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Informativo STF Mensal nº 66
Fevereiro de 2017
Compilação dos Informativos nos 852 a 855
O Informativo STF Mensal apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo Informativo STF concluídos no mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por assuntos.
SUMÁRIO Direito Administrativo
Agentes Públicos
Afastamento de prefeito: supremacia da vontade popular e preservação da coisa pública - 2
Responsabilidade do Estado
Responsabilidade civil do Estado: superpopulação carcerária e dever de indenizar - 4
Servidores Públicos
Anulação de registro de aposentadoria e comprovação de tempo trabalhado na condição de
aluno-aprendiz - 3
Aposentadoria compulsória e titulares de serventias judiciais não estatizadas
Direito Civil
Associações
Autonomia de entidades desportivas e observância de normas gerais
Direito Constitucional
Competência Originária do STF
Licença-prêmio e interesse da magistratura
Controle de Constitucionalidade
ADI estadual e subsídio - 4
Magistratura
TCU: correção da forma de pagamento de proventos de magistrado - 2
Meio Ambiente
Crime ambiental de caráter transnacional e competência
Precatórios
RFFSA e penhora anterior à sucessão pela União
Direito Penal
Concurso de Crimes
Latrocínio: pluralidade de vítimas fatais e concurso formal - 2
Princípios e Garantias Penais
Rádio comunitária e princípio da insignificância
Condenação em segundo grau e execução da pena
Direito Processual Penal
Competência
Arquivamento e remessa dos autos - 2
Foro por prerrogativa de função e desmembramento de inquérito
Investigação Preliminar
Inquérito e compartilhamento de peças
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Nulidades
Instauração de investigação criminal e determinação de interceptações telefônicas com base em
denúncia anônima
Prisão Cautelar
Reclamação e prisão preventiva
Direito Tributário
Imunidades Tributárias
Entidades beneficentes de assistência social e imunidade - 7
Entidades beneficentes de assistência social e imunidade - 8
Princípios e Garantias Tributários
Imunidade tributária e contribuinte de fato
Regime Tributário
Redução da base de cálculo do ICMS e estorno de créditos
Tributos
Valor Adicionado Fiscal: forma de cálculo e questão infraconstitucional
DIREITO ADMINISTRATIVO
Agentes Públicos
Afastamento de prefeito: supremacia da vontade popular e preservação da coisa pública - 2 Em conclusão, o Plenário julgou prejudicado, por perda de objeto, agravo regimental em que se discutia
o afastamento de prefeito do cargo, por força de decisão cautelar de tribunal de justiça em face da suposta
prática de crimes — v. Informativo 809.
Tratava-se de recurso interposto contra decisão do então Ministro Presidente do STF, que havia
deferido, em parte, medida liminar em pedido de suspensão liminar para possibilitar o retorno do requerente ao
cargo que exercia.
O Tribunal considerou o fato de o mandato do prefeito em questão ter expirado.
SL 853 MC-AgR/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1º.2.2017. (SL-853)
(Informativo 852, Plenário)
Responsabilidade do Estado
Responsabilidade civil do Estado: superpopulação carcerária e dever de indenizar - 4 Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em seus presídios os
padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do
art. 37, § 6º, da Constituição, a obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados
aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.
Com essa orientação, o Tribunal, em conclusão e por maioria, deu provimento a recurso extraordinário
para restabelecer o juízo condenatório nos termos e limites do acórdão proferido no julgamento da apelação, a
qual fixara indenização no valor de dois mil reais a favor de detento. Consoante o acórdão restabelecido, estaria
caracterizado o dano moral porque, após laudo de vigilância sanitária no presídio e decorrido lapso temporal,
não teriam sido sanados os problemas de superlotação e de falta de condições mínimas de saúde e de higiene
do estabelecimento penal. Além disso, não sendo assegurado o mínimo existencial, seria inaplicável a teoria da
reserva do possível — v. Informativos 770 e 784.
Prevaleceu o voto do ministro Teori Zavascki (relator).
Registrou, de início, a inexistência de controvérsia a respeito dos fatos da causa e da configuração do
dano moral, haja vista o reconhecimento, pelo próprio acórdão recorrido, da precariedade do sistema
penitenciário estadual, que lesou direitos fundamentais do recorrente, quanto à dignidade, intimidade, higidez
física e integridade psíquica. Portanto, sendo incontroversos os fatos da causa e a ocorrência do dano, afirmou
que a questão jurídica desenvolvida no recurso ficou restrita à reparabilidade, ou seja, à existência ou não da
obrigação do Estado de ressarcir os danos morais verificados nas circunstâncias enunciadas.
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Em seguida, consignou que a matéria jurídica está no âmbito da responsabilidade civil do Estado de
responder pelos danos, até mesmo morais, causados por ação ou omissão de seus agentes, nos termos do art.
37, § 6º, da CF, preceito normativo autoaplicável, que não se sujeita a intermediação legislativa ou a
providência administrativa de qualquer espécie. Ocorrido o dano e estabelecido o seu nexo causal com a
atuação da Administração ou dos seus agentes, nasce a responsabilidade civil do Estado. Sendo assim e tendo
em conta que, no caso, a configuração do dano é matéria incontroversa, não há como acolher os argumentos
que invocam, para negar o dever estatal de indenizar, o princípio da reserva do possível, na dimensão
reducionista de significar a insuficiência de recursos financeiros.
Frisou que Estado é responsável pela guarda e segurança das pessoas submetidas a encarceramento,
enquanto ali permanecerem detidas, e que é seu dever mantê-las em condições carcerárias com mínimos
padrões de humanidade estabelecidos em lei, bem como, se for o caso, ressarcir os danos que daí decorrerem.
Ademais, asseverou que as violações a direitos fundamentais causadoras de danos pessoais a detentos
em estabelecimentos carcerários não poderiam ser relevadas ao argumento de que a indenização não teria o
alcance para eliminar o grave problema prisional globalmente considerado, dependente da definição e da
implantação de políticas públicas específicas, providências de atribuição legislativa e administrativa, não de
provimentos judiciais. Sustentou que admitir essa assertiva significaria justificar a perpetuação da desumana
situação constatada em presídios como aquele onde cumprida a pena do recorrente.
Relembrou que a garantia mínima de segurança pessoal, física e psíquica dos detentos constitui dever
estatal que tem amplo lastro não apenas no ordenamento nacional (CF, art. 5º, XLVII, “e”; XLVIII; XLIX; Lei
7.210/1984 - LEP, arts. 10, 11, 12, 40, 85, 87, 88; Lei 9.455/1997 - crime de tortura; Lei 12.874/2013 - Sistema
Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), como também em fontes normativas internacionais adotadas
pelo Brasil (Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas; Convenção Americana de
Direitos Humanos; Princípios e Boas Práticas para a Proteção de Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas,
contida na Resolução 1/2008, aprovada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos; Convenção da
Organização das Nações Unidas contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou
Degradantes; Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros, adotadas no 1º Congresso das Nações Unidas
para a Prevenção ao Crime e Tratamento de Delinquentes).
A criação de subterfúgios teóricos — como a separação dos Poderes, a reserva do possível e a natureza
coletiva dos danos sofridos — para afastar a responsabilidade estatal pelas calamitosas condições da
carceragem afronta não apenas o sentido do art. 37, § 6º, da CF, mas também determina o esvaziamento das
inúmeras cláusulas constitucionais e convencionais citadas. O descumprimento reiterado dessas cláusulas se
transforma em mero e inconsequente ato de fatalidade, o que não pode ser tolerado.
Por fim, o relator enfatizou que a invocação seletiva de razões de Estado para negar, especificamente a
determinada categoria de sujeitos, o direito à integridade física e moral não é compatível com o sentido e o
alcance do princípio da jurisdição. Acolher essas razões é o mesmo que recusar aos detentos os mecanismos de
reparação judicial dos danos sofridos, deixando-os descobertos de qualquer proteção estatal, em condição de
vulnerabilidade juridicamente desastrosa. É dupla negativa: do direito e da jurisdição.
Os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio deram provimento ao recurso extraordinário em maior
extensão, para acolher o pedido formulado, na petição inicial, pela Defensoria Pública, de indenização de um
salário mínimo por mês de detenção enquanto presentes as condições degradantes de superlotação.
Vencidos os ministros Roberto Barroso, Luiz Fux e Celso de Mello, que, ao darem provimento ao
recurso, adotavam a remição da pena como forma de indenização.
