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Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

do Titulo

MESTRE EM LINGÜÍSTICA

Ârea de Concentração: Lingüística Aplicada, pelo Programa de

Pós-Graduação.

Profi Dri Maria Marta Furlanetto

Coordenadora da Pós-Graduação em

Lingüística

'X

Profã Dxí^Hilda Gomes Vieira

Orientadora

Apresentada à Banca Examinadora:

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CONVENÇÕES

1. Abreviaturas que aparecem nesta dissertação:

EP = Experiência Pessoal

EV = Experiência Vicária

T = Total

S = Sinopse

0 = Orientação

AC = Ação Complicadora

A = Avaliação

R = Resolução

C = Coda

A = grupo de 20 informantes formado por alunos da

8â série do lo grau.

B = grupo de 20 informantes formado por alunos da

3â série do 2Q grau.

M = Masculino

F = Feminino

2. Numeração: Números de 01 a 20, referem-se aos in

formantes do grupo A e de 21 a 40 referem-sej , aos informan

tes do grupo B.

3. Notações que aparecem antes de partes de narrat_i

Page 6: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

va ou de narrativa completa: por exemplo EP A 20 F, significa

que é uma narrativa de experiência pessoal produzida pelo in

formante do sexo feminino, número 20, do grupo A.

4. As letras do alfabeto (a a ^ a que apare­

cem antes das orações, como, por exemplo:

aa e o cobrador colocou o meu irmão no colo

bb e levou-o para a grama,

servem apenas para identificação das orações narrativas de

qualquer tipo. Este critério da identificação segue o utili

zado por Labov e Waletzky (1967) na apresentação do modelo.

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RESUMO

O objetivo desta dissertação é a análise da estrutura

de narrativas escolares escritas produzidas por dois grupos de

informantes (A eB) em duas situações de produção: narrativas

de experiência pessoal (EP) e narrativas de experiência vicã

ria (EV) , ã luz do modelo de análise proposto por Labov/Wale_t

zky (1967) e confirmado por Labov (1972).

Trata-se de um estudo comparativo do desempenho da

produção de textos narrativos dos dois grupos de informantes,

formados por alunos da 8§ série do le grau (grupo A) e por

alunos da 3§ série do 2Q grau (grupo B); e da complexidade es

trutural de narrativas de experiência pessoal e de experiên

cia vicária.

0 estudo comparativo foi efetuado sob os aspectos qua

litativo e quantitativo..

Os resultados apontam que os informantes da presente

pesquisa, tanto os do grupo A quanto os do grupo B, já produ

zem textos narrativos e que as narrativas produzidas em situa

ção de produção EP apresentam maior complexidade estrutural

do que as narrativas produzidas em situação de produção EV.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ........................................................ 01

1.1. Motivação para a escolha do assunto ......................... 01

1.2. Objetivo da pesquisa ........................................ 02

1.3. Hipóteses ................................................... 05

1.4. Escolha do estabelecimento de ensino ........................ 06

1.5. Informantes ................................................. 07

1.6. Procedimento da coleta de dados ............................. 08

1.7. Estrutura desta dissertação ................................. 08

2. ABORDAGEM LINGÜÍSTICA DA NARRATIVA................................. 10

2.1. Preliminares ................................................ 10

2.2. Modelo de análise de narrativas proposto por

Labov/Waletzky (1967) e Labov (1972) ........................ 11

2.2.1. Definição da narrativa ............................. 11

2.2.2. Estrutura da narrativa ............................. 14

2.2.3. Seções estruturais da narrativa: definição

e funções .......................................... 16

2.2.4. Funções da narrativa na situação de_. comuni^

cação .............................................. 24

2.2.5. Reportabilidade e credibilidade .................... 28

2.3. Teoria de Weinrich ..... .................................... 30

2.3.1. Atitude de locução ................................. 31

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2.3.2. Prospectiva de locução ............................. 32

2.3.3. Relevo ............................................. 33

3. ANÁLISE DAS NARRATIVAS ............................................ 36

3.1. Abordagem da estrutura global da narrativa nas

duas situações EP e EV ..36

3.2. Pseudo-narrativas ........................................... ..67

3.3. Ciclo narrativo; texto com mais de uma narrativa 73

3.4. Análise quantitativa ........................................ ..75

3.4.1. Avaliação da hipótese 1 ............................ 84

3.4.2. Avaliação da hipótese 2 ............................ 88

3.4.3. Conclusão do capítulo .............................. 94

4. SEÇÕES ESTRUTURAIS DA NARRATIVA ................................... 98

4.1. Caracterização do bloco narrativo formado pelas

seções: Orientação, Complicação da Ação e Resolu­

ção ......................................................... 98

4.1.1. Orientação ......................................... 98

4.1.2. Ação Complicadora e Resolução ...................... 106

4.2. Caracterização do bloco narrativo formado pelas

seções Sinopse, Avaliação e Coda ............................ 118

4.2.1. Sinopse ............................................ 118

4.2.2. Avaliação .......................................... 122

4.2.2.1. Avaliação, como estrutura primá­

ria ..................................... 123

4. 2.2.2. Avaliação, como estrutura secun­

dária ................................... 124

4.3. Coda ........................................................ 138

4.4. Conclusões do capítulo ...................................... 142

Page 11: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

5. CONCLUSAO ........................................................ 146

BIBLIOGRAFIA ......................................................... 150

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1. INTRODUÇÃO

1.1. Motivação para a escolha do assunto.

Pressupondo-se que a função da escola, na área de lin

guagem, é introduzir o educando no mundo da escrita e torná-lo

capaz de empregar este instrumento de comunicação de forma ade

quada, numa sociedade que valoriza este tipo de conhecimento,

é que se pensou em efetuar um trabalho com textos escritos.

A preocupação com a dificuldade de escrever pela maio

ria dos alunos motivou a pesquisa, pois se acredita ser esta

capaz de apontar caminhos e possíveis soluções para amenizar

este problema que angustia todos quantos estejam envolvidos com

o processo ensino-aprendizagem.

Decidido trabalhar com textos escritos, restava selec_i

onar o tipo de texto. Optou-se por narrativas. Por que narrat_i

vas? Interessava, por um lado, o fenômeno de se poder, através

do discurso, reconstituir uma realidade que se transforma. Por

outro lado, a experiência pedagógica apontava para o privilégio

da narrativa no exercício escolar da produção escrita.

Além disso, é sabido que contar história é um comporta

mento humano característico; ouve-se e conta-se histórias desde

pequenos.

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1.2. Objetivo da Pesquisa

Esta dissertação pretende ser um estudo da estrutura

de narrativas escolares escritas produzidas por dois grupos de

informantes (Â e B) em situação de produção de narrativas de

experiência pessoal (EP) e narrativas de experiência vicária (EV).

Trata-se de uma estudo comparativo do desempenho da produção

de textos narrativos dos dois grupos, formados por alunos de

8§ série do IQ grau (grupo A) e por alunos de 3â série do 2Q

grau (grupo B) nas duas situações de produção de narrativa

(EP e EV) e da complexidade estrutural de narrativas de experi

ência pessoal e narrativas de experiência vicária.

Pretende-se estudar a estrutura narrativa sob dois as­

pectos :

a) aspecto qualitativo, onde se estuda os elementos for

mais que caracterizam as várias seções estruturais da narrativa.

b) aspecto quantitativo: onde se estuda a freqüência

das várias seções da narrativa.

Um exame de alguns trabalhos referentes ã narração le

vou aos estudos de Propp (1965), Lévi-Strauss (1970), Barthes

(1971) , William Labov/Joshua WaletzIcY (1967) e Labov (1972) .

Dentre eles, os de Labov/Waletzky (1967) e Labov (1972) foram os

que mais se aproximaram da análise que se pretendia realizar,

que consta de uma investigação da estrutura de narrativas es­

critas produzidas por alunos do IQ e 2e graus.

Todos os trabalhos examinados apresentam reflexões so

bre narrativas, mas com exceção do trabalho de Labov / Waletzky

(1967) e Labov (1972) , nenhiim outro oferece análise dos elemen

tos lingüísticos que compõem a narrativa.

A sucessão temporal de que fala Propp (1965), ou os d^

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ferentes significados que uma ação pode adquirir na narrativa,

conforme ele propõe não estão fundamentados com elementos for

mais da linguagem.

Lévi - Strauss (1970) em seu estudo sobre omito, encara

-o como uma forma de discurso que deve ser pesquisada acima do

nível habitual da expressão lingüística, representando mais

uma análise do pensamento mítico do que propriamente da narra

ção mítica.

O trabalho de Barthes (1971), embora se proponha como

partindo da Lingüística, opera com conceitos intuitivos e de

difícil detecção no plano de iima análise concreta. Isto não di

minui a importância e a riqueza de sua reflexão sobre a narra

tiva, mas esta abordagem não ajuda a empreender uma descrição das

características lingüísticas da narrativa.

Para o propósito desta pesquisa, e em decorrência das

diferenças na perspectiva de abordagens, as análises destes au

tores, acabaram por se definir na bibliografia lida apenas co

mo xima leitura extra do fenômeno da narração, mas que não viria

a intervir diretamente nas análises efetuadas.

Ao contrário, os estudos de Labov e Waletzky apóiam-se

numa metodologia que se propõe todo o tempo científica e apre

sentam, de forma efetiva, noções, conceitos e procedimentos,

propriamente lingüísticos. A própria compreensão do objeto faz

necessariamente incluir na análise, conceitos e noções estrita

mente lingüísticos (tais como: verbos, orações, coordenaçãcy su

bordinação, restrição, mecanismos sintáticos, etc ...), presen

te todo o tempo na análise destes autores.

Atualmente, muitas são as adesões ãs correntes do pen

sarnento lingüístico de que é necessário ampliar-se o escopo de

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exame e reflexão da ciência lingüística (que nas grandes ver

tentes tem-se limitado à Frase), assim se propõe o presente e^

tudo da narrativa escrita numa situação determinada de fala,

qual seja, o narrador estar consciente de que escreve para um

narratário.

Como esta dissertação pretende ser um estudo da narra

tiva sob o ponto de vista lingüístico, procurou-se adotar um

modelo de análise que atendesse a este objetivo, e a abordagem

de Labov e Waletzky pareceu o modelo de análise mais adequado,

já que evidencia a estrutura narrativa e se presta, também, ã

efetivação do estudo comparativo que se pretende.

Embora seja um modelo aplicado a narrativas orais, para

afastar a dúvida da validade de aplicar-se este modelo de aná

lise a narrativas escritas, buscou-se apoio na tese de Kato

(1987; 9): " defendi a tese da isoformia e da isofuncionalida

de parcial entre a fala e a escrita", ou ainda, quando esta me^

ma autora afirma;

"a conclusão natural é de que a teoria da apren dizagem da escrita não pode ser algo totalmen te independente de uma teoria da aquisição".

(Kato, 1987: 137).

Portanto, a reflexão sobre estas afirmações forneceu

tranqüilidade para a adoção deste modelo de análise, o que foi

reforçado pelas considerações de Sleight (1987) ao adotar este

modelo de análise em seu estudo comparativo entre narrativas o

rais e escritas, quando cita outros pesquisadores que estão u

tulizando este mesmo modelo em narrativas escritas.

As reflexões que embasam as análises desta dissertação

partem das considerações de Labov e Waletzky acerca das seções

estruturais da narrativa e as respectivas funções que exercem

dentro da globalidade narrativa.

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1.3. Hipóteses

De maneira a atingir o objetivo da pesquisa, fez-se ne

cessário o controle das variáveis sexo, idade, escolaridade,

homogeneização da situação de produção da narrativa e o conse

qüente levantamento de hipóteses.

A seguir se justifica o controle das variáveis acima

relacionadas:

a) Sexo - várias pesquisas têm mostrado que o fator se

xo intervém na aquisição e desenvolvimento da linguagem (Hunt:

1965); Vito:1970; Piaget:1923). Assim, controlou-se esta variá

vel, ao compor-se os grupos com o mesmo número de informantes

do sexo masculino e do sexo feminino.

b) Idade - Concorda-se com Piaget (1923), Hunt(1965),

Deese (197 6) que o amadurecimento global do ser humano leva o

indivíduo ao amadurecimento gradativo da linguagem. Por isso,

a variável idade foi levada em consideração. A presente inve^

tigação preocupa-se com informantes na faixa etária de 14 e de

17 anos, completados durante o ano de 1988.

c) Escolaridade - Na literatura lingüística, é corren­

te que a aquisição e o desenvolvimento da linguagem oral sofrem

influência do ambiente lingüístico a que o indivíduoé exposto.

Ê de se esperar que o mesmo ocorra com a linguagem escrita no

ambiente escolar, como já constataram Hunt (1965)e Menyuk(1975).

Por esta razão, a variável escolaridade foi considerada neste

estudo. Os informantes são concluintes dos lõ e 2Q graus.

d) Homogeneização da situação de produção das narrati­

vas - Acreditando-se que uma das maiores dificuldades da produ

ção escrita está na indefinição da situação de interlocução na

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na qual se insere o texto escrito escolar é que se levou em

consideração esta variável. As situações de interlocução oral

e escrita são diferentes na medida em que, na oral, a situação

de enunciação é dada ao mesmo tempo que o texto, ou seja, co

nhece-se o interlocutor, enquanto que, na escrita, o interlocu

tor está ausente. A posição assumida é de que a artificialid£

de do uso da língua escrita (Geraldi, 1984) poderia interferir

nos resultados da pesquisa, portanto procurou-se a homogeneiza

ção da situação de produção das narrativas, expondo-se os in

formantes ao mesmo espaço (local de coleta; sala especialmente

cedida para este fim pelo estabelecimento)e a umnarratãrio vir

tual, para inserir a produção do texto em um contexto que o

tornasse o mais próximo possível da realidade lingüística.

Controladas estas variáveis, levantou-se as seguintes

hipóteses;

1.3.1. Hipótese 1 - Os informantes do grupo B apresen­

tariam um melhor desempenho na produção da estrutura narrativa

do que os informantes do grupo A nas duas situações de produção.

1.3.2. Hipótese 2 - Os textos narrativos produzidos em

situação de produção EP apresentariam maior complexidade estru

tural que os textos narrativos produzidos em situação de produ

ção EV nas dois grupos.

1.4. Escolha do estabelecimento de ensino

Escolheu-se para a coleta de dados o Conjunto Educacio

nal Almirante Lamego, estabelecimento de ensino da rede estadu

al, situado na zona urbana da cidade de Laguna, litoral sul de

Santa Catarina. Este estabelecimento de ensino recebe grande

número de alunos de vários pontos do município e nele seria

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possível selecionar-se os informantes, atendidos os critérios

de controle das variáveis já apresentadas, uma vez que é fre

qüentado por alunos de ambos os sexos e oferece cursos de 19 e

20 graus.

1.5. Informantes

Os informantes foram selecionados aleatoriamente, atra

vés de fichas fornecidas pela Supervisão Escolar do estabeleci

mento, apenas atendidos os critérios de controle das variáveis.

Os informantes formam dois grupos: grupo A e grupo B.

0 grupo A é formado por 20 alunos de 8ã série do IQ grau; sen

do 10 informantes do sexo masculino (M) e 10 informantes do se

xo feminino (F).

0 grupo B é formado por 20 alunos da 3§ série do 2Q

grau, sendo 10 informantes do sexo masculino (M) e 10 informan

tes do sexo feminino (F).

Para a formação dos grupos observou-se o critério da

idade. Os informantes do grupo A deveriam ter, ou vir a ter,

14 anos até o final do ano letivo de 1988 e os do grupo B, de

veriam ter, ou vir a ter, 17 anos até o final do respectivo ano

letivo, respeitando-se, assim, a idade regulamentar estabeleci^

da para as séries envolvidas neste trabalho.

Para a formação do grupo B, buscou-se os informantes

do sexo feminino junto ao curso do Magistério, enquanto que os

do sexo masculino junto ao curso de Química, visto que estes

cursos são mais freqüentados por um dos sexos. Predomina o se

xo feminino, no curso do Magistério e o sexo masculino, no cur

so de Química.

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1.6. Procedimento da eoleta de dados

As narrativas foram coletadas no início do ano letivo

de 1988. Todas as narrativas foram selecionadas num mesmo lo

cal (uma sala especialmente cedida para este fim), no período

da tarde.

Os grupos produziam as narrativas separadamente.

Inicialmente coletou-se as narrativas de experiência

pessoal nos dois grupos e posteriormente, (intervalo de dois

dias) as narrativas de experiência vicãria.

Para a coleta das narrativas de experiência pessoal,

foi apresentada a seguinte proposição aos informantes; "Você

poderia escrever um susto que você levou para alguém, que não

conhecesse este fato da sua vida?"

Para a coleta das narrativas de experiência vicãria,

os informantes foram expostos a um filme com 7 minutos de du

ração. Tratava-se do primeiro episódio do filme "Fuga para a

Liberdade", original em Inglês e legendado em Português.

Após assistirem ao filme, foi-lhes apresentada a se

guinte proposição; "Você poderia escrever a história do filme

a que você acabou de assistir para alguém que não o assistiu?."

1.7. Estrutura desta dissertação

Além desta introdução, onde se apresenta a metodolo­

gia empregada, os critérios de seleção de informantes, motiva

ção para a escolha do assunto e adoção do modelo de análise,

apresenta-se mais 4 capítulos.

No capítulo 2, os aspectos da narrativa são considera

dos sob a perspectiva de análise apresentada por W.Labov e J.

Waletzky (1967) e Labov (1972).

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2 - ABORDAGEM LINGÜÍSTICA DA NARRATIVA

2.1 - Preliminares

Esta dissertação ê uma tentativa de identificar e anal_i

sar os elementos lingüísticos que definem a narrativa como um

tipo específico de discurso. Segundo a tradição da ret5rica ,

é possível pensar-se era três tipos de discurso: narração, de£

crição e dissertação. O discurso englobaria, portanto, todas

as formas, enquanto a narrativa se definiria por característi­

cas próprias que a distinguem das outras formas que o termo

discurso engloba. Ê o que diz Genette na citação abaixo:

(...) o discurso (...) ê o modo "natural" da linguagem, o mais aberto e o mais universal , acolhendo, por .definição todas as formas; a narrativa; ao contrário, ê iim modo particular definido por um certo numero de exclusões e condições restritivas ( Genette,1973:272)

Dessa forma, a especificidade da narrativa do ponto

de vista de sua função estã na instauração de um acontecimento,

daí vários autores terem definido a narrativa como sendov a

parte do texto que veicula as açoês, como diz Genette:

"Toda narrativa comporta com efeito, embora intimamente misturadas e em proporçoês muito variáveis, de um lado representações de ações e de acontecimentos, que constituem a narra ção propriamente dita, e de outro lado repre sentações de objetos e personagens" (Genette,1973:375)

à Afirmação de Genette, pode se acrescentar . as idéias

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de Labov ao tratar as várias seçoes estrutiirais da narrativa ,

atribuindo a elas funções diversas dentro da globalidade da

narrativa. Por ser objeto deste estudo, a estrutura da narra­

tiva, adotou-se o modelo de Labov./ ÍWalétzky (1967) e Labov

(1972) , jã que estes modelos incluem uma tentativa de detec­

tar os elementos lingüísticos que aparecem na narrativa, pro­

curando-se estabelecer um paralelo entre as reflexões destes

autores e as de Weinrich para fundamentar teoricamente este

estudo. Espera-se que as idéias apresentadas por estes auto­

res sejam capazes de fornecer subsídios para a análise que se

irã efetuar.

2.2 - Modelo de Analise de Narrativas Proposto por La

bov/Waletzky (1967) e Labov (1972)

2.2.1 - Definição da Narrativa

Labov e Waletzky definiram a narrativa

como um:

"method of recapitulating past experience by matching a verbal sequence of clauses to the sequence of events which ( it is inferred ) actually ocorred" (Labov, 1972:359).^

Assim definida a narrativa, percebe-se que uma das

suas finalidades é recapitular experiências passadas, cora a

particularidade de recuperar linguisticamente a seqüência or_i

ginal dos eventos ocorridos e reorganizá-los. Desta maneira ,

uma simples alteração na disposição sintática das orações nar

rativas resultaria na quebra da seqüência original dos aconte

cimentos e o comprometimento da interpretação semântica origi

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a) orações narrativas - são aquelas ordenadas tempo-

ralmente, ou seja, estão em "juntura temporal" e a simples al­

teração na disposição sintática deste tipo de oração resulta

na alteração da interpretação semântica original do evento

ocorrido. Como no exemplo:

Eu esmurrei o menino

então ele me esmurrou

ou

Ele me esmurrou

então eu o esmurrei.

b) oraçoes livres - são aquelas que podem ser desioca

das para qualquer ponto da narrativa sem prejuízo da interpre­

tação semântica da ordenação temporal do evento narrado.

c) orações restritas - são aquelas que podem ser des­

locadas somente através de alguns pontos da narrativa, pois

são limitadas a determinados momentos narrativos.

d) orações coordenadas - são aquelas que indicam a-

ções simultâneas e podem ter sua disposição sintática altera­

da sem prejuízo da interpretação semântica original dos even­

tos narrados.

Pelo exposto, percebe-se que a unidade básica da nar­

rativa é a oração narrativa e diz-se que duas orações estão em

"juntura temporal" quando estão ordenadas temporalraente.

Para Labov, uma narrativa mínima ê aquela que contém

apenas uma juntura temporal: "minimal narrative is deflned as

one containing a single temporal juncture" (Labov:197 2,361)^ .

Em seu artigo "The Transformation of Experience in Narrative

Sintax" ele apresenta um exemplo de narrativa mínima:

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Este autor, prosseguindo a análise das diversas se -

ções da narrativa, diz que a narrativa pode ser considerada

como uma série de respostas a questões subjacentes que cor­

responderiam a um esquema previamente interiorizado pelo nar

rador, que o aciona no momento de produzir este tipo de discur­

so.

As questões subjacentes, que desencadeariam a realiza

ção das seções estruturais, são:

(a) Para a Sinopse: sobre o que é?

(b) Para a Orientação: quem?, quando?, o que?, onde?

(c) Para a Ação Complicadora; o que aconteceu então?

(d) Para a Avaliação; e daí?

(e) Para a Resolução; o que afinal aconteceu?

Segundo Labov apenas a questão (c) i essencial para

desencadear a narrativa, já que (e) é uma seçao conseqüente

da questão (c); sendo assim as seçoes Ação Complicadora e Re

solução constituem-se nas seções estruturais que são essenci^

ais â realização da narrativa.

Pode se ainda, dizer que a narrativa é uma entidade

formal e funcional. Formal,, na medida em que se identifica a

narrativa como discurso constituído â base de elementos, reco­

nhecido desde o nível das orações ati o nível da narrativa com

pleta. Funcional, na medida em que estes elementos são identi­

ficados a partir das funções que o discurso narrativo cumpre

na situação de comunicação: uma função referencial e uma fun -

ção avaliativa.

2.2.3 - Seções Estruturais da Narrativa; Definição e

Funções.

Page 27: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Cada seção estrutural cumpre uma função dentro da

globalidade narrativa. É o que será apresentado a seguir:

A Sinopse constitui-se de uma ou duas orações que re

sumem o relato.

A Orientação situa o ouvinte em relação a pessoa, lu

gar, tempo e situação de comunicação. Ê responsável pela con

textualização.

A Ação Coraplicadóra ê o corpo propriamente :dito da

narrativa, onde se concentram as orações narrativas.

A Resolução apresenta o desenlace dos acontecimentos.

A Coda é um mecanismo funcional que faz com que a

perspectiva verbal volte ao momento presente.

A avaliação ê a parte da narrativa que revela a ati­

tude do narrador em relação â narrativa, destacando eventos

em relação a outros.

