educaÇÃo indÍgena no rn: movimento de emergencia …

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 6863 EDUCAÇÃO INDÍGENA NO RN: MOVIMENTO DE EMERGENCIA ETNICA NA COMUNIDADE DO CATU - RN José Mateus do Nascimento 1 Introdução O artigo trata da educação indígena potiguar a partir do movimento de emergência étnica dos Eleotérios do Catu, que vivem entre os municípios de Canguaretama e Goianinha, na microrregião sul do Rio Grande do Norte (RN). Uma comunidade de oitocentas pessoas que habitam o meio rural, as margens do rio Catu, distante 78 quilômetros de Natal, nas divisas dos municípios de Goianinha e Canguaretama, onde existe um vale, conforme observamos na Figura 1. Figura 1 Vale do Catu, Goianinha/Canguaretama, RN Fonte: Moritz, 2010, p. 36 1 Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, professor efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, Campus Natal Central. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional e integrante do Núcleo de Pesquisa em Educação (NUPED/IFRN), do Núcleo de Pesquisa em Educação, Gênero e Diversidade (NEGÊDI/IFRN) e do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação, Etnia e Economia Solidária (GEPEEES/UFPB). E-Mail: <[email protected]>.

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 6863

EDUCAÇÃO INDÍGENA NO RN: MOVIMENTO DE EMERGENCIA ETNICA NA COMUNIDADE DO CATU - RN

José Mateus do Nascimento1

Introdução

O artigo trata da educação indígena potiguar a partir do movimento de emergência

étnica dos Eleotérios do Catu, que vivem entre os municípios de Canguaretama e Goianinha,

na microrregião sul do Rio Grande do Norte (RN). Uma comunidade de oitocentas pessoas

que habitam o meio rural, as margens do rio Catu, distante 78 quilômetros de Natal, nas

divisas dos municípios de Goianinha e Canguaretama, onde existe um vale, conforme

observamos na Figura 1.

Figura 1 – Vale do Catu, Goianinha/Canguaretama, RN Fonte: Moritz, 2010, p. 36

1 Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, professor efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, Campus Natal Central. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional e integrante do Núcleo de Pesquisa em Educação (NUPED/IFRN), do Núcleo de Pesquisa em Educação, Gênero e Diversidade (NEGÊDI/IFRN) e do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação, Etnia e Economia Solidária (GEPEEES/UFPB). E-Mail: <[email protected]>.

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A comunidade é geograficamente dividida pelo rio Catu que é fonte corrente de vida

para os moradores que sobrevivem da agricultura familiar, por meio do cultivo de hortaliças,

de empregos no serviço público nas áreas da saúde e da educação, como também nos

trabalhos sanzonais na monocultura da cana de açúcar, sob o comando dos usineiros que

predominam na região do litoral sul do estado.

O termo Katu, em Tupi-guarani, está relacionado à adjetivação de “bom” ou “bonito”

que aliado a outras palavras pode explicar a bondade das pessoas, das coisas e lugares

(MINIDICIONÁRIO..., 2009). Neste sentido, a expressão “caá-catu” significa “mato bom”. A

comunidade se reuniu em torno do “i-catu” ou “águas boas”, rio catu, manancial de onde a

comunidade retira a irrigação das plantações de hortaliças e sacia a sede das parcas criações

de aves e gado.

O povo indígena do Catu, amparado pela legislação, desde o ano de 2002 inaugurou

processo de (auto) reconhecimento como comunidade indígena, elegendo como liderança um

cacique e recuperando a vivencia do ritual Toré em suas festividades. Dentro do movimento

de emergência étnica do povo indígena do RN, os Eleotérios inauguram um processo de

(auto) afirmação como remanescentes indígenas em terras potiguares, contrariando a tese

histórica da extinção de todos os povos tradicionais desse território.