RE 580252/MS, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento
em 16.2.2017. (RE-580252)
(Informativo 854, Plenário, Repercussão Geral)
1ª Parte : 2ª Parte : 3ª Parte :
Servidores Públicos
Anulação de registro de aposentadoria e comprovação de tempo trabalhado na condição de
aluno-aprendiz - 3 A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou mandado de segurança
impetrado contra acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU), que anulou ato de concessão de
aposentadoria e determinou que o impetrante retornasse à atividade, para completar os requisitos da
aposentadoria integral, ou que a ele fossem pagos proventos proporcionais ao seu tempo de contribuição.
Na espécie, a Corte de Contas glosou o cômputo de tempo prestado na condição de aluno-
aprendiz, por entender não ter sido comprovada a efetiva prestação do serviço – v. Informativo 814.
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O Colegiado afirmou que o servidor, para ter o citado período contado como tempo de serviço,
deveria apresentar certidão do estabelecimento de ensino frequentado. Tal documento deveria atestar a
condição de aluno-aprendiz e o recebimento de retribuição pelos serviços executados, consubstanciada
em auxílios materiais diversos.
Ressaltou que, com a edição da Lei 3.353/1959, passou-se a exigir, para a contagem do tempo
mencionado, a demonstração de que a mão de obra foi remunerada com o pagamento de encomendas. O
elemento essencial à caracterização do tempo de serviço como aluno-aprendiz não é a percepção de
vantagem direta ou indireta, mas a efetiva execução do ofício para o qual recebia instrução, mediante
encomendas de terceiros.
Como consequência, a declaração emitida por instituição de ensino profissionalizante somente
comprovaria o período de trabalho caso registrasse expressamente a participação do educando nas
atividades laborativas desenvolvidas para atender aos pedidos feitos às escolas, o que não ocorreu no
caso. Da certidão juntada aos autos consta apenas que o impetrante frequentou curso técnico
profissionalizante por certo período, sem referência à sua participação na produção de quaisquer bens ou
serviços solicitados por terceiros. Não há sequer comprovação de retribuição pecuniária à conta do
orçamento.
A ministra Rosa Weber, em voto-vista, acrescentou que, durante o transcurso do lapso temporal
entre a concessão inicial da aposentadoria e o seu exame pelo TCU, o impetrante permaneceu inerte,
apesar de haver sido intimado para comprovar ter recebido alguma remuneração como contraprestação
pelo trabalho realizado na condição de aluno-aprendiz. Ademais, não instruiu o “mandamus” com a
imprescindível prova pré-constituída.
Vencidos os ministros Luiz Fux e Edson Fachin, que concediam a ordem.
MS 31518/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 7.2.2017. (MS-31518)
(Informativo 853, 1ª Turma)
Aposentadoria compulsória e titulares de serventias judiciais não estatizadas Não se aplica a aposentadoria compulsória prevista no art. 40, § 1º, II, da CF aos titulares de
serventias judiciais não estatizadas, desde que não sejam ocupantes de cargo público efetivo e não
recebam remuneração proveniente dos cofres públicos.
Com essa orientação, o Tribunal negou provimento a recurso extraordinário no qual se pretendia
fosse aplicada a aposentadoria compulsória a escrivã de serventia judicial não estatizada remunerada
exclusivamente por custas e emolumentos, cujo ingresso ocorreu em 19.11.1969.
Inicialmente, o Tribunal rejeitou a preliminar de perda superveniente do objeto, em virtude do
reconhecimento administrativo do direito pleiteado.
A Corte entendeu que, ainda que reconhecida a suposta prejudicialidade do recurso, deveria
proceder ao julgamento da tese de repercussão geral, em vista da relevância da questão constitucional
posta em discussão. Citou o disposto no parágrafo único do art. 998 do CPC e o que decidido no RE
693.456 QO/RJ (DJE de 22.9.2015), no qual assentada a impossibilidade de desistência de qualquer
recurso ou mesmo de ação após o reconhecimento de repercussão geral da questão constitucional.
Em seguida, fez uma breve digressão histórica sobre a constitucionalização da matéria referente às
serventias judiciais. Asseverou que a primeira previsão de oficialização dessas serventias se deu com a
EC 7/1977 à CF de 1967/1969 (art. 206) e que apenas com a EC 22/1982, que alterou, entre outros, o art.
206, a determinação de oficialização das serventias judiciais passou a ter força cogente. Observou que a
mesma orientação foi mantida pela CF/1988 (ADCT, art. 31). Diante disso, concluiu pela coexistência de
três espécies de titulares de serventias judiciais: a) os titulares de serventias oficializadas, que ocupam
cargo ou função pública e são remunerados exclusivamente pelos cofres públicos; b) os titulares de
serventias não estatizadas remunerados exclusivamente por custas e emolumentos; e c) os titulares de
serventias não estatizadas remunerados, em parte, pelos cofres públicos e, em outra, por custas e
emolumentos. Frisou que o mencionado comando constitucional resguardou os direitos adquiridos até
então, de modo que ainda hoje existem diversas serventias judiciais, cujos titulares ingressaram de forma
regular, que ainda não foram estatizadas.
Consignou que o art. 40, § 1º, II, da CF estabelece que a aposentadoria compulsória será aplicada
apenas aos servidores titulares de cargo efetivo, abrangidos pelo RPPS. Citou o entendimento firmado na
ADI 2.602/MG (DJU de 5.12.2005) no sentido da inaplicabilidade da aposentadoria compulsória pelo
implemento de idade a titulares de serventias extrajudiciais, pelo fato, entre outros motivos, de não serem
servidores públicos titulares de cargos efetivos.
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Em razão da similitude das relações jurídicas (ambos se referem à atividade privada em
colaboração com o Poder Público), o Plenário considerou possível estender aos titulares de serventia
judicial não estatizada remunerados exclusivamente por custas e emolumentos o mesmo tratamento
conferido aos titulares de foro extrajudicial.
Por fim, o Tribunal ressaltou que, resguardados os direitos adquiridos, a persistência de serventias
judiciais privatizadas em alguns Estados-Membros é totalmente incompatível com o disposto no art. 31
do ADCT, sendo urgente que cada ente da Federação adote as providências cabíveis para regularizar a
situação. Mencionou o que decidido no julgamento da ADI 1.498/RS (DJU de 18.11.2002), no qual
consignada a determinação de que as serventias privatizadas devem retornar ao sistema estatizado.
RE 647827/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 15.2.2017. (RE-647827)
(Informativo 854, Plenário, Repercussão Geral)
DIREITO CIVIL
Associações
Autonomia de entidades desportivas e observância de normas gerais Não viola o art. 217, I, da Constituição (“Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas
desportivas formais e não formais, como direito de cada um, observados: I - a autonomia das entidades
desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento”) decisão que determina
associação esportiva a observar a norma do art. 59 do Código Civil (“Art. 59. Compete privativamente à
assembléia geral: I - destituir os administradores; II - alterar o estatuto. Parágrafo único. Para as
deliberações a que se referem os incisos I e II deste artigo é exigido deliberação da assembléia
especialmente convocada para esse fim, cujo quorum será o estabelecido no estatuto, bem como os
critérios de eleição dos administradores”). Com base nesse entendimento, a Primeira Turma negou
provimento a agravo regimental.
O agravante alegava que, diante da autonomia conferida pela citada norma constitucional para a
organização e o funcionamento das entidades esportivas, estaria dispensado de observar o art. 59 do
Código Civil, que disciplina a forma de alteração dos estatutos de associações em geral.
A Turma afirmou que a decisão agravada está em consonância com a jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal firmada a partir da ADI 2.937/SP (DJE de 28.5.2012).
RE 935482 AgR/SP, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 7.2.2017. (RE-935482)
(Informativo 853, 1ª Turma)
DIREITO CONSTITUCIONAL
Competência Originária do STF
Licença-prêmio e interesse da magistratura A Segunda Turma, por maioria, não conheceu de ação originária em que se discutia o direito de
magistrado gozar de licença-prêmio e determinou a devolução dos autos ao juízo de origem.
No caso, foi ajuizada ação, com base na simetria entre as carreiras da magistratura e do Ministério
Público, para reconhecer a percepção de licença-prêmio por tempo de serviço pelo período de três meses a cada
quinquênio ininterrupto de exercício, contado da data de ingresso do autor na magistratura.
O autor alegava ter direito à percepção de licença-prêmio garantida aos membros do Ministério Público
da União (MPU), prevista no art. 222 da Lei Complementar 75/1993, a partir da edição da Emenda
Constitucional 45/2004, que incluiu na Constituição Federal o § 4º do art. 129, por meio do qual o Conselho
Nacional de Justiça reconheceu a simetria entre os dois agentes políticos.
Inicialmente, a ação foi proposta perante juizado especial federal, que declinou de sua competência para
o Supremo Tribunal Federal (STF), por entender que a matéria atingia interesse privativo da magistratura, não
abarcando interesse direto de outros servidores.
