Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
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Manguesia A Poesia da Lama
Jefferson Ferreira Wesolowski
2012
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
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“Fui no Mangue pegar lixo, catar Caranguejo, conversar com
Urubu!” Chico Science & Nação Zumbi
“Maternidade, Salinidade, Diversidade, Fertilidade, Produtividade: Mangue,
Mangue, Mangue, Mangue, Mngue...”
Mundo Livre S/A
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Á todos envolvidos no Projeto Manguebit, desde o
início até os dias de hoje.
Á Chico Science e Toda Nação Zumbi, ao mundo
livre S/A.
Á Jusciane Pereira de Andrade, musa e inspiração.
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Índice
Caranguejos com Cérebro.....................................13
Geografia da Fome................................................17
Emergindo.............................................................21
M.A.N.G.U.E........................................................23
Mangue Sempre....................................................25
Na Sombra.............................................................27
Mesmice................................................................29
Alho.......................................................................31
Carapaça................................................................37
Um Passo a Frente.................................................41
Urubuservando......................................................47
Vigor.....................................................................49
Um Dia..................................................................51
Crescendo com Coração........................................55
Sinta......................................................................59
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Voltando................................................................61
Manguesia.............................................................63
Nação em Festa.....................................................64
Folhas....................................................................65
Doceira..................................................................69
Pelas Ruas.............................................................71
Undreground.........................................................73
Vamos Dançar (Manguebit a Cena)......................75
Absoluto................................................................79
Otário....................................................................81
Abordado..............................................................85
Minha História......................................................89
Sampler’s (Trocando uma idéia com Chico)........95
Quanto Vale uma Vida?........................................99
O Autor...............................................................113
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CARANGUEJOS COM
CÉREBRO
(MANIFESTO I)
FRED ZERO QUATRO
O primeiro manifesto do Mangue, na íntegra e em
sua versão original de 1992.
MANGUE, O CONCEITO.
Estuário. Parte terminal de rio ou lagoa.
Porção de rio com água salobra. Em suas margens
se encontram os manguezais, comunidades de
plantas tropicais ou subtropicais inundadas pelos
movimentos das marés. Pela troca de matéria
orgânica entre a água doce e a água salgada, os
mangues estão entre os ecossistemas mais
produtivos do mundo.
Estima-se que duas mil espécies de
microorganismos e animais vertebrados e
invertebrados estejam associados à vegetação do
mangue. Os estuários fornecem áreas de desova e
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criação para dois terços da produção anual de
pescados do mundo inteiro. Pelo menos oitenta
espécies comercialmente importantes dependem do
alagadiço costeiro.
Não é por acaso que os mangues são
considerados um elo básico da cadeia alimentar
marinha. Apesar das muriçocas, mosquitos e
mutucas, inimigos das donas-de-casa, para os
cientistas são tidos como símbolos de fertilidade,
diversidade e riqueza.
MANGUETOWN, A CIDADE
A planície costeira onde a cidade do Recife
foi fundada é cortada por seis rios. Após a expulsão
dos holandeses, no século XVII, a (ex)cidade
*maurícia* passou desordenadamente às custas do
aterramento indiscriminado e da destruição de seus
manguezais.
Em contrapartida, o desvairo irresistível de
uma cínica noção de *progresso*, que elevou a
cidade ao posto de *metrópole* do Nordeste, não
tardou a revelar sua fragilidade.
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Bastaram pequenas mudanças nos ventos da
história, para que os primeiros sinais de esclerose
econômica se manifestassem, no início dos anos
setenta. Nos últimos trinta anos, a síndrome da
estagnação, aliada a permanência do mito da
*metrópole* só tem levado ao agravamento
acelerado do quadro de miséria e caos urbano.
MANGUE, A CENA
Emergência! Um choque rápido ou o Recife
morre de infarto! Não é preciso ser médico para
saber que a maneira mais simples de parar o
coração de um sujeito é obstruindo as suas veias. O
modo mais rápido, também, de enfartar e esvaziar a
alma de uma cidade como o Recife é matar os seus
rios e aterrar os seus estuários. O que fazer para
não afundar na depressão crônica que paralisa os
cidadãos? Como devolver o ânimo, deslobotomizar
e recarregar as baterias da cidade? Simples! Basta
injetar um pouco de energia na lama e estimular o
que ainda resta de fertilidade nas veias do Recife.
Em meados de 91, começou a ser gerado e
articulado em vários pontos da cidade um núcleo de
pesquisa e produção de idéias pop. O objetivo era
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engendrar um *circuito energético*, capaz de
conectar as boas vibrações dos mangues com a rede
mundial de circulação de conceitos pop. Imagem
símbolo: uma antena parabólica enfiada na lama.
Hoje, Os mangueboys e manguegirls são
indivíduos interessados em hip-hop, colapso da
modernidade, Caos, ataques de predadores
marítimos (principalmente tubarões), moda,
Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo
não-virtual, sabotagem, música de rua, conflitos
étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons
e todos os avanços da química aplicados no terreno
da alteração e expansão da consciência.
Bastaram poucos anos para os produtos da
fábrica mangue invadirem o Recife e começarem a
se espalhar pelos quatro cantos do mundo. A
descarga inicial de energia gerou uma cena musical
com mais de cem bandas. No rastro dela, surgiram
programas de rádio, desfiles de moda, vídeo clipes,
filmes e muito mais. Pouco a pouco, as artérias vão
sendo desbloqueadas e o sangue volta a circular
pelas veias da Manguetown.
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Geografia da Fome
Saiu de casa á correr, por que na dispensa não
tinha nada pra comer,
Foi ver, a procissão, o batuque da lata, na rabeira
do caminhão
A fala acelerada daquele que pregava.
Mesmo novo, ainda chié, já se emocionava.
Calma, que a noite tem zuada, foi-se o tempo
que não pagava nada
Que não pagava nada,
Tempos outros, tempo amarelo, agarrado á foice
e o martelo
Pra poder entrar, eo eo...
Tem que trabalhar, tem que trampar há há...
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Tem que trampar há há...
Se diverte no baque virado, se diverte no baque
solto
Sobe o morro, quebrando o silêncio que precede
o esporro!
Camelou como camelô, anunciou
Gritando forte Macô.
