edp_056_literatura_miolo
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁSETOR DE EDUCAÇÃO
COORDENAÇÃO DE INTEGRAÇÃO DE POLÍTICASDE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
MAGISTÉRIO DA EDUCAÇÃO INFANTIL EANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
LITERATURA NA EDUCAÇÃO
INFANTIL E ANOS INICIAIS
DO ENSINO FUNDAMENTAL
Autores:Profª. Msc. Sandra Maria MattarProfª. Esp. Rita de Cássia Mattar
CURITIBA2011
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
Dilma Roussef
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
Fernando Haddad
UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL
Diretor
Celso José da Costa
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
Reitor
Zaki Akel Sobrinho
Vice-Reitor
Rogério Andrade Mulinari
Pró-Reitora de Graduação - PROGRAD
Maria Amélia Sabbag Zainko
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação - PRPPG
Sérgio Scheer
Pró-Reitora de Extensão e Cultura - PROEC
Elenice Mara Matos Novak
Pró-Reitora de Gestão de Pessoas - PROGEPE
Laryssa Martins Born
Pró-Reitor de Administração - PRA
Paulo Roberto Rocha Krüger
Pró-Reitora de Planejamento, Orçamento e Finanças - PROPLAN
Lucia Regina Assumpção Montanhini
Pró-Reitora de Assuntos Estudantis - PRAE
Rita de Cássia Lopes
Contatos
CIPEAD
Fone: (41) 3310.2761
e-mail: [email protected]
www.cipead.ufpr.br
Coordenação do Curso de Pedagogia
Fone: (41) 3360.5141 3360.5139
e-mail: [email protected]
www.educacao.ufpr.br
SETOR DE EDUCAÇÃO
Diretora
Andrea do Rocio Caldas
Vice-Diretora
Deise Cristina de Lima Picanço
Coordenação do Curso de Pedagogia - Magistério da Educação
Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Sonia Maria Chaves Haracemiv
Veronica Branco
Coordenação de Integração de Políticas de Educação a Distância - CIPEAD
Coordenadora EaD - UFPR e UAB
Marinelli Joaquim Meier
Coordenadora Adjunta UAB
Gláucia da Silva Brito
Coordenadora de Recursos Tecnológicos
Sandramara Scandelari Kusano de Paula Soares
Revisão Didático-Pedagógica
Sonia Maria Chaves Haracemiv
Veronica Branco
Revisão Textual
Prof. Altair Pivovar
Produção de Material Didático
CIPEAD
APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA
Prezado Aluno,
Convidamos você a realizar os caminhos tecidos pela história da Literatura
Infantil. De pouca idade, 100 anos, caminha para a maturidade; vamos acompanhar o
nascimento da Literatura Infantil desde seus primórdios até os dias atuais, passando
pela concepção da infância. Ao se falar em Literatura Infantil, não podemos deixar de
falar nas dimensões culturais e psicológicas, na sua importância ao desenvolvimento
da criticidade e do imaginário. Mas, para existir uma Literatura Infantil é preciso um
leitor que se identifique com ela, que com ela dialogue. Como estão sendo construídos
os leitores nas escolas e quais as formas de se trabalhar com a literatura na escola?
Profª Sandra Maria Mattar e
Profª Rita de Cássia Mattar
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
PLANO DE ENSINO
1 DISCIPLINA
Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
2 CÓDIGO
EDP-056
3 CARGA HORÁRIA TOTAL
60 HORAS
3.1 CARGA HORÁRIA PRESENCIAL
Doze (12) horas distribuídas em encontros de aula e orientação no Polo, conforme
cronograma da disciplina, com professores formadores da Universidade Federal do
Paraná (UFPR) e tutores presenciais no Polo.
3.2 CARGA HORÁRIA A DISTÂNCIA
Quarenta e oito (48) horas a distância sob orientação dos professores formadores da
UFPR, tutores do Polo presencial e/ou tutores da UFPR. Esses estudos incluem a
participação em fóruns, chats e outros espaços virtuais.
4 EMENTA
Fundamentação teórica e metodológica da Literatura Infantil, considerando a
importância da mesma nas dimensões cultural e psicológica para a infância.
Fundamentos teóricos e de análises, visando repensar a Literatura Infantil como um
instrumento de interferência na prática escolar, estimulando o imaginário do aluno no
desenvolvimento da criticidade.
5 OBJETIVOS
5.1 OBJETIVO GERAL
Analisar as concepções de Literatura Infantil ao longo dos anos, considerando sua
importância para o desenvolvimento da criança das séries iniciais.
5.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
· Refletir a respeito da definição de como se entende Literatura.
· Identificar a concepção de infância e sua evolução até a sociedade moderna.
· Analisar o contexto histórico da Literatura Infantil e a ideologia nela contida.
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
· Compreender a definição da Literatura Infantil.
· Reconhecer a importância das histórias para o desenvolvimento das dimensões
culturais e psicológicas dos indivíduos.
· Compreender o papel da criticidade e do imaginário no contato com a Literatura
Infantil.
· Identificar a escola como um lugar privilegiado no trabalho com o leitor.
· Observar as relações entre Literatura Infantil e a prática pedagógica.
6 PROGRAMA
UNIDADE 1: Concepção de Literatura e de infância
1.1 O que é literatura
1.2 Concepção de infância ontem e hoje
UNIDADE 2: Contexto histórico da Literatura infantil
2.1 Panorama da Literatura infantil
2.2 O que é a Literatura infantil?
UNIDADE 3: Espaço ocupado pela Literatura infantil nas dimensões cultural e
psicológica para a criança
3.1 Literatura infantil: dimensões psicológica e cultural
3.2 Literatura infantil como estímulo à criticidade e ao imaginário
UNIDADE 4: Literatura e educação
4.1 Literatura na escola
4.2 Como se constroem leitores?
NA UNIDADE 1: Concepção de Literatura e de infância
A concepção da Literatura, como as pessoas entendem sua definição. A
literatura colabora para formar e manter a língua como patrimônio coletivo. Cria
identidade e possibilita a livre interpretação e a identidade emocional do leitor com o
texto. Utilizando-se da posição de vários autores, o aluno irá compreendendo essa
concepção. O texto prático será a referência para o estudo e identificação das
intencionalidades da Literatura. Já a concepção de criança, levará a uma reflexão de
como ela era vista antigamente e o lugar que ocupa atualmente.
A transmissão de valores e conhecimentos, e também a socialização das
crianças não eram assegurados nem controlados pela família. Durante séculos a
educação foi garantida pela aprendizagem, graças à convivência da criança ou do
jovem com os adultos. Para que leitor se destinam os textos de literatura infantil. Qual
a concepção de infância que observamos nos dias atuais?
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
NA UNIDADE 2: CONTEXTO HISTÓRICO DA LITERATURA INFANTIL
A Literatura Infantil é uma jovem de 100 anos. O percurso que trilhou até os
dias de hoje precisa ser considerado. A cada década percebe-se a intencionalidade com
que era tratada, atendendo a determinados segmentos da época, possibilitando um
conhecimento do leitor a que se destinava e a ideologia nela contida. conteúdo No início
a Literatura Infantil se alimenta de obras destinas a outros fins: a leitores adultos,
gerando adaptações ao pequeno leitor. Há ainda obras destinadas às escolas. Existe
uma literatura que se pode chamar de infantil na sociedade moderna? Qual é a
literatura infantil que privilegia o leitor?
UNIDADE 3: ESPAÇO OCUPADO PELA LITERATURA INFANTIL NAS
DIMENSÕES CULTURAL E PSICOLÓGICA PARA A CRIANÇA
Literatura Infantil: dimensões cultural e psicológica, e a, importância das
histórias infantis para o desenvolvimento da criança. A Literatura Infantil deve
enriquecer a vida da criança. Estimular a imaginação, desenvolver o intelecto,
relacionar-se com todos os aspectos da personalidade. Promover a identificação do
leitor com o texto, em um diálogo crítico. Tornar claras as emoções e colaborar na
superação de conflitos. Quais contribuições encontramos na Literatura Infantil para o
desenvolvimento dos indivíduos?
UNIDADE 4: LITERATURA E EDUCAÇÃO
A escola é um lugar privilegiado do leitor com o livro. Desde pequenos, o
contato com os livros deve ser incentivado nas crianças, para que desenvolvam em sua
caminhada o interesse pelas histórias, pelos livros. Antigamente não se valorizava
tanto a transformação do indivíduo, ocorrida por meio da leitura da Literatura Infantil,
e sim os conteúdos ali contidos. Hoje, o professor precisa acompanhar o ritmo das
mudanças da sociedade atual. Um trabalho constante de atualização é imposto pela
aceleração cultural própria da sociedade tecnológica. Nessa sociedade se desenvolvem
os novos leitores, e o professor é o mediador desse processo, precisando ser ele
mesmo um leitor.
7 ORIENTAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA
Estratégias de Ensino e Aprendizagem
Cada unidade didática está organizada em três momentos:
Momento 1 - Fundamentação teórica: Em todas as etapas do processo,
procurar-se-á apresentar suporte conceitual que propicie ao aluno a
instrumentalização necessária para o acompanhamento da temática proposta. Esse
momento introduz um texto base com reflexões que serão complementadas pelas
atividades práticas e teóricas sugeridas.
Momento 2 - Atividades de pesquisa: Esse momento se destina a
promover a reflexão criativa dos alunos, a partir da realização da pesquisa bibliográfica
recomendada ou feita pela internet, para aprofundamento dos temas abordados na
unidade. O ponto de partida é o texto base, o referencial bibliográfico e os sites
recomendados que acompanham e visam a ampliação do conteúdo estudado pelo
aluno. A atividade de pesquisa requererá modos de apresentação negociados entre os
alunos e os professores e tutores podendo ser os recursos midiáticos disponíveis.
Momento 3 - Atividade prática: Nessa última seção, será proposta uma
atividade final da unidade, na qual o aluno irá construir um texto aplicando os saberes
aprendidos, o que pode se dar através da reflexão conjugada a partir delivros de
história recomendados, por exemplo, ou da reflexão sobre textos para análise. Essa
seção poderá apresentar mais de uma proposta de produção de texto.
8 AVALIAÇÃO
8.1 Atividades nos encontros presenciais com no mínimo 75% de frequência (aula na
UFPR e tutoria no Polo), desenvolvidas e fundamentadas nos textos e materiais de
apoio.
8.2 Atividades à distância na Plataforma MOODLE, com postagem de no mínimo 75%
dos registros das análises críticas das leituras, participação nos fóruns,
desenvolvimento de pesquisa, produção de textos e outras necessárias ao
entendimento e encaminhamentos, com avaliação escrita ao término da disciplina, na
modalidade presencial e sem consulta, na UFPR.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
SUMÁRIO
1 CONCEPÇÃO DE LITERATURA E DE INFÂNCIA ......................................
1.1 O QUE É LITERATURA ........................................................................
1.2 CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA ONTEM E HOJE ..............................................
2 CONTEXTO HISTÓRICO DA LITERATURA INFANTIL ...........................
2.1 PANORAMA DA LITERATURA INFANTIL? ..................................................
2.2 O QUE É LITERATURA INFANTIL? .........................................................
3 ESPAÇO OCUPADO PELA LITERATURA INFANTIL NAS DIMENSÕES
CULTURAL E PSICOLÓGICA PARA A CRIANÇA .........................................
3.1 LITERATURA INFANTIL: DIMENSÕES PSICOLÓGICA E CULTURAL ................
3.2 LITERATURA INFANTIL COMO ESTÍMULO À CRITICIDADE E AO IMAGINÁRIO .
4 LITERATURA E EDUCAÇÃO ..................................................................
4.1 LITERATURA NA ESCOLA .....................................................................
4.2 COMO SE CONSTROEM LEITORES? ........................................................
REFERÊNCIAS ......................................................................................
17
17
20
27
27
35
41
41
47
55
55
60
69
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
UNIDADE
1
CONCEPÇÃO DE
LITERATURA E DE INFÂNCIA
17
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
1 CONCEPÇÃO DE LITERATURA E DE INFÂNCIA
1.1 O QUE É LITERATURA
FIGURA 1- ILUSTRAÇÃO DO LIVRO “ERA UMA VEZ DOM QUIXOTE”FONTE: CERVANTES, 2006.
A noite das confusões
Naquele dia, nem bem amanheceu, viram ao longe trinta ou quarenta
moinhos de vento. Então Dom Quixote disse:
– Já temos aqui a primeira aventura, amigo Sancho! Está vendo aqueles gigantes
tão furiosos? Pois penso lutar com eles até matá-los para que nunca mais façam
maldades.
– Que gigantes? – Perguntou Sancho.
– Aqueles que despontam lá longe. Não está vendo que braços enormes?
– Aqueles não são gigantes, são moinhos de vento, e o que parecem braços são as
pás.
Acontece que, como Dom Quixote estava louco de amarrar, tudo o que via lhe
18
parecia igual ao que havia lido nos seus livros. Confundia porcos com dragões,
criadas com princesas, pousadas com castelos e moinhos de vento com gigantes
poderosos. Sancho lhe repetiu mil vezes que o que viam ao longe eram moinhos.
Mas vocês acham que ele acreditou?
– Vejo que está com medo! – exclamou Dom Quixote. – Mas não tema, que esse
combate é assunto meu.
E sem acrescentar mais nada, começou a cavalgar a toda velocidade, empunhando
a lança contra os gigantes da sua imaginação.
– São moinhos, senhor! – gritava Sancho.
Mas seu patrão já não podia ouvi-lo. E como o vento movesse as pás dos moinhos,
Dom Quixote dizia com grande valentia:
– Podem agitar os braços quanto queiram, que não me assustam!
Porém, quando chegou ao primeiro moinho e cravou a lança na pá, o golpe foi tão
forte que Dom Quixote e Rocinante rolaram no chão em meio a uma nuvem de
poeira. O pobre cavaleiro viu estrelas e ficou mais branco que um fantasma. Nisso,
chegou Sancho gritando:
– Eu não disse que eram moinhos?!
Ao que respondeu Dom Quixote:
– Cale-se, meu amigo, que tudo isso foi coisa do mago Frestón. No outro dia levou
meus livros pelos ares, e agora transformou os gigantes em moinhos para me ver
rolar no chão. Mas juro por minha Dulcinéia que esse feiticeiro maldito pagará muito
caro por todo o mal que está me fazendo.
O texto de Miguel de Cervantes, numa tradução de Marina Colasanti (2006, p.
36-39), presente no livro ’’Era uma vez Dom Quixote’’, traduz para a prática muitos
conceitos teóricos que pesquisamos sobre o conceito de Literatura.
O significado etimológico de literatura deriva do latim littera – “letra”. Termo
esse empregado a partir do final do século XVIII, cujo sentido é utilizado até os dias
atuais. Em geral, as pessoas entendem a literatura como aquilo que está em livro e que
tem caráter de história inventada ou de texto para ser declamado, com sons parecidos
ao final das linhas (as rimas). O termo literatura, pode ainda se referir aos livros com
textos que tratam de áreas profissionais específicas. Fala-se em literatura médica ou
jurídica em referência a textos que se referem a esses assuntos (COSTA, 2007).
