Download - Renata E Silva
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 1/211
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO –PUC-SP
Renata Elaine Silva
Decisão Judicial em Controle de Constitucionalidadedas Normas Tributárias: Análise Sob o enfoque da Teoria daLinguagem
MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2008
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 2/211
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO –PUC-SP
Renata Elaine Silva
Decisão Judicial em Controle de Constitucionalidadedas Normas Tributárias: Análise Sob o enfoque da Teoria da
Linguagem
MESTRADO EM DIREITO
Dissertação apresentada à BancaExaminadora como exigênciaparcial para obtenção do título de
MESTRE em Direito do Estado,pela Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo, sob aorientação da Profa. DoutoraFabiana Del Padre Tomé.
SÃO PAULO
2008
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 3/211
Banca Examinadora
________________________________
________________________________
________________________________
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 4/211
Dedico este trabalho aos meus pais, Valdemar e
Dina, pelo eterno amor e apoio incondicional em
todos os momentos de minha vida, pelo exemplo de
força, dedicação, fé e coragem.
À minha irmã, Roberta , pelo carinho e torcida por
mais esta conquista e por estar sempre ao meu lado
nos momentos difíceis.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 5/211
AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus , pelo presente da Vida e por guiar meus
pensamentos.
Ao professor Paulo de Barros Carvalho , sem o qual não seria possível a realização
deste sonho e pelos ensinamentos, que levarei por toda minha vida.
À minha orientadora, Fabiana Del Padre Tomé , pelas horas dispensadas com
reuniões e leituras para orientação desta obra, que muito contribuiu para meu
amadurecimento intelectual.
Ao professor Ricardo Castilho , pelo apoio em minha carreira profissional e carinho
dispensado durante anos de amizade preciosa e rara.
Ao professor Regis Fernandes de Oliveira pelo carinho e convivência profissional
que muito me honra.
À amiga, Patrícia Fudo , pelo convívio pessoal e profissional, e por estender as
mãos para me confortar nos momentos difíceis.
Aos professores Tácio Lacerda Gama e Robson Maia Lins , pela força, apoio e
carinho antes e durante o mestrado.
Aos amigos Rubya Floriani dos Anjos e German Alejandro San Martin Fernandez ,
pela amizade verdadeira e preciosa ajuda com a finalização do trabalho.
A todos os amigos e professores da Pontifícia Universidade Católica. E, por fim, a
todos os amigos e professores da Escola Paulista de Direito.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 6/211
“A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios.
Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes quea cortina se feche, e a peça termine
sem aplausos”.
Charlie Chaplin
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 7/211
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar as decisões judiciais em controle deconstitucionalidade das normas tributárias. A análise será elaborada partindo da
teoria de como se processa a decisão judicial, as premissas decisórias, o limite e a
construção do aplicador do direito da norma concreta de decisão judicial. Para só
após analisar a pragmática, através das próprias decisões proferidas em controle de
constitucionalidade no âmbito no Supremo Tribunal Federal. Todo o
desenvolvimento da teoria e da prática do trabalho será realizado de acordo com a
Teoria da Linguagem como construção do direito em seus aspectos sintáticos,semânticos e pragmáticos.
Palavras-chave: Direito Tributário. Decisão Judicial. Controle de Constitucionalidade.
Efeitos da decisão em Controle de Constitucionalidade. Teoria da Linguagem.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 8/211
ABSTRACT
The present work aims at analyzing the judicial decisions in control of constitutionality
of the tax norms. The analysis will be elaborated from the theory of how the judicial
decision is processed, decision premises, limit and construction of the applier of the
law of the of the concrete norm of judicial decision. Afterwards, through the very
decisions uttered in constitutionality control from Federal Supreme Court, pragmatic
will be analyzed. The whole theory and practical development in the work will be
accomplished in agreement with the Theory of the Language as construction of the
Law in its syntactic, semantic and pragmatic aspects.
Key-words: Tax right. Judicial decision. Control of Constitutionality. Effects of the
decision in Control of Constitutionality. Theory of Language.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 9/211
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 13
1 INTRODUÇÃO CIENTÍFICA DO TRABALHO
1.1 Abordagem ........................................................................................................ 16
1.2 Inserção Filosófica .............................................................................................. 17
1.3 Constructivismo Lógico-Semântico .................................................................... 18
1.3.1 Contexto Cultural no Constructivismo Lógico-Semântico ................................ 21
1.4 Teoria da Linguagem Jurídica ............................................................................ 23
1.4.1 Plano de Investigação dos Sistemas Sígnicos ................................................ 26
1.4.2 Mensagem Jurídica: Elemento Comunicacional .............................................. 28
1.4.3 Atos de Fala e Força Ilocucionária das Decisões Judiciais ............................. 31
2 ESTRUTURA NORMATIVA DA E NA DECISÃO JUDICIAL EM CONTROLE
DE CONSTITUCIONALIDADE
2.1 Introdução .......................................................................................................... 40
2.2 Conceito de Norma Jurídica ............................................................................... 42
2.2.1 Norma em Sentido Amplo e Norma em Sentido Estrito ................................... 44
2.2.2 Regra-Matriz de Incidência Tributária.............................................................. 46
2.2.3 Objeto e Procedimento: Norma Primária e Secundária .................................. 48
2.2.4 O que são as “espécies”: normas gerais e abstratas, normas gerais ou
individuais e concretas. ............................................................................................ 49
2.2.5 Normas de Estrutura e Normas de Comportamento ....................................... 51
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 10/211
2.2.5.1 Os Princípios como Norma de Estrutura ...................................................... 53
2.3 Norma Jurídica Válida e sua Importância nas Decisões em Controle de
Constitucionalidade .................................................................................................. 58
2.3.1 Validade como Relação de Pertinencialidade.................................................. 61
2.3.2 Validade do Controle de Constitucionalidade na Teoria de HERBERT L. A.
HART ....................................................................................................................... 66
2.3.3 Validade Adotada para Desenvolvimento do Tema ........................................ 71
2.4 O que é Inconstitucionalidade? .......................................................................... 72
2.5 O que é Vigência? ............................................................................................. 74
2.6 O que é Eficácia? .............................................................................................. 75
2.7 Retirada de Norma Inconstitucional do Sistema ................................................. 77
3 CONSTRUÇÃO DE DECISÃO JUDICIAL EM CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE
3.1 Introdução........................................................................................................... 81
3.2 O Juiz e o processo de interpretação ................................................................ 81
3.3 O Juiz diante de uma lacuna no direito............................................................... 89
3.3.1 Lacuna em seu aspecto sintático .................................................................... 91
3.3.2 Lacuna em seu aspecto semântico e pragmático ........................................... 93
3.4 Construção e Formação dos Conceitos.............................................................. 98
3.4.1 Os Valores na Construção e Formação dos Conceitos ................................. 104
3.4.2 Como Resolver o Problema Semântico: Ato de Escolha ............................... 109
3.5 Decisão Judicial e Criação Jurídica .................................................................. 113
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 11/211
3.5.1 O Juiz perante um caso de difícil decisão...................................................... 116
4 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS TRIBUTÁRIAS E
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
4.1 Introdução ........................................................................................................ 122
4.2 Breve análise histórica evolutiva do Controle de Constitucionalidade
no Brasil.................................................................................................................. 125
4.3 Controle Difuso de Constitucionalidade........................................................... 129
4.3.1 O Princípio da Reserva de Plenário .............................................................. 132
4.3.2 Resolução do senado .................................................................................. 134
4.3.3 Efeitos da Decisão em Controle Difuso ......................................................... 136
4.3.3.1 Modulação dos efeitos em Controle Difuso................................................. 136
4.3.4 Transcendência dos Motivos Determinantes da Decisão ............................. 137
4.4 Controle Concentrado de Constitucionalidade ................................................ 141
4.4.1 Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ................................................... 143
4.4.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) Por Omissão ............................ 145
4.4.3 Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) ........................................ 149
4.4.4 Medida Cautelar ............................................................................................ 151
4.4.5 Efeitos da Decisão em Controle Concentrado.............................................. 153
4.4.5.1 Diferença entre nulidade ex tunc e anulabilidade ex nunc ......................... 154
4.4.5.2 Modulação dos efeitos em Controle Concentrado ..................................... 156
4.4.5.3 O efeito vinculante ..................................................................................... 158
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 12/211
4.5 O Supremo Tribunal Federal: órgão jurídico ou político.................................... 161
4.6 A função do Supremo Tribunal Federal: dar segurança Jurídica às relações. . 169
5 CASOS CONCRETOS DE DECISÃO EM CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS TRIBUTÁRIAS
5.1 Introdução ........................................................................................................ 172
5.2 Vaguidade e Ambigüidade dos Signos no Controle Judicial de
Constitucionalidade: Contribuição Para Financiamento da Seguridade Social –
COFINS ................................................................................................................. 172
5.3 Princípios no Controle Judicial de Constitucionalidade: Isenção de Imposto
sobre Propriedade de Veiculo Automotor – IPVA .................................................. 178
5.4 Modulação dos efeitos sem controle de Constitucionalidade: Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI), creditamento de aquisição de insumos
favorecidos com alíquota-zero ............................................................................... 180
5.5 Não Modulação dos Efeitos em Controle Difuso: Revogação da Isenção da
Sociedade Civil de Prestação de Serviços Profissionais ........................................ 183
5.6 Medida Cautelar em Ação Declaratória de Constitucionalidade: Inclusão do
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo
da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e do
Programa de Integração Social/Programa de Formação do Patrimônio do
Servidor Público (PIS/PASEP) ............................................................................... 185
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 13/211
6 CONCLUSÕES ................................................................................................... 187
7 BIBLIOGRAFIA ................................................................................................... 203
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 14/211
INTRODUÇÃO
O estudo da decisão judicial no âmbito do Supremo Tribunal Federal,
especialmente quando a decisão envolve matéria tributária em controle de
constitucionalidade, é uma proposta que pretende ir além do aspecto formal do
direito1.
A proposta é estabelecer, por meio da teoria analítica do conhecimento,
sem adentrar nas questões empíricas tratadas pelo realismo jurídico 2 , uma
construção da norma concreta “decisão judicial”, de modo a delimitar apenas
daquelas proferidas em controle de constitucionalidade e seus respectivos efeitos no
universo do direito tributário.
Primeiramente, a abordagem terá como ponto de partida as premissas
científicas que serão usadas como base para o pensamento aqui adotado; após,
passar-se-á à construção do fenômeno jurídico “decisão judicial”, através da Teoria
da Linguagem em seus aspectos sintático, semântico e pragmático, construindo todo
o sistema3.
Partimos da norma jurídica geral até a criação da norma concreta em seu
processo de positivação. Isso porque o direito aqui adotado é aquele entendido
1 Não há aqui que se confundir “Direito” (Ciência do Direito) com “direito” (direito positivo). A Ciênciado Direito, bem como o direito positivo, são realidades inconfundíveis, cada qual se encontra emplanos distintos, e possui organização lógica, peculiaridades e características lingüísticas (semânticae pragmática) próprias. Sem entrar na discussão que encontramos na doutrina nacional e estrangeirasobre a palavra direito e seu aspecto semântico, apenas para diferenciação o Direito como ciênciaserá grafado de letra maiúscula e o direito positivo com minúscula, sempre nessa disposição. Noscasos em que a palavra apresentar outro significado diferente do aqui adotado será prontamenteespecificado.2 Apesar de tratar de decisões judiciais, não adotaremos ao realismo de ALF ROSS, que entende quea validade da norma jurídica é dada pela sentença dos tribunais. As bases serão positivistas e a
pesquisa será analítica.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 15/211
14
como objeto cultural que carrega consigo valores que se pretendem alcançar. Por
derradeiro, serão abordadas as decisões do Supremo Tribunal Federal – órgão que
diz a última palavra em direito quando a matéria é constitucional –, porque toda
matéria tributária tem sua delimitação geral constitucionalmente estabelecida.
Com apoio em grandes juristas e filósofos, pretende-se desenvolver uma
teoria que, com bases científicas, explique as recentes decisões do Supremo
Tribunal Federal, que certamente servirá não apenas para a melhor compreensão
das normas tributárias, mas, também, para melhor entender as polêmicas decisõestomadas por este órgão, que, diferente do que acha boa parte da doutrina, não age
como “legislador positivo4”.
Isso porque abundam comentários sobre as decisões do Supremo
Tribunal Federal (STF) em controle de constitucionalidade, quanto à aplicação dos
seus efeitos, em especial quando versam sobre matéria tributária, pois o aspectopragmático do direito muitas vezes é esquecido e somente vem à tona quando
determinado fato não se encontra ipsis verbis regulado pela norma jurídica, em
razão da impossibilidade do legislador de prever, em sua atividade legiferante, todos
os fatos sociais possíveis que visam ser jurisdicizados.
Como se processam as normas jurídicas como fenômeno lingüístico queé? A definição de validade é importante para a definição de direito? O STF tem um
papel jurídico ou político? Como fica a situação de algumas normas que,
interpretadas pelo STF, podem adquirir conteúdo semântico diferente daquele
3 Também apenas a titulo de esclarecimento, a expressão sistema jurídico será usada como sinônimode ordenamento jurídico , assim como PAULO DE BARROS CARVALHO e diferentemente de
GREGÓRIO ROBLES.4 O “legislador positivo” é aquele que cria nova norma através de sua decisão. Nova norma que seriade competência exclusiva do Poder Legislativo.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 16/211
15
positivado? O princípio é norma de estrutura e deve ser observado pelo Juiz na
criação do direito diante da existência de lacunas? O juiz cria normas? A criação
judicial de normas possui limites? O juiz pode decidir fora da “moldura” de Kelsen?
Como dizer o que está fora ou dentro da “moldura”? Para que serve a “textura
aberta” do direito de Hart? Como se processa o controle de constitucionalidade das
normas tributárias?
Eis alguns dos problemas que se pretende enfrentar no decorrer do
trabalho, por meio de movimento dialético entre a teoria e a prática (fazendo um
paralelo com os próprios julgados), para ao final chegar a uma conclusão com bases
científicas do fenômeno da decisão em controle de constitucionalidade e de seus
efeitos no mundo jurídico tributário. Pois, só a teoria nos dá base para a construção
científica sólida.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 17/211
1 INTRODUÇÃO CIENTÍFICA DO TRABALHO
1.1 Abordagem
Inicia-se o presente trabalho estabelecendo as premissas teóricas
científico-filosóficas que guiarão todo o desenvolvimento e análise do tema objeto de
estudo.
Todo trabalho que tem a pretensão de ser científico necessita de uma
organização. Tal organização começa com a demarcação do contexto filosófico, ou
seja, o paradigma em que o trabalho está inserido; em seguida identifica-se o
método escolhido, para, então, finalmente, chegar à necessária delimitação do
objeto, o que se dará através do corte metodológico.
O corte metodológico é necessário para delimitar o objeto, o que não
entendemos como reducionismo do objeto e sim parte integrante da ciência, sem o
qual não é possível o conhecimento científico.
O trabalho também contará com a linguagem em sua função
metalingüística, demonstrando a preocupação com que a mensagem pretendida
atinja o receptor sem ruídos; além da função metalingüística, contaremos também
com inúmeras notas explicativas para que possamos aclarar e destacar o sentido
das palavras, que, como se sabe, são, segundo ALF ROSS 5 , sempre vagas e
potencialmente ambíguas.
5 ROSS, Alf. Sobre el derecho y la justicia . 2. ed. Buenos Aires: Eudeba, 1997, p. 112.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 18/211
17
O método de pesquisa do trabalho também deve ser delimitado; o aqui
adotado é o “constructivismo lógico-semântico”. Neste sentido, é interessante
colacionar o que escreveu PAULO DE BARROS CARVALHO6
:
Na proposta epistemológica do direito, não me canso de repetir quetodo trabalho com aspirações mais sérias há de expor previamenteseu método, assim entendido o conjunto de técnicas utilizadas peloanalista para demarcar o objeto, colocando-o como foco temático, eem seguida, penetrar seu conteúdo.
Após a breve introdução sobre o método adotado para desenvolvimentodo tema, passa-se agora à analise do aspecto filosófico.
1.2 Inserção Filosófica
Conforme mencionado, todo trabalho científico precisa da indicação do
paradigma7 em que está inserido, como também da demarcação de seu método. O
presente estudo tem como inserção filosófica a Filosofia da Linguagem.
Desse modo, os elementos filosóficos que serão usados para a análise do
tema proposto: “Decisão Judicial em Controle de Constitucionalidade das Normas
Tributárias: Analise sob o enfoque da Teoria da Linguagem” serão os relacionados
com a Filosofia da Linguagem, mais precisamente conhecidos por “giro lingüístico”.
6 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, linguagem e método . São Paulo: Editora Noeses,2008, p. 2008.7 Segundo THOMAS S. KUHN, paradigma seria uma teoria mais ampla formada por conceitos,
modelos, analogias, valores, regras de avaliação de teoria, formulação de problemas, princípiosmetafísicos e pelos exemplares que para o autor são a parte mais importante de um paradigma.(KUHN, Thomas S. As estruturas das revoluções científicas . Trad. Beatriz Vianna Boreira e NelsonBoreira. São Paulo: Perspectiva, 1970, p. 232, passim.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 19/211
18
O “giro lingüístico”, movimento filosófico que representa a mudança de
paradigma da filosofia da consciência para a filosofia da linguagem, relaciona
linguagem e conhecimento, construção do conhecimento por meio da linguagem.
Portanto, é um modelo filosófico que auxilia a aprofundar o conhecimento através da
linguagem, fazendo desta o seu ponto de partida.
Pelo método aqui adotado, toda forma de compreensão se dá através da
linguagem, não mais como simples instrumento que aproxima o sujeito do objeto,
mas como instrumento de construção do próprio sujeito e do próprio objeto de
conhecimento, passando a ser uma relação de significações (sentidos) entre
linguagens.
1.3 Constructivismo Lógico Semântico
O constructivismo lógico-semântico é método analítico 8 de trabalho
hermenêutico que auxilia no exame do direito. O constructivismo enfatiza a
uniformidade na análise do objeto e a precisa demarcação da esfera de
investigação, somando-se sempre o contexto cultural que está inserido o objeto de
investigação. Desse modo, os métodos lógicos coerentes somados às categorias
semióticas da linguagem com a intenção de compreensão com racionalidade é o que
chamamos “constructivismo lógico-semântico”.
Neste sentido são as palavras de PAULO DE BARROS CARVALHO9:
8 Afirmamos ser “um dos métodos”, pois muitos são os sistemas de referência por intermédio do qual
o direito pode ser examinado, cada qual representando seu corte metodológico que o sercognoscente trava com seu objeto de estudo. Nesse sentido CARVALHO, P., 2008, p. 6.9 Ibid., p. 5.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 20/211
19
Agora, se agregarmos a tal critério expositivo a preocupação com alinguagem jurídica-normativa; se atinarmos para o rendimento quepode ser obtido pela utilização das categorias do projeto semiótico,mais precisamente para as dimensões lógico-semânticas do textoprescritivo; se pensarmos que toda a marcha do raciocínio se reportaa uma visão da norma jurídica, analisada com vigor na sua inteirezaconceptual, como “unidade mínima e irredutível” da mensagemdeôntica portadora de sentido completo; se não perdermos de vista anecessidade premente de o discurso teórico propiciar acompreensão, com boa dose de racionalidade, da concretudeempírica do direito posto; estamos diante daquilo que bem se podechamar de “constructivismo jurídico”, vertido sobre o subsistema deregras tributárias […].
A indicação do método é fundamental (como já mencionado) e surge junto
com a necessidade de indicação do paradigma em que o trabalho está inserido. Os
critérios metodológicos definem como o objeto deve ser pesquisado.
Todos os métodos que trabalham sob a filosofia do “giro lingüístico” têm
em comum a preocupação com a precisão do discurso científico; esta preocupação
existe porque o discurso científico inegavelmente é afetado pelas estruturas
sintáticas, pelo campo semântico e pela argumentação pragmática.
Os métodos precisam ser rigorosos para serem eficazes. No
constructivismo, o rigor apresenta-se na linguagem, pois seu método de investigação
é o analítico, ou seja, o objeto de estudo é decomposto analiticamente em partes,
para só depois ser reconstruído através da contextualização.
Paulo de Barros Carvalho10, enfatizando o rigor com a linguagem que vem
crescendo progressivamente no direito, e principalmente no direito tributário, após o
movimento do “giro-lingüístico”, leciona que:
Foi com esta preocupação em “escrever bem e pensando” que o
constructivismo lógico-semântico tomou força em toda a comunidade
10 CARVALHO, P., 2008, p. 159.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 21/211
20
científica. A busca incessante de se aperfeiçoar a Teoria Geral, como objeto de aprofundar o conhecimento da matéria, tornou-se a basedo movimento que introduziu, no campo do epistemológico do direito,mudanças ideológicas relevantes.
Nessa entoada, vemos que no constructivismo lógico-semântico o sentido
é construído dentro do contexto cultural, que é pressuposto de significação. Primeiro
se faz uma decomposição analítica, para depois construir o sentido dos termos,
sempre considerando o contexto cultural. Mesmo com a decomposição analítica, não
se desprezam os valores, representados pela semântica da linguagem e pelo
aspecto pragmático inserido nesse contexto cultural. Desse modo, após a
decomposição, faz-se a contextualização para se ver o todo.
Visto que o constructivismo segue a tradição interpretativa, porque os
significados não se dão de modo imediato e precisam ser construídos pelo
interprete, ALVES-MAZZOTTI e GEWANDSZNAJDER11 elencam a necessidade de
três elementos: a) visão do conjunto (holística): a compreensão depende da inter-
relação que se tem do contexto; b) abordagem indutiva: parte-se da observação
particulares para fazer generalizações; c) investigação naturalística: que é aquela
em que a investigação do pesquisador no contexto observado é reduzida ao mínimo.
Para os constructivistas, a realidade é construída pela linguagem, assim
pode-se até dizer que há sempre múltiplas realidades sobre uma dada questão
(relativismo). Mas, o relativismo não se torna um problema se a pesquisa se propõe
a compreender o aspecto cultural em que está envolvido o sujeito congnoscente, ou
seja, tenta entender a “cultura” de grupos que têm diferentes visões.
11 ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas ciências naturaise sociais . 2. ed. São Paulo: Pioneira, 1999, p. 131.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 22/211
21
O método do “constructivismo lógico-semântico” no estudo do direito
positivo torna o pensamento coerente, permitindo, além do rigor lingüístico, o
conhecimento do sistema jurídico como um todo. Mas, para isso, necessita do
contexto cultural.
1.3.1 Contexto Cultural no Constructivismo Lógico- semântico
O conceito de cultura torna-se necessário para o método do
constructivismo lógico-semântico, principalmente quando estamos na região ôntica
dos objetos culturais 12 . Isso porque será através do contexto cultural que se
alcançará o sentido dos termos jurídicos.
O culturalismo aborda o homem e a sua realidade circundante; não há
como sustentar um ordenamento jurídico dotado de normas que “devem-ser” sem
considerar a realidade e os valores que envolvem o ser cognoscente.
O conceito de cultura teve como precursor TOBIAS BARRETO DE
MENEZES13, fundador da Escola de Recife, porém seus pensamentos foram se
sedimentando na teoria da linguagem por LOURIVAL VILANOVA, como uma
totalidade de valores, idéias e normas, incorporadas nas condutas humanas e coisas
físicas14.
12 Esta divisão foi retomada e explicitada por Carlos Cossio, que sintetizou a teoria husserliana dosobjetos em: naturais, ideais, metafísicos e culturais. “Já os culturais são reais, têm existência espaço-temporal, suscetíveis, portanto, à experiência, além de serem valiosos, positiva ou negativamente. Oacesso cognoscitivo se dá pela compreensão e o método próprio-dialético, já que o saber, nessecampo, pressupõe incessantemente idas e vindas da base material ao plano dos valores e, desteúltimo, à concreção da entidade física que examinamos”. CARVALHO, P., 2008. p. 14-17.13 Segundo AIRES BARRETO, “o mundo do homem não é produto natural, mas cultural”.(CARVALHO, José Maurício de. Curso de Introdução à filosofia brasileira. Londrina: CEFIL – EDUEL,
2000, p. 122.)14 VILANOVA, Lourival. Teoria Jurídica da Revolução. Escritos Jurídicos e Filosóficos . v. 2. SãoPaulo: Axis Mundi/IBET, 2003, p. 295.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 23/211
22
Foi MIGUEL REALE15 o jurista que mais contribuiu para o estudo do
culturalismo no Brasil. Segundo o autor, culturalismo é “concepção do direito que se
integra no historicismo contemporâneo e aplica, no estudo do Estado e do direito, os
princípios fundamentais da axiologia, ou seja, da teoria dos valores em função dos
graus de evolução social”. Ressalta ainda o jurista 16 que “ninguém pensa in
abstracto , e nenhuma realidade é cognoscível em abstração de suas
circunstâncias.”17
Não há como estudar culturalismo sem fazer referência ao tema dos
valores18; apenas para ilustrar, é salutar a lição de JOHANNES HESSEN19: “cultura
significa precisamente realização de valores, realização de valores objetivos por
meio duma actividade exercida pelo homem”.
Sendo a cultura condição do conhecimento, este (conhecimento) só será
alcançado quando houver uma comunicação entre ambos, pois a cultura e o
conhecimento estarão sempre unidos.
15 REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado . 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 08.16 E de acordo com a teoria tridimensional de MIGUEL REALE, o direito é fato, valor e norma. Mas,apenas para esclarecimentos é importante mencionar que, mesmo adotando a posição deculturalismo do autor, a teoria normativa-positivista não trabalha com a teoria tridimensional “fato,valor e norma”; para a teoria há uma inclusão de classes em que o fato e o valor estão na próprianorma. A teoria tridimensional não resiste ao paradigma adotado.17
REALE, Miguel. Cinco Temas do Culturalismo . São Paulo: Saraiva, 2000, p. 42.18 Sobre os valores, trataremos no capítulo próprio.19 HESSEN, Johannes. Filosofia dos Valores . Coimbra: Almedina, 2001, p.102.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 24/211
23
1.4 Teoria da Linguagem Jurídica
“Os limites da minha linguagem significam os limites do meu mundo”20.
Dentro do paradigma em que se desenvolve o trabalho somente por meio da
linguagem, é possível o conhecimento21; a linguagem constrói a realidade jurídica e
nos permite compreender o sujeito e o objeto. Sem linguagem não há realidade, não
há conhecimento, não há compreensão. Por este motivo, o parágrafo foi iniciado
com a proposição 5.6 de WITTGENSTEIN, pois a teoria do filósofo dava ênfase à
relação linguagem e realidade22.
Segundo VILÉM FLUSSER, 23 a língua é realidade; ela forma, cria e
propaga a realidade.
Necessário se faz delimitar que estamos afirmando que a linguagem é
instrumento de criação do direito, que é um objeto cultural, e é dentro desse sistema
que as premissas aqui adotadas são relevantes.
ALFREDO ALGUSTO BECKER24 sabiamente já dizia:
20 WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus Logico-Philosophicus . São Paulo: Edusp, 2001, proposição5.6, p. 245.
21 Diferentemente, TÁREK MOYSÉS MOUSSALLEM afirma que o direito não é linguagem, pois,através das lições de GREGÓRIO ROBLES, entende que a afirmação de que o direito é só linguagemé redutiva do fenômeno jurídico. (MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Revogação em Matéria Tributária .São Paulo: Editora Noeses, 2005, p. 55.)22 Segundo MENDES: “Os trabalhos de Ludwig Wittgenstein dão ênfase à relação existente entre alinguagem e a realidade, intermediada pelo pensamento. No Tractatus, a relação da linguagem com omundo é representativa, isto é, a linguagem representa o mundo. Em Investigações Filosóficas ,LUDWIG WITTGENSTEIN verifica que não existe uma relação única e imutável entre a linguagem e oque ela representa. A relação somente pode ser descoberta através do uso que se faz da linguagem.(MENDES, Sonia Maria Broglia. Validade Jurídica Pré e Pós-Giro Lingüístico . São Paulo: EditoraNoeses, 2007. p. 71.)23 Segundo o autor: “A língua é o conjunto de todas as palavras percebidas e perceptíveis, quando
ligadas entre si de acordo com regras preestabelecidas”. (FLUSSER, Vilém. Língua e Realidade . 2.ed. São Paulo: Annablume, 2004, p. 41.)24 BECKER, Alfredo Augusto. Carnaval Tributário . 2. ed. São Paulo: Lejus, 1999, p. 51.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 25/211
24
Ele [mundo jurídico] substitui o mundo dos fatos reais por umuniverso de palavras. Onde há floresta amazônica, o legisladordetermina que deva existir uma flor de papel. Tudo se converte empapel em signos gráficos no papel: as palavras. Os próprios juristaspassam a vida a investigar palavras, a escrever palavras a propósitosde palavras”. O direto se manifesta, se propaga e se cria através dalinguagem.
A linguagem prescritiva do direito positivo ordena e tem o condão de estar
perante a sociedade para regulá-la e organizá-la. A linguagem prescritiva cria e não
apenas relata. Por outra feita, a linguagem descritiva da Ciência (Teoria da
Linguagem) apenas diz como é a realidade, o que o cientista entende do mundo queo entorna, sem alterá-lo.
A linguagem das normas jurídicas tributárias, sejam elas abstratas,
advindas do Poder Legislativo, sejam elas concretas, advindas do Poder Judiciário,
por meio de uma decisão será sempre técnica, jamais será científica, pois não
descreve o objeto, mas sim prescreve comportamentos intersubjetivos. Para definir
linguagem técnica , valemo-nos das lições de PAULO DE BARROS CARVALHO25:
Linguagem técnica é toda aquela que se assenta no discurso natural,mas aproveita em quantidade considerável palavras e expressões decunho determinado, pertinentes ao domínio das comunicaçõescientíficas. Não chegando a atingir uma estrutura que se possa dizersistematizada, busca transmitir informações imediatas acerca dafuncionalidade do objeto, utilizando, para tanto, número maior oumenor de termos científicos.
A linguagem formalizada também é importante, pois é através dela que a
ciência atinge maior grau de consensualidade, mas, por ter um conteúdo semântico
mínimo, passa a ser uma objeção à utilização na ciência jurídica, que precisa ser
25 CARVALHO, P., 2008. p. 57.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 26/211
25
significativa e suficientemente clara; v.g., a linguagem matemática que é o grau
máximo da formalização e universalmente válida, mas sem conteúdo semântico.
O cientista, portanto, deve ter preocupação com a linguagem, deve se
expressar em uma linguagem clara e sanar, na medida do possível, os casos de
ambigüidade e vaguidade, para ser universalmente compreendido. A precisão e
clareza é pré-condição da ciência. Por isso, dizemos que a linguagem científica é
artificialmente construída pelo homem.
A análise da decisão judicial em controle de constitucionalidade das
normas tributárias parte da premissa de que direito, antes de qualquer coisa, é
comunicação e, por esse motivo, deve ser analisado pelos instrumentos da Teoria
da Linguagem.
Não se nega, sobretudo, que direito positivo é o conjunto normas válidas
em um determinado espaço e tempo delimitado, cuja linguagem se apresentará na
função prescritiva; e que a Ciência do Direito é conjunto de enunciados que terá
como objeto as normas do direito positivo, que, por sua vez, apresentará a
linguagem em sua função descritiva. Mas, por ser “sistema que comunica aos seus
destinatários/usuários padrões de conduta social” 26 teremos que estudar os
fenômenos jurídicos pelos métodos lingüísticos.
A linguagem prescritiva criará o fato jurídico; antes dela, o fato jurídico
não existe. O direito não possui outra forma se não a linguagem para juridicizar os
fatos sociais. Não é apenas a descrição de um determinado evento que garante a
passagem de evento para fato jurídico, é necessária a linguagem prescritiva do
direito. Antes da prescrição de que, v.g., todos que moram na zona urbana do
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 27/211
26
município devem pagar um tributo chamado Imposto de Propriedade Territorial
Urbana (IPTU), o tributo não existe como fato jurídico relevante para o direito;
apenas o evento físico de morar na zona urbana não é suficiente para o direito, que
necessita da mensagem prescritiva, sem se olvidar que a linguagem, contudo, é
instrumento jurídico que nunca toca a realidade27.
A linguagem pode ser analisada em seu caráter técnico e filosófico
através da semiótica e da hermenêutica, que são, respectivamente, a ciência dos
signos e da compreensão. Linguagem, em sentido amplo, é toda forma de
expressão do pensamento possível de ser lida, interpretada e compreendida, toda
linguagem que apresente estas três formas hermenêuticas – ler, interpretar e
compreender – é linguagem em sentido amplo.
1.4.1 Plano de investigação dos Sistemas Sígnicos
Destaca-se a importância da semiótica como ciência que estuda os signos
e o fenômeno da representação. Signo pode ser entendido
Como unidade de um sistema que permite a comunicação inter-humana, signo é um ente que tem status lógico de relação. Nele, umsuporte físico se associa a um significado e a uma significação, paraaplicarmos a terminologia husserliana. 28 (destaque consta nooriginal).
26 ARAUJO, Clarice Von Oertzen de. Semiótica do Direito. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 17.27
Cf. CARVALHO, P., 2008, p. 162: “porquanto sabemos que a linguagem, ainda que proferida com aautoridade coativa dos órgãos do Poder Público, não chega a tocar materialmente os eventos e ascondutas por ela regulados.”
28 Cf. Ibid., p. 33. Isso porque o autor adota as terminologias de Husserl, de “suporte físico,significação e significado” assim como adotamos neste trabalho. (Idem, p. 34). Mas, tambémpodemos destacar a explicação de signo relatada por CLARICE VON OERTZEN DE ARAÚJO,
2005b, p. 128: “Para a tradição filosófica, um signo pode ser qualquer objeto ou acontecimento usadocomo menção de outro objeto ou acontecimento. Esta seria a definição mais genérica de signo, apartir da qual poderíamos partir para uma investigação que venha lhe sofisticar ou definir com maiorprecisão. Em sentido um pouco mais preciso, um signo seria uma relação, uma associação.”
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 28/211
27
A semiótica tem como objetivo o exame do modo de produção da
significação e do sentido, é método investigativo capaz de compreender a
linguagem.
Segundo CLARICE VON OERTZEN DE ARAUJO,29
A semiótica é a ciência dos signos, a ciência que estuda osfenômenos da representação. Como ciência, estuda não somente asrepresentações verbais, ou seja, as representações vertidas empalavras, mas sistematiza rigorosamente qualquer tipo derepresentação, assim entendida a ação ou modo de comportamentode qualquer tipo de signo.
CHARLES MORRIS, influenciado pela distinção de PIERCE, distingue
três planos na investigação dos sistemas sígnicos30: (i) sintático: relação de signos
entre si, ou signo com signo; (ii) semântico: relação signo com objeto do mundo que
ele representa (dicionário); (iii) pragmático: relação dos signos com o utente
(usuários) da linguagem (emissor e destinatário). Ou seja, o plano sintático seria a
organização dos signos; o plano semântico, a significação dos signos; o plano
pragmático, a possível determinação dos signos construída pelos utentes.
A linguagem será analisada nesses três planos para a interpretação dos
vocábulos, mesmo que um deles tenha mais ênfase em face dos outros, será
necessária a analise dos três planos.
Como a proposta é estudar o fenômeno da decisão judicial em controle de
constitucionalidade pelo ângulo analítico, tem-se que atentar aos planos de
investigação dos sistemas sígnicos, sem, contudo, estudar a semiótica do direito em
29 ARAÚJO, Clarice Von Oertzen de. Fato e Evento Tributário – uma análise semiótica. In: Curso deEspecialização em Direito Tributário . Rio de Janeiro: Forense, 2005a, p. 335.30 CARVALHO, P., 2008. p. 36.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 29/211
28
sua profundidade, assim como fez CLARICE VON OERTZEN DE ARAUJO31 através
da obra de CHARLES SANDERS PEIRCE, mas apenas delimitar as dimensões,
sintática, semântica32
e pragmática da linguagem e dos fenômenos jurídicos
inerentes ao tema.
1.4.2 Mensagem Jurídica: elemento comunicacional
A comunicação jurídica pode ser entendida como sendo: troca entre
sujeitos de direito (emissores e receptores) por meio de uma relação jurídica em que
temos um código comum para que haja o recebimento da mensagem pelos
receptores, através de um canal, tudo isso relacionado a um contexto em que deve
estar inserida a mensagem.
Nas lições de ROMAN JAKOBSON33, temos
O remetente envia uma mensagem ao destinatário. Para ser eficaz, a
mensagem requer um contexto a que se refere (ou “referente”, emoutra nomenclatura algo ambígua), apreensível pelo destinatário, eque seja verbal ou suscetível de verbalização; um código total ouparcialmente comum ao remetente e ao destinatário (ou, em outraspalavras, ao codificador e ao decodificador da mensagem); e,finalmente, um contacto, um canal físico e uma conexão psicológicaentre remetente e o destinatário, que os capacite a ambos aentrarem e permanecerem em comunicação.
31 ARAÚJO, 2005b.32 Apenas para esclarecimento, com lição de um dos mais eminentes lingüistas da atualidade: “Certosteóricos afirmam, é verdade, que a sintaxe se ocupa das relações dos signos entre si e a semânticadas relações entre os signos e as coisas. Limitemo-nos, entretanto, no quadro da Lingüísticasincrônica, a examinar qual a diferença entre sintaxe e semântica. A linguagem implica dois eixos. Asintaxe se ocupa do eixo dos encadeamentos (concatenação), a semântica do eixo das substituições.Suponhamos que eu diga, por exemplo, “o pai tem um filho”: as relações entre “o” , “pai”, “tem”, “um”,e “filho” se situam no campo da cadeia verbal, são sintáticas.Quando comparo os contextos – “o paitem um filho”, “a mãe tem um filho”, “o pai tem uma filha”, “o pai tem dois filhos”, substituo certossignos por outros e as relações semânticas com que nos havemos são relações tanto lingüísticas
quanto sintáticas. A concatenação implica a substituição. (JAKOBSON, Roman. Lingüística eComunicação . Trad. Izidoro Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo: Editora Cultrix, 2007, p. 30.)33 Ibid., p.123.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 30/211
29
Os emissores são responsáveis pela autoprodução do direito. O Supremo
Tribunal Federal encontra-se na posição de emissor e a decisão judicial tributária
seria o canal da mensagem; isso porque a mensagem jurídica abstrata necessita ser
contextualizada e concretizada para que a mensagem atinja os indivíduos, sejam
eles individualmente ou geralmente considerados. É oportuno destacar que a
mensagem estará sempre na função prescritiva, ordenando condutas34.
O direito como comunicação jurídica deve ter uma mensagem; a
mensagem, com vimos linhas acima por ROMAN JAKOBSON, é o conteúdo
normativo veiculado na norma, que necessita de um significado, que pode ser
entendido de acordo com. CLARICE VON OERTZEN DE ARAUJO35:
O significado das normas está, mediata ou imediatamente,relacionado com a ordenação das condutas humanas em sociedade.Ou seja, o seu significado é a informação que elas transmitem. Ora,normas transmitem comandos que poderiam ser classificados em
obrigações, permissões e proibições. No entanto, com referência aoseu conteúdo, as normas podem se referir diretamente à conduta oupodem disciplinar competência ou procedimentos jurídicos.
O processo de incidência (aqui considerado como aplicação do
direito) é necessário para que haja comunicação da mensagem jurídica, atingindo as
condutas interpessoais. A incidência ou aplicação do direito deve ser
necessariamente feita através de um sujeito de direito (homem), isto é, não se dá de
forma automática, solicita sempre um sujeito de direito habilitado pelo sistema. Essa
é a lição de PAULO DE BARROS CARVALHO36:
34 CRISTIANO CARVALHO escreve que “Essa é a característica principal que diferencia o direito dosdemais sistemas comunicacionais: o fato de emitir mensagens sempre na função prescritiva ouordenadora de condutas”. (CARVALHO, Cristiano. Teoria do Sistema Jurídico : direito, economia,
tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 135.)35 ARAÚJO, 2005b, p. 45.36 CARVALHO, P., 2008, p. 169-170.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 31/211
30
Somente sujeito de direito, indicado pela lei, poderá, por intermédioda norma individual e concreta [ou geral e concreta], recolher oselementos verificados no acontecimento efetivo da vida social,proceder à operação lógica de subsunção e expedir a normaindividual e concreta, construindo em linguagem a relação jurídica.Em outras palavras, e transportando essas reflexões ao campo dofato comunicacional, só será emissor da mensagem jurídica aqueleque estiver assim qualificado pelo código comunicacional, ou seja,pelo ordenamento positivo.
Pela teoria de NIKLAS LUHMANN 37 , que não é uma teoria que
adotaremos em sua integridade, mas apenas usaremos nos pontos convergentes
em que for possível colher as mesmas conclusões das premissas adotadas peloautor, a decisão é definida como comunicação jurídica que mantém a autopoiese do
sistema. O sistema autopoiético é aquele que tem como elemento apenas
comunicação; excluem–se os indivíduos. Desse modo, para LUHMANN só há grupo
social com comunicação (linguagem); portanto, é a comunicação que dá surgimento
da sociedade. Os próprios juízes também são comunicações.
Na mesma linha de raciocínio, concorda CRISTIANO CARVALHO38:
Quanto ao sistema jurídico, os órgãos jurídicos são, antes de maisnada, comunicações jurídicas também. Ser juiz não é ser umaentidade biológica, composta de sangue, osso e tecido. É ter umafunção atribuída pelo sistema comunicacional do direito, através deatos comunicativos jurídicos que outorgam competência paraexpedição de outros atos comunicativos jurídicos. Portanto,verificamos que o sistema jurídico é formado por atos comunicativos
e esses próprios atos comunicam também quem os enviou.
As decisões jurídicas em controle de constitucionalidade das normas
tributárias também podem ser vistas como atos de fala, elemento dinâmico do
direito. O direito é elemento aberto cognitivamente (aspecto semântico) e fechado
37 A teoria de Luhamann apareceu em um momento em que o positivismo estava em crise e o
naturalismo havia chegado ao fim, daí a necessidade de se chegar a uma “nova teoria do direito” combases científicas e não mais filosófica que era encontrada na Teoria Kelseniana.38 CARVALHO, C., 2005, p. 141.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 32/211
31
operativamente (aspecto sintático) e opera com progressivas transformações, auto-
reproduzindo-se.
1.4.3 Atos de fala e força ilocucionária das decisões judiciais
É possível, como mencionado, fazer uma leitura da decisão judicial em
controle de constitucionalidade das normas tributárias através dos atos de fala. A
teoria dos atos de fala entende que a ação de falar (falar no sentido amplo) é uma
ação que cria uma nova situação. É a linguagem como ação, atuando sobre o plano
real, não apenas como representação da realidade. Desse modo, ao ser
exteriorizada a ação de enunciação pelo enunciado, cria-se uma nova situação
prescritiva de conduta que se denomina atos de fala .
A teoria dos atos de fala, assim como as demais teorias aqui adotadas,
insere-se na filosofia analítica de tradição britânica, que teve um dos seus
precursores WITTGENSTEIN, mas surge com duas intenções iniciais, sendo a
primeira: analisar frases para delimitar forma lógica e elementos constitutivos, isto é,
uma “teoria filosófica sobre a natureza e estrutura da linguagem, examinado noções
como termos e proposições, sentido e referência, nomes próprios e predicativos,
verdade, etc.” e a “segunda tarefa da filosofia será desenvolvida pela corrente
conhecida por vezes como filosofia da linguagem ordinária, filosofia lingüística ou,
ainda, Escola de Oxford”.39
O primeiro estudioso da teoria dos atos de fala (speech acts) foi JOHN
LANGSHAW AUSTIN 40 . Esse autor contrapõe-se à teoria tradicional de que a
linguagem é essencialmente descritiva. E através da “teoria da linguagem
39 AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer: palavras e ação. Trad. Danilo Marcondes deSouza Filho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990, p. 8.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 33/211
32
performativa” estabeleceu diferenças entre enunciados performativos (que não
constatam fatos ou ações, mas executam uma ação) e enunciados constatativos
(meramente descritivos). Mas, foi a partir da experiência fracassada com a distinção
dos procedimentos constatativos e performativos que AUSTIN fez a primeira
tentativa de articulação sistemática da “teoria dos atos de fala”, no que tange à sua
pluridimensionalidade.
Pela teoria desenvolvida por AUSTIN, todo o problema pode ser
considerado restrito a “semântica” da linguagem, delimitando seu contexto para
saber se determinado termo pode ou não ser usado naquele contexto em que está
inserido.
Daqui, já percebe-se que a linguagem sempre dependerá de um caso
concreto, termos abstratos de linguagem sempre devem ser analisados sob
determinado contexto. Assim, “Não há mais uma separação radical entre
“linguagem” e “mundo”, porque o que consideramos “realidade” é constituído
exatamente pela linguagem que adquirimos e empregamos”41.
Para AUSTIN as palavras ou sentenças lingüísticas não apenas
descrevem uma situação de fato, ou apenas declaram, mas, sim, realizam uma
ação; por este motivo, chama as sentenças de performativas ou proferimento
performativo. Isso porque o proferimento de uma palavra é geralmente42 a realização
de um ato.
40 Ibid., passim. 41 AUSTIN, 1990, p. 10.42 Digo “geralmente” pois um ato pode ter outras ocorrências, como ações físicas ou mentais.Exemplo dado pelo próprio AUSTIN de uma doação que não se realiza caso a pessoa diz: “dou-lheisto”, mas não faz a entrega do objeto. (Ibid., p. 26.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 34/211
33
Para o autor, o ato de fala é pluridimensional, pois é uma realidade
complexa, com muitas dimensões43. A primeira delas seria atos de fala como “ato
locucionário”, em que cada procedimento lingüístico é um tipo de ação humana,
como articular uma palavra ou emitir uma frase ou texto de acordo com a gramática
(significado). É ato locucionário, e.g., a simples frase: “Se auferir renda, deve pagar
Imposto sobre a renda”.
