4 | FUGAS | Público | Sábado 2 Junho 2012
CapaPorto
O lado B do Porto
A “história e autenticidade” convivem com a “cidade mais cosmopolita e contemporânea”. Adivinham-lhe uma “inquietude cultural”. Roteiro indie para a cidade que vai receber os festivaleiros Primavera no próximo fi m-de-semana. Andreia Marques Pereira (texto) e Nelson Garrido ( fotos)
H á
uma contra-revolução em curso no
centro do Porto e na cidade muitos
falam nela com tristeza. Há pou-
cos anos, ninguém imaginaria que
poderia vir a existir um “manual”
autárquico de Medidas de actuação e utilização da Baixa da cidade do Porto, porque a Baixa se insufl ava
de vida durante o dia para a ver es-
vair-se à medida que o sol se punha.
João Pedro Coimbra, compositor e
letrista dos Mesa, recorda-se bem
desses tempos, quando tinha estú-
dio na Rua de Cândido dos Reis e
“não se via ninguém na rua à noite”.
Agora já lá andam e isso “é muito
gratifi cante — e ver que foram as
pessoas que o fi zeram é algo a que
dou muito valor”.
O “agora” da Baixa do Porto é,
diz, “um atractivo mundial”. “Os
estrangeiros vêm cá e fi cam doidos”
— a noite é interminável, bebem-se
copos na rua… O “agora”, que pro-
vocou o surgimento do “manual”,
existe porque, entretanto, uma re-
volução aconteceu, ou se calhar uma
série de pequenas revoluções, que
transfi guraram quarteirões mais ou
menos decrépitos em símbolos de
uma certa contemporaneidade do
Porto e nova imagem da cidade — a
mesma que chegou às páginas de jor-
nais insuspeitos, como o New York
Times, mostrando o Porto como uma
cidade cool, harmonização exacta
entre a história e a modernidade.
Foram os bares que chegaram, pri-
meiro pé ante pé, agora em sprint, foi a base da low-cost Ryanair no ae-
roporto Sá Carneiro que aproximou
mais a cidade da Europa, foram as
lojas, foram os restaurantes, foram
os hostels… Não todos na mesma me-
dida, claro, mas a movida instalou-se
na Baixa portuense e poucos a que-
rem ver sair.
Mas muitos já o prevêem, à boleia
destas tais “medidas de actuação e
utilização da Baixa” que restrin-
gem horários, limitam potência
sonora, proíbem venda ambulante
e fecham algumas ruas ao trânsito.
“Não me admirava que a Baixa do
Porto recuasse uns anos”, admite
Nelson Pedrosa, na varanda do seu
Era Uma Vez no Porto, bar a mirar
a Torre dos Clérigos, o ícone por-
tuense que emprestou o nome a
este olho de furacão. Muito pouco
espiritual, a congregação de ba-
res e movida que agora gravita em
torno da igreja e torre construídas
por Nicolau Nasoni no século XVIII
e que se tornou sinónimo invo-
luntário de um Porto cool, eleito o
“melhor destino europeu de 2012”
pela European Consumers Choice.
“Com a sua variedade de ofertas,
o Porto conquista todos os seus visi-
tantes”, lê-se na (curta) declaração
do organismo, “desde os que o pro-
curam pela sua história e autentici-
dade, como os que buscam explorar
uma nova cidade, mais cosmopolita
e contemporânea”. Do topo dos 75
metros de altura da Torre dos Clé-
rigos, a cidade estende-se em 360
graus: a poente encontra-se com o
Atlântico e é na sua orla que o Festi-
val Primavera Sound vai assentar na
próxima semana. Aquele que é dos
principais eventos de música alterna-
tiva na Europa sai pela primeira vez
de Barcelona e viaja até ao Parque
da Cidade do Porto, com interlúdios
pela Casa da Música e Hard Club.
O motivo da escolha do Porto? As
“muitas características comuns com
Barcelona” e a “inquietude cultural”,
justifi cou Gabi Ruiz, o director do
festival catalão, na altura do anúncio.
Pretexto, portanto, para desvendar
um pouco dessa “inquietude” que
vai trazer ao Porto uma média de
25 mil visitantes por dia entre 7 e 10
de Junho. E que mistura, voltamos a
citar o European Consumers Choice,
“o famoso Vinho do Porto, um cen-
tro histórico distinguido como Patri-
mónio Mundial da Humanidade pela
UNESCO, museus, parques e jardins
encantadores, boutiques de desig-
ners nacionais e internacionais…”
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conta desta rua, muito para além
dos bares, e esse é o elemento que
continua a distingui-la, para o bem
e para o mal. Na paralela Cândido
dos Reis a rua está mais “controla-
da” em esplanadas bem defi nidas.
