especialistas acreditam que músicas banalizam violência ... · como flor / mas no fim era uma...

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17/11/2015 Especialistas acreditam que músicas banalizam violência contra a mulher Jornal O Globo http://oglobo.globo.com/sociedade/especialistasacreditamquemusicasbanalizamviolenciacontramulher18067514 1/7 PUBLICIDADE Especialistas acreditam que músicas banalizam violência contra a mulher Para diretora do Instituto Patrícia Galvão, artistas devem ter responsabilidade com letras POR MARINA COHEN 17/11/2015 6:00 / atualizado 17/11/2015 8:50 PUBLICIDADE Francisco Alves, Wilson Batista, Mario Lago e Gabriel O Pensador compuseram ou interpretaram canções cansideradas machistas pela militância feminista Arte O GLOBO RIO — “Se ele te bate/ É porque gosta de ti/ Pois baterse em quem/ Não se gosta/ Eu nunca vi”. A canção “Amor de malandro”, gravada por Francisco Alves em 1929, deixa evidente: bater em mulher era tão trivial algumas décadas atrás que, sem cerimônia alguma, virava letra de samba. Mais de 80 anos depois da canção e nove anos depois da aprovação da Lei Maria da Penha, que protege a mulher contra a violência doméstica, o Brasil ainda mostra resquícios da herança misógina. O levantamento “Mapa da violência 2015: homicídio de mulheres no Brasil”, lançado semana passada pela Faculdade LatinoAmericana de Ciências Sociais (Flacso), mostrou SOCIEDADE COMPARTILHAR BUSCAR g1 ge gshow famosos vídeos

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17/11/2015 Especialistas acreditam que músicas banalizam violência contra a mulher  Jornal O Globo

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Especialistasacreditam que

músicas banalizamviolência contra a

mulherPara diretora do Instituto Patrícia Galvão, artistas

devem ter responsabilidade com letras

POR MARINA COHEN

17/11/2015 6:00 / atualizado 17/11/2015 8:50

PUBLICIDADE

Francisco Alves, Wilson Batista, Mario Lago e Gabriel O Pensador compuseram ouinterpretaram canções cansideradas machistas pela militância feminista  Arte O GLOBO

RIO — “Se ele te bate/ É porque gosta de ti/ Pois baterse em

quem/ Não se gosta/ Eu nunca vi”. A canção “Amor de malandro”,

gravada por Francisco Alves em 1929, deixa evidente: bater em

mulher era tão trivial algumas décadas atrás que, sem cerimônia

alguma, virava letra de samba. Mais de 80 anos depois da canção e

nove anos depois da aprovação da Lei Maria da Penha, que protege a

mulher contra a violência doméstica, o Brasil ainda mostra resquícios

da herança misógina. O levantamento “Mapa da violência 2015:

homicídio de mulheres no Brasil”, lançado semana passada pela

Faculdade LatinoAmericana de Ciências Sociais (Flacso), mostrou

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17/11/2015 Especialistas acreditam que músicas banalizam violência contra a mulher  Jornal O Globo

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que 4.762 mulheres foram assassinadas no país em 2013, índice 12,5%

maior do que em 2006. A taxa de homicídios de mulheres — a quinta

maior do mundo — foi revelada na mesma semana em que o

secretário de Governo do Rio, Pedro Paulo Carvalho, précandidato do

PMDB à prefeitura em 2016, foi acusado de agredir a exmulher,

Alexandra Marcondes Teixeira, pelo menos duas vezes. “Quem não

tem um momento de descontrole?”, argumentou Pedro Paulo em

entrevista coletiva. Especialistas acreditam que as músicas não são

apenas um retrato de uma sociedade que naturaliza a violência

doméstica, mas também têm um papel ativo em estimular, em certa

medida, o feminicídio. O machismo está tão presente na cultura

popular que, muitas vezes, dificulta que a própria mulher perceba que

é vítima de relacionamentos abusivos.

LINHA DO TEMPO: O MACHISMO ATRAVÉS DA MÚSICA

BRASILEIRA

— Quando se coloca na letra de uma música popular um

comportamento violento, sem uma reflexão por trás, é uma forma de

banalizar a opressão. De certa forma, isso estimula as agressões —

comenta Marisa Sanematsu, diretora de conteúdos do Instituto

Patrícia Galvão, que zela pelos direitos das brasileiras. — Quando você

diz numa canção “Se te pego com outro, te mato”, isso passa a ser

esperado socialmente.

De “Dá nela!”, de 1930, a “Lôraburra”, de 1993, passando pelo clássico

“Amélia”, os exemplos de músicas que criam estereótipos femininos

são muitos. A historiadora Carla Bassanezi Pinsky, autora do livro

“Mulheres dos Anos Dourados” e especialista na pesquisa de revistas

femininas dos anos 1940, 1950 e 1960, ressalta que a produção

cultural do país é o maior reflexo da disseminação dessa cultura

hegemônica.