“Ato ilocucionário” seria outra dimensão dos atos de fala, dimensão esta
que surge do “ato locucionário”; isso significa que o “ato ilocucionário” (proposição in
em inglês, ao em português) é o ato de dizer algo, fazendo também algo (força). A
função lingüística da frase nem sempre é explícita, necessitando do contexto para
que possa ser identificada sua real função. É aquele que nos diz se a pessoa disse
algo para emitir um juízo, advertir, prevenir, ordenar, informar etc., e.g., “se auferiu
renda, deve pagar Imposto sobre a Renda” (a autoridade está ordenando o
contribuinte a pagar tributo).
A terceira dimensão dos atos de fala é o “ato perlocucionário” (proposição
by em inglês, por em português), que é aquele que provoca, por meio de expressões
lingüísticas, certos efeitos nos sentimentos, pensamentos e ações de outras pessoas
(efeito). O ato perlocucionário é aquele que exerce influência de forma determinada
sobre outras pessoas, tais como convencer, persuadir, impedir, etc., e.g., “aquele
que auferiu renda pagou o tributo (foi obrigado a pagar o tributo que era devido).
43 OLIVEIRA, Manfredo Araújo. Reviravolta lingüístico-pragmática na filosofia contemporânea . SãoPaulo: Loyola, 2001, p. 157.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 35/211
34
TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR. 44 diz: “podemos dizer que ‘atos
locucionários’ têm significado, ‘atos ilocucionários’ desempenham um papel (o papel
de ameaçar ou descrever uma sanção), ‘atos perlocutivos’ visam a certos efeitos,
não são instrumentos para agir, mas realizam imediatamente uma ação”.
Por isso AUSTIN diz que “Devemos distinguir o ato ilocucionário do ato
perlocucionário. Por exemplo, devemos distinguir entre ‘ao dizer tal coisa eu estava
prevenindo’ e ‘por dizer tal coisa eu o convenci, ou surpreendi, ou fiz parar’”45
AUSTIN46, em sua obra, na tentativa de compreender a força ilocucionária
dos atos de fala, divide a dimensão em cinco classes: (1) veriditivos, (2) exercitivos,
(3) comissivos, (4) comportamentais, (5) expositivos.
A força ilocucionária veriditiva, segundo o Autor, é caracterizada por um
juízo, um veredicto sobre valores ou fatos, assim como sugere o nome. Pode não
ser definitivo, mas constitui uma estimativa, um cálculo, uma apreciação. São atos
judiciais e se distinguem dos legislativos ou executivos que são os exercitivos.
Os atos de fala classificados por ilocucionários exercitivos são aqueles
que consistem em uma tomada de decisão que se dá em nome de determinado
poder, de um direito ou influência, é advogar que determinada coisa deve ser assim
no lugar de determinar que seja; por exemplo: designar, votar, anunciar, advogar,
avisar, tendo como objetivo que os receptores se ajustem ao ato de fala proferido.
44 FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Teoria da Norma Jurídica : ensaio de pragmática da comunicação
normativa. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 70.45 AUSTIN, 1990, p. 96.46 Ibid., p. 123.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 36/211
35
Os comissivos são aqueles que comprometem o locutor a fazer ou
assumir algo, não constituindo apenas as promessas, mas também declarações e
anúncios de intenções ou até mesmo as adesões; são os verbos: pretender, planejo,
defendo, sou a favor de, etc.
Os comportamentais são aqueles que têm relação com o comportamento,
com a reação diante da conduta passada, como felicitar, elogiar, dar os pêsames,
etc. Segundo AUSTIN47, os comportamentais deixam uma oportunidade bastante
grande para a insinceridade.
Por fim, os expositivos são aqueles que esclarecem usos e referências,
isto é, como um ato de fala deve ser considerado; aclara a expressão através das
locuções: exemplifico, cito, repito que, etc.
Resumidamente pode-se dizer, segundo AUSTIN, que48,
verideditivo é um exercício de julgamento, o exercitivo é umaafirmação de influência ou exercício de poder, o comissivo é assumiruma obrigação ou aclarar uma intenção, o comportamental é aadoção de uma atitude e o expositivo é o esclarecimento de razões,argumentos e comunicações.
No estudo do direito, os atos de fala demonstram que uma declaração em
direito jamais será uma declaração de fato, pois constituirá direitos e deveres e
mudará a situação de fato, já que, na linguagem do direito positivo, o procedimento é
normativamente estipulado. Na decisão em controle de constitucionalidade, teremos
o ato de fala com força ilocucionária veriditiva.
47 AUSTIN, 1990, p. 130.48 Ibid., p. 131.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 37/211
36
O direito basicamente é formado por atos de fala, porque os enunciados
prescritivos do direito nada descrevem, nem nada declaram, mas, sim, realizam
ações de ordem ao prescreverem condutas, por isso verificamos que o direito
positivo se constitui por atos de fala: “Dizendo no presente o direito do passado, o
juiz o reorganiza necessariamente”49.
AUSTIN também determinou que os atos de fala não são verdadeiros ou
falsos, como acontece com os atos descritivos, e também não assumem caráter de
valido ou não válido dos prescritivos deônticos. Mas, como servem para realizar
ações, serão felizes ou infelizes, de acordo com seu sucesso ou insucesso de certas
condições estabelecidas ou normativamente estipuladas.
Após AUSTIN, outro autor contribuiu para as pesquisas do ato de fala,
JOHN R. SEARLE, que tentou responder algumas questões não solucionadas por
AUSTIN. Entre elas, que o objeto da filosofia da linguagem é a relação entre palavra
e mundo, e que apenas há fenômeno comunicacional, desde que haja consciência e
intencionalidade. Contudo, adotaremos neste trabalho apenas as bases filosóficas
do pensamento AUSTIN.
Desse modo, para desenvolvimento da pragmática da decisão judicial,
adotaremos a dimensão ilocucionária dos atos de fala, pois, como vimos, é através
da dimensão ilocucionária (propósito pretendido pelo autor) que a prescrição
normativa da decisão atingirá a força perlocucionária (efeitos gerados nos
receptores) dos atos de fala. Isso porque consideramos que a decisão judicial em
controle de constitucionalidade é ato comunicacional, ou seja, atos de fala que
pressupõem um emissor e um destinatário.
49 OST, François. O Tempo do Direito . Trad. Élcio Fernandes. Bauru, SP: Edusc, 2005, p.177.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 38/211
37
Mais uma vez, não significa que estamos negando o caráter da decisão
judicial como norma individual ou geral e concreta, mas olhando o fenômeno da
decisão judicial pelo prisma da Pragmática da Linguagem como ramo da Teria da
Linguagem; podemos sacar pelo ângulo da ação humana que são também atos de
fala ilocucionários.
No direito, verificamos que os atos de fala criam um novo estado para a
coisa. Mesmo os enunciados prescritivos que aparecem na forma declaratória têm a
função de prescrever. Assim, TÁREK MOYSÉS MOUSSALLEM50 leciona que os
atos de fala possuem a máxima de “‘dizer alguma coisa é fazer alguma coisa’, pode-
se inferir que em termos de direito positivo ‘dizer alguma coisa é fazer alguma coisa
juridicamente relevante’.”
MOUSSALLEM 51 entende que o conceito de atos de fala pode ser
entendido em três sentidos: (i) enunciado; (ii) ação de emissão de proferimento; e
(iii) enunciação, enquanto ato produtor de enunciados.
Neste trabalho, conseguimos identificar duas acepções de (iii) enunciação
e de (i) enunciado, porque a enunciação é o ato de criação da decisão judicial, mas,
por se esvair no tempo, apenas o que fica são as marcas da enunciação, que é
chamada de enunciação–enunciada, ou seja, a enunciação no enunciado 52 . O
enunciado seria o produto da enunciação. Assim, enunciação é conduta
caracterizadora de tomadas de decisão, ato que produz o enunciado, isto é, o
processo. O resultado dessa conduta, o produto produzido, seria o enunciado, ou
50 MOUSSALLEM, 2005, p. 67.
51 Ibid., p. 68.52 FIORIN, José Luiz. As Astúcias da Enunciação – As Categorias de Pessoa, Espaço e Tempo. 2.ed. São Paulo: Editora Ática, 2005, p. 32.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 39/211
38
seja, um suporte físico, as marcas de tinta no papel. A enunciação-enunciada seria
as marcas da enunciação com delimitação de espaço, tempo e pessoa competente
para produção do ato, são os fatos enunciativos, isto é, os dêiticos53
.
A decisão judicial através de seu veiculo introdutor (acórdão ou sentença)
é o produto que nos permitirá verificar as marcas da enunciação. Portanto, só após o
ingresso no sistema será possível verificar ou controlar a constitucionalidade das
normas postas pelo legislativo.
O juiz, no seu mister de produzir veículos introdutores (sentenças) através
de normas individuais ou gerais, mas sempre concretas, se encontra na função de
fontes do direito, praticando a enunciação do direito 54 . Nesse sentido, arremata
TÁREK MOYSÉS MOUSSALLEM55:
Frisemos: os juízes (órgão singular ou colegiado), quandoprovocados, exercem uma atividade jurisdicional que denominamosenunciação. Esse procedimento cria um documento normativo(sentença e acórdão, respectivamente). Nesse documento normativo,distinguimos um veículo introdutor, norma individual e concreta, quedenominamos “enunciação-enunciada” (infelizmente denominadapelos teóricos de “sentença” e “acórdão”), no qual consta a incidênciade uma norma de produção jurídica. Por sua vez, o veículo introdutorinsere no sistema do direito positivo enunciado(s)-enunciados(s), queperfarão a norma individual e concreta ou geral e concreta, tambémdespretensiosamente designada sentença ou acórdão, que consistena incidência de uma regra de comportamento ou uma regra de
revisão sistêmica (regra revogatória, sentença procedente em açãorescisória, declaração de inconstitucionalidade pelo SupremoTribunal Federal).
53 Dêiticos são os elementos da linguagem que permitem ao intérprete a reconstrução da enunciação,como a indicação da pessoa que proferiu o ato, o lugar e o tempo (eu (ego); aqui (hic); agora (nunc)),sem os quais a mensagem fica incompreensível.54 “O que cria a sentença e o acórdão (norma jurídica) é o processo judicial impulsionado pelo juiz, ouseja, a fonte produtora da sentença/acórdão é a atividade de enunciação exercida pelo juiz. Esta nos
parece ser a fonte do direito e não a sentença ou o acórdão”. (MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Fontesdo Direito Tributário . Editora Noeses, 2006, p. 150.)55 Ibid., p. 151.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 40/211
39
Em suma, após o movimento do “giro lingüístico” e as investigações de
LUDWIG WITTGENSTEIN, várias teorias se criaram em torno da linguagem como
instrumento de criação da realidade, porque não existe apenas uma única relação
entre linguagem e realidade, mas várias. tais como apontado. Portanto, as teorias
adotadas são compatíveis e aplicáveis ao fenômeno da decisão judicial em controle
de constitucionalidade das normas tributárias. O constructivismo lógico-semântico é
método analítico-hermenêutico que permite a construção da realidade jurídica por
meio da linguagem (entendida como conjunto de signos) que objetiva a comunicação
da mensagem jurídica, que, na visão pragmática, é ato de fala ilocucionário.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 41/211
2 ESTRUTURA NORMATIVA DA E NA DECISÃO JUDICIAL EM CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE
2.1 Introdução
O motivo pelo qual foram eleitas apenas as decisões tributárias em
controle de constitucionalidade ocorreu porque nessas espécies de ação não se
analisam os fatos, mas tão somente o direito e a relação de direito entre contribuinte
e fisco. O objeto do controle de constitucionalidade aqui adotado serão sempre as
normas gerais e abstratas do direito positivo tributário; após o processo de
positivação pelo Supremo Tribunal Federal, verifica-se o surgimento de uma nova
norma, que será individual ou geral, mas sempre concreta, dependendo do caso e
do procedimento, se difuso ou concentrado.
Desta feita, podemos dizer que a norma jurídica como uma classe que
possui atributos peculiares é “gênero” da qual as “espécies” são56: (i) normas gerais
e abstratas (objeto da ação); e (ii) normas gerais ou individuais e concretas
(decisão). Por isso, a norma (objeto) na decisão judicial em controle de
constitucionalidade será abstrata; e a norma da decisão será sempre concreta,
sendo individual e concreta no controle difuso, e geral e concreta no controle
concentrado.
56
PAULO DE BARROS CARVALHO (2008, p. 118) ensina que “os diversos grupos de umaclassificação recebem o nome de espécies e de gênero, sendo que espécies designam os gruposcontidos em um grupo mais extenso, enquanto gênero é o grupo mais extenso que contém asespécies”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 42/211
41
Resumidamente, é o processo de positivação: normas abstratas de um
lado e concretas do outro. Análise normativa vista em duas dimensões.
Apenas as normas introduzidas por lei serão objetos de nosso estudo. As
normas veiculadas por instrumentos introdutores sem força legal, apesar de o
dispositivo legal (art. 102, I, a) mencionar que serão objeto de controle de
constitucionalidade “as lei ou ato normativo”, não farão parte dos nossos estudos. O
STF já se prenunciou sobre a questão, não dando seguimento a pedido de
declaração de inconstitucionalidade 57 de ato normativo “instrução normativa”.
Apenas normas introduzidas por veículos introdutores “leis” que possuam abstração
e generalidade (emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei delegada,
medida provisória (reedição ou conversão em lei quando mantida a mesma redação
não prejudica a ação), decreto legislativo e resoluções, decretos autônomos (que
inova autonomamente a ordem jurídica com força de lei) e tratados internacionais)serão objeto de nossos estudos. Isso porque, como salientou MANOEL
GONÇALVES FERREIRA FILHO58, “O ‘controle’ de constitucionalidade é, destarte,
condição da supremacia da Constituição”.
57 ADI-AgR 365 / DF - DISTRITO FEDERAL, AG. REG. NA AÇÃO DIRETA DEINCONSTITUCIONALIDADE. Rel. Min. CELSO DE MELLO, Julgamento: 07/11/1990, ÓrgãoJulgador: TRIBUNAL PLENO, Publicação DJ 15-03-1991. Ementa ação direta deinconstitucionalidade - agravo regimental - impugnação de instrução normativa do departamento dareceita federal - alegada vulneração de princípios constitucionais tributários - seguimento negado -natureza das instruções normativas - caráter acessório do ato impugnado - juízo prévio de legalidade- matéria estranha ao controle concentrado de constitucionalidade - medida provisória - disciplinaconstitucional das relações jurídicas fundadas em medida provisória não convertida em lei - efeitosradicais da ausência de conversão legislativa - insubsistência dos atos regulamentares fundados emmedida provisória não-convertida - agravo não provido - público, com ela mantinham - ou deveriammanter - estrita relação de dependência normativa e de acessoriedade jurídica, tais como as
instruções normativas.58 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estado de Direito e Constituição . 3. ed. rev. e atual. SãoPaulo: Saraiva, 2004, p. 88.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 43/211
42
2.2 Conceito de Norma Jurídica
Norma jurídica é um conceito essencial para o direito, que, como objeto
cultural, visa organizar os comportamentos dos indivíduos, alterando a realidade
social. Sem a norma jurídica, o direito não alcançaria seu objetivo59. Nessa linha de
raciocínio, para a teoria normativista de KELSEN60, os comportamentos humanos só
são conhecidos mediatamente pelo cientista do direito, enquanto regulados por
normas61.
Observou TÁCIO LACERDA GAMA: falar em norma jurídica é falar em
conceito ambíguo, cujo significado deve ser explicado, para evitar contradições ou
imprecisões no discurso.62
KELSEN inicia sua obra Teoria Geral das Normas , explicando o que é
norma, e diz63:
A palavra “norma” procede do latim: norma, e na língua alemã tomouo caráter de uma palavra de origem estrangeira – se bem que nãoem caráter exclusivo, todavia primacial. Com o termo se designa ummandamento, uma prescrição, uma ordem. Mandamento não é,todavia, a única função de uma norma. Também conferir poderes,permitir, derrogar são funções de normas.
59 TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR. (2006, p. 36): “A literatura sobre a norma é vasta, difícil de serreduzida a uma unidade. Houve já quem, só no âmbito sociológico, contasse 82 definições de norma”.60 Logo a teoria normativista divide a realidade em duas partes: do mundo do ser (sein) e o mundo dodever-ser (sollen), em que o mundo do ser é o mundo real dos fatos e o mundo do dever-ser é omundo do direito e das normas. Esta dualidade de ser e dever-ser foi difundida por KELSEN, mas foiiniciada por KANT e permanece assim pelos seguidores positivismo normativista.61 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. Técnica, decisão, dominação.4. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 98.62 GAMA, Tácio Lacerda. Contribuição de intervenção no Domínio Econômico. São Paulo: Quartier
Latin, 2003, p. 40-41.63 KELSEN, Hans. Teoria Geral das Normas . Trad. José Florentino Duarte. Porto Alegre: SergioAntônio Fabris Editor, 1986, p. 01.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 44/211
43
Em seu turno o Italiano NORBERTO BOBBIO64 esclarece que
o melhor modo para aproximar-se da experiência jurídica eapreender seus traços característicos é considerar o direito como umconjunto de normas, ou regras de conduta. Comecemos então poruma afirmação geral do gênero: a experiência jurídica é umaexperiência normativa.
Para alguns autores, norma é a proposição que extraímos da leitura dos
textos do direito positivo65, ou norma é texto jurídico elaborado66, ou ainda não é
texto, e nem tampouco conjunto deles, mas o sentido da interpretação sistemáticade todo os textos normativos.67
É importante destacar que a norma jurídica pode ser conceituada através
dos três planos de investigação do sistema signo, conforme ensina ROBSON MAIA
LINS68:
Em voga na doutrina, temos definições que ora primam pelo enfoquesemântico (v.g., norma jurídica é o instrumento elaborado peloshomens para lograr aquele fim consistente na produção da condutadesejada); outros vão sobrelevar o nível pragmático (v.g., norma jurídica é um programa de ação em face da crescente estabilização eburocratização dos sistemas sociais); e outros ainda primam peloaspecto sintático (v.g., norma jurídica é um juízo hipotético-condicional, que por meio da imputação deôntica ou causalidade jurídica, liga o antecedente ao conseqüente).
64 BOBBIO, Norberto. Teoria da Norma Jurídica . 3. ed. rev. Trad. Fernando Pavan Baptista e ArianiBueno Sudatti. Barueri, SP: Edipro, 2005, p. 23.65 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário . 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.8.66 ROBLES, Gregório. O Direito como Texto . São Paulo: Manole, 2005, p. 01.67 GUASTINI, Riccardo, Teoria e Dogmática delle Fonti . Millano: Giuffré Editore, 1998, p. 16, eGUASTINI, Riccardo. Dalle Fonti alle Norme . Torino: Giappichelli, 1992, p. 20 et seq. apud ÁVILA,Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 2006, p. 30.68 LINS, Robson Maia. Controle de Constitucionalidade da Norma Tributária : decadência e prescrição.São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 52.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 45/211
44
Assim como procedeu ROBSON MAIA LINS, no presente serão
trabalhados os três enfoques semióticos, ora como norma jurídica como juízo
hipotético –condicional (sintático), ora como prescrição que relaciona o conteúdo
com o fato que implica relações jurídicas (semântico), ato de fala ilocucionário
(pragmático)69.
Norma não se confunde com lei, ou texto de lei. Lei e texto de lei é
suporte físico, veículo introdutor de norma, mas, neste trabalho, os termos lei e
norma serão usados como sinônimos, visto que é assim que usualmente são
empregados na doutrina jurídica, mas a distinção é importante. Quanto a intenção
for o uso da palavra lei como suporte físico ou veículo introdutor, usar-se-ão as
expressões em sua literalidade, suporte físico ou veiculo introdutor .
Seguindo essa linha de raciocínio, podemos dizer que norma pode ser
conceituada em dois sentidos: amplo e ou estrito.
2.2.1 Norma em Sentido Amplo e Norma em Sentido Estrito
Para conceituar norma jurídica, é necessário delimitar a norma em sentido
amplo: é toda e qualquer proposição construída pelo intérprete a partir do texto do
direito positivo. É produto do intelecto70, que não se apresenta em estrutura lógica
hipotético-condicional e sentido deôntico completo.
Nas palavras de PAULO DE BARROS CARVALHO71:
69 No mesmo sentido, ocorrerá com a expressão decisão judicial que ora será apresentada comonorma individual e concreta (sintático) ou como ato de fala ilocucionário (pragmática).70 Sobre o intelecto é oportuno o ensinamento de VILÉM FLUSSER (2004, p. 47), que diz que o
intelecto “consiste de palavras, e as transporta ao espírito, o qual, possivelmente, as ultrapassa. Ointelecto é, portanto, produto e produtor da língua, “pensa”.71 CARVALHO, P., 2008. p. 128.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 46/211
45
conteúdos significativos das frases do direito posto, vale dizer, aosenunciados prescritivos, não enquanto manifestações empíricas doordenamento, mas como significações que seriam construídas pelointérprete.
Por sua vez, a norma jurídica em sentido estrito é “a significação que
obtemos a partir da leitura dos textos do direito positivo” 72, com estrutura lógica
hipotético-condicional e “sentido deôntico-jurídico73”. Isso significa que, ocorrendo o
fato descrito no antecedente, deve-ser a conseqüência que constituirá a relação
jurídica modalizada entre dois sujeitos de direito. É prescrição deôntica, dotada de
significação completa e estrutura sintática hipotética-condicional, formada por
enunciados prescritivos que são frases bem construídas dentro da regra do idioma,
dotadas de sentido74.
Pode-se dizer que norma é a significação 75 que captamos quando
entramos em contato com os suportes físicos do direito positivo, organizada em uma
estrutura lógica hipotético-condicional; que possui valores lógicos de válido ou não-
válido e modalizadores deônticos de condutas: permitido (P) obrigatório (O) e
proibido (V)76.
72 CARVALHO, P., 2007. p. 8.73 Id., 2008. p. 128.74 A representação da estrutura lógica da norma jurídica completa é: D [(p → q) v (–q→s)], ou ainda: D{ (p→ q) v [ (p . –q) → s] }.75 Sobre significação é relevante a lição de Roman Jakobson (2007, p. 33): “A lógica simbólica nãotem deixado de lembrar-nos que as significações lingüísticas pelo sistema das relações analíticas deuma expressão com outras expressões, não pressupõem a presença das coisas. Os lingüistas, aocontrário, fizeram o impossível para excluir a significação, e todo o recurso à significação, daLingüística. Dessarte, o campo da significação permanece uma terra de ninguém.”76 “Sob o ponto de vista sintático e semântico do sistema de proposições normativos do Direito, a
conduta que não estiver proibida, ou não for obrigatória, é permitida. Quarta possibilidade não se dá.Sintaticamente, os modais deônticos são irredutíveis , mas interdefiníveis , modalizando-se o operadorde negação”. (VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o Sistema do Direito Positivo. São Paulo:Ed. Revista dos Tribunais; EDUC, 1977, p. 153.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 47/211
46
2.2.2 Regra-Matriz de Incidência Tributária
A regra-matriz de incidência tributária é o esquema lógico formal que
permite a verificação da constitucionalidade da lei instituidora da relação tributária
havida entre Fisco e contribuinte, desde que sua análise seja realizada entre regra-
matriz e Constituição Federal. Isso porque, se a lei instituidora do tributo não guardar
inteira consonância com Constituição Federal e esquema lógico, o tributo instituído
será passível de reconhecimento de inconstitucionalidade.
Com a construção da regra-matriz de incidência tributária, o texto do
direito positivo será organizado de modo a permitir a identificação dos critérios
mínimos de manifestação do deôntico, sem os quais uma norma seria
inconstitucional.
Esses critérios são verificáveis através do antecedente e conseqüente da
regra-matriz de incidência tributária: Antecedente: critério material, representado por
verbo e seu complemento; critério espacial, reporta-se ao local do fato descrito no
antecedente; critério temporal, refere-se ao marco de tempo em que se reputa
ocorrido o fato descrito no antecedente. Em seu turno no conseqüente da regra-
matriz de incidência tributária, encontram-se os seguintes critérios: critério
quantitativo, consistente no aspecto pecuniário da obrigação tributária, representado
pelo binômio base de cálculo e alíquota. A base de cálculo consiste na quantificação
do valor pecuniário devido a título de tributo. A alíquota é “indicador da proporção a
ser tomada da base de cálculo”, em geral é a percentagem aplicável sobre a base de
cálculo77 ; critério pessoal, representa o critério subjetivo da obrigação tributária,
77 BARRETO, Aires F. Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais . 2. ed. São Paulo: MaxLimonad, 1988, p. 134.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 48/211
47
sendo composto pelo sujeitos: ativo e passivo. O primeiro é aquele que tem o direito
subjetivo do crédito, e o segundo é aquele de que tem o dever jurídico do débito.
A regra-matriz é método de investigação formal que necessita de
preenchimento com os aspectos semânticos e pragmáticos da linguagem, fazendo,
assim, a tão famosa ligação entre a teoria e a prática.
Nas palavras do ilustre Paulo de Barros Carvalho78, temos:
Na regra-matriz de incidência tributária, vale dizer, aquelaresponsável pelo impacto da exação, quando reduzida à suaestrutura formal, no mínimo irredutível que é o ponto de confluênciadas indagações lógicas, vamos encontrar o pressuposto ouantecedente representado simbolicamente da maneirasupramencionada [ Ht ≡ Cm (v.c) . Ce. Ct ]. Sabemos, contudo, que ainterpretação não se esgota no plano formal, havendo necessidadede investigarmos os conteúdos de significação que a linguagem dodireito positivo carrega e, ainda, os modos como os utentes dessalinguagem empregam seus signos. O passo subseqüente, então,será preencher as variáveis daquela fórmula lógica com as
constantes do direito posto.
Assim, a regra-matriz é norma jurídica tributária capaz de prever uma
descrição hipotética de cunho tributário, ou seja, a relação jurídica legalmente79
estabelecida entre fisco e contribuinte, cada qual com seu respectivo direito subjetivo
e dever jurídico, que terá como núcleo um valor que corresponda a uma prestação
pecuniária compulsória que não constitua sanção de ato ilícito nos termos do art. 3º
do Código Tributário Nacional.
78 CARVALHO, P., 2008, p. 149.79 O princípio da legalidade dispensa comentários, para ratificar sua importância além da legalidadegeral consagrada na Constituição Federal, art. 5º, II, temos também o princípio da estrita legalidadeque consagrado no art. 150, I, do mesmo diploma.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 49/211
48
2.2.3 Objeto e Procedimento: Norma Primária e Secundária
A norma primaria é a norma que institui as relações entre os sujeitos de
direito e prevê os fatos juridicamente qualificados, portanto possui natureza material.
É a norma obrigacional que traz a instituição dos direitos e deveres correlatos, com
natureza material de direito substantivo. Para EURICO MARCO DINIZ DE SANTI,
pode ser subdividida em primária dispositiva e sancionatória80.
A norma secundária, de natureza processual, preceitua as conseqüências
sancionatórias advindas do descumprimento da previsão hipotética que se encontra
no conseqüente da norma primária. É a sanção que garante a juridicidade da norma.
A norma secundária na teoria Kelseniana, ou norma processual, prevê
uma atuação do Estado-Juiz. É norma garantidora da manutenção e harmonia do
sistema do direito, o qual, por meio do exercício de sua função judiciária, garantirá
pelo uso da força (se necessária) a restauração da ordem jurídica violada e a
posterior penalização do agente violador através do exercício do direito de ação.
A estrutura da norma (primária ou secundária) no seu aspecto sintático
será sempre homogênea e no seu aspecto semântico sempre heterogênea; o
primeiro porque terá estrutura sempre idêntica para qualquer tipo de norma,(hipotético-condicional) e o segundo porque terá sempre um fato da vida para
regular, que nunca será o mesmo, assim receberá variados significados.
80 EURICO MARCO DINIZ DE SANTI bem assevera sobre o tema: Importante identificar nessainvestigação uma categoria elipsada naquele corte abstrato: a norma primária sancionadora. A normaprimária sancionadora, como a norma secundária, tem por pressuposto o não-cumprimento dedeveres e obrigações; carece, entretanto, da eficácia coercitiva daquela. E continua: Têm-se,portanto, norma primária estabelecedora de relações jurídicas de direito material decorrentes de (i)
ato ou fato lícito, e (ii) de ato ou fato ilícito. A que tem pressuposto antijurídico denominado normaprimária sancionadora, pois veicula sanção – no sentido de obrigação advinda do não-cumprimentode um dever jurídico – enquanto que outra, por não apresentar aspecto sancionatório,
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 50/211
49
2.2.4 O que são as “espécies”: normas gerais e abstratas e normas gerais ou
individuais e concretas.
Na introdução do capítulo, foi dito que norma jurídica é “gênero” da qual
as “espécies” são: (i) normas gerais e abstratas (objeto da ação); e (ii) normas gerais
ou individuais e concretas (decisão). Oportuno agora fazer a distinção entre norma
geral e abstrata, individual e concreta, geral e concreta e ainda individual e abstrata.
Analisando o antecedente das normas, pode-se dizer que as normas
abstratas terão em seu antecedente apenas conotação de fatos e que as normas
concretas conterão um enunciado denotativo sacado dos enunciados conotativos
existentes na norma geral e abstrata.
A combinação dos enunciados conotativos do antecedente e conseqüente
da norma geral e abstrata, e dos enunciados denotativos do antecedente e
conseqüente da norma individual e concreta possibilitará a existência das normas
abstrata e geral, abstrata e individual, concreta e geral, concreta e individual, como
leciona PAULO DE BARROS CARVALHO81.
O universo dos discursos geral e abstrato será conotativo, como uma
porta aberta que enuncia os critérios de pertinencialidade (critérios que pertencem à
classe). Desse modo, os fatos previstos do antecedente serão de possível
ocorrência (futuro) que vinculará uma relação também de possível ocorrência, com
sujeitos ainda indeterminados.
convencionamos chamar norma primária dispositiva. (Lançamento Tributário . 2. ed. São Paulo: Max
Limonad, 2001, p. 43-44.)81 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário : Fundamentos Jurídicos da Incidência. São Paulo:Saraiva, 2006, p. 35.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 51/211
50
Em seu turno, no discurso individual e concreto, os enunciados que
compõem a norma estarão denotativamente determinados. No antecedente,
encontraremos um fato jurídico concreto, identificado no tempo e no espaço e, no
conseqüente, uma relação com sujeitos e quantum também definidos (verbo no
passado), assim ensina PAULO DE BARROS CARVALHO82.
Somente a norma concreta traz a mensagem do direito positivo; assim, “a
norma geral e abstrata, para alcançar o inteiro teor de sua juridicidade, reivindica,
incisivamente, a edição de norma individual e concreta”83 emitida em linguagem
prescritiva de condutas; atingirá seus objetivos, que são os comportamentos
interpessoais, o que chamamos de “processo de positivação”84.
Urge consignar que em controle de constitucionalidade a norma abstrata
objeto de controle (difuso ou concentrado) “aponta para uma ação cuja realização
não esgota a sua força normativa, a norma está apta a incidir todas as vezes em que
a conduta ocorrer” e a norma proferida pela decisão, ou seja, norma concreta,
descreve “uma ação que, realizada, esgota o comando normativo 85 ”, pois, no
82 CARVALHO, P., 2006, passim.83 Id., 2008, p. 141.84 Diz PAULO DE BARROS CARVALHO (2006, p. 226): "Esse caminho, em que o direito parte deconcepções abrangentes, mas distantes, para chegar às proximidades da região material dascondutas intersubjetivas, ou, em terminologia própria, iniciando-se por normas jurídicas gerais eabstratas, para chegar a normas individuais e concretas, e que é conhecido por “processo depositivação”, deve ser necessariamente percorrido, para que o sistema alimente suas expectativas deregulação efetiva dos comportamentos sociais”. No mesmo sentido CARVALHO, P. (2008, p. 168.),“Em suma, as normas gerais e abstratas não ferem diretamente as condutas intersubjetivas para
regulá-las. Exigem o processo de positivação […]”.85 LINS, 2005. p. 71, O autor baseia-se na definição de MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso deDireito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 22º edição, 2007, p. 405
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 52/211
51
antecedente desta última, encontraremos um fato jurídico concreto, conforme
consignou ROBSON MAIA LINS.86
Por isso, a proposta é estudar as decisões do Supremo Tribunal Federal
na sua função de emissor de norma geral e concreta (decisões em controle
concentrado de constitucionalidade) ou norma individual e concreta (decisão em
controle difuso de constitucionalidade); sem adentrar em considerações que
excedam os limites do tema, o tópico serve apenas como base para reflexões do
trabalho.
2.2.5 Normas de Estrutura e de Comportamento
Segundo NORBERTO BOBBIO, as normas podem ser classificadas em
normas de comportamento e normas de estrutura. Sendo de comportamento
aquelas que se dirigem às condutas dos destinatários da comunicação normativa e
de estrutura as que regulam o “modo de regular um comportamento ou, mais
exatamente, o comportamento que elas regulam é de produzir regras”.87
Contudo, a classificação realizada por NORBERTO BOBBIO deve ser
realizada com ressalva de que todas as normas, mesmo as de estrutura, se dirigem
a um comportamento. Isso significa que as normas de estrutura, além de estarem
voltadas às condutas, estabelecem a forma de elaboração de outras normas, ou
seja, são normas de produção normativa que se direcionam às pessoas eleitas pelo
sistema para fazer normas; assim são as chamadas normas de estrutura que
determinam o órgão e o expediente pelo qual as normas serão criadas, alteradas ou
86 LINS, Robson Maia. Controle de Constitucionalidade da Norma Tributária: decadência e prescrição.
São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 71, O autor baseia-se na definição de MELLO, Celso AntônioBandeira de. Curso de Direito Administrativo . 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 405.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 53/211
52
desconstituídas, ou seja, subdividem-se em (i) norma de produção normativa: de
competência, que indica “quem” pode criar norma e, de procedimento, que indica
“como” deverá ser a norma criada; e, ainda, (ii) norma de revisão sistêmica, que é
aquela que visa à revisão das normas existentes no sistema. Assim, as normas de
estrutura são normas de comportamento, pois dirigem de forma imediata ao
comportamento do legislador.
Dentro da divisão formulada, podemos destacar os princípios como sendo
uma norma em sentido amplo de produção normativa direcionada ao julgador que
indica “como” a norma concreta criada por ele deve ser, ou seja, dentro dos limites
da legalidade, da anterioridade, da capacidade contributiva, da segurança jurídica,
etc. Ou ainda, no caso do controle de constitucionalidade, se a norma (objeto da
ação) foi criada respeitando princípios que são procedimentos de criação das
normas.
Em sede de controle de constitucionalidade, faz-se oportuno, ainda,
esclarecer que a decisão proferida em sede de controle concentrado tanto pode ser
de revisão sistêmica ou de produção normativa, a depender do caso, ou seja, a
decisão proferida em controle concentrado que reconhece a inconstitucionalidade ou
não de uma norma suspende a vigência e eficácia da norma abstrata objeto da ação,
e na hipótese de inconstitucionalidade da norma tributária com força vinculante para
os demais órgãos do Poder Judiciário, representando verdadeira norma de estrutura
de produção normativa88.
87 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico . Trad. Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos.5. ed. Brasília: UNB, 1995, p. 45.88 LINS, 2005, p. 58-61.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 54/211
53
2.2.5.1 Princípios como norma de Estrutura
Os princípios são fundamentais na ordem jurídica, vez que assumem
posição de vetor axiológico do aplicador do direito (juiz) no momento da composição
da decisão.
Além de ser denominado por grande parte da doutrina de forma abstrata
como “pilares” e “vigas mestras”, os princípios, em termos mais concretos, são
normas de estrutura (competência 89 e procedimento) que possuem conteúdo
valorativo eleito de forma objetiva pelo sistema, que obriga o criador da norma de
comportamento (legislador e juiz) à sua observância.
Nesse sentido, os princípios são normas de estrutura que se dirigem
imediatamente ao legislador em sentido amplo90 e mediatamente aos destinatários
da norma.
Interessante destacar o pensamento de CRISTIANO CARVALHO, que
concorda com a posição que adotamos neste trabalho sobre os destinatários dos
princípios91.
89 Como norma de competência, temos a posição adotada por TÁCIO LACERDA GAMA (2003, p.
144), que diz: “Princípios tributários são enunciados prescritivos que compõem a norma decompetência, ampliando ou restringindo as possibilidades de criar normas jurídico-tributárias –relacionadas, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação ou fiscalização de tributos”. E adiantecompleta que “Princípios é enunciado que compõe a norma de competência em sentido estrito. Todae qualquer prescrição veiculada por um princípio servirá para delimitar um ou mais dos critérios danorma de competência”.
90 Os princípios como norma de estrutura, na posição que adotamos, se dirigem ao aplicador.Diferentemente do voto do ministro Sydney Sanches, na ADI 939, “Insta destacar que essesprincípios constitucionais de tributação caracterizam-se como normas programáticas vinculante parao legislador, e não, para o magistrado. Ao julgar, cabe interpretar a norma infraconstitucional comprudência”.91 CARVALHO, Cristiano. Ficções jurídicas no direito tributário . São Paulo: Editora Editora Noeses,
2008, p. 163-164. O autor não concorda que os princípios são normas de estrutura, diz: “Os princípiossão normas. Todavia, são normas, por assim dizer, de uma categoria especial [meta-regras]. Sãotraduções axiológicas, digitalizações lingüísticas de valores sociais, internalizados no sistema pelolegislador constituinte”. Desse modo, entende que são “componentes formadores das normas de
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 55/211
54
Os destinatários imediatos dos princípios, e esse é um pontofundamental, não são os cidadãos comuns, mas aqueles investidosde competência jurídica, em outras palavras, os órgãos emissores deregras. Em suma, os princípios são normas endógenas, que servemà função de controle da autogeração do sistema jurídico; os órgãosprodutores de regras devem ater-se aos valores enunciados pelosprincípios, sob pena de terem seus atos normativos invalidados.
Contudo, pela definição acima, que muito interessa para as premissas
adotadas neste trabalho, vê-se que os princípios vinculam o legislador e o aplicador.
Isso porque o sistema jurídico é um complexo que liga de forma bem estruturada
todas as disposições legais e garantem a condição de obrigatoriedade de decidir,non liquet .
Os princípios jurídicos são infinitos. Acreditamos que nenhum cientista
tenha tido a ousadia de catalogá-los; isto se deve, justamente, pela premissa que
adotamos que o sistema do direito é uno e indivisível e é apenas cindido para fins
didáticos; então, desse modo, temos: princípios constitucionais gerais, princípios
constitucionais específicos, princípios legais gerais, princípios legais específicos e
princípios infralegais gerais e específicos, além, é claro daqueles, criados todos os
dias pelos cientistas do direito para fundamentar um direito individual. Por este
motivo, SAMPAIO DORIA92 diz que, “genericamente, princípios se entendem por
normas gerais e fundamentais que inferem leis”.
A doutrina de PAULO DE BARROS CARVALHO93 faz distinção entre os
princípios em decorrência do maior ou menor grau de conteúdo axiológico. Classifica
os princípios em “valores” e em princípios que apontam para fixar “limites objetivos”,
estrutura” (p. 168), por ser a norma de estrutura mais complexa. Discordamos do autor, pois peladivisão normativas que adotamos neste trabalho não cabe aos princípios outra categoria que não sejaa norma de estrutura, pois, se assim não fosse, teríamos que entender que os princípios não sãonormas, o que seria um contra-senso.92 DORIA, A. de Sampaio. Princípios Constitucionaes . São Paulo: Editora Ltda, 1926, p. 17.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 56/211
55
que, por sua vez, também apontam para “valores”. Os princípios “limites objetivos”
se direcionam ao julgador, como o princípio da legalidade e do devido processo
legal; os princípios “valores” seriam o princípio da justiça, da igualdade, da
segurança jurídica, da racionalidade, da certeza jurídica, etc.
A distinção é importante e ajuda a compreensão dos princípios, pois,
como bem salienta o Jurista, esses limites objetivos “voltam à realização dos valores
de forma indireta, mediata”94. Mas, trabalharemos com o critério geral de princípios
como normas (em sentido amplo) de estrutura de conteúdo valorativo. Todo princípio
está necessariamente impregnado de valores, o valor é o próprio conteúdo do
princípio.
Os princípios são necessários para a decisão judicial, pois o “juiz cria de
forma condicionada” o direito, e sua criação encontra essa limitação também nos
princípios. Conforme REGIS FERNANDES DE OLIVEIRA95, princípios são “normas
que orientam a elaboração de outras de primeiro grau, extraídas, por dedução, do
sistema normativo, operando limitação das próprias normas e auto-integração do
sistema”. Os princípios (norma de estrutura) funcionam como uma “moldura” que
não pode ser ignorada, sob pena de inconstitucionalidade da norma.
Os princípios constitucionais, sem sombra de dúvida, são os mais
importantes e requerem observância obrigatória; nesse sentido, bem salientou
FABIANA DEL PADRE TOMÉ96:
93 CARVALHO, P., 2007, p. 150.94 CARVALHO, P., 2007. p. 155.95 OLIVEIRA, Regis Fernandes de; HORVATH, Estevão. Manual de Direito Financeiro . 6. ed. rev. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 32.96 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Contribuição pra a Seguridade Social : A Luz da Constituição Federal. 1.ed., 3. tir. Curitiba: Juruá, 2004, p. 127.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 57/211
56
Os mais importantes, porém, são os constitucionais, posto quehierarquicamente superiores aos demais, dirigindo a aplicação detodas as normas jurídicas, interferindo, inclusive, no exercício dascompetências constitucionalmente previstas.
Merecem destaque as lições de ROQUE CARRAZZA 97 , que também
enaltece a importância dos princípios:
Muito bem, em razão de seu caráter normativo, os princípiosconstitucionais demandam estrita observância, até porque, tendoamplitude maior, sua desobediência acarreta conseqüências muitomais danosas ao sistema jurídico que o descumprimento de umasimples regra , ainda que constitucional. São eles que estabelecemaquilo que chamamos de pontos de apoio normativos para a boaaplicação do Direito. (grifos do autor)
Além das funções de compor em termos semânticos a “textura aberta” do
direito, os princípios constitucionais orientam a interpretação de todo o sistema; isso
se dá porque toda e qualquer interpretação deve partir do texto constitucional e dele
sacar suas premissas cognoscitivas. Isto nos leva a crer que o princípio tem dupla
função: norma de estrutura de observância obrigatória de conteúdo valorativo e
instrumento axiológico de interpretação.
Os princípios constitucionais tributários trazem em sua estrutura lógico-
semântica valores fundamentais que são aqueles fundantes do sistema jurídico. Vale
dizer, “onde houver direito, haverá, certamente, o elemento axiológico”.98
O tema “princípios” sempre chamou a atenção dos cientistas dos direito,
mas atualmente vê-se com uma maior freqüência seu uso pelos Tribunais, mais
precisamente pelo Supremo Tribunal Federal em decorrência do que dispõe o art.
97 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucionais Tributário . 22. ed. São Paulo:Malheiros, 2006, p. 41.98 CARVALHO, P., 2008. p. 174
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 58/211
57
27, da lei 9.882, de 3 de dezembro de 1999, que assim está redigido: “Ao declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo e, tendo em vista razões de segurança
jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por
maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou
decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro
momento que venha a ser fixado”. “Razões de segurança jurídica” ou “interesse
social”, eis aí o princípio da segurança jurídica e o princípio do interesse social para
justificar a prática de efeitos prospectivos da decisão. Essa norma, na verdade,
hierarquiza os dois valores declinados, dando a eles superioridade em relação aos
demais.
DWORKIN 99 , que não segue as bases filosóficas adotadas por este
trabalho 100 , mas converge nesse ponto, entende que os princípios diferem da
regras 101 porque têm uma dimensão de peso; por isso, em um conflito entre
princípios, deve-se ponderar o de maior peso, sem que isso implique sua
inaplicabilidade a outros casos. Os princípios implícitos que encontramos no texto
constitucional são os chamados sobreprincípios, que extraem seu sentido de outros
princípios e normas expressas na Constituição.
Assim, recentes decisões do Supremo Tribunal Federal estão apoiadas
em princípios, tais como: legalidade, razoabilidade, publicidade, anterioridade. Desse
modo, qualquer teoria que pretende ser científica deve agasalhar o tema dos
99 DWORKIN, Ronald M. Taking Rights Seriously . 16. ed. Cambridge: Harvard University Press, 1997,p. 26 apud HART, Herbert L. A. O Conceito de Direito . 3. ed. Trad. A. Ribeiro Mendes. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 323.100 DWORKIN diferencia as regras (rules) dos princípios e entende que o sistema jurídico não contémapenas regras (positivismo) mas também princípios, isto porque os juízes diante de hard cases
(casos de difícil decisão) decidem com base nos princípios ou em standards (padrões). DWORKINtrabalha com um sistema avaliativo e de justificação encontrado na jurisprudência. (Ibid., passim.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 59/211
58
princípios. Sobre os valores que são conteúdos dos princípios, maior esclarecimento
será elaborado no capítulo 3, item 3.4.2.
Os princípios implícitos que encontramos no texto constitucional são os
chamados sobreprincípios, que extraem seu sentido de outros princípios e normas
expressas na Constituição. Sobre os valores que são conteúdos dos princípios,
maior esclarecimento será elaborado no capítulo 4 item 4.4.2.
2.3 Norma Tributária Válida e sua Importância nas Decisões em Controle de
Constitucionalidade
A declaração de inconstitucionalidade tem relação direta com a validade
da norma, pois somente normas válidas podem participar do sistema, e o controle de
constitucionalidade foi a maneira que o sistema encontrou de verificar a
compatibilidade da norma com a Constituição. Desse modo, “o jurídico da norma é
dado pela sua validade”102; não existe norma jurídica inválida, norma inválida não é
norma jurídica.
