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Claudia Wanderley de Barros Correia 1 CLAUDIA WANDERLEY DE BARROS CORREIA ESTUDO DA VIABILIDADE DA PRÉ-TRIAGEM PARA SÍFILIS EM CANDIDATOS À DOAÇÃO DE SANGUE DE PRIMEIRA VEZ Dissertação apresentada ao colegiado do Mestrado em Medicina Tropical do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Medicina Tropical Orientadora: Profª. Drª. Maria Rosângela Cunha Duarte Coelho Co-Orientador: Prof. Dr. Divaldo de Almeida Sampaio RECIFE 2003

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  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    1

    CLAUDIA WANDERLEY DE BARROS CORREIA

    ESTUDO DA VIABILIDADE DA PR-TRIAGEM PARA SFILIS EM

    CANDIDATOS DOAO DE SANGUE DE PRIMEIRA VEZ

    Dissertao apresentada ao colegiado do Mestrado em Medicina Tropical do Centro de Cincias da Sade da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para a obteno do ttulo de Mestre em Medicina Tropical

    Orientadora: Prof. Dr. Maria Rosngela Cunha Duarte Coelho Co-Orientador: Prof. Dr. Divaldo de Almeida Sampaio

    RECIFE 2003

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    2

    DEDICATRIA

    Aos meus pais, minha eterna gratido pelo esforo, amor,

    dedicao e presena constante, para que conseguisse a realizao de meus

    projetos

    A meus filhos e meu marido pela pacincia, amor e fora que me

    concederam nos momentos difceis e por tornarem minha vida mais feliz

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    3

    AGRADECIMENTOS

    A Deus pela vida.

    Aos meus irmos e a minha cunhada, pelo incentivo e ajuda.

    A minha orientadora Prof. Rosngela Coelho por sua dedicao,

    ajuda, incentivo e compreenso de minhas dificuldades.

    Ao meu co-orientador Prof. Divaldo Sampaio por sua dedicao,

    confiana e seu apoio, fundamentais para a concretizao do estudo.

    A Dr Paula Loureiro, Chefe de Ensino e Pesquisa e Dr Carolina

    Milito, Gerente do Hemocentro Recife da Fundao HEMOPE, pelo apoio

    institucional e orientaes tcnicas disponibilizadas, minha sincera gratido.

    Aos colegas do Laboratrio de Imunopatologia da Fundao

    HEMOPE, pelo apoio tcnico que me concederam, contribuio inestimvel para

    o andamento do projeto. Dr. Luiz Airton Medeiros, Dr. M Iraci Buarque, Andra

    Selva e especialmente a minha amiga e companheira de bancada Vera Lcia

    Arajo, meus sinceros agradecimentos.

    As bolsistas Lidiane, Manuella, Raquel, Cntia e Lorena pela

    disponibilidade e grande ajuda.

    Ao Laboratrio ALKA Tecnologia em Diagnstico Ltda, pela

    cesso dos kits comerciais do Sfilis Fast.

    A FACEPE pelo seu apoio financeiro.

    Aos amigos do Mestrado de Medicina Tropical, Prof Ricardo

    Ximenes, Walter e Jupira pela pacincia e auxlios prestados.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    4

    LISTA DE ABREVIATURAS

    AABB- Associao Americana de Bancos de Sangue

    Anti-HBc- Anticorpo contra o antgeno core do vrus da hepatite B

    ANVISA- Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    CDC- Centro de Controle de Doenas

    DNA- cido Desoxirribonuclico

    DST- Doena Sexualmente Transmissvel

    EIA- Enzima Imuno Ensaio

    EUA- Estados Unidos da Amrica

    FDA- Administrao de Alimentos e Medicamentos

    FTA-Abs- Teste de absoro do anticorpo fluorescente ao Treponema pallidum

    g/dl- Grama por decilitro

    HBsAg- Antgeno de superfcie da hepatite B

    HIV- Vrus da Imunodeficincia Adquirida

    HTLV- Vrus Linfotrpico Humano de clulas T

    MHA-TP- Microhemaglutinao de anticorpo contra Treponema pallidum

    L- Microlitro

    mL- Mililitro

    mm- Milmetro

    OMS- Organizao Mundial de Sade

    PBS- Tampo Fosfato Salino

    PCR- Reao em Cadeia da Polimerase

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    5

    RNA- cido Ribonuclico

    rpm - Rotaes por minuto

    RPR- Reagina Plasmtica Rpida

    SDI- Iniciativa Diagnstica para Doenas Sexualmente Transmissveis

    SIDA- Sndrome da Imunodeficincia Adquirida

    SINAN- Sistema de Informaes de Agravos Notificveis

    SUS- Sistema nico de Sade

    TDR- Programa Especial para Pesquisa e Treinamento em Doenas Tropicais

    TGP- Transaminase Glutmico Pirvica

    TPHA- Hemaglutinao para o Treponema pallidum

    VDRL- Laboratrio de Pesquisa de Doenas Venreas

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    6

    Lista de Tabelas e Figuras Tabela 1: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro

    Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo o sexo

    Tabela 2: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do

    Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a

    Fevereiro/2003, segundo a faixa etria

    Tabela 3: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro

    Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo o

    estado civil

    Tabela 4: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do

    Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a

    Fevereiro/2003, segundo o grau de instruo

    Tabela 5: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do

    Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a

    Fevereiro/2003, segundo o tipo da doao

    Tabela 6: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do

    Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a

    Fevereiro/2003, segundo a aprovao na triagem mdica

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    7

    Tabela 7: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do

    Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de uma semana a trs

    meses aps a doao, quanto inteno de realizar novas doaes

    Tabela 8: Distribuio de freqncia da aceitao ou recusa dos

    doadores em realizar a pr-triagem, quanto ao tipo da doao

    Tabela 9: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos doadores em realizar

    a pr-triagem quanto ao sexo

    Tabela 10: Distribuio da freqncia da aceitao dos doadores em

    realizar a pr-triagem quanto ao grau de instruo

    Tabela 11: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos

    doadores em realizar a pr-triagem quanto faixa etria

    Tabela 12: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos

    doadores em realizar a pr-triagem quanto ao estado civil

    Tabela 13: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos

    doadores em realizar a pr-triagem quanto aprovao na triagem

    mdica

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    8

    Tabela 14: Comparao diagnstica entre o Sfilis Fast e o padro ouro

    FTA-Abs

    Tabela 15: Comparao diagnstica entre o Sfilis Fast e o VDRL

    Figura 1: Treponema pallidum

    Figura 2: Desenho esquemtico do Sfilis Fast

    Figura 3: Frmulas utilizadas para anlise do teste rpido em relao

    ao FTA-Abs e VDRL

    Figura 4: Percentual de candidatos doao de sangue de primeira

    vez que aceitaram realizar a pr-triagem para sfilis

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    9

    RESUMO A sfilis representa ainda um problema de sade pblica mundial, apesar dos

    avanos no diagnstico e da teraputica amplamente disponvel. No Brasil,

    ndices inaceitavelmente altos de prevalncia da doena ainda so encontrados.

    A sorologia positiva para sfilis, como reflexo desses dados, a segunda causa de

    inaptido sorolgica entre doadores de sangue no Hemocentro de Pernambuco

    (HEMOPE), fato mais grave nos doadores de primeira vez. Um estudo para ver a

    possibilidade de realizar uma pr-triagem para sfilis, juntamente com uma

    validao de um teste rpido para sfilis foi realizado com a inteno de excluir

    doadores soropositivos para lues, antes da doao, visando melhorias na

    qualidade e reduo no descarte do hemoderivado, alm da segurana do

    doador. Uma populao de 535 doadores de primeira vez foi entrevistada e

    selecionada para a primeira fase do estudo. Foram adicionados 170 soros

    provenientes da soroteca do HEMOPE, sabidamente positivos para sfilis pelo

    teste de imunofluorescncia (FTA-Abs), tcnica esta, utilizada tambm como

    padro ouro para validar o teste rpido (Sifilis Fast, Diesse Diagnstica. Itlia). Os

    resultados do estudo mostraram que 92% dos doadores aceitaram realizar a pr-

    triagem, sua durao foi em mdia de 23,60 min e o teste rpido mostrou uma

    sensibilidade de 93,41%, especificidade de 98,32%, com uma concordncia de

    92,4% (Kappa= 0,924). A implantao do procedimento de pr-triagem requer

    algumas modificaes no fluxo da doao, instalaes do hemocentro e anlise

    de custo-benefcio. No entanto, o teste rpido para sfilis mostrou-se de fcil

    execuo, interpretao simples, custo acessvel, alm de possuir uma boa

    especificidade e sensibilidade para uso na triagem de doadores de sangue.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    10

    ABSTRACT

    Syphilis still represents a worldwide public health problem despite the advances in

    diagnosis and the widespread availability of treatment. In Brazil unacceptably high

    rates of prevalence of the disease are still to be seen. Positive serology for

    syphilis, as a reflection of this data, is the second cause of serological ineligibility

    among blood donors at Hemocenter of Pernambuco (HEMOPE), a situation that is

    even more serious when it comes to first-time donors. A study to ascertain the

    feasibility of performing pretesting for syphilis, together with a validation of a quick

    test for syphilis, was carried out with the aim of excluding donors seropositive for

    lues prior to the donation. Such pretesting is designed to bring about

    improvements in quality and donor safety as well as a reduction in the discarding

    of blood derivatives. A population of 535 first-time donors was interviewed and

    selected for the first phase of the study. One hundred and seventy sera found to

    be positive for syphilis by the immunofluorescence test (FTA-Abs) from

    HEMOPE's serum bank were added to the sample, this technique was also used

    as the gold standard to validate the quick test (Syphilis Fast, Diesse Diagnstica,

    Italy). The findings of the study showed the following: 92% of the donors agreed to

    undergo the pretest; its mean duration was 23.60 min; and the quick test showed a

    sensibility of 98.32% and an agreement of 92.4% (Kappa = 0.924). The

    introduction of the screening prior to donation requires a number of changes in the

    various stages involved in donating blood and in the facilities of the hemocenter,

    as well as a cost-benefit analysis. Nonetheless, the quick test for syphilis proved to

    be easy to perform, simple to interpret and financially feasible, in additon to

    exhibiting a good specificity and sensibility for use in the screening of blood

    donors.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    11

    SUMRIO

    Pg.