Segundo Labov, a Avaliação é uma suspensão da ação

básica da narrativa que. tem por finalidade informar sobre a

carga dramática ou o clima emocional da situação.

Ao retomar o estudo da narrativa em 1972, Labov con

centra-se, sobretudo, no estudo da Avaliação na narrativa e

deixa claro, então, que nem sempre a Avaliação suspende a

ação, afirmando que:

"The evaluation of the narrative forms a se- condary stríícture which is concentrated in the evaluation section but may be found in various forms throughout the narrative".

(Labov, 1972:369)9

Para este autor, a função da Avaliação é realizada por

orações coordenadas entre si ou grupos de orações livres ou

restritas, ou ainda, por elementos lexicais e sintáticos. Por

essa razão, diz ele, a definição fundamental da Avaliação de

ve ser semântica, embora sua implicação seja estrutural, já

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que a Avaliação foi definida como aquela parte da narrativa

que traz embutido o ponto de vista do narrador.

Através destes argumentos, Labov considera que

qualquer elemento que indique o valor de certos eventos em re

lação a outros deve ser considerado como avaliativo. Considera

a Avaliação muito importante para a estrutura narrativa, con

forme pode ser constatado na afirmação abaixo;

"Beginnings, middles, and ends of narratives have been analyzed in many accounts of folk lore or narrative. But there is one impor- tant aspect of narrative which has not been discussed - perhaps the most important ele- ment in addition to the basic narrative cia use. That is what we term the evaluation of the narrative, the means used by the narra- tor to indicate the point of the narrative, its raison d'être: why it was told, andwhat the narrator is getting at."

(Labov, 1972:366).10

Para o autor, a Avaliação i a razão de ser narrativa,

o elemento mais importante depois da oração narrativa básica,

pois e através da Avaliação que o narrador sinaliza para o nar

ratário porque está contando aquilo, defendendo o seu ponto de

vista e tornando o.evento reportável, isto é, torna-o capaz de

despertar o interesse do narratário.

Sob esta visão de Labov sobre a função da • Avaliação

na narrativa, ; ode se entender a narrativa como xmia modalidade

discursiva, uma vez que as relações discursivas e pragmáticas,

segundo Koch, são:

"de caráter eminentemente subjetivo já que dependem das intenções do falante, dos efei tos que este visa ao produzir o seu discur­so"

(Koch, 1984:33)

Dessa maneira, do desejo do narrador de tomar o seu re

lato reportável, este utiliza-se de recursos lingüísticos vis­

to que

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"a linguagem possui uma lógica própria e carac teriza-se, acima de tudo, pela argumentativi- dade"

(Koch, 1984:33)

Acredita-se que esta "lógica própria da linguagem" es

teja, também, presente no discurso narrativo, pois ao lado das

orações narrativas formam-se relações de ordem diversas a fim

de direcionar o ponto de vista do relato. Pelas leituras de au

tores que se dedicam ao estudo da linguagem, pode-se dizer que

o tipo de argumentatividade que predomina na narrativa é a per

suasão, que apela mais para os sentimentos do narratário, em

oposição ao convencimento predominante no texto dissertativo e

que opera mais com argumentos racionais.

Labov classifica a Avaliação na narrativa através de

sua função, que se realiza por uma variedade de recursos. As

sim, tem-se os seguintes tipos de Avaliação:

1. Avaliação, como estrutura primária

Este tipo de Avaliação - ocupa uma posição fixa en­

tre a Ação Complicadora e a Resolução. Quando este tipo de Ava

liação ocorre a ação é suspensa, o.que chama a atenção do nar­

ratário para aquela parte da narrativa. Quando isto é feito ha

bilmente, a atenção do narratário é suspensa e a Resolução vem

com maior força.

2. Avaliação, como estrutura secundária

A Avaliação, como estrutura secundária pode ocor

rer sob diversas formas e distribuir-se por toda a narrativa :

"as the focus of waves of evaluation that penetrate the narra-^

tive"(cf.Labov, 1972;369)^ A Avaliação, como estrutura secunda

ria pode, ainda, ser classificada como;

Page 30: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

a) Avaliação Externa - Quando o narrador suspende momen

taneamente a ação e comunica ao narratãrio o seu ponto de vista

sobre determinado ponto da narrativa.

b) Avaliação Encaixada - A Avaliação vem encaixada na

narrativa preservando a continuidade dramática do processo nar

rativo. Corresponde ao uso do discurso direto na narrativa. Se

gundo Labov, o encaixamento da Avaliação na narrativa pode ser

feito através de passos, sugerindo vima gradação de encaixamento:

- o 19 passo i quando o narrador cita seus sentimentos

como algo que estivesse ocorrendo com ele naquele momento;

- o 29 passo é quando o narrador fala para si próprio

como se o fizesse para os outros;

- o 39 passo é quando o narrador introduz a 3- pessoa

que avalia a ação para o narrador.

c) Ação Avaliativa - é a dramatização da ação, consiste

em contar o que as pessoas fizeram em lugar do que elas disse

ram.

d) Avaliação Interna oü Elementos Avaliativos - Quando

os elementos sintáticos servem para que o narrador comunique

seu ponto de vista, eles podem ser vistos como elementos avalia

tivos. Estes elementos avaliativos distribuem-se por toda a nar

rativa e integram a sintaxe da própria narrativa.

Labov (1972) afirma que a oração narrativa apresenta

uma estrutura sintática simples e que, quando o narrador foge a

esta estrutura sintática básica da oração narrativa é porque

quer marcar avaliativamente o seu relato. Veja-se o que diz o

autor a este respeito:

Page 31: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio
Page 32: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

-------- ^ ^ ---------- J> --------- J>

As setas indicam uma série linear de eventos organiza­

dos na narrativa em seqüência temporal, o que é característica

básica da narrativa.

0 narrador, ao empregar um intensificador, seleciona

um evento e o reforça, como pode ser visualizado no esquema a

baixo. A intensificação de um evento, no processo narrativo ,

em relação a outro, possui um caráter avaliativo:

Os intensificadores são gestos (ou dêiticos -como

"this", "that"), quantificadores e repetições.

Labov diz que:

"Intensifiers as a whole do not complicated the basic narrative sintax. But the other types of internai evaluation are sources of syntactic complexity"

(Labov, 1972:380) 13

Os que trazem maior complexidade ã estrutura sintática

narrativa são: comparadores, correlativos e explicativos.

Acerca da simplicidade da isintaxe narrativa, Labov diz

não ser ela surpreendente, se for tomado o ponto de vista opo£

to, e reflete;

"If the task of the narrator is to tell what happened, these will serve very well. What use has he for questiona, or what reasondoes he have to speak of the future, since he is dealing with past events?(...) What reason would the narrator have for telling us that something did not happen, since he is the business of telling us what did ha£

(Labov, 1972; 380)

Assim, Labov mostra que os desvios são maneiras de a-

valiar, uma vez que através de Comparadores (negativos, futu­

ros, modais, interrogativos, imperativos, comparativos), colo­

Page 33: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

ca-se cs eventos ocorridos em contraste com eventos que pode-=-

riam ter ocorrido, porém não ocorreram. Em termos de esquema

narrativo/ têm-se:

Já os correlativos trazem juntos dois eventos que ocor

reram efetivamente: São eles os progressivos, os particípios ,

os apostos duplos, os adjetivos duplos e pode-se visualizar os

correlativos através deste esquema:

Por sua vez, os explicativos, como é de se esperar, a-

crescentam explicações. São realizados em orações coordenadas

ou subordinadas introduzidas por conjunções, tais como: mas,

embora, já que, porque, pois, e o pronome relativo que. Os ex­

plicativos classifican-se, ainda, em causativos e qualificati­

vos. Podem ser representados através do seguinte esquema:

■>

Tais esquemas sintáticos podem aparecer em orações pu­

ramente de avaliação, compondo a seção estrutural Avaliação ,

como distribuir-se por toda a narrativa.

Estes são os pontos mais relevantes sobre a Avaliação,

apresentados por Labov (1972). Neste estudo, o autor dá um

maior peso à Avaliação, em relação as outras seções estrutu­

rais, conferindo-lhe um papel maior na estruturação da narrat^

va e um lugar central entre as demais seções estruturais, E,

Page 34: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

como já foi exposto, esta seção passa inclusive a ser responsa

vel pelos desvios ou modificações que se impõem â estrutura

sintática básica da naírativa. Apesar da grande importância

que Labov atribui ã Avaliação, ele ressalta o traço de essen-

cialidade da narrativa desempenhado pelas orações narrativas

que apresentam juntura temporal, uma vez que a especificidade da

narrativa consiste em recuperar lingüisticamente um evento em

sua seqüência temporal.

2.2.4 - Funções da Narrativa na Situação de Comunicação

A narrativa cumpre na situação de comunicação as fun

ções referencial e avaliativa.

A especificidade da narrativa de recuperar lingüística

mente a seqüência temporal em que os fatos ocorreram efetiva­

mente, Labov e Waletzky(1967) e Labov (1972) denominam de fun

ção referencial; mas afirmam que a seqüência temporal organiz^

da em orações não é, por si só, motivadora da narrativa, já

que esta se presta a outra função que é determinada por um e^

timulo no contexto social em que ocorre.

Denominam, assim, de função referencial ã relação en

tre a ' seqüênclá temporal r e o r g a n ã z ;a ,d a;. narra

tivamente e a experiência efetivamente ocorrida. E denominam

de função avaliativa, à relação motivadora da narrativa a par

tir das relações humanas que ela organiza e das quais depende.

Labov e Waletzky(1967) e Labov (1972) afirmam que a

Avaliação ê típica da narrativa oral de experiência pessoal,

onde ciampre a função acima mencionada. Para estes autores o de

sencadeamento da atividade avaliativa é a resposta a um estímu

lo que não se encontra presente na narrativa de experiência v_i

Page 35: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

caria.

Para confirmar esta posição, Labov (1972) compara na£

rativas de experiência pessoal e de experiência vicária e con

clui que a narrativa de experiência vicária é diametralmente

oposta ã de experiência pessoal em graus de avaliação;

"The difference between evaluated and unevalu ated narrative appears most clearly when we examine narrative of vicarious experience"

(Labov, 1972: 367)^^

e a posição do autor sobre este aspecto pode ser verificada

nesta outra citação;

"This is typical of many such narratives ' of vicarious experience that we collected"

(Labov, 1972; 367)^^,

como conclusão da análise efetuàdá numa narrativa de experiên

cia vicária.

Da posição destes autores, de que a narrativa de expe

riência vicária não é avaliada, discorda Lira, argumentando

que:

"a avaliação deve ser relacionada ao fato nar rado. Quando este for significativo para o narrador vai haver avaliação”

(Lira, 1987; 107)

Para esta pesquisadora, a avaliação não depende da s^

tuação de produção da narrativa, mas do empenho do narrador

em atuar sobre o narratário. Ao considerar-se a narrativa co

mo um ato de fala, é natural que se pense que esta tenha efe_i

tos perlocucionários sobre o narratário, no sentido de ating_i

lo de alguma forma. Se de forma positiva, o narrador será re

compensado com expressões de apreço e interesse como: "Nossa!','

"Que maravilhai", "Que horror!", "Não é possível!", e se de

forma negativa, receberá a frustrante pergunta: "E dai?", demon^

Page 36: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

trando que a questão subjacente à estrutura narrativa e refe

rente à avaliação não foi devidamente controlada pelo narrador.

Dessa maneira, ao considerar-se a função avaliativa co

mo resultado das relações humanas dentro do contexto social em

que ocorre, verifica-se que a relação que se estabelece entre

narrador/narratãrio é fator determinante da presença ou ausên­

cia da avaliação e da composição da própria sintaxe narrativa.

0 próprio Labov afirmou que a gramática não é exatamen

te um instrumento para expressar proposições básicas:

"A gramática se ocupa da ênfase, do focus, da escolha entre o que é de menor e maior vülor, ela é um meio de organizar a informação e ado tar pontos de vista alternativos"17

Para Slobin, isto é verdade tanto para o discurso fala

do como para o discurso escrito, pois as diversas maneiras de

escrever exploram e alargam as possibilidades de uma língua.

Assim, também na narrativa, o narrador, além de ordenar tempo-

ralmente os eventos, pode escolher o ponto de vista de acordo

com a sua intenção, pois, segundo Labov, cabe ao narrador sina

lizar para o narratário por que está contando aquilo.

Esta posição do autor coincide com a posição de Benve-

niste que mostrou a existência de dois planos distintos da

enunciação: o do discurso e o da história. Estes planos de

enunciação se referem ã integração do sujeito da enunciação no

enunciado. No caso da história, diz ele;

"trata-se da apresentação dos fatos advindos a certo momento do tempo sem qualquer interven­ção do locutor na narrativa".

(Benveniste, 1976: 267)

O discurso, por contraste, é definido como:

"toda enunciação supondo um locutor e um ouvin te tendo o primeiro a intenção de influenciar o outro de algum modo".

(Benveniste, 1976: 267)

Page 37: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Pensa-se que quando alguém produz uma narrativa, esta

belece-se como narrador e estabelece o narratário, seu inter

locutor. O que ele pensa do mundo, o que ele conhece ou desco

nhece, o que pode lhe interessar, tudo é incorporado à pró

pria tessitura da narrativa para que se estabeleça uma ponte

entre eles.

Dessa maneira, a relação narrador/narratário deve ser

entendida como fundamental para a compreensão da narrativa,

pois estas duas categorias têm realidade sociológica, o que

possibilita considerar-se a narrativa como modalidade discur­

siva, que permite caracterizar as relações entre narrador/nar

ratário na situação real de narração, já que o primeiro tem

uma intenção representada semântica e sintaticamente, o que

marca significativamente a interpretação destas relações.

Esta posição pode ser reforçada por Vieira/Vogt(1978),

em seu artigo "Função do Narratário nas Narrativas Orais de

Experiência Pessoal:

"- 0 narrador tem um papel importante na com­posição da narrativa, uma vez que ele é responsável pelo aparecimento nela de cer tos elementos, o narratário é especifica mente responsável pela presença da avaliaçãa

- o narratário é uma categoria dependente do narrador, tanto quanto este o é daquele. Correspondem estas duas categorias, ao eu e ao tu de toda enunciação, e têm, do pon­to de vista estritamente verbal, uma idên tidade sempre relativa. Isto significa, que não existe narrador sem narratário, nem narratário sem narrador, da mesma forma, que quem diz eu não pode, pela mesma instan ciação do pronome de lã pessoa, deixar de estabelecer os limites de sua identidade. Esses limites são dados pela instituição de tim tu djscursivo (o outro discursivo) e é só em relação a ela que se pode falar legj^ tivamente na identidade da pessoa verbal."

(Vieira/Vogt, 1978; 28-29)

Page 38: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Procurando ser coerente com a posição assviinida, neste

capítulo, através dos argumentos apresentados nas posições as

sumidas por Labov, Lira, Benveniste, Vieira, Vogt é que, no

presente estudo da narrativa, procurou-se determinar o narra

tário virtual nas duas situações de produção de narra­

tiva. (EP e EV).

2.2.5 - Reportabilidade e Credibilidade

Em 1981, Labov acrescentaria ã narrativa os elementos

reportabilidade e credibilidade, não os considerando como in

tegrantes da estrutura sintática da narrativa.

A reportabilidade responde pelo direito concedido pe

lo narratário ao narrador de fazer uso da palavra por determ^

nado período de tempo, que na narração costuma ser maior que

o utilizado em outros atos de fala e está diretamente ligada

à avaliação através do controle, por parte do narrador, da

questão subjacente: "E daí?".

A credibilidade, assim como a reportabilidade, é tam

bém ligada ãs intervenções avaliadoras e é tão importante quan

to a reportabilidade, só que a credibilidade é construída so

bre uma série de relações lógicas de causa e efeito, oriundas

do conhecimento geral que determinada cultura ou grupo tem do

mundo.

Pode se dizer, então, que a reportabilidade é o atri^

buto do que é narrável, conforme os valores de cada povo e a

adequação ãs situações de narração, enquanto a credibilidade

é o encadeamento de situações que são narradas e que tornam o

relato verossímel. Segundo Citell:

Page 39: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

"verossímel é, pois, aquilo que se constitui em verdade a partir de sua própria lógica".

(Citelli, 1985; 14)

E este autor vai além em seu raciocínio:

"Daí a necessidade para se conseguir" o efei. to de verdade", da existência de argumentos".

(Citelli, 1985: 14)

A credibilidade está intimamente ligada ao desejo do

narrador de "paçsar" o seu relato como verdadeiro, pois nem to

do ato de convencer se reveste de verdade.. Pode ser que o nar

rador não esteja "passando" uma verdade mas apenas manipulan

do-a. Assim,a credibilidade liga-se ã própria lógica da nar

rativa e Citelli exemplifica com a estória do super - homem,

dizendo;

"Ê indiscutível que o Super-homem não seja verdadeiro, porém ele nos resta verossímel. Todos conhecem e aceitam as transformações pelas quais passa o repórter do Planeta Piá rio, Clark Kent. Afinal, ele não é um ser comum, é um extraterreno, filho de um lon gínguo e desaparecido planeta. Assim sendo, a estória do super-homem está montada numa lógica que lhe é própria, e que lhe dá su^ tentação contra os apressadinhos que desejam alegar ser tudo aquilo lama grande mentira".

(Gitelli, 1985; 14)

Dessa forma, a credibilidade pode ser entendida como

resultado de certa organização da narrativa que a apresenta

como verdadeira para o narratário e a falha desta organiza­

ção pode provocar a reação do narratário e levá-lo a conte^

tar a verdade dos fatos narrados.

A partir da divisão feita por Labov, pode se dizer

que a reportabilidade de um evento tem pouco ou nada a ver

com sua credibilidade, já que um bom narrador pode levantar

detalhes de acontecimentos em situações onde outros narrado­

res não encontrariam elementos para serem narrados.

Page 40: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

2.3 - Teoria de Weinrich

Harald Weinrich (1973) procede a xiin estudo minu

cioso e sistemático da classe dos verbos, mais precisamente das

formas temporais flexionadas.

Pelo exame de vários textos escritos (de Merimée, Sar

tre e outros) ele observa a grande freqüência das formas tempo

rais na sua relação com a totalidade de linhas dos textos esco

Ihidos, e no total das ocorrências, ele verifica num e noutro

texto a freqüência maior de uma ou de outra forma temporal.

sa distribuição das formas verbais não é arbitrária. Segundo

ele, a sucessão dos tempos nos textos obedece manifestadamente

a um certo princípio de ordem.

De acordo com Weinrich, as formas verbais através de

seus morfemas de tempo estão intimamente ligadas ã relação de

interlocução. Nessa íntima relação com a interlocução, as for

mas temporais empregadas por um locutor transmitem sinais a

seu ouvinte, como se dissessem "isto é um comentário", ou "i£

to é uma narração", invocando neste ouvinte uma reação corres­

pondente, de tal modo que a atitude de comunicação assim cria

da lhes seja comum.

Daí surgiu a noção de dominãncia temporal (freqüência

maior de uma forma temporal em detrimento de outra) que deve

marcar para o alocutário o tipo de texto constituído. A obser­

vação sistemática dos tempos verbais revelou a distribuição de

dois grandes grupos de verbos: verbos do Grupo I e verbos do

Grupo II.

Koch objetivando analisar a proposta de Weinrich e ve

rificar sua adequação ao sistema temporal do Português,. apre

senta o seguinte esquema:

Page 41: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

"Grupo I: canto, tenho cantado, cantarei, terei cantado, vou cantar, acabo de cantar, estou cantando, etc ..

Grupo II: cantei, cantava, tinha cantado, can­taria, terei cantado, ia cantar, acabava de cantar, estava cantando, etc ...

(Koch, 1984: 37)

Assim, Weinrich estabeleceu a primeira grande oposição

no seu trabalho: a distinção entre o que nos textos se revela

como "mundo narrado", onde a dominância temporal é cumprida por

verbos do Grupo II, e como "mundo comentado", caracterizado pe

la grande freqüência de verbos do Grupo I.

Os morfemas temporais, que assinalam comentário ou nar

rativa, permitem ao locutor influenciar o alocutário no sent^

do de assegurar para seu texto a acolhida que ele deseja, empre­

gando os tempos comentativos o locutor pede a seu interlocutor

que se concentre em cada informação lingüística, exigindo uma

atitude vigilante, ao passo que ao empregar os tempos narrati

vos adverte que é possível uma atitude mais descontraída.

2.3.1 - Atitude de Locução

à constituição dos textos mediante o uso pelo

locutor de um ou outro dos grupos de formas temporais, Weinrich

dá o nome de Atitude de Locução, que se caracteriza pela oposi^

ção entre o grupo dos tempos do mundo narrado e o grupo dos tem

pos do mundo comentado. Por mudança de Atitude de Locução enten

de-se a passagem que ocorre num texto entre o uso de verbos de

um grupo para outros do outro grupo, marcando aí diferente tex

tos {comentativos e narrativos).

De acordo com Weinrich, um tempo não pode jamais per­

tencer ao grupo do comentário e ao da narração ao mesmo tempo.

Page 42: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

0 uso do tempo Presente liga-se ao comentário, ao passo que o

uso do tempo Pretérito Imperfeito e do tempo Pretérito Perfe_i

pertence ao mundo narrado.

2.3.2 - Perspectiva de Locução

O tempo de um texto, segundo Weinrich, é nor

malmente orientado conforme duas direções fundamentais da co

municação; a informação anterior (retrospecçao) e a informa

ção posterior (prospecção). E é no sistema temporal que se en

contram as distinções encarregadas da orientação em relação

ao tempo do texto.

Weinrich distingue, ainda, tempo de texto de tempo de

ação. Tempo da Ação é o tempo ao qual corresponde o conteúdo

da comunicação. O tempo do texto e o tempo da ação podem coin

cidir e, quando ocorre esta coincidência, tem-se o grau zero

da perspectiva. Isso se dá no caso dos tempos comentativos com

o Presente, e nos narrativos, ao mesmo tempo, com o Pretérito

Imperfeito e Pretérito Perfeito. No grau zero não há a preocu

pação em se marcar a perspectiva de locução.

A perspectiva de locução exprime a relação entre tem

po de texto e tempo da ação e divide os tempos verbais em três

tipos, conforme o esquema apresentado por Koch:

tempos de grau zero,

sem perspectiva

"b perspectiva

comunicativa

-retrospectiva

tempos com /

perspectiva \prospectiva"

(Koch, 1984: 44)

Page 43: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

2.3.3 - Relevo

Para o autor, ainda, é necessário observar xuna

terceira dimensão para xima teoria do tempo: os tempos têm por

função dar relevo a um texto, projetando para o Primeiro Plano

alguns conteúdos e rechaçando outros como Plano de Fundo. Ape

nas nesta dimensão é que aparecerão as diferenças entre Preté

rito Imperfeito e Pretérito Perfeito, conforme apresenta Koch

em seu esquema, quando pretende adequar a proposta de Weinrich

ao sistema temporal do Português:

is plano

só aparecendo em alguns setores do sistema tem poral. Por exemplo o perfeito simples do in

"c relevo , ), dicativo indicaria o IQplano, ao passo que o imperfeito marcaria o 29 plano."

2Q plano ou Plano de Fundo (Koch, 1984: 44)

Pelo exposto, pode-se observar que ambos os tempos ver

bais caracterizados como tempos narrativos (pertencem ao grupo

II - mundo narrado), no que diz respeito ã atitude de locução,

e pertencem ao grau zero, no que diz respeito ã perspectiva de

locução. Por esta razão surge a questão sobre qual seria o pa

pel destes tempos na narrativa. Para respondê-la, pode-se re­

correr ao próprio Weinrich para mostrar estes mecanismos de

transição verbal no texto narrativo e sua função:

"... na repartição desses dois tempos na narra tiva não há outra lei constante além do princT pio de sua mescla; o detalhe de sua distribui.

