epidemia 5 decadas de homicidios

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7/17/2019 Epidemia 5 Decadas de Homicidios http://slidepdf.com/reader/full/epidemia-5-decadas-de-homicidios 1/6 C8  Cidades/Metrópole  DOMINGO, 14 DE OUTUBRO DE 2012 O ESTADO DE S. PAULO 1961 6,4 1962 6,4 1963 8,1  1964 7,7 1965 8,3 1966 9,0 1967 9,2 1 8 10,4  1969 9,9 1960  5,7 Grupos erammais letais que a ditadura ENTRE 1960 E 1999, HOMICÍDIOS PULARAM DE 217 CASOS PARA 6.653. EM 2000, AS MORTES COMEÇARAM A CAIR ESCALADA “GUARDEI(ORELÓGIO DEUMAVÍTIMA)SÓDE LEMBRANÇA” Bruno Paes Manso “P aracadapo- licial mor- to, dez ban- didos vão morrer”,  bradou em novembro de1968oin-  ve sti ga dor  Astorige Correia,o Correinha, nafrente de jornalistas durante o enter- ro de Davi Parré, investigador mortoporumtraficantedazo- nanortedeSãoPauloconheci- docomoSaponga.Ojuramen- toantecipavaasériedeassas- sinatos praticada por poli- ciais civis do famigerado es- quadrão da morte liderado pelo delegado Sérgio Para- nhos Fleury. Nasemanapassada,afa- tídicasentençavoltouaas- sombrar o cotidiano dos paulistas como se as 130 mil mortes ocorridas em 52anostivessemsidoin- suficientes para dar li- ções.Ohomicídiodepo- liciais militares na Bai-  xada Santista e em Ta-  boãoda Serraprovoca- ramumasequênciade 20 homicídios nos  bairrosvizinhos. Mo- radores que viram o massacre apontaram PMs à paisanacomosuspeitos. Emdoismomentosdistantes, separadospormaisdemeiosécu- lo, a vingança continua fazendo aengrenagemdoshomicídiosgi- rar. Para compreender a violên- cianosdiasdehoje,éfundamen- talentenderavariaçãodoshomi- cídiosnosúltimos52anos.Aepi- demia dos assassinatos começa nofimdosanos1960,depoisque asmortesàbalapassamaservis- tas como uma maneira de se manter o controle dos roubos emumacidadequecresciadesor- denadamente.  Antes disso, o mundo do cri- me em São Paulo era quase ro- mântico, palco dos desviantes quevagavamnabocadolixoper- to da Estação da Luz e da velha rodoviáriadocentro.Nochama- do Quadrilátero do Pecado, re- gião da Avenida Duque de Ca-  xias, que no futuro se transfor- mariana cracolândia, emvezde revólveres, os malandros usa-  vam navalhas em noitadas abas- tecidasporanfetaminase desti- lados. Maisdoqueumredutodecri- minososviolentos,o submundo paulistano era palco de contra-  venções e contraventores que  vendiam sexo, jogos de azar e drogas leves. Assassinatos, nes- se tempo, eram a opção dos vi- lões,malvadoseloucos.“Ostem- pos eram outros. O crime que maisassustavaeraofurtoqualifi- cado, quando o ladrão invadia umcomércioouumacasaquan- doodonoestavafora”,lembrao criminalista Roberto Von Hyde, de 82 anos,que defendeu crimi- nosos perseguidos  pelo esqua- drão,alémdeJoãoAcácioPerei- ra da Costa, o Bandido da Luz  Vermelha,que em 1967 foi preso porassaltarcasasematarquatro pessoas. “Crimes de sangue” envol-  viamgeralmentehistóriasdema- ridostraídos,que,movidospelo ódioincontrolável,muitasvezes matavamasiprópriosemtragé- dias passionais à la Nelson Rodrigues. Entre 1960 e 1965, em mais da metade dos assassinatos em São Paulo,corposdevítimasfo- ram encontrados dentro de casa,revelandoforteassocia- çãoentreessetipodecrimee paixõesdomésticasmalresol-  vidas. Por serem ações treslouca- das,osassassinossofriamcon- trole acirrado de instituições e dasociedade. Casos comoo de Benedito Moreira de Carvalho, que ficou conhecido como o Monstro de Guaianases ao ser acusadodeviolentarematardez mulheres entre 1950 e 1953, tor- navam o homicida um pária, odiado e caçado como persona- gemdefilmedeterror. Mudança. A epidemia de assas- sinatos em São Paulo começou quando homicídios passaram a servistoscomoferramentapara limpar a sociedade dos bandi- dos.Comocrescimentodosrou-  bose dos assaltosa bancono fim dos anos 1960, viraram instru- mentodeextermínioouvingan- ça para ser usado em benefício dapopulaçãocommedo. Emvezdemonstros,oshomi- cidasquealegavamagiremdefe- sadasociedadeetornaracidade mais segura se transformaram em heróis. Os chamados “pre- suntos” eram desovados em es- tradas de São Paulo, depois de seremretiradosdepresídiosco- mooantigoTiradentes. Chefedoesquadrãodamorte, o delegado Fleury – que come- çou em 1968 a matar suspeitos comajudadeoutrosintegrantes do bando – virou um dos ídolos doperíodo,recebendohomena- gensemletrasdecançõespopu- lares.Eosmétodoscruéisdoes- quadrãotambémganharampres- tígio durante o regime militar. Técnicas de tortura e assassina- tospassaramaserusadasporin- tegrantes do Exército e da Polí- cia Militar no combate à guerri- lha e para desbaratar os grupos deesquerda.Em1969,Fleuryes- tava à frente da emboscada que levouà mortedolídercomunis- taCarlosMarighellanaAlameda CasaBranca,nos Jardins. Rota. No combate ao crime co- mum, policiais das Rondas Os- tensivasTobiasdeAguiar(Rota) assumiramnosanos1970opos- to de “caçadores de bandidos”, celebradospelopovo.“Embair- ros das periferias, a população pedia para beijar nossa mão”, lembrao coronelNiomarCyrne Bezerra, ex-comandante da Ro- tanaépoca. Nosanos1980,saiudaPMum dosprincipaismatadoresdahis- tóriadacidade.OsoldadoFloris-  valdode Oliveira,conhecido co- mo Cabo Bruno, morto há duas semanasdepois de ficar 27 anos naprisão,iniciousuacarreirade  justiceiromatandoa soldode co- merciantes. Logo justiceiros pi- pocaramportodos os cantos de SãoPaulo.Deformageral,todos alegavammatarbandidosemde- fesadostrabalhadores. Em 1987, depois da prisão de FranciscoVitaldaSilva,justicei- ro conhecido como Chico Pé de Pato,apopulaçãodoJardimdas Oliveiras, na zona leste, foi em pesoaoFórumdeSantanapedir sua liberdade. Comopassardosanos,noen- tanto,foificandomaisclaroque oshomicídios,emvezdecontro- laremo crime,acabavamprovo- cando novos assassinatos, em círculosininterruptosdeviolên- cia. Se por um lado eliminavam suspeitos, consolidavam tam-  bém nesses bairros o medo da morteeestimulavamodesejode  vingança. Éoquerevelaahistóriadoma- tador César de Santana Souza, quenosanos1990diziatermata- domaisde50pessoasnoGrajaú, na zona sul. Ele praticou o pri- meiro homicídio por vingança, depois que um amigo foi morto emumcampinhodefutebol.Ju- rado de morte por inimigos que queriamvingança, passoua ma- tar porrazões cada vezmais ba- nais, semprequepressentiaque corriariscodesermorto.Eleche- gouaacreditarqueaviolênciao ajudariaa dominaro bairro. De- poisdeumtempo,percebeu,no entanto, que homicídios ser-  viam apenas para provocar no-  voshomicídios.Em 2006,termi- nouassassinadoporintegrantes do Primeiro Comando da Capi- tal (PCC) que passaram a ven- derdrogasemseubairro. EPIDEMIA: www.estadao.com.br/acervo Dasexecuçõesdoesquadrãodamortenosanos1960aoshomicídios ordenados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) nos dias de hoje, a epidemia de assassinatos em São Paulo matou 130 mil pes- soas.Aolongode52anos,comoemumcomportamentocontagioso, os assassinatos começaram a crescer. De menos de um homicídio pordiaem1960,chegouaquaseumamorteporhoraem1999. Nesseano,acidaderegistrou63,5assassinatospor100milhabitan- tes,taxasemelhanteàdostrêsanosdeguerranoIraque.Apartirde 2000, a exemplo das epidemias, o contágio cessou e os homicídios despencaram77%aolongode11anos.Nesteano,contudo,disputas incessantes entre policiais militares e integrantes do PCC mostra- ramque essapacificaçãosesustentavasobrefrágeisestruturas. Comocompreenderessasmudançasbruscasnocomportamento doshomicidas?Dehojeaquinta-feira,o Estadopublicaumasériede reportagensparaexplicaravariaçãodosassassinatosemSãoPaulo. Omaterial éresultado de 13anos deinvestigaçõese estudose de maisdecementrevistas–muitasfeitascommatadoresqueatuaram em diferentes períodos em SãoPaulo. O trabalho resultou em uma tesede doutorado, defendidaem 28deagostonoDepartamentode CiênciaPolíticadaFaculdadedeFilosofia,Letrase CiênciasHuma- nasda Universidadede SãoPaulo(FFLCH-USP). Maioria das mortes (aqui por 100 mil/hab) era passional e em casa estadão.com.br DELEGADO FLEURY Líder do esquadrão  Assassinatos aumentam depois que passam a ser vistos como ferramenta de controle do crime Tantono Riode Janeiro quanto emSãoPaulo,o esquadrãoda morterepresentouo começo da epidemia de assassinatos. Não pelaquantidade de homicídios deseusintegrantes,masporco- locarem práticaumanovaforma devero mundo e lidar com as- sassinatosem sociedades em processodeurbanização. O esquadrãocomeçouno Rio em1958e serviude modelo para o resto do Brasil, inclusiveSão Paulo. Policiaispaulistas conver- savamcomoscariocasantesde se organizar para matar. O Espíri- to Santo, Estado que liderou o ranking dosassassinatos no Bra- silnosanos 1980e 1990,tam- bémteve seuesquadrão. Considerandol evantamentos policiaisdo período,entre 1963e 1975os grupos de extermínio formadospor policiaismataram quase900pessoasno Rio(654) eemSãoPaulo(200)– maisdo que os 20anos deregime militar. O que 5 décadas de homicídios emSãoPaulotêmaensinar Dos esquadrões ao PCC, 52 anos de  violência mataram 130 mil pessoas Online. Áudios e músicas sobre a violênciae osesquadrões  www.estadao.com.br A PMsó é criadaem 1969. Antes, cabia à ForçaPública defendero patrimônio do Estado. Pouco saía às ruas. Nodia 23 denovembrode 1968, é morto Saponga,acusa- dodemataro investigador DaviParré 9/8/1967 O delegadoFleuryconversa coma mãe deSaponga,que erajurado de morte acusado dematarum policial

