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Finalista do Prmio SESC de Literatura (2008)
Vencedor do Prmio Utopia de Literatura (2010)
Terceiro colocado do Concurso Internacional daUnio Brasileira de Escritores (2012)
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Copyleft Rodrigo Domit
Projeto GrficoLas Brevilheri
http://cargocollective.com/laisbrevilheri
Utopia Editorahttp://www.utopiaeditora.com.br
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao - CIPBIBLIOTECA MUNICIPAL MARIETTA TELLES MACHADO
ALGUNS DIREITOS RESERVADOS
Qualquer pessoa pode copiar, distribuir, adaptar (audiovisual eteatro) e transmitir os textos contidos nesta obra, contanto queatribua, expressa e formalmente, a autoria destes a RodrigoDomit (http://rodrigodomit.blogspot.com). proibido o uso comercial de qualquer dos textos sem a prvia eexpressa autorizao do autor.
As silhuetas de Dom Quixote e Sancho Pana e a imagem do solutilizadas nas pginas 4 e 5 so de autoria de Pablo Picasso.
Publicado no BrasilPublished in Brazil
D721 Domit, Rodrigo, 1984 -Colcha de Retalhos / Rodrigo Domit, Braslia : Utopia,
2011
ISBN: 978-85-400-0184-8
1. Literatura brasileira - contos. 1. Ttulo
CDU: 821.134.3(81)-34
256-2011
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Nascido em Curitiba em 1984, Rodrigo Domit foicriado em Londrina e reside atualmente no Rio de
Janeiro. autor dos livros Vem c que eu te conto (2010) eColcha de Retalhos (2011).
Entre outros certames literrios, j foi selecionado
nos concursos Luiz Vilela (Contos - 2007), Helena Kolody(Poesias - 2008 e 2009), Prmio SESC (Livro de Contos -2008), Poemas no nibus (Poesia - 2010, 2011e 2012) ePrmio ler&Cia (Contos - 2011); Alm destasclassificaes, foi 1 colocado do Prmio Utopia (Livro deContos - 2010), do Prmio Cidado (Poesia - 2011), doConcurso SESC-DF Machado de Assis (Contos - 2011) etambm do Concurso Literrio de Suzano (Poesia - 2012).
Criou e administra o blog Concursos Literrios, oprojeto Textos & Livros Premiados e o projeto e-Literatura. Alm disso, publica exerccios literrios noTiro Curto e colabora na produo e seleo de contedopara peridicos da rea de cultura e literatura,destacando-se entre estes o jornal Algo a Dizer, o jornalSobrecapa Literal e a revista Samizdat.
Mais informaes:http://rodrigodomit.blogspot.com.br
Rodrigo Domit
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Em seus microcontos, Domit expressa o universodenso da sociedade contempornea. Com palavrasdosadas, ele constri textos milimetricamenteestruturados. Ao longo de seu livro pode-se deparar comuma variedade de estruturas textuais e de linguagens que
nos fazem refletir abismados sobre os mais variadostemas
KAREN DEBRTOLIS, escritora e jornalista de Londrina (PR)
O livro me fez lembrar a velha mxima as melhoresessncias esto nos menores frascos. Domit levou isto
to a srio que acabou criando um pequeno clssico, sim,pois abastado de aforismos, inverses, fantasia e,acredite, surrealismo.
ANGELO PESSOA, escritor e professor de Cordeiro (RJ)
Muitas vezes, pretensiosamente, pensamos que j
lemos tudo. Outras vezes, levianamente, imaginamos quej escreveram tudo. A, atropelados por uma dose fatal deinovadora simplicidade como a dessa Colcha de Retalhos,percebemos que ainda h muito o que ler, e que existemnovos e jovens autores nos surpreendendo a cada pgina,a cada frase. Felizes de ns.
VIVINA DE ASSIS, escritora de So Paulo (SP)
Outros possveis prefcioshttp://bit.ly/opiniao-dos-leitores
Possveis Prefcios
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Agradeo esta publicao Larissa,responsvel pela Utopia, Lali,responsvel pelo projeto grfico, Aninha, irresponsvel que esteve aomeu lado e, especialmente, a toda aminha famlia e aos meus amigos.
Dedico esta publicao digital a todosque no puderam, pelos mais variadosmotivos, ter em mos este livro.
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Alegrou-se com a notcia de que o livroseria dedicado a ela. Caminhou at a livraria compassos e um sorriso dignos de uma musainesquecvel, imortal.