Page 44: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

ção é abandonado ao poder do narrador. Na ver dade sua liberdade é limitada por certas estru turas narrativas fundamentais. No início da e^ tória não se pode passar totalmente sem expos^ ção; também a narrativa tem normalmente uma in trodução onde o tempo é mais frequentemente do Plano de Fundo. Ademais em numerosas narrati. vas o final é explicitamente marcado por uma conclusão e ela também tem uma tendência para os tempos de Plano de Fundo. Isso não é abso lutamente uma obrigação, as exceções existem; mas é relativamente freqüente encontrar, como na lenda de Saint Dimitri, no início e no fim da narrativa uma concentração de tempos do Pia no de Fundo.'No nó narrativo esses (Imperfeito e Mais que Perfeito) são destinados ãs circun^ tãncias secundárias, ãs descrições, reflexões e tudo o que o autor deseja repousar no Plano de Fundo.

Ê completamente impossível decidir "a priori" o que, numa narrativa estará do .lado do Passado Simples e portanto do Primeiro Pia no. Pertence ao Primeiro Plano aquilo que o autor quer constituir como tal. Aqui também a margem do jogo onde se dispõe o narrador encon tra-se limitada por certas leis fundamentais da narratividade. Elas querem que o Primeiro Pia no seja habitualmente aquilo porquê a estória é contada; retém o resumo factual; o que o t_í tulo resiime ou poderia resumir; ou ainda aqu_ilo que no fundo dá ãs pessoas o desejo de dei. xar de lado um instante suas ocupações para e^ cutar uma estória tão estranha ao seu universo cotidiano; é em suma, segundo a palavra de Goethe, L'evénement inoui (o acontecimento não não esperado, novo). A partir daí deixa-se en fim determinar o inverso, o plano de fundo da narrativa; em seu sentido mais amplo é aquilo que por si só não despertaria o interesse mas ajuda o ouvinte a se orientar através do mundo narrado e lhe torna a escuta mais fácil"

(Weinrich, 1973: 115)

Quando examina narrativas, Weinrich percebe que ela é

composta por verbos no Imperfeito e no Passado Simples. Os pri.

meiros dominam no início e no fim das narrativas, enquanto o

Passado Simples ocupa o meio. Acrescenta, ainda, que os Imper

feitos localizados no início e no fim da narrativa, represen

tam circustâncias secundárias,- embora tenham funções precisas

e indispensáveis a cumprir. Entre essas duas partes, localiza-

se o corpo narrativo; nessa parte os verbos aparecem no Passa

Page 45: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

do Simples. Conclui gue o Imperfeito é na narrativa o tempo de

Plano de Fundo, e o Passado Simples (Pretérito Perfeito no sis

tema temporal do Português) é o tempo do Primeiro Plano.

Nesta visão de Weinrich, a flexão verbal é responsável

tanto pela diferença de atitude de locução e pela perspectiva

de locução como também pelo relevo.

A narrativa é, assim, em primeiro lugar, uma atitude

do locutor em relação ao mundo; mas como próprio Werinch diz,

o texto narrativo vem mesclado de partes narrativas e comenta-

tivas.

Embora fundamentado em outros aspectos e com outros ob

jetivos, o texto de Weinrich, quando estuda o relevo nas narra

tivas acaba por se aproximar bastante das conclusões de LabovV

a respeito deste tipo de discurso. 0 que se mostra a princípio

de natureza tão distinta e descrevendo objetos iguais (Weinricív

narrativas literárias e Labov, narrativas de experiência), mas

de forma também diferente, quanto podem parecer por um lado as

funções estruturais de Labov e Waletzky e por outro a detecção

de dois planos: Primeiro Plano e Plano de Fundo de Weinrich,

na realidade se revelam como formas descritivas bem semelhan

tes, no que diz respeito sobretudo ã funcionalidade de seus

elementos, do material narrativo com que trabalham.

Descrevendo e postulando funções estruturais da narra­

tiva Labov, tanto quanto Weinrich, busca dar conta de elementos

encontrados no texto e para os quais atribui o papel de estru

turador, do mesmo modo como Weinrich fala de seus planos.

A apresentação das reflexões de Weinrich acerca do tex

to narrativo e o paralelismo das suas reflexões com as de Labov/

Waletzky (1967) e Labov (1972) são importantes, neste estudo,

jã que se espera que sejam subsídios valiosos para a análise

de narrativas que se pretende efetuar.

Page 46: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

NOTAS DO CAPiTULO 2

1. "método de recapitulação de experiência passada combinando

uma seqüência verbal de orações a uma seqüência de eventos que

(segundo se infere) ocorreram efetivamente".

2. "Narrativa, então, é apenas uma maneira de recapitular esta

experiência passada: as orações caracterizam-se pela ordenação

em seqüência temporal; se as orações narrativas são invertidas

a interpretação semântica da seqüência original é alterada; Eu

esmurrei este rapaz e ele me esmurrou, ao invés de Este rapaz

esmurrou-me e eu o esmurrei".

3. "uma narrativa mínima é definida como contendo apenas uma

juntura temporal".

4. "a Eu conheço um garoto chamado Harry.

b Outro garoto atirou-lhe uma garrafa na cabeça,

c e ele levou sete pontos.

5. "0 esqueleto de uma narrativa então consiste de série de

orações ordenadas temporalmente às quais chamamos de orações

narrativas".

6. "uma narrativa completa deve apresentar o seguinte:

1. Sinopse

2. Orientação

Page 47: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

3. Ação Complicadora

4. Avaliação

5. Resultado ou Resolução

6. Coda

7. a "Sinopse", descrita como "uma ou duas orações resumindo a

história toda", t8. É claro que há um complexo encadeamento e encaixamento de^

tes elementos mas aqui estamos apresentando-os de forma simpli.

ficada".

9. A avaliação da narrativa forma uma estrutura secundária que

está concentrada na seção Avaliação mas que pode ser encontra­

da de forma variada por toda a narrativa".

10. "Inícios, meios e finais das narrativas têm sido analisa­

dos em muitas abordagens de folclore ou narrativa. Mas há um

aspecto importante que não tem sido discutido - talvez o ele

mento mais importante em adição ã cláusula narrativa básica.

Isso é o que denominamos de avaliação da narrativa, o sentido

dado pelo narrador para indicar o ponto de vista da narrativa,

sua razão de ser por que foi contada e o que o narrador quer

conseguir com isso".

11. "como foco de ondas de avaliação que penetram a narrativa".

12. Dada a existência desta organização simples das cláusulas

narrativas, nós podemos perguntar: onde, quando e com que efei­

to as narrativas podem fugir a isso (a esta estrutura simples)? De^

de que a complexidade sintática é relativamente rara na narra

tiva, quando ela ocorre deve ter um efeito marcado. E de fato

nós percebemos que desvios da sintaxe narrativa básica têm uma

força avaliativa marcada. A perspectiva do narrador é frequen­

temente expressa poe elementos sintáticos relativamente me

Page 48: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

nores na cláusula narrativa".

13. "Intensificadores como um todo não complicaram a sintaxe

narrativa básica. Mas os outros três tipos de avaliação in­

terna são responsáveis pela complexidade sintática".

14. "Se a tarefa do narrador é contar o que aconteceu, esta

(a simplicidade sintática) serve muito bem. Por que ele faria

perguntas ou qual a razão para falar do futuro, se ele está

apresentando fatos passados? (...) Que razão teria o narrador

para contar o que não aconteceu, se o seu propósito é- contar

o que aconteceu?."

15. "A diferença entre narrativas avaliada e não - avaliada

aparece mais claramente quando examinamos narrativas de expe

riência vicária".

16. "Isto é típico de muitas de tais narrativas de experiên­

cia vicária que coletamos."

17. Labov, 1971: 72, apud Slobin, 1980: 270

Page 49: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

3. anAlise das narrativas

3.1. Abordagem da estrutura global da narrativa nas duas situa

ç5es EP e EV

Neste capítulo serão examinadas algumas das narrativas

colhidas nas duas situações de narrativa (EP e EV), procurando

caracterizar as diversas seções estruturais deste tipo de texta

Serão abordados alguns mecanismos sintáticos usados nas

narrativas (chamados por Labov de "desvios sintáticos" que fo

gem ã estrutura sintática da oração narrativa básica). Esses

esquemas sintáticos usados como recursos avaliativos nas narra

tivas ocuparão espaço na exposição das idéias, pois dessa expo

sição é que se poderá situar mais devidamente estes elementos,

entendidos na sua função de organizadores de narrativa, para se

obter uma melhor compreensão da sua natureza enquanto elemen­

tos que devem ser recuperados na própria situação de interlocu

ção em que emerge o processo narrativo.

,Ê evidente que durante a análise das narrativas, a a-

tenção estará todo o tempo voltada para o modelo de análise que

deu a origem a estas reflexões.

Por fim, pela combinação da análise qualitativa ã aná

lise quantitativa, que se pretende seja profunda o suficiente

para que se compare a estrutura global das narrativas nas duas

Page 50: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

situações de narrativa (EP e EV), espera-se uma maior compreen

são das funções das várias seções em sua concorrência para a

organização do texto narrativo.

Selecionou-se, para a análise das narrativas nas duas

situações, narrativas consideradas coirpletas e incocipletas quanto a estru,

tura global.

Para a análise de narrativas completas quanto â estru

tura global, selecionou-se narrativas de um mesmo informante

para representar narrativa de experiência pessoal e narrativa

de experiência vicária. Adotou-se o critério da ecolha do me^

mo informante por parecer que assim fica mais evidente a estru

tura narrativa que caracteriza a produção do tipo de texto,

sem interferência de elementos extralingüísticos (sexo, ida­

de, escolaridade, influência cultural e social).

Observe-se o procedimento do narrador (Informante 20F

A) para recuperar o acontecimento na narrativa de Experiência

Pessoal (EP):

O

a Era iim lindo dia de sol

b havia muita gente na praia,

gatinhos e gatinhas,

c estavam surfando,

d jogando frescobol, volei, enfim, se divertindo.

Entre eles, eu.

e Então peguei meu mory boogui

fdau<ü+jXM•

><

f fiz meus aqúecimentos

g pensando

que tudo estivesse em ordem, pés-de-pato, cor-

dinha, etc ...

Page 51: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

h e entrei na água,

^ j minha colega ainda estava se aprontando, a^ por isso entrei na água sozinha.-p

w i Eu já estava acostumada a isso,

o fazia todos os dias.

1 passei a arrebentação

m e procurei um lugar bom

para eu ficar

(0---

^ n (uma tarefa dificil,

w o pois havia muitos surfistas dentro d'água)

p Após tentativas frustradas de pegar algumas

ondas

consegui.

(0c

0)+J

w

q era uma onda enorme

r confesso

que naquele instante senti medo,

s pois a onda era realmente gigantesca.

t trepei aquela maravilha da natureza,

u mas quando ia tentar dar um 360°

V cai,

X eu vi o lip daquela onda

estourar em sima de mim,

z fui rolando dentro d'água.

Page 52: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio
Page 53: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

gens, de hábitos, de lugar e de tempo; ainda que a expressão

indicadora de tempo: "a Era um lindo dia de sol" se constitui

numa expressão atemporal, pois não informa o narratário sobre

a época do acontecimento, apenas o situa em algum momento do

passado, constituindo-se numa fórmula eficaz para traçar uma

fronteira entre mundo narrado e mundo cotidiano e uma vez ace

to, pelo narratário, o seu papel, este se estenderá até o final

do relato. (Ver Weinrich, 1974:81.)

Nesta narrativa, o protagonista é a própria narradora,

o que permite afirmar ser esta uma narrativa de experiência

pessoal.

Formalmente as orações da Orientação (orações de a a

d) são orações livres em que se constata a presença de verbos

no Pretérito Imperfeito (estavaj^ era, havia) e no Progressivo

Passado - (estavam) jogando, (estavam) surfando, (estavam) se

divertindo). Como se pode observar esta seção estrutural reaM

za a contextualização da cena onde se desenrolará o fato, con^

tituindo-se em Plano de Fundo para a ação que se desenrolará.

O uso dos progressivos passados é o recurso avaliativo

usado nesta seção estrutural, pois expressa uma ação durativa

que se prolonga, mesmo enquanto o fato estiver acontecendo. 0

uso desses progressivos faz com que a narrativa fique mais vi­

vida e dramática, pois a par da tranqüilidade e harmonia da ce

na, orienta que ocorrerá um fato que momentaneamente deveria

pertubá-lo, caracterizando-se este recurso avaliativo como um

correlativo. (Labov, 1972).

A narradora prossegue seu relato, passando ã seção e^

trutural Ação Complicadora (orações e a ^), e a partir da ora

ção e introduz-se efetivamente o primeiro evento narrativo,

Page 54: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

é aqui que se inicia o acontecimento único que faz deste tex

to, um texto narrativo.

Por acontecimento único entende-se aquele de que se

ocupa a "seqüência narrativa" propriamente dita, a qual ex

pressa o processo dinâmico de eventos que se sucedem ordena­

damente no tempo, constituindo-se num todo e que deve ser en

tendido nessa organização própria e sobretudo na sua unicida

de.

A Ação Complicadora configura-se lingüísticamente co

mo uma seqüência ordenada de enunciados responsáveis pela ex

pressão dos eventos e obedecendo à ordem em que esses eventos

ocorreram, para que se cumpra a função narrativa. Esta se

qüência narrativa é veiculada pelas orações narrativas e têm

como marca particular o verbo no Pretérito Perfeito, caracte

rizado por Weinrich como tempo de grau zero da perspectiva

narrativa (peguei, fiz, entrei, passei, procurei, consegui ,

trepei, caí, vi, fui (rolando), pensei, tomei, emergi, respj.

rei, tive). No entanto, o Pretérito Perfeito não é exclusi­

vo das orações narrativas típicas (isto é, aquelas que apre

sentam juntura temporal) e aparece em outras orações indepen

dentes, principalmente nas seções Avaliação e Coda.

Muitas vezes, o Pretérito Perfeito não cumpre a fun

ção referencial na narrativa, entendida como a relação tempo

ral "antes" e depois", e isso já havia sido constatado por

Koch:

"0 maior problema encontrado foi o pretérito simples, que apresenta elevado índice tanto no relato como no comentário. (...) Todavia, nos casos em que o pretérito perfeito co-o corre com tempos do comentário dentro de um mesmo período, fato bastante freqüente em português, somos de opinião de que se trata de um tempo do mundo comentado e postulamos^ com base na posição de Buli (1960), (...) a existência de uma neutralização entre duas

Page 55: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

formas diversas; a que constitui, em nossa língua, o tempo zero do mundo narrado e o que representa a perspectiva retrospectiva em re lação ao tempo zero, no mundo comentado." (Koch, 1984 : 43).

Esta constatação de Koch serve para a análise deste

tempo verbal nas narrativas do corpus coletado.

Assim sendo, a série de eventos que constitui a seção

estrutural Ação Complicadora é realizada através de orações

narrativas, cujo núcleo verbal encontra-se no Pretérito Per

feito, que recuperam linguisticamente os fatos na ordem tempo

ral em que estes ocorreram.

Nesta seção estrutural da narrativa há uma mescla de

verbos no Pretérito Perfeito e verbos no Pretérito Imperfeito .

Note-se que a dinâmica do processo narrativo se dá com verbos

do Pretérito Perfeito, que imcorporam a função referencial e

por si sõ conseguem recuperar linguisticamente os fatos orde

nados temporalmente e apresentam os elementos que, segundo

Labov, compõem a estrutura sintática básica da oração narrati^

va:

"e Então peguei meu mory boogui

f fiz meus aquecimentos

h e entrei na água.

1 Passei a arrebentação

m e procurei um lugar bom

p Após tentativas frustradas de pegar

algumas ondas consegui

t Trepei aquela maravilha da natureza

V e caí

X Eu vi o lip daquela onda

Page 56: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

estourar em cima de mim

2 fui rolando dentro d'água

hh e emergi

ii respirei fundo

11 e sair dali"; enquanto que as orações com Pretérito

Imperfeito têm uma função nitidamente avaliativa e não fazem

avançar o processo narrativo, antes comentam sobre as orações

narrativas, constituindo-se em Plano de Fundo do processo nar

rativo, já que este processo tem a função primeira de recuperar

lingüísticamente os eventos em sua seqüência temporal, confor

me pode se observar na seqüência de orações abaixo:

" g pensando

que tudo estivesse em ordem, pés-de-pato, cordi-

nha, etc ...

j minha colega ainda se aprontando

por isso entrei na água sozinha

i Eu estava acostumada a isso,

o fazi todos os dias,

1 passei a arrebentação."

0 acontecimento único, merecedor da própria locução,

se faz introduzir à altura da oração e. As orações e, ^ e h

estão em juntura temporal, e a narradora relata os procedimen

tos necessários e costumeiros para a prática do esporte a

que se refere no relato.

A oração g é avaliativa e não está em juntura tempo

ral com as orações próximas. Ao enunciá-la a narradora tem a

intenção de agir sobre o narratário através de recursos ava-

liativos, visando a apresentar o seu ponto de vista. Para is

so desvia-se da sintaxe básica da narrativa e utiliza , como

Page 57: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

recurso avaliativo, o condicional, que segundo Todorov:

"o condicional e preditivo oferecem não só uma característica semântica comum (a hipótese ) más se distinguem por uma estrutura sintática particular: dizem respeito a uma sucessão de duas orações e não a uma oração isolada. Mais precisamente, concernem ã relação entre essas duas orações, que é sempre de implicação, mas com a qual o sujeito da enunciação pode man­ter diferentes relações." (Todorov, 1979:142)

0 condicional, nesta oração, determina uma relação de

implicação com os eventos que seguem e a hipótese permanecerá

subjacente ã narração, apontando para uma relação implícita de

causa e efeito, que eventualmente poderá ser afastada em confor

midade com o desenvolvimento do fluxo do fio narrativo.

A narradora, na oração j, realiza uma avaliação exter

na, apresentando o ponto de vista de que a prática daquele es­

porte lhe é familiar e freqüente, e utiliza-se de vários me­

canismos de avaliação, tais como; o intensificador "ainda", a

negação, o progressivo passado, a oração explicativa "por is­

so entrei na água sozinha", o item lexical "sozinha", o marca

dor temporal de excesso "já", intensificado pela oposição an

tes e depois.

Nas orações e m a narradora dá prosseguimento ã a-

ção básica, informando ao narratário a seqüência dos eventos.

Suspende momentaneamente o fluxo do fio narrativo para apre­

sentar outra avaliação externa (oração o), de caráter locali^

ta, comentando sobre a escolha do lugar, marcada inclusive gra

ficamente pelo uso dos parênteses. Utiliza-se de recursos ava

liativos internos como o intensificador "muito", o item lexi­

cal "difícil" e a oração explicativa "pois havia muitos sur

fistas dentro d'água", levando o narratário a entender que a

prática deste esporte exige qualidades como paciência, habili

Page 58: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

dade e conhecimento e incluindo-se entre os praticantes deste

esporte ela também é detentora dessas qualidades, evidencian­

do-se a intenção de tornar seu relato reportável.

A narradora prossegue o desenvolvimento desta seção

estrutural com a oração £ , que fornece ao narratário uma or_i

entaçâo sobre o desenvolvimento da ação, além de informar que

o referido esporte é perigoso e difícil e exige habilidades ,

trazendo embutida uma força avaliativa, na seqüência;

"p Após tentativas frustradas de pegar

algumas ondas

q consegui

r era uma onda enorme

com a caracterização da onda, elemento indispensável para a

prática deste esporte.

Na oração r, o fluxo do fio narrativo é suspenso nova

mente enquanto a narradora tece considerações sobre este mo­

mento narrativo e utiliza o Presente Histórico como um meca

nismo de avaliação interna que torna o relato mais dramático,

pois traz o evento para o momento da fala, deslocando-o do

seu momento narrativo. (Ver Schiffrin, 1981).

Ao mesmo tempo que faz uso do Presente Histórico ( meio

produtor de tensão enquanto metáfora temporal).(Weinrich,

1974: 162,163), contrasta-o com o dêitico "naquele instante" ,

levando e trazendo o narratário do momento da fala ao momento

narrativo com grande rapidez, um jogo lingüístico que torna o

relato mais vivo através da apresentação dos seus sentimentos,

prosseguindo a avaliação com a caracterização da onda: " a on

da era realmente gigantesca".

O advérbio "realmente", embora não figure no modelo

Page 59: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

de Labov, foi considerado na análise desta narrativa como um

recurso altamente avaliativo, pois reforça o grau de credibi­

lidade e reportabilidade que a narradora quer imprimir a seu

relato, uma vez que exprime o sentimento e a atitude da narra

dora diante do fato enunciado. Os itens lexicais "confesso" e

"gigantescas" vem reforçar a credibilidade e a reportabilida­

de do evento através de seus expressivos conteúdos semânticos.

A ação narrativa alcança seu clímax com a seqüência

de orações t a Com a oração t, tem-se o sucesso de narrado

ra e na oração v, o seu fracasso introduzido pela conjunção

"mas" e ao fazer um jogo de prospecção (ia tentar dar) e de re

trospecção (cai), de caráter avaliativo, atua sobre o narratá

rio no sentido de abrir-lhe possibilidades de conclusão, base

ado na relação implícita de causa e efeito, introduzido pela

hipótese que já se encontra subjacente desde a oração £.

Neste ponto a ação narrativa é suspensa totalmente,

caracterizando a seção estrutural Avaliação, como estrutura

primária nas narrativas de experiência pessoal, confirmada pe

Ias narrativas produzidas pelos informantes do presente estu

do. A Avaliação estende-se da oração ^ a 23. Os recursos ava

liativos que marcam esta seção são a negação e a repetição ,

este último faz com que "a narrativa adquira a forma de esp^

ral" (Vogt, 1978) , demonstrando a competência narrativa do in

formante que não exagera nos detalhes, não causando confusão,

nem se tornando elíptica.

A negação, segundo o modelo de Labov, é um comparador

na medida em que coloca a negação como uma ação possívele não

realizada. 0 uso do verbo saber, precedido pela negação, ind^

ca que o narrador, no momento em que está narrando, perdeu o

Page 60: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

controle da situação e a oração subordinada é que apresenta a

ação importante para o desenrolar da narrativa (gg Nao sei co

mo tomei impulso).

Formalmente esta seção estrutural caracteriza-se pela

presença de orações restritas a este ponto da narrativa, mas

permutáveis entre si, isto é, não estão confinadas por juntura

temporal, além da predominância dos verbos no Pretérito Imper­

feito (estava, tentava, conseguia).

Quando a narradora produz a oração inicia-se Reso

lução que se caracteriza como conseqüência da Ação Complicado-

ra e prossegue até a oração 11^. Nesta seção, a narradora narra

que consegue emergir e intercala orações de juntura temporal

(orações narrativas) cora orações avaliativas, justificando, ex

plicando e apresentando seu ponto de vista, através de mecani^

mos sintáticos como o intensificador "ainda"; a oração explica

tiva combinada com comparador: "pois estava vindo uma seqüência

de ondas igualmente gigantescas"; o correlativo "estava vindo",

que apresenta um aspecto durativo da ação; além do reforço se­

mântico conseguido pelo item lexical "Gigantescas".