Vai pro baile de periferia, com as asas de urubu
e seria agora um gabiru.
A volante persegue o macaco
Que se esconde no mocambo assustado
Vê a figura paterna do mulambo
Que sai na madrugada para o escambo
Agarra pela pata a cria, que as cinco acorda
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E a corda sai de andada para suar sangue
Itacaré, Lagoinha ou qualquer outro mangue.
No final do dia, não imaginaria, não imaginaria.
Homem, criança, caranguejo ou lama,
Não sabe quem é quem, quem leva a fama
De alma sebosa, será agora
O homem caranguejo, patola
Carapaça, ficha na radiola
Uma idéia na cachola...
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Emergindo
Encarei os fatos, afagos e afetos
Necessito estar perto, da eletricidade
Que ilumina a cidade.
Em bares, lugares, onde estarei plugado
Sintozinado, com a antena captando
Boas, novas, ótima bibes
No estilo livro, freestayle.
Chapeú de palha, sandália de couro.
Meu brilho não é ouro.
Meu brilho não é ouro.
Músicando a poesia suja de barro
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Entoando alegria em meus lábios
Regando o que quer que a cultura plante
Vai emergindo vida lá do mangue.
Regando o que quer que a cultura plante
Vai emergindo vida lá do mangue.
Regando o que quer que a cultura plante
Vai emergindo vida lá do mangue.
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23
M.A.N.G.U.E.
Maneira Memorial, modelar
Mistos, maracatu, muita música
Movimento, mangue, mesclar!
Mais!
Agora, ansioso, alfaia arranja
Arredondado, assim age
Aratu, alvitre. alto, astuto.
Aqui!
Ninguém nunca navegou
Na nascente
Nossa nação novo nível!
Negro!
Guerreiro, gente gentil
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Guerreia geral, general
Guapo, Guadalupe.
Guararapes.
Gueto: grande gerador.
guerrilheiro!
Urgência, uma ultrapassagem
Um uivo, um urgido único
Umabrauna , ula-lá
Unha , urubu urge ungido
Ufa!
Emergência, emergindo
Eletricidade, Estado em eutanásia
Escapou, exílio
Ensinada, embolada
Escambo!
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Mangue Sempre
Se no Mangue a lama escura
É suja, A cultura lava a alma
Plante semeNtes, cultive na lama
Pois ninGuém dúvida do fruto
que inflama
Mude seU critério
Diversão dEve ser levada a sério!
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Na Sombra
Foi no Mangue
Foi no Mangue
Que a antena se enfiou
Que o satélite captou
Que a ciranda começou
Que o coco embolou
Foi no Mangue
Foi no Mangue
A Nação de Zumbi
Alimentou-se por aqui
Onde o homem caranguejo reside
Onde enfim o Mundo é Livre
O satélite captou?
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Captou!
A guitarra se plugou?
Sim Senhor!
O satélite captou?
Já falei que sim meu senhor, captou!
Foi no Mangue
Foi no Mangue
Foi no Mangue
Foi no Mangue
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Mesmice
Mesmice, mormaço, mesmice
Receptor ultrapassado, só capta tolices
Tudo igual atrasado, marasmo,
Parado.
Não tem direção, não tem direção
Se esconder em si, é correr parado
Estar longe sem sair daqui do lado
Mesmo mormaço,
Marasmo, mantém o mangue
Mantém o mangue
Sujo, mantém sujo o mangue
Sempre sujo.
Cujo deleite da mesmice das pessoas
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Do mesmo pássaro que voa
Na mesmice do urubu
No mesmo salto de aratu
Mas em desejo, desejo a debandada do
caranguejo
A corda sai de andada
Com a face incrustada na lama
A chama arde na patola, a sede
De se libertar, de criar o que não existe
Insiste e muda o critério
O grupo de caranguejo com cérebro.
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Alho
Faróis em oposto sentido, iluminam, quase
tiraram a visão
Seguro forte no volante com as duas mãos,
redobrando a atenção
Injúrias, ódio, abalo, sentimentos que apago
Não dirijo em contramão, a quarenta por hora
Ignora as buzinas que chamam-me agora
Sobe ladeira, verdadeira missão
Deixar o egoísmo, saio de primeira sem usar freio
de mão
Vou embora, vou voltar pensamentos alheios
São como o alho
Tempero de forte cheiro, e preço salgado
Por uma cabeça que nem sempre trará resultado
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Do alto se vê a cidade e suas pequenas pessoas
Com suas luzes de emergência ou mesmo a toa
Pessoas com pensamentos inoportunos
Tramando planos futuros
Pensando em se dar bem!
Ninguém, quer viver sem
Ninguém quer viver sem
Ostentando num grande vai e vem
Se ele tem eu quero também
Vou vivendo no ostracismo
Surrealismo, com Cristo no espírito
E o tanque na reserva, a descida longa me espera
Mas na minha situação, vou na banguela
Na cidade trafego em mentes que não me
entendem
E muitas vezes até mentem
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Bêbados, festeiros, putas e até trabalhadores
Mendigos, atletas, senhores
Vou embora, vou voltar pensamentos alheios
São como o alho
Tempero de forte cheiro, e preço salgado
Por uma cabeça que nem sempre trará resultado
Vale da Lama
E o dia chegou, solo fértil hostil!
Degradado, de bom grado, já sem agrado
Sai em disparada, e a jornada começa cedo
Tomado pelo medo se vai
Em nome do filho, em nome do pai
O rastro é de lama, anda em passos peculiares
Saindo sem seus familiares
Está só...
Na certeza que veio do barro e voltara ao pó!
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Aonde tu vais Chié?
Cuidado com o Urubu!
Te cuidas e fique em pé...
... mas primeiro terá que ficar sentado
Pra poder ensinar no mangue degradado.
Aonde tu vais Chié?
- Eu vou ali buscar a minha antena
- Eu vou ali buscar a minha antena
E Aquela Dama como se chama?
E Aquela Dama como se chama?
Que encontraste no meio do caminho
Te vi, e não estavas sozinho
E Aquela Dama como se chama?
Não sei.
Só sei que teremos novidade no vale da lama.
E Aquela Dama como se chama?
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35
Não sei.
Só sei que teremos novidade no vale da lama.
