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06 A VOCAÇÃO BANDEIRANTE DOS VILELAS ARISTIN0 VILELA Nas fazendas Santa Helena e Fundão, Aristino com o mesmo espírito desbravador e empreendedor, com fé e coragem, nos últimos 55 anos entregou a sua vida à produção de riquezas no município de Poxoréu. Os obstáculos não foram empecilhos para ele deixar de lado os seus objetivos. A vocação bandeirante da família Vilela, para se embrenhar no sertão inóspito, fundar fazendas e povoados, não surgiu no século XX. Ainda na primeira metade do século XIX, grandes levas de garimpeiros e lavradores embrenharam-se no sertão de Goiás, desbravando e fundando vilas. Conduzindo equipamentos, escravos e rebanhos de gado, fixaram-se no sudeste de Goiás, dominado pelos índios Caiapós. Conseguiram fundar rapidamente povoados com heroísmo e luta contra as intempéries e as hostilidades dos silvícolas. Um desses povoados foi Torres do Rio Bonito, fundado por membros das famílias Vilela, Goulart, Cardoso e Leite. Em 1845, foi erguida uma capela em louvor do Divino Espírito Santo. Em 1850, o povoado tinha aparência de uma vila. No dia 5 de novembro de 1855, a vila foi elevada à categoria de distrito de Rio Verde. No dia 20 de junho de 1873, o distrito foi transformado no município de Torres do Rio Bonito, mas somente foi instalado no dia 7 de janeiro de 1894. Em 1937, o município perdeu o seu nome e foi batizado com o nome de Caiapônia. Está situado na região do Alto Araguaia, limitando-se com os municípios de Baliza, Piranhas, Jataí, e Rio Verde. Em 1895, João José de Moraes, “o Cajango”, já está nas nascentes do Rio Araguaia acompanhando o seu patrão e mais tarde sogro, estabelecendo a primeira fazenda na região. Em 1911, Cajango envia uma petição ao governo de Mato Grosso, requerendo as terras ao redor da fazenda “Boa Vista”. Aquela fazenda vai se tornar um ponto de referencia e apoio, para centenas de sertanistas que por ali passavam em busca de terras no leste matogrossense. Bonifácio Ribeiro de Macedo, pai de João Ribeiro Vilela, nos primeiros anos do século XX, saiu do Rio Bonito com mais dois companheiros, com a intenção de descobrir boas terras devolutas em Mato Grosso. Não teve sorte. Nunca mais retornou a sua terra natal. Cajango deu notícias de sua passagem pela fazenda Boa Vista. Joaquim Brandão de Moraes que era irmão de João José de Moraes, o Cajango e pai de Dona Rita Ribeiro Vilela que é a esposa de João Ribeiro Vilela, em 1916 já tinham sua fazenda, no Capão Bonito, perto do Batovi, hoje distrito do município de tesouro. EM RIO BONITO Muitas famílias Vilelas em Torres do Rio Bonito não estavam satisfeitas em morar ali, pois os seus sonhos eram possuir fazendas de gado, o que não estava acontecendo, até então. No começo do século XX em Rio Bonito, já se tinha conhecimento da implantação de fazendas nas cabeceiras do Rio Araguaia e no leste de Mato Grosso. Já se sabia de Canjango, que tinha parentes em Rio Bonito. Joaquim Brandão de Moraes já dera noticias de suas fazendas no Capão Bonito. João Ribeiro Vilela, em nenhum momento, se esqueceu do UNIÃO POXORENSE DE ESCRITORES Setembro/2010 - Poxoréu - Mato Grosso A Upenina Nº 3 - 1ª Edição A UPENINA - Edição Especial E U E E M A R D U E T L F U E C S A D A A E A D T R E União Poxorense de Escritores

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A VOCAÇÃO BANDEIRANTE DOS VILELAS

ARISTIN0 VILELA

Nas fazendas Santa Helena e Fundão, Aristino com o mesmo

espírito desbravador e empreendedor, com fé e coragem,

nos últimos 55 anos entregou a sua vida à produção de riquezas no

município de Poxoréu. Os obstáculos não foram empecilhos para ele deixar de lado os seus

objetivos.