Literatura se constitui num gênero textual específico, marcado pela beleza da
linguagem. Segundo Costa (2007), a leitura da literatura pode exercer diferentes
funções na escola, como informar, educar, entreter, persuadir ou expressar uma
opinião ou ideia.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
19
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
Literatura é a arte da palavra e, como tal, tem na linguagem verbal sua
matéria-prima. Os efeitos causados pelos textos literários, tal como emoções,
informação, reflexões e percepções em geral, só podem tornar-se acessíveis aos
leitores por intermédio das palavras escritas ou orais (no caso da literatura não escrita,
da poesia popular, da contação de histórias e de outras formas orais (COSTA, 2007).
A literatura colabora para formar e manter a língua como patrimônio coletivo.
Cria identidade e possibilita a livre interpretação e a identidade emocional do leitor com
o texto.
Segundo Anflor (2007):
A linguagem utilizada na Literatura é diferenciada da que se usa no
dia-a-dia (sic), tanto nas nossas conversas quanto em textos não-
literários, por ser carregada de conotação e muito rica em significados
simbólicos. Isso significa que, na linguagem literária, uma
determinada palavra pode adquirir muitos outros sentidos além
daquele que possui concretamente. A Literatura necessita apoiar-se
em uma determinada língua para que possa existir, pois é através da
expressão verbal que ela se realiza (ANFLOR, 2007).
Em seu texto Formação de leitura e razões para a Literatura’’, Azevedo (2004,
2010) fala da literatura como a arte feita com palavras e suas características:
1. Recorrer à ficção e ao discurso poético. A ficção nos encaminha ao
imaginário e à fantasia.
2. Pode e deve inventar palavras, [...] pode transgredir as normas
oficiais da Língua; pode criar ritmos inesperados e explorar
sonoridades entre palavras; pode brincar com trocadilhos e duplos
sentidos; pode recorrer a metáforas, metonímias, sinédoques e
ironias; pode ser simbólico; pode ser propositalmente ambíguo e até
mesmo obscuro. Tal tipo de discurso tende à plurissignificação, à
conotação, almeja que diferentes leitores possam chegar a diferentes
interpretações. É possível dizer que quanto mais leituras um texto
literário suscitar, maior será sua qualidade.
Voltemos agora ao texto de Miguel de Cervantes. Quando Sancho fala a Dom
Quixote:
“
“Sancho lhe repetiu mil vezes que o que viam ao longe eram moinhos. Mas vocês
acham que ele acreditou?”
Observe o tipo de linguagem utilizada. Como você descreveria Sancho? E Dom
Quixote? Existe uma relação entre este trecho e o conceito de Literatura?
20
Moinho
Engenho que se destina à moagem, esp. de cereais, composto de duas mós postas
uma sobre a outra, movidas pelo vento, água ou motor (HOUAISS; VILLAR; FRANCO,
2009).
Ex.: m. de vento
Compare agora os dois textos que aqui estão apresentados. Qual deles você
percebe informativo? Há diferença na forma com que os dois textos foram escritos?
Nesse exemplo não há mistério. O segundo quadro é a definição do que seja
um moinho, levando-se em consideração suas especificidades. Já no primeiro texto, as
pás do moinho são braços, são gigantes, o que faz dele um texto literário pois enfatiza
a linguagem poética.
Procure saber mais sobre o texto de Miguel de Cervantes. Quem era Sancho,
Dulcinéia, Dom Quixote e Rocinante. Que importância tem esse texto na história
da Literatura e descreva as características de cada personagem para melhor
conhecê-los.
A turma deverá se dividir em dois grupos e utilizando a ferramenta de produção
colaborativa Wiki organizar um texto de cada grupo com a pesquisa proposta. Conclua
o seu trabalho, realizando uma crítica ao texto lido.
A partir do que você já conhece, sugira outros dois títulos para a história. Um
que convide à imaginação e outro informativo. Leia Dom Quixote para
crianças, de Monteiro Lobato, Editora Brasiliense.
Elabore um resumo de duas laudas, contando com suas palavras o que compreendeu
da história e faça uma crítica sobre o texto lido.
1.2 CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA ONTEM E HOJE
Na sociedade medieval não existia essa conscientização das particularidades
do infantil. Logo que a criança atingia mais independência, sem precisar da ajuda de
sua mãe ou ama, ingressava no mundo dos adultos. A sociedade dos adultos
Agora, pare um pouquinho e perceba-se lendo o texto. Que emoção sentiu
durante a leitura. Que imagens foram se desenhando ao longo dele. Que outras
relações vieram ao seu pensamento enquanto realizava a leitura. Teria a literatura essa
capacidade de ampliar-se para outros saberes?
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
21
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
compreendia crianças e jovens de pouca idade. A criança era vista com um adulto em
miniatura, sendo assim representada na pintura.
A mortalidade infantil era muito alta, então a criança era vista como alguém ao
qual não se podia apegar. Por outro lado, o índice de natalidade era grande e a perda
vista como natural. Até o século XVII a sociedade não dava atenção às crianças.
Segundo Ariès (1986), até o século XVII, a socialização da criança e a
transmissão de valores e de conhecimentos não eram assegurados pelas famílias. A
criança era afastada cedo de seus pais e passava a conviver com outros adultos,
ajudando-os em suas tarefas. A partir daí, não se distinguia mais desses. Nesse
contato, a criança passava dessa fase direto para a vida adulta.
O primeiro sentimento de infância, conforme Ariès (1986), – caracterizado
pela “paparicação” – surgiu no meio familiar, na companhia das criancinhas pequenas.
O segundo, ao contrário, proveio de uma fonte exterior à família: dos eclesiásticos ou
dos homens da lei, raros até o século XVI, e de um maior número de moralistas no
século XVII, preocupados com a disciplina e a racionalidade dos costumes. Esses
moralistas haviam-se tornado sensíveis ao fenômeno outrora negligenciado da
infância, mas recusavam-se a considerar as crianças como brinquedos encantadores,
pois viam nelas frágeis criaturas de Deus que era preciso ao mesmo tempo preservar e
disciplinar. Esse sentimento, por sua vez, passou para a vida familiar. Junto a esses
elementos, juntaria-se ainda a preocupação com a higiene e a saúde física. A presença
da criança e sua existência eram objeto de preocupação. A criança adquiria um lugar
no seio da estrutura familiar.
Essa afetividade era demonstrada, principalmente, por meio da valorização
que a educação passou a ter. A aprendizagem das crianças, que antes se dava na
convivência delas com os adultos em suas tarefas cotidianas, passou a dar-se na
escola. O trabalho com fins educativos foi substituído pela escola, que passou a ser
responsável pelo processo de formação. As crianças foram então separadas dos
adultos e mantidas em escolas até estarem “prontas” para a vida em sociedade
(ARIÈS, 1986).
As mudanças beneficiaram as crianças da burguesia, pois as crianças do povo
continuaram a não ter acesso aos ganhos representados pela nova concepção de
infância, como o direito à educação e a cuidados mais específicos, sendo direcionadas
para o trabalho.
Segundo Ariès, até o século XVII, a criança era afastada cedo de seus pais e
22
passava a conviver com outros adultos, ajudando-os em suas tarefas. A partir daí, não
se distinguia mais desses. Nesse contato, a criança passava dessa fase direto para a
vida adulta (ARIÈS, 1986). Com o passar do tempo, a criança passa a ocupar lugar de
destaque na sociedade e o sentimento de infância passa a ser considerado.
Hoje, a criança é vista como um sujeito de direitos, situado historicamente e
que precisa ter as suas necessidades físicas, cognitivas, psicológicas, emocionais e
sociais supridas, caracterizando um atendimento integral e integrado da criança. Ela
deve ter todas as suas dimensões respeitadas. A aprendizagem passou a dar-se na
escola que tornou-se a responsável pelo processo de formação. A Igreja passa a
direcionar a aprendizagem, que, acreditavam, era fruto do pecado e deveria ser
conduzida ao caminho do bem. Esse sentimento inspirou toda a educação do século
XX.
A vida familiar ganha caráter privado, com a família interessando-se pela
criança, incluindo os aspectos de higiene e saúde e reduzindo assim, a mortalidade
infantil. Começa a existir uma preocupação em conhecer sua mentalidade, adaptando
métodos de educação, visando maior aprendizagem.
No trecho da música, composição de Milton Nascimento (1996), “Bola de
Meia, Bola de Gude” podemos perceber o papel importante que a criança ocupa na
atualidade.
[...] Há um menino, há um moleque, morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto balança ele vem pra me dar a mão
Há um passado no meu presente, o sol bem quente lá no meu quintal
Toda vez que a bruxa me assombra o menino me dá a mão
Ele fala de coisas bonitas que eu acredito que não deixarão de existir
Amizade, palavra, respeito, caráter, bondade, alegria e amor [...]
Na música percebemos, que os aspectos destacados pelo compositor, que
caracterizam a criança, é o ser puro, amoroso, ingênuo, angelical. Essa conotação é
bastante usada quando se fala em infância. Porém, em meio a tantas mudanças
educacionais, culturais, políticas, tecnológicas, influenciando essa nova mentalidade
que está se desenvolvendo, vemos novas definições para os indivíduos que vivem essa
idade, com crianças não tão ingênuas e mais autônomas.
De um tempo onde não eram consideradas, passaram a um status de
importância acentuada. Esse fator afetou também o adulto, que muitas vezes, vê sua
autoridade contestada, sendo comandados pelos desejos infantis.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
23
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
Segundo Korczak (1981):
Se eu soubesse naquela época, nunca teria feito força para crescer. Ser
criança é mil vezes melhor. Os adultos são infelizes. Não é verdade que
eles podem fazer o que querem. Têm até menos liberdade do que as
crianças. Têm pesadas responsabilidades. Têm mais aborrecimento. É
mais raro terem pensamentos alegres. É verdade que nós, os adultos,
não choramos mais; deve ser porque não vale mais a pena chorar. Em
vez disso, suspiramos fundo.
E suspirei.
Suspirei fundo, o mais fundo que pude: o que é que se vai fazer – está
tudo perdido. Não adianta. Nunca mais serei criança (KORCZAK, 1981,
p.19).
O autor descreve aqui o desejo de voltar a ser criança, o sentimento de que as
crianças vivem sem os problemas que cercam a vida adulta. Percebo que a saudade
dele volta-se a um tempo que a imaginação ocupa um enorme espaço. Ao lado dos
problemas enfrentados e, atualmente são muitos que afetam nossas crianças, há uma
leveza que caracteriza algumas delas e ainda faz manter a ideia do ser angelical.
O mundo impõe-se de forma incisiva diante delas, que precisariam encontrar
em suas famílias e escola um lugar que as instrumentalizasse para essa caminhada.
Antes, quem formava a criança era a igreja, a família, a escola e outras
instituições. Na pós-modernidade a ideia de infância é ampliada além dessas
instituições. Uma sociedade onde impera o individualismo, o hedonismo, o consumo e
a mídia, atinge diretamente o desenvolvimento das crianças. Desde pequenas
aprendem a reconhecer a propaganda, por exemplo, do McDonald's. Não sabem ler,
mas de longe identificam a logomarca e o definem como um excelente passeio, que
ocupa o lugar de outras atividades de lazer que comportavam a vida das famílias.
Brinquedos cada vez mais sofisticados tornam-se indispensáveis. Os pais rendem-se,
muitas vezes, a todos os pedidos das crianças, pensando que devem demonstrar seu
amor dando de presente, aquele objeto divulgado insistentemente na mídia. A
mercantilização é um dos definidores da cultura infantil.
Schor, citado por Momo (2010), desenvolveu um estudo divulgado em seu
livro Born to buy (Nascido para comprar), o qual se tornou um best-seller, que
evidencia e denuncia o ataque à infância empreendido pelas redes de consumo. Ela
acompanhou o trabalho desenvolvido por grandes corporações e pôde constatar que as
crianças norte-americanas de oito meses já reconhecem logomarca; as de um ano já
assistem Teletubies e comem McDonald's; antes de dois anos, pedem produtos pelo
nome da marca; aos três e três anos e meio começam a acreditar que as marcas
comunicam suas qualidades pessoais (dizer se elas são espertas, por exemplo); na
24
escola inicial já evocam mais de duzentas marcas e acumulam uma quantidade de
setenta brinquedos novos por ano; e aos seis/sete anos, as meninas pedem a última
moda, pintam as unhas e cantam músicas pop. A autora afirma que atualmente, nos
Estados Unidos, as crianças são o epicentro da cultura de consumo e suas opiniões
moldam as estratégias de marketing. Segundo a autora, as crianças são as primeiras a
adotar e utilizar as novas tecnologias, conhecem e se envolvem com a mídia eletrônica
(televisão, Internet, videogames, cinema etc.) e tem influência na escolha de produtos
e marcas que serão consumidos pela família.
Diante da concepção dessa nova criança também a escola, os professores e as
famílias encontram-se na busca de novos parâmetros que garantam uma educação de
qualidade, valores e cidadania. Criança que aprenda a discernir criticamente diante de
tanta oferta de consumo.
Pesquise no livro de Ariès (1986), as características do sentimento de infância,
da era medieval ao século XIX.
Faça uma síntese em duas laudas de todos os aspectos marcantes que o
definiram.
Elabore um quadro apontando a visão que o professor tem da criança de hoje,
em sala de aula. Para a realização dessa atividade, entreviste um professor dos
anos iniciais (1º ou 2º ano) do Ensino Fundamental e outro da 8ª série. Após a
construção do quadro, comente e compare a visão dos professores entrevistados,
dando seu parecer em relação ao que foi observado pelos referidos docentes. Atente
para focar nos aspectos comportamentais, atitudinais e cognitivos. O texto não deverá
ultrapassar duas laudas.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
UNIDADE
2
CONTEXTO HISTÓRICO
DA LITERATURA INFANTIL
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
27
2 CONTEXTO HISTÓRICO DA LITERATURA INFANTIL
Sabemos que a literatura infantil possibilita o desenvolvimento das
capacidades afetivas e intelectuais. O texto que vai ao encontro de seu leitor, em suas
necessidades, facilita a compreensão do real. Com o passar do tempo, modificam-se os
leitores, mas a fantasia permanece.
2.1 PANORAMA DA LITERATURA INFANTIL?
Segundo Alves e Brandão (2006):
Uma coisa que acho fantástica sobre a literatura e a poesia é que nelas
a gente sente prazer em repetir. Por exemplo, um texto científico, uma
vez lido e entendido, nunca mais será lido. Isso tem a ver com a briga
que travo, vez ou outra, com os gramáticos. Briga contínua, porque
eles colocaram a palavra “estória” em desuso, ensinando às crianças e
aos jovens que se deve usar sempre “história”.