Analisando o direito em seu aspecto dinâmico, poderíamos dizer que o
tema validade é complexo. Mas, não mais ou menos complexo se comparado aos
demais temas jurídicos. Assim não é um risco dizer que a complexidade é inerente
ao mundo do direito.
101 Sobre a distinção entre princípios e regras, interessante estudo foi elaborado por HUMBERTOÁVILA (2006), que não será aprofundada em nosso trabalho para não fugir do fim proposto.102 LINS, 2005, p. 74.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 60/211
59
Para iniciar o capítulo, necessário se faz delimitar que a validade aqui
colocada da norma jurídica é sempre em relação a alguma coisa, ou seja: (i)
sintática: norma com relação à norma em seu aspecto formal (signo-signo); (ii)
semântica: norma e objeto que ele representa, que pode ser entendido como os
comportamentos intersubjetivos que ela regula (signo – objeto) e, por fim, (iii)
pragmática: norma – usuários ou aplicador da norma, relação entre normas e seus
usuários (signo-utentes).
A validade de uma norma inicia-se com a publicação da norma jurídica
tributária, no “canal” eleito pelo sistema em seu processo comunicacional jurídico,
Diário Oficial (jornais oficiais da União, Estados e Municípios e Distrito Federal).
O tema validade será abordado através de duas teorias: HANS KELSEN e
HERBERT L. A. HART, pois ambos desenvolvem de forma fascinante a questão da
validade, gerando uma legião de seguidores quando o assunto é esse. Dentro das
similitudes e diferenças encontradas em cada teoria, pretende-se compatibilizar e
harmonizar ambas, para atender a proposta de trabalho, que é analisar o tema sob
o enfoque da Teoria da Linguagem (que nos remete às categorias da sintaxe, da
semântica e da pragmática).
KELSEN desenvolve sua teoria através de uma relação sintática103, formal
de validade, diferentemente de HART, que desenvolve, além da relação sintática,
uma relação semântica e pragmática104 de validade.
103 Encontraremos autores que defende a validade para KELSEN não era apenas sintática, que avalidade sintática da norma seria apenas quando se está tratando das normas derivadas, masquando se refere à “norma fundamental” acaba sendo uma validade semântica. O que discordamos.
Nesse sentido, é importante trazer a colocação à opinião do respeitável professor TÉRCIO SAMPAIOFERRAZ JR.: “Na verdade, Kelsen parece insistir, sem o perceber claramente, que a validade paraele é uma qualidade puramente sintática quando trata de normas derivadas, mas uma qualidadesemântica, quando fala da norma fundamental, dizendo, por exemplo, que uma norma só é valida no
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 61/211
60
Nesse aspecto interessante, disse MENDES105:
O normativismo jurídico é a concepção mais difundida e maisdesenvolvida do ponto de vista teórico, no século XX e, comoesclarece Manuel Atienza, embora existam vários tipos denormativismo, ele propõe a redução de todos estes a dois modelosbásicos: i) o normativismo formalista de Hans Kelsen e ii) onormativismo analítico ou positivismo analítico representado deforma paradigmática pela obra de Hart. […] diferem em aspectossecundários, mas coincidem em pontos essenciais que os separamtanto dos jusnaturalistas quanto dos realistas.
Todas as normas nascem com a presunção de validade, e o sistema
jurídico trabalha com esta realidade de presunção de validade, até que outra norma
do sistema venha retirar a validade da norma, através da revogação. Por isso que,
na dúvida, deve-se decidir pela constitucionalidade da lei. Conforme defendeu
BITTENCOURT106, desde os idos de 1949: “É claro que na dúvida, decidir-se-á pela
constitucionalidade”. E continua:
Esta é um corolário da regra anterior. Uma vez que ainconstitucionalidade não se presume, é indispensável que suademonstração seja feita de modo tal que a incompossibilidade entrea lei e o Estatuto Político fique acima de toda dúvida razoável –beyond all reasonable doubt .
O controle de constitucionalidade das normas é instrumento que verifica a
validade ou não das normas, ou seja, é o meio processual que o sistema encontrou
sistema, mas que o sistema, como um todo (referência à unidade proporcionada pela normafundamental), só é válida se eficaz”. (grifos do autor). (FERRAZ JR., 2006. p. 98.)104 Outro autor que também entende que a validade é pragmática é FERRAZ JR. “A validade ourelação de imunização de uma norma por outra norma não é, porém, como em Kelsen, uma relaçãoformal ou sistêmica, mas uma relação pragmática. Envolve os usuários, suas possíveis reações econtra-reações”. (FERRAZ JR., 2003. p. 256). Também TÁREK MOYSÉS MOUSSALLEM: “Aaceitação da norma jurídica pela comunidade confere-lhe validade ao passo que sua desconfirmação,aceita pelas autoridades, gera sua invalidade. Daí falar-se em validade por consentimento ou validadepragmática. (MOUSSALLEM, 2006, p. 175.)105 MENDES, S., 2007, p. 111.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 62/211
61
de verificar se o Poder Legislativo, órgão político que detém a função pública de
colocar normas no sistema jurídico, as colocou de acordo com as regras
determinadas pela Constituição.
Ao Supremo Tribunal Federal foi outorgada a competência Constitucional
de controlar a constitucionalidade dos veículos normativos e das normas tributárias
quando o controle for concentrado. Quando o controle for difuso, o Supremo Tribunal
Federal também analisará a constitucionalidade ou não da norma tributária via
recursal, Recurso Extraordinário.
Levantadas as premissas relevantes para justificar o subitem da validade
no tema proposto, passemos à analise da Teoria de KELSEN e HART.
2.3.1 Validade Como Relação de Pertinencialidade
O pensamento Kelseniano procurou conferir à Ciência do Direito
autonomia científica, método e objeto próprio. KELSEN procurou distanciar a sua
teoria dos aspectos axiológicos e sociais, e procurou concentrar suas atenções
apenas na norma jurídica. Com essa atitude metodológica, preservou a autonomia, a
neutralidade e a objetividade da Ciência do Direito. Daí a renúncia à avaliação do
justo e do injusto, visto que seria impossível superar a cientificidade e a
multiplicidade do sistema moral.107
Mesmo que as normas derivadas da “norma fundamental” fossem
injustas, o direito que delas decorre seriam válidos e legítimos, pois ser justa ou
106 BITTENCOUT, C. A. Lúcio. O contrôle Jurisdicional da Constitucionalidade das Leis. Rio de janeiro: Revista Forense, 1949, p. 115.107 A teoria Kelseniana que reduz o objeto jurídico à norma, esquecendo das dimensões sociais evalorativas, causou e causa muitas polêmicas; nesse contexto, é oportuna à citação do grande juristaMIGUEL REALE, que entendia que o jurista ante o sistema de normas, deve sentir que há nele algosubentendido como os fatos e valores, não poderia abstrair tais fatos e valores presentes. Mas,
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 63/211
62
injusta é considerar a norma sobre outro ponto de vista, sobre o ponto de vista do
sistema social e não do sistema do direito, que, portanto, não lhe altera a
validade108
.
KELSEN trabalha com o dualismo neokantiano do “ser” e “dever ser”.
Entende que a lei da natureza é governada pela probabilidade e não pela
causalidade. Para ele, no campo do direito, o princípio metodológico prevalecente é
o da imputação, uma vez que se estabelece uma conexão entre o lícito e a
conseqüência do ilícito, ou seja, uma ligação deôntica entre descrição de uma
conduta e a sanção estatuída. O jurista, segundo a concepção kelseniana, deve
aplicar este método.
Observou que as normas devem ser consideradas, válidas ou inválidas, e
que esta validade é decorrente de uma escala de normas (validade relacional de
norma para norma), sendo que todas as normas teriam como pressuposto de
validade a chamada “norma fundamental”, norma esta considerada uma ficção109, ao
contrário das demais normas que são postas por uma decisão. Por isso, afirma que
a validade de uma norma é o mesmo que sua existência.
Desse modo, para o mestre de Viena, o direito positivo é direito posto e
modificado por uma decisão; é conjunto dinâmico de normas que se entrelaçam e
reconheceu que KELSEN determinou “melhor a natureza lógica da norma jurídica”. (REALE, Miguel.Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 457.)108 O positivismo-normativista nos termos que KELSEN propôs tinha como estudo o direito demaneira pura, sem interferências de outros sistemas que pudesse interferir no direito. A teoriakelseniana é uma conseqüência da 1ª Guerra Mundial e da decadência do mundo capitalista-liberal.Kelsen chegou até mesmo a ser injustamente acusado de ter servido, ainda que indiretamente, aoregime nazista. Kelsen era judeu, jamais foi nazista, fugiu da Alemanha, e teve que reconhecer
quando chegou ao exílio nos EUA que o direito nazista era válido e legítimo, “embora criticável doângulo de boas intenções moralizantes, ainda assim era direito” (FERRAZ JR., 2006, p. 164.)109 KELSEN, 1986, p. 328.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 64/211
63
controlam sua própria produção. KELSEN ainda diz que o direito é um sistema que
auto-regula sua produção.
Validade, então, é “o nome da relação que entre as normas do sistema é
estabelecida”110. A norma válida deve ter seu fundamento de validade em outra
norma hierarquicamente superior, ou de escalão superior, por isso se diz que é uma
validade formal. A “norma fundamental” seria o fundamento para todo o
ordenamento jurídico. Assim, KELSEN vê o sistema totalmente fechado, pela “norma
fundamental”111.
Para KELSEN a norma jurídica é vaga e ambígua e, em razão dessa
indeterminação, ela deve ser “metaforicamente” comparada a uma “moldura”, dentro
da qual se amoldam muitos significados. Por isso KELSEN admite a existência de
várias interpretações e entende que cabe ao Juiz interpretar as normas para aplicá-
las ao caso concreto112. Assim como também cabe ao Direito quando descreve o
direito interpretar suas normas113.
Partindo da premissa que uma norma é valida quando pertence ao um
sistema do direito, esta relação de pertinencialidade deve estar de acordo com uma
condição de validade, qual seja: procedimento estabelecido pelo sistema e
autoridade competente.
110 FERRAZ JR., 2006, p. 97.111 A questão da norma fundamental é criticada por muitos autores, pois a grande maioria entendeque é uma deformidade em sua teoria.112 Neste caso, KELSEN diz que a interpretação é autêntica pois “A interpretação feita pelo órgãoaplicador do Direito é sempre autêntica. Ela cria Direito […] cria Direito não apenas para o casoconcreto mas para todos os casos iguais, ou seja, quando o ato designado como interpretaçãoautêntica representa a produção de uma norma geral.” E continua “Da interpretação através de umórgão aplicador do Direito distingue-se toda e qualquer outra interpretação pelo fato de não ser
autêntica, isto é, pelo fato de não criar Direito. (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito . Trad. JoãoBaptista Machado. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 394, 395.)113 Ibid., p. 388.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 65/211
64
É importante destacar que, analisando a obra no idioma de KELSEN,
verifica-se que a palavra utilizada por ele tanto pode significar validade quanto
vigência, como se fossem a mesma coisa. Isso acontece porque a palavra utilizada
por KELSEN, em alemão, Geltung , significa tanto validade como vigência , e, com a
tradução de sua obra para outros idiomas, essa dualidade de significados se
perdeu114. Nesse sentido, explica MENDES115:
Kelsen utiliza o termo “Geltung ” para designar validade. Na verdade,
esse termo, em alemão, designa tanto validade como vigência.Ocorre, contudo, que na língua portuguesa existem duas palavrasdistintas. No sentido de existência e obrigatoriedade, “Geltung ” émelhor traduzido como validade. Quando Kelsen faz referência aoaspecto temporal, a melhor tradução para “Geltung ” é vigência.(grifos do autor)
Assim, KELSEN116 coloca que, em se tratando de validade no aspecto
temporal, ela pode ser limitada por uma norma mais elevada ou que regule sua
produção, vejamos: “Como a outro propósito já foi referido, o domínio de validade
pode ser limitado, quer dizer: o começo e o fim da sua validade podem ser
determinados, por ela própria ou por uma norma mais elevada que regula a sua
produção”. KELSEN117 se refere ao principio da legitimação:
114 Por este motivo concordarmos com VILÉM FLUSSER (2004, p. 61) de que a tradução em rigor éimpossível: “a possibilidade de tradução é uma das poucas possibilidades, talvez a única praticável,de o intelecto superar os horizontes da língua. Durante esse processo, ele se aniquilaprovisoriamente. Evapora-se ao deixar o território da língua original, para condensar-se de novo aoalcançar a língua da tradução. Cada língua tem uma personalidade própria, proporcionando aointelecto um clima específico de realidade. A tradução é, portanto, a rigor, impossível. Ela é possívelaproximadamente, graças às semelhanças existentes entre as línguas, semelhanças ontológicas. Apossibilidade da tradução diminui com a diminuição das semelhanças. Todo esse complexo revela,com força redobrada, o que ficou assentado no parágrafo anterior: a relatividade ontológica de cadalíngua”.115
MENDES, S., 2007. p. 116.116 KELSEN, 2006, p. 232.117 Ibid., p. 233.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 66/211
65
O princípio de que uma norma de uma ordem jurídica é válida atésua validade terminar por um modo determinado através destamesma ordem jurídica, ou até ser substituída pela validade de outranorma desta ordem jurídica é o princípio da legitimação.
A validade sintática pressupõe que, além de buscar seu fundamento de
validade na “norma fundamental”, também deve observar como a norma deve ser
produzida, qual o procedimento e qual a autoridade prevista, norma de competência
e norma de procedimento, respectivamente.
O principio da legitimação encontra-se limitado por outro principio que é o
da efetividade, que significa dizer que a norma tem que ter o mínimo de eficácia
como condição de validade118. A eficácia aqui referida é a eficácia sociológica,
eficácia em sentido empírico, conforme explica MARCELO NEVES 119 : “à
conformidade das condutas à norma”, ou seja, “se a norma foi realmente
“observada”120, “aplicada”121, “executada122” (imposta) ou “usada”123.
118 Importante trazer à baila a distinção de MARCELO NEVES: “Da eficácia, compreendida comomera conformidade dos comportamentos ao conteúdo (alternativo) da norma, tem-se procuradodistinguir a efetividade, surgindo-se uma referência aos fins do legislador ou da lei. Formulando comoutras palavras, pode-se afirmar que a eficácia diz respeito à realização do “programa condicional”,ou seja, à concreção do vínculo “se-então” abstrata e hipoteticamente previsto na norma legal,enquanto a efetividade se refere à implementação do “programa finalístico” que orientou a atividadelegislativa, isto é, à concretização do vínculo “meio-fim” que decorre abstratamente do texto legal”.(NEVES, Marcelo. A Constitucionalização Simbólica . São Paulo: Editora Acadêmica, 1994, p. 46.)119 NEVES, 1994. p. 42. Interessante anotar a explicação que faz o ilustre professor da PUC/SP daeficácia técnico-jurídico que “refere-se à possibilidade jurídica de aplicação da norma, ou melhor, àsua aplicabilidade, exigibilidade ou executoriedade. A pergunta que se põe é, nesse caso, se a normapreencheu as condições intra-sistêmicas para produzir os seus efeitos jurídicos específicos”.120 “a observância significa que se agiu conforme a norma legal, sem que essa conduta estejavinculada a uma atitude sancionatória impositiva”, “diz respeito à norma primária”. (Ibid., p. 42.)121 “...a aplicação normativa pode ser conceituada como a criação de uma norma concreta a partir dafixação do significado de um texto normativo abstrato em relação a um caso determinado...” (Ibid., p.43.)122 “surge exatamente como reação concreta a comportamentos que contrariam os preceitos legais,destinando-se à manutenção do direito ou ao restabelecimento da ordem violada”. “refere-se à normasecundária”. (Ibid., p. 42.)123
“Não estando presentes as condições (“infra-estrutura”) para o uso das ofertas de regulamentaçãolegalmente postas, pode-se falar, então, de ineficácia normativa. Porém, nesse caso, não se trata derespeito, violação ou burla de preceito legal, mas sim de uso, desuso ou abuso de textos legais quecontém oferta de auto-regulamentação de relações intersubjetivas”. (Ibid., p. 45.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 67/211
66
Vemos que a validade formal pode ser aplicada pelos tribunais, conforme
na ADI 652 QO/MA, voto de Celso de Mello. Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Acórdão de 2 abr.1992. Diário da Justiça, Brasília 2 abr. 1993124
:
Ação Direta de Inconstitucionalidade – controle normativo abstrato –Natureza do ato inconstitucional – Declaração deinconstitucionalidade – Eficácia retroativa – O Supremo TribunalFederal como “legislador negativo” – Revogação superveniente doato normativo impugnado – Prerrogativas institucionais do poderpúblico – Ausência de efeitos residuais concretos – Prejudicidade –O repúdio ao ato inconstitucional decorre, em essência, do princípioque, fundado na necessidade de preservar a unidade de ordem
jurídica nacional, consagra a supremacia da Constituição. Essepostulado fundamental de nosso ordenamento normativo impõe quepreceitos revestidos de “menor” grau de positividade jurídicaguardam “necessariamente”, relação de conformidade vertical comas regras inscritas na carta política, sob pena de ineficácia e deconseqüente inaplicabilidade.
2.3.2 Validade do Controle de Constitucionalidade na Teoria de HERBERT L. A.
HART
Com relação à divisão lógica das normas em primárias e secundárias é
oportuno trazer as lições de HERBERT L. A. HART, que, através de sua proposta de
uma Teoria Geral para o ordenamento jurídico, sem querer explicar um ordenamento
jurídico específico ligado a uma cultura concreta, veio mudar de certa forma o
paradigma hermenêutico utilizado até então com bases na teoria Kelseniana. Sua
teoria é de caráter descritivo, importando a análise da estrutura do direito e do seu
funcionamento sem o uso da justificação moral.
A teoria de HERBERT L. A. HART desenvolve-se com bases na teoria
analítica, influenciada pela corrente filosófica da linguagem. Apesar de ser
positivista-normativisma, assim como KELSEN, sua corrente não se preocupa
somente com o aspecto formal de estrutura normativa.
124 MENDES, S., 2007. p. 176.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 68/211
67
Para o Autor, as normas ou regras jurídicas são necessariamente
indeterminadas, porque sabe-se pouco sobre o fatos concretos e, ao estabelecer as
regras, não se pode prever todos os casos possíveis de aplicação, antecipando
experiências futuras que ao longo do tempo podem mudar.
HART entende que existem dois tipos de regras125 no sistema: as regras
primárias e as regras secundárias. As regras primárias seriam aquelas dirigidas ou
não à realização de determinada conduta, as regras secundárias seriam aquelas que
se dirigem às regras primárias, subdividindo-se em: reconhecimento (rules of
recognition), alteração (rules of change) e julgamento (rules of adjudication). As
regras secundárias são aquelas que definem quais regras são válidas, quais regras
alteram ou não o sistema e quem são as pessoas competentes para emitir regras
primárias. Por este motivo, as regras primárias precisam das regras secundárias, e a
união de ambas as regras formariam o sistema completo para o autor ou, melhor
dizendo, o coração de um sistema jurídico.
A regra de reconhecimento soluciona a questão da validade de modo
empiricamente comprovado, através da “aplicação e efetividade de suas normas
numa determinada ordem social”126, diferentemente de KELSEN, que soluciona a
questão da validade com a criação “norma fundamental”, que é apenas mentalmente
verificada. A necessidade da criação da norma pressuposta kelseniana e da norma
de reconhecimento de HART existe para que o sistema seja fechado, caso contrário
haveria uma situação infinita de norma que procura seu fundamento de validade em
outra norma; assim, ad eternum.
125 Para este trabalho regras e normas são palavras sinônimas.126 CARVALHO, C., 2005. p. 161.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 69/211
68
HART, desse modo, trabalha com um sistema circular, em que o sistema
cria suas próprias normas válidas, buscando, assim, suas validades dentro do
próprio sistema, sem a necessidade de buscar seu fundamento de validade em uma
“norma fundamental” que está fora do sistema. A validade aqui é dada pela própria
norma do sistema que determina a aplicação e a efetividade das normas, chamada
de norma de reconhecimento.
A norma de reconhecimento seria aquela que reconhece a prescrição
jurídica dotada de autoridade como modo de adequação e eliminação e dúvidas
acerca da validade (existência) da regra, ou seja, o reconhecimento da norma é a
eliminação de dúvidas sobre a validade da norma, isto é, o reconhecimento é o
fundamento de validade da norma (assim como a “norma fundamental” de Kelsen).
É aquela baseada em uma forma comum de consenso judicial. Por esse
motivo, a regra de reconhecimento é o próprio conceito de validade para HART. No
controle de constitucionalidade, vemos que a regra de reconhecimento de Hart é
aquela que permite que o sistema controle a compatibilidade da norma posta com a
Constituição.
As regras de alteração são aquelas que conferem a determinados sujeitos
autoridade para introduzir novas regras primárias ou ainda para eliminar as antigas
regras primárias para a conduta da vida do grupo ou de certa classe dentro dele e
para eliminar as antigas 127.
E, ainda, as regras julgamento consistem em atribuir poderes aos
indivíduos que julgam, além de definir também o processo que deve ser seguido.
Essas regras não impõem deveres e sim atribuem poderes. Será dentro da regra de
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 70/211
69
julgamento que encontraremos os conceitos de sentença , juiz , jurisdição e tribunal .
MOUSSALLEM128 entende que a norma secundária para HART seria a norma de
atuação judicial, pois, “além de identificarem os indivíduos que devem julgar, tais
regras definirão também processo a seguir”.
A questão da validade para HART está justamente na regra secundária de
reconhecimento. O aspecto interno e externo da regra de reconhecimento é de suma
importância dentro de sua teoria, pois a verificação da validade de uma norma pode
ser vista sob o ponto de vista interno e externo. O ponto de vista interno se dá em
relação ao sistema (semântico) e o ponto de vista externo se dá em relação ao
sujeito, que tem que reconhecer a regra como válida, submetendo-se ou não a ela
(pragmático).
Também com base na visão normativa interna e externa, pode se dizer
que a regra de reconhecimento existe como fato ou direito, pois, vista em seu
interior, é direito, já que a regra fornece critérios para a identificação de outras
regras; e, vista em seu aspecto externo, é fato, no sentido de que sua existência
corresponde a uma comprovação fática129.
Por fim, percebe-se que uma norma só será valida se a regra de
reconhecimento existir em sua completude, não só no aspecto interno como direito,
mas principalmente no aspecto externo, que diz respeito ao uso feito pelos Tribunais
dos elementos fornecidos pela regras de reconhecimento: reconhecer pelo Tribunais
127
HART, 2001, p. 105.128 MOUSSALLEM, 2005, p. 106.129 Ness sentido, concorda MENDES, S., 2007, p. 135.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 71/211
70
sua existência130. Se isso não existir, não haverá regra válida e sim uma “patologia
do sistema”, nas palavras de HART.
A obrigatoriedade de decidir é da própria essência do direito131. A regra
jurídica limita a liberdade de escolha, pois tem como um de seus modais o
obrigatório132, e a aplicação através do tribunal por meio de uma decisão é o que dá
reconhecimento a uma regra jurídica.
O papel dos tribunais é muito importante neste aspecto, como dizia
HART133:
a história do direito, todavia, sugere insistentemente que a falta deinstâncias oficiais para determinar com autoridade o facto da violaçãodas regras constitui um defeito muito grave; porque muitassociedades remediaram este defeito muito antes do outro.
Principalmente quando estamos tratando de inconstitucionalidade econstitucionalidade das normas, verifica-se que o aspecto circular de validade
realmente ocorre, pois será o órgão competente Supremo Tribunal Federal que
poderá “declará-la” (de modo prescritivo) a inconstitucionalidade ou
constitucionalidade da norma; esse sentido ficou bem claro por CRISTIANO
CARVALHO:
130 Diz HART (2001, p. 113) que, “na maior parte dos casos a regra de reconhecimento não éanunciada, mas sua existência manifesta-se no modo como as regras são identificadas, tanto pelostribunais ou outros funcionários, como pelos particulares ou seus consultores”.131 O tema da obrigatoriedade de decidir non liquet será tratado no capítulo sobre lacunas do direito.132 Sobre a obrigatoriedade, HART (2001, p. 143) faz uma interessante distinção “A afirmação de quealguém tem ou está sujeito a uma obrigação traz a verdade implícita a existência de uma regra;todavia, nem sempre se verifica o caso de, quando existem regras, o padrão de comportamentoexigido por elas ser concebido em termos de obrigação. “Ele tinha o dever de ter” e “ele tinha aobrigação de” nem sempre são expressões mutáveis entre si, mesmo se são semelhantes por
conterem uma referência implícita aos padrões de conduta existentes ou são usadas para extrairconclusões, em casos particulares, de uma regra geral.133 HART, 2001, p. 103.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 72/211
71
Muitas vezes, por mais óbvio que a inconstitucionalidade desta leipossa ser aos olhos dos juristas, somente o Supremo tem o condãode declará-la constitucional. O fundamento de validade desta lei nãosó será declarado pelo Órgão, mas também constituído e confirmadopor ele, numa dinâmica sistêmica verdadeiramente circular. Note-seque numa análise anterior à declaração do referido Tribunal, o juristaconcluiria que tal diploma legal não atende aos requisitos de validadedo sistema e por isso deve ser expurgado dele. Após a declaração,todavia, não tem como considerar mais isto, buscando inclusive essavalidação na própria norma expedida pelo Supremo Tribunal, quetem a função de modificar incessantemente o sentido da ConstituiçãoFederal e, conseqüentemente, de todo o sistema jurídico.
Para HART uma regra valida é aquela que passou por todos os critérios
da regra de reconhecimento. “Dizer que uma regra é válida é reconhecê-la como
tendo passado todos os testes facultados pela regra de reconhecimento e, portanto,
como uma regra do sistema” 134 . Ainda assim, a norma secundária garante a
continuidade e permanência no tempo e no espaço de acordo com a evolução dos
tempos, do direito, pois através delas o direito pode ser criado, modificado e extinto.
2.3.3 Validade Adotada para Desenvolvimento do Tema
Como o conceito de validade define o conceito de direito adotado, vimos
que sem o conceito de validade não podemos seguir adiante, pois sem ele o direito
não existe, logo o trabalho se tornaria deficiente. Sem mencionar que o controle de
constitucionalidade trabalha justamente com este cotejo: a norma posta no sistema
pela autoridade competente seguindo o procedimento eleito.
Dessa forma, o trabalho analisou o fenômeno da validade com bases
analíticas, considerando duas teorias, adotando, portanto, um modelo aglutinador,
em que duas teorias se comunicam de maneira dialógica. Isso se dá porque a
validade para Kelsen pode ser analisada junto com a validade de HART.
134 HART, 2001, p. 114.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 73/211
72
É importante colocar que a escolha de uma não implica necessariamente
a renúncia da outra, pois ambas trabalham com convergências e divergências, fato
comum quando se trata de assuntos do mundo social que nunca serão totalmente
esgotados, visto que o conhecimento está sempre em contínuo aprimoramento.
Adotaremos a validade em todo o trabalho como relação de
pertinencialidade, porque, com estes requisitos formais, já é possível que a norma,
que diretamente seja incompatível com a Constituição, seja objeto de controle de
constitucionalidade. Contudo, a teoria de HART demonstra-se importante para o
desenvolvimento do trabalho, pois o Autor defende, através de sua norma de
“reconhecimento”, que há necessidade de o Tribunal reconhecer a validade da
norma e que só poderá assim fazer através do controle de constitucionalidade.
Desse modo, o que o controle de constitucionalidade brasileiro faz nada mais é que
aplicar a validade pragmática inspirada na “norma de reconhecimento” de HART.
Inclusive, depois do advento da Ação Declaratória de Constitucionalidade, a
aplicação da teoria ficou muito mais explícita, vez que, em caso de dúvida da
validade da norma tributária, a mesma necessita da norma de “reconhecimento” para
sanar a dúvida com relação a sua válida.
Desta feita, mesmo que no decorrer do trabalho não se faça menção a
todo tempo da norma de reconhecimento de HART, entendemos que a decisão em
controle de constitucionalidade é a própria aplicação da validade de HART.
2.4 Que é Inconstitucionalidade?
Inconstitucionalidade é um fenômeno que ocorre toda vez que uma norma
geral, válida, é analisada pelo instrumento processual de controle de
constitucionalidade e por esse processo verifica-se a sua incompatibilidade com
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 74/211
73
norma de hierarquia superior, qual seja a Constituição Federal. Isso significa que
houve ofensa direta135 da norma abstrata com relação à Constituição. Desse modo,
a inconstitucionalidade sempre tem que ser analisada com relação à Constituição e
à regra-matriz de incidência tributária.
É importante frisar que inconstitucionalidade não se confunde com
“invalidade”, mesmo porque, após o reconhecimento da inconstitucionalidade, a
norma continua válida à espera de um veiculo normativo da mesma natureza
(abstrata) para retirá-la do sistema. A validade é inerente ao processo de produção
da norma, a inconstitucionalidade é instrumento de controle do processo de
produção. Dizer que uma norma é invalida é impróprio, pois a validade formal é da
natureza da norma, sinônimo de existência.
Adotamos a divisão doutrinária de inconstitucionalidade formal como
inobservância do procedimento previsto constitucionalmente, bem como ao órgão
competente, e inconstitucionalidade material como sendo aquela que se refere ao
conteúdo da norma introduzida (enunciado-enunciado), levando-se em conta o
aspecto semântico. Adotamos, apenas para fins didáticos, sem que isso implique
equiparação de inconstitucionalidade formal e material à invalidade, posição esta
que rechaçamos.
ROBSON MAIA LINS136 resume a inconstitucionalidade formal e material
da seguinte forma:
A inconstitucionalidade formal pode ser detectada com o exame doantecedente da norma introdutora, que aponta o órgão, o
135 A norma deve derivar diretamente da Constituição, não pode ser uma derivação indireta que seriahipótese de ilegalidade e não inconstitucionalidade.136 LINS, 2005, p. 258.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 75/211
74
procedimento, data e lugar da constituição da RMIT. Já ainconstitucionalidade material é averiguada no exame da normaintroduzida que, no caso, resta incompatível com alguma norma ouprincípio constitucionais.
Assim, a inconstitucionalidade sempre analisará a validada da norma
abstrata, norma esta que se presume válida formalmente, pois o controle de
constitucionalidade não retira validade, apenas retira a vigência da norma no caso
de controle concentrado e a eficácia no caso de controle difuso.
2.5 O que é vigência?
A validade não deve ser confundida com a vigência da lei. A vigência tem
status de relação é condição necessária para que o ocorra à força da norma. “A
vigência é propriedade das regras jurídicas que estão prontas para propagar efeitos,
tão logo aconteçam, no mundo fáctico, os eventos que elas descrevem”137.
A vigência também pode ser analisada no tempo, porque, quando uma
norma fica condicionada ao prazo da vacatio legis , prescrito no art. 1º da Lei de
Introdução ao Código Civil, que assim dispõe: “Salvo disposição contrária, a lei
começa a vigorar em todo o País 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente
publicada”, não tem vigência para disciplinar os fatos, assim como ocorre no direito
tributário: antes do término do prazo da anterioridade a norma não é vigente. Oprincípio da anterioridade, no caso de instituição ou majoração de tributo, conforme
art. 150, III, “b” e “c”, sendo um conhecido como anterioridade geral (alínea “b”),
proibição de cobrar tributo no mesmo exercício financeiro, em que haja sido
publicada a lei que os instituiu ou aumentou; e a anterioridade nonagesimal (alínea
“c”), que prescreve que não se pode cobrar antes de ocorridos os noventa dias da
137 CARVALHO, P., 2007, p. 84.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 76/211
75
data que tenha sido publicada a lei, não adquire vigência. Ambos preceitos juntos
possibilitam a harmonia do sistema e alcançam o tão almejado tratamento
isonômico, além de garantir também a previsibilidade (Segurança Jurídica).
A vigência tem relação temporal com o conseqüente do veículo introdutor,
ou seja, determina o prazo em que a norma terá força para regulamentar conduta.
Nesse caso, o Supremo Tribunal Federal pode estabelecer prazo de vigência da
norma.
Desse modo, toda vez que uma norma for declarada inconstitucional pelo
controle concentrado, o que ocorrerá será a retirada da sua vigência, ou seja, a
norma não tem mais força para regular as condutas prescritas em seu conteúdo
semântico; por sua vez, sem vigência, não há que se falar em eficácia, que também
acaba sendo retirada junto com a vigência. E em controle difuso retira-se apenas a
eficácia.
2.6 O que é Eficácia?
A eficácia é um fenômeno que garante os efeitos desejados ou
conseqüências almejadas. A norma é eficaz quando produz os efeitos típicos. A
inconstitucionalidade em controle difuso trabalha justamente nesse plano, no plano
da eficácia técnica sintática. Em controle concentrado, além da perda da eficácia, a
concomitante perda da vigência. A eficácia pode ser dividida em: técnica (sintática
ou semântica), jurídica ou social.
Podemos dizer que a eficácia jurídica ocorrerá toda vez que os fatos
previstos no antecedente da norma desencadearem os efeitos previstos no
conseqüente, como uma operação lógica de incidência, também chamada de
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 77/211
76
causalidade jurídica, que nas lições de PAULO DE BARROS CARVALHO 138 é:
“vínculo de implicação mediante o qual, ocorrendo o fato jurídico (relatado do evento
no antecedente da norma), instala-se a relação jurídica”.
A eficácia técnica é aquela em que os efeitos ficam condicionados à
remoção de obstáculos de ordem sintática ou semântica, para produção de efeitos.
Podemos exemplificar uma ineficácia técnica sintática com resolução do Senado
Federal, que suspende a eficácia da norma devido a declaração de
inconstitucionalidade da lei, nos termos do art. 52, X da CF, ou ainda, falta de lei
complementar para disciplinar a cobrança do Imposto Sobre Grandes Fortunas, nos
termos do art. 153, VII da Constituição; por sua vez, ineficácia técnica semântica
seria a norma que encontra dificuldades de ordem material, para produzir efeitos, ou
seja, na hipótese de falta de bafômetros para cumprir a Lei 11.705/2008 (Lei Seca),
quando a mesma foi instituída. Isso, de fato, não ocorreu, mas, se ocorresse, seria
um exemplo de ineficácia técnica semântica.
Quando o Senado edita resolução, suspende a eficácia técnica da regra,
que, mesmo vigente, não pode atuar, continuando também válida até que o órgão
que a promulgou venha a expulsá-la do sistema, conforme explicação de PAULO DE
BARROS CARVALHO139.
Por fim, a eficácia social seria aquela norma que atende as expectativas
do órgão produtor, ou seja, os comandos emanados da norma são acatados por
seus destinatários, assunto que é extra-jurídico, pois a efetividade da norma não
interessa ao direito positivo.
138 CARVALHO, P., 2008, p. 413.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 78/211
77
É importante destacar que inconstitucionalidade não se confunde com
invalidade; toda declaração de inconstitucionalidade reconhece a validade ou não de
uma norma, mas não a retira do sistema. Os efeitos ocorrerão no plano da eficácia
da norma jurídica tributária, quando o controle for difuso, ou seja, reconhece-se a
invalidade da norma, mas não se a retira do sistema, pois a norma continua
existindo para os casos passados e continua surtindo efeitos. Da mesma forma,
constitucionalidade e validade são coisas distintas: a Constitucionalidade reconhece
a invalidade, mas não é instrumento competente para tirar a norma do sistema, pois
apenas suspende sua eficácia (difuso) ou a vigência (concentrado).
Desse modo, eficácia é a condição que a norma tem para descrever
acontecimento, que, uma vez ocorrido, irradia efeitos jurídicos, já que não há
obstáculos para impedir sua propagação.
2.7 Retirada de Norma Inconstitucional do Sistema
Como vimos, a decisão de declaração de inconstitucionalidade não retira
a norma, mas tão somente retira a eficácia ou a vigência de acordo com o tipo de
controle da norma. Assim, mesmo com a declaração de inconstitucionalidade, a
norma continua válida no sistema para casos pretéritos140. A única forma por que o
sistema permite a retirada da norma declarada inconstitucional é através de outra
norma que veio apenas para este fim ou de maneira indireta assim o faça.
139 CARVALHO, Paulo de Barros. Crédito Prêmio de IPI : estudo e pareceres III. Barueri, SP: MinhaEditora, 2005, p. 26.140 ROBSON MAIA LINS (2005, p. 83) adota posição diferente entendendo que em duas hipótesespoderá haver retirada da validade, quais sejam: quando a norma objeto de controle deconstitucionalidade ainda não adquiriu vigência (por que respeita o princípio da anterioridade ou
porque ainda encontra-se na vacatio legis). Ou seja, a norma é valida mais ainda não é vigente, nãoproduziu efeitos; ou, ainda, quando a declaração de inconstitucionalidade reconhece ainconstitucionalidade da norma geral, revogando as normas individuais criadas sob fundamento de
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 79/211
78
Estamos tratando da revogação, que pode ser expressa ou tácita. A
revogação expressa é aquela que traz em seu suporte físico “texto de lei” a
expressão o dispositivo X fica revogado . Em seu turno, pode-se dizer que a
revogação tácita é aquela em que implicitamente, por ausência do dispositivo
expresso, pode-se entender que uma norma foi revogada. Isso porque no sistema
existem duas normas – uma anterior e uma posterior – conflitantes, e, nesse caso, a
última norma regulou inteiramente a matéria veiculada na lei anterior.
Assim como dispõe o art. 2º e § § da LICC, assim dispõe:
Art. 2º - Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor atéque outra a modifique ou revogue.
§ 1º. A lei posterior revoga a anterior quando expressamente odeclare, quando seja com ela incompatível ou quando reguleinteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
§ 2º. A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais apar das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
§ 3º. Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora
perdido a vigência.
Nas palavras de PAULO DE BARROS CARVALHO141, temos:
Diz-se haver revogação expressa quando a lei revogadoramanifestamente o declare, e haverá revogação tácita quando existirincompatibilidade entre lei anterior e lei posterior, ou, ainda, quandoesta regular inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.Observando o direito como texto, poderíamos dizer a revogaçãoexpressa atua no plano da literalidade textual (S1), enquanto arevogação tácita ocorre no altiplano das significações, querconsideradas isoladamente (S2), quer articuladas na forma de juízohipotético-condicional (S3)”.
validade com base na lei inconstitucional, ou seja, os efeitos ocorrerão no plano da norma individual econcreta.141 CARVALHO, P., 2008, p. 399.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 80/211
79
Segundo TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR.142, a norma revogadora tem
um período de tempo limitado e surge apenas para cumprir seu papel de revogar
uma norma. A norma, introduzida no sistema pelo veículo introdutor chamado lei,
que conflita com outra norma já existente no sistema, derroga implicitamente a
norma anterior. KELSEN diz que a norma revogadora apenas prevê um não-dever-
ser de outra norma. Ela, a norma revogadora, apenas existe para tirar a validade de
outra norma.
Seguindo os dispositivos normativos do art. 2º § § da LICC, podemos
dizer que uma lei declarada inconstitucional tem o poder de restaurar a vigência da
legislação anteriormente existente, que tratava do mesmo assunto, a lei 9.868/99 em
seu art. 11, § 2º: “torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo
expressa manifestação em sentido contrário”.
Também, a lei não recepcionada pode ser considerada revogada. É o
caso de lei editada antes da Constituição de 1988, que seja com ela incompatível,
pois, o sistema não admite a inconstitucionalidade superveniente.
Como a declaração de inconstitucionalidade não retira a norma do
sistema, continuando válida, apenas ataca sua força através da eficácia normativa;
conforme HART, a revogação é instrumento primordial ao sistema jurídico.
A revogação, nesses moldes, apenas será possível através do próprio
ente ou Poder que a criou. Isso significa que norma, posta no sistema através de
veiculo introdutor (lei), só pode ser retirada por veiculo introdutor da mesma
natureza, ou seja, lei e não sentença.
142 FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Inconstitucionalidade de norma de revogação e racionalidadesistemática. In: Direito Constitucional : Liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 81/211
80
Com relação às normas individuais e concretas que foram produzidas
com fundamento de validade na norma abstrata declarada inconstitucional, as
mesmas deverão ser objeto de nova norma que retire sua validade devido o efeito
erga omnes, pois a declaração de constitucionalidade é linguagem constitutiva ou
desconstitutiva da vigência e eficácia da norma.
Somente norma abstrata retira a validade de norma abstrata; a norma
concreta da decisão em controle de constitucionalidade não tem a força ilocucionária
de revogar norma abstrata.
outros temas. Barueri, SP: Manole, 2007ª,. p. 55.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 82/211
3 CONSTRUÇÃO DE DECISÃO JUDICIAL EM CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE
3.1 Introdução
Sabe-se que a decisão é um processo complexo; por este motivo,
analisaremos neste capítulo o que um julgador deve considerar para chegar a uma
decisão em controle de constitucionalidade.
Consideramos que o processo semântico de decisão inicia-se pela
interpretação, que são os primeiros passos que o sujeito cognoscente emissor de
decisão judicial necessita percorrer para a emissão de norma concreta, pois sem
interpretação não se constrói o sentido do texto.
Após a análise do processo de interpretação, vamos analisar um
problema real que o julgador encontra no seu processo de formação de decisão: as
lacunas e também o próprio valor, problema axiológico de qualquer objeto cultural;
tudo convergindo para a criação de uma decisão que se dá através de um processo
de escolha e vontade, o qual terá necessariamente um limite que aqui também será
tratado.
3.2 O Juiz e o Processo de Interpretação
Todo é qualquer texto necessita de interpretação. A interpretação é
inerente ao conhecimento. Sem interpretação o texto não tem contexto, e texto sem
contexto não é texto. Desse modo, a expressão latina que diz que In claris cessat
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 83/211
82
interpretatio (A lei sendo clara dispensa interpretação) não condiz com a realidade
jurídica.
Interpretar é um ato de conhecimento e vontade. Quanto maior for o
conhecimento do intérprete com relação ao seu objeto de conhecimento maior será
sua coerência na interpretação, por isso é sempre um ato criativo. Ao interpretar
uma lei, o juiz necessariamente terá que construir143, através de ato de vontade
criativo, uma significação dos enunciados que compõem a norma.
PAULO DE BARROS CARVALHO 144 leciona que interpretação é “a
atividade intelectual que se desenvolve a luz de princípios hermenêuticos, com a
finalidade de construir o conteúdo, o sentido e o alcance das regras jurídicas”. E
continua afirmando que “a interpretação é tema fundamental e, sem ela, não
teremos acesso ao conhecimento do direito”.
A doutrina de PAULO DE BARROS CARVALHO 145 explica o
comportamento de quem pretende interpretar e, através de quatro passos S1, S2,
S3, S4, conhecido como percurso gerador de sentido, explica também que o
intérprete alcançará o sentido do texto jurídico-positivo que pretende interpretar;
assim, partindo do conjunto de enunciados tomados no plano da expressão, suporte
material da linguagem prescritiva, ou seja, seu aspecto documental, que pertence à
escala da expressão dos textos prescritivos, passará ao conjunto de conteúdo de
significação dos enunciados prescritivos, isolando a base física do texto que se
143 O processo pré-interpretativo começa com a leitura do texto ou do objeto que se pretendeinterpretar. Após passa-se à análise interpretativa, que consiste em chegar a um sentido coerente doobjeto da leitura, para assim compreender através da captação dos sentidos. A compreensão éilimitada, por isso é conhecida como “espiral hermenêutico”. O espiral hermenêutico é sugerido por
GREGORIO ROBLES, 2005, p. 50.144 CARVALHO, P., 2007. p. 96.145 CARVALHO, P., 2006, p. 63-84.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 84/211
83
pretende entender ou interpretar, para, assim, atribuir valores unitários aos signos,
fazendo a compreensão de cada enunciado, ou produto da enunciação, para depois
colocar em conjunto, atingindo o conhecimento total que se chegará ao domínio das
significações normativas. No domínio das significações normativas, passará, por fim,
à noção de sistema, em que as normas são organizadas numa estrutura escalonada.
Antes de qualquer coisa, é necessário estabelecer quem interpretará a
norma: jurista ou aplicador. Se o ato de interpretação provém do cientista do Direito,
do jurista, este não cria normas, a Ciência do Direito não cria norma jurídica, apenas
cria proposições normativas ou jurídicas. A Ciência do Direito trabalha com
metalinguagem que serve para falar da linguagem-objeto que é o direito positivo.
Para o presente trabalho, apenas a interpretação realizada pelo aplicador
será objeto de estudo, pois é ele que outorga significação às normas ou aos
enunciados que compõem a norma, completando o processo de positivação da
norma geral e abstrata à individual ou geral e concreta.
Quando um órgão aplicador interpreta uma lei, ele emite sobre ela
enunciados normativos, que, por sua vez, têm força vinculante; assim, no processo
de aplicação, sempre cabe ao órgão aplicador interpretar a lei. O juiz, nesse caso,
faz uma delimitação do significado do texto normativo de acordo com sua vontade
(ato de vontade Kelseniano146).
Podemos estender essa forma de interpretar também para os órgãos do
poder legislativo. É de se perceber, até por uma questão óbvia, que, mesmo se
146 “na aplicação do Direito por um órgão jurídico, a interpretação cognitiva (obtida por uma operação
de conhecimento) do Direito a aplicar a combina-se com um ato de vontade em que o órgão aplicadordo Direito efetua uma escolha entre as possibilidades reveladas através daquela mesmainterpretação cognoscitiva. Com esse ato, ou é produzida uma norma de escalão inferior, ou éexecutado um ato de coerção estatuído na norma jurídica aplicanda”. (KELSEN, 2006, p. 394.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 85/211
84
tratando de ato de conhecimento, o intérprete da lei (judiciário ou legislativo, ou
particular no direito privado) o faz por ato de vontade147, através de atos cognitivos
(conhecimento), sendo que o primeiro se sobrepõe ao segundo.