    Lista de Abreviaturas VII

    Lista de Tabelas e Figuras IX

    Resumo XII

    Abstract XIII

    1- INTRODUO 01

    2- REVISO DA LITERATURA 04

    2.1- Histrico 04

    2.2- O agente 04

    2.3- Dados epidemiolgicos 06

    2.4- Transmisso 08

    2.5- Sfilis e transfuso de sangue 09

    2.6- Sfilis, a histria natural da doena 12

    2.7- Diagnstico sorolgico da sfilis - Reviso das principais

    metodologias

    16

    3- OBJETIVOS 29

    3.1- Objetivo Geral 29

    3.2- Objetivos Especficos 29

    4- CASUSTICA E MTODOS 30

    4.1- Desenho do estudo 30

    4.2- Definio e categorizao das variveis 30

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    12

    4.2.1- Variveis da fase de avaliao da pr-triagem 30

    4.2.2- Variveis do estudo de validao 32

    4.3- Consideraes ticas 32

    4.4- Local do estudo 33

    4.5- Populao estudada 33

    4.6- Clculo da amostra 34

    4.7- Coleta de dados 35

    4.8- Coleta, processamento e armazenamento das amostras 35

    4.9- Operacionalizao do estudo 36

    4.10- Descries das tcnicas 38

    4.11- Anlise estatstica 41

    4.12- Coeficiente de concordncia 43

    4.13- Problemas metodolgicos 43

    5- RESULTADOS 45

    5.1- Caracterizao da amostra para o estudo da viabilidade da

    pr-triagem

    45

    5.2- Anlise da aceitao do procedimento de pr-triagem 48

    5.3- Perfil do doador de primeira vez que concordou em realizar

    a pr-triagem

    49

    5.4- Anlise do fluxo da doao 52

    5.5- Caracterizao da amostra para o estudo de validao do

    teste

    53

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    13

    5.6- Fase de validao do teste rpido para sfilis: 53

    6- DISCUSSO 55

    7- CONCLUSES 66

    8- SUGESTES 67

    9- BIBLIOGRAFIA 68

    10- ANEXOS 79

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    14

    1- INTRODUO

    A sfilis, tambm conhecida como lues, uma doena infecto-

    contagiosa de transmisso predominantemente sexual, de distribuio universal,

    causada por uma espiroqueta, o Treponema pallidum. Foi descrita no final do

    sculo XV, e ainda constitui um problema de sade pblica mundial, apesar dos

    avanos diagnsticos e teraputica curativa amplamente disponvel (Weinstock,

    1998).

    No Brasil no diferente e em Pernambuco, de acordo com o

    SINAN-1999 (Sistema de Informao de Agravos Notificveis), apesar da

    subnotificao, verifica-se um aumento de trs vezes do nmero de casos em

    relao a 1995 e uma incidncia de lues congnita de 3,4 casos por 1000

    nascidos vivos.

    O diagnstico baseado na avaliao clnica e confirmao

    sorolgica, atravs da conciliao de um teste no treponmico (anti-cardiolipina)

    com um treponmico (Rodriguez et al, 2002).

    A sfilis tem sido testada em doadores de sangue h mais de 60

    anos (Orton, 2001). Os testes realizados em bancos de sangue, na triagem de

    doadores, requerem como caracterstica principal, alta sensibilidade, de modo a

    evitar ao mximo o aparecimento de resultados falso-negativos, visando

    principalmente a segurana do receptor. Embora a transfuso de sangue venha

    salvando milhares de vida ao longo dos anos, os receptores possuem risco de

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    15

    tornarem-se infectados com alguns patgenos, dentre os quais se encontra o

    Treponema pallidum.

    A OMS (Organizao Mundial de Sade) recomenda para triagem

    sorolgica da sfilis a realizao de dois testes em paralelo, o VDRL e o TPHA

    (Hemaglutinao para o Treponema pallidum) (Derrico, 1997). No Brasil, o

    Ministrio da Sade, atravs da portaria 1376 de 19 de novembro de 1993,

    determina a realizao da triagem sorolgica em doadores de sangue com pelo

    menos um teste para sfilis (Hemonline, 2003). A Fundao de Hematologia e

    Hemoterapia de Pernambuco, HEMOPE, emprega o teste VDRL para triagem, a

    cada doao e, em caso de positividade, realiza o FTA-Abs, como teste

    confirmatrio.

    A prevalncia da sorologia positiva para lues nos doadores de

    sangue da hemorrede pblica do Brasil, no ano de 1999, foi de 0,82%, ou seja, de

    um total de 193.612, 14.378 doadores tiveram suas doaes rejeitadas por

    apresentarem VDRL positivo, segundo a ANVISA (Agncia Nacional de Vigilncia

    Sanitria). Os maiores ndices foram alcanados pelas regies Norte e Nordeste,

    onde a sfilis ficou em segundo lugar, perdendo apenas para a prevalncia da

    positividade do anti-HBc. Em Pernambuco, de acordo com dados do HEMOPE, a

    sfilis tambm a segunda causa da inaptido sorolgica, fato agravado nos

    doadores de primeira vez, alcanando uma prevalncia de 10,77%, no ano de

    1999. E considerando o uso disseminado dos hemocomponentes e o risco

    potencial para adquirir sfilis transfusional, pouca ateno tem sido dispensada a

    este assunto.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    16

    A pr-triagem de doadores em bancos de sangue de

    fundamental importncia, principalmente nos pases em desenvolvimento,

    objetivando reduzir os elevados custos com o processo de doao de sangue. A

    exemplo do que est sendo feito na frica, devido alta prevalncia do HIV na

    populao, onde em alguns locais, a prevalncia do vrus alcana at 20%, o

    estabelecimento de um suprimento sangneo seguro um objetivo eficiente e

    custo-efetivo. Por isso, a Fundao Africana para a Segurana do Sangue espera

    atravs de uma pr-triagem para o HIV, diminuir o descarte de hemoderivados e o

    desperdcio com a realizao de testes adicionais. Assim, o FDA aprovou um

    teste para deteco de anticorpos anti-HIV ser realizada na urina de doadores de

    sangue antes da doao (Business Wire, 2002).

    Em sntese, havendo positividade sorolgica, a bolsa de sangue

    ser desprezada embora vrios procedimentos j tenham sido executados, tais

    como classificao de grupos sanguneos, pesquisa de anticorpos irregulares,

    sorologias para hepatite B e C, Chagas, sfilis, HIV, HTLV 1 e 2 e dosagem de

    transaminase. Isso representa para o sistema pblico de sade elevao de

    custos, que incluem tambm, a compra de material de coleta e despesas com

    pessoal, alm da espoliao desnecessria do doador.

    Tendo em vista esta problemtica, questionou-se a possibilidade

    de execuo de uma triagem sorolgica para sfilis, antes da doao, atravs de

    um teste rpido, o qual tambm foi validado no presente estudo. Visando fornecer

    subsdios para a implantao posterior em hemocentros, especialmente nos

    localizados em reas de maior prevalncia desta patologia.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    17

    2- REVISO DA LITERATURA

    2.1- HISTRICO

    A sfilis foi reconhecida como entidade patolgica no final do

    sculo XV e rapidamente alcanou propores epidmicas na Europa, onde

    surgiu altamente virulenta e freqentemente fatal nos estgios precoces da

    infeco. O agente causal foi identificado por Schaudinn e Hoffman em 1905,

    (apud Weinstok et al, 1998). Em 1906, August Von Wassermann desenvolveu o

    primeiro exame laboratorial para diagnstico da sfilis, um teste no-treponmico.

    E finalmente, em 1940, iniciou-se a triagem sorolgica para doadores de sangue

    (apud, Orton, 2001).

    2.2- O AGENTE

    O microrganismo do gnero Treponema, subespcie pallidum,

    uma espiroqueta, bactria espiralada que se locomove girando em torno do seu

    eixo longitudinal. constituda por 6 a 14 espirais e possui extremidades finas,

    mede de 6 a 15m de comprimento e 0,2m de largura. Encontra-se no limite de

    resoluo tica dos microscpios ticos convencionais, o que permite a sua

    visualizao por coloraes habituais e pela prata. Seu citoplasma circundado

    por uma membrana trilaminar coberta por fina camada de peptideoglicano e outra

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    18

    rica em lipdios. Seis endoflagelos situados no espao periplasmtico, so

    responsveis pela motilidade (Figura 1). O nico hospedeiro natural conhecido o

    ser humano (Lukehart e Holmes, 1995). Os tecidos afetados pelo T. pallidum

    liberam cardiolipina, lecitina e colesterol, componentes detectados pelos testes

    no treponmicos. Tem uma estrutura complexa e compartilha propriedades com

    outros microrganismos. Os anticorpos reagem, portanto, com espiroquetas

    patognicas e no patognicas, o que dificulta uma interpretao correta dos

    testes diagnsticos (Wicher et al, 2001). O genoma completo do T. pallidum

    compreende 1.138.006 pares de base, com 1.041 seqncias preditoras de

    protenas. A anlise do genoma identificou cerca de 67 genes relacionados com a

    virulncia, outros com a produo de hemolisinas e vrias classes proticas de

    interesse (Weinstock, 1998).

    Figura 1- Treponema pallidum

    Fonte: (http: //www.uveitis.org/Images/syphil1.jpg)

    http://www.uveitis.org/Images/syphil1.jpg
  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    19

    2.3- DADOS EPIDEMIOLGICOS

    Nos Estados Unidos da Amrica (EUA), como resultado de

    esforos intensivos de sade pblica, iniciados durante a Segunda Guerra

    Mundial, o nmero de casos de sfilis diminuiu. Nos anos 70 e 80 houve um

    aumento na incidncia, particularmente relacionada aos homossexuais

    masculinos. Ocorreu um pico em 1990, quando surgiram 50.223 casos novos de

    sfilis primria e secundria e 55.132 de sfilis latente inicial, sendo os

    adolescentes e negros jovens os principais responsveis. Acesso limitado

    sade, uso de drogas, prostituio e dificuldade em contactar o parceiro, foram os

    fatores envolvidos (Jacobs, 1999). A sfilis comeou a declinar em 1991 e tem

    diminudo a cada ano, sendo que de 1990 a 2000, a taxa de infeco diminuiu

    89,2% (Brown e Frank, 2003). Em 1998, 6.993 casos primrios e secundrios

    foram relatados nos EUA, atingindo uma incidncia nacional de 2,6 casos por

    100.000 habitantes (Finelli et al, 2001).

    Na maior parte da Europa, a sfilis tem declinado marcadamente,

    atingindo menos de dois casos por 100.000 habitantes. Em Londres, por exemplo,

    a incidncia maior em homens e alcanou 2,9 casos por 100.000 habitantes em

    2000. Porm, nos pases que constituam a antiga Unio Sovitica, a doena

    alcana taxas de at 32 casos por 100.000 habitantes (Young, 1998;

    Machoucov, 2002).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    20

    No Brasil, o Programa Nacional de Doenas Sexualmente

    Transmissveis estimou, em 1994, 311.748 casos de sfilis, equivalendo a 19,5%

    do total de doenas sexualmente transmissveis (Santos, 1996). Houve uma

    tendncia na queda da mortalidade por sfilis de 1980 a 1995 e o coeficiente de

    mortalidade caiu de 2,45 para 1,02 / 1.000.000 habitantes, um decrscimo de

    58,2% em 15 anos, sendo nas regies Sul, Sudeste e Centro Oeste, as de maior

    declnio.