Pois Guimarães Rosa diz: “Tu, também, dizendo a 'estória' não quer
tornar-se 'história'. A 'estória' é contra a 'história'. Então o que é
'história'? A “história” é um passado que aconteceu e não volta mais. A
“estória” é o que nunca aconteceu e que acontece sempre, porque isso
que você diz não é o que aconteceu, mas o que está sempre
acontecendo.
É como se cada um de nós fosse um artista trabalhando com matéria-
prima. Toda vez que se conta um “causo” – “quem conta um conto
aumenta um ponto” -, é uma outra coisa, recriada. A gente ouve e se
emociona, se sente tocado. A gente chora. É isso que não entendo.
Posso entender que prender o dedo na porta me faça chorar, faça uma
criança chorar, mas que uma palavra – guarda-comida – ou o cheiro de
capim-gordura tenha tal poder poético e profético é realmente
surpreendente!
Uma vez, escrevi um longo artigo para uma revista. Depois, recebi
uma carta de um homem lá de Poços de Caldas falando sobre o artigo.
Do artigo, ele tirou uma palavra, uma expressão. Ele não falou nada do
artigo, só falou sobre “o cheiro do capim-gordura'. E quando falou “o
cheiro do capim-gordura', que eu tinha escrito “capim-gordura”, nós
criamos uma comunhão. É como se o capim-gordura fosse parte de
nós dois. Este é meu corpo, esse é seu corpo, então, nós dois vivemos
juntos uma comunhão. A poesia e a literatura criam comunhão, e a
gente descobre que é igual ao outro (ALVES; BRANDÃO, 2006, p. 58).
Acredito que esse texto expressa bem o sentimento a respeito da Literatura ao
falar de leitor e texto em comunhão. Quando há identificação, leitor e texto, por alguns
momentos, tornam-se únicos, unidos pela estética da linguagem.
28
Rubem Alves fala da questão da repetição. Quantas vezes em sala de aula -
trabalhei muitos anos com crianças do ensino fundamental - precisei contar e recontar
a mesma história para as crianças. Ela era recebida como se fosse ainda desconhecida
por todos eles, que a esperavam com ansiedade. Qual a mágica que se esconde nas
linhas das histórias?
De acordo com Coelho (1987):
A verdadeira evolução de um povo se faz ao nível da mente, ao nível da
consciência-de-mundo que cada um vai assimilando desde a infância
[...] É ao livro, à palavra escrita, que atribuímos a maior
responsabilidade na formação da consciência-de-mundo das crianças
e jovens (COELHO, 1987, p.2).
A partir dos anos 70, observamos um crescimento muito grande da Literatura
Infantil. Sedimenta-se a consciência de que a Literatura permite maneiras de ler o
mundo, que se sobrepõem a qualquer outras.
Coelho (1987, p. 2) afirma que Literatura oral ou Literatura escrita foram as
principais formas pelas quais recebemos a herança da tradição que nos cabe
transformar, tal qual outros o fizeram, antes de nós, com os valores herdados e por sua
vez renovados.
No início do século começou uma necessária transformação que encontra na
Literatura infantil o agente para a nova mentalidade que se cria. Sob onda nacionalista,
o Brasil começa a produzir livros infantis. Há valorização do País, do local, havendo a
preocupação de tornar os textos para crianças mais interessantes.
Como cita Perroti (1986):
[...] uma literatura brasileira para crianças e jovens não existirá antes
da década de 20. Ela só se iniciará, na verdade, com Lobato, conforme
atestam referências históricas [...] o que possuíamos eram “leituras
escolares”, de feição nitidamente didática. O que era lido pelas
crianças era uma literatura constituída por textos portugueses feitos
para essa faixa ou textos não infantis, como Os Lusíadas, de Camões,
ou ainda textos traduzidos vindos de Portugal, adaptados ou não.
Textos importados de Portugal, como História do Trancoso ou
traduzido: Perrault, Grimm, Andersen etc (PERROTI, 1986, p.57).
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Em 1984 (alguns historiadores, dizem 1986), Figueiredo Pimentel lança Os
Contos da Carochinha’’, seguindo-se as Histórias da avozinha’’ e as Histórias da
baratinha’’. Apesar de iniciador de um trabalho de literatura, restringiu-se a
adaptações de contos clássicos vindos de Portugal. Era uma concepção de Literatura
expressa em contos morais e explicitava a concepção utilitária presente na Literatura
para crianças. Começa a desvincular-se da Literatura escolar. Afirma Perroti (1986),
que na verdade, existe uma atitude social generalizada que concebe a literatura para
crianças como instrumento de formação, antes de qualquer coisa, seja ela escolar ou
não. Em consequência seriam necessárias mudanças sociais mais amplas para que
uma nova concepção literária pudesse surgir, desenvolver-se.
A literatura escolar passou a ser o modelo dessa literatura. Ou seja, servir-se
do literário para atender finalidades outras que não a estética, e nas palavras de Perroti
(1986), o problema será que, misturando-se ao campo da literatura propriamente dita,
essa literatura didática contaminaria a área do especificamente artístico, reforçando a
concepção da literatura para crianças como literatura utilitária que nos chegava da
Europa, através de publicações traduzidas em Portugal.
O Brasil foi campo fértil para a expansão desse ideal literário. A “condição
colonial” criava ambiente propício para a assimilação do conceito utilitário da literatura
para crianças, para a mesclagem da literatura à pedagogia. A partir de Lobato, uma
nova geração de educadores, entre eles, Cecília Meirelles, tentam expressar essa nova
concepção de Literatura para crianças que surge. Ela, especialmente, preocupava-se
com a questão estética da literatura infantil com extensões pedagógicas. Deixa vasta
produção literária destinada ao público infantil, para o qual valoriza a rima, a
musicalidade e a sensibilidade.
A brasilidade é presente nos escritos às crianças e mesmo Lobato é atingido
por essa preocupação. Lobato pretende, com sua obra, transmitir o sentimento das
coisas da terra, formar homens livres, capazes de retirar o país de sua condição
subdesenvolvida (PERROTI, 1986, p. 61).
A seguir, apresentamos um trecho de Lajolo (2010):
José Renato Monteiro Lobato nasceu em Taubaté, cidade do interior de
São Paulo, em 18 de abril de 1882. Mais tarde, mudou seu nome para
José Bento, o mesmo de seu pai. Muito jovem, com apenas quinze
anos, perdeu o pai e, no ano seguinte, a mãe, indo viver com seu avô
materno, o Barão de Tremembé. Sempre gostou muito de ler e de
pintar e sonhava ser pintor, mas acabou sendo convencido pelo avô a
cursar Direito na Faculdade do Largo de São Francisco, em São Paulo.
“
“ “
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
29
Formado, tornou-se promotor em uma pequena cidade de nome
Areias. Casou-se com Maria da Pureza Natividade, carinhosamente
chamada Purezinha, com quem teve quatro filhos. Ainda em Areias,
começou a escrever para jornais e revistas. Com a morte do avô,
herdou a Fazenda São José do Buquira e decidiu administrá-la,
abandonando a carreira jurídica. Depois da frustrante experiência
como fazendeiro, mudou-se para S. Paulo, tornando-se editor da
Revista do Brasil, que pertencia ao grupo do jornal O Estado de S.
Paulo.
Sua vida transformou-se e Lobato envolveu-se em uma série de
projetos: fundou a Editora Monteiro Lobato, que abriu espaço para
novos escritores, além de modernizar o tratamento gráfico dado aos
livros e seu processo de vendas.
É neste momento que Lobato escreve A menina do narizinho
arrebitado, que inaugura sua criação literária para crianças. Alguns
anos depois, decidiu mudar-se para Buenos Aires, onde contava com
muitos admiradores. Regressou a São Paulo, onde morreu em 4 de
julho de 1948.
Lobato escreveu vários contos para adultos, mas é na literatura infantil
que é consagrado por leitores e críticos. Em homenagem a Lobato,
considerado
o pai da literatura infantil brasileira, o dia 18 de abril, dia de seu
nascimento, tornou-se o Dia Nacional do Livro Infantil (LAJOLO,
2010).
Gregorin Filho (2009, p. 28-29), afirma que, com o surgimento de Monteiro
Lobato, a criança passa a ter voz, ainda que uma voz vinda de uma boneca de pano,
Emília. A contestação, a irreverência adquirem concretude com as ilustrações do Sítio
do Pica-pau Amarelo. Características antes não exploradas em textos infantis,
aparecem agora nos textos de Lobato.
Segundo Gregorin Filho (2009):
Apelo a teoria evolucionistas para explicar o destino da sociedade;
onipresença da realidade brasileira; olhar empresarial; preocupação
com problemas sociais; soluções idealistas e liberais para os
problemas sociais; tentativa de despertar no leitor uma flexibilidade
em face do modo habitual de ver o mundo; relativismo de
valores;questionamento do etnocentrismo e a religião como resultado
da miséria e da ignorância (GREGORIN FILHO, 2009, p. 28-29).
Lobato fora o precursor de uma nova Literatura destinada às crianças no
Brasil. Essa mesma literatura que passaria por uma ditadura militar e inúmeras
mudanças na sociedade e tecnologia.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
30
31
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
FIGURA 2 - CAPA DO LIVRO DE MONTEIRO LOBATO “A MENINA DO NARIZINHO
ARREBITADO” (1921).
FONTE:http://acervomonteirolobato.blogspot.com/2009/09/menina-do-narizinho-
arrebitado.html
Reinações de Narizinho é um livro infantil de autoria de Monteiro Lobato
(1921). É o livro que serve de propulsor à série que seria protagonizada no Sítio do
Picapau Amarelo. Apresenta os personagens de grande sucesso: Emília, a boneca que
fala, Pedrinho e Narizinho, as crianças que partem nas aventuras, o Visconde de
Sabugosa, o sabugo de milho que é um sábio, Dona Benta, Tia Nastácia, o Marquês de
Rabicó e outros.
Conheça um pequeno trecho do livro de Monteiro Lobato, “Reinações de
Narizinho”, antes chamado de “A menina do narizinho arrebitado”, primeiro livro
destinado ao público infantil, lançado em 1921.
Lobato, citado por Bertolucci (2010):
Qual seda, nada! Feito de cor – e cor do mar! Em vez de enfeites
conhecidos – rendas, entremeios, fitas, bordados, plissés ou vidrilhos,
era enfeitado com peixinhos do mar. Não de alguns peixinhos só, mas
de todos os peixinhos – os vermelhos, os azuis, os dourados, os de
escamas furta-cor, os compridinhos, os roliços como bolas, os
achatados, os de cauda bicudinha, os de olhos que parecem pedras
preciosas, os de longos fios de barba movediços – todos, todos!... Foi
ali que Narizinho viu como eram infinitamente variadas a forma e a cor
dos habitantes do mar. Alguns davam ideia de verdadeiras joias vivas,
como se feitos por um ourives que não tivesse o menor dó de gastar os
mais ricos diamantes e opalas e rubis e esmeraldas e pérolas e
turmalinas da sua coleção. E esses peixinhos-joias não estavam
32
pregados no tecido, como os enfeites e aplicações que se usam na
terra. Estavam vivinhos, nadando na cor-do-mar como se nadassem
n'água. De modo que o vestido variava sempre, e variava tão lindo,
lindo, lindo, que a tontura da menina apertou e ela pôs-se a chorar.
[...] O mais lindo era que o vestido não parava um só instante. Não
parava de faiscar e brilhar, e piscar e furtar-cor, porque os peixinhos
não paravam de nadar nele, descrevendo as mais caprichosas curvas
por entre as algas boiantes. As algas ondeavam as suas cabeleiras
verdes e os peixinhos brincavam de rodear os fios ondulantes sem
nunca tocá-los nem com a pontinha do rabo. De modo que tudo aquilo
virava e mexia e subia e descia e corria e fugia e nadava e boiava e
pulava e dançava que não tinha fim [...].
Este é um trecho do primeiro livro voltado ao público infantil. O último foi “Os
Doze Trabalhos de Hércules”, em 1944, entre muitas outras literárias editadas por ele.
Uma de suas obras de grande destaque é “O Sítio do Pica-Pau Amarelo”, um mundo
imaginário onde todas as fronteiras são abolidas, tanto entre “humanos, não
humanos, pessoas e animais, realidade e fantasia”, segundo Zilberman e Silva (2008,
p. 360). Monteiro Lobato faleceu em 1948. A Literatura Infantil, após as incursões de
sucesso dele, é vista agora como algo rentável, dando oportunidade a novos escritores
brasileiros serem publicados.
De 1945 à década de 1960, o Brasil viveu período de retrocesso no que diz
respeito à criatividade. Em seu final, diante da repressão, usou-se os recursos da
linguagem figurada como forma de contestação.
Segundo Aguiar (2001):
As obras infantis do período absorveram os procedimentos massivos
da produção cultural para adultos, incrementada a partir da década de
50, com o avanço do processo industrial e com o surgimento da
televisão e de todos os demais produtos de largo e indiscriminado
consumo. O modelo lobatiano de contar histórias foi absorvido pelos
novos autores e repetido à exaustão, sem qualquer inventividade ou
preocupação em retratar a diversidade cultural brasileira no seu
linguajar próprio (AGUIAR, 2001, p. 26).
Ao final da década de 60 a produção infantil brasileira se encaminha de forma
promissora. Escritores utilizam-se da linguagem figurada para expressar o que não era
permitido, em um período de repressão no País.
A reforma de ensino, em 1970, abre a escola à população. O livro passa a ser
privilegiado, assim como os exames seletivos. Aguiar (2001, p. 28) aponta que junto a
edições de qualidade gráfica e estética – que propiciaram uma reorganização, pela
criança, de suas percepções do mundo e das próprias experiências existenciais –
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
33
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
surgiram obras que não tinham compromisso com o leitor infantil; “pecaram pelo
pedagogismo, pela imbecilização da infância ou pela incapacidade de promover a
identificação da criança com as propostas ali contidas.”
FIGURA 3 – CAPA DO LIVRO “HISTÓRIA MEIO AO CONTRÁRIO”, DE MACHADO
(1997)
FONTE: http://www.anamariamachado.com/livro/historia-meio-ao-contrario
A seguir, veja o trecho do release da história de Ana Maria Machado (1997):
E então eles se casaram, tiveram uma filha linda como um raio de sol e
viveram felizes para sempre. É o fim da história? Não, é o começo. Mas
não é por isso que a história é meio ao contrário, quer dizer, não é só
por isso. Entre muitas risadas, você vai descobrir que 'ser feliz para
sempre' não é tão fácil assim e pode ser até meio chato. E que de nada
adianta o poder do rei, a beleza da princesa, a coragem do príncipe [...]
se não puderem fazer sua própria história. E por falar em história, esta
já virou um clássico e é uma das mais premiadas da literatura infanto-
juvenil (MACHADO, 1997).
Assim inicia essa história, da década de 70, que utiliza o final feliz, que muitas
histórias infantis traziam. Marca ainda, uma crítica ao poder estabelecido, propiciando
uma reflexão sobre os costumes vigentes. Realiza uma quebra na tradição
estabelecida pelos textos de Literatura Infantil.