”A vocação bandeirante da família Vilela, para se embrenhar no sertão inóspito, fundar fazendas e povoados, não surgiu no século XX.

Ainda na primeira metade do século XIX, grandes levas de garimpeiros e lavradores embrenharam-se no sertão de Goiás, desbravando e fundando vilas. Conduzindo equipamentos, escravos e rebanhos de gado, fixaram-se no sudeste de Goiás, dominado pelos índios Caiapós. Conseguiram fundar rapidamente povoados com heroísmo e luta contra as intempéries e as hostilidades dos silvícolas.

Um desses povoados foi Torres do Rio Bonito, fundado por membros das famílias Vilela, Goulart, Cardoso e Leite.

Em 1845, foi erguida uma capela em louvor do Divino Espírito Santo.

Em 1850, o povoado tinha aparência de uma vila.No dia 5 de novembro de 1855, a vila foi elevada à categoria

de distrito de Rio Verde.No dia 20 de junho de 1873, o distrito foi transformado no

município de Torres do Rio Bonito, mas somente foi instalado no dia 7 de janeiro de 1894.

Em 1937, o município perdeu o seu nome e foi batizado com o nome de Caiapônia.

Está situado na região do Alto Araguaia, limitando-se com os municípios de Baliza, Piranhas, Jataí, e Rio Verde.

Em 1895, João José de Moraes, “o Cajango”, já está nas nascentes do Rio Araguaia acompanhando o seu patrão e mais tarde sogro, estabelecendo a primeira fazenda na região.

Em 1911, Cajango envia uma petição ao governo de Mato Grosso, requerendo as terras ao redor da fazenda “Boa Vista”. Aquela fazenda vai se tornar um ponto de referencia e apoio, para centenas de sertanistas que por ali passavam em busca de terras no leste matogrossense.

Bonifácio Ribeiro de Macedo, pai de João Ribeiro Vilela, nos primeiros anos do século XX, saiu do Rio Bonito com mais dois companheiros, com a intenção de descobrir boas terras devolutas em Mato Grosso. Não teve sorte. Nunca mais retornou a sua terra natal. Cajango deu notícias de sua passagem pela fazenda Boa Vista.

Joaquim Brandão de Moraes que era irmão de João José de Moraes, o Cajango e pai de Dona Rita Ribeiro Vilela que é a esposa de João Ribeiro Vilela, em 1916 já tinham sua fazenda, no Capão Bonito, perto do Batovi, hoje distrito do município de tesouro.

EM RIO BONITOMuitas famílias Vilelas em Torres do Rio Bonito não estavam

satisfeitas em morar ali, pois os seus sonhos eram possuir fazendas de gado, o que não estava acontecendo, até então.

No começo do século XX em Rio Bonito, já se tinha conhecimento da implantação de fazendas nas cabeceiras do Rio Araguaia e no leste de Mato Grosso. Já se sabia de Canjango, que tinha parentes em Rio Bonito.

Joaquim Brandão de Moraes já dera noticias de suas fazendas no Capão Bonito.

João Ribeiro Vilela, em nenhum momento, se esqueceu do

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desaparecimento do seu pai, quando este propôs explorar o leste de Mato Grosso, em busca de terras devolutas para formar fazendas.

O desejo de realizar o sonho que seu pai sonhara, era intenso. Depois do seu casamento em 1912, esteve viajando pelos sertões de Mato Grosso, fazendo o mesmo trajeto que o seu pai fizera tomando conhecimento dos caminhos e realidade da região.

Ao retornar ao Rio Bonito, João Ribeiro leva a certeza para si e para seus parentes insatisfeitos, de que em Mato Grosso poderiam possuir terras suficientes para formarem as fazendas dos seus sonhos e motivar alguns parentes seus a se mudarem para Mato Grosso. Os companheiros e parentes que aceitaram o seu convite foram: Sebastião Vilela de Moraes, seu cunhado, José Ribeiro Vilela, seu irmão e Josias Batista, que era casado com Ana Esméria de Moraes Vilela que era irmã de Joaquim Brandão de Moraes e todos eles tinham esposa e filhos.