    A mortalidade por lues congnita no acompanhou estes dados,

    chegando at a aumentar nas regies mais pobres, no Nordeste, por exemplo,

    subiu de 3,54 (1980) para 6,88 / 100.000 menores de um ano (1995) (Lima,

    2002). Se levarmos em considerao que a incidncia da lues congnita,

    acompanha em termos gerais, a infeco na mulher e que para cada mulher

    afetada h pelo menos um parceiro infectado, esta diminuio deve-se mais a

    melhorias no tratamento, do que a reduo na prevalncia. De acordo com dados

    do DATASUS, 1998, constatou-se uma prevalncia de 1,20 casos por 1000

    nascidos vivos, no Brasil neste ano. Tendo sido Pernambuco o estado de maior

    prevalncia, com 3,75 casos por 1000 nascidos vivos. Em 1999, de acordo com o

    SINAN, pouco mudou, 3,4 casos por 1000 nascidos vivos, sendo que em 2001,

    foram registrados 451 casos confirmados de sfilis congnita (DATASUS, 2001).

    A freqncia da infeco na populao em geral pode influenciar

    a probabilidade de um doador estar verdadeiramente infectado, ou seja, uma

    incidncia elevada da doena na populao, aumenta a chance do doador estar

    verdadeiramente infectado e, portanto, maior a probabilidade da presena do

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    21

    Treponema no sangue doado (Orton, 2001).

    Nos EUA, em 1999, 0,13% das doaes de sangue foram positivas

    para sfilis. Em alguns pases em desenvolvimento, esta positividade pode chegar

    a 11%das doaes (Greenwalt e Rios, 2001)

    A prevalncia da sorologia positiva para sfilis nos doadores de

    sangue da hemorrede do Brasil, no ano de 1999, foi de 0,82%, de acordo com a

    ANVISA, concentrando os maiores ndices nas regies Norte e Nordeste, sendo a

    segunda causa mais freqente de inaptido sorolgica entre todos os doadores

    de sangue. Em So Paulo, no ano de 2001, a sfilis, foi tambm a segunda

    doena infecciosa de maior prevalncia entre os doadores, 1,10% das doaes

    (Salles et al, 2003). Pernambuco, no ano de 2002, manteve essa colocao, com

    uma taxa de inaptido sorolgica por lues de 1,01% (ANVISA, 2002).

    possvel que com tal prevalncia se justifique a implantao da

    pr-triagem para sfilis, numa tentativa de reduzir o descarte de hemoderivados e

    assim diminuir os custos do processo de doao de sangue no Brasil.

    2.4- TRANSMISSO

    A transmisso da sfilis ocorre mais freqentemente durante o

    contato sexual, atravs de leses mnimas na pele ou mucosas. O risco de

    desenvolvimento da doena aps o ato sexual sem proteo, com indivduos na

    fase precoce de 30 a 50% (Jacobs, 1999). Modos de transmisso menos

    comuns incluem contatos pessoais no sexuais, infeces via transplacentria,

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    22

    principalmente aps a dcima semana e subseqentes s transfuses

    sangneas e transplante de rgos (Ko et al, 1998).

    2.5- SFILIS E TRANSFUSO DE SANGUE

    No incio do sculo XX, era fcil adquirir sfilis atravs de

    transfuso sangnea, que era feita diretamente do doador para o receptor, por

    bombeamento do sangue (Schmidt, 2001). Em 1941, 138 casos de sfilis

    transfusional haviam sido descritos na literatura, desde ento testes sorolgicos

    so empregados nas doaes (De Schryver e Meheus, 1990; Orton, 2001; Marfin

    et al, 2001). Aps a Segunda Guerra Mundial, o doador e o receptor foram

    separados, o sangue passou a ser coletado em bolsas com soluo

    anticoagulante e conservante, alm de estocado sob refrigerao, o que foi letal

    para o T. pallidum. A transmisso atravs de hemocomponentes tornou-se rara,

    porm possvel. E em 1966, o ltimo caso de sfilis transfusional foi descrito nos

    Estados Unidos, em um paciente com linfoma, que recebeu concentrado de

    hemcias e plaquetas, desenvolvendo um exantema mculo-papular, dois meses

    aps. No perodo de 1 a 4 meses depois da transfuso, a infeco se manifesta

    como uma sfilis secundria aguda, fulminante e sintomtica, com exantema

    generalizado mais proeminente nas extremidades (Schimidt, 2001).

    Em 1977, na Holanda, uma criana adquiriu sfilis aps transfuso

    de sangue total fresco (Risseeuw-Appel e Kothe, 1983). Outro caso ocorreu em

    uma mulher chinesa de 58 anos, que recebeu transfuso de sangue proveniente

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    23

    de doador com resultado positivo para sfilis, porm assintomtico (Soendjojo et

    al, 1982).

    A espiroqueta perde gradualmente sua infectividade durante o

    processo de armazenamento a frio dos hemoderivados, podendo sobreviver at

    120 horas no sangue estocado a 4C (Van der Sluis et al, 1984; Ko et al, 1998),

    sendo esta sobrevida maior, quanto maior for o nmero de T. pallidum

    inicialmente presente no sangue estocado do doador (Van der Sluis et al, 1985).

    O risco de infectividade maior para o sangue fresco e produtos preservados

    temperatura ambiente, como o concentrado de plaquetas (Serrano, 1991). A atual

    demanda transfusional, pode levar ao uso de hemocomponentes com poucos dias

    de estocagem, logo o processo de armazenamento a frio, no preveniria a

    transmisso do agente. O concentrado de plaquetas estocado em bolsas para

    facilitar o fluxo de oxignio, alcanando uma concentrao de 15%, que mais

    alta do que a espiroqueta pode resistir (1-4%), porm o impacto disto na

    sobrevida da bactria desconhecido. Acredita-se tambm que o uso de filtros

    para remoo de leuccitos diminuiria a sfilis transfusional, porque retiraria os

    leuccitos com espiroquetas, aderidas a eles (Orton, 2001).

    Por outro lado, um estudo falhou em demonstrar RNA ou DNA do

    T. pallidum em concentrado de plaquetas preparados com sangue de doadores

    com sorologia positiva para sfilis, sugerindo que estes hemoderivados no seriam

    infectantes (Orton et al, 2002). Porm este fato pode ser explicado por um outro

    estudo caso-controle, realizado nos EUA, onde os doadores reativos e no

    reativos para sfilis, ao serem inquiridos pelo correio, dentre os reativos

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    24

    aproximadamente 50% relataram passado de lues tratada com sucesso (Orton,

    2001).

    A baixa incidncia e controle da sfilis nos EUA, a ausncia de

    casos de lues transfusional h mais de 35 anos, o impacto da refrigerao na

    sobrevida do T. pallidum e o fato da triagem sorolgica para sfilis no diferenciar

    casos infectantes de falso-positivos ou tratados, levaram os pesquisadores

    americanos a questionar a utilidade da triagem para lues em doadores de sangue.

    Em 1985, a Associao Americana de Bancos de Sangue desobrigou a testagem

    sorolgica para a doena em doadores, fato no apoiado pelo FDA, que tornou

    mandatria a triagem para lues. Em 1995, o Instituto Nacional de Sade

    recomendou a permanncia do procedimento. E finalmente, em 2000 o encontro

    do Comit Consultivo dos Produtos Sangneos votou na continuidade dos testes

    (Orton, 2001). Concluiu-se ento que os testes para sfilis, ainda devem fazer

    parte da triagem sorolgica de rotina nos bancos de sangue norte-americanos

    (Greenwalt e Rios, 2001).

    Os argumentos levantados a favor da continuidade desta prtica

    nos EUA foram:

    Os bancos de sangue estariam prestando um servio de sade pblica ao

    testarem doadores para sfilis (Gardella et al, 2002).

    As provas da no transmissibilidade do T. pallidum em sangue estocado, no se

    aplicam ao concentrado de plaquetas.

    O quadro clnico da sfilis num paciente que recebeu transfuso pode ser de

    difcil diagnstico e mascarado por tratamentos antibiticos concomitantes.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    25

    A sfilis tem aumentado nos pases em desenvolvimento.

    A triagem sorolgica para sfilis pode revelar doadores de alto risco para hepatite

    e SIDA (Sndrome da Imunodeficincia Adquirida), funcionando como marcador

    satlite (Schimidt, 2001; Serrano, 2001; Silvani et al, 2000; Seidl, 1990). Este

    argumento contribui favoravelmente para a implantao da pr-triagem, pois alm

    de eliminar previamente doadores contaminados com sfilis, poderia at impedir

    que doadores em perodo de janela imunolgica para estas patologias doassem

    sangue.

    Diferentemente dos autores americanos, no Brasil e em outros

    pases em desenvolvimento no se questiona a continuidade da testagem para

    sfilis em doadores de sangue, muito provavelmente devido prevalncia desta

    patologia nestes locais.

    2.6- SFILIS, A HISTRIA NATURAL DA DOENA

    Normalmente, a sfilis adquirida atravs do contato sexual. Os

    diferentes estgios da doena tm implicaes no diagnstico e tratamento da

    doena (Wicher et al, 1999). O T. pallidum penetra rapidamente nas abrases

    cutneas ou mucosas, chega aos vasos sangneos e linfticos e dissemina,

    produzindo uma infeco sistmica (Orton, 2001). O perodo mdio de incubao

    de cerca de 21 dias, quando surge a leso primria no local da inoculao,

    persiste geralmente por duas ou seis semanas e cura-se espontaneamente. a

    sfilis primria que se caracteriza pela presena do cancro localizado

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    26

    normalmente no pnis, canal anal, reto, boca ou genitlia externa nos homens e

    nas mulheres, no colo uterino e lbios vaginais (Goldmeier e Guallar, 2003; Brown

    e Frank, 2003).

    Cerca de 6 a 8 semanas aps a cura do cancro, surgem as

    manifestaes parenquimatosas, sistmicas e mucocutneas da sfilis secundria.

    A erupo cutnea consiste em leses inicialmente maculosas (rosolas

    sifilticas), depois papulares, papuloescamosas e ocasionalmente pustulares. O

    acometimento da regio palmo-plantar de grande valor diagnstico, embora no

    patognomnico. Manifestaes gerais incluem micropoliadenopatia generalizada,

    mialgias, artralgias, cefalia, meningite, febre, emagrecimento, astenia, iridociclite,

    hepatite, esplenomegalia, periostite e glomerulonefrite (Doherty et al, 2002;

    Goldmeier e Guallar, 2003).

    As leses secundrias desaparecem em duas a seis semanas e o

    paciente passa para o estgio latente, que s detectvel por testes sorolgicos

    (Orton, 2001). H ausncia de manifestaes clnicas, exame fsico e radiografias

    normais. A fase latente inicial compreende os primeiros dois anos aps a infeco

    e a latente tardia aps este perodo. Durante esse estgio o T.pallidum pode

    invadir a corrente sangnea de forma intermitente infectar o feto no tero e

    ocasionar tambm sfilis transfusional (Goldmeier e Guallar, 2003).

    Um tero dos pacientes com sfilis latente no tratada

    apresentaro doena terciria clinicamente evidente. Que pode ser cutnea,

    cardiovascular ou neurolues (Santos, 1996).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    27

    A neurossfilis pode ser assintomtica, ou seja, encontra-se

    apenas algumas anormalidades no LCR. Ou sintomtica dividida em categorias

    clinicas que incluem sfilis menngea, sfilis meningovascular e parenquimatosa

    (Lukehart e Holmes, 1995; Ooi e Dayan, 2002).