34
A literatura infantil passa a apresentar personagens que subvertiam as
normas de comportamento vigentes e propunham uma ordem mais satisfatória para
um maior número de pessoas. Muitos reis apareceram ridicularizados por simbolizar o
poder arbitrário. Os heróis infantis passaram a ser contestadores e detonadores do
conflito, revolucionando a ordem com as soluções propostas. Esta tendência se utilizou
da paródia e da inversão para fazer sua denúncia. Uma outra linha de criação buscava
retratar as categorias sociais que não apareciam nas obras literárias tradicionais, cujos
ambientes eram castelos reais e casas burguesas. O negro, o índio, o favelado, a
criança de subúrbio, o menino abandonado de rua passaram a habitar também as
páginas impressas da produção editorial (YUNES; PONDÉ, 1989, p. 79).
Na década de 80, período em que se encaminhava a abertura política, a
escolarização espalha-se pelo País. Aguiar (2001) relata a respeito:
A cultura letrada atingiu um público maior, apoiada pelos meios de
comunicação. Houve uma explosão de publicações, e a produção de
livros infantis tornou-se mais especializada, com ênfase em temas
como o cotidiano da criança, os contos de fadas modernos e, em
alguns casos, as denúncias sociais. A literatura, como bem de
consumo, viu-se presa à constante apresentação de novidades, o que
muitas vezes, enfraqueceu sua qualidade. Muitas vezes, vale mais a
linguagem visual do que o texto escrito, o que, no mínimo, deve levar-
nos a questionar o conceito de literatura infantil (AGUIAR, 2001, p.31).
Pesquise três autores que foram significativos para a Literatura infantil, nos
anos 70, fazendo um breve resumo de cada uma de suas obras.
Utilize a ferramenta Wiki e forme grupos de três pessoas para a realização da
atividade. Cada um dos elementos do grupo deve postar uma obra de cada autor,
seguida de uma apreciação crítica.
Faça uma linha do tempo, elencando de uma a duas obras editadas em cada
década, que fizeram e fazem parte da Literatura Infantil e que até hoje têm
passado de geração a geração. Utilize também as capas dos livros que pesquisar
essa atividade.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
35
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
2.2 O QUE É LITERATURA INFANTIL?
“Espelho, espelho meu, diga-me se há no mundo mulher mais bela do que eu.
E o espelho respondia: — Em todo o mundo, minha querida rainha, não existe beleza
maior.” (QDIVERTIDO, 2010).
Oliveira (2008, p. 117), coloca que é porque respondem a anseios profundos
do ser humano. São textos que tratam de sentimentos, ideias sempre presentes no ser
humano, que se manifestam em comportamentos, instintivamente, como ciúme,
inveja, medo, busca de identidade, entre outros. Cada leitura proporciona um encontro
do leitor consigo mesmo, fazendo com que todos se reconheçam neles.
Segundo Coelho (1987, p. 10) “Literatura é arte: fenômeno de criatividade
que representa o Mundo, o Homem, a Vida, através da palavra. Funde os sonhos e a
vida prática; o imaginário e o real; os ideais e sua possível/impossível realização [...].”
Perroti (1986) diz que:
Cecília Meireles faz profissão de fé no valor estético enquanto critério
norteador da criança literária para crianças e jovens. Tudo é uma
literatura só. Assim, a dificuldade está em delimitar o que se considera
como especialmente do âmbito infantil. A delimitação é realizada pelas
crianças ao escolherem seus títulos preferidos. A ela interessa
distinguir o que é “estético” e o “utilitário” (PERROTI, 1986, p. 75).
Cabe aqui traçar uma diferenciação entre “estético” e “utilitário”.
Cecília Meireles ressalta que “a realização literária implica o culto àquela
beleza gratuita que, nos grandes tempos, define a obra-prima”, a condução do leitor
para outros horizontes, sem formalismo de aprendizagem.
Ÿ Quem é que lembra da história onde encontramos essa frase?
Ÿ E quem a disse?
Ÿ E quantas vezes já a repetimos?
Ÿ E agora, quais são as histórias que fizeram parte de sua infância?
Ÿ Você costumava pedir que elas fossem
repetidas muitas e muitas vezes?
Ÿ O que será que chamava mais sua atenção em cada uma dessas
histórias que marcaram sua infância.
Ÿ Pode-se dizer que houve uma identificação do leitor com o texto?
Ÿ Por que até hoje muitos textos permanecem?
36
Já o “utilitarismo” vê na obra um instrumento de ensinamento. Essa
diferenciação nem sempre é fácil de ser estabelecida.
Perroti (1986) em relação ao objetivo da Literatura Infantil, complementa
que:
Não se trata, portanto, de negar o instrumental, a “transmissão de
valores”, pois estes são inerentes a qualquer ato de linguagem. Trata-
se de não reduzir a literatura para crianças e jovens ao discurso
“didático”, principalmente” se considerarmos que muitas crianças,
ainda hoje, tem na infância o melhor tempo disponível de sua vida:
que talvez nunca mais possam ter a liberdade de uma leitura
desinteressada (PERROTI, 1986, p.76).
Quando se fala em Literatura infantil, é comum percebermos a convivência de
critérios estéticos e pedagógicos caminharem intercalados.
Sob a designação Literatura infantil, encontra-se diversas modalidades e
processos textuais, tanto verbais como visuais. São os modos de expressão, os
processos narrativos que definem o público a que o livro está endereçado
(CADEMARTORI, 2010, p. 16).
A Literatura Infantil requer escritores que falem a esse segmento de público,
evitando assim, desencontros de visões. Esse escritor deve estar em consonância com
a ótica atual da criança. É importante ressaltar a afirmação que nos traz Costa (2007),
ao afirmar que:
É a literatura infantil, que reflete, como toda literatura, a história, a
ideologia, os costumes, as atitudes, as crenças, o inconsciente coletivo
e a cosmovisão da cultura de um povo. A literatura infantil se distingue
das demais produções culturais pela assimetria: é produzida por
adultos para destinatários crianças. Muitas vezes, essa assimetria
produz alguns equívocos: escritores constroem uma sociedade e um
mundo que estão distantes demais da ótica da criança atual; ou tratam
crianças leitoras como adultos porque desconhecem as aspirações e a
visão de mundo infantil. Em qualquer um desses casos, a produção
literária tende a desencontrar-se de seu leitor (COSTA, 2007, p. 96).
A Literatura infantil (do século XX até a década de 70), ainda segundo Oliveira
(2008, p. 121), tinha por objetivo conservar os valores sociais, religiosos, familiares
estabelecidos. Valorizava-se a submissão à autoridade, à disciplina, à ordem, à
higiene, a obediência absoluta à autoridade política, religiosa e familiar; os
preconceitos em relação à pobreza, às etnias (negra, indígena), a valorização do ter
em detrimento do ser, a discriminação do diferente e do individualismo. A criança não
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
37
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
tinha direito de opinar. Devia obedecer ao adulto e cultivar todas as virtudes possíveis.
Segundo Oliveira (2008):
Também a Literatura Infantil passa por transformações. Literatura que
privilegiasse o imaginário do leitor, uma linguagem clara e poética.
Uma Literatura questionadora, rompendo com o jogo do poder
absoluto, com o preconceito, com o individualismo, com o tabu,
deixando para trás valores ultrapassados, respeitando as etnias,
valorizando as diferenças, a solidariedade, a partilha, o altruísmo, o
ser e não o ter, a essência e não a aparência, dialogando com o mundo
que a cerca e interagindo com o processo educacional do leitor
(OLIVEIRA, 2008, p. 122).
A nova literatura vinha ao encontro da nova concepção de criança. Capaz de
criar, ser livre, ser respeitada em seus direitos básicos, sujeito de sua própria
aprendizagem e de aprender com os textos.
A Literatura infantil sempre teve uma conotação de forma literária menor,
vinculada à função utilitário-pedagógica. Conforme afirmam Palo e Oliveira (2006) a
respeito da função pedagógica:
Dentro do contexto da literatura infantil, a função pedagógica implica a
ação educativa do livro sobre a criança. De um lado, relação
comunicativa leitor-obra, tendo por intermediário o pedagógico, que
dirige e orienta o uso da informação; de outro, a cadeia de mediadores
que interceptam a relação livro-criança: família, escola, biblioteca e o
próprio mercado editorial, agentes controladores de usos que
dificultam à criança a decisão e a escolha do que é como ler (PALO;
OLIVEIRA, 2006, p. 13).
O texto literário, na visão de Yunes e Pondé (1989, p. 44), partiu para uma
revisão do mundo na perspectiva da infância, para uma pesquisa de estrutura de
linguagem e imagens próprias da criança. Ao envolver os problemas cotidianos que
fazem parte da vida das crianças, a literatura assume-se como texto artístico. Não há
só a fantasia, e sim realismo quebrando tabus e preconceitos presentes nas histórias
infantis.
Percebe-se atualmente a preocupação com a autenticidade dos textos de
Literatura Infantil e seu leitor. Sua presença é significativa na formação e
desenvolvimento. Nelly Coelho (1987), apresenta a posição de Marc Soriano ao definir
a Literatura Infantil:
A literatura é uma comunicação histórica (=localizada no tempo e no
espaço) entre um locutor ou um escritor-adulto (=emissor) e um
38
destinatário-criança (receptor) que, por definição, ao longo do período
considerado, não dispõe senão de modo parcial da experiência do real
e das estruturas linguísticas, intelectuais, afetivas e outras que
caracterizam a idade adulta. Complementa que embora não abranja a
totalidade do fenômeno em causa, essa definição toca em seus
elementos essenciais; o livro infantil é entendido como uma
“mensagem” (=comunicação) entre um autor-adulto (=o que possui a
experiência do real) e um leitor-criança (=o que deve adquirir tal
experiência). Nessa situação, o ato de ler (ou de ouvir) pelo qual se
completa o fenômeno literário, se transforma em um ato de
aprendizagem (COELHO, 1987, p.13).
A conotação pedagógica que permeia a literatura para crianças se justifica no
fato da criança estar em processo de desenvolvimento e a infância ser um período de
aprendizagem. Certamente também é utilizada como atividade mediada pela
professora ampliando possibilidades de aprendizagem.
Em relação à visão puramente como entretenimento ou pedagógica, Coelho
(1987) afirma, “acreditamos que a Literatura (para crianças ou para adultos) precisa
urgentemente ser descoberta, muito menos como mero entretenimento (pois desse se
encarregam com mais facilidade os meios de comunicação de massa).” Ela precisa ser
vista como uma rica experiência de inteligência e emoções.
Discute-se muito sobre o texto literário. Há muitas críticas quando se fala que
determinado texto não é literário.
Em duas laudas, procure explicar esse conceito de texto literário, apontando as
diferenças do texto não-literário.
Defina também o que é Literatura infantil.
Realize uma pesquisa nos livros de literatura infantil, e busque dois exemplos
práticos, em pequenos textos para exemplificar o texto literário daquele não-
literário.
Elabore uma lista de obras que merecem ser lidas pelas crianças e jovens, que façam
parte da literatura tradicional e moderna, e de seus respectivos autores e ilustradores.
Faça a postagem da sua pesquisa na plataforma Wiki.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
UNIDADE
3
ESPAÇO OCUPADO PELA LITERATURA
INFANTIL NAS DIMENSÕES CULTURAL
E PSICOLÓGICA PARA A CRIANÇA
41
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
3 ESPAÇO OCUPADO PELA LITERATURA INFANTIL NAS DIMENSÕES
CULTURAL E PSICOLÓGICA PARA A CRIANÇA
3.1 LITERATURA INFANTIL: DIMENSÕES PSICOLÓGICA E CULTURAL
O leitor constitui-se, a cada leitura, numa realidade histórica distinta,
sofrendo condicionamentos variados, originários de sua inserção social e cultural. Uma
mesma pessoa ao reler um livro, ainda que imediatamente à primeira leitura, já não é o
mesmo leitor. É um novo leitor, cujo cabedal de leituras inclui essa primeira, que se
transformará em elemento de produção de sentido da releitura iniciada. Cada um lê
com os instrumentos de sua época e de sua cultura, um capital maior, um maior. O
leitor, sem deixar de ser pessoa individual, é necessariamente uma realidade social e
histórica. Na sua leitura, inscrevem-se as marcas de seu tempo, de sua cultura, de
suas preferências, de seu desejo e de sua loucura (RIBEIRO, 2000). Vygotsky ressalta
em sua teoria, a importância que tem a interação como fator de aprendizagem. Ao
promover a interação em sala, os alunos estarão desenvolvendo também a linguagem,
o pensamento, a atenção, pois a palavra é ação. Em sua teoria, destaca a importância
do falar, pois falar ordena o pensamento, elaboração de sequência de palavras faz com
que organize o mundo para ela mesma.
Já Piaget, nos mostra que a criança, antes de pensar com a lógica dos adultos,
produz mitos. Revela a pesquisa que fez, em seu livro A representação do mundo real
na criança, onde descreve as explicações que as crianças dão aos fenômenos da
natureza (o que é a lua, o que é a noite etc.).
Até sete anos, aproximadamente, Piaget (apud AGUIAR, 2001, p. 47) afirma
que :
A criança pensa e vê do mesmo modo como desenha. A observação do
desenho nos permite captarmos o pensamento animista infantil.
Observou que a criança leva um tempo para juntar com coerência as
partes de um desenho (pense em um quebra-cabeça), necessitando
de um tempo para usar as conjunções com o intuito de estabelecer as
relações lógicas que a gramática pressupõe. Muitas vezes, a criança de
até seis ou sete anos usa palavras como “porque', “quando”, 'mas”,
articulando-as corretamente mas atribuindo a elas outros significados.
Aguiar (2001, p. 161) explica que uma das maiores riquezas das narrativas
infantis é exatamente a de ajudar a criança a ordenar seus sentimentos e a
42
compreender o mundo a partir de uma linguagem que seja compatível com sua lógica.
Bruno Bettelheim (2002) concorda com Piaget, quando afirma sobre a
necessidade infantil da mágica. Segue os princípios pesquisados por Piaget de que “o
pensamento da criança permanece animista até a puberdade”. Afirma que predomina
na mente infantil uma forma de pensar imagética. Por narrar figurativamente, o conto
de fadas consegue mais facilmente atingir o pequeno leitor, descrevendo estados
internos por meio de imagens e ações.
Cabe ao adulto conhecer essa característica, concreta e animista que as
crianças apresentam, pois como não estão prontas para compreender o sentido lógico
de frases ou palavras, muitas vezes há desencontros com os adultos que não as
interpretam corretamente. O que ocorre é a criança não estar entendendo o discurso
do adulto. Daí a importância do adulto conversar com a criança para ela desenvolver o
pensamento, familiarizando-se com as palavras e as relações entre elas (AGUIAR,
2001, p. 40-51).
À medida que se desenvolve, a criança precisa aprender a se conhecer melhor
e também aos outros, afastando-se de uma postura autocentrada. Nesse processo
encontram-se as emoções, imaginação e intelecto sendo mobilizados pelos recursos
interiores de cada pessoa. Entre as experiências mais adequadas para promover sua
capacidade de encontrar sentido na vida, Bruno Bettelheim aponta a literatura, entre
outras.