Tendo resolvido que se mudariam para Mato grosso, iniciaram os preparativos para longa e monótona viagem. Era preciso adquirir os meios de transporte para a família e seus pertences.

Na época não havia outro meio de transporte mais econômico e seguro do que o carro-de-boi, os cavalos, os burros de sela e carga. Como o que sabiam fazer era lidar com a agropecuária e a sua intenção era fazer o mesmo nas terras que adquiririam em Mato Grosso, cada família procurou adquirir algumas cabeças de gado e de outros animais de cria, para trazer na bagagem.

PARTINDO DE RIO BONITOEra o ano de 1916. Os viajantes, já haviam alcançados as

metas, no planejamento de sua viagem definitiva. Além do gado, suficientes para iniciarem uma fazenda, dos meios de transporte, estavam providos de diversos apetrechos. Levavam na bagagem, muita paciência e estoicismo, habilidades e determinação.

Partiram, o desconhecido os esperavam.

A VIAGEMMas nessa historia onde entra Aristino?Aristino Vilela, o major Vilela, pertence a essa família de

bandeirantes e talvez, seja o “último dos moicanos”. Ele nasceu em Torres do Rio Bonito no dia 09 de setembro

de 1912.É filho de Josias Batista Vilela e Dona Ana Esméria de

Moraes Vilela e irmão de: Antônia Esméria Vilela, Geovalina Esméria Vilela, Rita Esméria Vilela, Sebastiana Esméria Vilela, José Batista Vilela (o Dego), Maria Esméria Vilela (Maruca), João Batista Vilela e o gêmeos Joaquim Batista Vilela e Ana Esméria Vilela Filha.

Aristino, menino ainda, fez parte, no ano de 1916, daquela comitiva de sertanejos que saindo de Goiás veio em busca de terras para implantarem fazendas no Estado de Mato Grosso e o destino quis que aquela corajosa e destemida comitiva viesse se estabelecer em terras que mais tarde formariam o município de Poxoréu.

A viagem, devido aos meios de transporte, foi demorada, cansativa, a velocidade era medida pelas passadas lentas e desinteressadas dos bois, puxando o carro. As paradas eram freqüentes, porque na caravana havia crianças de até um ano. Aconteciam para se fazer e tomar a refeição, para o descanso, geralmente as margens de algum córrego ou rio e para o pernoite.

Aristino Vilela, diz que ainda se lembra de algumas passagens da viagem, sobretudo quando atravessavam os rios. Ele conta: “No Araguaia a travessia foi muito difícil. Foi necessário descobrir-se um alcantilado, improvisar uma pinguela para poder atravessar os carros-de-boi. Naturalmente os animais não passaram na pinguela. Atravessaram no rio onde o barranco era mais baixo. Os carros foram descarregados, a carga transportada nos ombros dos homens e os carros vazios arrastados com muito cuidado, força e paciência por sobre a pinguela improvisada. Os

homens, quando terminaram o arrasto estavam exaustos e molhados de suor.

No Rio das Garças, tudo foi diferente encontrou-se uma passagem em que tanto os animais quanto os carros passavam normalmente carregados sem grandes dificuldades.

Muitos foram os dias de viagem da caravana, ate o seu primeiro, mais não o definitivo paradeiro em terras matogrossenses.

A caravana dos Vilelas ao se mudarem para Mato Grosso tinha um endereço certo: a Fazenda do Sr. Joaquim Brandão de Moraes no Capão Bonito perto do Batovi, no Vale do Rio das Garças.

Ao chegarem ali, a família se instalaram da melhor maneira que puderam e permaneceram por algum tempo, enquanto adquiriam as suas próprias terras e iniciariam a implantação de suas fazendas.