Por enquanto. “É mais virada para
o interior, mas o seu crescimento pa-
rece potenciar estar na rua, em con-
vívio.” Quem o diz é Joel Azevedo,
que, com dois sócios, é responsável
pelo novíssimo maomaria, wine bar
e happy bar, com clara devoção pela
música indie, que no início de todo
este movimento, quando os Clérigos
eram apenas um enclave da noite
portuense (não “a” noite portuense),
era uma espécie de credo professado
pela maioria dos espaços.
Elisa Bessa aprecia a diferença
deste novo bar. “Acho que estão a
abrir sítios sem a preocupação de ser
bonitos, confortáveis”, considera,
“estes assim não são apenas para be-
ber fi nos”. Elisa conhece bem a nova
Baixa porque é aqui que trabalha.
“Durante o dia há cada vez mais tu-
ristas e cada vez menos portuenses.”
Os bares, analisa, até estão a puxar
novamente pela zona — os copos de
fi m de tarde começam até a ter se-
guidores entre os portuenses.
E até onde é que isso pode ir? Car-
Porto XXNeste início de noite nas esplanadas
da Praça Filipa de Lencastre o por-
tuguês está claramente em minoria.
Uma babel rodeia-nos. “Sabe tão
bem”, afi rma Paula Faria. “Antiga-
mente”, diz Gisela Duarte, “os turis-
tas no Porto eram pessoal mais velho
e [vinham] sobretudo no Verão. Ago-
ra estamos invadidos por mochilei-
ros todo o ano”. E esta é uma das
zonas onde eles mais se concentram
— à noite, principalmente. Faz tudo
parte da “Baixa-Clérigos” que já tem
subdivisões: aqui, em “Filipa de Len-
castre” ou “Ceuta”, como lhe cha-
mam as amigas (do histórico café),
a “idade sobe um pouco, há alguma
sofi sticação, que a arquitectura tam-
bém proporciona”, consideram as
portuenses Paula e Gisela. “Muito
confortável”, resumem, sobretudo
enquanto as multidões compactas
não tornam difícil a movimentação,
e com “boa música” e “diferente” em
todos os bares.
O termo de comparação é quase
sempre a Rua das Galerias de Paris
de onde houve movida nos Clérigos
(movida ecléctica, aliás, onde o mais
despretensioso transeunte pode cru-
zar-se com trajes de noite, smoking
incluído). As multidões tomaram
O Candelabro (à esquerda), na Rua da Conceição, é um espaço de reunião durante praticamente todo o dia. À direita, o passeio fronteiro ao mar, na Foz.
la Costa não sabe, mas tem a cer-
teza de que não vai fi car por aqui.
Da sua Lemon Pie, loja de roupa e
acessórios na Rua das Oliveiras, tem
observado a dinâmica da zona e vai
enumerando os encerramentos: as
Galerias Lumière, um alfarrabista,
outro alfarrabista, a loja de costura, a
sex shop. Tudo em meio ano, calcula,
depois de um período de aparente
boom. “A tendência é piorar”, diz,
prevendo que rapidamente a sua rua
seja só de bares — “só se os senhorios
baterem o pé, como o meu”.
Já há alguns bares na rua, mas
quase todos instalados há bastante
tempo, um hostel que abriu na porta
ao lado e outro que se prepara para
abrir um pouco acima; o bar 77, per-
to, aparece certifi cado como o que
mais “minis” vende em Portugal.
Carla Costa vende roupa Surkana e
Pepa Loves, por exemplo, mas são
as sapatilhas Victoria (que podem
ser personalizadas) a grande ânco-
ra da loja, que atrai mais turistas do
que portugueses. Em Junho, haverá
vários eventos promocionais e fes-
tas (“sempre fomos conhecidos por
elas”), uma forma de fazer frente à
vizinha Rua da Cedofeita, que “se
transformou em outlet” e torna mui-
to difícil a sobrevivência do negó-
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cio. “Se estivéssemos no Aviz ou
mesmo em Santa Catarina…”.
Santa Catarina é a rua mais co-
mercial do Porto e há décadas al-
berga um dos cafés mais bonitos
do mundo — o Majestic. Porém, há
poucas surpresas na rua, composta
por cadeias internacionais ou esta-
belecimento tradicionais que, como
é comum na cidade, fecham ao do-
mingo. Porfírios era o nome da sua
loja mais alternativa nos anos 1990
— agora é a Ekstra, dos fi lhos dos
ex-proprietários da Porfírios e com
uma oferta que agrada a vários tribos
urbanas: dos rockabilly aos góticos
e punks, descreve Luísa Araújo. Há
uma certa infl uência das “Harajuku
girls” e qualquer uma pode sair da-
qui como pin up (com um pendor
gótico, reconheça-se).