Insatisfeito com a literatura infantil, Bettelheim (2002) critica:
Os livros e as cartilhas onde se aprende a ler na escola são destinados
ao ensino das habilidades necessárias, independentemente do
significado. A maioria da chamada "literatura infantil" tenta divertir ou
informar, ou as duas coisas. Mas grande parte destes livros são tão
superficiais em substância que pouco significado pode-se obter deles.
A aquisição de habilidades, inclusive a de ler, fica destituída de valor
quando o que se aprendeu a ler não acrescenta nada de importante à
nossa vida (BETTELHEIM, 2002, p. 4).
Ainda, ao falar sobre a importância das histórias infantis, afirma que a
Literatura Infantil deve enriquecer a vida da criança. Estimular a imaginação,
desenvolver o intelecto, “tornar clara as emoções, estar harmonizada com suas
ansiedades e aspirações; reconhecer plenamente suas dificuldades e, ao mesmo
tempo, sugerir soluções para os problemas que a perturbam” (BETTELHEIM, 2002).
Relacionar-se com todos os aspectos de sua personalidade, promovendo a
autoconfiança da criança, nela mesma e em seu futuro. Os contos de fadas, mais do
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
que qualquer outro tipo de história, segundo Bettelheim (2002, p. 5) oportunizam o
conhecimento dos seres humanos, de seus problemas interiores e suas soluções.
Referem-se a problemas universais, principalmente os que preocupam as crianças. Os
contos de fadas aplicam o modelo psicanalítico da personalidade humana,
transmitindo importantes mensagens à mente consciente, pré-consciente e à
inconsciente.
Esta é exatamente a mensagem que os contos de fada transmitem à criança
de forma múltipla: que uma luta contra dificuldades graves na vida é inevitável, é parte
intrínseca da existência humana - mas que se a pessoa não se intimida mas se defronta
de modo firme com as opressões inesperadas e muitas vezes injustas, ela dominará
todos os obstáculos e, ao fim, emergirá vitoriosa. As histórias modernas escritas para
crianças pequenas evitam estes problemas existenciais, embora eles sejam questões
cruciais para todos nós.
Ao contrário do que acontece em muitas histórias infantis modernas, nos
contos de fadas o mal é tão onipresente quanto a virtude. Em praticamente todo conto
de fadas o bem e o mal recebem corpo na forma de algumas figuras e de suas ações, já
que bem e mal são onipresentes na vida e as propensões para ambos estão presentes
em todo homem. É esta dualidade que coloca o problema moral e requisita a luta para
resolvê-lo (BETTELHEIM, 2002, p. 5).
Nos contos de fadas, como na vida, a punição ou o temor dela é apenas um
fator limitado de intimidação do crime. A convicção de que o crime não compensa é um
meio de intimidação muito mais efetivo, e esta é a razão pela qual nas estórias de fadas
a pessoa má sempre perde. Não é o fato de a virtude vencer no final.
O conto de fadas não poderia ter seu impacto psicológico sobre a criança se
não fosse primeiro e antes de tudo uma obra de arte. Os contos de fadas são ímpares,
não só como uma forma de literatura, mas como “obras de arte" integralmente
compreensíveis para a criança, como nenhuma outra forma de arte o é.
Em contato com os contos de fadas, a criança, em seus devaneios, reorganiza
e fantasia sobre os elementos da história em resposta a pressões inconscientes.
Adequa, então, o conteúdo inconsciente às fantasias conscientes, o que a capacitará
para lidar com este conteúdo. “É aqui que os contos de fadas têm um valor inigualável,
conquanto oferecem novas dimensões à imaginação da criança que ela não poderia
descobrir verdadeiramente por si só” (BETTELHEIM, 2002, p. 5-7).
Em entrevista a Augusto Nunes, a governadora de Luanda, no artigo “Um
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
43
incentivo à Literatura Infantil”, em 2009, comenta a respeito da importância da
Literatura Infantil. Além de garantir a formação das crianças, ela contribui para a
preservação da identidade de um povo. Cita: “impõem-se a necessidade de transmitir
às crianças o hábito e gosto pela leitura, o que, por sua vez, passa pelo aumento
significativo de livros infantis, de modo a estimulá-las a fazerem do livro o seu melhor
amigo”. Na sua óptica, este é um método de garantir a formação contínua da nova
geração e dar um impulso às ações de desenvolvimento do país. Para que tal aconteça,
acrescentou, é necessário que se dê um grande impulso a indústria gráfica, de modo a
facilitar o acesso do livro ao leitor a preços bonificados. Além do aumento da produção
de livros infantis, a governadora considerou essencial a criação de infraestruturas
capazes de levar o livro mais próximo das comunidades.
As primeiras edições destinadas às crianças eram feitas a partir de histórias
orais, recolhidas. “Chapeuzinho Vermelho” e “João e Maria”, eram histórias ouvidas por
adultos que as repassaram de geração a geração, também por adultos. Os textos ainda
trazem resquícios desse tempo: o ambiente rural, a presença de animais, por exemplo,
o lobo, cuja presença devia causar medo às populações; a ameaça da morte e da fome,
por exemplo, na história de “João e Maria”.
Outra questão presente nas histórias é a magia e a violência. Há perigos que
nem sempre se realizam. Maldade, envenenamento, dilaceramento de órgãos,
automutilação, fazem parte de ações encontradas nelas, assim como bruxas, fadas,
feiticeiros. Esses elementos já foram contestados em alguns momentos, o que hoje já
não ocorre, também graças à contribuição de Bruno Bettelheim (2002), no livro “A
psicanálise dos contos de fadas”, que afirmava a magia não criar dependência em seus
leitores, e a violência não atingir o personagem, que acaba sempre escapando e
usando a seu favor.
No Brasil, Figueiredo Pimentel resgata os “Contos da Carochinha” e “Histórias
da Avozinha” em uma produção nacional voltada à criança. A partir daí, os escritores
nacionais pesquisaram uma vertente brasileira, em detrimento da dependência até
então da europeia.
Em 1885, visando valorizar o folclore nacional, Sílvio Romero, publica Contos
Populares do Brasil’’, antologia que reunia as várias expressões da tradição oral do
país. Em 1937, Lobato lança ’’Histórias da tia Nastácia’’, baseadas nos Contos
Populares do Brasil’’. Segundo Aguiar, Lobato não é grande admirador de nosso
folclore, transferindo aos personagens do sítio essa postura. Nessa época o Brasil
estimulado pelo Estado Novo, encontrava-se no regime ditatorial. O governo incentiva
as propagandas de elementos nacionalistas, assim como as criações populares, desde
“
“
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
44
45
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
que viessem ao encontro das ideias do governo.
Nas décadas seguintes destacam-se apenas “Histórias de Alexandre”, de
autoria de Graciliano Ramos e também o autor Orígenes Lessa, em seus escritos,
datados nos anos de 1970. Destaca-se a obra de Joel Rufino dos Santos, com a
“Coleção Curupira”, que reúne histórias do fabulário popular brasileiro, invertendo o
modo de contar histórias, modernizando a linguagem e a maneira de transmiti-la.
Resgatando o folclore brasileiro, encontramos em 1979, Haroldo Bruno como a
publicação “O Misterioso Rapto de Flor-do-Sereno” e Ricardo Azevedo, em “Meu livro
de Folclore” (1997) (ZILBERMAN, 2005, p. 94-95).
Escritores brasileiros como Chico Buarque, Marina Colasanti, com seus livros
Chapeuzinho Amarelo’’ e ’’Uma ideia toda azul’’ e Doze reis e a moça no Labirinto do
Vento’’, revolucionaram a escrita dos contos de fada, mantendo assim mesmo, as
características do gênero. Contraria a tendência que marca esse gênero ao mesmo
tempo que renova-o preservando as conquistas deste tipo de história (AGUIAR, 2001,
p. 99). A poesia esteve sempre presente desde o início da Literatura Infantil brasileira.
Yunes e Pondé (1989) ressaltam a importância que tem a leitura em nossa
sociedade, a dar voz ao cidadão, prepará-lo para ser “sujeito no ato de ler, como
preconiza Paulo Freire: o livro deve levar a uma leitura/interpretação da vida que
ajude o indivíduo na transformação de si mesmo e do mundo.”
Os autores Yunes e Pondé (1989) apontam, ainda, que a:
Ÿ a democratização da leitura em nosso país depende dos
seguinte fatores:
Ÿ de uma escolarização ampla da população, o que nos coloca
perante os problemas relativos ao ensino de leitura (alfabetização)
e de literatura;
Ÿ da diminuição das altas taxas de analfabetismo;
Ÿ a popularização da literatura, e à produção de uma literatura
“ “
O termo folclore, pode ser definido como: “Conjunto de
costumes, lendas, provérbios, manifestações artísticas em
geral, preservado, através da tradição oral, por um povo”.
Abrange um patrimônio popular já existente, veiculado
sobretudo de forma oral, composto por contos, frases,
canções, danças, atitudes; também pode ser visto como
ciência que estuda nossa cultura e tradições, como o fizeram,
Mário de Andrade e Câmara Cascudo (AGUIAR, 2001, p. 98).
46
popular;
Ÿ de uma rede atuante de bibliotecas públicas e infantis;
Ÿ de uma adequação da escola à realidade, à medida que não está
cumprindo suas tarefas básicas com competência;
Ÿ de um sistema eficaz de distribuição de livros por todo o país;
Ÿ de uma melhoria da qualidade de vida da população, para que a
família retome a sua função educadora e incentive as crianças para
a leitura (YUNES; PONDÉ, 1989, p. 34).
Cabe à literatura infantil um espaço de grande importância dentro de nossa
sociedade. Ela se assume como texto artístico, privilegiando uma postura crítica, e
concluem que:
O exercício da leitura se coloca hoje em função do circuito de
informações que controla a sociedade. Saber ler profundamente é
inserir-se na discussão do poder; isolando o saber, evitando o querer,
perpetua-se o gesto de dominação, em que o fazer está dissociado dos
níveis de participação e decisão (YUNES; PONDÉ, 1989, p. 49).
Cabe ainda refletir sobre os valores da sociedade, o conteúdo social das obras
e a influência que a literatura exerce no receptor. Yunes e Pondé já afirmavam em 1989
que um dos grandes impasses da sociedade brasileira é a democratização da leitura.
Para isso ocorrer é necessário: que se superem os índices de analfabetismo; que
melhore a qualidade de vida e o poder aquisitivo da população; que haja programas de
incentivo à leitura. Também os professores precisam receber cursos de formação,
reciclagens periódicas, gostar de ler e fazê-lo regularmente.
Mas a leitura serve, também, para nos ajudar a perceber as intenções
escondidas atrás das falas e situações existentes na nossa vida ou que
são representadas na literatura e nos meios de comunicação de massa
(YUNES; PONDÉ, 1989, p. 147).
A literatura infantil, viveu décadas de mudança, lideradas por representantes
do sexo feminino que reproduziam o que se passava na sociedade e na cultura. As
mulheres reinvindicavam reconhecimento e retribuíam com ações transformadoras. A
literatura infantil assumiu um papel de vanguarda, pois nesse gênero de livros
apareceu o maior número de escritoras e de personagens femininas no lugar de
protagonistas (AGUIAR, 2005, p. 88).
As histórias abrangem ainda, temas que envolvem sentimentos infantis e
atingem a emoção dos leitores, ao tematizarem conflitos existenciais como busca de
identidade, medo, terror, segurança. Outras são as que envolvem relações familiares,
quando a criança precisa resolver conflitos com os pais, desfrutar espaço e atenção
com os irmãos, aceitar novos membros (como a esposa do pai, o marido da mãe, um
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
47
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
irmão mais novo etc.). Enfim, descobrir modos de se relacionar e amar. [...] Ainda
encontramos narrativas cujos temas são questões históricas, sociais e ambientais
(fatos reais, preconceitos, racismo, ecologia...), policiais, ficção científica e as que
tratam de religiosidade (AGUIAR, 2001, p. 96-97).
3.2 LITERATURA INFANTIL COMO ESTÍMULO À CRITICIDADE E AO IMAGINÁRIO
As histórias desenvolvem no aluno a criticidade, oportunizando a ele pensar,
duvidar, perguntar, questionar, saber se gostou, se concordou ou não com o que foi
contado, se ficou envolvido, se não gostou. Enfim é desenvolver uma opinião a respeito
do que leu ou ouviu. De acordo com Abramovich (1989, p. 143-144), é começar a amar
um autor, um gênero, uma ideia, um assunto e, daí, ir seguindo por essa trilha e ir
encontrando outros e novos volumes... (que talvez façam o amor pelo autor redobrar,
ou provoquem uma decepção... isso tudo faz parte da vida!).
A literatura infantil são as histórias e os poemas que, ao longo dos tempos,
seduzem e cativam a criança, embora às vezes não sejam destinados ao público
infantil (e o livro “Robinson Crusoé”, de Daniel Defoé, é um exemplo). Alguns
confundem a literatura infantil como um dos tantos objetos culturais que se oferecem à
infância (tal qual as histórias em quadrinhos, os jogos, os CD-ROMs, os livros
didáticos); muitos chegam a confundi-la com esses produtos e a duvidar de seu valor
literário (AGUIAR, 2001, p. 16).
Para Aguiar (2001)
O livro infantil, enquanto modalidade artística, possui as
características estéticas que envolvem a literatura de uma forma
geral. O adjetivo que o especifica não diminui seu valor, nem significa
perda de qualidade (AGUIAR, 2001, p. 16).
Conforme Zilberman (2005), a obra infantil tem sua dimensão artística
assegurada quando rompe com o normativo, com o pedagógico, enfim, com o ponto de
vista adulto e, através de um exercício de qualidade com a linguagem, leva o leitor a
uma abrangente compreensão da existência.
Cecília Meireles, afirmou que “literatura infantil é tudo o que escrevemos para
a criança e que ela lê com utilidade e prazer”. Para ela, “o gosto e a preferência do leitor
infantil por esta ou aquela obra serve para delimitar o conceito de literatura infantil e
para afirmar a qualidade do texto” (AGUIAR, 2001, p. 17).
Bettelheim (apud AGUIAR, 2001, p. 18), a partir de um estudo sobre contos
48
de fadas, afirma que a obra infantil é aquela que, enquanto diverte a criança, oferece
esclarecimentos sobre ela mesma, favorecendo o desenvolvimento de sua
personalidade. A criança vê representados no texto, simbolicamente, conflitos que
enfrenta no dia a dia e encontra soluções porque a história traz um final feliz. O conto
de fadas dá à infância a certeza de que os problemas existem, mas podem ser
resolvidos.
Citamos vários autores, ao definirem a literatura infantil. Uma questão
importante a se discutir, é a perspectiva sob a qual se define a literatura infantil.
Analisar a possibilidade da identificação do leitor com o texto, embora o texto seja
consumido pela criança, ele é produzido pelo adulto a partir de sua vivência e
experiência.