Ao abrir na primeira pgina, leu: Emmemria de...
O livreiro recolheu o corpo.
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Ouvia, via e sentia a tristeza alheia. Aangstia lhe estufava o peito, o ar ficava pesado eos ombros recolhiam-se enquanto as mospassavam pelo rosto suado.
E foi assim em todas as vezes que sedeparou com as tulipas negras, desdentadas, bocasdo desespero
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Desceu daquele nibus lambendo cadadegrau com os ps. Sentiu o gosto quente doasfalto em sol a pino. Percorreu a praa dedilhandoo aroma das flores enquanto o canto dos pssaros
massageava suas pernas cansadas. Viu o toque dosino vindo em sua direo, por todos os lados,ecoando pela catedral. Ouviu cada detalhe do quequeria dizer cada escultura do museu. Deu voltaspela cidade em um cavalo branco e uma charretetinta, amadeirada, com toques frutais e final suave.
Ao final do dia, ouviu o sol tombar no
horizonte e, apesar do cheiro de chuva, no sentiuo gosto das nuvens. Durante a noite, todas as luzeseram artificiais, mas as sombras, caridosas,acolheram-no em suas camas e o cobriram com osangue quente do jornal popular. Apesar dobarulho dos tiros, zunindo a cada pgina ealojando-se em seu tmpano, dormiu.
No dia seguinte, acordou sendo lambidopelo sol spero e continuou sua saga.
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Eram feitos um para o outro.
Ela muda. Ele cego.
Ela muda. Ele surdo.
Cansada de mudar sem ser vista ououvida, ela fez um enorme discurso de despedida.
Ele mudo.
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O mercado de trabalho continuaexecutando crimes perfeitos. Sequestra as almas epede em troca, como forma de resgate, as foras docorpo.
E as vtimas s percebem tarde que denada vale uma alma torturada, repleta de medos,somada a um corpo calejado, exausto.
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Contrariado, Francisco matou Jos detiro; E antes do sangue secar, Severino matouFrancisco na faca. Por vingana, Chiquinho matouSeverino a golpe de enxada. Traioeiro, Zico
colocou uma cobra na cama de Chiquinho.Traioeira, a cobra mordeu Zico tambm.S sobraram as comadres, que sentaram
varanda, agulhas mo, e comentaram comdesdm:
Esses homens...
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Quando Ele apareceu, perguntando quem que havia comido do fruto proibido, todosficaram desesperados. Ado, que no havia sequerse aproximado da rvore, no pensou duas vezes,
apontou o dedo acusador para Eva e disse quehavia sido ela.Os pssaros at hoje assobiam, fazendo-se
de desentendidos.
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Seria uma ofensa chamar o cu de azulnaquele momento. Era uma mistura de rosa,laranja, amarelo e azul.
Sem aviso, veio o vento gelado que varre
todo final de tarde, garantindo que esteja tudolimpo quando a noite chegar.O sol, com frio, foi embora; E levou com
ele todas as nuvens, para cobrir-se at a aurora.
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Ela chegou chorando, nervosa. Oferecimeu ombro, ela aceitou. Ofereceu-me a boca, euaceitei.
No sei se por consolo ou por vingana
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Ele d gritos agudos ao meu ouvido. Logodepois, me empurra com toda fora; E, em seguida,atira gros de areia em meus olhos. Tudo para queeu volte para casa.
O vento fica muito nervoso quando, pormais que ele avise, as pessoas insistem emenfrentar as tempestades.
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Nasceu para serViveu para terE morreu, sem nem ver
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Todas as coisas e ideias tendiam para aesquerda. Depois, inclinaram-se um bom tantopara a direita. Ento, rolaram para o centro e porali ficaram, no equilbrio frgil de uma mesa de
boteco. O lcool e a poltica tm efeitossemelhantes.
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Regou o tmulo por dias, at secarem osolhos, vermelhos e speros.
Uns dizem que foi por compaixo.
Outros sussurram que foi por culpa
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Passei na casa dos meus avs para umavisita rpida. Inocncia minha achar queconseguiria sair de l antes do jantar; Comosempre, minha av convenceu-me a ficar. Segundo
ela, estava preparando uma comidinha especial e,alm disso, eu andava muito magro, muito branco,precisando comer bem. Decidi ficar.
Enquanto ela terminava os preparativos,sentei sala com meu av para ver o jornal. Ele,esparramado na velha poltrona de couro, apsduas ou trs notcias, comentou:
Bons os tempos em que s se roubavamcoraes.
