Transcript
Page 1: Cultura - Lei Rouanet, arte e mecenato

8 | CADERNO DEZ! | SALVADOR, TERÇA-FEIRA, 11/11/2008

NA REAL ❚ Após 18 anos, a Lei Rouanet continua como base para produção nacional e é reavaliada pelo MinC

Mecenato para consumidor ver

MARC DUMAS | DIVULGAÇÃO

Incentivos federaispagam o longa baianoTrampolim do Forte

MIRELA PORTUGALm p o r t u g a l @ g r u p o a t a rd e . c o m . b r

Enrolado no malabarismo derecursos entre pão e circo, o Estadobrasileiro demorou até entender oseu papel na cultura. Mesmo acriação do Ministério da Cultura(MinC), em 1985, acalentado comouma resposta à ausência estrutural,não trouxe no bojo a discussão depolíticas culturais. Só entre 85 e 94,10 ministros se sucederam nocargo em gestões inconsistentes.

As leis de incentivo fiscal foramuma mudança de rota. A LeiRouanet, criada em 1991, permiteque parte do imposto de renda daempresa seja aplicado em projetosculturais. Segundo o MinC, 290 milempresas já foram beneficiárias daRouanet. Só em 2007, elamovimentou um bilhão de reais –40% saídos direto dos cofres deestatais.

Hoje, com 18 anos de vigência,a lei volta à mira da discussãocultural. O substituto de Gilberto

Gil no MinC, Juca Ferreira,promete guiar uma reforma embusca de modernização. O novoministro chamou de “aperitivo“ aportaria emitida uma semana apóssua posse, em setembro, quesimplifica o cadastro de projetos.Ou seja, mais propostas e nomesna corrida. O próximo alvo é aincorporação da lei a um projetomais amplo de fomento, dentro doPlano Nacional de Cultura (PNC),ainda em discussão.

A revisão é bem vinda para oprofessor da Universidade Federalda Bahia, Albino Rubim,coordenador do Centro de EstudosMultidisciplinares em Cultura. “Émuito estranho, convenhamos,uma lógica de financiamentoprivado que não traz recursos deempresas necessariamente”.

O pesquisador condenatambém a isenção total deimpostos concedido às empresas.“Um incentivo não prever aentrada de nenhum dinheiroprivado é um daqueles absurdos

direto ao consumidor. Se não, nãose fará uma produção cultural"sustentável", e continuará com asua "insustentabilidade" garantidapelo Estado“.

Ele acredita que o foco deveriaser no acesso aos os bens culturais.”O consumidor de cultura, hoje,no Brasil, é um consumidordoméstico, como provam os dadosdo IPEA [55% dos gastos comcultura são domiciliares, enquanto41%, vão para espetáculos, filmese similares]. Prefere um DVD, umCD, um livro. A questão, meparece, é levar esses bens à eles“.

Solange Farkas, diretora doMuseu de Arte Moderna [MAM],defende que é preciso questionarquais são os setores beneficiadospela lei. Grandes shows e atoresconhecidos estão um passo àfrente, e a decisão sobre osinvestimentos, nas mãos dosdepartamentos de marketing.”Não se investe em videoarte, emnovas linguagens, em artistastalentosos, mas iniciantes“.

que só acontecem no Brasil”.Segundo Rubim, em outros países,por exemplo, quanto maior é aisenção, menor é o poder daempresa para decidir sobre o queapoiar, e o recurso privado vai paraum fundo de apoio à cultura.

MARKETING – Para o sociólogoCarlos Alberto Dória, autor do livro

Os Federais da Cultura, o discursoreestruturador de Juca Ferreiratem mais de protagonismo que dereforma. “Isso é tentado desde oinício do governo Lula, paramostrar que o tom do governo eradiferente dos tucanos. Agora, eleparece querer nos convencer queestamos diante de uma novaorientação política pós Gil”.

Mexer na lei, segundo oescritor, significa primeiroultrapassar o lobby das empresasque concentram os recursos,nomeadas beneméritas da culturasem, às vezes, gastar nenhumcentavo. “O fato é que essegoverno nunca conseguiu mexerna Lei Rouanet porque osinteresses cristalizados em tornodela se tornaram ‘imexíveis‘.“

Dória explica que a saída idealseria contornar o grande defeitoda Rouanet – a questão dasustentabilidade. ”A lei entronizoua visão da cultura como produção,não como consumo. Um país tãopobre poderia ter um incentivo

*A documentação e o cadastrodos projetos já foramalterados. Mais mudançasvirão caso o Plano Nacional deCultura (PNC) seja aprovado.

Top Related