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E SE O “FELIZES PARA SEMPRE" NÃO EXISTIR? ARTE CONTEMPORÂNEA E REPRESENTAÇÕES DE DES(AMOR) NAS RELAÇÕES DE GÊNERO. Natasha Miamoto Autora (UEM) Dr. João Baliscei Coautor (UEM) E-mail: [email protected] Resumo: Neste resumo, indaga-se a construção visual do casamento e dos papéis desempenhados por homens e mulheres. Mais do que um adjetivo, ser esposa ou ser marido é, para algumas mulheres e homens, um status social valorizado. Isso, principalmente, quando são consideradas as relações e papéis de gênero que insistem em colar a feminilidade à subordinação e ao doméstico e a masculinidade ao sustento e à liderança. Elaborou-se um estudo com delineamentos bibliográficos e analíticos, respaldados nos Estudos Culturais e Estudos de Gênero. O objetivo foi analisar as representações de casamento, de esposa e de marido em expressões da arte contemporânea. Como recorte de análise, selecionou-se a instalação Esposas (2005), da artista contemporânea portuguesa Joana Vasconcelos. Ao final, identificou-se que a obras de Vasconcelos, problematiza sobre as insatisfações que consomem homens e mulheres em suas relações conjugais. Palavras-chave: Estudos Culturais; Artes Visuais; Casamento; Gênero; Identidade. Introdução Não só as imagens oriundas da Arte, mas, por exemplo, as visualidades que permeiam a publicidade, cinema e moda, demonstram possíveis identidades culturais no contexto pós-moderno. Essas balizam práticas culturais tais como, as configurações familiares, as concepções de amor, de paternidade e maternidade e de casamentos. De acordo com Ferreira (2013), a família é uma instituição social que está em constante mudança, uma vez que outras configurações estão surgindo para além daquela que fora valorizada como convencional. O que é considerado “ideal” na nossa sociedade é a configuração de família nuclear, ou seja, composta de pai, mãe e filhos, que ocupam preferencialmente espaços urbanos. Conforme a autora, a

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Page 1: E SE O “FELIZES PARA SEMPRE NÃO EXISTIR? ARTE … · 2019. 5. 23. · E SE O “FELIZES PARA SEMPRE" NÃO EXISTIR? ARTE CONTEMPORÂNEA E REPRESENTAÇÕES DE DES(AMOR) NAS RELAÇÕES

E SE O “FELIZES PARA SEMPRE" NÃO EXISTIR? ARTE CONTEMPORÂNEA E REPRESENTAÇÕES DE DES(AMOR) NAS

RELAÇÕES DE GÊNERO.

Natasha Miamoto Autora (UEM) Dr. João Baliscei Coautor (UEM) E-mail: [email protected]

Resumo: Neste resumo, indaga-se a construção visual do casamento e dos papéis desempenhados por homens e mulheres. Mais do que um adjetivo, ser esposa ou ser marido é, para algumas mulheres e homens, um status social valorizado. Isso, principalmente, quando são consideradas as relações e papéis de gênero que insistem em colar a feminilidade à subordinação e ao doméstico e a masculinidade ao sustento e à liderança. Elaborou-se um estudo com delineamentos bibliográficos e analíticos, respaldados nos Estudos Culturais e Estudos de Gênero. O objetivo foi analisar as representações de casamento, de esposa e de marido em expressões da arte contemporânea. Como recorte de análise, selecionou-se a instalação Esposas (2005), da artista contemporânea portuguesa Joana Vasconcelos. Ao final, identificou-se que a obras de Vasconcelos, problematiza sobre as insatisfações que consomem homens e mulheres em suas relações conjugais. Palavras-chave: Estudos Culturais; Artes Visuais; Casamento; Gênero; Identidade. Introdução

Não só as imagens oriundas da Arte, mas, por exemplo, as visualidades que

permeiam a publicidade, cinema e moda, demonstram possíveis identidades

culturais no contexto pós-moderno. Essas balizam práticas culturais tais como, as

configurações familiares, as concepções de amor, de paternidade e maternidade e

de casamentos.

