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REFORMA DO ESTADO E AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR:
TRAJETÓRIA E POLÍTICAS RECENTES
Sabrina Brüne1
RESUMO: O objetivo deste trabalho é de compilar Leis, Decretos, Portarias e demais medidas
normativas sancionadas durante o governo FHC (1995-2002) e Lula (2003-2010) que alteraram o
papel do Estado na educação superior, atribuindo- lhe maior papel de avaliador em detrimento do
papel de financiador. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e as principais fontes de
dados foram as Leis e Decretos que regulamentam a avaliação institucional. Este trabalho é um
desmembramento de uma dissertação de mestrado, ainda em andamento. Parte-se do pressuposto de
que a adoção do pacote de ideias neoliberais, no início dos anos 1990, contribuiu para iniciar uma
contrarreforma da educação superior que modificou o modelo de gestão universitária ao atrelá-lo a
lógica mercantil. Desde então, as IFES são instigadas a buscarem fontes de financiamento alternativas,
transformando-as em “empresas”. Com isto, torna-se necessário implementar mecanismos de controle
capazes de assegurar que as instituições permaneçam agindo conforme as leis de mercado, com
máxima eficiência e qualidade, com o mínimo de custos. Este é o principal papel do Estado na
educação superior hoje, que deve prezar pela qualidade do ensino e para tanto, utiliza um conjunto de
instrumentos avaliativos que contribuem para acirrar a competição dentro do ambiente acadêmico.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Superior; Avaliação Institucional; Papel do Estado; IFES.
INTRODUÇÃO
A trajetória da política para a educação superior é extensa e remete a primeira reforma
da educação superior, com a sanção da Lei n º 5.540/68, cuja redação preconiza a educação
superior pública, gratuita, com acesso equânime e financiamento estatal, alocados no território
nacional de maneira unificada. O modelo de gestão universitária previa a indissociabilidade
entre o tripé ensino, pesquisa e extensão (BRASIL, 1968).
Caminhando em direção contrária, a reforma educacional em pauta hoje, normatizada
pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB/96 (Lei n° 9.394 de 20 de
dezembro de 1996) atesta o esgotamento deste modelo anterior, afirmando que ele é incapaz
de atender as novas condições de mercado e da economia mundial (CATANI, 2002). Dessa
forma, as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) são pressionadas a diversificarem-
se, expandindo a oferta e modalidades de cursos a fim de atender diferentes mercados. Preza-
1 Mestranda em Desenvolvimento Regional e Agronegócio pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná
(UNIOESTE); Bacharel em Secretariado Executivo pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná
(UNIOESTE). Email: [email protected]
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se também a flexibilização dos formatos institucionais, implantando novas modalidades de
instituições, fato que contribui para desfazer a união do ensino, pesquisa e extensão. Outro
pressuposto da contrarreforma da educação superior é a modificação do papel do Estado, cuja
função prioritária resumiu-se a avaliador e coordenador do sistema, em detrimento da função
de mantenedor das IFES que anteriormente lhe cabia. Por esta razão, as IFES são
pressionadas a reduzir custos, racionalizando a gestão e aumentando os encargos docentes, e,
são incentivadas a cultivarem bons relacionamentos com o mercado, firmando parcerias e
convênios com o setor privado e oferecendo serviços remunerados (BRASIL, 1996).
O último pressuposto é o tema deste trabalho. A implantação da política neoliberal que
culminou na diminuição do papel estatal transformou o modus operandi das instituições,
mercantilizando-as. Ao Estado, restaram-lhe principalmente as funções de avaliação
institucional, abordadas neste trabalho.
OBJETIVOS
O objetivo principal deste trabalho é de sistematizar a trajetória das medidas
normativas sancionadas ao longo do governo FHC (1995-2002) e Lula (2003-2010) que
alteraram o papel do Estado na educação superior, atribuindo- lhe maior papel de avaliador e
coordenador do sistema em detrimento dos papéis de gestor e financiador das IFES.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica. As principais fontes de dados
foram as Leis e Decretos que regulamentaram e ainda regulamentam a avaliação institucional.