Monteiro Lobato foi o primeiro autor da literatura infantil brasileira que deu
voz às crianças através das personagens, reproduzindo o universo inquiridor e
imaginativo delas, desafiando-as a novas descobertas. Ele mostrou que a literatura
infantil assegura o status de produção artística quando se vincula ao interesse e à
realidade do pequeno leitor. O autor de literatura para crianças precisa ter a
sensibilidade para ver o mundo com os olhos delas, ampliando esse olhar (AGUIAR,
2001, p. 20).
Tanto a literatura para crianças como para adultos participam de um mesmo
processo bastante complexo, que é o contexto cultural em que convivem elementos
diversos, como o político, o econômico, o ideológico etc. Assim o texto ajuda-a a
reelaborar o real, sob a forma do jogo e da ficção. A leitura é uma maneira de
representação do real, segundo Yunes e Pondé (1989, p. 41).
O texto literário passa a valorizar a perspectiva da infância, em suas próprias
imagens, lidando com seus problemas cotidianos inclusive. Declina, graças a isso, de
seu aspecto pedagógico, dando lugar à qualidade artística. Yunes e Pondé (1989, p.
46) afirmam, que decidida a não servir de pretexto, a literatura infantil se assume
como texto artístico, capaz de atingir também as crianças, guardando todavia
fidelidade aos princípios de estranhamento – diferença – que permitem à arte se
constituir como um modo de conhecimento, ampliando, reformulando a percepção do
leitor de qualquer idade.
A escola é um espaço de grande importância para o trabalho com literatura
infantil no ensino transformador e adequado para o professor atuar como mediador
entre a criança e a literatura. Sua responsabilidade está em escolher textos
condizentes com o contexto de seus alunos e para que:
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
49
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
Possa promover a interação participativa deles com a obra; crie
espaços implementadores (não inibidores) das propriedades dessa
leitura; provoque o desenvolvimento da fantasia, da imaginação, do
brincar; em síntese, crie o espaço da interação participativa da criança
com a história, permitindo o estabelecimento de conexões de sentido
com o que ela vive, bem como com a reelaboração de medos,
fantasias, ampliando a composição de juízos de valor e a exposição a
julgamentos diferentes, elaborados por diferentes leitores.
(OLIVEIRA, 2008, p. 30-31).
Um professor que esteja atento à construção do conhecimento dos seus
alunos possibilitará o acesso a diversidade textual, que em muito contribui para esse
processo. Oliveira (2008) complementa, ao falar da escolha de material de literatura
infantil, pelo professor:
Descobrir a natureza específica do literário presente no livro a ser
escolhido para o seu trabalho docente, e a partir daí poder ter
condições de atrair o aluno para a sua leitura e para as inúmeras
descobertas, invenções, discussões, que a interação leitor/livro
poderá provocar. É na escolha consciente das obras a serem lidas pelos
alunos que começa o trabalho do professor [...].
É fundamental que o professor esteja capacitado para usar as dinâmicas de
leitura e levar o aluno para além da compreensão linear das histórias, a fim de
descobrir seus múltiplos significados. Uma história literária oferece muitas
possibilidades formativas para o processo ensino-aprendizagem. Dentre elas:
As qualidades literárias do texto, os valores nele contidos, as situações
focalizadas, as personagens descritas. Nas sociedades tecnológicas
atuais, em que nos encontramos inseridos, há que considerar a
presença das mídias eletrônicas, também trabalhando valores de
maneira sedutora, com linguagens que de alguma forma precisam ser
incluídas no texto literário, enquanto mídia impressa, para que
adquiram qualidades comunicacionais fortemente expressivas para
crianças da sociedade atual (OLIVEIRA, 2008, p. 39).
E a Imaginação?
Encontramos no Dicionário Houaiss, várias definições, mas escolhemos a seguinte,
para imaginação: “capacidade de formar imagens originais” (HOUAISS; VILLAR;
FRANCO, 2009). Falar de literatura infantil, implica em abordar várias questões,
entre elas, o imaginário.
50
O conteúdo expressivo e simbólico da literatura contém uma
quantidade de argumentos, sobre os quais a imaginação deverá
operar e estimular, na criança, uma reelaboração criativa, onde poderá
combinar os dados de sua experiência, no sentido de construir um
novo real, correspondente às suas curiosidades e necessidades.
(PAULINO, 1997, p. 117).
Uma mente criativa faz perguntas, descobre problemas onde outros
encontram respostas, sempre faz perguntas, recusa o codificado, remanuseia objetos
e conceitos sem se deixar inibir pelo conformismo. Exemplifica que através da
literatura podemos estimular a imaginação da criança, com atividades variadas que
provoquem alguma reação, agitando imagens, recordações, analogias e significados,
que toquem a sua experiência e memória (PAULINO, 1997).
No livro de Ana Maria Machado (2003), “O menino que espiava para dentro”,
podemos perceber como a personagem principal é dotada de grande imaginação,
confira no trecho a seguir:
Viu tantos lugares, nadou tantos mares, voou pelos ares. Viu cavalos e
castelos, viu bosques de caramelos, viu piratas e palhaços, viu
vaqueiros e laços, viu automóveis-leões, viu parques de diversões, viu
carrossel de dragões. Depois andou sobre as ondas, mergulhou fundo
na terra, morou em conchas redondas, brotou no alto da serra. Viu flor
voar feito borboleta, viu cachoeira cair pro alto, viu vaga-lume fazer
careta, viu chão de som no lugar de asfalto. Viu panela que não se
esvazia, viu criança que não se machuca, viu tambor que só traz
alegria, viu olhar que derrete arapuca (MACHADO, 2003, p. 19).
Esse livro fala da criança urbana, que, embora apoiada pela família, carece de
espaço para expandir a imaginação. Embora acostumado a prestar atenção em tudo,
ele gosta mesmo é do mundo imaginário em que se isola, já que esse lhe apresenta
uma realidade muito melhor e superior: a rede onde se balança transforma-se no
barco que enfrenta um mar agitado ou perigosos piratas; se fica junto à janela, pensa
viajar em naves espaciais a distantes galáxias, e assim sucessivamente. A fantasia
suplanta a realidade, que Lucas povoa com um amigo imaginário, Talento, com quem
dialoga, confessando o plano de converter-se em personagem de conto de fada
(ZILBERMAN, 1985, p. 74).
No livro Mapa do Mundo, crônicas de aprendiz”, de Marta Morais da Costa
(2006), encontro, entre muitos, um artigo interessante que fala sobre a imaginação de
uma forma muito criativa. A partir do enredo intitulado Uma delirante confusão
fabulística’’, entoado em um desfile de escola de samba, que homenageou Hans
“
“
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
51
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
Christian Andersen (1805-1875), os compositores utilizam o mote “Era uma vez...”
Todos nós conhecemos o poderio dessas palavras, que abrem o
universo indescritível e incontrolável do imaginário, provocando entre
falantes e ouvinte o surgimento do invisível fio e de um contrato de
cumplicidade. “Era uma vez [...].” lança contador e leitor/ouvinte no
desenrolar e desenvolver de narrativas aparentemente
descompromissadas com a realidade.
[...] Mikhail Tchekóv, sobrinho do grande dramaturgo e contista russo,
escreveu: “A matéria-prima da imaginação é sempre tirada da vida”.
Vida e arte, realidade e imaginação se unem na obra resultante.
Quanto pode a arte fazer, servindo-se do imaginário, para tornar-se
um legado, para ser a herança de um excluído e estar destinada a
promover a compreensão e o encontro de culturas em terras, línguas e
formações imaginárias tão diversas? Que poder têm o escrito, a
fabulação e a simbolização para sobreviverem em terras e tempos tão
diferentes, como os séculos XIX e XXI? Em línguas tão distantes como
o dinamarquês e o português? Nas culturas nórdica e tropical? No
ritmo pausado da narrativa e no verso cadenciado do samba e da
dança erotizada do carnaval?
[...] O pó de pirlimpimpim não aliena nem ilude: nos faz ir à procura e
ao encontro de exemplos e respostas. Nas palavras do samba da
Imperatriz, “um sorriso de criança faz a gente acreditar” (COSTA,
2006, p. 68-69).
Vemos aqui um exemplo de algumas das características que têm a
imaginação. Flexibilidade, vivacidade, energia. A educação deveria ser perpassada
inteiramente pela imaginação em seu sentido mais amplo possível. Ser imaginativo, é
ter capacidade aprimorada em todas as funções mentais. Não algo distinto da razão,
mas sim o que dá flexibilidade à razão. Torna a vida mental mais abundante, mais
significativa.
Quando tentamos conceituar a imaginação, percebemos que não é fácil.
Fritzen e Cabral (2007) citam que a:
Originalidade em termos de ideias quase sempre está relacionada com
a capacidade imaginativa de 'ver' as soluções para o problema. A
imaginação se encontra como que no ponto crucial onde a percepção,
a memória, a geração de ideias, a emoção, a metáfora e, sem dúvida
outros aspectos de nossa vida se cruzam e interagem.
52
O início da Literatura Infantil é marcado pela intenção de formar a criança, de
ensinar comportamentos e atitudes e de sedimentar uma ideologia.
Forme um grupo com cinco pessoas. Cada pessoa escolhe um texto de cada autor
sugerido abaixo.
Em seguida, descreva as intenções (a ideologia oculta ou não) que você percebeu no
texto escolhido. Escreva sua opinião sobre o que descobriu:
1. Irmãos Grimm;
2. La Fontaine;
3. Monteiro Lobato;
4. Lewis Carrol;
5. Ana Maria Machado.
a) Utilizando-se da plataforma Wiki, aponte sua opinião a respeito da
importância (ou não) dos contos de fadas para o desenvolvimento das crianças.
Defenda sua posição com argumentos pesquisados entres os estudiosos do
assunto.
b) Em sua infância você leu contos de fadas? Quais os contos lidos por você?
Utilize o livro “A psicanálise dos contos de fadas”, de Bruno Bettelheim (2002).
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
UNIDADE
4
LITERATURA INFANTIL
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
55
4 LITERATURA E EDUCAÇÃO
4.1 LITERATURA NA ESCOLA
Até o século XVIII a literatura era vista como educativa. Cunha (1997), ao
falar do trabalho com literatura infantil, explica que é ele é recente no Brasil. A
literatura infantil era vista como um assunto menor, havendo intelectuais
preconceituosos, e até hoje esse comportamento ainda persiste. Ainda segundo Cunha
(1997), a boa literatura infantil é um bom material e tem os mesmos problemas que o
mau poema, o mau romance, o mau conto, a má crônica e assim por diante. É preciso
ter cuidado em não se incorrer no risco de julgar que qualquer texto seja literatura
infantil. Atualmente ainda persiste uma questão a ser melhor resolvida entre a escola e
a literatura infantil. Isso se deve ao conteúdo altamente moralizante que as primeiras
histórias infantis traziam. Percebe-se que ainda paira a cultura de que a literatura
infantil seja feita para atender a escola.
Uma definição de literatura infantil contemporânea diz que ela deve ser doce,
isto é, deve deleitar os pequenos leitores, cumprindo um destino estético, e, ao mesmo
tempo, deve ser útil, atendendo às demandas históricas, datadas, de pequenos
cidadãos de uma sociedade em crise. Qualquer dessas funções pressupõe que a
literatura infantil seja relevante, tanto no nível estético quanto no nível do
compromisso social (PAULINO, 1997, p. 107).
No livro de Sueli Cagneti e Werner Zotz (1986), ao falar sobre Literatura
infantil, apontam que:
sem dúvida, existem hoje, no Brasil, muitos e bons livros escritos para
crianças e jovens.[...] A literatura infanto-juvenil não só é o gênero
literário que mais cresceu e evoluiu, na última década, mas se mantém
viva, num processo de contínua oxigenação. E isso como decorrência
de suas próprias características. Por procurar inquietar, levantar
dúvidas, fazer pensar, ela também se questiona, não se conformando
com caminhos já trilhados, buscando sempre abrir novas
picadas...Repare ainda que não existe uma tendência única dentro da
literatura infanto-juvenil. Porque ela não se fechou em dogmas, nem
estabeleceu regras ficas. Existem sim critérios básicos, a qualidade
literária é uma delas. E neste gênero encontram-se livros de
aventuras, livros de extremo realismo, outros que recriam o
fantasioso, elemento também tão comum em nossas vidas. E ainda
livros sobre o cotidiano urbano das pessoas ou que se voltam para
motivos rurais. E livros onde o humor, a sátira, o nonsense ditam o
ritmo e a sequência de narrativa. E mesmo temas que eram
considerados tabus até bem pouco tempo atrás, temas antes proibidos
para crianças foram desmistificados sem que o mundo acabasse. A
morte, o sexo, a triste realidade política do Brasil pós-64, o racismo, a
exploração do ser mais fraco, a marginalidade infantil deram origem a
verdadeiras obras-primas (CAGNETI; ZOTZ, 1986, p.19-20).
Até o século XX, a escola tradicional visava o conteúdo, muito mais que a
transformação do indivíduo. O ambiente escolar atendia aos interesses da classe
dominante, fazendeiros, juízes, políticos, e essa educação garantiria a condição de
poder da estirpe dos que estavam no poder. Os conteúdos eram genéricos,
abrangentes e informativos. O professor era o dono do saber e o aluno o único
responsável pelo fracasso. Hoje, a educação vê o educando como sujeito da própria
educação, um ser em formação e transformação. Hoje o professor também precisa
acompanhar o ritmo das mudanças da sociedade atual. Necessita de um trabalho
constante de atualização imposto pela aceleração cultural própria da sociedade
tecnológica.
Em relação à Literatura Infantil, com a Lei n° 5.692/1971, a Literatura Infantil
é abordada como campo literário a ser incentivado na educação.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997), do final do séc. XX
enfatizam a importância da leitura em sala de aula:
A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de
construção de significado do texto, a partir de seus objetivos, do seu
conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo que sabe sobre a
língua: característica do gênero, do portador, do sistema de escrita
etc.
Não se trata simplesmente de extrair informações da escrita, decodificando-a
letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica,
necessariamente, compreensão na qual os sentidos começam a ser construídos antes
da leitura propriamente dita. Qualquer leitor experiente que conseguir analisar sua
própria leitura constatará que a decodificação é apenas um dos procedimentos que
utiliza quando lê: a leitura fluente envolve uma série de outras estratégias como
seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível rapidez e
Para conhecer a Lei nº 5.692/1971 na íntegra, acesse o endereço:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
56
proficiência.
Oliveira (2008, p. 95), afirma que “preconiza-se hoje a exploração do
fantástico, do lúdico, da fantasia, que são as metas da interação participativa do aluno
com a obra, explorando o saber literário [...]” O simples contato do aluno com a
história infantil, seja através da leitura, seja da audição ou da recepção via mídia, como
TV, cinema, teatro, já constitui uma forma de interação com seus aspectos formativos
e informativos, desde que a narrativa tenha significado para ele. E um texto
significativo é aquele que, na sua incompletude, permite ao leitor incursionar por sua
bagagem de vida pessoal, história e cultural, possibilitando novas experiências e
reelaborações. É fundamental as escolas possuírem uma biblioteca onde tenham
acesso a todo tipo de material escrito.