CONQUISTANDO A TERRA E PLANTANDO FAZENDASNão perderam tempo, mal haviam se instalado, Josias

Batista, João Ribeiro e seu irmão Deco, dirigiram-se para o Oeste, em busca do local da realização aos seus sonhos. Josias descobriu a INVEJA e ali plantou o seu marco. João e José Ribeiro, caminharam um pouco mais, chegando até o “Sangradorzinho”. Naquele local foi a vez do Deco fazer a sua escolha.

João Ribeiro, também teria ficado às margens do “sangradorzinho”, se não fosse a rejeição de Dona Rita, por aquelas terras. Ela achava-as muito vermelhas.

Conhecendo a propriedade do Senhor Benedito Gambira, nas margens do rio Alminhas e da intenção do dono em vendê-las, João Ribeiro fez negócio, “matando dois coelhos com uma só cajadada”: afastava-se um pouco mais do seu companheiro e irmão e agradava sua esposa, que muito gostou do local.

Tendo descoberto estes locais, todos abençoados com água em abundância, iniciaram um grande trabalho.

Suas famílias permaneceram na fazenda de Joaquim Brandão, pois não era fácil levar as famílias imediatamente, para lugares tão deserto, tão sem conforto e tão longe de algum centro, onde pudesse encontrar um pouco do necessário para sobreviver. Tendo encontrado o lugar dos seus sonhos para formar a fazenda sonhada Josias, pai de Aristino procurou com muito esforço e determinação, transformá-lo.

Com a foice, o machado, o facão, a cavadeira, o carro-de-boi e os bois de carro iniciou a sua grande construção.

Mas o que fazer primeiro? Isto não era importante, pois tudo estava por fazer.

Era preciso construir uma casa que adequasse aos seus sonhos, derrubar a mata e plantar a roça, produzir alimentos, construir cercas e currais para abrigar as suas poucas cabeças de gado e animais de carga e sela.

A fazenda sonhada devia ser autossustentável. Ali devia ser produzido o necessário para se viver.

Iniciou, portanto uma produção ainda pequena de determinadas culturas. Plantou arroz, milho, mandioca e cana de açúcar para consumo animal e humano. Plantou algodão, que depois de colhido era fiado pelas mulheres nos fundos das rocas, para depois tecer o pano com o qual eram feitas as redes, as cobertas, as calças e camisas para que os homens usassem no pesado trabalho na roça e no campo; o algodão servia ainda para fazer os pavios usados nas lamparinas que iluminavam as noites.

As hortaliças, as plantas medicinais, as fruteiras, foram também cultivadas em abundância.

A casa grande foi construída com dimensões e cômodos para acomodar uma família grande. Foi construída na década de 20. Ainda hoje o casarão está erguido, como testemunho, da coragem, da garra e da luta de cidadãos que não encontravam nenhum empecilho para desbravar os sertões de Mato Grosso e transformá-los.

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Casa da Fazenda InvejaConstruída na Década de 20

A casa grande está assentada sobre esta estrutura

de madeira, aí é o porão

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Esta é um pouco da história do menino Aristino Vilela.Foi ali na inveja, que o Major Vilela cresceu e aprendeu

com o pai e os seus parentes a arte de formar fazendas a partir do nada.

No grupo que ali chegara havia carpinteiro, serradores. Ali foram construídos adobes, telhas o madeiramento todo de madeira de lei, grandes troncos foram arrastados, lavrados e instalados nos locais adequados.

Apesar de haver água em abundância na região tornava-se difícil a obtenção do precioso líquido para as lides domésticas. Por isso foi construído um rego e nele foram instaladas bicas que levaram água até o interior da casa, servindo para as lides mais comuns e para movimentar o monjolo que servia para limpar o arroz e outros alimentos.