Uns números acima, na esquina
com a Rua de 31 de Janeiro — o Tea-
tro Nacional São João a espreitar, o
antigo cinema Batalha a decair e a
Igreja de Santo Ildefonso a brilhar
em azulejos — a alternativa não é tão
radical, mas é eminentemente ur-
bana. A Taken Urban.Culture.Store
é o paradigma do Porto cosmopoli-
ta: edifício centenário (em restau-
ro exterior e magnífi cos tectos) e
conteúdo contemporâneo. Marcas
como a Fred Perry (colecção Amy
Winhouse em abundância), Skunk
Funk, Carhartt, Insight, entre outras,
compõem uma oferta respeitável em
roupa, acessórios, sapatilhas (e há
um canto de skate).
Porto SpiritualizedJá recebeu o epíteto de “Soho por-
tuense” e agora a Rua de Miguel
Bombarda é o centro do chamado
“quarteirão das artes”, com tentá-
culos por ruas vizinhas. Pintura,
escultura, instalações enchem ga-
lerias que se sucedem quase sem
descanso, e um inesperado centro
comercial. Dizem-no “alternativo” e
o certo é que as lojas que se encon-
tram no Centro Comercial Bombarda
(CCB) são edição única. Há roupa de
jovens designers, artesanato urba-
no, mobiliário de autor, produtos
gourmet (portugueses e não só) e
vintage, merchandising pop, jardim
com esplanada…
A Ó! Galeria é a “montra” do CCB
e a ilustração a sua religião. Tem
espaço expositivo, ao fundo, onde
encontramos mostra de Rita Was-
ted, incluindo uma intervenção na
parede “Fuck you, world, I’m out”
(e quem o diz “é” Amy Winehou-
se); e espaço de venda. Grande
parte do acervo dos 40 artistas da
galeria está em capas, outro cobre
paredes, “em constante transfor-
mação”, uma “forma de dinamizar
a galeria”, declara Ema Ribeiro, a
responsável. Uma parte, pequena,
vai viajar até ao Primavera Sound na
próxima semana, onde vai dividir es-
paço com a vizinha Águas Furtadas.
“Vamos levar mais merchandising”,
revela Ema, “que os autores estão
a produzir agora”. T-shirts, sacos,
postais, cadernos, zines, pins, por-
tanto, e “provavelmente uma capa
com trabalhos mais acessíveis”. No
CCB, as portas mantêm-se abertas,
até porque o próximo sábado é dia
de inaugurações simultâneas, que
é como quem diz, é dia de festa na
Rua de Miguel Bombarda. “É um dia
fantástico”, considera Ema, “não pe-
las vendas, mas porque as pessoas
voltam”. Galerias, lojas, bares, restauran-
tes unem-se para proporcionar uma
experiência única que vale pelo mo-
vimento que gera. Uma oportunida-
de para uma espécie de operação
de relações públicas, como confi r-
ma Ricardo Rodrigues, na Coisas
d’Homem, acabada de sair do fundo
do labiríntico CCB para uma nova
loja nas margens do jardim, onde os
Crianças brincam na rua, conversa--se janela-a-janela e no São João ainda se saltam fogueiras. “Os vizinhos são muito coloridos, dão a cara”
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seus “clássicos com um twist [algo
como british chic, atrevemo-nos]
ganham nova visibilidade”. Ricardo
e Carlos Carneiro, o designer, não
querem “que os homens tenham
uma imagem aborrecida” e o seu
contributo passa por uma marca
própria de acessórios, a CDH, “em
padrões e tecidos pouco usuais” a
complementar oferta de etiquetas
como Ben Sherman e Dr. Denim.
“Quando andávamos à procura de
espaço, queríamos algo alternativo,
Bombarda foi como uma luz ao fun-
do do túnel”, lembra Ricardo. “Esta
zona acabou por ajudar a defi nir o
projecto. Aqui sentimos liberdade
de ir um bocadinho mais longe.”
Porque, justifi ca, aqui “as pessoas
não têm medo de ser elas próprias,
correm riscos”.