Com a oração mm, a narradora instala a seção estrutural

Coda e traz o narratário ao momento da enunciação e este efeito

é conseguido através do núcleo verbal no Pretérito Perfeito

usado no final da Resolução ("peguei"), do dêitico "aquela" e

pelo uso do Pretérito Perfeito no início da Coda "sai" e "pen

sei", sendo que este tempo verbal usado neste ponto da narrati­

va constitui-se numa neutralização entre o tempo de grau zero

do mundo narrado e o tempo de retrospecção do mundo comentado ,

ou ainda, "uma passagem da situação narrativa para a situação

discursiva" (como quer Morey, 1986: 48), e pelo Presente, numa

Page 61: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

clara referência ao momento da enunciação e à situação dialôg^

ca que engloba narrador/narratário: "É realmente existe alguém

la em cima que gosta de mim". A estes aspectos formais que ca

racterizam o momento discursivo na Coda, acresce-se o uso de

vun . estereótipo, que funciona como um recurso avaliativo alta

mente persüasivo, uma vez que o estereótipo" impede qualquer

questionamento acerca do que está sendo enunciado" (Citelli,

1985: 47). Então a narradora remete a Deus (alguém lã em cima)

o seu sucesso e fecha-se a hipótese que estava em aberto desde

a oração e que orientou a lógica da narrativa através da

argumentação de que a causa do seu fracasso estava fora do seu

conhecimento e a solução também, fora do seu alcance, evidenci

ando a tessitura desta narrativa e aonde a narradora estava

querendo chegar com o relato no sentido de influenciar o narra

tivo a adotar seu ponto de vista.

Este é um exemplo de uma narrativa altamente avaliada

e que se caracteriza como representante da estrutura global t^

pica da narrativa de experiência pessoal.

A seguir será analisada a narrativa de experiência v_i

cária produzida pela mesma informante EV A 20F;

a O fato que vou relatar agora

trata-se de uma história de amor à vida e à natureza

0

b Trapper era garimpeiro

que gostava muito da vida nas montanhas

c e vivia só,

d tinha como amigos apenas os animais e a natureza

e vivia do ouro, que ele retirava do rio

Page 62: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

u<

f e trocava por mantimentos

h certa vez, ao sair do posto de trocas

ele leu \im cartaz

que o fez ter lembranças tristes,

se tratava de um anúncio de compra de filhotes pelo

zoológico.

i Aquilo o revoltou tanto que ele rasgou o cartaz,

j o homem que lia

ficou furioso,

1 Frenchy era um homem sem escrupulos, sem carater,

que s5 pensava em dinheiro,

m Voltando as montanhas

n Trapper logo se esqueceu do ocorrido,

o Foi vizitar uma família de coiotes

que ele tratava com imenso carinho,

p Sem Trapper perceber

Frenchy o seguiu

q e viu a família de coiotes

r e pensou: Estes coiotes valem mais

que ouro, vou vendê-los ao Zoológico"

s Logo que Trapper se afastou

t Frenchy se aproximou

para pegar os filhotes,

u Os filhotes se assustaram

V e começaram a uivar.

X Trapper escutou

z e foi ver

o que acontecia

aa Trapper viu

Page 63: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Frenchy indo com os filhotes,

bb Trapper não sabia

o que fazer

pois Frenchy era mais forte que ele,

dd então teve uma idéia

ee e fez uma armadilha.

Rff Trapper prendeu Frenchy

gg e salvou os filhotes.

hh após o episódio Trapper voltou a sua

vida simples, sem riqueza

ii apenas amando

jj e protegendo a natureza.

Esta narrativa de experiência vicária apresenta as se

ç5es Sinopse, Orientação, Ação Complicadora, Resolução e Coda.

A seguir será analisada a estrutura global desta narrativa:

A Sinopse é realizada pela oração a que resume a estó

ria e traz embutido o ponto de vista da narradora. Pode- se ob

servar que a referência da Sinopse abrange a Ação Complicadora,

a Resolução e também a Avaliação. A Sinopse desta narrativa mo£

tra aspectos de envolvimento do narrador com o texto que produz

{"que vou relatar"), atuando como um recurso para despertar o

interesse do narratário.

Formalmente esta Sinopse é realizada por uma oração in

dependente, no início da narrativa e apresenta uma locução ver

bal (ir + relatar) que é marcadamente avaliativa, pois contém

um aspecto durativo, e, incorpora uma prospecção intrínseca, se

guida do item lexical "agora", que no texto perde o significado

Page 64: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

de neste momento para adquirir o significado de enquanto durar

esta narrativa^ numa evidente transmutação semântica em função

deste ato de fala; a narração.

Nas orações "b" a realiza-se a caracterização da

personagem principal (Trapper), através da seção estrutural Ori

entação, formada, nesta narrativa, por uma série de orações li­

vres, cujo núcleo verbal apresenta-se no Pretérito Imperfeito ,

o que indica o caráter habitual das ações enunciada e funcionan

do como Plano de Fundo para realçar a ação narrativa propriamen

te dita, que se desenvolverá: na seção estrutural Ação Complica

dor a.

O recurso avaliativo (sintático) mais usado nesta seção

é a explicação que funciona como qualificativo (oração adjetiva

introduzida pelo pronome relativo): "que gostava muito da vida

nas montanhas;"

"e (que) vivia só";

"que ele retirava do rio";

"e (que) trocava por mantimentos".

A narradora usa, ainda, o intensificador "muito; opera­

dor comparativo "como" e o item lexical "só", como recursos ava

liativos.

A narrativa prossegue com a expressão "certa vez", uma

expressão estereotipada utilizada para marcar, nesta narrativa,/

o inicio do processo narrativo dinâmico capaz de recuperar lin

guísticamente os eventos em sua seqüência temporal, e esta dina

micidade do processo narrativo realiza-se por uma série de ora­

ções narrativas concatenadas, cujos núcleos verbais encontrara -se

no Pretérito Perfeito (leu, revoltou, rasgou, ficou, esqueceu ,

foi visitar (^visitou), perceber (=percebeu), seguiu, viu, pen-

Page 65: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

sou, afastou-se, aproximou-se, assustaram, escutou, foi ver

(=viu), teve, fez), constituindo-se no Primeiro Plano narrati-.

vo, aquilo que é novo e digno de ser narrado, embora nesta se

ção estrutural encontre-se também orações avaliativas, funcio­

nando como Plano de Fundo para o desenrolar da ação narrativa,

cujos núcleos verbais se encontram-se no Pretérito Imperfeito

(tratava, lia, era, pensava, tratava, sabia, era).

A Ação Complicadora engloba as orações de h a In_i

cia narrando a ida da personagem Trapper ao posto e o encontro

com a personagem antagonista (Frenchy). A ação é interrom pid a

momentaneamente para a caracterização da personagem antagonis­

ta na oração 1. Esta oração, apesar de apresentar elementos o

rientadores para a caracterização da personagem antagonista, é

claramente avaliativa e para isso a narradora utiliza-se dos

recursos avaliativos; negação e explicação; "sem caráter", 'feem

escrúpulos", "que só pensava em dinheiro".

Nas orações 25, n e o, a narrativa retoma o seu fio con

dutor, levando a personagem principal para o seu espaço e afa­

zeres habituais, através da locução verbal (ir + visitar) e do

imperfeito (tratava) apoiado em seu aspecto durativo e imper

fectivo, o que se caracteriza como marca avaliativa, confirman

do o que Labov (1972) diz sobre a avaliação ser uma estrutura

secundária, que se distribui por vários pontos da narrativa,

sob várias formas.

Na oração , o fluxo do fio narrativo prossegue, mar

cado avaliativamente pela negação: "Sem Trapper perceber "

(= paráfrase: Trapper não percebeu). Tem-se, então, as orações

narrativas 3/ r e o encaixamento da avaliação, através da ação

avaliativa; "e pensou; Estes coiotes valem mais que ouro, vou

Page 66: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

vendê-los ao zoológico". Este momento narrativo é muito avalia

do através de desvios da sintaxe narrativa básica como o compa­

rativo (mais que) e da prospecção (vou vendê-los).

A ação narrativa prossegue com a oração s. apresentan­

do ações simultâneas das duas personagens, caracterizadas como

anti-sujeitos, enquanto desenvolvem programas narrativos anta­

gônicos, introduzidos pela partícula "logo".

A narradora suspende momentaneamente a seqüência de

ações conseqüentes e apresenta uma ação paralela nas orações u

e V para avaliar a reação dos filhotes diante da atitude da per

sonagem-antagonista;

"u Os filhotes se assustaram

V começaram a uivar"

O processo narrativo é retomado novamente nas orações

X a relatando a atitude da personagem principal. A seguir

tem-se uma Avaliação Externa nas orações bb - cc, marcada sin

taticamente pela negação, explicação e comparação, trazendo

grande complexidade ã estrutura narrativa básica:

" Trapper não sabia

o que fazer

pois Frenchy era mais forte que ele".

O processo narrativo prossegue nas orações ^ - ^3.

tingindo o seu clímax e o seu desenlace ocorrerá já na seção

estrutural Resolução, com as orações - jj.' sendo que as ora

ções 22 ® Ml orações narrativas típicas, marcadas por

juntura temporal; isto implica que qualquer alteração na orga

nização sintática destas orações prejudicará a interpretação

semântica original da seqüência temporal em que os eventos

ocorreram, observe-se:

" então teve uma idéia

Page 67: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

fez uma armadilha

Trapper prendeu Frenchy,"

assim sendo, infere-se que nesta narrativa a Ação Complicadora

e a Resolução formam uma única seção estrutural narrativa, nu

ma nítida relação de causa-consegüência, não interrompida pela

seção estrutural Avaliação, e esta estrutura global apresenta­

da por esta narrativa é típica da narrativa de experiência vi

cária, ou seja, neste tipo de narrativa a Avaliação, como es­

trutura primária, não se faz presente.

Já na Coda, a narradora tece comentários sobre a vida

da personagem principal e volta ao momento da enunciação atra­

vés da expressão: "Após o episódio", e esta seção confirma seu

caráter eminentemente avaliativo, fechando o círculo narrativo

iniciado pela Sinopse e indicando que a fronteira entre o mundo

narrado x mundo cotidiano está fechada, afastando a significa­

ção transmutada que "agora" tomou ao iniciar-se este ato de fa

la e libera o narratário de seu papel de interlocutor. No en­

tanto, as formas gerundivas das orações ff-gg; "amando"e"pro

tegendo", mostram claramente que o narrador deseja ter influen

ciado o narratário de algum modo, (efeito perlocucionário) dei^

xando implícita uma lição de amor à vida e à natureza, já colo

cada de forma subentendida quando do sucesso do programa narrati^

vo da personagem principal e o conseqüente fracasso do programa

narrativo da personagem-antagonista.

Prosseguindo a análise de narrativas, passa-se ao exa

me de narrativas.que^ segundo o modelo que orienta estas refle^

xões, podem ser consideradas incompletas por não apresentarem

todas seções estruturais da narrativa; Trata-se da.' narrativa

EP A 7M;

Page 68: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

O<

a Uma noite iim amigo me convidou

para roubar laranja

b antes de ir

nós convidamos outro amigo

c mas ele não quiz ir.

d AÍ nós fomos

e e chegando lá,

f o Everaldo subiu no pé

g e daí eu fiquei enbaicho

h pegando as laranja.

1 o Dadá, convidou outro guri

pra dar um susto em nós,

m o Dadá chegou lá

n e daí ele vio nós apanhando laranja

o e daí ele falou "assim" O que vocês

estão fazendo aí"

p eu e o Everaldo saimos correndo

q e nois passamo um cerca de arame farpado

só num pulo.

R

r quando chegamos em casa

s eles chegaram logo depois

t contamos essa história do susto

u e eles começaram a rir

V e dizer "o rapaz pois foi eu e o

Lino que falemos aquilo"

Esta narrativa apresenta apenas as seções estruturais

Ação Complicadora e Resolução. Os itens lexicais "noite" e

Page 69: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

"amigo" econtrados na oração a não são suficientes para se con^

tituírem niama seção de Orientação, pois que esta oração caracte

riza-se como uma oração narrativa típica e encontra-se em juntu

ra temporal com a oração b, e o item lexical "antes" que intro­

duz a oração b afasta qualquer dúvida neste sentido por ser um

elemento denotador da seqüência temporal.

Se para Labov (1972) uma narrativa completa apresenta

as seções estruturais; Orientação, Ação Complicadora, Avalia­

ção, Resolução, Coda, esta narrativa caracteriza-se como uma

narrativa incompleta, pois apresenta apenas as seções estrutu­

rais essenciais da narrativa, aquelas capazes de recuperarem

lingüísticamente um acontecimento em sua dinamicidade. Assim

sendo, este texto só cumpre a seqüência narrativa e pode se

atribuir a ele um caráter de pobreza, entendido enquanto falta

de detalhes e avaliação, mas não se pode dizer que não se deu

o processo narrativo. Por outro lado, observou-se no corpus co

letado poucos textos com estas características, o que permite

mostrar que manifestações lingüísticas as mais diversas são

criadas a partir da situação de interlocução que se estabelece

entre os usuários da língua; e nessa situação e por ela é que

se dão as diversas formas discursivas. Parece que, neste textcy

houve interferência, na escrita de recursos da oralidade, o que

demonstra que o narrador teve dificuldades em dominar a situa­

ção de interlocução na qual se insere o texto escrito, não per

cebendo que as situações de interlocução oral,e escrita são di^

ferentes na medida em que, na oral a situação de enunciação é

dada, ao mesmo tempo que o texto, ou seja, conhece-se o inter­

locutor, o tempo e o lugar da enunciação, enquanto que, na es

crita, apenas o texto é apresentado ao narratário.

Page 70: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

A apresentação abrupta das personagens antecedidas pe

lo artigo definido: "f o Everaldo subiu no pé"; "1 o Dadá con

vidou outro guri"; o uso dos continuativos: "ai, daí, então" ;

além de desvios de concordância; como o apagamento do s: "h pe

gando as laranja"; "q e nois passamo um cerca..."; alternância

da vogal [a] e [e[ na conjugação verbal: "falemo"; podem ser

citadas como marca desta oralidade, evidenciando-se o manejo

precário que o narrador tem da língua escrita e que este narrador

assimila a imagem do interlocutor a sua própria imagem, deixan

do muitas lacunas, pois para este narrador tudo pode ser supri,

mido diante deste narratário idealizado. (Ver Vieira e Vogt, 1978).

Observe-se, agora, como este narrador recuperou o acon

tecimento. Cfcmo'-já foi visto esta narrativa apresenta apenas as

seções estruturais Ação Complicadora e Resolução.

Inicia-se a Ação Complicadora na oração a e estende-se

até a oração 3. Esta seção é formada por orações narrativas t^

picas, cujos núcleos verbais encontram-se no Pretérito Perfeito

(convidou, convidamos, quiz, fomos, subiu, fiquei, convidou ,

chegou, viu, falou, passamos, falamos, foi), no Progressivo Pa£

sado (saímos correndo) ou no infinitivo ou gerúndio (chegando,

apanhando, roubar, ir, dar), denominado por Weinrich de semi-

tempos, pois estes tempos verbais dependem de informação de ou

tros tempos verbais. (Ver Weinrich, 1974: 360).

Esta narrativa apire senta poucos desvios da sintaxe nar

rativa básica, uma vez que na maior parte das orações realizam

-se apenas os elementos sintáticos que Labov considerou como

estruturadores da sintaxe básica da narrativa, quais sejam ;

conjunção, sujeito, núcleo verbal, complemento verbal, adjunto

adverbial de tempo, de lugar e de modo e os poucos desvios que

Page 71: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

ocorrem podem ser considerados como recursos avaliativos, nesta

narrativa:

"a Uma noite iim amigo me convidou para roubar laranja";

o infinitivo roubar, nesta oração, desloca a perspectiva de lo­

cução, fazendo uma prospecção e apresentando a ação principal

da narrativa que ainda irá se desenrolar. Pode-se atribuir a

este jogo prospectivo um caráter avaliativo. A narrativa pros­

segue com as orações b e c:

"b antes de ir

:: nós convidamos outro amigo

c mas ele não quiz ir."

A oração b está em juntura temporal com a, como indica

o item lexical "antes", e na oração £, a conjunção "mas" e a

negação são recursos avaliativos, que apresentam um fato que

poderia ocorrer {a aceitação do convite) e não ocorreu. Esta

oração é altamente avaliativa, pois dela depende o desenrolar

da narrativa, constituindo-se no elemento propulsor do proces­

so narrativo: a não aceitação do convite é que desencadeará os

eventos seguintes.

Nas orações d e h, instala-se a ação principal, enquan

to nas orações m a n instala-se uma ação paralela, desenvolvi­

da pela personagem - antagonista, Dadá. A oração 1 apresenta

o infinitivo (para dar), que desloca a perspectiva de locução

através do jogo prospectivo para esta ação paralela e antagôni^

ca. A narrativa projeta-se sobre interesses antagônicos (rou

bar laranjas x dar susto) que movem as personagens envolvidas

em programas narrativos distintos.

Na oração o, o narrador utiliza-se do discurso direto,

uma forma de encaixamento da avaliação capaz de reproduzir a

Page 72: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

ação da personagem-antagonista (antagonista, do ponto de vista

do narrador, já que esta interfere em seu programa narrativo;

roubar laranjas);

o falou assim "0 que voces estam fazendo ai"; este re

curso avaliativo torna-se eficaz, pois desencadeia uma

ação que influenciará o fracasso do programa narrativo de per­

sonagem principal (narrador) como ele narra nas orações £ a 3;

"p eu e o Everaldo saimos correndo

q e nois passamo uma cerca de arame farpado só num pulo; "

e o sucesso subtendido do programa narrativo da perso

nagem antagonista (dar susto), e neste momento narrativo, che­

ga-se ao clímax da ação e inicia-se a Resolução, na seqüência

de orações de £ ^ X*

r quando chegamos em casa

s eles chegaram logo depois

t contamos essa história do susto;

nas orações r e t, o narrador prossegue relatando a

ação principal de chegar e contar a história, intercalada pela

explicação da oração que adquire um caráter avaliativo, em

bora seja uma oração narrativa que esteja em juntura temporal

com r, como o propósito de confrontar as personagens principal

e antagonista e seus respectivos programas narrativos.

Prosseguindo a narrativa tem-se nas orações u e v ( e

eles começaram a rir) a apresentação do sucesso da personagem

antagonista e seu programa narrativo (dar susto) e para isso,

o narrador utiliza-se do recurso avaliativo discurso direto,

passando a palavra a seu antagonista;

"v "0 rapaz, pois foi eu e o Lino que falemos aquilo".

As orações avaliativas o e v caracterizadas pelo dis-

Page 73: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

curso direto, quando o narrador passa a palavra a seu antagonis

ta, aponta para o ponto de vista que o narrador deseja passar

para o narratário de que o seu colega é esperto e ele não; nar­

ra a sua desvantagem por ter feito papel de tolo {levar susto).

Na verdade, não havia razão para o susto, já que era falso o po

der atribuído ao colega (em determinado momento narrativo) de

interpelá-lo; "0 que vocês estão fazendo aí?" Ao narrador falta

ram instrumentos lingüísticos para auxiliá-lo no desempenho da

produção narrativa para poder influenciar e informar melhor o

narratário.

A seguir será analisada uma narrativa de experiência vi^

cária como outro exemplo de narrativa incompleta. Utilizou-se o

mesmo critério de seleção de informantes para que se evidencie

a estrutura global da narrativa. Assim, analisou-se narrativas

de um mesmo informante, para exemplificar narrativa de experiên

cia pessoal e narrativa de experiência vicária.

EVA 20M;

o

a Um dia Trapper achou ouro

b e desceu

c ele ia comprar comida

d Na vendinha tinha um homem mal encarado e barbudo,

e Trapper parou no caminho

f e viu os lobinho

g e então foi embora

h mas o homem lhe tava seguindo

i e pegou aqueles filhotes

que começaram a gritar

j Daí ele fez uma armadilha

Page 74: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

1 que caiu direto nela

m e os bichinhos foram soltos

n e aquele outro deu boas gargalhadas

Esta narrativa de experiência vicária apresenta apenas

as seções estruturais Ação Complicadora e Resolução, caracter_i

zando-se como uma narrativa incompleta, segundo o modelo que

orienta .esta análise.

A ação complicadora inicia-se na oração a e estende-se

até a oração j, quando a ação atinge seu clímax. Nota-se que o

narrador não domina a situação de interlocução, em que seu vir

tual narratário não conhece o filme a que ele assistiu e que

está relatando. A omissão de detalhes de orientação e avaliação

prejudicam a recuperação do acontecimento narrado.

Na oração a, o narrador inicia a narrativa com a fórmu

la estereotipada "um dia", que não acrescenta nenhuma informa­

ção ao narratário, apenas o transporta do mundo cotidiano para

o mundo narrado e apresenta abruptamente a personagem em ação:

a Um dia Trapper achou ouro

b e desceu;

as lacunas na informação deixam dúvidas ao narratário

(achou ouro-^onde?; desceu-de onde?); dúvidas, que numa situa­

ção de interlocução face a face poderiam ser suprimidas; mas

que, na escrita, permanecem e prejudicam a recuperação do pro

cesso narrativo, o que provoca dificuldades de entendimento do

texto.

Na oração c "ele ia comprar comida", o narrador explica

o que o personagem desejava fazer. Poder-se-ia pensar que estas

orações formassem uma seção de Orientação, mas as característi-

Page 75: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

1 que caiu direto nela

m e os bichinhos foram soltos

n e aquele outro deu boas gargalhadas

Esta narrativa de experiência vicãria apresenta apenas

as seções estruturais Ação Complicadora e Resolução, caracter_i

zando-se como uma narrativa incompleta, segundo o modelo que

orienta : esta análise.

A ação complicadora inicia-se na oração a e estende-se

até a oração j, quando a ação atinge seu clímax. Nota-se que o

narrador não domina a situação de interlocução, em que seu vir

tual narratário não conhece o filme a que ele assistiu e que

está relatando. A omissão de detalhes de orientação e avaliação

prejudicam a recuperação do acontecimento narrado.

Na oração a, o narrador inicia a narrativa com a fórmu

la estereotipada "um dia", que não acrescenta nenhuma informa­

ção ao narratário, apenas o transporta do mundo cotidiano para

o mundo narrado e apresenta abruptamente a personagem em ação;

a Um dia Trapper achou ouro

b e desceu;

as lacunas na informação deixam dúvidas ao narratário

{achou ouro^onde?; desceu-de onde?); dúvidas, que numa situa­

ção de interlocução face a face poderiam ser suprimidas; mas

que, na escrita, permanecem e prejudicam a recuperação do pro

cesso narrativo, õ que provoca dificuldades de entendimento do

texto.

Na oração c "ele ia comprar comida", o narrador explica

o que o personagem desejava fazer. Poder-se-ia pensar que estas

orações formassem uma seção de Orientação, mas as característi-

Page 76: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

"lobinhos" e "bichinho" enunciados neste texto.

Na oração j: "Daí ele fez uma armadilha". 0 item lex_i

cal "ele” não deixa clara a sua referência, pois tanto pode re

ferir-se a "Trapper" ou ao "homem", dificultando a interpreta­

ção, e esta dificuldade se ampliará na oração _1, já na seção

estrutural Resolução;

"1 que caiu direto nela", nesta oração o item lexical

"que" é usado inadequadamente e tem valor da conjunção aditiva:

(e caiu direto nela) . Se por vim lado, a conjunção "e" afasta

a possibilidade de interpretar-se esta oração como uma oração

explicativa, introduzida por pronome relativo, por outro lado

resolve o aspecto da juntura temporal, pois evidencia a rela

ção temporal marcada por "antes" e "depois" em que se sucedem

os fatos: alguém fez uma armadilha e alguém caiu nela; o que

esta alteração e esse raciocínio não explicam é quem fez a ar­

madilha e quem caiu nela, e neste ponto a narrativa torna-se

incompreensível. E o narrador prossegue:

"m e os bichinhos foram soltos

n e aquele outro deu boas gargalhadas"; e o narratá-

rio deveria perguntar; "quem é aquele outro?"

