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AVALIAÇÃO DAS PATOLOGIAS CAUSADAS PELO DESLIZAMENTO DE MASSA EM UMA OBRA DO AGRESTE PERNAMBUCANO

F. R. BARBOSA L. S. BATISTA G. I. R. MELO Prof. Eng.º Civil Prof. Eng.º Civil Estudante Eng.º Civil FAVIP FAVIP FAVIP Pernambuco; Brasil Pernambuco; Brasil Pernambuco; Brasil [email protected] [email protected] [email protected]

RESUMO A industria da construção civil tem um grande desafio em aliar os riscos inerentes ao desenvolvimento de aspectos voltados para o atendimento das necessidades do mercado à segurança e durabilidade das estruturas, numa tentativa de garantir aos usuários não apenas o conforto na utilização, mas principalmente a ausência de problemas patológicos futuros. Dentre as principais causas de problemas patológicos que podem ser observadas em construções, destacam-se os estudos e projetos incompletos ou falhos e os erros nos procedimentos executivos dos serviços. Embora não haja um consenso entre os autores que tratam do tema, um fato inconteste é que estes dois aspectos respondem por mais de 50% dos problemas patológicos observados na atualidade. Este trabalho procura contribuir com o tema em questão apresentando um estudo de caso em uma obra no agreste pernambucano, onde a observância de fissuras, trincas e rachaduras provocou uma investigação no intuito de se identificar as causas das patologias observadas, resultando na descoberta de que o principal motivo reside na ocorrência de um movimento de massa provocando recalques diferenciais nas fundações da edificação. As investigações demonstraram ainda que este movimento surge em função de um projeto deficiente de contenção e de equívocos na sua implantação. Neste sentido, são apresentados detalhadamente quais os principais condicionantes que contribuíram para o problema e as terapias empregadas para recuperação. 1. INTRODUÇÃO A indústria da construção civil vem se defrontando com um grande paradigma a ser vencido na atualidade quando de um lado depara-se com um mercado sempre ávido por soluções inovadoras ou requerendo a ocupação de áreas exclusivas e de outro lado surge em contraponto a avaliação técnica dos empreendimentos, numa tentativa de equilibrar o aspecto inovador com requisitos como segurança e durabilidade para as estruturas e com isso garantir aos usuários não apenas o conforto na utilização, mas principalmente a ausência de problemas patológicos futuros. Os problemas patológicos aparecem nas edificações em decorrência de diversos fatores, fato que é perfeitamente compreensível, principalmente quando se considera a diversidade de materiais e técnicas utilizadas, somadas à diversidade das características dos canteiros de obras e os múltiplos usos que podem ser atribuídos a estas edificações [1]. Ademais, torna-se relevante pontuar que as análises de sistemas já amplamente difundidos na indústria da construção possibilitam uma boa avaliação de seu desempenho futuro, por outro lado, a utilização de sistemas arrojados ou inovadores traz sempre implícita um dose de risco quanto ao desempenho dos materiais e técnicas utilizadas [2].

