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RAFAEL ALENCAR FURTADO ESPAÇO MARX DA UFPR E A CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE DA CLASSE TRABALHADORA Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação, Programa de Pós-Gradução em Educação da, Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná. Orientadora: Profa. Dra. Orliney M. Guimarães CURITIBA 2 0 0 6 1

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RAFAEL ALENCAR FURTADO

ESPAÇO MARX DA UFPR E A

CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE DA

CLASSE TRABALHADORA

Dissertação apresentada como requisito parcial

para obtenção do título de Mestre em Educação,

Programa de Pós-Gradução em Educação da,

Setor de Educação da Universidade Federal do

Paraná.

Orientadora: Profa. Dra. Orliney M. Guimarães

CURITIBA2 0 0 6

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RAFAEL ALENCAR FURTADO

ESPAÇO MARX DA UFPR E A

CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE DA

CLASSE TRABALHADORA

CURITIBA2 0 0 6

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DEDICATÓRIA

Aos trabalhadores e trabalhadorasque constroem alienadamente, reivindicatoriamente

ou revolucionariamente, o caminho para a chegada da época em que a humanidade será possível.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, a todos os companheiros e companheiras do Espaço Marx que durante os últimos três anos e meio, contribuíram incisivamente na minha formação política. Esse é um trabalho escrito por nossas mãos, com suas semelhanças e diferenças.

Às pessoas que compõem parte fundamental dessa formação e cotidianamente estenderam-me a mão e o coração para que eu pudesse continuar. Em especial à Mieko, Ana e Maria Luiza, três mulheres, três gerações, três amores.

Aos demais companheiros e companheiras de outros espaços de militância, por em tempos tão sombrios se proporem a continuar construindo a saída da pré-história da humanidade.

E finalmente à professora Orliney Maciel Guimarães, pela paciência e pela autonomia concedida ao desenvolvimento desse trabalho.

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EPÍGRAFE

O mar vem do marmorre nascendo

simulacro de deusbaba do céu

vem do mar o marmar de si mesmo

deserto sem memóriae sem esquecimentoo mar chega ao mar

mas à noiteas ressacas não retornam

para o horizonte

Mario Benedetti

Não importa que doa: é tempode avançar de mão dada

com quem vai no mesmo rumo,mesmo que longe ainda esteja

de aprender a conjugaro verbo amar.

É tempo sobretudode deixar de ser apenas

a solitária vanguardade nós mesmos.

Se trata de ir ao encontro.( Dura no peito, arde a límpida

verdade dos nossos erros. )Se trata de abrir o rumo.

Os que virão, serão povo,e saber serão, lutando

Thiago de Mello

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SUMÁRIO

RESUMO..........................................................................................................................vi

ABSTRACT.....................................................................................................................vii

1. INTRODUÇÃO............................................................................................................09

PARTE I

2.O PROCESSO DE CONSCIÊNCIA: UMA ABORDAGEM MARXISTA.............11

2.1 - Consciência de Classe: o processo de sua constituição........................................17

2.2 - Formação Política na Formação da Classe...........................................................27

PARTE II

3. HISTÓRICO DO ESPAÇO MARX/UFPR: CAMINHOS QUE LEVAM A SUA

ORIGEM..........................................................................................................................35

3.1 - Antes de Espaço Marx, Florestan Fernandes........................................................41

3.2 - Espaço Marx, porquê?...........................................................................................44

3.3 - O vínculo com a instituição UFPR.......................................................................46

3.4 - A Definição da Metodologia Inicial.....................................................................47

3.5 - Assim inicia-se o Espaço Marx da UFPR............................................................52

3.6 - Para Além do Capital, sem abandoná-lo..............................................................53

3.7 - Aumenta a demanda: O que fazer?.......................................................................54

3.8 - O Espaço Lênin, revoluções e conjuntura............................................................57

4. OS PARTICIPANTES DO ESPAÇO MARX: QUEM SÃO E O QUE

AVALIAM?.....................................................................................................................59

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS: ESPAÇO MARX UM INSTRUMENTO DE SEU

TEMPO ............................................................................................................................82

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................90

7. ANEXOS.......................................................................................................................94

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RESUMO

ESPAÇO MARX DA UFPR E SUA CONTRIBUIÇÃO NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE DA CLASSE TRABALHADORA

A fundamentação teórica é vista como um dos instrumentos de desenvolvimento da consciência de classe. Lênin afirmava que os processos de lutas reais coadunados com o processo de formação teórica, são elementos essenciais para o desenvolvimento da consciência da classe trabalhadora no seu processo de libertação. No momento atual do sistema capitalista, de aprofundamento da ofensiva do capital sobre o trabalho nas relações sociais de produção, expressa pela depreciação das condições de trabalho, aumento do exército industrial de reserva e aumento acentuado da miséria em uma grande parte da população, faz-se necessário não somente entender, interpretar a consciência social sintetizada nesse cenário, mas essencialmente perceber possibilidades de contribuir para a sua transformação. Este trabalho teve como objetivo analisar o grupo de estudos que ocorre na UFPR, denominado Espaço Marx, procurando entender sua concepção metodológica, contextualizar seus limites, avanços, contradições e possibilidades enquanto um instrumento possível de desenvolvimento da consciência de classe. Através de uma revisão de literatura sobre o processo de consciência e mais especificamente sobre o processo de consciência de classe e da participação das etapas iniciais do curso de formação de monitores do Núcleo de Educação Popular 13 de maio de São Paulo, buscamos fundamentar a análise sobre o trabalho desenvolvido no espaço Marx. O trabalho de campo constituiu-se de entrevistas previamente estruturadas com os fundadores do Espaço Marx da UFPR, aplicação de um questionário aos participantes deste espaço, de uma apresentação e conseqüente debate com esses membros sobre as considerações iniciais e da participação do autor no grupo de estudos pelo período de três anos e seis meses. Nesse processo realizado concluímos que o Espaço Marx da UFPR tem como objeto prioritário de trabalho o aprofundamento teórico para militantes que passam ou já realizaram o rompimento com a fase de consciência reivindicatória e que consegue avançar significativamente nesse aprofundamento desses participantes. Por outro lado, constatou-se também a necessidade de se avançar na discussão estrutural e metodológica desse espaço, na perspectiva tanto de possibilitar a construção de um programa de estudos mais sistematizado como de conseguir contemplar outros objetivos a que se propõe como: produção e divulgação da ciência marxista e interação com outros espaços de estudo do marxismo.

Palavras-chave: Espaço Marx, formação da consciência, classe trabalhadora.

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ABSTRACT

UFPR MARX CENTER AND THE CONTRIBUTION ON THE PROCESS OF CLASS CONSCIOUSNESS FORMATION OF WORKING CLASS

The theoretical formation is seen as one of the class consciousness development instrument. Lenin affirmed that the real fight processes combined with the theoretical formation process, are essential elements to develop the working class consciousness on its process of liberation. On this actual moment of the capitalism system, the deepen of the offensive capital over work upon the social relations of production, makes necessary not only understand, interpret the social consciousness within this scenery, but specially feel the possibilities of contributing for its transformation. This assignment had as objective analyze the study group that takes place in UFPR, called Marx Center, looking forward understanding its methodological conception, contextualizing its limits, advances, contradictions, and possibilities as a possible instrument of class consciousness development. Throughout a review on the literature about the consciousness process and more specifically about the class consciousness process and about the participation on the initial stages of the curse for monitors formation from the Núcleo de Educação Popular 13 de maio (May 13th Popular Education Center) from São Paulo, we looked for substantiate the analyze about the work developed in the Marx Center. The fieldwork was based on interviews previously structured with the Max Center founders, the application of a questionnaire to the Center participants, presentations and consequently debate with those members about initial considerations and the author participation in the group of studies for the period of three years and six months. On this made process we concluded that the UFPR Marx Center has as prior object of work the carefully study of theoretical for militants that are passing or have already broken up with the stage of consciousness claimed and are able to advance significantly on the deepen of those participants. On the other hand, it was also seen the need of advancing on the Center structured and methodological discussion, under the perspective of making possible the construction of a more systematized study program as well as being able to contemplate other objectives such as: the Marxism science productions and divulgation and interaction with other Marxism study centers.

Key words: Marx center, consciousness formation, working class

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1 - INTRODUÇÃO

A fundamentação teórica é vista como um dos instrumentos de desenvolvimento da

consciência de classe. Lênin afirmava que os processos de lutas reais coadunados com o

processo de formação teórica, são elementos essenciais para o desenvolvimento da

consciência da classe trabalhadora no seu processo de libertação enquanto classe1.

O Espaço Marx da UFPR, existente há mais de seis anos, procura realizar um

trabalho de fundamentação da teoria marxiana e de experiências revolucionárias,

propondo-se a ultrapassar os limites da simples interpretação desses temas em seu sentido

academicista, com o objetivo de propiciar um espaço de fundamentação teórica para a ação

militante.

Durante essa existência o espaço que foi fundado também com os objetivos de

elaboração de textos, divulgação das idéias marxistas e interação com outros Espaços

Marx, passou por diversas mudanças quantitativas e qualitativas no que se refere à

metodologia, aos conteúdos trabalhados e aos participantes do processo. Atualmente, esse

espaço conta com a participação constante de aproximadamente 40 pessoas que se

encontram semanalmente para estudar a obra O Capital, de Marx e um conjunto de

experiências revolucionárias socialistas e burguesas, em encontros onde se alternam estas

duas temáticas.

Esta pesquisa tem como objetivo analisar essa formação histórica e o

desenvolvimento desse projeto de fundamentação teórica, procurando entender e verificar

sua concepção metodológica, contextualizar seus limites e avanços, contradições e

possibilidades enquanto um instrumento possível de desenvolvimento da consciência de

classe na atual conjuntura do desenvolvimento do capitalismo e da luta de classes.

A importância dessa pesquisa parte da necessidade da classe trabalhadora em

sistematizar, analisar e avaliar os instrumentos construídos por ela para a contribuição do

processo de emancipação da humanidade em suas diversas dimensões, prática, teórica e

organizacional. No caso do presente trabalho, buscamos efetuar esse processo de pesquisa

em um espaço que trabalha fundamentalmente com o aspecto da formação teórica, com a

intenção de contribuir para a compreensão e desenvolvimento desse instrumento.

Para analisar esse espaço de fundamentação teórica que pretende contribuir no

processo de formação da consciência de classe de seus participantes, o caminho

metodológico adotado é o de se iniciar a exposição com base na teoria marxiana sobre a

1 Lênin, Que Fazer? As Questões Palpitantes do Nosso Movimento. Editora Hucitec - São Paulo, 1979.

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formação e o desenvolvimento da consciência humana. Essa discussão inicial estabelece

princípios gerais que nos subsidiaram na análise posterior sobre o processo de consciência

de classe da classe trabalhadora, onde buscamos delimitar os momentos desse processo em

que a fundamentação teórica atua de forma mais efetiva, bem como o que é e como se

compõe um processo de formação política.

Com esse conjunto teórico inicialmente traçado, partimos para a construção do

relato da história e desenvolvimento do objeto de estudo, bem como para o processo de

análise crítica desse material. Essa análise teve como fontes as entrevistas realizadas e os

documentos recolhidos junto aos fundadores, questionários aplicados aos participantes, a

sistematização da apresentação e do debate da pesquisa realizada no Espaço Marx para

fundadores e participantes em uma das sessões de estudo e a própria participação por parte

do pesquisador nos últimos três anos e seis meses de existência do Espaço Marx da UFPR.

Nas considerações finais procuramos sistematizar essa análise em seus pontos

centrais, bem como apontar nossas conclusões sobre a pesquisa.

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PARTE I

2. - O PROCESSO DE CONSCIÊNCIA: UMA ABORDAGEM MARXISTA

“¿Que necesita un ser humanopara no apartarse de si?”

(Silvio Rodriguez)

Entender o caminho que o ser humano percorreu e percorre para a construção de

sua consciência, faz-se necessário para perceber os fatores fundamentais que determinam

esse processo. Para tanto, o percurso inicial a se desenvolver para tal compreensão, deve

centrar-se em como o homem2 constrói sua história e como é por ela construído, que

relações estabelecem com a natureza e com os outros homens e qual o significado dessas

relações para a constituição de seus processos cognitivos, para a formação da sua

consciência.

Na construção desse percurso devemos, mediante o princípio da totalidade, incorrer

em abstrações que nos levem à categoria fundante do objeto analisado e reconstruir esse

caminho delineando as relações entre essas abstrações até chegarmos de novo ao todo, já

não mais caótico e sim uma totalidade concreta pensada (Marx, 2005). Como pretendemos

analisar a formação da consciência humana, devemos partir da história da sociedade

humana e perceber qual a categoria fundante desse processo, que caracteriza o homem

enquanto espécie, que o diferencia essencialmente das outras espécies e confere a ele uma

posição de destaque perante a história e a natureza.

O homem na sua caracterização enquanto ser genérico, ou seja, ser humano, é

produto da natureza e essencialmente é um produto da história humana e de seu

desenvolvimento. É um produto da natureza, pois é dela uma parte, enquanto organização

corporal, em sua vida física e espiritual (Marx, 2002). Um elemento integrante,

indissociável e somente nela consegue buscar os elementos para a satisfação de suas

necessidades e para consecução de sua existência. E um produto da história humana,

porque é no desenvolvimento e reconhecimento dessa história que se percebe enquanto

humano, configura-se enquanto espécie, acumula conhecimentos e os desenvolve.

O homem mediatiza então sua relação com a natureza, pela relação que possui com

a sociedade humana. Por sua vez, a relação que estabelece com os outros seres humanos é

impulsionada pela necessidade de produzir as condições que garantam sua sobrevivência,

esse processo de interação com os outros de sua espécie acontece mediatizado pelo

2 Utilizaremos no decorrer da pesquisa a terminologia homem para nos referir ao gênero humano.

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trabalho. Portanto, o trabalho é a atividade que dá significado ao gênero humano, que o

inaugura enquanto espécie, o trabalho enquanto atividade socialmente construída e

elaborada.

É através do trabalho, da produção de sua existência, que passa pela produção dos

meios que a garantam, que o homem primeiramente atua sobre a natureza e interage com

os outros homens. Essa é a sua atividade vital, seu primeiro ato histórico (Marx, 1987)

atividade pela qual se constrói enquanto espécie, que se posta perante a natureza como uma

força que não se adapta simplesmente a seus limites ou características naturais, mas que

agindo sobre ela a modifica, a reelabora enquanto fonte de riqueza, enquanto lugar de onde

busca os elementos que o possibilitam viver enquanto ser humano, onde imprime sua

marca e transforma a natureza em natureza humana. Nessa ação, o homem não transforma

unilateralmente a natureza, o homem modifica sua própria constituição, sua própria

percepção da realidade, suas próprias relações. Transforma então seu próprio modo de

vida, suas necessidades e possibilidades (Marx, 1987).

Na relação que esse homem genérico estabelece com a natureza, através do trabalho

social é que ele se constrói, inclusive em sua organização corporal:

“O olho tornou-se um olho humano, no momento em que o seu objeto se transformou em

objeto humano, social, criado pelo homem para o homem. Por conseqüência, os sentidos

tornaram-se diretamente teóricos na sua prática. Relacionam-se à coisa por ela mesma,

mas a própria coisa já constitui uma relação humana objetiva a si mesma e ao homem, e

vice-versa. A necessidade ou o prazer perderam portanto o caráter egoísta e a natureza

perdeu a sua mera utilidade, na medida em que a sua utilização se tornou utilização

humana.”(Marx, 2002, p.142)

O mundo passa de sua condição natural, sensível e estranha ao homem, para a

condição de mundo objetivado, na qual o homem reconhece o objeto enquanto produto de

sua intervenção na natureza, ou seja, “descobre nas coisas propriedades até então

desconhecidas, penetra na sua essência, abstrai suas características e capta as relações nas

quais se inserem, rompendo as fronteiras da experiência sensível” (Klein, 2005, p.02).

Torna a realidade sensível para ele como a realidade objetivada, construída pelo trabalho

social.

Nessa objetivação do mundo e de suas relações é que o ser humano começa a

abstrair, a representar e reelaborar no pensamento sua realidade concreta. E aqui nesse

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ponto, cabe colocar que “o surgimento da linguagem é a segunda condição que leva à

formação da atividade consciente de estrutura complexa do homem” (Luria, 1979, p.77).

Por isso, ao considerarmos o trabalho como o ponto inaugural da existência humana

propriamente dita, temos que entender a linguagem como um processo e um produto dessa

atividade especificamente humana (Klein, 2005). Parece-nos importante também entender

que assim como o trabalho, as raízes da linguagem não podem ser procuradas ou

designadas a um indivíduo isoladamente, qual seja sua forma de expressão ou de

formulação ela pertence a um grupo social, ao ambiente social desse indivíduo (Bakthin,

2004). Ainda segundo esse autor “o componente verbal do comportamento é determinado

em todos os momentos essenciais do seu conteúdo por fatores objetivos-sociais” (Bakthin,

2004, p.86).

Entende-se nessa perspectiva a linguagem atuante primordialmente tanto nas

funções de comunicação e intercâmbio das experiências e pensamentos entre humanos,

como para o desenvolvimento do próprio pensamento, é a interiorização do diálogo

exterior que faz com que o instrumento da linguagem atue decisivamente no fluxo de

desenvolvimento do pensamento (Vigotski, 2003). Permitindo ao ser humano a

conservação das informações recebidas do mundo exterior, a construção interior de

representações desse mundo e a análise e classificação dos objetos pré-existentes na

natureza e dos desenvolvidos ao longo do processo histórico, abstraindo-os e

generalizando-os (Luria, 1979). “Deste modo, o pensamento e a linguagem, embora

distintos, mantêm entre si uma unidade indissociável. Nessa unidade, não é a atividade

mental que organiza a expressão, mas é a linguagem, enquanto expressão, enquanto signo,

enquanto material semiótico que organiza a atividade mental” (Klein, 2005, p. 02).

A linguagem, portanto, media o processo de trabalho e em concomitância tem

papel fundamental no desenvolvimento da consciência, “a partir da linguagem de cada

um, é possível julgar da maior ou menor complexidade da sua concepção de

mundo”(Gramsci, 1989, p.12).

A consciência, nessa perspectiva, aparece então como um produto social, ou seja, o

caminho desse processo não é do indivíduo para as relações que ele estabelece e sim, ao

contrário, das relações estabelecidas para o indivíduo. Somente nessas relações sociais, da

produção dos meios de sua vida, é que o homem se estabelece enquanto homem. Nessas

relações mediatizadas pelo trabalho que por sua vez é mediado pela linguagem é que ele se

coloca e se reconhece como espécie. Reconhecer que esse caminho parte inicialmente das

relações sociais estabelecidas, não nos coloca em uma posição mecanicista ou unilateral do

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desenvolvimento da consciência, essa definição afirma fundamentalmente um princípio

determinante na construção desse processo.

As suas possibilidades e limitações de avançar nesse processo de consciência são

datadas historicamente pelas condições materiais, determinadas por sua vez,

essencialmente pelo grau de desenvolvimento das forças produtivas da sociedade na qual

este ser humano está inserido. “Por isso, não se pode partir do que os homens pensam ou

falam de si em uma determinada época para entendê-los em suas relações, em seu

processo de vida real. O caminho é ao contrário, parte-se dessa concretude material para

compreender suas relações sociais e suas representações que ressoam em suas mentes”

(Marx, 1987).

Neste mesmo ponto, ao situar o grau de desenvolvimento das forças produtivas

como base do desenvolvimento da história humana e conseqüentemente da consciência

humana, Marx assinala na carta a Annenkov:

“...os homens não dispõem livremente de suas forças produtivas – que constituem a base

de toda a sua história, pois toda a força produtiva é uma força já adquirida, produto de

uma atividade anterior. Assim, as forças produtivas são o resultado da energia posta em

prática pelos homens: essa energia, porém, é determinada, ela própria, pelas condições

em que os homens se encontram, pelas forças produtivas já alcançadas, pela forma

social que lhes é anterior, que eles não criaram e que é o produto da anterior geração.

Graças ao simples fato de que toda nova geração se encontra face a forças produtivas já

adquiridas pela geração precedente e que lhe servem de matéria-prima para a nova

produção, surge um encadeamento na história, surge a história da humanidade, a qual é

tanto mais a história da humanidade quanto mais se desenvolverem suas forças

produtivas e, em conseqüência, suas relações sociais”. (Marx, 1846)

Essa determinação econômica não significa que esse se constitui no único fator que

determina o desenvolvimento do processo, mas que é a base determinante da sociedade

humana. Estabelece desse modo o princípio de determinação econômica e não de

determinismo econômico conceito empregado por críticos dessa teoria. Engels em sua carta

a Block aborda essa questão colocando que “em última instância, o que determina a

história é a produção e a reprodução da vida real. Nem Marx nem eu afirmamos, uma vez

sequer, algo mais que isso. Se alguém o modifica, afirmando que o fato econômico é o

único fato determinante, converte aquela tese em uma frase vazia, abstrata e absurda”

(Engels, 1961).

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E mais adiante argumenta:

“nós mesmos fazemos nossa história, mas isto não se dá, em primeiro lugar, de acordo

com premissas e condições muito concretas. Entre elas, as premissas e condições

econômicas são as que decidem, em última instância. No entanto, as condições políticas

e mesmo a tradição que perambula como um duende no cérebro dos homens, também

desempenham seu papel, embora não decisivo.(Engels, 1961)”

Esse ser humano então é um produto histórico, um produto do desenvolvimento da

história da humanidade que o antecedeu. Por isso, não se pode estabelecer comparações de

homens de diferentes épocas históricas, como se estivéssemos analisando o mesmo

homem. As possibilidades concretas para que a sociedade humana desenvolva-se,

incluindo sua consciência que tem sua origem nas relações sociais estabelecidas no

trabalho social, estão determinadas também por esse desenvolvimento das forças

produtivas.

Como nos aponta Marx na obra O Capital, “os meios de trabalho não só são

medidores do grau de desenvolvimento da força de trabalho humana, mas também

indicadores das condições sociais nas quais trabalha” (Marx, 1988, p.144). O que por sua

vez, fornece ao seres humanos dessa época, a base material para o desenvolvimento de sua

consciência.

Esse desenvolvimento das forças produtivas constitui-se de uma relação centrada

no ser humano, no desenvolvimento de suas potencialidades físicas e intelectuais, com os

instrumentos de trabalho que esse ser humano é capaz de construir/elaborar e pelos

recursos naturais disponíveis no meio ambiente. Uma relação de interdependência e de

interdesenvolvimento desses três fatores.

Com o desenvolvimento do processo de trabalho, aperfeiçoamento dos

instrumentos, das técnicas empregadas, o homem além de suprir suas necessidades, passa a

produzir diferentes necessidades, de produtos sociais, que não existiam anteriormente. Essa

produção crescente de novas necessidades faz com que a partir de determinado momento

esse homem já não consiga produzir todos os produtos que necessita para sua existência e

torne-se cada vez mais orgânico a essa sociedade, pois necessita cada vez mais desse

trabalho social para prover sua existência. Aprofundando também a divisão social do

trabalho e o intercâmbio social dos produtos do trabalho.

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Esse desenvolvimento das forças produtivas apesar de não ser linear, seja por sua

própria destruição, parcial ou total (guerras, catástrofes naturais), ou por insucesso de

novas técnicas e instrumentos que não contribuam para o seu desenvolvimento, tende a ser

crescente. Conseqüentemente, a divisão social do trabalho e a criação de novas

necessidades também.