    As manifestaes cardiovasculares so mais comuns em homens

    e a aortite sifiltica a mais freqente. Outras complicaes incluem aneurismas,

    estenose do stio coronrio e insuficincia artica (Azulay e Azulay, 1999).

    As gomas sifilticas so usualmente nicas ou pouco numerosas,

    assimtricas, regionais, localizadas e destrutivas, deixando cicatrizes atrficas e

    no retrteis. No so contagiosas e no involuem espontaneamente. Os locais

    mais afetados so a pele, sistema esqueltico, vias areas superiores, laringe,

    fgado e estmago (Azulay, 1999).

    A sfilis congnita ocorre devido transmisso da infeco da

    me para o feto via placenta aps o 4 ms de gestao. At o segundo ano de

    vida, sfilis congnita precoce e depois do segundo ano considera-se congnita

    tardia (Lukehart e Holmes, 1995; Egglestone e Turner, 2000).

    A sfilis e outras patologias que cursam com ulceraes genitais

    so fatores de risco importantes na transmisso do vrus da imunodeficincia

    adquirida (HIV). As manifestaes clnicas da lues podem ser atpicas nos

    indivduos com co-infeco pelo HIV, requerendo ateno do especialista (Ooi e

    Dayan, 2002).

    Trata-se de uma patologia cujo tratamento altamente efetivo,

    sendo que a ausncia deste pode, algumas vezes, resultar em morte ou

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    28

    morbidade significativa. O tratamento feito com a penicilina, cuja eficcia

    permanece inalterada aps 50 anos de uso, curando mais de 95% dos casos de

    sfilis primrias (Jacobs, 1999). Apesar de completamente curados com o

    tratamento adequado, alguns indivduos podem permanecer com resultados

    sorolgicos positivos por toda a vida.

    A preveno feita principalmente atravs de proteo durante o

    sexo, exames pr-natais e triagem adequada em bancos de sangue. A sfilis

    uma doena passvel de ser eliminada da populao, porque no existe

    reservatrio animal, o homem o nico hospedeiro e uma dose de penicilina

    trata a maior parte dos casos. A erradicao da doena , at o momento, a nica

    maneira de abolir a triagem sorolgica para sfilis dos bancos de sangue

    (Greenwalt e Rios, 2001).

    A sfilis possui as propriedades necessrias para classificar uma

    doena como potencialmente transmissvel por transfuso: infeco

    assintomtica, estgio de portador ou latente e crescimento do agente nos

    hemoderivados estocados. Alm disso, as caractersticas de suas diferentes fases

    esto relacionadas com a probabilidade de um indivduo se apresentar como

    doador de sangue. Na fase primria, a rpida disseminao precede o

    desenvolvimento dos anticorpos e da sintomatologia, resultando em doadores

    infectantes e soronegativos. A fase secundria mais clinicamente aparente e,

    portanto, improvvel de um indivduo nesta fase se apresentar para doar. Na fase

    latente, pela ausncia de sintomatologia clnica, maior a probabilidade do

    indivduo se apresentar para doar, porm expressam positividade sorolgica e,

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    29

    ainda assim, o potencial de infectividade dos hemocomponentes resultantes no

    est bem descrito (Orton, 2001).

    2.7- DIAGNSTICO SOROLGICO DA SFILIS - REVISO DAS PRINCIPAIS

    METODOLOGIAS

    O diagnstico da sfilis baseado na evoluo clnica, deteco

    do organismo causal e confirmao por sorologia. A variabilidade das leses e as

    freqncias de manifestaes atpicas da doena fazem com que a deteco do

    agente e o sorodiagnstico sejam essenciais (Brown e Frank, 2003). O T.

    pallidum no pode ser cultivado in vitro, nem ser visto com coloraes

    laboratoriais de rotina, sendo necessrios mtodos alternativos, que se baseiam

    ora na identificao direta do microrganismo ora na presena de anticorpos.

    1- MTODOS DE DETECO DIRETA DO Treponema pallidum:

    1.1- Microscopia em campo escuro:

    Trata-se do teste mais antigo, mais simples e ainda bastante til.

    O exudato de leses primrias e secundrias, ou lquido amnitico so colocados

    em uma lmina, cobertos e examinados em microscpio apropriado com objetiva

    de 45 a 100 vezes. O Treponema identificado pela sua morfologia e por seus

    movimentos. Desde que 100.000 organismos / ml so requeridos para

    visualizao, um teste negativo no afasta o diagnstico (Clyne e Jerrard, 2000).

    Esse mtodo particularmente importante nas fases precoce da sfilis, quando

    no h ainda anticorpos detectveis e nos pacientes com imunodeficincia. A

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    30

    sensibilidade do campo escuro alcana 80% (Larsen et al, 1995). o teste mais

    especfico para o diagnstico da lues, quando o cancro e o condiloma esto

    presentes (Brown e Frank, 2003).

    1.2- Imunofluorescncia direta para o Treponema pallidum em

    fluidos corporais (DFA-TP) e tecidos (DFAT-TP):

    Amostras das leses so coletadas e anticorpos anti-treponema

    ligados a isotiocianato identificam o organismo. A leitura realizada atravs de

    microscpio que verifica a fluorescncia. Eles, porm, no diferenciam o agente

    patognico da sfilis de outros treponemas. A sensibilidade deste mtodo

    levemente maior que o campo escuro, aproximando-se de 100%, quando uma

    leso recente examinada (Larsen et al, 1995; Wicher et al, 1999). A DFAT-TP

    utiliza material biopsiado para pesquisa do T. pallidum, atravs de microscpio

    fluorescente (Larsen et al, 1995).

    1.3- Identificao do T. pallidum atravs da colorao pela prata:

    realizada em material biopsiado, com intuito de evidenciar o T.

    pallidum (Wicher et al, 1999).

    1.4-Reao em cadeia de polimerase (PCR):

    A tcnica de PCR tem sido utilizada para identificao do agente

    patognico em fluidos corporais e tecidos frescos e parafinados. Em certas

    situaes a PCR pode ser mais prtica e mais sensvel, alm de necessitar de

    apenas 1 a 5 microrganismos por espcime (Wicher et al, 1999). Estudos

    evidenciam uma sensibilidade de 91% e especificidade de 99% (Schmitz e Folds,

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    31

    1997). Tem como limitao no diferenciar o DNA de organismos vivos e portanto

    infectantes, de organismos mortos (Orton, 2001).

    1.5- PCR por transcriptase reversa (RT-PCR):

    Como o RNA rapidamente degradado aps a morte da bactria,

    a sua deteco altamente sugestiva de infectividade. uma tcnica baseada na

    amplificao do RNA do T.pallidum. Tem sido usado de maneira experimental em

    LCR humano. mais sensvel que o DNA-PCR, necessita apenas de um

    microrganismo (Centurion-Lara et al, 1997). Estudos comparativos com o RIT

    (Teste da infectividade do coelho), mostraram uma sensibilidade e especificidade

    de aproximadamente 100% (Orton, 2001).

    1.6- Teste da infectividade do coelho (RIT):

    um teste considerado padro ouro para a infectividade da sfilis.

    A inoculao intra-testicular, ou intra-drmica, causa a leso tissular que

    permanece por toda a vida, com capacidade de infectar outro animal e causar

    reao sorolgica positiva (Orton, 2001). considerado de uso acadmico. Tem

    uma sensibilidade de 10 a 50 organismo (Wicher et al, 1999). uma das tcnicas

    mais sensveis, alcanando aproximadamente 100% de sensibilidade (Larsen et

    al, 1995).

    2- MTODOS DE DETECO INDIRETA DO T. pallidum:

    Detectam anticorpos treponmicos e no treponmicos ou contra

    fosfolipdios (anti-cardiolipina).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    32

    2.1- Testes para anticorpos antifosfolipdios ou no treponmicos:

    2.1.1- VDRL (Veneral Disease Research Laboratory):

    um teste de microfloculao que usa como antgeno uma

    mistura de cardiolipina lecitina colesterol. O antgeno que uma soluo

    alcolica contendo 0,03% de cardiolipina, 0,21% de lecitina, 0,9% de colesterol

    suspenso em uma soluo salina tamponada. Quando combinada com anticorpos

    forma floculao que visvel ao microscpio. Pode ser usado de forma

    qualitativa e quantitativa. Nesta ltima o soro sofre diluies seriadas e o ttulo

    reportado a maior diluio a produzir resultado reativo. til para acompanhar o

    tratamento, cuja eficcia verificada com a reduo dos ttulos iniciais. Sua

    sensibilidade depende do estgio da sfilis. Torna-se positivo em torno da quarta a

    oitava semana aps a infeco inicial. Nesta fase a sensibilidade de 78%

    (variando de 59 a 87%). Na sfilis secundria alcana 100% devido aos altos

    nveis de anticorpos, na latente precoce de 95% (88-100%) e diminui para 71%

    (37-94%) na fase latente tardia e terciria, especificidade de at 98% (96-99%),

    podendo inclusive o VDRL tornar-se negativo em dos pacientes tardiamente

    (Clyne e Jerrard, 2000; Sexual Health and Sexually Transmitted Infectious, 2004).

    Falsos negativos podem ser encontrados em tcnica imprpria, por conta do

    efeito prozona (em 1 a 2% dos casos h excesso de anticorpos prejudicando a

    aglutinao) e nos estgios muito tardios da doena (Clyne e Jerrard, 2000).

    recomendado para triagens populacionais. Resultados falsos positivos ocorrem

    com ttulos geralmente menores que 1:8, podendo alcanar taxas de at 5-20%

    (Clyne e Jerrard, 2000). Ressalta-se que anticorpos contra fosfolipdios, inclusive

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    33

    cardiolipina, so produzidos em uma variedade de patologias, tais como

    pneumonias atpicas, brucelose, doena heptica crnica, gravidez, malria,

    tuberculose, leptospirose, mononucleose, doenas neoplsicas,

    hipergamaglobulinemia, riquetsiose, sarampo, varicela, toxicomania, colagenoses

    e hansenase virchowiana (Brown e Frank, 2003; Ooi e Dayan, 2002).

    2.1.2- RPR (reagina plasmtica rpida):

    um teste de floculao macroscpica e decorre de uma

    modificao do VDRL. O soro do paciente combinado com o antgeno

    cardiolipina (reagina) contendo partculas de carbono em um carto plstico. O

    carto mecanicamente rodado a 100 rpm por 8 minutos. O soro contendo

    anticorpos anticardiolipina formar floculao. Diluies seriadas so realizadas

    para obter a titulao. Nos EUA utilizado como triagem devido ao custo e

    simplicidade. levemente mais sensvel que o VDRL sendo este mais especfico.

    A sensibilidade na fase primria de 86% (77-100%), na secundria de 100%, na

    latente precoce de 96% (95-100%) e na latente tardia e terciria de 70 a 73%

    (Clyne e Jerrard, 2000; Sexual Health and Sexually Transmitted Infectious, 2004).

    Alguns autores relatam especificidade de at 98% (93-99%) (Larsen et al, 1995;

    Fuertes, 2002).

    2.1.3- EIA-VDRL (Enzima Imunoensaio para anticorpos contra

    cardiolipina):

    um EIA para deteco de anticorpos IgM e IgG contra

    cardiolipina, com sensibilidade e especificidade de 97% (Larsen et al, 1995).