O IBGE publicou, por meio do censo de 2010, que existem 2.597 indígenas em dez

municípios do RN. Dentre as principais grupos étnicos cita-se presença de remanescentes

dos Potiguara, Tapuia e Tapuia Paiaçú, distribuídos nas aldeias de Sagi – Trabanda/Baia

Formosa, Catu/Canguaretama-Goianinha, Taporá/Macaiba-São Gonçalo do Amarante,

Mendonças do Amarelão, Serrote de São Bento e Assentamento Terezinha/João Câmara,

Banguê, Trapiá e Caboclos do Assú e Apodi.

O movimento de produção da etnicidade se fortalece entre os Eleotérios, quando se

estabelece um diálogo com os povos indígenas da Paraíba, a nação Potiguara que habita

trinta e três aldeias no litoral norte da Paraíba, nos municípios de Rio Tinto, Marcação e Baia

da Traição. A interação entre índios advindos das raízes étnicas dos Tupinambás objetivou a

busca por uma realidade perdida durante séculos de opressão e violência efetivada pelo não

índio colonizador. (SILVA, 2007)

O trabalho trata da história social do tempo recente dos povos indígenas que

resistiram, preservando suas descendências e tradições no nordeste do Brasil. Por meio dos

pressupostos da História Cultural e Social possibilita-se o registro histórico dessas culturas,

que predominantemente, resistiram, preservando seus costumes pelo exercício da

comunicação oral entre seus parentes, no âmbito das práticas cotidianas nas aldeias.

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O objetivo do estudo está em evidenciar as formas de educação que consideram os

saberes da tradição presentes na aldeia indígena do Catu. Trata-se de pesquisa da história do

tempo presente intermediada pela etnografia porque se realizou observação participante do

cotidiano dos indígenas potiguares, com relação à instituição de práticas socioeducativas que

cultivam a memória identitária desses sujeitos.

A história do tempo presente ou história recente apresenta-se como campo de

pesquisa que busca se firmar, estabelecendo distinções teóricas e metodológicas diante das

praticas sociológicas e jornalísticas de estudo e registro dos acontecimentos. Nesse sentido,

“[...] o tempo presente constitui um campo científico singular, pela sua própria definição.”

(DELGADO; FERREIRA, 2013, p. 23)

Pelo auspício da Nova História, a vertente ganha representatividade entre os

historiadores, de forma que

No campo especificamente historiográfico a denominação história do tempo presente convive com outras denominações que têm no recorte temporal da contemporaneidade a sua marca. Entre essas denominações estão história imediata, história contemporânea, história recente e história atual. Todas, mesmo não tendo exatamente o mesmo significado, fazem do passado próximo o objeto de estudo do historiador e são expressivas da opção por uma temporalidade repleta de dificuldades para demarcar datas e estabelecer limites cronológicos precisos e definidos. Isto porque a história do tempo presente se dedica, na maioria das vezes, à pesquisa e à análise de experiências históricas específicas, espacialmente delimitadas e, portanto, pouco compatíveis com critérios universais e abrangentes de definições cronológicas. (DELGADO; FERREIRA, 2013, p. 24)

Trabalhar sob esta perspectiva exige do historiador da educação uma postura

interdisciplinar, de diálogo com campos de conhecimento como a Antropologia e a

Sociologia. No nosso caso específico, a observação etnográfica se apresentou como atitude

metodológica prioritária. Segundo Angrosino (2009, p. 16) “a etnografia significa

literalmente a descrição de um povo”, um campo de conhecimento que lida com gente e se

ocupa em estudar pessoas organizadas em grupos que são denominadas de comunidades ou

sociedades. O foco da ação está em compreender o modo de vida peculiar de cada um deles,

fator entendido como cultura. Para tanto, faz-se necessária a observação criteriosa de

comportamentos, costumes e crenças socialmente difundidos no interior dos grupos sociais

observados.