Ao analisar as formas de sociedade e como elas organizaram o processo de

produção, Marx coloca que:

“quanto mais recuamos na história, mais o indivíduo - e portanto o produtor individual -

nos aparece como elemento que depende e faz parte de um todo mais vasto; faz parte, em

primeiro lugar, e de maneira ainda inteiramente natural, da família e dessa família

ampliada que é a tribo; mais tarde, faz parte das diferentes formas de comunidades

provenientes do antagonismo entre as tribos e da fusão destas. Só no século XVIII, na

"sociedade civil", as diversas formas de conexão social aparecem face ao indivíduo

como simples meios para alcançar os seus fins privados, como uma necessidade exterior

a ele. Contudo, a época que gera este ponto de vista, esta idéia do indivíduo isolado, é

exatamente a época em que as relações sociais (universais, segundo esse ponto de vista)

alcançaram o seu mais alto grau de desenvolvimento”.(Marx, 2005)

Dentro de uma sociedade capitalista, uma sociedade de classes, não somente

distintas, mas antagônicas, onde uma detém a propriedade privada dos meios e dos objetos

de trabalho capazes de produzir os bens necessários à existência humana e a outra não

possuidora desses meios só possui a sua força de trabalho para prover a sua existência, os

produtos sociais do trabalho acabam sendo também propriedades privada daquela classe. O

que torna a classe trabalhadora alienada não somente no processo de trabalho, por não

possuir os meios de produção e não participar efetivamente da elaboração desse processo,

como alienada do produto de seu próprio trabalho.

Essa alienação da classe trabalhadora caracteriza-se por uma mutilação das

potencialidades desse homem que não têm mais o significado do trabalho como princípio

fundante de sua espécie, que a diferencia dos outros animais, mas sim como simples meio

de prover a sua existência. Uma mutilação de suas potencialidades de consumo dos

produtos sociais do trabalho sejam eles produtos do desenvolvimento em alimentos, em

vestuários, em moradia, em meios de transporte, de comunicação, de arte, de tecnologia em

informática enfim, de todas as áreas que são fundamentais para o seu reconhecimento

enquanto ser humano de sua época.

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O homem alienado dos produtos sociais do trabalho de sua época sente-se estranho

a seu momento histórico, não se reconhece na história da qual faz parte. Poderíamos dizer

que ele é a sombra ou um esboço do homem de sua época histórica, por suas

potencialidades estarem mutiladas. Pois é sobre essa base material de relações sociais de

produção que determina a participação desse indivíduo no consumo, entendido aqui como

usufruto dos bens sociais, frutos do trabalho social, que esse homem pode desenvolver sua

maneira de se relacionar com os outros de sua espécie.

E é nesse terreno, das condições materiais de garantir sua existência é que o homem

insere-se na sociedade, estabelece suas relações. É essa base econômica que determina em

última análise as possibilidades desse ser humano realizar-se enquanto ser humano de seu

momento histórico.

O desenvolvimento de sua consciência evidentemente não fica imune a esse

processo, sendo ele um produto social é essencialmente determinado também por essa base

econômica. Nesse sentido “a produção de idéias, da abstração, de representações, da

consciência partem, estão imbricadas, derivam das atividades materiais, concretas do

homem, das relações que estabelecem com outros homens e com a natureza” (Marx,

1987). Ou seja, o processo de consciência deve ser entendido dentro do momento histórico

da sociedade humana, ao qual está inscrito.

O processo de consciência então que partimos agora para analisar, traz seus

princípios de determinação que o definem enquanto produto social das relações sociais que

os homens estabelecem para garantir sua existência. Porém, situando sua inserção nas

relações capitalistas de produção, buscaremos traçar os aspectos centrais de seu

desenvolvimento dentro desse momento histórico.

2.1 - Consciência de Classe: o processo de sua constituição

“A realidade da relva cresce em sonho no sereno para não ser relva apenas, mas a relva que se sonha”

(Thiago de Mello)

Situando então esse processo de consciência dentro da sociedade capitalista, vamos

tentar perceber o processo pelo qual se desenvolve a consciência de classe. E não de

qualquer classe, mas da classe trabalhadora, que dentro do conjunto dessa sociedade se

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coloca enquanto classe que pode superar esse sistema pela posição que ocupa em seu

processo de produção (Marx, 1988).

Então, nessa parte da pesquisa, tentaremos estabelecer uma visão mais aprofundada

sobre esse processo de desenvolvimento da consciência de classe que pode levar a uma

consciência de classe revolucionária. Para tanto, recorremos à discussão realizada no

tópico anterior que situa o processo de desenvolvimento da consciência como um produto

social e determinado pelas relações sociais de produção estabelecidas por sua vez, pelo

grau de desenvolvimento das forças produtivas. Ressaltamos ainda que esse processo não é

unilateral, que essa mesma consciência que é determinada primeiramente pela estrutura

econômica, atua sobre essa base e pode em determinadas conjunturas atuar inclusive como

determinante na luta de classes, mas sem deixar de ser determinada pela mesma base

econômica.

O ser humano então nasce dentro dessas relações sociais construídas pelas gerações

anteriores, em nosso caso de análise relações sociais capitalistas. Nesse cenário, a classe

que nos propomos a analisar, nasce expropriada dos meios de trabalho que podem garantir

sua existência imediata e histórica. Tendo que se submeter aos que possuem esses meios

como única forma de garantir o caráter de existência imediata e que permita algum acesso,

mesmo que mutilado, na existência histórica enquanto espécie humana.

Por necessariamente ter que se submeter para garantir o primeiro fato histórico3

torna-se uma classe subordinada pela força de suas necessidades materiais “sejam elas da

barriga ou da fantasia” (Marx, 1988) à outra classe, dos capitalistas. Essa subordinação no

terreno concreto do cotidiano de reprodução da vida também se reflete em um domínio das

idéias e da consciência da classe que ocupa a posição privilegiada no processo de

produção.

Concordamos também nessa discussão com Marx, quando aponta que:

“Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem, entre outras coisas, também

a consciência e, por isso pensam; na medida em que dominam enquanto classe e

determinam todo o âmbito de uma época histórica, é evidente que o façam em toda sua

extensão e, conseqüentemente, entre outras coisas, dominem também como pensadores,

como produtores de idéias; que regulem a produção e a distribuição das idéias de seu

tempo e que suas idéias sejam, por isso mesmo, as idéias dominantes da época.”(Marx,

1987, p.72)

3 Conceito utilizado por Marx na obra A Ideologia Alemã para conceituar a existência humana em si.

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As idéias então dessa classe dominante, como acontece em qualquer processo de

desenvolvimento do pensamento, emergem da realidade vivida por essa classe. Das

relações que estabelece no seu cotidiano imediato e da realidade social mais abrangente em

que está inserida, que por sua vez são determinadas pela estrutura econômica construída

historicamente.

Germer aponta que:

“...as idéias (o conhecimento) constituem um reflexo, na mente, da realidade que

circunda o ser humano, isto é, são as expressões mentais dos fenômenos reais. Mas as

idéias não são geradas como reflexos mecânicos na mente de um ser humano passivo e

contemplativo, como o reflexo de um objeto no espelho, mas resultam da atividade

prática do ser humano sobre a realidade circundante.(Germer, 2003, p.64)”

Então as idéias de uma classe que domina outra no que é essencial para a produção

e reprodução da vida não se constituem em meros reflexos da realidade, mas

fundamentalmente “em qualquer época histórica, as classes sociais detentoras de

privilégios têm todo interesse em manter estáveis as relações sociais de seu tempo, sob as

quais garantem tais privilégios. Por conta desse interesse, elaboram, defendem e

consolidam uma visão de mundo que legitima, justifica e explica aquela organização

social.” (Klein, 2005, p.05)

Nessa sociedade então, cindida em classes antagônicas, o aspecto da superestrutura

apontado por Marx no Prefácio à Contribuição à Crítica da Economia Política, como

consciência social, como a forma ideal da sociedade real, aparece na forma de ideologia.

Entendemos que “o termo ‘ideologia’ está em Marx inseparavelmente ligado à necessidade

de esta consciência justificar determinada relação de dominação, e, portanto, de velamento,

inversão e naturalização de relações sociais que marcam o domínio de uma classe sobre

outra” (Iasi, 2002, p. 95).

Ou ainda como nos coloca o próprio Marx, “as idéias dominantes nada mais são

do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, as relações materiais

dominantes concebidas como idéias; portanto, a expressão das relações que tornam uma

classe a classe dominante; portanto, as idéias de sua dominação” (Marx, 1987, p.72).

A consciência social, que constitui o conjunto de idéias e teorias provenientes da

realidade concreta e por tanto reveladoras e aprofundantes dessa mesma realidade, torna-se

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um conjunto de idéias e de teorias que também provém da realidade concreta, mas que

buscam prioritariamente naturalizar, legitimar, preservar e aprofundar a dominação

exercida pela classe hegemônica.

Sendo então, a consciência social formada hegemonicamente pelas teorias da

ideologia da classe dominante, na sociedade capitalista essa ideologia se expressa através

das idéias e valores burgueses. É esse ideário burguês4, de justificação e perpetuação do

sistema social, que permeia a sociedade hegemonicamente como “verdade” construída pelo

seu conjunto e portanto reveladora da realidade.

A classe dominante primeiramente no processo de produção e reprodução da vida,

necessita que essa dominação estenda-se ao terreno da superestrutura da consciência social,

para que a classe dominada, vivendo a realidade concreta e cotidiana, tenha aonde buscar

em “seus” pensamentos as justificativas e respostas para continuarem expropriadas e

mutiladas enquanto seres humanos. E “ao progredir a produção capitalista, desenvolve-se

uma classe trabalhadora que por educação, tradição e costume aceita as exigências

daquele modo de produção como leis naturais evidentes” (Marx, 1988, p.854).

E é nesse cenário de dominação material e ideológica que a classe subjugada no

processo de produção, a classe trabalhadora forma sua primeira forma de consciência, a

alienação (Iasi, 2001). Através de “instituições como a família, como socialização

primária, e outras instituições de socialização secundária, como escola, trabalho, e outras

inserem os indivíduos em relações que são a base sobre a qual eles constituirão suas

concepções de mundo” (Iasi, 2002, p. 108). Essas instituições por sua vez, também estão

imersas dentro das relações capitalistas e portanto, hegemonicamente, às reproduzem.

O trabalhador necessariamente estabelece suas relações, imerso nessa dominação

ideológica, e acaba assumindo como seus os valores construídos pela classe que o domina

e que são valores hegemônicos na sociedade. Essas idéias trazem a ele a sensação de que a

realidade que vive está devidamente explicada, encontram nesses pensamentos explicações

que se por vezes não agradam, justificam sobremaneira as relações às quais está submetido

no seu cotidiano, situando-as como naturais ao seres humanos.

Generalizar uma forma particular de organização da sociedade, e tomá-la como

universal e única, é sentar-se sobre a linha da história do gênero humano. Desconsiderar

4 Podemos resumir esse ideário como sendo os da revolução burguesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Esses valores tidos como “universais” devem estar subordinados às leis capitalistas, de direito à propriedade privada dos meios de produção e à exploração da força de trabalho mediante um salário. Ou seja, por exemplo, na questão da liberdade, os trabalhadores devem ser livres para vender sua força de trabalho para quem quiserem (?) e do outro lado, os burgueses devem ser livres para comprá-la também de quem quiserem. Dessa forma, estão bem colocados os limites da liberdade burguesa.

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seu longo processo de desenvolvimento precedente por um lado e por outro considerar que

essa linha não continua mais sua trajetória de transformações e que, portanto na vida nada

se muda, nem se transforma tudo continua na mesmice que enxergamos por nossa janela.

Ou ainda, como bem argumenta Iasi:

“Esse fato faz com que o indivíduo assuma como sua uma concepção de mundo que se

origina no outro; pode naturalizá-la imaginando, por captar uma relação particular

como se fosse o todo, que sempre foi assim, e portanto sempre será. Desta forma, o

indivíduo constitui uma visão de mundo particularista e apartada do movimento

histórico de sua entificação, por isso podemos chamar essa primeira forma de

consciência, típica de indivíduos novos que se inserem numa sociedade determinada, de

alienação, ou consciência alienada.” (Iasi, 2002, p.112)

Nessa primeira forma de consciência a classe trabalhadora comporta-se então como

a classe ideal à classe dominante, ela está subordinada materialmente e ideologicamente

quase que por completo. Porém, esse ideário burguês que é assimilado de forma

hegemônica como natural, universal e eterno não tem a possibilidade concreta de se tornar

absoluto.

Por ser reflexo da base econômica social o conjunto das idéias burguesas não pode

fugir da contradição inerente a essa base, não pode fugir ao choque constante provocado

pela forma em que se organiza. Nessa base existe um choque irremediável dentro do

sistema capitalista, que também se expressa na realidade imediata dos seres humanos, que

é o choque das relações sociais de produção capitalistas com o desenvolvimento das forças

produtivas.

Como nos aponta Marx nesse trecho:

“Ao chegar a uma determinada fase de desenvolvimento, as forças produtivas materiais

da sociedade se chocam com as relações de produção existentes, ou, o que não é senão a

sua expressão jurídica, com as relações de propriedade dentro das quais se

desenvolverem até ali. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas

relações se convertem em obstáculos a elas” (Marx, 1961).

O desenvolvimento das forças produtivas então, é um processo que, como já

pontuamos, não é linear, mas tende a ser crescente e dentro do sistema capitalista ele

acentua-se constantemente por ser a produção baseada na competição entre os capitalistas

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por consumidores. E nessa sociedade ele chega a um grau de avanço nunca antes visto pela

humanidade, porém as relações sociais de produção, baseadas na propriedade privada dos

meios de produção e na exploração assalariada da força de trabalho, que na época do

rompimento com o sistema feudal, foram impulsionadores de seu desenvolvimento, hoje se

constituem em contendores desse processo.

Essa contradição do processo de produção por sua vez, se expressa diariamente

para a classe trabalhadora, que alienada no processo de trabalho e em conseqüência do

fruto dele, fica com um sentimento ainda não sistematizado de incômodo, de insatisfação

com sua realidade cotidiana. A contradição do sistema não se sistematiza de imediato na

consciência dessa classe, mas antes são sentidas pelas condições de vida a que essa classe

está submetida. O ideário hegemônico começa incomodar por não corresponder com a

realidade vivida por essa classe. A realidade a toda hora fornece elementos concretos que

desmentem partes desse ideário. Nesse sentido Iasi (2001) exemplifica que “alguém, por

exemplo, que acreditasse que trabalhando se consegue tudo o que se quer, mas passa a

viver uma situação onde, apesar de trabalhar muito, não consegue o mínimo para viver,

vivencia uma contradição que pode levá-lo à revolta.” Essa revolta se expressa ainda de

forma individual, esse ser humano situa essa contradição com sua vida pessoal, sofre e

expressa individualmente sua indignação.

Por estar mutilado materialmente da grande maioria das possibilidades de consumo

produzidas pela humanidade, começa a questionar e refletir sobre esse paradoxo castrador.

Esse choque entre o que acredita e o que vive pode se expressar em diversas reflexões

como nos mostra Fernando Pessoa nesse trecho de “Passagem das horas” recolhido do

livro que tem o sugestivo nome de “O Eu profundo e os outros Eus”:

“Não sei se a vida é pouco ou demais prá mim.

Não sei se sinto de mais ou de menos, não sei [...]

Seja o que for, era melhor não ter nascido,

Porque, de tão interessante que é a todos os momentos,

A vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger, [...]

Tenho a alma rachada sob o indicador curvo que lhe toca...

Que há de ser de mim? Que há de ser de mim? (Pessoa, 1980, p.239)”

E mais adiante:

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“Torna-me humano, ó noite, torna-me fraterno e solícito.

Só humanitariamente é que se pode viver.

Só amando os homens, as ações, a banalidade dos trabalhos,

Só assim – ai de mim! - , só assim se pode viver.

Só assim, ó noite, e eu nunca poderei ser assim! (Pessoa, 1980, p.240)”

Essa contradição ainda constitui-se em um problema “seu” e, portanto, encontra

ressonância somente na sua individualidade. Esse é o limite de sua revolta. Agora, esse

sujeito tem possibilidades reais, por desenvolver relações com outros trabalhadores, de

entender que a “sua” contradição, não se limita ao plano individual e sim se estende a um

grupo determinado dessa sociedade. Ao denotar a sua condição primeiramente individual

esse caráter coletivo, ele reúne condições reais de avançar para a segunda forma da

consciência, a consciência de classe em si (Iasi, 2001).

Isso só torna-se possível quando esse indivíduo estabelece relações sociais com

outros indivíduos que sofrem a mesma contradição específica. Portanto, o indivíduo não

fica limitado a uma indignação individual, ele consegue se enxergar no grupo e

conseqüentemente, enxerga essa indignação como sendo não só dele, mas

fundamentalmente ao grupo ao qual pertence. “A injustiça vivida como revolta é

partilhada numa identidade grupal o que possibilita a ação coletiva” (Iasi, 2001).

Essas lutas coletivas circunscrevem-se ainda dentro dos limites do sistema

capitalista, são reivindicatórias. Possuem a percepção de uma das conseqüências das

relações sociais de produção capitalista e se organizam para melhorar as condições desse

fator pontual e específico. No caso, por exemplo, de trabalhadores de uma fábrica que

sentem uma defasagem salarial, insegurança no trabalho e excesso de carga horária, sua

luta centra-se na melhoria dessas condições de trabalho. Possuem então, a consciência de

que formam uma classe e reivindicam melhorias de condições para essa classe. Não

rompem com o capital, pelo contrário nesse confronto com o capital enquanto classe,

acabam por afirmar a necessidade do capital, suas exigências limitam-se a melhorar as

condições de sua exploração dentro dos limites colocados pela outra classe.

Sua consciência agora de classe em si, o leva então a se organizar junto aquela

parcela da sociedade que sofre da mesma mazela que o atinge individualmente, porém suas

lutas consistem basicamente por melhores condições de serem explorados. Essa

consciência pode levá-lo até a entender que esse é um processo que acontece com pessoas

de todo o mundo e não somente ao seu grupo de relações imediatas, porém o que ele não

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consegue compreender ainda é que esse processo somente pode ser rompido com a

superação do modo de produção capitalista.

Existe ainda nesse momento, um sério julgamento moral e valorativo sobre as

causas dos contrastes vividos. As responsabilidades são destinadas e personificadas tanto

em personagens que possuem um modo de vida privilegiado baseado na ostentação quanto

na falta de valores “éticos” e “justos”. Existe um julgamento acentuado nas questões

superestruturais, mas a estrutura econômica permanece inquestionável em seus limites

capitalistas.

Os indivíduos que se encontram nessa fase do processo de consciência de classe,

lutam então reivindicando melhorias setorizadas dentro do contexto social mais amplo.

Porém, nesse processo de lutas esses indivíduos entram em choque mais direto com a

legalidade burguesa e podem perceber seus limites mais claramente. Seja no atendimento

parcial de suas reivindicações ou até completa, esses indivíduos podem entrar em

contradição com essa forma de consciência de classe, pois como não resolveram as

questões estruturais que provocam as contradições vividas, essas contradições imediatas

resolvidas ou parcialmente atendidas ressurgem num processo histórico cíclico com fases

de agudização.

Por exemplo, em no caso anterior de trabalhadores que lutam por melhores

condições de trabalho, mesmo que essas reivindicações sejam atendidas por completo, o

que é raro, a própria lógica do sistema de produção capitalista, centrada no

desenvolvimento tecnológico para diminuição do valor necessário para produção da

mercadoria para entrar na competição intercapitalista do mercado de forma constante,

provocará novamente as mesmas e algumas novas dificuldades nas condições de trabalho.

O que pode levar o trabalhador a entender que enquanto persistir esse modo de produção,

as condições de seu trabalho estão subordinadas e por isso mutiladas à lógica capitalista.

Para superar essa forma de luta reivindicatória e de consciência de classe em si, é

preciso que esses indivíduos superem a compreensão vivida pela personagem do livro “A

Mãe” de Máximo Gorki que, ao acompanhar de perto a luta e a transformação de

consciência de classe de seu filho, em determinado momento de sua fase reivindicatória

“se pôs a pensar nessa ‘causa’ que os homens defendiam, dia após dia, com obstinação e

serenidade. Sentiu-se perante eles como diante de uma montanha à noite” (Gorki, 2000,

p.234).

Chega-se a um ponto desse processo de consciência de classe no qual o

questionamento então se expressa na seguinte formulação feita por outro personagem da

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obra “Ensaio sobre a lucidez” de José Saramago que ao discutir sobre o processo de

manifestação realizada pela população da capital de seu país, expressa: “Nascemos, e

nesse momento é como se tivéssemos firmado um pacto para toda a vida, mas o dia pode

chegar em que nos perguntemos Quem assinou isto por mim” (Saramago, 2004, p.285).

A passagem então dessa forma de consciência de classe em si para a consciência de

classe para si5, revolucionária, depende do entendimento desses indivíduos da necessidade

de se romper com o sistema capitalista de produção em suas leis fundamentais6. Somente

com esse entendimento é que o indivíduo compreende a necessidade de transformação da

sociedade em seu conjunto, propondo-se então a uma tarefa que não se limita somente aos

interesses de sua classe, mas sim que se apresentam enquanto necessidade da própria

sociedade humana.

Ao assumir essa tarefa de rompimento com um sistema que oprime a grande

maioria dos seres humanos, ele coloca para si a tarefa de emancipação não somente de sua

classe, mas de toda a humanidade. Seus interesses e sua luta, pelo lugar que ocupa no

processo de produção dos valores necessários à existência humana, tornam-se valores e

objetivos a serem alcançados pelo conjunto dessa humanidade.

A luta até então reivindicatória vai além desse ponto e torna-se revolucionária. O

que não nos pode levar ao equívoco de imaginar que essa classe agora não utiliza mais as

lutas reivindicatórias como instrumento de sua luta. A diferença é que esses objetivos

imediatos agora estarão coadunados com objetivos históricos de transformação de toda a

sociedade. O que na fase anterior do processo de consciência era um fim em si mesmo,

agora é um meio para o alcance de transformações mais profundas.

Essa consciência revolucionária, assim como todo esse processo, não é linear ou

irreversível. Não há nenhuma “receita infalível” ou “garantia absoluta” de que os

indivíduos avançarão nesse processo naturalmente e que ao avançarem, os mesmos não

voltarão a assumir formas anteriores de consciência. Ter consciência da necessidade da

transformação social não proporciona necessariamente o comprometimento em contribuir

com ela7, porém somente com esse passo isto se torna uma possibilidade.

5 Iasi trabalha muito bem na definição desses termos: “uma consciência de classe em si indicaria uma classe que ainda se define pela sua simples existência no conjunto das relações capitalistas, e no interior destas expressa seus interesses imediatos (ou numa síntese pouco precisa: econômicos); ao passo que uma classe que adquire uma consciência além de sua posição imediata, mas de seu papel histórico para além da ordem estabelecida, assumiria, assim, uma consciência para si.” (O Dilema de Hamlet, 2002, p. 131)6 Propriedade privada dos meios de produção e exploração da força de trabalho mediante um salário.7 Um exemplo aprofundado dessa reversibilidade no processo de consciência de classe encontramos na tese “A mediação particular e genérica da consciência de classe (O Partido dos Trabalhadores entre a negação e o consentimento)”, de Mauro Iasi ao analisar a conformatação paulatina do Partido dos Trabalhadores à ordem capitalista e a conseqüente perda de seu posicionamento contestador dessa mesma ordem.

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Ao chegar nessa fase de contradição e rompimento com a forma de consciência de

classe reinvindicatória, um elemento novo até esse momento torna-se essencial para que

esses indivíduos avancem ainda mais em sua consciência revolucionária, esses

trabalhadores devem apropriar-se da teoria revolucionária (Lênin, 2005c). As contribuições

das relações imediatas que os trabalhadores estabelecem chegam ao seu limite no que diz

respeito ao avanço dessa consciência de classe sem ter como instrumentos aliados o

conhecimento e o aprofundamento teórico. O limite é o entendimento da necessidade de se

romper com o sistema capitalista, mas o que ela não fornece de forma sistematizada é o

porquê dessa necessidade de forma mais aprofundada, para além das relações imediatas, e

o como construir esse rompimento.

