estudo: o uso de medidas flexíveis para lidar com crises econômicas na alemanha e no brasil

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Confira o estudo preparado por José Pastore, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio, Werner Eichhorst e Paul Marx, ambos do Instituto de Estudos do Trabalho de Bonn. A flexibilização das relações do trabalho é um tema altamente controvertido. Os que são a favor defendem que tal processo é necessário para se promover os ajustes requeridos por uma economia volátil e cada vez mais diversificada como é a dos dias atuais. Os que são contra consideram a flexibilização como mero subterfúgio para reduzir os direitos e precarizar a vida dos trabalhadores. Este estudo focaliza o papel desempenhado por regras flexíveis no mercado de trabalho da Alemanha e do Brasil.

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  • Werner Eichhorst e Paul MarxInstituto de Estudos do Trabalho de Bonn

    Jos PastoreUniversidade de So Paulo

    alemanha e no brasilO Uso de medidas flexveis paralidar com crises econmicas na

  • 4O usO de medidas flexveis para lidar cOm crises ecOnmicas na alemanha e nO Brasil Werner Eichhorst e Paul MarxInstituto de Estudos do Trabalho de Bonn

    Jos PastoreUniversidade de So Paulo

    Bonn-So Paulo 1 de Novembro de 2011

    Para a realizao deste estudo, os autores agradecem o apoio do Bradesco, Confederao Nacional da Indstria, Mercedes Benz do Brasil, Fecomercio de So Paulo e Sindipeas (Sindicato Nacional da Indstria de Componentes para Veculos Automotores). As ideias expressas neste trabalho so de responsabilidade exclusiva dos autores. Este trabalho foi escrito originalmente em ingls. Esta uma verso livre.

  • 5RESUMO

    A flexibilizao das relaes do trabalho um tema altamente contro-vertido. Os que so a favor defendem que tal processo necessrio para se promover os ajustes requeridos por uma economia voltil e cada vez mais diversificada como a dos dias atuais. Os que so contra conside-ram a flexibilizao como mero subterfgio para reduzir os direitos e precarizar a vida dos trabalhadores.

    Este estudo focaliza o papel desempenhado por regras flexveis no mer-cado de trabalho da Alemanha e do Brasil.

    Alemanha e Brasil so pases bastante diferentes no campo das relaes de trabalho, alm dos enormes contrastes de educao, renda e bem-es-tar social. Na Alemanha quase tudo acertado por negociao coletiva. No Brasil quase tudo depende de lei.

    Apesar disso, os dois pases tm apresentado um resultado bastante sa-tisfatrio nos anos recentes, tanto em termos de gerao de empregos como de conteno do desemprego.

    O que explica resultados semelhantes em pases to diferentes? Para responder a essa pergunta, uma ateno especial foi dada ao desem-penho das duas economias durante a crise de 2008-09. Em ambas, a gerao de empregos foi retomada rapidamente e o desemprego ficou em torno de 7% enquanto outras naes do G20 amargaram taxas de desocupao de 9%, 10% e at mais, lembrando-se que a da Espanha ul-trapassou a casa dos 20%.

    Pela anlise realizada ficou evidente que, ao lado de estmulos econmi-cos (reduo de impostos, oferta de crdito, programas de investimento de emergncia e outros), o uso de medidas flexveis no campo trabalhis-ta desempenhou um papel estratgico para manter empregados de boa qualidade nas empresas que realizaram ajustes de jornadas, de salrios, de formas alternativas de contratao e outras.

    Na Alemanha o uso de banco de horas, flexibilizao de jornada e salrio, tempo parcial, prazo determinado, trabalho temporrio e outras formas de ajuste fazem parte da rotina das negociaes entre empregados e empregadores. No Brasil, as resistncias ainda so grandes e decorrem, em grande parte, da ideia de precarizao e do receio de que as decises negociadas sejam posteriormente anuladas pela Justia do Trabalho, o que no ocorre na Alemanha.

    Quatro estudos de caso cobrem empresas que usaram com diferente intensidade medidas flexveis para enfrentar os problemas da crise de 2008-09. As que mais as usaram protegeram melhor os empregos, a exemplo do que ocorreu na Alemanha. Isso mostra que regras flexveis podem ajudar os trabalhadores.

  • 6ndice

  • 71 INTrOduO 12 2 O cENrIO sOcIOEcONmIcO 16 3 ElEmENTOs dE flExIBIlIdAdE NO mErcAdO dE TrABAlhO 22

    3.1 Tipos de flexibilidade no mercado de trabalho 233.2 flexibilidade no ncelo e na margem 29

    4 cArAcTErsTIcAs INsTITucIONAIs 34

    4.1 salrios e relaes do trabalho na Alemanha 354.2 salrios e relaes do trabalho no Brasil 434.3 Protees do emprego e trabalho flexvel 51 4.4 custos trabalhistas 694.5 seguro-desemprego e renda mnima 724.6.Polticas ativas de mercado de trabalho 774.7 formao profissional 78

    5 duAlIsmO NO mErcAdO dE TrABAlhO 865.1 Alemanha: ncleo e periferia 875.2 Brasil: formal e informal 93

    6 lIdANdO cOm A crIsE: O usO dE mEcANIsmOs flExvEIs 100

    6.1 Alemanha 1016.2 Brasil 106

    7. AvAlIAO cOmPArATIvA 122 8. ImPlIcAEs PArA POlTIcAs PBlIcAs 130 rEfErNcIAs 135

  • 8Lista de Tabelas

    Tabela 1 18Indicadores socioeconmicos (2005-10)

    Tabela 2 31flexibilidade na margem dos quadros de pessoal

    Tabela 3 42Exemplos de pisos na Alemanha (por hora)

    Tabela 4 50relaes do trabalho e negociao coletiva Tabela 5 56Indicadores de proteo do emprego, segundo a OcdE, 2008 Tabela 6 58Brasil: custos demissionais. hiptese: salrio de r$ 1.000 por ms (cerca de 435) e empregado com 3 anos na mesma empresa

    Tabela 7 69Alemanha: custos de contratao na indstria (% de salrios brutos), 2010

    Tabela 8 70Brasil: custo de contratao na indstria empregados horistas

    Tabela 9 74Tipos de contrato, proteo contra o desemprego, proteo contra demisso e cobertura do seguro-desemprego na Alemanha

    Tabela 10 81Indicadores comparativos de educao Tabela 11 101 componentes da reao do mercado de trabalho na Alemanha 108Tabela 12 componentes da reao do mercado de trabalho no Brasil

  • 9Lista de Figuras

    Figura 1 52Nmero de casos remetidos Justia do Trabalho (total e com relao a demisses) e acordos acertados compartilhados na Alemanha, 1999- 2008

    Figura 2 53cobertura por proteo contra dispensa na Alemanha em 2008 (sem levar em conta o perodo probatrio)

    Figura 3 80Alemes em idade produtiva com base nas graduaes mais altas (IscEd-97), 2008

    Figura 4 88Estrutura de idade da populao em idade produtiva na Alemanha, 1995-2009

    Figura 5 89Trabalho atpico e crescimento dos empregos por ocupao, 1995-2009

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    INTRODUO

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    O objetivo deste trabalho analisar as bases institucionais dos sistemas de relaes de trabalho da Alemanha e do Brasil e o uso de mecanismos flexveis de contratao de trabalho e seu impacto no desemprego, no emprego fixo e atpico e na informalidade dos dois pases. uma ateno especial ser dada ao papel destes mecanismos durante a crise financeira de 2008/2009.

    As estruturas econmicas e as relaes do trabalho so muito diferentes nos dois pases. A Alemanha tem a quinta maior economia do mundo, com base na exportao de produtos de alta tecnologia (mquinas, equipamentos, ve-culos, produtos qumicos, etc.) e possui quadros de traba-lhadores com alta qualificao. O Brasil tem a oitava maior economia do mundo, caracterizada pelo seu potencial de exportao de produtos bsicos (minerais, soja, algodo, acar, etc.)1 e possui um grande nmero de trabalhadores pouco qualificados. A diferena no padro de vida entre eles enorme. Os dados de 2010 indicam que a renda per capita alem, medida em poder de compra, equivale a r$ 67.000 ( 29.200) anuais, enquanto a brasileira de r$ 18.000 ( 7.842). A desigualdade social muito mais acen-tuada no Brasil do que na Alemanha.

    Porm, em comparao com outros pases do G20, o desem-penho da Alemanha e do Brasil tem sido bastante razovel nos ltimos anos em particular durante e depois da crise econmica mundial de 2008/2009, quando a taxa de de-semprego dos dois pases ficou em torno de 7% e 8%. Naque-le perodo, houve um crescimento no nmero de empregos, enquanto que, em alguns pases europeus e at nos Estados unidos, a criao de empregos diminuiu e a taxa de desem-prego ultrapassou 9%. Na Espanha, chegou a 20%.

    Embora este trabalho reconhea o papel relativo dos estmu-los econmicos dos governos nos tempos de crise, uma aten-o especial dada anlise de mecanismos flexveis no cam-po do trabalho. Nos dois pases h mecanismos desse tipo. A diferena est na intensidade e forma de uso. Na Alemanha a flexibilidade de remunerao e de jornada desempenha um papel preponderante no ajuste das dificuldades nos tempos de crise. No Brasil, tais mecanismos tm o mesmo papel, mas so usados em menor escala e com mais cautela.

    1Em escala menor, o Brasil tambm exporta mqui-nas, veculos, avies e ou-tros produtos industriais.

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    socioeconmicoO cenrio

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    A demografia em ambos os pases est mudando, mas de maneiras diferentes. A Alemanha tem 81 milhes de pessoas, enquanto o Brasil tem 195 milhes. A populao brasileira a quinta maior do mundo, porm o crescimento populacional diminuiu de 1,8% ao ano em 1990 para 1% em 2008. Em 2009, foi de 0,9% (PNAd/IBGE)3. A populao brasileira cresceu cer-ca de 25% nos ltimos vinte anos, sendo ainda relativamente de maioria jovem. Na Alemanha, a situao outra. O Pas tem a dcima quinta maior populao do mundo, que predomi-nantemente idosa. A mdia de idade de 44,2 anos. Apenas 30% da populao tm menos de 30 anos, enquanto um tero tem 55 anos ou mais. desde o comeo da dcada de 90, a po-pulao tem se mantido constante, mas vai diminuir bastan-te no futuro, j que o crescimento atual de -2,2% ao ano.

    mas, no Brasil tambm h importantes mudanas. Apesar de ter uma populao de maioria jovem, o pas est enve-lhecendo rapidamente. Em 1992, os idosos (60 anos ou mais) somavam apenas 7,9%. Em 2009, esta proporo pulou para 11,3%. durante o perodo, quase dobrou e sero 28% em 2020 e 30% em 2050 (Banco mundial, 2011).

    Quanto educao, os pases so bem diferentes. de acordo com o ndice de desenvolvimento humano, a mdia de anos de estudo da populao adulta no Brasil de apenas 7,2, en-quanto na Alemanha de 12,2 havendo, alm disso, uma enorme diferena na qualidade da educao.