    Apresenta uma adaptao que pode ser utilizada como teste de triagem, que

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    34

    detecta nveis mais baixos de anticorpos, conhecido como teste da reagina

    SPIROTEK II (Pendersen et al, 1987). Com sensibilidade de 93% na fase

    primria, 100% na secundria, 100% na latente e especificidade de 94% (Wicher

    et al, 1999).

    2.1.4- Teste cardiolipina de captura-S:

    um teste de deteco de anticorpo antifosfolipdio atravs de

    um ensaio de fase slida de aderncia eritrocitria. Foi desenvolvido para triagem

    de doadores de sangue por ser mais econmico. Tem sensibilidade e

    especificidade comparveis ao RPR, alcanando 80,5% de sensibilidade e 99,2%

    de especificidade (Stone et al, 1997).

    2.2- Testes treponmicos:

    2.2.1- FTA-Abs (teste de absoro do anticorpo fluorescente ao Treponema

    pallidum):

    Os testes treponmicos especficos so usados para verificar a

    positividade de um teste no treponmico, ou confirmar o diagnstico de sfilis. O

    FTAAbs geralmente o teste considerado como padro-ouro confirmatrio

    (Young et al, 2000). feito usando T. pallidum de coelho como antgeno. O soro

    do paciente passa por uma cultura de Treponemas no patognicos para remover

    anticorpos inespecficos. O soro colocado sobre uma lmina com T.pallidum

    fixado, aps lavagem e anticorpos fluorescentes so adicionados. A intensidade

    da fluorescncia visualizada atravs do microscpio ultravioleta e descrita

    usando uma escala de 0 a + 4, onde o 0 negativo e o soro com +2 reativo.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    35

    Em estgios muito precoces 20% dos pacientes podem ter FTA-Abs negativo. A

    maioria dos pacientes permanece positivo durante toda a vida. Na sfilis primria a

    sensibilidade de 86% (70-100%), na secundria e latente precoce 100% e na

    latente tardia e terciria 97% (94-100%), com especificidade de 99% (98-100%)

    (Larsen et al, 1995; Wicher et al, 1999; Sexual Health and Sexually Transmitted

    Infectious, 2004). Embora menos comumente, podem ocorrer falsos positivos nas

    mesmas condies anteriormente descritas para o VDRL e o RPR (Larsen et al,

    1986).

    2.2.2- Tcnica de dupla colorao fluorescente (FTA- Abs DS):

    Melhora a sensibilidade do FTA-Abs, ao usar dois conjugados na

    lmina, variando de 69 a 90% na fase primria e atingindo 100% na secundria e

    latente (Larsen et al, 1995). Sua especificidade alta, 98% (97-100%), falsos

    positivos ocorrem em 1% dos indivduos normais e 3% das mulheres grvidas

    (Larsen et al, 1995).

    2.2.3- FTA-Abs 19S IgM:

    Foi desenhado para o diagnstico de sfilis congnita. Tem uma

    sensibilidade de 92% e especificidade de 93%, comparado com 90 e 75% para

    FTA-Abs IgM convencional (Larsen et al, 1995).

    2.2.4- TPHA (Hemaglutinao para Treponema pallidum):

    Eritrcitos cobertos de antgenos de T. pallidum so diludos em

    soro contendo anticorpos anti-treponema resultando em aglutinao das clulas

    vermelhas. altamente sensvel e especfico mais no o bastante para

    diagnosticar a sfilis primria. Tem uma concordncia de 87 a 93% com relao

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    36

    ao FTA-Abs (Orton, 2001). Uma sensibilidade de 76% na fase primria, 100% na

    secundria, 97% na latente, 94% na tardia e especificidade de 99% (Fuertes,

    2002).

    2.2.5- MHA (Microhemaglutinao para Treponema pallidum):

    Eritrcitos de ovelhas sensibilizadas aglutinam na presena de

    anticorpos anti-treponema no soro testado, a reao se processa em uma placa

    microtitulada (Larsen et al, 1995). Pode ser realizado de forma automatizada, que

    ideal para bancos de sangue (Orton, 2001). Apresenta na fase primria uma

    sensibilidade de 76% (64-90%); 100% na secundria; 97% (94-100%) na latente

    precoce, tardia e terciria, alm de uma especificidade de 99% (98-100%) (Sexual

    Health and Sexually Transmitted Infectious, 2004).

    2.2.6-TP PA (teste de aglutinao passiva para anticorpos contra

    T.pallidum):

    um novo teste de aglutinao passiva usando uma preparao

    liofilizada de partculas gelatinosas coloridas como carregadoras do T.pallidum.

    Semelhantes ao teste de MHA, estas partculas so misturadas com diluies

    seriadas de plasma ou soro em uma placa. O teste incubado por duas horas e a

    reao lida. A sensibilidade e a especificidade so similares ao TPHA, com uma

    taxa de concordncia de 98,9% com o FTA-Abs (Castro et al, 2003).

    2.2.7- Olympus PK-TP

    um teste de hemaglutinao desenvolvido principalmente para

    bancos de sangue. Tem uma capacidade de realizar cerca de 240 amostras por

    hora, sendo 2 vezes mais especfico que o RPR (Larsen et al, 1995).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    37

    2.2.8- EIA (Enzima Imuno Ensaio) competitivo:

    um mtodo automatizado que pode ser usado para triagem.

    Tem sensibilidade de 99,5% e especificidade de 99,4%, quando comparado com

    o FTA-Abs, para todas as fases da sfilis, exceto a primria (Castro et al, 2003). O

    EIA com leitura objetiva evita o problema da interpretao subjetiva, que pode

    influenciar o observador a confirmar reaes positivas de outros testes (Young et

    al, 2000).

    2.2.9- Sfilis G captura:

    um EIA que pode ser usado como triagem e como teste

    confirmatrio. Pode dar falso positivo com: anticorpos antifosfolipdios, doena de

    Lyme e outras (Pope et al, 2000). Sensibilidade de 70,7% e especificidade de

    97,9% comparado com o FTA-Abs (Halling et al, 1999).

    2.2.10- Sfilis M captura:

    um EIA de captura anti-cadeia pesada. Especialmente

    desenvolvido para deteco de sfilis congnita. Sensibilidade similar ao FTA-Abs

    IgM porm mais especifico. tambm utilizado para estgios precoces da sfilis.

    Sensibilidade de 94% para primria, 85% para secundria e 82% para latente

    precoce (Leferve, 1990). Possui uma especificidade de 90% (Fuertes, 2002).

    2.2.11- EIA-TmpA (testes para anticorpos antitreponemas usando

    antgenos recombinantes de T.pallidum):

    um EIA que usa uma protena de membrana localizada no

    T.pallidum, TmpA, obtida por tcnica recombinante e tem se mostrado til para o

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    38

    desenvolvimento diagnstico da sfilis. Os nveis de anticorpos para o TmpA

    diminuem aps o tratamento. Tem sensibilidade de 93,3% e especificidade de

    95,5%, quando comparado ao TPHA (Rodriguez et al, 2002).

    2.2.12- Anticorpos antiespiroquetas da sfilis;

    um EIA que tem sido recomendado pelo CDC (Centro de

    controle de doenas) como teste confirmatrio para sfilis. o teste de

    sensibilidade mais alta, especialmente na fase primria no tratada (Larsen et al,

    1995).

    2.2.13-EIA captura imune (ICE sfilis):

    Teste de triagem que usa trs antgenos recombinantes (TpN15,

    TpN17 e TpN47). Significantemente mais sensvel que o FTA-ABS. Ideal para

    infectados pelo HIV. Especificidade de 99,8% e sensibilidade de 99,4% (Young et

    al, 2000).

    2.2.14- Anticorpos antitreponema detectados por WESTERN-

    BLOT (imunoblot; IB):

    A deteco de no mnimo 3 a 4 antgenos maiores, indica um

    teste positivo. Tem sensibilidade de 93,8% e especificidade de 100%, alm de

    concordncia com FTA-Abs de mais de 95% (Orton, 2001). Detectam anticorpos

    contra uma variedade de protenas do T.pallidum. muito til como adjuvante

    para o diagnstico de sfilis congnita. Sua sensibilidade de 90% na primria,

    98% na secundria e 100% na latente precoce. Tem especificidade de 99%

    (Larsen et al, 1995).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    39

    3- Testes rpidos para sfilis:

    A avaliao da utilidade de testes rpidos e simples para sfilis em

    pases em desenvolvimento uma prioridade para a OMS. Atualmente existem

    cerca de 20 testes treponmicos rpidos, comercialmente disponveis. Porm as

    informaes sobre suas caractersticas so limitadas. Estudo recente, realizado

    pela Iniciativa Diagnstica de Doenas Sexualmente Transmissveis (SDI), que

    faz parte do programa especial para pesquisa e treinamento em doenas tropicais

    (TDR) da OMS, com alguns destes testes, encontrou sensibilidade variando de 85

    a 98% e especificidade de 93 a 98%, comparado-os ao TPHA. O tempo de

    execuo deles variou de 5 a 20 min, sendo alguns com possibilidade de utilizar

    sangue total, eliminando-se a etapa de centrifugao. O Sfilis fast foi um dos

    avaliados neste estudo (SDI, 2003). Ele constitudo de antgenos

    recombinantes, livre de contaminao, o que representa uma vantagem sobre os

    testes treponmicos usuais, os quais utilizam uma mistura de antgenos selvagem

    o que pode prejudicar a especificidade do teste (Sato et al, 1999; Rodrigez et al,

    2002).

    Existe uma srie de limitaes nos estudos que avaliam os testes

    diagnsticos e falta um padro-ouro para o diagnstico da sfilis em doadores de

    sangue. O RIT no utilizado rotineiramente para avaliar exames laboratoriais

    liberados para triagem de doadores, ento o diagnstico clnico tem sido utilizado

    como padro-ouro. Porm, quando surgem novos kits, estes so comparados

    com outros, mais do que com o diagnstico clnico. Esta comparao pode induzir

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    40

    erros, quando realizada em populaes de baixo risco, tais como doadores de

    sangue e isto no melhora mesmo utilizando-se testes em paralelo. A maioria

    destes mtodos supracitados foi desenvolvida para o diagnstico e no para a

    triagem sorolgica de bancos de sangue (Orton, 2001).

    Os testes reagnicos ou anti-cardiolipina tm a vantagem de seu

    baixo custo e deteco alta da sfilis infecciosa, porm com sensibilidade e

    especificidade mais baixas. Esto indicados nos locais de alta prevalncia da

    patologia, com os casos positivos sendo confirmados com testes treponmicos,

    como a melhor opo custo-efetiva na triagem de doadores (De Schryver e

    Meheus, 1990).

    Os testes treponmicos tm a vantagem de terem elevada

    sensibilidade e especificidade, porm so complexos e caros, alm de detectarem

    cicatrizes sorolgicas. So mais indicados nos locais de baixa prevalncia da

    doena, porm com um valor preditivo positivo baixo (De Schryver e Meheus,

    1990).