O que estamos dizendo então, é que existem graduações de níveis dentro das

mesmas fases, na fase revolucionária do processo de consciência também. Para avançar em

sua consciência de classe que já rompeu, mesmo que ainda de forma não sistematizada,

com os limites da ordem burguesa o trabalhador necessita instrumentalizar-se teoricamente

para que sua luta torne-se cada vez mais calcada na racionalidade e não incisivamente em

juízos valorativos. A transformação da sociedade é essencialmente necessária por

determinações concretas, pelo próprio desenvolvimento da base econômica, e não por

determinações morais ou éticas, mesmo que essas estejam presentes no desenvolvimento

da própria transformação.

Ao traçar uma tendência histórica sobre o processo de acumulação capitalista,

Marx, no capítulo 24 de O Capital, coloca as linhas gerais das necessidades concretas para

a superação das relações capitalistas de produção:

“O modo de produção capitalista de apropriar-se dos bens, decorrente do modo

capitalista de produção, ou seja, a propriedade privada capitalista é a primeira negação

da propriedade privada individual baseada no trabalho próprio. Mas, a produção

capitalista gera sua própria, com a fatalidade de um processo natural. É a negação da

negação. Esta segunda negação não restabelece a propriedade privada, mas a

propriedade individual tendo por fundamento a conquista da era capitalista: a

cooperação e a posse comum do solo e dos meios de produção gerados pelo próprio

trabalho.( Marx, 1988 ,p.881)”

Admitir as necessidades estruturais de superação do modo de produção capitalista,

não significa entender que ela acontecerá naturalmente. Significa principalmente

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reconhecer essa tendência histórica e concreta da superação. Tendo essa tendência como

um dos fatores fundamentais que impulsionam a superação, devemos incluir também que

outro fator essencial é a luta que a classe trabalhadora, portanto, a classe revolucionária

desenvolve para transformar essa tendência em realidade.

E novamente, entendermos que para assumir essa tarefa enquanto classe para si, o

desenvolvimento dessa consciência revolucionária deve ser aprofundada com a

apropriação da teoria revolucionária, a teoria marxiana.

Realizado esse primeiro estudo sobre o processo de desenvolvimento da

consciência de classe da classe trabalhadora e de suas fases, passaremos agora para o

entendimento dele dentro do processo de formação política também dessa classe.

2. 2 – Formação Política na Formação da Consciência de Classe

“Era extraño aquel hombre,o por tal lo tomaron,porque besaba todo

lo que hallaba a su pasoUn día , sin aviso ,

murió aquel hombre extraño ;y muy naturalmente ,

en tierra lo sembraron.En ese mismo instante,

desde el cielo , los pájarosdescubrieron que al mundo

le habían nacido labios.Era extraño aquel hombre...”

(Silvio Rodriguez)

Nessa discussão sobre o processo de formação política, estaremos tentando traçar

os elementos que compõem determinado processo de formação: a formação política da

classe trabalhadora para o desenvolvimento de sua consciência de classe revolucionária,

entendo este como um momento possível do movimento da classe e não como uma

característica inata. Ou seja, como os trabalhadores formam-se politicamente para na luta

de classes na qual estão imersos, conscientes ou inconscientes dela, atuarem na perspectiva

de superação do capitalismo.

Marx em sua obra Contribuição para uma crítica da Economia Política, coloca que

“o homem é, no sentido mais literal, um zoon politikon (animal político); não é

simplesmente um animal social, é também um animal que só na sociedade se pode

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individualizar” (Marx, 2005). Esse fato de considerar o ser humano como um ser

necessariamente político, nos leva a compreensão de que a formação política de todos os

seres humanos se dá justamente nas relações que estabelece com a sociedade. Nessa

relação da sociedade com o indivíduo é que ele relaciona-se com a genericidade de sua

espécie.

Esta sociedade encontra-se determinada, como já dissemos antes, pelas relações

sociais estabelecidas no processo de produção que por sua vez, estão determinadas em

última instância, pelo grau de avanço das forças materiais necessárias à produção da

existência humana. E em nosso caso de análise, o modo de produção capitalista. Essas

relações que os indivíduos estabelecem, possuirão características comuns conforme à

posição que ocupam nesse modo de produção específico e diferentes também, na medida

de suas singularidades.

Relações que primeiramente se constituem nas imediatas, estabelecidas em seu

cotidiano por esse indivíduo e as relações estabelecidas com o conjunto dos produtos

produzidos pela humanidade, que na sociedade capitalista tomam forma de mercadorias.

Claro também fica que as possibilidades e profundidades dessas relações, estão

circunscritas à posição ocupada pelo indivíduo no processo de produção. Delimitação que

não se consiste como absoluta, mas que se torna hegemônica na sociedade.

A classe que pretendemos analisar em seu processo de formação política ocupa um

espaço determinado na produção da existência humana. Expropriados dos meios de

produção, condicionados a vender suas forças de trabalho, alienando-se tanto do processo

quanto do produto de seus trabalhos, a classe trabalhadora que num primeiro momento

encontra-se num grau mais ampliado, em relação a sua classe antagônica, de mutilação

frente às possibilidades humanas de sua época, torna-se também a classe capaz de tomar

para si o processo de libertação do conjunto da humanidade. Justamente por se

encontrarem expropriados dos meios de produção, por serem os produtores das condições

para a existência humana, e por ocupar essa posição fundamental no processo de produção

da vida, a classe trabalhadora constitui-se como a classe revolucionária (Marx, 1988).

Porém, essa classe não se constitui ontologicamente revolucionária como tão pouco

ontologicamente reformista. Para que essa classe venha a desempenhar seu papel histórico

que decorre do modo de produção atual que a genericidade humana construiu durante seu

desenvolvimento, é necessário que ocorra também um processo de desenvolvimento de

uma consciência revolucionária.

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Esse não é o único fator que possibilita uma superação do modo de produção

capitalista, porém sem ele tão pouco essa superação torna-se possível. Vimos no capítulo

anterior o processo pelo qual os trabalhadores podem desenvolver essa consciência de

classe revolucionária de uma forma quase inteiramente “espontâneo, isto é do que existe

'no momento presente' ” (Lênin, 2006b) através das contradições vividas em sua própria

realidade cotidiana circunscrita pelo capitalismo. Esse processo espontâneo, é um elemento

essencial dentro do processo de formação política da classe trabalhadora, porém

permanecendo somente com essa forma, parece-nos que acontece não só uma

simplificação como uma superficialização desse processo de formação. Seria acreditar que

o barco da história vai levar inevitavelmente a classe à revolução.

Podemos dizer que esse barco mais do que leva, traz elementos concretos e

imediatos que servem de base para o desenvolvimento do processo de consciência de

classe, ao mesmo tempo em que traz elementos que justificam a manutenção do sistema

social vigente e que, portanto, atuam como ideologia. Fatores que atuam

contraditoriamente na formação política desses indivíduos.

Como afirmamos anteriormente, ao trabalhar o processo de desenvolvimento da

consciência de classe, as próprias relações sociais capitalistas fornecem subsídios

constantes dos elementos de sua contradição, visíveis principalmente nas desigualdades

sociais provocadas pelo processo de acúmulo de riquezas e sentidas cotidianamente pelo

conjunto dos trabalhadores. O próprio desenvolvimento do capitalismo oferece em

determinadas conjunturas condições objetivas para sua superação, o que Lênin chama de

situação revolucionária8. Momentos históricos em que as contradições inerentes ao sistema

chegam a determinado ponto conjuntural que fazem da revolução uma possibilidade real.

Nesses períodos, decorrentes da combinação e da construção histórica dessas

condições objetivas, ocorrem uma determinada inversão no comportamento dos

trabalhadores “que se deixam pilhar tranquilamente nos períodos ‘pacíficos’, mas que,

num período tempestuoso, são impelidos, tanto pela crise no seu todo como pelas próprias

cúpulas, a uma ação histórica independente.” (Lênin, 2006a).

Condições objetivas que se constituem em três fatores fundamentais: a)

determinada crise política da elite dominante, aonde parte dela percebe a necessidade de

mudanças, mesmo que parciais, no modo de organização da sociedade e a outra continua

8 Como nos coloca Lênin: “Sem essas mudanças objetivas, independentes da vontade de tais ou tais grupos e partidos ou mesmo de tais ou tais classes, a revolução é, de maneira geral, impossível. É o conjunto dessas mudanças objetivas que constitui uma situação revolucionária.” (A Falência da Segunda Internacional, internet).

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na convicção de manutenção da mesma ordem econômica, política e social. Ou seja,

mesmo sendo fundamental “não é suficiente que ‘a base não queira mais’ viver como

antes, mas é importante também que ‘as cúpulas não consigam mais’ viver como antes.”

(Lênin, 2006a); b) as condições sociais da maioria dos trabalhadores chegam a um ponto

de degradação e de acentuamento da miséria extrema que necessariamente os levam a uma

perda da ‘esperança’, ou seja, uma condição social que os façam não esperar mais como

‘cordeiros pacíficos’ da ordem burguesa. Ou ainda como apontou Marx é preciso que a

própria miséria torne-se “consciente de sua miséria espiritual e física, a desumanização

que, consciente de sua desumanização, supera por isso a si mesma” (Marx, 1987) e; c)

esses fatores acima traçados levam à intensificação da mobilização e da ação independente

das massas que procuram intensamente solucionar as contradições extremas às quais estão

submetidas.

Por outro lado, se são necessárias essas condições objetivas construídas pelo

próprio desenvolvimento da história, para que a possibilidade de uma revolução do modo

de produção da sociedade se torne real, somente elas não são capazes de operar essa

transformação. A história fornece situações revolucionárias, porém “nem toda situação

revolucionária tende à revolução” (Lênin, 2006a).

Nesse desenvolvimento ‘espontâneo’ da história, decorrente do próprio

desenvolvimento do modo de produção, do avanço das forças produtivas e do seu choque

com as relações sociais de produção, ocorre também o que chamamos anteriormente de

formação política ‘espontânea’. Essa formação de modo geral, estabelece limitações dentro

da ordem capitalista, atinge um grau avançado de consciência de classe reivindicatória ou

até promove um rompimento com essa forma de consciência chegando à consciência de

classe revolucionária, porém ainda não de forma sistematizada.

Produz uma inconformidade com o sistema capitalista, uma necessidade mais

‘sentida’ do que ‘racionalizada’ de sua superação. É fundamental que esse sentimento, essa

indignação manifestada ainda de forma caótica adquira uma forma mais sistematizada e

ordenada para que atue intencionalmente numa situação revolucionária.

Atentamos agora ao fato de que essa mesma realidade, que oferece determinada

formação política pelo seu próprio desenvolvimento, mantém a classe trabalhadora muito

aquém de suas potencialidades humanas, alijada do acesso de grande parte dos produtos

produzidos pela humanidade, limitando também dessa forma esse processo de formação

política aonde “o 'elemento espontâneo', no fundo, não é senão a forma embrionária do

consciente” (Lênin, 2005c). Deter-se somente a esse processo seria não levar em

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consideração que “todo culto da espontaneidade do movimento operário, toda diminuição

do papel do 'elemento consciente', do papel da social-democracia significa - quer se

queira ou não - um reforço da influência da ideologia burguesa sobre os operários”

(Lênin, 2005c).

Dentre esses produtos temos os conhecimentos historicamente construídos,

possibilitadores de uma compreensão maior sobre a realidade que vivemos e que

contrariamente a uma ideologização da realidade, buscam um aprofundamento da análise

crítica da mesma. A classe trabalhadora encontra-se, amplamente em sua maioria,

expropriada também do acesso desse conhecimento, dentre eles um em especial que é o da

teoria revolucionária.

Porém, esse não é o único fator que deve se combinar ao processo de formação

política ‘espontâneo’ da classe. Lênin ao determinar as condições objetivas de uma

situação revolucionária e de traçar os motivos pelos quais nem toda situação leva

necessariamente à revolução, aponta o seguinte fator:

“... a revolução não surge de toda situação revolucionária, mas somente nos casos em

que, a todas essas mudanças objetivas acima enumeradas, vem juntar-se uma mudança

subjetiva, a saber: a capacidade, no que concerne à classe revolucionária, de conduzir

ações revolucionárias de massas bastante vigorosas para destruir completamente (ou

parcialmente) o velho Governo, que não ‘cairá’ jamais, mesmo em épocas de crises, se

não for forçado a sucumbir”(Lênin, 2006a).

Para a condução dessas ações revolucionárias vigorosas, não basta somente a

vontade de transformar, mesmo sendo ela essencial, é necessário que a classe

revolucionária seja capaz de formular um plano estratégico e tático para a superação do

capitalismo, bem como ser capaz de construir uma organização capaz de aplicá-lo (Lênin,

2006a).

Esse processo de formulação torna-se somente possível com a apropriação da teoria

revolucionária e através da construção de uma organização que seja a expressão política da

classe. De qualquer forma, essa apropriação não se dá de forma absoluta, por todos os

indivíduos da classe.

Esses dois elementos – a teoria e a organização revolucionária – tornam-se

fundamentais para esse salto qualitativo no processo de formação política que pode

contribuir com o desenvolvimento da consciência de classe revolucionária. Nesse sentido,

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Germer aponta o elemento organizativo como fator aglutinador dos outros dois fatores,

como fator que possibilita uma situação revolucionária tender à revolução:

“O partido socialista pretende fundir estes dois movimentos ou correntes em uma

organização, de tal modo que as lutas práticas do proletariado possam ultrapassar os

limites das reivindicações econômicas e das lutas sindicais, meramente paliativas, e

converter-se em um poderoso movimento social de luta por uma nova sociedade livre da

exploração, ou seja, uma sociedade socialista. Constituindo-se deste modo, o partido

socialista realiza, na prática, a união entre a teoria e a prática, indispensável para o

desempenho consistente da missão, que pretende desempenhar, de dirigir as lutas do

proletariado na direção da tomada do poder e da transformação socialista da sociedade,

para que as energias transformadoras, que são ativadas nos momentos de crise e revolta

de massas, não sejam desviadas para objetivos meramente reformistas por intermédio de

lideranças oportunistas.” (Germer, 2006, cd)

Entendemos então que o processo específico, para além do espontâneo, de

formação política por qual essa classe deve passar para desenvolver uma consciência de

classe revolucionária torna a combinação desses três fatores fundamentais. A coadunação

das experiências e das lutas práticas vividas nas relações sociais imediatas estabelecidas

pelos trabalhadores, a sua apropriação da teria revolucionária e a construção de seu

elemento de organização de classe, decorrente de diferentes estágios desses dois processos

anteriores.

Dessa forma, o processo de formação política adquire uma concepção

qualitativamente superior ao traçado anteriormente. Assim como ele ultrapassa os limites

das experiências práticas cotidianas, espontâneas, não se limitando aos aspectos

reivindicatórios trazidos com maior ênfase pelo imediatismo, ele não se refugia no outro

lado da balança, no aprofundamento teórico, isolado da práxis humana, o que o tornaria

puramente ‘escolástico’ (Marx, 1987).

Nesse sentido, Marx aponta a necessidade de se estabelecer a “importância da

atividade ‘revolucionária’, ‘prático-crítica’(Marx, 1987). E mais adiante afirma que “a

questão de saber se cabe ao pensamento humano, uma verdade objetiva não é uma

questão teórica, mas prática. É na práxis que o homem deve demonstrar a verdade, isto é,

a realidade e o poder, o caráter terreno de seu pensamento” (Marx, 1987).

Essa combinação entre a prática e a teoria revolucionária é potencializada dentro de

uma organização também revolucionária. Lênin ao discutir as condições para o

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funcionamento e para a disciplina dentro de um partido revolucionário volta à discussão

desse tema apontando que “sua formação é facilitada por uma acertada teoria

revolucionária que, por sua vez, não é um dogma e só se forma de modo definitivo em

estreita ligação com a experiência prática de um movimento verdadeiramente de massas e

verdadeiramente revolucionário.” (Lênin, 2005a)

Temos então o processo de formação política como um processo não mais

simplesmente espontâneo, mas sim como um processo que demanda ações também

planejadas e formuladas, tendo como base uma teoria revolucionária e como fator

executador uma organização revolucionária. Processo esse que combinado com as

condições objetivas de uma situação revolucionária podem fazer tende-la à revolução.

Lênin ao analisar o processo de formação política da classe trabalhadora russa e de

sua expressão política, nos oferece uma ótima síntese da multiplicidade de fatores que

devem interagir espontânea e intencionalmente para o desenvolvimento da consciência de

classe revolucionária. Diz ele:

“Se o bolchevismo pôde elaborar e levar à prática com êxito, nos anos de 1917/1920, em

condições de inaudita gravidade, a mais rigorosa centralização e uma disciplina férrea,

deve-se simplesmente a uma série de particularidades históricas da Rússia. De um lado,

o bolchevismo surgiu em 1903, fundamentado na mais sólida base da teoria do

marxismo. E a justeza dessa teoria revolucionária - e de nenhuma outra - foi

demonstrada tanto pela experiência internacional de todo o século XIX como, em

particular, pela experiência dos desvios, vacilações, erros e desilusões do pensamento

revolucionário na Rússia. [...] A Rússia tornou sua a única teoria revolucionária justa, o

marxismo, em meio século de torturas e sacrifícios extraordinários, de heroísmo

revolucionário nunca visto, de incrível energia e abnegada pesquisa, de estudo, de

experimentação na prática, de desilusões, de comprovação, de comparação com a

experiência da Europa.” (Lênin, 2005a)

E mais adiante complementa:

“Por outro lado, o bolchevismo, surgido sobre essa granítica base teórica, teve uma

história prática de quinze anos (1903/1917) sem paralelo no mundo, em virtude de sua

riqueza de experiências. Nenhum país, no decurso desses quinze anos, passou, nem ao

menos aproximadamente, por uma experiência revolucionária tão rica, uma rapidez e

uma variedade semelhantes na sucessão das diversas formas do movimento, legal e

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ilegal, pacífico e tumultuoso, clandestino e declarado, de propaganda nos círculos e

entre as massas, parlamentar e terrorista. Em nenhum país esteve concentrada, em tão

curto espaço de tempo, semelhante variedade de formas, de matizes, de métodos de luta,

de todas as clames da sociedade contemporânea, luta que, além disso, em conseqüência

do atraso do país e da opressão do jugo czarista, amadurecia com singular rapidez e

assimilava com particular sofreguidão e eficiência a "última palavra" da experiência

política americana e européia.” (Lênin, 2005a)

Através desse processo de formação política, que para atingir esse grau de avanço

na formação da consciência de classe revolucionária, deve passar pela combinação da

prática, da teoria e da organização revolucionária, torna-se possível então que diante de

uma situação revolucionária, a classe trabalhadora possa atuar de acordo com seu papel

histórico de emancipação da sociedade.

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PARTE II

3. HISTÓRICO DO ESPAÇO MARX/UFPR: CAMINHOS QUE LEVAM A SUA

ORIGEM

O espaço Marx foi fundado em 1999, por um grupo de mestrandos em educação do

Programa de Pós-graduação da UFPR, pela professora Lígia Klein, vinculada a esse

programa e pelo professor do Departamento de Economia da mesma instituição Claus

Germer. O que levou esse grupo a se reunir e a pensar em formar um grupo de estudo

sobre a teoria marxiana? Que caminhos em comum foram percorridos por essas pessoas

que produziram essa necessidade? Essa é uma história que começa a ser contada.

O primeiro fato que nos chama atenção, na entrevista com os fundadores do espaço

é que todos os que participaram dessa construção atuavam enquanto militantes socialistas,

ou seja, eles estavam vinculados a alguma organização que se propunha não somente a

lutas reivindicatórias ou econômicas na terminologia utilizada por Lênin em O que fazer,

mas que empreendiam uma luta pela superação do modo de produção capitalista e

construção de uma sociedade socialista.

Há muito já haviam superado a fase da consciência reivindicatória e em sua

consciência revolucionária, construída através de suas histórias, de seus processos

específicos de formação política, procuravam aprofundar seu entendimento não só da

sociedade capitalista, mas fundamentalmente da teoria socialista de superação desse

modelo.

A maioria dos fundadores era vinculada ao Partido dos Trabalhadores (PT), que

embora já nessa época não se colocasse mais como contrário ao sistema capitalista e nem

propusesse a sua superação9, possuía em sua composição, correntes internas pertencentes

ao denominado campo da esquerda do PT. Estas correntes defendiam abertamente, em seus

programas e em suas deliberações de encontros e congressos, o socialismo e a via

revolucionária como estratégia de sua viabilização. A esse campo é que majoritariamente o

grupo de fundadores estava vinculado ou próximo. Também um de seus fundadores era

militante do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU).9 Como nos aponta Iasi analisando as resoluções do 10o. Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores (1995): “o centro do argumento refere-se à necessidade de uma reelaboração da ‘estratégia de poder’ do partido para que fosse possível um novo projeto para a ‘sociedade brasileira’, um projeto ‘alternativo ao neoliberalismo’ que fosse capaz de articular ‘amplas forças sociais’. O que fica evidente, e na seqüência se torna explícito, é que esta reelaboração se dá no sentido de um projeto claramente fundado na moderação do programa e na ampliação do leque de alianças, assim como o caráter ‘socialista’ da meta é substituído por um projeto ‘nacional’ de desenvolvimento” (p.417). Iasi, Mauro. A mediação particular e genérica da consciência de classe (O Partido dos Trabalhadores entre a negação e o consentimento)

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Desse primeiro retrato, pode-se constatar que todos os fundadores da proposta do

Espaço Marx eram militantes socialistas que, por boa parte de suas histórias vinham se

dedicando à construção, mesmo que com diferenças programáticas, estratégicas e/ou

táticas, de um processo de superação da sociedade capitalista e construção do socialismo.

Através então da experiência das relações sociais imediatas e das lutas práticas, de

determinado aprofundamento teórico e da construção de uma organização, que mesmo com

suas limitações, constituía-se enquanto expressão política da classe, foram construindo sua

consciência de classe revolucionária.

Porém, esse fator político-partidário não é o único em comum e relevante a

considerarmos dessa história. Sendo todos militantes socialistas, e de uma trajetória, à

época do início do espaço, de militância que variava entre 15 a 30 anos de militância, o que

os leva depois de tanto tempo de luta, de disputas em sindicatos, partidos, de estudos

realizados, mesmo que individualmente, da teoria marxiana, a sentir a necessidade de

constituir um grupo de fundamentação dessa teoria? Aqui a resposta possui dois caminhos

que levam à constituição do Espaço Marx.

O primeiro é um fato apontado por todos: a inconsistência de suas fundamentações

teóricas. Uma fragilidade de estudo e de conseqüente compreensão da teoria marxiana. Ou

seja, apesar de todos os anos de militância e de estudos contidos nos membros desse grupo,

houve uma constatação paulatina durante essa história de um desconhecimento acentuado

da teoria marxiana, de seus fundamentos e método. Constatou-se que a grande maioria não

só dos fundadores do espaço Marx, mas dos companheiros com os quais militavam e dos

críticos da teoria marxiana dominavam-na com visível superficialidade, o que fazia por

muitas vezes, que as discussões e debates ficassem baseados em argumentos rudimentares

e beirando a impressões do conteúdo.

Durante as suas trajetórias de militância isso vinha sendo constatado, o que gerou

por parte desses militantes uma primeira tentativa de formação de um grupo de estudo em

1995. Nessa primeira tentativa, também o foco das discussões era a teoria marxiana,

porém, ainda muito imbuídos de um ativismo político, de “carregar o piano”, abriram mão

desse espaço em detrimento de demandas mais imediatas e concretas, principalmente as

eleições municipais e estaduais de 1996 e as eleições internas do Partido dos

Trabalhadores. Assim o que era um dos elementos prioritários, apontados sempre em suas

análises ou balanços sobre a organização da militância, a fundamentação teórica, ficou

destinada novamente ao ostracismo.

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Essa experiência, apesar de sua impressão negativa, fez parte do processo de

amadurecimento desse grupo, na medida em que produziu mais um saldo reflexivo sobre

como os militantes socialistas em geral, inclusive eles mesmos, acabavam por relegar a

fundamentação teórica a um plano secundário, uma atividade política que podia esperar

“épocas mais calmas”. Embora em todas as suas colocações e deliberações de congressos e

encontros situasse a fundamentação teórica enquanto aspecto fundamental para a

orientação de suas práticas.