O intérprete indubitavelmente se vê frente a diversas significações que a
linguagem vaga e ambígua propicia. Contudo se a significação conduzir a várias
interpretações possíveis, com valores iguais, apenas uma delas se tornará direito
positivo no ato de aplicação do direito. Assim, o intérprete deve considerar todo o
contexto em que está inserida a norma, além, é claro, dos valores objetivos que
encontram-se no sistema, como assevera FABIANA DEL PADRE TOMÉ148:
O direito, como objeto cultural que é, exige inevitavelmente tomadade posição daquele que o interpreta, não havendo como dele seaproximar na condição de sujeito puro, despojado de atitudesaxiológicas.
A norma geral é propositadamente criada com certa indeterminação149
pela norma superior, que HART chama de “textura aberta”, e essa margem de
indeterminação somente poderá ser preenchida dentro de um limite que KELSEN
chama de “quadro ou moldura”.
Essa indeterminação própria da norma geral é necessária para o ato de
aplicação, porque a norma individual continuará o processo de criação do direito,
determinando o que a norma geral apenas traçou em linhas gerais. É claro que
147 Podemos distinguir dois atos de vontade: a vontade da lei (voluntas legis ), que é a doutrinaobjetivista, e a vontade do legislador (voluntas legislatoris ), que é a doutrina subjetivista.148 TOMÉ, Fabiana Del Padre. A Prova no Direito Tributário . São Paulo: Editora Noeses, 2005, p. 252.149 Para GÜNTHER, “a indeterminação não é um problema da estrutura da norma, contudo umaperífrase do procedimento de aplicação imparcial. Se uma norma só puder ser aplicada de modo
imparcial, sob a consideração de todos os sinais característicos de uma situação, a propriedade daindefinição se aplica a cada norma”. (GÜNTER, Klaus. Teoria da Argumentação no Direito e na Moral :Justificação e Aplicação. Trad. Cláudio Molz; introdução à edição brasileira Luiz Moreira. São Paulo:Landy Editora, 2004, p. 398.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 86/211
85
haverá sempre um limite máximo e mínimo, imposto ao aplicador. As referências
sintáticas, semântica e pragmática da linguagem encontradas na norma,
representam esse limite na interpretação dos textos normativos.
Também não se pode olvidar que em um sistema positivo, em que há
uma norma hierarquicamente superior, toda e qualquer interpretação deve ser feita
sob o prisma da Constituição Federal150, ou seja, a constituição deve se projetar
como um dos princípios máximo da interpretação 151 da norma jurídica. A
Constituição, pela posição que ocupa, no ápice do sistema, deve emanar toda a
atitude interpretativa. Isso porque no “processo interpretativo temos, de um lado, a
prescrição constitucional, de outro, a realidade152”.
Por isso, pondera GERMAN ALEJANDRO SAN MARTÍN FERNÁDEZ153 que
O sistema constitucional brasileiro apresenta algumaspeculiariedades. Entre as mais importantes estão a rigidez daConstituição, a prevalência dos princípios e dos enunciadosconstitucionais e os métodos próprios de interpretação daConstituição Federal, tudo isso por força da posição de supremaciaque a Carta Magna ocupa em relação às demais normas integrantesdo sistema”.
150 Assim entendeu a ação ADI 3246 / PA. Ação Direta De Inconstitucionalidade Rel. Min. Carlos
Britto Julgamento: 19/04/2006, Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação DJ 01-09-2006 .Ementa:Constitucional. Ação Direta De Inconstitucionalidade. Impugnação Do Inciso I Do Art. 5º Da Lei Nº6.489/02, Do Estado Do Pará. Decisão: O Tribunal, à unanimidade, julgou procedente a ação paradeclarar a inconstitucionalidade do inciso I do artigo 5º da Lei nº 6.489, de 27 de setembro de 2002,do Estado do Pará, para aplicar-lhe interpretação conforme à Constituição Federal, no sentido de quesejam excluídos do âmbito da sua aplicação os créditos relativos ao ICMS que não tenham sidoobjeto de convênio entre os Estados da Federação, tudo nos termos do voto do Relator. Votou aPresidente, Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello. Falou pelo requerido, Governador do Estado doPará, o Dr. José Aloysio Campos, Procurador-Geral do Estado. Plenário, 19.04.2006.151 Aqui ainda não se trata de “interpretação conforme a constituição” e sim apenas de uma referênciahierárquica como um início para o ato interpretativo.
152 FERRAZ JUNIOR, 2003, p. 278.153 FERNÁNDEZ, German Alejandro San Martín. Introdução ao Direito Tributário . São Paulo: MPEditora. 2008, p. 235-236.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 87/211
86
É a chamada interpretação conforme a Constituição. Nas palavras de
GILMAR FERREIRA MENDES154, temos:
interpretação conforme a Constituição existe sempre quedeterminada disposição legal oferece diferentes possibilidades deinterpretação, sendo algumas delas incompatíveis com a própriaConstituição.
Desse modo, é regra de hermenêutica que busca o melhor sentido da
norma de acordo com a Constituição e baseia-se na presunção de
constitucionalidade das leis e na supremacia da Constituição, pressupondo vários
significados, os quais devem ser eleitos somente se forem compatíveis com a
Constituição. Nesse sentido, Regis Fernades de Oliveira155 arremata:
O direito é um todo harmônico. […] Todas as normas jurídicas devemser interpretadas de acordo com o que se contém na Constituição. Éela fonte inspiradora e integradora de todo o direito. Por vezes, bastaatentar ao conteúdo, para que se possa interpretar o problemaconcreto.
Sendo o Supremo Tribunal Federal guardião da Constituição, nada mais
coerente que seja o órgão competente para interpretar as leis e sua compatibilidade
com o Texto Maior. Porém, sabe-se que todos os tribunais são os órgãos
competentes para interpretar as leis, contudo, conforme SONIA MARIA BROGLIAMENDES:
normalmente, esse papel cabe às cortes constitucionais e, no nossosistema jurídico, em último grau de jurisdição, ao Supremo TribunalFederal. O que se faz é, por meio da interpretação, estabelecer se as
154 MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional : o controle abstrato de normas no Brasil e na
Alemanha. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 287.155 OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro . 2. ed. ver. atual. São Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2008, p. 26.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 88/211
87
regras dos jogos jurídicos permitem aquele uso determinado, contidoem determinada norma.156
A interpretação conforme a constituição é premissa inicial; desse modo, a
interpretação deve ser feita de modo dialógico: interpretação conforme a constituição
de forma sistemática. Nesse sentido, BASTOS157: “a letra da lei é ponto de partida
de sua interpretação e, mais adiante, consistirá no limite da mesma”. Quando há
interpretação conforme a constituição, o Supremo elimina as demais possíveis
interpretações incompatíveis com o texto constitucional, desde que seja analisado
todo o sistema jurídico tributário.
O que pretendemos sobre a problemática das decisões judiciais das
normas tributárias com enfoque das normas de controle de constitucionalidade é
uma análise que visa ao sentido dos signos em seu campo sintático, semântico e
pragmático. Para tanto, a interpretação conforme a Constituição deve ser realizada
de maneira sistemática, pois será através da interpretação sistemática que o
aplicador poderá ver o sistema como um todo e analisar dentro de todo o
contingente de possibilidade possíveis e disponíveis no sistema, como os princípios
gerais e específicos, as normas, os valores e, assim, emitir uma decisão jurídica com
bases legais dentro da competência que lhe foi atribuída. Por isso, professa PAULO
DE BARROS CARVALHO158: “o método sistemático parte, desde logo, de uma visão
grandiosa do direito e intenta compreender a lei como algo impregnado de toda a
pujança que a ordem jurídica ostenta.”
156 MENDES, S., 2007. p. 192.
157 BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e interpretação Constitucional . São Paulo: Celso BastosEditores, 1997, p. 110.158 CARVALHO, P., 2007. p. 99.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 89/211
88
Para TÉRCIO SAMAPAIO FERRAZ JR. 159 “Quando se enfrentam as
questões de compatibilidade num todo estrutural, falemos em interpretação
sistemática (stricto sensu).”
e mais:
em tese qualquer preceito isolado deve ser interpretado em harmoniacom os princípios gerais do sistema, para que se preserve acoerência do todo. Portanto, nunca devemos isolar o preceito nemem seu contexto (a lei em tela, o código: penal, civil etc.) e muitomenos em sua concatenação imediata (nunca leia só um artigo, leia
também os parágrafos e os demais artigos).160
No método sistemático de interpretação, o intérprete terá uma visão global
do direito para então entender os mecanismos de existência do direito positivo. A
análise alcançará os princípios, as normas, a relação de subordinação e
coordenação das normas. Isso porque a interpretação sistemática envolve os três
planos da investigação lingüística, os quais são: sintático (arranjo dos signos
jurídicos e uso da palavra na frase normativa); semântico (estudo das denotações e
conotações dos termos jurídicos, a acepção do vocábulo); pragmático (relação dos
signos e seus utentes, ou seja, inclui-se o fato da interpretação em que a aplicação
do direito é promovida por alguém que pertence ao contexto social por ele regulado);
Assim, por envolver os três planos da linguagem, torna a interpretação exaustiva.
Será através da atividade interpretativa que os objetos e os fatos
começaram a existir. Conforme FABIANA DEL PADRE TOMÉ161, “o fato inexiste
antes da interpretação”, a interpretação antecede ao objeto, só através da
interpretação e da linguagem que a realidade passa a existir.
159 FERRAZ JUNIOR, 2003, p. 288.160 Ibid., p. 289.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 90/211
89
HART162 entende que a linguagem da norma geral e abstrata elaborada
pelo legislador tem como elemento necessário a “textura aberta”. O problema da
“textura aberta” deve ser resolvido pela interpretação, mas adverte que não existe
uma interpretação definitiva.
A interpretação deve ser conforme a Constituição, analisando todo o
sistema; se assim não for, estaremos não aplicando o papel do Tribunal de
“Guardião da Constituição”.
3.3 O Juiz diante de uma Lacuna no Direito
O tema da lacuna no direito pode ser analisado através de duas
concepções: uma formal, em que se analisa a compatibilidade das normas com o
sistema, isto é, se as normas deste sistema são completas ou não, e umapragmática, em que o preenchimento das lacunas caberá a decisão judicial.
Como a intenção do trabalho é analisar os aspectos sintáticos,
semânticos e pragmáticos do direito para entender as decisões judiciais em controle
de constitucionalidade das normas tributárias, tem-se o dever de assim proceder
também com o subitem “lacunas do direito”, visto que as concepções se completam
e não se excluem.
Adotando-se a premissa que o direito é um sistema único e indivisível e
por ter como função resolver conflitos intersubjetivos, necessariamente será
indeterminado e terá lacunas. Por isso, o legislador deixa essas lacunas para serem
161 TOMÉ, 2005, p. 4.162 HART, 2001, p. 139.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 91/211
90
preenchidas pelo aplicador, visto que os fatos sociais não podem ser todos previstos
pelo legislador, respeitando a dinamicidade do direito.
Todo sistema será aberto para os fatos sociais e fechado em sua
estrutura. Isso decorre de sua estrutura homogênea em termos sintáticos e sua
estrutura heterogênea em termos semânticos, necessária para abarcar os fatos
sociais que necessitam serem regulados. Para KELSEN, a estrutura sintática é
fechada pela “norma fundamental” e para HART pela “norma de reconhecimento”.
Normalmente, as lacunas do direito são identificadas pela doutrina como
ausência ou omissão (lacuna normativa) de norma jurídica geral para determinado
caso concreto, ou seja, inexistência de previsão legal que certamente levaria ao
aplicador a recorrer ao meio de integração permitido em seu sistema jurídico como:
analogia, costume163, princípios gerais, etc. Ou, ainda, presença de uma solução que
para o caso concreto se tornou insatisfatória (lacuna axiológica)164.
A doutrina divide as lacunas em: genuínas (ou normativas), que são
aquelas que surgem quando o direito é omisso; e ordinárias, que são aquelas
indeterminações que surgem quando o direito utiliza termos vagos. Há autores,
163 Com relação aos costumes e a analogia e importante observar que nem todas as normas são
passíveis de aplicação analógica, inclusive em Direito Tributário. A analogia seria uma forma deaplicação de uma norma a um fato semelhante que não encontra qualificação normativa, ou seja, umcaso que não se subsuma a norma, mas apresenta uma semelhança do fato tipo previsto. O costumeseria a prática reiterada de determinado fato que não previsto na norma acaba por passar a serprevisto devido a sua repetição, mas parto da premissa que apenas o costume-enunciação ou seja, ocostume que foi positivado que pode ser usado em direito tributário, ver explicação detalhada sobrecostume-enunciação em MOUSSALLEM, 2006.164 Para ALCHOURRÓN e BULYGIN a última é uma lacuna axiológica que são aquelas queapresenta a presença de uma solução insatisfatória, quando há uma discrepância entre a tese derelevância do sistema e a hipótese de relevância, ou seja, as quais existe solução para o caso, mas o julgador a considera inadequada política e eticamente e, portanto, haveria uma subordinação dodireito às questões éticas. E a primeira é a lacuna normativas que apresenta-se quando há
insuficiência do direito positivo (escrito ou consuetudinário) para determinadas situações objetivas,que exige uma decisão judicial complementar ao direto positivado. (ALCHOURRÓN, Carlos E.;BULYGIN, Eugenio. Introducción a la Metodología de las Ciencias Jurídicas y Sociales . Ed. Astrea,Buenos Aires, 1974.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 92/211
91
como RAZ165, por exemplo, que entendem que as lacunas ordinárias são inevitáveis.
Esse entendimento vem ao encontro das premissas da teoria da linguagem, vez que
o direito é construído pela linguagem e sabemos que a linguagem será sempre
ambígua e vaga166.
3.3.1 Lacuna em seu Aspecto Sintático
Ao analisar as lacunas em seu aspecto sintático/formal, destaca-se a
posição kelseniana, que entende que este tipo de problema de ausência de norma é
de impossível ocorrência167, levando-se em conta que a norma jurídica é estruturada
de forma “ser/dever ser”, isto é, “descrição de uma conduta e a sanção estatuída”.
Veja então que, se no ordenamento não há uma norma geral proibitiva, a conduta
será permitida (através da permissão geral), que KELSEN chama de “ordem jurídica
negativa”168; deste modo, nunca haveria ausência de norma.
Revela o mestre que, diante de um caso concreto que não encontre
literalmente o fato descrito em alguma norma, os órgãos aplicadores do direito
poderão aplicar a solução mais justa. No entanto, isso não representaria a existência
de uma lacuna, pois para ele o sistema é completo, e as normas que o compõem
165 RAZ, Joseph. Legal Principles and the Limits of Law (Postscript). In: COHEN, Marshal (ed.),Ronald Dworkin and Contemporary Jurisprudence . Totowa, New Jersey: Rowman & Allanheld, 1984,
p. 81166 “É mister esclarecer que apenas nas linguagens puramente formais, como a da lógica e a damatemática puras, não surge esse problema da vaguidade, não porque os seus conceitos sejam maisexatos do que o de outros tipos de linguagem, mas, sim, porque são empíricos. Em outros termos, oproblema da aplicação de um conceito matemático ou lógico a objetos da experiência sensível,simplesmente não se apresenta, pois nada há na experiência sensível que corresponda ao pontogeométrico, ao numero 5 ou à implicação lógica. Porém, quando estes mesmos conceitos sãoutilizados empiricamente, isto é, para a descrição da realidade empírica – como sucede com ageometria aplicada – o problema da vaguidade reaparece com todas as suas implicações. Poder-se-ádizer, parafraseando Einstein, que “na medida em que os conceitos se referem à realidade são vagos,e na medida em que não soa vagos não se referem à realidade”. (DINIZ, Maria Helena. As lacunas nodireito . 7. ed. adaptada ao novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 273.)
167 No mesmo sentido RAZ, Joseph, Legal Reasons, Sources and Gaps. In: ______. The Authority ofLaw . Oxford: Clarendon Press, p. 53-77, 1979, p. 76.168 KELSEN, 2006, p. 273.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 93/211
92
têm possibilidade solucionar qualquer problema. Pois, o que não está proibido está
permitido ou ainda o que não está permitido é proibido169, fazendo assim com que
todas as condutas sejam juridicamente qualificadas,
sendo o sistema jurídico uno, pleno e harmônico, não pode haverlacunas ou espaços em branco no direito: todo conflito, todacontrovérsia encontra nele solução adequada, sempre será possívela decisão judicial, de forma que o direito é, necessariamente,aplicável em qualquer hipótese.170
KELSEN assim entende porque o legislador não tem condições deantecipar todas as futuras ações humanas e a conduta do legislador deve escolher
entre não aplicar uma sanção por ausência de norma geral ou ainda aplicar um dos
meios de integração. Não cabe à Ciência do Direito verificar as razões internas do
julgador, mas sim a psicologia ou a sociologia.
Assim, quando a aplicação da ordem jurídica vigente é insatisfatória parao caso que foi apresentado ao Juiz para decidir, este só poderá fazer as vezes do
legislador quando o direito apresentar uma lacuna. Mas, e se o direito não tem
lacunas?
O julgador nesse caso teria que aceitar a existência de “suposta lacuna” e
criar direito novo. Contudo, o Tribunal deveria assumir a responsabilidade de
colocar-se no lugar do legislador e criar uma norma individual sem correspondência
em relação à norma geral. KELSEN, no entanto, afirma que “raramente fará uso do
poder, que lhe é conferido, de assumir o lugar do legislador”171.
169
Ibid., p. 270.170 DINIZ, 2002, p. 44.171 KELSEN, 2006, p. 275-276.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 94/211
93
Assim, de certa forma, KELSEN admite como “ficção” a existência das
lacunas, que chama de política ou axiológica. Interessante a passagem de MARIA
HELENA DINIZ172
, que concorda:
Apesar de Hans Kelsen não admitir a existência de ”lacunas” nosistema jurídico, reconhece a importância da teoria das lacunas noâmbito da jurisdição, como um limite ao poder normativo domagistrado. Considerando a “lacuna” como uma ficção utilizada pelolegislador com a finalidade de restringir o poder de interpretação e deintegração conferido aos tribunais, quando estes constatam a falta deuma determinada norma, na ordem jurídica, para resolver certo caso,‘falta essa determinada com base num juízo de valor ético-político
subjetivo, que é apresentada como impossibilidade lógica daaplicação dessa ordem jurídica’.
KELSEN, portanto, admitindo que as lacunas são ficções que
estabelecem limites ideológicos à atividade judicial e que diante de um caso
concreto, no nível da decisão judicial, o sistema é incompleto quando não possui
norma. Acredita-se que apenas em seu aspecto formal o mestre de Viena teria
razão, mas, como já mencionado, o direito não pode ser visto apenas por um ângulo
(formal) que o torna injustificável, quando efetivamente estamos no âmbito de
aplicação da norma geral e abstrata.
3.3.2 Lacuna em seu Aspecto Semântico e Pragmático
Em seu turno, quando se analisa a questão das lacunas no campo
pragmático, para os autores que defendem essa corrente, o problema da lacuna
existe como uma continuação da positivação do direito, pois, no seu ciclo de
positivação, necessita do aplicador, que estará apenas aclarando os termos
abstratos. Forma analítica que constrói a seguinte norma: dado o fato de existir um
172 DINIZ (2002, p. 44) comentando a posição de Kelsen.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 95/211
94
conflito, deve ser a decisão judicial. Daí advém a necessidade de decisão para os
conflitos.
Sem mencionar que sistema jurídico é diferente do demais sistemas
(político, social, ético, econômico, etc.), por ser o único sistema que se auto-obriga a
tomar decisões, esta é sem dúvida a grande diferença de todos os demais sistemas,
pois que, no caso de existência de controvérsia, também se socorre do sistema
jurídico. É claro que o sistema jurídico apenas decidirá casos que forem compatíveis
com sua própria linguagem, casos que serão filtrados pela linguagem do direito para
serem levadas aos Tribunais.
Essa obrigatoriedade de tomar decisões chama-se cláusula de proibição
de denegação de justiça ou non liquet , que pressupõe uma aparente posição
hierárquica do legislador sobre o julgador, mas, de outro modo, também demonstra a
necessidade de o juiz decidir, inclusive para os casos em que o legislador não
normatizou. Em nosso ordenamento, a cláusula está positivada através do art. 108
do Código Tributário Nacional e no art. 126 do Código de Processo Civil, além de
estar também no art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil.173
Esta cláusula nada mais é que uma norma de estrutura que assegura ao
julgador que na ausência de norma material que se subsuma ao caso concreto,
haverá a norma de estrutura que lhe dá legitimidade para decidir criando para o caso
173 O art. 108 do CTN da maneira que está prescrito admite expressamente que o sistema pode terlacunas. Art. 108 do CTN: “Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente paraaplicar a legislação tributária utilizará, sucessivamente, na ordem indicada: I – analogia; II – osprincípios gerais de direito tributário; III – os princípios gerais do direito público; IV – a equidade”.
Art. 126 do CPC: “O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridadeda lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo recorrerá a
analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito.Art. 4º da LICC: Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, oscostumes e os princípios gerais de direito.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 96/211
95
concreto uma decisão com base legal. Esta então seria uma técnica para resolver
casos concretos que apresentem uma falta de norma, e não a negação de existência
de lacunas devido à cláusula do non liquet .
As decisões do Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado de
constitucionalidade, não apenas cria uma norma para o caso concreto como também
cria uma norma que vincula todos os demais casos a emitirem normas que resolvam
os demais caso concretos. Contudo, quando a decisão é proferida pelo Supremo
Tribunal Federal, mas em controle difuso, a lacuna permanece porque a decisão não
terá status deôntico de garantir todos os comportamentos.
Na teoria luhmanniana, também encontramos a cláusula de
obrigatoriedade de decidir: “Los tribunales deben decidir allí donde no pueden decidir
– en todo caso deciden fuera de los estándares aceptables de la racionalidad. Y si
no pueden esforzarse en poder. Si no se encuentra el derecho, hay que
inventarlo”174.
A sociedade moderna é uma sociedade de risco onde a contingência
impera, pois no futuro tudo pode ser diferente, sem mencionar que o sistema jurídico
não pode se negar a decidir diante de um caso concreto. Apesar de Luhmann
afirmar a inexistência de lacunas, concorda que há, devido à cláusula do non liquet,
uma “decisão formal de desvio”, que para nós, em termos finalísticos, significa a
mesma coisa.
174 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad . Mexico: Universidad Iberoamericana, 2002, p. 379.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 97/211
96
O centro do sistema jurídico será ocupado pelos Tribunais que têm o
dever de decidir, devido à cláusula do non liquet 175 , que de certa forma, além de
obrigar a decidir, também permite a liberdade176
na interpretação em suas decisões
(construindo o direito).
A decisão é a comunicação jurídica que mantém a autopoiese 177 do
sistema, ou seja, é ato de fala ilocucionário. Isso tudo ocorre em conseqüência do
fechamento operativo do direito e de sua abertura cognitiva, da necessidade de
decidir e do poder de criar.
Em outras palavras a norma individual e concreta, ou geral e concreta
emitida pelo Juiz ou pelo Supremo Tribunal Federal é necessária para a continuação
do sistema, e sua criação não é autônoma, feita com base em seu livre arbítrio, e
sim dentro dos limites formais delimitados pelo próprio sistema (moldura da norma).
Com relação à classificação doutrinária no campo da pragmática, é
importante trazer à baila os conceitos de “lacunas de conhecimento” e “lacunas de
reconhecimento”, apresentadas por ALCHOURRÓN e BULYGIN178, que diz que as
“lacunas de reconhecimento” são aquelas que decorrem do desconhecimento acerca
da resolução de um caso, em virtude da indeterminação semântica dos conceitos
175 TÉRCIO SAMPAIO entende que nesse caso podem ser usadas as “regras de calibração”: “Assim,por exemplo, quando no interior do ordenamento surge a configuração de um fato cuja relevância jurídica se reconhece, mas para o qual não se encontra uma norma adequada (problema daslacunas), o sistema evoca uma regra de calibração segundo a qual é defeso ao juiz deixar de julgarsob o argumento de falta de obscuridade da lei”. (FERRAZ JR., 2003, p. 193.)176 É claro que está liberdade não é subjetiva e sim mitigada por valores objetivos, vide capítulo dosvalores.177 “O conceito de autopoiese será definido mais enfaticamente por LUHMANN, sob influência deMATURANA e VARELA, como auto-referência dos elementos sistêmicos: “um sistema pode serdesignado como auto-referência, se ele mesmo constitui, como unidades funcionais, os elementos deque é composto […]”. Aqui se trata primariamente da reprodução unitária dos elementos construtoresdo sistema e, simultaneamente, por ele constituídos, não da auto-organização ou da manutençãoestrutural do sistema.” (NEVES, 1994. p. 116.) “O modelo luhmanniano do Direito moderno (positivo)como sistema autopoiético é, numa perspectiva empírica, suscetível de restrições”. (Ibidem, p. 124.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 98/211
97
(vagueza) que caracterizam um caso genérico. Para os autores, a vagueza pode até
ser reduzida pelo uso de termos técnicos, mas não desaparece nunca. Por outra
feita, as “lacunas de conhecimento” são aquelas que apresentam o
desconhecimento do fato, o juiz desconhece na aplicação do direito ao caso
concreto as informações fáticas. Nesse último caso, pode-se dizer que a ausência
de conhecimento pode ser suprida pelas presunções legais179 e outras regras de
natureza processual.
É possível falar em inconstitucionalidade de lacuna? Não, apenas
podemos suscitar a inconstitucionalidade da omissão legislativa que impediu o
exercício de um direito reconhecido pela norma. Seria a chamada
inconstitucionalidade por omissão passível de Ação direta de inconstitucionalidade
por omissão, tipo de ação direta de inconstitucionalidade propriamente dito que
possui algumas particularidades, como veremos no capítulo 4, item 4.4.2.
O aplicador do direito apenas resolverá, para um determinado caso
concreto, a ausência da norma (lacuna), mas jamais a eliminará do sistema. Essa
tarefa de eliminar caberá apenas ao legislador; mesmo no caso das decisões do
Supremo Tribunal Federal, em controle abstrato o mesmo se dará, visto que a
decisão em controle de constitucionalidade não retira ou põe norma abstrata no
ordenamento que pode resolver o problema de lacuna.
Resumidamente, quando o direito é analisado por seu aspecto formal, a
estrutura normativa e sua lógica, dado fato (F), deve ser a relação deôntica entre
dois sujeitos de direito S’ e S’’, não sendoo possível a existência de lacunas, pois o
178 ALCHOURRÓN; BULYGIN, 1974, p. 61-63.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 99/211
98
que não está proibido está permitido, mesmo porque há inclusive a existência de
norma permissiva da integração do direito. Mas, quando a análise recai sobre fatos
concretos, no campo pragmático (e aqui, mais uma vez ressalva-se que a analise é
jurídica positiva) as lacunas existem como parte do sistema de positivação do direito
(norma de estrutura voltada ao Juiz) e cabe ao Juiz, através de suas decisões, o
preenchimento das lacunas para emissão da norma concreta, seja ela individual seja
ela geral.
O preenchimento dessa lacuna, ou seja, o modo como o juiz emite a
decisão quando não tem uma norma materialmente positivada no sistema que lhe
sirva de fundamentação, é o que veremos a seguir.
3.4 Construção e a Formação dos Conceitos
Percebe-se que as demandas muitas vezes giram em torno do conteúdo
de significação dos institutos, o problema semântico é existente, fato que não temos
como negar, mas é lógico que o aspecto sintático e pragmático também estão
ligados de forma inseparáveis. O que ocorre é maior predominância de um em
detrimento de outro.
Segundo ALF ROSS, todas as palavras são vagas e potencialmente
ambíguas, e o significado de uma palavra é a conexão da expressão, do contexto e
da situação180. Assim, onde houver linguagem haverá os problemas semânticos de
179 As presunções legais podem ser consideradas em síntese como aquelas “elaboradas pelolegislador e impostas como regras jurídicas gerais e abstratas”. (FERRAGUTT, Maria Rita.Presunções no Direito Tributário . 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 294.)
180 ROSS, 1997, p. 112. “En resumen, los siguientes axiomas se aplican a las palabras en el usocotidiano: 1)El significado posible de toda palabra es vago; su posible campo de referencia esindefinido; 2) La mayor parte de las palabras son ambiguas; 3) El significado de una palabra sedetermina en forma más precisa cuando ella es considerada como parte integrante de una
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 100/211
99
vaguidade e ambigüidade. Vago é o termo que representa o fato de não existir regra
que permita identificar sua aplicação, é o termo indefinido181; por sua vez, ambíguo é
o termo que apresenta mais de um significado. WARAT182
diz que um termo é
ambíguo quando existem dúvidas sobre qual seu âmbito de denotação, ao passo
que será vago toda vez que, especificado seu campo denotativo, surgirem dúvidas
em torno de sua extensão.
Um termo vago apresenta-se, assim, com uma zona de penumbra, v.g., a
palavra jovem : até que idade uma pessoa é ou não “jovem”?. Ou ainda, a pessoa
considerada “careca”: quantos fios de cabelo precisam estar faltando em sua cabeça
para ser considerado “careca”? Ou seja, não há um limite onde começa e termina183.
A vaguidade potencial que as palavras apresentam foi chamada por WAISMANN184
de “textura aberta” da linguagem, que se apresenta como necessária à linguagem
natural, assim como a textura aberta normativa apresentada por HART.
determinada expresión; 4) El significado de una expresión – y con ello el significado de las palabrascontenidas en la misma-se determina en forma más precisa cuando la expresión es considerada en laconexión en que es formulada. Esta conexión puede ser lingüística (el contexto) o no lingüística lasituación). A partir de 3) y 4) es posible formular la siguiente generalización: el significado de unapalabra es una función de la conexión – expresión, contexto, situación”.181 O dicionário nos dá várias acepções da palavra, sendo sempre a primeira acepção de base e asdemais como é a palavra comumente usada. Sobre temos o que diz OGDEN: “Essa fixidez emreferência é apoiada e mantida na sua maior parte, pelo uso de dicionários e, para muitos fins, o‘significado de dicionário’ e o ‘bom uso’ seriam equivalentes. Mas é possível indicar um sentido maisrefinado de significado de Dicionário. O Dicionário é uma lista de símbolos-substitutos. Com efeito, elediz: “Isto pode ser substituído por aquilo em tais circunstâncias.” Pode fazer isso porque, nessascircunstâncias e para intérpretes adequados, as referências causadas pelos dois símbolos serãosuficientemente análogas. Assim, o Dicionário serve mais para assinalar as preposições entre asreferências de símbolos do que para definir os seus respectivos campos”. (OGDEN, C. K.;RICHARDS I. A. O significado de significado : Um estudo da influência da Linguagem sobre oPensamento e sobre a Ciência do Simbolismo. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar Editores,1972, p. 212-213.)182 WARAT, Luís Alberto. O Direito e sua Linguagem . 2. ed. Porto Alegre: Fabris, 1995, p. 79 apudCARVALHO, P., 2005, p. 23.183 CARRIÓ, Genaro R. Notas Sobre Derecho y Lenguaje , 4. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1990,p. 31-35: “Ya sabemos lo que quiere decir ‘joven’ o ‘calvo’. No se trata aquí de un problema de
ambigüedad. El problema es este otro: carece de sentido preguntarse a qué precisa edad se deja deser joven, o cuántos cabellos hay que tener para no ser calvo […]”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 101/211
100
Por outro lado, a característica das palavras de apresentarem mais de um
significado (ambigüidade) pode ser suprida, se for considerado o contexto lingüístico
e a situação humana em que as palavras são usadas. Nesse sentido, GENARO R.
CARRIÓ185.
Tanto a questão da indefinição do termo quanto a questão do significado
do termo em se tratando de decisão judicial passa a ser uma questão chamada, pela
semiótica, de semântica. O conteúdo normativo é o significado.
Assim, podemos definir uma palavra pelo seu uso, natural ou técnico,
dentro de um sistema lingüístico determinado, que é a chamada definição nominal
ou ainda podemos definir uma palavra pela realidade apresentada, ou seja, a
palavra seria um instrumento que indica a realidade, que é chamada de definição
real, mas como trabalhamos com a Teoria da Linguagem não podemos admitir que a
palavra capta a realidade, pois sabemos que construímos a realidade pela
linguagem, levando em conta o contexto em que ela está inserida. Por isso,
trabalharemos com a definição nominal.
Dizemos que o significado de uma palavra se dá pelo seu uso186, isso não
significa um processo mental que termina na mente do sujeito187, não é uma relação
184 Cf. CARRIÓ (ibid., p. 35), este termo foi apresentado por WAISMANN, no artigo “Verifiability”(WAISMANN, F. Verifiability. In: Logic and Language (primeira série) Oxford: A.N.G. Flew; Blackwell,1951, p. 119.)185 Ibid., p. 29-31: “las palabras está en función del contexto lingüístico en que aparecen y de lasituación humana dentro de la que son usadas. Claro está que el contexto y la situación, en lageneralidad de los casos, disipan toda posibilidad de confusión”.186 É importante destacar a diferença entre uso e menção, que está na distinção de um objeto ou umnome, ou seja, o uso (manifestação direta sobre o objeto) é quando usamos um vocábulo em seupapel ou seja em seu lugar e a menção (referência sem comunicação direta) é quando usamos onome em lugar de outro, fazemos menção ou referência. Ex.: São Paulo é cidade (uso); “São Paulo” é
nome de cidade (menção).187 Mas, não podemos ignorar a existência mental de um significado; sabemos que, quando lemos apalavra cadeira , só sabemos o que é porque temos uma representação mental sobre ela, cada qualcom uma representação própria, mas uma representação global com detalhes necessários que antes
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 102/211
101
psicológica entre palavra e significado, também não se pode dizer que o significado
está ligado na palavra, por isso diz WAISMANN 188 (desenvolvendo a teoria de
WITTGENSTEIN):
También é engañoso hablar de que el significado fuese una especiede entidad mágica unida a la palabra de manera muy semejante acomo el alma lo está al cuerpo. Pero el significado no es alma en elcuerpo de la palabra, sino que lo que llamamos el “significado” semanifiesta a si mismo en el uso de la palabra. Todo el propósito denuestra explicación podría resumirse diciendo: Si desea saber quésignifica una palabra, inquiere cómo se usa.
WAISMANN e J. L. AUSTIN, apesar de trabalharem com teorias
diferentes, sendo o primeiro com teoria do significado e o segundo com a teoria da
ação, ambos convergem com a premissa de que “são as condições de uso da
sentença que determinam seu significado”189
O que se extrai é que o contexto jurídico deve sempre ser levado emconta, e essa tarefa cabe ao julgador, que tem o dever de impor um significado
jurídico de acordo com o caso concreto; isso significa que, devido ao problema
lingüístico da vaguidade e da ambigüidade, o aplicador deve analisar o uso dos
termos que compõem a norma dentro do contexto jurídico.
foram convencionados; por exemplo, ter uma plataforma para se sentar e que possua uma altura dosolo que permite no mínimo dobrar as pernas, mas cada uma vai imaginar uma cor, com braços ousem braços, com três ou quatro pés de diferentes materiais, etc. Desse modo, a imagem mental éprova da compreensão do que foi dito; se eu disser imbu e o ouvinte não souber como é o fruto doimbuzeiro, não conseguirá entender o que quero dizer e não formará em sua mente o fruto, mas nãosabe como é, nem ao menos que de fruto trata-se.188 WAISMANN, F. Los Principios de La Filosofía Lingüística . Trad. José Antonio Robles. México:Universidad Nacional Autónoma de México, Ciudad Universitaria, 1970, p.174. Tradução livre:“Também é enganoso falar que o significado fosse uma espécie de entidade mágica que se une àpalavra de maneira muito semelhante a como a alma está ao corpo. Mas o significado não é a almanem o corpo da palavra, somente o que chamamos significado se manifesta em si mesmo no uso da
palavra. Todo o propósito de nossa explicação poderia se resumir dizendo: Se deseja saber quesignifica uma palavra, pergunte como se usa”.189 AUSTIN, 1990, p. 11.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 103/211
102
O significado escolhido pelos tribunais chama-se “poder de violência
simbólica que é o poder capaz de impor significações como legítimas” 190 . Isso
porque, “de certa forma, as palavras com que se faz o direito, as palavras das leis e
das decisões, e mesmo as palavras da doutrina, são normatizadoras de sentidos
literais, impondo-se de modo violento191”. Não concordamos totalmente com o “poder
de violência simbólica”, pois sabemos que no caso das normas abstratas (leis) esse
poder de violência simbólica não se opõe devido a vaguidade e ambigüidade das
palavras. Apenas se opondo no caso das normas concretas.
TORQUATO CASTRO192 admite que, “na verdade, ainda está mesmo
longe de uma explicação literalmente científica para o problema do sentido e do
significado como um todo”.
A súmula vinculante é um problema de “poder de violência simbólica” que
atualmente vem impor uma determinada decisão judicial como correta para todos os
casos semelhantes.
A decisão baseada em súmula vinculante ou precedente193 judicial é um
problema que o Supremo Tribunal Federal tem que enfrentar após a Emenda
Constitucional 45 de 8 de dezembro de 2004. A súmula vinculante não resolve o
problema semântico da linguagem. Apesar de a súmula indicar qual o uso que de
190 Cf. FERRAZ JR., 2006, p. 175. O termo é de BOURDIEU, Passeron; PASSERON, Jean-Claude.La Reproduction . Paris: Ed. de Minuit, 1970, p. 18.191 CASTRO JR. Torquato. Interpretação e Metáfora no Direito. In: BARRETO, Aires F. et al.Segurança Jurídica na Tributação e no Estado de Direito . (II Congresso Nacional de EstudosTributários). São Paulo: Editora Noeses, 2005, p. 667-668.192 Ibid., p. 669.193 O termo precedente aqui não significa aquele adotado por ALEXY como método de argumentação“A aplicação do precedente é assim mostrada como um método de argumentação que por si mesmo
é requerido por motivos práticos gerais (o princípio da universalidade / a regra sobre o encargo doargumento) e é racional até esse ponto. Além disso, seu uso pressupõe outros argumentos,
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 104/211
103
deve dar à palavra em determinado caso, ou como devem os demais julgadores
julgar casos semelhantes, é na verdade um erro, uma anomalia que precisa ser
combatida, porque sempre haverá uma interpretação que levará em conta os
valores; assim, sabe-se que “os tribunais que decidem um caso posterior podem
chegar a uma decisão oposta à contida do precedente e da admissão de algumas
acepções a ela que não foram antes consideradas ou, se foram consideradas, foram
deixadas em aberto” 194 . Isso ocorre, pois cada caso é um caso e há sempre
“diferença juridicamente relevante” 195 que deve ser considerada em um caso
concreto.
ROBERT ALEXY 196 concorda na impossibilidade de os casos serem
totalmente semelhantes:
As razões básicas para seguir os precedentes é o princípio de
universalidade, a exigência de que tratemos casos iguais de modosemelhante, o que está por trás da justiça como qualidade formal.Isso imediatamente revela uma das dificuldades decisivas de seguiro precedente: dois casos não são sempre totalmente idênticos.Sempre é possível descobrir uma diferença. O problema real nãomuda para o problema de determinar que diferenças são relevantes.
HART197 diz que a textura aberta do direito significa que há, na verdade,
áreas de conduta em que muitas coisas devem ser deixadas para ser desenvolvidas
pelos tribunais ou pelos funcionários, os quais determinam o equilíbrio, à luz das
circunstâncias, entre interesses conflitantes que variam em peso, de caso para caso.
particularmente os práticos gerais”. (ALEXY Robert. Teoria da Argumentação Jurídica . Trad. ZildaHutchinson Schild Silva. São Paulo: Ed. Landy, 2001, p. 262.)194 HART, 2001, p. 148.195
HART, loc. cit.196 ALEXY, 2001, p. 259.197 HART, 2001, p. 148.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 105/211
104
Assim, pode-se extrair que a construção ou formação dos conceitos se
dará em cada caso concreto através da decisão judicial, pois esta estará apta a
aplicar o melhor significado e a melhor determinação da linguagem jurídica e, para
isso, terá que aplicar aspectos subjetivos e valores considerados também objetivos,
esse é o papel do julgador.
3.4.1 Os Valores na Construção e Formação dos Conceitos
Sem pretensão de tornar o tema dos valores como tema central, conforme
fizeram JOHANES HESSEN, MAX SCHELER, NICOLAI HARTMANN e MIGUEL
REALE198, analisaremos os valores objetivos, devido sua importância no ato de
decidir.
O olhar científico será primordial para tentar fugir do senso comum de um
modo geral, porque o ato de valorar em uma decisão judicial não deve ser visto
como algo pessoal discricionário e até mesmo indiscriminado.
O ato de valor é inerente ao ser humano, assim como o de respirar ou o
de piscar os olhos, algo que está presente: queira ou não. Por esse motivo, não
iremos iniciar o tema definindo valor , mesmo porque o conceito de valor não pode
ser rigorosamente definido, pertence ao número dos conceitos supremos que não
admite definição, como a palavra ser 199.
Assim, a possibilidade que nos resta é de tentar classificá-lo ou mostrar
seu conteúdo, dizendo que valor é vínculo que se institui entre o agente do
conhecimento e o objeto, vinculo esse que faz com que o sujeito não se comporte
198 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, linguagem e método . São Paulo: Editora Noeses,2008. p. 177199 HESSEN, Johannes. Filosofia dos Valores. Coimbra: Almedina,2001, p.37
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 106/211
105
com indiferença frente ao objeto e lhe atribui qualidades positivas ou negativas. O
valor não é algo existente, mas é algo existente para alguém (uma sociedade).
O ato de valorar está presente na norma jurídica quando ela realiza a
seleção dos fatos relevantes que o direito pretende regular, estabelecendo uma
relação de imputação e armazena em seu antecedente; mas, também quando
pratica o ato de aplicação do direito decidindo judicialmente os fatos da vida.
Os valores não são normas, mas as normas devem necessariamente
conter valores, pois o direito existe para cumprir o fim específico de regrar o
comportamento humano nas suas relações de interpessoalidade; com isso, implanta
os valores que a sociedade almeja alcançar.
Desse modo, não há direito positivo e Ciência do Direito sem ato de
valoração. O direito, quando regula as relações intersubjetivas, está valorando
positiva ou negativamente às condutas dos indivíduos, por isso sempre haverá o ato
de valoração; dessa maneira, entende PAULO DE BARROS CARVALHO200.
E continua PAULO DE BARROS CARVALHO201:
quem se proponha a conhecer o direito positivo não pode aproximar-
se dele na condição de sujeito puro, despojado de atitudesaxiológicas, como se estivesse perante um fenômeno da natureza ouuma equação algébrica. A neutralidade axiológica impediria, desde oinício, a compreensão do sentido das normas, tolhendo ainvestigação. Alem do mais, o conhecimento jurídico já encontra noseu objeto uma auto-explicação, pois o direito fala de si mesmo eeste “falar de si” é componente material do objeto.
200 CARVALHO, P., 2008, p. 175.201 CARVALHO, Paulo de Barros. O Sobreprincípio da Segurança Jurídica e a Revogação de NormasTributárias. In: Crédito Prêmio de IPI – Estudos e Pareceres. Ed. Manole, 2005, p. 3.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 107/211
106
Todo fato jurídico está inserido em um contexto cultural, e será através da
análise do contexto cultural que um fato será jurídico ou não. O conteúdo normativo
necessita de uma significação que será influenciada pelo contexto cultural. Por isso,
dizemos que o direito cria sua própria realidade, o conteúdo semântico da norma; o
conceito jurídico de uma palavra pode ser completamente diferente daquele
usualmente aceito por dada comunidade, pois o significado para os objetos
culturais 202 são aqueles convencionalmente aceitos com intuito de regular as
condutas intersubjetivas.
Valorar é um ato humano. Todos os objetos possíveis são capazes de ser
valorados, pois todos eles são objetos de apreciação humana, mas haverá apenas
duas opções para se valorar: positivo ou negativo. Nas relações deônticas que são
as reguladas pelo direito, os valores positivos seriam os dos modais obrigatório e
permitido , e os valores negativos, do modal proibido 203.
Valor é um conceito relacional, sempre haverá uma relação com o
sujeito204, porque o valor é atribuído por alguém; por esse motivo, afirma-se que
valor é uma relação. Essa referência a um sujeito não representa um subjetivismo,
pois aqui refere-se ao sujeito homem, ou sujeito supra-individual, ou interindividual,
como chamou HESSEN205, de um modo geral e não a um sujeito apenas. Se uma
202 Segundo COSSIO, os objetos culturais necessitam da existência do substrato e a existência dosentido. (COSSIO, Carlos. El derecho en el derecho judicial . 2. ed Buenos Aires: Abeledo Perrot,1959, p. 38.)203 Na mesma linha, CARVALHO, P., 2008. p. 174-175.204 Cf. SUCUPIRA, Newton. Tobias Barreto e a filosofia alemã . Rio de Janeiro: Gama Filho, 2001, p.149-150 apud CARVALHO, P., 2008. p. 175: “Newton Sucupira apresenta alguns princípios geraisque norteavam a teoria de Lotze e que se encontram na filosofia dos valores do neokantiniana daescola de Baden e em outros filósofos: 1). os valores repousam sobre validades irreais; 2). constituemcampo autônomo junto e sobre o ser concreto; 3). O valor é sempre uma relação ligada a um sujeito;
4) não é atividade puramente teorética, mas uma faculdade prática que nos conduz à apreensão dovalor”.205 HESSEN, 2001, p. 49.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 108/211
107
coisa vale apenas um sujeito, trata-se de subjetivismo, o que não faz parte desta
proposta. Aqui a referência é ao sujeito homem; o valor deve ser reconhecido por
todos do mesmo modo, como uma validade geral. Isso porque o valor, para o direito,
quer aquele escolhido pelo legislador, quer pelo aplicador, não pode depender da
vontade individual, deve ser algo comumente aceito por dada sociedade, por isso
dizer que é objetivo e não subjetivo.
