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747 IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA Estabilização de talude no Gasoduto Bolívia-Brasil – Caso de Obra Oliveira, H.R. Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil - TBG, Florianópolis, SC, Brasil, [email protected] Vasconcellos, C.R.A. Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil - TBG, Florianópolis, SC, Brasil, [email protected] Silva, S.R.B. Geoprojetos, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected] Santos, C. Tecnosonda, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected] Resumo: O Gasoduto Bolívia-Brasil tem início na cidade de Santa Cruz da La Sierra, na Bolívia, chegando até Canoas (RS), no Brasil, percorrendo uma extensão de 3.150km. O gasoduto atravessa nos 2.593km implantados em solo brasileiro, os mais variados tipos de geologia e geomorfologia. Ao longo do traçado, o gasoduto atravessa também diversas estradas, ferrovias, rios e lagos. Durante inspeção de rotina, foram detectados sinais de instabilidade junto ao talude em aterro de uma rodovia estadual de Santa Catarina, no cruzamento com o gasoduto. Uma eventual ruptura deste talude poderia colocar o gasoduto em risco. O objetivo deste artigo é apresentar os principais aspectos das etapas de estabilização, desde as fases de investigações, projeto, execução da obra, instrumentação, até o monitoramento. São enfatizados os critérios de projeto relacionados a segurança do gasoduto. A solução adotada é composta por solo grampeado, retaludamento e drenagem superficial. Abstract: The Bolivia-Brazil Natural Gas Pipeline starts at Santa Cruz de La Sierra city, in Bolivia, and goes until Canoas City (RS) in Brazil, with a total extent of 3,150km. The pipeline crosses in the 2,593km established in Brazilian soil, the most diverse types of geology and geomorphology. Along the line, the pipeline also crosses a lot of roads, railways, rivers and lakes. During a routine inspection, signs of instability were detected at an embankment slope of a highway of the Santa Catarina state, at the pipeline crossing. An eventual failure of this slope could put the pipeline at risk. The aim of the paper is present the aspects of the stabilizations phases, since field investigation, design, works, instrumentation, until monitoring. Emphasis is given to the design criteria to pipeline safety. The solution adopted is composite by soil nailing, a changing of slope inclination and superficial drainage system.

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Page 1: Estabilização de talude no Gasoduto Bolívia-Brasil – Caso ... · NBR11682. (1991) Estabilidade de Taludes. ABNT, Rio de Janeiro, 39p. Oliveira, H.R. e Vasconcellos, C.R.A. (2004)

747IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA

Estabilização de talude no Gasoduto Bolívia-Brasil –Caso de Obra

Oliveira, H.R.Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil - TBG, Florianópolis, SC, Brasil,[email protected]

Vasconcellos, C.R.A.Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil - TBG, Florianópolis, SC, Brasil,[email protected]

Silva, S.R.B.Geoprojetos, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected]

Santos, C.Tecnosonda, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected]

Resumo: O Gasoduto Bolívia-Brasil tem início na cidade de Santa Cruz da La Sierra, na Bolívia,chegando até Canoas (RS), no Brasil, percorrendo uma extensão de 3.150km. O gasoduto atravessanos 2.593km implantados em solo brasileiro, os mais variados tipos de geologia e geomorfologia. Aolongo do traçado, o gasoduto atravessa também diversas estradas, ferrovias, rios e lagos. Duranteinspeção de rotina, foram detectados sinais de instabilidade junto ao talude em aterro de uma rodoviaestadual de Santa Catarina, no cruzamento com o gasoduto. Uma eventual ruptura deste taludepoderia colocar o gasoduto em risco. O objetivo deste artigo é apresentar os principais aspectos dasetapas de estabilização, desde as fases de investigações, projeto, execução da obra, instrumentação,até o monitoramento. São enfatizados os critérios de projeto relacionados a segurança do gasoduto.A solução adotada é composta por solo grampeado, retaludamento e drenagem superficial.