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Importante conjunto de Reportagens de Bruno Paes Manso sobre as curvas de violência em São Paulo: de 1960 aos 2000.

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Page 1: Epidemia 5 Decadas de Homicidios

7/17/2019 Epidemia 5 Decadas de Homicidios

http://slidepdf.com/reader/full/epidemia-5-decadas-de-homicidios 1/6

%HermesFil eInfo:C- 8:20121014:

C8   Cidades/Metrópole   DOMINGO, 14 DE OUTUBRO DE 2012 O ESTADO DE S. PAULO

1961

6,4

1962

6,4

1963

8,1  1964

7,7

1965

8,3

1966

9,01967

9,2

1 8

10,4   1969

9,9

1960

 5,7

Grupos

erammaisletais que aditadura

ENTRE1960E1999,HOMICÍDIOS

PULARAMDE217CASOSPARA6.653.EM2000,ASMORTESCOMEÇARAMACAIR

ESCALADA 

“GUARDEI (ORELÓGIODEUMAVÍTIMA) SÓDELEMBRANÇA”

BrunoPaesManso

“P

aracadapo-licial mor-to, dez ban-didos vãom o r r e r ” ,

 bradou emnovembrode1968oin-

 ve sti gador A s t o r i g e

Correia,o Correinha, na frentede jornalistas durante o enter-ro de Davi Parré, investigadormortoporumtraficantedazo-nanortedeSãoPauloconheci-docomoSaponga.Ojuramen-toantecipavaasériedeassas-sinatos praticada por poli-ciais civis do famigerado es-quadrão da morte lideradopelo delegado Sérgio Para-nhos Fleury.

Nasemanapassada,afa-tídicasentençavoltouaas-sombrar o cotidiano dospaulistas como se as 130

mil mortes ocorridas em52anostivessemsidoin-suficientes para dar li-ções.Ohomicídiodepo-liciais militares na Bai-

 xada Santista e em Ta- boãoda Serraprovoca-ramumasequênciade20 homicídios nos

 bairrosvizinhos. Mo-radores que viram omassacre apontaram PMs à paisanacomo suspeitos.

Emdoismomentosdistantes,separadospormaisdemeiosécu-lo, a vingança continua fazendoaengrenagemdoshomicídiosgi-rar. Para compreender a violên-cianosdiasdehoje,éfundamen-talentenderavariaçãodoshomi-

cídiosnosúltimos52anos.Aepi-demia dos assassinatos começanofimdosanos1960,depoisqueasmortesàbalapassamaservis-tas como uma maneira de semanter o controle dos roubosemumacidadequecresciadesor-denadamente.

 Antes disso, o mundo do cri-

me em São Paulo era quase ro-mântico, palco dos desviantesquevagavamnabocadolixoper-to da Estação da Luz e da velharodoviáriadocentro.Nochama-do Quadrilátero do Pecado, re-gião da Avenida Duque de Ca-

 xias, que no futuro se transfor-

mariana cracolândia, em vez derevólveres, os malandros usa-

 vam navalhas em noitadas abas-tecidas por anfetaminas e desti-lados.

Maisdoqueumredutodecri-minososviolentos,o submundopaulistano era palco de contra-

 venções e contraventores que vendiam sexo, jogos de azar edrogas leves. Assassinatos, nes-se tempo, eram a opção dos vi-lões,malvadoseloucos.“Ostem-pos eram outros. O crime que

maisassustavaeraofurtoqualifi-cado, quando o ladrão invadiaumcomércioouumacasaquan-

doodonoestavafora”,lembraocriminalista Roberto Von Hyde,de 82 anos,que defendeu crimi-nosos perseguidos

 pelo esqua-drão,alémdeJoãoAcácioPerei-ra da Costa, o Bandido da Luz

 Vermelha,que em1967foi presoporassaltarcasasematarquatropessoas.

“Crimes de sangue” envol- viamgeralmentehistóriasdema-ridostraídos,que,movidospeloódioincontrolável,muitasvezesmatavamasiprópriosemtragé-

dias passionais à la NelsonRodrigues. Entre 1960 e1965, em mais da metadedos assassinatos em SãoPaulo,corposdevítimasfo-ram encontrados dentro decasa,revelandoforteassocia-çãoentreessetipodecrimeepaixõesdomésticasmalresol-

 vidas.Por serem ações treslouca-

das,osassassinossofriamcon-trole acirrado de instituições eda sociedade. Casos comoo deBenedito Moreira de Carvalho,que ficou conhecido como oMonstro de Guaianases ao seracusadodeviolentarematardezmulheres entre 1950 e 1953, tor-navam o homicida um pária,odiado e caçado como persona-gemde filmede terror.

Mudança. A epidemia de assas-sinatos em São Paulo começouquando homicídios passaram aservistoscomoferramentapara

limpar a sociedade dos bandi-dos.Comocrescimentodosrou- bose dos assaltosa bancono fimdos anos 1960, viraram instru-mentodeextermínioouvingan-ça para ser usado em benefícioda populaçãocom medo.

Emvezdemonstros,oshomi-cidasquealegavamagiremdefe-sadasociedadeetornaracidademais segura se transformaramem heróis. Os chamados “pre-suntos” eram desovados em es-tradas de São Paulo, depois deseremretiradosdepresídiosco-mo o antigo Tiradentes.

Chefedoesquadrãodamorte,o delegado Fleury – que come-çou em 1968 a matar suspeitoscomajudadeoutrosintegrantes

do bando – virou um dos ídolosdoperíodo,recebendohomena-gensemletrasdecançõespopu-lares.Eosmétodoscruéisdoes-quadrãotambémganharampres-tígio durante o regime militar.Técnicas de tortura e assassina-tospassaramaserusadasporin-

tegrantes do Exército e da Polí-cia Militar no combate à guerri-lha e para desbaratar os gruposdeesquerda.Em1969,Fleuryes-tava à frente da emboscada quelevouà mortedo lídercomunis-taCarlosMarighellanaAlamedaCasaBranca,nos Jardins.

Rota. No combate ao crime co-mum, policiais das Rondas Os-

tensivasTobiasdeAguiar(Rota)assumiramnosanos1970opos-to de “caçadores de bandidos”,celebradospelopovo.“Embair-ros das periferias, a populaçãopedia para beijar nossa mão”,lembra o coronelNiomar CyrneBezerra, ex-comandante da Ro-tanaépoca.

Nosanos1980,saiudaPMumdosprincipaismatadoresdahis-tóriadacidade.OsoldadoFloris-

 valdo de Oliveira,conhecido co-mo Cabo Bruno, morto há duassemanas depois de ficar 27 anosnaprisão,iniciousuacarreirade

 justiceiromatandoa soldode co-merciantes. Logo justiceiros pi-pocaram por todos os cantos deSãoPaulo.Deformageral,todos

alegavammatarbandidosemde-fesados trabalhadores.Em 1987, depois da prisão de

FranciscoVitaldaSilva,justicei-ro conhecido como Chico Pé dePato,apopulaçãodoJardimdasOliveiras, na zona leste, foi em

pesoaoFórumdeSantanapedirsua liberdade.

Comopassardosanos,noen-tanto,foificandomaisclaroqueoshomicídios,emvezdecontro-larem o crime, acabavamprovo-cando novos assassinatos, emcírculosininterruptosdeviolên-cia. Se por um lado eliminavamsuspeitos, consolidavam tam-

 bém nesses bairros o medo da

morteeestimulavamodesejode vingança.Éoquerevelaahistóriadoma-

tador César de Santana Souza,quenosanos1990diziatermata-domaisde50pessoasnoGrajaú,na zona sul. Ele praticou o pri-meiro homicídio por vingança,depois que um amigo foi mortoemumcampinhodefutebol.Ju-rado de morte por inimigos quequeriam vingança, passou a ma-tar porrazões cada vezmais ba-nais, sempre quepressentia quecorriariscodesermorto.Eleche-gouaacreditarqueaviolênciaoajudaria a dominar o bairro. De-pois deum tempo, percebeu,noentanto, que homicídios ser-

 viam apenas para provocar no-

 voshomicídios.Em 2006,termi-nouassassinadoporintegrantesdo Primeiro Comando da Capi-tal (PCC) que passaram a ven-derdrogas em seubairro.