Se calhar por isso mesmo tantos
jovens criadores têm encontrado
aqui um porto seguro, mais pro-
priamente na Rua do Rosário, que
cruza a Miguel Bombarda. Em nome
próprio ou em projectos colectivos
— como o Muuda, o Artes em Partes
ou o Cru, espaços multidisciplina-
res —, a rua acolhe novos talentos
e valores reconhecidos da moda
portuguesa. Entre eles Mariana
da Fonseca, que passou por Paris
e regressou para criar a sua Punch
Couture, numa esquina redonda
abrindo à curiosidade da rua a sua
colecção, feita de peças únicas e li-
mitadas. Totalmente made in Portu-
gal, inclui desde os “básicos” twin-sets aos vestidos, em cores neutras
ou em explosões calorosas. Veio
“pelo ambiente criativo, artístico”
e sente “essa imersão”. Sobretudo
em dia de inaugurações simultâne-
as, quando aproveita para promo-
ver eventos: no próximo sábado, o
“Flowers Punch” vai dar música e
fl ores a quem passar.
No outro extremo da rua, o que ca-
minha para o Museu Soares dos Reis,
a Oliva & Co, “da e para a oliveira”,
também correu riscos. Quando se
instalou estava praticamente sozi-
nha, agora juntaram-se-lhe vizinhos
com artesanato urbano e design.
“Somos o novo eixo e isso sente-se
e ressente-se”, admite Helena Ferrei-
ra, uma das sócias, “mas como diz
uma colega, se Bombarda tem muita
vida é porque alguém a criou”. Por
isso, arregaçam-se as mangas para
atrair o público até este canto, que
até tem “uma melhor qualidade de
espaço público”. A Oliva & Co faz a
sua parte com as suas degustações
de azeite (acompanhado por outros
produtos, de conservas a sabonetes,
passando por bombons) e, em bre-
ve, com uma carta de petiscos — os
sábados são eleitos para provas de
vários produtos derivados, incluin-
do chás.
Porto, The RaptureMas a tradição ainda é o que era, por
paragens portuenses, se bem que se
possa revestir de formas diferentes:
o vinho do Porto pode já não ser o
motivo principal de atracção, porém
ainda dá mote a visitas. Como a de
Mark Tachovsky que está na Merce-
aria das Flores a ver garrafas, depois
de ter passado pelas caves de Gaia.
Vem de Vancôver (Canadá), onde es-
tuda vinhos, e já leva muito Portugal
na bagagem — culpa da namorada,
Jessica Hollander, sobrenome que
esconde as origens portuguesas.
Ela busca as suas raízes e, afi nal,
os doces que espreita também são
parte delas. Iam a passar, à procura
de “coisas artesanais, portuguesas”
e acabaram nesta mercearia, visu-
al retro a servir produtos regionais,
os de sempre e os gourmet, a servir
turistas e moradores, aqui na Rua
das Flores, encravada em plena
zona histórica, a ligar os Aliados à
Ribeira. Gostam de vinho e de co-
mida; gostam deste tipo de lojas, “é
melhor do que ver as toalhas junto
do rio”.
A mercearia aterrou aqui tam-
bém para ser janela do que se faz
(e come, sobretudo) em Portugal e
para usufruir do roteiro turístico que
cruza a rua, mas acabando por ter
“algum ambiente de bairro”, conta
Joana Osswald, uma das “joanas” da
mercearia — a outra é a sócia, Joana
Nos armários com portas de rede
alinham-se ainda vinhos e licores,
arroz e compotas biológicas, azeites
e azeitonas, batatas fritas transmon-
tanas e Sovina, a cerveja artesanal
feita no Porto, um best-seller. Aqui
também se servem refeições leves
(dos aperitivos, saladas e pratinhos
de conserva, às tostas, sandes doces,
lanches), acompanhadas de bebidas
quentes e frias, cervejas e vinho a
copo, todo o dia — hoje há provas:
queijo dos Açores e Moscatel de Se-
túbal. “Fechamos às 19h durante a
semana e às 20h ao fi m-de-semana”,
explica, “porque a partir dessa hora
a rua morre um bocadinho”. Descem
apenas os turistas para a Ribeira,
para jantar.
Oliveira. Há “estudantes e jovens”
que vivem perto e até da Rua Escura,
na encosta da Sé, do outro lado da
Rua de Mouzinho da Silveira — o eixo
que divide (informalmente) a zona
histórica cortando o emaranhado de
ruelas numa grande via que une a
Estação de S. Bento à Ribeira—, vem
gente vem gente em busca do pão,
da broa de Avintes, das azeitonas…
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Seguimos esses passos até lá,
passando o Palácio das Artes, o
Mercado Ferreira Borges converti-
do em Hard Club, sempre em ferro
vermelho ocre a olhar o Infante D.
