da regulamentação do EIV ainda seja

 postergada pelas brechas que há na própria Lei. Tem sido comum a prática de instituir o EIV

como um dos instrumentos de política urbana no Plano Diretor, explicitando que sua

regulamentação se dará posteriormente, mediante lei específica. E, com isto, o município adia

indefinidamente sua elaboração.

Alie-se a isto a acomodação em torno da não obrigatoriedade do Plano Diretor, cuja

articulação com o EIV é fundamental para a gestão urbano-ambiental, e tem-se cada vez mais

cidades caóticas, cuja ordenação territorial não condiz com os usos atuais e os interesses da

  população. Falta o planejamento estratégico, que engloba políticas urbanas de

desenvolvimento, agrega diferentes instrumentos de ordenação territorial e consagra a

  participação popular por meio da gestão democrática do município. Não é sem razão que a

Constituição Federal, em seu artigo 182, instituiu o Plano Diretor como instrumento básico da

  política de desenvolvimento e de expansão urbana. Constitui-se o Plano Diretor o cerne do

 planejamento das cidades modernas, deixando no passado as ações pouco efetivas da gestão

autoritária e anacrônica das municipalidades convencionais.

É fundamental que a população seja chamada ao processo de tomada de decisão.

Embora não estejam expressamente previstas no Estatuto da Cidade audiências públicas ou

outras formas de publicização da análise e aprovação do EIV, é recomendável que a

legislação municipal assim o faça. Tanto a participação popular quanto as conclusões doestudo são auxiliares no processo. Cabe ao administrador público avaliar os elementos

dispostos no EIV e as considerações feitas na audiência, que podem ser conflitantes ou

contraditórias, e acatá-las ou refutá-las, fundamentando sua decisão.

É, portanto, conveniente que o EIV, bem como outras ações de planejamento

regulamentadas pelo Plano Diretor sejam cada vez mais discutidos com a população, tornando

os instrumentos de gestão urbana acessíveis, facilitando sua implementação no casos cabíveis.

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Uma das grandes críticas às legislações ambientais diz respeito à morosidade do

 processo decisório. A introdução do EIV como instrumento de gestão urbana deve tornar o

  processo mais eficiente, e não burocratizá-lo ainda mais. Portanto, recomenda-se aos

municípios que se atentem às normas regulamentadoras, simplificando-as e otimizando as

etapas de aprovação.

Quanto à autoria do EIV, embora a legislação não determine sua realização por equipe

técnica multidisciplinar, é desejável que assim o seja, formada por estudiosos do espaço

urbano de áreas de conhecimento complementares, como a Arquitetura, o Urbanismo, a

Engenharia e a Geografia, dentre outras, pelas vantagens que a interação de conhecimentos

favorece, minimizando a análise fragmentada.

Recomenda-se aos municípios, exemplificativamente, que sejam sujeitos ao EIV

grandes empreendimentos geradores de fluxos importantes de pessoas e veículos, como

hipermercados, centros de compras e lazer, hospitais, grandes loteamentos urbanísticos, bem

como atividades desenvolvidas no meio urbano causadoras de poluição visual, sonora e que

causem possíveis emanações radioativas, como as torres e estações de telefonia celular.

Também devem ser considerados os empreendimentos e atividades propostos em área de

maior sensibilidade, ou próximos a estas, como os sítios históricos e locais de especial

interesse ambiental.

O EIV deve fazer a demonstração da compatibilidade do empreendimento com a

capacidade das redes de infra-estrutura urbana, sistema de transporte públicos, paisagem

urbana da vizinhança, atividades humanas vizinhas e recursos naturais remanescentes da

urbanização, principalmente solo, ar, água, silêncio, clima, vegetação e fauna.

Por fim, espera-se que o EIV promova a redescoberta do vínculo do cidadão com o

espaço urbano onde vive, mediante a discussão das funções urbanas, dos fatores degradadoresda cidade, das relações sociais e da manutenção ou mesmo retomada dos índices de qualidade

de vida, fazendo o indivíduo entender-se como parte integrante do ecossistema e, portanto,

responsável pela sustentabilidade do meio ambiente urbano.

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58

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 1 FRANCO, Maria de Assunção Ribeiro. Desenho Ambiental. São Paulo, Annablume, 1997, p. 99.2 Ibid, p. 91.

3 Holismo: s.m. 1 abordagem, no campo das ciências humanas e naturais, que prioriza o entendimento integraldos fenômenos, em oposição ao procedimento analítico em que seus componentes são tomados isoladamente 1.2(...) 1.3 (...). Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Objetiva: 2001, p.1544.