Ali o Major aprendeu a utilizar a aroeira, a madeira mais nobre e abundante naquelas matas. Era extraída da densa mata, não importava a distância do local, onde seria utilizada. O madeiro era lavrado e cortado nas dimensões adequadas a cada utilização. As peças eram transportadas pelos bois; a aroeira servia para mil e uma utilidades: tronqueiras para os currais, mourões e postes para as cercas de arame farpado ou as casas de pau-a-pique, esticadores de diâmetros avantajados, as aroeiras com mais de sessenta centímetros de grossura e até três metros de comprimento eram usadas na confecção dos mais diversos artefatos como cochos para dar comida aos porcos e água para as galinhas; gamelas utilizadas nas casas de farinha, do engenho, nas lidas domésticas diárias; as salgadeiras as milhares de cabeças de gado vinham se deliciar com o sabor do sal; as bicas que serviam de canais para transportar água que atendia as mais variadas lidas domésticas, inclusive para movimentar o monjolo; os pilões para socar arroz e outros alimentos; as mãos de pilão. Na fazenda inveja o gado e o porco forneciam a carne e a gordura para uma alimentação adequada à vida no campo; a gordura animal também servia como combustível para iluminar a noite, fazer sabão; era também usada como graxa para lubrificar várias engrenagens de madeira tais como: moendas do engenho, eixo de carro de bois, rodas na casa de farinha. O couro de gado tinha mil e uma utilidades. Com ele eram confeccionadas as bruacas, os cabrestos, as rédeas para as cavalgadas, os laços para prender o gado. Uma grande quantidade de outras peças eram feitas com o couro de gado e usadas nas lidas do carro-de-bois e dos currais. A crina dos animais servia para fabricação de sedém (cordas) que eram usadas nas rédeas, barrigueiras das montarias, na armação das redes de dormir ou para pear as vacas e amarrar os bezerros na hora de ordenhar.

O COMÉRCIOQuando Josias Batista descobriu a inveja, a estrada leste ainda

estava pouco povoada, a missão salesiana de São José de Sangradouro já atendia os boboro; o telégrafo já funcionava na região. Caçununga, o primeiro garimpo do leste de Mato Grosso, e arredores era um fervilhar de garimpeiros, revirando o solo quebrando e lavando o cascalho, pegando diamante e ganhando dinheiro em abundância, mas o isolamento das fazendas dos Vilelas era grande. O comércio mais próximo e mais evoluído era Cuiabá a capital do Estado, que distava 50 léguas aproximadamente o transporte para se chegar até os locais onde se poderia encontrar o necessário, era o carro de boi, o lombo dos cavalos, dos burros, dos bois. Guiando ou tangendo os bois Josias acompanhado pelo filho Aristino por várias vezes fez aquela viagem. Ao partir os caminheiros, sabiam apenas o dia da partida, jamais o dia volta. A velocidade média da viagem era o monótono e vagaroso caminhar dos bois tangidos pelo hábil carreiro. Eram dias da incômoda e cansativa marcha a comida era feita e consumida ao meio dias e ao anoitecer. Ao alvorecer ainda escuro, tomava-se o café, tirava-se o torto. O pouso era ao relento ou dentro do carro que era coberto com couro de gado. Muitas vezes enquanto os viajantes dormiam, alguns bois fugiam retardando a viagem, pois enquanto não fossem encontrados os fugitivos não se retomava a caminhada. Outras vezes,

