FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE GEOGRAFIA: O PAPEL DAS SAÍDAS DE CAMPO PARA ACADÊMICOS DO CURSO DE GEOGRAFIA EM EAD
Douglas Rundvalt
UEPG: [email protected]
Gilson Campos Ferreira da Cruz
UEPG: [email protected]
Lais Vaz de Jesus
UEPG : [email protected]
INTRODUÇÃO
A educação a distância vem sendo a alternativa de muitas pessoas para conseguir
estudar, e agora que essa modalidade de ensino já ganhou seu espaço perante a
sociedade, a preocupação é de cada vez mais prezar pela qualidade de ensino e formar
profissionais preparados para o mercado de trabalho. O ensino superior a distância já é
uma realidade, principalmente os cursos de licenciatura, como no caso do curso de
Geografia a distância da Universidade Estadual de Ponta Grossa pela Universidade
Aberta do Brasil. Visando a melhoria do curso de Geografia EAD da UEPG/UAB
optou-se pela realização de saídas de campo para oportunizar ao acadêmico aplicar a
teoria e enriquecer o processo de ensino aprendizagem.
Partindo da premissa onde o ensino da Geografia “pode ser ampliado e
aproximado da realidade por meio do uso de metodologias que possibilitam ao
professor estabelecer uma proposta de trabalho a partir da leitura subjetiva dos fatos
sociais, culturais e naturais de diferentes espaços” (CRUZ, 2011, p. 27). E para que seja
realizada essa leitura é essencial o estudo do meio, principalmente da região onde os
acadêmicos residem, sendo essa a principal proposta desse projeto. Pontuschka (1998,
p. 64), destaca que a implantação de atividades extraclasses subsidia professor e aluno
com informações e relacionamentos que permitirão uma visão mais ampla e profunda
do seu entorno e do mundo. Assim, a prática de campo, em diferentes locais e
momentos distintos, proposta no curso de Geografia EAD da UEPG/UAB possibilitaria
ao acadêmico o contato com a metodologia de ensino estudo do meio, ampliando seu
processo de formação, pois nos cursos de licenciaturas, as instituições se preocupam
mais especificamente com a formação docente, preparando os acadêmicos para a sala de
aula, seja através dos conteúdos, estágios e também muitos induzem os futuros
profissionais a aumentar seus conhecimentos através de praticas, seja em laboratórios,
saídas de campo e afins.
O objetivo deste trabalho é analisar a importância das aulas de campo no curso
de licenciatura em Geografia na modalidade à Distância oferecido pela Universidade
Estadual de Ponta Grossa. Algo inédito elaborado pela coordenadoria, professores e
acadêmicos dessa instituição visando principalmente ‘desmistificar’ e não mais pré-
conceituar esse modelo de ensino, aproximando os acadêmicos à instituição e vice-
versa.
Para este artigo vamos apresentar duas saídas de campo que foram trabalhadas
com os acadêmicos, a primeira foi a visita a uma tribo indígena de origem Guarani
M’byas e a visita à capela Nossa Senhora das Mercês, ambas localizadas na ilha de
Cotinga, pertencentes ao município de Paranaguá, no litoral paranaense. E a segunda foi
a saída de campo a Unidade de conservação também localizada no estado do Paraná,
mais especificamente no município de Tibagi, conhecida como Parque Estadual do
Guartelá. Pretende-se também apresentar nesse trabalho o depoimento dos acadêmicos
que participaram da organização das saídas e das saídas.
SAÍDAS DE CAMPO NA MODALIDADE À DISTÂNCIA, UM DESAFIO, VÁRIOS
OBJETIVOS
Foram realizadas duas experiências de saídas de campo com acadêmicos do Polo
de Paranaguá-PR, desenvolvidas de forma proativa, envolvendo a coordenação do
curso, professores formadores e acadêmicos.
As experiências resultaram de uma proposta da coordenação de curso, de
incentivar os acadêmicos a elaborarem projetos para as saídas e descobrir através do
estudo do meio, formas de realizar a pratica do que aprenderam por meio dos livros e
das atividades em plataforma e presencialmente, oportunizados pela instituição.