Os valores não possuem existência por si mesmos, têm necessidade de
outro ser para existir. O valor é algo que se adere ao ser, não é o próprio ser, mas
sim algo que depende do ser. Isso é, os valores não possuem existência por si sós,
necessitam de outro “ser” onde possam aderir, não pode o “ser” se confundir com o
valor; por exemplo, o valor amor : se a pessoa a quem você ama trai alguém ou deixa
de amar esse alguém, ou vice-versa, não significa que o valor amor deixa de existir;
assim também se dá com o valor justiça . Desse modo, não tem existência real, pois
os valores não são, mas valem. O valor está intimamente ligado ao ser, mas com ele
não se confunde.
Há valores considerados pessoais, individuais e subjetivos que valem
para determinada pessoa de acordo com seu sistema moral206, em que “cada um (é)
o seu próprio juiz207”, não sendo este caso relevante para as bases científicas aqui
adotadas.
Para o fim proposto, apenas interessam os valores gerais, objetivos, que
residem na própria essência da vida. Valores que não se relacionam com um único
206 Quanto à utilização do sistema moral, é interessante o pensamento de GÜNTER (2004, p. 367): “Ofato de se dispor de recursos para produzir empiricamente uma decisão, portanto, não pode ser
exposto às mesmas fraquezas motivacionais, por cuja compensação fundamentou-se moralmente odireito. Para controlar esse perigo, não obstante, dispõe-se novamente apenas do Direito.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 109/211
108
indivíduo, mas com o ser homem de um modo geral208. HESSEN209 também diz que
esse valor é absoluto porque é “incondicional e independe de quaisquer valorações
acidentais e particulares dos indivíduos”.210
Também PAULO DE BARROS CARVALHO concorda afirmando que “A
aplicação do direito é promovida por alguém que pertence ao contexto social por ele
regulado e emprega os signos jurídicos em conformidade com pautas axiológicas
comuns à sociedade.”211 (grifo nosso). E será exatamente no conteúdo das normas
principiológicas que encontraremos tais valores.
FRANÇOIS GÉNY entende que, “para que o juiz escape aos perigos da
arbitrariedade, ele deve desligar-se, portanto, de toda e qualquer influência pessoal
e fundar sua decisão (construída) sobre elementos de natureza objetiva, que são os
dados”. Os dados são um conjunto de realidades normativas sociais que
apresentam, embora “normativa” independa da vontade do legislador, “realidades
morais, econômicas etc.”212
207
LOCKE, John. Zwei Abhandlungen über die Regierung , 2. Abhandlung. Stuttgart: Suhrkamp, 1978,p. 66, 98 apud GÜNTER, 2004, p. 367.208 Diferentemente da posição que adotamos, para FABIANA DEL PADRE TOMÉ (2005, p. 242), oconhecimento adquirido pelo julgador no decorrer de sua experiência de vida influencia sua decisão.Nesse sentido, coloca: “Dentro da liberdade conferida ao julgador atuam as denominadas máximasde experiência. Os conhecimentos adquiridos pelo julgador ao longo de sua vivência social eprofissional influenciam decisivamente na apreciação das provas. […] o julgador com base nasnormas jurídicas vigentes e em seus valores, seleciona os fatos que entende convincentes […]”.209 HESSEN, 2001, p. 95.210 É claro que encontramos os adeptos da corrente do relativismo axiológico que entende que todosos valores são relativos e que não existe valor absoluto e geral, mas de fato apenas para fazer esta
afirmação emitindo juízo de valor desmente a própria tese.211 CARVALHO, P., 2008, p. 200.212 GÉNY, François. As lacunas no direito . São Paulo: Saraiva, 2002 apud DINIZ, 2002, p. 97-98.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 110/211
109
O juiz nunca emite ato de valoração partindo de um valor pessoal, pois o
valor é impessoal, é objetivo e adere ao ser e não à pessoa213. É claro que se for
possível verificar que o aplicador usou de valores pessoais e não gerais em sua
função de julgador, pode-se suscitar a falta de validade da sentença, que não pode
ser objeto de controle de constitucionalidade, pois o objeto do controle de
constitucionalidade são apenas as normas abstratas, a decisão deve encontrar
outros instrumentos jurídicos processuais para sua reforma. Se a decisão do
Supremo Tribunal Federal não encontrar mecanismo processual para sua reforma,
ficará como formalmente válida no sistema.
Por fim, como o valor utilizado pelo Juiz no momento de sua decisão
judicial é aquele que é ideologicamente214 inerente a toda sociedade; esse valor
eleito pela sociedade necessita estar positivado ou juridicizado pelos sistema, para
poder ser aplicado pelo julgador em sua decisão; por isso, como dissemos, ele será
enunciado prescritivo que compõe a norma de estrutura princípios. Essa é a única
forma de separar a pessoa do julgador da função que ele exerce, é a única forma
também de apresentar os valores dentro de uma teoria positivista e não
jusnaturalista.
3.4.2 Como resolver o problema semântico: Ato de escolha
Vimos então que o problema semântico é inerente à linguagem, que por
sua vez se torna um problema inerente ao próprio direito.
213 De maneira diferente das premissas aqui adotadas escreveu CRISTIANO CARVALHO (2005, p.194) em seu livro sobre Sistema Jurídico: “O Juiz, ao exarar a sentença, toma como ponto de partidao fato concreto que se apresenta, para, então, escolher a norma a ser aplicada e, principalmente,fundamentar sua decisão. Tal fundamentação costuma ser efetuada não apenas levando em
consideração a norma a ser aplicada, como os valores, a cultura e o contexto em que o aplicadoradquiriu ao longo da experiência pessoal e profissional”.214 Ideologia entendida como conjunto de valores de uma sociedade.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 111/211
110
Assim, vaguidade e ambigüidade são problemas inerentes ao próprio
direito, porque a linguagem constrói a realidade para o direito. Por esse motivo, o ato
de escolha também é inerente ao direito, não só sua aplicação, e à própria
constituição pelo poder legislativo, iniciado desde sua origem no Congresso
Nacional.
O homem legislador não é ser Divino capaz de prever todos os fatos
possíveis que devem ou deveriam ser regulamentados por normas; por isso, a
norma, apesar de ser geral (número indeterminado de pessoas) e abstrata (que
prevê reiterada aplicação, não se esgota com a produção da situação hipotética
prescrita215), possui uma abertura semântica para acomodar os fatos que não foram
naquele momento previstos de forma precisa.
HART216, inclusive, comenta em seu livro que
se o mundo em que vivemos fosse caracterizado só por um númerofinito de aspectos e estes, conjuntamente com todos por que sepodiam combinar, fossem por nós conhecidos, então poderiaestatuir-se antecipadamente para cada possibilidade. Poderíamosfazer regras cuja aplicação a casos concretos nunca implicasse umaoutra escolha. Mas, ao final coloca que simplesmente este mundonão é o nosso mundo; os legisladores humanos não podem ter talconhecimento de todas as possíveis combinações de circunstânciasque o futuro pode trazer.
Muitas vezes vemos os aplicadores das normas jurídicas se utilizando de
variações de sentido das palavras jurídicas, e.g. pode-se extrair das lições de
PAULO DE BARROS CARVALHO217:
215
Cf. MELLO, 2007, p. 405.216 HART, 2001, p. 141.217 CARVALHO, P., 2005, p. 19.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 112/211
111
A utilização inadequada de símbolos jurídicos-normativos não se dáapenas com regras de “decreto-leis” ou de “medidas provisórias”,diplomas que por sua própria peculiariedade são vistos com restriçãopela comunidade jurídica. A Lei n. 8.383/91, editada em 31 dedezembro pretendendo vigorar no ano subseqüente, isto é, a partirde 1º de janeiro de 1992, começou a circular, tornando-se pública,tão-só no dia 2 de janeiro.
Ora, segundo o princípio da anterioridade, sua vigência deveria ficarprotraída para o ano seguinte (1/1/1993), uma vez que o sentido de“publicar” é “dar ao conhecimento público”, “tornar o ato conhecidopor todos”, e tal providência veio a realizar-se somente com acirculação, no dia 2 de janeiro de 1992.
Todavia, contra todas as expectativas, o Poder Público Federal
defendeu a tese de que a “impressão” aconteceu em 21/12/1991, oque seria insuficiente para determinar a ciência dos administrados.Por mais absurda que seja a argumentação, o singelo uso “circular”,com o valor semântico de “publicar” modifica o conteúdo designificação do princípio da anterioridade, exatamente no instantemáximo de sua concretude, evitando que genuína concepçãodaquele primado chegue intacto ao plano das condutasintersubjetivas e, desse modo, ameaçando a “segurança jurídica”..
Devido à própria vaguidade e ambigüidade da linguagem, o juiz pratica
um ato de escolha, fazendo uso do significado previamente estabelecido pelas
próprias palavras, levando em consideração os significados que melhor se ajustem
ao contexto do caso sub judice , passando a ser um poder “discricionário” que
encontra “vinculação” dentro dos limites da linguagem e do contexto. HART nesse
particular trabalha com a “textura aberta” do direito que, em termos lingüísticos, é um
maravilhoso mecanismo de abertura para que vários conceitos se apliquem a várioscasos, em suas diferentes formas de repetição218.
218 DWORKIN, criticando a teoria de HART, dizia que esta tratava-se apenas de uma teoria semânticaou baseada em considerações lingüísticas; “o positivista, segundo ele, aceita erradamente que os
mesmos estão fixados por regras lingüísticas, partilhadas pelos juízes e juristas, as quais regulam ouso e, por isso, o significado da palavra “direito”, não só quando esta surge nas afirmações do que éo “direito” de um sistema concreto sobre um ponto concreto, mas também em afirmações acerca doque é “direito”. (HART, 2001, p. 306).
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 113/211
112
O ato de escolha não seria possível, se o sistema não elegesse um órgão
que ficasse no centro do sistema219, resolvendo todo o problema semântico. Os
tribunais desempenham esse papel, e, como o corte do presente trabalho analise
apenas as decisões em controle de constitucionalidade das normas tributárias, o
Tribunal a qual estaremos nos referindo será o Supremo Tribunal Federal.
O único modo de resolver o paradoxo entre linguagens é colocando no
centro do sistema jurídico um órgão jurídico capaz de resolver o paradoxo. Essa
posição é atribuída aos Tribunais, em especial ao Supremo Tribunal Federal, que
são organizações com competências decisórias e atribuição estabelecida por norma
para desempenhar suas funções com adequação exigida pelo sistema jurídico. O ato
de escolha não imprime um timbre de ato político, a escolha aqui é limitada pelo
contexto jurídico.
Assim como as normas positivas pelo legislador são objetos de ato de
escolha, as normas criadas através da decisão dos Tribunais também são atos de
escolha. Os tribunais são os órgãos que possuem função calibradora capaz de dizer
qual será o melhor sentido para os termos jurídicos
Pertinente o pensamento de KELSEN, no sentido de que os Tribunais,
mesmo estando no centro do sistema, devem cumprir o que estatui a norma geral,
deve sempre interpretar dentro dos limites da “moldura ou quadro” da norma
abstrata para a criação de norma concreta. Isso porque KELSEN220 entende que a
norma concreta é a continuação do processo de criação do direito, sendo um
219 Isso porque entendemos que a decisão judicial proferida pelos Tribunais é continuação doprocesso de criação da norma.220 KELSEN, 2006, p. 272.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 114/211
113
limitador da criatividade221. É possível criar desde que dentro da “moldura da norma”,
como veremos agora.
3.5 Decisão Judicial e Criação Jurídica
O direito em sua dinamicidade se recria a todo o instante, parte do geral e
abstrato para o individual e concreto, através do processo de positivação do direito,
em que a linguagem constitui e desconstitui relação jurídicas através da verificação
dos pressupostos da conseqüência que fora determinada pela norma geral, ligando
assim a sanção ao fato através da imputação. Segundo LOURIVAL VILANOVA, “A
decisão judicial é ato que qualifica deonticamente uma situação controvertida”222.
Em uma visão pragmática, conforme ficou consignado no capítulo próprio,
decisão é ato de fala proferido por autoridade eleita pelo sistema. Apresenta-se
como ato de fala, expressão comunicativa produtora de enunciados. Toda norma jurídica é ato de uma decisão, sempre haverá uma decisão que precede uma norma,
e a atividade que a gera é ato de fala. O ato de decidir é complexo e consiste na
prática de aplicação do direito criando norma. Conforme FABIANA DEL PADRE
TOMÉ223: “O ato decisório, sendo criador da norma jurídica, apresenta-se como um
ato de fala, expressão comunicativa produtora de enunciados, ou seja, enunciação”.
Para TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR. 224, todo conflito pede uma decisão
e neste contexto decisão seria, “um ato de fala que soluciona uma questão sem
eliminá-la”. Continua o autor com mestria, dizendo que a decisão tem por finalidade
221 Ibid., p. 265.222
VILANOVA, 1977, p.179.223 TOMÉ, 2005, p. 245.224 FERRAZ JR., 2006, p. 29.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 115/211
114
“absorver inseguranças” e que as decisões “não eliminam alternativas, mas tornam
alternativas indecidíveis em decidíveis”.
Se partirmos do estudo que o juiz é responsável pela dinâmica do direito e
desta feita coloca a cada momento novas normas no ordenamento, não se pode
ignorar que o juiz ao interpretar 225 sempre agirá com certa dose de criação226
normativa. É notório, todavia, que o juiz prefere aplicar a lei existente ao invés de
criá-la. Mas, há casos em que a lei existente se mostra insuficiente ao caso
concreto, obrigando o juiz a criar uma lei nova227.
Assim, o juiz, na sua função de aplicador do direito, ejeta normas no
ordenamento jurídico (normas individuais e concretas, gerais e concretas). E no seu
mistér de criador de norma individual e concreta ou geral e concreta, jamais poderá
atuar como legislador positivo228.
Quando se fala em criação, que a decisão judicial é um ato criativo, nãose pode usar a palavra como algo que nasce, como a criação Divina, e sim como
225 Interessante complementar o pensamento com as palavras de FRANÇOIS OST (2005, p. 180):“Cada um sabe, que qualquer texto escrito é interpretado e o quanto as interpretações são criativas. Ateoria da linguagem demonstrou a inevitabilidade da interpretação; a teoria do direito apropriou-se docaráter normativo da produção jurisprudencial. Se se tornou claro, portanto, que o juiz não se limita arepetir uma norma preexistente, mas contribui para configurá-la (adaptando-a às vezes, às vezescriando-a) […]”226
Não se pode confundir o poder de criação que têm os Tribunais no sistema common law que crianorma geral e abstrata, visto ser o Poder Judiciário o principal órgão emissor de normas. A criaçãoaqui será sempre concreta.227 “Dworkin insiste para que os juízes não criem novos direitos, mas descubram os direitos quesempre existiram, ainda que freqüentemente de modo implícito. Esta argumentação de Dworkin éconseqüente, porque, no âmago, direitos são de natureza moral, portanto, inacessíveis à alteraçãopositivadora”. (GUNTHER, 2004, p. 410.)228 Nesse sentido AG. REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO - RE-AgR 278.466-4 / RS - RIOGRANDE DO SUL, Publicação 06.12.2002, voto do Ministro Maurício Corrêa que relatou: “Por outrolado, no que diz respeito às alegações da empresa, que pretende a declaração deinconstitucionalidade da limitação prevista na lei, importa recordar que a atuação do Poder Judiciáriose dá como legislador negativo, não sendo admissível a declaração de inconstitucionalidade, por
supressão de parte de dispositivo legal, de modo a dar ao ordenamento positivo alcance nãopretendido pelo legislador ordinário e, assim, permitir a compensação de maneira integral. Ademais,se houvesse inconstitucionalidade na norma e essa eiva fosse declarada pelo Supremo TribunalFederal, a decisão não teria o condão de repristinar a norma revogada”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 116/211
115
algo que dependente da vontade humana e dos valores objetivados pelo sistema.
Uma coisa é criar, outra é ser criativo (inovador). Isso porque o juiz deve ser o
seguidor da lei geral e abstrata, pois é dela que se extrai a validade da norma
individual. Deve, então, julgar de acordo com os ditames estabelecidos na norma de
superior hierarquia.
O Tribunal tem o dever de criar a norma jurídica individual, mas seu
conteúdo é muito mais limitado do que o conteúdo concedido ao legislador pela
Constituição. Mas, o julgador pode ser criativo, pois, mesmo limitado, possui umamargem de livre apreciação. Conforme afirma KELSEN, a norma jurídica geral é
uma moldura dentro da qual o órgão julgador (Tribunal) deve criar a norma
individual. É claro que essa moldura poder ser, na expressão de KELSEN, “mais
larga ou mais estreita” dependendo do conteúdo, e.g., quando a norma geral apenas
atribui competência para a criação da norma individual, a moldura é mais larga,
porque o Tribunal deve criar todo o conteúdo da norma jurídica individual229.
Em regra, o Tribunal tem competência para criar uma norma individual. A
norma individual vincula apenas o sujeito de direito à qual ela foi criada. Mas, há
possibilidades de uma certa norma, que foi criada para ser individual, também
vincular casos idênticos, e desse modo a norma individual passa a ser geral. Isso
acontece principalmente no Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de última
instância. É o chamado precedente judicial230. Mas, apenas isso será possível, se
houver uma norma geral que for criada para que casos iguais sejam julgados de
forma igual, o que ocorre no caso de controle de constitucionalidade concentrado ou
do controle difuso na hipótese de Resolução do Senado.
229 KELSEN, 2006, p. 272.230 Ibid., p. 278.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 117/211
116
A conclusão a que se chega é que para KELSEN a decisão judicial dos
Tribunais é a continuação do processo de criação do direto e não uma nova
criação231
. Desse modo, a criatividade até existe, mas de maneira limitada.
É importante deixar claro que o fato de defender a criação dos tribunais e
seu papel perante a textura aberta do direito, os limites da moldura de KELSEN, não
qualifica o pensamento aqui como cético. Não há pretensão alguma em defender
que as normas não existem e o que existe são apenas aquelas aplicadas pelos
tribunais.
3.5.1 O Juiz perante um caso de difícil decisão
Há casos em que se verifica a perfeita subsunção do fato jurídico
tributário à norma geral e abstrata, permitindo ao juiz aplicar o direito criando norma
concreta. Decerto que haverá casos em que o fato jurídico tributário não encontre
perfeito encaixe com a norma geral e abstrata prevista para o caso, pois na norma
geral e abstrata encontram-se apenas fatos conotados, que devido à ambigüidade e
vaguidade da linguagem permitirá mais de uma solução, que ficará sob ponderação
do aplicador do direito.
São os chamados hard cases, que são os casos difíceis apresentados ao
aplicador, decorrentes da “textura aberta” do direito; nesse sentido, interessante a
leitura que Genaro R. Carrió232, realiza da doutrina de HART:
La teoría que puede extraerse o, mejor dicho, extrapolarse de lostextos de Hart publicados desde 1960, según la cual, al enfrentarsecon casos difíciles, los jueces ejercen virtudes típicamente judicialesque no pueden describirse adecuadamente por medio de
231 Ibid., p. 283.232 CARRIÓ, 1990, p. 361.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 118/211
117
expresiones tales como “legislación judicial”, “elección”, “discreción” o“fiat”. Al decidir los casos difíciles los jueces aplican “criterios derelevancia y proximidad de parecidos” que dependen de muchosfactores complejos que se dan a lo largo del sistema jurídico”. Muy amenudo ocurre que, tras esa deliberación, la solución del caso puedepresentarse como natural y aun como necesaria. Pero no hay buenasrazones para sostener que haya siempre una única respuestacorrecta que aguarda ser descubierta; por ende, no tiene sentidoesforzarse por descubrirla. Muchas veces los jueces tienen quesopesar argumentos de fuerza equivalente, todos igualmentefundados en los materiales jurídicos que han guiado susdeliberaciones. A veces la guía puede ser muy tenue.
FABIANA DEL PADRE TOMÉ233 coloca em sua teoria que existem dois
tipos de critérios para decidir, um baseado no livre convencimento que confere a
liberdade plena ao julgador e outro baseado na persuasão racional em que exige
que o julgador sujeite-se às normas jurídicas postas […]. Isso significa que diante de
casos fáceis aplica-se a persuasão racional e, diante dos hard cases, o livre
convencimento limitado pela moldura (vale dizer: valores, conteúdo semântico,
contexto).
No entanto, naquilo que não estiver estabelecido, que estiver
indeterminado, caberá ao “livre convencimento”, que ao nosso ver encontra-se
limitado. A limitação se dará pelo contexto jurídico, pelas palavras e seu uso dentro
do contexto jurídico, pelos valores objetivos comuns à sociedade, pelos princípios
que carregam valores, tudo conforme delimitado neste trabalho.
Na teoria de HART234 que trabalha com a textura aberta do direito, que
são as áreas que os legisladores deixam em aberto na norma para serem
preenchidas pelos tribunais, dizemos então que os tribunais exercem desse modo
233 TOME, 2005, p. 246-250.234 Acrescente HART (2001, p. 149) dizendo que Num sistema em que o stare decisis (Expressão
latina que significa à letra acatar os casos decididos. Esta expressão designa o princípio fundamentaldo direito inglês, segundo o qual, os precedentes são vinculativos, devendo ser seguidos por todos ostribunais quando ocorram no fundo casos semelhantes) é firmemente reconhecido, esta função dos
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 119/211
118
uma função criadora. Hart, quando adverte que o julgador possui discricionariedade
(livre convencimento), esclarece que ela é utilizada à medida que há uma suposta
lacuna no sistema em que o caso concreto não encontra uma solução nas normas
existentes, sendo assim pode-se dizer que a discricionariedade de HART seria a
solução de preenchimento da lacuna. Portanto, não há discricionariedade enquanto
arbitrariedade e ilegalidade, mas enquanto necessidade de cumprimento do dever
de decidir possibilitando a dinamização e transformações do direito. Mas, não se
pode esquecer que mesmo o ato discricionário tem sua competência, finalidade e
forma vinculados, ou seja, mesmo a discricionariedade não pode ser total ao livre
arbítrio do sujeito competente.235
Assim, a discricionariedade do juiz está adstrita ao ordenamento jurídico,
e sua criação está respaldada pelo próprio legislador através dos art. 126 c/c art.
335, ambos do Código de Processo Civil, e art. 4º e 5º da Lei de Introdução ao
Código Civil.
Com relação à “textura aberta”, urge esclarecer que na maioria das vezes
os casos são claros e requerem apenas a aplicação da norma cabível, ou conforme
FABIANA DEL PADRE TOMÉ, na “persuasão racional”236. Repisa-se então que nos
casos difíceis, haverá necessariamente a necessidade de ponderação do juiz, livre
tribunais é muito semelhante ao exercício de poderes delegados de elaboração de regulamentos porum organismo administrativo.235 O ato vinculado é aquele em que a lei não deixa margem de liberdade ao sujeito competente apraticar o ato, todos os elementos estão vinculados ao disposto na lei. Com relação ao atodiscricionário, o ato pode ser praticado com um certo limite de escolha, nos termos da lei, apenas omotivo (oportunidade e conveniência) e o objeto (conteúdo) podem ser livres estando a competência,finalidade e forma sempre vinculados. Segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2007, p.414), “Discricionariedade é liberdade dentro da lei, nos limites da norma legal, e pode ser definidacomo: A margem de liberdade conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o dever
de integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica, diante do caso concreto, segundo critériossubjetivos próprios, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema legal”.236 TOMÉ, 2005, p. 246-250.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 120/211
119
convencimento ou discricionariedade limitada. Mas, como o direito prescreve a
obrigação de decidir conforme a lei, e ainda prescreve uma lei de competência para
o juiz julgar os casos difíceis, mantém afastada a idéia realista de que o direito é
aquilo que os juízes dizem que é. Mas é aquilo que o juízes dizem que é com
embasamento em lei.
Assente que mesmo perante uma zona de penumbra, o julgador não pode
deixar de decidir diante de uma situação concreta. Daqui advém o que HART
denominou de “poder discricionário do Juiz”, que não significa fazer uma escolha
arbitrária nem aleatória ou irracional, mas fundamentada dentro da ordem jurídica
que impõe os limites do poder criativo do juiz.237
Esta é a interpretação parecida que realizou KLAUS GUNTHER sobre o
tema:
Regras jurídicas ostentam, conseqüentemente, uma ‘estruturaaberta’, da qual só será possível obter um ‘paradigma’ paracasos claros, enquanto casos difíceis dependerão da avaliaçãodo juiz. HART não considera as conseqüências dessaindeterminação estrutural de regras jurídicas tão importantesque obriguem a conclusões ceticistas em relação a regras. Oseu argumento é empírico: já que, na maior parte dos casos,conseguimos aplicar regras segundo as condições necessáriase, em geral, suficientes de aplicação ao nosso comportamento;
não precisamos ficar apreensivos pelos poucos casos em queas condições de aplicação não são claras.238
237 DWORKIN propõe um modelo descritivo-justificativo mediante a “casos difíceis” se opondo aHART, sobre a discricionariedade do Juiz e diz através da “tese da resposta certa”, alegando que nãopoderia haver discricionariedade do juiz, pois as partes de um processo têm direito uma soluçãoatravés de direito pré-existente. Pois é possível buscar no sistema solução sem dar margem à criaçãodo juiz, e isso se daria através dos princípios ou políticas; poderia, assim, o juiz chegar à melhor
justificação política possível à decisão, sem criar um novo direito. (DWORKIN, Ronald M. O impériodo direito . Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999, passim.) 238 GÜNTHER, 2004, p. 397.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 121/211
120
Os tribunais usam da função criadora que lhes é deixada pela “textura
aberta” das normas. Mas haverá sempre regras que limitará a decisão, normalmente
representada por um princípio. O juiz continua o processo de positivação da
norma239, pois só a norma concreta pode alterar a realidade, por isso alguns autores
defendem que “norma” é apenas a norma concreta, conforme FRIEDRICH MÜLLER
citado por MARCELO NEVES, que afirma: “norma jurídica só é produzida no
decurso da solução do caso”240. Ressaltamos que a norma concreta é continuação
do processo legislativo, sem tornar o juiz “o único legislador”241, como defende o
Autor alemão.
Como disse HART242, “Um supremo tribunal tem a última palavra a dizer
sobre o que é o direito e, quando a tenha dito, a afirmação de que o tribunal estava
“errado” não tem conseqüência dentro do sistema: não são por isso alterados os
direitos ou deveres de ninguém”
O fato de entendermos que o juiz pode ser criativo não significa dizer que
entendemos que a norma jurídica tributária em sua estrutura formal é desnecessária,
como bem disse HART sobre o ceticismo sobre as regras. Assim fazendo uma
239 KELSEN, 2006, p. 283.240
MÜLLER, Friedrich. Essais zur theorie von Recht und Verfassung . Publ. Ralph Christensen.Berlim: Duncker & Humblot, 1990, p. 273 apud NEVES, 1994, p. 78: “Nesse sentido, Müller define anormatividade em duas dimensões: “normatividade significa a propriedade dinâmica da [...] norma jurídica de influenciar a realidade a ela relacionada (nomatividade concreta) e de ser, ao mesmotempo, influenciada e estruturada por esse aspecto da realidade (normatividade materialmentedeterminda). Se o âmbito normativo, que importa uma função seletiva perante os âmbitos da matériae do caso, não se constitui de forma suficiente, a normatividade do respectivo texto constitucional éatingida. Faltam, então, as condições e os pressupostos para a “produção” da norma jurídica – “querege mediatamente um caso determinado” – e, portanto, da norma de decisão – “imediatamentenormativa, reguladora do caso determinado”. Nesse contexto, não se fala de legislação e de atividadeconstituinte como procedimentos de produção de norma jurídica (geral), mas sim de emissão de textolegal (Gesetzestextgebung ) ou de emissão de texto constitucional (Verfassungstextgebung ). A norma jurídica, especialmente a norma constitucional, é produzida no decorrer do processo de
concretização”.241 Ibid., p. 127 apud NEVES, 1994, p. 78.242 HART, 2001, p. 155.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 122/211
121
leitura de HART, entendemos que mesmo defendendo que os Tribunais têm um
poder final definitivo de dizer o direito, estes só fazem porque existe no sistema uma
norma permissiva dirigida a eles; desse modo, não há uma decisão tomada de forma
intuitiva, como defendiam os céticos sobre as regras. Quando a norma jurídica
individual é criada pelo Tribunal sem a existência de uma norma geral que prescreve
o seu conteúdo, ela deve se fundamentar na norma geral que atribui competência ao
Tribunal.
O juiz jamais poderá, quando constituiu uma sentença de declaração de
inconstitucionalidade, emitir em sua decisão uma norma que substitui a norma
declarada inconstitucional (revogação), isso é fato; pode-se apenas reconhecer a
inconstitucionalidade da norma jurídica tributária e atribuir os efeitos cabíveis, mas
jamais legislar norma abstrata.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 123/211
4 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS TRIBUTÁRIAS E O
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
4.1 Introdução
O controle de constitucionalidade é instrumento que garante a harmonia
do sistema tributário, em que de um lado encontra-se o contribuinte com o dever
jurídico de pagar tributo, para assim contribuir com o funcionamento do Estado (em
sentido lato), e do outro o Estado com o direito subjetivo de cobrar o tributo que
garantirá a arrecadação (efeito fiscal) para suprir as necessidades públicas ou ainda
regular o mercado (efeito extrafiscal), tudo isso em harmonia com o sistema que
necessita garantir a Segurança Jurídica de ambas as partes.
Tarefa árdua foi atribuída ao Supremo Tribunal Federal que no âmbito do
Direito Tributário recebe severas críticas por aqueles que entendem que há
discricionariedade ilimitada. Contudo, nosso posicionamento supre de maneira
científica que não há discricionariedade ilimitada e sim limitada pela lei, pelos
princípios, pela interpretação do contexto jurídico, pelos valores, etc.
Contudo, como veremos no capítulo 5, toda a teoria aqui desenvolvida é
aplicada pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões proferidas em controle de
constitucionalidade, mas, antes de verificamos a aplicação, é importante entender a
posição do Supremo Tribunal Federal e sua função quando se está perante uma
decisão em controle de constitucionalidade.
Para tanto, é necessário entender que o modelo de controle de
constitucionalidade brasileiro é chamado misto, por ter sofrido influências do modelo
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 124/211
123
americano (difuso) e do modelo austríaco (concentrado); na verdade, não é um
simples modelo misto, em que aplicam-se as duas teorias da maneira que foram
concebidas em sua origem, porque no sistema brasileiro os modelos foram
adaptados de modo que pode ser considerado novo modelo.
No modelo americano, assim como no modelo difuso brasileiro, o controle
é exercido de forma incidental, por ocasião da apreciação do caso concreto, mas, no
modelo americano, diferentemente do brasileiro, as decisões proferidas têm força
vinculante chamada stare decisis , diferentemente do que ocorre com o modelo
brasileiro, que necessita de um órgão do Poder Legislativo (Senado Federal) para
assim declarar a decisão proferida pelo Poder Judiciário com efeito vinculante aos
demais órgãos da Administração e do Poder Público. Do mesmo modo, ocorre com
austríaco 243 (de Kelsen), que inspirou o modelo concentrado brasileiro. Que
originalmente na Europa é exercido pelo Tribunal Constitucional244, órgão que não
compõe a estrutura do Poder Judiciário, visto possuir total autonomia com relação ao
Poder Judiciário, inclusive suas decisões tem força de lei 245 ou melhor, norma
abstrata, por este motivo este órgão, Tribunal Constitucional, tem competência para
retirar a norma válida do sistema, sua decisão emite no sistema norma geral e
abstrata e não geral e concreta como vemos no modelo “adaptado” no Brasil.
No modelo americano, os efeitos são inter partes e ex tunc (nulo ab initio
ou ipso jure ); no modelo europeu, são erga omnes e ex nunc (a pronúncia da Corte
Constitucional é de invalidação a partir da data da decisão, assim como ocorre com
243 KELSEN, 2003, p. 306-309.244 “A Corte Constitucional não se encontra inserida como uma nova instância no complexo das
jurisdições ordinárias. Ao revés, desempenha uma função especial – a jurisdição constitucional”(MENDES, G., 2007, p. 14-15.)245 Ibid., p. 11-12.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 125/211
124
a edição de uma lei que deve respeitar os princípios da irretroatividade e do direito
adquirido).246
Por estes motivos, vê-se a confusão em torno do modelo brasileiro, que
não é apenas um modelo misto americano-europeu, mas sim um modelo
brasileiro 247 . Desse modo, qualquer analogia realizada com base no modelo
americano ou europeu deve necessariamente antever estas diferenças para justificar
a posição aqui tomada.
Há vários tipos de controle, os quais por uma questão de corte
metodológico não serão abordados neste trabalho; apenas como lembrança,
podemos citar o controle prévio ou preventivo do Poder Legislativo, Executivo e
Judiciário, além do controle posterior ou repressivo político ou jurisdicional exercido
pelo Legislativo e Executivo248. O que vamos analisar será apenas o controle Judicial
e seus sistemas de controle, concentrado quando for exercido apenas pelo Supremo
Tribunal Federal e difuso quando exercido por qualquer juiz ou tribunal, mas que em
grau de recurso seja decidido em última instância pelo Supremo Tribunal Federal.
As normas objeto de controle de constitucionalidade não serão apenas as
leis emanadas do Poder Legislativo, mas aquelas do Poder Executivo (medidas
provisórias) e ainda aquelas do Poder Judiciário (regimento interno). No caso
246 MARIANO, Cynara Monteiro. Controle de Constitucionalidade e ação rescisória em matériatributária . Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 15.247 É de se notar que não é apenas o Brasil que adotou um sistema próprio com base nos sistemasamericano e europeu; cada País, v.g. Portugal em seu modelo europeu, aliou-se ao modeloamericano com a ressalva à força retroativa das decisões do Tribunal Constitucional em seu art. 282,§ 4º, permitindo que a corte restrinja os efeitos retroativos da decisão, ou seja, adota a teoria deacordo com sua necessidade (CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial da constitucionalidade das
leis no direito comparado . Porto Alegre: Fabris, 1984, p. 115-118.)248 O STF já se manifestou na ADIMC- 221/DF; Rel. Moreira Alves, DJ 22.10.1993 que “o controle deconstitucionalidade da lei ou atos normativos é da competência exclusiva do poder judiciário”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 126/211
125
brasileiro, temos ainda a Emenda Constitucional como o que aconteceu com a ADI
926 e 939, que julgaram a emenda que criou a IPMF249.
4.2 Breve análise histórica evolutiva do controle de constitucionalidade no
Brasil
A Constituição Republicana de 1891 inseriu no contexto brasileiro o
controle de constitucionalidade incidental incidenter tantum, que é mantido até hoje.
Com influência no direito norte-americano, através do controle de constitucionalidade
difuso, qualquer juiz ou tribunal judicial 250 possuía competência para analisar a
constitucionalidade da uma norma que demonstrasse, no caso concreto, prejudicial
ao mérito.
Nas Constituições seguintes, 1934 e 1937, o sistema eleito de
constitucionalidade se manteve com pequenas alterações 251 . Mas, foi na
249 Segundo MENDES, Conrado Hübner. Controle de constitucionalidade e democracia . Rio deJaneiro: Elsevier, 2008, p. 146 (nota de rodapé): “O Supremo Tribunal Federal e o TribunalConstitucional indiano, até onde sei, são os únicos tribunais do mundo a terem declarado ainconstitucionalidade de uma emenda constitucional (agradeço essa constatação ao Prof. DimitriDimoulis). Apesar de outros sistemas constitucionais também preverem cláusula pétreas, o STF foium dos primeiros a ter tido esta ousadia. O curioso é que a Constituição de 1988 não lhe conferiu
esta competência. O art. 102, I, é a base de sua atribuição para exercer a jurisdição constitucional. Noentanto, refere-se apenas ao controle de ‘lei ou ato normativo’. Extrair desta expressão a competênciapara julgar a constitucionalidade de emendas constitucionais parece um razoável desvio daquilo queo constituinte originário lhe reservou”.250 Coloca-se aqui como tribunal judicial para diferenciar dos tribunais administrativos que na minhaconcepção não possuem competência para declarar a constitucionalidade das normas tributárias,visto que sua decisão faz coisa julgada para a administração e no caso de declaração deinconstitucionalidade contra a administração esta não poderia recorrer ao judiciário e teria umadeclaração de inconstitucionalidade declarada por um órgão julgador administrativo, o quedemonstraria uma usurpação de competência. O que os tribunais administrativos podem, assim comoos judiciais, é afastar a aplicação de uma lei em detrimento de outra, ato de escolha que resolve oproblema semântico assim como veremos no item próprio.251
A Constituição de 1934 incluiu a cláusula de reserva de plenário e atribuiu ao Senado Federalcompetência para suspender a eficácia da norma declarada inconstitucional. A Constituição de 1937estabeleceu a possibilidade de o Presidente da Republica influenciar as decisões do Poder Judiciárioque declarassem inconstitucional determinada lei ou ato normativo.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 127/211
126
Constituição de 1946, com a Emenda Constitucional nº 16 de 1965, que a ação
direta de inconstitucionalidade de competência originária do STF foi inserida no
ordenamento. Desse modo, o Supremo Tribunal Federal passou a ter competência
para processar e julgar originariamente a inconstitucionalidade das normas (lei ou
ato normativo), federal ou estadual, de legitimação exclusiva do Procurador Geral da
República. Também foi essa Emenda Constitucional que estabeleceu que poderia
haver controle de constitucionalidade concentrado no âmbito federal.
A Constituição de 1967 retirou do ordenamento a regra estabelecida pela
Constituição anterior (mas, a EC 1/69 previu o controle de constitucionalidade de lei
municipal, em face da Constituição Estadual apenas para fins de intervenção no
município). Contudo, a Constituição de 1988 restabeleceu a ação direta de
inconstitucionalidade de competência originária do STF e ampliou o rol das pessoas
legitimadas252 para a propositura da ação no controle concentrado.
Além disso, foi na atual Constituição253, de 05 de outubro de 1988254, que
evoluindo para um sistema misto (controle concentrado e difuso) criou a
possibilidade do controle de constitucionalidade das omissões legislativas “ADI por
Omissão”, quando se trata de controle concentrado, e “Mandado de Injunção”,
252 Vide art. 103 da Constituição Federal de 1988.253 Cf. NEVES (1994, p. 160-161), “A falta de concretização normativo-jurídica do texto constitucionalestá associada à sua função simbólica. […] Em face da realidade social discrepante, o modeloconstitucional é invocado pelos governantes como álibi: transfere-se a “culpa” para a sociedadedesorganizada. […] Ao nível da reflexão jurídico-constitucional, essa situação repercuteideologicamente, quando se afirma que a constituição de 1988 é “a mais programática” entre todas asque tivemos e se atribui sua legitimidade à promessa e esperança de realização no futuro: “apromessa de uma sociedade socialmente justa, a esperança de sua realização […] na medida emque se ampliam extremamente a falta de concretização normativa do documento constitucional e,simultaneamente, o discurso constitucionalista do poder, intensifica-se o grau de desconfiança noEstado. A autoridade pública cai em descrédito”.254 Publicada no Diário Oficial da União nº 191-A.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 128/211
127
quando se trata de controle difuso. Assim como a criação da argüição de
descumprimento de preceitos fundamentais – ADPF255.
Mas, a expressiva alteração foi a redução da competência do Supremo
Tribunal Federal, em face da existência do controle difuso. De toda sorte, foi dado a
esse órgão a incumbência de “Guardião da Constituição”.
Nesse contexto, já podemos perceber que a Constituição tem um papel de
extrema relevância, pois nela se guarda toda a expectativa de uma sociedade e,
quando o sistema elege um órgão como “guardião de todas as expectativas de uma
sociedade”, imputa a este órgão uma responsabilidade e um poder imensurável.
Como modo de controle desse “poder imensurável”, o próprio sistema
tentou traçar procedimentos de delimitação da conduta atribuindo à Constituição
uma forma de alteração bastante rígida256. Ou seja, o sistema elegeu o Supremo
Tribunal Federal como órgão principal controlador de constitucionalidade, mas traçou
limites para que o mesmo pudesse assim proceder. Em face dessas disposições,
sempre haverá um “limite” a ser respeitado pelo Tribunal em sua função de controle
de constitucionalidade da regra-matriz de incidência tributária, qual sejam as
próprias normas constitucionais, aí incluídos os princípios constitucionais (norma de
255 A ADPF, que não será objeto deste trabalho, tem como hipótese de cabimento evitar ou repararlesão a preceito fundamental ou quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucionalsobre lei ou ato normativo federal. Encontra-se no art. 102, parágrafo 1º da CF/88, que foi declaradode eficácia limitada pelo STF AGRPET -1140/TO, relator ministro Sydney Sanches, DJ 31.05.1996, eque por este motivo foi regulamentado pela lei 9.882/99.256 “No Estado Brasileiro a Constituição tem características rígidas, ou seja, sua alteração depende derequisitos rigorosos (exige-se proposta de um terço dos membros de uma das Casas do Parlamento -
art. 60, I; ou do Presidente – II; ou de mais de metade da Assembléia Legislativas de cada unidadefederativa, mediante maioria relativa de seus membros – III) e apenas será aprovada a emenda seobtiver, em ambas as Casas do Congresso, “três quintos dos votos dos respectivos membros” (§ 2ºdo art. 60 da CF)” OLIVEIRA, R., 2008. p. 24.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 129/211
128
estrutura) em especial as cláusulas pétreas 257 estatuídas no art. 60 § 4º da
Constituição Federal de 1988.
Desse modo, a idéia de controle de constitucionalidade surge junto com o
tipo de Constituição de cada País. A forma de alteração rígida258, apresentada pela
Constituição brasileira, serve como requisito essencial de controle das normas
jurídicas tributárias.
Prescreve o art. 60, § 4º da Constituição Federal de 1988 259 o
procedimento de controle dos atos normativos, ou seja, como poderá a Constituição
ser emendada. Isso porque a forma de alteração rígida pressupõe um processo
severo e solene 260 de emendas, tais como se apresentam do modo como
disciplinado no citado dispositivo constitucional.
257 Chamada de regra superconstitucional por MENDES, C., 2008, passim e VIEIRA, Oscar Vilhena. A
Constituição e sua reserva de justiça . São Paulo: Malheiros, 1999, passim.258 Podemos destacar que, além da forma de alteração a CF/88, também pode ser analisada quanto àsua origem: promulgada; quanto à forma: escrita; quanto ao conteúdo: formal; quanto ao modo deelaboração: dogmático-sistemática. Tais, análises não serão elaboradas para não tornar o trabalhopredominantemente constitucional.259 Art. 60 - A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se,cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
§ 1º - A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado dedefesa ou de estado de sítio.
§ 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos,considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.
§ 3º - A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e doSenado Federal, com o respectivo número de ordem.
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;IV - os direitos e garantias individuais.260 A única forma de mudar a ordem jurídica vigente seria através de uma revolução social.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 130/211
129
Veremos então a relevância do papel da Constituição em uma sociedade
e mais ainda a responsabilidade dos Tribunais em interpretar as normas tributárias
diante da função constitucional de controle de constitucionalidade dos atos
normativos, vez que terá que interpretar e através dessa interpretação escolher a
única e melhor forma de regular condutas intersubjetivas.
Esse é o panorama geral colocado de forma sucinta do controle de
constitucionalidade das normas ou atos normativos tributários. Desse modo, o
Supremo Tribunal Federal, órgão eleito como “Guardião da Constituição”, analisará a
compatibilidade da norma tributária válida com a Constituição para então
“declarar261” sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade.
4.3 Controle Difuso de Constitucionalidade
O controle de constitucionalidade chamado difuso é assim nomeado
porque leva em consideração o aspecto subjetivo, permitindo que qualquer juiz ou
tribunal de maneira “difusa” possa reconhecer a inconstitucionalidade de uma lei ou
ato normativo de acordo com suas regras de competência.
Via de regra, o controle difuso é realizado via incidental ou de exceção,
através de incidente processual, também conhecido como concreto, haja vista que
as partes e a matéria encontram-se individualizadas. Percebe-se que há uma certa
confusão com a nomenclatura nos textos doutrinários, usando-se um termo pelo
outro, como se tratassem da mesma coisa.
261 Já nos posicionamos que o termo declarar é impróprio, pois entendemos decisão judicial como atode fala ilocunionário; desse modo, não apenas declara, mas constitui uma situação de fato.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 131/211
130
Sob o ponto de vista formal, será incidental ou de exceção, isto é, a
questão da inconstitucionalidade será analisada antes do mérito da ação; e sob o
ponto de vista subjetivo, será difuso uma vez que qualquer juiz ou tribunal pode
exercer seu controle.
Isso porque originalmente apenas o réu poderia pleitear o reconhecimento
da inconstitucionalidade da lei tributária como matéria de defesa perante uma
obrigação tributária advinda de uma norma inconstitucional. Hoje não mais subsiste
apenas como tese de defesa, podendo ser utilizada pelo autor da demanda, que não
quer se sujeitar aos efeitos da norma tributária inconstitucional.
No sistema de controle incidental, haverá necessariamente uma norma
individual e concreta objeto de pretensão resistida em que, para se chegar ao mérito
da questão, há necessariamente que resolver o problema incidental que é a
constitucionalidade ou não da lei que institui ou majorou o tributo. O juiz ou o
tribunal, verificando a existência de norma tributária inconstitucional, poderá
reconhecer a inconstitucionalidade por meio de sentença para depois passar ao
mérito da ação.