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    crescimento real do PIB (%) - mdia 2005-08

    PIB per capita ( ) 2010

    Taxa de emprego (%) 2009

    Taxa de desemprego (%) 2009

    crescimento da populao 2010

    Exportaes (% de PIB) 2009

    Empregos na agricultura (%) 2099

    Empregos na indstria (%) 2009

    Empregos nos servios (%) 2009

    1,4

    29.200

    70

    7,1

    -0,3

    41

    1,7

    28,7

    69,5

    5,8

    7.842

    68

    7,2

    0,9

    11

    17

    22,1

    60,7

    INDICADORES SOCIOECONMICos (2005-10)

    INDICADORES ALEMANHA BRASIL

    Fonte: OCDE FMI Banco Mundial

    tabela 1

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    mas, o Brasil vem apresentando uma expressiva evoluo nesta rea. A parcela da populao que nunca frequentou a escola caiu de 20% em 1992 para menos de 7,5% em 2009; j o nmero de trabalhadores com nvel superior cresceu de 1,3% para 10,2%. um aumento significativo tambm foi ob-servado no nmero de pessoas com nvel mdio (11 anos de estudos), de 4,8% para 27%. Os brasileiros esto passando mais tempo nas escolas, o que contribui para a desacelera-o do crescimento da populao economicamente ativa. No mercado de trabalho tem havido muitas mudanas, dentre elas uma formalizao expressiva nos ltimos tempos. Por ora, basta destacar o continuo avano dos empregos formais. Nesse campo, h tambm continuidades. Apesar do referido avano, a taxa de informalidade ainda alta cerca de 45% da mo-de-obra (Jacob, 2010)2.

    2Na Amrica Latina, alguns pases tm taxa de informalidade muito mais alta do que a brasileira, como no Paraguai (84%), Guatemala (77%) e Peru (70%). Em outros pases, o problema afeta uma par-cela menor da populao, como no Chile (35%). Com 45%, o Brasil est na mdia.

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    FLEXIBILIDADEELEMENTOS DE

    NO MERCADO DE TRABALHO

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    A flexibilizao das relaes do trabalho um dos assuntos mais controversos. com frequncia, diz-se que a integrao de economias nacionais no mercado mundial as torna mais vulnerveis a mudanas estruturais, o que as leva a aprimo-rar sua capacidade de adaptao. A abertura das economias exige mais flexibilidade da fora de trabalho em termos ocu-pacionais e salariais. As empresas, ao se deparar com uma demanda voltil, sofrem presso para fazer ajustes de em-prego e de remunerao. Outros entendem os referidos ajus-tes como movimentos que, no fundo, tentam passar para os empregados o custo da adaptao. Os trabalhadores seriam, assim, os eternos perdedores e, por isso, condenam todo e qualquer tipo de flexibilidade no campo trabalhista. inegvel, porm, que a globalizao aumentou a presso para a criao de polticas econmicas menos rgidas, o que de fato ocorre nas vrias correes que so realizadas diaria-mente no mercado de trabalho.

    inegvel tambm que as comparaes internacionais tra-zem respostas controversas. O assunto dos mais polmicos. mas, h tipos e tipos de flexibilizao, o que ser tratado na seo que segue. diferentes tipos de flexibilidade podem dar resultados equivalentes. Antecipando as concluses, porm, h que se destacar que os pases que vm apresentando maior sucesso econmico valorizam e utilizam sistemas de adaptao no mercado de trabalho.

    Tipos de flexibilidade no mercado de trabalho

    A tipologia sobre flexibilidade vasta. O trabalho clssico o de Atkinson (1984), que aponta dois tipos bsicos. A flexibi-lidade interna refere-se s estratgias utilizadas dentro da empresa para realizar as adaptaes como, por exemplo, o ajuste entre remunerao e jornada de trabalho. A flexibili-

    3.1

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    dade externa aplicada fora da empresa, no mercado de tra-balho, como o caso de contratao de trabalho temporrio ou por prazo determinado.

    Os tipos bsicos podem ser desdobrados em cinco subtipos de flexibilidade, a saber:

    (1) Flexibilidade numrica externa refere-se possibilidade de adaptar o nmero de empregados s exigncias econ-micas por meio de demisses e contrataes (permanentes ou temporrias). Isso depende, claro, do rigor da legislao no campo da proteo ao trabalho ou a sua abertura para contratos de prazo determinado ou em tempo parcial assim como depende da disponibilidade quantitativa da mo-de--obra. Influencia nesse quadro tambm a estrutura de encar-gos sociais. despesas de contratao elevadas podem levar a armadilhas que geram incentivos inatividade, desemprego ou rebaixamento dos salrios.

    (2) Flexibilidade numrica interna - a que decorre de ajus-tes na jornada de trabalho com acrscimo de horas extras ou o uso do banco de horas. Isso no implica em aumentar ou reduzir o quadro de pessoal, mas sim a uma diferente utili-zao da mo-de-obra.

    (3) Flexibilidade funcional externa - a que requer trabalha-dores especializados para adaptar mudanas estruturais por meio de mobilidade entre cargos e ocupaes. Isto depende do nvel de educao geral (para garantir uma aprendiza-gem contnua) e de polticas ativas no mercado de trabalho, particularmente de treinamento e de colocao profissional.

    (4) Flexibilidade funcional interna - a habilidade de reagir mudana de demanda com uma organizao flexvel na linha de produo. Para isso, so necessrios empregados

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    formados e habilitados a desempenhar novas e diversas tarefas. O investimento em profissionais especficos com qualificao continuada (interna) contribui para este tipo de flexibilidade.

    (5) Flexibilidade salarial - ocorre quando o salrio ajustado ou reajustado em funo das condies macroeconmicas e conjunturais. Tal ajuste dificultado quando os salrios so legalmente estabelecidos ou determinados por contratos co-letivos inflexveis.

    Esta tipologia proporciona uma estrutura analtica que per-mite a identificao de modelos diferentes de flexibilidade no mercado de trabalho. Esses tipos de flexibilidade podem apoiar ou substituir uns aos outros e pode haver um mix de todos esses tipos.

    O fenmeno europeu de desemprego em larga escala e que persistiu durante muitos anos do ps-guerra mudou o foco da anlise comparativa do mercado de trabalho. A flexibili-dade e a rigidez institucional passaram a ser cada vez mais consideradas como fatores explicativos do nvel de emprego (Blanchard, 2006). A partir da dcada de 90, as instituies do trabalho passaram a ocupar o centro das explicaes da dinmica do mercado de trabalho.

    um grande nmero de estudos tericos sugere uma rela-o causal entre as instituies e o desempenho do mer-cado (Nickell, 1997, Nickell et al., 2005, Bassanini e duval, 2006). sabe-se que instituies adversas levam a um desvio persistente do equilbrio do mercado de trabalho, distor-cendo preos e faixas salariais. Neste campo, quatro classes de aes so apontadas como criadoras ou agravantes do desemprego: acordos salariais rgidos, benefcios elevados aos desempregados, impostos e proteo exagerados na

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    contratao de empregados. Polticas ativas do mercado de trabalho formam o quinto grupo de aes com influncia significativa, mas no como adversas e sim como apoiado-ras na gerao de empregos.

    Para entender plenamente os padres de flexibilidade no mer-cado de trabalho, a anlise deve ser estendida a outros fatores institucionais. O mais importante de todos a educao (in-cluindo educao infantil, ensino vocacional e aprendizagem ao longo da vida). Outro ponto diz respeito possibilidade real de uso da flexibilidade interna. Em muitos pases, modelos de jornadas de trabalho flexveis compensam as prticas rgidas de contratao e demisso. finalmente, os aspectos organiza-cionais tambm contribuem para a flexibilidade. Trabalhado-res versteis respondem s mudanas das condies externas com base na flexibilidade interna sem que seja necessrio usar a flexibilidade externa.

    de forma geral, podem-se considerar oito tipos de mecanismos institucionais internos e externos no mercado de trabalho:

    (1) Ajuste salarial. O tipo clssico diz respeito aos acordos que tm influncia direta na flexibilidade salarial (sem rigidez nominal ou real) e a possibilidade de variaes salariais. Nis-so influenciam o nvel de sindicalizao, o status e o respei-to aos contratos coletivos, a existncia de salrios mnimos e o grau de centralizao e/ou coordenao das negociaes coletivas. O ajuste salarial tende a ser mais eficiente em: a) estruturas de negociao descentralizadas, ou em b) formas centralizadas ou coordenadas com ajustes moderados.3 (2) Proteo do emprego. A existncia de sistemas de pro-teo do emprego e restries contratao de empregos temporrios podem influenciar os processos de adaptao na medida em que aumentam os custos de contratao e

    3Em escala menor, o Brasil tambm exporta mquinas, veculos, avies e outros produtos industriais.

  • 27

    demisso. Enquanto tais sistemas estabilizam os empregos e criam incentivos para treinamento contnuo, eles dificul-tam os ajustes s mudanas, pelo fato de reduzirem a mobi-lidade da mo-de-obra no mercado de trabalho. A proteo dos empregos por prazo indeterminado e em tempo inte-gral tende a elevar a presso salarial dentro do mercado de trabalho, assim como reduz as oportunidades de emprego para os novos trabalhadores, agravando, deste modo, a seg-mentao no mercado de trabalho.

    (3) Proteo aos desempregados. O seguro-desemprego um tipo de poltica passiva no mercado de trabalho, que, em muitos casos, somada assistncia social, aposentadoria precoce ou ao apoio invalidez. Por sua vez, os benefcios do seguro-desemprego podem funcionar como os recursos necessrios para a qualificao e requalificao dos desem-pregados. h que se considerar, porm, que tais benefcios podem desestimular a procura por emprego.

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    (4) Encargos sociais. As contribuies no salariais podem redu-zir a demanda de empregados. O efeito final depende das des-pesas que so pagas pelos empregados e pelos empregadores. Efeitos negativos so mais provveis nos casos de empregos de baixa remunerao e quando os custos no salariais no so pagos pelos trabalhadores, mas sim pelos empregadores.

    (5) Polticas ativas no mercado de trabalho. Estas polticas podem estimular o emprego por meio de apoios recoloca-o e aumento de produtividade induzidos por programas de treinamentos ou compensao dos benefcios por meio de subsdios. Ao aumentar o capital humano dos desempre-gados e estimular a procura por emprego, a competio no mercado de trabalho se eleva.

    (6) Educao e treinamento afetam tanto a demanda quan-to a oferta de trabalho, pois trabalhadores especializados so mais atraentes aos empregadores. O investimento na capacitao profissional aumenta o custo de oportunidades de inatividade e estimula a procura de emprego. Ademais, a educao produz benefcios de longo prazo, uma vez que fa-

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    cilita a adaptao e a empregabilidade durante toda a vida. Este efeito acentua-se com a educao continuada.

    (7) Acordos da jornada de trabalho so o equivalente funcio-nal flexibilidade numrica externa. Os modelos de jorna-das atpicas, como hora extra, meio perodo, horrio flexvel e banco de horas, permitem o ajuste dos picos e quedas de trabalho sem contrataes e demisses.

    (8) Investimento em capital humano em empresas especficas se refere criao e manuteno de habilidades polivalentes de trabalhadores formais e informais que sejam capazes de rea-gir s mudanas que o mercado exige. A rotao em diferentes departamentos, tarefas ou ramo de atividade sem necessidade de treinamento extensivo pode suplementar a flexibilidade do banco de horas como meio de adaptao interna.

    Flexibilidades no ncleo e na margem

    Os diferentes tipos de flexibilidade no mercado de trabalho so usados em vrios graus por empregadores e trabalha-dores de acordo com o setor, tamanho da empresa, especia-lizao necessria e poder de negociao. de maneira geral, pode-se observar uma diviso no uso das flexibilidades in-terna e externa entre grupos de trabalhadores que esto no centro do quadro de pessoal das empresas (ncleo) e os que esto na margem dessas empresas (periferia). Esses grupos tendem a trabalhar sob diferentes tipos de contratos.