Este trabalho é um desmembramento de uma dissertação de mestrado, que ainda está em
andamento.
RESULTADOS
A redação da LDB/96, atrelada à adoção de políticas neoliberais que prezam o “Estado
mínimo” e os direcionamentos fornecidos pelo Banco Mundial delinearam o papel do Estado
no que tange a educação superior, desde o início da década de 1990. Com isto, modificou-se o
posicionamento estatal de interventor para controlador, partindo do pressuposto de que as
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IFES devem buscar recursos por fontes próprias e o Estado deve assegurar que as instituições
sejam de qualidade, via avaliação institucional. Assim, a avaliação institucional tornou-se o
ponto central da pauta de ações estatais para a educação superior. De fato, ela tornou-se
imprescindível, uma vez que, as instituições foram designadas como prestadoras de serviços
atreladas à lógica mercantil e emergiu a necessidade de fiscalizar se as elas estão agindo
dentro das premissas de eficiência e qualidade.
Nesse sentido, a LDB/96 atribui ao poder estatal o credenciamento/recredenciamento
de instituições, o reconhecimento/renovação de reconhecimento de cursos e a avaliação
institucional. Pela LDB/96, as instituições passaram a ter prazos, sendo necessária a
renovação periódica, via processos avaliativos. Em caso de avaliação negativa, a lei
estabelece um limite de “saneamento de deficiências” para, findo este prazo, reavaliar a
instituição. As instituições que não se adequarem às normas impostas, não corrigindo as
deficiências no período de saneamento poderão sofrer intervenção, suspensão temporária de
autonomia ou descredenciamento (BRASIL, 1996).
O art. 46 da LDB/96 apresenta as diretrizes de reconhecimento e renovação de
reconhecimento de cursos e credenciamento/recredenciamento de instituições e como ele não
apresentava especificidades sobre a avaliação institucional, um decreto foi baixado,
posteriormente revogado por um segundo, mas ambos estabelecendo procedimentos para o
processo de avaliação dos cursos e instituições de ensino superior. O primeiro deles foi o
Decreto nº 2.026/96 de 10 de outubro de 1996, ainda no primeiro mandato de Fernando
Henrique Cardoso (1995-1998). O segundo, revogado pelo primeiro, foi o Decreto nº
3.860/01 de 09 de julho de 2001, elaborado no segundo mandato de FHC (1999-2002).
Entretanto, o decreto que vigora atualmente é o Decreto nº 5.773, de 09 de maio de 2006,
instaurado no primeiro governo de Lula (2003-2006).
Quadro 1 - Principal diferenças entre os Decretos 2.026/96 e 3.860/01 no que tange a avaliação institucional
Decreto nº 2.026/96 de 10 de
outubro de 1996.
Decreto nº 3.860, de 09 de
julho de 2001.
A avaliação compreende os
procedimentos
- análise dos indicadores de
desempenho global, por região,
estado, área de conhecimento e/ou
natureza da instituição, levantados
pelo SEDIAE*;
- avaliação individual da instituição
(com ensino, pesquisa e extensão);
- avaliação dos mesmos
indicadores globais, porém sob
responsabilidade do INEP**;
- avaliação de desempenho
individual das instituições;
- avaliação da graduação por
curso (condições de oferta,
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- avaliação da graduação por curso
(condições de oferta, resultado do
Exame Nacional de Cursos);
- avaliação de mestrados e
doutorados por área de
conhecimento.
resultado do Exame Nacional
de Cursos).
Desempenho Global
- taxa de escolarização bruta e
líquida;
- taxa de disponibilidade e utilização
de vagas para ingresso;
- taxa de evasão e de produtividade;
- tempo médio para conclusão dos
cursos;
- qualificação docente;
- relação aluno x docente
- tamanho médio das turmas;
- participação da despesa com
ensino nas despesas públicas com
educação;
- despesa pública por aluno;
- despesa por aluno em relação ao
PIB;
- proporção da despesa pública com
remuneração docente.
- o art. 17 apenas explica que a
avaliação será feita pelos
indicadores de desempenho
global do sistema nacional de
educação superior por região,
estado, área de conhecimento,
natureza das instituições,
definidos no Sistema de
Avaliação e Informação
Educacional do INEP.