EPIDEMIA:

www.estadao.com.br/acervo

Dasexecuçõesdoesquadrãodamortenosanos1960aoshomicídiosordenados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) nos dias dehoje, a epidemia de assassinatos em São Paulo matou 130 mil pes-soas.Aolongode52anos,comoemumcomportamentocontagioso,os assassinatos começaram a crescer. De menos de um homicídiopordiaem1960,chegouaquaseumamorteporhoraem1999.

Nesseano,acidaderegistrou63,5assassinatospor100milhabitan-

tes, taxa semelhante à dostrêsanos deguerra noIraque.A partirde2000, a exemplo das epidemias, o contágio cessou e os homicídiosdespencaram77%aolongode11anos.Nesteano,contudo,disputasincessantes entre policiais militares e integrantes do PCC mostra-ramque essapacificaçãose sustentavasobrefrágeisestruturas.

Comocompreender essas mudançasbruscasno comportamentodoshomicidas?Dehojeaquinta-feira,oEstadopublicaumasériede

reportagensparaexplicaravariaçãodosassassinatosemSãoPaulo.O material éresultado de 13anos de investigaçõese estudose de

maisdecementrevistas–muitasfeitascommatadoresqueatuaramem diferentes períodos em SãoPaulo. O trabalho resultou em umatesede doutorado, defendidaem 28 de agosto no DepartamentodeCiênciaPolítica da Faculdadede Filosofia, Letrase CiênciasHuma-nasda Universidadede SãoPaulo (FFLCH-USP).

Maioria das mortes (aqui por 100

mil/hab) era passional e em casa

estadão.com.br

DELEGADOFLEURYLíder do esquadrão

 Assassinatos aumentamdepois que passama servistos como ferramenta de controledocrime

● Tantono Riode Janeiro quanto

emSão Paulo,o esquadrãoda

morterepresentouo começo da

epidemia de assassinatos. Não

pelaquantidade de homicídios

deseus integrantes,mas porco-

locarem prática umanovaforma

devero mundo e lidar com as-

sassinatosem sociedades em

processo de urbanização.

O esquadrãocomeçouno Rio

em1958e serviude modelo para

o resto do Brasil, inclusiveSão

Paulo. Policiaispaulistas conver-

savamcom os cariocasantesde

se organizar para matar. O Espíri-

to Santo, Estado que liderou o

ranking dos assassinatos no Bra-

silnos anos 1980e 1990,tam-

bémteve seu esquadrão.

Considerandol evantamentos

policiaisdo período,entre 1963e

1975os grupos de extermínio

formadospor policiaismataram

quase900pessoasno Rio(654)

e emSãoPaulo(200)– maisdo

que os 20anos deregime militar.

Oque5décadasdehomicídiosemSãoPaulotêmaensinar

Dos esquadrões aoPCC, 52 anos de violênciamataram130mil pessoas

Online. Áudios emúsicassobrea violênciae osesquadrões

 www.estadao.com.br

A PMsó é criadaem 1969.

Antes, cabia à ForçaPública

defendero patrimônio do

Estado. Pouco saía às ruas.

Nodia 23 denovembrode

1968, émorto Saponga,acusa-

dodemataro investigador 

DaviParré

9/8/1967

O delegadoFleury conversa

coma mãe deSaponga,que

era jurado de morte acusado

dematarum policial

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7/17/2019 Epidemia 5 Decadas de Homicidios

http://slidepdf.com/reader/full/epidemia-5-decadas-de-homicidios 2/6

%HermesFil eInfo:C- 9:20121014:

O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 14 DEOUTUBRO DE 2012   Cidades/Metrópole   C9

1970

9,9

1971

9,6

1972

11,2 1973

10,11974 

8,41975

8,3

1976

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1977

9,0

1979

13,1

1978

10,0

1970

9,9

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18,5

Um delegado ligava para os jor-nalistas anunciando que haviaum“presunto”naestrada.Afon-te secreta tinha o apelido de Lí-rio Branco e passava a ficha cri-minal do morto. Em alguns ca-sos, os matadores deixavam aoladodocorpodesenhosdecavei-ra do esquadrão da morte. Não

 bastava matar. Era preciso avi-

sar o público, pelos jornais, queos assassinos tentavam livrar omundodosbandidos.

Entre1969e1971,maisde200suspeitosforamexecutadospeloesquadrão. O efeito dessas mor-tes, no entanto, transcenderamasvítimas.Aplaudidospelapopu-laçãoerespaldadospelasautori-dadespaulistasenacionais,osas-sassinos consolidaram em SãoPaulo a ideia de que os homicí-dios podiam ser usados comoumaferramenta eficaz paralim-parasociedadedosbandidos,aomesmo tempo em que aplaca-

 vamo desejode vingançade umapopulaçãoamedrontada.

“Os efeitos dos assassinatospraticados pelo esquadrão sãosentidos até hoje. A limpeza so-cial continuou sendo defendidae praticadapor gruposde exter-míniohojelocalizadosprincipal-mente na Polícia Militar”, afir-ma o padre Agostinho DuarteOliveira, de 81 anos, na sede doInstituto Brasileiro de CiênciasCriminais, em SãoPaulo.

 Amigo de infância do delega-do Sérgio Paranhos Fleury, comquem jogava futebol no mesmoclube da Vila Mariana, padre

 Agostinho conseguiu, em 1969,autorização do secretário da Se-gurançaPública,HelyLopesMei-relles, para ingressar no antigoPresídioTiradentes,emSãoPau-lo, onde a presidente DilmaRoussefftambémcumpriupenacomoutros presos políticos, se-parada dospresoscomuns.

Conversando com os deten-tos, padre Agostinho descobriucomooesquadrãodamorteagia.Os presos comuns eram retira-dosdascelasnasmadrugadaspa-ra serem exterminados e teremocorpocheiodebalasjogadoemalguma estrada. Para provar oquefalava,oreligiosoconseguiua lista oficial dos presos. Comoelesapareciamnasestradascomsuasidentidadesdivulgadas nos

 jornais, bastava checar a lista e verquem deveriaestar nascelas.“Eucompravaoantigojornal No-tícias Populares e lia o nome dosmortos para saber se eram osqueestavamno Tiradentes.”

Vingança. Depois da morte deSaponga, em vingança ao crimecontra o investigador Davi Par-ré, as execuções do esquadrãopassaram a se tornar corriquei-ras e banais. Jornais da épocacontabilizavam o total de mor-tos anunciados pelo esquadrão.Havia uma certa tolerância comessas ações, cujas investigações

eram inexistentes. Afinal, aque-les que deveriam investigareramos mesmos quematavam.

O jornalista Afanásio Jazadji,quecobriaoassuntonoperíodo,lembraquando,certanoite,aten-deuumtelefonemanasaladeim-prensa da central de polícia queexistia noPátiodo Colégioe lhedisseram que havia quatro cor-pos jogados em um matagal emGuararema, na Via Dutra. Ini-ciante, elefoiapuraro crimeem

 busca de um furo semfalar paraos outros jornalistas, que conti-nuaram jogando baralho. Paraevitar que concorrentes depoischegassem ao local e reportas-sem a informação aos seus jor-nais, mudou os corpos de lugarparadespistarosoutroscolegas.“Imagina. Naquele tempo issoera possível. Foi quando deixeideserfoca.”

 A situação dos integrantes doesquadrãomudouem17dejulhode 1970, depois da morte de ou-tro investigador. O suspeito daautoria da morte do policial

 Agostinho Gonçalves de Carva-lhoeraumjovemde20anosco-nhecido como Guri. No mesmodiadamortedoinvestigador,oi-to corpos baleados foram leva-dosao InstitutoMédico-Legal.

OpromotorHélioBicudo,quepassariaaatuarnocasodoesqua-drão, descobriria, com a ajudaposterior do padre Agostinho,que quatro mortos tinham sidoretirados do Presídio Tiraden-

tes.Nosdiasqueseseguiram,pa-ra achar Guri, Fleury e seus ho-mens foram acusados de tortu-rar os pais do suspeito para que

elesoentregassem.Guri acabou sendo encontra-

donamatafechadadeumafazen-danoParquedoCarmo,nazonaleste. Os policiais chegaramacompanhados de jornalistasquedescreveramacenanosdiasseguintes nos jornais. Guri foimortocommaisde100tirosemseu corpo, que ficou desfigura-do. O homicídio, anunciado aosquatro ventos pelos policiais,

provocou a reação das institui-çõescomooTribunaldeJustiça.Em agosto de 1970, o depoi-

mento do padre Agostinho, desobreviventese de presos do Ti-radentes ajudaram o então pro-motorHélioBicudo,hojeprocu-radoraposentado,eojuizcorre-gedor Nelson Fonseca a inicia-remoprocessoquelevariaaoin-diciamento de 35 pessoas. Sóseis foram condenadas. Apesarda dificuldade em punir, os au-

tostrouxeramàluzinformaçõespreciosas.