    Os contratos por prazo indeterminado geralmente envolvem empregados mais especializados e mais estratgicos. Esses profissionais tm mais proteo no trabalho e desfrutam de benefcios de contratos coletivos mais completos. Nesse ni-cho, pratica-se mais a flexibilidade interna do que a externa.

    3.2

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    Os grupos de empregados que trabalham na margem ou na periferia das empresas dispem de condies menos seguras e, com mais frequncia, so atingidos pela flexibilidade exter-na. O objetivo bsico do uso deste tipo de flexibilidade o de conter custos fixos. o que ocorre quando se contrata trabalho temporrio ou por prazo determinado ou em tempo parcial. Os salrios e os benefcios so mais baixos e a proteo menor.

  • 31

    reduo dos contratos por prazo

    indeterminado

    reduo dos empregos em perodo integral

    reduo de vnculos

    empregatcios

    disperso salarial

    reduo do cus-to do trabalho

    por ao governamental

    Empregos informais

    custos darotatividade

    custos nosalariais

    custos salariais, no salariais e de rotatividade

    custos salariais

    custos salariais e no salariais

    custos salariais e no salariais

    contratos de trabalho

    temporrio, prazo determinado

    Tempo parcial, em especial, na margem

    Trabalho autnomo

    (sem empregados)

    Todos

    Todos e progra-mas especiais de contratao

    Todos

    Proteo doemprego

    cobertura da previdncia

    social

    Proteo, salrios

    e previdncia social

    salrios

    mobilidade limitada

    Informalidade, excluso da

    proteo social

    FLEXIBILIDADE NA MARGEM DOS QUADROS DE PESSOAL

    Caminhos para reduo de custos

    trabalhistas

    tipoS de custos afetados

    tipoS de EMPREGOS

    ASPECTOAFETADO

    Fonte: OCDE FMI Banco Mundial

    tabela 2

  • 32

  • 33

    4

  • 34

    INSTITUCIONAISCaractersticas

  • 35

    Salrios e relaes do trabalho na Alemanha

    O entendimento do atual sistema de relaes do trabalho alemo s pode ser alcanado mediante uma anlise de suas razes histricas e das mudanas ocorridas nas ltimas duas ou trs dcadas.

    Aps a II Guerra mundial, a Alemanha criou um sistema de dupla representao dos interesses dos trabalhadores. Eles passaram a ter voz no topo da administrao das empresas co-gesto e na base das linhas de produo os conselhos de empregados (workers councils).

    A co-gesto foi estabelecida por lei em 1951 nos setores de car-vo, ao e minerao. Em 1952, tornou-se obrigatria nos esta-belecimentos com mais de 500 empregados e em 1976, para empresas com mais de 2 mil empregados. No primeiro caso, afetou cerca de 1.500 empresas e no segundo, 700 empresas.

    A co-gesto tem importncia relativamente superficial no gerenciamento geral das empresas. uma atuao mais forte se d nas linhas de produo. Ali, os conselhos de emprega-dos opinam sobre vrios assuntos trabalhistas (ver detalhes a seguir). A obrigatoriedade dos conselhos foi estabelecida pela mesma lei de 1952. mas a sua formao voluntria e depende da iniciativa dos trabalhadores. Nos dias de hoje, os conselhos existem em cerca de 10% das empresas, especial-mente nas mdias e grandes.

    Apesar da reunificao do pas em 1990, persistem diferen-as no campo trabalhista. No lado ocidental, 45% dos empre-gados do setor privado so representados pelos conselhos de empregados. No (ento) lado oriental so 38%.

    4.1

  • 36

    Embora com informaes e direitos limitados, os conselhos de empregados atuam bastante no campo dos recursos hu-manos, opinando sobre os processos de reorganizao inter-na, contratao e demisso de empregados, uso de formas atpicas de emprego, terceirizao e acordos especiais de jornada de trabalho.

    A prpria legislao, porm, exige uma cooperao constru-tiva entre os conselhos, os empregados e a administrao das empresas. Os conselhos tm agido de forma pragm-tica e buscando sempre a estabilizao dos empregos, su-avizando os efeitos das reestruturaes por que passam as empresas atuais.

    Os conselhos de empregados esto proibidos de iniciar gre-ves ou boicotes e nem podem negociar as clusulas que so acertadas nos contratos coletivos. A lei da Negociao cole-tiva de 1949 estabeleceu que a negociao desses contratos deve ser feita pelos sindicatos laborais e associaes empre-sariais em nvel nacional e setorial, e, em casos excepcionais, em nvel regional.

    O que negociado no sofre nenhuma interferncia do go-verno ou da Justia do Trabalho.

    Os contratos coletivos regulam apenas as condies de trabalho dos empregados e empregadores cobertos pela negociao coletiva. Nos casos de impasse, no se usa a ar-bitragem, mas a maioria dos contratos coletivos estabelece mecanismos de resoluo de disputas, se necessrio, com a ajuda de um mediador.

    As greves so legais apenas quando os mecanismos de reso-luo de disputas falham e quando a maior parte dos mem-bros do sindicato vota a favor das greves. Os empregadores

  • 37

    podem responder s greves fazendo o lock-out. Em compa-rao com outros paises da Europa, as greves tm sido raras. A Alemanha possui um sistema abrangente e eficiente de sindicatos em nveis setoriais e regionais, assim como asso-ciaes nacionais de empresrios bem organizadas. Em con-traste com vrios outros pases europeus, a maior parte dos sindicatos alemes so politicamente unificados e aderem a uma entidade sindical dominante. O sindicato mais podero-so engloba o setor metalrgico, a produo de veculos, a in-dstria qumica e o setor pblico. Estes setores estabelecem rodadas regulares (em geral anuais) de negociao. mas, o dilogo social tripartite em nvel nacional raro. Os assuntos so normalmente resolvidos bilateralmente.

    O sistema de relaes do trabalho acima descrito tem sido visto como pilar de sustentao do sucesso econmico ale-mo no ps-guerra. foi ele que conseguiu garantir uma dis-tribuio razovel dos ganhos com poucos conflitos sociais. A situao ficou mais litigiosa nas crises do petrleo nas d-cadas de 70 e 80. Os conflitos aumentaram e geraram muitas crticas ao sistema de co-gesto e de negociao coletiva. At hoje, alguns observadores consideram esses sistemas muito rgidos para se fazerem os ajustes demandados por uma com-petio global mais intensa. Apesar disso, o sistema de rela-es do trabalho da Alemanha prossegue, embora com muitas mudanas. Nas ltimas trs dcadas, a cobertura de contratos coletivos diminuiu de forma significativa, em especial aps a reunificao do pas. Por exemplo, em 1996, os contratos cole-tivos setoriais cobriam 69% dos trabalhadores na Alemanha Ocidental e 56% na Alemanha Oriental. hoje, essas propores caram para 56% e 38%, respectivamente. As condies de tra-balho de cerca de 9% dos trabalhadores do lado ocidental e 13% do lado oriental so regidas por contratos em nvel empresa-rial. Apenas 19% dos empregados no lado ocidental e 24% no oriente trabalham em empresas que tm cobertura de con-

  • 38

    tratos coletivos. cerca de 36% dos empregados da Alemanha Ocidental e 49% da Alemanha Oriental trabalham sem o apoio de tais contratos.

    mas, as negociaes continuam a ser a opo mais segura em empresas industriais de grande porte, em especial nos setores metalrgico e qumico, assim como nas reas de energia, construo, seguros, os bancos e o funcionalismo.

    As negociaes descentralizadas vm aumentando e decor-rem do declnio da sindicalizao, de 30% em meados da dcada de 90 para 19% em 2008. A diminuio do nmero de filiados desencadeou uma srie de fuses, resultando em sindicatos conglomerados que abrangem mais de um setor, enquanto sindicatos independentes, que representam gru-pos poderosos de trabalhadores, que representam grupos poderosos de trabalhadores cresceram e se estabilizaram. Nas ltimas duas dcadas, os empregadores continuaram a se filiar s associaes patronais.

    como consequncia, a Alemanha de hoje apresenta um qua-dro mais flexvel no campo trabalhista, com uma menor re-

  • 39

    presentao efetiva dos trabalhadores. Empresas menores, recm-fundadas e muitas do setor de prestao de servios no fazem parte do sistema alemo de relaes do trabalho, ou seja, no so cobertas por negociao coletiva, conselhos de empregados ou co-gesto.

    O modelo clssico de negociao coletiva e co-gesto, porm, continua presente nas indstrias de mdio e grande porte. Para esse segmento que, alis, de grande importncia para a economia do pas a participao dos conselhos no nvel de produo, combinada com a negociao coletiva e com a co-gesto, pode ser considerada como o esteio da har-monia social e do entendimento construtivo entre emprega-dos e seus superiores nessas empresas.

    desde meados da dcada de 90, as negociaes no nvel de empresa expandiram-se muito. Isso levou os conselhos de empregados e os empregadores a acertarem muitas con-cesses, modulando os contratos coletivos setoriais. A meta sempre foi a de manter os empregos. Para tanto, os conselhos exploram e at esticam as clusulas abertas que constam dos contratos coletivos. Tais clusulas permitem desvios do que foi negociado setorialmente tanto no campo da remune-rao quanto no da jornada de trabalho, principalmente em situaes complicadas. Nesse sentido, os contratos coletivos tornaram-se mais flexveis para permitir um maior grau de liberdade no nvel empresarial. Isso tem ajudado muito. No nvel corporativo, esse desenvolvimento tem contribudo para a criao de novos modelos de jornada de trabalho, incluindo bancos de horas e maior flexibilidade de remunerao em tro-ca da manuteno do emprego, junto com aumentos salariais modestos. Por sua vez, os contratos coletivos tm induzido o crescimento dos empregos e a elevao moderada da renda. A maior participao de empregados especializados tem contri-budo para a emergncia de contratos por prazo determinado

  • 40

    ou trabalho temporrio, em particular para os trabalhadores da margem do mercado de trabalho.

    Este duplo padro de ajustes ficou transparente na crise econmica que afetou drasticamente as exportaes em 2008-09. Os mecanismos flexveis ajudaram os trabalha-dores do ncleo a ficar seguros pelo uso de mecanismos de ajuste interno, como ajuste de salrio e jornada de trabalho. Estima-se que o uso da flexibilidade salvou cerca de 350 mil empregos regulares. Para evitar maiores estragos, as empre-sas deixaram de renovar contratos por prazo determinado ou de contratar trabalhadores temporrios. Em alguns casos, dispensaram tais trabalhadores. Estima-se que isso tenha atingido cerca de 300 mil deles que, no entanto, foram re-contratados na primeira fase da recuperao da economia.

    mas, nem tudo so rosas no sistema alemo. O declnio das ne-gociaes coletivas centralizadas tem levado o sistema a uma maior diversidade em termos de salrio e demais condies de trabalho. Os conselhos de empregados tm ajudado a estabilizar apenas os empregos do ncleo da fora de trabalho. Isso tudo vem gerando uma sobrecarga para os trabalhadores da mar-gem. O dualismo se acentua, o que tem gerado novas formas de tenso tanto nas empresas como no mercado de trabalho.

    E mais. Nos ltimos anos, tm crescido as negociaes indivi-duais de salrios e condies de trabalho, algumas para baixo, outras para cima quando comparadas com os contratos coleti-vos. Por exemplo, os profissionais especializados tm negocia-do acima. Para eles, os contratos coletivos setoriais so cada vez menos relevantes. multiplicam-se os sindicatos independen-tes (mdicos de hospitais, pilotos, maquinistas e outros), de-vido ao enfraquecimento dos sindicatos conglomerados que representam os grandes setores. Os independentes esto tendo xito na organizao de eleies pequenas, porm poderosas.