    A escolha dos testes para triagem de doadores ir depender

    ento, da disponibilidade nos servios de sade e da epidemiologia da doena.

    Com relao aos testes rpidos, espera-se que os testes rpidos

    possam ser teis no controle da doena e na eliminao na sfilis congnita. Haja

    vista que o maior obstculo na erradicao da transmisso da sfilis congnita o

    atraso na obteno do resultado dos testes sorolgicos. A disponibilidade de um

    teste rpido, que possa ser executado no momento da consulta do pr-natal, por

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    41

    uma enfermeira treinada, pode ser custo-efetivo e prtico, em locais de elevada

    prevalncia da doena (Patel et al, 2001).

    Uma outra utilidade dos testes rpidos seria em clnicas

    psiquitricas, setores de emergncia e de atendimento de DST (Doenas

    sexualmente transmissveis), para diagnstico no momento da consulta e

    prescrio imediata (Fears e Pope, 2001).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    42

    3- OBJETIVOS

    3.1- OBJETIVO GERAL

    Verificar a viabilidade de realizao da pr-triagem e validao de

    um teste rpido para sfilis em candidatos doao de sangue de primeira vez do

    HEMOPE.

    3.2- OBJETIVOS ESPECFICOS

    Verificar a aceitao ou recusa dos doadores de primeira vez em

    submeter-se a um teste rpido para sfilis, antes da doao de sangue, no

    momento da pr-triagem, caracterizando o perfil desta populao.

    Avaliar como funcionaria o fluxo do doador no setor, o tempo de

    liberao do resultado do exame e as alteraes necessrias na infra-estrutura

    para implantao do procedimento.

    Validar um teste rpido para triagem de sfilis, em candidatos

    doao de sangue no HEMOPE.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    43

    4- CASUSTICA E MTODOS

    4.1- DESENHO DO ESTUDO

    O estudo constituiu-se de duas fases. Em um primeiro momento

    efetuou-se um corte transversal para verificar a freqncia da aceitao ou no do

    doador, quanto a uma puno venosa antes da doao. Posteriormente,

    compararam-se as caractersticas destes doadores, analisou-se o fluxo da doao

    e possveis interferncias na infra-estrutura do hemocentro.

    Na segunda etapa do estudo, voltada para validar o teste rpido

    para sfilis (Sfilis Fast), foi empregado tal procedimento diagnstico numa

    populao, de doadores de sangue, comparando-se o resultado com o do FTA-

    Abs, que foi utilizado como teste confirmatrio (padro-ouro).

    Posteriormente comparou-se tambm os resultados do Sfilis

    Fast, com o VDRL, por ser esta, a tcnica realizada de rotina na triagem de

    doadores de sangue no HEMOPE.

    4.2- DEFINIO E CATEGORIZAO DAS VARIVEIS

    4.2.1- VARIVEIS DA FASE DE AVALIAO DA PR-TRIAGEM

    Sexo: masculino ou feminino

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    44

    Idade: definida como o intervalo de tempo entre a data do nascimento e a data

    da coleta, sendo categorizada como: 18 29, 30 - 39, 40 49, 50 60 anos.

    Estado civil: situao conjugal no momento da coleta, categorizado como:

    solteiro, casado, divorciado, vivo, concubinato.

    Grau de instruo: categorizado como: analfabeto ou primeiro grau incompleto,

    primeiro grau completo, segundo grau completo, nvel superior.

    Tipo da doao: voluntria, quando o doador doava espontaneamente e de

    reposio, quando a doao era feita em nome de algum.

    Aprovao na triagem mdica: referente ao doador ter se submetido triagem

    mdica (entrevista com o mdico), ter sido aprovado e concretizado a doao ou

    ter sido reprovado e, portanto, no ter doado.

    Tempo de realizao do teste: definido como o perodo de tempo necessrio

    para liberao do resultado do exame, incluindo desde o tempo de coleta,

    centrifugao e realizao do teste propriamente dito.

    Inteno de voltar a doar: categorizado como sim ou no. Num perodo que

    variava de uma semana a trs meses aps a doao, os indivduos eram

    questionados sobre a inteno de voltar a realizar doaes de sangue, por

    telefone.

    Reincidncia da doao: categorizado como, voltou a doar ou no voltou a doar.

    Em um perodo de observao de seis meses aps a doao foi verificado quem

    realmente efetuou novas doaes.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    45

    Concordncia em realizar a pr-triagem: referente aceitao ou no do

    doador para a puno venosa antes da doao, sendo categorizado como:

    aceitao ou recusa.

    4.2.2- VARIVEIS DA FASE DE VALIDAO DO TESTE

    Presena ou ausncia de sfilis conforme o resultado dos testes

    FTA-Abs, VDRL e do teste rpido para sfilis.

    4.3- CONSIDERAES TICAS

    Antes do incio do estudo, o projeto foi protocolado sob o n

    140300 e aprovado em 12/03/2002, de acordo com a resoluo de n196/96 do

    Conselho Nacional de Sade, pelo Comit de tica em Pesquisa da Fundao

    HEMOPE, instituio onde se desenvolveu o estudo.

    A amostra para realizao do pr-teste s foi coletada aps a

    assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    46

    4.4- LOCAL DO ESTUDO

    O estudo foi realizado no Hemocentro Recife (HEMOPE). Sendo

    que no Laboratrio de Imunopatologia foram realizados os exames laboratoriais,

    na soroteca do doador, obteve-se amostras sorolgicas positivas para sfilis e,

    finalmente nos setores de Triagem e Coleta. O HEMOPE uma fundao de

    direito pblico, vinculada a Secretaria de Sade do Estado, fundada em 1977, que

    proporciona uma cobertura hemoterpica para mais de 98% da rede de sade do

    Estado. responsvel por 40% das coletas de sangue realizadas no Nordeste

    brasileiro, sendo o hemocentro de maior complexidade dentre os nordestinos

    (Sampaio, 2001), alm de cumprir as normas nacionais e controle de qualidade

    exigido pelo Ministrio da Sade do Brasil.

    4.5- POPULAO ESTUDADA

    A populao do estudo foi constituda de candidatos doao de

    sangue de primeira vez, homens e mulheres, que se apresentaram Diviso de

    Triagem do HEMOPE, no perodo de outubro / 2002 a fevereiro / 2003.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    47

    4.6- CLCULO DA AMOSTRA

    A amostra para avaliao da pr-triagem foi constituda de todos

    os doadores de primeira vez que se apresentaram para doar, nas datas pr-

    determinadas, no horrio de 13 s18 horas. Para a etapa da validao do teste, a

    amostra foi complementada com 170 soros sabidamente positivos para sfilis, pelo

    mtodo FTA-Abs, da soroteca do Hemocentro Recife.

    Para avaliar a freqncia da aceitao do procedimento de pr-

    triagem, foi realizado um teste piloto com 50 doadores, onde encontramos uma

    aceitao de 92%. A partir deste dado, utilizando o Epi-info 6.0, opo corte

    transversal, aceitando um erro de 5% e com uma confiabilidade de 99,99%,

    seriam necessrios aproximadamente 446 doadores.

    Na fase de validao, a amostra foi calculada utilizando o

    programa EPI-INFO 6.0, sendo selecionada a opo coorte no pareado e

    estudos transversais. Foram utilizados os seguintes parmetros:

    Nvel de confiana de 95%.

    Power 80%

    Trs controles para um caso

    Uma diferena entre as propores de 5%

    Resultando em aproximadamente 423 doadores considerados

    negativos para sfilis e 141 doadores com sorologia positiva (FTA-Abs). Foram

    utilizados para esta fase do estudo, 481 soros negativos e 178 positivos.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    48

    4.7- COLETA DE DADOS

    As coletas dos dados foram realizadas no perodo j referido,

    atravs do preenchimento de um formulrio contendo dados pessoais, como

    nome, idade, sexo, grau de instruo, tipo da doao, etc (anexo 2). Aps a

    obteno do consentimento livre e esclarecido, foi realizada a coleta do sangue.

    Nos doadores, que efetivamente concretizaram a doao, em que

    foi possvel o contato telefnico dentro de um perodo de uma semana a trs

    meses aps a coleta, uma rpida entrevista foi realizada, visando questionar

    sobre a inteno de voltar a doar sangue (anexo 3).

    O sistema de informtica dos setores de captao e coleta de

    sangue foi disponibilizado pelo servio pesquisadora, para esclarecimentos de

    dados e para verificao da efetuao de novas doaes pelos indivduos

    selecionados, dentro de um perodo de at seis meses aps a coleta do sangue.

    4.8- COLETA, PROCESSAMENTO E ARMAZENAMENTO DAS AMOSTRAS

    Foram colhidos por puno venosa 5 ml de sangue, utilizando-se

    tubos tipo vacutainer sem anticoagulante. Este procedimento ocorreu antes da

    doao de sangue. Aps a coleta, as amostras foram transportadas para o

    laboratrio de imunopatologia, situado um andar acima do local da pr-triagem,

    onde eram centrifugadas a 3000 rpm por 10 minutos. O teste rpido era feito e

    uma alquota com soro (1,5 ml) contendo nome do doador, cdigo do doador e

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    49

    data da coleta, era congelada a - 20C, para realizao posterior do VDRL e FTA-

    Abs.

    4.9- OPERACIONALIZAO DO ESTUDO

    O fluxo da coleta iniciava-se quando o doador se apresentava

    para doao e era recepcionado pelo setor de cadastramento, para identificao.

    Nesta etapa era classificado como doador novo ou de repetio. Aps receberem

    explicaes sobre a triagem clnica, coleta de sangue e todas as etapas pelas

    quais o sangue doado seguiria, eram questionados sobre a participao no

    estudo. Em caso afirmativo, assinavam o Termo de Consentimento Livre e

    Esclarecido e nessa ocasio aplicava-se um formulrio colhendo informaes

    pessoais. O doador seguia para a pr-triagem, local onde eram aferidos peso,

    altura, presso arterial, pulso, temperatura, dosagem da hemoglobina e coletada

    amostra sangnea para o teste rpido, nos indivduos que aceitaram participar do

    estudo. Estas amostras seriam utilizadas posteriormente para realizao do VDRL

    e FTA-Abs. Independente do resultado, o doador seguia o fluxo rotineiro da

    instituio. O candidato era submetido triagem mdica individual, os aprovados

    na triagem, doavam e, logo aps era servido o lanche. Na sala de coleta era

    recepcionado pela flebotomista, sob superviso de uma enfermeira chefe,

    efetuava a doao de 450 ml de sangue total, em bolsa plstica apropriada e 10

    ml de amostra eram coletadas em tubos pilotos para os exames laboratoriais de

    rotina para triagem de doadores.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    50

    Fluxo do Desenho

    DOADORES DE SANGUE

    SETOR DE CADASTRAMENTO

    J DOARAM DOADORES DE PRIMEIRA VEZ

    ENTREVISTA COM PESQUISADORA + ASSINATURA DO TERMO DE CONSENTIMENTO

    FLUXO ROTINEIRO

    ACEITOU PARTICIPAR

    RECUSOU PARTICIPAR

    PR-TRIAGEM TESTE RPIDO

    LANCHE

    VDRL FTA-Abs

    TRIAGEM MDICA

    APROVADO NO APROVADO

    DOAO

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    51

    4.10- DESCRIES DAS TCNICAS

    As tcnicas laboratoriais adotadas no presente estudo seguiram

    as regras gerais descritas abaixo:

    - Os reagentes no eram utilizados aps o vencimento.