Nos últimos anos, a comunidade indígena Catu dos Eleotérios tem investido em ações

que fomentam e fortalecem a cultura da etnia entre os jovens e as crianças. A esse movimento

sociocultural de grupos étnicos, Arruti (1995) denomina de emergência étnica. Por séculos,

esses moradores originários do Brasil foram invisibilizados e a partir da década de 1920,

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foram amparados pela legislação do país e organizaram-se por meio de militância política

para reconhecimento identitário, legitimados pela tradição, genealogia e instituições como

Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

A esse processo de evidência étnica, Arruti (1995, p. 70) denomina de “os caminhos do

emergir” que se caracterizou por uma trajetória de luta que começa com a criação da

instituição SPI no Nordeste brasileiro, durante o período de 1924 a 1967, momento em que

“12 grupos se iniciam nas primeiras movimentações pela conquista do estatuto legal de índios

e pela consequente demarcação de terras reservadas, quase todos em locais antigos

aldeamentos, [...].” (ARRUTI, 1995, p. 70)

A investigação está em desenvolvimento pela realização de intervenções junto ao

grupo de mulheres indígenas catuenses. As visitas ocorrem por intermédio de lideranças da

comunidade e sob a autorização do Cacique que comanda a aldeia. Os encontros para a

efetivação de rodas de conversa ocorrem no pátio da escola indígena João Lino da Silva e

também envolve a organização de uma mostra de artesanato e culinária com pratos típicos da

região.

Comunidade Indígena Catu dos Eleotérios

Os Eleotérios se concentraram na região do litoral sul, a partir do século XVIII por

meio da formação de aldeamentos organizados pelas ordens religiosas dos Jesuítas e

Carmelitas. A missão Igramació na região de Vila Flor, Canguaretama e Goianinha foi capaz

de congregar etnias do tronco Tupi, conhecidos como Potiguara, que significa comedores de

camarão. (SILVA, 2007)

A disposição geográfica da aldeia, dividida politicamente em dois municípios, tem se

apresentado como questão, historicamente, constituída contradição no estabelecimento da

unidade territorial e étnica desse povo. O Sítio Catu ou Vale do Catu também assim

conhecido, localiza-se a 80 km de Natal, onde se encontram morando, aproximadamente,

100 famílias. Uma área de preservação ambiental porque inclui trechos de Área de Proteção

Ambiental (APA) sob a jurisdição do Instituto de Desenvolvimento e Meio Ambiente do Rio

Grande do Norte (IDEMA).

Os saberes da tradição estão presentes na memória dos índios idosos da comunidade,

que se materializam nas formas cotidianas de vida como a linguagem, as superstições, a

culinária e a agricultura. As crianças e os jovens também são convidados cotidianamente para

integrar o movimento indígena de fortalecimento da identidade dos Eleotérios do Catu.

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No esforço de estabelecer um diálogo com as novas gerações, a reatualização das

festas tradicionais tem sido o foco das lideranças, a exemplo da

[...] Festa da Batata que ocorre há três anos. Surgiu pelo motivo do plantio de batata doce, a maior cultura agrícola do local, e vem sendo comemorada todo dia primeiro de novembro. Na ocasião, a comunidade comemora o Dia de Todos os Santos, uma forma estratégica de resgatar as características culturais da comunidade, ao passo que se torna um atrativo cultural para propagação do turismo na localidade. Na festa são apresentadas diversas manifestações da cultura como o Toré e o artesanato. (MORITZ, 2010, p. 55)

Além da festa batata, a reatualização do ritual Toré nas comemorações da

comunidade tem sido prioridade do cacique e lideranças, que inclusive, buscam parcerias

com outros povos indígenas do nordeste, a exemplo dos Potiguara da Baia da Traição, na

Paraíba, com a intenção de ampliar suas ações socioculturais, como processo de

aprendizagem da língua Tupi, incluindo esse saber como componente curricular na escola

indígena presente na comunidade, no lado do município de Canguaretama.