Abstract: The Bolivia-Brazil Natural Gas Pipeline starts at Santa Cruz de La Sierra city, in Bolivia, andgoes until Canoas City (RS) in Brazil, with a total extent of 3,150km. The pipeline crosses in the2,593km established in Brazilian soil, the most diverse types of geology and geomorphology. Alongthe line, the pipeline also crosses a lot of roads, railways, rivers and lakes. During a routine inspection,signs of instability were detected at an embankment slope of a highway of the Santa Catarina state,at the pipeline crossing. An eventual failure of this slope could put the pipeline at risk. The aim of thepaper is present the aspects of the stabilizations phases, since field investigation, design, works,instrumentation, until monitoring. Emphasis is given to the design criteria to pipeline safety. Thesolution adopted is composite by soil nailing, a changing of slope inclination and superficial drainagesystem.

Page 2: Estabilização de talude no Gasoduto Bolívia-Brasil – Caso ... · NBR11682. (1991) Estabilidade de Taludes. ABNT, Rio de Janeiro, 39p. Oliveira, H.R. e Vasconcellos, C.R.A. (2004)

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1 INTRODUÇÃO

O Gasoduto Bolívia-Brasil tem início na cidadede Santa Cruz da La Sierra, na Bolívia, chegan-do até Canoas (RS), no Brasil, percorrendo umaextensão de 3.150km. O gasoduto atravessa nos2.593km implantados em solo brasileiro, os maisvariados tipos de geologia e geomorfologia. Aolongo do traçado, o gasoduto atravessa tam-bém diversas estradas, ferrovias, rios e lagos.Durante inspeção de rotina após chuvas inten-sas, foram detectados sinais de instabilidadejunto ao talude em aterro de uma rodovia esta-dual de Santa Catarina, com cerca de 13m dealtura, no cruzamento com o gasoduto. Umaeventual ruptura deste talude poderia colocar ogasoduto em risco.

Detectado o problema, a TBG iniciou umprograma de investigações geotécnicas e ini-ciou os estudos de estabilização do talude.

A Figura 1 apresenta uma vista aérea do ta-lude no cruzamento entre o gasoduto e a rodo-via, após a ocorrência de instabilidades locali-zadas. O gasoduto neste local tem 18" de diâ-metro e opera com pressão interna máxima de75 kgf/cm2.

Os sinais de instabilidade detectados foramescorregamentos superficiais e sulcos erosivos,além de uma fenda de tração no acostamentoda rodovia.

Figura 1: Vista geral do talude

2 INVESTIGAÇÕES GEOTÉCNICAS

Uma linha em branco deve separar a última li-nha do parágrafo anterior da linha do Título denível 2, digitado em letras minúsculas e com afonte de 11 pontos.

Deixar uma linha em branco e iniciar adigitação do texto seguindo a mesma recomen-dação do item anterior.

2 CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA

Para caracterização geotécnica e posterior ava-liação da segurança do talude, foi realizada umacampanha de sondagens à percussão.

Todas as sondagens executadas indicarama presença de camada superficial de aterro, clas-sificado como silto-argilo-arenoso, espessuravariando de 1,60 a 2,95m, SPT entre 2 e 8, commédia 4. Nas sondagens SP-03 e SP-06, encon-trou-se camada coluvionar com espessura daordem de 4,0m, constituída por material argilo-silto-arenoso, com pouca matéria orgânica, SPTentre 4 e 9, com média 6, estendendo-se até asprofundidades de 6,80m e 5,90m, respectivamen-te. Subjacentemente a essas camadas descritasacima encontra-se solo residual classificadocomo silte-areno-argiloso / silto-arenoso, SPTentre 17 e 70/17, com média 46, estendendo-seaté profundidades variando entre 7,33 e 10,20m(Geoprojetos, 2002).

3 ANÁLISES DE ESTABILIDADE

Com base na topografia e nas sondagens reali-zadas, foi definido um modelo geológico-geotécnico do talude.