Presume-se que os mesmos
índices do decreto anterior
sejam considerados.
Avaliação Individual da
Instituição
- conduzida por comissão designada
pela SESu, externa a instituição;
- considera: i) administração geral;
ii) administração acadêmica; iii)
integração social e; iv) produção
científica.
- considera i) autoavalição; ii)
resultados do ENC; iii) avaliação da
CAPES e; iv) indicadores de
desempenho global
- considera, pelo menos, os
itens: i) grau de autonomia
cedido por quem a mantém; ii)
plano de desenvolvimento
institucional; iii)
independência acadêmica dos
colegiados; iv) acesso a redes
de comunicação e sistemas de
informação; v) estrutura
curricular e sua adequação as
diretrizes curriculares
nacionais da graduação; vi)
critérios para avaliação de
rendimento escolar; vii)
programas de integração
social; viii) - produção
científica, tecnológica,
cultural; ix) condições de
trabalho e qualificação
docente; x) autoavaliação e
providências para saneamento
de deficiências já identificadas
e; xi) resultados de demais
avaliações do MEC.
Avaliação dos Cursos de
Graduação
- considera: i) organização didático-
pedagógica; ii) instalações físicas no
geral; iii) instalações espefícias
(laboratórios, oficinas); iv)
qualificação docente; e v) acervo
bibliográfico.
- avaliação das condições de
oferta de cursos será realizada
in loco por comissão
designada;
- considera: i) organização
didático-pedagógica; ii) corpo
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docente, titulação, experiência,
jornada; iii) instalações físicas
gerais e específicas e; iv)
acervo bibliográfico;
- esta análise subsidia
reconhecimento e renovação
de reconhecimento de cursos
superiores.
Avaliação da Pós-Graduação - cabe a CAPES, com seus próprios
métodos.***
- permanece cabendo a
CAPES, com seus próprios
métodos.
Fontes: Elaboração própria com base nos Decretos nº 2.026/96 de 10 de outubro de 1996 e Decreto nº 3.860, de
09 de julho de 2001
* Secretaria de Avaliação e Informação Educacional.
** Os dados levantados serão tratados pelo Sistema de Avaliação e Informação Educacional do INEP.
*** Consultar Quadro 02.
Além destas, outras diferenças entre os dois decretos podem ser apontadas. O segundo
ordena as competências das instituições públicas, privadas e das entidades mantenedoras,
aborda as formas de organização acadêmica (universidades, centros universitários e
faculdades, faculdades integradas, institutos ou escolas superiores), prega a publicidade e
transparência dos dados institucionais, fornece instruções quanto ao processo de autorização
para funcionamento de instituição e reconhecimento de curso superior. O primeiro decreto
não abordou nenhum destes pontos.
Ainda, ambos os decretos deixam claro, no art. 2º, que os instrumentos de avaliação,
apesar de complementares, são independentes entre si e podem ser conduzidos em diferentes
momentos e valendo-se de técnicas que as entidades responsáveis julgarem adequadas
(BRASIL, 1996; BRASIL, 2001).
Ao analisarem-se estes regulamentos, pode-se perceber que a lei exige uma avaliação
constante e sistemática das instituições, oferecendo prazos limites para a correção de
eventuais falhas. No caso das instituições públicas, em especial as federais, nota-se que é
responsabilidade do órgão que a mantém auxiliá-la no processo de habilitação, inclusive
fornecendo recursos extras se este for o caso.
O resultado destes programas reflete no funcionamento da instituição. Cursos com
avaliação ruim podem ser fechados e cursos que obtiveram boa classificação são
automaticamente recredenciados. O intuito destes programas ainda consiste em instituir um
sistema de incentivo e punições, com foco no estímulo à eficiência e a produtividade.
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Desde as reformas iniciadas no governo FHC (1995-2002), novos procedimentos
foram implantados no processo de avaliação da educação superior no Brasil. O Quadro 2
destina-se a resumir os principais instrumentos utilizados pelo referido governo na avaliação
da educação superior.