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H um casal problemtico que passeiaentre minhas ideias. No conseguem viver juntospor muito tempo.
Se o lcool entra, a poesia logo sai
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Desde o casamento, acostumou-se a sertratada como uma rainha - indo para ondequisesse, quando quisesse. Quase todos os desejoslhe eram atendidos, com exceo dos que revelava
apenas entre quatro paredes. No entanto, devidos regalias, as dificuldades do marido pouco lheincomodavam at aquela tarde chuvosa.
Ao arrumar as gavetas, para evitar que osvelhos pijamas embolorassem, encontrou as cartase bilhetes. Descobriu, naquele momento, que ele sse interessava pelas outras rainhas.
Tomada por ira, desgovernada, deixou-selevar pelo primeiro peo que cruzou pela casa.
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na minha vida!
Est me chamando de coisa?
Voc a melhor coisa que j aconteceu
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Durante a noite, na praia, viu as luzes dosbarcos em alto mar, isolados. Pensou em quotriste seria viver dessa maneira, passar o dia nomar, trabalhando, e noite virar um pontinho em
meio a outros pontinhos perdidos na escurido.No caminho de volta para a cidade,reparou nos pontinhos, todos empilhados, mas,ainda assim, isolados.
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Sem ter uma casa para levar desaforo,armou o barraco
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Sente o vazio no fundo do travesseiro.Revira-se e estica os braos em busca daquelapresena; Uma esperana, nada alm disso. Pormais que se deparasse com outro corpo, no seria
aquele. Nunca mais foi.Depois daquela noite, a cama semprepareceu vazia.
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Ao final do vero, as cigarras invadem acidade. Chegam queimadas pelo sol, trocando depele.
As formigas, trabalhadoras, da cidade
nunca saem. Para elas, o inverno uma ameaaconstante.
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Bebo para dormirE, quem sabe, um dia no acordar
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Engana-se quem pensa que, algum dia, elearrependeu-se.
Morreu sorrindo aquele cnico; Sabia quea mdia, a seu servio, na terra ou no inferno, o
transformaria em heri.
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O sorriso de hiena desfez-se. Embrenhou-se pelos cantos da parede, como se andasse pelorodap. Curvou-se para olhar pela quina da porta,confirmou que a outra se afastava e, ento, disse:
Eu no falei? Essa vagabunda, falsa,nunca me enganou.
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A lua, deitada no cu, sorri um sorrisominguado.
Ela sabe que, por estas ruas enevoadas,durante a madrugada, encontrar apenas os
bbados e os loucos.
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Na desforra, at ouso blasfemar; Mas, nodesespero, rezo fervorosamente.
Quando estou para baixo, ter um santo
ajuda
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Por dentro, explodia um no. Mas o nicosom que se ouviu foi o daquela voz, suave e sofrida:
Aceito.E prosseguiram com a cerimnia.
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Costumava dizer que estava apenasexperimentando, abrindo portas.
Algum tempo depois, entre tantas portas,j no sabia mais por qual sair.
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Como todo dia, na pia, o ritual ps-sacrifcio acontecia: limpar as peles, cortar emfils, tiras ou cubos, temperar e cozinhar. Naqueledia em especial, na tbua de madeira, jazia uma
galinha caipira, com o pescoo torcido e aindamantendo algumas penas.O garoto, curioso, aproximou-se da
cozinha e observou, com um pouco de nojo, a memanuseando aquele bicho. Ela arrancando penas,cortando a cabea e tirando as peles. Quandoreparou que o garoto estava ali, ele aproveitou
para perguntar: Me, o que isso? Franguinho, filho! Ento... isso que franguinho?
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No pas da impunidade, faz-se exceo lei do silncio, a nica respeitada e temida.
Quem cala contente; E os que ousamdesafiar a lei, arruaceiros, sofrem as punies
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Depois de um dia cansativo, dando suor esangue no trabalho, ele sentou-se sua poltrona,no meio da sala. O filho surgiu correndo pelocorredor, saltou sobre ele e lhe deu um abrao
apertado. J sem foras, retribuiu com um beijo norosto e disse para o garoto que se sentasse no chopara que pudesse prestar ateno no jornal.
Aps uma notcia, o garoto ficou curioso eperguntou:
Como que as vacas ficaram loucas? Elas foram alimentadas com rao que
continha carne de vaca e um monte de produtosqumicos, da elas ficaram doentes eenlouqueceram.