    - Eram armazenados sob as circunstncias ideais determinadas por cada

    fabricante.

    - Eram colocados temperatura ambiente aproximadamente 30 minutos

    antes do uso.

    - Os reagentes de um kit no eram utilizados em outro.

    - Todas as amostras eram tratadas como potencialmente infectantes.

    - Todo material de reutilizao era adequadamente descontaminado e os de

    descarte colocados em recipientes apropriados para isto.

    O kit Sfilis Fast (Diesse Diagnostica/Alka, Itlia) uma TPHA

    modificada e foi realizada na hora da doao na maior parte da amostra. So

    utilizadas partculas de ltex sensibilizadas com antgenos especficos de T.

    pallidum (trs antgenos recombinantes- 47k, 17k, 15k). Vinte microlitros de ltex

    (partculas de ltex coloridas de azul, ligadas s protenas do T. pallidum) aps

    reconstituio com 1,1mL de gua destilada, foram misturados com 40L de soro

    do doador (aps centrifugao 10 minutos) em um crculo de uma placa onde se

    processa a reao, e submetidos rotao por oito minutos a 100 rpm em um

    rotador automtico. A leitura era executada imediatamente, a presena de um

    padro de floculao no crculo indicava um teste positivo (significando a

    presena de anticorpos contra o T. pallidum) e a ausncia de floculao,

    aparncia homognea, um teste negativo (Figura 2). As amostras positivas eram

    submetidas a diluies 1:1, 1:2, 1:4, 1:8, 1:16 e o ttulo da diluio multiplicado por

    1/40 (sensibilidade limite). A cada rotina eram includos 2 soros controles; positivo

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    52

    e negativo j contidos no teste.

    . Fig-2: desenho esquemtico do Sfilis Fast. Fonte: (http//www.alka.com.Br) O VDRL (VDRL-Brs, Laborclin) capaz de detectar reaginas ou

    anticorpos no treponmicos associados a uma infeco sifiltica. um teste de

    microfloculao que usa como antgeno uma mistura de cardiolipina, lecitina e

    colesterol dissolvido em lcool etlico. O preparo da suspenso antignica foi feito

    a cada dia de trabalho, para cada 0,4ml de salina tamponada adicionou-se 0,5ml

    de antgeno gota a gota. O antgeno suspenso em soluo salina tamponada, ao

    ser combinado com soro com anticorpos, forma floculaes que so visveis ao

    microscpio. Se positivo haver floculao. Os resultados podem ser reagentes,

    ou no reagentes, a depender da formao e tamanho dos grumos. Os soros

    reagentes eram re-testados utilizando-se o mtodo quantitativo, que nada mais

    que a diluio do soro at uma titulao final. As amostras de soros foram

    inativadas a 56C por 30 minutos. A temperatura ambiente encontrava-se entre

    http://www.alka.com.Br
  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    53

    23-29C, 50l do soro eram colocados em crculo de 14mm pertencente a uma

    lmina de vidro 50x80mm e adicionado 17l da suspenso antignica, a lmina

    era colocada no agitador por 4 minutos a 180 rpm. Os resultados eram lidos

    imediatamente no microscpio tico usando ocular e objetiva de 10x. Os testes

    reagentes eram titulados 1:1, 1:2, 1:4, 1:8, 1:16, 1:32. A cada rotina eram

    includos 2 soros controles; um reagente e outro no reagente.

    O FTA-Abs (Imunopallidum, Biolab-Mrieux) um teste de

    fluorescncia para absoro de anticorpos anti-treponemas. Foi utilizado como

    padro ouro. Utilizou-se uma suspenso liofilizada de T. pallidum de coelho como

    antgeno, que aps reidratada com gua destilada, era aplicada em lamnulas

    24x60, estas eram congeladas e retiradas temperatura ambiente a cada dia de

    trabalho. O soro do paciente era inativado 30 minutos a 56C. Em um tubo de

    ensaio as amostras eram diludas com o Sorbent na proporo 0,025ml para

    0,100ml, que nada mais , do que uma passagem por uma mistura de

    treponemas no patognicos, para remoo de anticorpos inespecficos. Aps

    adsoro, 20L desta mistura eram colocados sobre as reas delimitadas da

    lmina e incubadas em cmara mida a 37C por 30 minutos. As lminas eram

    lavadas 2 vezes, com tampo PBS, por imerso, 5 minutos cada, retirando o

    excesso de sais por rpida lavagem com gua destilada. Os anticorpos

    fluorescentes (antiglobulinas totais - Fluoline H), 20l, eram adicionados, diludos

    conforme o ttulo encontrado de 1/100. Novamente incubadas e lavadas conforme

    descrio anterior, as lminas eram montadas utilizando-se glicerina tamponada e

    lamnula. A leitura era realizada no mesmo dia e a intensidade da fluorescncia

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    54

    era medida usando microscpio ultravioleta e descrita como reao positiva (T.

    pallidum apresentando fluorescncia verde brilhante mais ou menos intensa) ou

    reao negativa (ausncia de fluorescncia ou fraca colorao esverdeada do T.

    pallidum). A cada rotina eram includos 2 soros controles: um reagente e outro

    no reagente.

    4.11- ANLISE ESTATSTICA:

    As informaes coletadas eram armazenadas no banco de dados

    do EPI-INFO (6.0). O programa Check permitiu uma verificao automtica dos

    erros ocorridos durante a entrada de dados, bloqueando, por exemplo, a entrada

    de dados numricos fora dos limites estabelecidos. Utilizou-se a dupla entrada

    dos dados e o programa Validate, permitindo a visualizao das diferenas entre

    eles, possibilitando reviso das diferenas e ajustes. Os resultados foram

    tabulados e processados pelo EPI-INFO (6.0), empregaram-se tambm, os

    softwares Word for windows, com processador de texto, para elaborao de

    tabelas, alm do excel 2000, o SPSS 11.0 e o Minitab 13 for Windows.

    A primeira parte da anlise estatstica teve por objetivo a

    descrio das variveis amostrais estudadas. Posteriormente realizou-se o

    cruzamento da varivel concordncia em fazer o teste com tipo de doao,

    sexo, grau de instruo, efetuou a doao, idade. Em todos os cruzamentos foi

    realizado o teste qui-quadrado e quando a tabela 2x2 utilizou-se o teste exato

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    55

    de Fisher, todos com objetivo de verificar a relao entre as variveis cruzadas.

    Foi calculada a mdia para variveis contnuas.

    Na fase de validao foram mensuradas a sensibilidade e

    especificidade do mtodo, de acordo com as frmulas abaixo (Figura-3).

    1-SFILIS FAST X FTA-Abs:

    FTA-Abs Total Sfilis Fast Positivo Negativo

    Positivo a b a + b Negativo c d c + d

    Total a + c b + d a + b + c + d

    Sensibilidade = a / a + c

    Especificidade = d / b + d

    2-SIFILIS FAST X VDRL:

    VDRL Total Sfilis Fast Positivo Negativo

    Positivo a b a + b Negativo c d c + d

    Total a + c b + d a + b + c + d

    Figura 3: Frmulas utilizadas para anlise do teste rpido em comparao com

    FTA-Abs e VDRL

    4.12- COEFICIENTE DE CONCORDNCIA

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    56

    Foi calculado o coeficiente de concordncia ou valor de Kappa (K)

    do teste rpido em relao a ambos os testes, FTA-Abs e VDRL, atravs da

    frmula abaixo:

    K = P0 Pe / 1 Pe

    P0 = a + d / a + b + c + d

    Pe = {(a + b)(a + c)} + {(c + d)(b + d)} / (a + b + c + d)

    Fonte: (Pereira, 1995)

    13- PROBLEMAS METODOLGICOS

    Muitos estudos de testes diagnsticos envolvem julgamentos,

    como a deciso de considerar positivo um resultado, logo sempre que possvel, a

    pessoa que interpreta os resultados no deve ter acesso a informaes

    (cegamento). O conhecimento prvio de dados sobre os indivduos testados pode

    afetar o julgamento dos resultados, ocasionando vieses. No presente estudo, no

    foi possvel este procedimento, pois foi prpria pesquisadora, que realizou todas

    as fases do estudo.

    O teste rpido foi aplicado em uma populao de indivduos

    hipoteticamente saudveis, doadores de sangue, o que pode aumentar o

    percentual de falsos positivos. O uso de testes diagnsticos para triagem em

    populaes de baixo risco, resulta em aumento relativo de resultados falsos

    positivos, levando a um baixo valor preditivo positivo de um teste reagente (Orton,

    2001).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    57

    Tendo em vista o elevado custo do estudo, foi preciso completar

    amostra para a validao com soros sabidamente positivos para sfilis da soroteca

    do HEMOPE, ento um esquema transversal de amostragem, que geralmente

    produz resultados mais vlidos e de interpretao mais fcil, no pde ser

    utilizado.

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    58

    5- RESULTADOS

    De um universo de 13.619 doadores de primeira vez que

    compareceram, durante o perodo de realizao da coleta das amostras, para

    doar sangue no Hemocentro Recife, 535 doadores foram entrevistados para o

    estudo. Alm destes, 170 amostras da soroteca do HEMOPE, conhecidamente

    positivas para sfilis (FTA-Abs positivo), foram utilizadas para completar a amostra

    da etapa de validao.

    5.1- CARACTERIZAO DA AMOSTRA PARA O ESTUDO DA VIABILIDADE DA

    PR-TRIAGEM

    As tabelas abaixo apresentam a distribuio dos doadores

    envolvidos nesta fase do estudo, de acordo com sexo, estado civil, grau de

    instruo, tipo da doao, aprovao na triagem mdica ou efetuao da doao.

    A maioria dos indivduos era do sexo masculino (66,2%), solteiros (59,3%) e

    doadores de reposio (74%) (tabelas 1, 3 e 5), com apenas 12,5% dos

    indivduos com nvel superior de escolaridade (tabela 4). A mdia de idade do

    grupo foi de 29 9,7 anos, com idade mnima de 18 e mxima de 60 anos (tabela

    2).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    59

    Tabela 1: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo o sexo N %

    Sexo Masculino 354 66,2 Feminino 181 33,8 Total 535 100,0 Tabela 2: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo a faixa etria n %

    Faixa etria 18 29 318 59,4 30 39 129 24,1 40 49 66 12,3 50 60 21 3,9 No informado 1 0,2 Total 535 100,0 Tabela 3: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo o estado civil N %

    Estado civil Solteiro 317 59,3 Casado 172 32,1 Divorciado 11 2,1 Vivo 1 0,2 Concubinato 33 6,2 No informado 1 0,2 Total 535 100,0

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    60

    Tabela 4: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo o grau de instruo N %

    Grau de instruo Analfabeto ou 1 grau incompleto 87 16,3 1 grau 128 23,9 2 grau 253 47,3 Nvel superior 67 12,5 Total 535 100,0 Tabela 5: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo o tipo da doao n %

    Tipo da doao Voluntria 138 25,8 Reposio 396 74,0 No informado 1 0,2 Total 535 100,0

    A maior parte dos indivduos entrevistados, 66%, foram

    posteriormente aprovados pela triagem mdica e concretizaram a doao.Trinta e

    quatro por cento foram reprovados, por motivos variados como: uso de

    medicamentos, desproporo peso/altura, hemoglobina baixa, promiscuidade,

    entre outros (tabela 6).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    61

    Tabela 6: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de Outubro/2002 a Fevereiro/2003, segundo a aprovao na triagem mdica N %

    Aprovao na triagem mdica Aprovado 353 66,0 Recusado 182 34,0 Total 535 100,0 5.2- ANLISE DA ACEITAO DO PROCEDIMENTO DE PR-TRIAGEM

    Dos 535 doadores entrevistados para a pesquisa, 492 (92%)

    concordaram em realizar o exame de sangue antes da doao, 43 (8%) se

    recusaram a submeter-se coleta sangnea pr- doao.