Quadro 2 - Instrumentos de avaliação institucional introduzidos no governo FHC (1995-2002).
NOME ORGÃO
FISCAL
REGULAMENT
AÇÃO OBJETIVOS PRINCIPAIS CONSIDERAÇÕES
Avaliação dos
Programas de
Pós-Graduação
Capes
Portaria Nº 80 de
16 de dezembro
de 1998
- estabelecer padrão de qualidade
nos mestrados e doutorados;
- fundamentar os pareceres do CNE
sobre autorização e renovação de
reconhecimento de mestrados e
doutorados;
- impulsionar a evolução do sistema
de Pós-Graduação, antepondo metas
e desafios;
- contribuir para o aprimoramento
de cada curso, fornecendo
assistência;
- contribuir para o aumento da
eficiência no atendimento de
necessidades regionais e nacionais
na formação de recursos humanos
de alta qualidade;
- gerenciar um banco de dados
sobre a pós-graduação no Brasil;
- subsidiar a definição de políticas
de desenvolvimento da pós-
graduação.
- há duas formas de
avaliação: i)
acompanhamento anual e.
ii) avaliação trienal;
- os resultados são em
escala (1-7);
- o CNE delibera com
base na nota quais cursos
obterão a renovação do
reconhecimento;
- em 1998 foi definido que
a nota 5 só seria atribuída
a programas que tivesse
também o Doutorado.
Programa de
Avaliação
Institucional
das
Universidades
Brasileiras –
PAIUB
MEC
Decreto nº 2.026
de 10 de outubro
de 1996
- promover autoavaliação
institucional;
- respeitar a identidade institucional
e prezar a comunidade acadêmica;
- auxiliar no processo de
aperfeiçoamento da instituição;
- estabelecer três fases centrais de
avaliação: Avaliação Interna,
Avaliação Externa e Reavaliação.
- não há punições ou
recompensas, sua adesão é
voluntária;
- ferramenta de
planejamento e de
prestação de contas da IES
à sociedade;
- preza ensino, pesquisa e
extensão.
Avaliação das
Condições de
Oferta de
Cursos de
Graduação
Secretaria
de
Educação
Superior
(SEsu)
Decreto nº 2.026
de 10 de outubro
de 1996, revogado
pelo Decreto nº
3.860 de 09 de
julho de 2001;
Lei 9.131 de 24
de novembro de
1995;
LDB de 1996
- prezar pela avaliação dos itens: i)
organização didático-pedagógica;
ii) adequação das instalações físicas
gerais e especiais (laboratórios,
oficinas); iii) qualificação docente
(titulação, regime de trabalho,
produtividade); e iv) acervo
bibliográfico e modernização de
serviços.
- em outubro de 1999,
foram avaliados os cursos
submetidos ao Provão
98/99;
- atribui-se conceitos na
escala: Condições Muito
Boas, Condições Boas,
Condições Regulares,
Condições Insuficientes.
Exame
Nacional de
Cursos (ENC-
Provão)
MEC
Decreto nº 2.026
de 10 de outubro
de 1996.
- avaliar o processo de ensino-
aprendizagem por aluno;
- avaliar e divulgar os resultados
anualmente;
- garantir o sigilo das notas
individuais;
- a Lei 9.131/95 que
substituiu o CFE pelo
CNE também substituiu o
“Provão” pelo ENC;
- houve resistência entre
IES privadas;
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- anunciar quais cursos participarão
das provas anualmente;
- fomentar iniciativas para melhorar
a qualidade do ensino;
- utilizar os dados no processo de
(re)credenciamento das IES.
- aplicado aos formandos,
no período de 1996 a
2005.
Fonte: Elaboração própria com base em Catani (2002) e nos Decretos, Leis e Portarias citados.
Assim, apesar da política educacional do governo FHC prezar a expansão do ensino
superior pelas instituições privadas, percebe-se que esta expansão privada se deu atrelada à
avaliação institucional, com o intuito de ofertar ensino superior de qualidade.