Outro aspecto significativo, também desse período onde o grupo dedicou maior

tempo às demandas imediatas e pontuais, foi a compreensão mais clara da inflexão à

direita da organização na qual a maioria militava, qual seja, o Partido dos Trabalhadores.

Inflexão essa, não casual ou inovadora, mas sim já experimentada pelos partidos socialistas

europeus, cuja experiência encontra significativa análise no livro de Adam Przeworski “O

capitalismo e a social-democracia10”.

O embate travado nas instâncias do partido e as conseqüentes deliberações e

encaminhamentos pelos campos majoritários tanto das forças políticas do campo da

esquerda quanto do partido em geral, faz com que esse grupo sinta, mais uma vez, a

necessidade de se aprofundar teoricamente para compreender a conjuntura pela qual estão

passando e concomitantemente para aprofundar a teoria marxiana que acreditavam, devia

ser a base de suas ações e formulações.

Se é verdade que em tempos de crise a humanidade é levada a refletir sobre si

mesma, podemos constatar que para essa pequena parcela da humanidade a crise pela qual

passavam a maioria desses militantes não era pequena, portanto sua necessidade de

reflexão também se expandia. O instrumento de ação e formulação política pelo qual

militaram nas décadas de 80 e 90 já não estava correspondendo as suas convicções

políticas. Porquê? Existiam contradições internas que demonstravam uma inflexão de

princípios socialistas no sentido de se limitar a uma reivindicação de humanização dentro

do próprio capitalismo. O que explicava tais contradições e tamanha inflexão? Algo que,

longe de ser o motivo central, mas que saltava aos olhos de todos esses militantes era a

superficialidade com que se tratavam os debates internos, programáticos e de concepção de

sociedade.

O pragmatismo eleitoral coadunado com a adoção da política de resultados,

denotava nas falas inclusive dos dirigentes mais expressivos, um profundo abandono da 10 Nessa obra o autor analisa a história em comum dos partidos socialistas europeus que optaram pela priorização da via eleitoral enquanto via para a tomada do poder de estado, sua conseqüente adequação aos limites do estado burguês e abandono da luta pela construção do socialismo.

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teoria marxiana, que se não tinha sido em nenhum momento pautada nas resoluções e

deliberações partidárias, permeava aberta e/ou implicitamente as falas, documentos e

materiais impressos internos do partido ao se assumir como objetivo estratégico o

socialismo11.

Então, se por um lado essa inflexão de princípios socialistas estava cada vez mais

sendo assumido pelos campos majoritários, repetimos não só do partido em geral, mas das

correntes que se colocavam à esquerda, do outro lado, nos campos minoritários, havia

também um abandono dessa fundamentação teórica. Fato este que impossibilitava

intervenções mais qualificadas nos debates que, se por sua vez não mudariam os rumos que

estavam sendo adotados, pelo menos conformaria um campo mais nítido e aprofundado

das diferenças e divergências de concepção de organização e atuação do e no partido.

Diferenças que já ultrapassam o limite de táticas adotadas para o alcance do objetivo

estratégico ou do embate mais clássico sobre a via estratégica12, e que se colocavam

fundamentalmente na mudança desse próprio objetivo.

Claro está também, que não foi simplesmente ou principalmente a falta de

fundamentação da teoria marxiana para que tanto as inflexões dos princípios socialistas

como a falta de oposições mais organizadas que alterassem a correlação de forças perante

essas inflexões ocorressem. Não cabe aqui fazer essa análise de forma mais profunda, mas

somente deixar indicado a existência de todo um cenário de desenvolvimento econômico

do sistema capitalista, de reestruturação produtiva e de adoção do neoliberalismo como

saída da crise de superprodução do final da década de 70, que corroborou para um

aprofundamento da correlação de forças desfavorável do trabalho perante o capital. E

também de uma reconfiguração da correlação de forças internacionalmente estabelecida e

desfavorável aos socialistas do mundo inteiro, pela derrocada do bloco socialista do leste

europeu e pelas conseqüentes denúncias de crimes e da situação deixada pelo antigo

regime na então União Soviética13. O que em última análise, constituem elementos que

11 Como fica claro nesse trecho do discurso de Lula na 1a. Convenção Nacional do PT em agosto de 1981: “Nós, do PT, sabemos que o mundo caminha para o socialismo. Os trabalhadores que tomaram a iniciativa histórica de propor a criação do PT já sabiam disto muito antes de terem sequer a idéia da necessidade de um Partido. (...) Os trabalhadores são os maiores explorados da sociedade atual. Por isso sentimos na própria carne e queremos, com todas as forças, uma sociedade que, como diz, o nosso programa, terá que ser uma sociedade sem exploradores. Que sociedade é esta senão uma sociedade socialista?” In: Iasi, Mauro. A mediação particular e genérica da consciência de classe (O Partido dos Trabalhadores entre a negação e o consentimento), p. 313.12 Nos referimos ao debate sobre reforma ou revolução, que os militantes socialistas vem pautando de longa data, mais acentuadamente após a II Internacional.

13 Anderson, Perry. In: GENTILI, P.; SADER, E. Pós-neoliberalismo: As políticas sociais e o Estado democrático. São paulo, Paz e Terra, 4ª edição, 1998.

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agiram mais determinantemente na conformação das ações da esquerda brasileira

hegemonicamente, no seu abandono paulatino do socialismo como objetivo estratégico do

que somente a carência de fundamentação teórica.

Enfatizamos esse ponto, o da fundamentação teórica, em nosso trabalho, por ser um

importante fator dentro de um processo de formação política para o desenvolvimento de

uma consciência de classe revolucionária e também por ser o objeto de concentração de

nossos esforços. Mas, não ignoramos o fato de que a falta desse elemento, por parte da

militância socialista tem, além de uma opção política realizada pela esquerda brasileira de

forma majoritária, toda uma base material nas relações sociais de produção que atingem

determinantemente as expressões políticas de sua época. Determinações não absolutas, mas

que é a base de onde emergem essas expressões políticas, no caso específico o PT, e que

conforme o momento desse desenvolvimento estrutural, determinam, em última análise,

suas possibilidades históricas. Ou seja, construir uma revolução socialista não depende

somente do fator subjetivo, mas sim da combinação desse fator subjetivo com fatores

objetivos fornecidos pelo próprio desenvolvimento da história14.

Portanto, a fundamentação de uma teoria científica revolucionária, em nosso caso a

teoria marxiana, é parte importante desse processo, porém parte interdependente de outros

processos, tanto conjunturais como estruturais. “Sem teoria revolucionária, não há

movimento revolucionário”, nos diria Lênin em O Que Fazer.

O que estava colocado então para esses militantes era a necessidade de um

aprofundamento da teoria na qual acreditavam serem baseadas suas ações, para melhor

compreendê-las, reformulá-las e elaborar outras, calcadas mais firmemente em uma

fundamentação. Se por um lado, foi na militância, principalmente dentro de uma

organização partidária que essa necessidade foi se constatando e delineando, não foi nessa

instância que ela se concretizou. O surgimento do espaço Marx não foi uma deliberação a

priori de uma corrente pertencente ao PT e muito menos do partido em geral. Ele somente

concretizou-se quando esta constatação e a necessidade de aprofundamento teórico

esbarrou na dificuldade de elaboração e discussão teórica por parte desses militantes em

outro espaço, nesse caso, em suas relações sociais imediatas, no desenvolvimento de suas

dissertações de mestrado e no embate dentro da academia com agrupamentos que se

contrapunham à teoria marxiana.

Esse é o segundo caminho que leva à constituição do Espaço Marx da UFPR, a

necessidade acadêmica, uma forma de aprofundamento teórico que não está

14 Lênin, O Oportunismo e a Falência da Segunda Internacional.

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necessariamente ligada à militância. Por estarem a grande maioria em um momento de

qualificação acadêmica, um programa de pós-graduação em Educação, seja como

educando ou educador, decorrente da posição que ocupam no processo de produção,

acabam por convergir a necessidade de aprofundamento teórico tanto pela necessidade

imediata, cotidiana como pela necessidade construída durante seus anos de militância

político-partidária.

Essa necessidade dentro do meio acadêmico por sua vez, delineou-se no decorrer da

disciplina ministrada pela professora Lígia Klein, a qual os fundadores com exceção do

professor Claus Germer, cursavam. Nessa disciplina, com a discussão de textos marxistas e

com o debate com outros colegas de mestrado e com outros professores, percebeu-se que

na academia também havia uma fragilidade tanto por parte dos defensores quanto dos

opositores da teoria marxiana em relação ao seu conhecimento aprofundado. Críticas e

defesas que segundo a professora Lígia Klein, “apresentavam somente rudimentos da

teoria” e empobreciam a discussão ao invés de elevá-la.

Ou seja, apesar de todos os fundadores já estarem constatando essa falta de

fundamentação mais aprofundada sobre a teoria marxiana, ao longo de suas histórias de

militância, somente no momento em que se encontra em um processo mais específico de

elaboração teórica, um “curso de mestrado” é que o grupo decide formar um espaço

sistemático de discussão sobre essa teoria. Ou seja, quando essa necessidade se torna mais

concreta e imediata, pois sem satisfazê-la outras ações concretas e imediatas se tornam

impossibilitadas, no caso principalmente a elaboração de suas dissertações e da construção

de posicionamentos mais qualificados nas discussões com outras perspectivas teóricas.

Esses dois caminhos, que não se constituem enquanto paralelos, mas ao contrário

possuem vários momentos de interfaces vivenciados pelos fundadores, fazem com que a

origem do Espaço Marx da UFPR surja de uma necessidade de duplo caráter, que não

necessariamente são excludentes ou divergentes: o da militância político-partidária e o da

elaboração acadêmica, uma forma de fundamentação teórica, caminhos constitutivos da

história desses militantes.

3.1 - Antes de Espaço Marx, Florestan Fernandes

Nos referimos até aqui, ao espaço de fundamentação teórica construído por esses

militantes como Espaço Marx, mas temos que lembrar que sua primeira denominação foi

Grupo de Estudos Florestan Fernandes (GEFF). Essa idéia parte dos fundadores como

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forma de propor na própria nomenclatura, a necessidade do estudo também de marxistas

contemporâneos. Esse grupo então lança, no segundo semestre de 1996, um folder de

divulgação do espaço aonde um dos pontos expostos procura conceituar no que consiste

esse grupo:

“O Grupo de Estudos Florestan Fernandes, organizado por alunos do Mestrado

em educação da UFPR, é um espaço aberto à comunidade, que objetiva desenvolver

estudos sobre a Teoria Marxiana e as Tendências Marxistas contemporâneas. Pretende

constituir-se como um ponto de convergência pluralista, aberto e unitário de entidades,

movimentos políticos e sociais e de todas as pessoas que se identificam com a teoria e as

propostas de Marx, reivindicando sua atualidade e validade na luta pela supressão das

relações capitalistas de produção e por uma nova ordem social em que o livre

desenvolvimento de cada um seja a condição para o livre desenvolvimento de todos.

Para tanto, atuará como um espaço de reflexão, debate e intercâmbio, na perspectiva da

geração de iniciativas e propostas.”(GEFF, material impresso)

Analisando o conteúdo expresso nessa passagem, fica claro que esse é um espaço

que procura alcançar aqueles que já romperam ou estão em fase de rompimento com a

consciência de classe reivindicatória. Isso fica evidenciado no momento em que se começa

a delinear os objetivos gerais, aonde se adota desde o princípio a teoria marxiana como o

objeto de estudo e quando se identifica para quem esse espaço é construído: “todas as

pessoas que se identificam” com a “luta pela supressão das relações capitalistas de

produção”. Propõe-se a realizar um trabalho de base então, de fundamentação teórica, com

aqueles que já estão nessa fase de amadurecimento do processo de formação política.

Colocado esse parâmetro de público a ser atingido, percebemos nesse texto ainda,

uma acentuada ênfase no aspecto “aberto” do espaço, como um lugar onde os militantes

socialistas independentemente de qual organização estivessem vinculados ou ainda que não

possuíssem essa vinculação com nenhuma organização, pudessem debater sobre a teoria

marxiana e sobre o marxismo contemporâneo. Aqui teríamos então, a proposição de uma

espécie de campo de discussão e fundamentação teórica aberto, aonde militantes socialistas

independente das diferenças táticas e/ou estratégicas das organizações nas quais militavam

ou ainda mesmo na ausência dessa militância, pudessem debater as questões teóricas

marxianas de fundo.

Somam-se a esses aspectos o leque amplo de ações a que esse grupo se propõe e

que nesse texto ainda aparecem de maneira imprecisa, focando somente aspectos gerais

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como “espaço de reflexão, debate e intercâmbio, na perspectiva da geração de iniciativas e

propostas”, mas que no ponto seguinte do folder, que definem os objetivos se especificam

e se ampliam:

“Promover: a) estudo da obra marxiana (fundamentalmente O Capital) e a

produção marxista contemporânea; b) a difusão das idéias marxianas; c) a divulgação

de informações do mundo inteiro relacionadas com o marxismo; d) o debate e a

discussão de idéias e pontos de vista e a reflexão na busca de novas propostas e

estratégias e a troca de experiências; e) a ação unitária de todas as forças políticas e

sociais comprometidas com a transformação da sociedade.” (GEFF, material impresso)

Ao traçar seus objetivos o grupo, ainda então Florestan Fernandes, reivindica como

suas ações, não só o estudo da teoria marxiana, como a difusão e divulgação dessas idéias e

pretende formular “propostas e estratégias”, mas não indica sobre e/ou para quê. Em

conversa com os fundadores eles apontam que seria sobre as estratégias e propostas

socialistas para a contemporaneidade, mas também têm dificuldade de sinalizar como isso

funcionaria. Essa dificuldade nos remete ao próprio caráter de constituição do grupo, um

“espaço aberto” a todos militantes socialistas para seu aprofundamento teórico. A

proposição de formular estratégias e propostas nos parece mais vinculada à militância

desenvolvida por estes militantes, em suas organizações, o que dificultaria sua realização

dentro de um espaço eminentemente “plural” com militantes que possuíam como já

dissemos divergências táticas e/ou estratégicas e que por isso não militavam em uma

mesma organização.

Relembrando Lênin (2005c) e Germer (2006) o partido é o fator aglutinador das

experiências práticas e da fundamentação teórica, nele é que se encontra a possibilidade

mais concreta de se formular e executar a luta socialista. Por exemplo, se pegarmos

grandes teóricos marxistas veremos que a grande maioria de suas formulações políticas de

elaboração estratégicas estava diretamente ligada aos papéis que desempenhavam em seus

partidos e às necessidades das lutas a que eles se impunham15.

Outro ponto que nos chama muito a atenção principalmente por sua generalidade é

o de promover uma “ação unitária de todas as forças políticas e sociais comprometidas

com a transformação da sociedade”. Aqui parece transparecer ainda a necessidade, ainda 15 Como por exemplo, Marx e Engels “Mensagem do Comitê Central à Liga dos Comunistas”; Marx “Crítica ao Programa de Gotha”; Lênin “O que fazer?”, “Esquerdismo, doença infantil do comunismo”, “Estado e Revolução”; Rosa Luxemburgo “Reforma ou Revolução”.

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que não sistematizada desse grupo, de fazer com que esse espaço eminentemente de

aprofundamento de seus estudos, mesmo não sendo este descolado de suas ações, se

transforme em um espaço de articulação prática da luta travada pelos socialistas na

atualidade.

Esse objetivo, ainda mais que o anterior, toma para si uma das funções principais de

um partido revolucionário:

“essa ampla agitação política será conduzida por um partido unindo em um todo

coerente a ofensiva contra o governo, em nome de todo o povo, da educação

revolucionária do proletariado, salvaguardando, ao mesmo tempo, sua independência

política, a direção da luta econômica da classe operária, a utilização de seus conflitos

espontâneos com seus exploradores, conflitos que levantam e conduzem sem cessar, para

o nosso campo, novas camadas do Proletariado!” (Lênin, 2005c)

O que nos parece essencialmente um reflexo da necessidade desses militantes de

buscarem respostas às crises de suas organizações, mesmo que fora delas, do que da

intenção de substituir ou de construir uma outra organização a partir do grupo de estudos.

Para iniciar esse trabalho de discussão e aprofundamento teórico, mesmo com todas

estas outras variantes mais gerais de ações e objetivos, o grupo propõe um encontro

introdutório sobre o marxismo que teria como texto a ser debatido “Considerações sobre o

Marxismo Ocidental”, de Perry Anderson (1989). E no próximo encontro, o início do

estudo de O Capital de Marx, discutindo-se a mercadoria e teoria de valor, tendo ainda

como texto de apoio “Teoria Marxista do Valor” de Isaac Rubin (1980).

O saldo desse estudo inicial foi a percepção da necessidade de mais e de outros

elementos teóricos para iniciar a discussão de O Capital e para além disso que deveriam

antes de ler e debater textos de marxistas contemporâneos, buscar os elementos centrais da

teoria marxiana no próprio Marx, em outras obras do autor, que pudessem permitir uma

aproximação mais exata ao seu pensamento. Começa a sair de cena então Florestan

Fernandes.

Durante as discussões e encaminhamentos posteriores os fundadores começam a

redesenhar esse espaço de estudo, desde seu nome até objetivos, metodologia e

bibliografia. Porém, não sistematizaram esse redirecionamento em nenhum documento, o

que nos leva a dialogar novamente com o relato dos fundadores.

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O que é apontado como central para essas mudanças, é a dificuldade de debater o

marxismo, ou melhor, “os marxismos”, por exemplo, o marxismo ocidental na

contemporaneidade sem dominar as categorias centrais do pensamento marxiano. O grupo

então, enfatiza ainda mais o aspecto ortodoxo da formação proposta, no sentido em que

prioriza o estudo de Marx no próprio Marx.

Essa priorização de redefinir com maior aprofundamento o caminho a ser tomado

para o trabalho de fundamentação teórica, reforça esse como objetivo principal da

constituição do grupo, fazendo com que as outras variantes expressas no primeiro folder de

elaboração sobre o grupo fiquem em segundo plano.

A mudança na bibliografia a ser estudada, vem acompanhada de mudanças na

metodologia, nos objetivos e na nomenclatura, que serão abordadas nos pontos seguintes.

Os dois primeiros no tópico A Definição da Metodologia Inicial e o terceiro no ponto a

seguir.

3.2 - Espaço Marx, porquê?

À primeira vista essa pergunta nos parece uma tautologia, pois se o que esses

militantes pretendiam era o estudo da teoria marxiana, nada mais coerente do que

denomina-lo pelo nome do autor que a elaborou. Essa explicação evidentemente constitui

um dos motivos principais da denominação, porém não é a única. Devemos atentar

também ao fato da priorização do aspecto ortodoxo da formação teórica, estudar Marx pelo

próprio Marx em detrimento da intenção inicial de trazer para o debate e estudo marxistas

mais contemporâneos. Portanto, não acontece somente uma mudança simples de

nomenclatura, essa mudança traz em si, uma mudança significativa do conteúdo a ser

priorizado pelo desenvolvimento do grupo.

Outra explicação apontada também como importante foi o fato de que no ano de

1998 realizou-se o Encontro Internacional de Paris para comemorar os 150 anos do

Manifesto Comunista, publicado primeiramente em 1948.

Esse encontro foi estruturado por uma organização francesa chamada Espaços

Marx, subsidiada por “um grupo de quase duzentos intelectuais e lideranças políticas

sindicais de diferentes concepções e sensibilidades, formou-se uma rede de comitês

nacionais, de modo geral não-governamentais e apartidários, que atingiu todos os

continentes: 16 na África, 10 na América Latina, 2 na América do Norte, 11 na Ásia, 23 na

Europa e 3 na Oceania.” (Filho, 2005)

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Esse encontro contou com a participação de cerca de 1500 pessoas provenientes de

mais de 60 países, com mesas de debates e apresentações de trabalhos que abrangiam

principalmente uma leitura contemporânea sobre o sistema capitalista e discussão de

possíveis alternativas marxistas para esse sistema.

Dentre as questões mais significativas abordadas no encontro nos valemos do relato

do professor de história contemporânea Daniel Aarão Reis Filho, da Universidade Federal

Fluminense (UFF), um dos 60 participantes brasileiros:

“...o elenco impressionante de desafios: a conjugação da proposta internacionalista, única

alternativa à globalização atualmente em curso, com o respeito pelas particularidades regionais e

nacionais. A investigação sobre a configuração do político numa sociedade socialista. A

reabilitação da utopia como invenção, mas ancorada no cotidiano vivido pelos comuns dos

mortais. As metamorfoses do trabalho (o capitalismo enterrou seus coveiros?), as incertezas do

progresso, os desafios ecológicos, a chamada exclusão de parcelas crescentes da humanidade dos

benefícios possíveis da nossa época (visto de um outro ângulo, não seria esta uma forma,

perversa, é verdade, de inclusão destas parcelas?).”

Sendo que a deliberação concreta e consensual desse encontro foi a de estimular e

de criar espaços de discussão sobre a teoria marxista nos países participantes do encontro,

os Espaços Marx, como forma de solidificar esse espaço comum de discussão para

possíveis encontros posteriores e de fomentar o debate da teoria marxista com as questões

colocadas aos socialistas da atualidade. Fortalecendo dessa forma, a construção de uma

associação entre os Espaços Marx mundialmente.

Percebemos através desse depoimento que uma questão em especial refletida no

folder inicial do grupo de estudos àquela época denominado Florestan Fernandes, aparece

também nesse encontro mundial: a necessidade de se formular uma ação conjunta, nesse

caso internacional, para superação do modo capitalista de produção. Através de grupos de

estudos que debaterão e formularão propostas sobre diversos temas? Temos nesse espaço,

uma pluralidade ainda maior de objetivos.

Ressaltamos que esse encontro constituiu-se de grande importância na medida em

que proporcionou um espaço com significativa representação mundial de socialistas para

debates sobre problemas com os quais nos defrontamos. Porém, vemos que esse espaço

refletiu também um momento, que perdura e se aprofundou até atualmente, a partir da

degeneração das organizações socialistas partidárias ocorrida primeiramente na Europa16.16 Adam Przeworski, O capitalismo e a social-democracia.

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Processo esse que faz com que funções do partido revolucionário dentre elas a

principal, como já apontamos, de aglutinador das lutas socialistas, diluam-se em outros

espaços, mais fragmentados e específicos, como principalmente movimentos sociais de

área e em menor escala em grupos de estudos ou de elaboração simplesmente intelectual.

A contribuição que prevaleceu concretamente deste encontro foi a fomentação dos

grupos de estudos. Tendo em vista esse fato, os fundadores do Espaço Marx da UFPR,

optaram por essa denominação para o seu grupo de fundamentação teórica, também com a

intenção de poder começar a se relacionar com esses outros e precursores Espaços Marx de

forma sistemática.

Esta possível inter-relação debate com outros espaços de diferentes perspectivas e

localidades, participação de um movimento de nível mundial de discussão da teoria

marxista, objetivo também traçado inicialmente, foram juntamente com os da teoria

fundante e do caráter privilegiado da ortodoxia na formação, objetivos centrais da

denominação do grupo.

3.3 - O vínculo com a instituição UFPR

Outro fator importante levantado pelos fundadores nesse início é sobre o vínculo

que o Espaço Marx manteria com a instituição UFPR. A decisão tomada foi a de se ter uma

vinculação com o programa de pós-graduação do setor de educação da UFPR, porém não

uma vinculação formalizada. Optou-se então em se vincular o Espaço Marx como um

grupo de estudo do Programa de Pós-Graduação da instituição, porém optou-se também

em não se formalizar essa vinculação. Na utilização do espaço físico institucional e da

produção científica, reivindica-se o Espaço Marx como um espaço da instituição.