Henrique que aponta na direcção
do mar. A casa onde nasceu está
mais abaixo, já no dédalo da Ribei-
ra, onde poucos bares sobrevivem
mas onde os restaurantes resistem
e os wine bars começam a surgir,
quase todos a olhar o rio, para as
caves do vinho do Porto que à noi-
te são luzes de néon. É o coração
turístico do Porto, esta Ribeira pos-
tal ilustrado vista do outro lado do
Douro, escura, estreita e labiríntica
em contacto directo, povoada de
escadinhas e pracetas inespera-
das onde a vida segue à margem
do movimento turístico, lojas de
artesanato e souvenirs. Porém, ao
contrário do que os turistas cana-
dianos viram, entre aquelas onde
abundam os atoalhados e cachecóis
da selecção, nasceram projectos em
que o nome Porto equivale a design.
A Take Away Porto é paradigmática:
o conceito é apresentar artistas por-
tuenses a trabalhar sobre o Porto,
em declinações que passam pela
pintura, artesanato, decoração, edi-
ção. Inclui uma galeria no primeiro
andar e no rés-do-chão tanto se en-
contram peças de Siza Vieira como
t-shirts, sacos e postais de autor.
Em alguma destas lojas que pulu-
lam na zona histórica à beira-água
se calhar encontrar-se-ão t-shirts “I
(heart) Opo”. E neste contexto tal-
vez não se coloque a dúvida quanto
ao “Opo”, diminutivo de Oporto.
Mas foi esse desconhecimento que
levou Ana Luandina a uma espécie
de epifania. Daí até ao Miss’Opo
(ou, deveríamos dizer, “a”) foi o
passo de um projecto de café-bar
e guest house, que se materializou
entre a Rua dos Caldeireiros e a
Rua de Trás — literalmente, uma
porta em cada uma das ruas —, em
pleno bairro típico e à sombra dos
Clérigos. Crianças brincam na rua,
conversa-se janela-a-janela e no São
João ainda se saltam fogueiras. “Os
vizinhos são muito coloridos, dão a
cara”, diz Ana.
As máquinas fotográfi cas viram-
se para a Capela de Nossa Senhora
da Silva, frontaria clara marcada
por oratório no primeiro andar e
devotos insuspeitos a deixar, en-
tre gritos de discussão, esmola na
caixa; os rostos espreitam ao lado,
pelas janelas do Miss’Opo, versão
bar-restaurante. O que vêem são
mesas de várias formas, cadeiras
desirmanadas, sofás, armários retro
com livros, panos de renda, jarros
de fl ores e vasos de plantas: uma
turista pede “aquela cerveja”, que
é a Sovina; outros pedem para ver
o espaço soltando “It’s beautiful”. A
curiosidade é tanta que se fazem vi-
sitas guiadas, refere Paula Lopes, a
outra sócia, incluindo à casa de hós-
pedes (t0 e t2): “As pessoas olham,
entram e fi cam… maravilhadas. Di-
zem que não se sentem no Porto”.
Berlim é comparação habitual.
Em breve haverá aqui “Trocas
por Arte” ( Julho, esperam) e o tu-
rismo cultural é uma aposta. Por en-
quanto, servem-se refeições (mais
ou menos) ligeiras — menu de pe-
tiscos a giz na parede — e jantares
quase de improviso, o que signifi ca
sem menu fi xo, ao sabor das idas ao
supermercado. “Como se fosse um
jantar de amigos”, afi rmam.
Seguindo rua acima, chega-se ao
Centro Português de Fotografi a — a
antiga Cadeia da Relação onde Ca-
milo Castelo Branco esteve encar-
cerado e onde uma exposição apre-
senta até fi nal de Junho As mulheres de Camilo — e pelos interstícios dos
edifícios repletos de roupa a secar e
antenas parabólicas espreita-se a sé,
que surge na colina em frente, para
além do mar de telhados de toda a
zona histórica do Porto.
Porto Beach HouseHá uma imponência cansada na
velha catedral portuense, erigida
nos séculos XII e XIII sobranceira
ao rio. A ponte de Luís I, ali ao lado,
continua a unir as duas margens, o
tabuleiro superior agora reservado
ao metro, o inferior continua a per-
correr o caminho para as caves do
vinho do Porto. Pelo morro da Sé
em ruelas até à Ribeira, da Ribeira
até à Foz em marginal que corre
com o rio para o mar mas entra em
devaneios quando se encontra com
as palmeiras do Jardim do Passeio
Alegre.
Por estes dias é na sua órbita que
o restaurante Sol em Sol espera es-
tar a aproveitar a benevolência do
astro-rei. Neste restaurante nóma-
da, que encontrámos em Maio no
Parque da Cidade, cozinha-se em fo-
gões solares e assume-se o compro-
misso “com uma restauração mais
sustentável”, explica José Pedro,
o cozinheiro. Cada mês tem uma
localização diferente na cidade,
em Agosto vai em “digressão” pelo
país, prometendo uma cozinha com
ingredientes nacionais, “incluindo
frutas e legumes biológicos”. De-
pendendo das benesses naturais,
a ementa é diferente a cada dia —
“Vivemos muito do improviso”, as-
sume José Pedro — mas há sempre
petiscos depois do almoço, “para
rentabilizar a hora solar”.
Quando a Foz olha o mar de
frente são quilómetros de passeio
pontuado de esplanadas raramen-
te vistas da rua, estão um “andar”
abaixo, quase com os pés na areia;
quando a Foz se vira para dentro
descobre-se o emaranhado da Foz
Velha, antigo povoado piscatório, e
os quarteirões da “nova” Foz, aber-
A Rua das Galerias de Paris é um dos centros de animação nocturna do Porto. Já a Mercearia das Flores, na rua com o mesmo nome, trouxe valor acrescentado a um eixo da cidade que beneficiava já de algum movimento turístico.
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manente evolução, de acordo com
o feedback dos clientes. Foi por eles
que o horário foi alterado — passan-
do a servir-se jantares e a abrir ao
domingo —; foi por eles que surgiu
a ideia do brunch que acontece ao
fi m-de-semana e feriados. É nestes
dias que público é mais imprevisí-
vel nestes lados da cidade, e que,
curiosamente, inclui turistas, sobre-
tudo, sublinha João Pedro, os “da
arquitectura”, ou não estivéssemos
em “território Siza”, com o Museu
de Serralves a pouca distância, por
exemplo, e, a algumas centenas de
metros na avenida, o Edifício Vo-
dafone, dos arquitectos Barbosa e
Guimarães, já atraía olhares antes
de ganhar prémios. O “diamante”
chamado Casa da Música, que é in-
contornável em qualquer roteiro,
arquitectónico ou não, também está
na avenida, mas onde ela principia,
na rotunda.
Ao fundo da avenida da Boavista,
o Castelo do Queijo divide o norte
e o sul das praias portuenses. Para
norte fi ca também o Parque da Ci-
dade que só termina no areal, ao
lado do Edifício Transparente: es-
planadas no rés-da-praia, de cafés,
restaurantes e bar; lojas nos outros
pisos, que já viram maior ocupação.
E praia que já vê banhistas. É sem-
pre uma alternativa no Porto, cida-
de à beira-rio e à beira-mar.
tos geometricamente. O comércio
local mistura-se com lojas de autor
— uma das mais recentes, a de Luís
Buchinho, virada para o Forte de
São João da Foz (também conhecido
como Castelo da Foz, construção
militar quinhentista), não muito
longe o atelier de Anabela Baldaque,
e, mudando a bitola, as especialida-
des bretãs da La Bombarde, crepes
e galettes à cabeça, acompanhados
pela sidra Kerné.
O Parque da Cidade já se avista
deste cantinho paralelo à Avenida
da Boavista conhecido por Aviz, gra-
ças ao edifício com o mesmo nome
que alberga escritórios, lojas, resi-
dências. E Aviz é sinónimo de luxo
e exclusividade: tem a fama de ter
as melhores lojas da cidade, com
marcas internacionais de prestígio.
É aqui que o restaurante Sensível
dá os primeiros passos, oferecendo
todas as refeições do ciclo diário.
Espaço irrepreensivelmente mo-
derno, enclausurado em vidro por
todos os lados menos um, para o
projecto da arquitecta Anabela
Rodrigues e do músico João Pedro
Coimbra, que inclui uma pequena
secção gourmet. À mesa, a oferta é
“diferente”, concebida (e cozinha-
da) pela própria Anabela: “Nunca
gostei de comida enfadonha.”
As tapas constituem uma boa por-
ção da carta, uma entidade em per-
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10 | FUGAS | Público | Sábado 2 Junho 2012
CapaRoteiro do Porto
O epicentro da noite portuense é a Baixa que, na verdade, parece actuar como uma força centrípeta – de bares e de gente numa relação de causa-efeito que não se sabe bem onde começa. Mas há sobreviventes fora desta órbita e pioneiros desbravando novos territórios na cidade. Deixamos pistas.
BARESEra uma Vez no PortoRua das Carmelitas, 162 (Baixa-Clérigos)Facebook: Era uma vez no Porto
Café Au LaitRua Galeria de Paris, 46 (Baixa-Clérigos)www.facebook.com/aulait.cafe
Casa do LóTravessa de Cedofeita, 20 (Baixa-Clérigos)
PherrugemTravessa de Cedofeita (Baixa-Clérigos)http://facebook.com/pherrugembarporto
maomariaRua de Cândido dos Reis, 84 (Baixa-Clérigos)Facebook: maomaria
CandelabroRua da Conceição, 3 (Baixa-Clérigos)http://cafecandelabro.com
O Meu Mercedes é Maior Que oTeuRua Lada, 20 (Ribeira)www.omeumercedes.com
BonaparteAvenida do Brasil, 130 (Foz)www.bonaparteporto.pt
WINE BARSAssociação de Associação dos Viticultores-Engarrafadores dos Vinhos do Porto e DouroRua Fonte Taurina, 89 (Ribeira)www.avepod.org
RAMALDE
ALDOAR
MATOSINHOS
VILA NOVA DE GAIA
NEVOGILDE
LORDELODO OURO MASSARELOS
CE
Serralves
Parque daCidade
Av. da Boavista
Via Cintu
Av. Assoc. Empresarial de Portugal
Av. de Montevideu
Palácio de Cristal
Circunvalação
A1
Rio Douro
R. Bo
FOZ DO DOURO
BOAVISTA
Solar do Vinho do PortoRua de Entre Quintas, 220 (Massarelos, ao Palácio de Cristal)www.ivdp.pt
La Bohème entre AmisRua da Galeria de Paris, 40 (Baixa-Clérigos)www.laboheme.com.pt
CLUBESPlano BRua de Cândido dos Reis, 30www.planobporto.com
Tendinha dos ClérigosRua Conde de Vizela (Baixa-Clérigos)
RádioPraça Filipa de Lencastre, 178 (Baixa-Clérigos)http://radio167.blogspot.pt
Armazém do CháRua de José Falcão, 180 (Baixa-Clérigos)http://armazemdocha.blogspot.pt
É impossível não notar a proliferação de alojamento pela cidade. Aos hotéis clássicos juntaram-se uma mão cheia de outros, alguns de referência internacional, as guest houses são abundantes, oferecendo, muitas vezes, propostas modernas em arquitectura centenária, os apartamentos de férias estão por todo o lado. Porém, é no segmento dos hostels que a oferta parece crescer de forma mais visível e com qualidade cada vez mais reconhecida.
Tattva Design Hostel Rua do Cativo, 22-28 (Batalha-Sé)www.tattvadesignhostel.com
Miss’Opo Guest HouseRua de Trás, 49 (Baixa-Clérigos)www.missopo.com
Hotel B&B Porto Praça da Batalha, 32 (Batalha)www.bbhotels.pt
Belomonte 20Rua do Belomente, 20 (Ribeira)www.belomonte20.com
A FavoritaRua Miguel Bombarda, 267www.pensaofavorita.pt
Carla Costa, da Lemon Pie, refere que para se conseguir sobreviver comercialmente no Porto, fora dos centros comerciais, é necessário “investir numa marca ou recurso diferente”. E a verdade é que a originalidade tem marcado muitas das propostas comerciais na cidade. Da Manufaktura e a sua oferta de produtos cosméticos à base de cerveja (entre outros) à Passadopresente com o seu vintage sentimental passando pela Mezzanine, com marcas como a Insight, Love Therapy e Iron Fist, há algo que se pode contar em quase todas: espaços trendy e originais.
ROUPAMezzanine Store Rua Cândido dos Reis 53, Porto (Baixa-Clérigos)www.mezzaninestore.com
Taken Urban.Culture.Store Rua Santa Catarina 1 (Baixa)http://takenstore.com
Lemon Pie ShopRua das Oliveiras 59 (Baixa-Clérigos)http://lemonpieshop.com
Punch CoutureRua do Rosário, 253 (Miguel Bombarda)www.punchcouture.com
Luís BuchinhoRua José Falcão, 122 (Baixa-Clérigos)Esplanada do Castelo, 113 (Foz)www.luisbuchinho.pt
EkstraRua de Santa Catarina, 45 (Baixa)www.facebook.com/ekstra.porto
GOURMET/PETISCOSMercearia das FloresRua das Flores, 110, Porto (Ribeira)http://merceariadasflores.com
Oliva&CoRua Professor Jaime Rios de Sousa, nº 3 (à Rua do Rosário) (Miguel Bombarda)www.facebook.com/OlivaeCo
OUTROSManufakturaRua das Flores, 213-221 (Ribeira)www.manufaktura.com.pt
PassadopresenteRua Sacadura Cabral nº 20 (Cedofeita)www.lojapassadopresente.blogspot.com
A juntar às tripas lendárias e ao não menos histórico bacalhau à Gomes de Sá, o Porto tem actualmente na francesinha um novo símbolo culinário. Uma espécie de parente pobre da família, já que tanto no que respeita ao apuro gastronómico como aos produtos utilizados, em nada se pode comparar com a riqueza daqueles cozinhados. Mas que é popular e está na moda, lá isso é verdade! A ponto de figurar como “especialidade” na generalidade dos cafés e snack-bares. A cidade tem uma tradição bem arreigada de casas de comida farta e franca, onde a qualidade anda sempre de par com o cuidado e a atenção ao cliente. Com as mudanças na animação e na vida cultural, chegou também um fervilhar de novidades no sector gastronómico, com o mote a ser dado pelos espaços de tendência gourmet e contemporânea. A oferta é hoje rica e variada, e a par das casas tradicionais multiplicam-se também os espaços com propostas de pendor mais cosmopolita contempâneo e a preços contidos.