Como se ve, esta narrativa esta repleta de lacunas, de

referências inadequadas e ambíguas, impossibilitando a compre­

ensão da narrativa, embora não se possa dizer que não ocorreu

o processo narrativo, pois este texto apresenta orações narra­

tivas com juntura temporal, elemento caracterizador do proces­

so narrativo, segundo o modelo de análise adotado. Mas, por

mais boa vontade que possua o narratário de recuperar o aconte

cimento efetivamente ocorrido, não conseguirá, pois os recur

sos lingüíticos utilizados pelo narrador não são suficientes

para que isto ocorra. A falta de domínio da situação de inter

Page 77: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

locução acrescido do manejo precário do código escrito faz com

que o narrador tenha o seu desempenho narrativo prejudicado. 0

narratário não consegue recuperar o ponto de vista do narrador,

uma vez que nesta narrativa os elementos avaliativos são esca^

sos e isso faz com que se tenha um texto desenunciado (Ver Ca

minha; 1986; 70-73), não fazendo referência alguma sobre o mo

mento ou sujeito da enunciação.

3.2. Pseudo-narrativas

Embora a grande maioria dos textos coletados sejam nar

rativas bem sucedidas, no sentido de apresentarem as seções e^

truturais da narrativa e ser possível evidenciar o processo nar

rativo, encontrou-se alguns que não o são (Ver análise quanti­

tativa) . Iniciam como se fossem narrativas, ou seja, apresen

tam segmentos com características de Sinopse ou Orientação e

mesmo um fato que poderia ser propulsor do processo narrativo,

como nos exemplos abaixo, mas estes textos não se configuram

como narrativas:

EVB 39F

a Trapper era um senhor

que vivia nas florestas e nos campos,

enfim vivia com a natureza,

b Os seus amigos eram os animais

c e seus inimigos eram os que maltratavam os animais,

d Mas toda vez que Frenchy ia maltratar os animais pa

ra ficar bem na vida,

e Trapper ia ajudar os seus amigos

f Trapper vivia em lugares lindos.

Page 78: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

g Era cada lugar que Trapper passava tinha seus animais

de toda espécie,

h Trapper de tão bom que era

sentia-se feliz,

i mas seus inimigos encontravam

a tristeza que mereciam,

j Não devemos nunca maltratar os animais

1 Devemos sim conservar a natureza.

Este texto caracteriza-se principalmente pela oposição

semântica entre itens lexicais. Observe-se outro texto que não

realizou o processo narrativo:

EVB 35 F:

a Esta história nos contou

que não devemos maltratar os animais

b não devemos ser egoístas

c sovando,

d chutando,

e malçacrando

pois os animais não fazem mal a ninguém^'

f querem de nós apenas a liberdade,

g também devemos olhar nosso mundo

para ver as maravilhas

h mas o que mais precisamos

poupar em nosso mundo

é a felicidade,

i e também lutarmos pela liberdade, não só a nossa, mas

também a dos animais,

que mais precisam de nós

Page 79: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

j Quando pensar em fazer algum mal lembre-se

que acontecerá coisas más.

1 Trapper queria s5 o bem dos animais enquanto Frenchy

queria s5 a riqueza.

m e acabou numa armadilha.

Nestes exemplos de textos não-narrativos dois deta­

lhes chamaram a atenção;

a) os textos não-narrativos foram produzidos na situa­

ção narrativa experiência vicária, o que leva a pensar que esta

situação narrativa ofereça maior dificuldade para o adolescen­

te reportar os acontecimentos;

b) os informantes que produziram textos não narrativos

eram alunos do curso do magistério (3i série do IIQ grau), o

que leva a pensar que estes informantes além de desconhe ce rem

as características do texto narrativo, têm a sua produção pre

judicada pela assimilação de características do discurso didá

tico, embora a variável curso não houvesse sido considerada co

mo uma variável relevante, capaz de interferir no resultado da

presente investigação, no entanto, ê uma hipótese que poderia

ser investigada em pesquisas futuras. 0 raciocínio de que o

curso haja influenciado na produção deste tipo de texto está

embasado teoricamente nas considerações de Orlandi (1987) so­

bre o discurso pedagógico. Segundo esta autora, este tipo de

discurso quebra as leis do discurso, tais como enunciadas por

0. Ducrot (1972) : o interesse, a utilidade ou a lei da informa

tividade e ela analisa:

"Além dessas leis gerais válidas para o compor tamento lingüístico em geral, há uma regula­

mentação para cada categoria de atos de fala (...), o recurso didático, para mascarar a

quebra das leis de interesse e utilidade, é a

Page 80: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

chamada motivação no sentido pedagógico. Essa motivação aparece no DP como motivação que cria interesse, que cria uma visão de utilidade, fa zendo ccan que o DP apresente as razões do sistona como razoes de fato. Ex.: no léxico, o uso das pala vras "dever", "ser preciso". (Orlandi, 1987:18)

As considerações da autora sobre o discurso pedagógico

orientaram a análise destes textos, que trouxeram dificuldades

sob o ponto de vista do modelo de análise adotado, já que não

apresentavam o elemento caracterizador da narrativa, ou seja,

a juntura temporal, o que implica em ausência do processo nar

rativo, e se tornaram úteis para a determinação das caracter!^

ticas do discurso didático que,- segundo Citelli (1985:53) cos­

tuma ser marcado por duas variáveis fundamentais: a estereoti-

pia e a idealização, e este se organiza em torno de temas como

religião, riqueza, pobreza, amizade, felicidade, etc....

Das considerações de Orlandi e Citelli valeu-se a ana­

lista para o estudo destes textos e procurou-se marcas lingüí^

ticas do discurso didático, que serão apresentadas a seguir;

a) Uso do imperativo, confirmando o caráter autoritá­

rio deste tipo de discurso, enquanto se apropria e reproduz o

saber institucionalizado:

EVB 35F:

"j lembre-se

que acontecerá coisa más;"

b) Uso constante dos itens lexicais "dever", "querer "

EVB 39F:

"j Não devemos maltratar os animais"

1 Devemos sim conservar a natureza.

EVB 35F:

" Esta história nos contou

Page 81: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

que não devemos maltratar os animais"

"b não devemos ser egoístas"

1 Trapper só queria o bem dos animais";

b) Jogo de negação e de afirmação, primeiro condena-se

um comportamento na voz autoritária deste discurso para a se

guir enunciar o comportamento correto, que implicitamente está

sendo endossado pelo referido discurso:

EVB 39F:

"j Não devemos nunca maltratar os animais"

"1 Devemos sim consrvar a natureza"

"h Trapper de tão bom que era

sentia-se feliz

i mas seus inimigos encontravam

a tristeza que mereciam"

EVB 35F:

"1 Trapper queria só bem dos animais,

enquanto Franchy queria só a riqueza"

c) Idealização subjacente neste tipo de discurso, e pa

ra exemplificar isto, pode-se citar a sobreposição de temas e

leitos por este tipo de discurso em constante oposição, como

ccnpor t amentos aceitáveis e inaceitáveis: felicidade x tristeza, , bem dós

animais e danatureza x riqueza; bondade x maldade; liberdade x

não liberdade; amor x desamor, egoísmo x altruísmo.

e) Estereotipia, pois o discurso pedagógico é por exce

lência um discurso persuasivo, enquanto espera modificar com­

portamentos; e este é um recurso altamente convicente por tra

Page 82: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

zer implicitamente um valor de verdade^ üm exemplo de estereo-

tipia encontra-se no texto EVB 35F; em que o estereótipo "pou

par" é usado inadequadamente e traz um certo estanhamento se­

mântico, pode se dizer até uma certa incoerência, pois na ora

ção h tem-se:

"h mas o que mais precisamos poupar em nosso mundo é a

felicidade". Ora se poupar felicidade, implica em não

ser feliz e pelos argumnetos da informante quem é feliz é quem

quer o bem dos animais, quem não é egoísta, percebe-se que a

informante está em flagrante contradição. A explicação para o

uso deste item lexical que parece mais adequada para a analista

é a assimilação de uma forma estereotipada, apreendida através

do discurso didático a que a informante está exposta e cujo

conteúdo semântico não incorporou por ser estranho ao seu re­

pertório lingüístico.

Sob o ponto de vista de modelo adotado, não é possível

considerar estes textos como narrativas, uma vez que não apre

sentam nenhuma juntura temporal e não recuperam linguísticamen

te o processo narrativo em sua dinamicidade; falta a estes tex

tos aquilo que é típico da narrativa, ou seja, falta o ciclo de

ações dinâmicas, ligando-se uma ã outra para restaurar um acon

tecimento, não apresentando aquilo que é essencialmente narra­

tivo: as seções estruturais Ação Complicadora e Resolução. Ã

ausência da juntura temporal soma-se a ausência de núcleos ver

bais no Pretérito Perfeito, caracterizado como tempo de grau

zero do mundo narrado. Assim sendo, pode-se considerar textos

como estes pseudo-narrativas, enquanto não detentores dos ca­

racteres da narrativa e por não serem capazes de recuperar lam

acontecimento em sua seqüência temporal.

Page 83: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

3.3. - Ciclo Narrativo: texto com mais de vuna narrativa.

Se, por um lado, tem-se textos que não apresentam nar

rativa alguma, como se viu anteriormente, por outro lado, tem

-se textos que se constituem em mais de uma narrativa. Obser­

ve-se o texto a seguir:

EPB 23M:

O

a Aos 7 anos eu morava em Santiago,

um lugar do interior, sem luz elétrica

b e tinha um colega muito brincalhão

u

c Um dia eu ia na venda

d e vi um vulto branco

e então sai correndo

f e gritando

g Lógico que pensei

que era um fantasma

Rh mas meu colega tirou o lençol

i e começou a rir de mim.

u

C

j Alguns dias depois eu convidei

o meu colega para brincar.

1 Fiz uma máscara com uma abóbora,

m coloquei uma vela acesa dentro dela,

n e deixei no rancho

Page 84: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

o Não havia a hora de me vingar

Rp Quando ele foi se esconder no rancho

levou um grande susto

q e aí foi a minha vez de rir.

r E continuamos a pregar peça um no outro durante mu_i

to tempo,

s até que vim para a cidade.

Para elucidar a idéia de que este texto apresenta mais

de uma narrativa, dividiu-se o texto em duas partes: a primei

ra de "Aos 7 anos ... rir de mim" e a segunda de "j Alguns

dias depois ... até o final, pois cada parte constitui-se numa

narrativa completa, conquanto, ambas apresentam um ciclo comple

to de ações conseqüentes, sendo que estes ciclos estão intima

mente relacionados, já que formam um texto complexo e coerente.

Na primeira parte, tem-se um ciclo narrativo completo,

com estas seções estruturais:

Orientação - orações a e b

Ação Complicadora - orações de c a ^

Avaliação - oração 3^

Resolução - orações h e i .

Da mesma forma, na segundo parte do texto, tem-se ou

tro ciclo narrativo completo, com estas seções estruturais:

Ação Complicadora - orações j. a n

Avaliação - oração o

Resolução - oração p

Page 85: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Coda - orações £ a ^

Tem-se, pois, em cada iima das partes, um ciclo de a

ções instaurando eventos distintos. As ações do primeiro ci­

clo estão ligadas entre si no sentido em que uma ação é conse

qüente em relação ã outra, o conjunto delas formando xim todo

coerente, um todo dinâmico. Já entre as orações "i e começou

a rir de mim” e "j Alguns dias depois eu convidei o meu cole­

ga para brincar", última oração da primeira parte e a prime_i

ra oração da segunda parte, respectivamente, não há tal liga­

ção conseqüente. Neste ponto do texto acaba um ciclo de ações

e começa outro, inclusive com a alternância pelas personagens

dos papéis de agente e paciente da ação, (ora dar susto, ora

tomar susto), além de que os programas narrativos que se pro

jetam na narrativa são distintos e não simultâneos.

Pelo exposto, procurou-se deixar claro por que se con

siderou que este texto apresenta mais de uma narrativa, e a

argiimentação que valida o raciocínio desta análise é que este

texto possui mais de um ciclo completo de ações conseqüentes.

3.4. - Análise Quantitativa

Prosseguinio a análise da estrutura global da narrativa

nas duas situações de produção (EP e EV) pelos dois grupos de

informantes (A e B), procurou-se combinar a análise qualitati­

va à análise quantitativa. Assim, elaborou-se quadros que con

figuram as matrizes narrativas das produções de cada informan­

te em seu grupo específico em cada situação de produção.

Estes quadros fornecem uma visão geral da produção da

Page 86: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

estrutura narrativa e constituem a fonte básica para o levanta

mento quantitativo, sobre o qual se fez o tratamento estatíst_i

CO, a fim de se detectar o nível de significãncia dos dados co

letados na realização do estudo comparativo que será apresenta

do a seguir.

Para se efetivar o estudo comparativo, baseou-se na ob

servação da expressão numérica e do índice estatístico. Apl_i

cou-se o teste estatístico Qui-quadrado, cujo índice de signi-

ficância é positivo, se superior a 3,841 e negativo, se infe

rior a este índice.

As matrizes narrativas dos quadros 1, 2, 3 e 4 configu

ram-se pela presença (+) ou ausência (-) das várias seções e^

truturais que concorrem para a estrutura global da narrativa.

Para a configuração destas matrizes narrativas levou-

se em conta apenas a seção estrutural Avaliação, como estrutu

ra primária, localizada entre as seções estruturais. Ação Com

plicadora e Resolução, conforme já foi caracterizada na funda

mentação teórica desta dissertação.

Page 87: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio
Page 88: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Os dados do quadro 1 mostram que os informantes do gru

po A na situação de produção EP, em sua totalidade, produziram

textos narrativos, porque produziram as seções estruturais

senciais à recuperação do evento narrado em sua seqüência tem

poral, fato verificável pela freqüência 20, para as seções

Ação Complicadora e Resolução.

Verifica-se que a seção produzida com menor freqüência

foi a Sinopse (freqüência 11), que as seções Orientação e Ava

liaçâo foram produzidas com igual freqüência (freqüência 16) e

que a Coda foi produzida com freqüência expressivai(freqüência 18).

Pela observação e análise dos dados constata-se que os

informantes do grupo A produzem textos narrativos nesta situa­

ção de produção o que fica evidenciado pela freqüência máxima

de realização das seções Ação Complicadora e Resolução.

A ausência de algumas seções assinaladas, neste quadro,

não se constitui em expressão numérica significativa capaz de

prejudicar o desempenho deste grupo nesta situação de produ­

ção, já que se refere a seções não essenciais à recuperação do

evento narrado em sua seqüência temporal.

Os dados atestam, conforme caracterização teórica da

estrutura narrativa, a realização de todas as seções estrutu

rais da narrativa previstas pelo modelo de análise adotado, em

bora haja- pequena diferença numérica entre algumas seções.

Mesmo havendo esta diferença numérica é de se esperar que ou

tros narradores desta faixa etária e neste nivel de escolarida

de produzam textos narrativos em situação de produção semelhan

te, fato que poderá ser confirmado em pesquisas futuras.

Page 89: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio
Page 90: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Os dados do quadro 2 mostram que os informantes do gru

po B na situação de produção EP, em sua totalidade produziram

textos narrativos na medida em que produziram as seções estru

turais essenciais à recuperação do evento narrado em sua se­

qüência temporal, fato verificável pela freqüência 20, para as

seções Ação Complicadora e Resolução.

Verifica-se, ainda, a freqüência 20 para a seção Ava

liação, freqüência 18 para as seções Orientação e Coda e que

a seção realizada com menor freqüência foi a Sinopse (freqüên

cia 13).

Pela observação e análise dos dados, constata-se que

os informantes do grupo B produzem textos narrativos nesta s^

tuação de produção, o que fica evidenciado pela freqüência máxi^

ma de realização das seções Ação Complicadora e Resolução.

A ausência de algumas seções assinaladas, neste qu£

dro, não se constitui em expressão numérica significativa ca

paz de prejudicar o desempenho deste grupo nesta situação de

produção, já que se referem a seções não essenciais ã recupera

ção do evento em sua seqüência temporal.

Os dados atestam, conforme caracterização teórica da e^

trutura narrativa, a realização de todas as seções estruturais

da narrativa previstas pelo modelo de análise adotado embora

haja pequena diferença numérica entre algumas seções. Mesmo ha

vendo esta diferença numérica é de se esperar que outros narra

dores desta faixa estária e neste nível de escolaridade produ­

zam textos narrativos em situação de produção semelhante, fato

que poderá ser confirmado em pesquisas futuras.

Page 91: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio
Page 92: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Os dados do quadro 3 mostram que 19 informantes do gru

po A na situação de produção EV produziram as seções estrutu

rais essenciais à recuperação do evento narrado em sua seqüên­

cia temporal (freqüência 19, para a Ação Complicadora e a Reso

lução) e que apenas 1 informante (16 F) produziu texto não nar

rativo, caracterizado pela ausência das várias seções estrutu­

rais da narrativa.

As observações dos dados mostram que apenas 3 informan­

tes deixaram de produzir a seção Orientação, indicada pela fre

qüência 17.

As seções produzidas com menor freqüência foram a S_i

nopse (freqüência 03) e a Coda (freqüência 04).

Quanto ã seção Avaliação, os dados mostram sua ausên

cia, nesta situação de produção, não figurando em nenhum dos

textos examinados, (freqüência 0).

A análise aponta que a ausência da Avaliação, nesta s_i

tuação de produção ê muito significativa, pois indica que esta

seção não concorre para a estrutura global da narrativa de ex

periência vicária (EV), conforme análise posterior desta seção

estrutural.

Page 93: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio
Page 94: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Os dados do quadro 4 mostram que 17 informantes do gru

po B, na situação de produção EV produziram textos narrativos,

enquanto 3 informantes (34F, 35F, 39F) produziram textos não-

narrativos, uma yez que deixaram de produzir as várias seções

estruturais da narrativa.

Observou-se que as seções Ação Complicadora, Resolução

e Orientação foram realizadas com igual freqüência. (Freqüência 17).

A seção Coda foi realizada com freqüência 09, enquanto

a seção Sinopse foi realizada com a menor freqüência. (Freq. 08).

Quanto à seção Avaliação, os dados mostram a ausência

desta seção, nesta situação de produção, não figurando em' ne­

nhum dos textos examinados. (Freqüência 0).

A análise aponta que a ausência da Avaliação, nesta si

tuação de produção, ê muito significativa, pois indica que e^

ta seção não concorre para a estrutura global da narrativa de

experiência vicária (EV), conforme análise posterior desta se

ção estrutural.

3.4.1 - Avaliação da hipótese 1

Os dados que configuram as matrizes narrativas apresen

tados- nos quadros 1, 2, 3 e 4 permitiram a elaboração do qua

dro 5, apresentado a seguir a fim de se efetuar a avaliação

da hipótese 1, através da confrontação e da análise dos dados.

Page 95: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Freqüência das várias seções que concorrem para a estru

rura global da narrativa produzidas pelos informantes dos grupos

A e B nas duas situações de produção.

Seçoes

Estruturais

Situação

de ProduçãoTotal Grupos

A B

EP

EV

24

11

11

03

13

08

EP

EV

34

34

16

17

18

17

ACEP

EV

40

36

2019

2 017

EP

EV

36 16 2 0

EP

EV

40

36

2 019

2 017

EP

EV

36

13

18

04

18

09

De maneira a avaliar a hipótese 1: os informantes do

Grupo B apresentariam um melhor desempenho na produção da es

trutura narrativa do que os informantes do grupo :A inas duas si

tuações de produção, confrontou-se os dados do quadro 5 que

apontam um desempenho idêntico dos dois grupos quando da reaM

zação das seguintes seções estruturais na situação de produção

EP, conforme pode ser verificado pelas freqüências:

Ação Complicadora - Freqüência 20 (A e B);

Page 96: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Resolução - Freqüência 20 (A e B);

Coda - Freqüência 18 (A e B), e um desempenho

diferenciado na realização das seguintes seções, nesta mesma

situação, conforme pode ser verificado pelas suas freqüências:

Sinopse - Freqüência 11 (A), 13 (B);

Orientação - Freqüência 16 (A), 18 (B);

Avaliação - Freqüência 16 (A), 20 (B).

Ao confrontar-se os dados coletados na situação EV para

a comparação do desempenho dos dois grupos, observa-se um de

sempenho idêntico entre os dois grupos quando da realização

das seguintes seções, conforme pode ser verificado pelas suas

freqüências;

Orientação - Freqüência 17 (A e B);

Avaliação - Freqüência 0 (A e B) e um desempenho d_i

ferenciado quando da realização das seguintes seções, conforme

pode ser verificado pelas suas freqüências:

Sinopse - Freqüência 03 (A); 08 (B)

Ação Complicadora - Freqüência 19 (A), 17 (B)

Resolução - Freqüência 19 (A), 17 (B)

Coda - Freqüência 04 (A), 09 (B).

Os dados apontam desempenho favorável para o grupo A,

na realização das seções Ação Complicadora e Resolução e desem

penho favorável para o grupo B, na realização das seções Sino£

se e Coda. Ê importante ressaltar que o grupo A produziu as se

ções essenciais ã estrutura narrativa em maior número.

Um dado valioso observado foi a igual freqüência reali.

zada para as seções estruturais Ação Complicadora e Resolução

nas duas situações de produção. Isto demonstra que o informan­

te realiza simultaneamente estas duas seções, responsáveis pe

Page 97: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

lo ciclo de ações conseqüentes e pela recuperação lingüística

do evento em sua seqüencia temporal.

Observa-se, ainda, que tanto os informantes do grupo A

quanto os do grupo B produziram textos narrativos na situação

EP, enquanto que na situação EV, o grupo A produziu 19 textos

narrativos e o grupo B produziu 17 textos narrativos, contra­

riando a hipótese levantada, embora a diferença (2 informantes)

não se constitua em número significativo capaz de caracterizar

um melhor desempenho do grupo A nesta situação de produção.

Outro dado importante que o quadro mostra é que a pro

dução de textos não-narrativos ocorreu apenas em situação- de

produção EV, o que leva o analista a considerar que não há d^

ferença significativa de desempenho na produção da estrutura

narrativa entre os dois grupos, uma vez que o fato (produção

de textos não-narrativos) ocorreu em uma situação específica

de produção.

Quanto ao maior número de informantes do grupo B que

produziu texto não-narrativo (3 informantes), já foi levantada

a hipótese, quando da análise qualitativa deste tipo de texto

no item 3.3, desta dissertação, de que o curso que os informan

tes freqüentam (magistério) tenha influenciado ■ sua produção.

O desempenho diferenciado mais significativo entre os

dois grupos ocorreu, na situação EV, na produção das seções es

truturais Sinopse e Coda, o que a análise aponta como não pre

judicial ã estrutura narrativa, já que estas são seções não e£

s enciais ao processo narrativo propriamente dito, porém esta

diferença numérica se constitui em indício que caracteriza

um desempenho favorável ao grupo B, na produção destas duas se

ções.

Page 98: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Apesar da diferença numérica apresentada na produçãc

de algumas seções estruturais da narrativa que indicam desempç

nho diferenciado entre os dois grupos nas duas situações de

produção (especialmente na situação EV), o dado considerado

mais significativo para esta análise foi a produção ou não de

textos narrativos, indicada pelas freqüencias das seções esser

cias ã recuperação do evento em sua seqüência temporal. (Açãc

Complicadora e Resolução). Isto leva ã conclusão de que nãc

ficou caracterizado um melhor desempenho de um dos grupos comc

se esperava e que os informantes, tanto os do grupo A quantc

os do grupo B, já interiorizaram a estrutura narrativa.