Os motivos que levaram a esse encaminhamento se tornam bem claros no

depoimento da fundadora Lígia Klein, professora do programa de pós-graduação “nós não

fizemos o atrelamento administrativo à instituição, por várias razões, primeiro porque no

momento em que ele se institucionaliza, adquire o formato da instituição e nós tínhamos

medo que isso pudesse levar em desvios da finalidade original”. Outro ponto importante

citado pela mesma fundadora é de que o objetivo do Espaço Marx era o de atrair militantes

socialistas e não pessoas que viessem “atrás de carga horária, para receber certificados ou

créditos”, mas sim de atrair pessoas que quisessem “aprender rigorosamente o marxismo

porque isso é um instrumento que orienta minha ação prática”.

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Essa decisão aparentemente simples acarreta algumas conseqüências importantes,

não formalizar essa vinculação garante a autonomia de organização e funcionamento do

Espaço Marx frente não somente à instituição como às políticas públicas implementadas

paulatinamente no Brasil. Em nosso caso de análise especialmente na área da Educação e

Pesquisa Científica, que resumidamente baseou-se em uma constante diminuição dos

recursos financeiros aplicados nessas áreas e em uma aplicação da lógica empresarial de

produtividade ao Ensino Superior de forma geral bem como aos seus programas de pós-

graduação e pesquisa científica.

Se isto torna-se possível com essa autonomia, por outro lado percebe-se que esse

fato não permite a esse espaço maiores possibilidades de reivindicar direitos que outros

grupos vinculados formalmente à instituição possuem, no que tange principalmente a

questão de recursos financeiros para seu funcionamento ou para eventos mais amplos que

sejam necessários realizar.

Essa opção inicial já demonstra também a opção por uma não institucionalização

burocrática ou demasiadamente acadêmica que vai se acentuar no decorrer dos anos.

3.4 - A Definição da Metodologia Inicial

Com a definição de se formar um grupo de estudos que debatesse com

profundidade a teoria marxiana já elaborada, as questões que aparecem é por onde e como

começar? Qual a obra de Marx ou tema por ele abordado que deve iniciar a discussão?

Estudar todas, algumas ou uma obra? Como esse grupo vai funcionar, qual a metodologia

que se vai utilizar para que o objetivo central de fundamentação teórica se alcance?

Com relação às obras ou temas o grupo fundador tinha um consenso, O Capital

deveria ser a obra central a ser estudada, por ser a obra na opinião de todos que mais

possibilitava esse aprofundamento da teoria marxiana. Porém, mesmo tendo esse consenso

outra questão que aparecia era: vamos direto ao estudo dessa obra, ou precisamos de outros

instrumentos teóricos para melhor entendê-la e estudá-la? Aqui também, todos pontuaram

que deveriam percorrer um caminho na teoria marxiana inicial que os preparassem para a

leitura e estudo da obra O Capital.

Essa opção justifica-se, pelos fundadores, pelo fato da necessidade de se ter uma

visão mais ampla do conjunto da teoria elaborada por Marx, entender conceitualmente

como ele entendia o ser humano e o desenvolvimento de sua história para depois se

debruçar no estudo da obra central. Discutir anteriormente as categorias centrais do

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pensamento marxiano que dessem conta de delinear sua concepção de entender, interpretar

e transformar o mundo.

Para tal, o fundador Claus Germer elaborou um roteiro de textos ou partes de textos

que considerava essencial para que esse caminho inicial fosse percorrido de maneira a dar

conta de sintetizar a concepção de mundo de Marx.

Bem importante enfatizar aqui, que essa proposta de realizar esse caminho prévio

de maneira aprofundada e sistemática para o estudo do Capital foi considerado essencial

por todos para que a discussão, inclusive as iniciais, da obra central pudesse ser mais

proveitosa no sentido que permitissem não só uma melhor compreensão do texto, mas do

próprio método aplicado por Marx na sua elaboração.

Por que a obra O Capital? Como já apontamos todos os fundadores a consideram

como a obra que mais permite um aprofundamento da teoria marxiana. Mas, a pergunta

qualitativamente diferente, mas que ainda persiste é: porquê? Na opinião dos fundadores

essa obra além de fazer uma análise profunda e consistente do sistema capitalista, de suas

leis, de seu funcionamento e de suas conseqüências contém em sua elaboração o método

materialista dialético aplicado. Nessa obra, Marx ao proceder a análise do sistema

capitalista aplica seu método de forma consistente e coerente, fazendo o que propõe no seu

texto “Para uma crítica da economia política”:

“Parece correto começar pelo real e o concreto, pelo que se supõe efetivo; por exemplo,

na economia, partir da população, que constitui a base e o sujeito do ato social da

produção no seu conjunto. Contudo, a um exame mais atento, tal revela-se falso. A

população é uma abstração quando, por exemplo, deixamos de lado as classes de que se

compõe. Por sua vez, estas classes serão uma palavra oca se ignorarmos os elementos

em que se baseiam, por exemplo, o trabalho assalariado, o capital, etc. Estes últimos

supõem a troca, a divisão do trabalho, os preços, etc. O capital, por exemplo, não é nada

sem o trabalho assalariado, sem o valor, sem o dinheiro, sem os preços, etc. Por

conseguinte, se começássemos simplesmente pela população, teríamos uma visão caótica

do conjunto. Por uma análise cada vez mais precisa chegaríamos a representações cada

vez mais simples; do concreto inicialmente representado passaríamos a abstrações

progressivamente mais sutis até alcançarmos as determinações mais simples. Aqui

chegados, teríamos que empreender a viagem de regresso até encontrarmos de novo a

população - desta vez não teríamos uma idéia caótica do todo, mas uma rica totalidade

com múltiplas determinações e relações.”(Marx, 2005)

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Portanto, os fundadores por esse motivo principal, escolheram o estudo de O

Capital, por ser, nas palavras da fundadora Lígia Klein, “a obra fundamental do

pensamento de Marx”.

Já em relação ao funcionamento e organização dos encontros, optou-se por utilizar

a metodologia trabalhada pela fundadora Lígia Klein em sua disciplina do mestrado. Esse

formato consistia basicamente em: uma leitura individual e anterior ao espaço de discussão

por parte dos participantes, com a tarefa de se levantar questionamentos, no mínimo um, e

pontos importantes do texto lido; uma breve exposição de um dos participantes,

determinada anteriormente, levantando os principais pontos abordados no texto;

levantamento das questões e pontos importantes feitos pelos participantes seguido do

debate dos mesmos; e fechamento por parte do professor Claus Germer das questões e

dúvidas trabalhadas na discussão.

Essa metodologia foi adotada pelo entendimento de que ela proporcionaria um

encontro baseado no debate, onde os participantes pudessem dialogar sobre suas dúvidas,

questionamentos e pontos importantes e que ao mesmo tempo não abrisse mão da figura de

um professor, não em seu aspecto formal, mas no sentido de ser aquele que possui um

nível mais aprofundado do conhecimento e que por isso conseguiria sistematizar a

discussão desenvolvida e a categorizar com maior precisão os conceitos trabalhados no

texto.

Estes dois aspectos são considerados muito importantes pelos fundadores. A

questão da abertura efetiva do diálogo e discussão sobre o texto seguido de um fechamento

mais aprofundado corrobora para que os participantes não assumam um papel passivo no

processo do desenvolvimento de seu conhecimento, não se portem como simples ouvintes

das “boas novas”. A questão de verbalizar seus pensamentos, de colocá-los em discussão

com outras pessoas, de confrontá-los com outras formas de entendimento, no processo de

desenvolvimento do próprio pensamento faz com que sua reelaboração, apreensão de

conceitos e desenvolvimento da argumentação solidifique-se ainda mais.

Assim como, manualmente o ser humano constrói e opera com objetos,

mentalmente opera e constrói através das categorias, de conceitos, abstrações de elementos

da realidade concreta. “Deste modo, o pensamento e a linguagem, embora distintos,

mantêm entre si uma unidade indissociável. Nessa unidade, não é a atividade mental que

organiza a expressão, mas é a linguagem, enquanto expressão, enquanto signo, enquanto

material semiótico que organiza a atividade mental” (Klein, 2005, p.02).

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Essa importância da fala para o desenvolvimento do pensamento coaduna também

com a intenção dos fundadores de que o Espaço Marx fosse um espaço para que os

militantes pudessem aprofundar seus conhecimentos sobre a teoria marxiana e que

pudessem com esse aprofundamento, qualificar mais a sua atuação na militância. Sem

esquecer que, como afirma Lígia Klein, o Espaço Marx é aonde “se exerce a militância

estudando”. Para essa qualificação era entendimento de que os participantes tivessem que

se colocar nas discussões, deveriam opinar, divergir, questionar, enfim, expor suas

análises, mesmo que a princípio parciais ou superficiais, para que no decorrer do processo

essas intervenções fossem se qualificando.

A figura de um professor, no sentido já citado, também foi priorizada pelos

fundadores, na procura de manter um rigor científico sobre o assunto, ou seja, para que não

se caísse nos chamados “achismos” ou “autoditatismos”, a figura de alguém que detivesse

o conhecimento com maior profundidade era essencial para que as categorias científicas

trabalhadas no texto pudessem ser apreendidas pelo grupo de forma mais sistematizada,

superando o entendimento e a compreensão senso-comum, acentuadamente presente no

grupo nesse início de trabalho.

Outro ponto apontado como importante era a autogestão do grupo, entendendo a

autogestão aqui como o processo que permitia aos próprios participantes do Espaço Marx a

definição do andamento de seus estudos. Essa autonomia do grupo era considerada

fundamental para que os próprios participantes tivessem a responsabilidade de decidir

como estava o andamento dos estudos. Por exemplo, se o grupo achasse que precisaria de

mais duas sessões para discutir com profundidade determinado capítulo, pois ainda

persistiam muitas dúvidas ou questionamentos, esse era o procedimento adotado.

Esse aspecto serviria também como uma certa avaliação do aprendizado por parte

dos participantes. Ao determinar o prosseguimento ou não da continuação do texto,

poderia-se perceber nas suas colocações, as dificuldades ou avanços com o estudo. Além

de atribuir funções e responsabilidades específicas a determinados participantes, que

deveriam apresentar determinadas partes no próximo encontro.

Embora existisse essa autonomia do grupo em relação ao ritmo do estudo, havia

também a preocupação de manter esse ritmo com o ritmo social estabelecido. Não era

possível, caso que nunca aconteceu, mas que se acontecesse já tinha um encaminhamento,

de permanecer demasiadamente em um capítulo ou em uma parte do texto por mais tempo

que o considerado socialmente necessário, caso isso acontecesse denotava algum ponto

falho da metodologia empregada que não estaria dando conta de seus objetivos.

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Essa preocupação de se estabelecer um ritmo que mantivesse a sua autonomia, mas

que não se deslocasse da realidade de um ritmo socialmente estabelecido foi uma

preocupação pontuada com ênfase pela fundadora Lígia Klein, no sentido de que o grupo

não esquecesse que deveriam exercer essa autonomia dentro de certos limites cronológicos

mesmo, como por exemplo, os prazos estabelecidos pelos seus estudos formais. Mais

adiante, como veremos, essa autonomia será exercida com maior flexibilidade.

No aspecto de sistematização e da elaboração teórica, pretendia-se ainda elaborar

cadernos contendo textos dos próprios participantes onde estes pudessem expor reflexões

feitas a partir das discussões realizadas. Nessa proposta não existia uma preocupação

excessiva com a qualidade ou aprofundamento dos textos, mas principalmente com a

possibilidade de realizar elaborações teóricas iniciais onde os participantes estariam mais

do que procurando elaborar teoricamente, expondo idéias que seriam debatidas no próprio

grupo.

Esse instrumento serviria como mais uma forma de aprofundar o desenvolvimento

dos estudos e do pensamento dos participantes, na medida em que primeiramente todos

seriam convidados a elaborar cientificamente a partir do estudo inicial de O Capital, e

posteriormente o grupo poderia debater essas sistematizações em conjunto, apontando

incongruências ou mesmo levantando aspectos a serem aprofundados, bem como avanços

percebidos na compreensão dos textos. Este caderno ficou apenas como um projeto a ser

desenvolvido.

Então agora, temos um quadro com as principais pontuações na determinação da

metodologia inicial, do funcionamento do Espaço Marx feita por seus fundadores.

Propostas baseadas na realidade concreta do grupo inicial, cinco alunos do mestrado e dois

professores da Universidade Federal do Paraná, que mesmo com todas as limitações já

delineadas, possuíam, mesmo que de forma não sistemática e aprofundada, determinada

leitura da teoria marxiana e uma formação política construída mais fortemente na luta

cotidiana de pelo menos 15 anos de militância.

3.5 - Assim inicia-se o Espaço Marx da UFPR

Então, depois desse percurso inicial, começa efetivamente o Espaço Marx. Um

espaço então já caracterizado prioritariamente como um espaço de fundamentação

sistemática da teoria marxiana, com ênfase na ortodoxia do estudo, estudar Marx por Marx,

e na busca ainda de concretizar outros objetivos como o da interação com os outros

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Espaços Marx, da produção de textos e da divulgação do pensamento marxista. Objetivos

iniciais tais como o da formulação estratégica para os socialistas na contemporaneidade e a

busca pela união das ações dos militantes socialistas deixam, pela própria limitação de um

grupo de estudo, de serem abordados como funções do espaço.

Como vimos, o espaço Marx da UFPR surge de uma combinação de necessidades

da militância exercida pelos fundadores e por uma necessidade acadêmica que passam a

vivenciar em seu curso de mestrado. E no decorrer já dos três primeiros anos, o perfil de

quem permanece, tanto dos fundadores como dos novos participantes, no grupo de estudos

predominantemente começa a tender mais para aqueles participantes que enxergam no

espaço Marx uma ação de militância, no que diz respeito a sua fundamentação teórica. Isso

aparece no relato de um dos fundadores, Armenes Ramos Jr, ao dizer que “fica claro que

quem encara o espaço Marx como uma ação de sua militância persiste por mais tempo no

grupo do que aqueles que encaram como uma atividade simplesmente acadêmica”.

O que nos chama a atenção, é que mesmo tendo nascido já com um pé para fora da

instituição ou da academia, no decorrer desses primeiros anos, essa necessidade que

impulsionou a construção do espaço vai perdendo sistematicamente sua importância e seu

peso dentro da formatação do grupo. E aqui vários fatores corroboram para isso: o término

do mestrado por parte de seus fundadores e a saída, por motivo de mudança residencial, de

alguns fundadores que tinham mais esse interesse.

Outro fator que colabora com a ênfase nesse perfil de militância é a própria

deliberação dos militantes ligados ao campo da esquerda do PT, de colocar como uma ação

obrigatória de seus militantes a participação nesse espaço de aprofundamento teórico,

acarretando no ingresso e a permanência de novos participantes no espaço Marx por serem

militantes socialistas, cumprindo uma ação deliberada por consenso de sua organização.

Nesses três anos iniciais então o fato que mais caracteriza, com relação às

mudanças, o Espaço Marx é esse, o fato de se constituir mesmo continuando, como aponta

o fundador Claus Germer, um “espaço aberto a todos que queiram estudar Marx”, um

espaço onde os militantes socialistas, pudessem buscar o aprofundamento da sua

fundamentação teórica. Ou seja, os participantes majoritariamente constituíam-se de

militantes que estavam desenvolvendo nas três principais dimensões, lutas concretas,

aprofundamento teórico e construção de uma organização revolucionária, o seu processo

de formação política.

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Esta mudança de perfil torna-se uma mudança qualitativa da característica do

grupo, sem juízo valorativo, mas fundamental para a escolha dos caminhos a serem

percorridos.

3.6 - Para Além do Capital, sem abandoná-lo

No final desse período de aproximadamente três anos, o grupo com um perfil de

militantes de uma mesma organização, começa a sentir a necessidade de ampliar seus

estudos, de ir além do estudo de O Capital, sem abandonar o estudo sistemático dessa obra.

A primeira proposta é a de realizar alguns eventos de celebração de algumas datas

importantes da história, principalmente para os socialistas como Guerra do Vietnã, 11 de

setembro (morte de Allende), e eventos sobre temas mais contemporâneos, Conjuntura

Brasileira com a participação do Professor Osvaldo Coggiola da USP, eventos estes que

chegaram a reunir mais de 100 pessoas para o debate.

Com esses eventos, os participantes do Espaço Marx perceberam que deviam

ampliar seus estudos não somente em forma de eventos pontuais, mas de estudo

sistemático também sobre outros aspectos fundamentais para a luta pelo socialismo. Nessas

discussões e em outros momentos em conjunto, na militância concreta ou mesmo no

próprio Espaço Marx, percebeu-se uma falta de conhecimento, no mesmo sentido da

percepção sobre a teoria marxiana, sobre as experiências de lutas pelo socialismo na

história mundial.

Por ter o grupo esse caráter mais vinculado à militância mais concreta de luta pelo

socialismo; conhecer, discutir e refletir sobre as experiências históricas evidenciou-se

como fundamental. E essa discussão começava a acontecer sob um domínio mais

qualificado da teoria marxiana, de um grupo que vinha estudando em conjunto e de forma

sistemática há aproximadamente três anos, em sua maioria, essa teoria.

Surge então, a proposta de formar o Espaço Lênin, que teve esse nome por ser

considerado pelos participantes como o maior teórico de uma revolução socialista, a

revolução russa. Esse espaço funcionaria com uma metodologia bem parecida com a do

Espaço Marx, sendo em algumas vezes mais expositivo no início da sessão dependendo da

necessidade ou viabilidade de alguém que dominasse mais o conteúdo. A partir de então,

se alternariam os encontros entre Espaço Marx e Espaço Lênin, semanalmente.

Para a definição do cronograma dessa proposta ficou estabelecido como obra inicial

o estudo de “O Dezoito Brumário” de Marx, que analisava a revolução burguesa na França.

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Ficou indicado também um conjunto de doze revoluções, vitoriosas e não vitoriosas, no

sentido da tomada do poder do estado, para o prosseguimento dos estudos.

Pode-se constatar que a proposta primeiramente traçada para o estudo das

revoluções, centrava-se no estudo das mesmas, sem que acontecesse a definição de

categorias centrais a serem analisadas. Tinha-se um esboço de um programa de estudos

sobre revoluções, porém não se havia estabelecido um roteiro de quais seriam as categorias

centrais a serem debatidas e compreendidas em cada ou em todas as revoluções a serem

estudadas.

3.7 - Aumenta a demanda: O que fazer?

Nesse primeiro período então, em relação ao número de participantes constantes,

ocorreu uma oscilação entre sete e quinze no máximo, porém o grupo que permaneceu,

mesmo não iniciando ao mesmo tempo, constituiu-se de nove pessoas e dessas, seis

estavam organizadas no campo da esquerda do PT, duas eram próximas dessa organização

e uma somente não tinha proximidade considerável. Como já pontuamos, nem todos os

fundadores permaneceram no grupo de estudos e outras pessoas ingressaram durante esses

três anos.

Como era feito para que essas pessoas que entraram em um intervalo de até um ano

após o início do Espaço Marx pudessem se inserir no grupo de modo a acompanhar o ritmo

e o nível de aprofundamento das discussões que já vinham acontecendo? O grupo decidiu

fazer alguns módulos de equivalência dos conteúdos passados, que consistiam em agrupar

os conteúdos e trabalhá-los de forma mais sucinta, procurando evitar a perda dos conceitos

centrais, mas também não permitindo o prolongamento das discussões como acontecia nas

sessões ordinárias.

Tal procedimento foi considerado como suficiente para que os novos participantes

pudessem ingressar no grupo sem terem seu processo de aproximação e aprofundamento

com a teoria marxiana abreviado, ou melhor, superficializado.

Porém, depois de três anos torna-se praticamente impossível fazer essa

aproximação da forma inicialmente pensada. O intervalo entre o início e o ponto do estudo

aonde se encontrava o grupo era considerado muito grande para que fosse possível esse

certo nivelamento dos novos participantes. O que fazer?

A solução proposta é a abertura de um novo grupo, um grupo que percorresse

basicamente o mesmo caminho do grupo inicial no estudo da obra central de Marx. Na

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verdade a demanda era tanta que se decidiu organizar mais dois grupos, um que

funcionaria no mesmo dia e horário do grupo inicial e outro que por condições

principalmente de impossibilidade de comparecer no dia indicado, se reuniria no sábado.

Uma das questões iniciais especificamente foi levantada novamente: torna-se necessário

um processo de aproximação com a teoria geral de Marx, como preparação para a leitura

do Capital. Decidiu-se utilizar para isso, um texto produzido pelo professor Claus Germer:

“A relação abstrato/concreto no método da economia política”, que abordava, como

indicado pela nomenclatura, a questão do método desenvolvido por Marx no processo de

desenvolvimento do pensamento. Esse texto debatido em uma ou duas sessões

proporcionaria uma aproximação suficiente da teoria marxiana no entendimento dos

participantes do grupo inicial.

Porém, a constituição desses dois grupos acarretou em outras situações, que se por

um lado não se consistiam enquanto problemas por ser esse um objetivo inicial do próprio

espaço, eram situações que obrigatoriamente colocavam necessidade de reorganização do

grupo inicial, principalmente na questão da figura do professor, no caso em questão o

fundador Claus Germer, que possibilitava por seu acúmulo teórico, um aprofundamento

maior das discussões. Para essa situação as alternativas encontradas, foram a de garantir a

presença do fundador Claus nos grupos novos prioritariamente nos três capítulos iniciais e

na seqüência ocorreria uma alternância de sua presença entre os grupos em cada sessão,

sendo que os grupos novos sempre teriam a figura de um outro professor, de preferência a

fundadora Lígia Klein, que exerceu essa função durante curto espaço de tempo, ou por

outros participantes do grupo inicial que dominavam, pelo menos em um nível superior aos

novos, os conteúdos trabalhados. Nas palavras do fundador Armenes Ramos Júnior

“sempre tinha uma supervisão, seja a mais qualificada do Claus ou uma mais de segunda

mão como a dos outros participantes antigos”.

Esses dois grupos novos, carinhosamente alcunhados de “lobinhos” pelos antigos,

em referência à terminologia utilizada por grupos de escoteiros novos, começaram com

cerca de 35 participantes aos sábados e 45 na segunda-feira. Este número perdurou por

aproximadamente duas a quatro sessões, quando começaram mais acentuadamente as

desistências. No caso do grupo que se reunia aos sábados o caso foi mais grave e ele findou

ainda no decorrer desse primeiro ano, sendo que aqueles participantes que não queriam

parar seus estudos tiveram que fazer um esforço para se reunirem na segunda-feira, dia de

encontro do outro grupo novo.

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Esse grupo então, chamado hoje de grupo 2, o inicial evidentemente é denominado

grupo 1, e que completou três anos no final de 2005, permaneceu seus estudos também

com várias baixas e algumas inclusões, estabilizando-se em um número de participantes

que mantém determinada constância de 12 pessoas.

Percebe-se aqui também um fator semelhante ao grupo inicial, existe uma inclusão

de novos participantes depois de certo período de existência do grupo, sendo feito da

mesma forma algumas sessões de equivalência do conteúdo trabalhado. Sendo uma

diferença o período dessas sessões, que no grupo 2 delongou maior tempo.

Após dois anos da existência desse grupo ocorre também, o distanciamento

acentuado do conteúdo já trabalhado com essa possível forma de integração de novos

participantes no grupo. A solução para a presente demanda também se repetiu, a criação do

grupo 3 para o estudo da teoria marxiana.

Esse grupo também começa com um número de participantes próximo aos 45 do

início do segundo grupo e atualmente tem um número aproximado de 18 participantes que

mantém uma determinada constância nos estudos.

Agora, com três grupos de estudos a questão da orientação realizada pelo fundador

Claus complica-se mais um pouco. A solução para esta situação é encontrada na medida

em que se ajustam os horários dos três grupos para que se possibilite a permanência, de

pelo menos uma hora, em cada grupo, do professor Claus Germer. E quando da

impossibilidade disso acontecer, o grupo 1 estaria exercendo essa função nos outros

grupos.