A Turma assentou a incompetência do STF para apreciar o feito, ante a inexistência de interesse da
totalidade da magistratura nacional.
O órgão fracionado afirmou que a pretensão vertida nos autos não se mostra exclusiva da categoria, haja
vista o direito à fruição de licença-prêmio por tempo de serviço interessar não apenas ao autor, mas também a
outros agentes políticos e servidores públicos. Afinal, o benefício pode estar previsto em estatuto jurídico do
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agente ou do servidor. Na hipótese dos autos, por exemplo, integra o estatuto do MPU e de outras carreiras do
serviço público federal.
Vencido o ministro Gilmar Mendes (relator), que conhecia da ação e julgava improcedente o pedido. O
ministro Dias Toffoli acompanhou o relator quanto ao conhecimento.
Para o relator, a tese alegada na inicial interessa exclusivamente aos magistrados, já que nenhuma outra
categoria de agente público “lato sensu” (agente político, servidor ou empregado público), exceto a
magistratura, poderia ajuizar demanda requerendo simetria com o MPU.
Declarava prescritas as parcelas porventura devidas anteriormente ao quinquênio que antecede o
ajuizamento da demanda. Para que houvesse a interrupção da prescrição, seria necessário o reconhecimento
indene de dúvidas pelo devedor (Código Civil, art. 202, VI), o que não se verificou no caso.
Quanto ao mérito, consignava inexistir respaldo legal. Além disso, o rol de direitos e vantagens disposto
no art. 69 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN) seria taxativo. Portanto, não seria possível a
extensão aos magistrados de vantagens previstas em legislação de outra carreira.
AO 2126/PR, rel. orig. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgamento
em 21.2.2017. (AO-2126)
(Informativo 855, 2ª Turma)
Controle de Constitucionalidade
ADI estadual e subsídio - 4 Tribunais de Justiça podem exercer controle abstrato de constitucionalidade de leis municipais
utilizando como parâmetro normas da Constituição Federal, desde que se trate de normas de reprodução
obrigatória pelos Estados.
O art. 39, § 4º, da Constituição Federal não é incompatível com o pagamento de terço de férias e
décimo terceiro salário.
Com base nas teses acima fixadas, o Plenário, em conclusão e por maioria, deu parcial provimento
a recurso extraordinário para reformar o acórdão recorrido na parte em que declarava a
inconstitucionalidade dos arts. 6º e 7º da Lei 1.929/2008 do Município de Alecrim/RS (“Art. 6º. Ao
ensejo do gozo de férias anuais, o Prefeito Municipal perceberá o subsídio acrescido de um terço. § 1º. O
Vice-Prefeito terá direito à mesma vantagem se tiver atividade permanente na Administração. § 2º. O
gozo de férias correspondentes ao último ano do mandato poderá ser antecipado para o segundo semestre
daquele exercício. Art. 7º. Além do subsídio mensal, o Prefeito e o Vice-Prefeito perceberão, em
dezembro de cada ano, na mesma data em que for pago o décimo terceiro dos servidores do Município,
uma quantia igual aos respectivos vigentes naquele mês. Parágrafo Único. Quando houver pagamento da
metade da remuneração de um mês aos servidores, a título de adiantamento do décimo terceiro salário, na
forma da Lei Municipal, igual tratamento será dado ao Prefeito e ao Vice-Prefeito”). Entretanto, o
Colegiado manteve a declaração de inconstitucionalidade do art. 4º [“Art. 4º. Será pago ao Prefeito
Municipal, a título de indenização, o valor mensal de R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais)”] — v.
Informativo 813.
Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso. Asseverou que a citada verba prevista no art. 4º
não é verba de representação, uma vez que não possui caráter indenizatório.
Afirmou também que o regime de subsídio é incompatível com outras parcelas remuneratórias de
natureza mensal.
No entanto, sustentou não ser o caso do décimo terceiro salário e do terço constitucional de férias,
pagos a todos os trabalhadores e servidores com periodicidade anual. Desse modo, o art. 39, § 4º, da CF
não é incompatível com o pagamento dos citados adicionais.
Vencidos, em parte, os ministros Marco Aurélio (Relator), Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e
Cármen Lúcia (Presidente), que negavam provimento ao recurso. Pontuavam que os agentes políticos
estão submetidos à regra do § 4º do art. 39, mas não figuram no rol de beneficiários da exceção criada
pelo § 3º do art. 39 da CF.
O ministro Marco Aurélio não participou da fixação do segundo enunciado de tese.
RE 650898/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento
em 1º.2.2017. (RE-650898)
(Informativo 852, Plenário, Repercussão Geral)
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Magistratura
TCU: correção da forma de pagamento de proventos de magistrado - 2 A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, concedeu mandado de segurança
impetrado contra acórdão do Tribunal de Contas da União que teria considerado irregular o pagamento ao
impetrante de proventos equivalentes ao subsídio de desembargador federal.
No caso, o impetrante é juiz federal e, embora tivesse passado à inatividade em 2010, teria
adquirido o direito de se aposentar em 1994, quando o art. 192 da Lei 8.112/1990 ainda estava em vigor
(“Art. 192. O servidor que contar tempo de serviço para aposentadoria com provento integral será
aposentado: I – com a remuneração do padrão de classe imediatamente superior àquela em que se
encontra posicionado;”). Isso garantiria a ele o direito de se aposentar com remuneração equivalente ao
cargo imediatamente superior ao seu — v. Informativo 752.
A Turma consignou que o impetrante tem direito aos proventos calculados com a incidência do
inciso I do art. 192 da Lei 8.112/1990, ou seja, à remuneração paga sob o regime de subsídio, em parcela
única.
A ministra Rosa Weber, em voto-vista, acrescentou que o regime de subsídio não tornou os
proventos do autor, tal como originalmente fixados, supervenientemente incompatíveis com a exigência
de recebimento em parcela única. Ao contrário, a situação do impetrante se ajusta perfeitamente ao
regime de subsídio.
Pontuou que, se o autor tinha direito a receber, de acordo as regras que vigiam ao tempo da
satisfação dos requisitos para a sua aposentadoria, a remuneração do cargo imediatamente superior, vale
dizer, desembargador federal, seria decorrência lógica que, com a alteração da Emenda Constitucional
19/1998, ele passasse a perceber o subsídio daquele cargo.
Ressaltou que o autor não pretendia nenhum adicional de caráter salarial cumulativo ao subsídio.
Sua intenção era continuar a perceber o mesmo valor determinado pela lei vigente ao tempo em que
preencheu os requisitos para sua inativação, ou seja, os proventos equivalentes à remuneração atualmente
paga sob o regime de subsídio, em parcela única, a um desembargador federal (Lei 8.112/1990, art. 192,
I), na exata medida do Enunciado 359 da Súmula do Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo a ministra, resultaria impróprio se decotar uma parte do subsídio, adquirido a tempo e
modo constitucionais e legais, e passar a denominá-lo como vantagem pessoal, dando, artificialmente,
tratamento diferente a verbas iguais, uma vez que derivadas da mesma rubrica (subsídio), como se
distintas fossem.
Sustentou, ademais, que a questão não se resolveria pela tradicional aplicação da jurisprudência
consolidada no STF, segundo a qual se admite a modificação de regime jurídico dos servidores a qualquer
tempo, respeitada a irredutibilidade nominal dos vencimentos. Nessa ótica, a interferência do ato coator
sobejaria a simples alteração dos critérios relativos à composição dos proventos e repercutiria nas
garantias constitucionais do direito adquirido e da irredutibilidade dos proventos.
Por fim, concluiu que não se pode conceituar a situação pessoal do impetrante como uma
vantagem pecuniária, uma vez que ele não pretendia nenhum acréscimo ao seu vencimento base, mas
justo e exclusivamente o subsídio (parcela única) tal como assegurado no título de sua aposentadoria.
Vencido o ministro Roberto Barroso, que indeferia a segurança.
MS 32726/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Marco Aurélio, julgamento
em 7.2.2017. (MS-32726)
(Informativo 853, 1ª Turma)
Meio Ambiente
Crime ambiental de caráter transnacional e competência Compete à Justiça Federal processar e julgar o crime ambiental de caráter transnacional que
envolva animais silvestres, ameaçados de extinção e espécimes exóticas ou protegidas por compromissos
internacionais assumidos pelo Brasil. Com base nesse entendimento, o Plenário deu provimento ao
recurso extraordinário em que se discutia a justiça competente para processar e julgar crimes ambientais
transnacionais.
O Tribunal afirmou que as florestas, a fauna e a flora estão protegidas, no ordenamento jurídico
inaugurado pela Constituição de 1988, como poder-dever comum da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios (CF/1988, art. 23, VII).