3.4.2 - Avaliação da Hipótese 2:

De maneira a avaliar a hipótese 2: os textos

narrativos produzidos em situação EP apresentariam maior com

plexidade estrutural que os textos narrativos produzidos em

situação EV nos dois grupos, buscou-se elementos nos quadros

6 e 7, que serão apresentados a seguir.

Esta hipótese foi levantada a partir do conhecimento

teórico sobre a estrutura narrativa que embasa este estudo.

Para Labov, o texto narrativo produzido em resposta a um est^

mulo que provoque o relato de uma experiência pessoal é mais

complexo porque mais avaliado, já que atribui ã avaliação mui.

tas das complexidades estruturais e sintáticas da narrativa.

Os dados que configuram as matrizes apresentadas nos

quadros 1, 2, 3 e 4 permitiram a elaboração dos quadros 6 e 7 ,

a fim de se efetuar a avaliação da hipótese 2, através da con

frontação e análise dos dados.

Page 99: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Freqüência das varias seções estruturais da narrativa

produzidas pelos grupos A e B nas situações EP e EV.

Situações de Produção

Estruturais EP EV

T A B T A B

S 24 11 13 11 03 08

0 34 16 18 34 17 17

AC 40 20 20 36 19 Í7

A 36 16 20 00 00 00

R 40 20 20 36 19 17

C 36 18 18 13 04 09

T 210 101 109 130 62 68

A partir da confrontação dos dados, efetuou-se a análi.

se comparativa da produção dos dois grupos nas duas situações.

Os dados, deste quadro, mostram maior freqüência das

seções Sinopse, Ação Complicadora, Avaliação, Resolução e Coda

na situação EP nos dois grupos. Apenas, na situação EV, ocor

reu uma maior freqüência da seção Orientação no Grupo A, embo­

ra a diferença entre as situações EP e EV, neste caso, não se

ja expressiva; freqüência 16 (EP) e 17 (EV).

A análise aponta freqüência favorável ã situação EP na

maioria das seções estruturais, especialmente na seção Avalia

ção (freqüência 16 no grupo A e freqüência 20 no grupo B na si.

tuação EP e freqüência 0 nos dois grupos na situação EV), e no

total (freqüência 210 (EP) e freqüência 130 (EV)) , o que leva a

Page 100: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

concluir que os textos narrativos produzidos em situação EP,

tanto pelo grupo A quanto pelo grupo B, apresentam maior com­

plexidade estrutural do que os produzidos em situação EV.

Para prosseguir a avalição da hipótese 2, apresentar-

se-á o quadro 7:

Quadro 7

Freqüência total, índice estatístico e nível de signi

ficância das várias seções estruturais que concorrem para a

estrutura narrativa nas situações EP e EV:

Seções

Estruturais

Situações de produção

EP EV

índice Significância

S 24 11 8,58 sim

0 34 34 0,00 não

AC" 40 36 3,12 não

A 36 00 - sim

R 40 36 3,12 não j.

C 36 13 27,86 sim

A partir da confrontação dos dados deste quadro, efe

tuou-se a análise comparativa para cada seção em particular,

que será apresentada a seguir;

- Sinopse - Tem-se, no quadro 7, : para -esta “^seção

a freqüência 24, na situação EP e a freqüência 11, na

situação EV.

A estes dados apresentados foi aplicado o teste esta­

Page 101: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

tístico que estabeleceu o índice de significância em 8,58 a

favor da produção EP para esta seção estrutural.

Isto leva a concluir que há diferença significativa

na produção da Sinopse entre as duas situações de produção,

favorável à situação EP.

- Orientação - Tem-se, no quadro 7, para a produção

desta seção freqüência igual para ambas as situações. (Fre­

qüência 34 (EP e EV).

A aplicação do teste estatístico estabeleceu o índice

de significância em 0,00, portanto se concluiu que não há di

ferença da seção Orientação ente as duas situações de produção.

- Ação Complicadora - Tem-se, no quadro 7, uma peque­

na diferença numérica quando da realização desta seção estru

tural nas duas situações de produção. (Freqüência 40 (EP) e 36 (EV)).

A aplicação do teste estatístico estabeleceu o índice

de significância em 3,12 para este seção estrutural, o que

aponta uma diferença não significativa na produção da Ação

Complicadora nas duas situações de produção.

- Avaliação - Tem-se, no quadro 7, para esta seção e^

trutural, uma freqüência bastante diferenciada, indicada pela

freqüência 36, na situação EP e freqüência 0, na situação EV.

A estes dados não foi possível aplicar o teste esta­

tístico devido ã total ausência de freqüência desta seção e^

trutural na situação EV. Porém esta ausência se constitui

num dado altamente significativo quando se estabelece a compa

ração da produção do texto narrativo nas duas situação de pro

dução.

Esta ausência da seção Avaliação, na situação EV, con

firma a posição de Labov de que a narrativa de experiência

Page 102: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

vicária não é avaliada e contraria a posição de Lira (1987),

que contesta esta posição do referido autor. No entanto, deve

se atentar para o fato de que esta ausência refere-se apenas

ã Avaliação, como estrutura primária. Na análise qualitativa

apresentada nesta dissertação (item 3.1) e exemplificada com

a narrativa EVA 20 F, mostrou-se a ausência desta seção estru

tural naquela narrativa, porém se mostrou evidências de que

aquela narrativa é avaliada (avaliação, como estrutura secun­

dária) e para isto o informante valeu-se de muitos recursos

avaliativos através de elementos lingüísticos variados.

Posto isto, é possível se concluir que a seção Avalia

ção, como estrutura primária, é típica de experiência pessoal,

com isso, entretanto, não se quer dizer que a narrativa de ex

periência vicária não é avaliada, já que neste tipo de narra­

tiva pode se encontrar a avaliação, como estrutura secundária.

O estudo da avaliação, como estrutura secundária, será

apresentado no capítulo 4, item 4.2.2.2. desta dissertação,

onde o leitor poderá ter uma apresentação mais detalhada de£

te elemento estrutural da narrativa.

- Resolução - Tem-se, no quadro 7, uma pequena dife­

rença numérica quando da realização desta seção estrutural

nas duas situações de produção. (Freqüência 40 (EP) e 36 (EV).

A aplicação do teste estatístico estabeleceu o índice

de significãncia em 3,12 para esta seção estrutural, o que

aponta uma diferença não significativa na produção da Resolu­

ção nas duas situações de produção.

- Coda - Tem-se, no quadro 7, para esta seção estrutu

ral, uma freqüência diferenciada favorável a situação EP, ind_i

cada pela freqüência 36 (EP) e 13 (EV).

Page 103: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

A estes dados foi aplicado o teste estatístico que e^

tabeleceu o índice de significância em 27,86 na produção des

ta seção estrutural.

Isto leva a concluir que há diferença significativa

na produção da Coda entre as duas situações de produção, favo

rável à situação EP.

Confrontando-se os dados e os índices de significãn

cia, verifica-se que não há diferença na produção Orientação

nas duas situações de produção; que não há diferença signifi­

cativa na produção da Ação Complicadora e da Resolução nas

duas situações e que há diferença significativa na produção

das seções Sinopse, Avaliação e Coda, favorável ã situação de

produção EP.

Estas verificações levam à confirmação da validade da

hipótese 2, uma vez que a observação indica \ima maior freqüên

cia das seções estruturais em narrativas de experiência pes­

soal e a análise aponta que há maior complexidade estrutural

presente na produção deste tipo de narrativa, entendida esta

complexidade estrutural pela maior freqüência de algumas se­

ções estruturais, principalmente pela freqüência da Avaliaçãcv

à qual são atribuídas muitas das complexidades do texto narra

tivo.

Estas constatações levam a concluir que o narrador

produz a estrutura narrativa em situação EP com mais esponta­

neidade, devido ã reportabilidade e a credibilidade que quer

imprimir ao fato narrado, quando se utiliza dos mais variados

recursos lingüísticos a fim de pressionar o narratário a com­

partilhar seu ponto de vista acerca do fato.

Page 104: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

3.4.3 - Conclusões do Capítulo

Após apresentação dos dados, índices e discussão a re^

peito destes elementos, pode se concluir que, ao contrário do

que se esperava, não ficou caracterizado \im melhor desempenho

do grupo B em relação ao grupo A na produção da estrutura nar

rativa, uma vez que ambos os grupos produziram textos narrati­

vos na situação EP e apresentaram um desempenho pouco diferen

ciado na situação EV.

0 dado mais significativo considerado nesta análise

foi a produção ou não de textos narrativos, caracterizada pela

freqüência das seções estruturais. Ação Complicadora e Resolu­

ção, seções responsáveis pela recuperação lingüística do even

to narrado em sua seqüência temporal.

Apesar da análise apontar desempenho idêntico na produ

ção da estrutura narrativa dos dois grupos, é importante res­

saltar que há indícios de diferença de desempenho entre os dois

grupos, favoráveis ao grupo B, referente à produção das seções

estruturais Sinopse e Coda, embora estas seções não sejam e^

senciais ã estrutura narrativa.

A ausência destas seções, especialmente no grupo A, le

va a pensar que, com o amadurecimento lingüístico elas vão se

integrando ã estrutura essencial da narrativa já interiorizada

pelos informantes.

0 conhecimento da estrutura narrativa, por parte dos

professores de língua, poderá contribuir para o desenvolvimen­

to destas seções ao longo das etapas de escolaridade, influen

ciando positivamente na aquisição da estrutura global da narra

tiva para que o texto escolar se torne mais completo e adequado.

Page 105: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Já a hipótese 2 foi confirmada, pois os dados apresen

tados nos quadros 6 e 7 apontam uma maior complexidade da nar

rativa de experiência pessoal, uma vez que foi nesta situação

que ocorreu maior freqüência de diversas seções estruturais

nos dois grupos.

A ausência da seção Avaliação na situação de produção

EV nos dois grupos é o dado mais significativo pois atesta uma

maior complexidade estrutural da narrativa de experiência pes

soai.

Esta constatação não ê surpreendente, porque o narra

dor tem a intenção de tornar o seu relato reportável e quando

se trata de reportar um relato de experiência própria ele se

utiliza espontaneamente dos mãis variados recursos lingüi^

ticos de que dispõe para melhorar seu desempenho narrativo.

Ao acionar estes recursos lingüísticos, o narrador aumenta a

complexidade estrutural do seu texto narrativo, produzindo as

várias seções que concorrem para a estrutura global da narra

tiva, o que não ocorre na situação EV, quando sua intenção é

recuperar a experiência do outro em sua seqüência temporal.

A partir das considerações acerca dos dados, efe

tuou-se a análise da estrutura global da narrativa e concluiu

se que a estrutura narrativa forma dois blocos narrativos di£

tintos, quando se procede ao estudo comparativo entre as duas

situações de produção: um bloco formado pelas seções Orienta­

ção, Ação Complicadora e Resolução e o outro, formado pelas

seções Sinopse, Avaliação e Coda.

O primeiro bloco narrativo não apresentou diferença

estatisticamente significativa na composição da estrutura nar

rativa nas duas situações de produção, enquanto que o segundo

Page 106: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

bloco apresentou diferença estatisticamente significativa a fa

vor da situação EP.

Estas considerações levaram ao estudo destes dois blo

COS narrativos nas duas situações de produção nos dois grupo^

e que será apresentado no capítulo seguinte para uma melhor ca

racterização das várias seções estruturais e da função que de^

sempenham na organização do texto narrativo.

Page 107: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

4. SEÇÕES ESTRUTURAIS DA NARRATIVA

Tendo sido analisadas narrativas representantes das

duas situações de produção de narrativa para obter-se uma vi.

são da estrutura global deste tipo específico de discurso, de

acordo com o modelo de análise adotado nesta pesquisa, passa

se, agora, à busca de uma maior caracterização formal de cada

seção estrutural da narrativa.

Buscando apoio no esquema formal fornecido por Labov,

separou-se os diversos enunciados lingüísticos responsáveis

pelas diferentes seções estruturais que compõem a narrativa.

A fim de se classificar um elemento como tendo qual ou tal fun

ção na narrativa, procurou-se distinguir e caracterizer umas

seções estruturais das outras.

A seguir, apresenta-se a caracterização das várias se

ções estruturais da narrativa com base em observação dos auto

res sobre a estrutura dos enunciados de uma narrativa e em ob

servações de fatos lingüísticos encontrados nos textos que for

mam o corpus desta pesquisa.

Esta caracterização parte das considerações já apre

sentadas no capítulo anterior, qual seja:

- a estrutura narrativa é formada por dois blocos nar

rativos distintos: o primeiro, formado pela Orientação, Ação

Complicadora e Resolução e o segundo, pela Sinopse, Avaliação

e Coda.

Page 108: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

O Objetivo deste capítulo é analisar um e outro bloco.

Espera-se que ao final desta exposição se possa ter

uma maior compreensão das características das seções estrutu

rais que concorrem para a organização do texto narrativo.

4.1 - Caracterização do bloco narrativo formado pelas

seções: Orientação, Complicação da Ação e Resolu

ção.

A análise destas seções em conjunto está apoiada

nas considerações apresentadas no final do capítulo anterior ,

à guisa de conclusão para as análises elaboradas até aquele mo

mento.

4.1.1 - Orientação

Para classificar as orações de Orienta

ção o modelo adotado leva em conta critérios que talvez não se

jam compatíveis entre si: semântico e formal. São orações de

Orientação por conterem informações de circunstancialidad^ re^

ponsáveis pelas informações de tempo, de lugar, sobre persona­

gens e seus hábitos, mas são também por virem no início do tex

/to narrativo e por terem conjunto livre de deslocamento.

Os textos coletados na pesquisa, tanto os de experiên­

cia pessoal quanto os de experiência vicária, confirmaram as

observações dos autores sobre esta seção estrutural, porém, le

vando-se em conta a afirmação de Labov de que quando uma oração

de Orientação vem em outros pontos da narrativa ela passa a

ser oração de Avaliação é que se analisará uma oração que apre^

senta informação de orientação, embora não esteja localizada no

Page 109: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

início do texto narrativo. Observe-se parte desta narrativa:

EP A 5M;

c Quando eu ia atravessar a rua

d estava distraído

e e não olhei

se vinha algum carro

f e o carro que um fusca

freiou próximo de mim,

h Neste momento eu fiquei

paralizado.

R i o carro quase me atropela

j Este foi um dos maiores

sustos da minha vida,

1 eu tinha apenas sete anos,

Tem.se na oração 1_ "eu tinha apenas sete anos", uma ora

ção que se poderia classificar como de Orientação, já que pode

ser considerada como resposta ã questão subjacente "quando"?,

cuja resposta, segundo o modelo de análise adotado, é considera

da como informação de orientação (pelo critério semântico) so

bre o tempo em que a ação aconteceu e formalmente caracteriza-se

como uma oração livre, uma vez que pode ser deslocada para quajL

quer ponto desta narrativa e continuar sendo verdade que o nar-

dor tinha sete anos quando o fato aconteceu. No entanto, esta

Page 110: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

oração (oração 1) foi produzida efetivamente pelo narrador na

seção estrutural Coda, e apresenta-se al estrategicamente, na

narrativa, para ressaltar a importância que o narrador quer im

primir ao fato de ter apenas sete anos na época em que a ação

se desenvolve, o que aponta para o caráter avaliativo desta

oração, e este caráter avaliativo é ressaltado pelo intensifi-

cador apenas, já que que marca o contraste com a idade atual

do narrador. Apreendido o sentido desta oração no processo nar

rativo, nota-se a intenção do narrador em atuar sobre o narra-

tário, mudando a sua opinião em relação ao narrador. Se o nar

rador não passasse esta informação (apenas sete anos), a imagem

do narrador estaria em desvantagem em relação ã sua idade a-

tual, pois distração deste tipo não combina cum um adolescente

mas o narrador ao apresentar estrategicamente esta informação

causa impacto no narratário, que automaticamente aceita a di£

tração como natural para a idade em que a ação efetivamente a

conteceu. Apresentados estes argumentos resta a dúvida: será a

oração 1, um a oração de orientação ou de avaliação?

Se for considerada de Orientação, pelo critério semãn

tico, pois é uma oração que dá informação de orientação, não

pode ser considerada de Orientação pelo critério formal, pois

não ocorre no início do texto narrativo. Parece que o critério

semântico é mais forte e ela não seria classificada de Orienta

ção apenas por estar noutra posição no texto narrativo, por

que não se pensar, então, em sobreposição de funções? Pensa-se

que orações deste tipo atuam no texto narrativo como orienta

ção ao mesmo tempo que avaliam, e esta posição está apoiada na

afirmação do próprio Labov (1972):

Page 111: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

"Of course there are complex chainings and em beddings of theses elements, but here we are dealing whith the sirapler forras." ,

(Labov,1972; 372T

Entende-se que a aceitação da sobreposição de funções

por lima mesma oração, num texto narrativo, pode acontecer em

alguns casos e que a oração _1 da narrativa EP A 5M pode ser

um exemplo desta sobreposição de funções, já que esta oração

incorpora simultaneamente as funções de orientar e avaliar ne^

ta narrativa.

Outros exemplos desta sobreposição de funções ' podem

ser observados nas orações abaixo;

EP A 16F:

m tinha bastante gente

EP A 20F:

q Confesso

que naquele intante senti medo.

Débora Schiffrin, analisando a Variação Temporal na

narrativa, verificou que:

"orientation clauses can be embedded in complica ting action to add Information which the hearer needs in order to understand or interpret the significance of adjacently reported events" ~

(Schiffrin, 1981: 48j

Assim, constatou-se que informações de orientação são

passadas pelo narrador durante o desenrolar da ação narrativa,

em pontos estratégicos do texto, e que estas informações de or_i

entação são localizadas de tal modo que fazem avançar o proce^

so narrativo. Observou-se através da análise, que, além da sobre

posição das funções de orientar e avaliar desempenhadas por

uma única oração, são frequentemente usadas pelos narradores o

rações com funções sobrepostas de orientar e fazer progredir o

Page 112: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

processo narrativo, conforme pode ser verificado nos exemplos

abaixo;

EPB 23M:

j Andei alguns metros ....

EPA 20F:

0 Após tentativas frustradas ...

EPB 22M:

m Naquelas alturas, não tendo ninguém por perto ...

EVA 13F:

De repente Trapper ouviu alguns ruídos

EVA 7M.

Trapper correu na frente

EPA 14F:

Quando ele seguiu em frente a moça já estava' seguran

do no ferro para subir no ônibus,

EPA 17F.

a Essa noite era noite de natal

EPA 18F;

1 Agora o ônibus está no conserto.

Estes exemplos apresentam orações das quais não se po

de afirmar que sejam orações de Orientação, segundo o modelo

de Labov; no entanto não parece restar dúvidas quanto a sua

Page 113: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

interpretação, enquanto também veiculadoras de tal função. A

questão é que, nestes casos, a Orientação se dá em referência

a momentos particulares da narrativa.

É fácil verificar que as orações acima são orações re^

ponsáveis pela recuperação lingüística do evento narrado em sua

seqüência temporal, e ao mesmo tempo, são responsáveis pela in

formação de plano de fundo para a ação que está se desenrolan­

do, ficando mais uma vez caracterizada a sobreposição de fun

ções por uma mesma oração no texto narrativo.

Do levantamento das marcas formais recorrentes na Se

ção Orientação, registrou-se o uso freqüente de verbos no Pre^

térito Imperfeito e locuções verbais formadas por estar + ge

•rúndio, projetando como secundárias as ações desta seção que

se constituem em Plano de Fundo para a ação que vai se desenro

lar. Freqüentemente esta seção cumpre a função de introduzir o

processo narrativo. Apresenta as personagens, instala-os num

lugar preciso e os situa numa cronologia, correspondendo ao que

é estático ou equilibrado numa determinada realidade, como po

de ser observado no exemplo abaixo:

EVB 22M:

O

a Trapper era um homem que vivia no Alaska.

b Era um garimpeiro

que morava nas montanhas

c e amava os animais,

d Conversava com eles

e e os alimentava

f Estava sempre admirando o caçador solitário - o Lobo

g Ficava horas observando o destemido

animal relaxando com os filhotes

Page 114: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

h Certo dia, o garimpeiro desceu ...

Pode-se constatar claramente que o narrador não está

narrando um acontecimento, mas descrevendo um hábito, onde pre

dominam os verbos no Pretérito Imperfeito e os Verbos de esta

do, denotando o caráter estático desta seção e seu papel de

Plano de Fundo para o processo narrativo.

Somente a partir da oração h é que se tem o início

propriamente do acontecimento. Toda essa parte inicial (a - g)

cobre a função referencial de fornecer elementos de orienta­

ção de pessoa, lugar e hábitos.

Estas constatações podem ser observadas também nos e

xemplos abaixo:

EVB 29M:

a Trapper tinha o dom de

falar com os animais

b Gostava muito de andar

pelas montanhas.

EVB 28M:

f Trapper era garimpeiro

g e pagava tudo com ouro.

EPA 4M:

a Eu estava no ponto do ônibus

b esperando o ônibus

Page 115: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

EPA lOM;

b Eu estava levando

umas compras para uma freguesa do

super-mercado

onde trabalho

c Eu ia pedalando pelo acostamento.

EPB 22M;

a Num dia ensolarado, calmo e tranqüilo

parecia estar tudo ocorrendo muito bem,

b eu estava vagando num campo de propriedade de meu pai.

c pensando sobre o futuro que parecia obscuro e incom­

preensível numa fase importante de minha vida a ado­

lescência.

Além dos aspectos já descritos, pode-se verificar que

elementos de orientação vêm muitas vezes constituindo a subor

dinada relativa introduzida pelos pronomes que e onde; e com

alguma freqüência a subordinada adverbial introduzida por conjunções como

I ^

porque e quando, oonforme pode se exenplificar oan as oraçoes a seguir:

EVA 3M;

a Trapper era um homem

que vivia com a natureza

b e gostava dos bichos

que moravam nela.

EVA 6M;

1 Na saída do lugar onde ele

fazia suas compras ...

Page 116: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

d Eu vinha rápido

porque estava frio

EPA 17F:

h Quando era detardezinha ...

EVA 12F:

i Quando estava saindo

: tinha um homem ...

EPB 24M:

a Era um dia muito quente

porque era época de verão.

EPB 25M:

c Nós iamos depressa

porque já estavamos atrazados,

4.1.2 - Ação Complicadora e Resolução

Como já foi exposto na seção teórica de^

te trabalho, estas seções são consideradas por Labov como se­

ções essenciais à estrutura narrativa por se comporem de ora

ções narrativas típicas (aquelas que apresentam juntura tempo­

ral) e portanto, são capazes de recuperar o acontecimento em

sua dinamicidade.

Retomaremos o exemplo apresentado anteriormente (4.1.1)

e a partir deste serão tecidas considerações sobre estas seções:

Page 117: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

O<

R

h Certo dia, o garimpeiro desceu

para comprar seus suprimentos,

i na loja encontrou um cartaz

que oferecia dinheiro

para quem prendesse animais para o zoológico,

j e um homem o estava lendo.

1 Seu nome era Frenchy

m O garimpeiro não gostou

n e rasgou o cartaz

dizendo

o que caçar para sobreviver

era uma coisa

p e para exibir era outra

q Frenchy achava

que Trapper era rico

r e queria pegá-lo

s então o seguiu

t No caminho de volta Trapper parou

para conversar com os filhotes de lobo

u e Frenchy resolveu pegá-los na intenção de

ganhar com isso.

