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Mauricio Aquino / Méd. Veterinário / Especialista em Docência para o Nivel Superior / Mestrando em Ciências da Saúde Informativo nº 8 / Junho de 2011 www.caramujoafricano.com / [email protected] Com a expulsão dos jesuítas no século XVIII o rumo da educação no Brasil ficou comprometido; como consequên- cia imediata desta perseguição política foram fechados 50 colégios e interrompidas atividades educacionais em inú- meras aldeias indígenas, retardando até os dias de hoje, a educação das classes desfavorecidas. Quando pessoas instruídas conversam, contemporanea- mente, sobre as origens dos problemas comuns à comuni- dade, seja numa festa, num restaurante, na beira da praia ou numa sala de aula, a conclusão quase sempre aponta para uma queixa comum: a falta de educação. Um exemplo: se a população toma conhecimento através de uma matéria jornalística que diz, explicitamente, que o Caracol Africano transmite doenças graves que podem ma- tar e que em hipótese alguma, ele pode ser tocado, exceto através de luvas, a população entenderá, simplesmente, que o caracol mata ao toque. Se um veículo jornalístico divulga uma informação incom- pleta, como se isso fosse uma regra e não uma exceção, para uma comunidade carente de educação sem apresen- tar alternativas, ele na verdade está prestando um desser- viço, pois passa a representar apenas o interesse de uma minoria. Sem educação, fica difícil distinguir nas entrelinhas a dife- rença entre a verdade e o exagero, pois para interpretar o que se lê, ouve ou assiste é necessária uma prática que só se adquire através da busca espontânea pelo conhecimen- to. Dizer que o Caracol Africano, num país de dimensão conti- nental como o nosso, mata ao simples toque, sem esclare- cer que lesmas e caracóis nativos também podem ser veto- res potenciais das mesmas doenças e que houve apenas duas mortes em 23 anos, é um bom exemplo de desserviço em escala continental. Já no caso do Caracol Africano o problema está na inter- pretação pontual das notícias incompletas e distorcidas, publicadas em veículos de comunicação que, só divulgam, os malefícios e, ainda por cima, de forma exagerada. Ratos (Rattus rattus, R. muelleri e R. norvegicus) são hos- pedeiros definitivos do Angiostrongylus cantonensis, um parasito que pode causar a Meningite Eosinofílica. Ao eli- minarem ovos e larvas do verme através das fezes, o roe- dores contaminam o ambiente. Algumas lesmas e caracóis, nativos e exóticos e entre eles, o Bradybaena similaris, Su- bulina octona, Veronicella alte além do próprio caracol afri- cano, podem se contaminar e desempenhar o papel de hospedeiro intermediário e, ao serem ingeridos, podem transmitir a Meningite Eosinofílica para o homem mas ape- nas se, forem ingeridos crus, mal cozidos ou através de legumes e verduras mal lavadas, contaminados por es- ses hospedeiros. A Meningite Eosinofílica é a doença mais grave associadas ao Caracol Africano (Achatina fulica) e ao Caramujo Doura- do (Ampullarium canaliculatus), responsabilizando-se, até hoje, por 2.827 óbitos registrados na história médica. Na Tailândia a ingestão de caramujos do gênero Pila spp. crus são os principais responsáveis pela Meningite Eosinofílica. Caranguejos, camarões, peixes, rãs e sapos, por exem- plo, são hospedeiros de transporte, mas não se conhece casos de infecção em humanos, com exceção de dois casos, provavelmente causados pela ingestão de fíga- do fresco de sapo e outro, de músculos e ossos de rã, re- sultantes do tratamento pela medicina chinesa. Esse número, 2.827, é relativo; expressivo para a popula- ção de uma cidade pequena, por exemplo. No entanto, pe- queno, quando o referencial passa a ser a população mun- dial ao longo de toda a história médica registrada desde 1945, quando a Meningite Eosinofílica foi diagnosticada pela primeira vez. Mas esta meningite parasitária não é causada apenas pelo Angiostrongylus cantonensis. O To- xocara e o Gnathostoma, entre outros parasitos, também são responsáveis pela sua ocorrência. É claro que a prevenção de doenças é uma obrigação de todos, no entanto, o pânico gerado pelos veículos de comu- nicação, responsáveis por este desserviço sem benefícios diretos, serve apenas para gerar o medo e o sentimento de impotência junto à população menos esclarecida que, infe- lizmente, em nosso caso, é a maioria da população brasilei- ra. Mas nem tudo está perdido, pois sempre podemos tirar lições de qualquer situação e, em minha opinião, todo o EDUCAÇÃO E CIDADANIA EDUCAÇÃO E CIDADANIA : A : A MELHOR PROFILAXIA MELHOR PROFILAXIA CONTRA AS DOENÇAS E A IGNORÂNCIA CONTRA AS DOENÇAS E A IGNORÂNCIA Informativo AchatinafulicaNEWS nº 8 / Junho 2011 www.Achatinafulica.com pag.01