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37
Carapaça
Cada passo que é dado
Tem sido com cuidado
As pedras evoluídas
Criam sombras, habitat das mentes poluídas
Mesmo mormaço, mesmice
Crendice ampla que não se altera
Nem no vale da lama, nem as bestas feras
Diferente de tudo e de todos
Em seus atos e modos
A cena melancólica
Transmitindo em UHF ou parabólica
A cidade é mais suja que a lama do manguezal
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É a morada do mal, onde cada qual é o tal!
E a radiola? Sai a ficha da patola
Som na cachola, treme até lajota
A parabólica capta...
A parabólica Capta...
Para embolar camará, meu xará
No peito crachá, meu camará
Sotaque que vai do Pará, Paraná, Ceará
Rapá, é para embolar camará!
Camarada, tua antena não capta nada
Para embolar camará,
Para embolar camarada, bate na lata.
Hahaá!
Esperteza, realeza. Uma Antena na Cabeça!
Sai acelerado, como quem rouba. O Roubado!
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Cigarro, carro, agito. Pra ganhar tem que ser no
grito!
Táxi, ônibus, metrô. Em qual desses eu vou?
Logo hoje, logo eu. Eu tenho sede isso é meu!
Tô atrasado para ser roubado. Para o coletivo
lotado!
Para o beco da fome. Pela Dona que não sei o
nome!
Música. Quântica? Quantas vezes vou reclamar?
Tem que acabar. Tem sim! Será logo, ou esse é o
fim?
A vida ainda é dura. Herança da ditadura!
Elétrons percorrem minha artéria.
É manchete da matéria!
Eletrecidade...
Alimenta a cidade
Alimenta a cidade
Alimenta o mangue
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Alimenta o mangue
Alimenta o mangue
Alimenta o manguebit
Manguetown, this is it the city!
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Um Passo a frente
O mangue ninguém vai aterrar
Eletrecidade de sobra pode acreditar
As rimas da lama vão enfetiçar
Ou abençoar, era hora de versar.
Os caras de Pernambuco fazem o som
Esse é o dom, eu vou rimando essa é minha
participação, sangue bom,
A unidade é o bit, o tema é o mangue
Segura o rojão, não se espante!
A cena urbana com o maracatu rural
É manifesto, é movimentação cultural
Manguestar, humildade 1000
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Vamos acordar Brasil!
Metralhadora de rimas, se encontra em qualquer
esquina, seja Recife, seja Olinda
Viva a mesa de bar, tem que versar
Informática, ficção, animo, injeção
Alunos, discípulo aprendo com a internet
Mas os ensinamentos são de grandes mestre
Homenagem, camaradagem
Caranguejo sulista
Ou som da magia nordestina
Delegacia não me prende
Balas não matam pensamentos
Ascendem as mentes, a qualquer momento
Meteoro cai na terra e se incinera
O movimento incinera e ganha terra
Atrasa lado fala mal joga sapato
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Mas o som ta no rádio, e mesmo anda ligado
Levou meu louvor, cântico ao irmão sol
Empesteia o ar como aerossol
Pego a caneta, correta a letra
Dj se adianta e escolhe o vinil
Logo menos um hino que surgiu
Suas notas na viola, o mangue não é moda
É cabuloso, som do terceiro mundo
Som nervoso!
Qual é a sua? Eu vou se Suassuna
No satand up cômico e inteligente
Irreverente, meu beat é contundente
Coleciono discos de heróis
Sons que sois colírio
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Uso óculos de sol com quando saio da lama
Bebo água fria, porque senão a garganta inflama
Senão ia de cana, ou mesmo com uma bagana
Mas ai ainda é cana.
Mangue de mesa, manguebit se palco
No som do rádio no carro
Ta ligado?
Manguesia no sarau
Mangue cultural
Ta no cinema, no teatro, na capa do jornal
Na HQ, na moda, mas não é moda
Vai entender
Ta em todos lugares, só não se vê na TV
Pode crê
Toca no rádio, mas só na comunitária
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45
Na internet, rede libertária
Liberta as bobagens que invadem a cena
Sem problema, o mangue ainda tem vários temas
Nessa constelação, a estrela que menos brilha é
que habito, sai como um tiro
A noticia ecoada, logo mais toda via láctea
também se apaga.
Cidadão normal ta no hospício, aqui fora cada
louco tem seu vicio
Eu escrevo, e mando regado recado
Como um regalo
Plugado, desplugado, rimático
Matemático, metafisico, quântico, ou engenheiro
De livros, arquiteto de rimas, maloqueiro
De alta classe, que toca violino
Bebe vinho tinto
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E segue o mangue como instinto
Escreve a vida sua, ainda com olhos de menino!
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Urubuservando
Vôo rasante, arrestante a beira do mangue
Nesse instante, o sangue ferve, o ódio cresce
O manguezal é a escapatória
No canavial a luta heróica
Foi-se mantê-lo
Com a foice e o martelo
No groove, bater palma a palmares
No lombo do bumba boi
Para o Quilombo se foi
Cordão de ouro, berimbau, ciranda e coco
Os macacos afoitos
Daruê Malungo, continua soltou
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Dispara ajada, rapidamente
De repente
De rapente
O cano do fuzil incandescente
Parece até mesmo um lampião
Com ele a volante não tem vez não!
Pede ajuda ao conselheiro
Na fé de Zapata, de Corisco Cangaceiro
Da terra seca á terra preta
Com a força de uma pantera negra
Urubu observa e fica calado
Agora o Baile é Perfumado
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49
Vigor
Vê-se a cidade iluminada
Pelas luzes do desespero
Sabe-se que a disputa está acirrada
Em algum lugar terá tempero?
Urge! Da Lama criaturas
Caranguejos com cérebro a loucura
Mangueboys e a vida ainda é dura
Manguetown, persiste, resiste
A cena ainda escura, aqui é manguebit
Vou na fé, vou a pé
É eu na parada
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50
Tô na área, sai de cima do murro
Minha corda sai de andada
Com fome de tudo
Pluga, aumenta o som, não tem mute
É manguegroove!
É manguegroove!