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Ressaltou que a Carta Magna dispõe que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”
(CF/1988, art. 225, “caput”), incumbindo ao Poder Público “proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma
da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou
submetam os animais a crueldade” (CF/1988, art. 225, § 1º, VII).
Asseverou que a competência da Justiça estadual é residual, em confronto com a Justiça Federal, à
luz da Constituição Federal e da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Consignou que a competência da Justiça Federal aplica-se aos seguintes crimes ambientais, que
também se enquadram nas hipóteses previstas na Constituição, quando: a) atentarem contra bens, serviços
ou interesses diretos e específicos da União ou de suas entidades autárquicas; b) previstos tanto no direito
interno quanto em tratado ou convenção internacional, tiverem a execução iniciada no País, mas o
resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou na hipótese inversa; c) tiverem sido cometidos
a bordo de navios ou aeronaves; d) houver grave violação de direitos humanos; ou ainda e) guardarem
conexão ou continência com outro crime de competência federal, ressalvada a competência da Justiça
Militar e da Justiça Eleitoral, conforme previsão expressa da Constituição.
A razão de ser das normas consagradas no direito interno e no direito convencional conduz à
conclusão de que a transnacionalidade do crime ambiental de exportação de animais silvestres atinge
interesse direto, específico e imediato da União, voltado à garantia da segurança ambiental no plano
internacional, em atuação conjunta com a comunidade das nações.
Portanto, o envio clandestino de animais silvestres ao exterior reclama interesse direto da União no
controle de entrada e saída de animais do território nacional, bem como na observância dos compromissos
do Estado brasileiro com a comunidade internacional, para a garantia conjunta de concretização do que
estabelecido nos acordos internacionais de proteção do direito fundamental à segurança ambiental. Assim,
a natureza transnacional do delito ambiental de exportação de animais silvestres atrai a competência da
Justiça Federal, nos termos do art. 109, IV, da CF/1988.
RE 835558/SP, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 9.2.2017. (RE-835558)
(Informativo 853, Plenário, Repercussão Geral)
Precatórios
RFFSA e penhora anterior à sucessão pela União É válida a penhora em bens de pessoa jurídica de direito privado, realizada anteriormente à
sucessão desta pela União, não devendo a execução prosseguir mediante precatório (art. 100, “caput” e §
1º, da Constituição Federal). Com essa orientação, o Tribunal negou provimento a recurso extraordinário
em que se discutiam a validade da penhora de bem da extinta Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA),
realizada anteriormente à sucessão de seus créditos pela União, e a possibilidade de a execução prosseguir
mediante precatório.
O Tribunal observou, inicialmente, que a sucessão da RFFSA pela União ocorreu em 22.1.2007
(Medida Provisória 353/2007, convertida na Lei 11.483/2007), portanto, após a determinação da
constrição judicial realizada em 21.1.2005 e confirmada pelo TRT da 3ª Região em 25.10.2006.
Também registrou que, por expressa disposição normativa (art. 173, § 1º, II, da CF) e pela pacífica
jurisprudência da Corte, a RFFSA não tem os privilégios da Fazenda Pública, que, em regra, não são
extensíveis às empresas públicas nem às sociedades de economia mista, porquanto submetidas ao regime
jurídico das pessoas jurídicas de direito privado.
Anotou que a Corte, diante de situações excepcionais, tem entendido que determinadas pessoas
jurídicas de direito privado podem submeter-se ao regime de precatórios, como no caso da Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), empresa pública que presta serviço público da competência da
União e por ela mantido.
Mencionou o RE 599.176/PR (DJE de 30.10.2014), com repercussão geral, no qual, diante
também de sucessão da RFFSA pela União, o Plenário concluiu que a imunidade recíproca do art. 150,
VI, “a”, da CF não exonera o sucessor das obrigações tributárias relativas aos fatos ocorridos antes da
sucessão. Reconheceu que a solução do mencionado precedente poderia ser aplicada ao presente caso e
salientou que os dois julgados tratam da mesma questão jurídica: a possibilidade de se concederem
privilégios próprios de pessoa jurídica de direito público, sucessora de empresa privada, aos atos
processuais praticados antes da sucessão.
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Nesse sentido, não se pode falar em afronta a preceito constitucional nem em impenhorabilidade
absoluta do bem penhorado em data anterior à sucessão processual da RFFSA pela União, haja vista a
impossibilidade de a sucessão ter efeitos retroativos em prejuízo dos atos processuais praticados.
Asseverou que, em certo sentido, a mudança do regime do rito de processamento da execução,
quando já estabelecida a penhora, pode ser considerada uma fraude contra os credores. A mudança, no
curso do processo executivo, tal como posta nestes autos, representa uma forma de retirar dos credores a
garantia de seus créditos já aperfeiçoada e consolidada na forma do regime anterior.
Por fim, o Plenário frisou que, no caso, deve ser levado em conta que o débito exequendo decorre
do pagamento de direitos trabalhistas, com prestação de serviços iniciada na década de 1970, de ex-
empregado da antiga empresa Ferrovia Paulista S/A (FEPASA), cuja pretensão já está a se arrastar por
quase duas décadas. Salientou a existência de inúmeras execuções que tratam da mesma matéria, com
processos sobrestados nos tribunais de origem aguardando a solução da presente controvérsia, cujos
exequentes, se vivos, teriam mais de sessenta anos de idade. Concluiu que admitir a pretensão da União
no sentido de submeter o crédito dos exequentes à ordem cronológica de apresentação dos precatórios
tornaria ainda mais penosa a espera dos ex-trabalhadores em ver realizados seus direitos já reconhecidos e
amparados pela coisa julgada.
RE 693112/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 9.2.2017. (RE-693112)
(Informativo 853, Plenário, Repercussão Geral)
DIREITO PENAL
Concurso de Crimes
Latrocínio: pluralidade de vítimas fatais e concurso formal - 2 A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, deu parcial provimento ao
recurso ordinário em “habeas corpus” em que se pretendia a desclassificação do delito de latrocínio
para o de roubo, assim como a exclusão do concurso formal impróprio reconhecido quanto aos
crimes de latrocínio.
No caso, o recorrente foi condenado a 42 anos de reclusão pela prática das condutas previstas
nos arts. 148 (sequestro e cárcere privado); 157, § 3º, segunda parte (latrocínio), por duas vezes; e
211 (ocultação de cadáver) do Código Penal (CP). Reconheceu-se, ainda, o concurso formal
impróprio com relação aos crimes de latrocínio, considerada a existência de duas vítimas fatais.
A defesa pretendia a desclassificação do delito de latrocínio para o de roubo, ante a ausência
de provas de que o recorrente teria concorrido para a morte das vítimas, bem como em razão da
participação de menor importância na prática delituosa. Pedia, também, a exclusão do co ncurso
formal de crimes, por entender ter havido apenas um latrocínio, não obstante a pluralidade de
mortes. Requeria, por fim, o reconhecimento do direito à progressão ao regime semiaberto — v.
Informativo 846.
Quanto à desclassificação pretendida, o Colegiado consignou que o juízo sentenciante, em
harmonia com o ordenamento jurídico, julgou ter o recorrente contribuído ativamente para a
realização do delito, em unidade de desígnios e mediante divisão de tarefas, com pleno domínio do
fato. Além disso, o agente assumiu o risco de produzir resultado mais grave, ciente de que atuava em
crime de roubo, no qual as vítimas foram mantidas em cárcere sob a mira de arma de fogo. Para a
Turma, aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo, sobrevindo a morte da vítima,
responde pelo crime de latrocínio, ainda que não tenha sido o autor do disparo fatal ou que sua
participação se revele de menor importância.
No tocante ao reconhecimento de crime único, a Turma ponderou ser o latrocínio delito
complexo, cuja unidade não se altera em razão da existência de mais de uma vítima fatal.
Acrescentou, por fim, que a pluralidade de vítimas é insuficiente para configurar o concurso de
crimes, uma vez que, na espécie, o crime fim arquitetado foi o de roubo (CP, art. 157, § 3º), e não o
de duplo latrocínio.
Vencidos os ministros Roberto Barroso e Rosa Weber, que negavam provimento ao recurso,
por entenderem que, diante da ocorrência de duas mortes, estaria configurado o concurso formal de
crimes.
RHC 133575/PR, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 21.2.2017. (RHC-133575)
(Informativo 855, 1ª Turma)
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Princípios e Garantias Penais
Rádio comunitária e princípio da insignificância A Segunda Turma concedeu a ordem em “habeas corpus” para absolver o paciente, denunciado
pela alegada prática de desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação (Lei 9.472/1997, art.
183), em face da aplicação do princípio da insignificância.