Nesse sentido, esclarece BUZAID262:
O exame sobre a inconstitucionalidade representa questãoprejudicial, não a questão principal debatida na causa; por isso o juiznão decide principaliter , mas incidenter tantum , pois ele não figuranunca como objeto do processo e dispositivo da sentença.
Pode-se dizer que, com o controle difuso, todos os órgãos do poder
judiciário fazem parte da chamada justiça constitucional. Desse modo, é uma via de
262 BUZAID, Alfredo. Da ação direta de declaração de inconstitucionalidade no direito brasileiro . SãoPaulo: Saraiva, 1958, p. 23-24.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 132/211
131
acesso a todas as pessoas, visto que não terem um rol de legitimado para propor a
ação, como vemos no controle concentrado que será estudado no item 4.4.
Em termos históricos, o controle de constitucionalidade difuso teve início
através do famoso caso julgado pelo Juiz John Marshall, da Suprema Corte dos
Estados Unidos que, em 1803, analisando o caso Marbury versus Madison, decidiu
que é nula qualquer lei que não seja compatível com a Constituição, inaugurando
desse modo o controle de constitucionalidade e destacando a supremacia da
Constituição263. Segundo OSCAR VILHENA VIEIRA264, “Este poder de controlar a
compatibilidade das leis com a Constituição decorre, assim, da jurisprudência
americana e não de uma autorização positivada de forma expressa pelo
constituinte”.
Nessa espécie de controle, o pedido de inconstitucionalidade será a
causa de pedir próxima. Isso porque em matéria tributária temos que o pedido
principal é o não pagamento do tributo, ou ainda a repetição dos valores pagos por
com suporte em uma lei que deve ser reconhecida como inconstitucional. Não se
pede como pedido principal a declaração da inconstitucionalidade, apesar de ser a
causa de pedir, não é o pedido (mediato ou imediato).
No controle difuso não só autor e réu podem alegar a
inconstitucionalidade, mas o Ministério Público quando esteja atuando na causa
(como parte ou custos legis ), os terceiros (litisconsorte, assistente e interveniente) e
ainda o próprio magistrado de ofício em qualquer grau de jurisdição.
263 Para melhor conhecimento sobre o tema, ler BARROSO, Luís Roberto. Controle deConstitucionalidade no Direito Brasileiro : exposição sistemática da doutrina e análise crítica da
jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 3-10.264 VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremo Tribunal Federal. Jurisprudência política. 2. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 1994, p. 66.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 133/211
132
Outra diferença do controle concentrado é que qualquer lei pode ser
objeto de controle via incidental, ou seja, uma lei federal, estadual ou até municipal
pode ter sua constitucionalidade questionada em um litígio. E até mesmo os
regulamentos, a resoluções e as portarias. No controle concentrado, apenas lei
federal e estadual.
Toda vez que ocorrer de forma incidental, o pedido de declaração de
inconstitucionalidade o tribunal ad quem que estiver julgando a matéria tributária
deve suscitar uma questão de ordem que deve ser analisada pelo pleno ou órgão
especial265 a chamada “cláusula de reserva de plenário”, instituída pelo art. 97 da
Constituição Federal, apenas ficando dispensado do disposto no art. 97 da
Constituição Federal, se já houve decisão do órgão especial, pleno ou Supremo
Tribunal Federal sobre a mesma matéria; nesse caso, pode ser inconstitucionalidade
declarada e reconhecida pelos demais tribunais de plano.
4.3.1 Princípio da Reserva de Plenário
Nos Tribunais, a declaração de inconstitucionalidade deve respeitar o
princípio da reserva de plenário; isso significa que a inconstitucionalidade de uma lei
somente pode ser declarada pela maioria absoluta dos membros, assim dispõe o art.
97 da Constituição Federal de 1988:
Art. 97 - Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros oudos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais
265
Cf. RE 179170-CE, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 30.10.1998, “Ora, em se tratando deinconstitucionalidade de norma jurídica a ser declarada em controle difuso por Tribunal, só podedeclará-la, em face do disposto no artigo 97 da Constituição, o Pleno dele ou seu Órgão Especial,onde este houver, pelo voto da maioria absoluta dos membros de um ou de outro”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 134/211
133
declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do PoderPúblico.266
O princípio de reserva de plenário também deve ser observado no
controle concentrado. Desse modo, nenhum órgão fracionário, turma, seção ou
câmara pode declarar a inconstitucionalidade de norma tributário incompatível com a
constituição, a não ser, é claro, que a inconstitucionalidade da mesma norma já
tenha sido reconhecida pelo plenário ou órgão especial. O órgão fracionário apenas
poderá reconhecer a inconstitucionalidade e encaminhar o processo ao plenário, ou
câmara especial para que este declare a inconstitucionalidade; nesse período de
tempo, o processo ficará suspenso no órgão fracionário.
Após a decisão do pleno ou órgão especial, o processo retoma ao órgão
fracionário com a decisão de constitucionalidade ou inconstitucionalidade da norma,
para que o órgão fracionário se aplique ao caso. A única exceção é dos processos
que estão sendo julgados pelo Supremo Tribunal Federal; após o plenário decidir
sobre a inconstitucionalidade, o processo não retorna ao órgão fracionário, a decisão
será julgada diretamente pelo plenário. Da decisão do pleno ou órgão especial não
cabe recurso, apenas poderá ser questionada no recurso contra a decisão de mérito
do processo.
O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante, em razão da
freqüência com que órgãos fracionários dos Tribunais reconheciam indiretamente a
inconstitucionalidade de lei ou dispositivo:
Súmula Vinculante 10 - Viola a cláusula de reserva de Plenário (CF/artigo 97), a decisão do órgão fracionário de Tribunal que, embora
266 Veja procedimento prescrito pelo Código de Processo Civil, art. 480 ao art.482. No caso do STFverificar os arts. 176 a 178 do Regimento Interno.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 135/211
134
não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou atonormativo, do poder Público, afasta sua incidência, no todo ou emparte.
Após o procedimento de declaração de inconstitucionalidade por maioria
absoluta, será feito o comunicado ao Senado Federal.
4.3.2 Resolução do Senado
Declarada a inconstitucionalidade de uma lei pelo Supremo Tribunal
Federal, através de decisão definitiva, respeitando os ditames do artigo 97 da
Constituição Federal (maioria absoluta do pleno do Supremo Tribunal Federal), deve
a decisão ser submetida ao Senado Federal em respeito ao que dispõe o art. 52,
X 267 da CF e o art. 178 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal
(RISTF)268 e art. 386 do Regimento Interno do Senado Federal269.
Isso porque, em controle difuso de constitucionalidade, a declaração que
reconhece a inconstitucionalidade por sentença atinge apenas as partes envolvidas
267 Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
[…]
X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisãodefinitiva do Supremo Tribunal Federal;268 Art. 178 - Declarada, incidentalmente, a inconstitucionalidade, na forma prevista nos artigos 176 e177, far-se-á a comunicação, logo após a decisão, à autoridade ou órgão interessado, bem como,depois do trânsito em julgado, ao Senado Federal, para os efeitos do Art. 42, VII, da Constituição.269 Art. 386. O Senado conhecerá da declaração, proferida em decisão definitiva pelo SupremoTribunal Federal, de inconstitucionalidade total ou parcial de lei mediante:
I – comunicação do Presidente do Tribunal;
II – representação do Procurador-Geral da República;
III – projeto de resolução de iniciativa da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
Art. 387. A comunicação, a representação e o projeto a que se refere o art. 386 deverão serinstruídos com o texto da lei cuja execução se deva suspender, do acórdão do Supremo TribunalFederal, do parecer do Procurador-Geral da República e da versão do registro taquigráfico do julgamento.
Art. 388. Lida em plenário, a comunicação ou representação será encaminhada à Comissão deConstituição, Justiça e Cidadania, que formulará projeto de resolução suspendendo a execução dalei, no todo ou em parte.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 136/211
135
no processo, contudo, sendo a matéria analisada de grande importância,
necessitando que os efeitos deixem de atender apenas as partes para atender a
todos os contribuintes que estão sob a égide da mesma lei, poderá o Senado
Federal editar resolução.
A resolução do senado é ato político e, desse modo, não é obrigatório, ou
seja, o senado poderá ou não suspender o ato normativo, no todo ou em parte, de
acordo com sua conveniência e oportunidade. Isso porque o Senado é órgão do
poder legislativo, e o legislador está investido de interesses políticos (o juiz não).
Se decidir por editar a resolução, fica restrito à decisão do Supremo
Tribunal Federal, ou seja, se a declaração do Supremo Tribunal Federal for total, a
suspensão através de resolução também deve ser total, se for parcial, idem, deve
obedecer ao que dispôs a decisão do Tribunal. Contudo não foi o que ocorreu com a
Resolução do Senado nº 71/05 que teria o condão de solucionar a divergência que
havia entre o fim do prazo do decreto 491/69 (crédito prêmio do IPI), se tivesse sido
editada nos exatos termos da decisão, que não ocorreu gerando mais dúvidas e
divergências com relação ao fim do prazo do Crédito- Premio do IPI. O tema não
será abordado visto que a decisão ocorreu no âmbito do Superior Tribunal de
Justiça, tribunal que não está sendo analisado.
A resolução poderá ser declarada de lei estadual, municipal ou federal e
ainda de atos normativos declarados inconstitucionais.
O que se discute atualmente é se realmente há necessidade da resolução
do senado para dar efeito vinculante e eficácia erga omnes ; nesse sentido, houve
manifestação do ministro Gilmar Mendes na Reclamação Constitucional 4.335- AC,
que alega que o art. 52, X da CF teria sofrido mutação constitucional.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 137/211
136
4.3.3 Efeitos da Decisão
Os feitos deverão ser analisados com relação às partes, ao tempo e aos
próprios órgãos. Assim, no controle difuso das normas tributárias, tendo em vista
que o processo será de um caso concreto em que as partes serão individualizadas
os efeitos só atingirão as partes do processo, o chamado inter partes e quanto ao
lapso temporal ex tunc .
Somente após a publicação da Resolução do Senado, a decisão que
reconheceu a inconstitucionalidade da norma tributária de modo incidental, passará
a ter efeitos, erga omnes (contra todos) e ex nunc (não retroage).
Com relação ao efeito vinculante, como vimos, este apenas poderá ser
produzido na hipótese de Resolução do Senado; antes da Resolução, a declaração
de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal em controle difuso
não vincula os demais órgãos da Administração Pública e do Poder Judiciário.
4.3.3.1 Modulação dos efeitos em Controle Difuso
A modulação dos efeitos da decisão, em controle difuso, é a possibilidade
de a decisão com efeitos ex tunc passar a ter efeitos ex nunc , ou seja, os efeitos não
retroagem à data da edição da lei inconstitucional, mas tão somente serão aplicados
a partir da data da declaração de inconstitucionalidade, ou seja, a partir do trânsito
em julgado ou em outro momento que venha a ser fixado pelo julgador que o faz
desde que haja razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social.
A permissão legar para a modulação dos efeitos encontra-se no art. 27 da
Lei 9868/98, que aplica-se apenas à ação direta de inconstitucionalidade, ou seja,
em controle de constitucionalidade concentrado. Desse modo, não há norma no
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 138/211
137
sistema que autorize a modulação em controle difuso. Daí advém a discussão
doutrinária da possibilidade de se aplicar o art. 27 da Lei 9868/98 às ações que não
sejam em sede de controle de constitucionalidade concentrado: ADI e ADC,
modulando assim os efeitos temporais da decisão.270
No âmbito tributário, vemos que a tentativa de modulação dos efeitos da
decisão vem sendo intentada até mesmo quando não há declaração de
inconstitucionalidade de norma, mas o Supremo Tribunal Federal nesse sentido tem
sido cauteloso, apesar de o assunto ainda não está pacificado na doutrina; por este
motivo, o tema é várias vezes referenciado no decorrer do trabalho.
4.3.4 Transcendência dos motivos determinantes da decisão
Vimos, portanto, que no controle difuso de constitucionalidade a causa de
pedir é a declaração de inconstitucionalidade da norma jurídica tributária e não o
pedido. Desta feita, a matéria de mérito não é a inconstitucionalidade da lei e sim a
não incidência da relação jurídica tributária, desenhada regra-matriz de incidência
tributária.
Consideramos que as sentenças e acórdão judiciais (veículos introdutores
de norma) compõem-se formalmente de três partes essenciais, conforme dispõe o
art. 458 do Código de Processo Civil: (i) Relatório: mera descrição fática, que
conterá os nomes das partes, o resumo do pedido, registro dos acontecimentos
processuais; (ii) Motivação ou Fundamentação: em que o juiz analisará os motivos
270 O ministro Gilmar Mendes já admitiu na decisão de julgamento da Ação Cautelar 189 do RE197.917 que em sistema difuso ou incidental pode haver controle de constitucionalidade commitigação dos efeitos, ou efeitos para o futuro.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 139/211
138
de fato e de direito que justificarão sua conclusão, a ausência da motivação é causa
de nulidade absoluta, é elemento essencial do ato jurisdicional, haja vista que sua
ausência acarreta a nulidade da sentença, a teor do artigo 93, inciso IX da CF; (iii)
Dispositivo: é a conclusão da decisão em que o juiz resolve a questão a qual foi
submetido. Na parte dispositiva que serão aplicados os efeitos da decisão ( inter
partes , vinculante ) fazendo coisa julgada, sua ausência é motivo de inexistência da
sentença.
Exemplificando, na decisão de controle de constitucionalidade em controle
difuso de uma norma tributária inconstitucional, temos: (i) Relatório: contribuinte e
Fisco; contribuinte pleiteia o não pagamento do tributo, por entender que
incidentalmente a lei X que instituiu o tributo é inconstitucional; (ii) Fundamentação:
na análise da questão incidental declara-se a inconstitucionalidade da lei X que
instituiu o tributo; (iii) Dispositivo: O contribuinte não deve pagar o tributo. Apenas aparte dispositiva da decisão faz coisa julgada.
Isso ocorre porque a declaração de inconstitucionalidade não era o pedido
da ação mas tão somente a causa de pedir; desta feita, os efeitos da declaração
apenas atingirão as partes envolvidas, tudo porque a fundamentação da sentença
não faz coisa julgada, não vincula os demais órgãos, servindo apenas de
pressuposto para análise da matéria meritória. Segundo dicção do art. 469 do
Código e Processo Civil que segue:
Art. 469 - Não fazem coisa julgada:
I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance daparte dispositiva da sentença;
II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença;
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 140/211
139
III – a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentalmente noprocesso.
A falta de vinculação dos motivos da decisão ao demais órgãos do Poder
Judiciário e da Administração Pública acarreta a inaplicabilidade da interpretação
conforme a Constituição; nesse sentido, concorda CELSO RIBEIRO BASTOS271. A
incorporação da fundamentação é a única forma de resolver o problema. Como
defendia em 1995 MERLIN CLÈVE272: “Parece ser inevitável conferir-se às referidas
decisões uma eficácia vinculante que se estenda para além do dispositivo,alcançando também a fundamentação da sentença […]”.
PEDRO LENZA273, discorrendo sobre o assunto, conclui que
Há que se observar, contudo, a distinção entre ratio decidendi e obterdictum . Obter dictum são os comentários laterais, de passagem, quenão influem na decisão. Portanto, não vinculam para fora doprocesso. Por outro lado, a ratio decidendi é a fundamentação queensejou aquele determinado resultado da ação. Nessa hipótese, oSTF vem entendendo que a “razão da decisão” passa a vincularoutros julgamentos.
Assim a transcendência dos motivos determinantes seria reconhecer a
eficácia vinculante não apenas da parte dispositiva da decisão mas também os
fundamentos ratio decidendi , conforme destaca o Inf. STF 379
O plenário do Supremo Tribunal Federal, no exame final da Rcl1.987/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, expressamente admitiu apossibilidade de reconhecer-se, em nosso sistema jurídico, a
271 BASTOS, 1997, p. 171.272 CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização Abstrata de Constitucionalidade no Direito Brasileiro .São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 178.273
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado . 11. ed. São Paulo: Método, 2007, p. 202.“Como exemplo, no julgamento da ADI 3345/DF que reduziu o número de vereadores de todo o país,o SFT entendeu que a Suprema Corte conferiu “efeito transcendente aos próprios motivosdeterminantes que deram suporte ao julgamento plenário do RE 197.917’”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 141/211
140
existência do fenômeno da ‘transcendência dos motivos queembasaram a decisão’ proferida por esta Corte, em processo defiscalização normativa abstrata, em ordem a proclamar que o efeitovinculante refere-se, também, à própria ‘ratio decidendi’ projetando-se, em conseqüência, para além da parte dispositiva do julgamento,‘in abstracto’, de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade.
A autoridade de coisa julgada que alcança a parte dispositiva da decisão
apenas se aplica quando há declaração em controle concentrado (ADI ou ADC274),
visto ser objeto principal da ação. Oportuno lembrar que a decisão de procedência
da ação nada impede que os legitimados da ação recorram novamente ao STF,
propondo uma nova ação, por motivos diferentes ou até por mudança no contexto
social. Mas é claro que poderá o STF rejeitar a ação se entender que os motivos da
improcedência continuam os mesmos, invocando o que já foi decido sobre a matéria.
Em matéria tributária, não há nenhum precedente de transcendência dos
motivos determinantes, mas, em razão da forte tendência de abstrativação do
controle difuso, fazem-se necessários os apontamentos, visto que uma decisão de
inconstitucionalidade em matéria tributária certamente não interessa apenas às
partes envolvidas e sim a todos os demais contribuintes que se encontram sob a
incidência da lei inconstitucional; uma possível vinculação de uma decisão inter
partes aos demais órgãos e Tribunais garante a posição do Supremo Tribunal
Federal como “guardião da Constituição”. Desse modo, só terá efeitos vinculantes se
transcender os motivos da decisão inter partes .
274 Lei 9.868/99, art. 24: “Proclamada a constitucionalidade, julga-se-á improcedente a ação direta ouprocedente eventual ação declaratória; e proclamada a inconstitucionalidade, julga-se-á procedente aação direta ou improcedente eventual ação declaratória”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 142/211
141
4.4 Controle Concentrado de Constitucionalidade
O controle concentrado surgiu na Áustria influenciado por Kelsen275 e se
estendeu por toda a Europa, atribuindo a guarda da Constituição a um único órgão,
diferentemente do sistema americano estudado no controle difuso.
O controle concentrado é aquele que tem um órgão apenas, que
concentra através de uma competência originária o controle de constitucionalidade;
no caso brasileiro, o Supremo Tribunal Federal. Analisado sob o critério formal, pode
ser via principal, por isso chamado de abstrato ou direto.
No controle abstrato, a análise da constitucionalidade será o objeto
principal da ação. Desse modo, não um conflito de interesses a ser solucionado pelo
juiz. A função do julgador é atípica, ou seja, “A ação direta destina-se ao julgamento,
não de uma relação jurídica concreta, mas da validade da lei em tese”.276
Via de regra, o controle concentrado é exercido pelo sistema por via de
ação direta, principal ou abstrato. No controle das normas tributárias, não
encontramos nenhum exemplo que possa trazer exceção à regra, ou seja, que seja
concentrado por via de exceção, mas bem comenta PEDRO LENZA277 que
No direito brasileiro, como exceção a regra do controle concentrado eabstrato de constitucionalidade, podemos pensar em situação naqual o controle será concentrado (em órgão de cúpula, com
275 “Não se ignora, porém, que esse sistema inclinou-se sobretudo para a solução de conflitos decompetência entre federação e seus estados membros, já que o acesso ao Tribunal Constitucionalestava franqueado apenas ao governo federal, quanto às normas dos Lander , e aos governosregionais, quanto às normas da federação”. (TAVARES, André Ramos. Tribunal e Jurisdição
Constitucional . São Paulo: Celso Bastos Editor, 1998, p.15.)276 ADInMC 1.434-SP, rel. Min Celso de Mello.277 LENZA, 2007, p. 172.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 143/211
142
competência originária), mas incidental, discutindo-se a questão deconstitucionalidade como questão prejudicial ao objeto principal dalide.
Por isso dizemos que a ação direta é um instrumento de proteção da
Constituição, que evita que uma norma incompatível com o Texto Maior venha a se
instalar no sistema de maneira a gerar insegurança jurídica.
A declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto é uma
técnica judicial que consiste em que o Supremo Tribunal Federal declare algumas
hipóteses de incidência da norma sem mexer em seu suporte físico, porque a norma
está lacunosa ou muito ampla e geral.278
Poderá haver ainda controle de constitucionalidade concentrado das
normas federais e estaduais no plano Federal, de competência do Supremo Tribunal
Federal (art. 102, I, a); e ainda das normas estaduais e municipais no plano
Estadual, cuja competência é atribuída ao Tribunal de Justiça (art. 125, parágrafo
2º).
No controle concentrado, os órgãos legitimados agem no interesse de
uma sociedade, beneficiando a todos que estão sob a égide da lei, diferentemente
do que ocorre no controle difuso, como acabamos de ver.
As decisões em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e Ação
Declaratória de Constitucionalidade (ADC) têm caráter dúplice, o que significa dizer
que a procedência de ADI equivale à improcedência da ADC; desse modo, a
278 RE nº 83.119/SC, rel. Min. ILMAR GALVÃO: “TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE OLUCRO DECORRENTE DE EXPORTAÇÕES INCENTIVADAS.EXPRESSÃO: “CORRESPONDENTE
AO PERÍODO-BASE DE 1989", CONTIDA NO CAPUT DO ART. 1º DA LEI Nº 7.988, DE 28 DEDEZEMBRO DE 1989, ENQUANTO REFERIDA AO INC. II DO MESMO DISPOSITIVO.Inconstitucionalidade que se declara, sem redução de texto, por manifesta incompatibilidade com o
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 144/211
143
improcedência de ADI corresponde à procedência da ADC: no primeiro caso,
decisão pela inconstitucionalidade; no segundo, pela constitucionalidade. Passemos
à análise de cada ação.
4.4.1 Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)
A ação direta de inconstitucionalidade (ADI) é aquela que tem como
objeto a norma geral e abstrata entendida como inconstitucional. Por ser uma ação
sem partes, autor-réu, lide, direitos controversos envolvidos alguns princípios como o
contraditório à ampla defesa não são aplicados. Dessa maneira, doutrinariamente
existe posição no sentido de não se tratar de uma ação, mas sim de um remédio
constitucional de controle legal.
A defesa da ADI será feita pelo advogado geral da União, conforme
prescreve, art. 103, § 3º; o mesmo funciona como defensor da presunção de
constitucionalidade, mas nada impede que se oponha à lei manifestando pela sua
inconstitucionalidade279.
Os legitimados, ativos para a propositura da ação, segundo o art. 103, Inc.
I ao IX, são divididos em dois grupos pela doutrina: os primeiros são chamados
universais, que são aqueles que podem propor a ação a qualquer hipótese:
Presidente da República, as mesas do Senado e da Câmara, o Procurador Geral da
República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e os partidos
políticos com representação no Congresso Nacional; e os legitimados especiais, que
são aqueles que só podem propor a ADI se a norma ou lei impugnada tiver relação
direta com seus interesses jurídicos ou de seus filiados, os quais são: o Governador
art. 195, § 6º, da Constituição Federal (princípio da anterioridade mitigada). Recurso não conhecido”(DJ 14.02.97).
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 145/211
144
do Estado, a Mesa de Assembléia Legislativa, confederação sindical ou entidade de
classe de âmbito nacional. Também teremos a presença obrigatória do Procurador
Geral da República, que deverá emitir parecer sendo ou não autor do pedido e a
presença facultativa do amicus curie (órgão ou entidade, terceiros na ação que tenha
interesse quando a matéria tenha relevante discussão).
Na ADI, os legitimados passivos são os órgãos responsáveis pela
elaboração da lei, que se pretende ver inconstitucional. Podem ser objeto de ADI
emenda constitucional (ADI 939, rel. Min. Sydney Sanches), lei complementar, lei
ordinária, lei delegada, medida provisória (reedição ou conversão em lei quando
mantida a mesma redação não prejudica a ação), decreto legislativos e resoluções,
decretos autônomos (que inova autonomamente a ordem jurídica com força de lei),
legislação estadual e tratados internacionais.
Apenas atos normativos e leis federais ou estaduais podem ser objeto da
ação direta de constitucionalidade (não cabe contra ato judicial). Com relação às leis
municipais, não podem ser argüidas via ADI, apenas via de exceção em controle
difuso, mesmo porque seria inviável ao Supremo Tribunal Federal analisar a
inconstitucionalidade em controle concentrado de mais de cinco mil municípios.
No Brasil, em direito tributário, temos um caso raro: a declaração de
Inconstitucionalidade de uma Emenda Constitucional. Isso porque neste caso o
magistrado age contra a vontade de uma maioria qualificada, três quintos do
Congresso Nacional280. Nesse sentido, podemos concordar com VIEIRA 281 : “Ao
decidir sobre a constitucionalidade ou não de uma emenda à Constituição o
279 ADI 3.082- DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence e ADI 1.616-4 – PE, rel. Min. Maurício Corrêa.280 No mesmo sentido, VIEIRA, 1999, p. 233.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 146/211
145
magistrado deve sentir-se submetido a uma pressão ainda mais forte, por parte do
princípio democrático, do que quando decide sobre a constitucionalidade de uma lei
ordinária”.
No dispositivo da ação direta de inconstitucionalidade a causa de pedir é
o enunciado da lei (que se afirma em desconformidade com a Constituição); e o
pedido o objeto da ação direta de inconstitucionalidade, acórdão constitutivo da
inconstitucionalidade da lei.
4.4.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) por Omissão
É modalidade de ação direta de inconstitucionalidade, que visa à
declaração pelo Supremo Tribunal Federal de uma omissão, um não fazer legitimado
pela Constituição.
Isso significa dizer que a Constituição prevê um comando que obriga a
atuação positiva de determinado Poder ou órgão competente editar lei ou ato
normativo, sem o qual o comando Constitucional não pode ser eficaz ou é
parcialmente eficaz (omissão total ou parcial). Assim, a declaração do Supremo
Tribunal Federal é no sentido de que o Poder Público ou órgão da Administração
Pública sane sua inércia e edite a lei ou ato normativo omisso282.
Não é qualquer inércia do Poder Legislativo que configura
inconstitucionalidade por omissão e sim uma omissão constitucionalmente ilegítima,
pois sabe-se que legislar é um ato discricionário do Poder Legislativo.
281 VIEIRA, 1999, p. 233.282 Em controle difuso, temos o mandado de injunção que visa determinar que direitos e garantias
assegurados pela Constituição sejam regulamentados pelos sujeitos competentes. Nesse caso, emface da omissão constitucional a parte poderá pleitear ao Juiz que seja garantido o seu direito degozo que tenha sido privado em decorrência da omissão. O tribunal poderá determinar que a parteassim procede sem estar ferindo a separação de poder, pois aqui haverá uma decisão concreta.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 147/211
146
O Supremo fica vinculado ao pedido da ação, mas não fica vinculado à
causa de pedir, que pode, tendo em vista sua função de Guardião da Constituição,
analisar a norma objeto da ação com relação a todo o sistema.
Esse tipo de ação vem suprir as lacunas normativas (conforme vimos no
capítulo III item 3.3), nos casos em que a Constituição impõe ao Poder Legislativo a
edição de normas necessárias à efetivação do comando Constitucional. Desse
modo, nas hipóteses em que a edição de uma lei é necessária para o comando
normativo constitucional sua omissão é caso típico de inconstitucionalidade por
omissão. Por isso, não há que se dizer aqui em usurpação de competência entre
judiciário e legislativo, pois o judiciário só está atuando nos casos em que a
Constituição já previa mandamento no mesmo sentido, sem que isso interfira na
separação de poderes.
Os legitimados para a propositura da ação serão os mesmo elencados no
art. 103 da CF (assim como ocorre com a ADI), os quais estão divididos em
universais e especiais: os primeiros são aqueles que podem propor a ação a
qualquer hipótese: Presidente da República, as mesas do Senado e da Câmara, o
Procurador Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil e os partidos políticos com representação no Congresso Nacional; e os
legitimados especiais que são aqueles que só podem propor a ADI se a norma ou lei
impugnada tiver relação direta com seus interesses jurídicos ou de seus filiados, a
chamada pertinência temática, os quais são: o Governador do Estado, a Mesa de
Assembléia Legislativa, confederação sindical ou entidade de classe de âmbito
nacional.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 148/211
147
Com relação à legitimidade passiva será o próprio órgão ou pessoa que
deveria ter editado a lei que a Constituição elegeu e não cumpriu o comando
Constitucional.
Na ação direita de inconstitucionalidade por omissão será proferida uma
decisão judicial reconhecendo a inércia de um órgão administrativo competente ou
um Poder legitimado pelo sistema para edição de uma norma jurídica tributária. A
decisão apenas reconhece a inércia, mas não aplica qualquer tipo de sanção,
servindo apenas como uma comunicação. A única sanção possível seria a
estabelecida no art. 37 § 6º da CF283. Vale notar que o art. 103, § 2º da CF,
estabelece:
§ 2º do art. 103 - Declarada a inconstitucionalidade por omissão demedida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência aoPoder competente para a adoção das providências necessárias e,
em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.
Registra-se assim uma diferença com relação ao sujeito passivo, que
sendo um Poder (Legislativo, Executivo ou até mesmo Judiciário) não haverá sanção
para eventual descumprimento. O Supremo Tribunal Federal apenas dá ciência aos
Poderes para que tomem as providências. Mas, se for um órgão administrativo,
deve-se respeitar o que estatui o art. 103 § 2º. Nesse sentido, é a lição de
BARROSO284 :
Pela literalidade da previsão do art. 103 § 2º, são duaspossibilidades. Se o sujeito passivo na ação for um dos Poderes, opedido é limitado a que lhe seja dada ciência da ocorrência da
283 “Art. 37 - § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.284 BARROSO, 2008, p. 244.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 149/211
148
omissão inconstitucional, para a adoção das providênciasnecessárias. Embora o STF já tenha admitido a fixação de prazo,ressaltou que se tratava de mera indicação, sem estabelecerconseqüências para o caso de eventual descumprimento. Por outrolado, sendo a omissão imputável a um órgão administrativo , adecisão terá caráter de uma verdadeira ordem , cabendo a ele adotaras providências necessárias no prazo de trinta dias, sob pena deresponsabilização.
A doutrina faz distinção entre a omissão inconstitucional total e parcial,
embora na constituição ou em normas infralegais não faça a distinção. A omissão
total é aquela em que há uma abstenção completa do Poder ou órgão pública da
edição de lei que a Constituição manifestou a necessidade de edição para prática de
algum direito; isso dependerá se a norma é auto-aplicável: sendo o Supremo
Tribunal Federal, poderá fazê-la incidir sem a norma omitida e, não sendo o Tribunal,
terá que declarar a mora legislativa do órgão responsável para que a norma seja
editada. A omissão parcial é aquela em que o legislador atuou de modo insuficiente
ou deficiente; o exemplo mais emblemático que não é tributário, mas serve apenas
para fins didáticos, é a declaração de inconstitucionalidade por omissão parcial do
salário mínimo, ADI 1.458-DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence. Mesmo que os valores
estabelecidos não cumpram com as exigências constitucionais (art. 7º, IV, CF), o
Poder Judiciário fica mitigado a exigir que o Poder Público edite um valor de salário
mínimo que cumpra as exigências constitucionais sem interferir nas políticas
públicas.
Esse tipo de Ação não tem prazo prescricional, e sua decisão de
constitucionalidade possibilita que em outro momento a norma possa se tornar
inconstitucional e o Supremo precise apreciar novamente sua inconstitucionalidade.
Nesse sentido, também concorda CLÈVE285.
285 CLÈVE, 1995, p. 161.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 150/211
149
4.4.3 A Declaratória de Constitucionalidade (ADC)
A ação declaratória de Constitucionalidade é aquele que pleiteia ao
Supremo Tribunal Federal uma decisão que imprima “timbres de
constitucionalidade286” a uma norma que possua questionamento de compatibilidade
com o sistema Constitucional no qual está inserida.
A presente ação tem como objetivo que o Supremo Tribunal Federal
reconheça expressamente que a norma infraconstitucional extraiu seu fundamento
de validade da Constituição, sendo com ela compatível, uma vez que haja no âmbito
judicial interpretações divergentes. Assim, o pedido se restringe ao reconhecimento
da constitucionalidade, uma vez que haja controvérsia judicial que ponha em dúvida
a validade da norma infraconstitucional federal. A controvérsia judicial, com decisões
divergentes, é imprescindível para que o Supremo não se torne órgão de consulta de
validade de normas infraconstitucionais, vindo então a servir a declaração como
instrumento de segurança jurídica em um sistema em que se verifique a dúvida da
norma infraconstitucional que sacou seu fundamento de validade da Constituição
Federal.
Isso porque todas as leis possuem presunção de validade e apenas no
caso de questionamento dessa validade é que pode o supremo se pronunciar sobre
o caso. Assim como a Ação Direta de Inconstitucionalidade, a Ação Declaratória de
Constitucionalidade é ação objetiva sem partes e sem contraditório, apesar de
permitir que outros interessados apresentem pareceres para defenderem sua
posição de inconstitucionalidade.
286 TAVARES, 1998, p. 100.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 151/211
150
Na questão de ordem levantada na ADC nº 1-DF, suscitou-se pelo
Supremo Tribunal Federal justamente as questões de constitucionalidade da própria
ação declaratória de constitucionalidade (ADC) e seus procedimentos, que
posteriormente foram disciplinados pela Lei nº 9.868, em 10 de novembro de 1999.
Os legitimados para a propositura da ação são os mesmos da ADI após a
emenda Constitucional 45/2004, ou seja, os sujeitos prescritos no art. 103, Inc. I ao
IX. Não há necessidade de que a ação seja proposta contra (sujeito passivo) o órgão
que elaborou a lei, da mesma forma não há atuação do Advogado Geral da União,
apenas do Procurador Geral da Republica, diferentemente do que ocorre com a ADI,
como vimos. Proposta a ação, não poderá mais desistir do pedido.
A ação declaratória de constitucionalidade (ADC) perante o Supremo
Tribunal Federal apenas pode ter como objeto lei ou ato normativo federal, sendo os
da mesma natureza da ação direta de inconstitucionalidade (ADI), ou seja: emenda
constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei delegada, medida provisória
(reedição ou conversão em lei quando mantida a mesma redação não prejudica a
ação), decreto legislativo e resoluções, decretos autônomos (que inovam
autonomamente a ordem jurídica com força de lei) e tratados internacionais .
Na parte dispositiva do acórdão da ação declaratória de
constitucionalidade, a causa de pedir é o enunciado da lei, e o pedido, a declaração
de que a lei está em conformidade com a Constituição. A Ação Declaratória de
constitucionalidade visa que a lei seja mantida no ordenamento jurídico como válida.
Na Ação Declaratória de Constitucionalidade, não há processo de
conhecimento, e portanto não há que se falar em análise dos fatos da incidência,
assim como já mencionado. O objetivo é que a sentença enuncie que a norma
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 152/211
151
pertence ao ordenamento jurídico. Também é oportuno destacar que não há efeito
condenatório, porque não se conhece dos fatos, não podendo constituir direitos
subjetivos, também não se exige atribuição de valor à causa, indicação de provas ou
requerimento de citação e nem identificação do réu, visto que inexiste defesa.
A decisão que reconhece a Constitucionalidade da norma também gera
efeito vinculante aos órgãos do Judiciário e do Executivo, apesar de não ter havido
mudança na situação normativa, que antes era válida, vigente e eficaz e, com a
declaração na ação declaratória de constitucionalidade, continua com o mesmo
status ; mesmo assim, gera efeito vinculante, pois em um dado momento houve
dúvida da validade da lei e a confirmação deve vincular os demais órgãos.
No caso de não reconhecimento do pedido de constitucionalidade e
declarando-se que a norma é inconstitucional, apesar do nome declaratória , constitui
uma nova situação de fato, ou seja, cria uma nova norma ou uma segunda norma, a
norma declarada inconstitucional continua existindo, mas tem sua vigência e eficácia
suspensa, continua válida. Tanto é verdade que todas as normas individuais e
concretas que se criaram com fundamento de validade da norma agora
inconstitucional necessitam de uma nova norma para retirar sua validade.
4.4.4 Medida Cautelar
Como medida de caráter excepcional, o pedido de Medida Cautelar é
cabível em Ação Direita de Inconstitucionalidade, assim como na Ação Declaratória
de Constitucionalidade, sempre após uma análise prévia e superficial do pedido,
devendo para tanto apresentar a plausibilidade jurídica da tese exposta, a
possibilidade do perigo em decorrência da demora da decisão, a possibilidade de
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 153/211
152
serem os danos irreparáveis, a necessidade de garantir a ulterior eficácia da decisão
prevista no ordenamento.
A concessão do pedido cautelar gera um efeito vinculante ao próprio
Supremo, que deve suspender o curso de mais processos sob a mesma matéria em
andamento, mas a denegação do pedido não traz efeitos aos demais processos.
Também a jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal vem entendendo que
tem efeito vinculante aos demais órgão do Poder Judiciário e da Administração
Pública287.
Também a concessão terá eficácia erga omnes e será concedida com
efeito ex nunc , mas de acordo com a lei 9.868/99 em seu art. 11 § 1º, o Supremo
Tribunal Federal poderá dar-lhe eficácia retroativa, se assim entender.
O art. 10 e seguintes da Lei 9.868/99 prevê a possibilidade de deferimento
de medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade, desde que seja por
maioria absoluta de seus membros (onze ministros), prevendo ainda a possibilidade
de eficácia erga omnes (contra todos) e efeito ex nunc , salvo se o Tribunal entender
que deverá conceder eficácia retroativa (ex tunc ).
Em seu turno, o art. 21 do mesmo dispositivo legal, prevê do mesmo
modo a possibilidade de deferimento de medida cautelar na Ação Declaratória de
Constitucionalidade, desde que seja por maioria absoluta de seus membros, para
que os juízes e os Tribunais suspendam, até o julgamento final, os processos que
envolvam a aplicação da lei ou ato normativo objeto da ação. A suspensão perdurará
por apenas 180 dias para que a ação declaratória seja julgada pelo tribunal; caso a
ação não seja julgada dentro dos 180 dias, a eficácia da medida cautelar será
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 154/211
153
suspensa. O cabimento de liminar em ADC foi pacificado através do julgamento da
ADC - 4.
Em tratando de Ação Direta de Inconstitucionalidade, o Art. 11, § 2º da lei
9868/99, alega que “A concessão da medida cautelar [em ADI] torna aplicável a
legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido
contrário”. Esse artigo foi um dos mais criticados e encontra-se com dois pedidos de
Inconstitucionalidade 288 , ADI 2.258-0 e ADI 2.154-2. Isso porque, declarada
inconstitucional uma lei que tenha revogado uma lei anterior, a decisão de
revogação restaura a norma revogada, o que não acorrerá caso haja “expressa
manifestação em sentido contrário” do Supremo Tribunal Federal. A Corte poderá
nesse caso entender que a lei que fora revogada pela norma declarada
inconstitucional padeça também de inconstitucionalidade e assim não atribuir efeito
repristinatório à norma revogada.
4.4.5 Efeitos da Decisão em Controle Concentrado
Os efeitos de uma decisão proferida nos processos subjetivos (difuso), de
praxe só alcançam as partes do processo. Mas, no caso das ações objetivas (de
controle concentrado) em que as partes não atuam em interesse próprio, agindo
como substituto processual (atuam em nome próprio mas em interesse da sociedade
em geral), os efeitos desse modo não podem ser inter partes , mas, sim, devem ser
erga omnes .
287 MC na Reclamação 2.256-1, rel. Min. Gilmar Mendes.288 Este artigo, juntamente com o art. 27, encontra-se com dois pedidos de Inconstitucionalidade um
ADI 2.258-0 interposto pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, distribuído em04.08.2000 e outra ADI 2.154-2 interposta pela Confederação Nacional das Profissões Liberais –CNPL, distribuída em 22.2.2000, ambas com relatoria do Min. Menezes Direito, com pedido de vistada Min. Cármen Lucia.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 155/211
154
O efeito erga omnes é aquele de natureza subjetiva que alcança todas as
pessoas sob a égide da lei, independente de serem parte de um processo.
A decisão que declara a inconstitucionalidade ou não de uma ADI é
irrecorrível, cabendo apenas Embargos de Declaração do requerente ou requerido.
A decisão gera efeitos retroativos, ex tunc , mas, devido ao excepcional interesse
social e razões de segurança jurídica, o Supremo poderá restringir os efeitos da
decisão. Também são vinculantes e erga omnes .
Na ADI por omissão, quanto aos efeitos são os mesmos vinculante e erga
omnes da ADI, apenas os efeitos temporais não podem retroagir ao momento inicial
da ausência de norma, ou seja, da data da promulgação da Constituição ou no dia
seguinte ou um mês, mesmo porque nunca saberíamos qual seria o exato momento
em que a norma deveria ter sido editada.
4.4.5.1 Diferença entre nulidade ex tunc e anulabilidade ex nunc
O tema da nulidade e anulabilidade merece comentários, haja vista que,
em se tratando de controle concentrado, não há dispositivo atribuindo
expressamente eficácia ex tunc às decisões proferidas no controle jurisdicional de
constitucionalidade, “jurisprudência e doutrina sempre se orientam no sentido da
nulidade ipso jure da lei declarada inconstitucional”289, quer seja no bojo de um
julgamento de procedência da ADI ou improcedência da ADC. Os argumentos
doutrinários recorrem o precedente do caso Marbury versus Madison do modelo de
controle de constitucionalidade americano que foi incorporado ao modelo brasileiro,
o qual argumentava que, se assim não fosse, haveria uma afronta direta ao princípio
da supremacia da Constituição.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 156/211
155
Contudo, o sistema de controle de constitucionalidade austríaco de
Kelsen entendia que as leis inconstitucionais são apenas anuláveis 290 , seriam
válidas até que um órgão competente declarasse sua inconstitucionalidade, porque
no sistema austríaco o controle de constitucionalidade era exercido pela Corte
Constitucional que era um órgão com função legislativa, por isso sua declaração de
inconstitucionalidade retirava a validade de uma lei.
A nulidade é a condição da norma, que uma vez reconhecida como nula
deixa de surtir efeitos desde sua origem. A anulabilidade, por sua vez, deixa de surtir
efeitos desde o momento do seu reconhecimento, não retroagindo a sua origem e
sim a partir da data do reconhecimento. O reconhecimento da nulidade ou
anulabilidade, segundo a doutrina, tem relação com o ato declaratório ou
constitutivo, gerando respectivamente os efeitos ex tunc , ex nunc .
Com a adoção da teoria da linguagem, em que todos os atos são
constituídos pela linguagem, a ação direita de inconstitucionalidade ou ação
declaratória de constitucionalidade de fato nada declaram, mas, sim, constitui uma
nova situação de direito. Desta feita, não faremos essa ligação entre os efeitos
declaração (ex tunc) e constituição (ex nunc).
A decisão em ADI e ADC produzirá efeitos contra todos (erga omnes ) e
terá efeitos ex tunc , retroagindo desde a data da lei que fora “declarada”
inconstitucional ou constitucional, além dos efeitos vinculantes em relação aos
órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual, municipal e
distrital.
289 MARIANO, 2006, p. 30.290 KELSEN, 2006, p. 290-299.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 157/211
156
4.4.5.2 Modulação dos Efeitos em Controle Concentrado
A regra geral em controle de constitucionalidade concentrado é que os
efeitos da decisão são: erga omnes e ex tunc. Com o advento da lei 9.868 de 10 de
novembro de 1999 que introduziu a técnica já edificada no direito alemão e
português da “declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade”, a
vigente regra de que é nula a lei declarada inconstitucional em controle de
constitucionalidade encontra-se atualmente com a ressalva legal estabelecida pelo
art. 27 da referida lei.
Isso porque, entendendo o Supremo Tribunal Federal, por maioria
qualificada de 2/3 de seus membros que em razões de segurança jurídica ou
excepcional interesse nacional, os efeitos da nulidade da decisão poderão ser
restritos ao trânsito em julgada da declaração (ex nunc ) ou ainda em outro momento
que será fixado pelo julgador. Assim prescreve a lei 9.868/99291:
Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, etendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcionalinteresse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria dedois terços de seus membros, restringir os efeitos daqueladeclaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seutrânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
A modulação dos efeitos em tese se aplica apenas nas ADI, não se
aplicando na ADC, mesmo porque assim estabelece o art. 27 da lei 9.868/99;
contudo, acreditamos que nada impede que os efeitos da ADC sejam modulados no
291 No mesmo sentido, art. 11 da lei 9.882/99 que trata do julgamento da Argüição deDescumprimento de Preceitos Fundamentais, que não será abordada neste trabalho.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 158/211
157
caso de grande repercussão em que se comprove a necessidade com base na
segurança jurídica e no excepcional interesse social.292
Outra crítica que se levanta com a questão da polêmica modulação dos
efeitos da decisão é que mais uma vez o poder de “temporalizar o tempo” fica com o
Supremo Tribunal Federal, mas não se pode esquecer que esse poder encontra-se
limitado a um quorum qualificado; desse modo, exigência em modular os efeitos
mediante dois terços dos membros do Tribunal, demonstrando que todo poder é
limitado.
Vemos que não é sempre o Supremo Tribunal Federal aplica o
dispositivo, que exige razões de segurança jurídica ou excepcional interesse
social 293 . Por isso que bem esclarece BARROSO 294 : “Aliás, a rigor técnico, a
possibilidade de ponderar valores e bens jurídicos constitucionais não depende de
previsão legal”.
Faz-se necessário lembrar que o referido artigo 27 da lei 9.868/99,
encontra-se com dois pedidos de declaração de Inconstitucionalidade ADI 2.154-2 e
ADI 2.258-0, que até a presente data295 encontra-se no gabinete da Min. Cármen
Lúcia com pedido de vista.