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51
Um Dia
Depois do doce balanço
Da brisa suave, repouso
Sol leve, leve sensação de descanso
No intuito oportuno de um dia manso
Depois das águas cristalinas do lago
Logo miro o horizonte, e apago
No mesmo instante, imagem mirabolante
Tijolos vermelhos empilhados
Moradia vertical, prédio inacabado
Em um sonho irreal, some da vista
Os montes que se esconde por detrás
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52
Da paisagem urbana que jaz
A beleza do campo, que não se recupera jamais
Haverá de ver somente, da sacada
Em comemoração
A paz que não se tem na televisão
No encosto, o vento gostoso
Despenteia dos cabelos, refresca o rosto
Alegra o coração, sentimento bom
E quem ficou na margem oposta, insatisfação
Vera apenas as luzes da informação
Não verá as águas em seu bailado primordial
Lerá na placa Edifício Montreal
Sentado á grama, é questão de tempo
O saco plástico, trago pelo vento
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53
Provindo de uma janela entreaberta
Em hora incerta, e hora do alerta!
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55
Crescendo com Coração
E se na rua de trás
Você me esperar e não deixar jamais?
Singrando o destino, menino que tudo vê
Não tem nada a vê com os padrões da TV
Vai emigrar, vai se exilar
Vai buscar não se emocionar
Será o bem que não teve
Terá que estar onde nunca esteve
Vai se batizar, vai se exorcizar
Um dia fora lagarta, agora vai voar
Era carcaça, poste o motor pra arrancar
Pra arrancar
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56
Desancorar, embarcar, decolar, lagar
Nascente, crescente, afluente
Recrutamento, treinamento, missão
Preparação, sofrimento sério
Medalha de honra ao mérito
Livro com leitura iniciada
Peça começada, poesia inacabada
Desfecho apenas de um trecho
Capitulo preferido ainda não definido
Empréstimo não devolvido
E se na rua de trás
Você me esperar e não deixar jamais?
Segue sentimento transcendental, milenar
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57
Desde antes da cruz, testemunha ocular
Vai emigrar, vai se exilar
Vai buscar não se emocionar
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59
Sinta
pague a luz, tire o capuz que
cobre a ignorância, sinta na pele a
beleza da dama, sinta na mente a
idéia do homem coerente, sinta nos dedos, na
ponta dos dedos a vida, que não quer, não atira.
Tire o sapato da arrogância, cubra-se
apenas com o lençol da perseverança, se encha de
desejo, aproveite, mas não goze de preconceito,
rejeite.
Mude, escute, não ilude, fale, não tecle
mute. Captarás um sonho, mas não será o seu,
mas realize, por que também é meu, o pão nosso
só será nosso se ficarmos de pé, pois quem reza
deitado não tem fé!
A
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Voltando
Vou voltar
Esteja a me esperar
Vou voltar
Quando sai, não me despedi
Não foi por erro não
Não foi por má educação
Não queria, que seus olhos belos se inchassem
Avermelhassem e transbordassem
De saudade! De meia culpa
A disputa é injusta e você sabe
Não fique triste, a vida não é filme
É verdade.
Mas estou voltando para ti
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62
Pra ver o lindo rosto
Retomar meu posto
Em lua cheia, cheia de maré
Maduro, já não sou chié!
Na pedra a beira mar
Na praia em luar, espetacular
Eu voltaria que alegria
Estou aqui, para ti
Estou aqui, perto de ti.
Te carreguei em memória, ilusória
Foram as vezes que minha mente contraditória
Não permitiu recíproca oratória
Majoritário meu desejo, esbravejo
Vou voltar
Esteja a me esperar.
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63
Manguesia
Música de
Atitude
Na base
Gera sempre
Ultra
Energia
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65
Nação em Festa
Batuque de zabumba, toque de maracatu
Scratch, viola, sai de baixo
Bateria, percursão, festa para Nação
Nação Zumbi, Nação de Maracatu em festa
Rock, rap fusão, em festa estão, festão
E o Caldeirão, também em festa
Zona da mata, Serra da Barriga, Alto José do
Pinho, Peixinhos, Daruê Malungo
O Pernambuco em festa
Oasis, Abril é tempo de festa
Skate, quadrinhos, cinema
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66
Na mídia os queridinhos em festa
Lamarca, Marighella, Lampião
Conselheiro , Panteras é festa
Festa na mata, no serrado, na seca, na lama, no
mangue, a periferia, na favela, na viela
No coletivo, no mocambo com mulambo
No boteco é festa
Festa da Nação
Nação em festa
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67
Folhas
A próxima folha do caderno
Trás complexo eterno
Mesmo nova e inspiradora
Trás marcas de outrora
De escritas passadas
Antigas idéias registradas
Que mesmo apagadas, folhas rasgadas
Estão marcadas na nova página
E minha vida, a sua, aqui se encaixa
Nada apaga as falhas
Não da pra começar de novo
Recomeço, não mereço
Pago pelo mal
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69
Doceira
Uma roda de crianças de cartola
Algumas com carapaças e patolas
Riem alto, na lama e no asfalto
Graças a doceira, que finamente
Finamente trouxera o doce
Hahaha doceira nunca fostes
Sem efeito escrevo
Mas vejo sem preconceito
Quem prefere o defeito
Brigadeiro, granulado deixa louco
Mas só não pode ser de coco
Não pode ser de coco
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70
Senão perco o respeito
Bem feito
Apenas doce, deixa doce minha fala
Mas por favor, sem bala
Sem bala
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71
Pelas Ruas
Observando as ruas por onde passo
Cada qual num entrelaço com outra
Assim como as pessoas, se conectam
Uma liga a outra, se anexam
A primeira não vê a terceira
Mas todas encontram a avenida inteira
A rua de trás não fala com a da frente
Não é diferente não, uma deu balão na outra
E agora? Nessa hora a rua um cruzou com a
quatro traindo a ordem dos fatos
Rua sem saída não agrega nada
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72
Quebra molas é bulling entre ruas isoladas
Rua de terra é como proletário
Sempre falta algo, nesse caso é asfalto
Que pra rua trás dignidade
E pro pobre quem diria,
Trás cidadania.
Rua sem iluminação
é como pobre de coração
não tem visão
é onde habita-se os maus elementos
sem luz, reinam os maus pensamentos
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73
Underground
Gira a chave, inclina o banco
Automático o som explode
Vê se pode.