    Dos que aceitaram a pr-triagem, em 3 no foi possvel se obter a

    amostra: dois por dificuldade de puno venosa e 1 por queixar-se de mal-estar

    92%

    8%

    SimNo

    Figura 4 - Percentual de candidatos doao de sangue de primeira vez que

    aceitaram realizar a pr-triagem para sfilis

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    62

    durante o procedimento. Resultando num percentual de 0,6% de complicaes

    inerentes ao procedimento de uma puno venosa comum.

    Os resultados do questionamento por telefone sobre a inteno

    de voltar a doar sangue, dos 244 doadores os quais se conseguiu contato

    telefnico, 87,7% manifestaram a inteno de voltar a doar, contra 12,3% que no

    gostariam de repetir a doao (tabela 7). Em um perodo de observao de at 6

    meses aps a primeira doao, dos 492 indivduos que aceitaram submeter-se

    pr-triagem, 61 ou 12,4% efetivamente voltaram a doar sangue, alguns mais de

    uma vez.

    Tabela 7: Distribuio dos candidatos doao de primeira vez do Hemocentro Recife, entrevistados no perodo de uma semana a trs meses aps a doao, quanto inteno de realizar novas doaes n %

    Inteno em realizar outras doaes

    Sim 214 40,0 No 30 5,6 No contactado 291 54,4 Total 535 100,0

    5.3- PERFIL DO DOADOR DE PRIMEIRA VEZ QUE CONCORDOU EM REALIZAR A PR-TRIAGEM

    Numa tentativa de encontrar uma relao entre aceitao ou

    recusa em realizar pr-triagem para sfilis e o perfil do candidato doao de

    primeira vez, foram realizadas as seguintes anlises comparativas:

    No grupo de doadores voluntrios, 94,9%, aceitaram a realizao

    da puno venosa antes da doao e no grupo de doadores de reposio 90,9%.

    No houve diferena estatisticamente significante (p=0,150) (tabela 8).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    63

    Tabela 8: Distribuio de freqncia da aceitao ou recusa dos doadores em realizar a pr-triagem, quanto ao tipo da doao.

    Concordncia em realizar a pr-triagem Tipo da doao Aceitao Recusa Total n % n % n %

    Voluntria 131 94,9 7 5,1 138 25,8 Reposio 360 90,9 36 9,1 396 74,2

    Total 491 43 534* 100,0 Teste exato de Fisher p=0,150 * Um doador a informao foi perdida

    Cerca de 90,9% dos doadores do sexo masculino e 93,9% do

    sexo feminino aceitaram o exame, no havendo diferena (p= 0,313).

    Tabela 9: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos doadores em realizar a pr-triagem quanto ao sexo.

    Concordncia em realizar a pr-triagem Sexo doador Aceitao Recusa Total

    n % n % n % Masculino 322 90,9 32 9,1 354 66,2 Feminino 170 93,9 11 6,1 181 33,8

    Total 492 43 535 100,0 Teste exato de Fisher p=0,313

    Quanto ao grau de instruo, tambm no houve diferena na

    concordncia em submeter-se ao teste, valor de p de 0,328 (tabela 10). A varivel

    faixa etria no pode ser avaliada, pois o teste de significncia no foi vlido

    (tabela 11).

    Tabela 10: Distribuio da freqncia da aceitao dos doadores em realizar a pr-triagem quanto ao grau de instruo

    Concordncia em realizar a pr-triagem Grau de instruo Aceitao Recusa Total

    n % n % n % Analfabetos ou 1 grau incompleto 76 87,3 11 12,7 87 16,3

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    64

    1 grau completo 120 93,7 8 6,3 128 23,9 2 grau completo 233 92,1 20 7,9 253 47,3

    Nvel superior 63 94,0 4 6,0 67 12,5 Total 492 43 535 100,0

    ? = 3,44 p=0,328

    Tabela 11: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos doadores em realizar a pr-triagem quanto faixa etria.

    Concordncia em realizar a pr-triagem Faixa etria Aceitao Recusa Total

    n % n % n % 18 30 297 93,4 21 6,6 318 59,6 31 40 118 91,5 11 8,5 129 24,1 41 50 56 84,8 10 15,2 66 12,4 50 60 20 95,2 1 4,8 21 3,9

    Total 491 43 534* 100,0 ? = no aplicvel

    * Um doador a informao foi perdida

    Quanto aos diferentes estados civis, observa-se que a

    distribuio dos doadores que aceitaram ou recusaram o procedimento de pr-

    triagem, foi semelhante, porm o teste de significncia no foi vlido, por conter

    baixas freqncias em alguns estados civis (tabela 12).

    Tabela 12: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos doadores em realizar a pr-triagem quanto ao estado civil

    Concordncia em realizar a pr-triagem Estado civil Aceitao Recusa Total

    n % n % N % Solteiro 296 93,4 21 6,6 317 59,4 Casado 154 89,5 18 10,5 172 32,2

    Divorciado 8 72,7 3 27,3 11 2,0 Vivo 1 100 0 0 1 0,2

    Concubinato 32 97 1 3 33 6,2 Total 491 43 534* 100,0

    ? = no aplicvel

    * Um doador a informao foi perdida

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    65

    Na varivel aprovao na triagem mdica, no foi observada, tambm, diferena estatisticamente significativa entre aceitar o procedimento em estudo, ou no e ser aprovado na triagem mdica para concretizar a doao (p=0,153) (tabela 13).

    Tabela 13: Distribuio da freqncia da aceitao ou recusa dos doadores em realizar a pr-triagem quanto aprovao na triagem mdica.

    Concordncia em realizar a pr-triagem Triagem mdica

    Aceitao Recusa Total

    N % n % n % Aprovado 320 90,6 33 9,4 353 66,0

    Reprovado 172 94,5 10 5,5 182 34,0 Total 492 43 535 100,0

    Teste exato de Fisher p=0,133

    5.4- ANLISE DO FLUXO DA DOAO

    A mdia de tempo de execuo do teste foi de 23,60 3,11 minutos estando j calculados neste intervalo os tempos de coleta da amostra, a centrifugao, o perodo de 8 minutos no agitador mecnico e a leitura imediata do teste.

    5.5- CARACTERIZAO DA AMOSTRA PARA O ESTUDO DE VALIDAO DO

    TESTE

    Nesta fase foram utilizadas 489 amostras de doadores que

    aceitaram submeter-se a pr-triagem, alm dos 170 soros da soroteca.

    Perfazendo um total de 659 amostras, sendo 481 soros negativos e 178 positivos,

    de acordo com o padro-ouro, FTA-Abs.

    5.6- FASE DE VALIDAO DO TESTE RPIDO PARA SFILIS:

    Os resultados da validade do teste rpido (Sfilis Fast), atravs da

    comparao com o padro ouro FTA-Abs, mostaram uma concordncia de 92,4%

    entre os dois testes. Aferiu-se uma sensibilidade de 93,41% IC (92,04 98,97) e

    especificidade de 98,32% IC (94,86 100), para o teste rpido (tabela 14).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    66

    Tabela 14: Comparao diagnstica entre o Sfilis Fast e o padro ouro FTA-

    Abs

    FTA-Abs

    Sfilis Fast Positivo Negativo Total %

    Positivo 170 12 182 27,6

    Negativo 8 469 477 72,4

    Total 178 481 659 100,0

    Kappa= 0,924 IC (0,89 0,96)

    O teste rpido apresentou um total de 12 resultados falso-

    positivos e 8 considerados como falso-negativos (Tabela 14).

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    67

    Foi estabelecida uma comparao com o teste utilizado na rotina

    da triagem sorolgica dos doadores no HEMOPE, o VDRL. Encontrou-se uma

    concordncia de 91,6 %, do Sfilis Fast em relao ao VDRL (tabela 15).

    Tabela 15: Comparao diagnstica entre o Sfilis Fast e o VDRL

    VDRL Sfilis Fast Positivo Negativo Total %

    Positivo 168 14 182 27,6 Negativo 8 469 477 72,4

    Total 176 483 659 100,0 Kappa= 0,916 IC (0,88 0,951)

  • Claudia Wanderley de Barros Correia

    68

    6- DISCUSSO

    De acordo com estimativa da OMS, 386 milhes de novos casos

    curveis de doenas sexualmente transmissveis ocorrem a cada ano, dos quais

    80 a 90% esto nos pases em desenvolvimento, onde coexistem pobreza e

    dificuldade de acesso aos servios de sade (SDI, 2003).

    A sfilis no Brasil ainda um problema de sade pblica. Nos

    ltimos anos, verificou-se uma tendncia ao declnio na sua mortalidade em todas

    as regies brasileiras, principalmente no tocante as formas no congnitas, em

    decorrncia, talvez da diminuio da letalidade da doena, pela possibilidade de

    tratamento. Contudo nveis inaceitavelmente altos de prevalncia esto se

    mantendo e a mortalidade por lues congnita at aumentou em alguns estados

    mais pobres (Lima, 2002).

    Apesar de rara, a transmisso da sfilis por transfuso de sangue possvel, sendo um problema diretamente proporcional prevalncia da infeco na comunidade, de onde procedem, os doadores (Choudhury e Phadke, 2001). Pelo fato da sorologia positiva para lues indicar comportamento de risco, tem sido questionada como possvel marcador para doenas sexualmente transmissveis, do tipo hepatite B e SIDA (Ramsey et al, 1991; Serrano, 1991; Matee et al, 1999; Gupta e Ramos, 2002).

    A sfilis a segunda causa de inaptido sorolgica em doadores

    de sangue do HEMOPE, ficando atrs apenas do anti-HBc (ANVISA, 2002), fato

    que se agrava nos doadores de primeira vez. A triagem clnica inclui normalmente

    a realizao de um teste rpido para verificao do hematcrito ou hemoglobina,

    determinando se o doador tem anemia, a entrevista mdica e o exame clnico.

    Alguns bancos de sangue incluem ainda, um teste rpido para hemoglobina S,

    sugerido pelo Ministrio da Sade, atravs da portaria n. 1376.