 Vieram à tona, por exemplo,daods de que traficantes de SãoPaulo eram beneficiados pormortes praticadaspelo grupo. A promiscuidadedepoliciaiseban-didos da boca do lixo motivou

 váriasmortes do esquadrão,queprotegiatraficantesamigosderi-

 vais,como revelaramdepoimen-tosdo processo.

“A violência era tolerada por-que aparentemente ocorria emdefesadasociedade,masnaver-dadeerausadaparaacobertarou-tros tipos de crime”, lembra Bi-cudo,umdosprincipaisrespon-sáveispelasinvestigaçõesdope-ríodo,hojecom92anos.“Oses-quadrõesdamorteacabaramse-guindo o caminho do crime. É oquecostumaocorrer.Engana-sequem acredita em um assassi-no”,diz.

● Emmaiode 1970,o tenente da

PolíciaMilitarAlbertoMendes

Júnior foiassassinadoa coronha-

daspelos guerrilheirosdogrupo

deCarlos Lamarcadepoisde

cair emumaemboscadano Vale

doRibeira. A informação sóche-

gouaoExércitoquatromeses

depois,quandoum integranteda

VanguardaPopularRevolucioná-

ria(VPR) foitorturado e apontou

onde estavao corpodo oficial.

A “ameaçacomunista” estava

noauge.Um dosresponsáveis

pelo cercomalsucedidoa Lamar-

caera o coronel doExército Eras-

moDias. Emcompanhia dodele-gadoSérgioParanhosFleury, ele

participouda caçadaà VPR, um

dosgrupos daguerrilhaurbana.

Trêsanos depois, em1974,Dias

assumiria a Secretaria daSegu-

rançapara combatero crimeco-

mum. Osbandidosseriamseus

novos inimigose alvos.A tortura

e os assassinatoscontinuariam

sendo as ferramentasde traba-

lhode alguns policiais.

“Desdeaquelesanos,as simu-

lações de resistênciasseguidas

demortese tornariamumadas

formas dedisfarçarexecuções”,

afirmaIvanSeixas,quehoje pre-

sideuma entidadededireitos

humanos.Emabril de1971, aos

16anos,Ivanfoi presocomo

pai,o operárioJoaquimAlencar

Seixas,doMovimentoRevolucio-

nário Tiradentes.Ambos foram

levados aoDestacamento deOpe-

rações e Informações –Centro

deOperaçõesde DefesaInterna

(DOI-Codi),formadopor integran-

tesdo Exércitoe dasPolícias Ci-

vil e Militar.O pai deIvanfoimor-

tonodiaseguinte, durante ses-

sõesde tortura. Oficialmente,

policiaisinformaramque eleha-

viamorridoem umtiroteiono dia

anterior.

A caçada aosbandidos co-

muns, iniciadapelo esquadrão

damorteno fim de1968 e adapta-

dana luta contraa guerrilha, le-

varia tensãoe medo paraasperi-

ferias emformação ao longoda

década de1970. Osnovosagen-

tesdoshomicídios seriamgru-posde policiaismilitares.

O enfrentamentoera incentiva-

dopelosecretário ErasmoDias,

quepremiava commedalhase

elogios PMsenvolvidos emtiro-

teio,comoconta o coronel João

PessoaNascimento.

ANOS 60

O ASSASSINO

ASSASSINATOS

Variaçãoseacelera a partirde

meadosde 1975e a capital

registraem 1999 quase1

homicídio porhora. Em1960,eramenos de1 por dia

129.278

Comosecretário daSeguran-

ça,coronel ErasmoDiaspre-

miava policiaisque se envol-

viamem confrontos

O esquadrão retiravaas vítimas

dospresídiose, porisso, nãose

vinculavaaos territórios.QuandoaPMpassaa matar,a partirdos

anos1970, asmortes começam

a se concentrarnas periferias

LOCAL

EFEITOS

Como crescimentodosassaltose omedo dapopulação, policiais

doesquadrão damorte passa-

rama matarsob a justificativa de

quetornavama sociedademais

segurae livredosladrões

Ohomicida deixadeser um

páriaparasetornarum herói ao

matarem defesada sociedade

CABEÇA

Emvez decoibiremos roubos,

oshomicídiosprovocama rea-

çãodaqueles quese sentemvíti-

masdos assassinos. Vingançase

disputasterritoriaiscriamcírcu-

losviciososdeviolência

 Vingadoroficial, Fleuryinicia a ondademortesPoliciais retiravam vítimas de presídio para executá-las até que um padre,um promotor e um juiz desvendaram o que havia por trás dos crimes

60

●  A epidemiacomeçou

nofimdosanos 1960e

cresceuprincipalmente

depoisde1975

“TINHADEMANTERA 

ORDEM.NÃOACEITAVA DESOBEDIÊNCIA”

CORONELERASMO DIASSecretário de Segurança

10A CURVAEntre1900e 1960,SãoPaulo nuncahaviaultrapassadoa

barreirados 10casospor 100mil habitantes. Oshomicídios

eramendêmicose nãocriavamcírculosdevingança

80 90   0070

●Apoio popular

●Rua

Sobo discursodadefesada

sociedade,poli-

ciaisdaRota

assumemo

postode

“caçadoresde

bandidos”

Nodia17 dejulhode 1970,

policiaisdo esquadrão encon-

tramGuri, queseriamorto

commaisde 100tiros

60%dapopulaçãodeSP em1970

apoiavamesquadrão(Marplan)

49%apoiavamo esquadrão porconsi-

derarembandidosirrecuperáveis

38%achavamque a Justiça nãoera

suficiente paracoibiro crime

Tiroteiocoma

políciaédisfarceparaexecuções

As mortes do esquadrãoEM 21 MESES

NOV

3

DEZ

12

FEV

12

JUL

13

JAN

8

MAR

4

ABR

6

MAI

9

JUN

2

JUL

3

AGO

4

OUT

10

SET

2

NOV

3

DEZ

9

JAN

3

ABR

2

MAR

5

JUN

5

FEV

6

1968 1969 1970

123mortos

2.351tiros

CRESCIMENTO DAS PERIFERIAS

SERRA DACANTAREIRA

PARQUEANHANGUERA

PARQUEDO IBIRAPUERA

PARQUEDO ESTADO

ÁREA URBANIZADA ATÉ 1949

ÁREA URBANIZADA ATÉ 1962

ÁREA URBANIZADA ATÉ 2002

LIMITE DA ÁREA DE PROTEÇÃODOS MANACIAIS

A EXPANSÃO DE SP

PARQUEESTADUAL

GUARAPIRANGA

PARQUEESTADUAL

DO JARAGUÁ

PARQUEECOLÓGICO

DO TIETÊ

VILAMEDEIROS

PIRITUBA

ITAIMPAULISTA

TATUAPÉ

CIDADETIRADENTES

SAPOPEMBA

VILA

MARIANA

CAMPO

LIMPO

MORUMBI

BUTANTÃ

LAPA

GRAJAÚ

MARSILAC

INFOGRÁFICO/AE

Page 3: Epidemia 5 Decadas de Homicidios

7/17/2019 Epidemia 5 Decadas de Homicidios

http://slidepdf.com/reader/full/epidemia-5-decadas-de-homicidios 3/6

%HermesFil eInfo:C- 5:20121015:

O ESTADO DE S. PAULO SEGUNDA-FEIRA, 15 DE OUTUBRODE 2012   Cidades/Metrópole   C5

1981

21,7

1984 

37,9   1985

36,9

1987

40,1

1986

36,5   1988

36,2

1989

41,7

1982

20,41980

18,5

1990

44,1

198330,5

Os homicídios passarama se

concentrarnas periferias de nor-tea sul deSãoPaulo.Nosanosque viriam, os mesmos bairrosdasperiferiasvão liderar os ran-kingsde assassinatos.

A açãoterritorial dosjusticeirose dospoliciaismilitaresprovocamdisputas localizadase concentradas na periferia

DepoisdaPM,mortesmigramparaa periferia

Bairros em área nobre da zona

sul, como o JardimPaulista, ti-nhamtaxa de homicídio europeia(3 por100 mil), enquanto mortesno Jardim Ângela ultrapassavam100casos por100 mil.

HOMICÍDIOS

forampraticados por ano

durante a décadade 1980 emsupostos casosde resistênciaseguida de morteenvolvendopoliciais militares.

Contando coma omissão e o in-

centivo da polícia,justiceiros pas-saram a matar suspeitosnosanos 1980 acreditando agir emdefesa dos trabalhadores do bair-ro e bancados por comerciantes.

A violência migra paraos territórios periféricos dacidadenos anos 1980, décadaem queo crescimentodas taxasde homicídioalcançou 144%.

ANOS 60

Justiceiros imitam policiais ematam suspeitos para tentarmanter a ordem no bairro

ENTRE1975E1989,AEPIDEMIASEACELERA:PASSA,EM1979,ABARREIRADOSMILCASOS.DEZANOSDEPOIS,ALCANÇA3.850

 A recente eleição para vereadordedoisoficiaisdareservadaRon-dasOstensivasTobiasdeAguiar(Rota) mostra como, até hoje, odiscursotruculento de combateao crime tem apelo popular.Quando na ativa, o coronelPau-

loTelhadaseenvolveuem36re-sistências seguidasde mortee ocapitão ConteLopes,em 41.