Como o tempo disponível para o estudo nãopermitiu a realização de ensaios, os parâmetrosgeotécnicos foram estimados com base em umaretroanálise a na experiência da Projetista.

A Figura 2 apresenta a seção com a retroaná-lise, que está localizada sobre o gasoduto.

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Figura 2: Resultado da retroanálise.

Com base nos parâmetros obtidos naretroanálise, foram desenvolvidas análises deestabilidade para as condições atuais do talu-de. O fator de segurança global obtido foi de1,12, considerado baixo da situação de segu-rança requerida para gasodutos (NBR 11682,1991).

Com vistas a melhorar as condições de se-gurança do talude, foram analisadas diversassoluções de estabilização, sendo que a maisadequada inicialmente foi a execução de um“muro de terra” (Figura 3). O fator de seguran-ça para esta alternativa foi de 1,40.

Figura 3: Fator de segurança do talude estabilizado com“muro de terra”.

Apesar desta solução ter sido a mais indicadapara a estabilização do talude, quando analisadoo efeito desta obra sobre o gasoduto, essa alter-nativa teve de ser reavaliada. O peso de solo do

muro de terra traria um excesso de carga no duto,que poderia sofrer recalques e conseqüentemen-te ser submetido a tensões excessivas.

4 PROJETO DE ESTABILIZAÇÃO

Na reavaliação do projeto de muro de terra, foianalisada a possibilidade de execução de muro àflexão, cortina atirantada e solo grampeado na re-gião do talude sobre o duto, de tal forma que nãofossem adicionadas cargas adicionais ao duto.

Do ponto de vista técnico-econômico, a exe-cução de um solo grampeado foi a mais indicada,pois apresentou as seguintes vantagens:

- execução mais simples (menor aplicaçãode formas, concreto e aço; equipamentosrelativamente simples, etc);

- menor custo;- possibilidade de manter a geometria atual

do talude sobre o duto;- perfuração simples com circulação de

d’água: tirantes são geralmente executa-dos com perfuratrizes rotativas que po-dem atingir e danificar o duto;

Frisa-se que somente na região acima do dutoé que seria necessária a estabilização com sologrampeado, sendo que nas laterais a solução maisadequada continuaria sendo o muro de terra.

O fator de segurança obtido para a seçãoem solo grampeado foi 1,47 (Figura 4).

Figura 4: Fator de segurança do talude estabilizado com“solo grampeado”.

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A Tabela 1 apresenta os principais dados daobra (altura média de 13m).

Tabela 1: Dados da obra.

5 EXECUÇÃO DA OBRA

As figuras 5 a 8 apresentam algumas dasprincipais etapas da execução da obra.

Figura 5: Instalação dos chumbadores na crista.

Figura 6: Instalação de malha (5mm/10x10cm) sobrechapisco de argamassa.

Figura 7: Execução do concreto projetado (7cm).

Figura 8: Vista geral da obra concluída.

A Figura 9 apresenta uma seção transversalpassando pelo duto. Sobre a linha do duto, nãoforam instalados chumbadores, e foi respeitadoum afastamento mínimo de 1,50m para evitar to-ques no duto. Ainda que houvesse desvios daperfuração, o impacto seria mínimo, pois a perfu-ração foi executada com trado manual e o dutoencontra-se protegido com um tubo camisa (tubode maior diâmetro externo ao duto em operação).

Figura 9: Detalhe de haste de monitoramento de deslo-camento em dutos.

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6 INSTRUMENTAÇÃO

Toda obra de estabilização que envolva umoleoduto ou um gasoduto merece atenção es-pecial quanto à instrumentação.

Um aspecto diz respeito ao comportamentodo maciço e outro ao comportamento do dutoface às obras de estabilização e o seu desempe-nho.

A instrumentação de maciços de solo é alta-mente conhecida. Já a instrumentação de dutostem se tornado mais importante à medida quealguns acidentes geotécnicos ocasionaram da-nos em dutos no Brasil e no mundo (Oliveira,2004).