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Neste sentido, a busca pela ausência de patologias nas construções passa por um incremento na qualidade dos produtos e processos ligados à indústria da construção e sua busca tem perpassado pelas mais diversas áreas, como planejamento, projeto e execução [3]. Em que pese todo o esforço desenvolvido pela comunidade técnica e científica, a identificação de manifestações patológicas em edificações ainda é muito frequente [4]. Dentre as principais causas de problemas patológicos que podem ser observadas em construções, destacam-se os estudos e projetos incompletos ou falhos e os erros nos procedimentos executivos dos serviços. Embora não haja um consenso entre os autores que tratam do tema, um fato inconteste é que estes dois aspectos respondem por mais de 50% dos problemas patológicos observados na atualidade [2, 5]. Particular interesse pode ser atribuído aos problemas patológicos relacionados à falhas de desempenho das fundações, uma vez que podem ser responsáveis por danos significativos às edificações, inclusive inviabilizando sua utilização. Milititsky, Consoli & Schnaid apontam como fatores intervenientes no comportamento das fundações não apenas os estudos, projetos e técnicas de implantação, mas destaca ainda a ação de acontecimentos pós implantação, incluindo sua possível degradação [6]. No rol das patologias associadas a problemas em fundações, torna-se relevante considerar aquelas decorrentes de recalques diferenciais provocados por grandes movimentos de massa de solo. Oliveira cita que os processos que envolvem estes movimentos de massa podem ter uma origem natural ou serem induzidos por interferências do homem no ambiente e acrescenta que o avanço das diversas formas de ocupação do solo em áreas naturalmente susceptíveis aos movimentos de massa acelera e amplia os processos de instabilização. Este autor ainda destaca algumas interferências antrópicas que se caracterizam como potenciais indutoras dos movimentos de massa, quais sejam: remoção de cobertura vegetal; execução de cortes e aterros inadequados; saturação do solo por meio do lançamento e concentração de águas pluviais e servidas; vazamentos na rede de abastecimento e esgoto; presença de fossas; lançamento de lixo nas encostas e taludes; e cultivo inadequado do solo, entre outros [7]. Segundo Velloso & Lopes [8], os efeitos dos recalques nas estruturas podem ser classificados em 3 grupos: danos estruturais (aqueles causados à estrutura propriamente dita - pilares, vigas e lajes), danos arquitetônicos (aqueles causados à estética da construção, tais como fissuras, trincas em paredes e acabamentos, rupturas de painéis de vidro ou mármore) e danos funcionais (que compreendem aqueles causados à utilização da estrutura com refluxo ou ruptura de esgotos e galerias, emperramento das portas e janelas e desgaste excessivo de elevadores em decorrência de desaprumo da estrutura). Diante da relevância do tema em pauta, o presente trabalho procura apresentar um estudo de caso, onde a movimentação de massa no solo provocou diversos problemas patológicos a uma edificação, detalhando a anamnese realizada, os resultados desta investigação e as principais técnicas corretivas apontadas para solução do problema. 2. ESTUDO DE CASO 2.1 Histórico dos problemas Em julho de 2013, o município de Garanhuns, interior do estado de Pernambuco, recebeu uma UPAE (Unidade Pernambucana de Atenção Especializada) destinada a promover atendimento médico-hospitalar para a população da região. Embora no momento da inauguração, a obra estivesse em perfeito estado e pronta para seu funcionamento, antes de completarem 6 (seis) meses da data da inauguração (dezembro de 2013), a administração da unidade observou a presença de diversas fissuras espalhadas entre pisos, paredes e forros da edificação. Inicialmente cogitou-se tratar de simples acomodação do terreno, tendo em vista as condições climáticas da região no período de entrega da obra (estação chuvosa) agravadas por uma condição especial ocorrida em meados de dezembro (zona de convergência do Atlântico Sul) provocando uma precipitação de cerca de 45 mm em apenas 24 horas. Segundo a Agência Pernambucana de Água e Clima (APAC) todo o estado sofreu este efeito, registrando neste período um volume de precipitação em apenas 6 horas, equivalente a 97% do volume esperado para todo o mês de dezembro. Ocorre que as patologias observadas não estabilizaram, passando de fissuras a trincas e rachaduras, comprometendo não apenas a estética do ambiente hospitalar, mas também a segurança da edificação. Importante destacar que algumas áreas apresentavam os sinais de deterioração mais acentuados que as demais, além disso, era possível observar que a propagação dos danos parecia ocorrer com maior intensidade também. Em todos os casos, tais áreas localizavam-se

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próximas aos taludes executados durante o movimento de terra realizado para implantação do empreendimento, levando a crer que o principal motivo poderia residir na ocorrência de um movimento de massa provocando recalques diferenciais na fundação da edificação. A partir deste ponto, diversas investigações foram realizadas, abordando desde o projeto concebido para o empreendimento até a metodologia executiva empregada e os materiais utilizados na implantação do empreendimento. Tais avaliações seguem apresentadas, sendo precedidas pela apresentação das características gerais do ambiente e do empreendimento, a fim de se estabelecer a importância da obra em estudo e ainda dos projetos elaborados. 2.2 Características do empreendimento em análise A UPAE em estudo está localizada no município de Garanhuns, interior do Estado Pernambuco, distante cerca de 230 km da capital pernambucana, Recife. A referida obra situa-se mais precisamente as margens da BR 423, nas proximidades do km 92 e tem como proprietário a Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco. A Figura 1 apresenta um detalhe da localização do empreendimento. O município de Garanhuns está localizado a 896 m acima do nível do mar, ocupa uma área aproximada de 458,55 km2, dos quais apenas 7,11 km2 formam o perímetro urbano; além disso, possui uma população de aproximadamente 136.057 habitantes, o que o qualifica como o nono maior município de Pernambuco e o terceiro maior do interior do estado. Importante destacar ainda que caracteriza-se como uma cidade polo para 32 municípios adjacentes, sendo um importante centro regional de saúde e educação.