Outro fator importante de mudança provocada também pela formação de dois

novos grupos e principalmente pelo número efetivo de participantes destes em relação ao

grupo inicial, foi a da metodologia empregada para a discussão do conteúdo. A

metodologia antes empregada permaneceu em sua totalidade, sendo que um espaço a mais

foi criado dentro dela para que se permitisse uma maior participação e verbalização dos

participantes nas discussões.

Após a exposição inicial do conteúdo feita por um dos participantes, o grupo agora

era subdividido em outros grupos de 4 a 5 pessoas, dependendo do número de participantes

na determinada sessão, que discutiriam os pontos mais importantes que cada um pontuou

em sua leitura individual, bem como as questões nas quais teriam dúvidas, devendo então

esse pequeno grupo sistematizar a discussão feita e apresentar ao grande grupo tanto os

pontos principais discutidos como as questões que consideravam de maior importância.

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Então, as discussões ocorridas nos pequenos grupos é que iriam fomentar o debate no

grupo geral.

Essa mudança na metodologia foi adotada, como já dissemos, pelo aumento dos

participantes efetivos desses grupos e por uma dificuldade de vários participantes de se

colocarem nas discussões, o que não possibilitava um dos passos fundamentais aqui já

colocados no processo de aprendizagem, que é a da verbalização do pensamento. Esta

observação e proposta de reformulação foram feitas por alguns participantes do grupo 2 e

por alguns do grupo 1 que por algumas vezes exerciam o papel de “professor” nos demais

grupos.

3.8 - O Espaço Lênin, revoluções e conjuntura

Nesses três anos de existência do Espaço Lênin como uma proposta intrínseca ao

Espaço Marx, procurou-se desenvolver as discussões pré-estabelecidas na proposta inicial.

Porém, algumas outras discussões que não estavam no eixo traçado previamente, de se

discutir experiências revolucionárias anteriores, foram incorporadas principalmente a partir

do segundo bimestre de 2004.

Antes de levantar essas discussões, vamos pontuar algumas características

específicas do espaço Lênin, relevantes para as análises posteriores.

O espaço Lênin passou a constituir-se então em um espaço comum para todos os

participantes do Espaço Marx, um momento em que esses participantes se reuniam em

conjunto para discutir um assunto. Além desse momento em comum com os demais

participantes era um momento também aberto para demais pessoas que se interessassem

pelo tema a ser debatido. Como a discussão se dava por um tema, no caso uma revolução,

subsidiado por uma bibliografia colocada a disposição previamente, isso facilitava a

participação para quem não participava do Espaço Marx.

As sessões do Espaço Lênin, principalmente quando pautaram revoluções,

contaram na maioria das vezes com um número maior de participantes do que os que

estavam constantemente no Espaço Marx. Aqui algumas hipóteses que não se excluem,

mas sim ao contrário compõem um quadro significativo, são levantadas pelos fundadores

que ainda atuam constantemente no espaço, Armenes Ramos Júnior e Claus Germer, em

suas entrevistas para que tal fato acontecesse. Uma delas é de que o tema era mais atrativo

para a discussão por parte das pessoas novas no espaço e/ou na militância. Afinal discutir

experiências “mais concretas” da luta pelo socialismo “sempre” despertou um maior

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interesse por parte dos militantes para a discussão. Outra hipótese é de que esse tipo de

atividade não exigia um comprometimento a médio e longo prazo por parte do militante,

por ser temporalmente bem mais reduzido do que a discussão específica do Espaço Marx.

Cada tema durava no máximo de uma a duas sessões.

Uma grande positividade apontada do Espaço Lênin foi o fato de que da mesma

forma que aconteceu no Espaço Marx, estes militantes não possuíam experiência de estudo

sistemático e coletivo das experiências de lutas concretas pela superação de formas de

organização da sociedade, neste caso, mais acentuadamente a superação da forma

capitalista de organizar a sociedade. O Espaço Lênin começa então a proporcionar essa

discussão sistemática e coletiva.

Nesse primeiro formato da discussão procurava-se debater as revoluções em seu

processo pré-revolucionário e revolucionário como um todo, ou seja, simultaneamente. O

que para os fundadores permitia uma aproximação da discussão, mas não dava conta de

traçar os elementos fundamentais e comuns para que essas revoluções fossem realizadas.

As discussões ficavam pontuais também na compreensão das condições objetivas e

subjetivas para a construção de uma revolução, ficando aos que já tinham maior acúmulo

de leitura e de discussões sobre o tema, a oportunidade de aprofundá-lo. Para a grande

maioria dos participantes o espaço possibilitava então uma aproximação com o tema, mas

não oportunizava, principalmente por essa metodologia aplicada, um aprofundamento

teórico maior.

Durante esse trajeto do Espaço Lênin foram discutidos os seguintes processos

revolucionários: Revolução Francesa; Revolução Russa; Revolução Chinesa; Revolução

Cubana e o processo no Chile, que teve como liderança Salvador Allende.

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4. OS PARTICIPANTES DO ESPAÇO MARX: QUEM SÃO E O QUE AVALIAM?

“Faça perguntas sem medo não te convenças sozinho mas vejas com teus olhos.

Se não descobriu por si na verdade não descobriu.”

(Bertold Brecht)

A partir dessa história relatada principalmente pelos fundadores e através da

observação participativa, aprofundaremos a pesquisa sobre o espaço Marx, através da

análise dos dados recolhidos em forma de questionário realizado, em sua maioria, em

junho de 2005. Bem como, contaremos no que diz respeito principalmente à metodologia,

funcionamento e organização do espaço com a sistematização de uma apresentação e

debate da pesquisa em uma das sessões do espaço Marx em dezembro do mesmo ano.

Nessa busca de aprofundar a análise do Espaço Marx da UFPR então, nos parece

fundamental partir agora para uma análise de seus participantes atuais e de como esses

participantes compreendem-no. Para tal análise, aplicamos questionários separando em

dois grupos os participantes: o primeiro reunindo os grupos 1 e 2, menos os fundadores,

que chamaremos de grupo A, portanto mais antigos e o segundo que reúne os participantes

do grupo 3, que teve seu início em março de 2005 e que denominaremos de grupo B.

Essa divisão baseia-se no tempo de participação no espaço. Consideramos que os

participantes que estão no espaço há mais de dois anos podem avaliá-lo com maior

profundidade em relação à metodologia, funcionamento, organização e transformações, do

que aqueles que estavam, na época de aplicação do questionário, somente há três meses, no

caso o grupo 3. Contamos com a resposta de 12 integrantes de um total de 18 pertencentes

ao grupo A, o que corresponde a aproximadamente a 67% da amostra possível e com 18 de

um total de 25 do grupo B, correspondente a 72% do total de integrantes do grupo.

Quem são esses participantes? A primeira característica a analisar é como estes

participantes estão desenvolvendo suas relações concretas e imediatas, qual a posição

ocupada por eles dentro do processo de produção, fator esse que nos possibilita um maior

entendimento das experiências práticas que vivenciam e que contribuem para o

desenvolvimento de sua consciência de classe. Para essa análise vamos trabalhar com a

combinação de três perguntas: a) Qual a profissão dos participantes (figuras 1, 2 e 3); b) Se

estudam formalmente ou não (tabela 1) e c) Se trabalham (tabela 2). Com a combinação

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desses três fatores teremos um quadro mais elucidativo sobre o universo de suas relações

cotidianas.

41,66%

33,33%

25%EstudantesProfessoresP.Liberais

Figura 1 – Profissão dos participantes do grupo A do Espaço Marx da UFPR

62,50%

12,50%

13%

6,25%

6,25%EstudantesProfessoresP.LiberaisFuncionário PúblicoAnalista de sistemas

Figura 2 – Profissão dos participantes do grupo B do Espaço Marx da UFPR

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53,42%

21,42%

7,16%18%

Estudantes

Professores

Profissionais Liberais

Outras profissões

Figura 3 – Profissão dos participantes dos grupos A e B do Espaço Marx da UFPR

Temos então, nesse primeiro aspecto, no grupo A 41,6% dos participantes tendo

como atividade principal serem estudantes, 33,3% como professores e 25% como

profissionais liberais. Já no grupo B 62,5% são estudantes, 12,5% professores e

profissionais liberais e 6,25% funcionários públicos e analistas de sistemas. Se somarmos

os dois grupos temos 53,4% de estudantes prioritariamente, 21,4% de professores e 18% de

profissionais liberais e o restante 7,16% em outras profissões. O que nos fornece alguns

dados interessantes para análise: a) a forte presença de participantes estudantis no espaço;

b) ao somarmos percentual de estudantes com o de professores constatamos um total de

74,8% de participantes que possuem na área da educação sua atividade principal; c) apesar

de não termos abordado a questão da idade desses participantes, constatamos por

observação e participação durante mais de três anos no espaço que 82,14% dos

participantes têm idade inferior a 30 (trinta) anos.

A combinação desses dados nos fornece um primeiro retrato da composição do

espaço Marx: um grupo com expressiva participação estudantil e de jovens ligados

principalmente à área educacional.

Já o segundo ponto abordado pretende constatar se mesmo no caso dos

participantes que não tem como atividade principal o estudo, existem aqueles que também

estão desenvolvendo formalmente um processo educacional, conforme podemos observar

na tabela 1.

Tabela 1 – Percentual de participantes do Espaço Marx que estudam

GRUPO DE PARTICIPANTES Estudam Formalmente Não estudamA 83,3% 16,7%B 68,7% 31,3%

A + B 75,0% 25,0%

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Nessa ampliação parcial da análise para aqueles que também estudam além de

desenvolverem outra atividade profissional, esse percentual sobe, no caso do grupo A, de

41,66%, que tinham como atividade principal o estudo, para 83,33% e de 62,5% para

68,75% no grupo B. O que fortalece ainda mais o perfil estudantil do grupo.

Esse perfil dos participantes pode, nesse primeiro momento, ser justificado pela

localização de funcionamento do espaço Marx que ocorre no campus da Reitoria da

Universidade Federal do Paraná, o que facilita à participação dos estudantes dessa

instituição, tanto de graduação como de programas de pós-graduação. No cruzamento dos

dois grupos temos então que 75% dos participantes estão em algum processo de educação

formal enquanto que 25% não estão.

No terceiro aspecto componente dessa tríade que forma as atividades principais às

quais estão vinculados os participantes em sua realidade cotidiana, procuramos saber

quantos estão trabalhando, tendo por critério a venda da sua força de trabalho mediante o

recebimento de um salário. Os resultados estão apresentados na tabela 2.

Tabela 2 – Percentual de participantes do Espaço Marx que trabalham

GRUPO DE PARTICIPANTES Trabalham Não trabalhamA 33,3% 66,7%B 43,7% 56,3%

A + B 42,8% 57,2%

Nesse terceiro aspecto, observamos que a maioria dos participantes do Espaço

Marx não está trabalhando, segundo o critério estabelecido, sendo a produção de sua

existência garantida através principalmente por familiares. Somando-se os dois grupos

temos então uma minoria de 42,8% que trabalham e uma maioria de 57,2% que não estão

vendendo ainda sua força de trabalho.

Completamos esses primeiros dados com outro que a nosso ver também é

significativo: no grupo A todos participantes eram estudantes de graduação à época de sua

entrada no espaço Marx, sendo essa sua atividade principal desenvolvida.

Ao analisarmos o conjunto desses três aspectos, conseguimos traçar um perfil mais

depurado da composição dos participantes atuais do espaço Marx: um grupo com

expressiva vinculação à realidade estudantil universitária e também à área educacional,

setor do processo de produção responsável atualmente principalmente pela formação de

trabalhadores. Soma-se a isso ainda o fato desse grupo ser na sua maioria de jovens e

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estudantes e de não estarem vendendo sua força de trabalho diretamente, o que limita sua

formação política proveniente da luta direta entre capital-trabalho ao processo ‘espontâneo’

economicista das lutas práticas, principalmente vinculadas às conseqüências do

desenvolvimento do capitalismo na área educacional universitária. Temos também por

conseqüência dessa composição uma parcela minoritária, perto de 15% de trabalhadores

produtivos17. Atentamos também, que essa é uma característica importante, porém ao

mesmo tempo momentânea, pois em sua totalidade esses participantes tendem a ocupar nas

relações sociais capitalistas de produção a posição de trabalhadores. Fato esse que já vem

acontecendo com os participantes do grupo A que inicialmente tinham por atividade

principal, em números absolutos, o estudo e que agora se encontram em um processo

crescente de venda direta da sua força de trabalho.

Temos então um processo que atinge principalmente uma parcela da classe

trabalhadora que pela situação econômica familiar pode dedicar-se momentaneamente aos

estudos com maior facilidade de tempo e de espaço, que trabalhadores que já estão

vendendo sua força de trabalho.

Buscaremos agora acrescentar a esse aspecto mais imediato das relações sociais dos

participantes o fator da militância, considerando como critério para tal, militante aqueles

que estão inseridos em alguma organização que atue na luta concreta seja ela

reivindicatória ou revolucionária, conforme podemos observar na tabela 3.

Tabela 3 - Participantes do Espaço Marx e o fator militância nas suas relações sociais

GRUPO DE PARTICIPANTES Militantes Não militantesA 83,3% 16,7%B 93,7% 6,3%

A + B 89,3% 10,7%

No grupo A, encontramos um total de 83, 3% de participantes que estão de alguma

forma militando e no grupo B esse total sobe para 93,7%. O que nos coloca que somente

16,7% do grupo A e 6,3% do grupo B não militam em organizações, sejam elas específicas

ou gerais. Ao cruzarmos os grupos observamos que a grande maioria, cerca de 95% dos

participantes atuam na militância de uma forma concreta.

Constatamos então que a grande maioria desse grupo está vinculada a alguma

organização, seja ela reivindicatória ou revolucionária. Ao detalharmos ainda mais esse

17 Conceito de Marx para trabalhadores que estão submetidos diretamente a um capitalista, vendendo sua força de trabalho como capital variável e produzindo diretamente mais-valia.

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dado da militância pudemos identificar que desses militantes, que formam um total de 25,

18% estão inseridos em uma organização somente reivindicatória e 72% estão em uma

organização de característica revolucionária.

Com esse quadro podemos aprimorar o perfil primeiramente traçado, se

anteriormente definimos que esse grupo era formado majoritariamente por jovens

estudantes e que mesmo entre os trabalhadores tínhamos uma forte vinculação à área

educacional, podemos incluir um outro aspecto fundamental para análise: uma forte

característica de militantes socialistas que atuam em alguma organização, sendo que em

sua maioria em uma organização revolucionária.

Podemos constatar uma mudança qualitativa dos participantes atuais em relação ao

grupo inicial, composto principalmente pelos fundadores ao lembrarmos que todos àquela

época tinham pelo menos 15 anos de militância, sendo que no caso atual temos militantes

em sua grande maioria ‘novos’ que se encontram em seus primeiros anos de militância

principalmente no caso do grupo B. Fato esse que se repete também no grupo A aonde

mesmo com uma maior experiência de militância prática os participantes não ultrapassam

os 10 anos de militância. Não só pelo tempo quantitativo, mas também pelo tempo visto

qualitativamente percebemos que o grupo inicial pode aprofundar seu processo de

formação política teórica, prática e organizatoriamente mais do que os participantes atuais.

Esses militantes vivenciaram em uma militância socialista, enquanto grupo, o

processo de lutas da classe trabalhadora a partir da década de 60. Podendo acumular

experiências de diversas formas de organização trabalhadora, legal e ilegal, pacífica e

armada, construção de sindicatos, de movimentos sociais, de partidos, enquanto expressão

política da classe. Bem como puderam vivenciar nessa militância como os capitalistas

reagem a essas diversas formas de organização e mobilização da classe trabalhadora,

através de seu “comitê executor” o estado burguês (Lênin, 2005b) e passaram por diversos

momentos de organização de greves, em especial no final da década de 70 início dos anos

80, verdadeiros processos educativos da consciência revolucionária (Lênin, 2006b). Além

desse aspecto, todos os fundadores vendiam sua força de trabalho e aqueles que não eram

professores, nesse caso da Universidade Federal do Paraná, estavam no programa de pós-

graduação em educação na mesma instituição. Possuíam em seu conjunto então, uma

experiência socialista de prática, teoria e organização na luta de classes que possibilitou um

avanço maior na consciência de classe revolucionária quando em comparação ao dos

participantes atuais.

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Essa mudança do perfil nos parece importante para o aprimoramento de análises

que faremos nos próximos pontos, porém ela não anula um perfil em comum entres esses

participantes, o de serem em sua maioria militantes socialistas e ligados à área educacional.

O que ela nos aponta é a diferença quanto ao grau de avanço no processo de formação

política entre eles.

Junto a esses fatores de características de composição do Espaço Marx, vamos

agora abordar elementos que trabalhem a questão da aproximação e da inserção inicial no

grupo, tentando perceber as relações possíveis com o perfil de composição até agora

traçado. Trabalharemos com duas questões: a) qual o instrumento de aproximação e

conhecimento inicial do espaço e, b) quais os objetivos principais dessa aproximação e

inserção. Os resultados encontrados estão apresentados na tabela 4.

Tabela 4 – Instrumento de aproximação dos participantes do Espaço Marx da UFPR

Grupos participantes Instrumento de aproximaçãoAmigos/Militantes Professores Cursos/Palestras

A 83,3% 16,7% -B 87,5% - 12,5%

Esses militantes que em sua maioria estudam, colocam que seu conhecimento

inicial do Espaço Marx ocorreu através principalmente de amigos/militantes, no grupo A

83,3% relatam esse fato enquanto no grupo B é apontado por 87,5%. Ou seja, através de

suas relações principalmente de militância é que tomaram conhecimento desse espaço de

aprofundamento teórico. Na soma dos participantes dos grupos A e B, temos um total de

85,7% de aproximação através das relações de militância. O aspecto que aparece como

segundo fator de aproximação são atividades ou espaços acadêmicos, relações com

professores em suas aulas e cursos ou palestras, que atingiram 14,30% dos participantes.

Já sobre os motivos que levaram ao ingresso no Espaço Marx, as figuras 4 e 5

mostram os resultados encontrados para o Grupo A e B, respectivamente.

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83,33% 83,33%

32,75%

50%

Fundamentação teórica

Fundamentação teórica paramilitânciaCompreensão maior doCapitalismoFund. p/área específica

Figura 4 – Principais motivos que levaram o grupo A, a ingressar no Espaço Marx

100,00%

56,25%

31,25%

Fundamentação teórica

Fundamentação teórica paramilitância

Debate coletivo da teoriamarxiana

Figura 5 – Principais motivos que levaram o grupo B a ingressar no Espaço Marx

Vemos então que o principal motivo que levam ao ingresso constitui-se no

aprofundamento teórico tanto no grupo A como no grupo B e que essa fundamentação

teórica ligada à prática militante aparece também na maioria dos integrantes dos dois

grupos. Como outros aspectos significativos, temos outros três elementos: compreensão

maior do sistema capitalista; fundamentação teórica para a área específica de formação e a

possibilidade de discutir a teoria marxiana de forma coletiva.

Esses dados nos mostram que a maioria expressiva dos participantes vê no Espaço

Marx um espaço para seu aprofundamento teórico e deseja utilizar esse aprofundamento

teórico como base de sua ação militante, o que coaduna com um dos objetivos colocados

pelos fundadores o de atrair pessoas que desejassem “aprender rigorosamente o marxismo

porque isso é um instrumento que orienta sua ação prática”, nas palavras da fundadora

Lígia Klein. Esse aspecto da relação da fundamentação teórica com a prática militante é

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fundamental tanto na origem quanto na compreensão por parte dos fundadores de que esse

espaço não poderia constituir-se enquanto espaço escolástico, interpretativo apenas da

realidade, mas que procuraria contribuir com sua transformação através da ação dos

militantes que participassem dele.

Então, para ter uma visão geral ainda mais detalhada, cruzando os dois grupos,

vemos que o aprofundamento teórico ligado à prática militante, lembrando que a maioria

dos participantes estão vinculados a organizações revolucionárias, aparece como sendo

fundamental para 67,87% dos participantes, restringindo esse fator aqueles que militam em

uma organização revolucionária vemos que aparece para 100% desses integrantes.

Com esses dados, podemos também procurar constatar em que fase do processo de

desenvolvimento da consciência de classe esses participantes estavam no momento de seu

ingresso e por conseqüência enxergar com maior clareza em qual parte desse processo o

espaço Marx tem atuado com maior incidência.

Apontávamos até aqui, que esse processo de aprofundamento da teoria marxiana

atuaria de forma mais efetiva na fase de rompimento da consciência reivindicatória ou já

na fase da consciência revolucionária. Enfatizávamos nossa afirmação no sentido de que

esse processo é mais efetivo e não exclusivo dessas fases, podendo com menor incidência

atuar nos processos de consciência que denominamos como alienação e reivindicatória.

Com o quadro acima traçado podemos constatar essas afirmações. Em sua grande

maioria os participantes no momento de seu ingresso mesmo, já estavam vinculados em

uma organização que pretende contribuir para a construção de um processo revolucionário

socialista. No caso desses participantes constatamos que se encontram na fase de

consciência revolucionária, com diferenças de profundidade nessa fase, mas com o

parâmetro de rompimento e superação do modo de capitalista de produção, como fica claro

na resposta de um dos participantes:

“...os dois elementos citados (interpretar a realidade através do pensamento marxista e a

apropriação do método materialista dialético) são requisitos para o desenvolvimento do

que entendo como meu projeto de vida: contribuir para a extinção da sociedade

capitalista e para a construção de uma sociedade sem exploração do homem pelo

homem, que em meu entendimento, é o socialismo.” (participante do grupo A )

Já com relação aqueles participantes que estão na fase de rompimento com a

consciência de classe e que compõem a maioria dos militantes vinculados somente a

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organizações reivindicatórias vemos que esse conceito de superação ainda está em uma

formação mais inicial, não sistematizada, tomando como exemplo as seguintes respostas:

“pensar em uma transformação da sociedade, para isso era necessário conhecer a

sociedade em que estamos inseridos”, “conhecer a teoria que da base à vários

movimentos sociais” e, “necessidade de uma base teórica e expansão dos conhecimentos

referentes às questões sociais”.

Não encontramos nenhum participante que estivesse nas fases de alienação ou

reivindicatória simplesmente, o que nos confirma que o Espaço Marx, não se constitui em

regra geral, como espaço de aproximação de novos militantes que ainda não romperam ou

que não estão em rompimento com o entendimento reivindicatório de sua consciência e

sim como um espaço de consolidação e aprofundamento teórico de militantes que já se

encontram nesses momentos. O que caracteriza com maior precisão os limites e as

possibilidades desse instrumento.

Chegamos até o momento com as seguintes características majoritárias do Espaço

Marx e de seus componentes: um espaço de fundamentação teórica que atualmente é

composto por militantes socialistas, em sua maioria também, jovens e estudantes que

através de suas relações de militância descobrem esse espaço e ingressam nele com o

objetivo principal de subsidiar, aprofundar e reformular teoricamente suas ações na

militância.

Essa é a análise possível para o grupo B, considerando o ainda curto tempo de sua

existência. Os demais dados que estaremos considerando a partir de agora na análise, se

restringem aos participantes do grupo A que estão há pelo menos dois anos no espaço

Marx. Com os participantes desse grupo procuraremos avançar na discussão sobre a

metodologia de estudo utilizada no espaço, bem como analisar como esses participantes

qualificam sua participação nesse processo e como avaliam os impactos do grupo de

estudo em seu processo de formação política.

Partindo agora para a metodologia, funcionamento e organização do espaço,

estaremos incluindo na análise a apresentação e debate sobre a pesquisa realizada com o

conjunto dos participantes. Na questão da metodologia abordamos o tema com as seguintes

questões: a) você acha que ela é adequada; b) consegue atingir seus objetivos; c) já

aconteceram mudanças nessa metodologia, quais; d) o que essas mudanças proporcionaram

em sua opinião.

Para 100% dos participantes do grupo A, a metodologia utilizada no Espaço Marx

da UFPR é adequada.