De acordo com Ferreira (2013), a família é uma instituição social que está em

constante mudança, uma vez que outras configurações estão surgindo para além

daquela que fora valorizada como convencional. O que é considerado “ideal” na

nossa sociedade é a configuração de família nuclear, ou seja, composta de pai, mãe

e filhos, que ocupam preferencialmente espaços urbanos. Conforme a autora, a

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concepção de família nuclear surgiu com o advento da Revolução Industrial, onde

homens e mulheres burgueses buscavam maiores lucros e menores custos. Antes

disso as famílias costumavam ser extensas e viviam em espaços rurais.

O casamento, por sua vez, enquanto tradição e ritual esteve presente em

muitas culturas e se mantém ainda valorizado na pós-modernidade. Pensando nas

problematizações que atravessam esse assunto, propomos o objetivo de analisar as

representações de casamento, de esposa e de marido em expressões da arte

contemporânea. Como recorte de análise, selecionou-se a instalação Esposas

(2005), da artista contemporânea portuguesa Joana Vasconcelos. Durante a análise

da poética da artista, percebemos como as imagens possibilitam um questionamento

a respeito do casamento tanto para homens, como para mulheres. Sabemos que as

imagens são artefatos culturais e políticos importantes, já que possibilitam

constantes diálogos entre sujeito e sociedade.

Dessa forma, as visualidades, em especifico, aquelas da Arte

Contemporânea, nos capacitam para a construção de significados, ampliação de

repertório, e, até mesmo para a problematização e negação das representações

oferecidas. Para nos respaldar, teoricamente, nos utilizamos dos Estudos Culturais e

Estudo de Gênero (BALISCEI, CALSA e SILVA 2007; BORRE, 2009 e FERREIRA,

2013) com a intenção de indagar: Quais são as representações de casamentos

oferecidas nas visualidades da Arte Contemporânea de Vasconcelos?

GÊNERO E CASAMENTO

As visualidades que permeiam nossa sociedade fabricam identidades, como

aquelas relacionadas ao casamento, que são ilustradas em propagandas, outdoors e

revistas. Tais aparatos visuais aproximam o casamento a uma ideia de segurança e

proteção. A esse respeito, Ferreira (2013) menciona que isso tem gerado

consequências nas relações amorosas, já que o casamento tem sido reconhecido

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enquanto a materialização do amor. Devido a isso, os casais têm exigido a

estabilidade desse sentimento, a qual é difícil de ser mantida, já que o casamento

trata-se da união de pessoas diferentes entre si.

Além disso, a autora ressalta que geralmente a ideia de amor apresentado

socialmente contempla-o como uma solução dos problemas econômicos, físicos e

afetivos, ou, então, é representado como uma forma de se enquadrar à sociedade e

a determinado requisito religioso. E, nesse sentido, o casamento se assemelha com

o amor dos contos de fada, indissolúvel, romântico, e configurado em uma espécie

de “‘ciclo natural’, no qual a ordem é: casar, obter a casa própria, ter filhos e

envelhecer juntos” (FERREIRA, 2013, p.98).

Sublinhamos também que, as visualidades constituem identidades de gênero

e oferecem comportamentos as mulheres, como ser feminina, ser sexy, saber

cozinhar, querer-se, casar e ser mãe. Esses comportamentos podem ser

questionados e analisados, pois essa aspiração pode não ser o desejo de todas as

mulheres pós-modernas.

Borre (2009) destaca a relação entre as visualidades e o gênero feminino,

para ela, as imagens buscam enquadrar meninas e mulheres em desenfreados

padrões de beleza, os quais são apresentados em revista, cadernos, e demais

materiais publicitários, que buscam definir os comportamentos mais atuais sobre o

que é ser mulher. Diante disso, enfatizamos que sujeitos pós-modernos têm contato

com determinado padrão de feminilidade que dentre outras coisas enuncia que para

se sentirem completas, as mulheres precisam se casar.