O excesso de violência virouumadascaracterísticasdacorpo-ração, postura queacabouse es-tendendoa outros batalhões. Se

durante o períododo esquadrãodamorteasvítimaseramtiradasde presídios,quandoos homicí-diossetornaramferramentasdopoliciamentoostensivoosassas-sinatosmigraramparaosterritó-riosdasperiferiasdemetrópole.

Matarse transformou em ins-trumento de trabalho de partedosPMsquetentavamcontrolarocrimedenorteasuldeSãoPau-lo. Nos anos 1980, em Guaiana-ses, na zona leste, um tenenteque pediu para ser identificadoapenas como Pereira passou a

matar quando percebeu que ossuspeitoseramrapidamentesol-tosnosdistritospoliciais.Nazo-na sul, depois de 11 anos agindodeformaviolentaaolongodadé-cadade 1980, cominúmeros ca-sos de resistência seguida de

morte,osargentoDavidMontei-rocontaquese enxergavacomoumpolicialmodelo.Sópercebeuqueestavaagindodeformaequi-

 vocada quando o comando oafastoudaruaparatrabalhosbu-rocráticos.“Nessemomentoafi-cha caiu”, recorda. Ele já haviarecusado o convite de um justi-ceiropara matarem juntos.

Em 1960, quando os homicí-diosemSãoPauloaindaeramen-dêmicos e as autoridades de se-gurança se dividiamentre ForçaPública, Guarda Civil e Polícia

Civil,oficialmentefoiregistradoapenasumóbitocometidopelasforçaspoliciaisnoEstado.Cincoanos depois, em 1965, foramduasmortes.

 A situação começou a mudarem 1970, no regime militar. A 

PM foi criada e passou a ser co-mandada por oficiais do Exérci-to. Nesse ano, as mortes subi-rampara28,pulandopara59em1975, no augeda repressão.

 A execução de suspeitos nãoparou de crescer, revelando odespreparo dos policiais. Só nadécadade1980,foram4.093mor-tes.Longedediminuirocrime,atruculência aumentou a desor-demna cidadee acendeu o sinalde alerta. Em vez de aplauso, oexcessopediria ajustes.

EPIDEMIA:

Boa partedos justiceiros costu-mavaafirmarque tinham come-çado a matardepois quefamilia-resforam ameaçados ou violenta-dos por bandidos locais.

A CURVA

Oque5décadasdeviolênciatêmaensinar

CURVADEHOMICÍDIOS

LOCAL

JUSTIFICATIVA

L.GEVAERD/AE

70   80   90   00   10

PAULOCERCIARI/AE

Justiceiros ePMs fazemparceriaparamatarEm1987, Cabo Bruno tentouassassinarsobrevivente de chacina feita por policiais

MEDODAMORTEE VINGANÇASPROVOCAMMAISHOMICÍDIOS

Corposamanhecidos no chãoviraram rotina nas periferias.Cabo Bruno (à esquerda)agiuem parceriacom PMs

Nosanos 1980,a vida do justi-ceiroClidenorAncelmo Bri-lhante, queatuouem SãoBer-nardo, acabou virando filme.

60

ABISMO

estadão.com.br

CABEÇA

BrunoPaesManso

Opadre irlandês Jai-me Crowe chegouem fevereiro de1987aoJardimÂnge-la,nazonasuldaci-dade, para coman-dar a Igreja SantosMártires,umdospi-lares da pacificaçãodo bairro nos anos

2000. O prédio ainda estava emconstrução quando, em dezem-

 bro, no ano de sua chegada, ummeninoveiochamá-loparaaten-der a um homem armado, com

 bigodesnegros e grossos.Diante dele, estava o mais fa-mosojusticeirodazonasul:Flo-risvaldo de Oliveira, ex-policialconhecido como Cabo Bruno,quenãoseidentificouepediupa-radormirnaigreja.“EraDiados

DireitosHumanos,10dedezem- bro, eu nunca me esqueço. EunãosabiaqueeraoCaboBruno.”

Em tese, Cabo Bruno deveriaestarnoRomãoGomes,presídioda Polícia Militar onde cumpriapena por seus crimes. Mas, na-quelamadrugada,elebuscavaPi-rulito,filhodedonaLuzia,mora-dorado Jardim Ângela.

Trêsanosantes,Pirulitohaviasido o único sobrevivente deuma chacina praticada por PMscontraquatrojovens.Etestemu-nharia nos próximos dias. Paraque ficasse em silêncio, levou 15tiros.CaboBrunofugiriaoficial-mente do Romão Gomes depoisdo atentado, na noite de Natal.“EssaéahistóriadePirulitoqueme revelou a parceria entre osPMs e justiceiros”, diz o padre.Osdetalhesdaparceriaforampa-raotúmulodeFlorisvaldodeOli-

 veira, morto há duas semanas. Assassinatos praticados por

policiais para coibir roubos aca-ramincentivandoasescolhasho-micidas dos justiceiros. Comoeram tolerados pelas autorida-des, viraram opção popular. Os

 justiceiros eram bancados por

comerciantes, assim como, nadécadaanterior,industriaispau-listasjáhaviamfinanciadoaçõesnosporões do regime militar.

 A estimativa é de que os justi-ceiros tenham matado pelo me-nos mil pessoas na Grande SãoPaulo.

Conforme os assassinatoscresciam,apopulaçãodasperife-rias começava a reagir aos cor-posnomeiodaruaeàspequenastragédias cotidianas. Em vez deaumentarasensaçãodeseguran-ça,asaçõeshomicidasacabavamarmandoosespíritoseproduzin-donovosassassinatos.Cadano-

 vocaso instigavaa comprade re- vólveres, a formação de grupos

rivais e círculosde vingança.Comerciante em Diadema

nosanos1980,LaércioSoaresan-dava comduasarmas nacinturaparase protegernos campinhosdevárzeadacidade.Eleeoutrospequenos empresários tambémpagavam advogadospara defen-derosjusticeiroslocais.

Com raras exceções, os justi-ceiros eram migrantes ruraisapegados aos valores tradicio-nais das pequenas cidades ondenasceram.Chegavamacre-ditando nas oportunida-desoferecidasporSãoPau-

lo.Matavamaquelesqueviamco-mo “bandidos”, integrantes dageração de jovens urbanos, des-cendentesdemigrantes,quene-gavamos valores dospaise bus-cavam uma identidade própria.Jovens de uma geração que aca-

 bousendo dizimada na São Pau-lodosanos1980e1990.

TV Estadão. Confira análise

sobre homicídios www.estadao.com.br/

O ASSASSINO

Boinas pretas.Truculência nas

periferias

409

● Acompanhe até quinta-feiraa sérieespecialsobreseisdé-cadasde homicídios em SP.

●Emtodosos cantosde SPDa esquerda paradireita:JoãoBalaio, JonasFélix, Diógenes eÍndio, justiceiros que durante adécada de 1980atuaram nasdife-rentesregiõesda GrandeSãoPaulo. Omissão ou parceria compoliciaisacabou incentivando acarreirados matadores.

INFOGRÁFICO/AE

MORTOS PELA PM

229

1991 20120

300

600

900

1200

1500

Page 4: Epidemia 5 Decadas de Homicidios

7/17/2019 Epidemia 5 Decadas de Homicidios

http://slidepdf.com/reader/full/epidemia-5-decadas-de-homicidios 4/6

%HermesFil eInfo:C- 6:20121016:

C6   Cidades/Metrópole   TERÇA-FEIRA, 16 DE OUTUBRO DE 2012 O ESTADO DE S. PAULO

1991

45,5

1992

40,7

1995

 54,8

1996

 55,2

1998

 58,3

1999

65,3

1993

40,4

1997

 54,0

1994 

45,51990

44,1

2000

 59,4

Nosanos1990,nos territóriosviolentos,o excessode armas ederiscosinduzema escolhahomicida atéem conflitosbanais

Os homicídiosse concentramnosbairrosdasperiferias. Noano2000,a taxa emParelheiros(106 por100milhabitantes)é 28vezesmaiordo queno JardimPaulista (3,6 casospor100mil).

O resultadoda matança de jo-vens viciadosemcracké a craco-lândiano centro, quese tornaumrefúgio dosjovens quequeremfugirdas chacinasdasperiferiasda cidade.

CHACINASocorreramentre 1998 e 2000.Casosemquemorremtrês pes-soas oumais nomesmoevento,elascomeçaram a crescerde-pois demeadosdos anos 1990.

EFEITO DOMINÓ:QUANTOMAISHOMICÍDIOSEMUM TERRITÓRIO,MAIOR ACHANCE DENOVAS MORTESOCORREREM

ANOS 90

O altograuderisco,o medoex-cessivo e a grandequantidadedearmas emcirculação transforma-ramqualquerconflito em riscodevidapara osjovensque sesen-tiamameaçados.

PCCsurge domata-mata emSPe tentacriarhegemonia no crime

Noaugedo caos, 1morte levava a 150Jovens moradores de bairros violentos iniciavam conflitos incessantes contra vizinhos e disseminavam os assassinatos pelas periferias

NuncaSão Paulo registroutantos homicídiosquantoos6.653casos de1999.O total é 30vezesmaiordoqueos 217ocorridos nosanos1960.