  • 41

    Outra mudana importante diz respeito ao aumento dos empregos de baixa remunerao (mini jobs), principal-mente no setor de servios, onde o alcance da negociao coletiva baixo. como consequncia, aumenta o clamor em favor de um salrio mnimo legal. At agora, no se chegou a nenhum acordo poltico, pois os salrios mnimos so fixa-dos por negociao setorial so pisos salariais. Em meados da dcada de 90, foi estabelecido um piso salarial para o se-tor da construo. Ao longo do tempo surgiram outros pisos. hoje h pisos para as atividades de segurana, limpeza, la-vanderia, educao e cuidados com a terceira idade.

    O caso do trabalho temporrio peculiar. Teoricamente os que trabalham em regime temporrio deveriam ganhar igual aos empregados da empresa a que prestam seus servi-os. Na prtica, porm, os salrios so menores.

    uma das maiores preocupaes dos dias atuais o crescente hiato salarial que est se estabelecendo entre os trabalhado-res temporrios e os do quadro fixo. O sistema alemo est sendo desafiado a reconciliar a flexibilidade necessria para a criao de empregos e a competitividade com a necessi-dade de manter a distribuio justa de riscos econmicos e benefcios que sempre ocorreu no pas.

  • 42

    Indstria da construo

    comrcio de telhas

    comrcio eltrico

    limpeza industrial

    servios de pintura

    servios para a terceira idade

    servios de segurana

    servios de lavanderia

    Empregos temporrios

    Piso I: 11,00Piso II: 13,00

    10,80

    9,70

    Grupo salarial 1: 8,55Grupo salarial 6: 13,33

    Trabalhadores no especializados: 9,75Especializados: 11,75

    8,50

    7,95

    7,80

    7,79

    9,75

    10,80

    8,40

    Grupo salarial 1: 7,00Grupo salarial 6: 8,88

    9,75

    7,50

    6,53

    6,75

    6,89

    exemplos de pisos na alemanha (por hora)

    SETORES LADO OCIDENTAL

    r$ r$

    LADO ORIENTAL

    Fonte: OCDE FMI Banco Mundial

    25,3029,90

    22,43

    24,79 24,79

    22,31 19,32

    19,55 17,25

    18,29 15,02

    17,94 15,53

    17,92 15,85

    19,7730,66

    16,120,42

    22,4327,03 22,43

    tabela 3

  • 43

    Salrios e relaes do trabalho no Brasil

    O processo de relaes do trabalho do Brasil apresenta mui-tas diferenas em relao ao da Alemanha. As organizaes representativas das partes so nicas: empregados e empre-gadores organizam-se sob o ttulo de sindicato laboral e sindicato patronal, respectivamente, e isso feito de acor-do com uma lista de categorias ocupacionais e econmicas definidas por lei (Pastore, 2003; Nascimento, 2005).

    sindicatos dos dois tipos so organizados de maneira geo-grfica e hierrquica: sindicatos em nvel estadual ou muni-cipal, federaes em nvel estadual e confederaes em nvel nacional4. Juntos, formam o sistema confederativo definido na constituio federal (art. 8). Todos os sindicatos devem ser registrados no ministrio do Trabalho e Emprego, o que os torna de certa maneira dependentes do governo5.

    A sustentao econmica dos sindicatos ainda mais peculiar. Os trabalhadores registrados (setor formal) e empregadores so obrigados a contribuir para os seus respectivos sindicatos, independente de preferncias pessoais ou afiliao6. Apesar de 100% dos empregados serem obrigados a contribuir, na realidade, pouco mais de 20% so membros das respectivas entidades por vontade prpria, exceto no setor pblico, cuja proporo chega perto dos 50%7. Os sindicatos laborais dos setores mais estratgicos (metalrgica, bancos, qumicas, etc.) tm maior densidade cerca de 70%.

    com relao aos empregadores, a filiao voluntria de me-nos de 10% na maioria dos setores. Apesar disso, 100% dos em-pregadores so obrigados a contribuir para os seus sindicatos.

    4.2

    4Em algumas categorias, existem sindicatos e fede-raes em nvel nacional.

    5O Brasil no aderiu Conveno 87 da OIT (Organizao Internacional do Trabalho), que garante liberdade total aos sindica-tos. H incompatibilidade com a Constituio Federal.

    6Os empregados pagam um dia de salrio por ano, e os empregadores pagam um percentual do capital social da empresa.

    7Estimativas dos autores.

  • 44

    No Brasil, os sindicatos so considerados negcios vantajo-sos, e sua liderana disputada calorosamente8. No para menos. A receita assegurada por lei, garantindo a solvncia perptua. Os sindicatos so as nicas organizaes que nun-ca entram em concordata, e nem abrem falncia. Em con-sequncia disso, os dirigentes sindicais no tm incentivos para melhorar o desempenho dos seus sindicatos.

    desde o final da dcada de 80, os sindicatos laborais organi-zaram-se de forma abrangente e em estruturas com vrios setores as centrais sindicais. Em 2008, a lei 11.648 definiu as centrais sindicais como organizaes que podem agir em negociaes nacionais entre governo, empregadores e em-pregados9. Essa lei garantiu a elas uma receita equivalente a 10% da contribuio sindical10.

    No mesmo ano, o ministrio do Trabalho e Emprego aprovou a Portaria 186, segundo a qual as federaes e confederaes podem ser organizadas com base na filiao das empresas aos sindicatos, e no ao setor econmico a que pertencem, como reza a lei.

    No campo laboral, esta mudana induziu uma forte migra-o de sindicatos de um setor para outro. Induziu tambm a formao de novos sindicatos que constituem a base para a arrecadao das centrais sindicais. Isso porque o volume dos seus recursos depende do nmero de sindicatos e fede-raes a elas filiados.11

    No Brasil, a constituio federal d aos sindicatos laborais a responsabilidade pela negociao coletiva dos empregados. mas, na prtica, o espao para negociaes muito limitado. A lei praticamente tabela a maior parte dos direitos. Ape-nas dois direitos podem ser negociados para cima e para bai-xo: salrios e participao nos lucros ou resultados.

    8Dirigentes sindicais eleitos no podem ser demitidos do momento em que a candidatura aprovada at dois anos do final do seu mandato. Em muitos casos, os dirigentes sindicais so eleitos inmeras vezes.

    9Porm, a lei no garante a estas entidades o status de sindicatos. Elas no podem assinar acordos ou mover aes judiciais contra empresas.

    10O Supremo Tribunal Fe-deral decidir se as centrais sindicais so, na verdade, entidades sindicais luz do que est definido na Constituio Federal.

    11A constitucionalidade deste procedimento tam-bm ser examinada pelo Supremo Tribunal Federal.

  • 45

    O sistema de negociao coletiva desgua em dois tipos de instrumentos: acordo coletivo e conveno coletiva.

    O acordo coletivo estabelecido entre o sindicato que repre-senta os empregados e os administradores de determinada empresa. A conveno coletiva estabelecida entre um ou mais sindicatos laborais ou patronais12.

    Os acordos e convenes devem ser registrados com o mi-nistrio do Trabalho e Emprego, que classifica as clusulas principais do avenado entre as partes.

    As centrais sindicais, com a ajuda do dIEEsE (departamento Intersindical de Estatstica e Estudos socioeconmicos), as-sistem os sindicatos nas negociaes coletivas.

    No segmento formal do mercado de trabalho, a maioria dos trabalhadores est protegida por acordos e convenes cole-tivas. No segmento informal, no h negociaes organiza-das. Apesar disso, a remunerao costuma seguir a lei do sa-lrio mnimo. Parte dos trabalhadores informais recebe o 13 salrio, assim como frias remuneradas. Entretanto, poucos so os que contam com as protees da previdncia social.

    A lei brasileira no abriga a co-gesto ou os conselhos de empregados como na Alemanha. Pela constituio federal, os trabalhadores podem eleger um representante nas em-presas que tm mais de 200 funcionrios. so poucas as representaes que atuam dessa forma. Os conselhos de empregados existem em algumas empresas da indstria automobilstica e, mesmo assim, de forma limitada.

    Em todas as empresas com mais de 20 empregados, os traba-lhadores podem se fazer representar na cIPA (comisso Interna de Preveno de Acidentes). seus membros gozam de estabili-

    12Os dois tipos de institutos normalmente so usados conjuntamente. Salrio e condies de trabalho so negociados em nvel setorial, e clusulas mais especficas (benefcios, jornadas, participao nos lucros, etc.) so negociados em acordos diretos com as empresas. As convenes coletivas podem cobrir divises intra-estaduais ou o estado inteiro. Em alguns setores, como nos bancos, as negociaes so em nvel nacional.

  • 46

    dade durante o mandato e durante os dois anos subsequentes.Em contraste com a harmonia e o bom nvel de entendi-mento observados na Alemanha, no Brasil prevalece a falta de confiana. A cultura da desconfiana que se instalou na dcada de 30 enraizou-se com o tempo e persiste at hoje ao lado de leis rgidas e com forte interveno do Estado, em especial da Justia do Trabalho (robortella, 2011).

    Flexibilidade para ajuste de salrio e jornada

    No Brasil, o salrio mnimo e os pisos estaduais so estabele-cidos por lei. O valor do salrio mnimo definido anualmen-te pelo Presidente da repblica e aprovado pelo congresso Nacional. Em 2011, o salrio mnimo vale r$ 545 por ms (236). O piso estadual especfico para os empregados cujo salrio no determinado por acordos ou convenes coleti-vas. O valor proposto pelos governadores e aprovado pelas Assemblias legislativas de cada estado. Os demais salrios so ajustados por meio de negociaes coletivas.

    Nos tempos de crise, a flexibilidade salarial assegurada pela lei 4.923/1965 que permite reduzir at 25% do salrio por no mximo cinco meses em situao de grave dificul-dade econmica.

    Alm do salrio mnimo, do piso estadual e dos pisos sala-riais negociveis, a lei brasileira assegura que os emprega-dos recebam o salrio de um ms como bnus de Natal (13 salrio) e obriga os empregadores a pagar aos empregados o equivalente a um tero do salrio mensal nas frias anuais de trinta dias.

    Os empregados registrados formalmente tm compensao adicional por horas trabalhadas que excedam oito horas por dia ou 44 horas por semana. As horas extras so pagas na

  • 47

    base do valor da remunerao da hora normal mais 50% des-te valor, havendo ainda um adicional de 20% para trabalho noturno13. com base em negociaes coletivas, essas porcen-tagens podem ser mais altas.

    Por fora de leis especificas, a jornada diria de trabalhado-res de algumas profisses e tipos de atividades menor do que a mencionada. o caso, por exemplo, de operadores de elevador, telefonistas, mineiros, banqueiros e funcionrios de cinema, que trabalham seis horas por dia, ou advogados e mdicos, que trabalham quatro horas por dia.

    O uso de mecanismos flexveis no Brasil sujeito a bastante controvrsia. Tradicionalmente, as relaes do trabalho ti-nham, e ainda tm, uma forma rgida, criada pela clT con-solidao das leis do Trabalho , aprovada em 1943, durante a ditadura militar do Presidente Getlio vargas (Pastore e ski-dmore, 1985). A clT estabelece a mirade de protees sociais e regulariza a organizao de empregados e empregadores, negociao coletiva e resoluo de conflitos.