V Trapper percebeu o choro dos filhotes

X e descobriu

que estavam em apuros,

z Trapper preparou uma armadilha para Franchy.

aa Frenchy foi apanhado

bb e os filhotes libertados,

Page 118: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Se forem observadas as orações de a a 3 (apresentadas

no item 4.1.1) pode- se verificar que estas orações podem sofrer

deslocamentos entre si, sem que com isso se incorra em prejul

zo da sua significação. Esta é uma das características das o

rações de Orientação. E isso é o que as distingue daquelas da

seqüência narrativa, capazes de recuperar os eventos na ordem

em que ocorreram, pois qualquer alteração na ordem das orações

de h a ^ pode prejudicar a interpretação semântica da ordem

de ocorrência dos eventos.

Apesar das características próprias da seção Orienta­

ção, a partir deste momento, ela passará a fazer parte desta

reflexão, pois como já foi apresentado no capítulo anterior ,

esta seção juntamente com a Ação Complicadora e a Resolução

formam um bloco narrativo dentro da estrutura global da narra

tiva.

Retomando a análise, parte-se do raciocínio de que o

narrador controla questões subjacentes ditadas pela sua compe

tência narrativa, que dirige a sua produção. Dessa maneira, u

ma narrativa corresponde inicialmente às questões; "Onde?",

"Quando?", "Quem?", apresentando o acontecimento de forma e^

tável e equilibrada na Orientação, enquanto que nas seções A

ção Complicadora e Resolução, responde às questões, também

subjacentes: " 0 que aconteceu?" e " 0 que aconteceu finalmentá»"

e desempenha função bem definida, qual seja, a recuperação tem

poralmente ordenada dos eventos ocorridos, isto é, recupera o

acontecimento em sua dinamicidade, e entre estas seções se e^

tabelece uma intensa relação de causa/conseqüência. Outro ar

gumento que corrobora a posição de que estas seções mantêm

uma intensa relação, é que apresentaram o mesmo nível de sig-

nificância quando da análise quantitativa.(Ver item 3.4.2)

Page 119: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Embora as seções Orientação, Complicação da Ação e Re

solução possam ser estudadas conjuntamente pela característica

que comungam, a de desempenhar uma função referencial dentro

da globalidade narrativa, há de se entender que são diferentes

as relações tecidas entre os componentes de uma sentença no

grupo de orações da seção Orientação e das orações das seções

Ação Complicadora e Resolução, visto que cada seção desempenha

funções específicas. Cabe à Orientação a referência situacio-

nal, enquanto que ã Ação Complicadora e ã Resolução cabe a re

cuperação dos eventos na ordem temporal em que ocorreram.

Se é possível se considerar como um único bloco narra­

tivo a realização destas seções na estrutura global, caberia

perguntar como se dá a transição entre a seção Orientação e a

Ação Complicadora e Resolução?

Na produção da narrativa, verifica-se que a transição

entre estas seções não se dá de forma abrupta,e que a competên

cia do narrador o leva a empregar mecanismos de gradação art_i

culados através de elementos textuais, principalmente expre^

sões adverbiais e expressões verbais que podem servir de ele­

mentos demarcativos entre as seções. Estes mecanismos de grada

ção estão freqüentemente presentes nas narrativas escolares e^

critas. Entre os mecanismos de gradação mais usados pelos infor

mantes estão as formas estereotipadas, que são muitas vezes

condenadas na prática pedagógica. 0 conhecimento teórico da e^

trutura da narrativa por professores de língua poderia se tor­

nar útil, no sentido de substituir as expressões estereotipa­

das, na maioria das vezes desprovidas de conteúdo semântico no

texto (preenchendo ali apenas uma lacuna indicada pelo esquema

narrativo interiorizado pelo narrador), o que tornaria o texto

escolar mais pessoal, claro, atraente e significativo, cumprin

Page 120: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

do assim os princípios retóricos e as máximas griceanas na pro

dução do texto escrito. (Ver Kato, 1987: 84).

É freqüente encontrar-se no corpus expressões estereo

tipadas do tipo: "thi dia"f "Certa vez", "Uma vez", "üm certo

dia", "Uma bela manhã", "de repente".

Além destes mecanismos de gradação, as relações ver­

bais devem ser vistas como muito importantes no texto narrati

vo, porque é através destas que se dá a progressão necessária

para que se reproduza lingüísticamente uma realidade dinâmica,

uma realidade que se transforma. Por esta razão, nas seções A

ção Complicadora e Resolução, predominam as orações narrativas,

cujo núcleo verbal é constituído de verbos de ação no Pretéri­

to Perfeito. Observou-se que a passagem entre a Seção Orienta

ção e estas seções se dá através de transições verbais, sendo

as mais comuns entre o Pretérito Imperfeito/Pretérito Perfeito^

com a mediação de advérbios, de locuções adverbiais ou ainda de

expressões estereotipadas:

EPA 12F.

b embaixo da janela tinha um piso

c quando chegei no chao

EPA IM:

d estava esperando

e de repente um caminhão

começou a bozinhar.

EPA 6M;

b estava se divertindo muito

c estava brincando e tudo o mais

d e então o Paulo perguntou:

Page 121: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

EVA IM:

f trocava por mantimentos ...

g Certo dia^ quando ele foi

nesse lugar ...

EVA 3M:

g A ganância dele pela

riqueza era tanta que ele

fazia qualquer coisa pelo ouro.

i E um dia Frenchy foi atrás de Trapper

EPA 16F:

f eu vinha rápido

g e aí escutei um barulho.

EVA 5M:

i os cachorrinhos gostavam muito dele.

j Depois ele foi a um posto ...

EVB IIF;

i 0 Trapper achava outo

j Assim Trapper foi na venda

EVA 14F.

e mas também buscava ouro no riacho

r Certa vez Trapper encontrou ouro.

EPB 31B:

e tudo ia corendo normalmente

f até que chegou uma notícia

Page 122: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

0 eu estava meio sem sono

g mas um livro

h e adormeci

EVB 31F:

1 Frenchy era um homem mau.

j Um certo dia, Francchy saiu

para perseguir Trapper

EVB 21M:

d ... não concordava com isso.

e Por isso no dia que Frenchy

apareceu na floresta ...

Constatou-se que a transição verbal também acontece com

estes tempos verbais sem a medição de advérbios ou qualquer e

lemento textual:

EPA 5M:

d estava distraído

e não olhei se vinha algum carro

EPA 8M;

b Eu não tinha estudado

para o teste,

c a professora chegou na sala

EPA 4M:

d Ele vinha em alta velocidade

e e fez uma curva feixada.

Page 123: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

EPA lOM:

d e me preparava para atravessar a facha,

e Olhei para um lado, ...

EVA 2M;

c Por todos os lugares Trapper achava ouro.

d Trapper passou num lugar, ...

EVA 9M:

j s5 que Trapper não imagina

que lã tivesse um homem ganancioso

que fazia tudo por ouro.

1 Frenchy o homem ganancioso

pregou \im cartaz .. .

EPA 17F:

b eu ainda mora em Porto Alegre

c Meu pai convidou eu, minhas irmãos e minha mãe para

visitar minha madrinha em Cachoeirinha, ...

EVB 28M;

i Sua época preferida era a da procriação.

j construiram um loja,

Apesar de as narrativas coletadas evidenciarem as obser

vações de Labov sobre as seções Orientação, Ação Complicadora

e Resolução, por este trabalho ter pretensões pedagógica^ pen

sa-se que seja possível falar-se de momentos narrativos na

constituição destas seções estruturais da narrativa, tão im­

portantes para a produção deste tipo de texto, o que complemen

Page 124: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

taria a proposta de Labov e auxiliaria na aplicação deste mode

lo de análise para a compreensão e prática deste tipo de texto

nas atividades escolares. Uma vez que se tem tratado até o mo

mento a narrativa como um processo, dentro dessa dinâmica pro

cessual propomos considerar-se os seguintes momentos narrati­

vos que cumprem dentro da narrativa, uma função referencial:

- momento inicial . que dá conta do caráter estático

da narrativa, apresentando-a em equilíbrio; (na Orientação)

- modelo propulsor - que deixa a dinâmica da narrativa

bem explícita e funciona como elemento propulsor na narrativa;

- momento transformador - onde ocorrem as ações sücedâ

neas que alteram o equilíbrio estabelecido no momento inicial;

- momento final - (já na Resolução) quando ocorre a

passagem para um novo equilíbrio ou um novo momento.

Retomando a análise da narrativa EVB 22M, e consideran

do-se a proposta aqui apresentada, encontrou-se os vários mo­

mentos narrativos, como podem ver verificados a seguir: o mo

mento inicial encontra-se nas orações a e 3; o momento propul-

sorna oração h (certo dia, o garimpeiro desceu para comprar man

timentos); o momento transformador estende-se das orações i a

^ e o momento final, nas orações ^ e bb.

Passa-se, agora, â análise da narrativa EPA 6M, também

levando-se em consideração a proposta apresentada;

Oa No verão fui na praia com um colegas

b a gente estava se divertindo muito,

c estava brincando e tudo o mais.

Page 125: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

u<

d então o Paulo perguntou

quem queria fazer xaina proposta

que era atravessar o canal

e e eu aceitei

f Entrei na água

g nadei, nadei

i e quando faltava pouco

---fiquei com as pernas duras

j e então a força d'água começou

a me puchar para fora

1 Eu gritei muito

m mas ninguém me ouviu

n eu ia cadaveis mais pro fundo,

o a correnteza ficava cadaveis mais forte

p fui ficando apavorado

q gritei com toda a minha força

r e um colega percebeu

que tinha alguma coisa errada.

s Eu estava desesperado,

t pensavava na minha mãe

u e já estava perdendo as esperanças

R

v quando apareceu um salva vidas

X e me puchou prá terra

Page 126: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

z Então eu vejo o Paulo todo feliz

aa Este foi um grande susto

que levei

bb e ainda tive de pagar

a aposta

cc Porque aposta é aposta, não é?

Pode-se constatar que se trata de uma narrativa comple

ta, pois confirma a estrutura prevista pelo modelo adotado (La

bov). Ãs seções estruturais do modelo será acrescida a propos­

ta anterior, ou seja, a observação de momentos narrativos. A

análise aponta a existência de momentos narrativos bem marca­

dos, nesta narrativa que incorporam as funções de orientar e in^

taurar o processo narrativo em sua dinamicidade, reforçando as

considerações anteriores sobre a sobreposição de funções na

narrativa. Seguindo esse raciocínio, tem-se os seguintes momen

tos narrativos, neste texto;

- momento inicial - aparece nas orações a e c e corre^

ponde â seção Orientação;

- momento propursor:, aparece nas orações d e e e ope­

ra como elemento de gradação da passagem da seção de Orientação

para a seção Ação Complicadora, artiiulada pelos elementos tex

tuais: e então e pela transição temporal entre Pretérito Imper

feito e Pretérito Perfeito;

- momento transformador - estende-se da oração e a r ;

- momento final - instala-se nas orações v e

Embora a maioria dos informantes tenha produzido narra

tivas, conforme o modelo adotado, é freqüente encontrar-se, no

Page 127: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

corpus, exemplos de narrativas que não apresentam estes diver

sos momentos. Por isso se julga que a proposta de se acrescen­

tar ao modelo de Labov a noção de momentos narativos seja impor

tante, no sentido de completar este modelo de análise, e assim

tornar mais válida sua aplicação pedagógica, já que esta noção

de momentos narrativos pode ser aplicada em atividades escola

res de produção textual.

A seguir, será apresentado um exemplo de narrativa em

que os diversos momentos narrativos não estão bem marcados, em

bora apresente as várias seções previstas mo modelo de Labov;

EPA 13F;

a Um dia eu caí da janela

ub embaixo tinha um piso de cimento

c quando chegei no chão

d aí dei um corte bem grande na cabeça

f eu estava muito assustada

R g e fiquei alguns dias no hospital

Este texto pode ser definido como uma narrativa, já que

satisfaz as exigências do modelo de análise adotado, porém é in

consistente, pois os momentos narrativos não estão bem defin^

dos e a progressão narrativa fica prejudicada. Os fatos são nar

rados de forma abrupta e percebe-se que o narrador nao dispõe

de elementos de gradação textual para estabelecer a progressão

Page 128: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

narrativa. A noção de momentos narrativos poderia levar ã aqu_i

sição desses elementos textuais que possibilitam o desenvolvi­

mento desta gradação narrativa embasada na estrutura narrativa

já presente na produção do narrador adolescente, uma vez que a

recuperação do evento deveria ser feita de momento a momento ,

passando por um processo de equilíbrio / transformação / equilí­

brio novo, característico da estrutura narrativa.

4.2 - Caracterização do bloco narrativo formado pelas

seções Sinopse, Avaliação e Coda.

A análise destas seções em conjunto também está apoia

da nas considerações apresentadas no final do capítulo ante

rior, ã guisa de conclusão para as análises elaboradas até a

quele momento.

4.2.1 - Sinopse

Como já foi apresentada na fundamenta

ção teórica, Labov localiza as orações de Sinopse no início das

narrativas e as caracteriza como cobrindo os mesmos fatos tra

tados pela narrativa toda. Nas narrativas constantes do corpus*

desta pesquisa, encontrou-se vários exemplos que confirmam a

Sinopse tal como foi definida pelo autor (Labov; 1972).Aabran

gência referencial deste tipo de Sinopse abarca a seção Ação

Complicadora e Resolução, utilizando-se de elementos anafór^

COS, tais como: "tudo", "isso", "o que", como pode ser verifi­

cado nos exemplos abaixo:

Page 129: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

a Tudo aconteceu ...

EPB 36F:

a Tudo aconteceu a uns quatro

anos atrás-

EVB 40F;

a Tudo ocorreu no Alaska.

No entanto, encontrou-se alguns casos em que a Sinopse

não esta" iniciando a narrativa, mas é colocada num ponto estra

tégico do texto, intercalada ou após a Orientação, como nos

exemplos:

EPB 30M:

d quando soube

que havia virado um barco ...

EPB 22M;

d Isso aconteceu há cinco anos

atrás.

Além da Sinopse abranger a referência das seções essen

cialmente narrativas (Ação Complicadora e Resolução), pode tam

bém abranger a seção Avaliativa, trazendo embutido o ponto de

vista do narrador, como nos exemplos abaixo:

EPB 26M:

a No dia do meu aniversário

quando fiz sete anos, levei

um susto horrível.

Page 130: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

a Eu levei iim grande susto

no dia 20/11/87

EPB 38F:

a Jamais vou esquecer o que aconteceu.

EVB 38F:

a Essa é a história de um homem

que amava a natureza.

EVB 25F:

a 0 filme conta a história de um

homem que gostava de animais.

Além desses aspectos, a Sinopse pode, ainda, apresentar

o grau de engajamento do narrador com o seu texto, objetivando

despertar maior ou menor interesse no narratário para b relato

que vai se desenrolar. Quando o narrador tem a intenção de des­

pertar um maior interesse no narratário, ele utiliza marcas lin

güísticas que fazem alusão à situação de interlocução. Estas

marcas enunciativas são freqüentes nas narrativas de experiência

pessoal:

EPA 5M:

a Eu estava vindo da escola

quando levei um susto.

EPA BM:

a Quando eu estava na 6§ série

a professora me pegou colando.

Page 131: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

a Este susto que eu vou falar

é de mim e de outras pessoa.

EPB 31F;

a Agora vou contar um susto que aconteceu comigo.

Já nas narrativas de experiência vicária há um maior

distanciamento do narrador em relação ao seu texto, quando o

corre o apagamento do narrador, conforme pode ser verificado

nos exemplos abaixo:

EVB 25M:

a 0 filme conta a história

de um homem que gostava

de animais.

EVB 37F:

a 0 filme relata o episódio

da vida de um amante da natureza.

EVB 38F;

a Essa é a história de um

homem ...,

embora haja um único narrador, que mesmo na narrativa de expe

riência vicária apresenta marcas lingüísticas que apontam para

o seu envolvimento com o texto e com o narratário:

EVA 20F:

a O fato que vou relatar agora

trata-se de uma história

de amor ã vida e ã natureza.

Page 132: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Nas Sinopses produzidas pelos informantes nota-se uma

certa tendência para expressões estilizadas e que se configu

ram como uma introdução à narrativa, conforme pode ser verif^

cado nos exemplos acima.

A seção estrutural Sinopse não é considerada como uma

seção essencial à estrutura narrativa, tanto que Labov consi­

dera como bem formada a narrativa que apresenta as seções e^

truturais: Orientação, Ação Complicadora, Avaliação, Reso

lução e Coda.

Assim, a Sinopse constitui-se em mais uma opção de que o

narrador dispõe no universo lingüístico para enriquecer este

tipo específico de discurso.

Nesta seção também se pode falar sobre sobreposição

de funções, visto que a Sinopse, além de resumir o fato a ser

narrado, pode apresentar o ponto de vista do narrador, em re

lação ao fato, acumulando desta maneira a função de avaliar.

4.2.2 - Avaliação

A avaliação depreende-se, segundo Labov

e Waletzky, da atitude do narrador em direção ao narratário ,

no sentido de informá-lo da validade de sua experiência.

Para Labov (1972); "a avaliação é a razão de ser da

narrativa" Esta afirmação do autor deve ser entendida como o

desejo que o narrador possui ao contar algum fato de tornar

seu relato reportável e para isso selecionará o que narrar de

acordo com as pressões sociais exercidas pelo grupo sobre ele.

A sua competência narrativa lhe apontará o que é aceitável ou

não para ser contado para este ou aquele grupo, ou para este

ou aquele narratário.

Page 133: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Durante o relato, o narrador controla a questão subja

cante: "E daí”, que se não respondida adequadamente durante o

seu desempenho, poderá ser feita pelo narratário, o que aponta

rá o seu fracasso enquanto narrador.

A avaliação cumpre na narrativa função avaliativa, d_i

retamente ligada ã interlocução e não está diretamente ligada

ã recuperação lingüística do evento narrado em sua seqüência

temporal. Na verdade, o processo narrativo é suspenso para que

haja avaliação. As orações avaliativas não fazem progredir a

narrativa, antes comentam sobre as orações narrativas.

Quanto àestrutura formal, as orações avaliativas asse

melham-se ãs orações de Orientação. Compõem-se de orações mui

ticoordenadas, formando conjuntos livres ou conjuntos restri

tos a alguns pontos da narrativa.

A Avaliação participa da estrutura global da narrativa

como duas estruturas distintas: A Avaliação, como estrutura

primária e a Avaliação, como estrutura secundária.

4.2.2.1 - Avaliação, como estrutura primária

A Avaliação, como estrutura primária,

localiza-se entre as seções Ação Complicadora e Resolução» Ela

ocorre quando o narrador suspende a ação no seu momento mais

dramático, passando a tecer considerações sobre o acontecimen­

to, sobre seus sentimentos, elabora julgamentos, dá depoimen-s

tos, enfim, manifesta uma série de procedimentos subjetivos em

relação ao seu relato.

Freqüentemente o embutimento desta seção entre as se

•ções Ação Complicadora e Resolução se faz através de transições

temporais entre o Pretérito Perfeito/Pretérito Imperfeito / Pre

Page 134: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

térito Perfeito, conforme podem ser verificadas em narrativas

já apresentadas em exemplos anteriores, tais como a narrativa

EPA 20F, EPA 12F, EPA 6M.

A avaliação, como estrutura primária, pôde ser consta

tada, nas narrativas coletadas, como típica da narrativa de ex

periência pessoal, constituindo-se como o item de diferenciação

mais significativo ao comparar-se as narrativas coletadas em

situação de experiência pessoal e de experiência vicária, como

pode ser verificado na análise quantitativa dos dados, nesta

dissertação. (Ver item 3.4)

4.2.2.2 - Avaliação^ como estrutura secundária

Relembrando o que já foi colocado na

parte teórica desta dissertação, Labov diz que a estrutura sin

tática básica da oração narrativa é simples e atribui à avali

ação a complexidade sintática das orações que compõem a narra

tiva. Para este autor, ã estrutura sintática básica da oração

narrativa, constituída de elementos, tais como: conjunção, su

jeito, verbo, complementos, advérbios de modo, lugar e tempo,

vão se impor elementos que variam em complexidade e são desv_i

antes da estrutura básica narrativa. Estes elementos, segundo

o autor, possuem força avaliativa marcada e sobre este aspec-

e _

to será enfocada a presente observação.

Considerou-se Avaliação, como uma estrutura secundá­

ria, sempre que esta não ocupasse posição fixa entre as seções

^ -

Açao Complicadora e Resolução, podendo estar localxzada em qua^

quer ponto da narrativa.

A Avaliação, como estrutura secundária, pode ser cla^

sificada como:

1. Avaliação Externa

Page 135: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

2. Avaliação Encaixada

3. Avaliação Interna

1. Avaliação Externa - é a que mais se assemelha à ava

liação, como estrutura primária, uma vez que suspende momenta

neamente a ação e apresenta a atitude do narrador. A diferença

básica entre elas é que, enquanto esta avalia determinados mo

mentos narrativos, aquela avalia o momento mais dramático da

ação, incidindo esta avaliação sobre a globalidade da narrativa.

Este tipo de avaliação é muito freqüente nas narrativas

de experiência pessoal, como pode ser verificado nos exemplos

abaixo;

EPA 8M;

Quando eu estava na 6â série

a professora me pegou colando

o

<

b Eu não tinha estudado para o teste

c A professora chegou na sala

d e começou a distribuir os testes

f eu olhei as questões

g e vi

que não sabia nada

h Então puxei o caderno devagarinho

i e abri embaixo da carteira

j comecei a copiar.

1 Eu estava muito nervoso,

m suando frio

n parecia

Page 136: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

que a professora só olhava para mim

o Continuei colando ...

EPB 28M;

X ... e o cobrador colocou meu irmão

no colo

z e levou-o para a grama

aa Não havia mais nada a fazer

meu irmão já estava morto

EPB 29M:

a Quando eu tinha dez anos

fui pescar com meu pai em alto-mar

O

b De tanto eu pedir para ele

deixar eu ir lâr fora

ele concordou.

EPB SOM:

U

C

ee 0 barco foi tirado do mar com

‘ a união das pessoas,

ff foi uma solidariedade incrível!

Page 137: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

o<

e ... de caçar os animais,

f Trapper foi taxativamente brutal

g Quando ele ouviu gritos ...

EPB 31F:

R

o Quando cheguei,

perguntei

p e soube

que ele já havia sido medicado-

q Felizmente estava tudo bem.

EPB 39F;

i e comecei a chorar,

j Não tinha como voltar ã casa,

EPB 38F:

o

n senti um arrepio

o e era

como se alguém estivesse ao meu lado

As orações sublinhadas se constituem em focos avaliati^

vos, que incidem sobre determinados pontos da narrativa, levan

do o narratário a interessar-se pelo relato de forma explícita.

Page 138: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

0 narrador, que usa este tipo de avaliação, está consciente da

existência de um narratário e deseja tornar seu relato reporta

vel.