 A mística em torno das facçõesno Rio de Janeiro começou em1981,quandoZéBigode,cofunda-dordoComandoVermelho,refu-giou-se no Conjuntodos Bancá-rios,naIlhadoGovernador,tro-cando tiros com 400 policiaispor10horasatésermorto.

Com um bom fornecedor decocaína, entre 1983 e 1986 o Co-mandodominouas bocas de fu-motradicionais,tocadas porpe-

quenos traficantes de maconha.Em1985,jádetinha70%dospon-tosdevendaemumgrandeelu-crativo mercado.

Em São Paulo, desde os anos1970, quando as taxas de crimecomeçaram a crescer, pequenascélulas isoladas de criminososse equilibravam parcamente,correndo o risco de serem caça-dasporjusticeiros,policiaisecri-minoso rivais.

O roubosempre foio negócioprincipal.O tráfico de drogas sósefortaleceria emSão Paulode-poisdosanos1990,comachega-

dadocrack.Entre1981 e 1996,o rouboem

SãoPaulo cresceu emmédia9%ao ano. Enquanto no Rio os cri-minosos se vinculavam a fac-çõesque dominavamterritóriosnosmorros,emSãoPauloosin-tegrantesdomundodocrimeserelacionavamdeigualparaigual,como indivíduos, pisando emovosedisputandopoderemter-ritórios conflagrados, onde vi-

 viam sob risco de matar ou mor-rera qualquermomento.

Nessa estrutura criminal semhierarquia, horizontal, sobra-

 vamoportunidadese motivospa-ra vinganças e assassinatos ba-nais.“Ninguémémelhordoqueninguém” sempre foi uma frase

repetida nesse cenário igualitá-rioeinstáveldasredescriminaispaulistas.Naprática,jovensdes-confiavamde outros jovens,vis-tos como homicidas em poten-cial,ematavammotivadosàsve-zespor conflitos banais.

Origem. É nesse contexto demata-mataedesordemqueoPri-meiro Comando da Capital co-meçou a se formar nas prisõesem 1993. E a se fortalecer, comdiscurso que propunha fim dasmortes de integrantes do crimee incentivoa negóciosilegais.

DENORTEA SUL, RIXASCRIAMAGERAÇÃO DE JOVENSMORTOS

EPIDEMIA:

BrunoPaesManso

Aos 21 anos, César deSantana Souza sabiaqueseu tempoestavase esgotando. Em1999, como ele pró-prio dizia, estava fa-zendo “hora extra naterra”. Juntamente

comos“aliados”JoséIdel- van dos Santose João Car-los Queiroz, ele tentava

preservaraintegridadedogrupodeamigoseahegemonianosvá-rios tipos de negócios criminaisemumapequenaáreadoGrajaú,nazonasul.

Depoisdecincoanosdeconfli-toscomjovensrivais,elecalcula-

 va que já tinha matado mais de50 pessoas. Narrou pelo menostrês chacinas. A primeira mortequepraticou foipor vingançadeum colega no campinhode fute-

 bol. Vários conflitos se sucede-

ram.“Osproblemasvãobrotan-do e parece que não acabammais”, explicou.

Em2006,César e João Carlosforamqueimadosdentrodocar-rocomoutrastrêspessoas.Apo-líciaapurouqueosautoreseramintegrantesdoPrimeiroComan-do da Capital (PCC) que passa-ram a vender drogas no bairro.Idelvan morreu no mesmo ano,assassinadonafrentedofilhode6anos.

 As periferias da São Paulo dosanos 1990 são o resultado das

mortespraticadasporpoli-ciaise justiceiros nasdéca-dasanteriores.Em1999,osassassinatos na cidade al-cançariam seu ponto maisalto na curva, com65 mor-tes por 100 mil habitantes,

semelhante à guerra do Iraque.Corpos nasruas, rodinhas em

torno dos defuntos, enterros deamigoseparentes,conversasso-

 bretiroteiose crimesfaziampar-te da rotina e popularizaram asescolhashomicidas.Nolequedealternativas dos moradores dos

 bairros violentos, o homicídiotornou-seaomesmotempoumaameaçarealeumaopçãoderea-ção. Foinosanos1990 quea en-grenagemdehomicídiosseazei-

toue passoua girar commaisforça. As mortes dos anos1980chegaramcomoumabo-ladeneve.

Em 1990, aos 15 anos, Ale- xandreRodriguesda Silvaini-ciousuatrajetórianocrimenoJardimÂngela,nazonasul. Ele e os amigos ti-nham rivais em bairros

 vizinhos. A maior dasrivalidades começouem 1995, contra osNinjas, moradoresdo Jardim Tupi.

Segundo apu-rações da polí-ciaedoMinis-

tério Público, entre 1993 e 1998as rivalidades entre grupos noJardim Ângela provocaram 156mortes, sobretudode jovens.

Mudança.  A trajetória de Ale- xandreno crimeterminouquan-doelefoipreso,em1998.Repen-souavidaehojeestáemliberda-de provisória. Virou evangélicohá quase uma década. Aos 38anos, trabalha com decoração e

é pai de duas meninas. O jovemmatador que ele foi nos anos1990cresceuemumcontexto

 violento e foi resultado dasescolhas erradas que to-mou. “Eu, de verdade,souessapessoaquevo-cê conhece hoje. Empaz”,resume.

● Nocomeçodos 1990, o crack– droga feita a partirda pasta decocaína combicarbonatode só-dioe vendida empequenaspe-dras quetornavama dose barata– aumentouo girodasbocas e aquantidadedas biqueirasnasperiferias de SãoPaulo. Viciadosemcrack, chamadosdenoias,mergulharamde cabeça no con-sumo, fazendo de tudo pornovasdoses.Eles setornaramum dos

alvospreferenciais dosmatado-res. “Noia semata compedrada,nãoprecisanemgastarbalas detão tranqueira”, diziaCésar Sou-zaem 1999,matador doGrajaú.Aschacinas– casosemque

três oumais vítimas sãoassassi-nadas– alcançaram 95casosanuaisem 2000. E eram o retra-to dadesordemgeneralizada.Namaior ocorrênciado Estado, em1998, 12pessoas forammortasemFranciscoMorato.Os auto-res, PMsque tambémfaziam se-gurança,buscavamuma meninaque testemunhariacontra elesnaJustiça.Mataramos outrospara evitaro risco desobraremmais testemunhas.“Éaquelacoisa. Está dema-

drugada, bebendo comquemnãopresta,coisaboanãodeveser”, explicavaJosé Idelvan dosSantos sobreas trêschacinasquepraticou nosanos1990.Nesse contextode extermínio,

asperiferias passarama expur-garos consumidoresparao cen-trode SãoPaulo. A cracolândiasetornariaumazona neutra, umrefúgio onde sepodiatraficarsobosolhosda polícia e consumiradrogasem o riscodeser assassi-nado.Nasperiferias, comrevólveres

emedo emexcesso, conflitosbanais podiam provocar esco-lhas homicidas. O aluno deumaescolaem Diadema explicouoassassinato praticadopor umamigo.Ele ia todamanhã levar a

irmãà aulae umjovem o encara-vado ladode fora daescola.Noterceirodia, atiroue matouo jo-vemsem questionar. “Estácerto.Desacreditou,tem demorrer.”

HEITOR HUI/AE 4/10/1992

60A CURVA

Oque5décadasdeviolênciatêmaensinar70   80   00

LOCAL

10

AGLIBERTO LIMA/AE 1/12/1998

FREDERIC JEAN/EDITORA ABRIL

REPRODUÇÃO

Em1992, 111 sãomortos porPMsna Casa deDetençãodoCarandiru. Episódio vaimudara política carcerária emSP.

A chegada do cracknasbocasdasperiferiasaumenta a quan-tidadede pontosde vendaede conflitos.

CABEÇA

estadão.com.br

REFÚGIO

Episódioda Favela Naval, emDiadema,em 1997, revela des-preparo daPMe força coman-doa mudar a gestãoda tropa.

90

TV Estadão. Confira análises

sobre homicídios

 www.estadao.com.br

O ASSASSINO

Chacinaecrackrevelamápicedadesordemnos1990

Enquanto o crime no Rioeratocado porfacçõesdesde 1980, sóno fim dos1990uma organizaçãomarcoupresençaem SP

● Acompanheatéquinta-feiraa sérieespecialsobreseisdécadas dehomicídios emSP.

Facção. Em1993, Geleiãocria o PCC comoutros presos

273

Matadores do Grajaú.Em conflitos com jovens

rivais, disputas eramtravadas na periferia

      P      A      U      L      O

      L      I      E      B      E      R      T

      /      A      E

      7      /      1      1      /      2      0      0      2

Page 5: Epidemia 5 Decadas de Homicidios

7/17/2019 Epidemia 5 Decadas de Homicidios

http://slidepdf.com/reader/full/epidemia-5-decadas-de-homicidios 5/6

%HermesFil eInfo:C- 5:20121017:

O ESTADO DE S. PAULO QUARTA-FEIRA, 17 DE OUTUBRO DE 2012   Cidades/Metrópole   C5

2001

 57,8

2003

47,7

2004 

37,3

2006

23,5

2007

17,7

2005

24,3

2008

14,8

2009

15,3   2010

14,52011

12,5

2002

 50,9

2000

 59,4

2012

13,3

2001

 57,8

Quando todospodemmatar,o homicidadeixadeter poder e ficasujeito a serassassinado.Ganhamforça, assim,soluções alternativas

Apesar de oshomicídios teremcaídoem bairrosda periferia,elescontinuamliderando os ran-kingsde assassinato.O total decasos, contudo, cai acentuada-mente ao longoda década.