os bois se assustavam com o bramido de alguma onça que sentia a presença dos animais e faminta se manifestava, na capital do Estado os pontos de paradas para fazer as compras eram o Porto e a Praça Ipiranga, onde o carro ficava estacionado para ser carregado com os produtos. Aos mais tarde já não se podia estacionar nem no Porto nem na Praça Ipiranga. O novo ponto de parada passou a ser no Coxipó da Ponte em carroças os produtos de Cuiabá eram transportados para o local do embarque. No percurso da viagem havia obstáculos muito difíceis de serem transpostos: ladeiras, areões, atoleiros. Na descida ou na subida da serra o trabalho dos bois e carreiros era dobrado. Para descer, várias juntas de boi eram atreladas à parte traseira do carro para que o mesmo não atropelasse os bois. Naqueles momentos, ao invés de puxarem o carro era este que arrastava os bois ladeira abaixo. Quando o lançante era muito íngreme ou comprido derrubava-se uma árvore bem folhuda atrelando-a atrás do carro. Na subida, ou aumentava o número de juntas de boi no carro carregado ou descarregava um pouco o carro, levando uma parte da carga no lombo do burro. Os bois nessas horas tinham que redobrar os esforços e unirem as forças. Através de gritos do carreiro e a utilização do ferrão, os bois conseguiam levar o carro até o alto. Se o carro atolasse, era preciso descarregá-lo, transportar a carga nas costas, até passar o atoleiro. Às vezes, corta-se madeira e galhos, colocando-os debaixo das rodas do carro e em toda a extensão da lama. Força-se os bois a fazerem mais força, com pontadas de ferrão até superar aquele difícil trecho. De ida e volta, a viagem, geralmente levava um mês. O carro de boi e os animais de carga, ao voltarem de Cuiabá, vinham carregados com os produtos indispensáveis ao desenvolvimento da fazenda e a sobrevivência dos fazendeiros: sal para o gado e o consumo doméstico, arame, para fazer cercas, querosene, café, tecido e outras miudezas indispensáveis. Alguns anos depois que Josias fundara sua fazenda Inveja, apareceram os bois gordos que deviam ser vendidos. Era o retorno do trabalho intensivo, que chegava. Mas onde estava o mercado consumidor de carne bovina, em grande quantidade? Josias ainda em Rio Bonito, já tinha conhecimento, de que Barretos, no Estado de São Paulo, a centenas de quilômetros da fazenda, era ótimo mercado, para vender e o seu rebanho. Várias boiadas chegou a levar até Barretos. Lá o gado tinha mercado e bom preço de ida e volta. A viagem durava mês. Dependia dos contratempos. Alguns bois se cansavam e era preciso deixá-los para trás. Outras vezes, adquiriam aftosa e era preciso vacinar todo o rebanho e a viagem sofria grandes atrasos. A caminha, não havia dúvida, era lenta, cansativa, trabalhosa, arriscada e complicada. Quando apareceram os comércios de Itiquira, Lageado e Poxoréu, para lá se dirigiam para vender e comprar. Aristino cresceu, acompanhando o pai e outros Vilelas, nessas viagens demoradas.

ARISTINO – ESTUDANTE E ADMINISTRADOR DE FAZENDASAristino, crescendo na fazenda Inveja, não podia tornar-se

homem, sem nenhum estudo. Seu pai matriculou-o no Internato da Missão Salesiana de São José no Sangradouro. Depois estudou no Colégio André Avelino, do Estado. Estudando em Cuiabá, em 1926, Aristino teve que retornar o mais urgente possível à fazenda Inveja, pois o seu pai falecera. Diante da tragédia do passamento do pai, a família Batista Vilela ficou imensamente transtornada e a desesperança rondou-a intensamente. Aristino com apenas 14 anos de idade, mais maduro psicológica e intelectualmente, não teve outra saída, abandonou os estudos e foi assumir a administração da fazenda Inveja e a educação dos seus irmãos. Se ele não pode continuar estudando não permitiu que o mesmo acontecesse com seus irmãos Joaquim Batista Vilela e João Batista Vilela: um tornou-se médico e exerce sua profissão em Dourados, no Mato Grosso do Sul, o outro tornou-se engenheiro agrônomo e foi um grande agrimensor em Mato Grosso. A r i s t i n o a d o l e s c e n t e a i n d a a s s u m i u p a r a s i a responsabilidade de continuar administrando a fazenda Inveja, com a mesma determinação que o seu pai impôs a si mesmo. Aristino foi rígido em suas ordens e a obediência devia ser militar: Ordem dada, ordem cumprida, sem relutância. A rigidez foi tamanha que em pouco tempo ele recebeu dos irmãos e daqueles que com ele trabalhavam o epíteto

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de Major. A alcunha foi tão significativa e adequada que hoje só conhecemos Aristino como o Major Vilela.