CASAMENTO E ARTE CONTEMPORÂNEA

Instalação é uma manifestação artística contemporânea, que normalmente,

possui uma duração curta nos espaços onde são inseridas. Essa obra Esposas

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(2005), da Joana Vasconcelos, nos possibilita problematizar as relações amorosas e

refletir sobre as identidades femininas e a concepção tradicional de casamento.

Segundo o site oficial da artista (2009), essa obra dialoga a respeito dos

desafios que residem nas relações conjugais. Nessa instalação, visualizamos três

manequins femininos, claros, magros, sentados no chão de pernas abertas,

segurando as mãos de três manequins masculinos, confiantes. Uma leitura possível

é que os sujeitos masculinos querem se safar daquela relação. As mulheres,

entretanto, estão desesperadas por seduzi-los. Há diversas fitas em plástico, que

“estrangulam os corpos de cada um dos seis manequins imprimindo ao conjunto

uma carga tão estranha quanto opressiva” (SITE OFICIAL, 2019).

O que nos chama a atenção é que na composição da artista há cores opacas,

que dão a sensação de mornidão, frieza e exaustão. Como parte desta instalação,

localizamos uma fotografia, em tamanho real, com a representação de uma mulher

com sobrepeso, de roupa íntima, isolada dos demais personagens. Se

pesquisarmos as identidades contempladas na pós-modernidade, iremos perceber

que mulheres tidas como gordas são menos valorizadas em relação às tidas como

magras. A mulher isolada está envolvida nas fitas e, por isso, supomos que também

possui sobre si o peso ditador, que as mulheres casadas suportam. Vasconcelos

menciona que o título Esposas, em castelhano, tanto pode significar “mulheres

casadas” como “algemas”, podendo ser visualizado desencontros e pressões nas

relações em sua obra.

Baliscei, Calsa e Silva (2017) mencionam que, muitas vezes, as visualidades

banalizam as identidades de gênero, apresentando uma visão dualista de

feminilidade, a qual separa as mulheres em duas categorias. De um lado, estão

mulheres supostamente “para casar”, que são delicadas, pacientes, obedientes,

puras e românticas; de outro lado, estão as mulheres, supostamente, para se

“divertir”, vistas como independentes, pervertidas, sensuais, e afrontosas. O

problema disso é que muitas vezes as identidades das mulheres reais não são

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contempladas e muito menos representadas nas mídias contemporâneas. Por isso,

é de extrema importância como demonstrarmos e incentivar o contato com

produções da Arte Contemporânea por meio dela problematizar e questionar as

visualidades sobre gênero, feminilidade e o possível casamento contemporâneo.

Considerações finais

Essa pesquisa, ainda de caráter inicial, nos autorizou a questionar se a

concepção de casamento é do desejo de todos(as). Sendo assim, a Arte

Contemporânea auxiliou nesse tipo de análise, porque é capaz de captar as

inquietações da sociedade atual. É (im)possível ser feliz no casamento, mas sempre

regularizando condutas e modos de ser que não atrapalhem a identidade de cada

sujeito em si.

Referências BALISCEI, João Paulo; CALSA, Geiva Carolina; SILVA, Carolina Vendrame da. Feminismo, imagens e educação: análise visual das representações femininas nas capas dos cadernos Tilibra. Revista Canoas. v. 20, n. 42, jan-abr. 2018. pp. 244-278. BORRE, Luciana Nunes . As Imagens que Invadem as Salas de Aula: produzindo gênero!. La Salle (Canoas), v. 1, p. 117-128, 2009. PIRES, S. M. F. 'Quando mamãe e papai se apaixonaram': representações familiares em livros literários contemporâneos. In: Jane Felipe; Bianca Salazar Guizzo; Dinah Quesada Beck. (Org.). Infâncias, gênero e sexualidade nas tramas da cultura e da Educação. 1 ed. Canoas:ULBRA, 2013, v. 1, p. 89-108. Site oficial de Joana Vasconcelos. Esposas. Disponível em: <http://www.joanavasconcelos.com/info.aspx?oid=47>. Acesso em: 17 mar. 2019.