INTERVENÇÃOANTIVIOLÊNCIADOESTADOFOIEFICAZ PORQUEMORADORESDA

PERIFERIAAPRENDERAMCOMTRAGÉDIAS

O CemitérioSão Luís, na zonasul, queficouconhecido comoo “cemitério dosjovens”porenterrarmuitas vítimasde ho-micídio, passoua teráreasvagase arborizadas.

A surpreendente quedaininterruptadoshomicídiossalvoumais de30 mil vidas entre 2000e o anopassado, quandoas 6.653 mortescaírampara 1.403.

ANOS 2000

HOMICÍDIOSocorreram na capital em 2011.Esse númeroé inferior ao totalde1980,quando1.470 pessoasforamassassinadasem SãoPaulo.

OMESMOOCORREUEMOUTRASCAPITAISBRASILEIRAS

BrunoPaesManso

Natalino Pereira dos San-tos chegou a São Paulo,

 vindo da pequena Jar-dim Alegre, no Paraná,em1989.Veioparatraba-lhar em um frigorífico.

Separado da mulher, com ajudadasirmãsconseguiucriarosdoisfilhos, Leandro e Edmar, dando

duro em diferentes empregos.No ano passado, seu filho maisnovo, Leandro Damião, foi con-

 vocado para a seleção brasileiradefutebol,aos22 anos.

 A trajetória de Damião no es-porte está associada à pacifica-ção não só do Jardim Ângela, nazona sul, como detodaa cidade,ondehomicídiosdespencaramapartirde2000.LeandroDamiãofezprimeiracomunhãoecrismanaParóquiaSantosMártires,on-deopadreJaimeCrowepassoualiderar, em meados dos anos1990,umacaminhadaemdefesadavida.Aquedanastaxasdeho-micídio em mais de 80% permi-tiu que ele seguisse sua trajetó-riaempaz.

Em2006,Damiãojogounoti-me de várzea do Família TupiCity,antesdesedestacarnoAtlé-

tico de Ibi-rama,deSan-ta Catarina, echamar a atençãodoInternacional,quan-doem2010marcouogolque deu ao clube o títuloda Libertadores.

O presidente do FamíliaTupiCityéomotoboyPauloEnoc. Em outubro de 2001,ele havia sido ameaçado demorte por integrantes da Gan-gue dos Ninjas, um dos gruposmaisperigososdobairronaépo-ca,protagonistaderixasquepro-

 vocaram mais de 150 assassina-tosnoJardim Ângela de1990.

Para lidar com a situação,Enoc comprou uma arma e foiconversar com Luizinho, umdos líderes da gangue. Chegou aumpagode,assustou-seeatirou,matando Luizinho e outra pes-soa.Sumiuporumtempo,foiaju-dadopelospatrõeseacabouino-centadona Justiça poratirar emlegítimadefesa.

Enoc montou o Família Tupi

City para tentar ajudar as crian-ças do bairro. Entidades do Jar-dimCopacabana,comooCiodaTerra, ajudaram a levar Damiãoaotimede várzeado bairrovizi-nho,vistocomoviolento.“Mon-tamosaescolinhadefutebol,or-ganizamos festas, distribuímosleite e tentamos ajudar as crian-ças daqui. A pacificação a partirdoano2000foifundamentalpa-ra isso”, dizEnoc.

PCC. A queda acelerada dos as-sassinatos a partir da virada doséculo ocorreu com o aumentodavendade drogase dainfluên-ciadoPrimeiroComandodaCa-pital(PCC)naregião.Masaten-são permanece na cidade, que

aindasofreameaçaderetomadada epidemia.Mesmoque ocorrapelaaçãodeoutrotipodevírus.

O PCC deMarcola(acima)nãofoicausada queda doshomicí-dios,mas resultadode políticasantiviolência.A facção ganhouforça porconseguir,dentro e foradasprisões,mediar mortes.

EPIDEMIA: Oque5décadasdeviolênciatêmaensinar

Todos perderamcomhomicídiose açãodo

Estadosurtiu efeito

70   8060A CURVA

TIAGO QUEIROZ/AE

90

LOCAL

10

VIVI ZANATTA/AE 21/11/2005   NIGEL RODDIS/REUTERS   EVELSON DE FREITAS / AE 7/8/2006

No auge dos homicídios, em1999, José Idelvan, matador doGrajaú, autor de dezenas de as-sassinatos e de pelo menos trêschacinas, explicava que parariade matar se pudesse. “Mas nãotem como. Se eu parar, aquelesquequeremme pegarteriam vi-da fácil e eu morreria rapidi-nho”, disse. Idelvan morreu em2006,assassinadodepoisqueou-troscincocolegasforamqueima-dosdentrodeumcarro.

 Aqueda dosassassinatosocor-reuporque,depoisqueoshomi-cídios se disseminaram e se po-pularizaram,todosseprejudica-

ram, incluindo os assassinos,que passaram a ser jurados demorte.Nosanos1970 e 1980,osassassinosaindatinhamailusãodequeseuscrimespodiamexer-ceralgumcontrolenoterritório.

 Vinte cinco anos demortes ensinaramque não era bem as-sim:adesordemten-desóaaumentar.

Os homicídios eosassassinos,noen-

tanto, não mudaram sozinhos.Dependeramdeumaforçaexter-na, capaz de induzir potenciaishomicidas a optar por soluçõesalternativas.Só o Estado tinha acapilaridade e a capacidade deagir com abrangência suficienteparareverterastaxasdehomicí-dios em quase todas as cidadespaulistasa partir de 2000.

 As políticas mais importantescomeçaramaserexecutadasnosanos1990,provocadasporacon-tecimentostrágicos.Depoisdes-sasações,omundodocrimenun-camaisseria o mesmo.

O massacre do Carandiru,

quando111presosmorreramem1992, foi um desses episódiostransformadores.

Cincomesesdepois,foicriadaa Secretaria da AdministraçãoPenitenciária,que ganhou auto-nomiaemrelaçãoàSecretariadaSegurançaeampliouasvagasnosistema.Entre1988ehoje,ocres-cimento de presos por 100 milhabitantes foi de 770%. Passoude 51 por 100 mil habitantes noEstado para 418 por 100 mil nosdias dehoje.

Paralelamente, o sucesso dasmedidas implantadas em Nova

 York, que pela primeira vezcon-seguiu reduzir homicídios emcurtoprazo,incentivouamudan-ça no patrulhamento dos poli-ciais militares, que passaram aagirnoslugarescomtaxasmaio-res de homicídio. Um dos focosera retirar armas frias das ruas,aproveitando o rigor de novasleiscontrao porte.

Organização.No mundo do cri-me, o impacto dessas políticaspúblicaslevou a mudançasradi-cais no comportamento de seusintegrantes. Como o homicídioprejudicava os criminosos – queestãointeressadosemganhardi-nheiro roubando e traficando –,asmedidasinduziramaescolhasdiferentes.

OPrimeiroComandodaCapi-tal foi também uma das conse-quências das políticas públicas.Comoaumentodepresoseaor-ganização da facção, os debatesnas “quebradas” também aca-

 bou ajudando a controlar os as-sassinatos a partir de 2006.O círculo virtuoso entrou em

ação.Assimcomonoperíododeascensão, no qualum homicídiopodia produzir outros homicí-dios, um assassinato a menostambém provocava redução emescala.

Ascaminhadascontra a vio-lênciaaté o CemitérioSãoLuís,na regiãodo JardimÂn-gela,continuamaté hoje.

CABEÇA

00

estadão.com.br

EFEITOS

TV Estadão. Confira análisessobre homicídios

 www.estadao.com.br

Osataques praticadospeloPCCem 2006evidenciaramaopúblico a forçada facção,principalmentenas prisões.

Apósdesordemedor,mortes caemaceleradamente

Homicídios se tornamestorvo para todos,

até para assassinos, e abrem espaçopara aintervenção doEstadono crime

O ASSASSINO

● Acompanheaté amanhãasérie especial sobreseisdécadas de homicídios emSP.