Dicção ruim, letra boa
Isso pra mim é o que soa
Letra, poesia marginal
Batidas, inclusão social, digital
Insira o pendrive, ou via Bluetooth
Sem preconceito, só respeito
Conceito de rua
Verdade pura
Rif’s, dedos mágicos
Nas guitarras, baterias ou baixos
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
74
Nas sombras dos prédios
Espantando o tédio
Na praça, antes sem graça
No boteco no sarau
Tem gente que passa mal
Outros pagam pau
Subterrâneo
Instantâneo como miojo
Mas não desce fácil, é som de criolo
Preconceito cibernético, imperial
Chega a rede social
Underground o lixo do mundo
Tudo injusto
Prefiro assim
Isso que é cultura para mim.
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
75
Vamos Dançar
(Manguebit a Cena)
Vamos dançar, vamos dançar
Vamos bailar, o baile perfumado
Quero você do meu lado
Vamos dançar, vamos dançar
Vamos bailar, o baile perfumado
Quero você do meu lado
Vem ao meu lado, vem comigo
Me provoca, sei que não é santa
E se despede do seu vestido amarelo manga
Angicos, Angelical, não resiste
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
76
Eu pequeno príncipe admiro
Reflito
Balada para uma serpente, eu contente
E você não diferente
Zambo
Eu não preciso, eu não preciso
Eu não preciso disso não.
Macô, Zambo!
Só quero teu calor, somente teu amor
Se não eu morro
Teu amor é meu cordão de ouro
Vamos andar na lama
Descalços, onde tu dirás que me ama
Amo teu jeito celestial
Anamauê, auêa aê
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
77
Vamos se envolver
Na lama do mangue no manguezal
Será primordial
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
79
Absoluto
As vezes na volta para casa
De onde quer que seja, ganho asas
Escolho trilhar o caminho mais demorado
Isso me dá tempo, para que meus pensamentos
Andem comigo lado a lado.
Do alto do precipício, inicio
Do pensamento
na brisa do vento
duas situações, contraditórias
que inspiram emoções
Se jogar e por fim na ambição de viver
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
80
Melhor que apenas sobreviver
Seria morrer?
Olhar a paisagem de posto privilegiado
E saber que Deus está ai do lado
Ver que o Espírito Santo o deixa aliviado
A estrofe anterior já não existe, é passado.
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
81
Otário
Eu?
Eu bato ponto em cima do horário
Trago no bolso o calendário
Marcado, dia 30 para receber o salário
E no pescoço
O crachá, que abaixo do meu rosto
O número de funcionário
Mas sabe como é, não é?
Não gostaria de estar nessa né?
Fazer o que Zé?
Precisa comprar café, né?
Então é, e se é!
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
82
Não falta fé, só disposição né?
Todo dia trabalho
Sou só o operário
Me sustento, meu salário
Sou um otário
Que me vendo por necessidade
Ganho uma ajuda, por caridade
É hilário.
Talvez é, né?
Pode ser que não
Quem detém o poder, nunca se sucumbirá para
sair dessa posição
É o orgasmo da dominação
Lucrar com sua situação
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
83
Pegar migalhas no chão
É direito seu, garantido pela nossa constituição.
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
85
Abordado
Abordado eu sou
E não importa onde estou
Logo vem a cigana, o de menor, o deficiente
Querendo meu dinheiro, dizem que são carente
Abordado, de novo, eu sou
E não importa onde estou
Pelo candidato a vereador
Pelo dentista, pelo vendedor
Tatuador, cirurgião, camelô
Sou abordado pelo logista
Te faço uma corrida, aborda o taxista
Não quero não, não quero não, não quero não
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
86
Mas e ai, eu lei tua mão
Vote em mim, sou o melhor para tua idade
O melhor preço da cidade
Vamos comprar, é liquidação
Promoção, começou o saldão
Abordado eu sou
E não importa como estou
Se é de carro é no sinal
Se no busão começa lá no terminal
E não para, não para
Dentro do ônibus me abordam do outro lado da
catraca
Se é a pé, me engolem que nem a maré
abordado eu sou
e não importa onde vou
abordado eu sou
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
87
e não importa como estou
vejo se aproximar o esquadrão
munidos com planfetos na mão
eu vou, eu vou
eu vou fugir
e fingir que eu não os vi
mas e ai, vão parar de me abordar?
Não vão não, não vão não
mas e ai, vão parar de me abordar?
Não vão não, não vão não
Logo mais continua a amolação
E vão me abordar pela televisão
Ligue já!
Compre agora!
Cabe no seu bolso!
Berto 24 horas!
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
89
Minha História
Sol aquece o corpo,
enquanto a lua me deixa morto
parece idéia certa, mas também pode servir de
alerta
parece simples, mas posso complicar
o que sinto não da pra explicar
Antes de falar que não tem nexo, sua capacidade
não entende o que é complexo, fique quieto e
ouça, como soa, as palavras elaboradas que
escoam nessa longa estrada
Fitando ditadores, que não estavam nos planos
Sem abaixar a cabeça, cortador de cana
Não esqueço, enquanto cresço
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
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Da cultura, ideologia, abomino a repressão
Mas o que é mesmo liberdade de expressão?
Neo-liberalismo, não, prefiro realismo
Desço morro, e prancho asfalto
Vou baixo e ando alto
Real é só moeda, e colégio é purgatório
agradeço em meu oratório
in não foi meu preferido sufixo
no peito ando com meu crucifixo e espanto
bruxas, demônio e maus olhados
já se perguntou porque não to do seu lado?
A caminha inspira, a rima aparece e desaparece
Um voz dentro de mim dita as palavras
Hora sábias, hora mágicas
Mas quem nunca rimou, nunca foi feliz
Quem me criticou, disse o que quis
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
91
Se é verdade eu não sei, se é mentira não direi,
apenas continuarem com a caneta, que desliza no
papel, no racicionio rápido e cruel, que nem Bolt
Aqui urgem e 380 Wolts, para fora dos padrões
do Brasil, quem nunca me viu, não vai acreditar,
mas essa porra é de improviso, preciso respirar!
Pobre anda com calculadora, para não extrapolar
a matadora meta, do orçamento, não entendo
até quando que essa vida vai, morre um homem
nasce um pai, o ciclo se recicla e continuo vivo,
versando, ficando maduro, encantando, mas não
virando adulto, ainda assisto o Chaves, preciso
que se cale e continue prestando atenção, mesmo
que o verso não esteja bom, caricatura da vida
não, caranguejo da divida então, que vive
endividado, com a corda no pescoço, um dia
puxo a gravata, magnata fará festa,( foi mais que
não presta), Embriagado pelo vinho, tinto, o
padre reza a missa acende a vela, fumaça
sobe,Toca o som do Bob, como diria um
camarada, que brisa! E na praia, caranguejo
Alimenta turista, que não percebe que a lama
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
92
Que difama, energizou o crustáceo, estático
quando descobrir, eu não paro de sorrir, e nem de
rimar, para fechar a frase, pode acreditar
Uso verbo, mas não pretérito , mereço honra ao
mérito?
La vou eu de novo, num carro novo, e potente,
porém inexistente, que sou eu vejo, só os
verdadeiros, nota de três reais, aqui não têm, nem
capitalista atrás do óleo de Hussem, parabólica
capta imagem do terceiro mundo em destruição
os mutantes e Mum Ra em comemoração, mas a
toca dos gatos vem preparada pra retaliação
enquanto isso a ciência mistura rural com
urbano, e nasce caranguejo, parece estranho, por
que o desespero?
Conheça história e saberá, não tava lá, nunca fui
no beco da fome, nem ao menos no Recife, se
preferi, nunca fui na São Bento, mas tento te
trazer informação, das histórias que conheço, era
uma vez, esse sempre é o começo, mas nessa aqui
inicio diferente, com o final de algo, nasce o
sobrenatural, maracatu rural, de baque solto, de
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
93
baque virado, rock, rap plugado, se vai falar mal, e
insiste, conheça-te antes o Manguebit.
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
95
Sampler’s
(Trocando uma idéia com
Chico)
Fala Chico!
Eu vim com a Nação Zumbi, aos seus ouvidos
falar, somos todos juntos um miscigenação, vou
lembrando da Revolução, Vou lembrando da
Revolução, Samba que sai da favela acabada, é hip
hop, na minha embolada
Na minha embolada!
Onde é que você se meteu antes dessa roda
começar?
Nas ruas de Peixinhos, andar com meus amigos
Minha corda costuma sair de andada no meio da
rua, só queria matar a sede no canavial na beira
do rio.
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
96
Mais da Afrociberdelia, da nossa etnia!
Da lama ao caos, do caos a lama, mangue,
mangue, mangue, mangue, mangue, mangue,
mangue, mlticoloridos cérebros, sitonizam.
Minha cora costuma sair de andada no meio da
rua em cima da ponte, Rios pontes e Overdrives,
imprecionantes esculturas de lama, esse corpo de
lama que tu vê é a penas a imagem que sou.
Sou, sou, sou, mangueboy
São demôneos os que destroem
Macaxeira, Imbiribeira, Bom Pastor, é o Iburuna,
Ipseb, Torreão, Casa Amarela.
Onde é que você se meteu?
Onde é que você se meteu, antes desssa roda
começar?
Boa Viagem, Genipapo, Bonifacio, Santo Amaro
Madalena, Boa Vista, Dois Irmãos
É Cais do Porto, é Caxangá
É Brasilit, é o Centrão, eu falei
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
97
Vou pegar aquele capitão
Vou juntar a minha Nação
Na terra maracatu
O Maracatu atômico
Ananauê auêa aê
O Josué, eu corri sai no tombo senão ia me lascá
Desci na beira do rio fui parar na capitá
Quando vi numa parede o pinico anunciá
É liquidação total, o falante anunciou
Ih! To liquidado!
Frevo, samba
Samba que sai da favela acabada
O homem roubado nunca se engana
O Josué,
Eu não sabia o que fazer, morrer, viver, morrer
Viver!
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
98
Viva Zapata, Viva Sandino
Viva Zumbi
Antonio Conselheiro, Todos os Panteras Negras
Lampião, sua imagem e semelhança
Chico Science e Toda Nação Zumbi!
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
99
QUANTO VALE UMA VIDA (MANIFESTO)
FRED ZERO QUATRO
I - LONGA VIDA AO GROOVE!
Os alquimistas estão chorando. A indignação
ruidosa de Lúcio Maia com a ferocidade
carniceira da imprensa nos faz lembrar que
nem tudo tem que ser movido a cinismo e
oportunismo no - cada vez mais - cínico e
vulgar circuito pop.
Antes de mais nada, salve Lúcio, Jorge, Dengue,
Gilmar, Toca, Gira e Pupilo. Salve Paulo André
e longa vida ao Nação Zumbi, com seu groove
imbatível, mix epidêmico e urgente de química
e magia que cedo ou tarde vai varrer o mundo!
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
100
A primeira vez que vimos Chico juntando a
Loustal com o Lamento Negro (o embrião do
que seria a Nação Zumbi, ainda no início de 91),
comentamos arrepiados, eu e Renato L.:"não
importa que estejamos no fim do mundo e sem
dinheiro no bolso; não tem errada, não há nada
no mundo que possa deter esse som!" Na nossa
ficha, constava a produção de vários programas
de Rock na cidade, onde nos esforçávamos para
mostrar sons novos e interessantes de todos os
cantos do mundo. E não havia dúvida de que
naquele momento estávamos diante de algo
absurdamente novo e irresistível. Começamos
imediatamente a viajar num conceito capaz de
colocar o Recife no mapa. É claro que houve
momentos nos últimos anos em que chegamos
a pensar que talvez tivéssemos ajudado a criar
uma espécie de monstro incontrolável. Mas
hoje sabemos que agimos bem, não poderíamos
agir de outro modo.
- E agora, mangueboys?
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
101
Chico era referência e inspiração para muita
gente, talvez para toda uma geração de
recifenses. E a perda para a Nação Zumbi é
irreparável em termos de carisma, energia
vocal, gestual, etc. Ninguém questiona isso.
Mas o que muita gente esquece é que a fórmula
criada por Chico tinha uma base muito sólida
em termos de cozinha, acompanhamento,
groove. A maioria das pessoas desconhece
alguns fatos. Quando eu conheci Francisco
França, ele era o lado mais extrovertido da mais
nova dupla do barulho da cidade. Chico e Jorge
eram inseparáveis como unha e carne, egressos
da "Legião Hip Hop", que reunia no final dos
anos 80, alguns dos melhores dançarinos e djs
que o Recife já conheceu ( alguém aí já viu
Jorge Du Peixe dançando "street"? A galera que
hoje em dia ensina funk nas academias de
dança não daria nem pro caldo...).
Jorge sempre foi um pouco mais tímido, mas
não menos engraçado, e os dois se
completavam em termos de gosto, idéias, visão
e criatividade. Chico sempre teve mais
iniciativa e era, como todos sabemos, um
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
102
letrista formidável. Mas alguém aí se lembra
quem é o autor da letra do clássico "Maracatu
de Tiro Certeiro"? Isso mesmo, Jorge Du Peixe...
Quanto a Lúcio Maia, qualquer um que
acompanhe a Guitar Player, sabe que é cada vez
maior o número de pessoas que o consideram
um dos mais talentosos e ecléticos guitarristas
brasileiros, uma verdadeira revelação dos
últimos tempos. Dengue, então, é aquele
baixista contido, discreto, mas super-eficiente.
Desde os tempos do Loustal, ele sempre
conseguiu encaixar a levada perfeita para o
estilo fragmentado dos versos de Chico. E
quanto aos tambores e à bateria, nem é preciso
comentar. Não se via, no rock and roll, uma
engrenagem tão potente e envenenada desde a
morte de John Bonham.
Quando toda a crítica brasileira caiu de quatro
sob o impacto avassalador do "Da Lama ao
Caos", houve no Recife quem apostasse que
Chico despontaria em carreira solo já no
segundo disco. Argumentavam que, por um
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
103
lado Chico tinha luz própria de sobra e por
outro a fórmula do Nação Zumbi não renderia
mais nada interessante, pois já teria se
esgotado. Eu e Renato torcemos para que
acontecesse o contrário, para que Chico não se
rendesse à vaidade pessoal e injetasse todo gás
possível no fortalecimento da banda. Ele não
decepcionou, mostrou que não era nem um
pouco ingênuo ou deslumbrado e que sabia
muito bem do que precisava para se manter no
topo. O resultado foi o brilhante
"Afrociberdelia", um trabalho coletivo - com
Lúcio mais ativo do que nunca do que nunca na
produção.
Portanto, se existe uma banda que tem total
autoridade e potencial para ocupar
condignamente o lugar que o inesquecível
Chico Science deixou vago no topo, essa banda
é sem dúvida a Nação Zumbi. Por sinal, o
próprio Chico nem cogitava em dar por
esgotado o formato da banda, tanto que já
planejava entrar com os brothers no estúdio
ainda este ano para gravar o terceiro disco.
LONGA VIDA AO GROOVE!!!
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
104
II- BUSCANDO RESPOSTAS
"Something is happening here, but you don't
know what it is. Do you, Mr Jones?" Essa frase
de Bob Dylan me vem à mente sempre que eu
penso no tom de alguns comentários
publicados nos maiores jornais do país a
respeito da morte de Chico. Talvez com
intenção de pintar o fato com as cores mais
chocantes, expurgando, assim, a dor e a revolta
da perda, as matérias acabavam
invariavelmente emitindo um tom derrotista ou
até desolador.
Se o caso é especular sobre o que pode
acontecer daqui em diante, o mais oportuno
seria tentar identificar na história do Pop, fatos
ou situações semelhantes que possam servir de
exemplos. Em se tratando de movimentos de
cultura Pop; gerados em focos isolados;
situados na periferia do mercado; e com
reconhecimento mundial, os fenômenos mais
correlatos ao Mangue Beat que se tem notícia -
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
105
ainda que os estágios de desenvolvimentos
sejam distintos - são a Jamaica pós-Bob Marley
e Salvador pós-Tropicalismo.
Sobre Salvador, minha experiência como
mangueboy me diz que o Tropicalismo não
surgiu lá por acaso. Nada no mundo poderia ter
impedido o caldo cultural da cidade de gerar
posteriormente (e na sequência) os Novos
Baianos, A Cor do Som, os trios elétricos, a Axé
Music, o Samba - Reggae, a Timbalada, etc.
Também não foi por milagre que a Jamaica se
tornou berço do Calipso, do Ska, do Reggae, do
Dub, do Raggamuffin e de todas as variantes do
Dancehall que hoje, quase 20 anos depois da
morte de Marley, contaminam as paradas de
sucesso de todo o mundo.
Esses dois fenômenos foram condicionados por
combinações específicas de fatores geográficos,
econômicos, políticos, sociológicos,
antropológicos, enfim, culturais, cuja história
eu não seria capaz de analisar. Mas em se
tratando de focos isolados que a partir de um
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
106
determinado estímulo geram uma reação em
cadeia capaz de contaminar toda a história
futura de uma comunidade, meu depoimento
talvez possa ser útil.
III- UMA VISITA MUITO ESPECIAL
Lembro-me muito bem do nervosismo que
tomou conta da cidade quando, em 93 (logo
após o primeiro Abril Pro Rock), a diretoria da
Sony anunciou que mandaria um representante
ao Recife para contratar Chico Science... Fun!
Fun! Zoeira Total! Diversão a qualquer custo, e
a mais barulhenta possível! Esse havia sido o
nosso lema quando, dois anos antes, sentindo o
descompasso - o fundo do poço, o infarto
iminente - , resolvêramos tentar de tudo para
detonar adrenalina no coração deprimido da
cidade. Depois de vários shows e eventos muito
bem sucedidos, e do manifesto "Caranguejos
com Cérebro" ( que transformou, de uma hora
para outra centenas de arruaceiros inocentes
em "mangueboys" militantes ), parecia que a
cidade realmente começava a despertar do
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
107
coma profundo em que esteve mergulhada
desde o início da guerra dos 80.
Parêntese: não é exagero. Segundo os
levantamentos mensais do DIEESE, Recife
conseguiu manter sem muito esforço a
impressionante e isolada posição de campeã
nacional do desemprego e da inflação por nada
menos que dez anos seguidos!!! Imaginem o
efeito devastador que uma situação como essa
pode provocar na alma de uma comunidade
com mais de 400 anos de história e que só neste
século havia gerado nomes da dimensão de
Manuel Bandeira, Gilberto Freyre, Josué de
Castro e João Cabral de Melo Neto. Para nós,
que mal havíamos saído da adolescência só
restavam duas saídas: tentar uma bolsa na
Europa ou ganhar as ruas...