A escola é realmente um espaço privilegiado para o encontro entre o leitor e o
livro. Os estudos literários estimulam o exercício da mente; a percepção do real em
suas múltiplas significações; a consciência; a consciência do Eu em relação ao Outro a
leitura-do-mundo em seus vários níveis e, principalmente, dinamizam o estudo e
conhecimento da língua, da expressão verbal significativa e consciente – condição sine
qua non para a plena realidade do ser (COELHO, 1987, p. 3).
Vale ressaltar a importância que tem, principalmente nos livros infantis, o
papel da ilustração. Os livros de Eva Furnari exemplificam de forma muito clara essa
presença de uma ilustração que reflete o universo infantil propiciando uma
identificação leitor/texto/ilustração.
FIGURA 4- CAPA DO LIVRO O AMIGO DA BRUXINHA
F O N T E : h t t p : / / w w w . b i b l i o t e c a e v a f u r n a r i . c o m . b r / i e / p a g e -
livro.php?id_titulo=10015976
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
57
FIGURA 5- CAPA DO LIVRO “BRUXINHA ZUZU”
F O N T E : h t t p : / / w w w . b i b l i o t e c a e v a f u r n a r i . c o m . b r / i e / p a g e -
livro.php?id_titulo=10020401
Exemplo de que a imagem dialoga com o texto escrito (ou não), acrescenta
sentidos, contando uma história também. Funções da ilustração, apontadas por Luís
Camargo, selecionadas por Aguiar (2001):
As imagens criadas pelo ilustrador precisam fazer sentido para a criança. Como
o autor, precisa estar ao lado da criança. As primeiras histórias ouvidas ou lidas
marcam a vida delas, fazendo com que criem apreço por elas. Em sala de aula o
professor precisa explorar esse potencial que as ilustrações trazem, destacando
sempre, além do autor do livro, o ilustrador que complementa o trabalho com sua
criação.
1) Pontuar o texto;
2) Sugerir simbolicamente uma ideia não dita;
3) Narrar uma ação;
4) Expressar emoções;
5) Descrever objetos, cenários e personagens;
6) Funcionar como um jogo no livro-brinquedo;
7) Chamar a atenção para a maneira como foi esteticamente
realizada, salientando a sobreposição de pinceladas, o gesto, a
mancha, a transparência;
8) Falar de si mesma, quando, por exemplo, apresenta uma seta que
indica para onde vai a personagem ou faz com que ela rompa o
quadro em que está inserida, espie atrás dele, apareça ilustrando a
cena etc.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
58
59
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
O trabalho com a literatura infantil na escola deve levar em conta os diferentes
gêneros de textos escritos para crianças. As narrativas apresentam uma variedade de
tipos cuja construção específica deve ser do conhecimento do professor, para que as
propostas de atividades e de avaliações possam estar adequadas à concepção do
discurso literário escolhido.
Em relação à estrutura organizacional dos textos literários, encontramos os
seguintes gêneros textuais identificados na literatura infanto-juvenil: mito, lenda,
fábula, apólogo, conto, novela, crônica e as narrativas mistas, que apresentam
elementos dos demais gêneros (COSTA, 2007).
Escola e literatura podem tornar-se aliadas no processo de desenvolvimento
da criança, principalmente sendo o professor o mediador de textos que a façam refletir.
Ao professor, cabe uma seleção de textos de qualidade estética. Os pequenos leitores
têm o direito de receber textos de valor artístico (COELHO, 1987, p. 3).
Preservar as relações entre a literatura e a escola, ou o uso do livro em sala de
aula, decorre do fato de que ambas compartilham um aspecto em comum: a natureza
formativa. De fato, tanto a obra de ficção como a instituição do ensino estão voltadas à
formação do indivíduo ao qual se dirigem (ZILBERMAN, 1985, p. 21).
A obra de arte literária não se reduz a um determinado conteúdo reificado mas
depende da assimilação individual da realidade que recria. Supõe-se um intercâmbio
cognitivo entre texto e leitor. Sem ser compreendida na sua totalidade, advêm
algumas consequências, citadas por Zilberman (1985, p. 24-25):
· O professor que utiliza o livro em sala de aula, não pode ser um redutor,
transformando o sentido do texto num número limitado de observações
tidas como corretas (procedimento que encontra seu limiar nas fichas de
leitura, de respostas uniformizadas, a fim de que possam passar pelo
crivo de certo e do errado);
· Ao professor cabe o detonar das múltiplas visões que cada criação literária
sugere, enfatizando as variadas interpretações pessoais, porque estas
decorrem da compreensão que o leitor alcançou do objeto artístico, em
razão de sua percepção singular do universo representado;
· A atividade com a literatura infantil, incita o descobrimento do significado
mais profundo do objeto, sendo fundamental valorizar o processo de
compreensão, “pois é esta que complementa a recepção, na medida em
que não apenas evidencia a captação de um sentido, mas as relações
que existem entre a significação e a situação atual e histórica do leitor’’.
60
A utilização de metodologias que despertem o interesse pelo texto literário
desde as primeiras séries contribuirá para a formação profissional do aluno, uma vez
que a linguagem literária pode dar melhor condições de aquisição de um saber mesmo
técnico, por meio do estímulo à capacidade de interpretação, que permitirá ao
indivíduo situar-se melhor no trabalho. Com isso a escola estaria cumprindo sua
missão de educar não só para o trabalho, mas como para a vida, pela interação da
literatura com a realidade e pela utilização da literatura como meio primordial de
promoção do pensamento crítico. Porém, o objetivo maior seria promover a reflexão
sobre o cotidiano e sua expressão, valorizando todas as modalidades de registro
linguístico.
Assim a literatura serviria de mediadora entre a língua-padrão e os outros
falares, pelo prazer do texto e pelo jogo da interpretação, que permite a variedade de
opiniões, as diversas modalidades de linguagem.
Segundo Costa (2007), o bom texto de literatura instiga, motiva, favorece
atividades para o crescimento e o amadurecimento das competências leitoras.
Atividades devem ser realizadas com critérios, sem desvincular da condução dos
conteúdos que o texto literário exige.
Elabore uma lista com seis atividades que podem ser desenvolvidas a partir de textos.
Pesquise autores, entre eles Giani Rodari. Cada uma delas deverá vir acompanhada de
sua descrição e modo de desenvolvê-las em sala de aula.
Faça a postagem no ambiente virtual onde possa compartilhar com seus colegas as
ideias pesquisadas.
Sintetize o tema O papel da Literatura Infantil e a escola. Essa atividade tem
como objetivo reunir as principais ideias da Literatura infantil e o espaço que
ocupa na escola. Busque de três a quatro fontes de consulta e apresente em três
laudas a sua pesquisa. Ao final redija sua opinião, a partir de sua experiência com
Literatura Infantil na escola, de como ela está sendo trabalhada em sala de aula.
Combine com seu professor ou tutor a forma de postagem.
Lembre-se de referenciar a pesquisa.
4.2 COMO SE CONSTROEM LEITORES?
Quantos livros são necessários para formar um leitor proficiente? Em que
momento um leitor se torna independente e crítico? Ninguém sabe. A relação entre
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
61
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
quantidade de livros e qualidade de leitura desafia professores, pais, agentes de leitura
e o próprio leitor. Enquanto isso, questões básicas a respeito do nascimento de um
leitor continuam sem resposta.
Consideraremos atingido nosso critério de leitura crítica pelo número de
páginas lidas?
[...] A formação do leitor passa pela qualidade do texto lido. A
quantidade é decorrência. Se lemos esporadicamente, menor
intimidade temos com letras, palavras e parágrafos; em decorrência,
investe-se mais tempo no livro, mas o volume de páginas lidas é
pequeno. É normal que assim seja: a leitura tem um aspecto mecânico
a ser dominado para que a produção resulte acelerada após um
período de exercícios, como outras atividades mecânicas: bordar,
dirigir automóvel, digitar. O mérito não reside na velocidade com que
fazemos, mas na eficiência, prazer e competência com que o fazemos
(COSTA, 2007, p. 62).
A leitura pressupõe um diálogo ativo entre o leitor e o texto que lê. Ela tem
mais valor se for “saboreada”, em suas rimas, suas imagens, em um exercício de
disponibilidade entre o leitor e texto. O leitor realiza a atividade de leitura com as
estruturas cognitivas (conhecimento sobre a língua e conhecimento sobre o mundo)
que lhe são próprias além dos conhecimentos sobre a língua-fonológicos, sintáticos e
semânticos, o professor tem que mobilizar o conhecimento que o aluno traz e sua
leitura de mundo (BRAGA, 2009, p. 17).
À medida que o aluno lê, mais autonomia adquire. No momento da leitura,
deve-se levar em conta que o texto ou o livro envolve: autoria, data de publicação,
editora, edição, ilustração, ilustrador, prefácio, epígrafes, dedicatória, capa,
contracapa, capítulos, número de páginas, origem ou fonte, público-alvo, distribuição,
impressão, custo etc. A observação e a análise desses itens, permitem que o leitor
enxergue a produção escrita como uma atividade comunicativa, com uma função
social, realizada em uma determinada situação, que abrange tanto o conjunto de
enunciados que lhe deu origem quanto as condições nas quais foi produzido. Vale
lembrar que toda leitura tem uma intenção.
É o leitor quem cria, constrói o sentido a partir de seus conhecimentos, em sua
expectativa e em sua intenção de leitura. Já o professor deseja que a leitura seja feita
porque é importante e necessária para a explicitação de um assunto, ampliação de um
conhecimento, ou qualquer outro motivo. Ele pode transformar o que foi lido em algo
significativo para o aluno. É da responsabilidade do professor tornar o processo da
leitura transparente para o aluno: explicitar as intenções da leitura, as etapas que deve
percorrer, a fim de chegar à compreensão textual (BRAGA, 2009, p. 23).
“
62
A seguir, elencamos alguns pontos muito importantes adaptados do livro de
Foucambert (2008).
A criança vê, desde cedo, seus pais, irmãos, colegas mais velhos lerem livros,
jornais, instruções de uso, prospectos, catálogos, cartas familiares, cartazes na rua, a
receita do médico, um rótulo, um anúncio na televisão, faixas indicativas, letreiros das
lojas, indicações nas vitrines etc. A leitura, em seu valor afetivo e relacional, é um
constituinte de seu meio de vida, como a fala. A criança vive no meio de um mundo de
signos escritos a partir dos quais se guia: sobre as embalagens, as garrafas, o
alimento, as caixas de jogos, os jornais, a televisão, a publicidade, as placas de rua etc.
A criança, cedo associa uma significação a uma forma escrita. Desde o maternal, a
escola deve priorizar o contato com o texto escrito e, jamais excluí-lo da sala dos
pequenos porque ainda não dominam o código. No maternal o professor deve permitir
às crianças viver a aprendizagem da leitura como valor de comunicação.
Deixar o acesso livre ao canto-biblioteca, canto de leitura, onde estão reunidos
livrinhos, jornais, muito ilustrados e com textos escritos em letras grandes. As crianças
podem ir até o local sozinhas ou em grupos, solicitar a uma criança maior ou a outro
adulto que leia para ela. As crianças podem ser reunidas para uma hora do conto, e a
história lida é deixada para as crianças o manusearem livremente. Registrar os
projetos desenvolvidos em sala, os passeios, atividades significativas, que o professor
registre e retome em alguns momentos. Demonstrando a importância do registro e da
leitura.
Outra estratégia para incentivar o desenvolvimento da leitura, é a
correspondência escolar. As trocas entre as crianças da sala ou com outros grupos,
favorece a vivência das práticas sociais, a faz autora de atos de leitura.
As formas escritas aparecem no dia-a-dia da criança, naturalmente. As
etiquetas com o nome, cabides, pastas, caixas (descrição do conteúdo do interior) e
gavetas, potes etc., favorecem o uso da informação escrita.
Igualmente jogos em geral, outros que permitem colecionar e classificar o
material que as crianças tem perto delas, os rótulos de produtos, nomes dos jornais,
“quer sejam totalmente idênticos (os rótulos das garrafas de água), idênticos em
suportes diferentes (o mesmo nome escrito com os mesmos caracteres em suportes
redondos, retangulares, vermelhos etc., ou semelhantes (a mesma palavra, mas com
letra diferente) etc. , quebra-cabeças etc. (FOUCAMBERT, 2008, p. 101).
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
63
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
Assim a criança vai construindo a aprendizagem da leitura. A aprendizagem
da leitura não começa aos cinco anos, nem termina aos oito. Por volta dessa idade, a
leitura aumenta seu valor social: as pressões familiares, institucionais valorizam a
leitura, que é um valor extremamente positivo ao se orientar para o caminho da
autonomia, iniciativa, independência, afirmação de si mesma.
Nessa faixa etária o número de palavras conhecidas se avoluma ao mesmo
tempo que a significação que lhes está diretamente relacionada se torna mais precisa.
A criança conquista um domínio de funcionamento da escrita, de sua sintaxe, de suas
regras. As intervenções de ensino ajudarão a aprendizagem dos alunos: diante do
texto encontrar-lhe uma significação, origem, ilustração. As crianças, após a
exploração individual, irão, junto ao professor, falar dele - de que trata, o que se passa?
O professor ampliará o conhecimento sobre o texto. Após o trabalho, cada aluno pode
falar sobre o que compreendeu e realizar a leitura em voz alta (FOUCAMBERT, 2008, p.
121).
A criança de oito anos é um leitor dentro e fora da escola. Textos informativos,
narrativas, romances, histórias em quadrinhos, acesso a bibliotecas, em casa, na
comunidade, na escola, ou a uma biblioteca circulante. Efeitos dessa leitura são
encontrados em comportamentos: atividades induzidas pela leitura, discussões,
narração para outras pessoas, informações que se integram à vida das crianças.
De oito a onze anos, algumas situações funcionais para o desenvolvimento da
leitura se destacam: o leitor é solicitado constantemente – fora da escola, nas ruas, as
estradas, os muros, as lojas, a televisão, os jornais, atividades esportivas, os jogos, os
manuais de instruções provocam a leitura. A massa de informações escritas com as
quais a criança se defronta, é imensa.
Nas atividades escolares, a leitura é solicitada - a data no calendário, a palavra
dita pela vizinha, o enunciado do problema, a legenda sob a fotografia, as instruções
das fichas individuais, instruções de fabricação etc. O professor tem nessas situações,
uma boa oportunidade para observar e compreender o comportamento de leitores. A
essas situações, unem-se aquelas em que a leitura será a atividade principal – ter a
possibilidade de ler no tempo em que está na escola. Também a leitura em voz alta
deve ser privilegiada (FOUCAMBERT, 2008, p. 141).