No caso, tratava-se de proprietário de rádio comunitária cujo sinal supostamente causaria
interferência nos serviços de comunicações instalados na região.
A Turma ressaltou que a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), em laudo técnico,
reconheceu que, se a alegada interferência se confirmasse, atingiria canais que não estão sequer
outorgados a operar na pequena área de cobertura da rádio comunitária.
Asseverou não ser possível reconhecer a tipicidade material da conduta ante a incidência na
hipótese do princípio da insignificância. Afinal, o bem jurídico tutelado pela norma (segurança dos meios
de comunicação) permaneceu incólume, sem sofrer qualquer espécie de lesão nem ameaça de lesão a
merecer intervenção do Direito Penal. Nesse sentido, não foi demonstrada lesividade concreta, mas
apenas potencial. Assim, a matéria deveria ser resolvida na esfera administrativa.
Salientou, por fim, a importância das rádios comunitárias como prestadoras de serviço público e a
aparente boa-fé do paciente.
HC 138134/BA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 7.2.2017. (HC-138134)
(Informativo 853, 2ª Turma)
Condenação em segundo grau e execução da pena A Primeira Turma declarou prejudicada a impetração de “habeas corpus” no qual se buscavam o
conhecimento de apelação interposta perante tribunal de justiça e a revogação de prisão preventiva a fim
de que o paciente — condenado pelo tribunal do júri — pudesse aguardar o julgamento do recurso de
apelação em liberdade.
No caso, sobreveio o julgamento da apelação da defesa com a redução da pena privativa de
liberdade e a expedição de nova ordem prisional, por conta da exequibilidade de penas após condenação
em segundo grau.
A Turma entendeu que acarreta prejuízo da impetração o superveniente julgamento do mérito de
“habeas corpus” pelo STJ, a determinar o conhecimento da apelação, assim como a mudança no título
prisional.
Além disso, consignou que a ordem não poderia ser concedida de ofício porquanto a
jurisprudência do STF é no sentido da exequibilidade da pena depois das decisões de segunda instância.
Vencido, nesse ponto, o ministro Marco Aurélio (relator), que concedia a ordem de ofício por
entender existir ofensa ao princípio constitucional da não culpabilidade.
HC 129295/SC, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso,
julgamento em 21.2.2017. (HC-129295)
(Informativo 855,1ª Turma)
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Competência
Arquivamento e remessa dos autos - 2 A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, deu provimento a agravo regimental em inquérito
e determinou a remessa dos autos a juízo de primeira instância para apurar a eventual responsabilidade
penal de terceiros em fato criminoso — v. Informativo 837.
No caso, os autos foram encaminhados a esta Corte pelo juízo de primeiro grau em razão da
presença de um investigado com foro por prerrogativa de função no Supremo Tribunal Federal (STF).
O Ministério Público (MP) alegava a prévia existência de indícios de implicação delitiva de outros
indivíduos sem prerrogativa de foro e salientava que a autoria do fato criminoso teria sido apurada antes
da remessa dos autos ao STF, muito embora esses autos já tivessem sido arquivados nesta Corte.
A Turma entendeu que, vislumbrando o titular da ação penal a aparência de práticas criminosas
contra indivíduos sem prerrogativa de foro antes da declinação de competência a esta Suprema Corte, é
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adequado o encaminhamento dos autos originais ao juízo declinante para, se for o caso, o órgão do MP na
origem prosseguir na investigação com o aproveitamento dos atos até então praticados.
Afirmou, ainda, que a atuação judicial deve ser comedida em sede de investigações preliminares e
que, por se tratar de um momento ainda bastante embrionário, não cabe definir limites objetivos e
subjetivos da investigação.
Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator) e Luiz Fux, que negavam provimento ao agravo
regimental. Segundo eles, o inquérito dizia respeito, unicamente, a investigado com foro por prerrogativa
de função no STF, cujos autos foram arquivados.
Inq 3158 AgR/RO, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgamento
em 7.2.2017. (Inq-3158)
(Informativo 853, 1ª Turma)
Foro por prerrogativa de função e desmembramento de inquérito A Segunda Turma negou provimento a agravo regimental em reclamação no qual se pretendia o
reconhecimento da usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo juízo reclamado em
razão do não desmembramento de inquérito depois de vislumbrado, no curso das investigações, o suposto
envolvimento de deputado federal.
A defesa alegava que, embora tivessem sido captados diálogos que demonstrassem o envolvimento de
autoridade com prerrogativa de foro, o juízo de primeiro grau não declinou da competência em situação em que
seria imperiosa a remessa dos autos ao STF.
O Colegiado entendeu não haver cogitar de usurpação de competência desta Corte quando a simples
menção a nome de autoridade com prerrogativa de foro — seja em depoimentos prestados por testemunhas ou
investigados, seja na captação de diálogos travados por alvos de censura telefônica judicialmente autorizada —,
assim como a existência de informações, até então fluidas e dispersas a seu respeito, são insuficientes para o
deslocamento da competência para o juízo hierarquicamente superior.
Ressaltou que, para haver atração da causa ao foro competente, é imprescindível a constatação da
existência de indícios da participação ativa e concreta do titular da prerrogativa em ilícitos penais.
Por seu turno, ao analisar as informações prestadas pelo juízo reclamado, a Turma verificou que o
deputado federal não foi alvo de nenhuma medida cautelar autorizada por aquele juízo no curso da persecução
penal. Além disso, os fatos verificados sobre o parlamentar não tinham relação direta com o objeto da
investigação em desfavor do agravante.
Nesse contexto, asseverou ser inviável, em reclamação, o reexame do conteúdo do ato reclamado e de
todo o conjunto fático-probatório para chegar à conclusão diversa. Por fim, salientou que, conforme a
jurisprudência da Corte, a eventual declaração de imprestabilidade dos elementos de prova angariados em
suposta usurpação de competência criminal do STF não alcançaria aqueles destituídos de foro por prerrogativa
de função, como no caso.
Rcl 25497 AgR/RN, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 14.2.2017. (Rcl-25497)
(Informativo 854, 2ª Turma)
Investigação Preliminar
Inquérito e compartilhamento de peças A Segunda Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental interposto contra decisão que
determinou o compartilhamento de peças de investigação com a 13ª Vara Federal de Curitiba/PR, que apura
crimes praticados no âmbito da Transpetro e ligados a suposta organização criminosa investigada na Operação
Lava Jato.
No caso, depoimentos de colaborador apontam para a responsabilidade conjunta de cinco membros de
partido político por supostos atos de corrupção que envolveriam a manutenção do delator na chefia da
Transpetro, mediante pagamento de vantagem indevida, desviada de contratos da companhia. Daqueles, quatro
são atualmente senadores. O agravante era senador na época dos atos mencionados, mas hoje não ocupa cargo
eletivo.
A Turma afirmou que a decisão agravada, embora não seja expressa nesse sentido, deixa margem para a
interpretação de que teria ocorrido uma cisão subjetiva das investigações em relação ao agravante.
Ressaltou que o Supremo Tribunal Federal (STF) supervisiona investigações pelos mesmos fatos contra
outros investigados, e por fato conexo contra o agravante.
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Por outro lado, suscitou haver dúvida objetiva e fundada sobre qual juízo supervisionaria as
investigações contra o agravante pela suposta corrupção no âmbito da Transpetro.
Sublinhou que, na hipótese dos autos, em que quatro dos cinco investigados têm prerrogativa de foro,
haveria risco de o compartilhamento de dados com a 13ª Vara Federal de Curitiba/PR acarretar em
investigação de personagens sob a jurisdição do STF, o que poderia gerar anulação processual.
Vencido o ministro Edson Fachin (relator), que mantinha a decisão agravada. Pontuava que o
compartilhamento não significaria declinação nem afirmação de competência. Frisava que os mesmos
documentos e anexos remetidos para Curitiba, à guisa de compartilhamento, foram juntados em inquérito que
tramita na Suprema Corte.
Pet 6138 AgR-segundo/DF, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli,
julgamento em 21.2.2017. (Pet-6138)
(Informativo 855, 2ª Turma)
Nulidades
Instauração de investigação criminal e determinação de interceptações telefônicas com base
em denúncia anônima A Segunda Turma denegou a ordem em "habeas corpus" em que se pretendia o reconhecimento da
ilegalidade de ação penal e de interceptações telefônicas iniciadas a partir de denúncias anônimas.
No caso, o Ministério Público estadual, após receber diversas denúncias anônimas de prática de
crimes e seus possíveis autores, procedeu a investigações preliminares, com a oitiva informal de
testemunhas. Diante da verossimilhança das alegações, instaurou procedimento de investigação no qual
foi requerida quebra do sigilo telefônico dos envolvidos.
Por essa razão, o paciente foi denunciado pela suposta prática dos crimes de associação criminosa
e corrupção ativa (duas vezes), previstos nos arts. 288 e 333 do CP, e de fraude à licitação (cinco vezes),
previsto no art. 90 da Lei 8.666/1993.
Os impetrantes sustentavam que, por terem sido iniciadas a partir de denúncias anônimas — sem a
comprovação da realização de diligências preliminares nos autos —, as investigações preliminares
(portaria e procedimento investigativo criminal) e o procedimento relativo às interceptações telefônicas
deveriam ser declarados nulos. Alegavam, ainda, que as interceptações telefônicas não teriam atendido às
regras e condições estabelecidas pela Lei 9.296/1996.
A Turma rememorou entendimento do STF no sentido de que a denúncia anônima é válida,
quando as investigações se valem de outras diligências para apurar a “delatio criminis”.
Asseverou que a necessidade das interceptações telefônicas foi devidamente demonstrada pelo juiz
natural da causa, bem como que havia indícios suficientes de autoria de crimes punidos com reclusão,
conforme exigido pelo art. 2º da Lei 9.296/1996. Quanto às prorrogações das interceptações telefônicas,
ponderou que a Corte tem admitido a razoável dilação dessas medidas, desde que respeitado o prazo de
quinze dias entre cada uma das diligências, o que não caracteriza desrespeito ao art. 5º da Lei 9.296/1996.
Ressaltou, por fim, que o indeferimento de diligências pelo magistrado de primeiro grau não
configura cerceamento de defesa. Afinal, o art. 400, § 1º, do CPP (§ 1º “As provas serão produzidas numa
só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias”) prevê
a possibilidade de o juiz indeferir provas consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, sem
que isso implique nulidade da respectiva ação penal. Sustentou que a discussão sobre o acerto ou
desacerto dessa decisão exigiria exame aprofundado dos fatos e provas da causa, o que não se mostra
viável em “habeas corpus”, que não admite dilação probatória.
HC 133148/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 21.2.2017. (HC-133148)
(Informativo 855, 2ª Turma)
Prisão Cautelar
Reclamação e prisão preventiva O Plenário negou provimento a agravo regimental em reclamação no qual se discutia a legitimidade da
prisão preventiva do reclamante e, por maioria e de ofício, indeferiu a ordem de “habeas corpus”.
No caso, o agravante sustentava que a autoridade reclamada teria violado as decisões proferidas pelo
STF nas Ações Cautelares 4.070/DF (DJE de 21.10.2016) e 4.175/DF (DJE de 19.9.2016). Alternativamente,
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requeria a concessão da ordem de “habeas corpus” de ofício, em vista da ausência de requisitos que
justificassem a decretação da prisão preventiva, o que configuraria flagrante constrangimento ilegal.
O Tribunal afirmou que, ao julgar as referidas ações cautelares, não se manifestou sobre os requisitos da
prisão preventiva, o que impede a utilização da reclamação.
Verificou, também, que o agravante impetrou “habeas corpus” quando a discussão a respeito dos
requisitos de sua prisão preventiva estavam em análise no STJ. Por essa razão, é prematura a manifestação do
STF sobre o tema antes de esgotadas as instâncias antecedentes.
O cabimento de reclamação deve ser aferido nos estritos limites das normas de regência, que a
concebem para a preservação da competência do STF ou para garantia da autoridade de suas decisões (CF, art.
102, I, “l”). A reclamação não se destina, destarte, a funcionar como sucedâneo recursal nem se presta a atuar
como atalho processual destinado a submeter a mais alta Corte do País, “per saltum”.
Afinal, é assente na jurisprudência do STF a concepção segundo a qual a competência originária da
Suprema Corte se submete ao regime de direito estrito, não admitindo interpretação extensiva.
A despeito da dicção do art. 654, § 2º, do CPP, segundo o qual “Os juízes e os tribunais têm
competência para expedir de ofício ordem de ‘habeas corpus’, quando no curso de processo verificarem que
alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal”, tal regra não dispensa a observância do quadro de
distribuição constitucional das competências para conhecer do “habeas corpus”. Vale dizer, somente o órgão
jurisdicional competente para a concessão da ordem a pedido pode conceder o “writ” de ofício.
Nessa linha, ainda que o STF seja Corte de vértice, a Constituição somente lhe outorgou competência
para “habeas corpus” “quando o coator for tribunal superior ou quando o coator ou o paciente for autoridade ou
funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do STF, ou se trate de crime sujeito à mesma
jurisdição em uma única instância”, nos exatos termos do art. 102, I, “i”, da CF, e quando for paciente o
presidente da República, o vice-presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios ministros, o
procurador-geral da República, os ministros de Estado, os comandantes da Marinha, do Exército e da
Aeronáutica, os membros dos tribunais superiores, do TCU e os chefes de missão diplomática de caráter
permanente, em razão da incidência da regra prevista no art. 102, I, “d”, combinado com o art. 102, I, “b” e “c”,
todos da CF.
Portanto, é necessário que o tema tenha sido submetido às instâncias antecedentes e que se possa
depreender ato coator praticado por tribunal superior, ainda que se tenha por ato coator a omissão em conceder
um “habeas corpus” de ofício diante de uma ilegalidade cujo conhecimento fosse possível. Vale dizer, a
Suprema Corte pode conceder a ordem de ofício, se verificar que um tribunal superior teve a oportunidade de
sanar uma coação ilegal e não o fez.
Ademais, se houve coação ilegal contra o agravante, essa não seria mais imputável ao juiz de primeiro
grau, autoridade reclamada. O reclamante impetrou “habeas corpus” perante tribunal regional, que denegou a
ordem. Essa situação que faz da corte regional, caso seja mesmo ilegal a prisão do agravante, a autoridade
coatora. Há, portanto, alteração do título, o que torna sem objeto o pedido de concessão de ordem de ofício.
O STF tem entendido que se torna desnecessária a análise de impetrações quando o estado de liberdade
é alvo de ato jurisdicional superveniente e autônomo, que desafia impugnação própria, em evidente hipótese de
prejudicialidade.
Vencido o ministro Marco Aurélio, que concedia a ordem de ofício. Pontuava não haver fundamento
idôneo para a manutenção da prisão preventiva. Além disso, frisava que o “habeas corpus” não sofreria
qualquer peia. O fato de haver outro “writ” submetido ao crivo do STJ não impediria a apreciação do “habeas
corpus” de ofício pelo STF, pouco importando que isso implicasse queima de etapa ou supressão de instância.
Rcl 25509 AgR/PR, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 15.2.2017. (Rcl-25509)
(Informativo 854, Plenário)
DIREITO TRIBUTÁRIO
Imunidades Tributárias
Entidades beneficentes de assistência social e imunidade - 7 O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, com base no princípio da fungibilidade,
conheceu das ações diretas de inconstitucionalidade como arguição de descumprimento de preceito
fundamental.
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Vencidos os ministros Roberto Barroso, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Marco Aurélio, que não
convertiam as ações. O ministro Dias Toffoli ressaltava que, incluída em pauta a ação direta antes do
exaurimento da eficácia da lei temporária impugnada, o Tribunal deveria julgá-la. O ministro Marco
Aurélio afirmava que, se o ato normativo abstrato e autônomo tivesse sido revogado, seria o caso de
decretar o prejuízo da ação (v. Informativos 749 e 844).
No mérito, prevaleceu o voto do ministro Teori Zavascki, que julgou procedentes os pedidos
veiculados nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 2.028 e 2.036 para declarar a inconstitucionalidade
do art. 1º da Lei 9.732/1998, na parte em que alterou a redação do art. 55, III, da Lei 8.212/1991 e
acrescentou-lhe os §§ 3º, 4º e 5º, bem como dos arts. 4º, 5º e 7º da Lei 9.732/1998.
Além disso, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados nas Ações Diretas de
Inconstitucionalidade 2.228 e 2.621 para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 2º, IV; 3º, VI e §§ 1º e
4º; 4º, parágrafo único, todos do Decreto 2.536/1998; assim como dos arts. 1º, IV; 2º, IV e §§ 1º e 3º; e 7º,
§ 4º, do Decreto 752/1993.
Afirmou que a reserva de lei complementar aplicada à regulamentação da imunidade tributária,
prevista no art. 195, § 7º, da Constituição Federal (CF), limita-se à definição de contrapartidas a serem
observadas para garantir a finalidade beneficente dos serviços prestados pelas entidades de assistência
social, o que não impede seja o procedimento de habilitação dessas entidades positivado em lei ordinária.