Primeira Escola Indígena do Rio Grande do Norte

A etnia criou e mantém a primeira escola indígena do estado do Rio Grande do Norte,

com currículo diferenciado para o Ensino Fundamental. A Escola Municipal Indígena João

Lino da Silva localizada na comunidade, no lado de Canguaretama, que oferta turmas do 1º

ao 5º ano. A escola tem capacidade para atender aproximadamente 60 alunos em tempo

integral, no horário das 7h às 16h., dispondo três refeições por dia, a estrutura ainda conta

com biblioteca, brinquedoteca e laboratório. O brasão da escola traz a imagem de um maracá

intercruzado com um lápis sobre um livro aberto, simbolizando saberes e tradições

integradas na formação dos curumins. Vejamos essa intenção na Figura 2.

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Figura 2 : Brasão colocado no frontal de entrada da Escola Indígena do Catu, Canguaretama, RN Fonte: arquivo pessoal do pesquisador, 2014

Há uma campanha do diretor e professores para que o currículo da escola seja

formulado sob as orientações da educação diferenciada, incluindo componentes curriculares

que propiciem a aprendizagem de conhecimentos advindos da etno-história, etno-geografia e

o Tupi antigo.

A escola tem se destacado pelos eventos que tem promovido para dá visibilidade a

cultura indígena no RN. Tem tornado tradição a realização da Semana Intercultural

Indígena, congregando os professores, alunos e comunidade para interagirem com a cultura

indígena potiguara: confecção e exposição de artesanato, as rodas de conversa sobre

tradições e memórias, oficinas de pintura, produção de maracás e a realização do ritual Toré.

O ritual Toré assume a posição de patrimônio imaterial de grupos étnicos indígenas no

Brasil e tem sido eleito elemento essencial de formação das novas gerações no interior das

aldeias envolvidas no processo de (auto)firmação e reconhecimento, a exemplo do que ocorre

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na Escola Municipal João Lino, na comunidade do Catu. A Figura 3, a seguir, demonstra o

processo de iniciação em que os “curumins” estão passando.

Figura 3 - Dança do Toré na Comunidade do Catu.

Fonte: Acervo pessoal de Francisco do Nascimento Lima, 2014. (LELIS; LIMA, 2015, p. 6)

O intercâmbio entre a comunidade do Catu e os índios Potiguara, da Baia da Traição,

Paraíba, tem fortalecido a disseminação da cultura indígena Potiguara no cotidiano da escola.

Desde 2008, o cacique e lideranças têm viajado para litoral norte paraibano para reatualizar

os mitos e ritos que foram perpetuados pelos ancestrais a mais de quinhentos anos no Brasil.

Mulheres Indígenas Catuenses

As mulheres indígenas tem se destacado no movimento de emergência étnica

brasileiro. Em maior parte das comunidades, são elas quem realizam a iniciação das novas

gerações nos rituais e na militância das questões de demarcação de territórios.

A demarcação de territórios tem se apresentado como problema político e social

devido aos conflitos estabelecidos internamente por causa dos usineiros que promovem o

latifúndio e a monocultura da cana de açúcar na região. As oportunidades de trabalho são

sanzonais e são aplicadas, pelo agronegócio, técnicas de agriculturas agressivas que

maltratam a terra pelas queimadas e uso de agrotóxicos.

Por meio da pesquisa na comunidade, nota-se protagonismo do movimento de

mulheres indígenas catuenses, pela realização de eventos para discutir questões de gênero,

artesanato indígena, empreendedorismo e agricultura familiar. As rodas de conversa tem se

constituído oportunidade para reflexão de questões existências de ser mulher indígena na

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comunidade do Catu. Um desses encontros ocorreu em setembro de 2015 (Figura 4), no pátio

da Escola João Lino, quando ocorreu a interlocução com mulheres da comunidade

quilombola Acauã, caravana proveniente do município de Poço Branco, RN.

Figura 4 – Roda de Conversa durante encontro inter-étnico e cultural entre mulheres do Catu e Acauã na Escola Municipal João Lino da Silva–

Fonte: arquivo pessoal do pesquisador, 2015.