2. Avaliação Encaixada - Este recurso funciona como um

mecanismo de continuidade dramática e visa a tornar mais vivo

o relato da experiência; é o que pode ser verificado no exem

pio a seguir;

EPB 28M;

a No dia 18.10.85 eu estava trabalhando

quando me comunicaram

que um dos meus irmãos havia

sofrido um acidente

u

b No caminho de volta para casa

após ser dispensado pelo patrão

c vi minha mãe

que ia para Laguna no carro

do meu primo,

d Ela não me viu

e e eu fui ficando preocupado

f comecei a imaginar o que

teria acontecido,

g chegando em casa,

perguntei

o que aconteceu aos meus

irmãos

Page 139: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

h e eles me explicaram tudo.

i era 1 : 0 hs da tarde

j meu irmão Ariosvaldo estava

brincando

1 e o pai do colega dele

V pediu para ele

ir comprar cigarros,

m Ele não foi numa vendinha próxima,

n preferiu atravessar o asfalto

o e comprar no Restaurante Lagoa,

p Ao atravessar a pista

apareceu um carro marca Alfa Romeo

em uma velocidade não permitida

q meu irmão vendo

que não dava tempo de sair fora,

r isto é, de chegar ao acostamento

s colocou a mão na cabeça

t e não viu mais nada

R

u Com a batida meu irmão caiu no asfalto,

V porêm o ônibus que o carro havia ultrapassado

X viu tudo

z parou

aa e o cobrador colocou o meu irmão no colo

bb e levou-o para a grama,

cc Não havia mais nada a fazer

meu irmão já estava morto.

Page 140: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

dd Eu pensei

que fora injusto isto com a minha família

ee mas hoje penso

que foi apenas um imprevisto da vida.

Esta narrativa causou alguns problemas de análise. A

princípio, pensou-se que se tratava de um relato de experiên­

cia vicária, pois parecia tratar-se de um relato de experiên

cia de uma outra pessoa (o irmão do narrador), mas como esta

narrativa foi produzida a partir da situação em que se previ

ra a realização de narrativa de experiência pessoal, procurou

-se observar, com todo o rigor, o fato.

A observação levou a perceber que o narrador por estar

por demais envolvido com o relato, visto que é muito pessoal

e dramático, acionou a sua competência narrativa, e isso o le

vou ao encaixamento da avaliação e permitiu-lhe reviver o mo

mento em que tomou conhecimento do fato. O encaixamento da

avaliação se dá através da passagem da fala do narrador para

uma terceira pessoa (eles/seus irmãos) e através do item lexi.

cal "explicaram". Tem-se o encaixamento da avaliação das ora

ções a ccf cobrindo quase que a totalidade do processo nar­

rativo. O aparente distanciamento do narrador ao passar a pa

lavra a uma terceira pessoa foi considerado um recurso avalia

tivo altamente eficaz, pois além de tornar o relato mais dra

mático e vivo, descarta a possibilidade de dúvida, por parte

do narratário, quanto ã reportabilidade e credibilidade do fa

to narrado.

Este é o exemplo de encaixamento de avaliação mais pro

Page 141: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

longado que se encontrou nas narrativas coletadas, sendo um re

curso utilizado tanto nas narrativas de experiência pessoal,

quanto nas narrativas de experiência vicária, embora seja mais

freqüente nas primeiras.

A seguir, serão apresentados alguns exemplos de encai

xamento da avaliação;

EPB 29M:

e Meu pai olhou para o. céu

f e gritou para os tripulantes

que se apressassem.

EPB SOM;

j e outros gritavam praia

afora; ajudem, ajudem.

EVB 28M:

s viu os filhotes

t e disse Valem tanto quanto ouro

EVB 28M:

11 Então Trapper disse Da próxima vez te mando para

o zoológico.

EPB 34F:

n Quando cheguei perto da minha

casa meu tio falou

que minha avó tinha sido levada para o hospital.

Page 142: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

EPB 36F;

1 Então meu pai pediu

que ela pegasse iima toalha.

EPB 36F;

X o médico disse que meu

pai teve uma emorragia.

É freqüente, ainda, o narrador apresentar o que as per

sonagens fazem dentro do processo narrativo em lugar do que

elas dizem. A este recurso avaliativo Labov chama de Ação Ava

liativa e se constitui no mais alto grau de encaixamento da a

valiação, geralmente introduzido por verbos como pensar, saber,

imaginar e esperar, como pode ser observado nos exemplos abai.

xo:

EVA 19F:

i estava só esperando

que ele fosse embora

EPB 22M:

j mas ele não se contentou com isso.

EPB 22M;

m Eu pensei em atravessar a rua para o lado mais próxd.

mo,

EVB 27M:

j ele resolveu colocar uitia armadilha

Page 143: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

dd mas Trapper sabia

que tinha algo errado

EVB 29M;

p e percebendo

que ele gostava muito daqueles caozinhos

q resolveu pegá-los

EPB 38F:

V Eu sei que pronunciei

mas a voz não saiu.

EVB 32F:

p pensou: Esses filhotes

valem mais que o ouro

que o Trapper tem!

EVB 36F:

o e então pensou

que ele era muito rico.

EVB 20F:

u Quando viu Frenchy,

ele pensou: S5 existe

uma saída para a cidade.

Os encaixamentos da avaliação, é importante ressaltar,

são inerentes ao processo narrativo e colaboram para a progre£

são da narrativa.

Page 144: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

A observação dos encaixamentos da avaliação, nas narra

tivas analisadas, leva a concluir que o narrador - adolescente

jã domina este recurso narrativo, aplicando-o adequadamente no

seu discurso e que este representa mais uma opção para a produ

ção de narrativas.

3. Avaliação Interna - Relembrando o que já foi apre

sentado na parte teórica desta dissertação sobre a estrutura

sintática da oração narrativa, retomar-se-á a afirmação de La

bov sobre a simplicidade sintática da oração narrativa e sua

alusão ao caráter avaliativo de alguns elementos sintáticos ca

pazes de trazer complexidade à estrutura básica destas orações.

Segundo este autor, â estrutura básica da oração narra

tiva vão se impor desvios que variam em complexidade e possuem

força avaliativa. Estes elementos sintáticos, desviantes da, e^

trutura básica da oração narrativa são classificados ,em inten-

sificadores, comparadores, correlativos e explicativos.

A sintaxe narrativa não se constitui em assunto espec_í

fico desta dissertação, por isso serão aqui apresentados ape­

nas alguns mecanismos avaliativos que possuemirrpli.cações sintá

ticas a fim de se caracterizar a Avaliação, como estrutura se

cundária, já que o assunto por si só poderia se constituir em

tema de uma dissertação.

Dentre estes mecanismos avaliativos mais marcantes, po

de- se destacar o esquema sintático em que a negação aparece co

mo um comparador, conforme o ponto de vista de Labov (1972) .

Considerar a negação como um comparador dentro da estrutura

narrativa, como o faz Labov, é uma postura inovadora e é o que

Page 145: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

se procurará demonstrar, através dos dados, com base nas análi^

ses elaboradas.

Labov questiona por cpe o narrador usa a negação quando

está narrando um acontecimento passado e presumivelmente acon­

tecido. 0 próprio autoíf responde a este porquê: o narrador tem

a intenção de avaliar o fato narrado e torná-lo mais dramático

e reportável. Para conseguir seu intento, o narrador lança mão

de esquemas sintáticos, como a negação, que pela lógica da nar

rativa é um comparador, uma vez que coloca, no mesmo nível nar

rativo, elementos distintos e opostos: o negativo eo positivo;

o factual e o virtual. Ao optar por um, o narrador escolhe en

tre dois caminhos narrativos e alternativos, sendo que um deles

pode até interromper o fluxo do fio narrativo, como pode ser

verificado na narrativa EPA 7M {apresentada no item 3).

Nesta narrativa, tem-se, na oração c "mas ele não quiz

ir", a recusa de um convite. Se o amigo tivesse aceitado o con

vite da personagem-narrador, o fluxo do fio narrativo teria s_i

do interrompido e não haveria razão para narrar tal fato, pois

ele simplesmente não teria acontecido. Por esse motivo, Labov

atribui ã negação um caráter essencialmente narrativo e o papel

de comparador. (comparador em relação ao que poderia ter acon

tecido; aceitação do convite).

É freqüente, nos dados coletados, a negação evidenciar

seu caráter de comparador, enquanto apresenta uma ação que de

veria/poderia ter ocorrido e a não realização da ação expressa

pelo narrador, como pode ser constatado nos exemplos abaixo,

em que esse tipo de esquema sintático desviante do padrão nar­

rativo básico das orações narrativas se constitui num mecani^

mo avaliativo eficaz:

Page 146: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

a Quando ele seguiu em frente

a moça estava segurando

no ferro para subir no ônibus,

0 ele não viu

p e foi levando a moça pendurada

até na outra esquina.

EPA 18F:

j Eu não sofri nada, nem nenhum arranhãozinho.

EPB 21M:

h e aconteceu

o que não estava programado.

• • •

j Em lugar de doces e alegria encontrei rosas fúnebres

e muita tristeza.

EPB 22M:

g Era sem dúvida um terrível boi

h e só pelo fato de eu avistá-lo

proximo a mim

1 já me deixava penotizado,

j mas ele não se contentou com isso

1 e partiu em minha direção.

EPB 23M:

f Eu não queria ir

porque tinha medo de cair.

Page 147: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Nestes exemplos, fica claro que o uso da negação é um

mecanismo de avaliação, compreendido na sua relação com o que

o narrador supõe como verdadeiras justificativas para o aconte

cido.

Perceber a negação como um comparador é mais um passo

para a compreensão da estrutura narrativa, que possui uma orga

nização textual própria e deve ser percebida com tal. Assim co

mo a negação, outros elementos sintáticos podem ser recupera­

dos dentro da estrutura narrativa, na qual desempenham papel

notadamente avaliativo, como a interrogação, a explicação, a

quantificação e a correlação.

No caso específico da interrogação, Labov questiona

por, que o narrador faria perguntas, quando está narrando, se

ele sabe o que aconteceu e conclui que a interrogação tem, den

tro da estrutura narrativa, a função de avaliar e pela análise

efetuada pode-se acrescentar que a interrogação é uma marca

lingüística evidente de que o narrador está consciente da si­

tuação de interlocução em que está inserido. No entanto, esta

marca é rara nas narrativas coletadas, apenas dois informantes

a usaram;

EPB 38B:

E se aquilo puxasse o cobertor!

0 que seria de mim?

EPA 6M;

Por que aposta é aposta, não é?

0 exposto, com base na análise dos dados coletados, e^

tabelece que mecanismos de avaliação interna dependem direta­

mente do narrador, da sua interferência/avaliação sobre o que

Page 148: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

ele narra, da sua competência em organizar o seu texto, e rea

lizam-se sob a forma dos mais diversos esquemas sintáticos

que o narrador supõe seja compartilhada pelo seu narratário.

4.3 - Coda

A coda cumpre a função de sinalizar para o nar-

ratãrio que a narrativa está chegando ao fim.

A fim de se caracterizar a Coda examinar-se-á esta

seção estrutural da narrativa EPB 28M:

EPB 28M:

dd Eu pensei

que fora injusto isto para minha família

ee mas hoje penso

que foi apenas um imprevisto da vida.

Nesta Coda, o narrador ao mesmo tempo que finaliza a

narração (enquanto ato de fala) e libera o narratário de seu

papel assumido no início do relato, avalia o fato narrado.

Esta afirmação baseia-se na posição de que o narrador simul­

taneamente procura explicar o evento em questão sob um ponto

de vista pessoal, verificável principalmente pelo verbo pen­

sar (pensei, penso), através de uma atitude de locução comen

tativa e procura se colocar a partir do momento da enuncia-

ção, deixando evidente que está consciente do seu interlocu

tor (neste caso específico, o narratário), pois comenta dire

tamente para ele.

Percebe-se, neste exemplo, que a Coda está efetiva­

mente fora do acontecimento narrado propriamente dito. For

Page 149: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

malmente, compõem-se de orações livres que trazem, sem dúvida,

a perspectiva de locução para o momento da, enunciação, confor

me se constata pelo uso do Pretérito Perfeito "pensei" e do

Presente "penso", que aqui se constitui nvima neutralização en

tre o mundo narrado e o mundo comentado.

O uso do dêitico "isto" marca a proximidade do narrador

com o narratário, enquanto que o uso do pronome "eu" evidencia

a relação de envolvimento do narratário com o seu texto. Além

destes aspectos, o narrador usa a conjunção adversativa "mas"

numa clara oposição a sua posição anterior quanto ao fato, o

que se entende seja de caráter avaliativo, pois esta afirmação

parece ser fruto de uma análise do narrador sobre o fato narra­

do por ele.

Pela exposição destes elementos, neste caso específi­

co, é possível dizer que a Coda além de finalizar a narrativa

e trazer a perspectiva de locução para o momento da enunciação,

cumpre também a função de avaliar. Mais uma vez, nesta exposi­

ção, pode se falar da sobreposição de funções de uma seção e^

trutural dentro da estrutura global da narrativa.

Prosseguindo com este estudo, observou-se que o empre

go da Coda não é muito freqüente nas narrativas de experiência

vicária, e os informantes que a empregaram, nesta situação de

produção, objetivam indicar o fim da narrativa e fazer voltar

a perspectiva de locução para o momento de enunciação:

EVA 5M:

11 E assim foi a história

EVA 9M:

11 Esta é a verdadeira história de Trapper

Page 150: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

iiun e assim o filme terminou.

EVA 18F:

bb Assim acaba a História de Trapper è os coots.

Os exemplos acima levam a considerar que alguns narra

dores, mesmo em situação de produção de narrativa de experiên

cia vicária sentem necessidade de preencher o esquema, já in

teriorizado por eles, da estrutura narrativa e o realizam sob

a forma de estereótipos. Isto ocorreu muito raramente nas nar

rativas de experiência pessoal, apenas um informante do grupo

A empregou este tipo de Coda;

EPA 18F;

m E assim acabou o susto.

Por outro lado, nas narrativas de experiência pessoal,

o emprego da Coda é bastante freqüente e é ai empregada como

um prolongamento da Resolução, onde o narrador tece comentá­

rios sobre o desfecho da ação e marca a oposição entre narra

ção/discurso, justamente por ser a Coda a passagem de lorna si­

tuação de fala narrativa para uma situação de fala discursiva,

marcada lingüísticamente pelo uso de dêiticos e pelas transi­

ções temporais entre Pretérito Perfeito/Presente:

EPA 9M:

t Este foi um susto

que jamais pretendo esquecer.

EPA 13F:

f Mas tudo não passou de um grande susto que eu espero

Page 151: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

que não se repita nunca mais.

EPA 14F:

t O que eu quero dizer com esse assunto para os moto­

ristas é que

u quando forem seguir em frente olhar no retrovisor

primeiro para não acontecer mais isso.

EPA 15F:

q Este susto eu não queria levar nunca,

foi um susto e tanto 1

EPA 16F:

t Felizmente foi s5 um susto.

EPA 19F:

i Este foi o maior susto da minha vida.

EPB 23M;

gg Este foi o maior susto da minha infância que até

hoje me lembro muito bem.

EPB 25M;

q Este acidente abalou a cidade

r e foi o maicr susto da minha vida

s jamais esquecerei a terrível imagem daquele corpo

agitado no ar.

EPB 26M;

z Este foi um ato que ficou marcado na minha vida.

Page 152: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

t foi só apenas um susto.

EPB 35F:

n Este foi o maior susto

que eu lembro que já levei.

EPB 38F:

jj só sei

que foi o maior susto da minha vida.

Nos exemplos acima, é possível verificar a sobreposi

ção de funções desempenhada pela Coda. Esta . sobreposição de

funções já foi verificada também na narrativa EPB 28M, anal_i

sada anteriormente. Em ambos os casos, os narradores utiliza

ram muitas marcas lingüísticas com a função de avaliar. Estas

marcas lingüísticas são facilmente percebidas por quem acompa

nhou o desenrolar desta exposição e são utilizadas para pre^

sionar o narratário a compartilhar o ponto de vista do narra

dor e comprovam o seu nível de competência narrativa, üm rela

to torna-se mais reportável na medida exata em que for avalia

do.

4.4 - Conclusões do capitulo

Os aspectos apresentados no decorrer desta expo

sição confirmaram que é pertinente considerar-se que a estru­

tura narrativa é formada por dois blocos distintos, que devem

ser entendidos pelas suas respectivas funções na situação de

Page 153: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

comunicaçao.

O primeiro bloco, formado pelas seções estruturais

Orientação, Ação Complicadora e Resolução, cumpre uma função

referencial, ou seja, cumpre a função de recuperar lingüísti

camente o evento em sua seqüência temporal e apresentá-lo em

uma situação específica através da referência de tempo, de

espaço, de interlocução, compondo dentro da estrutura global

da narrativa- aquilo que é essencialmente narrativo. Este

bloco narrativo detém as propriedade definidoras da narrati.

va e compõe aquilo que é inerente ao processo narrativo ne^

te tipo específico de discurso.

0 segundo bloco, formado pelas seções Sinopse, Ava

liação e Coda, desempenham a função de relacionar o narrador

e narratário, portanto a função desempenhada por este bloco

deve ser entendida mais em seu aspecto discursivo através

das relações que se estabelecem entre narrador e narratário.

Aponta, ainda, o envolvimento do narrador com o seu texto e

seu nível de consciência da situação de interlocução em que

o processo narrativo está inserido.

Este bloco cumpre uma função avaliativa, no sentido

de atentar para as pressões sociais que o grupo exerce sobre

o narrador e compõe aquilo que não é essencialmente narrati­

vo, neste tipo específico de discurso.

Em razão de o presente estudo ter pretensões pedagó­

gicas, podendo contribuir para a melhoria do processo ensino

-aprendizagem no ensino da redação, em especial da narração,

apresentou-se a proposta de acoplar-se, ao modelo de análise

adotado para a estrutura narrativa, a noção de momentos nar

f ativos para que seja possível recuperar-se o processo nar

Page 154: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

rativo de momento a momento, evidenciando a dinâmica proce^

suai de uma realidade que se transforma e é representada por

elementos lingüísticos próprios a este tipo de discurso.

Além disso, durante a exposição, mostrqu-se que a ava

liação ocorre sob várias formas em pontos diversos da estrut£

ra, fato verificável pela realização de funções sobrepostas

nas diversas seções estruturais,o que traz uraa maior comple

xidade ao do texto narrativo. É importante atentar que a aná­

lise apontou um maior emprego deste tipo de avaliação nas nar

rativas de experiência pessoal,o que vem reforçar a posição

já apresentada anteriormente de que os textos narrativos- pro

duzidos em situação EP apresentam maior complexidade estrutu­

ral do que os textos narrativos produzidos em situação EV.

Page 155: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

NOTAS DO CAPÍTULO 4

1. "É claro que há um complexo encadeamento e encaixamento de^

tes elementos, más aqui estamos apresentando-os de forma ampl_i

ficada."

2. "orações de orientação podem estar encaixadas na ação com

plicadora para acrescentar informações que o ouvinte necessi­

ta nesta ordem para entender ou interpretar os eventos repor

tados adjacentemente."

Page 156: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

5. CONCLÜSAO

Ao longo deste trabalho, estudou-se a estrutura global

de narrativas escolares escritas e procurou-se caracterizar os

elementos lingüísticos das várias seções estruturais para se

obter uma melhor compreensão deste tipo de discurso.

Buscar-se uma caracterização da narrativa, através de

marcas lingüístivas ocorrentes e recorrentes neste tipo de di^

curso, que possibilitem distinguir a função e as peculiarida­

des das diversas seções estruturais não é tarefa fácil e muito

menos absoluta em seus resultados. É na consideração do texto

narrativo em sua totalidade, nas relações entre os diversos

elementos que aí aparecem que se procurou compreender a narra­

tiva, enquanto um tipo específico de discurso.

Pela análise qualitativa combinada à análise quantita­

tiva, que foi o procedimento deste estudo, pode se dizer que

os informantes da presente pesquisa, tanto os do grupo A quan

to os do grupo B, já produzem a estrutura narrativa, principa]^

mente a estrutura essencialmente narrativa, responsável pela

função 2'eferencial.

Por outro lado, a análise apontou que as narrativas

produzidas em situação de produção EP apresentam maior comple­

xidade estrutural do que as narrativas produzidas em situação

EV.

Page 157: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

Os aspectos apresentados no decorrer desta exposição

levam a considerar que a narrativa é formada por dois blocos

narrativos distintos, cumprindo funções específicas na situa

ção de comunicação.

O primeiro, cumpre uma função referencial, qual seja

a de recuperar o evento ocorrido em sua dinamicidade (recupe­

ração da seqüência temporal) e apresentá-lo em uma situação

específica (referência tempo, espaço, personagens, e a própria

situação de interlocução). Este bloco narrativo, formado pelas

seções Orientação, Ação Complicadora e Resolução, ao cumprir

uma função referencial dentro da globalidade da narrativa,

compõe . aquilo que é essencialmente narrativo neste tipo de

discurso.

0 segundo, formado pelas seções Sinopse, Avaliação e

Coda, cumpre uma função avaliativa, compreendendo aquilo que

não é essencialmente narrativo, neste tipo de discurso, e a

função desempenhada por este bloco narrativo deve ser entend^

da mais em função do seu aspecto discursivo através das rela­

ções estabelecidas entre narrador e narratário e sua consciên

cia da situação de interlocução, portanto a função deste blo­

co deve ser recuperado a nível de discurso.

Pensa-se que as considerações e as análises apresen­

tadas, nesta pesquisa, poderão ter repercuss^ pedagógica de

grande valia no ensino de IQ e 2° graus, relacionada princi­

palmente ao ensino da redação, em especial da narração, pois

apresenta um referencial teórico aplicado ao produto real co

Ihido ém . situação escolar.

Sugere-se que as atividades escolares de produção tex

tual, especialmente a produção de textos narrativos, sejam

Page 158: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

propostas a partir de experiências do próprio educando. Duran

te a exposição deste estudo mostrou-se que o narrador ao re

portar uma experiência própria se utiliza dos mais variados

recursos lingüísticos.

O conhecimento da estrutura narrativa, por parte do

educador, é indispensável pois o desempenho narrativo do edu

cando é o ponto de referência que indicará ao educador as se

ç5es estruturais já interiorizadas, o que possibilitará o de

senvolvimento da competência narrativa do educando, ao fixar

as estruturas que ele já produz e propondo situações para a

aquisição das outras seções que ele ainda não realiza em"suas

produções de narrativas.

Desta forma, o ensino da estrutura narrativa poderá

se tornar um processo gradual de complexidade, influindo na

aquisição da estrutura global da narrativa.

Muito importante, ainda, é não esquecer que o texto

narrativo deve ser produzido numa situação em que o narrador

esteja consciente de que escreve para um narratário, pois a

artificialidade das redações escolares se torna um entrave pa

ra o desenvolvimento da capacidade de expressão do educando.

Espera-se que a leitura desta dissertação, estimule

os professores a conhecerem aspectos teóricos que orientem a

sua prática pedagógica, além dos apresentados aqui, para assu

mirem a sua responsabilidade perante a educação atual, já que

a sociedade hoje está a exigir dos jovens a capacidade de do

minar a escrita como uma das habilidade indispensáveis para

a sua realização profissional e social. Como diz Mello;

Page 159: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

"a questão da capacitação do professor e de sua formação cultural mais ampla se coloca com grande relevância. Para a tarefa de ser um dos agentes de mudança da escola e da prá tica pedagógica visando a torná-la adequada ..., o saber fazer técnico constitui cond^ ção necessária porque é a base do querer po lítico, ainda que a dimensão política da ta refa docente não seja percebida com tal".

(Mello; 1982; 141)

Assim sendo, buscar o auto-aperfeiçoamento é tarefa

que se impõe ao educador, para situá-lo como um profissional

que procura solucionar os problemas educacionais e de sua

área específica de atuação através do conhecimento racional

do objeto do seu trabalho, pois não basta ter boa intenção,

é preciso, antes de tudo, ter competência técnica para desen

volver a atividade educacional como uma atividade política,

no sentido de compromisso com a evolução do conhecimento e

da sociedade.

Page 160: Esta dissertação foi julgada adequada para a obtençio

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