Com a ausência da segurança e da força do seu trabalho do seu pai, o Major se colocou diante da fazenda Inveja com força redobrada e juvenil afim de que o ritmo do crescimento e do desenvolvimento não arrefecesse.

DA INVEJA PARA SANTA HELENAAristino, como já vimos, assumiu a responsabilidade de

administrar a fazenda Inveja juntamente com sua mãe e os seus irmãos desde criança, ali imprimiu a sua coragem a sua determinação, o seu trabalho, mas a fazenda Inveja não era sua, era de sua mãe e de seus irmãos e ele, filho de Josias, um sonhador, não estava satisfeito ele precisava ter a sua própria fazenda. Em 1942 aos 30 anos de idade conheceu a jovem Anecy Meira, cuiabana e com apenas 12 anos foi o grande amor da sua vida. Com ela se casou no dia 18 de setembro de 1942. Em 1949, requereu mais de 7 mil hectares de terras, a margem do rio Coité, bem próximas da sede e distrito do mesmo nome. Ali ele implantou e desenvolveu as fazendas Santa Helena e Fundão. Ali imprimiu o seu ritmo dinâmico e aplicou todos os seus conhecimentos da construção de fazendas. Já não era o garoto goiano que chegou deslumbrado aos sertões de Mato Grosso. Era o homem forte, destemido, sonhador, calejado nas lides do campo e com firmes propósitos. A fazenda Inveja ele deixou aos cuidados de seu irmão Dego, sua mãe e irmãs. Os irmãos Joaquim e João não optaram pela vida nas fazendas. Sua mãe enquanto a saúde permitiu permaneceu na fazenda Inveja. Ela faleceu em Poxoréu no dia 06 de agosto de 1962.

Nas fazendas Santa Helena e Fundão, Aristino com o mesmo espírito desbravador e empreendedor, com fé e coragem, nos últimos 55 anos entregou a sua vida à produção de riquezas no município de Poxoréu. Os obstáculos não foram empecilhos para ele deixar de lado os seus objetivos. Mesmo quando os governos não se propunham fazer o desenvolvimento do município, por exemplo construindo pontes o Major tomou a iniciativa. Em1980, ele as suas custas construiu uma grande ponte de madeira sobre o rio Coité, eliminando assim as dificuldades de travessia, mão somente suas, mas de muitos outros fazendeiros vizinhos seus que foram beneficiados com seu empreendimento

Fazenda Inveja em pé Dona Ana Esméria de Moraes Vilela

Fazenda Inveja em pé Dona Ana Esméria de Moraes Vilela

Fazenda Fundão

Fazenda Santa Helena

Fazenda Fundão

Fazenda Santa Helena

Major e Anecy na Fazenda Santa Helena

Inauguração da ponte sobre o rio Coité na fazenda Santa Helena (1980)

Inauguração da ponte sobre o rio Coité na fazenda Santa Helena (1980)

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Aristino é testemunha dos mais significativos acontecimentos da história de Poxoréu. Em 1924 por sua fazenda passou João Airenas Teixeira o sertanista que juntamente com mais seis companheiros descobriu diamantes no córrego São Pedro. Por sua fazenda ele viu passarem centenas de garimpeiros que saiam dos garimpos do Caçununga e se dirigirem para as novas jazidas do São Pedro. A fazenda Inveja era um ponto de referência na estrada que ligava Cuiabá a Goiás. Ali, o Major Vilela soube das rusgas entre baianos e maranhenses no São Pedro. Ele conta: “Reginaldo de Melo fugindo de São Pedro com medo de ser assassinado pernoitou na fazenda Inveja e obrigou alguns homens para irem até Caçununga observarem os movimentos dos homens de Morbeck. Em 1926 Aristino viu Carvalinho quando acompanhado por mais de trezentos homens militares e civis armados, partindo de Cuiabá e passando por sua fazenda se dirigiram para Santa Rita do Araguaia para combater Morbeck e seus homens. Da sua fazenda o batalhão levou alimento e animais. Testemunhou no mesmo ano a passagem da Coluna Prestes que na Missão Salesiana do Sangradouro combateu a tropa do governo, desbaratou-a e incendiou todas as casas dos bororo e dos missionários. Incendiou até o caminhão que a missão possuía. Nessas ocasiões todas as famílias Vilelas sofriam as conseqüências. Tinham que deixar as sedes das fazendas e se embrenharem no mato para não sofrerem conseqüências piores. Animais e alimentos sempre eram roubados pelos beligerantes. Na fazenda Inveja pernoitou Maroto Sodré e seus companheiros que descobriram diamantes no sopé do morro da mesa em julho de 1926. Aquela descoberta deu origem à cidade e ao município de Poxoréu. Afinal, Aristino Vilela, o Major Vilela, é testemunha de toda a história deste município, da sua origem aos dias de