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Mauricio Aquino / Méd. Veterinário / Especialista em Docência para o Nivel Superior / Mestrando em Ciências da Saúde

Informativo nº 8 / Junho de 2011 www.caramujoafricano.com / [email protected]

Com a expulsão dos jesuítas no século XVIII o rumo da educação no Brasil ficou comprometido; como consequên-cia imediata desta perseguição política foram fechados 50 colégios e interrompidas atividades educacionais em inú-meras aldeias indígenas, retardando até os dias de hoje, a educação das classes desfavorecidas.

Quando pessoas instruídas conversam, contemporanea-mente, sobre as origens dos problemas comuns à comuni-dade, seja numa festa, num restaurante, na beira da praia ou numa sala de aula, a conclusão quase sempre aponta para uma queixa comum: a falta de educação.

Um exemplo: se a população toma conhecimento através de uma matéria jornalística que diz, explicitamente, que o Caracol Africano transmite doenças graves que podem ma-tar e que em hipótese alguma, ele pode ser tocado, exceto através de luvas, a população entenderá, simplesmente, que o caracol mata ao toque.

Se um veículo jornalístico divulga uma informação incom-pleta, como se isso fosse uma regra e não uma exceção, para uma comunidade carente de educação sem apresen-tar alternativas, ele na verdade está prestando um desser-viço, pois passa a representar apenas o interesse de uma minoria.

Sem educação, fica difícil distinguir nas entrelinhas a dife-rença entre a verdade e o exagero, pois para interpretar o que se lê, ouve ou assiste é necessária uma prática que só se adquire através da busca espontânea pelo conhecimen-to.

Dizer que o Caracol Africano, num país de dimensão conti-nental como o nosso, mata ao simples toque, sem esclare-cer que lesmas e caracóis nativos também podem ser veto-res potenciais das mesmas doenças e que houve apenas duas mortes em 23 anos, é um bom exemplo de desserviço em escala continental.

Já no caso do Caracol Africano o problema está na inter-pretação pontual das notícias incompletas e distorcidas, publicadas em veículos de comunicação que, só divulgam, os malefícios e, ainda por cima, de forma exagerada.

Ratos (Rattus rattus, R. muelleri e R. norvegicus) são hos-pedeiros definitivos do Angiostrongylus cantonensis, um

parasito que pode causar a Meningite Eosinofílica. Ao eli-minarem ovos e larvas do verme através das fezes, o roe-dores contaminam o ambiente. Algumas lesmas e caracóis, nativos e exóticos e entre eles, o Bradybaena similaris, Su-bulina octona, Veronicella alte além do próprio caracol afri-cano, podem se contaminar e desempenhar o papel de hospedeiro intermediário e, ao serem ingeridos, podem transmitir a Meningite Eosinofílica para o homem mas ape-nas se, forem ingeridos crus, mal cozidos ou através de legumes e verduras mal lavadas, contaminados por es-ses hospedeiros. A Meningite Eosinofílica é a doença mais grave associadas ao Caracol Africano (Achatina fulica) e ao Caramujo Doura-do (Ampullarium canaliculatus), responsabilizando-se, até hoje, por 2.827 óbitos registrados na história médica. Na Tailândia a ingestão de caramujos do gênero Pila spp. crus são os principais responsáveis pela Meningite Eosinofílica. Caranguejos, camarões, peixes, rãs e sapos, por exem-plo, são hospedeiros de transporte, mas não se conhece casos de infecção em humanos, com exceção de dois casos, provavelmente causados pela ingestão de fíga-do fresco de sapo e outro, de músculos e ossos de rã, re-sultantes do tratamento pela medicina chinesa.