Explicou que, justamente por cumprir uma missão mais nobre, a imunidade se diferencia das
isenções e demais figuras de desoneração tributária. A imunidade de contribuições sociais serve não
apenas a propósitos fiscais, mas à consecução de alguns dos objetivos fundamentais para a República – como
a construção de uma sociedade solidária e voltada para a erradicação da pobreza –, os quais não podem ficar à mercê
da vontade transitória de governos. Devem ser respeitados, honrados e valorizados por todos os governos,
transcendendo a frequência ordinária em que se desenvolvem costumeiramente os juízos políticos de
conveniência e oportunidade, para desfrutar da dignidade de políticas de Estado.
Portanto, não se pode conceber que o regime jurídico das entidades beneficentes fique sujeito a
flutuações legislativas erráticas, não raramente influenciadas por pressões arrecadatórias de ocasião. É
inadmissível que tema tão sensível venha a ser regulado por medida provisória. O cuidado de inibir a
facilitação de flutuações normativas nesse domínio justifica-se, sobretudo, pela própria jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal, que afirma não haver direito adquirido a determinado tratamento tributário.
Assim, diante da relevância das imunidades de contribuições sociais para a concretização de uma
política de Estado voltada à promoção do mínimo existencial e da necessidade de evitar que as entidades
compromissadas com esse fim sejam surpreendidas com bruscas alterações legislativas desfavoráveis à
continuidade de seus trabalhos, deve incidir nesse caso a reserva legal qualificada prevista no art. 146, II,
da CF. É essencial frisar, todavia, que essa proposição não produz uma contundente reviravolta na
jurisprudência da Corte a respeito da matéria, mas apenas um reajuste pontual. Aspectos meramente
procedimentais referentes à certificação, à fiscalização e ao controle administrativo continuam passíveis
de definição em lei ordinária. A lei complementar é forma somente exigível para a definição do modo
beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF,
especialmente quanto às contrapartidas a serem observadas por elas.
Por essas razões, o ministro Teori Zavascki concluiu pela inconstitucionalidade dos artigos da Lei
9.732/1998 que criaram contrapartidas a serem observadas pelas entidades beneficentes, e também dos
arts. 1º, IV; 2º, IV e §§ 1º e 3º; 7º, § 4º, do Decreto 752/1993, que perderam o indispensável suporte legal
do qual derivam. Contudo, não há vício formal – tampouco material – nas normas acrescidas ao inciso II
do art. 55 da Lei 8.212/1991 pela Lei 9.429/1996 e pela Medida Provisória 2.187/2001, essas últimas
impugnadas pelas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 2.228 e 2.621.
As sucessivas redações do art. 55, II, da Lei 8.212/1991 têm em comum a exigência de registro da
entidade no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), a obtenção do certificado expedido pelo
órgão e a validade trienal do documento. Como o conteúdo da norma tem relação com a certificação da
qualidade de entidade beneficente, fica afastada a tese de vício formal. Essas normas tratam de meros
aspectos procedimentais necessários à verificação do atendimento das finalidades constitucionais da regra
de imunidade.
Vencidos, em parte, os ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio, que julgavam totalmente
procedentes os pedidos formulados nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 2.228 e 2.621 e, portanto,
reputavam inconstitucional o art. 55, II e III, da Lei 8.212/1991, com a redação conferida pelo art. 5º da
Lei 9.429/1996, bem como os arts. 9º e 18, III e IV, da Lei 8.742/1993.
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Por fim, o ministro Marco Aurélio aditou o seu voto para assentar a inconstitucionalidade formal
do art. 55, III, da Lei 8.212/1991, na redação conferida pelo art. 1º da Lei 9.732/1998.
ADI 2028/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgamento
em 23.2 e 2.3.2017. (ADI-2028)
ADI 2036/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgamento
em 23.2 e 2.3.2017. (ADI-2036)
ADI 2621/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgamento
em 23.2 e 2.3.2017. (ADI-2621)
ADI 2228/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgamento
em 23.2 e 2.3.2017. (ADI-2228)
(Informativo 855, Plenário)
Entidades beneficentes de assistência social e imunidade - 8 Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário
para declarar a inconstitucionalidade formal do art. 55 da Lei 8.212/1991, que dispõe sobre as exigências
para a concessão de imunidade tributária às entidades beneficentes de assistência social (v. Informativos
749 e 844).
Prevaleceu o voto do ministro Marco Aurélio (relator). Ele explicou que as normas de imunidade
tributária constantes da Constituição Federal (CF) objetivam proteger valores políticos, morais, culturais e
sociais essenciais e não permitem que os entes tributem certas pessoas, bens, serviços ou situações ligadas
a esses valores. Além disso, lembrou que o § 7º do art. 195 da CF traz dois requisitos para o gozo da
imunidade: ser pessoa jurídica a desempenhar atividades beneficentes de assistência social e atender a
parâmetros legais.
No que se refere à primeira condição, o ministro asseverou que o Supremo Tribunal Federal (STF)
conferiria sentido mais amplo ao termo “assistência social” constante do art. 203 da CF, a concluir que,
entre as formas de promover os objetivos revelados nos incisos desse preceito, estariam incluídos os
serviços de saúde e educação.
Reputou que toda pessoa jurídica a prestar serviços sem fins lucrativos com caráter assistencial,
em favor da coletividade e, em especial, dos hipossuficientes, atuaria em conjunto com o Poder Público
na satisfação de direitos fundamentais sociais. Por isso, o constituinte assegurou a imunidade a essas
pessoas em relação tanto aos impostos quanto às contribuições sociais, a partir da impossibilidade de
tributar atividades típicas do Estado em favor da realização de direitos fundamentais no campo da
assistência social.
O ministro ainda frisou que a definição do alcance formal e material do segundo requisito
(observância de “exigências estabelecidas em lei”) deveria considerar o motivo da imunidade em
discussão – a garantia de realização de direitos fundamentais sociais.
Sinalizou que, por se tratar de limitação ao poder de tributar, as “exigências legais” ao exercício
das imunidades seriam sempre “normas de regulação” às quais o constituinte originário teria feito
referência no inciso II do art. 146 da CF, a serem dispostas em lei complementar.
Assinalou que, para disciplinar as condições mencionadas no § 7º do art. 195 da CF, dever-se-ia
observar a reserva absoluta de lei complementar, sob pena de negar-se que a imunidade discutida fosse
uma limitação ao poder de tributar. Ponderou caber à lei ordinária apenas prever requisitos que não
extrapolem os estabelecidos no Código Tributário Nacional (CTN) ou em lei complementar
superveniente. Seria, portanto, vedado criar obstáculos novos, adicionais aos já dispostos em ato
complementar.
Pontuou que, sob o pretexto de disciplinar aspectos das entidades pretendentes à imunidade, o
legislador ordinário teria restringido o alcance subjetivo da regra constitucional, a impor condições
formais reveladoras de autênticos limites à imunidade.
Entendeu que, no caso, teria ocorrido regulação do direito sem que estivesse autorizado pelo art.
146, II, da CF. O art. 55 da Lei 8.212/1991 previra requisitos para o exercício da imunidade tributária
contida no § 7º do art. 195 da CF, a revelar condições prévias ao aludido direito. Assim, deveria ser
reconhecida a inconstitucionalidade formal desse dispositivo no que ultrapassasse o definido no art. 14 do
CTN, por afronta ao art. 146, II, da CF.
Considerou que os requisitos legais exigidos na parte final do mencionado § 7º, enquanto não
editada nova lei complementar sobre a matéria, seriam somente aqueles do art. 14 do CTN.
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Concluiu por assegurar o direito à imunidade de que trata o art. 195, § 7º, da CF – haja vista que
reconhecido pelo magistrado sentenciante que a entidade preenchera os requisitos exigidos no CTN – e,
por consequência, desconstituir o crédito tributário inscrito em dívida ativa, com a extinção da respectiva
execução fiscal.
Por fim, o relator aditou o voto para esclarecer que não haveria fundamento autônomo no aresto
impugnado a ensejar o desprovimento do recurso, porquanto o tribunal de origem teria decidido com base
na aplicação do art. 55 da Lei 8.212/1991.
Vencidos os ministros Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que
negavam provimento ao recurso. Aduziam que o acórdão recorrido se assentou não apenas na questão da
reserva de lei complementar como veículo adequado à definição do modo beneficente de prestar
assistência social, mas também na circunstância de a demandante não ter preenchido uma das exigências
validamente previstas pela Lei 8.212/1991, a de obtenção de título de utilidade pública federal.
O ministro Ricardo Lewandowski reajustou o voto para acompanhar o relator.
RE 566622/RS, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 23.2.2017. (RE-566622)
(Informativo 855, Plenário, Repercussão Geral)
Princípios e Garantias Tributários
Imunidade tributária e contribuinte de fato A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de
direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante, para a verificação da existência do
beneplácito constitucional, a repercussão econômica do tributo envolvido.
