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  • 1. Presidncia da Repblica Secretaria Especial dos Direitos Humanos Coordenadoria Nacional para Integrao da Pessoa Portadorade Deficincia CORDE A Conveno sobre os Direitos dasPessoas com Deficincia Comentada Organizao: Ana Paula Crosara de ResendeFlavia Maria de Paiva Vital BRASLIACORDE 2008

2. Presidncia da RepblicaLuiz Incio Lula da SilvaSecretaria Especial dos Direitos Humanos Paulo de Tarso VannuchiCoordenadoria Nacional para Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior 3. Presidncia da RepblicaSecretaria Especial dos Direitos HumanosCoordenadoria Nacional para Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia - CORDESistema Nacional de Informaes sobre Deficincia - SICORDEEsplanada dos Ministrios , Bloco T, Anexo II, 2 andar, sala 20070064-900 Braslia DF BrasilFones : 0xx61-3429-3669 3429-3432Fax : 0xx61-3225-8806E-mail : [email protected] : http://www.presidncia.gov.br/sedh/cordeReproduo autorizada, desde que citada a fonte de refernciaDistribuio gratuitaImpresso no BrasilCopyright @2008 by Secretaria Especial dos Direitos HumanosTiragem : 10.000 exemplares em impressos e 5000 exemplares em CD-RomCoordenao de Ana Paula Crosara de Resende e Flavia Maria de Paiva VitalNormalizao: Maria Amlia Elisabeth Carneiro Verssimo ( CRB - 1 n303 )Referncia bibliogrficaA Conveno sobre Direitos das Pessoas com Deficincia comentada / Coordenao de Ana Paula Cro-sara de Resende e Flavia Maria de Paiva Vital . _ Braslia : Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2008.p. : 164 cmFicha catalogrfica:323.362 A Conveno sobre Direitos das Pessoas com Deficincia Comentada /Coordenao de Ana Paula Crosara Resende e Flavia Maria de Paiva Vital _Braslia : Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Coordenadoria Nacionalpara Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia, 2008. p. : 21 cmInclui a ntegra da Conveno sobre Direitos das Pessoas com Deficincia e oProtocolo Facultativo e a Declarao Universal dos Direitos Humanos1.Deficincia Direito internacional 2. Deficincia Direitos humanos 3. Pes-soa com Deficincia Direito internacional 4. Pessoa com Deficincia Direitoshumanos 5. Direitos humanos Pessoa com Deficincia I. Brasil. Coordena-doria Nacional para Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia II. Resende,Ana Paula Crosara e Vital, Flvia Maria de Paiva, coord.CDD 323.362 4. Autores:1. Alexandre Carvalho Baroni, Educador Social do Municpio de Maring, Diretor Presidentedo CVI-Brasil, Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de DeficinciaCONADE 2006/2008. [email protected]. Ana Paula Crosara de Resende, Advogada, Especialista em Direito Administrativo e DireitoEmpresarial. Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Uberlndia. Scia de AdvocaciaCatani e Crosara ( www.cataniecrosara.com.br ), Secretria do Instituto dos Advogados deMinas Gerais/Seo Uberlndia. Destaque Jurdico 2001 da Associao Brasileira de Mulheresde Carreira Jurdica do Tringulo Mineiro, Responsvel pelos Quadros De Igual para Igual eQuesto de Direitos no Programa Trocando em Midos da Rdio Universitria de [email protected]. Ana Paula Scramin, Enfermeira, Mestre em Cincias da Sade pela Universidade Estadualde Maring/PR, Enfermeira Auditora da Secretaria de Sade de Maring/PR, Presidente doCentro de Vida Independente de Maring/PR. [email protected] Rita de Paula, Psicloga, Mestre em Psicologia Social, Doutora em Psicologia Clnicae Ps-Doutoranda pelo Instituto de Psicologia da Universidade de So Paulo, Consultora doMinistrio da Sade e da Sorri Brasil, Ganhadora dos Prmios USP de Direitos Humanos, DireitosHumanos na categoria de Pessoas com Deficincia pela Presidncia da Repblica, e PrmioCladia como Mulher do Ano na categoria de Polticas Pblicas. Membro da equipe tcnica doCVI Araci Nallin. [email protected] Guedes de Mello, Membro do grupo de pesquisa em Acessibilidade e Tecnologiasdo Laboratrio de Experimentao Remota da Universidade Federal de Santa Catarina RExLab/UFSC, Membro-Fundador e Presidente do Centro de Vida Independente de Florianpolis CVI-Floripa.6. Brbara Kirchner, Administradora, Presidente da 3IN Incluso, Integridade eIndependncia www.3in.org.br . Participou da 8. sesso do Comit da ONU que elaborou aConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia.7. Cludio Vereza, Deputado Estadual do Esprito Santo e Militante da Defesa dos Direitosdas Pessoas com Deficincia.8. Cleide Ramos Reis, Promotora de Justia do Estado da Bahia. 5. 