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Essa adequação da metodologia empregada é principalmente apontada como

coerente pelos participantes por proporcionar um espaço efetivo de debate coletivo e de

rigor conceitual, o que consequentemente proporciona um avanço significativo no

aprofundamento da teoria marxiana. Porém, mesmo com a concordância geral sobre esses

itens anteriores, vemos na figura 6, que 25% dos participantes colocam que esse objetivo

de aprofundamento teórico ainda é parcial, citando como principal argumento a dificuldade

de assimilação dos conteúdos trabalhados e sua conseqüente aplicação.

75,00%

25,00%

SimParcialmente

Figura 6 – Opinião dos participantes do Grupo A se os objetivos do Espaço Marx são

atingidos

Já na questão sobre as mudanças ocorridas na metodologia inicial, 100% apontaram

que houve uma modificação feita na metodologia inicial, com a inclusão da divisão em

pequenos grupos precedendo o debate no grupo geral. Sendo consenso que os impactos

dessa mudança foram positivos. Principalmente pelo fato de, na opinião dos entrevistados,

proporcionar um aprofundamento teórico ainda maior dos debates (83,3%) e na

participação dos membros na discussão (75%), dois pontos fundamentais da proposta

inicial dos fundadores, conforme podemos observar na figura 7.

69

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83,33%75,00%

Maior aprofundamento nasdiscussões

Maior participação nas discussões

Figura 7 – Conseqüências da mudança da metodologia nos estudos no Espaço Marx

Considerando agora os pontos negativos apontados pelos participantes sobre o

funcionamento do grupo e podendo eles indicar mais de um aspecto, vemos que dois deles

se destacam pela sua freqüência de citações: a fragilização do direcionamento do estudo

(58,3%) e a falta de um processo sistematizado de avaliação (75%).

58,33%

75,00%Fragilização do direcionamentodo estudo

Falta de um processosistematizado de avaliação

Figura 8 – Pontos negativos da metodologia apontados pelo grupo A

Esses problemas assinalados pelos entrevistados possuem ressonância na análise

feita sobre o aumento da demanda do espaço Marx e da forma não sistematizada utilizada

para resolver as situações que surgiram com essa nova conjuntura, não conseguindo com

que alguns pontos considerados como essenciais, principalmente nesse caso o do

direcionamento do processo educativo, fossem garantidos com a mesma ênfase dos

primeiros quatro anos. Mesmo assinalando esses problemas, os participantes são unânimes

em avaliar positivamente o processo que vêm vivenciando dentro do espaço Marx

enquanto o aprofundamento teórico que ele proporciona por suas características. A crítica

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aqui situada faz a relação de quem vivenciou o processo quando era possível o

acompanhamento do professor durante toda a sessão e de quem vem vivenciando o

processo com o acompanhamento parcial. Lembramos também que sobre esse ponto, todos

os fundadores entrevistados foram também unânimes em reconhecer que esse

direcionamento do processo educativo está fragilizado comparado ao período inicial, ainda

que consiga garantir esse aprofundamento teórico com determinado rigor conceitual.

Sobre a avaliação, os participantes apontam-na como um ponto deficiente da

metodologia do espaço. A principal crítica a esse processo é a da falta de sua elaboração

sistemática enquanto parte do processo educativo, limitando-se a algumas avaliações

realizadas de forma esporádica e não sistematizada para fundamentar possíveis

encaminhamentos e mudanças. Os fundadores por sua vez, também apontaram em suas

entrevistas que a avaliação estava muito “subjetiva”, nas palavras do fundador Armenes

Ramos Júnior “baseada num certo ‘olhômetro’ dos participantes com maior acúmulo

teórico” que se reduzia somente a tentar perceber os avanços dos mais novos na

apropriação do conhecimento em suas intervenções e/ou produções realizadas.

Temos então um quadro inicial que aponta uma aprovação da metodologia

empregada nos estudos desenvolvidos com ressalvas importantes para dois aspectos

fragilizados: o direcionamento do estudo e o sistema de avaliação. Agora existe um outro

aspecto da metodologia que abordaremos agora e que além de abranger as questões já

trabalhadas, traz elementos novos, nos permite uma visão maior do conjunto do espaço

Marx e aparece com ênfase no debate realizado junto aos participantes. A inexistência de

um programa de estudos sistematizado que leve em conta o acúmulo desses 6 (seis) anos

de história, os acúmulos individuais de seus participantes em seus processos de formação

política, que possibilite uma relação maior entre objetivos e caminhos propostos para

alcançá-los e que dê conta dessa conjuntura nova de composição referente aos

participantes. A formulação de um programa de estudos que abranja os pontos acima

mencionados torna-se necessário, na avaliação do debate realizado, para que o espaço

Marx avance tanto no objetivo central de aprofundamento teórico marxiano e do estudo

das revoluções, como em outros objetivos ainda presentes, que estão em direta

dependência do anterior, de produção e divulgação das idéias marxistas.

Trabalharemos agora com as partes constatadas como frágeis, após esse processo de

análise, da metodologia: a) processo de aproximação para a leitura de O Capital; b)

processo de categorização para a discussão das revoluções; c) falta de um sistema de

avaliação e; d) fragilização do direcionamento do estudo.

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Em relação à preparação para a leitura do Capital que na proposta inicial consistia

em um conjunto de textos e de sessões de estudos que trabalhavam questões como o

método materialista dialético, concepção de Estado e revolução, atualmente limita-se a um

texto sobre o método do fundador Claus Germer e a no máximo dois encontros. Encontra-

se então atualmente restrito, não possibilitando que esse tema seja devidamente

aprofundado. Ao não priorizar esse debate sobre o método em Marx, as dificuldades de

compreensão do texto do Capital também aumentam, pois nessa obra como já pontuamos

anteriormente, o autor aplica diretamente esse método de análise para descrever os

fundamentos e desenvolvimento do sistema capitalista de produção.

Constatamos também que essa aproximação em nenhum momento foi sistematizada

ou mesmo formulada como um conjunto de estudos e discussões necessários para

proporcionar um processo de aproximação efetiva, mesmo que teoricamente, os fundadores

tivessem essa compreensão, principalmente no que diz respeito ao objetivo central que é a

discussão do método materialista dialético elaborado por Marx, para compreensão e análise

da realidade.

Principalmente se considerarmos a composição atual e que vem se repetindo nos

últimos anos, de militantes jovens e estudantes, que estão em fase de rompimento com a

consciência de classe reivindicatória ou em um grau inicial da consciência de classe

revolucionária. Muitos desses militantes têm sem primeiro contato com a teoria marxiana

nesse espaço, o que demanda que esse caminho inicial seja mais extenso e aprofundado e

mesmo aqueles que têm determinado acúmulo anterior o possuem de forma ainda não

sistematizada. Se o espaço Marx não se constitui enquanto um espaço prioritário de

trabalho de base, no que diz respeito aos indivíduos que estão nas fases do processo de

consciência de classe como alienação e reivindicatória, ele vem se constituindo como um

espaço de formação teórica inicial e aprofundada para aqueles que estão rompendo com os

limites da sociedade capitalista ou para aqueles já romperam e procuram aprofundar não

só esse rompimento, seus conhecimentos sobre o funcionamento dessa sociedade e sua

superação.

Parece-nos coerente para a formulação desse programa de estudos do Espaço Marx

que ocorra essa priorização do espaço inicial de estudos, na perspectiva de construí-lo de

forma a coadunar uma primeira aproximação com a teoria marxiana e seus fundamentos

com um conseqüente aprofundamento do tema.

Outro aspecto sobre o método também nos chama à atenção. Mesmo na proposta

inicial quando o método tinha uma ênfase maior nessa preparação, no decorrer dos estudos

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pouco se retornava a ele ou se construía o caminho metodológico percorrido por Marx na

elaboração da obra O Capital. Esse é um ponto que incide diretamente na metodologia de

funcionamento das discussões. Entendemos que após esse trabalho inicial, deve-se partir

para a discussão do Capital procurando perceber em sua exposição o método aplicado e

enfatizar durante os estudos esse ponto do caminho e do porquê desse caminho percorrido

por Marx, além da ênfase já existente de apropriação das categorias.

Já em relação ao segundo ponto, de categorização do estudo dos processos

revolucionários no espaço Lênin, traçaremos um quadro do acúmulo de experiências

ocorridas principalmente no decorrer do ano de 2005 para que possamos analisar e

formular, tendo em conta também o debate realizado junto aos participantes, mais

nitidamente uma proposta para o desenvolvimento desse espaço.

No ano de 2005 então, desenvolveu-se uma tentativa inicial de estabelecimentos de

categorias fundamentais para o desenvolvimento dos estudos sobre as revoluções. Essa

tentativa consistiu no estudo inicial de dois textos bases: “Prefácio à contribuição à crítica

da economia política” de Marx e o tópico “Situação revolucionária” do texto “A falência

da II internacional” de Lênin. O primeiro com a intenção de se trabalhar as condições

apontadas por Marx que caracterizam uma época revolucionária e o segundo

principalmente para se debater as condições objetivas e subjetivas que conformam uma

situação revolucionária, segundo Lênin.

A avaliação consensual dessa experiência foi positiva pelos participantes que

colocam como um avanço real na metodologia de discussão das revoluções. Porém, essa

categorização permaneceu somente nesse estudo inicial, não conseguindo com que nas

discussões posteriores dos processos revolucionários elas exercessem um papel de base

para os estudos ou que pelo menos aparecessem como fator importante a ser entendido e

analisado.

Além desse estudo inicial outra experiência considerada importante foi o

estabelecimento da discussão sobre as experiências revolucionárias analisando-as em seus

processos pré-revolucionário, revolucionário e pós-revolucionário. Considerado também

consensualmente, como um salto qualitativo na metodologia, pois permitiu uma visão mais

ampliada de um processo revolucionário em sua extensão mais geral, possibilitando dessa

forma um aprofundamento maior nas discussões.

Tendo feito esse quadro do acúmulo ocorrido no espaço Lênin, significativamente

no ano de 2005 e sistematizando o debate sobre esse tema, consideramos que dois pontos,

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que precisam interagir, são importantes de trabalharmos com o intuito de avançar no

aprofundamento teórico desses estudos.

O primeiro deles é o acréscimo de algumas categorias que serviriam como um

roteiro para o estudo dos processos revolucionários, mantendo-se sua divisão em períodos

pré-revolucionário, revolucionário e pós-revolucionário. Esse roteiro procuraria analisar

esses períodos em seus seguintes aspectos: a) a estrutura econômica, procurando delinear

em que grau se encontra o desenvolvimento das forças produtivas em seu conjunto e

relacionar esse quadro específico à situação mundial do desenvolvimento capitalista; b) um

estabelecimento de um quadro da composição de classes, como as classes estão

organizadas e divididas para a produção da condições da existência humana; c) como o

estado está organizado politicamente nesse cenário e d) como os trabalhadores estão

organizados, quais suas expressões políticas construídas significativas para esse período.

Dialogando com esse roteiro, consideramos primordial também que diante desse

quadro melhor delineado e sistematizado, retome-se e procure-se também delinear as

categorias inicialmente trabalhadas, principalmente as que compõem uma situação

revolucionária, segundo o texto de Lênin, ou seja, as condições objetivas e a condição

subjetiva. Para que essa análise do estudo de processos revolucionários consiga

proporcionar também um exercício de análise de conjuntura e não só de estudo de um caso

específico.

Essa categorização da discussão junto ao estabelecimento desse roteiro nos parece

pertinente também para a metodologia, na medida em que ela pode proporcionar uma

discussão mais sedimentada em fundamentos e na correlação entre as diferentes

experiências revolucionárias, avançando no perfil episódico em que o estudo vinha

acontecendo em anos anteriores.

Além dessa construção metodológica, consideramos que seria importante a

elaboração de um programa de estudos que estabeleça principalmente as seguintes

questões: a) o conjunto de revoluções a serem estudadas; b) bibliografias que subsidiem o

debate; c) possíveis debatedores para os temas e e) possíveis espaços para outros temas,

principalmente conjunturais.

Outra proposição é a incorporação programada da exibição de filmes relacionados

aos temas trabalhados. Essa experiência ocorreu também durante o ano de 2005 e foi

denominado de Cine Marx, porém não ocorreu de forma sistemática, o que dificultou sua

concretização enquanto uma atividade dentro desse espaço de formação. Porém, os

participantes avaliam que as experiências que foram realizadas, principalmente após as

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discussões realizadas nas sessões ordinárias do espaço Lênin baseadas em textos,

permitiram debates pós-filmes que conseguiam proporcionar um aprofundamento de

pontos centrais da experiência estudada e o surgimento e análise de outros pontos que nos

estudos dos textos não haviam aparecido.

Sobre o ponto da avaliação devemos considerar primeiramente que o espaço Marx

não é, como já pontuamos, um espaço de aprofundamento da teoria marxiana e do estudo

dos processos revolucionários, dimensão importante do processo de formação política e

que, mesmo sendo um espaço aberto para qualquer indivíduo que queira participar, procura

atingir principalmente militantes socialistas. Sua constituição tem por objetivo contribuir

para a construção de um processo revolucionário, através do estudo sistemático e

aprofundado da teoria revolucionária. Portanto, um sistema de avaliação desse processo

deve se constituir enquanto um elemento importante que procure contribuir na construção

desse objetivo central.

Para que isto ocorra, analisamos que não é o caso de se aplicar instrumentos

avaliativos, tais como provas ou trabalhos, no sentido de “quantificar” o “progresso

obtido” em relação aos conteúdos trabalhados. Consideramos mais pertinente que esse

sistema de avaliação consista em breves e sistemáticas auto-avaliações verbais, que

ocorriam no início do espaço, feita pelos próprios participantes no final de todas as sessões

aonde expunham sua opinião sobre o desenvolvimento da discussão ocorrida e sobre suas

dificuldades. Combinando-se a essas auto-avaliações, avaliações periódicas feita pelos

participantes que desempenham o papel de professor nos grupos, para avaliarem de forma

mais sistemática suas impressões dos estudos.

Partindo agora para o último ponto levantado nos questionários e no debate junto

aos participantes vamos procurar sistematizar os principais aspectos sobre a fragilização do

direcionamento do estudo e através dessa análise procurar os avanços possíveis.

Temos um quadro então de grande demanda, três grupos que necessitariam da

figura de um professor. Porém, não podemos considerar esses três grupos como

homogêneos em relação ao aprofundamento teórico acumulado e a autonomia decorrente

nas discussões. O grupo mais antigo estará completando 7 (sete) anos desse processo

sistemático de discussão da teoria marxiana em agosto de 2006, todos os participantes

desse grupo estão pelo menos há mais de 5 (cinco) anos nesse processo de estudo. Por esse

acúmulo, concluímos que sua possibilidade de autonomia frente a figura de um professor é

muito maior do que a dos outros grupos. Para além dessa capacidade maior de exercer seus

estudos autonomamente enquanto grupo, concluímos também que esses participantes

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podem começar a exercer de forma planejada e periódica o papel de 'professor' nos demais

grupos. Mesmo considerando a colocação feita por alguns membros do grupo de que não

possuem o mesmo acúmulo do que o professor Claus Germer, que exerce mais

constantemente esse papel ou do que a professora Lígia Klein, também está claro que não

seria aconselhável que esses participantes esperassem obter integralmente esse acúmulo

para a partir daí, começar a desempenhar essa função.

Ao colocar-se ativamente e constantemente nesse papel, esses participantes

estariam também aprofundando sua formação enquanto educadores socialistas, pois não

somente iriam reler e rediscutir conteúdos já estudados, como estariam com a função de

colaborar na mediação e sistematização desses conhecimentos com os grupos mais novos.

O que não descarta a participação dos professores citados, mas sim provoca um aumento

de possibilidades de ampliação para esse espaço e de formação de educadores socialistas a

curto, médio e longo prazo.

Em relação aos outros objetivos do espaço que são a produção de textos e a

divulgação das idéias marxistas, os participantes reconhecem-no como algo com que o

espaço Marx se preocupa. Porém, unanimemente também consideram que essa produção

ocorre de forma esparsa e individual. Sendo que os próprios participantes têm pouco

conhecimento inclusive dessas produções, com exceção do texto do fundador Claus

Germer sobre o método, que faz parte do programa de estudos. Apontam que essa deveria

ser uma atividade melhor direcionada pelo espaço de forma que começasse a ocorrer como

atividade do coletivo e não de alguns participantes apenas.

A dificuldade principal aqui, em nosso entendimento, é a falta também de um

planejamento e coordenação dessas produções. A proposta a se desenvolver é a proposição

de temas que o conjunto dos participantes considerem pertinentes para pesquisa e produção

e que se estabeleçam períodos para que elas se efetivem. Essa produção se daria por

participantes que possuíssem proximidade profissional e/ou científica com a temática ou

por aqueles que se propusessem a desenvolvê-las. Essa produção individual poderia passar

depois por debates internos com os demais participantes, com o intuito de coletivizar a

produção e conseqüentemente aprofundá-la.

Com esse processo mais delineado de produção, a possibilidade concreta de se

produzir propostas iniciais de divulgação como o caderno de textos e a revista do Espaço

Marx tornam-se mais provável de se realizar.

A produção de textos tem importância acentuada também no processo de avanço

no grau de consciência de classe, pois sendo uma forma de linguagem, ela proporciona um

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processo de sistematização e ordenação das idéias que ajudam a reelaborar e reorganizar o

próprio pensamento.

Esse processo também contribui para o avanço no terceiro objetivo principal do

Espaço Marx da UFPR que é a interação com outros espaços Marx. Através dessa

produção e divulgação científica a aproximação pode se realizar também através do debate

desses textos ou das temáticas desenvolvidas nos materiais de divulgação. Outra

possibilidade considerada é a realização de eventos em comum com outros espaços Marx

que busquem a discussão de temáticas pertinentes aos marxistas contemporâneos e a troca

de experiência sobre os processos internos de cada espaço.

Feita essa análise sobre a metodologia desse instrumento de formação, partiremos

agora para a compreensão de como os participantes avaliam sua participação no Espaço

Marx e as mudanças promovidas por essa participação.

Em relação à participação dos integrantes, analisamos dois fatores importantes para

o processo de aprofundamento teórico: a) tempo dedicado e qualidade da leitura

prévia dos temas propostos e, b) participação efetiva nos debates dos temas, tendo

por critério que o participante considere efetivar intervenções com determinada

freqüência nas discussões. Os resultados obtidos para a primeira questão se

encontram na figura 8.

75,00%25,00%

RazoávelPouco/Insatisfatório

Figura 8 – Avaliação do grupo A em relação ao tempo dedicado a leitura dos textos

Observamos que 75% dos participantes acreditam que dedicam tempo suficiente a

essa tarefa de leitura considerando-o como razoável, porém insuficiente para aprofundar o

estudo individual para além de uma primeira leitura. Sendo que os outros 25% consideram

pouco o tempo que dispensam para a leitura dos textos, considerando que até essa primeira

leitura fica prejudicada. Esse ponto também é importante para a avaliação do espaço na

medida em que essa tarefa é essencial tanto para o desenvolvimento das discussões como

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para a apropriação do conhecimento. Sem realizá-la de modo satisfatório, a participação

dos membros nas discussões e o conseqüente aprofundamento ficam comprometidos.

Podemos evidenciar na figura 9 que os mesmos participantes que colocaram sua

dedicação de tempo à leitura como insuficiente, apontam também dificuldades em suas

participações nas discussões.

75,00%25,00%

Regular/RazoávelPouca/Insatisfatória

Figura 9 – Participação efetiva do Grupo A nas discussões do Espaço Marx

Constatamos até o momento algo que se pode observar em qualquer processo de

formação e que aparece na própria realidade da prática do espaço Marx: quem efetua sua

parte individual para participar do estudo coletivo, nesse caso a leitura prévia, tem mais

facilidade, por saber previamente o que vai ser estudado, de participar das discussões.

Porém, essa não é a única conseqüência decorrente desse fato, relativamente óbvio,

analisaremos outros no próximo ponto de análise.

Considerando as mudanças promovidas pelo espaço na vida de seus participantes,

propomos coletar e expor dados sobre determinadas dimensões das relações sociais que os

participantes estabelecem: a) Acadêmica, b) Profissional, c) Pessoal e d) Militância, sendo

que nesse último aspecto não consideraremos as respostas de 2 (dois) participantes, pois os

mesmos, não atuam em nenhuma organização, seja reivindicatória ou revolucionária.

Essa divisão dos aspectos de vida tem por finalidade somente enfatizar momentos

em que estes estão mais presentes, entendemos sim que existem consistentes relações entre

eles, utilizamos essa separação momentânea como um recurso didático para melhor

detalhar os impactos promovidos pela inserção dos participantes no Espaço Marx.

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Em relação ao impacto provocado por esse processo de estudo nas 4 (quatro)

dimensões de suas vidas explicitadas, os participantes posicionam-se unanimemente em

avaliar que aconteceram mudanças significativas.

Em sua vida acadêmica os entrevistados afirmam que essa mudança se deu

principalmente no fato do conteúdo trabalhado no espaço Marx passar a servir como base

de sua fundamentação teórica para o estudo de outros conteúdos mais específicos.

Em sua vida profissional conseguem uma percepção maior das posições de classe

colocadas nas discussões e atuações em sua área, como fica claro nessa resposta de um dos

participantes: “no campo profissional, fez eu ter a consciência e a possibilidade de revelar

questões ideológicas colocadas diariamente em minha profissão, bem como a

possibilidade de estabelecimento de relações mais generalizadas tanto do campo político

como econômico.”

Em sua vida pessoal os participantes apontam mudanças profundas no modo de

compreender e de se posicionar perante a realidade em que estão inseridos, pois “nos

apresenta um método de interpretação da realidade que nos capacita a atuar de maneira

mais eficiente para enfrentar os problemas do cotidiano”. Proporcionando uma “visão

mais crítica” sobre o cotidiano, ou ainda na exemplificação de um outro entrevistado “não

consigo olhar na rua ao andar e me manter com a mesma postura, fico indignado com

tanta desigualdade e esta indignação serve como combustível político para todas as ações

de minha vida.”

Em sua militância os participantes apontam uma mudança qualitativa de sua

atuação na militância que, mesmo considerando algumas dificuldades que serão apontadas

no ponto de análise seguinte, pois as discussões desse processo de estudo “transformaram-

se na base teórica de minhas atuações enquanto militante.”

Esses apontamentos são significativos para a constatação de que o Espaço Marx, ao

trabalhar o aprofundamento teórico marxiano, promove mudanças substanciais de seus

participantes no sentido de consolidação de sua opção de classe na totalidade dos aspectos

que compõem suas vidas. Aprofundando a consciência revolucionária de seus participantes

inclusive no aspecto da necessidade organizativa para a ação.

Já em relação à aplicação dos conteúdos trabalhados no espaço Marx, nestas outras

dimensões da vida dos participantes, os resultados obtidos se encontram na figura 10.

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91,66%

8,34%

SimNão

Figura 10 – Capacidade de aplicação da teoria marxista em outros espaços

Constatamos que a grande maioria, 91,66%, acreditam que conseguem aplicar a

teoria nos outros espaços, sendo que mesmo com essa constatação positiva, 50% dos

participantes indicam que encontram certa dificuldade em aplicá-la na sua militância.

Outro fato observado é que a porcentagem de 8,34% de incapacidade de aplicação da

teoria, deve-se a um participante que apontou anteriormente, dificuldade em participar

efetivamente nas discussões e que destinava pouco tempo para as leituras prévias.

Concluímos então que para aqueles que estão participando com maior dedicação e

ênfase ao Espaço Marx, os impactos qualitativos tendem a ser maiores do que aqueles que,

mesmo tendo uma freqüência semelhante, não se dedicam a suas tarefas individuais. Ou

seja, não basta 'participar' do Espaço Marx, é preciso que o 'como' se participa também seja

qualificado.

Como último aspecto analisado, temos as perspectivas apontadas pelos

participantes com relação ao espaço Marx e seu desenvolvimento, conforme resultados

apresentados na figura 11.