Ento as vacas que se alimentaram devacas so chamadas de vacas loucas?
Sim. Isso mesmo. E como que so chamadas as pessoas
que se alimentam de pessoas?Aps pensar um pouco, no seu dia e noestado em que se encontrava, ele respondeu:
Chefe, meu filho. Ns chamamos dechefe.
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Fez um casulo e virou lagarta... Ah! Que pena. ... Acontece.
Mas no se preocupe, tem muitaborboleta no ar
E a borboleta?
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Ela foi at o quartinho dos fundos; Em umcanto escuro e empoeirado, encontrou o velhoba. Levou-o at a sala e comeou a redescobrirtudo que estava guardado h anos.
Tinha ali um sorriso sincero, que j estavaum pouco amarelado pela falta de uso. Haviatambm uma poro de otimismos infantis, que -apesar de serem infantis - eram pelo menos dezvezes maiores do que os adultos. Tambm brincouum pouco com os sonhos, fantasias e iluses.Encontrou at alguns medos, mas algumas peas
tinham sumido com o tempo.O velho ba rendeu bons momentos, mas,ao final da tarde, ela recolheu tudo do cho, fechouo ba e colocou-o de volta naquele canto escuro. Osorriso, amarelado, acabou esquecido - debaixo dotapete.
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Depois de muito tempo, descobriu-se que,na verdade, os responsveis pelas pinturas nascavernas no foram os homens, mas sim osantlopes, mamutes, tigres e gnus. Cada espcie
havia feito suas pinturas em homenagem a seusmortos durante as batalhas do dia a dia. Somenteaps terem encontrado estes registros que oshomens comearam a fazer os seus tambm.
Atualmente, os homens so os nicos amanter registros alm das marcas no corpo e naalma. Os outros animais no tm dvida de que
ainda demoraremos a perceber que melhor viverdo que recordar.
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Vaga vagarosamente divagando,revirando o vcuo, vivendo o vazio, envelhecendodevagar e levando a vida em vo
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Nenhum dos dois conseguia se envolver,desenvolver confiana, intimidade, cumplicidade,esses detalhes que sustentam um relacionamento.Sabiam que era coisa de uma noite, uma semana,
com sorte, um ms.No entanto, estavam decididos a tentar,vestir as mscaras e ver at onde a mentira oslevaria; E levou longe, at que a morte os separou.
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O advogado alegou legtima defesa; E ojuiz absolveu o comandante e mais 11 rus de todasas acusaes: homicdio, agresso e uso abusivo defora.
Mais um caso de legtima defesa, emdefesa da ordem social.
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Cabisbaixos, ambos, ele e o canrio. Elesentou-se na varanda, abaixo da gaiola, e comeoua assobiar, lenta e tristemente.
O canrio, que at ento nunca havia
sequer piado, respondeu com um canto rpido ealegre. Ele ento sorriu, como nunca havia sorrido.No se sabe at hoje quem ensinou quem.
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O amor chega de fininhoMas, por mais que chegue em silncio,
desperta curiosidadesE acorda tambm os medos, que tm o
sono ainda mais leve, paranicos
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A sala era divida em quatro blocos, que,por sua vez, eram divididos em quatro cubculos.Apenas a sala do chefe, separada da outra, tinhajanelas - que de nada adiantavam, uma vez que no
se abriam e que eram cobertas por uma pelculaescura. Aqueles tantos cbiculos estavam todosocupados, com exceo de um: discutiu com ochefe e pediu demisso, no aguentava mais.
Dizem que foi porque um dia teve quesair um pouco mais cedo, para levar o filho aodentista, e, s ento, depois de anos, reparou que o
mundo no era cinza como na hora em que saia decasa ou na hora em que voltava.No dia seguinte, com um sorriso
reluzente, comentou com os colegas: O mundo amarelo!
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Sempre se deu bem com nmeros:somando investimentos, fazia as cifras semultiplicarem.
Em relao aos outros, subtraa; Nunca
aprendeu a dividir.
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Vestiu o terno da indiferena, os culosescuros do desprezo e subiu o vidro daintolerncia.
Aps realizar o ritual dirio, rumou pelo
meio daquela gente, que ele sempre desdenhou,para onde aquela mesma gente, que pagava seusalrio, o colocou.
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s vezes tenho l meus desentendi-mentos com o mundo. Ficamos brigados, ambosemburrados e em silncio. Ontem mesmo tivemosuma briga feia; O mundo pode ser bem cruel de vez
em quando.Mas ao final da tarde, uma borboletapousou ao meu lado na rede. Chegou, observou-mee ali ficou, batendo asas como se danasse. Aceiteias desculpas imediatamente, sem pensar duasvezes.