hoje. Não se preocupou apenas em cuidar de suas fazenda e produzir riquezas. Esteve sempre atento ao desenvolvimento do município, participou do processo político e chegou a se candidatar ao cargo de prefeito nas eleições de 1966. Seu adversário foi o Dr. Antônio dos Santos Muniz que venceu o pleito.

O CARINHO DA FAMÍLIADo casamento de Aristino com Anecy Meira nasceu a filha

Arinê Beatrice Meira Vilela, no dia 05 de março de 1966.Mais tarde se casou com seu parente Walterly Ribeiro da

Silva e com ele teve os seguintes filhos: Diandra Vilela Silva, formada em medicina;

Aristino

Testemunha da históriaTestemunha da história

Diandra Vilela Silva, formada em medicina

Nayane Soyara Vilela Silva, cursando o 1º semestre

de medicina na universidade de Iguaçu, no Rio de Janeiro

Nathane Vilela Silva, cursando o 2º semestre

de medicina na universidade de UCBOL na Bolívia.

Aristino Vilela Neto

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Setembro/2010 - Poxoréu - Mato Grosso A Upenina Nº 3 - 1ª Edição

A UPENINA - Edição Especial

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União Poxorense de Escritores

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BODAS DE OURO - ANIVERSÁRIO DE 50 ANOS DE CASADOS

Afinal, Aristino Vilela, o Major Vilela, é testemunha de toda a história deste município, da sua origem aos dias de hoje. Não se preocupou apenas

em cuidar de suas fazenda e produzir riquezas. Esteve sempre atento ao desenvolvimento do município, participou do processo político e chegou a se

candidatar ao cargo de prefeito nas eleições de 1966.

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CONCLUINDOHoje, aos 98 anos, um mês e dois dias, na Rua Mato

Grosso, na casa de número 355, numa cama, fragilizado pela avançada idade e pela intensa atividade desde criança nas lides agropecuárias no município de Poxoréu, com dificuldades de locomoção, de fala e impedido de realizar as mais simples atividades do seu cotidiano, jaz o último dos moicanos, o Major Vilela.

BIBLIOGRAFIA:Este texto foi elaborado através de informações e depoimentos coletados

outrora com os senhores Antônio Ribeiro Vilela (Tunico), Juary Ribeiro Vilela, Valdomiro Ribeiro Vilela, o próprio Major Vilela e atualmente as informações

Hoje, aos cuidados carinhosos de sua filha Arinê Beatrice, ele vai se desligando sensivelmente de tudo aquilo que foi o sentido do seu intenso labutar e por isso mesmo impedido de estar presente à solenidade de entrega da comenda que o município de Poxoréu com muita hora e gratidão lhe entregou.

A história, jamais pesará com justiça a grandiosidade de homens como Aristino Vilela na implantação e no desenvolvimento do município.

dadas por sua filha Arinê Beatrice Meira Vilela.Enciclopédia dos municípios brasileiros. vol. 35. 1957.

Autor deste texto: Comendador da Educação Prof. João de Souza.Digitação: Sandra Maria Moraes Rangel Soares.

Marcos Vinícius Pereira Amorim

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