    13Quase 20% das pessoas trabalham mais de 44 horas por semana; 27% trabalham exatamente 44 horas, e os demais trabalham menos de 44 horas. Na verdade, 40% trabalham 40 horas por semana devido a acordos negociados.

  • 48

    Ao contrrio da Alemanha, o sistema brasileiro limita se-veramente o alcance da negociao coletiva na fixao dos direitos. A maioria fixada por lei e no por negociao. A constituio federal de 1988 expandiu e incorporou inme-ros direitos trabalhistas que faziam parte da clT. Alm disso, a Justia do Trabalho tem em operao uma avantajada ju-risprudncia. O peso do Estado nas relaes do trabalho do Brasil continua grande (Pastore, 2011).

    conflitos individuais e coletivos so resolvidos exclusiva-mente pela Justia do Trabalho em nveis locais, regionais e nacionais. cerca de 50% dos processos so acertados nas va-ras do Trabalho (localmente) em menos de 12 meses. Os de-mais seguem para outras instncias e podem levar at oito anos para serem resolvidos14. Os Tribunais do Trabalho jul-gam mais de dois milhes de casos por ano (frana, 2011). uma verdadeira indstria de queixas e conflitos que, ironica-mente, parece agradar a empregados e empregadores, pois permite que eles se esquivem dos conflitos e de suas respon-sabilidades na soluo dos mesmos (Zylberstajn, 2005).

    14Na Justia, h pleitos de trabalhadores formais e informais, em geral ligados ao processo de desligamento.

  • 49

    Aps o Plano real (1994), que reduziu a inflao drasticamen-te, o nmero de greves no Brasil diminuiu para cerca de 300 por ano, em contraste com as mais de 2 mil durante o pe-rodo de hiperinflao (1980-94). A liberao do mercado e a privatizao de empresas pblicas tambm contriburam para a reduo das greves, exceto no setor pblico, cujo n-mero continuou subindo.

    uma caracterstica inquietante do sistema brasileiro a possibilidade de a Justia do Trabalho anular acordos e con-venes acertados entre as partes. Esta uma das principais fontes de insegurana jurdica para empregados e emprega-dores, pois nunca se sabe se o magistrado estar ou no a favor dos acordos e convenes.

    Os trabalhadores podem acionar a Justia do Trabalho sem custo. Isto cria um incentivo adicional para os litgios e um desincentivo para o acordo, alimentando o mencionado cli-ma de desconfiana que prevalece entre as partes. Por sua vez, a interveno da Justia do Trabalho nos casos de greve reduz a presso que os movimentos dos trabalhadores po-dem exercer junto s empresas.

    O ministrio do Trabalho e Emprego oferece um servio de mediao, mas de eficcia limitada. Grande parte dos casos submetidos aos mediadores prossegue para os Tribunais de Justia por falta de acordo. Existe, tambm, o instituto da arbitragem (lei 9.307/1996), mas sua aplicao na rea tra-balhista costuma ser vetada pela Justia do Trabalho e pelo ministrio Pblico do Trabalho, que consideram os direitos trabalhistas como indisponveis e inegociveis. O avano desse tipo de arbitragem no Brasil tem sido lento e incerto.

  • 50

    Abordagem geral

    Abordagem de negociao

    densidade sindical

    Abrangncia de negociao

    Autonomia para negocia-o coletiva + legislao e regras de co-gesto

    Negociao padro, em geral no nvel setorial,

    aumentando a autonomia recente no

    nvel das empresas.

    18,6 *

    61% ***

    Legislao rgida + nego-ciao coletiva sujeita

    a intervenes da Justia do Trabalho

    Nveis setoriais/regionais. Algumas negociaes empresariais, desde que no contrariem conven-es setoriais/regionais

    total: 21,0% **setor formal: 30,5% **

    Acordos e convenes setoriais/regionais abran-gem quase 100% do setor formal O setor informal segue algumas clusulas negociadas do setor for-mal (Neri/Fontes 2010)

    RELAES DO TRABALHO ENEGOCIAO COLETIVA

    COBERTURAS ALEMANHA BRASIL

    Fontes: Compilao do autor. * OCDE; ** PNAD microdados; *** EIRO.

    tabela 4

  • 51

    Protees do emprego e trabalho flexvel

    Proteo do emprego na Alemanha

    O sistema alemo de proteo de emprego foi criado em lei do comeo da dcada de 50 e no mudou muito. As demis-ses so vlidas apenas com a apresentao de um motivo justificvel por parte do empregador (como razes econ-micas urgentes).

    definir tais razes uma tarefa complexa. como os trabalha-dores demitidos tm o direito de apelar Justia do Trabalho (de organizao semelhante do Brasil)15 e como a definio dos tribunais difcil de prever, o sistema bastante incerto, ainda mais quando se misturam as razes justificadas com questes sociais como idade, gnero e obrigaes familiares.

    se, e apenas se, a demisso for considerada invlida, o em-pregador deve pagar uma indenizao ao empregado. Geral-mente esse valor equivale a quinze dias de salrio por ano trabalhado, mas pode ser mais alto.

    Os conselhos de empregados no podem vetar uma demis-so formalmente, mas devem ser informados sobre as suas razes. Erros formais no procedimento tornam a demisso invlida, e o empregado demitido deve ser readmitido ou compensado o que mais frequente.

    O sistema alemo de proteo do emprego d segurana aos trabalhadores, mas impe custos e incertezas aos em-pregadores. Na Alemanha, uma ao judicial contra demis-ses simples e barata, portanto, frequente. Os sindicatos fornecem assistncia legal a seus filiados. A maioria dos ca-

    4.3

    15At hoje, a Alemanha mantm os juizes classistas ao lado dos togados, como ocorreu no Brasil at 1999.

  • 52

    sos chega a um acordo em primeira instncia, antes de um julgamento formal. Apesar disso, o nmero de casos que se-guem s instncias mais altas grande (figura 1).

    importante notar que a cobertura de proteo do empre-go no universal. desde 2004 ela abrange apenas as em-presas com mais de dez empregados, sendo mais frequente no setor pblico. levando-se em conta os empregados das pequenas empresas, os funcionrios pblicos, os autnomos e os trabalhadores temporrios, a figura 2 mostra que apro-ximadamente 60% dos alemes tm proteo de emprego.

    Nmero de casos remetidos justia do trabalho (total e com relao

    a demisses) e acordos voluntrios compartilhados na alemanha, 1999-2008

    total

    acordos

    demisses

    nm

    ero d

    e cas

    os

    Fonte: Statistisches Bundesamt (2009)

    acordos voluntrios

    1999

    100 10%

    200 20%

    300 30%

    400 40%

    500 50%

    600 60%

    700 70%

    2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

    figura 1

  • 53

    empr

    egad

    os d

    os s

    etor

    es p

    bl

    ico

    e pr

    ivad

    o

    Fonte: GSOEP, clculos prprios.

    Trabalho flexvel na Alemanha

    (1) As regras para a contratao do trabalho temporrio fo-ram liberalizadas por fora das reformas lideradas pelo con-sultor do chanceler Gerhard schrder na rea trabalhista, Peter hartz, no inicio dos anos 2000. com elas, a contratao, que tinha um limite de dois anos, passou a ter prazo inde-terminado. Por outro lado, foi introduzida a obrigatorieda-de de isonomia em relao a salrio e outras condies de trabalho. A mesma lei, porm, permite o relaxamento dessa regra por meio de negociao coletiva. Os contratos coleti-vos dela decorrentes tm fixado salrios bem abaixo dos que

    figura 2

    Cobertura por proteo contra dispensa na Alemanha em 2008 (sem levar em conta o perodo probatrio)

    cobertos58,5%

    trabalho temporrio

    pequenas empresas

    aprendizesfuncionrios pblicos

    autnomos

  • 54

    so aplicveis s empresas contratantes, principalmente nos trabalhos de rotina industrial, onde o uso de trabalho tem-porrio mais proeminente. recentemente, porm, foi esti-pulado um piso salarial para trabalhadores temporrios, que deve entrar em vigor em breve. mesmo assim, esse piso est abaixo do piso das empresas contratantes. Isso significa que duas categorias de empregados podem ser contratadas para as mesmas tarefas com salrios diferentes e por perodo de tempo indefinido.

    (2) Outra mudana, mais antiga, tocou nos contratos por prazo determinado. No passado tais contratos requeriam uma justificativa do lado da empresa. Em 1985, eles foram liberalizados, mas com um limite de dois anos.

    Tais contratos tm cobertura previdenciria e, quando so regidos por contratos coletivos, gozam de protees de em-prego durante sua vigncia. Quanto remunerao, repete--se a situao do trabalho temporrio: apesar da exigncia de pagamento igualitrio, h grandes hiatos em relao aos salrios dos empregados regulares.

    (3) Na Alemanha, o trabalho free-lance e o trabalho pro-fissional autnomo so formas altamente flexveis, que ope-ram fora dos contratos coletivos e das regras de proteo do emprego e at mesmo de certos benefcios da Previdncia social. voluntariamente, os autnomos podem contribuir para os fundos de penso e de desemprego. Os tomadores de seus servios, porm, no so obrigados a recolher contri-buies sociais. Os autnomos que no contribuem para o seguro privado ou para a previdncia social ainda assim so cobertos pelo regime de renda mnima em caso de necessi-dade comprovada.

    A situao dos autnomos que tm apenas um cliente ou

  • 55

    esto integrados na estrutura hierrquica das empresas de seus clientes diferente. Nessas circunstncias eles so con-siderados falsos autnomos e tratados como funcionrios com vnculo empregatcio.

    (4) Na Alemanha no h restries legais para a terceiriza-o de trabalho temporrio ou autnomo. A partir do ano 2000, esse tipo de arranjo passou a ser apoiado por pesa-dos subsdios, destinados principalmente s empresas que iniciam suas atividades (start-ups). foi liberada, tambm, a exigncia de mestre na profisso para vrios negcios inde-pendentes e em sua fase inicial16.

    (5) O horrio de trabalho flexvel outra estratgia impor-tante para evitar o custo de demisso. Isto pode ser alcan-ado remunerando horas de trabalho ou contratando traba-lhadores a tempo parcial. O clculo das horas trabalhadas tornou-se muito importante na Alemanha e contribuiu para atenuar os impactos da crise de 2008-09. Nesse regime, as horas extras no so compensadas com o pagamento de adicional, mas sim por folgas. Esse sistema tornou a flexibili-dade numrica mais barata.

    (6) Quando a jornada de trabalho previsvel, o tempo par-cial uma opo atraente para muitos empregadores. Entre-tanto, os trabalhadores a tempo parcial que ganham mais de 400 (r$ 920) por ms so considerados empregados regu-

    lares, mesmo trabalhando poucas horas, e, por isso, inte-gram-se Previdncia social.

    O trabalho a tempo parcial usufrui de protees e benefcios do tempo integral na base pro rata. Esse tipo de trabalho fre-quentemente utilizado para conciliar as vidas familiar e pro-fissional em uma situao em que os servios de assistncia pblica infncia no so suficientemente desenvolvidos.

    16Na Alemanha, depois do curso tcnico (em geral de trs anos), exige-se um curso de mestre na mesma profisso (um ou dois anos) e aprovao em exame realizado por conselhos profissionais comunitrios. S ento o profissional pode abrir e operar um negcio independente.

