epidemiologia das lesões nos praticantes de capoeira na cidade de são paulo
TRANSCRIPT
Epidemiologia das lesões na capoeira na cidade de São Paulo
Epidemiologia das lesões na capoeira
Epidemiology of injuries in capoeira in São Paulo city
1
Epidemiologia das lesões na capoeira na cidade de São Paulo
Epidemiologia das lesões na capoeira
Epidemiology of injuries in capoeira in São Paulo city
Domingos Belasco Júnior
Fisioterapeuta formado pela USP, Mestre em Reabilitação pela UNIFESP, docente de
Higiene e Socorros de Urgência – UNISA e docente de Bases e Métodos de Avaliação
da UMESP.
José Néris Nogueira
Professor de Educação Física pela UNISA, Especialista em Educação Física Escolar
pela UNIFMU, Mestre de capoeira da ONG Aldeia do Futuro.
Domingos Belasco Junior
Rua Edson Régis, 426 - Jd Guarapiranga
CEP 04770-050- São Paulo-SP-Brasil
E-mail: [email protected]
Domingos Belasco Junior
Rua Edson Régis, 426 - Jd Guarapiranga
CEP 04770-050- São Paulo-SP-Brasil
E-mail: [email protected]
Fone-fax: (0XX11)56865120
2
Resumo
O objetivo deste estudo foi através de um questionário sobre as incidências de lesões na
capoeira paulistana e analisar as áreas de maior acometimento das lesões e possíveis
associações com faixa etária e tempo de prática do esporte.
As áreas de maior acometimento das lesões foram braços e coluna lombar, seguida de
perto dos joelhos e tornozelos. Houve baixa associação entre a freqüência de lesões e
faixa etária e tempo de prática de capoeira (r=-0,13 e r=-0,12) o que sugere que as
lesões estão mais associadas aos movimentos da capoeira do que a fatores fisiológicos
da idade.
Palavras Chave: lesões, capoeira, epidemiologia
Abstract
The aim of this study was to analyze the areas more injured in capoeira practitioners of
São Paulo city and the possible relationship between the injuries and age and the
injuries and time of practice using a injury questionnaire.
The areas more injured were arms and low back, followed to knees and ankles. The low
association between the injuries and age and the injuries and time of practice(r=-0,13 e
r=-0,12) suggests that the injuries are associated with the movements of capoeira more
than the physiologic factors of age and time of practice.
Keywords: injuries, capoeira, epidemiology
3
INTRODUÇÃO
Apesar de existirem vários estudos voltados para a capoeira, não temos um estudo
conclusivo da sua verdadeira origem, porém com base nas pesquisas da maioria dos
estudiosos (Acordean,1999;.Pinatti et al, 1983; Soares, 1999), sabemos que a capoeira é
descendente da cultura africana e que se deu no processo de colonização do Brasil. Os
estudos que apontam a capoeira como sendo brasileira, (Santos, 1996; Vieira, 1998)
alegam que apesar de muitos países europeus terem sofrido as mesmas influências da
cultura africana, não se encontram focos da capoeira com as mesmas características, e
sim danças semelhantes.
Hoje a capoeira, é um esporte muito popular no Brasil, assim como o futebol (Cohen et
al, 1997) e está presente como um esporte e uma dança, que vem sendo praticada por
muitos admiradores, e ela vem sofrendo várias mudanças no decorrer das últimas
décadas; mais recentemente vem estando presente nos meios acadêmicos, seja como
objeto de estudo ou de prática. Com a existência de campeonatos e sendo alvo de
pesquisa, principalmente na área de origens históricas e pedagógicas a capoeira está se
finalmente recebendo a atenção que merece. Muito já se foi levantado sobre a capoeira,
porém são poucos os estudos com respaldado científico, dentro e fora da literatura
brasileira, sobre os aspectos fisiológicos e epidemiológicos que sustentam esta prática
(Moraes et al, 2003).
Atualmente não temos dados detalhados sobre o número e as características dos
praticantes de capoeira na cidade de São Paulo, mas sabemos que existe um elevado
número de praticantes em agremiações e clubes, a maioria sem nenhum tipo de
legalização ou referência.
4
As informações conhecidas sobre a freqüência de lesões restringem-se à literatura
associada aos esportes de contato (McLatchie et al, 1980, Shirley, 1998,) faltando
informações sobre as características dos acometimentos traumáticos relacionados à
prática da capoeira o que foi uma motivação ao desenvolvimento de um instrumento de
avaliação das incidências de lesões na capoeira paulistana.