Dos instrumentos avaliativos dispostos no Quadro 2, o Exame Nacional de Cursos
foi o que mais recebeu críticas. Calderón (et al, 2011) explica que o exame era aplicado aos
acadêmicos e consistia em uma prova de conhecimentos específicos. Posteriormente, os
alunos concluintes no ano da avaliação respondiam um questionário e o desempenho dos
acadêmicos nestes testes é que definia o conceito da instituição.
Outro instrumento quantitativo aplicado no governo de FHC foram os censos anuais
da educação superior, compilando indicadores globais e específicos de cada instituição de
ensino superior do Brasil.
Com o término do mandato de FHC e início do governo Lula, em 2003, a reforma
educacional, no que tange a avaliação institucional, percorreu caminho semelhante ao tomado
até então. Apesar do discurso presidencial de ruptura com o modelo de avaliação anterior, o
fato é que as políticas neoliberais ainda foram as principais norteadoras da avaliação,
valorizando a concorrência entre as instituições, a racionalização dos custos e da gestão e
divulgando amplamente os resultados de cada instituição na mídia (CALDERÓN ET AL,
2001; FERREIRA, 2012).
Assim, assistiu-se durante o governo de Lula a aplicação das mesmas práticas
mercadológicas, porém revistadas, adotadas como diretrizes da avaliação institucional. O
Exame Nacional de Cursos (ENC-Provão) foi substituído pelo Sistema Nacional de Avaliação
da Educação Superior (Sinaes), instituído pela Medida Provisória 147 ainda no primeiro ano
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de governo Lula, em dezembro de 2013 e alterado no Congresso Nacional em 2004,
culminando na Lei nº 10.861 de 14 de abril de 2004.
Quadro 3 - Instrumentos de avaliação institucional introduzidos no governo Lula (2003-2010).
Lei nº 10.861 de 14 de abril de 2004 alterada por sucessivas normativas, em
especial no que tange o Enade
Instituição do Sinaes
- substituiu o ENC (de FHC);
- substituiu a Avaliação das Condições
de Oferta dos Cursos de Graduação (de
FHC);
- instituiu o Sinaes;
- regulamenta o Enade junto com a
Portaria INEP nº 107/2004 (que
estabelece que o exame será anual, mas
o mesmo curso será avaliado de 3 em 3
anos e os conceitos variam de 1 a 5);
- a Portaria INEP nº 107/2004 é
complementada pela Portaria
Normativa nº 40/2007 (sem revogá-la).
Fariam o exame os ingressantes com
7% até 22% da carga horária mínima e
os concluíntes com menos de 80%;
- a Portaria Inep nº 145/2009 alterou o
percentual para cursos superiores de
tecnologia. Ingressantes: 7 a 25% e
concluintes: 75% ou mais;
- a Portaria Normativa nº 8/2011
modificou o Enade 2011, o qual
considerou ingressantes aqueles com
matrícula no ano de realização do
exame e concluintes os prováveis
formandos do ano em exame e aqueles
com mais de 80% da carga horária
mínima do currículo concluída;
- a Portaria Normativa nº 40/2007
explica que os ingressantes que tiverem
realizado o ENEM poderão ser
dispensados do Enade mediante
comprovação de resultados válidos, via
comparação de resultado entre os dois
exames.
Decreto Presidencial n. 5.773 de 09
de maio de 2006
Regulação, Supervisão e Avaliação das
Instituições de Educação Superior
- dispõe sobre a regulação, supervisão e
avaliação de instituições de educação
superior e cursos superiores de
graduação e seqüenciais no sistema
federal de ensino;
- trata do credenciamento,
recredenciamento de instituições e
autorização, reconhecimento e
renovação de reconhecimento dos
cursos superiores;
- as funções previstas no decreto serão
exercidas pelo MEC, CNE, INEP e
CONAES;
- exercem funções a Secretaria de
Educação Superior, a Secretaria de
Educação Profissional e Tecnológica e
a Secretaria de
Fonte: Elaboração própria com base em Catani (2002) e nos Decretos, Leis e Portarias citados.