Índice dehomícidiospor 100 milhabitantes

Damião. DoJardim Ângelapara a seleçãobrasileira

1.403

Jardim Ângela. Enoc comcrianças dobairro:dono dotimeem queLeandroDamiãojogou

Page 6: Epidemia 5 Decadas de Homicidios

7/17/2019 Epidemia 5 Decadas de Homicidios

http://slidepdf.com/reader/full/epidemia-5-decadas-de-homicidios 6/6

%HermesFil eInfo:C- 10:20121018:

C10   Cidades/Metrópole   QUINTA-FEIRA, 18 DE OUTUBRO DE 2012 O ESTADO DE S. PAULO

1950

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 5,7

1970

9,9

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18,5

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 59,4

2010

14,52012

13,3

ENTENDERANATUREZADOSCONFLITOS

ÉIMPORTANTEPARADEFINIRSEESSAEXPANSÃOÉCONJUNTURALOUESTRUTURAL

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Todos os homicídios registrados na capital paulista em cada um dos anos

 VIOLÊNCIA

2000

2007

Parque Santo AntonioCapão RedondoJardim HerculanoJardim MiriamJardim das ImbuiasCidade Tiradentes Jardim MirnaParelheirosCampo Limpo Parada de Taipas

92º DP47º DP

100º DP98º DP

101º DP54º DP85º DP25º DP37º DP74º DP

Os 10 mais violentos de 2000

235212

209

197

195

157

156

139

133

124

Jardim das ImbuiasPar Santo AntonioCampo LimpoJd MiriamCapão Redondo

ParelheirosJaçanãPerusParada de TaipasJd Herculano

101º DP92º DP37º DP98º DP47º DP

25º DP73º DP46º DP74º DP

100º DP

Os 10 mais violentos de 2007

57

49

47

47

46

46

40

40

39

38

INFOGRÁFICO/AE

ASSASSINATOCOMOCONTROLEINTENSIFICAA VIOLÊNCIA

Antesdoesquadrãoda morte,oassassinoera o páriae louco queassustavae provocavarepulsa.A epidemiacomeçou quando poli-ciais do esquadrãopassaramamatar alegandodefendera socie-dade. Com a açãoda PMnosanos 1970, amorte de suspeitosse concentrouna periferia, mes-molugarondeos justiceirosma-tavamnos anos 1980. A engrena-gemda violência passoua funcio-nar, comcírculosde vingançae

assassinatos.Todos perdiam.Apartirdo ano2000,com a socie-dadesaturadade tragédias,abriu-se espaçoparaque aspolí-ticas públicas tivessemmais efei-to. Os homicídios, então, caíram.

EPIDEMIA:

Homicídio

retomaalta

comembate

‘PMxPCC’Antes emqueda, índice volta a crescer apósatentadosa policiais e mortesde suspeitos

BrunoPaesManso

O

primeiro trabalho dosoldado Paulo CesarLopesCarvalhonaPo-lícia Militar foi na ba-secomunitáriadoJar-dim Ângela, na zonasul, em 1998. Carva-lhotinha26anosenos

anosseguintesfariapartedeumdosprojetosmais premiados dacorporaçãopaulista.

 Antesde começara funcionar,a base comunitária organizoudiscussões na Paróquia SantosMártires,dopadreJaimeCrowe,onde os PMs conheceram maisde200liderançasdazonasulnoFórumemDefesadaVida.Ogru-posejuntouparareverteroqua-drodobairroque,em1995,haviasido considerado o mais violen-to do mundo, com 108 homicí-diospor 100mil habitantes.

Uma das ideias surgidas foi acriação da Caminhada em Defe-

sa da Vida, feita no Dia de Fina-dos,atéoCemitérioSãoLuís,co-nhecido como o “cemitério dos

 jovens” pelo número de vítimasde homicídios. Os PMs da baseestavamsempre presentes.

Carvalho fazia cooper unifor-mizadopelasruasdobairroparainteragir com a população. NaPáscoa,eleeoutrospoliciaisdis-

tribuíam ovos para as crianças,concorrendo com o crime queusava a mesma estratégia. PMstambémabriramabaseparainte-grantesdohip-hoporganizaremcursos e oficinas.

Em21dejunho,aos40anosdeidade, Carvalho foi assassinadoenquantofazia compras.O poli-cialestavadefolga.Antesdema-tá-lo,umjovemmexeunospaco-tes do supermercado para des-

 viarsuaatenção.Outrostrês che-garam atirando.

Nos dias seguintes, oito pes-soas foram mortas nos arredo-res,em crimes comcaracterísti-cas parecidas. Na morte do co-peiro Eleandro Cavalcante de

 Abreu, testemunhas disseramque homens com toucas ninjasem carro e moto mataram compistolas silenciosas e de calibre12 de canoserrado.

Retomada. Assim como ocor-reuem2009,nesteanoasdispu-tassangrentasenvolvendomor-tesdepoliciaisedesuspeitosvol-taram a mudar a tendência dacurva de homicídios, que vinhacaindo aceleradamente. Em2009,naBaixadaSantista,oem-

 bateenvolvendomatadores nin- jas já havia causado leve aumen-to de homicídios no Estado.

Neste ano, a situação come-çou a degringolar em março.Nosoitoprimeirosmeses,osho-micídioscresceram 15,4% na ca-pital e 6,3% no Estado. Até on-

tem,81 policiaishaviamsido as-sassinados.Desses,segundoapu-raçãodaPolíciaCivil,39homensdaativae4dareservaforamexe-cutados. Outros 27 foram mor-tos em ocorrências esclarecidas

comoroubos. Gramposmostra-ramintegrantesdoPrimeiroCo-mando da Capital (PCC) dandoordensparamatarPMs–ascha-madas “xeque-mate”.

Sequências suspeitas de mor-tesocorreramlogoapósassassi-natodepoliciais.EmOsasco,oi-tomorreramdoisdiasdepoisdoatentado a um soldado que so-

 breviveu.Duassemanasmais tar-de, seis pessoas foram executa-das em Guarulhos após um PMdas Rondas Ostensivas Tobiasde Aguiar (Rota) levar um tiro.

Moradores disseram que osPMsda Rotapassaram na regiãoordenando toque de recolher.Partedosassassinatosocorreua200metrosdoatentado.Atéago-ra,os casosnão foramesclareci-dos.Nasemanapassada,20mor-tesocorreramnaBaixadaSantis-taenaregiãodeTaboãodaSerradepois de atentadosa PMs.

 Ainda é cedo para afirmar so- bre o futuro, se a tendênciaé pa-ra valer ou apenas um espasmo,comoexplicaoeconomistaJoãoManoel Pinho de Mello (PUC-

RJ),queestudaacurvadehomi-cídios em São Paulo. “Isso podeser conjuntural – uma onda deconflitosfora do nívelde equilí-

 brio – ou estrutural – quando,poralgumarazão,aumentaonú-mero e a letalidade dos confli-tos”, afirma. “Será importanteestudaranaturezadessesconfli-tosparaevitarquealgoconjuntu-ralsetorneestrutural.”

Conclusões.É importante,con-tudo,prestaratençãoaosensina-mentosqueos52anosdeassassi-natosoferecem.Paraosespecia-listas, o principal deles é que oshomicídios não podem ser maisaceitoscomorespostadeautori-dadesde segurançapública.

 A grande quantidade de resis-tências seguidas de morte reve-lam–segundoeles–despreparodaPolíciaMilitareincapacidadede prender criminosos com es-tratégias e métodos inteligen-tes. Dão brecha também paraque agentes de segurança aca-

 bemse tornandoassassinos ein-tegrantesde grupos de extermí-nioe outras quadrilhas.

Como esta série de reporta-gens mostroude domingo a ho-

 je, homicídios provocam novoshomicídios.Emvezdefunciona-remcomoferramentadecontro-le,eles aumentama desordemefazemo vírusda epidemiase es-palhar rapidamente.

Oque5décadasdeviolênciatêmaensinar

estadão.com.br

A CURVA

TV Estadão. Assista ao

documentário ‘12 Tiros’

 www.estadao.com.br

FRASES | Leia a íntegra: www.estadao.com.br

TULIO KAHNCIENTISTA POLÍTICO

“Épossível apontar acontinuidade da quedanacionaldastaxas dehomicídionospróximosanos emrazãodefatores como a diminuição de jovens na população,o

aumento do investimento emsegurançae a quedadadesigualdadeno País.”

JOÃOMANOELPINHODEMELLOECONOMISTADA PUC-RIO

“Para atingir níveis maisbaixosdehomicídios, seriaprecisomelhorara distribuiçãoderendae aumentarum poucoaspenasnas idades entre

15e 18anos. A segundaopçãonãome pareceestardisponível.”

SÉRGIOADORNOSOCIÓLOGO DA USP

“Aquestão da segurançapúblicanãomaisse restringeaoaparelhorepressivo. Outraspolíticas,com apoiodasociedadecivil, devemalcançaros cidadãoscomuns nosbairros,

solidificar laçosde cooperaçãoecontribuirpara umredesenhourbano commaiorequidade.”

LEANDROPIQUETCIENTISTA POLÍTICO DA USP

“As instituiçõesdo sistemadeJustiça criminal deSãoPauloconseguiramdeterasengrenagens que tornaramoEstadoum dosmais violentosdoPaís.O ciclo virtuosoda política

seinicia quandoo crime,queantesrecompensava, deixou deserumaalternativa viável.”

ADÍLSON PAES DESOUZACORONEL DARESERVA DAPM

“(Muitos policiais) desconhecema realidadesocial emque vãotrabalhar,confundemautoridadecomtruculência, exercíciodopodercom superpoderes,com

osquaispodemagirsegundosuasprópriasregras,cujoresultadoé maisarbitrariedade.”

●Zonade perigoSozinhos,quatro DPsda zona sul(92º, 47º, 37º

e 100º) regis-traram 789homicídios,ou 14,9%dototal dacidade.

●AlívioComdiminui-çãogeral doíndice de homi-cídios, alguns

bairros quaseconseguiramse livrar total-mente doscri-mes, masain-dahábolsões.

●Zonade perigoNobolsãoda zona sul,o total demortes caipara 180, masisso ainda re-presenta 12%doshomicídiosda capitalpaulista.

●MapavermelhoCidade tinhahomicídiosespalhadosportodososdistritos,combolsões deviolêncianaszonassul,norte, lestee central.

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1 º DP

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3 º DP

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81º DP

9º DP

3º DP

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9 º DP

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7º DP

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58º DP

 

Todos os homicídios registrados na capital paulista em cada um dos anos