Além de visar à preparação dos novos professores para a elaboração e
desenvolvimento de projetos de saídas de campo com futuros alunos, as duas
experiências serviram, também, para que o acadêmico pudesse exercitar e aprofundar os
conhecimentos trabalhados ao longo do curso. Procurou-se escolher lugares próximos
onde se encontram os polos de EaD da instituição, tomando por base a ideia de ‘espaço
vivido’ um dos conceitos chave da Geografia para Tuan (1979, p.30 (1992, p. 440 apud
CORRÊA, 2003, p. 32) “nesse espaço consideram-se os sentimentos espaciais e as
ideias de um grupo ou povo sobre o espaço a partir da experiência” e também que
Holzer (1992, p. 440 apud CORRÊA, 2003, p. 32) denomina como um espaço onde é
“uma experiência contínua, egocêntrica e social, um espaço de movimento de um
espaço-tempo vivido”, podendo assim criar uma ponte entre o conhecimento científico
ao empírico, exprimindo aos acadêmicos a importância da transposição didática ao
Ensino de Geografia.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os procedimentos metodológicos passaram por visita aos polos, onde foi dado
conhecimento aos acadêmicos da possibilidade de fazerem saídas de campo, a partir de
seus polos, desenvolvendo projetos apoiados por professores formadores ou tutores.
Os projetos para realização das saídas de campo foram elaborados, pelos
discentes com auxilio do professor formador, ambos tendo inicio a partir das conversas
pelo Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) para a escolha dos locais de destino
das saídas. Após a definição dos locais, inicia-se o processo de levantamento
bibliográfico abrangendo aspectos geológicos, geomorfológicos, biogeográficos,
históricos, formação territorial dentre outros, coletados por alguns acadêmicos do curso
sobre, a área e a busca de informações locais.
Ao mesmo tempo o foi feita a orientação aos acadêmicos para a elaboração do
projeto, buscando fundamentação teórica sobre a questão de projetos e das temáticas das
saídas, com conversas que visam definição de trilhas, tempo, horários, entre outras
especificidades da proposta. Paralelamente, o professor formador e os coordenadores
procuram resolver a parte ‘burocrática’ dessa saída, como deslocamento do professor ao
destino da saída, possíveis gastos oriundos dessas saídas e elaboração de material
explicativo, tendo em vista a distância do polo e dos locais das saídas de campo.
Percebe-se que deve haver um trabalho conjunto dos envolvidos na atividade,
pois diferentemente da maioria das aulas de campo do curso presencial onde o docente
possui mais responsabilidades, neste caso os acadêmicos participam ativamente do
processo. Isso resulta em dois pontos aos quais os professores têm como objetivo, o
primeiro é orientar os acadêmicos para aprenderem elaborar um projeto, com normas e
todas as exigências descritas para o mesmo e o segundo, preparar os discentes para
ampliar sua gama de conhecimentos e ir além do simples ‘dar aula’, mas sim, transpor
didaticamente o que aprendeu durante o curso.
Toda esta dinâmica foi registrada, assim como tudo o que ocorreu durante e após
as saídas, para posterior analise e discussão dos resultados.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
As saídas de campo foram realizadas em locais totalmente distintos, o primeira
visava mais a questão da Geografia Cultural e o segundo mais na parte geológica e
geomorfológica, sendo a primeira na Ilha da Cotinga, pertencente ao município de
Paranaguá no litoral do Paraná, tendo como objetivo principal estabelecer contato com a
tribo indígena de origem Guarani M’byas, para conhecer costumes e a realidades em
que vivem os indígenas nos dias de hoje e também as ruínas da capela Nossa Senhora
das Mercês, patrimônio histórico da cidade. A segunda saída foi para o Canyon do
Guartelá, que atualmente faz parte do Parque Estadual do Guartelá, no município de
Tibagi-PR, localizado no segundo planalto paranaense.
Para os organizadores essas saídas de campos permitiram que os acadêmicos
fizessem comparações e estabelecessem relação entre o que observaram na primeira
atividade, na região do polo e a segunda atividade em uma região distante e diferente,
onde foram abordados diversos temas da Geografia
ILHA DA COTINGA E O PARQUE ESTADUAL DO GUARTELÁ
A Ilha da Cotinga foi o local escolhido para a primeira saída de campo,
objetivando ampliar os horizontes dos acadêmicos, quanto à região próxima onde a
grande maioria reside, realizando analises socioculturais e naturais.
A visita a ilha tem todo um contexto histórico, também, com relação a ocupação
que remonta às primeiras habitações europeias para a colonização da região. Sua
localização está a aproximadamente dez minutos de distância da parte norte de
Paranaguá.
A localização geográfica do perímetro visitado encontra-se entre as latitudes
25°11'S e 25°59'S e longitudes 48°54'W a 48º42'W. Neste local habita a Comunidade
indígena dos Guaranis M’Byás, aldeia denominada Pindoty, que despertam interesses de
estudo na área sociocultural em virtude da fidelidade à tradição dos seus ancestrais,
mescladas com as intervenções da tecnologia dos dias atuais (FOTO 1).