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Desde aquele dia, virei um fantasma, umasombra - um vulto
Aquele reflexo no espelho, no qual vocno se reconheceu, aquele era eu
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Acendia fogueiras, despretensiosa,apenas para v-las arderem, estalarem econsumirem-se.
Quando sentiu frio, desamparada, j no
tinha mais ningum para servir de lenha.
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Mal sabia que seu trabalho fazia dignosapenas aqueles que colhiam os frutos de seuesforo.
Sdico e bem treinado, agradecia de bom
grado todo resto que lhe era dado
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aparecer.
Que triste isso... No triste no. Triste quando ela no
vem.
Eu passo o dia todo esperando ela
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Puxou o ar, para espairar, e soltoulentamente. Sentiu como se h muito tempo notivesse respirado, inspirado.
Dissipou a neblina que lhe cobriu o
mundo e deu um passo atrs. Dali, aliviado, olhoupara a prpria vida e esboou um sorriso no cantoda boca.
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Em alguns momentos, a sorte sorri paramim.
Mas, no momento seguinte, emburrada,franze o cenho, faz bico e me d as costas.
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Haviam comeado o namoro h poucotempo. Sorrisos, bicos, charmes e birras; Apelidosfofos e juras de amor.
Foi quando ele escreveu a carta de
despedida, com a certeza de que a entregaria embreve. Sabia at os motivos da separao, tinhatudo anotado, explicado, em palavras friamenteselecionadas.
Nunca teve a chance de entreg-la.
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Vivem vidas de condenados os quedormem o sono dos inocentes
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Ao pararem em um semforo, ao lado deuma carroa puxada por um burro, o garoto ficouobservando o animal, questionou-se por algunsmomentos e decidiu perguntar:
Vov, qual o nome desse negcio quetapa a viso dos burros?Sem nem ter visto o burro, o av
respondeu, com preciso: Preconceito, meu querido. Preconceito.
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A vida por aqui anda meio conto, nada depoesia.
Mas, pelo menos, no est crnica.
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Os opostos se atraem; E se enganamMas suas aes, sinceras, os traem
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Quando chegava ao quarto cambaleando,sentia-se como um voluntrio do atirador de facas;Enquanto a cama girava, ele ficava inerte, incapazde desviar das acusaes.
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Deito em minha cama e milhares depequenos demnios infestam-me as ideias, otravesseiro e o canto escuro do quarto.
Ando cautelosamente at o som, ligo-o e
volto para a cama; Com a msica, ao menos, elesdanam.
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Os donos do mundo sabem que o petrleoderivou-se de animais e vegetao soterrados
Pensando no futuro, matam, desmatam eencobrem
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Cantarolando, colheu do cho uma florcheia de ptalas. Delicadamente, retirando ptalapor ptala, comeou a falar, entre sorrisos esuspiros:
Bem me quer... Bem me quer! Bem mequer... Bem me quer!Um amigo um tanto sem sal, e
totalmente sem acar, interrompeu: No! No assim!Ao que ele respondeu: Voc s diz isso porque voc no
conhece ela!E continuou sorrindo.
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Em uma metrpole qualquer. Debaixo deuma chuva fina, mas to fina que se tornava quaseinvisvel, caminhavam lado a lado, de mos dadas,o garotinho e a me. A me ia andando com pressa,
sem dar ateno ao filho, arrastando-o pela mo.Quando eles pararam em um cruza-mento, esperando o sinal abrir, o garotinho girou opescoo e reparou no mundo sua volta: nascentenas de pessoas apressadas, nas plantas,pssaros, prdios e tudo o mais. Aps uma breveanlise, por sinal muito precisa, ele virou-se para a
me e perguntou: Mame, se os passarinhos so coloridos,as plantas so coloridas, os prdios so coloridos eat mesmo a comida colorida... Por que que aspessoas so assim, cinza?
E ele ficou olhando, esperando por umaresposta. Enquanto o rosto da me, por vergonha,
passou de cinza para rosa.
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Dinheiro faz o mundo girarAt ficar tonto e cair
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Explicou ao filho as coisas da vida e dotempo. Para facilitar, usou o relgio de exemplo:
Aquele o tempo, passando. Ele fica dando voltas?
Nem sempre, s vezes passa correndo enunca mais volta, por isso precisamos correr atrsdo tempo.