Na aldeia Catu, as mulheres são protagonistas na organização da comunidade, sendo

empreendedoras quando se apresentam como maioria na agricultura familiar, no cultivo das

hortas e venda dos produtos nas feiras livres da região. Torna-se marcante a presença

feminina nas redes de economia solidária, buscando capacitação e assessoria para melhorar o

desempenho da produção e das vendas do artesanato.

Um dos combates realizados pelas mulheres indígenas do Catu tem sido o

enfrentamento a discriminação e a violência contra a pessoa da mulher. As rodas de conversa

têm funcionado como oportunidade para a cartase, momentos em que as mulheres falam de

seus dramas, medos e tristezas a respeito da vida conjugal. A superação é apresentada como

um desafio, quando a comunidade indígena reprova a independência feminina e o seu

empoderamento. Apesar de ser maioria no comando da agricultura familiar, apresenta-se

dependente no contexto de uma relação desigual de gênero, que subjuga e, por vezes,

maltrata.

A violência está atrelada ao cultivo do machismo e a presença expressiva do

alcoolismo na comunidade. O processo de conscientização deve ser inaugurado e promovido

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entre os indígenas, a começar pelas novas gerações nas escolas. Ao contrário do que ocorre,

outras etnias da nação Potiguara, a exemplo da Aldeia Monte Mor, em Rio Tinto, na Paraíba,

valorizam a mulher na política, elegendo-as como lideranças das comunidades, caciques e até

vereadoras nos municípios circunvizinhos.

Outra frente que a mulher indígena catuense atua é o artesanato. A produção de

adornos envolve os materiais como penas, palha, madeira e sementes têm ajudado a divulgar

a cultura da etnia e, ao mesmo tempo, auxiliado a algumas na geração de renda. Ainda um

grupo pequeno de mulheres tem conservado essa tradição. Há a necessidade urgente que as

jovens se interessem em aprender a técnica de colher o material na natureza, selecionar e

tratá-los para a produção artística das peças.

O espaço do IFRN Campus Canguaretama tem se constituído espaço de protagonismo

da mulher indígena catuense, quando oportuniza a participação do grupo de horticultoras na

feira agroecológica realizada semanalmente, nos dias de quartas feiras, no centro de vivências

da instituição federal de ensino.

A Presença do Campus do IFRN

A comunidade tem sentido o impacto da implantação do campus do Instituto Federal

de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, pela participação em projetos de

extensão e pesquisa, envolvendo alunos e professores do Ensino Médio Integrado. A ação do

Campus Canguaretama provoca, de forma mais intensa, a aproximação dos centros de

pesquisa para a realização de estudos acerca de diversos temas, tendo como lócus a aldeia e o

processo de emergência étnica.

O campus foi inaugurado em outubro de 2013 e, desde esta data, tem apresentado um

perfil diferenciado para a implantação de uma política de fortalecimento da educação do

campo e para a diversidade étnico-racial. Nessa direção, durante esses quatros anos, foram

criados cursos como: Licenciatura em Educação no Campo e a Especialização em Educação

de Jovens e Adultos no Contexto da Diversidade.

O corpo de professores e diretoria acadêmica contabilizam ações de intervenções

socioculturais por meio do desenvolvimento de projetos de extensão que abordam a

sustentabilidade, turismo ecológico e a identidade indígena do Catu. Nesse sentido, a

revitalização de trilhas em matas da região tem recuperado a interação do povo com o meio

ambiente, catalogando sua fauna, flora e mananciais. Desde novembro de 2016, o campus

vem motivando e apoiando a realização da Feira da Agricultura Familiar, cedendo o espaço

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físico de suas instalações para montagem das barracas para exposições dos produtos,

conforme visualizamos na Figura 5.

Figura 5 – Banca em Feira da Agricultura Familiar, Campus IFRN Canguaretama, RN, 2016. Fonte: http://portal.ifrn.edu.br/campus/canguaretama/noticias/feira-da-agricultura-familiar-e-sucesso-no-

campus-canguaretama

A presença e atenção do campus IFRN Canguaretama às questões étnico-raciais tem

contribuído para fortalecer o movimento de emergência étnica do povo indígena catuense. A

perspectiva do Observatório da Diversidade só vem a promover mais visibilidade identitária

dessa comunidade que, por décadas, esteve esquecida e até tida como inexistente. O

observatório maximiza os estudos sobre o ser indígena no RN porque investe em pesquisas

para construção de um acervo de documentos sobre a diversidade histórica e cultural da

nação Potiguara resistente em terras norte-rio-grandenses.