O objetivo deste estudo foi verificar quais as variáveis que estariam relacionadas mais
fortemente com as lesões nos atletas de capoeira assim como identificar quais as áreas
mais acometidas.
MATERIAL E MÉTODO
Sujeitos
Adotaram-se como critérios básicos de procedimentos a inclusão no estudo de atletas de
ambos sexos, 127 homens, 72 mulheres, somando um total de 199 entrevistados, sendo
os mesmos com uma faixa etária acima de 12 anos (19 ( 7 anos) e com mais de um ano
de treinamento com a média de 6,2 horas de treino por semana. Os atletas eram
convidados pessoalmente a participar do questionamento, podendo ou não participar
conforme sua vontade.
Tabela 1 – Características dos Indivíduos
Média DP
Idade 19 6,90
Peso 59 12,90
5
Estatura 1,66 0,10
Desenho metodológico
Depois de devidas fundamentações bibliográficas (Carazatto et al, 1996) realizadas,
adotou-se como desenho básico da investigação um questionário de incidência de lesões
elaborado pelos autores que se constituiu de uma abordagem epidemiológica de
interesse originalmente clínico voltado especificamente para os atletas de Capoeira.
Consistiu de um procedimento de campo em que perguntas foram direcionadas com o
objetivo de identificar informações sobre a morbidade, obtidas sem instância de
medição a partir do contato com as próprias pessoas afetadas, assumindo o pressuposto
de que o não envolvimento direto de conotações médicas seja substituído pelo próprio
depoimento de tais agentes sociais obtidos dos atletas de capoeira.
Encerra, portanto, para o caso, algumas limitações dadas as naturais diferenças entre os
interesses da Educação Física, levando à necessidade de se procederem a adaptações
para a realidade em voga, entre as quais a adoção de questionário de simples
compreensão e com poucos termos técnicos como instrumento a ser empregado.
Complementarmente, uma dificuldade averiguada seria a falta de compreensão de
terminologias médicas, o que foi sanado pelo esclarecimento das dúvidas, desenvolvido
de forma padronizado, pois a entrevista dos atletas foi sempre feita pessoalmente pelo
mesmo pesquisador na academia em que o atleta treinava.
Esse estudo foi aplicado nas diversas regiões que ocorre a prática de capoeira na cidade
de São Paulo subdivida em região sul, norte, leste, oeste e central.
Análise Estatística
Os valores obtidos nas tabelas e no questionário são expressos em valores absolutos e
6
relativos (percentagem do total) e em média e desvio padrão, para os valores
antropométricos que caracterizam os sujeitos. As associações foram feitas através da
Correlação de Pearson, considerando um p<0,05.
RESULTADOS
As características das lesões foram consideradas segundo os seguintes aspectos:
distribuição nos segmentos corpóreos (Tabela 2), em relação à idade (Tabela 3) e ao
tempo de prática (Tabela 4).
7
Tabela 2 – Distribuição da freqüência das lesões segundo segmento corporal
nºlesões n tempo relativa
101 59 1 23,8
124 57 2 29,2
53 26 3 12,5
46 21 4 10,8
15 6 5 3,5
18 5 6 4,2
3 2 7 0,7
14 4 8 3,3
8 3 9 1,9
4 2 10 0,9
8 3 12 1,9
5 1 13 1,2
5 1 14 1,2
2 2 15 0,5
8 2 20 1,9
3 1 21 0,7
4 1 23 0,9
2 1 25 0,5
2 1 31 0,5
0 1 36 0
425 199 265 100
8
Tabela 3 - Distribuição da freqüência de lesões segundo idade
idade
idade nª lesões n relativa
12 20 9 4,65
13 25 16 5,81
14 35 18 8,14
15 47 27 10,93
16 50 26 11,63
17 53 24 12,33
18 41 14 9,53
19 37 14 8,60
20 13 5 3,02
21 8 5 1,86
22 22 9 5,12
23 7 5 1,63
24 7 1 1,63
25 13 5 3,02
26 8 3 1,86
27 6 2 1,40
28 5 2 1,16
29 0 1 0,00
30 4 2 0,93
31 1 1 0,23
32 7 1 1,63
9
34 4 2 0,93
35 6 2 1,40
36 4 1 0,93
38 3 1 0,70
43 2 1 0,47
47 2 1 0,47
71 0 1 0,00
430 199 100,00
10
Tabela 4 – Distribuição de freqüência relativa ao tempo de prática de capoeira
nºlesões
Tempo de prática nºlesões n relativa
1 101 59 23,8
2 124 57 29,2
3 53 26 12,5
4 46 21 10,8
5 15 6 3,5
6 18 5 4,2
7 3 2 0,7
8 14 4 3,3
9 8 3 1,9
10 4 2 0,9
12 8 3 1,9
13 5 1 1,2
14 5 1 1,2
15 2 2 0,5
20 8 2 1,9
21 3 1 0,7
23 4 1 0,9
25 2 1 0,5
31 2 1 0,5
36 0 1 0
265 425 199 100
11
DISCUSSÃO
A presença de lesões traumáticas, freqüentes nos atletas de capoeira, leva a danos
teciduais e conseqüentemente alterações fisiológicas que atrapalham na prática
esportiva assim como nas atividades de vida diária.(Rodrigues & Pedrinelli, 1993)
A distribuição generalizada das lesões esportivas relacionadas à prática da capoeira está
intrinsecamente associada à natureza dinâmica e diversificada dos movimentos contidos
na ginga e nos golpes. Uma sobrecarga mais acentuada, representada por uma maior
incidência, é apresentada nos braços, que servem de apoio para muitas bases de golpes
assim como na região da coluna lombar pela própria postura no momento da ginga e nas
várias situações que o atleta tem que submeter a coluna lombar a uma hiperextensão.