Em dutos, a principal forma de instrumentaçãoé realizada com strain-gauges (extensômetros),que são utilizados para monitorar as variaçõesde tensão na parede do duto (Sandroni, 2004).Entretanto, nem sempre se dispõe dos equipa-mentos de maneira rápida e pessoal especializa-do para instalação destes componentes. Alémdisso, para uma melhor avaliação da segurançado duto, é necessário medir o estado de tensõesreinante no duto, cujo procedimento mais ade-quado é o “furo cego”. Fillipin apud Oliveira etal (2004) apresentaram o uso da técnicaextensiométrica denominada “furo cego”(ASTM, 2001), para avaliação e análise detensionamento em dutos e sua correlação comefeitos devido a movimentação de solo.

Uma alternativa para monitorar o comporta-mento de dutos é a instalação de abraçadeiras ehastes para monitoramento topográfico do duto.Este procedimento tem sido utilizado com su-cesso em diversas obras no sul do Brasil (Figura10).

A obra em tela foi instrumentada com 3inclinômetros e quatro hastes fixadas do duto.Os movimentos lidos tanto nas hastes quantonos inclinômetros até o presente momento, sãoinsignificantes, comprovando o desempenho daobra de estabilização executada.

Figura 10: Detalhe de haste de monitoramento de des-locamento em dutos.

7 CONCLUSÕES E PROPOSTAS

A obra executada em muro de terra e solo gram-peado garantiu a estabilização do talude e con-seqüentemente a integridade do duto.

O monitoramento do talude e duto com ainstrumentação instalada vem mostrando queos deslocamentos do talude e do próprio dutosão mínimos, comprovando o desempenho daobra de estabilização executada.

Os principais aspectos levantados neste tra-balho é que, durante a execução de uma obra deestabilização de encosta que envolva dutos,deve-se sempre avaliar o comportamento daobra pretendida e o comportamento do duto.Um erro de projeto numa obra deste tipo podecolocar em risco outra estrutura, no caso, osdutos.

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Outro aspecto desta obra é que, além dostestes usuais de arrancamento de chumbadorespara certificação da qualidade, foram implanta-dos mais dois chumbadores que serão ensaia-dos (arrancados) posteriormente, em cerca de 5anos. O objetivo será conhecer a influência dotráfego da rodovia nos chumbadores. Imagina-se que essas vibrações possam descolar a cal-da de preenchimento do furo do solo, conse-qüentemente, reduzindo o fator de segurançada obra (avaliação de longo termo no fator desegurança em análises de estabilidade).

8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASTM (2001). Standard Test Method forDetermining Residual Stresses by the Hole-Drilling Strain Gage Method – E 837.

FILLIPIN, G.. (2004) Medição dos níveis de ten-sões residuais em duto no Labmetro – UFSC.Technical Report: LACTEC Residual Stress– nº 64, Florianópolis.

Geoprojetos. (2002) Projeto Executivo de Esta-bilização de Aterro. Rio de Janeiro, 14p.

Geoprojetos. (2004) Projeto de Estabilização deEncosta. Rio de Janeiro, 12p.

NBR11682. (1991) Estabilidade de Taludes.ABNT, Rio de Janeiro, 39p.

Oliveira, H.R. e Vasconcellos, C.R.A. (2004) Ris-cos geotécnicos no Gasoduto Bolívia-Bra-sil. Anais do IV Simpósio de Prática de En-genharia Geotécnica da Região Sul –GEOSUL. Curitiba, 199-206.

Sandroni, S. (2004) Instrumentação geotécnicapara monitoramento de tubulações de açoque atravessam línguas coluviais no sudes-te brasileiro. Proc. V Seminário de Engenha-ria de Fundações Especiais e EngenhariaGeotécnica - SEFE, Vol. 1, São Paulo, 233-250.

Oliveira H.R., Freitas, J.C. e Vasconcellos. C.R.A(2004) A historical case in the Bolívia-BrazilNatural Gas Pipeline: slope at Curriola River.Proc. International Pipeline Conference, Ca-nadá, CD-ROM.