Considerações Finais

Apresentamos algumas reflexões sobre o tema que nos motiva a pesquisar, no

momento, sob a ótica da história social e da etnografia na comunidade do Catu que, por

décadas, foi silenciada e dada por extinta, mas que emerge pela força do movimento indígena

do nordeste brasileiro.

O movimento de emergência étnica dos indígenas do Catu dos Eleotérios foi

recentemente inaugurado e depende do envolvimento de toda a comunidade para sua

consolidação diante das demais etnias indígenas do Brasil.

Os fatores geográficos e políticos ainda interferem no processo de construção

identitária do povo pesquisado. O movimento indígena requer unidade na militância política,

principalmente, para enfrentar os conflitos existentes em torno dos processos de demarcação

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de terras indígenas no contexto dos latifúndios e agronegócios. Nesse sentido, os catuenses

necessitam buscar uma unidade para alcançar esse objetivo.

O protagonismo das mulheres indígenas do Catu tem contribuído para fortalecer o

processo de emergência étnica, quando um grupo de índias se reúnem para falar sobre si e os

problemas que enfrentam na comunidade, discutindo relação de gênero e quando organizam

estratégias para manter a agricultura familiar, por meio da produção e venda de hortaliças

nas feiras da região.

A escola indígena João Lino da Silva destaca-se por assumir a posição de centro

formação e difusão da cultura Potiguara na comunidade, chegando a projetar o povo Catu

para outras regiões do país e do mundo. As redes sociais têm contribuído para isso, como

meio de comunicação mais democrático, que contribui para divulgar os eventos e congregar

pessoas em torno das causas dos índios brasileiros, a exemplo dos Seminários de Cultura

Indígena realizados anualmente na primeira escola indígena do RN.

A criação do Campus do IFRN no município de Canguaretama foi outro marco

significativo para a consolidação de estudos, pesquisas e intervenções extensionista no

âmbito da educação do campo e da diversidade, com destaque para as políticas de afirmação

das etnias e pessoas do campo. Nesse contexto, a criação do Observatório da Diversidade se

apresenta como um diferencial institucional que pode contribuir no processo de emergência

étnica e inclusão social dos povos tradicionais.

Referências

ANGROSINO, Michael. Etnografia e observação participante. São Paulo: ArtMed, 2009. ARRUTI, José Maurício Andion. Morte e vida do Nordeste indígena: a emergência étnica como fenômeno histórico regional. In Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 8, n.15, 1995, p. 57-94. DELGADO, Lucia de Almeida Neves; FERREIRA, Marieta de Moraes. História do tempo presente e ensino de história. In Revista História Hoje, v. 2, n. 4, p. 19-34, 2013. LELIS, Creusa Ribeiro da Silva; LIMA, Francisco do Nascimento. Sustentabilidade e identidades indígenas: um roteiro pela Trilha do Catu. In Anais do II Congresso Nacional de Educação, II CONEDU, 2015. MINIDICIONÁRIO de Tupi-Guarani. In Blog Mania de História. 2009. Disponível em: https://maniadehistoria.wordpress.com/mini-dicionario-tupi-guarani/ Acesso em: 04. abr. 2017.

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MORITZ, Tatiana. Turismo no espaço rural e comunidades tradicionais: uma análise das percepções da Comunidade do Catu/RN. Natal: UFRN, 2010.76 p. Dissertação (Mestrado em Turismo) - Programa de Pós-Graduação em Turismo, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. SILVA, Claudia Maria Moreira da. “Em busca da realidade”: a experiência da etnicidade dos Eleotérios (Catu/RN). Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal, 2007, 271 f.