  • 56

    A situao diferente para o chamado trabalho a tempo par-cial marginal (geringfugige Beschftigung), que recebe me-nos de 400 (r$ 920) brutos por ms. Nesse caso, os trabalha-dores no pagam nem contribuies previdencirias nem impostos. Estas vantagens, na realidade, so transferidas aos empregadores que acabam pagando menores salrios por hora. Esse tipo de trabalho fornece uma camada de mo-de--obra barata em servios de baixa mdia qualificao, prin-cipalmente no comrcio varejista e no setor hospitalar.

    Na Alemanha o uso de diferentes formas de empregos fle-xveis no limitado por lei, mas a sua utilizao pode ser influenciada pelos conselhos de empregados, isso porque os conselhos tm o direito de opinar sobre as polticas de con-tratao e demisso.

    Na sua vida diria, os alemes podem combinar diferentes tipos de trabalhos, como, por exemplo, ter um emprego de tempo integral e um mini job de baixa remunerao nas ho-ras de folga. Eles podem ser empregados dependentes em um caso e trabalhar como free-lancer em outro.

    Proteo do emprego regular

    Proteo para contratos a prazo determinado

    Proteo ao trabalho temporrio

    3,0

    0,75

    1,75

    1,37

    4,75

    3,50

    indicadores de proteo do emprego, segundo a ocde, 2008

    indicadores ALEMANHA BRASIL

    Fonte: OECD. Observaes: Os indicadores medem os procedimentos e os custos envolvidos na demisso de empregados regulares e os sob contrato por prazo determinado ou em regime de trabalho temporrio. O indicador varia entre 0 (muito flexvel) e 6 (muito rigoroso).

    tabela 5

  • 57

    A proteo do emprego no Brasil

    O Brasil no ratificou a conveno 158 da Organizao Inter-nacional do Trabalho, nem possui um mecanismo de pro-teo do emprego que possa ser comparado ao da Alema-nha. como alternativa, utiliza um sistema indenizatrio o fundo de Garantia do Tempo de servio (fGTs) e outras medidas auxiliares para proteger os empregados na resci-so dos contratos.

    Existem quatro mecanismos legais que protegem os empre-gados demitidos sem justa causa: (1) aviso prvio de resciso de 30 dias (um perodo em que o empregado poder utilizar duas horas pagas por dia ou sete dias de trabalho consecu-tivos para procurar outro emprego, ou receber 30 dias de li-cena remunerada17; (2) uma indenizao de 40% do saldo do fGTs para demisses sem justa causa (para a qual a empresa contribui com uma base de 8% ao ms durante 13 meses por ano)18, e (3) o saldo acumulado de depsitos realizados pelos empregadores em nome dos empregados. Em outras pala-vras, um empregado demitido tem um perodo de tempo sua disposio, bem como recursos financeiros para lidar com os imprevistos do desemprego. Essas regras geram, claro, um custo para os empregadores.

    O clculo do custo demissional depende do tempo trabalha-do em uma empresa, bem como das condies ligadas com a data da demisso e com os 30 dias de aviso prvio. Quando a demisso ocorre um ms antes do fim do contrato (ou data base), a empresa deve pagar um salrio adicional. A ta-bela 6 fornece um exemplo de um trabalhador que trabalha na mesma empresa por trs anos, recebe r$ 1.000 ( 434), demitido prximo do trmino do contrato e recebe o aviso prvio em dinheiro.

    17Recentemente foi apro-vada a lei (Lei 12.506/2011) que garante um aviso pr-vio proporcional, ao qual se somam trs dias para cada ano de trabalho na mesma empresa a partir do segundo ano e com um teto de 20 dias.

    18O FGTS financiado pelas contribuies dos empregadores a uma al-quota de 8% do valor dos salrios dos empregados ao ms, sem qualquer teto. Com o advento da Lei Complementar 110/2001, os empregadores so obri-gados agora a pagar um adicional de 10%, chegando a um total de 50% no FGTS para financiar os dficits acumulados em antigos planos econmicos.

  • 58

    fGTs acumulado8% ao ms

    multa de 40%

    Subtotal

    Aviso prvio (dias)

    Incidncia 1 - 13 salrio

    Incidncia 2- frias

    Incidncia 3 - fGTs

    Total

    80,00 x 40 meses

    0,40 x o saldo da data

    1 ms de salrio

    1/12 do 13 salrio

    1/12 do 13 salrio + 1/3 do bnus

    fGTs s/ sal + 1/12 do 13 salrio

    brasil: custos demissionaishiptese: salrio de r$ 1.000 por ms (cerca de 435) e empregado com 3 anos na mesma empresa

    custos clculos r$

    Fonte: Clculos dos autores

    3.200,00 1.391

    1.391,80 605

    1.000,00 434

    83,33 36

    111,08 48

    86,67 37

    5.872,87 2.553

    4.591,80 1.996

    tabela 6

    O exemplo mostra que, para a hiptese descrita, a empre-sa paga cerca de seis salrios para demitir um empregado que nela trabalhe h trs anos. Esse um dos motivos pelos quais muitas pequenas empresas optam pela informalida-

  • 59

    de, correndo o risco de serem descobertas e autuadas19 pelo no cumprimento da lei.20

    As centrais sindicais argumentam que o atual sistema de indenizao induz a rotatividade. As taxas de rotatividade, entretanto, esto relacionadas natureza da atividade. A agricultura, por exemplo, sazonal e sensvel rotativida-de. O Brasil ainda tem 16% de sua mo-de-obra neste setor, enquanto pases desenvolvidos possuem menos de 5%. A construo tambm sazonal: pronta a obra, os emprega-dos sero demitidos. cerca de 8% da mo-de-obra est na construo civil. Igualmente, o pequeno comrcio e os ser-vios tm demandas instveis (trabalhadores temporrios so contratados para festividades como Natal, dia das mes, etc.). mais de 50% da mo-de-obra trabalha para pequenas lojas e efetuam servios de curto prazo. Todos esses fatores so responsveis por grande parte da taxa de rotatividade, que, evidentemente, no pode ser totalmente atribuda ao sistema de indenizao.

    Algumas tentativas vm sendo feitas para suavizar a rigidez da clT e, ao mesmo tempo, estender as protees aos traba-lhadores informais, bem como para proteger os empregados em geral em tempos de crise. Os empregadores tm sido favorveis a tais ideias. Os trabalhadores esto divididos: os que esto na franja do mercado de trabalho, em geral infor-mais (outsiders) tendem a favorecer as medidas. Os empre-gados do ncleo do mercado, principalmente os sindicaliza-dos (insiders), resistem s medidas propostas e agem junto ao congresso Nacional para sua rejeio.

    Em poucos casos de sucesso as mudanas foram posterior-mente revertidas. uma importante melhoria foi trazida pe-las comisses de conciliao Prvia estabelecidas pela lei 9.958/2000 para promover o acerto direto e, assim, reduzir

    19Hoje as multas so aplicadas depois de um pr aviso dado pelos auditores fiscais.

    20H estudos que indicam bons resultados da inten-sificao da fiscalizao (Almeida e Carneiro, 2007; Simo, 2009). Mas, pouco provvel que o mero enrijecimento das punies possa dar conta desse complexo problema. Isso pode provocar o fechamento das empresas e dos postos de trabalho.

  • 60

    a carga de trabalho dos juzes. Entretanto, essa lei foi severa-mente atacada pelos sindicatos e desacreditada pela prpria Justia do Trabalho e pelo ministrio Pblico do Trabalho, tornando-se letra morta. Isso revelou o poder poltico dos magistrados, particularmente quando apoiados por procu-radores do trabalho e dirigentes sindicais laborais.

    Trabalho flexvel no Brasil

    dois dispositivos legais oferecem oportunidades de reduo da contribuio previdenciria e de outras.

    (1) O primeiro a lei 9.317/199, que instituiu o regime do Programa do Simples e de acordo com o qual as pequenas empresas e microempresas esto isentas das cobranas do imposto sindical e de contribuir para os programas de for-mao profissional e promoo social e empreendedorismo que fazem parte do chamado sistema s. Avaliaes pre-cisas mostraram que, nos trs primeiros anos, O Programa simples conseguiu formalizar cerca de 3 milhes de empre-gados (cechin e fernandes, 2000).

    (2) O segundo a lei 128/2008 tambm chamada de mi-croempreendedor Individual (mEI) , que permite aos aut-nomos informais receber as protees do sistema de Previ-dncia social pagando uma quantia mensal muito modesta, de cerca de r$ 27 ( 12)21. O programa destina-se a beneficiar os autnomos que ganhem at r$ 36.000 ( 15.600) por ano. A maior parte dessas pessoas trabalha como construtores, pintores, eletricistas, encanadores, tcnicos de Tv, etc. O pro-grama incorpora o conceito de proteo parcial: os contri-buintes tm direito aposentadoria por idade, acidente e incapacidade , mas no por tempo de servio.

    Esses mecanismos so relativamente novos, mas tm sido

    21O MEI tem a virtude de ser porttil. Se um traba-lhador deseja se aposentar por tempo de contribuio, ele pode comear a pagar somas maiores e progredir mais rapidamente em direo aposentadoria. Trabalhadores que esto mudando de autnomos para empregados ou o contrrio podem transpor-tar com eles as protees adquiridas. Aqueles que participam do MEI podem ter um empregado, desde que este ganhe um salrio mnimo. A introduo do programa em 2009 foi frustrante, uma vez que pe-quenos empresrios foram incapazes de superar as formalidades burocrticas. Mas, os avanos foram expressivos em decorrncia das simplifcaes introdu-zidas em 2010.

  • 61

    bem aceitos tanto pelas empresas quanto pelos emprega-dos. Estimativas realizadas em meados de 2011 mostraram que mais de um milho de autnomos estavam matricula-dos no programa mEI.

    uma restrio pendente no programa o nmero limitado de ocupaes que tm direito a us-lo. Outra restrio a insegurana jurdica que prevalece nas empresas que gosta-riam de contratar servios de empreendedores do mEI, como o caso da indstria da construo civil. Nesse setor, eletricistas, encanadores, pintores e outros profissionais so necessrios somente por curtos perodos de tempo e para tarefas espe-cficas. Entretanto, as empresas temem que este tipo de con-tratao leve criao de uma relao de emprego, conforme definido pela clT, mesmo porque ainda no existe no Brasil uma lei clara que regulamente a terceirizao de servios. re-

  • 62

    movendo tal insegurana, parece vivel acelerar o processo de formalizao dos microempreendedores individuais.

    (3) h ainda a participao nos lucros ou resultados da em-presa (Plr) uma outra forma de flexibilidade interna. Esta medida claramente estabelecida pela constituio federal de 1988. O objetivo foi criar um estmulo ao dilogo interno entre empregadores e empregados, visando ao aumento da produtividade e do lucro. Ao contrrio de outras formas de remunerao, os pagamentos no esto sujeitos a despesas no salariais. Empregadores e empregados negociam livre-mente os acordos, que estabelecem os objetivos a serem alcanados e os valores a serem distribudos. A distribuio deve ocorrer em perodos no menores que seis meses. Em-bora opcional, este mecanismo vem sendo adotado por um grande nmero de empresas. Impasses jurdicos so raros.

    Ajustes salariais

    (4) Em tempos de dificuldade, a clT tem alguns dispositi-vos para ajustes do emprego. um deles a lei 4.923/1965, j mencionada, que permite s empresas em dificuldade devidamente comprovada cortar as horas de trabalho e os salrios em at 25% por no mximo cinco meses. mas elas tm de cortar tambm os salrios dos gestores.