Esse número, 2.827, é relativo; expressivo para a popula-ção de uma cidade pequena, por exemplo. No entanto, pe-queno, quando o referencial passa a ser a população mun-dial ao longo de toda a história médica registrada desde 1945, quando a Meningite Eosinofílica foi diagnosticada pela primeira vez. Mas esta meningite parasitária não é causada apenas pelo Angiostrongylus cantonensis. O To-xocara e o Gnathostoma, entre outros parasitos, também são responsáveis pela sua ocorrência.

É claro que a prevenção de doenças é uma obrigação de todos, no entanto, o pânico gerado pelos veículos de comu-nicação, responsáveis por este desserviço sem benefícios diretos, serve apenas para gerar o medo e o sentimento de impotência junto à população menos esclarecida que, infe-lizmente, em nosso caso, é a maioria da população brasilei-ra.

Mas nem tudo está perdido, pois sempre podemos tirar lições de qualquer situação e, em minha opinião, todo o

EDUCAÇÃO E CIDADANIAEDUCAÇÃO E CIDADANIA: A : A MELHOR PROFILAXIA MELHOR PROFILAXIA CONTRA AS DOENÇAS E A IGNORÂNCIACONTRA AS DOENÇAS E A IGNORÂNCIA

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país poderia lucrar muito, nesse momento, com uma campa-nha bem orquestrada de educação para a saúde, onde con-ceitos básicos de higiene poderiam ser relembrados, objeti-vamente, contribuindo para a prevenção de milhares de mor-tes.

Essa campanha abordaria questões de higiene pessoal; hábi-tos simples que devem ser cultivados, regularmente, tais co-mo o banho diário, a higiene das mãos antes das refeições e depois de utilizar o banheiro, a limpeza e o corte das unhas, a higienização bucal e a ingestão de água potável que po-dem, com certeza, salvar milhares de vidas pela simples pre-venção.

Já a higiene coletiva, é o conjunto de normas elaboradas pa-ra zelar pela saúde da população em geral, especificando diretrizes comuns, por exemplo, para a manutenção da quali-dade do ambiente que nos rodeia e assim, como na higiene pessoal, contribua para a prevenção de doenças e epidemi-as. Um exemplo são as doenças transmitidas por alimentos (DTA), causadas pela ingestão de comidas ou bebidas conta-minadas. Existem mais de 250 tipos de DTA e a maioria são causadas por bactérias e suas toxinas, vírus e parasitas.

Para a prevenção de doenças que podem, raramente, serem transmitidas pelo caracol africano, que é um alimento rico e desprezado pelo preconceito, o procedimento é simples e já adotado para a prevenção contras outras doenças transmiti-das pela carne de frango, porco, peixe, carneiro, boi, ou qual-quer outro animal, porque qualquer animal pode ser um transmissor potencial de enfermidades:

• Não ingerir carne crua ou mal cozida, especialmente sem inspeção. (No caso do caracol, cozinhá-lo pelo menos 20 minutos em panela de pressão);

• Lavar bem as frutas, os legumes e as verduras, espe-cialmente os que são consumidos crus, deixando-os em solução de hipoclorito de sódio. Na prática é só colocar uma colher das de sopa de sanitária para ca-da litro de água e deixar os alimentos em imersão por 15 minutos para eliminar larvas de nematódeos e as bactérias. Depois é só lavar em água corrente.

Se pensarmos seriamente, por um minuto, chegaremos a conclusão que o problema, no final das contas, não é alimen-tar mas, educacional. A população desinformada sobre os seus direitos, ainda se permite eleger dirigentes que primam pela perpetuação da ignorância no país, desde o século XVII-I, sem assumirem nenhum compromisso para o bem estar de seus eleitores ou do país.

Para cada real investido em saneamento básico, por exem-plo, temos uma economia de 4 reais com assistência médi-ca, no entanto, existe uma enorme quantidade de brasileiros que não tem acesso a esses benefícios essenciais e mo-ram, literalmente, entre dejetos humanos e animais que escoam no seu peridomicílio, locais onde hábitos saudáveis de higiene, infelizmente, pouco contribuem para a prevenção do inevitável. Você pode contribuir para minimizar este qua-dro, exigindo de seus representantes, um compromisso por uma educação de qualidade, no mínimo.