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O Sinaes é complementado por outros seis instrumentos: i) auto avaliação: realizada
pela Comissão Própria de Avaliação (CPA), instituída por servidores da instituição; ii)
avaliação externa: a IES recebe a visita no local de uma comissão designada pelo INEP; iii)
Enade: avalia o conhecimento adquirido pelos alunos ao longo do curso e, para tanto,
participam do exame os ingressantes e os concluintes de cada curso; iv) Avaliação dos Cursos
de Graduação: abrange a autorização (quando uma IES solicita ao MEC autorização para abrir
um curso), o reconhecimento (realizado quando a primeira turma de ingressantes conclui o
curso) e a renovação de reconhecimento (é trienal e baseia-se no Conceito Preliminar do
Curso); v) Censo da Educação Superior: ferramenta independente da avaliação, porém
auxiliar. O censo coleta os dados referentes a fim de fornecer um amplo panorama da
educação superior e; vi) Cadastro: disponibilização de informações por parte das instituições
(BRASIL, 2004; BRASIL, 2008).
Destaca-se que estes procedimentos avaliativos são coordenados pela Comissão
Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), mas sua operacionalização é
incumbência do INEP.
Após a implementação do Sinaes, o Enade foi o mecanismo de avaliação que acabou
sobrepondo-se sobre os demais. Por essa razão, Barreyro e Rothen (2009) explicam que o
governo intencionalmente decidiu transformar o Enade na principal ferramenta de avaliação,
baixando a Portaria Normativa nº 40 que sancionava a criação do Conceito Preliminar de
Cursos.
Os autores ainda explicam que este Conceito Preliminar de Cursos, como o próprio
nome já diz, consiste em uma pré-análise elaborada para a renovação de conhecimento de
curso, que atribuiu o conceito com base nos dados do Censo da Educação Superior e dos
resultados do Enade. Caso esta nota previamente atribuída fosse satisfatória, as visitas in loco
de comissões do INEP poderiam ser dispensadas. Barreyro e Rothen (2009) complementam
explicando que, para a autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento, cada
curso declara suas informações em um formulário eletrônico, respondendo perguntas sobre a
infraestrutura, corpo docente e projeto pedagógico do curso.
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Calderón et al (2011) explica que a proposta do Sinaes visava perpassar a ênfase
dada à categorização das universidades em rankings de desempenho e a lógica de mercado
que caracterizou o governo anterior. Entretanto, conforme brevemente mencionado, dentre os
meios de avaliação que compõe o Sinaes, o que mais ganhou destaque foi o Enade, que
novamente enfatizada os rankings de desempenho das universidades. Assim, contrariando o
que havia sido proposto pelos formuladores do Sinaes, assistiu-se novamente o mesmo
fenômeno que caracterizou as políticas educacionais do governo de FHC: a subordinação da
avaliação institucional às lógicas de mercado, relegando para o segundo plano o objetivo
principal da avaliação, qual seja, prezar pela qualidade do ensino (também da pesquisa e
extensão no caso das universidades) e auferir os níveis de desenvolvimento das instituições
como parte de um projeto de planejamento e também de correções que se façam necessárias.
CONCLUSÕES
A contrarreforma da educação superior iniciada na década de 1990 com a adoção do
“pacote” de políticas neoliberais modificou o modelo de qualidade subjacente às políticas de
avaliação institucional das IES brasileiras. A análise da trajetória das Leis, dos Decretos, das
Portarias e demais medidas normativas permite concluir que a expansão do ensino superior
infelizmente foi acompanhada pela mercantilização, inundando o ambiente universitário com
a lógica empresarial. Invariavelmente, a avaliação da educação superior se baseia neste
mesmo preceito, cobrando racionalidade e eficiência ao mesmo tempo em que reduz o
financiamento.
A importação do neoliberalismo e o consequente alinhamento da política educacional
com os ditames de organismos internacionais contribuiu para minimizar a atuação do Estado
na educação superior. Com a ausência do Estado mantenedor, as IFES devem financiarem-se
a si mesmas, na maioria de seus projetos, por meio de parcerias com o setor privado,
prestação de serviços de pesquisa, consultoria e através de qualquer forma de capitalização
que se disponha. Uma vez transformadas em empresas e agindo pelas vias da administração
empresarial privada, torna-se necessária a implementação de mecanismos de controle capazes
de assegurar que as instituições permaneçam agindo conforme as leis de mercado, de máxima
eficiência e máxima qualidade, com o mínimo de custos.