33,33% 33,33%

8,33%

25%

Autonomia frente a umcoordenadorMaior facilidade na utilização dateoria na militânciaAmpliação do espaço (público econteúdo)Maior preocupação compublicações

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Figura 11 – Perspectivas do Grupo A para o próximo período de estudos

Vemos pelo gráfico que a continuidade do desenvolvimento da autonomia dos

estudos torna-se um anseio presente nas perspectivas dos participantes. Fato que corrobora

a análise feita anteriormente, da necessidade dos participantes, que vão paulatinamente

persistindo em seus estudos sistemáticos no grupo, e que possam se formar enquanto

educadores socialistas. No sentido de poderem exercer essa função, tanto na possibilidade

de ampliação desse espaço, fato também apontado como perspectiva pelos participantes,

como em outras instâncias de formação.

Também constatamos novamente o anseio de coadunar o acúmulo teórico com sua

utilização na prática militante, o que fortalece juntamente aos outros aspectos desse perfil

militante, o caráter não escolástico e puramente interpretativo da realidade, na

terminologia empregada por Marx, nas Teses sobre Feurbach, desse grupo de estudos, mas

que procura contribuir concretamente na transformação da sociedade, porém com aquilo

que realmente é o objeto de seu trabalho, a formação teórica.

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5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS: ESPAÇO MARX UM INSTRUMENTO DE SEU TEMPO

Em nossas considerações finais estaremos trabalhando no sentido de sistematizar o

quadro traçado pela análise do espaço Marx, referendados pela discussão teórica inicial,

pontuando sobre os aspectos que consideramos centrais na análise do objeto como: a) sua

caracterização dentro de um processo de formação política; b) o perfil de seus participantes

e a metodologia adotada nos estudos e; c) seu papel frente à conjuntura atual da luta de

classes.

Temos acumulado então, que o processo de formação política para o

desenvolvimento da consciência de classe deve ser compreendido como um processo em

sua totalidade de momentos, dimensões e mediações, não desprezando sua interelação

enquanto aspectos constituintes de um mesmo processo, bem como não ignorando suas

características singulares e específicas.

Partindo dessa concepção de totalidade temos por conceito de formação política a

formação do militante composta pelas diferentes dimensões de sua vida e das mediações

entre elas. Um processo por qual esse militante passa na luta concreta, cotidiana

reivindicatória e/ou revolucionária frente ao capital, no seu aprofundamento teórico e na

construção de sua organização política enquanto classe. Processos que possuem um caráter

mais determinante em suas constituições específicas, mas que possuem também estreita

ligação. Entendemos, portanto, que esse processo de formação política se dá de forma

plena na medida em que o militante esteja envolvido nessas três esferas do processo de

formação.

Com esses pressupostos consideramos que o Espaço Marx é um espaço que

possibilita mais acentuadamente uma parte desse processo de formação política, qual seja,

o da formação teórica. Parte importante e constituinte do processo de formação política

para o desenvolvimento da consciência de classe revolucionária. Assumir essa identidade

de formação teórica implica em reconhecer o seu papel dentro desse processo de formação

política, que consiste fundamentalmente em aprofundar os estudos e a educação dos

militantes na teoria marxiana e nas experiências revolucionárias, como forma de subsidiar

suas ações nas lutas práticas, tanto as econômicas e reivindicatórias quanto às de

construção de uma organização revolucionária.

Sendo um espaço de aprofundamento teórico, claro também fica que seu trabalho é

mais eficiente junto aos militantes ou indivíduos que não se contentam mais somente com

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posições frente ao capital, específicas e limitadas, ou economicistas e reivindicatórias. Ou

seja, atua principalmente com aqueles que estão rompendo ou que já romperam com as

barreiras limítrofes da ideologia burguesa e mesmo que ainda não consigam desenhar ou

elaborar uma outra forma de organização da sociedade, ‘sentem’ mais ainda do que

formulam que a forma atual deve ser superada.

Se a formação política ‘espontânea’, das relações concretas estabelecidas pelos

trabalhadores frente ao capital, é capaz de contribuir fundamentalmente no processo de

formação da consciência de classe reivindicatória e até para o início de rompimento com

essa fase da consciência, para que essa se desenvolva e sistematize esse ‘sentimento’ de

superação do capitalismo, é necessário que esses trabalhadores conheçam e se aprofundem

teoricamente.

Ou ainda como nos coloca Lênin, ao analisar o impacto ‘espontâneo’ da formação

política, coloca que “os operários, perdiam sua crença costumeira na perenidade do

regime que os oprimia; começavam... não direi a compreender, mas a sentir a necessidade

de uma resistência coletiva, e rompiam deliberadamente com a submissão servil às

autoridades” (Lênin, 2005c). Porém, para que essa compreensão se tornasse possível era

necessário que a teoria começasse a fazer parte do processo de formação política desses

operários.

O desenvolvimento da história do Espaço Marx até o presente momento e em nossa

avaliação conseguiu avançar significantemente nessa característica central de

aprofundamento teórico e no desenvolvimento do processo de consciência de classe

revolucionária, tanto no amadurecimento do rompimento com a fase reivindicatória quanto

no amadurecimento da fase revolucionária da consciência.

Mesmo com esse avanço, essa transição e amadurecimento do processo de

consciência de classe, não podem ser considerados como que obedecendo a uma lógica

linear e muito menos como consistindo-se em um processo sem retorno. Mesmo

avançando na análise da sociedade capitalista em que vive e da necessidade de sua

superação, o ser humano é um ser humano primordialmente de seu tempo histórico e em

conseqüência sua consciência também.

Ou como ainda nos coloca Iasi:

“Ela é, antes de tudo, uma consciência social herdada, inercial, resultante de uma certa

ordem social de relações que se instituíram em forma de valores, juízos, concepções de

mundo, partilhados em comum por aqueles que convivem numa certa época, mas é mais

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que isto, é a expressão ideal de uma substância que corresponde à essência das próprias

relações que constituem uma sociedade dada, e, neste sentido, é uma singularidade, ou

seja, uma singular visão do mundo própria de uma forma singular de vida” (Iasi, 2004,

p.427).

Por tanto a representação social que os indivíduos fazem em suas mentes da

realidade vivida, mesmo superando a concepção social hegemônica idealmente, em última

análise ainda encontra-se determinada pelas relações materiais as quais os mesmos estão

submetidos. Não basta uma consciência revolucionária para que se construa a revolução.

Ou ainda, desenvolver a consciência revolucionária da luta de classes dentro do

capitalismo, não leva necessariamente a optar pela atuação efetiva na luta pela

emancipação da humanidade. E mesmo que se faça essa opção de lutar, esses indivíduos

ainda podem posteriormente optar por se “retirar” das lutas ou ainda escolher ir lutar no

lado oposto ao da trincheira da classe trabalhadora.

Todavia, mesmo entendendo essa possibilidade sobre a reversibilidade do processo

de consciência e dos limites do papel dessa consciência no processo revolucionário

concreto, compreendemos também que sem avançar para essa consciência de classe

revolucionária um processo de superação do capitalismo tampouco se torna possível. O

Espaço Marx tem sua contribuição na construção de um instrumento que tem possibilitado

esse avanço da consciência que transpõe os limites da sociedade burguesa, dentro do

processo de formação política de seus participantes.

Com essa sistematização das características centrais de seu papel dentro de um

processo de formação política, constatamos que atualmente o perfil daqueles que

participam do grupo de estudos é majoritariamente composto de jovens militantes

socialistas ligados à área educacional. Participantes que mesmo estando em sua maioria na

fase de consciência de classe revolucionária, ainda estão, também em sua maioria, num

grau inicial desse momento do desenvolvimento do processo de consciência de classe.

Sendo esse o perfil da expressiva maioria dos participantes, e que vem se repetindo

nos últimos três anos de sua existência, cabe-nos entender que o trabalho de

fundamentação teórica proporcionado pela metodologia de estudo do grupo deve priorizar

primeiramente a aproximação à leitura da teoria marxiana. Por trabalhar com militantes

novos que pouco ou nada leram de Marx antes de sua entrada no grupo, esse trabalho

inicial deve ser considerado como essencial, inclusive para o desenvolvimento posterior do

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aprofundamento teórico, principalmente no que diz respeito ao método de análise e

interpretação da realidade.

A importância desse aspecto da teoria marxiana aparece inclusive no texto

produzido pelo fundador Claus Germer e que subsidia atualmente essa discussão inicial:

“O método de Marx constitui tema de relevância especial para o desenvolvimento da

teoria marxista. Não me refiro ao caráter genérico da relevância do método como

momento essencial de toda pesquisa científica, mas ao caráter específico da sua

relevância atual para o marxismo, devido às consequências da acentuada diferença da

base filosófica do marxismo em relação à base filosófica da ciência não marxista, que é

dominante. A base filosófica do marxismo é o materialismo, entendido como corrente da

filosofia, que se contrapõe ao idealismo, base filosófica da ciência não marxista, e o seu

método é a lógica dialética, em oposição à lógica formal dominante. Dado o domínio

absoluto do idealismo e da lógica formal no establishment científico das sociedades

capitalistas, projetando-se ademais nos modos de pensar do senso comum em geral, e

dada a inferioridade numérica do materialismo e dos pesquisadores marxistas nestes

meios, compreende-se não só a dificuldade de apreensão das particularidades da

filosofia e do método marxistas, mas também a possibilidade da sua apreensão

distorcida pela influência dominante de um modo de pensar em tudo oposto a eles”

(Germer,2003).

Mesmo com essas considerações o Espaço Marx tem, principalmente também nos

últimos três anos, construído esse caminho de forma ‘abreviada’ e ‘aligeirada’, por ainda

se basear fundamentalmente no trabalho em poucas sessões, nos últimos três anos as

sessões destinadas a essa discussão se restringiram somente a duas, e baseado centralmente

na discussão do texto já citado “A relação abstrato/concreto no método da economia

política”, do fundador Claus Germer, que já no início do texto pontua:

“Devido às limitações inerentes à forma artigo, a cobertura do tema não pode ser

completa, não tendo sido possível, por exemplo, explorar em toda a extensão os textos

citados. Também ficaram sem aprofundar - ou foram apenas mencionados - aspectos

importantes do método de Marx e suas implicações, como por exemplo a dialética e o

sentido do seu polêmico caráter lógico-histórico, entre outros. Também não pude incluir

referências a passagens metodológicas importantes presentes em outras obras de Marx,

com destaque para o próprio O Capital e Teorias da Mais-Valia, bem como obras

essenciais de Engels e outros autores marxistas. Por prudência e método, o presente

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artigo explora basicamente os textos metodológicos iniciais de Marx (e

Engels)”(Germer, 2003).

Com esses apontamentos feitos e levando em consideração também o perfil

predominante dos participantes dos últimos três anos, ponderamos sobre a necessidade do

Espaço Marx voltar a realizar esse caminho com maior consistência teórica e com maior

tempo para seu aprofundamento. Principalmente para que essa necessidade atual, apontada

no texto base de discussão, possa ser mais eficientemente atendida.

Ao considerarmos que sem o conhecimento e aprofundamento teórico torna-se

praticamente impossível o avanço na consciência revolucionária, não podemos ignorar o

fato de que sem a apreensão correta do método que baseia e constrói essa teoria sua

compreensão e aplicação tornam-se também mais difíceis e/ou limitadas. O que pode

explicar a dificuldade de parcela significativa dos participantes em aplicar a teoria em sua

militância prática.

Podemos seguir esse raciocínio para o estudo dos processos revolucionários, onde

mesmo com todo o processo em avanço na organização dos estudos, da categorização e do

estudo do processo em seu movimento, sem essa compreensão do método de análise

científico, o seu aprofundamento fica também limitado.

Fazemos essa ponderação sobre a importância de se intensificar o estudo do método

materialista dialético, sem perder de vista os avanços no desenvolvimento metodológico do

Espaço Marx. Acentuamos esse ponto também aqui nas conclusões no sentido de

perspectivar um aprofundamento ainda maior no desenvolvimento do programa de estudos

desse espaço.

Para concluirmos nossa análise do Espaço Marx, iremos abordá-lo diante da

conjuntura atual da luta de classes, tendo a compreensão de que iremos somente trabalhar

com alguns elementos, principalmente os que compõem a luta política, mas que não

conseguiremos aprofundar essa temática em sua totalidade nessa pesquisa.

Procuraremos então minimamente delinear a importância de um espaço de

aprofundamento da teoria revolucionária na luta política atual. Essa luta por sua vez passa

por um momento de reorganização dos socialistas. A expressão política da classe

trabalhadora brasileira, construída como resultado das mobilizações e da efervescência da

luta de classes ocorridas a partir da década de 70 desembocando na construção do Partido

dos Trabalhadores como instrumento classista, contra-hegemônico e de objetivo

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estratégico socialista, ruiu, formatando-se dentro da ordem e dos limites burgueses (Iasi,

2004).

A reversibilidade do processo de consciência de classe encontra um exemplo

emblemático não da forma individualizada como apontávamos até agora, mas como uma

construção da própria classe em seu processo de formação política.

“Novamente a classe trabalhadora viu o produto de sua ação distanciar-se, objetivar-se

em algo que se tornava cada vez mais estranho a ela.[...] Da mesma forma que os

produtos do trabalho convertidos em mercadoria se afastam daqueles que os produziram

e voltam como uma força estranha, de modo que os produtos dominam os produtores, na

ação histórica do ser social convertido em classe, primeiro em si e depois para si, são

produzidas e objetivadas organizações e instituições que em um momento

corresponderam ao movimento livre da práxis, expressaram a fusão de classe e deram

guarida ao seu juramento, mas que podem igualmente se distanciar e se estranhar

novamente, condenando de novo aqueles que as construíram à serialidade estranhada,

transformando os sujeitos da história novamente em objetos.”(Iasi, 2004, p. 464)

Essa inflexão primeiramente moderada e posteriormente conservadora, acompanha

também o movimento real da classe em sua luta frente ao capital, como continua

argumentando Iasi:

“O PT representou o ascenso do movimento e expressou sua radicalidade no corpo de

suas formulações, mas igualmente passou a simbolizar e incorporar, paulatinamente, o

amoldamento de fato que se operava na classe no universo de suas formulações

políticas. Em vez de ser a consciência possível que mantinha a meta estratégica apesar

do momento prático de derrota, se converteu na consciência política correspondente à

derrota prática” (Iasi, 2004, p. 437).

Uma expressão política que não possuindo firmeza em sua formulação estratégica e

que não assumia a teoria revolucionária como base de seu programa, acabou por tornar-se

uma presa mais dócil e fácil às intempéries da luta de classes.

Em conseqüência da derrocada desse principal instrumento erigido pela classe,

compreendida em diferentes momentos pelos socialistas organizados e ainda em boa parte

não compreendida pelos trabalhadores enquanto classe, assistimos a uma fragmentação

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desses socialistas na procura de se reorganizar ainda que de forma predominantemente

pulverizada.

Nesse momento do processo de reorganização da classe trabalhadora, que

entendemos ainda como pertencente a uma fase inicial, visto a falta de uma organização

capaz de unificar o grande número de ‘fragmentos organizados’ que se posicionam

enquanto socialistas revolucionários e que se encontram separados atualmente, a

fundamentação teórica nos parece ainda mais essencial.

Existe a necessidade de se refletir sobre os caminhos que estão se apresentando aos

socialistas e onde seremos convocados não somente a opinar, mas principalmente a

construir. Para que essa construção possa se formar com maiores chances de evitar os

desvios já cometidos não só pela experiência dos Partidos dos Trabalhadores, mas pelo

conjunto dos partidos que se construíram historicamente como expressões da classe em sua

consciência revolucionária, é preciso que o planejamento e a formulação dessa construção

se realizem tendo a teoria revolucionária como um de seus alicerces principais.

Para que não repitamos os mesmos erros ou para que não sejamos “ecos”

emprestando as palavras de Mario Benedetti “o pior do eco é dizer as mesmas

barbaridades”.

O Espaço Marx cumpre determinando papel nesse atual momento da luta de

classes: o de fomentar a criticidade revolucionária qualificando teoricamente seus

participantes na perspectiva da transformação efetiva da sociedade capitalista e da

construção do projeto socialista de sociedade que passa fundamentalmente pela análise e

atuação da e na realidade em que vivem.

Com a certeza de suas limitações enquanto um grupo de estudos e conhecendo

paulatinamente também as suas possibilidades podemos dizer que o Espaço Marx tende a

se comportar como o poeta Thiago de Mello que em sua poesia “Para os que virão”

pondera “como sei pouco e sou pouco, faço o pouco que me cabe me dando por inteiro.”

A revolução com certeza não começa no Espaço Marx da UFPR, mas também

certamente passa por espaços como esse. Nos tempos em que vivemos vale concluir com

as palavras de Brecht:

“Nossos inimigos dizem: a luta terminou.

Mas nós dizemos: ela começou.

Nossos inimigos dizem: a verdade está liquidada.

Mas nós sabemos: nós a sabemos ainda.

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Nossos inimigos dizem: mesmo que ainda se conheça a verdade

ela não pode mais ser divulgada.

Mas nós a divulgaremos.

É a véspera da batalha.

É a preparação de nossos quadros.

É o estudo do plano de luta.

É o dia antes da queda de nossos inimigos”(Brecht, 2005).

89

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6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Anexos

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Anexo I - Roteiro para entrevista com os fundadores do Espaço Marx

Perfil

• Qual sua formação acadêmica?

• Qual sua profissão atual?

• Sua história de militância?

Participação

- Quando surgiu? Quem participou dessa construção?

- Quais os principais motivos/necessidades que levaram a construção do Espaço

Marx?

- Por quê da sua participação nessa construção?

- Como foi definida a proposta inicial do espaço? Objetivos, metodologia,

periodicidade, público alvo. Breve histórico.

- Por que a construção de um espaço próprio e não a participação em outros espaços

de formação?

- Quais as perspectivas com a relação ao ingresso de novos participantes? Qual o

instrumento de aproximação, divulgação com /do espaço?

- Quais as metodologias utilizadas no desenvolvimento do espaço Marx?

- Aconteceram mudanças referentes à metodologia do projeto inicial? Quais? Por

quê?

- Quais as características principais dos participantes do espaço?

- Ocorre muita rotatividade dos participantes?

- Os objetivos iniciais sofreram mudanças? Por quê?

- Há registro da freqüência dos participantes, das discussões e do trabalho

desenvolvido?

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Avaliação

- Com relação aos objetivos iniciais e os que foram estabelecidos posteriormente,

qual o saldo?

- Com relação as metodologias utilizadas, quais as mudanças mais significativas? O

que tais mudanças proporcionaram?

- Com relação aos participantes do espaço, quantos permaneceram, quantos saíram?

Existem contatos ou registros?

- Desses dois grupos (permanecentes e que saíram) o que fazem com a formação que

construíram no espaço?

- O espaço tem a preocupação de sistematizar, publicizar, produzir materiais

referentes às discussões desenvolvidas? Quais? Qual a utilização desse material?

- Como se dá atualmente a organização do espaço? Já foi diferente?

- Quais as suas perspectivas para o espaço no próximo período? Objetivos,

metodologia, resultados, continuação.

- Existe a preocupação em formar formadores? Como?

- Existe diálogo com outros espaços de formação? Quais?

- De acordo com o trabalho desenvolvido, a metodologia utilizada no espaço está de

acordo com o método marxista?

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Anexo II - Questionário para os participantes dos grupos 1 e 2 do ESPAÇO MARX

Perfil

1) Profissão:_________________________________________________________________

2) Estudante: Sim ( ) Não ( )

Graduação:________________________________________________________________

Pós- Graduação:____________________________________________________________

Instituição:________________________________________________________________

3) Trabalha: Sim ( ) Não ( )

Função ou cargo que

ocupa:___________________________________________________________

4) Participa atualmente de algum Sindicato de representação de classe, Movimento Social ou

Partido político: Sim ( ) Não ( )

Qual?____________________________________________________________________

5) Já participou/participa de outros Espaços ?

Quais?____________________________________________

6) Como conheceu o Espaço Marx?

( ) através de amigos

( ) através de cursos ou palestras

( ) através de professores

( ) outros

(especifique):______________________________________________________________

7) Há quanto tempo freqüenta este espaço? _______ anos _______ meses

Participação e avaliação

8) Quais os principais motivos que o levaram a ingressar no Espaço Marx?

I. ____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

II. ____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

III. ____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

IV. ____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

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9) Quando se deu a formação do grupo que você participa?____________________________

10) Com que freqüência você participa das reuniões?

( ) semanalmente

( ) quinzenalmente

( ) mensalmente

( ) outra periodicidade:

_____________________________________________________________________

11) Em relação à metodologia de estudo:

a) Você acha que ela é adequada? Sim ( ) Não ( )

Por quê?_____________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

b) Consegue atingir os seus objetivos?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

c) Já ocorreram mudanças na metodologia de estudo desde a sua entrada no espaço?

( ) Sim Não ( )

Quais?_______________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

d) O que estas mudanças proporcionaram em sua opinião?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

12) De que forma as discussões no Espaço contribuem com a sua vida profissional, acadêmica

ou em seu cotidiano?

Profissional:__________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

Acadêmica:___________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

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____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

Vida pessoal:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

13) Você utiliza outras fontes bibliográficas (livros, textos, sites) e/ou outros autores para

complementar seu entendimento sobre os textos trabalhados no Espaço Marx: ?

( )Não ( ) Sim. Quais ?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

14) Como você avalia o trabalho desenvolvido no Espaço Marx?

( )ótimo ( )bom ( ) suficiente ( ) ruim

Por quê?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

15) E sua avaliação em relação:

a)aos textos trabalhados:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

b) à profundidade das discussões:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

c) ao tempo para as discussões:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

16) Como você avalia a sua participação no espaço Marx em relação:

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a) ao tempo dedicado a leitura dos textos propostos:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

b) à participação nas discussões:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

c) às dificuldades encontradas:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

d) à profundidade das discussões:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

17) Com relação aos seus objetivos iniciais quando ingressou no espaço Marx, vc acredita que

eles têm sido atingidos ? Sim ( ) ou não ( )Por quê?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

18) O espaço tem a preocupação de sistematizar, publicizar, produzir materiais referentes às

discussões desenvolvidas? Quais os materiais produzidos pelo espaço que você conhece ?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

19) Em relação à organização do espaço, cite pontos positivos e negativos.

a) Pontos Positivos:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

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b) Pontos Negativos:

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

20) Já ocorreram mudanças na forma de organização do espaço? Quais?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

21) Existe alguma forma de avaliação do trabalho desenvolvido no espaço Marx ? Qual?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

22) Qual sua opinião sobre essa forma de avaliação?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

23) Em relação aos conhecimentos trabalhados nas discussões, você se sente capaz de trabalhá-

los em outros espaços? Por quê?

____________________________________________________________________________

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24) Quais as suas perspectivas para o espaço no próximo período? Objetivos, metodologia,

resultados, continuação.

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25) Existe algum outro ponto que você considera importante e que não foi apontado durante

esse questionário? Escreva sobre ele.

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Obrigada pela sua colaboração !

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Anexo III - Questionário para os participantes do grupo 3 do ESPAÇO MARX

Perfil

9) Profissão:___________________________________________________________

10) Estudante: Sim ( ) Não ( )

Graduação:__________________________________________________________

PósGraduação:_______________________________________________________

Instituição:__________________________________________________________

11) Trabalha: Sim ( ) Não ( )

Função ou cargo que ocupa:____________________________________________

12) Participa atualmente de algum Sindicato de representação de classe, Movimento

Social ou Partido político: Sim ( ) Não ( )

Qual?______________________________________________________________

13) Já participou/participa de outros?

Quais?_____________________________________________________________

___________________________________________________________________

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14) Como conheceu o Espaço Marx?

( ) através de amigos

( ) através de cursos ou palestras

( ) através de professores

outros(especifique):___________________________________________________

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15) Quais os principais motivos que levaram a sua aproximação e ao seu ingresso no

Espaço Marx?

I. ______________________________________________________________

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II. ______________________________________________________________

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III. ______________________________________________________________

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