Referências:

• http://www.saberecrescer.com/educ-higiene_tipos-higiene_ambiental=+066790?v1&

• http://revistavivasaude.uol.com.br/Edicoes/47/artigo50498-1.asp

• http://www.applesnail.net/content/pila.htm

• http://www.ajtmh.org/content/76/2/399.full.pdf+html

• http://www.planetauniversitario.com/index.php?option=com_content&view=article&id=1950:pucrs-eferia-na-detec-de-meningite-eosinofca&catid=27:notas-do-campus&Itemid=73

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Mauricio Aquino / Méd. Veterinário / Especialista em Docência para o Nivel Superior / Mestrando em Ciências da Saúde

O Angiostrongylus costaricensis é um nematóide, parasitária de roedores silvestres, que vem sendo apontado no Brasil como uma grave verminose, lar-gamente transmitida pelo Caracol Africano (Achatina fulica), muito embora, na prática, nunca tenha se diagnosticado um único caso Angiostrongi-líase abdominal, em 23 anos, transmitido por ele. O A. costaricensis, nos roedores, habita o interior das artérias mesentérica e seus ramos, podendo infectar o homem, acidentalmente. Em Costa Rica, a infecção natural de um cão do-méstico (Canis familiaris) com lesões intestinais se-melhantes às descritas em seres humanos, motivou um experimento preliminar, publicado em 2002 na Rev. Inst. Med. Trop. S. Paulo, realizado por um se-leto grupo de pesquisadores gaúchos, do Inst. De patologia de Passo Fundo, do Inst. De Ciências Bio-lógicas da Universidade de Passo Fundo, do Lab. De Parasitologia Molecular do Instituto de Pesqui-sas Biomédicas e de Biologia Parasitária da Facul-dade de Biociências da PUCRS de Porto Alegre. O experimento foi planejado para avaliar a viabilida-de da utilização de cães como modelo experimental para estudos patológicos da Angiostrongilíase Ab-dominal. De acordo com Rodriguez, et.al. (2002, p.55) foi uti-lizado um cão adulto de 9 kg, de estirpe indefinida, inoculado por via oral com 75 larvas de terceiro es-tágio (L3 infectantes) de Angiostrongylus costaricen-sis. As larvas de metastrongilídios começaram a ser encontradas entre o 28º e o 88º dia após a infecção experimental inicial e a produção diária de L1

(larvas de primeiro estágio não infectantes) foi muito variável ao longo deste período, com um número máximo aproximado de detectado de 100.000 larvas por grama de fezes. “A identificação das larvas de A. costaricensis foi possível após a passagem pelo caramujo Biomphalaria glabrata e camundon-gos, de onde foram recuperados vermes adultos no interior das artérias mesentérica. O cão permaneceu assintomático e sem lesões macroscópicas signifi-cativas durante o experimento e foi sacrificado para necropsia no 94º dias após a infecção experimental inicial. [...] No sul do Brasil, vários focos de trans-missão estão localizados em áreas urbanas onde os roedores silvestres não são facilmente encontra-dos.” (RODRIGUEZ, 2002, p.56) Na opinião da equipe de pesquisadores, roedores sinantrópicos (aqueles que vivem próximas às habi-tações humanas) de áreas urbanas não são tão bem adaptados para hospedar o A. costaricensis como os roedores silvestres (Oligoryzomys nigripes) e portanto, a equipe consi-derou que outras espécies de vertebrados deviam estar desempenhando o papel de hospedeiro defini-tivo. Os dados preliminares obtidos através do experi-mento indicam o possível papel do cão doméstico (Canis familiaris) como reservatório pa-ra A. costaricensis já que o cão também é um hos-pedeiro natural para outra espécie de metastrongilí-deos, como o Angiostrongylus vasorum (Baillet, 1866), por exemplo, parasita de artérias pulmona-res. De acordo com Rodriguez et.al. (2002, p.56) “o cur-so assintomático da infecção e a ausência de lesões macroscópicas na laparotomia pode ser parte de uma característica da doença em cães, não permi-tindo confirmação através de uma única infecção experimental preliminar. [...] Se a baixa morbidade é uma regra, o cão não seria um bom modelo experi-mental para estudos patológicos. Mas esse dado também pode significar que o cão é um hospedeiro bem adaptado para A. costaricensis e assumir em áreas urbanas, o papel desempenhado pelos roedo-res no ciclo silvestre da Angiostrongilíase Abdomi-nal.” Referência:

RODRIGUEZ, Rubens, et.al. Dogs may be a reservoir host for Angios-trongylus costaricensis. Revista Inst. Med. Trop. São Paulo, jan.fev, 2002.