O comportamento do leitor dessa fase: amplitude de fixações, rapidez dos
saltos, eliminação das voltas para trás. Ausência de qualquer vocalização,
deslocamento e alternância entre os olhos e a voz na leitura falada etc. A criança já
possui estratégias eficazes na exploração de um texto e na pesquisa de informações.
64
Já possui amplo vocabulário. O desenvolvimento se refletirá na qualidade da leitura, no
“refinamento da compreensão, o desenvolvimento do espírito crítico, o crescimento
cultural”.
E para formar esse leitor? Encontramos a resposta em Costa (2007, p. 64-66).
É imprescindível que o professor-leitor conheça quem é esse aluno-leitor, quais são
seus interesses, em que estágio de leitura se encontra já alfabetizado; letrado; com
que condições de letramento; se é capaz de leituras autônomas e críticas -, qual a sua
disponibilidade de tempo, de acesso e de interesse em ler, que funções busca na leitura
e muitos outros aspectos. A definição da identidade do leitor permite ao educador
promover a leitura segundo estratégias adequadas e com objetivos bem definidos,
condições indispensáveis para uma sólida formação do leitor.
Citamos a seguir, os estágios da leitura infantil e adolescente e os modos como
esses estágios se sucedem (ou não) nas atividades que objetivam à formação do leitor,
numa classificação de Bamberger, no livro “Como incentivar o hábito da leitura”, citado
por Costa (2007).
Quadro 1 – Estágios da leitura infantil e adolescente X características
IDADE OU FASE CARACTERÍSTICA
Idade dos livros de gravuras e dos versos
infantis (de 2 a 5 ou 6 anos)
Fase inicial integral-pessoal, egocêntrica.
Existência de mínima distinção entre o
mundo interior e o exterior. A criança se
interessa menos pelo enredo e muito mais
por cenas isoladas. São recomendados os
livros de gravuras (sem texto ou livros de
imagens). Livros-jogos ou feitos em
materiais duráveis, como os de plástico, ou
os de pano.
Idade dos contos de fadas (de 5 a 8 ou 9
anos)
Idade da leitura de realismo mágico.
Criança está mais suscetível à fantasia.
Gosta de histórias que representam um
ambiente que lhe é familiar, mesmo que
mágico.
Interessa-se por contos com cenas
domésticas, crianças em ambientes
reconhecíveis, sejam naturais, sejam
domést icos, o que poss ib i l i ta a
identificação.
Atração por histórias de um mundo
distante, de fantasia, como os que
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
65
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
constituem os contos de fadas e os contos
de tradição, mitos e lendas. Continua a
encontrar prazer no ritmo e nos sons dos
versos.
Idade dos contos de fadas (de 5 a 8 ou 9
anos)
Idade da leitura de realismo mágico.
Criança está mais suscetível à fantasia.
Gosta de histórias que representam um
ambiente que lhe é familiar, mesmo que
mágico.
Interessam-se por contos com cenas
domésticas, crianças em ambientes
reconhecíveis, sejam naturais, sejam
domést icos, o que poss ib i l i ta a
identificação.
Atração por histórias de um mundo
distante, de fantasia, como os que
constituem os contos de fadas e os contos
de tradição, mitos e lendas. Continua a
encontrar prazer no ritmo e nos sons dos
versos.
Idade das histórias ambientais ou da leitura
factual (de 9 a 12 anos)
Construção de uma fachada prática,
realista, ordenada racionalmente, diante de
um pano de fundo mágico-aventuresco
pseudorrealisticamente mascarado.
Demonstra anseio pela aventura, embora
os contos de fadas e sagas não
desapareçam de sua leitura. Recusa de
modo geral descrições estáticas.
Idade das histórias de aventuras (de 12 a
14 ou 15 anos)
Fase da leitura não psicológica orientada
para o sensacionalismo. Período de
manifestação de agressividade e de
formação de tribos. O leitor prefere enredo,
acontec imentos, sensac ional ismo.
Interesse em livros de aventuras, romances
repletos de peripécias, livros de viagens,
livros de autoajuda.
Os anos de maturidade (de 14 a 17 anos) Denominada de desenvolvimento da esfera
estético-literária da leitura. Fase da
descoberta do mundo interior. Interesse
se volta para aventuras de conteúdo mais
intelectual, livros de viagens, histórias de
amor, atualidades, literatura engajada,
matéria factual e preferência vocacionais.
66
A leitura adquire sentido à medida que o leitor passa a construir imagens
mentais e acrescenta dados de suas vivências, suas leituras e compreensão do mundo.
Ao ler a obra o leitor preenche de significados o que o texto apresenta, num legítimo
diálogo. “Quanto mais leituras o indivíduo fizer, mais propenso a modificar seus
próprios horizontes ele vai estar.” (AGUIAR, 2001, p. 148-151).
Segundo Aguiar (2001):
No ato da leitura, encontram-se as expectativas do autor traduzidas no
texto, e as do leitor transferidas para o texto, uma vez que a leitura vai
estar marcada por sua experiência e compreensão. A valorização das
obras se dá na medida em que elas produzem alteração ou expansão
dos horizontes de expectativas dos leitores de sucessivas épocas
(AGUIAR, 2001, p. 149).
O professor, em seu papel de mediador de leitura, ao pensar um percurso de
leitura, pode já iniciar na informação sobre o título e o autor, para terminar no leitor –
destinatários das ideias e interessado na divulgação delas. A seleção dos livros
apresenta responsabilidade direta no sucesso de um projeto de formação de leitores. É
imprescindível uma seleção adequada. O acesso e a aquisição dos livros também são
muito importantes. Hoje contamos com a Internet, que possibilita o acesso às obras
completas. Ler exige dedicação e tempo. O professor que realiza um
compartilhamento de significações destacando as razões da importância da leitura,
encaminha seus alunos para a aprendizagem. Ainda nesse trabalho de mediação do
professor é imprescindível para a atividade leitora, a assimilação e a difusão do que foi
lido. [...] Assimilar “para produzir energia capaz de dar vida ao cérebro, às
inteligências, à sensibilidade. Possibilitar um embate que o leitor crítico trava com os
textos que lê”. (COSTA, 2007, p. 111-112).
O professor desempenha importante papel na formação de leitores. Ele
precisa estar atualizado, pesquisando informações, observando a realidade de seus
alunos e atento em como se dá essa interação significativa entre leitor e os textos. O
professor leitor terá muito mais desenvoltura ao trabalhar com seus alunos esse
objetivo sendo, em primeiro lugar, ele um bom leitor. Segundo Costa (2007, p. 126)
“Ler se aprende lendo. Não se aprende por osmose, por resumo do enredo das
narrativas ou pelo ativismo.” Ao livro atribuímos uma grande responsabilidade para a
formação da consciência de crianças e jovens, mas é importante ser compartilhada
com a família, os professores e a escola. A Literatura Infantil tem cada vez mais
preenchido os espaços que lhe cabem nessa sociedade em transformação.
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
67
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
Formem um grupo de cinco pessoas. Cada um dos componentes do grupo
deverá representar o professor das seguintes faixas etárias:
de 2 a 5 ou 6 anos;
de 5 a 8 ou 9 anos;
de 9 a 12 anos;
de 12 a 14 ou 15 anos;
de 14 a 17 anos.
Cada um deverá escolher um título de Literatura, com respectivo resumo da obra e um
plano de trabalho a ser desenvolvido com os alunos, de acordo com a faixa etária.
Apresentem no grupo e discutam os encaminhamentos pedagógicos. Façam uma
síntese do trabalho do grupo e postem no ambiente virtual para que os outros colegas
tenham acesso à atividade desenvolvida.
Em uma lauda, escreva como um professor pode construir muitos leitores, seus
alunos, a partir de um trabalho em sala de aula, usando como base de pesquisa
o livro “Felpo Filva”, de Eva Furnari, da Editora Moderna, 2006.
A história de Felpo, um coelho poeta um pouco neurótico. Um
dia, ele recebeu a carta de uma fã que discordava dos seus
poemas, a Charlô. Ele ficou muito indignado e isso deu início a
uma troca de correspondências entre eles. O livro conta essa
história de maneira divertida, usando os mais variados tipos de
texto, como poema, fábula, carta, manual, receita e até
autobiografia, permitindo, assim, que o leitor entre em contato
com as diversas funções da escrita.
REFERÊNCIAS
ABRAMOVICH, F. Literatura Infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione,
1989.
AGUIAR, V. T. de (Coord.). Era uma vez... na escola: formando educadores para
formar leitores. Belo Horizonte: Formato Editorial, 2001.
ALVES, R.; BRANDÃO, C. Encantar o mundo pela palavra. Campinas: Papirus,
2006.
ANFLOR, T. Literatura: uma breve definição. 2007. Disponível em:
<http://pt.shvoong.com/humanities/theory-criticism/1631586-literatura-uma-
breve- defini%C3%A7%C3%A3o/>. Acesso em: 26/10/2010.
ARIÈS, P. História social da criança e da família. Tradução de: FLAKSMAN, Dora. 2.
ed. Rio de Janeiro: LTC, 1986.
AZEVEDO, R. Formação de leitores e razões para a literatura. Disponível em:
<http://www.ricardoazevedo.com.br/artnew03Mfim.htm>. Acesso em: 26/10/2010.
AZEVEDO, R. Formação de leitores e razões para a literatura. In: SOUZA, R. J. (Org.).
Caminhos para a formação do leitor. São Paulo: DCL, 2004.
BERTOLUCCI, D. M. de P. “... Livro para ler, não para ver...” as imagens escritas e
visuais em reinações de narizinho. Disponível em: <http://intranet.ufsj.edu.br/re
p_sysweb/File/vertentes/Vertentes_30/denise_bertolucci.pdf>. Acesso em:
26/10/2010.
BETTELHEIM, B. A psicanálise dos contos de fadas. Tradução de: CAETANO, Arlene.
16. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
BRAGA, R. M.; SILVESTRE, M. de F. Construindo o leitor competente: atividade de
leitura interativa para a sala de aula. 3. ed. São Paulo: Global, 2009.
BRASIL. Lei n° 5.692, de 11 de agosto de 1971. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil, Poder Legislativo, Brasília, DF, 12 ago. 1971. Disponível em:
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
69
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm>. Acesso em: 26/10/2010.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Brasília, 1997. Disponível
em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro02.pdf>. Acesso em:
26/10/2010.
BUJES, M. I. E. Dos modos de olhar a infância. In: LEHENBAUER, S.; PICAWY, M. M.;
STEYER, V. E.; WANDSCHEER, M. S. (Orgs.). O ensino fundamental no século XXI:
questões e desafios. Canoas: Ulbra, 2005. p. 49-62.
CADEMARTORI, L. O que é literatura infantil. São Paulo: Brasiliense, 2010.
CAGNETI, S. de S.; ZOTZ, W. Livro que te quero te ver livre. Rio de Janeiro: Nórdica,
1986.
CERVANTES, M. de. Era uma vez Dom Quixote. Tradução de: COLASANTI, Marina.
São Paulo: Global, 2006.
COELHO, N. N. A literatura infantil: história, teoria, análise. São Paulo: Quiron,
1987.
COSTA, M. M. da. Mapa do mundo: crônicas de aprendiz. Belo Horizonte: Leitura,
2006.
COSTA, M. M. da. Metodologia do ensino da literatura infantil. Curitiba: Ibpex,
2007.
COSTA, M. M. da. Sempreviva, a leitura. Curitiba: Aymará, 2009.
CUNHA, M. A. Escola no livro ou livro na escola? In: PAULINO, G. (Org.). O jogo do
livro infantil: textos selecionados para formação de professores. Belo Horizonte:
Dimensão, 1997.
FOUCAMBERT, J. Modos de ser leitor. Curitiba: UFPR, 2008.
FRITZEN, C.; CABRAL, G. S. Imaginação e educação em debate. Campinas:
Papirus, 2007.
GREGORIN FILHO, J. N. Literatura infantil: múltiplas linguagens na formação de
70
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
leitores. São Paulo: Melhoramentos, 2009.
HOUAISS, A.; VILLAR, M. de S.; FRANCO, F. M. de M. Dicionário Houaiss da Língua
Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.
KORCZAK, J. Quando eu voltar a ser criança. Tradução de: MICHALSKI, Yan. São
Paulo: Summus, 1981.
LAJOLO, M. (Org.). Quando o carteiro chegou... Cartões-postais a Purezinha.
Disponível em: <http://literatura.moderna.com.br/catalogo/encartes/85-16-05103-
X.pdf>. Acesso em: 26/10/2010.
LAJOLO, M.; ZILBERMAN, R. Como e por que a literatura infantil brasileira. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2005.
LAJOLO, M.; ZILBERMAN, R. Literatura infantil Brasileira: história e histórias. 6. ed.
São Paulo: Ática, 2007.
MACHADO, A. M. História meio ao contrário. São Paulo: Ática, 1997.
MACHADO, A. M. O menino que espiava pra dentro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2003.
MOMO, M. Condições culturais contemporâneas na produção de uma infância
pós-moderna que vai à escola. Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/
31ra/1trabalho/GT07-4726--Int.pdf>. Acesso em: 26/10/2010.
NASCIMENTO, M. Bola de meia, bola de gude. In: NASCIMENTO, M. Maria,
Maria/Último trem. 1996. Disponível em: <http://www.vagalume.com.br/milton-
nascimento/bola-de-meia-bola-de-gude-cifrada.html#ixzz10DArDQdy>. Acesso em:
26/10/2010.
OLIVEIRA, M. A. de. A literatura para crianças e jovens no Brasil de ontem e de
hoje: caminhos de ensino. São Paulo: Paulinas, 2008.
PALO, M. J.; OLIVEIRA, M. R. D. Literatura infantil: voz de criança. 4. ed. São Paulo:
Ática, 2006.
PAULINO, G. (Org.). O jogo do livro infantil: textos selecionados para formação de
professores. Belo Horizonte: Dimensão, 1997.
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
71
PERROTI, E. O texto sedutor na literatura infantil. São Paulo: Ícone, 1986.
QDIVERTIDO.COM.BR. Branca de Neve e outras historinhas. Disponível em:
<http://www.qdivertido.com.br/verconto.php?codigo=2>. Acesso em: 26/10/2010.
RIBEIRO, L. F. Geometrias do imaginário. Santiago de Compostela: Laiovento,
2000.
YUNES, E.; PONDÉ, G. Leitura e leituras da literatura infantil. 2. ed. São Paulo:
FTD, 1989.
ZILBERMAN, R. A literatura infantil na escola. 4. ed. São Paulo: Global, 1985.
ZILBERMAN, R. Como e por que ler a literatura infantil brasileira. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2005.
ZILBERMAN, R. No começo a leitura. Em Aberto, Brasília, ano 16, n. 69, jan./mar.
1996. Disponível em: <http://www.rbep.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/
viewFile/1035/937>. Acesso em: 26/10/2010.
ZILBERMAN, R.; SILVA, E. T. da. Literatura e pedagogia: ponto e contraponto. 2. ed.
Porto Alegre: Mercado Aberto, 2008. (Série Contrapontos).
72
PEDAGOGIA Literatura na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental