ecoturismo indígena - 2007_ivaniferreiradefaria
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UNIVERSIDADE DE SO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
CURSO DE PS-GRADUAAO EM GEOGRAFIA FSICA
Ecoturismo IndgenaTerritrio, Sustentabilidade, Multiculturalismo:
princpios para a autonomia.
Ivani Ferreira de Faria
So PauloJunho de 2008
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UNIVERSIDADE DE SO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
CURSO DE PS-GRADUAAO EM GEOGRAFIA FSICA
Ecoturismo IndgenaTerritrio, Sustentabilidade, Multiculturalismo:
princpios para a autonomia
Ivani Ferreira de Faria
Tese apresentada Banca
Examinadora da Universidade de So Paulo,
para obteno do ttulo de Doutora em
Geografia Fsica, sob a orientao da Prof.
Dra. Regina Arajo de Almeida.
So PauloJunho de 2007
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Ao meu filho Lucas e todos os homens e mulheres indgenas
pela demonstrao de carinho, confiana pelas ruas e rios da regio,
seja o Negro, Iana, Uaups, Xi, Curicuriari, Tiqui
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AGRADECIMENTOS
Agradeo sinceramente a todos que de forma direta e indireta participaram e
contriburam para a realizao e xito desta pesquisa:
minha orientadora, Regina Arajo de Almeida, pela confiana e por
compreender a natureza do meu trabalho onde a minha presena a campo era
fundamental;
Rita, que me fez despertar para o caminho metodolgico que eu j trilhava;
As minhas irms, Nna pelo seu apoio incondicional a todas, e Baby, Janinha,
meus cunhados Cac e Ca que sempre cuidaram do meu filho durante a minha
ausncia nos longos trabalhos de campo em So Gabriel como se fosse filho deles e me
apoiaram em todos os meus projetos mesmo que, s vezes, achassem loucos, por no
pedirem mais para voltar, pois entenderam que meu lugar aqui na Amaznia, noAmazonas trabalhando junto com as comunidades indgenas cujo custo o pouco
convvio familiar entre ns, filhos, sobrinhos etc. devido distncia entre Vila Velha e
Manaus;
minha segunda famlia, Arany, Aldo, Ana Cludia, Alssia, Aluzio, Junior,
Antonio Marcos, Andr, lvaro, pelo apoio e carinho constante desde a minha
adolescncia;
Ao meu amigo inseparvel, Fbio Osolins, analista ambiental do IBAMA de So
Gabriel que me acompanhou em todas as reunies nas comunidades e cujo apoio,
confiana e dedicao foram imprescindveis realizao do trabalho, principalmente
aps o nosso naufrgio no rio Negro no retorno da comunidade de Cu-cu;
Ao amigo Nonato, com quem sempre discuti a base antropolgica da pesquisa e
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dos outros trabalhos conjuntos ao longo dos anos na regio do Rio Negro com quem
partilho o ideal de contribuir para a autonomia dos povos indgenas;
Eliony, Ktia e Anglica amigas de sempre, que nas horas difceis sempre me
encorajaram e me lembravam dos meus objetivos, sonhos e de como eu sou;
s amigas do ninho Rosely, Suely, Viviane e Andra que me acolheram e
apoiaram durante o trabalho de campo em So Gabriel;
Aos professores Hidembergue e Nakagima, pelo apoio e confiana no nosso
trabalho;
DIREC/IBAMA de Braslia que financiou o projeto Ukam-sara e Lourdes
Ferreira, em particular, por acreditar na nossa capacidade de trabalho;
Fundao de Amparo Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), pela
concesso da bolsa de estudos durante 36 meses;
Maria Lcia e ao Masulo, cuja amizade tornou a nossa estada na cidade de So
Paulo em 2004 mais divertida e proveitosa em nossas passagens pelas bibliotecas,
laboratrios e longos bate-papos para descontrao;
Prefeitura de So Gabriel da Cachoeira, na pessoa do Conde, pela concesso das
bases digitais dos mapas elaborados para o plano diretor e pelas trocas de idias durante
nossas longas conversas;
diretoria da FOIRN (Andr, Domingos, Renato, Erivaldo) e, em particular, lio
Fonseca, sempre prestativo, presente, que no mediu esforos para a realizao do
trabalho e aos diretores e membros das coordenadorias Sr. Afonso, Henrique, Evaldo,
Lucas, da COITUA; Roberto, Leondio, Ivo, Rafael, da COIDI; Ado, Alexandre,
Florncio, Arthur, Gregrio, da CAIARNX; Mrio, Laureano, Camico, Trinho, Ednia,
Custdio, da CABC e Ado Tukano, Abraho, Josias, Librio, Argemiro, da CAIBRN e
todas as lideranas e capites das comunidades que nos receberam com muito carinho,respeito e confiana;
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Wal pelo bom humor e carinho com que sempre nos atendeu;
E chuva, ao sol que bateram em nosso rosto durantes as horas e dias de viagem
de voadeira e barco pelos rios, s tempestades enfrentadas e a toda beleza dos rios de
gua preta com suas praias de areia branca, com as comunidades ao longo das beiras
revelando uma paisagem mpar e ao deleite de uma noite de lua cheia durante uma
viagem tranqila pelo rio Cauaburis at Maturac;
Pelos conhecimentos compartilhados pelos povos indgenas e por ser uma eterna
aprendiz que tem muito a aprender.
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RESUMO
O presente trabalho analisa um conjunto de aes e reflexes sobre o ecoturismo
na Regio do Alto rio Negro com o objetivo de preparar as comunidades indgenas,
citadinas ou no, para que possam, atravs do processo de gesto territorial e do
conhecimento desenvolvido por meio de educao ambiental e patrimonial, planejar,
gerir projetos de sustentabilidade em ecoturismo ou outros para manterem a autonomia
sobre suas terras e suas vidas. A metodologia da pesquisa participante adotada permite
que os envolvidos demonstrem seus conhecimentos sobre seu territrio e sua cultura,
fortalecendo suas identidades enquanto povos indgenas, como sua auto-estima e
dignidade, possibilitando-lhes reafirmarem-se como protagonistas, ao assumirem o
controle das foras de transformao da sociedade promovida pelo contato com a
economia de mercado, predominante na sociedade contempornea. Tal participao
pode minimizar ou excluir os riscos dos impactos indesejveis que o ecoturismo possa
trazer, propiciando-lhes incorporar valores, prticas, significados do sistema mundial de
acordo com suas vises de mundo e seus interesses. A autora espera que o resultado
deste trabalho possa contribuir para a construo de Polticas Pblicas para o
ecoturismo indgena, propiciando uma reflexo sobre os conceitos turismo indgena,
turismo tnico, etnoturismo, ecoturismo indgena e, ao mesmo tempo, sobre as formas
de participao das comunidades tradicionais indgenas e no indgenas nos projetos e
polticas pblicas a serem implementadas pelo Estado e organizaes no-
governamentais em qualquer ramo de atividade.
Palavra-chave: Ecoturismo indgena, Territrio, Sustentabilidade, Participao eAutonomia.
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ABSTRACT
This work analyses a conjunt of actions and considerations on ecotourism in
Alto Rio Negro (High Negro River), in Amazonas State (Brazil), with the aim to
prepare urban or country native communities to be able, through the process of
territorial and knowledge management, developed through environmental and
patrimonial education, to plan and run sustainable projects in ecotourism over theirlands and their lives. The participant research methodology adopted allows the native to
demonstrate their knowledge on their territory and their culture, encouraging their
identities as native peoples and their self-esteem and dignity, making possible for them
to reassert themselves as protagonists, by assuming the control of the of the
transformation forces of society furthered by the contact with the market economy,
predominant in present day society. Such participation might reduce or exclude the risks
of undesirable impacts that ecotourism might produce, allowing them to incorporate
values, practices, meanings of the word system according to their way of thinking and
their interests. The autoress expects that this work might be able to contribute for the
construction of Public Politics in native ecotourism, producing a reflection on the
concepts on native tourism, ethnic tourism, ethnotourism, ecotourism, native ecotourism
and at the same time on the forms of participation of native and non-natives traditional
communities in public and political projects to be developed by the State and non-
governmental organizations in any branch of activity.
Key-words:native ecotourism, territory, Sustaintability, Participation and Autonomy
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Lista de Siglas
ACIRX Associao das Comunidades Indgenas do Rio Xi
AEITYM Associao da Escola Indgena Tukano Yepa MahsAMAZONASTUR - Agncia de Turismo do Estado do Amazonas
APIARN Associao dos Professores Indgenas do Alto Rio Negro.
AYRCA Associao Yanomami do Rio Cauaburis e Afluentes
CABC Coordenadoria das Associaes Baniwa Curipaco
CAIARNX Coordenadoria das Associaes indgenas do Alto Rio Negro e Xi
CAIBRN Coordenadoria das Associaes do Baixo Rio Negro
CEDI Centro Ecumnico de Documentao e Informao
CIMI Conselho Indigenista Missionrio
COIAB Coordenao das Organizaes Indgenas da Amaznia Brasileira
COIDI Coordenadora das Organizaes Indgenas do Distrito de Iauaret
COITUA Coordenadoria das Organizaes Indgenas dos rios Tiqui Uaups e
Afluentes
COMTUR Conselho Municipal de Turismo de So Gabriel da Cachoeira
COPIARN Conselho dos Professores Indgenas do Alto Rio Negro
CMPL - Conselho Municipal de Poltica Lingstica
CSN Conselho de Segurana Nacional
EAF/SGC Escola Agrotcnica Federal de So Gabriel da Cachoeira
EMAMTUR Empresa Amazonense de Turismo
EMBRATUR Empresa Brasileira de Turismo
FAPEAM Fundao de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas
FEPI Fundao Estadual de Poltica Indigenista
FLONA - Floresta Nacional
FMPL Fundo Municipal de Poltica Lingstica
FNMA Fundo Nacional do Meio Ambiente
FOIRN Federao das Organizaes Indgenas do Rio Negro
FUMDETUR Fundo Municipal de Desenvolvimento do Turismo
FUNAI Fundao Nacional do ndio
FUNASA Fundao Nacional de Sade
GTC - Grupo Tcnico de Coordenao da Poltica de Ecoturismo da Amaznia
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IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renovveis
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IPHAN Instituto do Patrimnio Histrico Artstico Nacional
IPOL Instituto de investigao e Desenvolvimento em Poltica Lingstica
ISA Instituto Socioambiental
MEC Ministrio da Educao
MINTER Ministrio do Interior
MMA Ministrio do Meio Ambiente
OMT Organizao Mundial do Turismo
PCN Projeto Calha Norte
PDA Programa Demonstrativos da Amaznia
PDLIS - Plano de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentvel
PDPI Projetos Demonstrativos dos Povos Indgenas
PNMT Programa Nacional de Municipalizao do Turismo
PRODETUR Programa de Desenvolvimento do Turismo
PROECOTUR Programa de Desenvolvimento do Ecoturismo para a Amaznia
Legal
RINTUR Relatrio de Turismo
SAE Secretaria de Assuntos Estratgicos
SCA - Secretaria de Coordenao da Amaznia
SEC Secretaria Estadual de Cultura
SECAD Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade
SEDUC Secretaria Estadual de Educao e Qualidade do Ensino do Amazonas
SEMATUR Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Turismo de So Gabriel da
Cachoeira
SEMED Secretaria Municipal e Educao e Desporto de So Gabriel da CachoeiraSPI Servio de Proteo ao ndio
SUDAM Superintendncia de Desenvolvimento da Amaznia
UCIRT Unio das Comunidades Indgenas do Rio Tiqui
UEA Universidade Estadual do Amazonas
UFAC Unio Familiar Animadora Crist
UFAM Universidade Federal do Amazonas
UNESCO Organizao das Naes Unidas para Educao, Cincia e CulturaUNIRT Unio das Naes Indgenas do rio Tiqui
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Lista de Figuras
Figura 1 Municpios do Plo de Ecoturismo do Amazonas/AM..................................71
Figura 2 Zoneamento do Municpio de So Gabriel da Cachoeira..............................81Figura 3 Ocupao urbana de So Gabriel da Cachoeira em 1977..............................84
Figura 4 - Ocupao urbana de So Gabriel da Cachoeira em 2001...............................84
Figura 5 Magistrio Yanomami Pey Yo Yay...............................................................88
Figura 6 Magistrio Tukano. Foto: Paulo Lira. Taracu, 2006....................................88
Figura 7 Seminrio Poltica Lingstica, Gesto do Conhecimento e Traduo
Cultural, regulamentao da Lei de Co-oficializao das Lnguas Indgenas Tukano,
Nheengatu Baniwa...........................................................................................................89
Figura 8 - Aprovao da Lei n 210/2006. Cmara dos Vereadores de So Gabriel da
Cachoeira. .......................................................................................................................89
Figura 9 Distritos de So Gabriel da Cachoeira...........................................................90
Figura 10 Regies Administrativas (Plano Diretor Lei n 209/2006)..........................91
Figura 11 Subcoordenadorias Regionais da FOIRN....................................................92
Figura 12 Meio Urbano e Melhorias..........................................................................105
Figura 13 Festribal......................................................................................................107Figura 14 - Artesanatos Yanomami...............................................................................107
Figura 15 Dana do Karissu.......................................................................................108
Figura 16 Dana do Japurutu......................................................................................108
Figura 17 Comunidade de Monte Cristo, Rio Uaups................................................109
Figura 18 Comunidade de Aracu, Rio Iana..............................................................109
Figura 19 lha de Adana...............................................................................................110
Figura 20 Bas Boo (Bela Adormecida).....................................................................110Figura 21 Serra de Cucui, Rio Negro.........................................................................112
Figura 22 Serra de Cabari, Rio Negro........................................................................112
Figura 23 Terra Indgena Alto Rio Negro (FUNAI 1990).........................................132
Figura 24 Desenho de Socorro Teles Matos..............................................................155
Figura 25 Desenho de Laci Garrido Cabuia...............................................................155
Figura 26 Desenho de Gilson M. Almeida.................................................................156
Figura 27 - Desenho de Armando..................................................................................156
Figura 28 Discusso sobre turismo nas comunidades indgenas do
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Alto Rio Negro..............................................................................................................160
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SUMARIO
- Lista de Siglas..........................................................................................................................viii
- Lista de Figuras........................................................................................................................x
- Apresentao............................................................................................................................12
- Introduo.................................................................................................................................15
I Gesto do turismo: um dilogo necessrio.........................................................................31
1.1 Cultura, territrio, territorialidades e planejamento do turismo..........................................47
II - Ecoturismo indgena e Estado: o desafio da sustentabilidade.........................................57
2.1 Ecoturismo: uma alternativa deetnodesenvolvimento.......................................................60
2.2 - O Plano de desenvolvimento de Ecoturismo no Estado do Amazonas................................68
III Multiculturalismo e tendncias para o ecoturismo na Regio do Alto Rio
Negro............................................................................................................................................77
3.1- So Gabriel da Cachoeira no Plo de Ecoturismo do Amazonas.........................................82
3.1.1 Identidade tnica e potencial ecoturstico na cidade indgena.........................................94
3.2 A Terra Indgena do Alto Rio Negro: territrio e autonomia............................................116
3.2.1 Povo e organizao poltica da Regio do Alto Rio Negro............................................118
3.2.2 A luta pela demarcao do Territrio Indgena..............................................................126
3.2.2.1 - O territrio indgena contnuo: a reorganizao espacial............................................ 133
3.2.2.2 - O territrio: fonte de espiritualidade e vida.................................................................136
3.2.2.3 - Terra e territrio: o desencontro de ideologias............................................................138
3.2.2.4 - Para no concluir..........................................................................................................146
3.3 Cultura, territrio e territorialidades: bases para o ecoturismo indgena...........................150
3.3.1- Yaneretama: sustentabilidade e ecoturismo indgena.....................................................150
3.3.2 - Umukam-sara: guia de ecoturismo indgena para a regio do Rio Negro....................1533.3.3 - Umukam-sara: planejamento participativo e ecoturismo indgena...............................157
3.4 O Turismo a partir do olhar dos povos indgenas..............................................................161
IV Participao, Gesto do Conhecimento e Territorial: fundamentos para o
planejamento do ecoturismo em Terra Indgena no Alto Rio Negro . ................................171
- Bibliografia.............................................................................................................................181
-Anexos....................................................................................................................................................193
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Apresentao
O nosso interesse pela questo indgena e regio do Rio Negro teve incio nosanos 1991 quando chegamos a Manaus e logo nos envolvemos com o movimento
popular, em particular, com a Coordenao das Organizaes Indgenas da Amaznia
Brasileira (COIAB) e com o Frum de Debates da Amaznia, coordenado naquele
momento pelo Conselho Indigenista Missionrio (CIMI-Norte I) em Manaus.
A partir da, o envolvimento aumentou ainda mais quando comeamos a
pesquisar os motivos que levaram 23 povos indgenas a solicitarem a demarcao do
territrio nico, situao atpica para povos indgenas no Brasil, o que nos levou a
abordar tal fato na nossa dissertao de mestrado defendida em 1997.
No retorno do mestrado, assumimos a coordenao do curso de graduao em
Geografia da UFAM (1998 a 2001) em So Gabriel da Cachoeira; elaboramos e
coordenamos o curso de especializao em Turismo e Gesto Territorial (2002-2003), a
Semana Acadmica Wakotinnay Yawara Akanga, em 2004, participamos de seminrios
e assemblias com o movimento atravs da Federao das Organizaes Indgenas do
Rio Negro (FOIRN) e das associaes de base, como a Conselho de Professores
Indgenas do Alto Rio Negro (COPIARN) e, mais recentemente, assessoramos a Escola
Indgena Tukano Yepa Mahs, a Associao Yanomami do Rio Cauaburis e Afluentes
(AYRCA) por meio do projeto Tiemotima financiado pelos Projetos Demonstrativos
dos Povos Indgenas - (PDPI), a Associao Arko Iwi, na calha do rio Curicuriari com
projetos de educao e ecoturismo, coordenamos o seminrio organizado pelo Instituto
de Investigao e Desenvolvimento em Poltica Lingstica e FOIRN em 2006,
discutimos e coordenamos o projeto da Licenciatura Indgena Polticas educacionais e
desenvolvimento Sustentvel (2005-2007) e tambm o Magistrio indgena II,
coordenado pela Secretaria Municipal de Educao (SEMED) em parceria com a
SEDUC/AM e IPOL.
O trabalho apresentado resultado, principalmente, das pesquisas de campo
realizadas ao longo dos anos 2003 a 2007 com base, em parte, no nosso envolvimento e
nos conhecimentos compartilhados pelos povos indgenas da regio do Alto Rio Negro
em mais de 10 anos de convvio e nas fundamentaes tericas com base,
principalmente, em Milton Santos, Rita de Cssia Ariza Cruz, Rogrio Haesbart,
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Knafou, Eduardo Yzigi, Boulln, Fennel, Geertz, Marshal Salhins, Carlos Rodrigues
Brando e Thiollent.
Por acreditarmos que a cincia no neutra e que cada pesquisador deve ter um
propsito em comum com a sociedade, propusemo-nos a elaborar um trabalho no
convencional como convm aos que navegam entre as guas da cincia ocidental e de
outros saberes.
Trabalhamos com o mtodo dialtico, com a pesquisa participante e pesquisa-
ao com base nos aportes tericos da Geografia e Antropologia. A base conceitual da
pesquisa est centrada nos conceitos cultura, planejamento participativo, territrio,
territorialidades, turismo e seus segmentos ecoturismo indgena e turismo indgena,
discutidos ao longos dos captulos.
Est dividido em cinco partes envolvendo introduo e quatro captulos. A
introduo trata de como partiu nosso interesse pelo tema com justificativa da escolha
da rea de estudo, uma discusso sobre a metodologia desenvolvida e uma breve
reflexo sobre a questo indgena no Brasil.
O primeiro capitulo intitulado Gesto do Turismo: um dilogo necessrio
estabelece uma anlise sobre turismo e seus segmentos, cultura, territorialidade,
territrio, gesto e planejamento do turismo, avaliando a possibilidade de neutralizar os
impctos indesejveis da atividade turstica sobre as comunidades e lugares.
O segundo captulo, Ecoturismo indgena e Estado: o desafio da
sustentabilidade, discute a carncia de poltica pblica para o ecoturismo indgena e a
metodologia participativa implementada pelo Estado e prope o ecoturismo como uma
alternativa para o etnodesenvolvimento para garantir a sustentabilidade cultural e
territorial.
O terceiro captulo, Multiculturalismo e tendncias para o ecoturismo na
Regio do Alto Rio Negro est subdivido em duas vertentes: a primeira, voltada para omeio urbano, analisando o turismo e o ecoturismo e sua relao com a identidade tnica
em uma cidade indgena, demonstrando as aes e reflexes desenvolvidas para o
planejamento do turismo neste meio; a segunda, voltada para o interior, em terra
indgena, aborda a diversidade cultural da regio habitada por 23 povos, de cinco
famlias lingsticas diferentes, sua organizao sociopolitica, a luta pela demarcao de
suas terras, a relao entre cultura, territrio e territorialidades, fundamentais para o
planejamento do ecoturismo indgena, de aes e projetos desenvolvidos de forma
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participativa e a viso dos povos indgenas sobre seus medos, as vantagens, o que
esperam do turismo na regio, apontando princpios para o seu desenvolvimento.
O quarto captulo, Participao, Gesto do Conhecimento e Territorial:
fundamentos para o planejamento do ecoturismo em Terra Indgena no Alto Rio
Negro, o resultado de toda a pesquisa. No apresentamos da maneira convencional as
consideraes finais ou a concluso por se tratar de uma pesquisa cuja natureza e
resultado so diferentes. Adotamos uma metodologia para discusso e desenvolvimento
do ecoturismo indgena com base na participao dos protagonistas das comunidades
que, por meio da gesto do conhecimento ocidental, e outros saberes e do territrio,
podero alcanar a sustentabilidade e a autonomia to almejada pelos povos indgenas e
demais comunidades tradicionais.
O Ecoturismo ou qualquer atividade para os povos indgenas deve ser pensada
sempre a partir da gesto do territrio, considerando sempre o conhecimento pr-
existente destes povos sobre sua cultura e seus territrios.
Este trabalho tambm contm dois anexos: a Lei n 210/2006 que regulamenta a
co-oficializao das lnguas indgenas Tukano, baniwa e Nheengatu no municpio e a
proposta de incluso de um captulo sobre o turismo na Lei Orgnica do Municpio.
Esclarecemos que, por se tratar de uma pesquisa-ao e pesquisa participante,
foram necessrias vrias idas a campo com utilizao tambm de procedimentos da
pesquisa convencional. E por ser um tema novo para a Geografia, tambm para a
Antropologia e para o turismo no Brasil, pouca literatura especifica foi encontrada. A
maioria estrangeira que, apesar de refletirem sobre o turismo em sociedades
aborgines ou da Amrica Latina, s vezes no so adequadas ou servem como
parmetros para os povos indgenas do Brasil devido diferena de contexto histrico,
cultural e at mesmo territorial.
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Introduo
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O conjunto de aes e reflexes sobre o ecoturismo na regio do Alto Rio Negro
parte da preocupao em preparar as comunidades indgenas citadinas ou no para que
possam, atravs do processo de gesto territorial e do conhecimento desenvolvido por
meio da educao ambiental, patrimonial, planejar, gerir projetos de sustentabilidade em
ecoturismo ou outros, e reconquistarem a autonomia sobre suas vidas e sobre as suas
terras.
A discusso sobre turismono meio geogrfico polmica apesar de a maioria
das publicaes nesta rea, no momento, serem de gegrafos. Existem muitas
resistncias ao termo Geografia do Turismoou ainda que o turismo tambm seja uma
rea de estudo da cincia geogrfica.
Para a Geografia, a investigao desta temtica inovadora, pois traz uma
discusso que une o tema turismo associado questo indgena, envolvendo cultura,
tradio e identidade, ainda pouco desenvolvida por gegrafos.
Essa investigao marca a quebra de paradigmas quanto ao planejamento da
atividade turstica em terras indgenas, propondo por meio da pesquisa participante e da
pesquisa-ao uma metodologia construda passo a passo com as comunidades
indgenas do Rio Negro, ao mesmo tempo em que prope conceitos e aponta diretrizes
para a construo de polticas pblicas sobre o turismo indgena na regio.
Assim, concordamos com Meneses (1996, p. 99) quando afirma que o tipo de
turismo que almejamos depender do tipo de relaes que julgamos aceitveis e
desejveis entre os homens, ou seja, do tipo de sociedade pelo qual optamos.
Esperamos que o resultado deste trabalho possa contribuir para a construo de
Polticas Pblicas para o ecoturismo indgena permitindo uma reflexo sobre os
conceitos Turismo Indgena/tnico, etnoturismo, ecoturismo, ecoturismo indgena ao
mesmo tempo sobre as formas de participao das comunidades tradicionais indgenas e
no indgenas nos projetos e polticas implementados pelo Estado e organizaes nogovernamentais em qualquer ramo de atividade.
A escolha da rea de estudo
O municpio de So Gabriel da Cachoeira, regio do Alto Rio Negro, foi
escolhido em funo de ser integrante do plo de ecoturismo do Amazonas e por ser
considerado o municpio mais indgena do Estado com 95% da populao pertencentesa famlias lingsticas Tukano, Aruak, Maku e Yanomami e onde existem comunidades
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indgenas que pretendem desenvolver o turismo e/ou ecoturismo indgena, mas
precisam de conhecimento e discusso para elaborar parmetros e diretrizes para o
mesmo.
Foi tambm uma necessidade que partiu dessas comunidades diante das presses
das agncias de turismo, agravadas pela denncia de entrada de turistas na Terra
Yanomami sem autorizao destes e dos rgos competentes (FOIRN e FUNAI) em
2002, o que levou o fechamento do Parque Nacional do Pico da Neblina visitao.
Juntando a necessidade e a solicitao das comunidades para discusso do tema,
o conhecimento adquirido e compartilhado com e pelos indgenas da regio em funo
destes 10 anos de trabalho conjunto associado possibilidade de poder contribuir
concretamente para a melhoria das condies de vida destes partimos para o
desenvolvimento da pesquisa com as bases tericas e metodolgicas que julgamos mais
adequada diante da nossa ideologia e proposta de vida.
Rios e trilhas percorridas
O enfoque terico da pesquisa geogrfico com mtodo dialtico, porm
recorreremos, tambm, em funo do objeto de estudo, a contribuies da antropologia
e, sobretudo, no que diz respeito s discusses correlatas, como cultura, ecoturismoindgena, turismo tnico, etnoturismo. A base conceitual da pesquisa est centrada nos
conceitos cultura, planejamento participativo, territrio, territorialidades, turismo e
seus segmentos ecoturismo indgena e turismo indgena.
Tem como linha metodolgica a pesquisa-ao, ou seja, investigao cientifica
associada a uma prxis como resultado e tambm com procedimentos metodolgicos da
pesquisa convencional. Para seu desenvolvimento, trabalhamos com a pesquisa
participante na realizao da pesquisa de campo, essencial para alcanar os resultados epesquisa de gabinete, utilizando fontes primrias e secundrias e aportes tericos para
anlises dos dados.
A pesquisa participante teve incio na Amrica Latina nos anos 1970, em funo
da conjuntura poltica, social e econmica da poca, principalmente entre os militantes
de esquerda se contrapunham s bases da pesquisa convencional e positivista.
Surge a partir da proposta de alfabetizao com prticas e polticas pedaggicas
conhecidas como pesquisa participante de Paulo Freire que criticou o mtodo positivista
por transformar as cincias sociais em instrumento de controle social.
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Freire (1981) e Fals Borba (1981) criticaram o mito da neutralidade
objetividade da cincia e propuseram uma cincia popular baseada no conhecimento
emprico, fundado no senso comum, que teria sido uma caracterstica ancestral, cultural
e ideolgica dos que se acham na base da sociedade.
Assim Freire (op.cit. p.38), afirma que:
Simplesmente no posso conhecer a realidade dos que participam ano ser com eles como sujeitos tambm deste conhecimento quesendo para eles, um conhecimento de um conhecimento anterior (oque se d ao nvel de uma experincia cotidiana) se torna um novoconhecimento. Se me interessa conhecer os modos de pensar e osnveis de percepo do real dos grupos populares, estes grupos nopodem ser meras incidncias do meu estudo.
A pesquisa participante proposta por Freire e Fals Borba e outros recentemente,
na qual nos inclumos, vai alm de uma proposta metodolgica, pois no busca apenas a
conduo de uma pesquisa voltada aos interesses das classes populares, mas de buscar
junto com elas uma resposta efetiva para seus problemas.
O fruto deste novo conhecimento enriquecido e ampliado por uma constante
reflexo e ao, o que denominamos de pesquisa-ao, deve estar a servio das
necessidades coletivas das minorias e classes subjugadas, como operrios, indgenas,
quilombolas, seringueiros, quebradeiras de coco dos babauais, sem terra, caboclos
ribeirinhos, faxinais etc.
De acordo com Thiollent (2004, p.14), a pesquisa-ao um tipo de pesquisa
social com base emprica que concebida a realizada em estreita associao com uma
ao ou com a resoluo de um problema coletivo e no qual, os pesquisadores e os
participantes representativos da situao ou do problema esto envolvidos de modo
participativo ou cooperativo.
importante tambm distinguir a pesquisa-ao da pesquisa convencional. A
primeira, segundo Thiollent (op.cit.p.19), consiste na participao dos pesquisadores
junto com as pessoas da situao investigada. A segunda distancia os resultados de uma
pesquisa das possveis decises ou aes decorrentes, uma vez que esto inseridas no
funcionamento burocrtico das instituies. As pessoas implicadas no so consideradas
atores, mas informantes, e em nvel da ao, so meros executores que no participam
do processo em si. Ao passo que na pesquisa-ao, h a necessidade do envolvimento
das pessoas como atores envolvidos em todo o processo.
Para Thiollent (op. cit, p.19):
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De modo geral, a pesquisa-ao pode envolver tambmprocedimentos da pesquisa convencional. Alm da observao queocorre no processo de transformao abrande problemas deexpectativas, reivindicaes, decises, aes e realizada atravs de
reunies e seminrios nos quais participam pessoas de diversosgrupos implicados na transformao. As reunies e seminriospodem ser alimentados por informaes obtidas em grupos depesquisa especializados por assuntos e tambm informaesprovenientes de outras fontes, inclusive quando utilizveis aquelas que foram obtidas por meios convencionais: entrevistas,documentao etc.
Assim, de acordo com Thiollent, os principais aspectos da pesquisa-ao,
considerada como uma estratgia metodolgica da pesquisa social so:
- Ampla e explicita interao entre pesquisadores e pessoas implicadas na situaoinvestigada;
- Prioridade dos problemas a serem pesquisados e das solues a serem encaminhadas
sob forma de ao concreta;
- O objeto de investigao no constitudo pelas pessoas e sim pela situao social e
pelos problemas de diferentes naturezas encontrados nesta situao;
- O objetivo da pesquisa-ao consiste em resolver ou, pelo menos, em esclarecer os
problemas da situao observada;- H, durante o processo, um acompanhamento das decises das aes e de toda a
atividade intencional dos atores da situao;
- A pesquisa no se limita a uma forma de ao (risco de ativismo): pretende
aumentar o conhecimento dos pesquisadores e o conhecimento ou o nvel de
conscincia das pessoas e grupos considerados, ou seja, no relacionamento de dois
tipos de objetivos: um prtico - contribuir com levantamento de solues e proposta
de aes correspondentes s solues para auxiliar na sua atividade transformadorada situao, e outro, intelectual - construdo de conhecimento.
O mesmo autor adverte para no se confundir pesquisa-ao com pesquisa
participante e que a participao do pesquisador no qualifica uma pesquisa como
pesquisa-ao. Para ele, toda pesquisa-ao do tipo participativo: exige uma estrutura
de relao entre pesquisadores e pessoas implicadas nos problemas investigados, em
que a participao em aes concretas dos ltimos absolutamente necessria. A
participao dos pesquisadores explicitada dentro da situao de investigao, com os
cuidados necessrios para que haja reciprocidade por parte das pessoas e grupos
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implicados na pesquisa, no devendo chegar a substituir as atividades prprias dos
mesmos e suas iniciativas.
Pesquisa participante, na abordagem de Thiollent (op.cit. p.15) um tipo de
pesquisa baseado numa metodologia de observao participante na qual os
pesquisadores estabelecem relaes comunicativas com pessoas ou grupos da situao
investigada com o intuito de serem melhor aceitas. Neste caso, a participao
sobretudo participao dos pesquisadores e consiste em aparente identificao com os
valores e os comportamentos que so necessrios para uma ao problemtica pelo
grupo considerado (Sic).
Brando (1982) tambm adverte sobre a possibilidade da pesquisa participante
se tornar apenas um envolvimento aparente entre objeto de estudo e pesquisador. Neste
caso, o pesquisador no rompe a relao sujeito-objeto, mas somente disfara para
executar melhor sua pesquisa.
Desse modo, a pesquisa participante parece uma situao de oportunismo que
acontece em muitos casos de pesquisadores do estilo colonialista e no uma estratgia
para melhor compreender a real situao do problema e dos envolvidos.
Por isto, mesmo que Thiollent esteja certo, acreditamos que as duas
metodologias no so antagnicas ou excludentes, mas se complementam e que existem
pesquisadores que esto dispostos a colaborar na relao sujeito-sujeito, rompendo com
os mtodos da pesquisa tradicional, ouvindo sempre primeiro os mais interessados, no
caso, as comunidades.
Contribuindo e corroborando com esta discusso, Stavenhagen (1984, p.17),
mais no nvel de refletir e construir um novo modelo de desenvolvimento, prope uma
nova abordagem a partir dos conhecimentos e necessidades das classes populares.
Afirma que em funo da critica permanente da teoria do desenvolvimento nos
paises de terceiro mundo, na dcada de 80, houve o reconhecimento de que imitar ospaises do primeiro mundo no era possvel nem desejvel e a necessidade de buscar
estratgias alternativas de desenvolvimento, por parte de alguns governos do Terceiro
Mundo, de movimentos sociais de diversos tipos, de pequenos grupos de pesquisadores
e planejadores, bem como de pessoas de diversas organizaes internacionais. Esta
busca tem levado, basicamente, a rejeio dos modelos desenvolvimentistas impostos
do exterior e a necessidade de reduzir a sndrome da dependncia.
O modelo alternativo estaria baseado no uso dos recursos locais, quer sejamnatural, tcnico ou humano; ou seja, se orienta para a auto-sustentao, nos nveis
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locais, nacionais e regionais, procurando aproveitar as tradies culturais existentes e
no rejeit-las a priori como obstculos ao desenvolvimento, como era o caso das
primeiras dcadas da reflexo sobre o desenvolvimento.
Stavenhagen (op.cit, p.19) afirma ainda que este modelo:
Pretende ser mais participante do que tecnocrtico. Orienta-se para opovo. Este quer seja de camponeses ou operrios, aldees oufavelados, deve participar em todos os nveis do processo dedesenvolvimento: da formulao de necessidades s etapas deplanejamento, execuo e avaliao. O desenvolvimento deve serdeslocado dos escritrios dos burocratas para o seu verdadeiro lugar;as bases. Isto coloca, naturalmente, o problema do poder poltico, que, talvez a questo fundamental do desenvolvimento hoje.
No entanto, Little (2002) nos chama a ateno para que a prtica de
resgatar (SIC)1 os conhecimentos de uma sociedade sem tentar resgat-la da
destruio no seria mais aceita como apropriada, tendo de ser acompanhada de
posicionamentos e atividades comumente consideradas polticas. Desse modo, o atual
desafio da cincia acolher os frutos dessa tradio para integr-los sua prtica.
inegvel que o imenso acervo de conhecimentos e tecnologia das
distintas sociedades indgenas tem alto valor para a cincia ocidentale para a humanidade com um todo, pois contm modelos queduraram sculos, em uma prtica que hoje seria chamada dedesenvolvimento sustentvel. Por isso, um dos principaisargumentos utilizados a favor do resgate desses conhecimentos o deque podem ser incorporados ao acervo de conhecimentos cientficosocidentais. O problema aqui, de novo, que essa incorporaorepresenta uma apropriao unilateral dos conhecimentos etecnologias indgenas por parte do Ocidente, muitas vezesacompanhada pela privatizao dos conhecimentos por parte deempresas biotecnolgicas ou farmacuticas e dos governos dos pasesdo Norte (Little, p. 42, 2002).
Assim Stavenhagen, Thiollent, Brando, Freire, Fals Borba advertem que temos
de reconsiderar o nosso conceito de desenvolvimento bem como de cincia, de pesquisa,
de participao e do papel do pesquisador diante da conjuntura do sistema mundo.
Salhins (1997) afirma que est havendo a indigenizao da modernidade. A
incorporao das cosmologias e dos saberes dos povos dinmica do sistema mundial.
1Preferimos utilizar os termos afirmar, buscar, revelar no lugar de resgatar proposto por Little. A palavra significatrazer de volta o que perdeu o que no uma regra entre os povos indgenas. Pode existir a perda, mas na maioria dasvezes esto adormecidos e precisam ser acordados.
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Estes povos, por sua vez, incorporam saberes desse sistema, dando-lhes novos
significados e funes de acordo coma sua viso de mundo.
Para os habitantes da Regio do Alto Rio Negro, a desconstruo da ideologia
cientfica e educacional vigente, fundamentada nos pressupostos da racionalidade, da
tcnica, do pensamento lgico, convergente, disciplinado e comodista condio sine
qua nonpara o seu desenvolvimento.
A desconstruo desta ideologia a resposta inicial para o desafio da autonomia
em uma regio com a maior diversidade cultural e lingstica do pas, onde patrimnio,
natureza, cultura, cincia e foras msticas que regem o universo dos vinte e trs povos
indgenas so indissociveis.
Situando a questo indgena no Brasil
Todo e qualquer assunto referente aos indgenas no Brasil sempre foi tratado
com muita cautela e provocou inmeras discusses. Devido aos preconceitos racial e
cultural, a sociedade ocidental criou um esteretipo para o ndio, rotulando-o como
indolente, preguioso, dbil e incapaz.
Por se tratar de culturas diferentes, foram necessrias legislaes especficas que
tentassem direcionar as polticas indigenistas e o prprio indigenismo no pas. Falar de
uma poltica indigenista no pas falar de hipocrisia e de aes aliengenas e aleatrias,
como as chamadas catequizaes, aldeamentos e pacificaes. Todas essas aes, de
uma forma ou de outra, objetivaram direta ou indiretamente o aniquilamento das naes
indgenas, quer por meio do genocdio, como se verificou no incio da colonizao e,
mais tarde, na Repblica com as pacificaes de tribos hostis, quer por meio do
etnocdio, com a pretensa poltica de integrao nacional, que teve como precursor o
Marechal Rondon, quer por meio da poltica implementada pela Fundao Nacional do
ndio (FUNAI), que tinha como meta a integrao dos ndios estrutura de classes noBrasil.
Desde o perodo colonial, a correlao de foras que permeia a discusso sobre
indgenas constantemente desfavorvel para estes, pois, de um lado, esto os ndios,
organizaes e entidades que defendem a causa indgena e, de outro, os detentores do
poder poltico ou econmico - originrio de uma ordem econmica que a todo tempo
relegou a segundo plano questes sociais e culturais indgenas - quer tenha sido a Coroa
Portuguesa, quer sejam hoje o Estado, empresrios, madeireiras, mineradoras epolticos. No existem fronteiras nem obstculos para o grande capital. Todas as vezes
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que algum empecilho atrapalhou o seu desenvolvimento e expanso, ele foi transposto
ou exterminado.
Sempre foram paradoxais as opinies que dividiram a sociedade envolvente, em
virtude do jogo de interesses econmicos. As diversas posies surgidas de discusses,
como, por exemplo, se o ndio gente ou no, se ser humano ou no, se tem alma ou
no, e sobre os direitos destes ao territrio ilustram bem essa situao, que no foi muito
diferente em relao aos momentos que antecederam a criao do Servio de Proteo
ao ndio (SPI) em 1910.
Da poca colonial at incio da poca republicana, pouco ou nada foi feito para
regulamentar a relao entre ndios e a sociedade envolvente. Neste perodo, a expanso
de frentes pioneiras era um fator prioritrio para a integrao territorial. A abertura de
ferrovias, as instalaes de linhas telegrficas e a navegao dos rios por barcos a vapor
proporcionaram, mais uma vez, novas frentes de luta contra as naes indgenas, o que
descartou qualquer possibilidade de sobrevivncia autnoma destas (RIBEIRO, 1977).
Ribeiro ressalta que, devido s sucessivas batalhas sangrentas entre brancos e
ndios - que levaram ao extermnio inmeras naes indgenas e provocaram a morte de
inmeros imigrantes e pioneiros das frentes de expanso a sociedade nacional, com o
objetivo de assegurar o progresso e a colonizao das zonas pioneiras, exigiu
providncias do governo no sentido de regulamentar a situao dos povos indgenas.
Os dirigentes da Repblica viviam uma dicotomia entre o pensamento da
populao citadina e da populao rural. A primeira tinha uma viso romntica do ndio
como bom selvagem, inspirada nas obras de Jos de Alencar e Gonalves Dias e, com
base na literatura de Russeau e Chateaubriand, no aceitava o tratamento a ferro e fogo
dado aos ndios. Para a segunda, o ndio era a fera indomada que detinha a terra
virgem, era o inimigo imediato que o pioneiro precisava imaginar feroz e inumano, a
fim de justificar a seus prprios olhos, a prpria ferocidade (RIBEIRO, 1977, p.129).A partir deste momento, a discusso sobre o indgena passou a permear os
debates entre as camadas mais altas da sociedade, da imprensa, do meio cientfico e, em
particular, do 1oCongresso Brasileiro de Geografia realizado no perodo de 7 a 16 de
setembro de 1909, na cidade do Rio de Janeiro. Diante disto e das conferncias do
Marechal Rondon, que trouxeram uma outra viso do ndio para a sociedade
substituio de Peri por um Nambikuara - reforou-se ainda mais a idia da criao de
um rgo oficial para tratar dos assuntos indgenas.
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Em 1910, foi criado o SPI, contudo o paradoxo no acabou. A polmica do
momento era identificar que filosofia deveria nortear as aes daquele rgo. Mais uma
vez, as posies divergiram e duas correntes surgiram: uma religiosa, defendendo a
catequizao com base na experincia secular das misses - que at o sculo XIX no
haviam conseguido pacificar as tribos hostis - e outra leiga, defendendo a proteo do
ndio pelo Estado. Para um rgo leigo, caberia uma posio leiga. Assim, o SPI nasceu
com princpios positivistas, fundamentados no humanismo de Augusto Comte, que
afirmavam que as naes indgenas uma vez libertadas de presses externas e
amparadas pelo governo, evoluiriam espontaneamente (RIBEIRO, op. cit. p.134).
Os princpios de Rondon, expressos em sua clebre frase morrer, se preciso for,
matar nunca, nortearam o SPI at atingir o mais baixo grau de sua decadncia, com o
escndalo que envolveu seus funcionrios em muitas outras atrocidades contra os
ndios, inclusive assassinatos. Em 1967, o SPI foi extinto e foi criada a Fundao
Nacional do ndio para substitu-lo, cujo principal objetivo era a integrao do ndio
sociedade nacional e economia de mercado, para que no representasse obstculo
aliana feita entre militares, corporaes multinacionais e instituies internacionais de
crdito (BARBOSA, 1994).
As posies sempre divergiram sobre a funo e objetivos da FUNAI e, mais
recentemente, com a Constituio de 1988, as contradies atingiram seu auge em
relao aos temas concepo de ndio, de Terra Indgena, explorao de recursos
naturais em reas indgenasetc.,e, no momento, o Decreto 1775/96, que regulamenta a
sistemtica para a demarcao das terras indgenas. Todas as vezes que o fator
econmico for mais importante do que os sociais e culturais para os dirigentes desta
nao, existir o paradoxo sobre qualquer assunto relacionado s naes indgenas. Um
paradoxo mais econmico do que cultural.
A populao indgena atualmente no Brasil estimada em aproximadamente 734mil ndios (IBGE, 2006) remanescentes de milhes que habitavam diferentes territrios
neste continente, na poca da chegada dos europeus. Representam uma parcela nfima,
comparada com a populao do pas, hoje em torno de 180 milhes de habitantes.
Segundo Cunha (1987, p.32), freqente uma queda populacional drstica
aps o primeiro contato a qual, se no compromete irreparavelmente a reproduo
fsica e cultural do grupo, costuma ser seguida por uma recuperao demogrfica.
Mesmo em condies desfavorveis, como epidemias, guerras, escravizao e,de forma geral, pelo avano da fronteira econmica que provocou a dizimao por
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completo de vrias naes indgenas, essa populao vem resistindo e aumentando
apesar das possibilidades postas pelo Estado e pelo capital.
Em 1982, viviam no Brasil cerca de 185 mil ndios (CIMI, 1982); 234 mil em
1990 (CEDI, 1991); aproximadamente 300 mil em 1992 e de acordo com o IBGE,
2000, eram 734.131 mil indgenas no pas. Em termos absolutos, a populao indgena
tem crescido nos ltimos anos. No demais lembrar que os valores expressos so
parciais e podem ser acrescidos, se levarmos em conta os grupos isolados e arredios da
Amaznia, o que dificulta um censo preciso da populao indgena.
As instituies indigenistas governamentais e no governamentais divergem em
relao a nmeros da populao, povos indgenas e a quantidade de terras. De acordo
com o CIMI (2006), so 850 terras indgenas existentes, 241 povos com uma populao
de 734.131 indgenas. Para a FUNAI (2007), 611 terras indgenas, 215 povos com uma
populao de 460 mil, com estimativa de 100 a 190 mil indgenas vivendo no meio
urbano e para o ISA (2007), so 593 terras indgenas, 227 povos com uma populao
estimada em 600 mil indgenas, dos quais 480 mil so habitantes de terras indgenas e
120 mil no meio urbano.
Para o CIMI (2007), existem indgenas em 24 das 27 unidades da federao e
uma grande quantidade de indgenas morando em centros urbanos, alm daqueles
pertencentes a povos ainda sem contato com a sociedade nacional e outros que hoje
reassumem suas identidades tnicas at ento ocultadas.
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Populao Indgena no Brasil - Distribuio por Unidades da Federao*
UF Populao % do totalAcre (AC) 8.009 1,09
Alagoas (AL) 9.074 1,24Amap (AP) 4.972 0,68Amazonas (AM) 113.391 15,45Bahia (BA) 64.240 8,75Cear (CE) 12.198 1,66Distrito Federal 7.154 0,97Esprito Santo (ES) 12.746 1,74Gois (GO) 14.110 1,92Maranho (MA) 27.571 3,76Mato Grosso (MT) 29.196 3,98Mato Grosso do Sul (MS) 53.900 7,34Minas Gerais (MG) 48.720 6,64
Par (PA) 37.681 5,13Paraba (PB) 10.088 1,37Paran (PR) 31.488 4,29Pernambuco (PE) 34.669 4,72Piau 2.664 0,36Rio de Janeiro (RJ) 35.934 4,89Rio Grande do Norte 3.168 0,43Rio Grande do Sul (RS) 38.718 5,27Rondnia (RO) 10.683 1,46Roraima (RR) 28.128 3,83Santa Catarina (SC) 14.542 1,98
So Paulo (SP) 63.789 8,69Sergipe (SE) 6.717 0,91Tocantins (TO) 10.581 1,44
Total 734.131 100Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2000.
As naes indgenas no Brasil, com seus processos histricos distintos e
tradies especficas, so bastante diversificadas entre si. Na leitura de VIDAL, esta
diversidade conseqncia tambm do contato em situaes diferentes destas naes
com parte da sociedade brasileira. Ilustra esta afirmao com exemplos de naes sem
contato, como as do rio Cuminapaniuns, 300 Km a oeste de Santarm-PA, e outros
grupos do nordeste que convivem com a populao envolvente h sculos e pouco se
diferenciam da populao regional.
Contudo, questionvel o fato de o contato com outras sociedades e culturas
poder diversificar tanto estas naes. Uma outra hiptese que pode ser considerada
consiste no fato de serem naes e, portanto, terem seus costumes, hbitos e lnguas
diferentes.
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No se nega a relevncia do processo de assimilao que vem transformando a
cultura milenar destas naes durante estes 507 anos, mas o fato nos faz refletir se estas
180 naes que resistem at hoje, sem contar as que foram dizimadas, no teriam esta
diversidade antes da chegada dos europeus.
Entendemos que a preservao das estruturas de organizaes polticas,
econmicas e scio-culturais, conseqentes do parco contato destas naes entre si,
poderia ter causado grandes diversidades.
Terras Indgenas no Brasil (2007)
CIMI FUNAI
Situao N de terras % Situao N de terras %Registradas 323 38 regularizadas 398 87,27Homologadas 54 6,35 Homologadas 27 3,4Declaradas 39 4,59 Declaradas 30 7,67Identificadas 37 4,35 Delimitadas 33 1,66A Identificar 134 15,76 Em estudo 123 ----Sem providencias 229 26,94Reservadas/dominiais 34 4Total 850 100,00 611 100,00
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Terras Indgenas por Estados
UF Reg Hom Dec Ident A Ident Res Sem Prov Total
AC 24 1 1 1 9 1 2 39AL 2 0 0 1 2 4 4 13
AM 83 26 11 9 52 0 20 201AP 4 0 0 0 0 0 1 5BA 9 0 2 0 5 5 4 25CE 0 1 1 3 2 0 5 12ES 3 1 0 0 0 0 0 4GO 4 0 1 0 0 0 1 6MA 13 3 0 0 1 0 0 17MG 4 1 0 0 1 0 3 9MT 48 1 2 5 13 1 18 88MS 17 5 3 3 10 8 74 120PA 24 1 7 2 25 3 20 82
PB 2 0 0 1 0 0 0 3PE 4 1 2 0 2 2 3 14PR 8 1 0 3 1 6 13 32RJ 3 0 0 0 0 0 0 3RO 16 0 1 0 1 0 17 35RR 21 8 0 1 0 0 0 30RS 15 1 3 2 4 0 32 57SC 3 1 3 4 3 4 7 25SP 9 2 1 2 1 0 5 20SE 1 0 0 0 0 0 0 1TO 6 0 1 0 2 0 0 9
TOTAL 323 54 39 37 134 34 229 850Fonte: CIMI, 2007.
Vale lembrar que grande parte das demarcaes de terra foram feitas
erroneamente, sem acompanhamento tcnico nem dos ndios e sem parecer
antropolgico, como, por exemplo, a terra dos Kaiap-Xikrin do Bacaj, delimitada em
1976 a partir de um simples sobrevo da rea: essa demarcao no corresponde ao
habitat tradicional desta nao.Mesmo com a regularizao jurdica das terras, os ndios ainda no podem
usufruir por completo do seu territrio e de seus recursos. Em 1996, cerca de 58%
destas terras estavam cobertas por concesses e pedidos de alvars para a minerao e
13% para a construo de barragens. Segundo a FUNAI (10/93), cerca de 84% do total
das reas estavam invadidas por fazendeiros, madeireiras e garimpeiros.
De forma geral, os preceitos constitucionais no que se refere proteo e
inviolabilidade das terras indgenas esto sendo desrespeitados por grupos econmicos e
polticos, incluindo o prprio Estado.
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Desde o sculo XVII, a legislao reconhece a soberania e o direito dos ndios
ao territrio. Atravs das Cartas Rgias de 30/07/1609 e de 10/09/1611, promulgadas
por Felipe III, reconheceu-se o domnio sobre seus territrios e as terras onde esto as
aldeias. Alm disso, o alvar de 1ode abril de 1680 afirmava que as terras dos ndios
no poderiam ser afetadas pelas sesmarias e seriam isentas de qualquer tributo
(CUNHA, op.cit. p.31)
Entretanto o reconhecimento da terra indgena surgiu com a Lei 6.001/73 -
Estatuto do ndio que previa no seu Artigo 65 a concluso das demarcaes para 1978,
o que no ocorreu, pois o governo militar preocupou-se apenas com a poltica de
emancipao e integrao dos ndios sociedade nacional, expressa na referida lei.
Embora esta lei constitua um fato histrico, ela marcada pelo autoritarismo e
pela excluso da sociedade do processo de elaborao de polticas oficiais. Sua base de
legitimidade sempre foi questionada por no ter passado por um processo de discusso,
bem como terem sido ouvidos os principais interessados (os ndios) e outros grupos
colaboradores e oponentes, como fazendeiros, posseiros, funcionrios de rgos
administrativos ou de colonizao, missionrios, antroplogos etc..
Dada realidade poltico-social daquele momento, Oliveira Filho adverte que os
motivos da imposio deste regime ao ndio so o descaso da opinio pblica em
relao aos assuntos indgenas, a falta de organizao e de discurso tnico-poltico pelos
ndios e a no aceitao pelo Estado do dissenso entre seus pares.
Segundo Oliveira Filho (1985, p.22):
O Estado no admitia o dissenso mesmo entre os grupos maisprximos ao poder, nem aceitava a interveno de grupossubordinados na elaborao de suas polticas. O Governo e a opiniopblica no viam maior repercusso nos pequenos e espordicosconflitos ocorridos entre ndios e brancos nos confins da Amaznia.
Os ndios at aquele momento no haviam ainda constitudo formasorganizativas e um discurso tnico-poltico que permitisse umapresso adequada sobre o Estado.
A aprovao do Estatuto do ndio pelo governo militar foi uma tentativa de
melhorar sua imagem, calando os protestos externos em face das constantes denncias
de violao dos direitos humanos, como massacres de ndios, divulgados pela imprensa
internacional, que acusava o Estado brasileiro de omisso e de prticas etnocidas. O
Objetivo era mostrar uma fase positiva do governo, preocupado em acatar as
convenes internacionais e os direitos dos indgenas.
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Em 2006, houve uma grande conferncia em Manaus, promovida pela FUNAI
para discutir o Estatuto dos Povos Indgenas, com representantes de todos os povos
indgenas do Brasil, quando, pela primeira vez, foram ouvidos. O Estatuto est desde
1988 no congresso Nacional para ser reformulado, mas, at ento, os principais
ineteressados, os indgenas, no tinham sido ouvidos.
Tambm na Constituio Federal de 1988, no Artigo 67, do Ato das Disposies
Transitrias, consta que a concluso das demarcaes deveriam ocorrer at 05/10/93, o
que no se tornou fato. Entretanto um dos avanos dessa Carta foi nomear o Ministrio
Pblico Federal para defender os interesses e direitos dos ndios.
As polticas implementadas pelo governo, seja federal, estadual ou municipal
nas reas da sade, educao, produo e ambiente no tm levado em considerao o
pensamento das organizaes e povos indgenas no Brasil, pois o planejamento
participativo no ocorre de fato. Sempre grupos identificados como os Notveis
(sabem tudo) continuam a decidir e definir o que melhor para os povos indgenas sem
consult-los e desconsideram a identidade territorial e cultural do indgena.
Assim, o etnodesenvolvimento, que pode ser chamado de desenvolvimento
sustentvel em terras indgenas, assume o significado da autonomia dos povos indgenas
sobre seus territrios para decidir sobre o presente e o futuro de acordo com a sua
identidade territorial e cultural. Surge como uma alternativa de gesto territorial, desde
que os projetos de desenvolvimento sustentveis, entre eles o ecoturismo, sejam em
bases comunitrias e participativas, realmente planejados, executados e gerenciados
pelas organizaes e povos indgenas.
Alm da luta pela demarcao de suas terras, os povos indgenas hoje
enfrentam outros desafios, como sobreviver na terra j demarcada e proteger seus
conhecimentos e patrimnios material e imaterial da ideologia capitalista da sociedade
ocidental onde tudo se transforma em mercadoria, em capital.
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I
Gesto do turismo:Gesto do turismo:Gesto do turismo:Gesto do turismo:
Um dilogo necessrioUm dilogo necessrioUm dilogo necessrioUm dilogo necessrio
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Originalmente nmade, o homem primitivo vivia deslocando-se e ocupava
grande parte de sua vida nesta atividade; sempre em busca de lugares que lhe
proporcionassem melhores condies de vida. Mas a partir do momento que trocou esta
condio nmade pela sedentria, iniciou um crescente processo de desenvolvimento,
passando no s a transformar o espao, mas a domin-lo com o avano das tcnicas.
A partir de 1945, a internacionalizao da economia no mundo ocidental, por
meio de investimentos feitos pelos Estados Unidos na Europa arrasada (Plano
Marshall), assim como a generalizao do fordismo como sistema de produo,
trouxeram mercados de consumo de massa global, incrementando uma srie de
atividades internacionais, dentre elas, o sistema bancrio e o turismo. Dessa forma,
conforme Becker (1996), o meio tcnico cientfico informacional contribui muito para o
avano do turismo como vetor econmico. A venda de paisagens, da imagem dos
lugares atravs das redes, que permite a articulao entre o local e o espao
transnacional. Como fator econmico de desenvolvimento, o turismo, com sua face
capitalista, reafirmou a natureza e a cultura como mercadorias, em capital.
A mudana de postura pela qual passa a humanidade, preocupada com os atuais
quadros de degradao ambiental, fruto de aes irresponsveis e sem planejamento,
leva-nos a crer que esta seja uma das razes pela procura por locais que possuem
belezas naturais pouco modificadas. Essa procura pelo descanso, busca por lugares
exticos e fuga do stress vm sendo uma caracterstica dessa sociedade ps-industrial,
que com a reduo da jornada de trabalho levou a conquista de tempo livre e melhoria
da qualidade de vida por parte dos cidados.
Observa-se que o aumento do tempo livre, fruto da reduo da jornada de
trabalho, usufrudo pelos cidados dos pases do primeiro mundo, que passaram a viajar
para os pases de terceiro e segundo mundo, os quais comearam a organizar os mais
diversos lugares tursticos, devido ao elevado potencial cultural e natural que possuem,gerando novos campos de trabalho, principalmente no setor tercirio social.
Boulln (2002, p.20,37) afirma que o turismo no uma indstria com ou sem
chamin, e o situa como pertencente ao setor tercirio, sendo uma conseqncia de um
fenmeno social cujo ponto de partida a existncia do tempo livre e dos sistemas de
transporte (progresso da navegao e a inveno da ferrovia, do automvel e do avio).
No nasceu de uma teoria, mas de uma realidade, de uma prtica que surgiu
espontaneamente em que a iniciativa privada, primeiro, e o poder pblico, depois,resolveram as necessidades dos viajantes ao incorporar cada vez mais um grande
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numero de servios destinados a melhorar o conforto do turista e a multiplicar suas
oportunidades de lazer, dando origem a uma trama de relaes que caracterizam seu
funcionamento denominado por ele de sistema e por outros (CASTELLS, 2002) de
rede.
O fato de o turismo no ser uma cincia, mas um fenmeno social estudado por
vrias cincias das mais diversas reas do conhecimento faz com que cada uma delas
crie suas prprias terminologias e linguagens que acabam por promover uma confuso
dos termos bem como dificultar o planejamento do turismo. Entretanto Boulln (2002,
p.17-18) adverte que, no mnimo, os autores ou profissionais devem esclarecer os
critrios de categorizao nas definies dos termos tcnicos com que trabalham.
O Ministrio do Turismo (2005, p.3), em uma verso preliminar, no revisada,
do documento intitulado Segmentao do Turismo. Conceitos, fundamenta-se na
definio de turismo estabelecida pela Organizao Mundial de Turismo, adotada
oficialmente pelo Brasil: turismo uma atividade econmica representada pelo
conjunto de transaes compra e venda de servios tursticos efetuados entre os
agentes econmicos do turismo, gerado pelo deslocamento voluntrio e temporrio de
pessoas para fora dos limites da rea ou regio em que tm residncia fixa, por
quaisquer motivos, excetuando-se o de exercer alguma atividade remunerada no local
que visita.
Tambm apresenta uma tipologia do turismo, entendendo como segmentao
uma forma de organizar o turismo para fins de planejamento e gesto e,
principalmente, mercadolgico. Os segmentos tursticos podem ser estabelecidos a
partir de elementos da identidade da oferta e das caractersticas e variveis da
demanda2.
Conforme o documento, a segmentao da oferta define tipos de turismo3,cuja
identidade pode ser conferida pela existncia, em um territrio, de:
2Caractersticas da Demanda determinam as alteraes no volume e na qualidade da demanda:- Elasticidade: vulnerabilidade em relao a mudanas na estrutura dos preos e nas diversas condies
econmicas- Sensibilidade: vulnerabilidade em relao a condio scio-polticas- Sazonalidade: dependncia das pocas de temporadas (frias, feriados etc.), estaes e condies
climticas.Variveis da demanda:
- Fatores Demogrficos: idade, sexo.
- Fatores Sociolgicos: crenas religiosas, profisso, estado civil, formao educacional, nvel cultural.- Fatores Econmicos: renda- Fatores Tursticos: transporte e alojamento utilizado, destinos preferidos, objetivo e durao da viagem,
atividades de entretenimento.3Ecoturismo, Turismo Rural, Turismo de Aventura, Turismo Cultural, Turismo de Pesca etc.
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atividades, prticas e tradies (agropecuria, pesca, esporte, manifestaes culturais,
manifestaes de f)
aspectos e caractersticas territoriais (geogrficas, histricas, arquitetnicas,
urbansticas, sociais) determinados servios e infra-estrutura (de sade, de educao, de eventos, de
hospedagem, de lazer)
A segmentao da demanda definida pela identificao de certos grupos de
consumidores4 caracterizados a partir das suas especificidades em relao a alguns
fatores que determinam suas decises, preferncias e motivaes, ou seja, a partir das
caractersticas e das variveis da demanda.
Os produtos e roteiros tursticos, de modo geral, so definidos em funo daoferta (em relao demanda), de modo a caracterizar segmentos tursticos especficos.
Assim, as caractersticas dos segmentos de oferta que determinam a cara do roteiro,
ou seja, a sua identidade, e embasam a estruturao dos produtos potenciais. Esta
identidade principal, no entanto, no significa que o roteiro s pode apresentar e
oferecer produtos relacionados a apenas um segmento - de oferta ou de demanda.
Diante desta base conceitual, o Ministrio do Turismo dividiu o turismo em:
Ecoturismo, Turismo Rural, Turismo de Aventura, Turismo Cultural, Turismo de Pesca,
Turismo Nutico, Turismo Social, Turismo de Sol e Mar, Turismo de Negcios e
Eventos e Turismo de Estudos e Intercmbio.
O Ministrio do Turismo, com a definio da segmentao do turismo, confirma
a tese de Boulln (op.cit) de que este esclarecimento conceitual deve ser feito pelas
instituies governamentais e no governamentais para melhor planej-lo e direcion-lo.
Entretanto, todas as definies e, principalmente, a de turismo, propostas pelo
Ministrio do Turismo (2005) apontam para um nico caminho, o do mercado. Tudo
definido a partir da oferta, consumo, mercado e demanda. O Turismo conceituado
como atividade econmica e no mais como uma atividade social, como definiu
Boulln, De La Torre e Yzigi, o que pode ocasionar ainda mais a mercantilizaco da
cultura e impactos indesejveis quando desenvolvidos em comunidades tradicionais e
indgenas onde a preocupao com a cultura e a tradio fundamental.
A ausncia de clareza na concepo de terminologias, como turismo de natureza
e turismo cultural, turismo indgena, etnoturismo, turismo tnico e ecoturismo indgena,
4Adolescentes, Idosos, Pessoas com Deficincia, Grupos Familiares, Grupos Religiosos e inmeros outros grupos deconsumidores.
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tm dificultado o planejamento da atividade turstica pelos povos indgenas e em terras
indgenas.
Faz-se necessrio esclarecer que nos fundamentamos no conceito de turismo de
Boulln, Yzigi e De la Torre. Yazigi (1996) define turismo como um fenmeno social
pelo qual as pessoas ou grupos se deslocam com vrias finalidades, necessitando de um
meio geogrfico motivador, equipamentos tcnicos e culturais. De acordo com De la
Torre (1992, p. 19) turismo um fenmeno social que consiste no deslocamento
temporrio de indivduos ou grupos de pessoas fundamentalmente por motivos de
recreao, descanso, cultura ou sade, saem de seu local de residncia habitual para
outro, no qual no exercem nenhuma atividade lucrativa nem remunerada, gerando
mltiplas inter-relaes de importncia social, econmica e cultural.
Didaticamente, distinguimos trs segmentos de turismo a partir dos conceitos de
patrimnio naturale culturale de paisagem natural e culturalcujo sentido, aps uma
anlise associativa, se aproximam um do outro, orientam as definies de turismo de
natureza, cultural e ecoturismo. O fator utilizado alm das categorias o tipo de atrativo
motivador e de interesse que leva uma pessoa ou um grupo de pessoas a viajarem.
No pretendemos aqui fazer uma anlise aprofundada sobre os conceitos de
paisagem e patrimnio, mas apenas esclarecer de maneira sumria as definies dos
segmentos de turismo.
Patrimnio natural + paisagem natural = turismo de ou na natureza
Patrimnio cultural + paisagem cultural = turismo cultural
Patrimnio natural + paisagem natural + Patrimnio cultural + paisagem cultural
= ecoturismo
De acordo com Herbert (1989), El patrimonio puede definirse, en el sentido
ms amplio, como todos los vestigios, ya sean tangibles o intangibles, del pasado.Incluye al paisaje natural, el medio construido, labores culturales, idioma, creencias
religiosas y tradiciones culturales. Sin embargo el patrimonio cultural incluye, adems,
a los sitios arqueolgicos y los museos, los tesoros artsticos, tradiciones musicales,
costumbres, folklore, celebraciones, actividades religiosas, costumbres sociales,
patrones agrcolas, e incluso a la propia poblacin local.
Para Azevedo (2003), o patrimnio pode ser classificado em trs grandes
categorias: patrimnio naturalque arrola os bens da natureza; patrimnio cultural,que se refere ao conhecimento, tcnicas e o saber fazer, assim como a sua produo,
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onde est inscrito o patrimnio construdo e documental e, finalmente, o patrimnio
que compe a memria social.
De acordo com a Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a
Cultura Unesco, patrimnio natural so formaes fsicas, biolgicas ou geolgicas
consideradas excepcionais, habitats animais e vegetais ameaados, e reas que tenham
valor cientfico, de conservao ou esttico.
A Constituio Brasileira de 1988 define Patrimnio Cultural Brasileiro os bens
de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores
de referncia identidade, ao, memria dos diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira, nos quais se incluem as formas de expresso; os modos de criar,
fazer e viver; as criaes cientficas, artsticas e tecnolgicas; as obras, objetos,
documentos, edificaes e demais espaos destinados s manifestaes artsticas
culturais; conjuntos urbanos e stios de valor histrico, paisagstico, artstico,
arqueolgico, paleontolgico, ecolgico e cientfico.
Conforme Milton Santos (1997), paisagens so arranjos e formas de um
determinado momento resultantes de processos passados ocorridos em estruturas
subjacentes que ao refletirem a diversidade destas estruturas, revelam suas diferentes
formas naturais e artificiais. Afirma ainda que a forma um resultado de um fator
social o que significa dizer que, enquanto arranjos de formas, so dialeticamente,
produtos e agentes do processo de produo do espao. Assim, podemos dizer que a
paisagem um arranjo de formas naturais a qual podemos definir como paisagem
natural e de formas antrpicas que, de maneira simples, podemos denominar de
paisagem cultural.
Entendemos como Turismo de ou na Natureza, o tipo de turismo que utiliza o
patrimnio natural como rios, fauna, flora, montanhas, vales etc, como atrativo principal
e nem sempre de forma sustentvel. O principal interesse ou atrativo do turista apaisagem natural ou o patrimnio natural. Pode ser ecolgico, quando utiliza o
patrimnio natural e/ou a paisagem natural de forma racional, para ser admirado com
vistas educao ambiental, sem priorizar o envolvimento da comunidade local.
At o momento, o turismo de ou na natureza vem sendo freqentemente, de
forma equivocada, denominado como ecoturismo.
At os anos 1970 a palavra ecoturismo no existia e muito menos os princpios
que hoje ela representa, apesar da existncia de vrios viajantes naturalistas comoHumboldt e Darwin, cujas experincias foram espordicas e no produziram benefcios
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socioeconmicos e sim cientficos. Desta forma, podemos dizer que o ecoturismo
sempre existiu como contemplao da natureza. Somente com o advento da viagem
area a jato e dos documentrios televisivos sobre a natureza e questes ligadas
conservao do ambiente e a re-valorizao da natureza diante das tragdias ambientais
promovidas pela industrializao predatria que passou a ser um fenmeno
caracterstico do final do sculo XX.
Muitas confuses pairam sobre a origem do termo e sobre o prprio conceito de
ecoturismo. Alguns como Orams (1995) e Hvenegaard (1994) afirmam que remonta ao
final dos anos 1980, enquanto Higgins (1996) sugere que remonta aos anos 1970,
atravs do trabalho sobre ecodesenvolvimento de Miller (1989).
Outra vertente da literatura aponta Ceballos-Lascurin como o primeiro a usar o
termo no incio dos anos 1980, o qual definiu ecoturismo como viajar para reas
naturais relativamente no perturbadas nem contaminadas com o objetivo especifico de
estudar e admirar o cenrio e seus animais e plantas selvagens assim como quaisquer
manifestaes culturais (passadas e presentes) encontradas nestas reas (Boo, 1990).
Uma outra idia apresentada por Fennel (2002), acenando que Hetzer, em
1965, utilizou o termo para explicar a relao entre turistas, meio ambiente e culturas
num processo de interao. Identificou quatro pilares para a realizao de uma forma
mais responsvel de turismo, como: impacto ambiental mnimo; impacto mnimo em e
respeito mximo s culturas anfitris; mximos benefcios econmicos as
comunidades de base do pas anfitrio e participao recreacional mxima para os
turistas participantes e acrescenta que o desenvolvimento do conceito de ecoturismo
cresceu na convergncia da insatisfao com o enfoque negativo de governos e
sociedade ao desenvolvimento de um ponto de vista ecolgico.
Na definio de Wallace e Pierce (1996, p.848), o ecoturismo :
A viagem a reas naturais relativamente intocadas, para o estudo, odivertimento, ou a assistncia voluntria. a viagem em que hpreocupao com a flora, a fauna, a geologia e os ecossistemas de umarea, assim como com as pessoas (guardis) que vivem nasvizinhanas, suas necessidades, sua cultura e seu relacionamento coma terra. [...] encara as reas naturais como a casa de todos ns numsentido global (eco significando casa), mas tambmespecificamente a casa dos habitantes das vizinhanas. Ele vistocomo uma ferramenta para a conservao e o desenvolvimentosustentvel especialmente nas reas onde a populao local
solicitada a abrir mo do uso predatrio dos recursos naturais emfavor de outros tipos de uso.
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Os autores acima sugerem que esse turismo pode ser considerado o verdadeiro
ecoturismo se forem observados os seguintes princpios:
Vincula-se a um tipo de uso que minimiza os impactos negativos no meio ambiente
e na populao local;
Aumenta a conscincia e a compreenso em relao aos sistemas naturais e culturais
da rea e o conseqente envolvimento dos visitantes nas questes que afetam esses
sistemas;
Contribui conservao e gesto de reas legalmente protegidas e outras reas
naturais;
Maximiza a participao prvia e a longo prazo da populao local nas decises que
determinam o tipo e a quantidade de turismo a ser implantado;
Direciona os benefcios econmicos e outros tipos de benefcio populao local,
que pode assim complementar a renda decorrente das prticas tradicionais em vez de
eliminar ou substitu-las (a agricultura, a pesca, os sistemas sociais etc);
Oferece oportunidades especiais para a populao local e os funcionrios do turismo
na natureza de utilizarem e visitarem as reas naturais e aprenderem mais sobre
aquelas maravilhas que os outros visitantes vm conhecer.
Na interpretao de Crosby e Moneda (1996), o ecoturismo o
segmento turstico em que a paisagem a principal varivel comoponto de confluncia dos fatores ambientais e antrpicos. O objetivo a integrao do visitante com o meio natural e humano, e apopulao local participa dos servios prestados aos turistas. Oecoturismo prioriza a preservao do espao natural em que realizado e seu projeto contempla a conservao antes de qualqueroutra atividade. O termo ecoturismo est estritamente vinculado aoconceito de turismo verde, no sendo incorreta a identificao. A
diferena, mais que conceitual, histrica, no sentido de que turismoverde uma terminologia anterior ao ecoturismo e atualmente muitomenos utilizada.
O termo ecoturismo surge no Brasil no final dos anos 1980, seguindo a
tendncia mundial de valorizao dos espaos naturais e, oficialmente em 1994 por
meio da publicao dasDiretrizes para uma Poltica Nacional de Ecoturismoelaborado
pela EMBRATUR e Ministrio do Meio Ambiente.
At o inicio dos anos 1990, o ecoturismo no Brasil era concebido como turismoecolgico e a partir de 1994 passou a denominar-se ecoturismo sendo um segmento da
atividade turstica que utiliza de forma sustentvel o patrimnio natural e cultural,
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incentiva sua conservao e busca a formao de uma conscincia ambientalista atravs
da interpretao do ambiente, promovendo o bem-estar das populaes envolvidas
Ministrio do Turismo, 2005).
Esta conceituao da EMBRATUR referncia para o Ministrio do Turismo e
para o pas atualmente. Porm, o Ministrio do Turismo (2005) esclareceu suas
concepes sobre as seguintes expresses:
Segmento da atividade turstica
A segmentao do turismo, embora possa ocorrer por diversos elementos e
fatores, definida a partir das caractersticas da oferta, em funo da motivao do
turista e em relao atitude do prestador de servios, da comunidade receptora, sob os
seguintes aspectos:
Utilizao sustentvel do patrimnio natural (UNESCO) e cultural (Constituio
Federal do Brasil, 1988)
A prtica do Ecoturismo pressupe a utilizao sustentvel dos destinos
tursticos. O conceito de sustentabilidade, embora de difcil definio, refere-se ao
desenvolvimento capaz de atender s necessidades da gerao atual sem comprometer
os recursos para a satisfao das geraes futuras 5. Em uma abordagem mais ampla,
visa promover a harmonia entre os seres humanos e entre a humanidade e a natureza.
Utilizar o patrimnio natural e cultural de forma sustentvel representa a promoo de
um turismoecologicamente suportvel em longo prazo, economicamente vivel, assim
como tica e socialmente eqitativo para as comunidades locais. Exige integrao ao
meio ambiente natural, cultural e humano, respeitando a fragilidade que caracteriza
muitas destinaes tursticas (OMT, 2005). 6
Incentivo conservao do patrimnio natural e cultural e busca de uma
conscincia ambientalista pela interpretao do ambiente
Esse tipo de turismo pressupe atividades que promovam a reflexo e a
integrao homem e ambiente, em uma inter-relao vivencial com o ecossistema,
com os costumes e a histria local. Deve ser planejado e orientado, visando o
5Conceito de Desenvolvimento Sustentvel - World Commission on Environment and Development, 1987.6Conceito de Turismo Sustentvel da Organizao Mundial do Turismo - OMT, 1995.
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envolvimento do turista nas questes relacionadas conservao dos recursos que se
constituem patrimnio.
Promoo do bem-estar das populaesA distribuio dos benefcios resultantes das atividades ecotursticas deve
contemplar, principalmente, as comunidades receptivas, de modo a torn-las
protagonistas do processo de desenvolvimento da regio.
Na viso governamental, esta definio parte da preocupao em zelar por todas
as manifestaes culturais e possibilitar a integrao dos processos de efetivao do
ecoturismo, gerando melhorias s condies de vida de todos os envolvidos que no so
somente os turistas, mas, principalmente, os receptores dos lugares, as comunidades
envolvidas.
O ecoturismo, de acordo com a Ecoturism Society (1993), pode promover os
seguintes impactos:
Impactos Econmicos:
Positivos (desejveis)
Gerao de empregos e oportunidades;
Diversificao da economia;
Desenvolvimento regional;
Melhor distribuio da renda;
Aumento da renda tributria;
Melhoria da infra-estrutura e da qualidade de vida.
Negativos (indesejveis)
Transformao das ocupaes profissionais/desterritorializao;
Impactos sobre a estrutura e distribuio da renda (concentrao de renda
turismo somente para grandes empresrios);
Desvio dos benefcios econmicos.
Impactos socioculturais:
Positivos:
Conservao do patrimnio cultural, material e imaterial;
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Reafirmao e valorizao da identidade cultural;
Intercmbio cultural;
Qualificao e valorizao dos recursos humanos locais
Negativos:
Comercializao e perda da autenticidade das manifestaes culturais (artes,
msicas, danas, artesanatos);
Transformao da identidade cultural mediante influncia de outras culturas no
estilo de vida tradicional;
Degradao do patrimnio cultural arqueolgico, histrico e arquitetnico;
Modificaes no padro de consumo da populao local, despertandonecessidades econmicas at ento desconhecidas;
M prestao de servios em funo da desqualificao dos recursos humanos;
Aumento da populao residente e sazonal;
Aumento de problemas sociais, como drogas, prostituio e criminalidade.
Impactos ambientais
Positivos:
Conservao e proteo de reas naturais importantes;
Criao de reas protegidas (unidades de conservao)
Conservao de stios arqueolgicos e histricos;
Melhoria da infra-estrutura bsica urbana;
Aumento da conscincia ambiental.
Negativos: Degradao ambiental (poluio gua, ar, sonora, visual e desmatamento);
Problemas com saneamento bsico;
Problemas relativos ao uso e ocupao do solo ocupao desordenada.
Mesmo assim, para designar ecoturismo, aparecem denominaes as mais
diversas possveis, como turismo sustentvel, turismo responsvel, turismo alternativoe
mesmo, turismo ecolgico e todas as definies supracitadas das mais variadas
vertentes apontam para um denominador comum o ecoturismo como sendo de natureza
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cujo principal atrativo a natureza, embora, em algumas conceituaes, envolva o
patrimnio e o atrativo cultural.
Aps estudos, leituras da literatura nacional e internacional e principalmente por
meio de observaes e anlises de experincias, sempre sob a luz do olhar geogrfico,
numa perspectiva cultural, entendemos que o ecoturismo no poderia ser classificado
como de natureza ou na natureza, pois o interesse do ecoturista, ou melhor, o principal
atrativo que o motiva viagem no somente o natural.
O ecoturista quer conhecer a cultura dos povos do lugar, quer saber mais sobre a
interao destes com a natureza e no se contenta apenas em admirar a bela paisagem.
Quer tambm certificar que este patrimnio, seja natural ou cultural, como costuma
dividi-lo a cincia ocidental, est sendo utilizado de maneira sustentvel, quer conserv-
lo para geraes futuras ao mesmo tempo em que se preocupa com os impactos
desejveis e indesejveis que esta atividade pode exercer sobre as comunidades locais,
principalmente as tradicionais. Podemos dizer que o ecoturista tem um perfil diferente
do turista comum. responsvel e respeita o ambiente e a cultura. Para ele o ecoturismo
representa, antes de tudo, um intercmbio de conhecimentos, uma vez que acredita viver
na era da sociedade do conhecimento,
Sobretudo, o ecoturismo tem que utilizar como atrativo para ser ecoturismo tanto
o patrimnio natural quanto o cultural. No h como dissoci-los, mas sim uni-los,
integr-los, conforme a viso dos povos indgenas do Alto Rio Negro que consideram o
natural e o cultural patrimnio nico, sem divises. Patrimnio, para eles, tudo que
nosso, que temos de valor, a nossa riqueza. Tudo que est na terra e na cultura. Mani
Y, na lngua tukano.
Assim, o ecoturismo no pode ser denominado como turismo de natureza e nem
cultural porque, na verdade, a convergncia dos dois e com carter comunitrio
pautado no planejamento pa