O CÃO PODE SER UM RESERVATÓRIO PARA Angiostrongylus costaricensis?

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A Meningite Eosinofílica, a pior doença associa-da ao caracol africano, é uma doença parasitária potencialmente fatal, causada pelo verme Angiostrongylus cantonensis.

A Meningite Eosinofílica é uma doença grave que já causou em todo o mundo, no mínimo, “2.827 óbitos [...] devidamente documenta-dos. [...] Os seres humanos são infectados de várias maneiras, pois o ciclo de vida deste para-sita envolve diferentes hospedeiros intermediá-rios entre moluscos comestíveis e uma gama de hospedeiros de transporte, onde o parasita não evolui.” (WANG, Q..P. et. al. 2011, p.1)

O consumo de moluscos crus ou mal cozidos é a principal via de infecção do A. cantonensis na China e sudeste da Ásia. No Caribe, legumes e condimentos contaminados foram responsabili-zados por um surto na Jamaica. O lagarto moni-tor é considerado a principal fonte de infecção na Índia e no Sri Lanka e nas ilhas do Pacífico os principais suspeitos são camarões de água doce, os peixes e os caranguejos.

No Brasil, onde só ocorreram dois casos até ago-ra, o caracol africano (Achatina fulica) vem sen-do considerado o grande vilão da história. Mas o que ninguém esperava é que o maior responsá-vel pela epidemia em Dali, na China, entre outu-bro de 2007 a março de 2008, com 19 casos cli-nicamente confirmados e 22 suspeitos fosse, na verdade, um caramujo invasor de origem brasilei-ra, o Pomacea canaliculata que, nos últimos 10 anos assumiu uma importância maior que o pró-prio A. fulica na transmissão dessa doença na Ásia.

O Pomacea canaliculata foi introduzido como alimento em Taiwan em 1979 e depois, na China em 1981. Adaptou-se bem ao meio ambiente, particularmente ao sul da China, espalhando-se rapidamente para mais de 10 províncias, causan-do enormes danos à agricultura: milhares de hectares de arroz, verduras e outras culturas nessas províncias foram destruídos.

O principal sinal clínico é uma forte dor de cabe-ça e o principal achado hematológico é a alta contagem de eosinófilos no sangue e no líquido

O O ESCLARECEDOR ESCLARECEDOR SURTOSURTO DEDE MENINGITE EOSINOFÍLICA MENINGITE EOSINOFÍLICA NA NA

Pomacea spp.

CHINA

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Mauricio Aquino / Méd. Veterinário / Especialista em Docência para o Nivel Superior / Mestrando em Ciências da Saúde

cefalorra-quidiano (LCR). O tratamento a-

dotado contra a Meningite Eosinofílica é uma combinação de anti-parasitários como o albenda-zol e corticosteróides que, em Dali, resultou em significativa melhora dos pacientes tratados. Do total de paciente, 22 relataram o consumo de Po-macea canaliculata crus ou mal cozidos antes do início dos sintomas. A fonte da epidemia foi o mercado da cidade onde 1% dos caracóis comer-cializados estavam infectados pelo Angiostrong-ylus cantonensis. Nas populações de caramujos asselvajados pesquisadas, no entorno de Dali, o parasita não foi detectado.

No Brasil, nossa preocupação há alguns anos é com o caracol africano (Achatina fulica) e o seu “potencial” como hospedeiro intermediário do A. cantonensis, no entanto, o que esta pesquisa chi-nesa claramente evidencia é que o nosso cara-mujo nativo, conhecido pelo nome de Aruá (Pomacea canaliculata), pode vir a desempenhar, aqui, um papel muito mais preocupante que o

próprio Achatina fulica.

O artigo chinês é surpreendentemente e de-monstra, claramente, que o problema no Bra-sil não é a presença do caracol invasor afri-cano que, raramente, pode ser hospedeiro intermediário ao A. cantonensis e transmitir a Meningite Eosinofílica mas sim, a grande fragilidade da fiscalização sanitária em nos-sas duanas que já permitiu, aparentemente, a entrada do principal hospedeiro definitivo contaminado do A. cantonensis em duas cidades portuárias no país, Vitória e Reci-fe, onde foram diagnosticados, até agora, os dois casos de Meningite Eosinofilica.