Então, a chegada da Sony representava uma
espécie de prêmio coletivo. O significado
simbólico era que finalmente podia estar se
abrindo um canal de comunicação direta com o
mercado mundial, como os caranguejos do
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
108
asfalto haviam almejado em seu primeiro
manifesto. Para todos os agentes e operadores
culturais que viam seu talento e potencial
atrofiados pela desmotivação, era o estímulo
concreto que faltava. Afinal, queiram ou não,
discos pop lançados por multinacionais
movimentam várias áreas de expressão ao
mesmo tempo: moda, fotografia, design,
produção gráfica, vídeos, relações públicas,
assessoria, imprensa, marketing, música, etc.
Daí em diante, pode-se dizer que teve início um
efetivo "renascimento" recifense. Todo mundo
gritou mãos à obra! e partiu para o ataque. As
ruas viraram passarelas de estilistas
independentes; bandas pipocaram em cada
esquina; palcos foram improvisados em todos
os bares; fitas demo e clipes novos eram
lançados toda semana, e assim por diante,
gerando uma verdadeira cooperativa
multimídia autônoma e explosiva, que não
parava de crescer e mobilizar toda a cidade. De
headbangers a mauricinhos, de punks a líderes
comunitários, de surfistas a professores
acadêmicos, ninguém ficou de fora. Para se ter
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
109
uma idéia, a frase " computadores fazem arte,
artistas fazem dinheiro" ( Mundo Livre SA )
virou tema de redação de vestibular de uma
faculdade local.
IV - MANGUETOWN, 5 ANOS DEPOIS
O renascimento segue de vento em popa. A
noite mais concorrida do último Abril Pro Rock
foi a que reuniu três bandas locais. Mais de
cinco mil pessoas pagaram ingresso e
enfrentaram uma chuva intensa para aplaudir e
cantar junto com Mundo Livre SA, Mestre
Ambrósio e Chico Science e Nação Zumbi. O
festival "Viva a Música", realizado em setembro
passado, reuniu mais de 50 novas bandas. O
disco de estréia da campeã, Dona Margarida
Pereira e os Fulanos, está em fase de gravação.
O programa Mangue Beat (Caetés FM 99.1)
ocupa há 2 anos os primeiros lugares de
audiência, tocando fitas demo e lançamentos
locais, além de novidades de todos os cantos do
planeta. O "Manguetronic", um programa de
rádio idealizado especialmente para a Internet,
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
110
vem se firmando como um dos sites mais
acessados do Universo on Line. Os últimos cds
do Chico Science e Nação Zumbi e do Mundo
Livre SA e a estréia do Mestre Ambrósio
figuraram na lista dos dez melhores do ano da
revista Showbizz. Estão em fase de finalização
os aguardados álbuns de estréia das bandas
Eddie e Devotos do Ódio. O Abril pro Rock 97
entrou pela primeira vez no calendário de
eventos oficiais do Estado, ganhando assim
uma ampla divulgação nacional e uma infra-
estrutura mais organizada. A estréia em longa-
metragem dos cineastas pernambucanos Lírio
Ferreira e Paulo Caldas - o filme "O Baile
Perfumado", cuja trilha é assinada por Chico
Science, Siba (do Mestre Ambrósio) e Zero
Quatro - ganhou vários prêmios, entre eles o de
melhor filme, no último Festival de Cinema de
Brasília. O estilista Eduardo Ferreira já recebeu
vários prêmios nas últimas edições do
Phytoervas Fashion. O Mundo Livre S.A. acaba
de fazer 4 shows e um clipe no México,
devendo participar de vários festivais europeus
no segundo semestre...
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
111
(Pausa para respirar)
Temos como objetivo imediato pressionar a
Prefeitura do Recife para tirar do papel e
colocar no ar a rádio Frei Caneca FM, uma
emissora sem fins lucrativos cujo orçamento
para 97, ao que parece, já foi aprovado pela
Câmara Municipal. Afinal, o único e mais difícil
obstáculo que ainda não superamos foi o das
rádios comerciais. Sabemos que na Jamaica e
em Salvador foi preciso o uso até de ações
violentas para pressionar os disc - jóckeis. No
estágio atual, não achamos que recursos sejam
necessários. O Popspace não é invulnerável e a
história está do nosso lado.
Quem acompanhou no Recife as últimas
homenagens a Chico, sentiu a força de um
compromisso coletivo. Hoje cada recifense tem
no olhar um pouco de guerrilheiro da Frente
Pop de Libertação. E o recado que queremos
enviar para o mundo não é muito diferente
daquele que nos mandam as comunidades
indígenas de Chiapas- que têm no
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
112
subcomandante Marcos o seu porta-voz. VIVA
SANDINO! VIVA ZAPATA! VIVA ZUMBI! A
utopia continua...
"- Quanto vale a vida de um homem, em
quanto cada um avalia a sua própria vida, a
troco de quê está disposto a mudá - la? Nós
avaliamos muito alto o preço de nossas vidas.
Valem um mundo melhor, nada menos.
Homens e mulheres, dispostos a dar suas vidas,
têm direito a pedir tanto quanto valem. Há os
que avaliam suas vidas por uma quantidade de
dinheiro, mas nós a avaliamos pelo mundo, esse
é o custo do nosso sangue..." (Subcomandante
Marcos)
Ass: Zero Quatro, com a colaboração de Renato L.
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
113
O Autor
Nascido em Umuarama- PR, em 1988,
veio ainda cedo para São Paulo, em
Jaguariúna, no interior. É estudante de
Engenharia de Controle e automação.
Escreveu dois livros: Que Diferença Faz?
De poesias, de 2011 e o humor de E
Manguesia - A Poesia da Lama Jefferson F. Wesolowski
114
Agora? De 2012, malungo, mangueboy, fã
de rap, rock, e com influências explicitas
no manguebit, em Mundo Livre S/A, e a
Lendária Chico Science e Nação Zumbi,
foi com a terceira obra Manguesia,
trazendo ao público a continuação da
Poesia da Lama.