Figura 1: Localização do empreendimento em estudo – (a) posição do município de Garanhuns em relação à capital

pernambucana e (b) situação do empreendimento em relação à BR 423. A unidade objeto do estudo representa a primeira do seu segmento a ser inaugurada no interior do estado e tem como finalidade precípua suprir a demanda da saúde de cerca de 500 mil pessoas em 21 municípios da região. 2.3 Inspeção realizada Diante dos problemas identificados em dezembro de 2013, a administração da UPAE requisitou uma inspeção técnica a fim de se identificar os possíveis riscos a que a unidade encontrava-se exposta, bem como um entendimento das prováveis causas e das terapias que poderiam ser aplicadas para promover a devida recuperação. As figuras 2 a 5 apresentam os diversos detalhes observados durante a inspeção realizada.

Figura 2: Fissuras observadas nas fachadas da edificação– (a) detalhe da entrada da fachada oeste, (b) fissura na

platimbanda – fachada oeste, (c) detalhe da fachada norte e (d) aspecto da fissura próxima a esquadria – fachada norte.

a b

a b d c

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a b d c

Figura 3: Aspectos internos às edificações – (a) detalhe da entrada da fachada oeste, (b) fissura na platimbanda –

fachada oeste, (c) detalhe da fachada norte e (d) aspecto da fissura próxima a esquadria – fachada norte.

a b c d

Figura 4: Movimento observado no talude executado – (a) detalhe da abertura próximo do guarda corpo, (b) detalhe da abertura entre o radier e o talude, (c) detalhe da abertura entre o radier e o talude e (d) detalhe de movimento no corpo

do talude – provavelmente em decorrência de problemas na execução do aterro.

Figura 5: Detalhes do carreamento de material do aterro com areia observado sob a laje radier ao longo de toda a lateral

direita da edificação – adjacente ao muro de arrimo executado.

Os efeitos observados apontavam para problemas oriundos de movimentação de massa no solo. Há que se destacar o importante carreamento de material na lateral direita da edificação, pois em alguns pontos o material carreado provocou a exposição do radier a um balanço com mais de 3,4 m de comprimento (Figura 5). A partir destas observações e ainda considerando as particularidades da execução da obra, diante do grande volume de aterro executado, partiu-se para uma avaliação dos projetos executivos e análise das técnicas empregadas na construção a fim de comprovar as suspeitas e entender as causas das patologias observadas.

2.4 Apresentação dos elementos dos projetos executivos Para o desenvolvimento do objeto apresentado no item 2.2, o projeto executivo previu a construção de três blocos (A, B e C), sendo o bloco A aquele destinado as principais atividades da unidade e os bloco B e C representam anexos de utilidades e serviços. Desta forma o bloco A abriga todas as áreas de contato com o público no pavimento térreo, e as áreas de administração nos dois pavimentos superiores. O bloco B abriga a lanchonete e a parte destinada a manutenção da mesma e o bloco C abriga a central de gás, a lixeira, o gerador e a subestação. Com esta configuração, a edificação caracteriza-se como uma construção predominantemente horizontal, possuindo cerca de 4.004 m² de área construída, inserida em um terreno com aproximadamente 11.451 m². A Figura 6a ilustra a distribuição dos blocos. O terreno onde encontra-se inserida a edificação caracteriza-se por um solo de base silto argilosa com pequenos pedregulhos mediamente compactados, mas com um desnível de mais de 10 m em relação ao nível do acesso pela BR

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423 e em função desta característica necessitou de significativo movimento de terra para acomodar a obra, tendo sido necessário promover cortes diversos e um aterro de aproximadamente 52.700 m³, executado em dois diferentes níveis. O nível 1 ou principal foi executado até que o maciço alcançasse o mesmo nível da rua que passa em frente ao terreno (estabelecido aqui como cota 0,00 m ou cota de referência) e neste nível ocorreu a implantação dos blocos A e B. O nível 2 ou secundário foi executado na cota – 10,20 m e destinou-se à implantação do bloco C e do estacionamento. A contenção do aterro executado foi realizada através da implantação de muros de arrimo escalonados atuando por gravidade e executados em pedra rachão argamassada. O posicionamento e detalhe dos muros pode ser evidenciado na Figura 6b. Importante destacar que nos projetos dos muros de arrimo não se evidencia qualquer preocupação com sistemas de drenagem entre o maciço e os muros.

(a) (b)

Figura 6: Configuração do Empreendimento em Estudo – (a) detalhe do posicionamento dos blocos e contenções executadas e (b) detalhe da estrutura padrão de contenção utilizada.

A infraestrutura dos blocos A, B e C é constituída de uma laje tipo radier executada em concreto armado e com espessura de 12 cm, sobre a qual encontra-se posicionada um viga de bordo em concreto armado (seção de 16 x 59 cm) e sobre esta viga foi executada uma nova laje com espessura de 7 cm, destinada ao contrapiso dos blocos. O espaço entre as duas lajes foi preenchido por aterro com areia. Além disso, para a base dos pilares foi prevista a execução de um bloco de concreto armado apoiado sobre o radier. O concreto utilizado para a infraestrutura possui fck de 30 MPa. Importante destacar que o espaço entre as duas lajes também recebe toda a instalação dos blocos. A figura 7 apresenta um detalhe da estrutura de fundação executada.

Figura 7: Detalhe da estrutura de fundação empregada

As paredes das fachadas são de blocos cerâmicos estruturais nas dimensões 14x19x29 cm executados até uma altura de 3,60 m. Sobre estas paredes corre um bloco cerâmico tipo calha nas dimensões 19x19x29 cm, preenchido com concreto armado e acima desta calha foi executada uma platimbanda em alvenaria de 1 vez com tijolos cerâmicos de 8 furos, sobre a qual segue nova fiada de bloco cerâmico tipo calha também preenchido com concreto armado. No interior das unidades foi executada alvenaria de vedação em tijolos cerâmicos de 8 furos com 3 m de altura. Sobre todas as alvenarias foi aplicado revestimento argamassado (argamassa mista de cimento, cal e areia). Para estrutura de coberta, foram empregadas duas soluções: estrutura metálica de coberta e laje treliçada com espessura de 13 cm. Os blocos B e C utilizaram laje treliçada e sobre ela telhas de alumínio trapezoidal. No bloco A, foi empregada laje treliçada apenas na área da administração da unidade (laje impermeabilizada com manta asfáltica) e nas demais áreas optou-se pela estrutura metálica e sobre esta a utilização de telhas termoacústicas. Para captação das águas pluviais foi empregado sistema de calhas e rufos metálicos, descarregando em dutos de PVC, os quais interligam-se ao sistema de drenagem da área externa do empreendimento.

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A área externa conta com um sistema de pavimentação em blocos intertravados de concreto e nas áreas de talude opou-se por manter o solo com uma cobertura vegetal de grama esmeralda. O sistema de drenagem externo é feito por gravidade até uma interligação ao sistema de drenagem público existente. 2.5 Apresentação da metodologia empregada para execução dos serviços Considerando as observações provenientes da vistoria realizada e as particularidades dos projetos executivos, buscou-se avaliar os procedimentos construtivos que envolveram as etapas de serviços preliminares e mais particularmente o movimento de terra e execução das fundações. O item de serviços preliminares correu sem registros relevantes. Aponta-se a realização dos serviços de prospecção geotécnica através de sondagens do tipo SPT, que permitiram caracterizar o solo como um silte areno argiloso com pequenos pedregulhos, mediamente compacto de coloração amarela, e dos serviços de levantamento topográfico da área, permitindo mapear adequadamente os desníveis existentes e com isso quantificar as ações de movimento de terra necessárias à implantação. O movimento de terra foi iniciado com serviços de corte para regularização e conformação do terreno, seguido pela execução de aterro para obtenção das cotas do projeto. Durante todo o serviço de terraplenagem foi realizado o controle tecnológico do aterro através dos ensaios previstos em norma para determinação da sua resistência mecânica, compressibilidade e permeabilidade (ensaios de compactação - Proctor, CBR-ISC, expansibilidade, análise granulométrica, limites de liquidez e plasticidade e consequente índice de plasticidade). A execução do aterro contou com material selecionado e compactado mecanicamente em camadas de 20 cm de espessura, conforme previsto na NBR 5681/1980. Esta ação ocorreu entre fevereiro e junho de 2012 e os registros do controle tecnológico realizado indicam que o aterro apresentava uma resistência boa e estabilidade, embora tenham havido paralisações durante a execução em decorrência de chuvas. A compactação mecânica aconteceu em todo o corpo do aterro, exceto nos taludes onde o material ficou solto. A Figura 8 apresenta detalhes da execução do aterro.

a b

Figura 8: Detalhe da execução ao aterro – (a) praça de trabalho e (b) talude lateral

Com os níveis de projeto atingidos foram executados cortes nas laterais do aterro, ao longo de todo o seu comprimento e altura atingindo até um metro abaixo do terreno primitivo, para construção da base do muro de arrimo. As informações coletadas através do controle tecnológico indicam que a área cortada não teve qualquer tipo de escoramento. A face escalonada do muro foi executada de frente para a face do aterro, conforme previsto no projeto estrutural. A Figura 9 apresenta um detalhe dos cortes executados.

a b

Figura 9: Detalhe dos cortes executados no aterro – (a) lateral sentido Lajedo e (b) lateral sentido Águas Belas

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A construção do muro de arrimo foi iniciada de forma concomitante com o corte no aterro e tão logo atingia-se os níveis definidos para as fundações dos blocos, elas foram executadas. Importante registrar que durante a execução dos serviços foi realizada uma modificação no projeto inicial do bloco C, de forma que estabeleceu-se que sua fundação deveria ser embutida no talude dos fundos do aterro, ocasionando um novo corte ao longo de toda a extensão do bloco neste talude, para implantação de mais um muro de arrimo. Os muros de arrimo foram construídos conforme estabelecido no projeto estrutural e o espaço vazio existente entre as faces escalonadas dos muros e o corpo do aterro foi preenchido com areia úmida solta sem compactação mecânica ou manual. Observou-se que não foi executado nenhum dispositivo que permitisse a saída da água utilizada para o adensamento da areia ou mesmo proveniente de infiltração em decorrência de chuvas. A Figura 10 apresenta um detalhe desta configuração. Com as estruturas de contenção construídas e todos os vazios entre os muros e aterro preenchidos, as áreas destinadas aos blocos A e B foram liberadas para construção, pois ambos os blocos tinham partes que ficavam nesse área de transição entre aterro inicial e o muro.

Figura 10: Detalhe do preenchimento dos espaços entre os muros de arrimo e o maciço central do aterro

2.6 Discussão sobre a origem dos problemas patológicos e apresentação das terapias recomendadas A partir da inspeção realizada e das análises acerca dos projetos executivos e da metodologia empregada na implantação da obra foi possível confirmar a suspeita inicial de que se tratavam de patologias em decorrência de movimento de massa no aterro executado. Além disso, foi possível concluir que os problemas observados eram decorrentes de pequenos deslizes identificados tanto na execução dos projetos executivos – fruto da ausência de detalhes construtivos, quanto na própria execução do aterro e das contenções. No que diz respeito ao projeto, um fato que chamou a atenção encontra-se na ausência de qualquer detalhe que indique a necessidade de execução de drenos nos muros de arrimo que possibilitem o escoamento de eventuais fluxos decorrentes de percolação ou infiltração de água no maciço do aterro executado. A ausência do detalhamento não foi percebida durante a execução da obra e com isso, nenhum dispositivo de filtragem e escoamento foi implantado. Outro fato relevante identificado na implantação da obra, encontra-se associado à execução dos muros de arrimo, tendo em vista que após a execução do aterro, foi promovido um corte para implantar os muros de arrimo e os espaços vazios entre o muro e o maciço compactado foram posteriormente preenchidos com areia, onde o adensamento ficou comprometido por não existir a possibilidade de escoar adequadamente a água utilizada para sua compactação. Some-se a isto o fato de que na execução do aterro, os cuidados com a compactação ocorreram apenas no seu corpo principal, deixando os taludes sem qualquer tipo de compactação. Necessário atentar que para estes taludes foi escolhido um tratamento superficial que incluía tão somente a aplicação de grama esmeralda. Com este quadro, a incidência das chuvas provocou sérios danos à estrutura, uma vez que a massa sem compactação cedeu com a redução da coesão, provocando movimentação nos taludes e agravando ainda mais a situação, uma vez que a saturação do maciço apenas aumentava por não ter nenhum dispositivo que lhe facilitasse a drenagem. Além disso, as áreas onde foi executado o aterro com areia também mostraram-se seriamente danificadas, em decorrência da facilidade de carreamento deste material, que em diversos trechos chegou a atingir 3,4 m sob a laje radier executada para fundação.

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A recomendação para terapia da área, passou inicialmente pela recomposição das áreas de talude danificadas, procurando agora melhorar as condições de compactação destas áreas, além de providenciar-se uma impermeabilização da superfície dos taludes através da aplicação de argamassa armada, em decorrência da impossibilidade de se remover todo o material com compactação deficiente para refazer o processo. Além disso, para os vazios sob a laje radier, recomendou-se a aplicação de graute a fim de garantir um perfeito preenchimento dos vazios e com isso possibilitar a recomposição da estabilidade da edificação. 3. CONCLUSÕES Os desafios a que se encontra submetida a indústria da construção civil são muitos e de origens as mais diversas, merecendo destaque àqueles relacionados com a aquisição de áreas adequadas para a implantação dos mais diversos tipos de empreendimentos. Diante deste quadro, torna-se imprescindível a adoção de técnicas que permitam obter o melhor aproveitamento possível das áreas adquiridas, através da utilização de projetos executivos eficientes e metodologias de implantação adequadas à realidade que se apresenta. Ocorre que em muitos casos, a urgência na apresentação das soluções de engenharia vem permitindo que elementos de referência como os detalhes construtivos presentes nos projetos executivos, sejam relegados a um plano secundário para que tais soluções possam ser viabilizadas em obra a partir da experiência dos engenheiros construtores. Entretanto, quando isto não ocorre, seja por deficiência do corpo técnico, desatenção ou negligência, pequenas falhas acabam por se converter em grandes prejuízos através da instauração de patologias que vão além do inconveniente estético, pois muitas vezes comprometem a estabilidade estrutural das edificações e principalmente a sua função em serviço para os usuários. No caso em estudo, soluções simples e de conhecimento do meio técnico e acadêmico, que poderiam ter sido previstas desde a etapa de projeto a um custo quase que irrelevante, acabaram por se converter em problemas estruturais sérios, cuja terapia envolveu grande soma de recursos. Tal situação, que infelizmente não se constitui em um fato isolado, conclama a comunidade técnica e científica a uma reflexão para que os cuidados aparentemente corriqueiros na elaboração de projetos e obras não venham a ser relegados a um plano secundário, sob pena de promovermos um retrocesso no caminha de evolução pelo qual temos nos esforçado para conduzir a indústria da construção civil. 4. REFERÊNCIAS [1] Eldridge, H. J. Common Defects in Buildings. Britannic Majestry’s Sattionery Office. London, 1976. [2] Souza, V. C. M; Ripper. T. Patologia, Recuperação e Reforço de Estruturas de Concreto. São Paulo. Pini,

1998. [3] Fortes, A. S. Vigas de Concreto Armado Reforçadas com Fibras de Carbono. Dissertação apresentada à

Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis, 2000. [4] Silva, E. C; Fortes, A. S. Manifestações Patológicas em Salvador – BA. 7o Congresso Internacional sobre

Patologia e Reabilitação de Estruturas – CINPAR. Fortaleza, 2011. [5] Spehar, J; Lima, J. Identificação de Falhas Geradas pela Falta de Integração dos Projetos da Construção

Civil e seus Impactos. 7o Congresso Internacional sobre Patologia e Reabilitação de Estruturas – CINPAR. Fortaleza, 2011.

[6] Milititsky, J; Consoli, N. C; Schnaid, F. Patologia das Fundações. Editora Oficina de Textos. São Paulo, 2008. [7] Oliveira, L. M. Acidentes Geológicos Urbanos. Produção da Serviço Geológico do Paraná. 1a Edição. Curitiba,

2010. [8] Velloso, D. A; Lopes, F. R. Fundações, critérios de projeto – investigação do subsolo. Edição vol1: Fundações

Superficiais. São Paulo-SP. Oficina dos Textos. 2004.


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