— As revistas são verdadeiros documentos da época e mostram

claramente que as tarefas no lar eram obrigação das mulheres e que

trabalhar fora de casa não era bem visto entre a classe média. Ditados

populares como “em briga de marido e mulher ninguém mete a

colher” e outros que afirmam que a esposa que sai dos eixos merece

“corretivo” perpassam essa sociedade. Dar uma surra na mulher

porque ela fala demais, por exemplo, era motivo de risada — comenta

Carla. — As revistas e músicas reforçam e divulgam os valores.

Uma guinada aconteceu na segunda metade da década de 1960, com a

chegada do anticoncepcional e uma maior participação das mulheres

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no mercado de trabalho. O cinema americano deu um empurrão, ao

mostrar mocinhas ousadas que beijam rapazes no primeiro encontro e

dançam rock n’roll. Na MPB, o cenário muda a partir dos anos 1970,

segundo o pesquisador musical Rodrigo Faour, quando autores como

Chico Buarque, Gonzaguinha e Ivan Lins, e compositoras como

Vanusa e Rita Lee, começaram a defender os direitos das mulheres em

suas letras. Hoje, o funk carioca puxa a revolução feminina, com

Valesca e Tati Quebra Barraco cantando sobre sexo e o poder das

mulheres.

Elza Soares, Alcione, Vanusa e Tati Quebra Barraco revolucionaram a música brasileiraao abordarem temas femininos em canções  Arte O GLOBO

— A mulher poder dizer o que quer e expressar as angústias femininas

nas letras foi uma conquista dos últimos 40 anos. Vanusa foi

precursora, ao ser uma das primeiras cantoras e compositoras a falar

abertamente sobre a violência doméstica, em “S.O.S. mulher”, de

1981. É muito interessante que artistas abracem essa causa, como

também fizeram Alcione e Elza Soares — analisa o especialista, sem

esquecer das funkeiras. — Elas quebraram o mito que mulher tem

menos desejo sexual que o homem.

No álbum de inéditas “A mulher do fim do mundo”, lançado mês

passado, Elza Soares fez questão de incluir uma música que é um

alerta contra a violência doméstica. “Eu vou ligar pro um oito zero /

Vou entregar teu nome”, avisa a cantora na letra, divulgando o

telefone da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher.

— Acho essencial defender as mulheres agredidas, que não conseguem

pedir socorro. Senti necessidade de abraçar a causa — afirma Elza,

orgulhosa da faixa “Maria da Vila Matilde”. — Mulher tem que gritar

mesmo, tem que reivindicar, fazer escândalo. Gemer, só de prazer.

Letras de gosto duvidoso não pararam de ser produzidas na década de

1960. A canção “Trepadeira”, de Emicida, lançada dois anos atrás,

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causou ira entre as feministas com os versos: “Dei todo amor, tratei

como flor / Mas no fim era uma trepadeira”. A letra de “Agora viu que

perdeu e chora” — “Mulher foi feita para o tanque / Homem para o

botequim” —, sucesso de Arlindo Cruz em 2012, e um semnúmero de

hits do sertanejo universitário sobre mulheres interesseiras são

apenas alguns exemplos.

TEMA ATUAL

Marisa Sanematsu, do Instituto Patrícia Galvão comemora, no

entanto, as pequenas vitórias, como a decisão do Tribunal Regional

Federal da 4ª Região (TRF4), anunciada em outubro passado, que

concluiu que as músicas “Tapinha” e “Tapa na cara” incitam a

violência contra a mulher. O tribunal condenou, em segunda

instância, a produtora e a gravadora a pagarem multa de R$ 500 mil,

a ser revertida para o Fundo Federal de Defesa dos Direitos Difusos. A

ação tramitava na Justiça desde 2003.

— A patrulha e a pressão pública hoje são maiores. Vejo com otimismo

jovens mulheres e rapazes prestando mais atenção às manifestações

de discriminação e criticando esse tipo de apologia nas redes sociais.

Se a gente não reclama, a coisa banaliza. Tem que reclamar mesmo, e

fazer o artista se posicionar — cobra Marisa. — Dizer que a música

popular sempre foi assim não é desculpa. Naquela época, não tinha

Lei Maria da Penha, não tinha conscientização sobre a questão. Hoje

tem.

Para combater as estatísticas alarmantes de ataques ao sexo feminino,

a Rede Globo e a ONU Mulheres, liderança global na defesa dos

direitos humanos, lançaram, esta semana, na TV, uma campanha de

enfrentamento à violência de gênero, mostrando a importância da

denúncia das agressões pelo telefone 180.

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