Outros segmentos corporais muito afetados são os membros inferiores, principalmente
representados pelos joelhos e tornozelos.
As lesões relacionadas à prática da capoeira se apresentam distribuídas
equilibradamente no decorrer das diferentes faixas etárias, não apresentando associação
do acometimento das lesões com o desenvolver da idade (r=-0,13, p<0,05),
aparentemente o impacto fisiológico relacionado com o envelhecimento não predispõe o
praticante ao desenvolvimento de qualquer tipo de lesões relacionadas à prática
esportiva em estudo.
Uma outra associação que poderia estar presente com as lesões desportivas da capoeira
seria o tempo de prática no esporte, o que não ocorreu (r=-0,12, p<0,05), o que sugere
uma adaptação das estruturas orgânicas ao treinamento e à pratica do esporte. A
tendência de apresentação de lesões traumáticas em detrimento das associadas a
esforços repetitivos poderia explicar esta baixa correlação encontrada do número de
lesões com o tempo de prática na capoeira.
As lesões podem ter várias etiologias e um estudo minucioso dos mecanismos merece
12
ser desenvolvido posteriormente. (Prati, 1992)
CONCLUSÃO
As áreas de maior acometimento das lesões foram braços e coluna lombar, seguida de
perto dos joelhos e tornozelos. O presente estudo sugere que as lesões estão mais
associadas aos movimentos da capoeira do que a fatores fisiológicos da idade e do
tempo de prática.
13
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Acordean, B, A. ( 1999). Água de beber camarada, um bate – papo de capoeira:
Salvador, Bahia: EGBA
Cohen, M., Abdalla, R.J., Ejnisman, B., Amaro, J.T.(1997). Lesões ortopédicas no
futebol. Revista Brasileira Ortopédicas. Vol. 32. N.º 12. Pg 940-944.
Carazzato, G.J., Cabrita. H., Castropil,.W.(1996). Repercussão no Aparelho locomotor
da prática do judô de alto nível. Revista Brasileira de Ortopedia. Vol. 31. N.º 12. Pg
957-959.
McLatchie, G., Davies, J.E., Calouney, J.H.(1980).Injuries in karate: a case for medical
control. Journal of Trauma. Vol. 20. Pg. 956-971.
Moraes, E.R.P., Silva, M.A.G., Santos, J.P. (2003). A prevalência de lombalgia em
capoeiristas do Rio de Janeiro. Fisioter.Brás. Vol. 4. Nº 5. Pg. 311-9.
Pinatti, D., & Oliveira, G. (1983), Capoeira, São Paulo. Grupo de Comunicação Três
Ltda.
Prati, M.A.E. (1992). Lesão: fatores desencadeantes e prevenção. Fisioterapia em
Movimento. Vol. V. N.º01. Pg 09-19.
14
Rodrigues, L.R. & Pedrinelli. (1993) Uso do gelo nas lesões traumáticas de esporte.
Revista Paulista de Educação Física. Vol7, Nº 2. Pg 66-76.
Santos, V, S. (1996).Conversando nos bastidores com os capoeiristas. São Paulo:
Prima Ltda.
Shirley, M.E.(1992) The taekwondo side kick: a kinesiological analysis with strength
and conditioning principle. National Strength and Conditioning Association Journal.
Vol.14, Pg.72-78.
Viera, L , R,(1998). O jogo de capoeira. Rio de Janeiro: Sprint.
15