Minha sugestão é que, a energia e os recur-sos desperdiçados nas tentativas infrutíferas para o controle do Achatina fulica sejam, imediatamente redirecionados, para pesqui-sas que apontem para o seu controle atra-vés de seu aproveitamento racional e para o combate de roedores estrangeiros conta-minados que entram no Brasil, especial-mente, através dos portos e aeroportos, pois mesmo que erradiquemos o A. fulica no país, nunca poderemos erradicar o caramujo nativo Pomacea canaliculata, presente em boa parte da América do Sul. Isso sem falar que para Neuhauss

et.al. (2007), que submeteu o caracol africano a infecções experimentais por A. cantonensis e A. costaricensis,, ele “não representa [...] uma ame-aça significativa para a saúde humana” no Brasil pois não se comporta, propriamente, com um ve-tor significativo.

Referências: MARTÍN, P.R., ESTEBENET, A.L. e CAZZANIGA, N.J. Factors affecting the distribution of Pomacea canaliculata (Gastropoda: Ampullariidae) along its southernmost natural limit. Malacologia, vol. 43, 2001, p. 13-23.

NEUHAUSS, Erli; FITARELLI, Monaliza; ROMANZINI, Juliano; GRAEFFETEIXEIRA, Carlos. Low susceptibility of Achatina fulica from Brazil to infection with Angiostrongylus costaricensis e A. Cantonensis. Pontificia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e Laboratório de Biologia Parasitária, Faculdade de Biociências da PUCRS. Porto Alegre, RS, 2007.

SHANG Lv, et.al. Human Angiostrongyliasis outbreak in Dali, China. PLOS Neglected Tropical Diseases. Setembro de 2009, vol. 3, p. 1-7.

WANG Q.P. et. al. Human angiostrongyliasis. Disponível em: <http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18922484> Acesso: 06/06/2011

Mapa com a localização da cidade de Dali ao sul

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Exames parasitológicos realizados por Liboria et.al. (2010) em 542 caracóis africanos (A.fulica) asselvajados coletados em diferentes regiões na Venezuela demonstrou que o caracol africano pode se comportar como vetor de transporte, in-gerindo e eliminando ovos de vermes presentes no ambiente em que vive. Neste trabalho, Liboria (2010) encontrou nas fezes de Achatina fulica ovos de S. mansoni, Trichuris spp, Hymonolepis spp, Strongyloi-des spp, mas não evidenciou, em nenhum ani-mal, a presença de uma única larva de Angios-trongylus cantonensis, responsável pela Meningi-te Eosinofílica, a pior doença associada ao Achatina, nem de Angiostrongylus costaricensis, responsável pela Angiostrongilíase Abdominal.

CARACOL AFRICANO COMO SENSOR BIOLÓGICO: CARACOL AFRICANO COMO SENSOR BIOLÓGICO: UMA DESCOBERTA VENEZUELANAUMA DESCOBERTA VENEZUELANA

Caramujos de água doce do gênero Biomphalaria responsáveis pela transmissão da Esquistossomose ao homem.

Informativo AchatinafulicaNEWS nº 8 / Junho 2011 www.Achatinafulica.com pag.09

Felizmente, os ovos de S. mansoni encontrados nas fezes de Achatina fulica não caracteriza es-se caracol como transmissor da Esquistossomo-se, pois o responsável pela infecção no homem não é o ovo do verme, mas a sua cercária, uma forma larvária que faz parte de seu ciclo de vida, desenvolvendo-se nos caramujos de água doce

do gênero Biomphalaria. No entanto, es-

te trabalho nos permite

afirmar que o Achatina fuli-

ca pode se com-p o r t a r como um sensor biológico, útil, portanto, para o diagnóstico de parasitoses humanas e veterinárias na sua regi-ão de ocorrência por um custo muito mais baixo

e esta característica, com certeza, pode vir a ser explorada como mais uma utilidade, juntamente com o seu potencial zootécnico, nutricional e me-dicamentoso. A Dra Liboria Matinella, autora do artigo original, que gerou esta publicação, enviou com exclusivi-dade para nosso informativo, a sua opinião sobre o Achatina fulica.