FOTO 1: Moradia feita com barro e folhas de palmeira
FONTE: RUNDVALT, 2013
Na contramão de muitos dos povos indígenas brasileiros, que vivem dispersos
pelo país, essa ilha acomoda aproximadamente 76 índios da Cotinga, grupo esse que
procura preservar seus costumes, como a língua do tronco linguístico tupi-guarani e,
principalmente a religião milenar.
Como citado anteriormente, estes indígenas preservam rituais religiosos
compostos de músicas e danças, assim como as habitações, que são construídas pelos
próprios M’Byás com barro e bambu, estilo de vida sem preocupação com acumulação
de bens materiais.
A subsistência da aldeia é baseada principalmente no cultivo de feijão, milho,
mandioca, além da coleta de mel e a prática da caça e da pesca na própria ilha. Recebem
auxilio governamentais, provenientes de políticas públicas específicas, para que possam
manter-se, um exemplo são cestas básicas recebidas através da Fundação Nacional do
Índio (FUNAI).
Hábeis no artesanato produzem cestarias e pequenas esculturas, feitas em
madeira e decoradas com brasa, que retratam formas de animais da região. A produção é
comercializada no município de Paranaguá nos períodos em que os indígenas precisam
ir até a cidade, gerando uma pequena renda às famílias que ali residem.
Na Ilha da Cotinga encontram-se as ruínas da igreja de Nossa Senhora das
Mercês que foi construída em meados de 1677, sendo a primeira Igreja Católica em
território paranaense (FOTO 2). Por volta de 1699, a igreja foi demolida para começar a
construção da igreja de São Benedito, no continente. Somente em 1993 foi reerguida
uma nova igreja no mesmo local. Situada no alto de um morro pode-se contemplar uma
paisagem cênica ao chegar à mesma, tendo como vista a baía de Paranaguá em quase
toda sua totalidade.
FOTO 2: Ruínas da Igreja de Nossa Senhora das Mercês Paranaguá- Pr
FONTE: RUNDVALT, 2013
Com relação ao segundo local escolhido em conjunto com professores e
acadêmicos foi o Parque Estadual do Guartelá, participaram além do professor formador
e acadêmicos, dois tutores e um dos coordenadores do curso, onde os acadêmicos
puderam apreciar as mudanças fitogeográficas que ocorrem no estado do Paraná,
deslocando-se da região litorânea e subindo o interior do estado passando pelos
primeiro e segundo planalto paranaense, avistando desde a floresta da Mata Atlântica,
passando pelas matas de Araucária e conhecendo os Campos Gerais. O grupo saiu de
Paranaguá, no litoral paranaense, ao nível do mar, percorrendo 315 Km até a região do
parque com altitude de aproximadamente 1170 m (FOTO 3).
FOTO 3: Segunda saída de campo: grupo reunido no ‘Mirante 2’ do Parque Estadual do Guartelá
FONTE: RUNDVALT, 2013.
Segundo relataram os acadêmicos o parque é um laboratório a céu aberto,
propício para a observação de falhas, fraturas, grutas, canyons e cachoeiras entre outras
feições, que jamais imaginaria poder vê-las e que são completamente diferentes das
encontradas na nossa região.
Ainda com relação aos comentários do grupo pode-se criar uma ponte entre o
conhecimento teórico e pratico e, futuramente ter o discernimento básico para uma
transposição didática aos seus futuros discentes.
DA ORGANIZAÇÃO DAS SAÍDAS
Os acadêmicos participantes da equipe organizadora relataram os
procedimentos, suas dificuldades e o que aprenderam com a experiência.
As saídas de campo foram elaboradas totalmente de forma virtual, sendo que as
reuniões e troca de informações entre acadêmicos organizadores, professor formador,
tutores e demais acadêmicos ocorreram através de e-mails, Skype, rede sociais e o
ambiente virtual de aprendizagem.
Seja de forma síncrona ou assíncrona o meio virtual ajudou a dinamizar a
preparação do projeto, a convocação dos acadêmicos para as referias aulas de campo e a
organização ocorreram com o uso das tecnologias.
Quanto ao primeiro local de escolha para a prática de campo uma observação foi
a dificuldade em encontrar materiais que possuíssem informações a respeito da ilha,
evidenciando as limitações de referenciais teóricos em escala local e regional.
O projeto para a aula na Ilha da Cotinga demandou mais empenho,
principalmente devido a pouco material encontrado sobre a referida tribo e também
sobre a Ilha, que apesar de sua importância geo-histórica não é muito estudada. Nessa
saída foi necessário atentar para alguns cuidados, como locar um barco para transporte
devidamente cadastro e nas normas de segurança exigidas pela Diretoria de Portos e
Costas, pois não há barcos de carreira, ou seja, que façam esse trajeto diariamente e com
hora marcada.Outra peculiaridade, foi pedir permissão para utilizar como base da aula-
campo as dependências da sub-sede do Iate Clube, pois na ilha não existem pontos
comercias, somente a tribo indígena, poucos moradores que trabalham para o Iate Clube
e alguns pescadores que ainda tem permissão para habitar nessa região.