292 MOUSSALLEM, 2005, p. 150.293 O último precedente encontrado foi da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3458, ajuizada peloConselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que, por decisão unânime, o Plenáriodo Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucionais, as normas instituídas em 2004 pelo estado deGoiás que dispõem sobre o sistema de conta única de depósitos judiciais. A decisão tambémmodulou os efeitos da decisão da data da decisão que foi em 21.02.2008, para que ela passe a seraplicada apenas 60 dias depois da sua publicação. Essa solução foi proposta pelo relator da ADI,ministro Eros Grau, com objetivo de dar ao governo de Goiás tempo suficiente para desarmar osistema por ele estruturado, em que a administração dessa conta estava subordinada à Secretaria
estadual de Fazenda.294 BARROSO, 2008, p. 118.295 ADI 2.258-0, 14.08.2008.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 159/211
158
Finalizamos, parafraseando MOUSSALLEM296, na passagem de Chronos
da mitologia grega, que diz: “o direito controla o tempo jurídico-lingüístico ao seu bel-
prazer: Em suma, o direito temporaliza o tempo”.
4.4.5.3 Efeito Vinculante
Efeito vinculante é aquele que obriga aos demais órgãos do Poder
Judiciário, bem como pela Administração Pública direta e indireta, nas esferas
federal, estadual e municipal (art. 102 § 2º da CF), a acatar a decisão proferida pelo
Supremo Tribunal Federal. No mesmo sentido, discorre o art. 28, parágrafo único da
lei 9.868/99.
art. 28, parágrafo único – A declaração de constitucionalidade ou deinconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme aConstituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade semredução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante emrelação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Públicafederal, estadual e municipal.
O supremo Tribunal Federal está inexoravelmente vinculado às decisões
por ele produzida em controle abstrato de constitucionalidade, só poderá rever seus
posicionamentos nos casos de significativa mudança das circunstâncias fáticas ou
relevante alteração das concepções jurídicas dominantes297. Note-se que a decisão
não vincula os órgãos do Poder Legislativo, pois, desse modo, haveria um
engessamento do Poder Legislativo.
Nessa mesma linha de raciocínio, uma determinada lei tributária, num
dado momento histórico, pode ser declarada constitucional em sede de ADC, e,
futuramente, após mudança na realidade fática ser declarada inconstitucional por
296 MOUSSALLEM, 2005, p. 150.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 160/211
159
meio de ADI. Mas, simples mudança dos membros do tribunal não enseja alteração
de lei já apreciada anteriormente. Nesse sentido, foi o voto do Min. Carlos Mário
Velloso no julgamento de QO na ADC 1-DF:
a declaração de constitucionalidade da lei não impede, a meu ver,diante de alteração das circunstâncias fáticas ou da realidadenormativa, a propositura da ação direta de inconstitucionalidade.Penso que está é uma posição que a Corte constitucional deveassentar. É que, como foi dito: hoje, a lei pode ser constitucional,amanhã, não.
O instrumento cabível caso não seja respeitado o efeito vinculante da
decisão pelos tribunais ou órgão da administração pública é a Reclamação ao
Supremo Tribunal Federal, previsto no art. 102, I, L, da CF, para que se garanta a
autoridade com força vinculante da decisão.
Com relação ao efeito vinculante, urge consignar que várias hipóteses
podem ser encontradas nas demais instâncias do poder judiciário, no caso de
reconhecimento em controle difuso da constitucionalidade da norma, conflitando
assim com o reconhecimento da inconstitucionalidade em controle concentrado, e
havendo o efeito vinculante da decisão proferida em controle concentrado:
(i) com prazo para recurso: o contribuinte deve pleitear a reforma da
sentença de primeiro grau ou tribunal com base no reconhecimento da
inconstitucionalidade em controle concentrado298;
(ii) sem prazo para recurso, mas com prazo para ação rescisória (art. 495
CPC): deverá o contribuinte propor ação rescisória com base no art. 485,
297 RE 105.012-8, rel. Min. Nery da Silveira, DJ 01.07.1988.298 Cabe inclusive em matéria de embargos de declaração, quando for a decisão deinconstitucionalidade, conforme art. 741 e 745 do Código de Processo Civil.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 161/211
160
V do CPC “violar literal disposição de lei”, no prazo de dois anos da
decisão transitada em julgado, haja vista a não aplicação da súmula 343
no caso de controle de constitucionalidade, requerendo nova norma
individual e concreta com efeito revogatório para desconstituir a decisão
anteriormente proferida (nesse caso, se proferida a decisão em ação
rescisória com base na decisão de inconstitucionalidade em controle
concentrado), a nova sentença retira a validade da sentença anteriormente
proferida (norma individual e concreta, desconstituindo norma individual e
concreta), lembrando que, se no curso da declaração de
inconstitucionalidade houver medida cautelar com efeito vinculante e
eficácia erga omnes, o prazo decadencial da ação rescisória se suspende
também;
(iii) sem prazo para recurso e sem prazo para ação rescisória (art. 495 CPC):
nada poderá ser feito pelo contribuinte que é detentor de uma decisão que
está sob o manto da coisa julgada, que, com base no princípio da
segurança jurídica, representa para o ordenamento jurídico limites
processuais (assim como: decadência, direito adquirido, ato jurídico
perfeito), e, nesse caso, “Permanecem no sistema, mas com outro
fundamento de validade, tais quais a coisa julgada, o ato jurídico perfeito e
o direito adquirido” 299 . Há controvérsia doutrinária a esse respeito
daqueles que defendem que o prazo de dois anos é contado da data da
publicação da ADI ou ADC, mas essa não é a posição que adotamos,
mesmo porque aqueles que defendem que caberia ação rescisória mesmo
fora do prazo de dois anos motivam-se por razões que transcendem o
299 LINS, 2005, p. 240.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 162/211
161
campo do direito, principalmente do direito tributário, e.g ., prejuízo
financeiro;;
(iv) não havendo decisão, mas apenas norma individual e concreta do
contribuinte que ainda não seja objeto de demanda judicial, poderá o
contribuinte requerer ação de repetição de indébito dos últimos 5 anos.300
4.5 O Supremo Tribunal Federal órgão jurídico ou político?
Sem delongas, não nos privaremos da afirmação contundente que o
Supremo Tribunal Federal é órgão jurídico e não político. Vários são os motivos que
nos levam à afirmação.
Primeiro porque é órgão que compõe o Poder Judiciário, não é órgão
autônomo com função legislativa. Sua decisão deve ser com bases jurídicas. Todo o
desempenho em decidir é inerente ao Poder Judiciário, terá que analisar as normas
do sistema jurídico, dentre elas os princípios, terá que fazer uma interpretação
constitucional sistematizando todo o ordenamento jurídico, terá que valorar de forma
objetiva levando em conta os valores de uma sociedade e não valores pessoais, terá
que respeitar as formas estabelecidas pelo sistema para julgar (relatório,
fundamentação e dispositivo).
O Poder Legislativo, sim, pode ser considerado órgão político, pois sua
função é de representante de uma nação. Seus membros representam um ideal
político – partidário. A função legiferante, o Poder Legislativo, é considerado fonte do
direito, vez que introduz no ordenamento jurídico normas introdutoras e introduzidas.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 163/211
162
Ou seja, mesmo com toda sua “falta de técnica jurídica” (porque na maioria das
vezes não são operadores do direito) são os responsáveis pela dinâmica do direito,
alimentando o sistema jurídico com o ingresso de normas formalmente válidas no
sistema (desde que tenha competência e tenha respeitado a procedimento
estabelecido para a função). Normas que possuem presunção de validade em
decorrência do dogma do “legislador racional” 301 . Desse modo, seguindo o
raciocínio, no caso de uma norma que em termos formais ou materiais não respeitou
a constituição, deve ser “despolitizada 302 ” e juridicizada pelo controle de
constitucionalidade, ou seja, adequada aos termos jurídicos, apenas um órgão
jurídico poderia desempenhar esse papel.
Diferentemente do que ocorre com o legislador o ministro do Supremo
Tribunal Federal não está vinculado a interesses políticos partidários, além de ser
detentor de “notório saber jurídico” sua fundamentação, por mais que tenha signos
do sistema político (na linguagem luhmanniana, código político governo-oposição,
código econômico ter-não ter) é sempre jurídica.
Por isso, coube a competência ao Judiciário decidir sobre a
constitucionalidade das normas, por ser órgão jurídico, representante do Poder
Judiciário. Não se pode apenas analisar os efeitos da decisão que por óbvio atinge
todos os Poderes (Executivo, Legislativo e o próprio Judiciário), bem como os
setores econômicos, políticos e sociais. Do mesmo modo, não se pode partir do
300 Neste sentido ver estudo de LINS, 2005, p. 248.301 O legislador racional segundo SAMPAIO, Tércio. Introdução ao Estudo do Direito . 4. ed. SãoPaulo: Atlas, 2003, p. 280-281, “Trata-se de uma construção dogmática que não se confunde com olegislador normativo, nem com legislador real. É uma figura intermediária, que funciona como umterceiro metalingüístico, em face da língua normativa (LN) e da língua realidade (LR)”. O Autor
resume as propriedades com base em Santiago Nino, quais são: trata-se de uma figura singular,permanente, único, consciente, finalista, omnisciente, justo, coerente, omnicompreensivo, econômico,operativo e preciso.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 164/211
163
pressuposto que o Supremo Tribunal Federal é órgão político sob argumento de que
os legitimados para propor a ADI ou ADC são órgãos políticos, ou que a nomeação
dos Ministros se realiza por meio do Presidente da República303
, chefe do Executivo,
após sabatina do Congresso, e por esse motivo seria um órgão político, mesmo
porque não se pode esquecer que mantém os ministros do Supremo independência
funcional em relação ao executivo e ao legislativo, vitaliciedade, inamovibilidade, ou
seja, prerrogativas inerentes a qualquer magistrado. Além das virtudes judiciais,
denominadas por HART, que são: imparciabilidade e neutralidade ao examinar as
alternativas.
Para Celso Fernandes Campilongo304 :
A representação política tem estruturas, funções e técnicas deatuação que não lhe permitem substituir ou suprir as deficiências elacunas dos sistemas econômico e jurídico. A economia e o direito,
por sua vez, operam em bases que não se confundem com as dapolítica. É evidente a enorme relação entre estes sistemas. Mas issonão significa que um determine o outro. Política, economia e direitopodem trocar prestações, mas nunca atuar com lógicasintercambiáveis. Dito de outro modo: os sistemas sociais particularessão funcionalmente isolados e, por isso, só podem serautocontrolados e auto-estimulados. Só a política pode reproduzir osistema político.
A confusão muitas vezes é da própria Constituição Federal que é
instrumento multitemático que “deve abarcar conteúdos políticos, econômicos e
sociais, constituindo-se o reflexo da realidade 305 ”. As matérias delimitadas na
302 Termos utilizados por MENDES, C., 2008, p. 157.303 Art. 101 da CF de 1988: “O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidosdentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notávelsaber jurídico e reputação ilibada”. Parágrafo único. O Ministros do Supremo Tribunal Federal serãonomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta doSenado Federal”.
304 CAMPILONGO, Celso Fernandes. A Crise da representação política e a Judicialização da política.In: O Direito na Sociedade Complexa . São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 75.305 OLIVEIRA, R., 2008, p. 25.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 165/211
164
Constituição uma vez seja objeto de decisão pelo Supremo Tribunal Federal torna-se
jurisdicizada. Os efeitos finais da decisão podem até ser políticos, econômicos e
sociais, pois, em se tratando de matéria tributária, em que os interesses antagônicos
entre Contribuinte e Pessoas Políticas de Direito Publico (União, Estados,
Municípios, Distrito Federal), os efeitos podem ser políticos ou na maior parte
econômicos, mas o processo de decisão, a elaboração da decisão terá que respeitar
o ordenamento jurídico, os limites impostos pela norma (moldura), tendo em vista a
textura aberta. Apesar de não existir disposição expressa no ordenamento jurídico
de que o Supremo Tribunal Federal não possa dar decisões políticas como fez a
constituição de 1934 em seu art. 68. Pois um juiz, mesmo analisando o contexto
extrajurídico, não pode se esquivar do direito e das premissas jurídicas aqui
estabelecidas quando estiver decidindo.
A Constituição para o sistema político é um instrumento político tanto da
política instrumental quanto da política simbólica, e para o sistema jurídico é uma lei
fundamental. Segundo Luhmann306, a Constituição é uma reação à diferenciação
entre direito e política, ou dito com uma ênfase ainda maior, à total separação de
ambos os sistemas de funções e à conseqüência necessidade de uma religação
entre eles (riallacciamento ) 307.
306 LUHMANN, Niklas. A Constituição como Aquisição Evolutiva. Trad. Prof. Menelick de CarvalhoNeto. [Orig. ZAGREBELSKY, Gustavo; PORTINARO, Píer Paolo; LUTHER, Jorg (orgs.). Laconstituzione come acquisizione evolutiva. In: II futuro della constituzione . Torino: Einaudi, 1996), p. 3.307 NEVES (1994, p. 66-67): “A inexistência de Constituição juridicamente diferenciada conduz – nasociedade altamente complexa e contingente do mundo contemporâneo, não orientada por umamoral compartilhada globalmente e válida em todas as esferas da vida – à manipulação políticaarbitrária do Direito, o que impede sua positivação. A uma legislação ilimitada, que tem comoconseqüência a quebra da autopoiese do sistema jurídico, isto é, a alopoiese da reprodução dacomunicação jurídica, opõe-se à forma interna de hierarquização através da validade supralegal doDireito Constitucional”. A “validade e o sentido do Direito Constitucional depende da atividade
legiferante e da aplicação concreta do Direito. A interna hierarquização ‘Constituição/Lei’ atua comocondição da reprodução autopoiética do Direito moderno, serve, portanto, ao seu fechamentonormativo operacional. Nesse sentido, enfatiza Luhmann que a “Constituição fecha o sistema jurídico,enquanto o regula como um domínio no qual ela mesma reaparece”. “Sob esse ângulo, pode-se
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 166/211
165
Isso porque não se pode esquecer que matérias de cunho político
também são submetidas à apreciação do Supremo Tribunal Federal, pois a
Constituição que lhe coube como “guardiã” da Constituição que também é diploma
político, além de jurídico, é aquisição evolutiva da modernidade, passando a ser a lei
máxima que regrará os dois sistemas: político e jurídico, vez que regula atividades
políticos, divisão de poder, competência, atuação dos partidos políticos, etc., mesmo
assim, quando enfrenta matéria política, sua função é dar uma solução jurídica,
regulando condutas intersubjetivas e estará fazendo com sua formação jurídica,
formal e material, juridicizando a matéria para que possa decidir juridicamente.
Nesse sentido ENTERRÍA308,
Es, pues, cierto que el Tribunal decide conflictos políticos, pero locaracterísticos es que la resolución de los mismos se hace porcriterios y métodos jurídicos […] (grifos do autor)
O raciocínio percorrido por TAVARES 309 demonstra-se oportuno para
argumentos deste trabalho:
Decidir matéria que apresenta contornos políticos não transforma aatividade de jurisdicional em política, da mesma forma que falarsobre um psicopata não transforma ninguém num doente mental.Não se quer dizer que se trate de decisões formalmente jurídicas e
materialmente políticas. A decisão constitucional é de cunho jurídicoem todos os sentidos.
afirmar que a positivação do direito na sociedade moderna, além da distinção entre estabelecimentode norma geral (legislação) e aplicação concreta do Direito (jurisdição, administração), pressupõe adiferenciação entre Constituição e lei.
308 ENTERRÍA, Eduardo García de. La Constitución como norma y el Tribunal Constitucional . Madrid:Editorial Civitas, 1985, p. 178.309 TAVARES, 1998, p. 42.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 167/211
166
E mais, “mesmo que na motivação da decisão entrem elementos
extrajurídicos, o que é inevitável, ainda assim está-se perante uma decisão
judicial”310.
Com base mais uma vez na teoria de HART, vê-se que linguagem política
não pode ser usada pra justificar “linguagem jurídica” por serem regras diferentes e
situarem em diferentes contextos, é chamado “jogos de linguagem”, v.g.,
fundamentação de decisões da contribuição previdenciária de inativos que usava
como argumento o prejuízo ao Erário, aumentando o déficit previdenciário (código
econômico-ter não ter).311
Interessante comentar passagem do voto de vista do ministro Marco
Aurélio de Melo (relator) do Recurso Extraordinário (RE) 370682 na questão de
ordem sobre a modulação dos efeitos da decisão em ação subjetiva estendendo-se
os efeitos do art. 27 da Lei nº. 9.868/99:
Na espécie, em momento algum, declarou-se a inconstitucionalidadede lei ou ato normativo. Jamais figurou, no ordenamento jurídicopátrio, o creditamento, pela alíquota final, de valor que o contribuintenão recolheu a título de imposto sobre produtos industrializados emoperação anterior isenta, não tributada ou sujeita à alíquota zero. Atéaqui o que se tem é o pronunciamento do Plenário do Supremo sobrea inexistência do direito ao crédito, e isso se fez a partir de
interpretação conferida, como já consignado, a Constituição Federal,mais precisamente ao artigo 153, § 3º, inciso II, nela contido, que aUnião sempre aponto como infringindo.
Em síntese, pressupondo a aplicação analógica moldura semelhanteà que disciplina pela norma em relação à qual se pretende aextensão, não há campo para chegar-se ao implemento respectivo.
310 TAVARES, 1998, p. 46.311 Nesse sentido, concorda MENDES, S., (2007, p. 190), em nota de rodapé 539 “Ministro da
Previdência alerta STF sobre inativos – “O ministro Amir Lando (Previdência) disse ontem aopresidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, que a derrubada da contribuiçãoprevidenciária de servidores inativos e pensionistas impediria o governo de arrecadar cerca de R$ 1,9bilhão por ano” (Silvana de Freitas, Folha de S. Paulo, 28/05/2004).”
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 168/211
167
Conclusão diversa implicaria não o acionamento da analogia mas aatuação do Supremo como se legislador fosse e pudesseempreender, sem a atuação do Congresso Nacional, na ordem jurídica, dispositivo viabilizador da limitação de eficácia do julgado,pouco importando a existência pretérita de lei dispondo em certosentido.
Busquem a razão de ser do artigo 27 da Lei nº. 9.868/99. Outra nãosenão a presunção de legitimidade do ato normativo, a gerar aconfiança dos cidadãos em geral no que nele previsto. […] O preceitoque se quer aplicar por analogia, mesmo ausente a lacuna quanto aodireito questionado e objeto de decisão, pressupõe, sempre esempre, pronunciamento no sentido da constitucionalidade de lei ouato normativo, reconhecendo do conflito do que disciplinado com aConstituição Federal, e, neste caso, tem-se, sem o questionamentosequer de lei específica – inimaginável, portanto, o envolvimento de
declaração de inconstitucionalidade […].
Em complemento ao raciocínio seguem dois parágrafos finais do voto do
Ministro Ricardo Lewandowski, único voto vencido na questão de ordem dos efeitos
prospectivos que após fundamentar seu voto de maneira bem justificada
juridicamente assim diz:
Por essas razões entendo que convém emprestar-se efeitosprospectivos às decisões em tela, sob pena de impor-se pesadosônus aos contribuintes que se fiaram na tendência jurisprudencialindicada nas decisões anteriores desta Corte sobre o tema, comtodas as conseqüências negativas que isso acarretará nos planoseconômicos e social.
Assim, Senhora Presidente, ante as peculiaridades do caso, e emhomenagem não apenas ao princípio da segurança jurídica, mas
também aos postulados da lealdade, da boa-fé e da confiançalegítima, sobre os quais se assenta o próprio Estado Democrático deDireito, proponho que se confira efeitos ex nunc as decisõesproferidas nos REs 353.657 e 370.682”.
Impõem-se nos trechos dos votos proferidos no Recurso Extraordinário
370.682-SC (mesmo não sendo proferido em controle de constitucionalidade, mas
sobre ele e seus efeitos que se discute), as premissas discutidas nas páginas desse
trabalho, não se pode negar que os efeitos econômicos e sociais são de grande
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 169/211
168
monta para o contribuinte diante de uma tão pesada carga tributária brasileira a que
temos que nos submeter, mas abstendo-se do sentimento de contribuinte e
analisando o fenômeno jurídico positivo a decisão proferida pelo Ministro Celso de
Melo traduz o sistema jurídico positivo e o papel do Supremo Tribunal Federal,
enquanto o trecho da decisão do Ministro Lewandowski demonstra uma decisão com
bases em justificativas de outro sistema, qual sejam econômico e político.
Na introdução do capítulo, apontamos as diferenças encontradas nos
modelos de controles de constitucionalidade que serviram de base para o sistema de
controle brasileiro. O controle de constitucionalidade brasileiro não adota as teorias
americanas e austríaca em sua intereza; no sistema austríaco, a Corte
Constitucional é órgão com função legislativa e uma análise com base nas lições
Kelsenianas não pode ignorar está distinção. Não foi o que fez Hugo de Brito
Machado312, pois este com base na “Teoria Pura do Direito” de Kelsen, diz que a
declaração de inconstitucionalidade de uma lei equivale a sua revogação, é portanto
ato de natureza legislativa. Entendendo exatamente o contrário, ou seja, a
declaração de inconstitucionalidade não tem função legislativa, não revoga norma no
sistema, apenas suspende sua vigência no caso de controle concentrado e sua
eficácia no caso de controle difuso. O Autor certamente se esqueceu que a
fundamentação com base em Kelsenianas deve guardar à mente que o mestre de
Viena refere-se a Corte Constitucional que possui função legislativa, diferentemente
do que ocorre com o sistema brasileiro de constitucionalidade.
312 “Segundo a teoria pura do direito, a declaração de inconstitucionalidade de uma lei equivale a suarevogação. Tem, portanto, a natureza de ato legislativo e, assim, tal como acontece com os atos
legislativos em geral, não pode produzir efeitos retroativos, salvo em favor do cidadão. E esta é adoutrina que melhor preserva a segurança, e assim melhor realiza o objetivo fundamental de todaordem jurídica”. (MACHADO, Hugo de Brito. A Supremacia constitucional como garantia docontribuinte. Revista dialética de direito Tributário . São Paulo: Dialética, n. 68, maio 2001, p. 411.)
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 170/211
169
A Constituição brasileira313 convive de forma bem ordenada com questões
política e jurídica: todas as suas disposições são feitas de forma abstrata, contendo
uma textura aberta necessária, de modo a servir de forma eficaz às gerações
futuras. Contudo, na sua função precípua de decidir, certamente faz dentro do
sistema jurídico, mesmo que as questões impostas sejam de ordem
constitucionalmente política. Desse modo, o controle de constitucionalidade garante
a supremacia da constituição, e o Supremo Tribunal Federal é o órgão “guardião”
desta, exerce através do controle de constitucionalidade função harmonizar as
normas aos ditames da Constituição. A função do Legislativo é colocar normas no
ordenamento jurídico a função do Judiciário e reconhecer que a norma é compatível
com a Constituição e, desse modo, garantir a segurança jurídica nas relações.
4.6 A função do Supremo Tribunal Federal: Dar segurança Jurídica às relações
O princípio da segurança jurídica é princípio implícito, apenas encontrado
quando da análise de todos os valores explícitos do ordenamento jurídico, levando a
crer que todos os demais princípios convergem para um fim: Segurança Jurídica.
Decerto está que esse sobreprincípio só será alcançado se outros
princípios também forem. Isso significa que os princípios da legalidade, da
igualdade, da irretroatividade, etc., além do respeito das normas constitucionais
313 A Constituição brasileira como bem saliente CARVALHO, Cristiano (2005, p. 310) nas lições deNey Prado “A Constituição brasileira foi inspirada na Constituição portuguesa, denominadaConstituição Dirigente, que teve por mentor o constitucionalista português Joaquim Gomes Canotilho,de formação marxista. Destarte, o Estado democrático de direito passa a ser não um fim em si
mesmo, mas uma etapa para a instauração do socialismo e, posteriormente, do comunismo. Emverdade, a Constituição de 1988 não chega ao ponto de instaurar uma ordem política socialista noBrasil, simplesmente porque, ao prestigiar os direitos e garantias individuais, impossibilita, pelomenos formalmente, a instauração dessa forma de totalitarismo”.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 171/211
170
positivas de ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada, devem estar
conjugados. Isso não apenas nas normas abstratas, mas também nas normas
concretas.
A Construção doutrinária em cima desse princípio também se mostra
expressiva e, na sua maioria, remete ao enfoque de mínimo de previsibilidade que o
sistema jurídico urge ter. O Termo é facilmente expresso em decisões judiciais e foi
expresso também na lei 9.868/99. Assim, como de forma abstrata, o princípio da
segurança jurídica apenas encontra-se em instrumento infraconstitucional. Nas
normas concretas ele realmente é sempre lembrado. É princípio fecundo que só
aparece em decisão judicial.
Como órgão de composição de conflitos, imediatamente o papel do
Supremo Tribunal Federal é resguardar os valores embutidos na Constituição
Federal; agindo desse modo, estará gerando um sentimento de segurança. Isso
decorre de seu papel de “guardião da constituição”. A maneira com se comporta o
judiciário dentro de toda a teoria que estudamos tem um único objetivo: dar
segurança jurídica às relações.
O equilíbrio entre a norma, o seu conteúdo e como ela será emitida, além
da necessidade de busca do passado e adequação no presente fazendo com que a
relação seja harmoniosa entre legislador, juiz e partes, é tarefa da segurança
jurídica. Arremata PAULO DE BARROS CARVALHO314:
Sendo assim, de nada adiantam direitos e garantias individuais,placidamente inscritos na Lei Magna, se os órgãos a quem competeefetivá-los não o fizerem das maneiras que o bom uso jurídico
requer. Não haverá respeito ao sobreprincípio da segurança jurídica
314 CARVALHO, P., 2005, p. 32.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 172/211
171
sempre que as diretrizes que o realizem venham a serconcretamente desrespeitadas e tais situações infringentes seperpetuem no tempo, consolidando-se.
A segurança jurídica é aquela que direciona a atividade do aplicador do
direito e, desse modo, confere estabilidade e previsibilidade às relações
intersubjetivas.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 173/211
5 CASOS CONCRETOS DE DECISÕES EM CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS TRIBUTÁRIAS
5.1 Introdução
Neste capítulo, serão abordadas algumas decisões, em controle de
constitucionalidade concentrado e difuso, proferidas em matéria tributária. Sem
adentrar as questões meritórias se a posição tomada pelo Supremo Tribunal Federal
frente à questão é ou não correta (com exceção ao item 5.2 no qual nos
posicionamos), mas, tão somente, instrumentalizando a teoria da decisão judicial
aqui desenvolvida ao caso concreto, ligando a teoria à prática.
5.2 Vaguidade e Ambigüidade dos Signos no Controle Judicial deConstitucionalidade: Contribuição Para Financiamento da Seguridade Social –
COFINS
O primeiro caso abordado será a questão da Emenda Constitucional
20/98, que alterou a redação original do art. 195, I da Constituição Federal queapenas se referia ao termo “faturamento” e com a nova redação passou a abranger
na alínea “b” – a receita ou o faturamento.
A COFINS surgiu através da Lei Complementar 70/91 que instituiu de
forma permanente a Contribuição Social incidente sobre faturamento. Em 27 de
novembro de 1998 foi editada a Lei 9.718, a qual foi publicada em 28 de novembrode 1998 (resultante da Medida Provisória 1.724/98), que pretendeu dar novo critério
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 174/211
173
material para a regra-matriz de incidência tributária da COFINS, deixando de
abranger apenas o “faturamento” compreender também a “totalidade das receitas
aferida pela pessoa jurídica”, a denominada receita bruta, além de aumentar a
alíquota.
Como nesse período muitas discussões geraram em torno do comando
constitucional do art. 195, I, que se referia apenas a “faturamento”, para acabar com
a discussão foi editada e Emenda Constitucional 20/98 em 16 de dezembro de 1998
que inseriu a alínea “b” no diploma constitucional, a qual, além do faturamento,
prescreveu: “a receita ou o faturamento”. Com isso, pretendeu a referida emenda ser
o fundamento de validade da lei ordinária 9.718/98, achando que com isso acabava-
se a discussão em torno do suposto “alargamento” do critério material possível eleito
pela Constituição de 1988.
Com a Lei n.º 9.718, de 27 de novembro de 1998, o que de fato ocorreu
foi s extensão do conteúdo semântico da palavra faturamento , "equiparando-a" a
receita bruta de pessoa jurídica, independente de classificação contábil ou atividade
desenvolvida pela empresa. A edição da Emenda Constitucional n.º 20, de 16 de
dezembro de 1998, não poderia ter o condão de outorgar validade à Lei n.º 9.718, de
27 de novembro de 1998 e assim legitimar a cobrança da COFINS, com força
retroativa (27/11/98). Percebe-se nitidamente que o legislador não respeitou o
contexto lingüístico, ou seja, a situação jurídica tributária em que a palavra era
usada, não verificando assim a definição nominal.
Contudo, em novembro de 2005, o Supremo Tribunal Federal reconheceu
a inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º, da Lei n.º 9.718/98, no julgamento do RE
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 175/211
174
346.084-6/PR315 em relação ao conceito semântico de faturamento como receita
bruta de vendas de mercadorias e serviços. Porém, mesmo reconhecendo a
inconstitucionalidade, entendeu que a EC 20/98 teria o condão de elidir a
constitucionalidade. Conforme comentários de FERRAZ JR. 316:
O voto do ministro Ilmar Galvão havia reconhecido ainconstitucionalidade, porém entendeu que, diante de haver sido a leieditada para produzir efeitos a partir de 1º de fevereiro de 1999, nostermos do seu art. 17, mas, antes de esgotado tal termo, ter sidopromulgada a Emenda Constitucional n. 20/98 – que deu novaredação ao art. 195, I, b, da CF, passando a dispor sobrefaturamento ou receita -, teria sido elidida a inconstitucionalidadecongênita de que padecia o diploma legal, concluindo que somenteapós a vacatio legis, ou seja, a partir de 1º de fevereiro de 1999, éque começaria a ser contada a anterioridade nonagesimal,circunstância que teria tornado a Contribuição para o Financiamentoda Seguridade Social (Cofins) exigível apenas a partir de maio de1999.
Desse modo, “faturamento” passou a ter o conteúdo semântico de “receita
bruta entendida como a totalidade de receitas auferidas”, vimos de ver que o
significado se dá pelo uso da palavra; dessa forma, não pode haver uma mera
315
RE 346084/PR–PARANÁ. RECURSOEXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. Ilmar GalvãoRelator(a) p/ Acórdão: Min. MARCO AURÉLIO - Julgamento: 09/11/2005 Órgão Julgador: TribunalPleno. Publicação: 01.09.2006. Ementa: CONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE - ARTIGO 3º,§ 1º, DA LEI Nº 9.718, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1998 - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20, DE 15DE DEZEMBRO DE 1998. O sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidadesuperveniente. TRIBUTÁRIO - INSTITUTOS - EXPRESSÕES E VOCÁBULOS - SENTIDO. A norma
pedagógica do artigo 110 do Código Tributário Nacional ressalta a impossibilidade de a lei tributáriaalterar a definição, o conteúdo e o alcance de consagrados institutos, conceitos e formas de direitoprivado utilizados expressa ou implicitamente. Sobrepõe-se ao aspecto formal o princípio darealidade, considerados os elementos tributários. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - PIS - RECEITA BRUTA- NOÇÃO - INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 9.718/98. A jurisprudência do Supremo, ante a redação do artigo 195 da Carta Federal anterior à EmendaConstitucional nº 20/98, consolidou-se no sentido de tomar as expressões receita bruta e faturamentocomo sinônimas, jungindo-as à venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. Éinconstitucional o § 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, no que ampliou o conceito de receita bruta paraenvolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividadepor elas desenvolvida e da classificação contábil adotada. No mesmo sentido: RE 390840 / MG -MINAS GERAIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. Marco Aurélio -Julgamento: 09/11/2005. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação: 15-08-2006.316 FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Realidades institucionais e sentido das palavras. In: DireitoConstitucional: Liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri,SP: Manole, 2007b, p. 18.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 176/211
175
definição arbitrariamente estipulada, mas, sim, aquela que se dá pelo uso dentro do
sistema lingüístico. O que de fato não ocorreu.
A redação do art. 195 da CF, em 28 de novembro de 1998 (data da
publicação da lei 9.718), antes da EC 20, era:
Art. 195 - A seguridade social será financiada por toda a sociedade,de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursosprovenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do DistritoFederal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I –dos empregadores, incidente sobre a folha de salário, o faturamentoe o lucro.
Redação do art. 2º e 3º da Lei n.º 9.718 em 27 de novembro de 1998:
Art. 2º - As contribuições para o PIS/PASEP e a COFINS, devidaspelas pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas combase no seu faturamento, observadas a legislação vigente e asalterações introduzidas por esta Lei;
Art. 3º - O faturamento a que se refere o artigo anterior correspondeà receita bruta da pessoa jurídica.
§ 1º Entende-se por receita bruta a totalidade das receitas auferidaspela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por elaexercida e a classificação contábil adotada para as receitas.
Redação do art. 195 depois da EC 20.98, em 15 de dezembro de 1998:
A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de formadireta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientesdos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dosMunicípios, e das seguintes contribuições sociais:
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada naforma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salário e demais rendimentos do trabalho pagos oucreditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço,mesmo sem vínculo empregatício;
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 177/211
176
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
Como dissemos, o significado de uma palavra deve ser extraído do uso. O
termo faturamento decorre da prática comercial de emissão de fatura, fatura
entendida o documento que identifica a venda de mercadoria ou de serviços
prestados, individualizando as partes, a data o tipo de mercadoria, quantidade,
preço, etc. Assim, faturamento é atividade de que resulta nas faturas (vendas)
realizadas em um determinado período. Nesses termos, é importante complementar
a posição de PAULO DE BARROS CARVALHO317:
faturamento é signo que representa o ingresso bruto de recursosexternos, provenientes de operações de vendas a prazo ou à vista,de mercadorias, produtos ou serviços, tanto no mercado internocomo no exterior. A fatura aparece como o registro documental queexpressa a quantificação de negócios jurídicos realizados pelo
contribuinte, ao passo que o faturamento, enquanto calor final dasatividades praticadas registradas em fatura, equivale exatamente aoresultado de tais negócios.
Por outro lado, receita bruta seria, além das faturas (venda de
mercadorias ou de serviços prestados), os juros, correção monetária, lucros,
dividendos, royalties , aluguéis, etc., “independente da classificação contábil”. No
mesmo sentido, completa PAULO DE BARROS CARVALHO318:
Em conclusão, receita é o acréscimo patrimonial que aderedefinitivamente ao patrimônio da pessoa jurídica, não a integrandoquaisquer entradas provisórias, representadas por importâncias quese encontrem em seu poder de forma temporária, sem pertencer-lheem caráter definitivo.
317 CARVALHO, P., 2008, p. 724318 Ibid., p. 729.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 178/211
177
Como bem observou SAMPAIO FERRAZ JR. 319 , uma coisa é aplicar
interpretação extensiva, ou, bem diferente, é estabelecer uma equivalência
semântica entre dois termos, como fez a lei n.º 9.718, de 27 de novembro de 1998,
Ou seja, enquanto a interpretação do STF foi extensiva (estende osentido de faturamento a qualquer venda, com ou sem permissão defatura), a nova lei realizou uma verdadeira equiparação estipulativa,estabelecendo uma equivalência semântica entre os dois termos,sem autorização para tanto, tendo em vista o disposto no art. 195, I,
b, da CF, na redação vigente à época.
Em nada justifica a conduta do legislador ordinário, que nitidamente
contrariou os mandamentos constitucionais, interpretando uma palavra sem levar em
consideração seu conteúdo semântico. Mesmo porque poderia, no lugar de alargar o
conteúdo semântico, ter usado o mandamento constitucional de maneira racional, ou
seja, utilizar-se do mesmo art. 195, em seu parágrafo 4º e instituir nova contribuição,
pois prescreve o dispositivo que “A lei poderá instituir outras fontes destinadas a
garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecidos o disposto no
art. 154, I.” Ou seja, poderia ser instituída a contribuição sobre receita bruta, desde
que por lei complementar, que não fosse não cumulativo e não tivesse fato gerador
ou base de cálculo próprio dos os impostos já discriminados na Constituição.
Por isso, dissemos que os significados dos termos não podem ser
arbitrariamente constituídos; deve ser respeitado o uso estipulado lingüisticamente
dentro do contexto jurídico, para interpretar uma palavra. Desse modo, o “poder de
violência simbólica” não pode prosperar, pois, mesmo tendo prevalecido, no caso em
análise que o significado da palavra faturamento deve ser entendido como “receita
319 FERRAZ JR., 2007. p. 25.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 179/211
178
bruta”; para os demais casos, cada qual deve ser entendido com seu significado já
demarcado pelo uso. Como assim vem sendo.
5.3 Princípios no Controle Judicial de Constitucionalidade: Isenção de Imposto
sobre Propriedade de Veiculo Automotor - IPVA
EMENTA:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL356/97, ARTIGOS 1º E 2º. TRATAMENTO FISCAL DIFERENCIADOAO TRANSPORTE ESCOLAR VINCULADO À COOPERATIVA DOMUNICÍPIO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA IGUALDADE EISONOMIA. CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE.POSSIBILIDADE. CANCELAMENTO DE MULTA E ISENÇÃO DOPAGAMENTO DO IPVA. MATÉRIA AFETA À COMPETÊNCIA DOSESTADOS E À DO DISTRITO FEDERAL. TRATAMENTODESIGUAL A CONTRIBUINTES QUE SE ENCONTRAM NA MESMAATIVIDADE ECONÔMICA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Normade efeitos concretos. Impossibilidade de conhecimento da ação diretade inconstitucionalidade. Alegação improcedente. O fato de serem
determináveis os destinatários da lei não significa, necessariamente,que se opera individualização suficiente para tê-la por norma deefeitos concretos. Preliminar rejeitada. 2. Lei Estadual 356/97.Cancelamento de multa e isenção do pagamento do IPVA. Matériaafeta à competência dos Estados e à do Distrito Federal. Benefíciofiscal concedido exclusivamente àqueles filiados à Cooperativa deTransportes Escolares do Município de Macapá.Inconstitucionalidade. A Constituição Federal outorga aos Estados eao Distrito Federal a competência para instituir o Imposto sobrePropriedade de Veículos Automotores e para conceder isenção, mas,ao mesmo tempo, proíbe o tratamento desigual entre contribuintesque se encontrem na mesma situação econômica. Observância aosprincípios da igualdade, da isonomia e da liberdade de associação.Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
Merece comentário, outrossim, a ementa acima da Ação Direta de
Inconstitucionalidade – ADI 1.655/PR, julgada procedente declarando a
inconstitucionalidade dos art. 1º e 2º da Lei Estadual 351, de 07 de julho de 1997, do
Estado do Paraná que concedia isenção de Imposto sobre Propriedade de Veículo
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 180/211
179
Automotor – IPVA aos proprietários de veículo destinados a transporte escolar,
devidamente regularizados perante uma cooperativa municipal específica. Por óbvio,
essa ADI não causou tanta polêmica como a questão anteriormente levantada, mas
os apontamentos suscintos aqui tecidos apenas têm como objetivo a demonstração
da aplicação dos princípios e da necessidade de o Supremo Tribunal Federal, como
órgão que está no centro do sistema, resolver de acordo com os valores que a
sociedade como um todo pretende ver protegido, não se limitando a privilegiar
classes de pessoas que se encontrem em posição de igualdade com demais.
No julgamento da ADI, o Supremo Tribunal Federal entendeu que a Lei
Estadual em comento violava o princípio da isonomia tributária, vez que previa
expressamente tratamento desigual entre contribuintes que se encontravam em
situação equivalente, assim prevaleceu no julgado a aplicação dos valores objetivos,
conteúdo do princípio. Conforme segue:
Tenho que lei violadora de tais princípios, ao estabelecer tratamentodesigual aos que se encontram na mesma situação,necessariamente particularizará seus destinatários, criando assimsituação de discrímen injustificado.
[…]
No mérito, a vedação constitucional de tratamento desigual acontribuintes que estão em situação equivalente não foi observadapelo legislador estadual, ao editar a lei ora atacada. Um exame maisaprofundado, após o deferimento da medida liminar, revela não serpossível, no universo dos proprietários de veículos destinados aotransporte escolar, que somente os filiados a determinadacooperativa alcancem a isenção do IPVA.
A cerca do princípio da isonomia a que se refere o artigo 152, daConstituição Federal, e da observância a ele devida, bem resumiu ostermos de sua abrangência Sacha Navarro, ao explicitar que “oprincipio da igualdade da tributação impõe ao legislador “nãodiscriminar entre os iguais, que devem ser tratados igualmente .
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 181/211
180
Do trecho transcrito do voto do ministro Maurício Corrêa, em 03 de março
de 2004, (Tribunal Pleno - DJ 02.04.2004) percebe-se a aplicação dos princípios
como norma de estrutura de observância obrigatória, vez que não houve a
obrigatória observação do legislador Estadual no momento de edição da lei. E ao
Supremo Tribunal Federal como “guardião” da Constituição coube a tarefa de
declarar inconstitucional a referida lei. Para tanto observou a aplicação dos
princípios dos valores objetivados pelo sistema.
5.4 Modulação dos efeitos sem controle de Constitucionalidade: Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI), creditamento de aquisição de insumos
favorecidos com alíquota-zero
Apesar do julgamento em questão não se referir a um controle de
constitucionalidade, procurou-se estender os efeitos do art. 27 da lei 9.868/99, lei
esta que regulamentou o procedimento e julgamento da ação direita de
constitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo
Tribunal Federal, para a decisão do Recurso Extraordinário que analisava o direito
ao crédito de IPI para dos adquirentes de mercadorias com isenção ou não-
incidência.
Desse modo, o Supremo Tribunal Federal em 05 de março de 1998,
analisando a falta de norma constitucional positivada que proibia o creditamento de
IPI, assim como havia para o ICMS, entendeu que o silêncio constitucional poderia
ser interpretado como permissivo, ou seja, a aquisição de insumo isento de IPI
geraria direito ao creditamento do valor do imposto que teria sido pago, caso não
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 182/211
181
houvesse a isenção. Isso para que o produto com isenção não fosse onerado com a
falta de compensação com outro crédito tornando a isenção inócua.
Posteriormente, através do julgamento dos RREE 350.446, 353.668,
357.277 e 358.493, decidiu-se também pelo creditamento dos insumos adquiridos
tributados com alíquota zero. Veja ementa do RE 350.446/PR (de igual teor aos
demais julgados), rel. Min. Nelson Jobim, 18.12.2002 (DJ 06.06.2003):
se o contribuinte do IPI pode creditar o valor dos insumos adquiridos
sob o regime de isenção, inexiste razão para deixar de reconhecer-lhe o mesmo direito na aquisição de insumos favorecidos pelaalíquota zero, pois nada extrema, na prática, as referidas figurasdesonerativas, notadamente quando se trata de aplicar o principio danão-cumulatividade. A isenção e a alíquota zero em um dos elos dacadeia produtiva desapareceriam quando da operação subseqüente,se não admitido o crédito. 320
No julgamento pelo Supremo Tribunal Federal dos Recursos
Extraordinários (REs) 370682 e 353657, em 15 de fevereiro de 2007, o
entendimento foi modificado e decidiu-se pela impossibilidade dos contribuintes do
Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de se creditarem do valor na aquisição
de insumos favorecidos com alíquota-zero; que a admissão ao creditamento
implicaria ofensa ao inciso II do § 3º do art. 153 da CF.
Haja vista a mudança de posicionamento que para os contribuintes já
estava sendo sinalizada, no sentido de poder se creditar do Imposto Sobre Produtos
Industrializados, houve questão de ordem suscitada pelo Min. Ricardo Lewandowski,
no sentido de dar efeitos prospectivos à decisão sob argumento de antes a Corte
320 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Tributário na Constituição e no STF : teoria e jurisprudência. 13. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007, p. 178.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 183/211
182
Suprema já haver se pronunciado pelo direito de crédito. Em 25 de junho de 2007,
recurso voltou a ser discutido devido ao pedido de modulação dos efeitos da
decisão, que foi rejeitado pelo Plenário do Supremo, sob argumento de que a
decisão que apontava para o direito de creditamento não transitou em julgado e por
isso não gerou nenhum direito adquirido ao contribuinte, e desse modo garantiu o
direito da União de reaver das empresas os créditos de IPI.
Desta feita, os efeitos da decisão foi ex tunc , podendo atingir os fatos
geradores ocorridos antes de sua publicação, no prazo prescricional de cinco anos.
Apesar da decisão supra não ser sobre controle de constitucionalidade, é
interessante trazer à baila, pois mesmo assim se tentou modular os efeitos que
apenas diz respeito às ações em controle de constitucionalidade conforme art. 27 da
Lei 9868/98.
Interessante destacar mais um parágrafo do voto do Min. Marco Aurélio:
No tocante à alegada segurança jurídica que proporcionou um sem-número de pareceres – confesso que nunca presenciei tão grandemovimento - , parte-se de premissa que não corresponde àrealidade. O tema sobre o creditamento, ao contrário de outros emque, de qualquer forma, houve a reversão do quadro decisório, nãochegou a ser pacificado no Tribunal. É certo que, em 18 dedezembro de 2002, ao julgar os Recursos Extraordinários nº350.446-1/PR, 353.668-1/PR, 357.277-6/RS e 358.493-6/SC, o
Plenário proclamou esse direito, vencido, na oportunidade, o ministroIlmar Galvão e impedido o ministro Maurício Corrêa. Não menoscorreto é que os acórdãos formalizados vierem a ser impugnadosmediante declaratórios. Os interposto nos três primeiros somenteforam apreciados em fevereiro passado, quando proferi votodesprovendo –os. O trânsito em julgado não se confirmou em virtudede novos embargos. O último permanece concluso ao ministro ErosGrau – que sucedeu o ministro Nelson Jobim na relatoria -, paraapreciação dos declaratórios. Então, não cabe dizer que o Supremoassentou, mediante acórdão coberto pela coisa julgada, o direito aocreditamento. A matéria estava pendente de decisão final peloPlenário. Vale registrar a informação prestada pela Fazenda, no
respectivo memorial, de que nenhum processo transitou em julgado.