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Neste cenário entra o Estado, que, agora com papel reduzido, deve prezar pela oferta
de ensino superior com qualidade e para tanto, utiliza-se dos meios expostos neste trabalho,
incitando a concorrência no meio acadêmico ao divulgar os resultados da avaliação
institucional em forma de ranking de desempenho (CALDERÓN et al, 2011). O que se
percebe é que as avaliações institucionais realizadas na forma de avaliação de rendimento
acadêmico e nas avaliações das próprias instituições possuem um intuito subjetivo de permitir
que o Estado mantenha o controle sobre quais investimentos conduzem a maior qualidade das
IES.
A forma de se administrar universidades, inspirada em políticas neoliberais que
preconizam que técnicas de administração de empresas privadas sejam aplicadas ao ensino,
vai contra os atributos de ensino, pesquisa e extensão historicamente inerentes à instituição.
Contradiz-se o campo de atuação das IES, pois por um lado, o Estado lhes dá autonomia para
tomar decisões sobre sua própria gestão, por outro trava sua atuação ao privar-lhe de
financiamentos. Contradiz-se a natureza histórica da universidade e sua condição inerente, sua
vocação primeira de “ser campo de reflexão, crítica, descoberta e invenção de conhecimento
novo, comprometido com a construção e consolidação de uma sociedade democrática”
(CATANI, 2002, p. 15). As instituições de ensino superior não deveriam ser entendidas como
um meio de reprodução de poderes e capital, subordinada aos ditames do mercado.
Perante a situação descrita, o cenário que se esboça é de condução a um processo de
desintegração da universidade como um elemento institucional dotado de identidade,
historicidade e anteriormente comprometido com a sociedade. O que se percebe é um
distanciamento da universidade como uma instituição social, cujo papel de democratização e
emancipação da sociedade atenua-se na medida em que novas características mercadológicas
se sobressaem.
REFERÊNCIAS
BRASIL. MEC. Lei nº. 9394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. Brasília: Diário Oficial da União de 26.12.1996.
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BRASIL. Decreto nº 2.026, de 10 de outubro 1996. Estabelece procedimentos para o processo e
avaliação dos cursos e instituições de ensino superior. Brasília: Diário Oficial da União de
10.7.2001.
______. Lei n º 5.540, de 28 de novembro de 1968. Fixa normas de organização e funcionamento
do ensino superior e sua articulação com a escola média, e dá outras providências. Brasília:
Diário Oficial da União de 23.11.1968 e retificado no DOU de 3.12.1968.
______. Decreto nº 3.860, de 9 de julho de 2001. Dispõe sobre a organização do ensino superior, a
avaliação de cursos e instituições, e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União de
10.7.2001.
______. Decreto nº 5.773, de 9 de maio de 2006. Dispõe sobre o exercício das funções de regulação,
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seqüenciais no sistema federal de ensino. Brasília: Diário Oficial da União de 10.5.2006.
______. Portaria nº 80, de 16 de dezembro de 1998. Dispõe sobre o reconhecimento dos mestrados
profissionais e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União de 11.01.1999.
______. Medida Provisória 147 de 15 de dezembro de 2003. Institui o Sistema Nacional de
Avaliação e Progresso do Ensino Superior e dispõe sobre a avaliação do ensino superior. Brasília:
Diário Oficial da União de 16.12.2003.
______. Lei n. 10.861, de 14 de abril de 2004. Institui o Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior – SINAES e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União de
15.4.2004.
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BARREYRO, G. B.; ROTHEN, J. C. Avaliação da educação superior no segundo governo Lula:
“Provão II” ou a reedição de velhas práticas?. In: REUNIÃO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO
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CALDERÓN, A. I., POLTRONIERI, H., BORGES, R. M. Os rankings na educação superior
brasileira: políticas de governo ou de Estado? Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 19, n.
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