Como mencionado anteriormente, pôde-se perceber que há um esforço maior
ainda de todas as partes, pois após toda a parte burocrática, elaboração do projeto,
cronograma e informações, existiram também algumas dificuldades quanto a logística e
a participação dos acadêmicos, observados pelos organizadores.
Nos dias que antecederam a saída de campo foi necessário acompanhar a
previsão do tempo, pois se houvesse precipitação poderia afetar boa parte da saída de
campo na Ilha da Cotinga, devido a escadaria para Igreja Nossa Senhora das Mercês que
somente é segura com o tempo estável, pois fica no meio de altas arvores sendo
naturalmente úmida.
Já na saída de campo para o Guartelá os valores para contratação do transporte,
foi uma das dificuldades, pois por conta disso alguns acadêmicos não puderam
participar. E também a logística de apanhar os acadêmicos residentes em outros
municípios, bem como os professores e tutores em Ponta Grossa, dificultou com relação
ao tempo de duração da atividade. A distância foi outro fator que levou alguns
acadêmicos a não participarem da saída, pois foi necessário sair muito cedo e retorno só
ocorreu a noite.
Contudo o grupo saiu fortalecido e com o desejo de realizar novas saídas de
campo, com o envolvimento de outros acadêmicos na organização.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar das dificuldades e por se tratar de uma iniciativa inédita para o curso e
para a instituição, as saídas de campo foram realizadas conforme programadas,
atingindo os objetivos esperados.
Muitos conteúdos vistos na disciplina de Pratica de Campo, como cuidados ao
sair a campo, formas de registro e analise dos objetos de estudo, possibilitaram aos
acadêmicos exercitarem uma prática muito comum na Geografia, a realização de saídas
de campo.
Na Ilha da Cotinga, foram estudados aspectos geográficos e históricos
analisando de que forma isto reflete na população local, bem como foi possível
compreender como vivem, como se formou e como se relaciona a comunidade nativa
com as demais comunidades da região. Foi de suma importância para fixar os conteúdos
de disciplinas como Geografia do Paraná, Geografia do Brasil, Geo-História, Geografia
Urbana, Biogeografia, Climatologia e Cidadania e Sociedade.
Já no Parque Estadual do Guartelá, foi possível atentar para as particularidades
do relevo ímpar da região, onde foi possível observar aspectos da drenagem e
escoamento, intemperismo químico, físico e biológico, características da vegetação
como Campos Limpos e Floresta Ombrófila Mista Montana e Aluvial, aspectos
geológicos, com destaque para as rochas sedimentares do arenito Furnas.
No geral, os estudantes que participaram das saídas de campo, ampliaram seus
conhecimentos e terão mais facilidade ao trabalhar com a transposição didática de
alguns conteúdos no futuro quando do exercício docente.
Saídas de campo bem elaboradas e com objetivos definidos contribuem para a
formação dos profissionais do ensino a distancia, reforçando os conteúdos estudados e
também faz com que se habituem a realizar atividades diversificadas nessa disciplina
que tem grandes alternativas para atrair a atenção dos estudantes, pois além de
transcender os limites físicos da escola, também seduz os acadêmicos para uma
aprendizagem significativa dos assuntos abordados.
Os trabalhos realizados demonstram que existe um caminho para resolver um
dos problemas do ensino a distancia de Geografia que é a necessidade de aulas práticas,
aulas passeio e visitas técnicas.
Para o futuro, o propósito é desenvolver saídas de campos com acadêmicos dos
outros polos, onde é ofertado o curso de Geografia a Distância pela Universidade
Estadual de Ponta Grossa, aproximando acadêmicos, professores e coordenação.
REFERÊNCIAS
CORRÊA, Roberto Lobato. Espaço: um conceito-chave da geografia. In: CASTRO,
Iná Elias, GOMES, Paulo César da Costa, CORRÊA, Roberto Lobato (orgs.)
Geografia: Conceitos e Temas. 5ª edição. Bertrand: Rio de Janeiro, 2003.
CRUZ, Suzana F. C. F. da. Objeto de aprendizagem colaborativo-OAC. Disponível
em http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/52-2.pdf acessado em
15/04/2014.
PONTUSCHKA, Nídia N. A formação pedagógica do professor de Geografia e as
práticas interdisciplinares. 1994. Tese (Doutorado em Educação) Faculdade de
Educação, USP, São Paulo. 1994.