    Para haver reduo salarial, (a) a empresa deve apresentar provas convincentes de que est passando por graves dificul-dades econmicas; (b) a reduo deve ser negociada junto com o sindicato apropriado; (c) o perodo de reduo salarial no deve exceder trs meses; (d) a reduo no deve exceder 25% do salrio atual.

    Esta lei tem uma grave ambiguidade. Em algum momento os empregados podem alegar que a dificuldade econmica

  • 63

    da empresa no foi devidamente comprovada durante as negociaes ou que as remuneraes e os benefcios dos gestores no foram suficientemente reduzidos. Os empre-srios temem que a Justia do Trabalho venha invalidar um acordo desse tipo, obrigando as empresas a pagar todos os salrios atrasados, com juros e correo monetria. Por isso, essa alternativa usada com muita cautela.

    Suspenso do contrato de trabalho

    (5) O artigo 476-A da clT refere-se a um tipo de flexibilidade numrica externa que permite s empresas adaptar o n-mero de funcionrios a situaes econmicas peculiares. Em tempos de recesso, as empresas podem suspender o con-trato dos empregados por um perodo de dois a cinco meses durante o qual os empregados so colocados em um progra-ma de treinamento que pode ser apoiado e (parcialmente) remunerado na forma de bolsa de estudos (uma espcie de seguro-desemprego) pelo ministrio do Trabalho e Emprego sob as regras da lei 7.998/1990 (artigo 2).

    Esta medida tem sido usada raramente devido complexida-de burocrtica. Para obter a aprovao do programa de trei-namento este precisa satisfazer s seguintes condies: (a) os cursos oferecidos pelos empregadores no treinamento devem ter boa qualidade pedaggica, devendo ser relacionados s ati-vidades da empresa e ministrados em laboratrios adequados, seminrios e workshops; (b) o ministrio tem de aprovar o cur-rculo do programa e as condies em que o treinamento ser realizado; (c) os empregados, a fim de tomar parte do progra-ma, devem se apresentar nas agncias locais do ministrio do Trabalho e Emprego munidos de cpias da conveno coletiva assinada, seu carto da Previdncia social ou carteira de tra-balho, comprovante de matrcula no curso, rG, cPf e o com-provante de matrcula no Programa de Integrao social (PIs).22

    22Estes so os requisitos da Resoluo 591/2009 do Ministrio do Trabalho e Emprego.

  • 64

    Banco de Horas

    (6) O sistema de relaes do trabalho do Brasil oferece es-pao para a flexibilidade numrica interna do tipo banco de horas (lei 9.601/1998). Empregados em geral tendem a acei-tar essa medida. Os sindicatos laborais toleram-na durante as recesses, mas se opem durante tempos normais.

    Persiste uma controvrsia legal. Questiona-se se o uso des-se mecanismo exige negociao coletiva com os sindicatos laborais, ou se pode ser efetivado por acordo entre emprega-dos e empregadores. O fato que muitos acordos diretos j foram derrubados pela Justia do Trabalho, o que gera inse-gurana jurdica nas empresas, que temem multas e aes trabalhistas. um problema adicional est relacionado ao perodo mximo para uso desta medida um ano. muitas empresas acham necessrio prorrogar esse perodo em mo-mentos de dificuldades. Apesar disso, o banco de horas tem sido bastante usado.

    Trabalho a tempo parcial

    (7) O contrato de trabalho a tempo parcial foi criado pela medida Provisria 1.709-4/1998, mais tarde regulamentada pelo Artigo 58-A da clT. A lei no oferece vantagens nas des-pesas de contratao de empregados permanentes.

    O trabalho a tempo parcial no pode exceder 25 horas se-manais. Os empregados assim admitidos tm proporcio-nalmente os mesmos direitos que os empregados a tempo integral, e a empresa contratante tem as mesmas despesas nos itens em que no incide a proporcionalidade, como, por exemplo, o vale-transporte e o subsdio de alimentao. As frias so reduzidas de acordo com o nmero de dias tra-balhados durante o ano. A lei no permite horas extras em

  • 65

    regime de tempo parcial. Jornadas dirias de trabalho flex-veis tm sido usadas, dentro de estreitos limites. As pessoas podem trabalhar 4 horas em um dia e 8 no prximo.

    Em muitos pases o tempo parcial largamente usado por jo-vens estudantes, mulheres e idosos. No Brasil, o uso pequeno. dados de 2008 do cadastro Geral de Emprego e desemprego (cAGEd) mostraram que havia 1,5% de pessoas trabalhando 25 horas por semana ou menos. Na PNAd de 2009 havia menos de 2%. O IPEA estima em 2% os trabalhadores a tempo parcial no segmento formal, embora no segmento informal essa esti-mativa alcance 10% (IPEA, 2009). Tramita no congresso Nacio-nal um projeto de emenda constitucional que abre o tempo parcial para adolescentes entre 14 e 15 anos. A atual constitui-o permite o trabalho acima dos 16 anos.

    Trabalho por prazo determinado

    (8) No Brasil, os contratos por prazo determinado foram es-tabelecidos pela lei 9.601/1998 pelo tempo mximo de seis meses, renovveis em at dois anos. As empresas no so obrigadas a pagar o aviso de 30 dias e a multa de 40% do fGTs ao trmino do contrato. A contribuio mensal do fGTs reduzida de 8% para 2%.

    Na poca em que a lei foi aprovada, o objetivo da medida era trazer os desempregados de volta ao mercado de trabalho. O mecanismo foi visto com simpatia pelos excludos (out-siders), mas nem tanto pelos lderes sindicais (insiders), sob o argumento de que o sistema poderia criar duas classes de trabalhadores: os protegidos e os desprotegidos.

    mesmo assim, a lei foi aprovada, mas no ltimo minuto as centrais sindicais conseguiram introduzir um dispositivo por meio do qual a contratao de trabalhadores por prazo de-

  • 66

    terminado deveria ser previamente aprovada pelo sindicato que representa os trabalhadores da empresa contratante. Este se tornou um constrangimento importante especialmente em clima de desconfiana como o que impera no Brasil. Por motivos bvios, os insiders relutam em apoiar a entrada de outsiders - eventuais concorrentes. As negociaes tm sido difceis. como uma medida de flexibilidade numrica externa, esses contratos tm sido utilizados com mais frequncia pe-las grandes empresas, mas com muita cautela.

    Trabalhos temporrios

    (9) Outra medida de flexibilidade numrica externa so os trabalhos temporrios. No Brasil a lei 6.019/1974 permite contratar empregados temporrios por perodos de at 90 dias (renovvel por mais 90 dias).

    mas h restries. O uso de trabalho temporrio permitido no caso de emergncia ou quando a empresa possui traba-lho extra a realizar. O salrio dos empregados temporrios

  • 67

    tem de ser o mesmo dos empregados regulares da empre-sa na mesma posio. Na lei, o sistema brasileiro igual ao alemo. mas, na prtica, sabe-se que os salrios desses pro-fissionais na Alemanha tendem a ser mais baixos do que os dos empregados da empresa contratante. No Brasil, uma diferena desse tipo alvo de graves punies.

    As despesas no salariais so reduzidas devido anulao da obrigao do pagamento da indenizao de 40% do fGTs e dos 30 dias de aviso prvio. mas, na prtica, essas despesas so includas pelas agncias de trabalho tempo-rrio no valor do contrato.

    A despeito dessas restries, o trabalho temporrio larga-mente utilizado muito mais do que os contratos por prazo determinado. A principal vantagem a disponibilidade do trabalho quando este necessrio. Em 2010 havia cerca de 900 mil pessoas trabalhando como temporrias, na maior parte, menos qualificadas.

    (10) As cooperativas de trabalho so uma variao do traba-lho temporrio. As despesas com contratao so mnimas, porque os membros da cooperativa no pertencem ao pes-soal permanente de nenhuma das empresas para as quais trabalham. Nem so empregados das cooperativas, mas sim cooperados. As cooperativas mantm seus prprios fundos de proteo para atender licenas por doena, f-rias, seguro sade, etc.

    Apesar da existncia de clara proteo legal, esse tipo de fle-xibilidade externa tem sido vigorosamente combatido pelas autoridades governamentais, sindicatos, procuradores e ju-zes do trabalho. O argumento mais utilizado o de que as empresas contratantes usam esta alternativa para contor-nar a legislao trabalhista, evitando pagar os direitos dos

  • 68

    trabalhadores. Essa modalidade de flexibilizao tem sido usada em apenas alguns casos (ex: cooperativa de taxistas).

    Trabalho profissional autnomo

    (11) Os dados mostram que cerca de 20 milhes de pessoas trabalham por conta prpria sem qualquer proteo prin-cipalmente em ocupaes de baixa qualificao (por exem-plo: vendedores de rua, construo e pequenos servios). Esta uma parcela importante da informalidade.

    A clT no possui provises para a proteo do trabalho au-tnomo, com exceo dos empreiteiros da construo, que, mesmo assim, so regulados pelos artigos 619 e 620 do cdigo civil, no pela clT e precisa ser usada com extrema cautela, pois os tribunais do trabalho podem considerar os empregados do empreiteiro contratado como empregados da empresa contratante. Para evitar problemas, o objetivo do contrato deve ser muito especfico.

    Alm da construo, o uso de autnomos em outras ativida-des23 tem sido muito controverso. A lei 11.196/2005 estabele-ceu que os profissionais que prestam esse tipo de servios no so considerados empregados. Em 2007, o congresso Nacional reforou este princpio ao declarar que, em caso de dvida, esses contratos no poderiam ser anulados pelos au-ditores do trabalho, mas somente pelos juzes. Essa proviso, entretanto, foi vetada pelo Presidente lula, mantendo-se a insegurana jurdica existente. A critrio dos auditores do trabalho e da secretaria da receita federal, as empresas po-dem ser obrigadas a incorporar os profissionais autnomos em seu quadro de funcionrios, com pagamentos retroati-vos de juros e correo monetria. Este um dos motivos que fazem do trabalho informal algo to frequente nesse campo.

    23Direito, engenharia, tecnologia da informao, relaes pblicas, gesto de recursos humanos, sade, auditoria e contabilidade, marketing, artes e entrete-nimento, recreao.

  • 69

    Custos trabalhistas

    Os custos salariais e no salariais na Alemanha so altos. O salrio por hora trabalhada apenas uma parte desse custo, conforme demonstrado na Tabela 7. Os custos no salariais so pesados, em especial os relativos a licenas, frias e pla-nos de aposentadoria. Parte desses custos determinada por lei. Outra, por contratos negociados.

    Encargos de horas trabalhadasremunerao dos dias no trabalhados frias doena feriados pblicos Pagamentos especiais formao de peclio Pagamentos especiais fixos

    contribuio Previdncia social

    Plano de aposentadoria profissional

    Outras despesas

    Total

    Adicionais

    % dos custos decorrentes de leis

    custo do pessoal: % de despesasdas horas trabalhadas

    75,117,410,13,34,07,30,46,918,9

    5,64,3

    128,8

    7,1

    25,9

    71,4

    77,517,29,83,53,95,30,35,020,1

    2,33,9

    126,4

    27,7

    63,1

    75,417,510,13,44,07,10,46,7

    19,0

    5,3

    4,3

    128,6

    26,070,6

    ALemanha: custo de contratao na indstria (% de salrios brutos), 2010

    custoslado

    ocidental totalLADO

    ORIENTAL

    Fonte: IW Kln

    tabela 7

    4.4

  • 70

    No Brasil, a lei impe uma longa srie de despesas para a contratao de um empregado no segmento formal. Ao todo, somam 102,43% do salrio nominal (Tabela 8). Quando contra-ta um empregado a r$ 1.000 por ms ( 434), a empresa tpica gasta r$ 2.020 ( 878) com o pagamento de contribuies e indenizaes e com a remunerao de vrios tipos de tempos no trabalhados (13 salrio, frias, feriados pblicos, bnus de Natal, licena mdica, etc.). diferentemente do que ocorre na Alemanha, todas estas despesas so obrigatrias e no po-dem ser negociadas, nem que as partes envolvidas queiram.