4 ALVES, Isabel Teresa Gama. Metodologia de Pesquisa, Parte I - Conceitos, CDS/UnB. pg. 8.

5 Lei 10.257/2001, art. 1º, parágrafo único.

6  Estatuto da Cidade: guia para implementação pelos municípios e cidadãos. Câmara dos Deputados/Instituto

Polis: Brasília, 2001, p. 9.

7 Urbanismo: o estudo sistematizado e interdisciplinar da cidade e da questão urbana, e que inclui o conjuntode medidas técnicas, administrativas, econômicas e sociais necessárias ao desenvolvimento racional e humanodelas. Dicionário Aurélio Eletrônico, versão 3.0, 1999.

8 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Meio Ambiente: propriedade e repartição constitucional de competências. Riode Janeiro: Esplanada, 2002, p. 140.

9 OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Comentários ao Estatuto da Cidade. São Paulo: RT, 2002, p. 11.

10 FREITAG, Barbara. O novo Estatuto da Cidade. Brasília, 2001.

11 MARICATO, Ermínia. O contexto do Estatuto da Cidade. In:  Brasil, Cidades: alternativas para a criseurbana. Disponibilizado no site: http://www.usp.br/fau/depprojeto/labhab/04textos/1estatcidade/ocontexto.htm,consultado em 16/04/05.

12 MARICATO, Ermínia.  Ibid.

13 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Estatuto da Cidade Comentado: Lei 10257/2001: Lei do Meio Ambiente

 Artificial . São Paulo, RT, 2002, p. 81.

14 MENEGASSI, Jacqueline; OSÒRIO, Letícia Marques. Do Estudo de Impacto de Vizinhança. In: MATTOS,Liana Portilho (org.). Estatuto da Cidade Comentado. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p. 234.

15 MENEGASSI, Jacqueline; OSÒRIO, Letícia Marques. Ibid, p. 234.

16    Plano Diretor Participativo: guia para a elaboração pelos municípios e cidadãos. Ministério dasCidades/CONFEA: Brasília, 2004, p. 17.

17 MENEGASSI, Jacqueline; OSÒRIO, Letícia Marques. Ibid, p. 234.

18 MARICATO, Ermínia. Ibid.

19 www.crea-rj.org.br/crea/divulgacao/ publicacoes/revistas/revista36/plano2.htm, site consultado em 04/02/05.

20 Resolução CONAMA Nº 001, de 23 de janeiro de 1986.

21 Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 1097.

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59

 22 MOREIRA, Antônio Cláudio M. L. Conceitos de ambiente e de impacto ambiental aplicáveis ao meioambiente urbano. Material didático da disciplina de pós-graduação AUP 5861 – Políticas públicas de proteçãodo meio ambiente urbano. São Paulo: 1999.

23 BRANCO, Samuel Murguel. O fenômeno Cubatão na visão do ecólogo. CETESB/ACETESB: São Paulo,1984.

24 Ibid, p. 1578.

25 MOREIRA, Antonio Cláudio M. L. Ibid.

26  Deficiências em Estudos de Impacto Ambiental: síntese de uma experiência. Brasília: 4º CCR/MPF: ESMPU,2004, p. 20.

27 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 231.

28 Ibid, p. 232.

29 http://www.popular.inf.br/noticia.asp?not_id=4077, consultado em 16/04/2005.

30 MENEGASSI, Jacqueline; OSÒRIO, Letícia Marques. Ibid, p. 241

31 Estatuto da Cidade: guia para implementação pelos municípios e cidadãos. Câmara dos Deputados/InstitutoPolis: Brasília, 2001, p. 200.

32 MENEGASSI, Jacqueline; OSÒRIO, Letícia Marques. Ibid, p. 242.

33 SILVA, Armando Cavaleiro & MALATO, João José. Geometria da Insolação de Edifícios. Lisboa: M.0.0.,1969.

34 FREITAS, José Carlos. O Estatuto da Cidade e o equilíbrio no espaço urbano. In: Temas de DireitoUrbanístico 3. Ministério Público do Estado de São Paulo/Imprensa Oficial: São Paulo, 2001, p. 445.

35 http://www.polis.org.br, consultado em 03/06/04.

36 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Competência Concorrente Limitada. O problema da conceituaçãodas normas gerais, in Revista de Informação Legislativa, Brasília, a.25, nº 100, out/dez 1998, p. 131.

37 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Meio ambiente: propriedade e repartição de competências. Rio de Janeiro:Esplanada, 2002, p. 127.

38 Ibid. p. 129.

39 Ibid, p. 129.

40 SILVA, José Afonso da. O município na Constituição de 1988. São Paulo: RT, 1990, p. 435.

41 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1998. São Paulo: Atlas, 1991, p.127.

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