Com base nessa orientação, o Tribunal deu provimento ao recurso extraordinário no qual se
pretendia a não aplicação da imunidade tributária constante do art. 150, VI, “c”, da CF relativamente ao
ICMS incidente na aquisição de insumos, medicamentos e serviços adquiridos por entidade de assistência
social na qualidade de consumidora (contribuinte de fato).
Na espécie, o Tribunal de origem afastou a exigência do recolhimento do ICMS nas operações de
aquisição, por entidade de assistência social (na qualidade de consumidor final), de medicamentos,
máquinas e equipamentos necessários à execução de suas finalidades filantrópicas, ante a configuração da
imunidade tributária prevista no art. 150, VI, “c”, da CF.
Para o recorrente, a aquisição de insumos e produtos no mercado interno na qualidade de
contribuinte de fato não estaria albergada pela imunidade tributária prevista no art. 150, VI e § 4º, da CF.
Sustentava, ainda, que a relevância das atividades prestadas pelas entidades de assistência social não
poderia conferir aos fornecedores particulares, não abrangidos pela regra imunizante, a não incidência do
ICMS na venda de mercadorias e serviços.
O Colegiado rememorou que prevalece no STF o entendimento de que a imunidade tributária
subjetiva se aplica a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não àqueles na condição
de simples contribuinte de fato, bem como de que é irrelevante, para a verificação da incidência ou não da
imunidade constitucional, a discussão acerca da repercussão econômica do tributo envolvido.
Ressaltou, também, que a jurisprudência do STF vem se posicionando pela impossibilidade de se
estender ao particular vendedor (contribuinte de direito) a imunidade tributária subjetiva que detém o
adquirente de mercadoria (contribuinte de fato).
Assim, o beneficiário da imunidade tributária subjetiva na posição de simples contribuinte de fato,
embora possa arcar com os ônus financeiros dos impostos envolvidos nas compras de mercadorias, caso
tenham sido transladados pelo vendedor contribuinte de direito, desembolsa importe que juridicamente
não se qualifica como tributo, mas sim preço, decorrente de uma relação contratual.
Destacou a impossibilidade de, no contexto do exercício das atividades econômicas, ter-se certeza
da efetiva transferência do encargo financeiro dos tributos, em razão de o lucro não ser tabelado.
Ademais, quanto à regra contida no art. 150, § 5º, da CF (“§ 5º A lei determinará medidas para que os
consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços”),
asseverou não haver transformação dos contribuintes finais em contribuintes de direito dos impostos
incidentes sobre mercadorias e serviços que repercutem economicamente, mas sim existir o
reconhecimento de que “o consumidor ou usuário não é contribuinte, tanto assim que precisa ser
informado a respeito dos tributos que oneram mercadorias e serviços”.
Pontuou, igualmente, que a temática da repercussão econômica tributária está na área de formação
dos preços e que, apenas com substancioso estudo dos fatores e das circunstâncias (como condições de
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tempo, lugar e conjectura econômica), seria possível verificar, num juízo de relativa previsibilidade, a
provável repercussão econômica do tributo. Ponderou, dessa forma, ser desaconselhável considerar a
denominada repercussão econômica do tributo para verificar a existência ou não da imunidade tributária.
Essa orientação, a propósito, alinha-se aos precedentes da Corte no sentido de ser a imunidade tributária
subjetiva constante do art. 150, VI, “c”, da CF aplicável à hipótese de importação de mercadorias pelas
entidades de assistência social para uso ou consumo próprio. Com efeito, essas entidades ostentam, nessa
situação, a posição de contribuintes de direito, o que é suficiente para o reconhecimento da imunidade. O
fato de também serem apontadas, costumeira e concomitantemente, como contribuintes de fato é
irrelevante para a análise da controvérsia, portanto.
Asseverou, por fim, que a tese firmada não prejudica o entendimento adotado, em sede de recursos
repetitivos, pelo STJ no julgamento do REsp 1.299.303/SC (DJE de 14.8.2012), no sentido de que o
consumidor de energia elétrica tem legitimidade para propor ação declaratória com pedido de repetição de
indébito a fim de afastar, no tocante ao fornecimento de energia elétrica, a incidência do ICMS sobre
demanda contratada e não utilizada. Essa situação, além de peculiar, está inserida no contexto da
concessão de serviço público e tem regime jurídico próprio.
RE 608872/MG, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 22 e 23.2.2017. (RE-608872)
(Informativo 855, Plenário, Repercussão Geral)
Regime Tributário
Redução da base de cálculo do ICMS e estorno de créditos A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, deu provimento a agravo
regimental em que se pretendia o estorno total dos créditos do ICMS gerados na entrada de insumos
tributados, na hipótese de o contribuinte exercer a opção pela tributação com redução da base de cálculo
na saída das mercadorias.
No caso, norma estadual instituiu regime tributário opcional a empresas transportadoras
contribuintes do ICMS. Com isso, ficava facultada ao contribuinte a manutenção do regime normal de
crédito e débito do imposto ou a apuração do débito com o benefício da redução da base de cálculo,
vedada, nesta hipótese, a utilização de quaisquer créditos relativos a entradas tributadas.
O Colegiado entendeu que, havendo a opção pelo regime ordinário ou por regime mais favorável
de tributação e estabelecendo a lei um regramento específico para o regime mais favorável, a adesão a ele
não gera o direito ao creditamento se a lei o excluir. Assim, o contribuinte deve optar por um dos regimes.
Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que negava provimento ao recurso por entender que a
legislação em debate violaria o princípio da não cumulatividade, pois deveria resguardar o
aproveitamento dos créditos na proporção da redução da base de cálculo.
AI 765420 AgR-segundo/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber,
julgamento em 21.2.2017. (AI-765420)
(Informativo 855, 1ª Turma)
Tributos
Valor Adicionado Fiscal: forma de cálculo e questão infraconstitucional A matéria referente à forma de cálculo do Valor Adicionado Fiscal (VAF) não ostenta natureza
constitucional.
Com essa orientação, o Tribunal, por maioria, negou provimento a embargos de divergência
opostos contra acórdão da Segunda Turma nos quais se sustentava divergência em relação ao acórdão
proferido pela Primeira Turma no RE 136.189/SP (DJU de 22.5.1992).
Nos termos do voto condutor do acórdão paradigma, o ponto essencial à regência da repartição de
receitas entre Estados-Membros e Municípios — alçados os últimos, no federalismo brasileiro, ao
“status” de entidade política autônoma, a concretização dos caracteres essenciais da definição do “valor
adicionado” seria um problema nacional: se a própria Constituição não lhe delegou o deslinde — como o
fazia explicitamente o art. 23, § 8º, até a EC 17/1980, e o faz hoje, explicitamente, o art. 161, I, do texto
de 1988 —, seria na Constituição mesma que se haveria de buscar, até onde por possível, a densificação
do conceito necessário.
O Tribunal, preliminarmente e também por maioria, conheceu dos embargos de divergência por
reputar preenchidos todos os pressupostos processuais. Asseverou haver controvérsia entre os órgãos
fracionários do STF em relação à índole constitucional ou infraconstitucional da forma de cálculo do
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VAF do ICM, sob a vigência da EC 1/1969, após a promulgação da EC 17/1980, para fins de seguimento
de recurso extraordinário. Vencidos, no ponto, os ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, que
não conheciam dos embargos.
Quanto ao mérito, prevaleceu o voto do ministro Edson Fachin que, ao se referir ao acórdão
paradigma, entendeu que o fato de a matéria ser de abrangência nacional não implica dizer que, por isso,
também é necessariamente constitucional.
Asseverou que, no caso, verifica-se apenas que o poder constituinte derivado decidiu excluir da
esfera da política ordinária uma decisão fundamental para o federalismo fiscal, isto é, os critérios de
partilha das receitas do ICM pertencentes ao Estado por meio da constitucionalização desses critérios. No
entanto, estaria claro que não se extrairia um conceito de VAF do que positivado na Constituição, sendo
necessária a concretização normativa do Poder Público nos âmbitos legislativo e administrativo para
regular a vontade do constituinte.
Acrescentou que o VAF é um critério econômico contábil que se pauta simplificadamente na
diferença entre notas fiscais de venda e notas fiscais de compra na espacialidade do município.
Vencidos os ministros Dias Toffoli (relator) e Roberto Barroso, que davam parcial provimento ao
recurso.
RE 296178 AgR-ED-Edv/MG, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin,
julgamento em 23.2.2017. (RE-296178)
(Informativo 855, Plenário)
Supremo Tribunal Federal
Secretaria de Documentação - SDO Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados - CJCD