SensívelRua Pedro Homem de Melo, 142ª (Boavista-Foz)www.facebook.com/SensivelPorto
SAIR
DORMIR
COMPRAS
COMER
FUGAS | Público | Sábado 2 Junho 2012 | 11
GAIA
CEDOFEITA
BONFIM
PARANHOS
CAMPANHÃSTO.ILDEFONSO
Cintura Interna
Estádio Circunvalação
Pontedo Freixo
Av. dosAliados
R. MiguelBombarda
AA
RIBEIRASé
CLÉRIGOS
Tea PointLargo de São Domingos, 78Tel. 220 934 077; 916 405 116; 919 054 921Cozinha: Contemporâneawww.facebook.com/pages/TEA-Point
Adega São NicolauRua S. Nicolau, 1 (Ribeira)Tel. 222 008 232Cozinha: Tradicional
Restaurante O BuracoRua do Bolhão 95 (Baixa) Tel. 222 006 717Cozinha: Tradicionalwww.facebook.com/pages/Restaurante-O-Buraco/
Sol em SolRestaurante itinerantewww.solemsol.com
Katsu Sushi BarRua Comércio do Porto 197 (Ribeira)Tel. 938 334 479Cozinha: Japonesa
Restaurante O ErnestoRua da Picaria, 85Tel. 222 002 600Cozinha: Tradicionalwww.oernesto.com
Taberna do BonjardimRua do Bonjardim, 450 (Baixa)Tel. 222 013 560Cozinha: Comtemporânea de base regional
Restaurante Zé BotaTravessa do Carmo 16 4050-000 Porto (Baixa) Tel. 222 054 697; 918 807 154Cozinha: Tradicionalwww.zebota.com.pt
PETISCOSComer fora de horas é algo que se tem vindo a democratizar no Porto. Os petiscos, as tapas como prefiram chamar, estão a entrar na rotina da cidade – a meio da tarde e noite fora.
Museu dos PresuntosRua do Padre Luís Cabral, 1070 (Foz)
Museu d’AvóTravessa da Cedofeita, 54-56 (Baixa-Clérigos)http://www.facebook.com/museudavo
DOCESCupies GourmetTravessa da Senhora da Luz, 2 (Foz)www.cupiesgourmet.com
Leitaria da Quinta do PaçoPraça Guilherme Gomes Fernandes, 47 (Baixa – Clérigos)Facebook: Leitaria da Quinta do Paço
Creperia La Bombarde Rua de Gondarém 239 (Foz)http://creperialabombarde.wordpress.com
Louie LouieRua do Almada, 275 (Baixa-Clérigos)www.louielouie.biz
Porto CallingRua da Conceição, 80, loja 2 (Baixa-Clérigos)www.facebook.com/#!/portocalling
Livraria LelloRua das Carmelitas, 144 (Baixa-Clérigos)http://lelloprologolivreiro.com.sapo.pt
PoetriaRua das Oliveiras, 70 r/c, loja 12 (Baixa-Clérigos)www.livrariapoetria.com
TimTim por Timtim (BD)Rua da Conceição, 27 (Baixa-Clérigos)http://timtimportimtim.com.sapo.pt
Mercado Porto BeloPraça Carlos Alberto (Baixa-Clérigos)(sábados à tarde)www.facebook.com/mercadoportobelo
Feira da Vandoma Alameda das Fontainhas (sábados de manhã)
Artes em Partes (Miguel Bombarda)Rua do Rosário 274http://artesempartes.net
Muuda Rua do Rosário 294 Miguel Bombarda)www.muuda.com
Bicicletas (aluguer)Vieguini ScootersRua Nova da Alfândega, 7 www.vieguini.com
Centro Comercial BombardaRua de Miguel Bombarda 285 Portohttp://ccbombarda.blogspot.pt
MÚSICA
FEIRAS
LIVRARIAS
VÁRIOS--EM-UM