“En ningún país deben introducirse especies exóti-

cas, algunas Achatina han adquirido notoriedad

mundial, su penetración tanto en países en vías de

desarrollo como en los más avanzados, prueba que

su control no es fácil, cuando queremos erradicar

una especie encontramos factores ecológicos muy

complejos, unos favorecen nuestra acción mientras

otros lo contrarrestan. Generalmente las especies

introducidas, disminuyen de alguna forma, la capa-

Fotos de locais pesquisados pela equipe venezuelana durante o experimento: A) em gaiolas de frangos; B) Peri-domicilios humanos C) Contato humano com coleções d’agua D) Coleta de caramujos aquáticos.

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cidad vectora que poseen en su lugar de origen.

Observamos A. fulica en las inmediaciones de cur-

sos y cuerpos de agua donde habita B. glabrata,

donde el contacto humano es frecuente para fines

recreativos o laborales Es natural esta asociación

debido a que los Achatina, encuentran los paráme-

tros ambientales que favorecen su existencia. En

Maracay, estado Aragua Venezuela, los medios tele-

visivos y escritos, cau-

saron alarma a los

habitantes quienes por

pánico formularon de-

nuncias por la notorie-

dad de A. fulica en sus

viviendas, cultivos y

jardines. Al respecto se

recolectaron 452 ejem-

plares, de los cuales

253 correspondientes

al Sector El Limón,

municipio Mario Brice-

ño Iragorry, al anali-

zar las muestras de

heces resultaron positi-

vos a huevos de Schis-

tosoma mansoni el 8,70%, Trichuris spp. 2,77% y

Hymenolepis spp. 5,93%. Mientras que de los 90

caracoles A. fulica, procedentes del Sector La Pe-

drera, del municipio Girardot, en 10,42% se eviden-

ció la presencia de larvas de Strongyloides spp. en

heces y en 9,52% de los mismos, al evaluar la secre-

ción mucosa.

De manera resumida podrían citarse algunos as-

pectos beneficiosos de A. fulica:

1) Es una especie de mucha importancia médica en

Venezuela por su valor como transportador mecáni-

co de diferentes especies de helmintos y un indica-

dor de las infecciones parasitarias en la población

humana, lo que facilitaría, a las Instituciones de sa-

lud y específicamente al departamento de Parasito-

sis Intestinales, realizar un tratamiento masivo en

una comunidad después de evaluar las heces de A.

fulica.

2) En el análisis parasitológico de la secreción mu-

cosa no se encontraron larvas infectantes de An-

giostrongylus spp., se requiere la introducción del

agente etiológico o sea el nematodo, para que se

establezca la enfermedad. En Venezuela Incani y

cols, (2007) reportaron el primer caso introducido

de A. costaricensis.

3) Llama la atención de los laboratorios malacoló-

gicos, por cuanto permite mantener el ciclo biológi-

co de Schistosoma mansoni.

4) Investigaciones serias realizadas por farmacólo-

gos y dermatólogos en la secreción mucosa, repor-

taron que contiene

proteasas, enzimas

fibrinolíticas, antibi-

óticos naturales y

otras sustancias con

probada actividad bio-

lógica, como alantoí-

na, colágeno, elastina,

ácido glicólico y di-

versas vitaminas.

5) Puede ser utilizada

como fuente de ali-

mento por su alto con-

tenido proteico, alcan-

za ser una alternativa

nutricional en países

donde actualmente la

población padece de hambre por el bajo poder ad-

quisitivo.

6) Pudieran ser utilizados en nuevos procesos alter-

nativos productivos.

Debido a la importancia creciente del tema en la

actualidad, antes de intentar exterminar al caracol

gigante de la tierra (A. fulica), y los Biomp-

halaria es preciso profundizar en su biología y eco-

logía, se trata de emprender estudios que conlleven

a innovadoras investigaciones de aprovechamiento

animal y humano.” ☼

À Dra Liboria, sua equipe e a todo povo venezuelano, os nossos sinceros agradecimentos!

Referência: LIBORIA et.al. Primer hallazgo em Venezuela de hu-evos de Schistosoma mansoni y de otros helmintos de interes em salud pública, presentes em heces y secreción mucosa del molusco terrestre Achatina fuli-ca (Bowdich, 1822) Disponível em: <http://www.sian.inia.gob.ve/repositorio/revistas_ci/ZootecniaTropical/zt2803/pdf/2803_liboria_m.pdf>. Acesso em: 12/06/2011

Dra Liboria Matinella

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