[…]
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 184/211
183
A segurança jurídica está, na verdade, na proclamação do resultadodos julgados tal como formalizada, dando-se primazia à ConstituiçãoFederal e exercendo o Supremo o papel que lhe é reservado – o depreservar a própria Carta da República e os princípios que a ela sãoínsitos, como o da razoabilidade e o do terceiro excluído.
[…]
Eis o dilema que se coloca: caminha o Supremo no sentido dedesprezar as balizas legais e constitucionais ou torná-lasprevalecentes, sinalizando aos demais órgãos do Judiciário aimpossibilidade de ter-se, considerado o sistema atual, revelador dodireito posto, a adoção do denominado direito alternativo?
Da minha parte, pouco importa os interesses individuais emomentâneos em jogo, sufrago o entendimento, sempre e sempre,
da predominância da ordem jurídica. É o preço a ser pago em umEstado democrático de Direito, e é módico. Concluo pela eficácia dasdecisões tal como proferida. (grifos nossos)
Isso, mais uma vez vem em consonância com a teoria carreada no
presente trabalho de que o Supremo como órgão jurídico deve decidir de acordo
com os ditames positivados, e não há previsão constitucional ou legal para a
aplicação do art. 27 da lei 9.868/99, que regulamenta o procedimento e julgamento
da ação direta de constitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade
para ações que não versem sobre controle de constitucionalidade como no presente
caso, garantindo assim a segurança jurídica.
5.5 Não Modulação dos Efeitos em Controle Difuso: Revogação da Isenção da
Sociedade Civil de Prestação de Serviços Profissionais.
Recentemente, o mundo jurídico tributário acompanhou a discussão em
torno da revogação da isenção da Contribuição para o Financiamento da Seguridade
Social – COFINS para as sociedades civis de prestação de serviços profissionais
relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, em que teve uma
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 185/211
184
isenção regulamentada por lei Complementar que posteriormente foi revogada por
lei ordinária.
Desde modo, a lei complementar 70/91 não poderia ter sido revogada
pelo art. 56 da lei 9.430/96, por ser a lei ordinária não tendo o condão de revogar lei
complementar, levando-se em consideração a hierarquia das leis (caso que não
pretendemos nos posicionar neste trabalho), mas os votos proferidos até a presente
data sinalizam que não houve violação alguma à hierarquia das leis e, desse modo,
a isenção da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS
para as sociedades civis de prestação de serviços profissionais poderia ter sido
revogada por meio de lei ordinária.
Os recursos extraordinários, RREE 381964 e 377457 ainda pendentes
com vista ao ministro Marco Aurélio, por questões processuais não se pronunciou
sobre o pedido de modulação, mas no julgamento do RE-AgR 526.335-BA, Bahia,
AG.REG.NO Recurso Extraordinário, Relator Min. Gilmar Mendes,
Julgamento: 18/12/2007, Órgão Julgador: Segunda Turma, o pedido de modulação
foi negado. O voto do relator Min. Gilmar Mendes assim prescreveu a questão da
modulação:
Finalmente, também não merece acolhida a pretensão de seconceder efeito pro futuro à decisão desta Corte proferida no julgamento dos RE 377.457 e RE 381.964. No presente caso, nãohouve declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo, não sendopossível, portanto, a aplicação da norma contida no art. 27 da Lei nº9.868, de 10 de novembro de 1999.
Mas, tendo em vista que os recursos extraordinários, RREE 381964 e
377457, estão pendentes de julgamento e que em uma possível decisão favorável
ao contribuinte, o art. 56 da lei 9.430/96, que prescreve: “As sociedades civis de
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 186/211
185
prestação de serviços de profissão legalmente regulamentada passam a contribuir
para a seguridade social com base na receita bruta da prestação de serviços,
observadas as normas da Lei Complementar 70, de 30 de dezembro de 1991”.
Poderá ser declarado inconstitucional e caberá ao Supremo Tribunal Federal a
análise dos efeitos prospectivos, que ora estende o permissivo do art. 27 da lei
9.868/99 para o controle difuso (o qual somos contra), ora nega com o fundamento
de que não se trata de controle de constitucionalidade. Mas, vez que certamente
haverá “razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social”. Vamos
aguardar o posicionamento do Supremo com relação à aplicação ou não dos efeitos
prospectivos.
5.6 Medida Cautelar em Ação Declaratória de Constitucionalidade: Inclusão do
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo
da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e do
Programa de Integração Social/Programa de Formação do Patrimônio do
Servidor Público (PIS/PASEP)
Merece comentário a decisão proferida em 13.08.2008 no Plenário do
Supremo Tribunal Federal, que por nove votos concedeu liminar na ADC 18, que
trata da inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na
base de cálculo da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins)
e do Programa de Integração Social/Programa de Formação do Patrimônio do
Servidor Público (PIS/PASEP), a liminar suspende, até o julgamento da ADC, por
180 dias todos os processos judiciais que questionam na Justiça a obrigatoriedade
de excluir da base de cálculo do ICMS a Cofins e o PIS/PASEP previsto na Lei
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 187/211
186
federal 9.718/98. Com a decisão, todos os processos que estavam sendo julgados
em controle difuso também serão atingidos pelo efeito da decisão.
Desse modo, não há ainda a decisão sobre a questão posta, que muito é
aguardada pelos contribuintes e que certamente muito enriqueceria a análise aqui
elaborada, pois a mesma certamente será rica em detalhes dada a repercussão que
vem causando no mundo jurídico. Mas, apenas esperamos que qualquer que seja a
decisão, seja com base no sistema jurídico com aplicação das premissas arroladas
em todo decorrer do trabalho.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 188/211
6 CONCLUSÕES
Por fim, podemos sintetizar as seguintes conclusões de tudo que foi exposto.
Capítulo 1
1. Demarcando o contexto filosófico, ou seja, o paradigma em que o trabalho está
inserido, pode-se dizer que para a análise do tema utilizaremos da Teoria da
Linguagem ou “giro lingüístico”.
2. Pelo “giro lingüístico” toda forma de compreensão se dá através da linguagem,
não mais como simples instrumento que aproxima o sujeito do objeto, mas como
instrumento de construção do próprio sujeito e do próprio objeto de conhecimento,
passando a ser uma relação de significações (sentidos) entre linguagens.
3. O método escolhido foi o constructivismo lógico-semântico: método analítico de
trabalho hermenêutico que auxilia no exame do direito, enfatiza a uniformidade na
análise do objeto e a precisa demarcação da esfera de investigação, somando-se
sempre o contexto cultural em que está inserido o objeto de investigação. O método
do “constructivismo lógico-semântico” no estudo do direito positivo torna o
pensamento coerente, permitindo além do rigor lingüístico, o conhecimento do
sistema jurídico como um todo. Mas, para isso, necessita do contexto cultural. Isso
porque será através do contexto cultural que se alcançará o sentido dos termos
jurídicos. O culturalismo aborda o homem e a sua realidade circundante, não há
como sustentar um ordenamento jurídico dotado de normas que “devem-ser” sem
considerar a realidade e os valores que envolvem o ser cognoscente.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 189/211
188
4. Pode-se dizer então que somente por meio da linguagem é possível o
conhecimento, a linguagem constrói a realidade jurídica e nos permite compreender
o sujeito e o objeto. Sem linguagem não há realidade, não há conhecimento, não há
compreensão. A linguagem das normas jurídicas tributárias sejam elas abstratas,
advindas do Poder Legislativo, sejam elas concretas, advindas do Poder Judiciário,
por meio de uma decisão será sempre técnica, jamais será científica, pois não
descreve o objeto, mas sim prescreve comportamentos intersubjetivos
5. A análise da decisão judicial em controle de constitucionalidade das normas
tributárias parte da premissa de que direito, antes de qualquer coisa, é comunicação
e por este motivo deve ser analisado pelos instrumentos da Teoria da Linguagem. A
linguagem será analisada em três planos: o plano sintático seria a organização dos
signos; o plano semântico, a significação dos signos; e o plano pragmático, a
possível determinação dos signos construída pelos utentes. Mesmo que um deles
tenha mais ênfase em face dos outros, será necessária a analise dos três planos.
6. A comunicação jurídica pode ser entendida como sendo troca entre sujeitos de
direito (emissores e receptores) por meio de uma relação jurídica em que haverá um
código comum para que haja o recebimento da mensagem pelos receptores, através
de um canal, tudo isso relacionado a um contexto em que deve estar inserida a
mensagem. Nesse contexto identifica-se o Supremo Tribunal Federal na posição de
emissor e a decisão judicial tributária seria o canal da mensagem que estará na
função prescritiva, ordenando condutas, porque a mensagem jurídica abstrata
necessita ser contextualizada e concretizada para que atinja os indivíduos, sejam
eles individualmente ou geralmente considerados.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 190/211
189
7. Em seu aspecto pragmático é possível a identificação das decisões judiciais em
controle de constitucionalidade das normas tributárias através dos atos de fala. A
teoria dos atos de fala entende que a ação de falar (falar no sentido amplo) é uma
ação que cria uma nova situação. É a linguagem como ação, atuando sobre o plano
real, não apenas como representação da realidade. Desse modo, ao ser
exteriorizada a ação de enunciação pelo enunciado cria-se uma nova situação
prescritiva de conduta que se denomina atos de fala. Os atos de fala podem ser:
“ato locucionário”, em que cada procedimento lingüístico é um tipo de ação humana,
como articular uma palavra ou emitir uma frase ou texto de acordo com a gramática
(significado); “ato ilocucionário”, que é o ato de dizer algo, fazendo também algo
(força). É aquele que nos diz se a pessoa disse algo para emitir um juízo, advertir,
prevenir, ordenar, informar, etc. E por fim, o “ato perlocucionário” que é aquele que
exerce influência de forma determinada sobre outras pessoas, tais como convencer,
persuadir, impedir.
8. A força ilocucionária dos atos de fala, divide-se em cinco classes: (1) veriditivos:
exercício de julgamento; (2) exercitivos: afirmação de influência ou exercício de
poder; (3) comissivos: assumir uma obrigação ou aclarar uma intenção; (4)
comportamentais: adoção de uma atitude; (5) expositivos: esclarecimento de razões,
argumentos e comunicações. Na decisão em controle de constitucionalidade,
teremos o ato de fala com força ilocucionária veriditiva.
9. Por fim, pode-se dizer que após o movimento do “giro lingüístico” e as
investigações de LUDWIG WITTGENSTEIN várias teorias se criaram em torno da
linguagem como instrumento de criação da realidade, porque não existe apenas uma
única relação entre linguagem e realidade, mas várias tais como apontado. Portanto,
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 191/211
190
as teorias adotadas são compatíveis e aplicáveis ao fenômeno da decisão judicial
em controle de constitucionalidade das normas tributárias.
Capítulo 2
10. Normas são “gênero” da qual as “espécies” são: (i) normas gerais e abstratas
(objeto da ação de controle de constitucionalidade); e (ii) normas gerais ou
individuais e concretas (decisão). Por isso, a norma (objeto) na decisão judicial emcontrole de constitucionalidade será abstrata; e a norma da decisão será sempre
concreta, sendo individual e concreta, no controle difuso, e geral e concreta, no
controle concentrado.
11. A norma jurídica no sentido amplo é toda e qualquer proposição construída pelo
intérprete a partir do texto do direito positivo. É produto do intelecto, que não seapresenta em estrutura lógica hipotético-condicional e sentido deôntico completo.
Por sua vez, a norma jurídica em sentido estrito é aquela dotada de estrutura lógica
hipotético-condicional, isso significa que: ocorrendo o fato descrito no antecedente,
deve-ser a conseqüência, que constituirá a relação jurídica modalizada entre dois
sujeitos de direito.
12. A regra- matriz de incidência tributária é o esquema lógico formal em que permite
a verificação da constitucionalidade da lei instituidora da relação tributária havida
entre Fisco e contribuinte, desde que sua análise seja realizada entre regra-matriz e
Constituição Federal.
13. A norma primaria é a norma que institui as relações entre os sujeitos de direito e
prevê os fatos juridicamente qualificados, portanto possui natureza material. A norma
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 192/211
191
secundária, de natureza processual, preceitua as conseqüências sancionatórias
advindas do descumprimento da previsão hipotética que se encontra no
conseqüente da norma primária. É a sanção que garante a juridicidade da norma.
14. As normas ainda podem ser de estrutura e de comportamento, contudo, com a
ressalva de que todas as normas, mesmo as de estrutura, se dirigem a um
comportamento. Isso significa que as normas de estrutura, além de estarem voltadas
às condutas, estabelecem a forma de elaboração de outras normas, ou seja, são
normas de produção normativa que se direcionam às pessoas eleitas pelo sistema
para fazer normas. Assim são as chamadas normas de estrutura, que determinam o
órgão e o expediente pelo qual as normas serão criadas, alteradas ou
desconstituídas.
15. Os princípios compõem em termos semânticos a “textura aberta” do direito. Os
princípios constitucionais orientam a interpretação de todo o sistema, porque toda e
qualquer interpretação deve partir do texto constitucional e dele sacar suas
premissas cognoscitivas. Têm, portanto, dupla função: norma de estrutura de
observância obrigatória de conteúdo valorativo e instrumento axiológico de
interpretação.
16. A validade adotada é aquela estabelecida pela teoria Kelseniana: relação de
pertinencialidade, porque, com estes requisitos formais, já será possível que a
norma diretamente incompatível com a Constituição seja objeto de controle de
constitucionalidade. Contudo, a validade desenvolvida pela teoria de HART
demonstra-se importante para o desenvolvimento do trabalho, pois o Autor defende
através de sua norma de “reconhecimento” que há necessidade de o Tribunal
reconhecer a validade da norma, o que nos faz entender que o modo de aplicar a
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 193/211
192
norma de reconhecimento de HART se dá através do controle de
constitucionalidade. Desse modo, o que o controle de constitucionalidade brasileiro
faz nada mais é que aplicar a validade pragmática inspirada na “norma de
reconhecimento” de HART.
17. Inconstitucionalidade é um fenômeno que ocorre toda vez que uma norma geral,
válida, é analisada pelo instrumento processual de controle de constitucionalidade e
por este processo verifica-se a sua incompatibilidade com norma de hierarquia
superior, qual seja, a Constituição Federal. Isso significa que houve ofensa direta da
norma abstrata com relação à Constituição. Assim, a inconstitucionalidade sempre
analisará a validade da norma abstrata, norma esta que se presume válida
formalmente, porque o controle de constitucionalidade não retira validade, apenas
retira a vigência da norma no caso de controle concentrado e a eficácia no caso de
controle difuso.
18. Quando uma norma tributária for declarada inconstitucional pelo controle
concentrado, ocorrerá a retirada da sua vigência, ou seja, a norma não terá mais
força para regular as condutas intersubjetivas. Por sua vez, retira-se também a
eficácia junto com a vigência. Eficácia que é a condição que a norma tem para
descrever acontecimento que, uma vez ocorrido, irradia efeitos jurídicos, vez que
não haja obstáculos para impedir sua propagação. Na declaração de
constitucionalidade em controle difuso, retira-se apenas a eficácia técnica sintática
da norma.
19. Revogação é retirar a validade da norma do sistema. Apenas norma abstrata
retira a validade de norma abstrata, a norma concreta da decisão em controle de
constitucionalidade não tem a força ilocucionária de revogar norma abstrata.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 194/211
193
Capítulo 3
20. Interpretar é um ato de conhecimento e vontade. Quanto maior for oconhecimento do intérprete com relação ao seu objeto de conhecimento maior será
sua coerência na interpretação. A interpretação deve ser sempre sistemática,
buscando a regra de hermenêutica que melhor sentido dê às normas, de acordo com
a Constituição; o melhor significado será aquele compatível com a Constituição.
21. A lacuna é ausência de norma para um caso concreto, faz parte do ordenamento jurídico negar sua existência e apenas dar nomes diferentes a situações
semelhantes. Mas o desafio não está em dar o nome mais adequado ao problema
de ausência de norma, e sim entender que a existência de lacunas no plano formal
aparentemente não existe, contudo, se o sistema normativo for interpretado como
um todo, de forma sistemática como propomos, verificaremos que apenas a
integração das normas abstratas (normas advindas do poder legislativo) em conjunto
com as normas concretas (emitidas pelo aplicador) soluciona o problema. O
aplicador do direito apenas resolverá, para um determinado caso concreto, a
ausência norma (lacuna), mas jamais a eliminará do sistema. Essa tarefa de eliminar
caberá apenas ao legislador, mesmo no caso das decisões do Supremo Tribunal
Federal em controle abstrato o mesmo se dará, visto que a decisão em controle de
constitucionalidade não retira ou põe norma abstrata no ordenamento que pode
resolver o problema de lacuna.
22. O contexto jurídico deve sempre ser levado em conta, e essa tarefa cabe ao
julgador que tem o dever de impor um significado jurídico, de acordo com o caso
concreto, e o uso do termo lingüístico vago e ambíguo analisado. Assim, pode-se
extrair que a construção ou formação dos conceitos se dará em cada caso concreto
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 195/211
194
através da decisão judicial, pois esta estará apta a aplicar o melhor significado e a
melhor determinação da linguagem jurídica e, para isso, terá que aplicar aspectos
subjetivos e valores considerados também objetivos; esse é o papel do julgador.
23. Valor é um conceito que não admite definição. É algo que adere ao ser, mas com
ele não se confunde. Para o fim deste trabalho, interessam apenas os valores
gerais, objetivos que residem na própria essência da vida, os considerados
pessoais, individuais e subjetivos, que valem para determinada pessoa de acordo
com seu sistema moral, não é relevante para as bases científicas aqui adotadas.
Apenas os juridicizados pelo sistema podem ser aplicados pelo julgador em sua
decisão, essa é a única forma de separar a pessoa do julgador da função que ele
exerce, é a única forma também de apresentar os valores dentro de uma teoria
positivista e não jusnaturalista.
24. O ato de escolha só será possível através do Supremo Tribunal Federal, órgão
eleito pelo sistema para ocupar a região central, com a função de resolver o
problema semântico com força de norma concreta, de continuação do processo de
positivação.
25. Todo ato de decisão é um ato criativo; desse modo, o Supremo Tribunal Federal,
quando decide em controle de constitucionalidade, está criando norma concreta e
continuando o processo de positivação do direito. Mas, a criatividade do Juiz deve se
limitar à lei, à chamada “moldura kelseniana”. Mas, existem casos difíceis, os
chamados hard cases , para os quais a norma não encontra perfeita descrição ao
caso concreto e, como o Juiz é obrigado a julgar, usará a norma de estrutura que lhe
atribui competência para proferir a decisão. Nesse ato, por óbvio, haverá criatividade
e discricionariedade, mas não arbitrariedade e ilegalidade, pois é aqui que o julgador
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 196/211
195
deverá limitar-se ao contexto jurídico, pelas palavras e seu uso dentro do contexto
jurídico, pelos valores objetivos comuns à sociedade, pelos princípios que carregam
valores, tudo conforme delimitado neste trabalho.
Capítulo 4
26. O corte metodológico se dará nas normas proferidas em controle judicial de
Constitucionalidade. Controle concentrado, quando for exercício apenas peloSupremo Tribunal Federal, e controle difuso, quando exercido por qualquer juiz ou
tribunal, mas que, em grau de recurso, seja decidido em última instância pelo
Supremo Tribunal Federal.
27. O modelo de controle de constitucionalidade brasileiro não é apenas um modelo
misto americano-europeu, mas, sim, um modelo brasileiro. Desse modo, qualqueranalogia realizada com base no modelo americano ou europeu deve
necessariamente antever as diferenças comuns de cada sistema.
28. O instrumento de controle de constitucionalidade inseriu-se no contexto brasileiro
desde a Constituição Republicana de 1891, através do controle de
constitucionalidade difuso, através de influências do sistema americano. Na
Constituição de 1946, com a Emenda Constitucional nº 16 de 1965, a ação direta de
inconstitucionalidade de competência originária do STF foi inserida no ordenamento.
Mas, foi na atual Constituição, de 05 de outubro de 1988, que evoluindo para um
sistema misto (ou sistema brasileiro) de controle concentrado e difuso, em que,
outrossim, criou-se a possibilidade do controle de constitucionalidade das omissões
legislativas.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 197/211
196
29. Desde então, o Supremo Tribunal Federal é o órgão eleito como “Guardião da
Constituição” e, desse modo, através do controle de constitucionalidade, analisa a
compatibilidade da norma tributária válida com a Constituição.
30. O controle de constitucionalidade chamado difuso é assim nomeado porque leva
em consideração o aspecto subjetivo, permitindo que qualquer juiz ou tribunal, de
maneira “difusa”, possa reconhecer a inconstitucionalidade de uma lei ou ato
normativo de acordo com suas regras de competência. Com o controle difuso, todos
os órgãos do poder judiciário fazem parte da chamada justiça constitucional. Desse
modo é uma via de acesso a todas as pessoas, visto que não ter um rol de
legitimado para propor a ação, como que ocorre no controle concentrado.
31. Nos Tribunais, a declaração de inconstitucionalidade deve respeitar o princípio
da reserva de plenário; isso significa que a inconstitucionalidade de uma lei somente
pode ser declarada pela maioria absoluta dos membros. No controle difuso das
normas tributárias, tendo em vista que o processo será de um caso concreto em que
as partes serão individualizadas, os efeitos só atingirão as partes do processo, o
chamado inter partes e quanto ao lapso temporal ex tunc . Somente após a
publicação da Resolução do Senado, a decisão que reconheceu a
inconstitucionalidade da norma tributária de modo incidental passará a ter efeitos,
erga omnes (contra todos) e ex nunc (não retroage).
32. A modulação dos efeitos da decisão, em controle difuso, é a possibilidade da
decisão com efeitos ex tunc passar a ter efeitos ex nunc (a partir do trânsito em
julgado ou em outro momento que venha a ser fixado). A permissão legar encontra-
se no art. 27 da Lei 9868/99, que se aplica apenas em controle de
constitucionalidade concentrado, especialmente em ação direta de
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 198/211
197
inconstitucionalidade (ADI). Desse modo, não há norma no sistema que autorize a
modulação em controle difuso. Mas, no âmbito do direito tributário, vemos que a
tentativa de modulação dos efeitos da decisão vem sendo intentada até mesmo
quando não há declaração de inconstitucionalidade de norma, mas o Supremo
Tribunal Federal nesse sentido tem sido cauteloso.
33. A transcendência dos motivos determinantes da decisão é aquela que permite
que não apenas a parte dispositiva da decisão transite em julgado vinculando as
partes, mas toda a fundamentação e motivos que embasaram a parte dispositiva.
Isso porque, em controle difuso de constitucionalidade, a causa de pedir é a
declaração de inconstitucionalidade da norma jurídica tributária e não o pedido.
Desta feita, a matéria de mérito não é a inconstitucionalidade da lei e sim a não
incidência da relação jurídica tributária desenhada regra-matriz de incidência
tributária. Em matéria tributária, não há nenhum precedente de transcendência dos
motivos determinantes, mas, em razão da forte tendência de abstrativação do
controle difuso, foram necessários os apontamentos.
34. O controle concentrado é aquele que tem um órgão apenas que concentra
através de uma competência originária o controle de constitucionalidade; no caso
brasileiro, o Supremo Tribunal Federal. Analisado sob o critério formal, pode ser via
principal, por isso chamado de abstrato ou direto. É um instrumento de proteção da
Constituição, que evita que uma norma incompatível com o Texto Maior venha a se
instalar no sistema de maneira a gerar insegurança jurídica. No controle
concentrado, os órgãos legitimados agem no interesse de uma sociedade,
beneficiando a todos que estão sob a égide da lei.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 199/211
198
35. A ação direta de inconstitucionalidade (ADI) é aquela que tem como objeto a
norma geral e abstrata entendida como inconstitucional, é ação objetiva sem partes.
Efeitos em regra erga omnes , ex tunc e vinculante.
36. A ação direta de inconstitucionalidade (ADI) por omissão é modalidade de ação
direta de inconstitucionalidade que visa à declaração pelo Supremo Tribunal Federal
de uma omissão, um não fazer legitimado pela Constituição. A ADI por omissão vem
a suprir as lacunas normativas, nos casos em que a Constituição impõe ao Poder
Legislativo a edição de normas necessárias à efetivação do comando Constitucional.
Efeitos em regra erga omnes , ex tunc .
37. A ação declaratória de Constitucionalidade (ADC) é o tipo de ação que requer ao
Supremo Tribunal Federal o reconhecimento por decisão a constitucionalidade de
norma que apresenta dúvida quanto a sua compatibilidade com o sistema
Constitucional ao qual ela está inserida. Para a propositura da Ação Declaratória de
Constitucionalidade, é necessário que haja um questionamento prévio da
constitucionalidade da lei ou ato normativo. Efeitos em regra erga omnes , ex tunc e
vinculante.
38. A Medida Cautelar é cabível em Ação Direita de Inconstitucionalidade, assim
como na Ação Declaratória de Constitucionalidade, sempre após uma análise prévia
e superficial do pedido, devendo para tanto apresentar a plausibilidade jurídica da
tese exposta, a possibilidade do perigo em decorrência da demora da decisão, a
possibilidade de serem os danos irreparáveis, a necessidade de garantir a ulterior
eficácia da decisão prevista no ordenamento.
39. O reconhecimento da nulidade gera efeitos ex tunc e o reconhecimento da
anulabilidade gera efeitos ex nunc , ou seja, deixa de surtir efeitos desde sua origem
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 200/211
199
no primeiro caso e deixa de surtir efeitos desde o momento do seu reconhecimento
no segundo. Não adotaremos a relação entre declaração/ ex tunc e constituição/ ex
nunc , vez que, pela teoria da linguagem, todos os atos são constitutivos de nova
situação; assim, a ação direita de inconstitucionalidade ou ação declaratória de
constitucionalidade de fato nada declaram, mas, sim, constituem uma nova situação
de direito.
40. O efeito vinculante é aquele que obriga aos demais órgãos do Poder Judiciário,
bem como pela Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual
e municipal (art. 102 § 2º da CF), a acatar a decisão proferida pelo Supremo Tribunal
Federal.
41. Identificamos as seguintes hipóteses que podem ser encontradas nas demais
instâncias do poder judiciário, no caso de reconhecimento em controle difuso da
constitucionalidade da norma, conflitando assim com o reconhecimento da
inconstitucionalidade em controle concentrado, e havendo o efeito vinculante da
decisão proferida em controle concentrado:
(i) com prazo para recurso: o contribuinte deve pleitear a reforma da
sentença de primeiro grau ou tribunal com base no reconhecimento da
inconstitucionalidade em controle concentrado321;
(ii) sem prazo para recurso, mas com prazo para ação rescisória (art. 495
CPC): deverá o contribuinte propor ação rescisória com base no art. 485,
V do CPC “violar literal disposição de lei”, no prazo de dois anos da
decisão transitada em julgado, haja vista a não aplicação da súmula 343
321 Cabe inclusive em matéria de embargos de declaração, quando for a decisão deinconstitucionalidade conforme art. 741 e 745 do Código de Processo Civil.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 201/211
200
no caso de controle de constitucionalidade, requerendo nova norma
individual e concreta com efeito revogatório para desconstituir a decisão
anteriormente proferida (nesse caso, se proferida a decisão em ação
rescisória com base na decisão de inconstitucionalidade em controle
concentrado), a nova sentença retira a validade da sentença anteriormente
proferida (norma individual e concreta, desconstituindo norma individual e
concreta), lembrando que, se no curso da declaração de
inconstitucionalidade houver medida cautelar com efeito vinculante e
eficácia erga omnes, o prazo decadencial da ação rescisória se suspende
também;
(iii) sem prazo para recurso e sem prazo para ação rescisória (art. 495 CPC):
nada poderá ser feito pelo contribuinte que é detentor de uma decisão que
está sob o manto da coisa julgada, que, com base no princípio da
segurança jurídica, representa para o ordenamento jurídico limites
processuais (assim como: decadência, direito adquirido, ato jurídico
perfeito). Há controvérsia doutrinária a esse respeito daqueles que
defendem que o prazo de dois anos é contado da data da publicação da
ADI ou ADC, mas essa não é a posição que adotamos, mesmo porque
aqueles que defendem que caberia ação rescisória mesmo fora do prazo
de dois anos motivam-se por razões que transcendem o campo do direito,
principalmente do direito tributário;
(iv) não havendo decisão, mas apenas norma individual e concreta do
contribuinte que ainda não seja objeto de demanda judicial, poderá o
contribuinte requerer ação de repetição de indébito dos últimos 5 anos.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 202/211
201
42. Supremo Tribunal Federal é órgão jurídico e não político. O Poder Legislativo,
sim, pode ser considerado órgão político, pois sua função defende um ideal político –
partidário. O Supremo Tribunal Federal compõe o Poder Judiciário em sua estrutura,
não é órgão autônomo com função legislativa. Desse modo, no caso de uma norma
que em termos formais ou materiais não respeitou a constituição, deve ser
“despolitizada” e juridicizada através do reconhecimento de constitucionalidade ou
inconstitucionalidade, adequada aos termos jurídicos; apenas um órgão jurídico
poderia desempenhar esse papel.
43. O papel do Supremo Tribunal Federal é resguardar os valores embutidos na
Constituição Federal; agindo desse modo, estará gerando um sentimento de
segurança. A maneira com se comporta o judiciário dentro de toda a teoria que
estudamos tem um único objetivo: dar segurança jurídica às relações. A segurança
jurídica é aquela que direciona a atividade do aplicador do direito e, desse modo,
confere estabilidade e previsibilidade às relações intersubjetivas.
Capítulo 5
44. Para aplicação da teoria desenvolvida, foi analisada a decisão sobre a
Contribuição Para Financiamento da Seguridade Social – COFINS que demonstrou
a vaguidade e ambigüidade dos signos. Também, analisou-se a aplicação dos
princípios em controle de constitucionalidade na ADI que julgou a Isenção de
Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor – IPVA. Analisou-se, outrossim, a
modulação dos efeitos sem controle de Constitucionalidade dos Impostos sobre
Produtos Industrializados (IPI), creditamento de aquisição de insumos favorecidos
com alíquota-zero, bem como a não modulação dos efeitos em Controle Difuso:
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 203/211
202
Revogação da Isenção da Sociedade Civil de Prestação de Serviços Profissionais.
Por fim, a aplicação na Medida Cautelar em Ação Declaratória de
Constitucionalidade: Inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) na base de cálculo da Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social (Cofins) e do Programa de Integração Social/Programa de
Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP).
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 204/211
BIBLIOGRAFIA
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia . 4. ed. São Paulo: Martins Fontes,2000.
ADI-AgR 365 / DF - DISTRITO FEDERAL, AG. REG. NA AÇÃO DIRETA DEINCONSTITUCIONALIDADE. Rel. Min. Celso de Mello, Julgamento: 07/11/1990,Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO, Publicação DJ 15-03-1991.
ADI 939 / DF, (RTJ 151/755). ADInMC 1.805-DF, rel. Min. Néri da Silveira, 26.3.98.
ADI 1.616-4 / PE, rel. Min. Maurício Corrêa.
ADI 2.154-2 interposta pela Confederação Nacional das Profissões Liberais – CNPL,distribuída em 22.2.2000, rel. Min. Menezes Direito, com pedido de vista da Min.Cármen Lucia.
ADI 2.258-0 interposto pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil,distribuído em 04.08.2000.
ADI 3.082 / DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence,
ADI 3.246 / PA, rel. Min. Carlos Britto Julgamento: 19/04/2006, ÓrgãoJulgador: Tribunal Pleno. Publicação DJ: 01-09-2006.
ADI 3.345 / DF, rel. Min. Celso de Mello.
ADI 3.458 / GO, rel. Min. Eros Grau, Publicação: 14.08.2008.
ADIMC- 221/DF; Rel. Moreira Alves, DJ: 22.10.1993
ADInMC 1.434-SP, rel. Min. Celso de Mello, Publicação DJ: 22.11.1996.
AGRPET -1140/TO, rel. Min. Sydney Sanches, DJ 31.05.1996, regulamentado pelalei 9.882/99.
ALCHOURRÓN, Carlos E.; BULYGIN, Eugenio. Introducción a la Metodología de lasCiencias Jurídicas y Sociales . Ed. Astrea, Buenos Aires, 1974.
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Tributário na Constituição e noSTF : teoria e jurisprudência. 13. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.
ALEXY Robert. Teoria da Argumentação Jurídica . Trad. Zilda Hutchinson SchildSilva. São Paulo: Ed. Landy, 2001.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 205/211
204
ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nasciências naturais e sociais . 2. ed. São Paulo: Pioneira, 1999.
ARAÚJO, Clarice Von Oertzen de. Fato e Evento Tributário – uma análise semiótica.
In: Curso de Especialização em Direito Tributário . Rio de Janeiro: Forense, 2005a.
______. Semiótica do Direito . São Paulo: Quartier Latin, 2005b.
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária . São Paulo: Malheiros Editores2004.
AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer: palavras e ação. Trad. DaniloMarcondes de Souza Filho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
BARRETO, Aires F. Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais . 2. ed. SãoPaulo: Max Limonad, 1988.
______ et al. Segurança Jurídica na Tributação e no Estado de Direito . (II CongressoNacional de Estudos Tributários). São Paulo: Editora Noeses, 2005.
BARROSO, Luís Roberto. Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro :
exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 3. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2008.
BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e interpretação Constitucional . São Paulo:Celso Bastos Editores, 1997.
BECKER, Alfredo Augusto. Carnaval Tributário . 2. ed. São Paulo: Lejus, 1999.
BITTENCOUT, C. A. Lúcio. O contrôle Jurisdicional da Constitucionalidade das Leis. Rio de janeiro: Revista Forense, 1949.
BOBBIO, Norberto. Teoria da Norma Jurídica . 3. ed. rev. Trad. Fernando PavanBaptista e Ariani Bueno Sudatti. Barueri, SP: Edipro, 2005.
______. Teoria do ordenamento jurídico . Trad. Maria Celeste Cordeiro Leite dosSantos. 5. ed. Brasília: UNB, 1995.
BOURDIEU, Passeron; PASSERON, Jean-Claude. La Reproduction . Paris: Ed. deMinuit, 1970.
BUZAID, Alfredo. Da ação direta de declaração de inconstitucionalidade no direito
brasileiro . São Paulo: Saraiva, 1958.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 206/211
205
CAMPILONGO, Celso Fernandes. A Crise da representação política e aJudicialização da política. In: O Direito na Sociedade Complexa . São Paulo: MaxLimonad, 2000.
CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial da constitucionalidade das leis no direitocomparado . Porto Alegre: Fabris, 1984.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucionais Tributário . 22. ed. SãoPaulo: Malheiros, 2006.
CARRIÓ, Genaro R. Notas Sobre Derecho y Lenguaje , 4. ed. Buenos Aires:Abeledo-Perrot, 1990.
CARVALHO, Cristiano. Ficções jurídicas no direito tributário . São Paulo: Editora
Editora Noeses, 2008.
______. Teoria do Sistema Jurídico : direito, economia, tributação. São Paulo:Quartier Latin, 2005.
CARVALHO, José Maurício de. Curso de Introdução à filosofia brasileira. Londrina:CEFIL – EDUEL, 2000.
CARVALHO, Paulo de Barros. Crédito Prêmio de IPI : estudo e pareceres III. Barueri,SP: Minha Editora, 2005.
______. Curso de Direito Tributário . 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
______. Direito Tributário : Fundamentos Jurídicos da Incidência. São Paulo: Saraiva,2006.
______. Direito Tributário, linguagem e método . São Paulo: Editora Noeses, 2008.
______. O Sobreprincípio da Segurança Jurídica e a Revogação de NormasTributárias. In: Crédito Prêmio de IPI – Estudos e Pareceres. Ed. Manole, 2005.
CASTRO JR. Torquato. Interpretação e Metáfora no Direito. In: BARRETO, Aires F.et al. Segurança Jurídica na Tributação e no Estado de Direito . (II CongressoNacional de Estudos Tributários). São Paulo: Editora Noeses, 2005.
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização Abstrata de Constitucionalidade no DireitoBrasileiro . São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988.
COSSIO, Carlos. El derecho en el derecho judicial . 2. ed Buenos Aires: Abeledo
Perrot, 1959.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 207/211
206
DINIZ, Maria Helena. As lacunas no direito . 7. ed. adaptada ao novo Código Civil.São Paulo: Saraiva, 2002.
DORIA, A. de Sampaio. Princípios Constitucionaes . São Paulo: Editora Ltda, 1926.
DWORKIN, Ronald M. O império do direito . Trad. Jefferson Luiz Camargo. SãoPaulo: Martins Fontes, 1999.
______. Taking Rights Seriously . 16. ed. Cambridge: Harvard University Press,1997.
ENTERRÍA, Eduardo García de. La Constitución como norma y el TribunalConstitucional . Madrid: Editorial Civitas, 1985.
FERNÁNDEZ, German Alejandro San Martín. Introdução ao Direito Tributário . SãoPaulo: MP Editora. 2008.
FERRAGUTT, Maria Rita. Presunções no Direito Tributário . 2. ed. São Paulo:Quartier Latin, 2005.
FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Inconstitucionalidade de norma de revogação eracionalidade sistemática. In: Direito Constitucional : Liberdade de fumar, privacidade,estado, direitos humanos e outros temas. Barueri, SP: Manole, 2007a.
______. Introdução ao Estudo do Direito. Técnica, decisão, dominação. 4. ed. SãoPaulo: Atlas, 2003.
______. Realidades institucionais e sentido das palavras. In: Direito Constitucional: Liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri,SP: Manole, 2007b.
______. Teoria da Norma Jurídica : ensaio de pragmática da comunicação normativa.4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estado de Direito e Constituição . 3. ed. rev. eatual. São Paulo: Saraiva, 2004.
FIORIN, José Luiz. As Astúcias da Enunciação – As Categorias de Pessoa, Espaçoe Tempo. 2. ed. São Paulo: Editora Ática, 2005.
FLUSSER, Vilém. Língua e Realidade . 2. ed. São Paulo: Annablume, 2004.
GAMA, Tácio Lacerda. Contribuição de intervenção no Domínio Econômico . SãoPaulo: Quartier Latin, 2003.
GÉNY, François. As lacunas no direito . São Paulo: Saraiva, 2002.
GUASTINI, Riccardo. Dalle Fonti alle Norme . Torino: Giappichelli, 1992.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 208/211
207
______. Teoria e Dogmática delle Fonti . Millano: Giuffré Editore, 1998.
GUIBOURG, Ricardo A.; GHIGLIANI, Alejandro M.; GUARINONI, Ricardo V.Introducción al conocimiento científico . 3. ed. Buenos Aires: Eudeba, 1998.
GÜNTER, Klaus. Teoria da Argumentação no Direito e na Moral : Justificação eAplicação. Trad. Cláudio Molz; introdução à edição brasileira Luiz Moreira. SãoPaulo: Landy Editora, 2004.
HART, Herbert L. A. O Conceito de Direito . 3. ed. Trad. A. Ribeiro Mendes. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
HESSEN, Johannes. Filosofia dos Valores . Coimbra: Almedina, 2001.
JAKOBSON, Roman. Lingüística e Comunicação . Trad. Izidoro Blikstein e JoséPaulo Paes. São Paulo: Editora Cultrix, 2007.
______. Teoria Geral das Normas . Trad. José Florentino Duarte. Porto Alegre:Sergio Antônio Fabris Editor. 1986.
______. Teoria Pura do Direito . Trad. João Baptista Machado. 7. ed. São Paulo:Martins Fontes, 2006.
KUHN, Thomas S. As estruturas das revoluções científicas . Trad. Beatriz Vianna
Boreira e Nelson Boreira. São Paulo: Perspectiva, 1970.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado . 11. ed. São Paulo: Método,2007.
LINS, Robson Maia. Controle de Constitucionalidade da Norma Tributária :decadência e prescrição. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
LOCKE, John. Zwei Abhandlungen über die Regierung , 2. Abhandlung. Stuttgart:Suhrkamp, 1978.
LOSANO, Mario G., Teoria Pura Del Derecho, Evolución y Puntos Cruciales . SantaFé de Bogotá, Colômbia: Editora Temis, 1992.
LUHMANN, Niklas. A Constituição como Aquisição Evolutiva. Trad. Prof. Menelick deCarvalho Neto. [Orig. ZAGREBELSKY, Gustavo; PORTINARO, Píer Paolo;LUTHER, Jorg (orgs.). La constituzione come acquisizione evolutiva. In: II futurodella constituzione . Torino: Einaudi, 1996).
______. El derecho de la sociedad . Mexico: Universidad Iberoamericana, 2002.
MACHADO, Hugo de Brito. A Supremacia constitucional como garantia docontribuinte. Revista dialética de direito Tributário . São Paulo: Dialética, n. 68, maio2001.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 209/211
208
MARIANO, Cynara Monteiro. Controle de Constitucionalidade e ação rescisória emmatéria tributária . Belo Horizonte: Del Rey, 2006.
MC na Reclamação 2.256-1, rel. Min. Gilmar Mendes.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo . 22. ed. SãoPaulo: Malheiros, 2007.
MENDES, Conrado Hübner. Controle de constitucionalidade e democracia . Rio deJaneiro: Elsevier, 2008.
MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional : o controle abstrato de normasno Brasil e na Alemanha. São Paulo: Saraiva, 2007.
MENDES, Sonia Maria Broglia. A Validade Jurídica Pré e Pós-Giro Lingüístico . SãoPaulo: Editora Noeses. 2007.
MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Fontes do Direito Tributário . Editora Noeses, 2006.
______. Revogação em Matéria Tributária . São Paulo: Editora Noeses, 2005.
MÜLLER, Friedrich. Essais zur theorie von Recht und Verfassung . Publ. RalphChristensen. Berlim: Duncker & Humblot, 1990.
NEVES, Marcelo. A Constitucionalização Simbólica . São Paulo: Editora Acadêmica,1994.
OGDEN, C. K.; RICHARDS I. A. O significado de significado : Um estudo dainfluência da Linguagem sobre o Pensamento e sobre a Ciência do Simbolismo.Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1972.
OLIVEIRA, Manfredo Araújo. Reviravolta lingüístico-pragmática na filosofiacontemporânea . São Paulo: Loyola, 2001.
OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro . 2. ed. ver. atual. SãoPaulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
______; HORVATH, Estevão. Manual de Direito Financeiro . 6. ed. rev. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2003.
OST, François. O Tempo do Direito . Trad. Élcio Fernandes. Bauru, SP: Edusc, 2005.
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz dadoutrina e da jurisprudência . 9. ed. ver. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado -ESMAFE, 2007.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 210/211
209
RAZ, Joseph. Legal Principles and the Limits of Law (Postscript). In: COHEN,Marshal (ed.), Ronald Dworkin and Contemporary Jurisprudence . Totowa, NewJersey: Rowman & Allanheld, 1984.
______. Legal Reasons, Sources and Gaps. In: ______. The Authority of Law .Oxford: Clarendon Press, 1979, p. 53-77.
RE nº 83.119 / SC, rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 14.02.97.
RE 105.012-8, rel. Min. Nery da Silveira, DJ 01.07.1988.
RE 179.170 / CE, rel. Min. Moreira Alves, DJ 30.10.1998.
RE 197.917, rel. Min. Gilmar Mendes, Ação Cautelar 189.
RE 346.084 / PR – PARANÁ. RECURSOEXTRAORDINÁRIO. rel. Min. Ilmar Galvão,rel. para acórdão: Min. Marco Aurélio, Julgamento: 09/11/2005, ÓrgãoJulgador: Tribunal Pleno, Publicação: 01.09.2006.
RE 390.840 / MG - MINAS GERAIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. rel. Min.Marco Aurélio, Julgamento: 09/11/2005, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Publicação:15.08.2006.
RE-AgR 278.466-4 / RS - RIO GRANDE DO SUL, rel. Min. Maurício Corrêa,
Publicação: 06.12.2002.
REALE, Miguel. Cinco Temas do Culturalismo . São Paulo: Saraiva, 2000.
______. Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 2002.
______. Teoria do Direito e do Estado . 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
ROBLES, Gregório. O Direito como Texto . São Paulo: Manole, 2005.
ROSS, Alf. Sobre el derecho y la justicia . 2. ed. Buenos Aires: Eudeba, 1997.
SAMPAIO, Tércio. Introdução ao Estudo do Direito . 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
SANTI, Eurico Marco Diniz de. (coord.). Curso de Especialização em DireitoTributário – Estudos Analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio deJaneiro: Editora Forense, 2005.
______ . Lançamento Tributário . 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 2001.
SCAVINO, Dardo. La filosofia actual : pensar sin certezas. Buenos Aires: Paidós,1999.
7/21/2019 Renata E Silva
http://slidepdf.com/reader/full/renata-e-silva 211/211
210
SUCUPIRA, Newton. Tobias Barreto e a filosofia alemã . Rio de Janeiro: Gama Filho,2001.
SUPERIOR TRIBUNAL FEDERAL. RTJ, 164:506, 1998, ADInMC 1.434-SP, rel. Min
Celso de Mello.
TAVARES, André Ramos. Tribunal e Jurisdição Constitucional . São Paulo: CelsoBastos Editor, 1998.
TOMÉ, Fabiana Del Padre. A Prova no Direito Tributário . São Paulo: Editora Noeses,2005.
______. Contribuição pra a Seguridade Social : A Luz da Constituição Federal. 1. ed.,3. tir. Curitiba: Juruá, 2004.