No dia seguinte, aps observar o relgiopor horas, enquanto o pai corria de um lado para ooutro, o garoto retrucou:
Voc disse que a gente tem que correr
atrs do tempo; Mas ele tem uma perna bem maiorque a outra, nem consegue correr. A gente quetem que andar com mais calma, para no deixar elepara trs.
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E quando ela vai embora voc fica com
um buraco, vazio. No que eu fique vazio, eu guardo
espao para quando ela voltar.
Eu preencho meus dias com ela.
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Naquela noite que se fez outro dia, a luaestava to cheia, de si prpria, que mesmo depoisde o sol ter se aprumado, ostentoso, ela aindadesviava a ateno de muitos desavisados.
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O povo das sombras aparece sempre nomesmo horrio, junto com as sombras, assim que osol nasce. Sempre muito cedo, ainda na madru-gada, mas, aparentemente, sem nenhuma ajuda de
qualquer deus.Preparam seu caf antes de voc acordar,limpam o escritrio antes de voc chegar, colocamo nibus para rodar antes de voc se aglomerar aocongestionamento... Ligam os motores e preparama cidade para voc s chegar e sentar na janelinha,exigindo servio de bordo.
E voc nem ao menos os enxerga, fazquesto de desviar o olhar.
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O golpe ditatorial teve, no exrcito, seubrao armado
E na imprensa, o desalmado
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A noite de estreia um espetculo,mgico, incomparvel.
As noites seguintes j no tm o mesmoencanto. Os sorrisos j no so mais os mesmos.
Algum tempo depois, ela junta as tralhase toma outros rumos, paixo itinerante.
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Desde que o tempo tempo, as pessoasdesejam ter a capacidade de enxergar atravs dasoutras. Sensaes, sentimentos e os maisprofundos pensamentos. E a essa capacidade, deu-
se o nome de compreenso.Nos tempos atuais, caminhando pela rua,percebe-se que as pessoas tm a capacidade deenxergar atravs das outras; A essa capacidade, d-se o nome de indiferena.
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Antes de espatifar-se no cho, j eranovamente um milionrio.
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Era viciada em reunies de annimosNa esperana de ser notada, ia a todas.
Dos narcticos aos workaholics, passando poralcoolistas, comedores compulsivos e mulheres
que amam demais.Tudo que ela queria era deixar de serannima
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Ia sempre em direo contrria ao fluxo.Sabia que nunca ia ter carona; Mas sabia,
tambm, que sempre haveria algum para andarao lado
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Rendo-me a esta situao deplorvel,entrego-me a este sujeito desprezvel, deixo-melevar como cadela afvel
E vendo-me, no espelho, ajeito batom e
rmel.
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Acordou no nibus; No sabia para ondeestava indo, no fazia ideia.
Olhou em volta, apenas indiferena.Comeou a ficar incomodado com a situao.
Queria perguntar para algum sobre o destino,mas tinha vergonha. Tentou olhar pela janela, masestava no corredor e a senhora ao seu lado dormia,com as cortinas fechadas.
Depois de certo transtorno, resignou-secom a situao. Nunca achou que fosse chegar alugar algum. Algum lugar - qualquer que fosse - j
seria longe.
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Os papis, cheios de suas palavras vazias,saltavam da escrivaninha e fugiam para o corredor
A caneta escapava dos dedos, caia ao choe rolava para baixo da cama
A cada cochilo, uma revolta
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http://bit.ly/e-book_ColchadeRetalhos
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Estes retalhos foram reunidos pela primeira vez em 2008, paraparticipar do Prmio SESC; E ficaram entre os finalistas.
Em 2010, aps um ou outro remendo - e contando com o desgasteque tende a tornar melhores tanto as colchas quanto as toalhas
de banho, enviei esta obra para o Prmio Utopia; Desta vez, aoconquistar a primeira colocao, estes retalhos garantiram osmeios para estarem aqui reunidos e costurados.
Em 2012 o livro foi novamente reconhecido, desta vez pela UnioBrasileira de Escritores, com a terceira colocao no ConcursoInternacional promovido pela instituio.
Quando menina, meus sonhos eram aquecidos por uma velhacolcha de retalhos coloridos. Hoje, mulher feita, essa depalavras costurados pelo Rodrigo que me emociona HENRIETTEEFFENBERGER, escritora
Narrativas que lembram em um instante do que feita a boaliteratura DANIEL RUSSELL RIBAS, editor e jornalista