    Grupo A Obrigaes sociaisPrevidncia Social

    FGTS

    Salrio-educao

    Seguro do acidente de trabalho (mdia)

    Servios sociais (SESI/SESC/SEST)

    Formao profissional (SENAI/SENAC/SENAT)

    Empreendedorismo (SEBRAE)

    Reforma agrria (INCRA)

    Subtotal A

    20,00

    8,00

    2,50

    2,00

    1,50

    1,00

    0,60

    0,20

    35,80

    brAsil: custo de contratao na indstria - empregados horistas

    custos % do salrio

    tabela 8

  • 71

    Grupo B Tempo no trabalhado IFim de semana remunerado

    Frias

    Abono de frias

    Feriados

    Aviso prvio

    Licena por doena

    Subtotal B

    Gropo C Tempo no trabalhado II13 salrio

    Indenizao demissional 50% do FGTS

    Subtotal C

    Gropo D Incidncias cumulativas Grupo A/Grupo B

    Indenizao /13 salrio

    Subtotal D

    total geral

    18,91

    9,45

    3,64

    4,36

    1,32

    0,55

    38,23

    10,91

    2,94

    13,85

    13,68

    0,87

    14,55

    102,43

    custos % do salrio

  • 72

    Seguro-desemprego e renda mnima

    Alemanha

    Na Alemanha a proteo contra o desemprego est ancorada em dois pilares: de um lado, o seguro-desemprego baseado em contribuio especfica; de outro, o programa de renda mnima garantida (Ebbinghaus e Eichhorst, 2009; Eichhorst, Grienberger-Zingerle e Konle-seidl, 2008).

    O primeiro pilar (seguro-desemprego) tem seu acesso depen-dente do tempo de permanncia no emprego e da remunera-o recebida. A durao mnima no emprego para reivindicar os benefcios do seguro (Arbeitslosengeld I, uB I) de 12 meses. s tm acesso os que ganham mais de 400 (r$ 920) por ms.

    As contribuies ao seguro-desemprego so deduzidas do ganho bruto mensal, mas tm um teto de 5.500 (r$ 12.600) no lado ocidental e 4.880 (r$ 11,000) no lado oriental. Ga-nhos mais altos no so passveis de contribuio e no ge-ram benefcios adicionais. O valor dos benefcios relaciona-do aos ganhos e contribuies prvias. dependendo da presena de crianas no domiclio, o desempregado recebe 60% ou 67% a mais. A durao do benefcio varia entre 6 a 12 meses para os trabalhadores que tm 50 anos ou menos. Os mais velhos usufruem de prazo maior.

    A contribuio ao seguro-desemprego obrigatria para todos os empregados dos setores pblico e privado. mas o acesso aos benefcios tem sido problemtico para trabalha-dores com baixa permanncia nos postos de trabalho e ga-nhos salariais muito reduzidos, como o caso dos tempor-rios ou dos que trabalham em tempo parcial. Esses casos so

    4.5

  • 73

    amparados pelo programa de renda mnima.

    Os funcionrios pblicos concursados que tm estabilidade no fazem jus ao seguro-desemprego. Os que tm contratos por prazo determinado (o que comum na vida acadmica por exemplo) so beneficiados por indenizao no valor de um salrio mensal por ano de servio. Os que trabalham na margem e em tempo parcial no so cobertos pelo seguro--desemprego. O mesmo acontece com os autnomos, exceto para os que contribuem na base voluntria.

    Nem todos os trabalhadores atpicos se encontram em situao precria. Alguns tm boas chances de promoo, principalmen-te quando trabalham temporariamente ou por prazo determi-nado repetidas vezes na mesma empresa. Os autnomos englo-bam profissionais que ganham pouco e os que ganham muito.

    Os baixos salrios ocorrem com mais frequncia entre os que fazem trabalhos temporrios. Outras categorias de trabalha-dores atpicos, como os que tm os chamados mini jobs, po-dem receber benefcios da Previdncia social decorrentes de outro emprego ou de um cnjuge que tem trabalho regular. As variedades de contrato e nveis de proteo so apresen-tados na Tabela 9.

    No Brasil, a lei impe uma longa srie de despesas para a con-tratao de um empregado no segmento formal. Ao todo, so-mam 102,43% do salrio nominal (Tabela 8). Quando contrata um empregado a r$ 1.000 por ms 434), a empresa tpica gasta r$ 2.020 ( 878) com o pagamento de contribuies e in-denizaes e com a remunerao de vrios tipos de tempos no trabalhados (13 salrio, frias, feriados pblicos, bnus de Natal, licena mdica, etc.). diferentemente do que ocorre na Alemanha, todas estas despesas so obrigatrias e no podem ser negociadas, nem que as partes envolvidas queiram.

  • 74

    O segundo pilar de proteo social o programa de renda mnima garantida. O acesso a esse programa (Arbeitslosen-geld II, uB II) limitado aos que esto abaixo dos limites de renda devido falta de ganhos provenientes do trabalho ou devido ao trmino dos benefcios do seguro-desemprego.24

    24A reforma Hartz IV, que introduziu esse programa, contribuiu para reduzir a pobreza, especialmente a no declarada.

    Contrato a prazo indeter- minado e tempo integral

    Trabalho em tempo parcial

    Contratos por prazo determinado

    Trabalho temporrio

    Autnomos

    Trabalhadores margi-nais a tempo parcial

    Sim

    Sim

    No, mas tem durao

    estvel

    Sim (caso seja sem termo)

    No

    Sim (caso seja sem termo)

    Sim

    Sim

    Sim

    Sim

    Voluntrio

    No

    Sim, m

    edia

    nte c

    ompr

    ova

    o

    de fa

    lta de

    recu

    rsos

    tipos de contrato, proteo contra o desemprego, proteo contra demisso e cobertura do seguro--desemprego na alemanha

    tipos de contrato

    cobertura da proteo contra o desemprego

    cobertura do seguro-desemprego

    cobertura da renda

    mnima

    Fonte: Compilao dos autores.

    tabela 9

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    O acesso renda mnima depende da comprovao da falta de recursos. Atualmente os adultos solteiros recebem uma transferncia no valor lquido de 359 (r$ 825) por ms. um casal recebe duas vezes 90% desse valor. Para crianas, a ren-da mnima fica entre 215 (r$ 494) e 287 (r$ 660), depen-dendo da idade. Os ganhos de at 180 (r$ 414) so descon-siderados para a tributao.

    Esses benefcios podem ser recebidos por tempo indeter-minado, caso as famlias necessitem. mas a disposio para aceitar qualquer tipo de trabalho remunerado um requi-sito legal essencial para receber a renda mnima em idade produtiva. caso contrrio, o benefcio cortado.

    Os benefcios da renda mnima podem chegar prximo aos ganhos anteriores no caso de trabalhadores de baixa quali-ficao e baixos salrios, principalmente quando vivem em famlias carentes.

    Os benefcios do seguro-desemprego e da renda mnima influenciam diretamente o funcionamento do mercado de trabalho. Para os empregadores, isso cria um bolso de tra-balho mais barato, o que feito pela via da transferncia da diferena de custo para o Poder pblico.

    Brasil

    Embora garantido pela constituio federal de 1946, o segu-ro-desemprego no Brasil foi institudo somente em 1986. Ele pago pelo governo com os recursos aportados pelos em-pregadores na base de 1,65% do faturamento25.

    Para reivindicar o seguro, o trabalhador deve ter trabalhado no segmento formal por pelo menos seis meses. O valor de-pende da mdia do salrio do empregado. Ele varia entre o

    25Estabelecido pelo Decreto-lei 2.284/1986 e regulamentado pelo Decreto 92.608/1986. O Programa de Seguro--Desemprego rege-se pela Lei 7.998/1990, com as alteraes subsequentes.

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    valor do salrio mnimo de r$ 545 ( 237) e o valor mximo de r$ 1.110 por ms ( 478) (dados referentes a 2011). Emprega-dos domsticos s tm direito ao seguro-desemprego quan-do os empregadores pagam o fGTs voluntariamente.

    A durao do benefcio varia de trs a seis meses. so neces-srios dezesseis meses de intervalo para receber novamente os benefcios. O perodo de cobertura bem como o valor do benefcio foram aumentados em tempos de crise e alto de-semprego. Por exemplo, nos anos de 2008-2009, os benef-cios do seguro-desemprego foram estendidos para sete me-ses, mas limitados aos grupos de maior risco de desemprego.

    O Brasil , provavelmente, o nico caso em que as despesas com o seguro-desemprego aumentam em tempos de altas taxas de emprego. Isso se deve ao recente crescimento do nmero de empregos formais que tm direito ao seguro- desemprego e tambm a uma distoro do sistema fGTs. muitos empregados provocam suas prprias demisses aps 12 meses de trabalho, a fim de receber o pagamento da indenizao e ter direito a cinco meses de seguro-desempre-go. Os trabalhadores desempregados no podem trabalhar no perodo em que esto recebendo o seguro, embora mui-tos o faam, no segmento informal. h dez anos foi proposta uma mudana que remete para a aposentadoria os valores no sacados do fGTs. Essa proposta foi vigorosamente rejei-tada pelos sindicatos laborais (chahad, 2002).

    como j foi mencionado, um tipo especial de benefcio dis-ponibilizado aos empregados que tm seus contratos tem-porariamente suspensos (lay-off). Nesses casos, eles so co-locados em treinamento e recebem uma ajuda do ministrio do Trabalho e Emprego (bolsa de qualificao).

    Pessoas acima de 65 anos e com situao econmica com-

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    4.6

    provadamente precria (vivendo em uma famlia cuja renda per capita menor do que um quarto do salrio mnimo) re-cebem um salrio mnimo do Programa de Assistncia social (lOAs lei Orgnica de Assistncia social). Esta assistncia aplicvel tambm aos portadores de deficincias.

    Polticas ativas de mercado de trabalho

    Alemanha

    A partir dos anos 1960, a Alemanha criou um amplo repertrio de polticas ativas destinadas insero e reinsero dos traba-lhadores no mercado de trabalho pela via do aperfeioamento profissional. Nesse campo h um conjunto diversificado de ins-trumentos de informaes e aconselhamento para a procura de emprego, assim como medidas de assistncia recolocao, pro-gramas de treinamento, subsdios aos empregadores, apoio para a criao de empregos pblicos e para programas de formao.

    Ao longo do tempo, as polticas ativas passaram por refor-mas, incorporando novas medidas e mudando o foco polti-co. Preocupaes quanto efetividade e eficincia levaram o pas a reduzir e reorganizar essas polticas nos anos 2000. A reintegrao rpida no mercado de trabalho passou a ser uma prioridade poltica ao mesmo tempo em que o treina-mento de longo prazo perdeu espao (Eichhorst, Grienber-ger-Zinglerle, and Konle-seidl, 2008; caliendo, 2009).

    Brasil

    O Brasil administra trs programas para promover o empre-go: o sINE (sistema Nacional de Empregos); o PrOGEr (Pro-grama de Gerao de Emprego e renda) e o fAT (fundo de Amparo ao Trabalhador); (chahad, 2006). Tomadas em con-