9. Crismere Gadelha, Mestra em Antropologia Social pelo IFCH/Unicamp e tesoureira doCentro de Documentao e Informao do Portador de Deficincia (CEDIPOD).10. Elza Ambrsio, Vice-diretora Executiva do Centro de Documentao e Informao doPortador de Deficincia (CEDIPOD), desenvolvedora de sites. [email protected]. Fbio Adiron, Consultor e Professor de Marketing, Fundador da Associao Mais 1,Membro da Comisso Executiva do Frum Permanente de Educao Inclusiva e Moderador doGrupo de Discusso sobre Sndrome de Down do Yahoo Grupos. Colaborador dos sites daUniversidade Solidria (Unisol) e da Rede SACI, Responsvel pelas Novidades do Dia.12. Flvia Cintra, Jornalista, Consultora de Empresas e Ativista de Direitos Humanose Desenvolvimento Inclusivo. Participou da 8. sesso do Comit da ONU que elaborou aConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia.13.Flavia Maria de Paiva Vital, Graduada em Comunicao Social, Consultora Internade Gesto da Companhia de Engenharia de Trfego de So Paulo, Presidente do Centro deVida Independente Araci Nallin, Membro da Rede Interamericana sobre Deficincia - RIADIS.Participou, com o Projeto Sul, da 7. e 8. sesso do Comit da ONU que elaborou a Convenosobre os Direitos das Pessoas com Deficincia. [email protected] Nogueira, Advogado. Diretor Jurdico do CVI-Brasil e Segundo Vice-Presidenteda Rehabilitation International para Amrica Latina.15. Idari Alves da Silva, Historiador, Mestre em Histria Social pela Universidade Federal deUberlndia, com nfase na cidadania da pessoa com deficincia. Coordenador do Ncleo deAcessibilidade da Prefeitura Municipal de Uberlndia. [email protected]. Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior, Mdica Fisiatra (especializada em medicinafsica e reabilitao), Mestre do Departamento de Clnica Mdica da Universidade Federal do Riode Janeiro (UFRJ), Especialista em Poltica Pblica e Gesto Governamental, Titular da AcademiaBrasileira de Medicina de Reabilitao da UFRJ. Coordenadora Geral da Coordenadoria Nacionalpara Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia CORDE, rgo vinculado a SecretariaEspecial dos Direitos Humanos da Presidncia da Repblica. Recebeu o Prmio Cidadania 2006.Participou, da 7. e 8. sesso do Comit da ONU que elaborou a Conveno sobre os Direitosdas Pessoas com Deficincia.17. Joelson Dias, Advogado, Representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados 6. do Brasil no Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficincia CONADE,Integrante da Comisso dos Direitos Humanos da OAB. Participou da 7. sesso do Comit daONU que elaborou a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia.18. Jorge Mrcio Pereira de Andrade, Mdico Psiquiatra do CAPS Estao - Servio de SadeMental - Campinas - SP, Membro do Conselho Consultivo e Cientfico do CVI - Centro de VidaIndependente de Campinas - SP, Pesquisador e consultor em Novas Tecnologias, TecnologiasAssistivas, Direitos Humanos e Incluso/Excluso Social de Pessoas com Deficincias, Fundadordo Servio de Psiquiatria Infantil da Clnica de Reabilitao Psicomotora Vicente Moretti -Bangu/Rio de Janeiro, Idealizador do Projeto GEO-ORGOS e Fundador do DefNet - Centro deInformtica e Informaes sobre Paralisias Cerebrais.19.Lais Vanessa Figueiredo Lopes, Advogada, Mestranda em Direito na PUC/SP. Professorade Ps-Graduao da Unisantos, PUC/SP (COGEAE) e SENAC/SP. Integrante do Conselho Nacionaldos Direitos da Pessoa Portadora de Deficincia (CONADE) pela OAB Federal; das Comisses dosDireitos das Pessoas com Deficincia e do Direito do Terceiro Setor da OAB/SP; da InternationalSociety for Third Sector Research (ISTR); e do NEATS PUC/SP. Participou da 6., 7. e 8. sessodo Comit da ONU que elaborou a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia.Assessora jurdica da Mais Diferenas Educao e Incluso Social www.md.org.br e da 3IN Incluso, Integridade e Independncia www.3in.org.br .20. Luiz Baggio Neto, Ps Graduado em Letras, Editor, Presidente da Associao Brasileirade Sndrome Ps-Poliomielite - ABRASPP.21.Mara Gabrilli, psicloga e publicitria. Atualmente vereadora da Cidade de So Paulo.Foi Secretria Especial da Pessoa com Deficincia e Mobilidade Reduzida da Prefeitura de SoPaulo de 2005 a 2007. Em 1994 fundou a Organizao No Governamental Projeto PrximoPasso. Participou da 8. sesso do Comit da ONU que elaborou a Conveno sobre os Direitosdas Pessoas com Deficincia.22.Mrcia Golfieri, Advogada, Integrante da International Society for Third Sector Research(ISTR); e do NEATS PUC/SP, Assessora jurdica da Mais Diferenas Educao e Incluso Socialwww.md.org.br e da 3IN Incluso, Integridade e Independncia www.3in.org.br .23. Marco Antnio de Queiroz, Consultor Especialista em Acessibilidade Digital do Centrode Vida Independente Araci Nallin e da Click Maujor , d cursos e palestras sobre linguagemHTML e acessibilidade Web para empresas no Brasil, desenvolveu a verso em lngua portuguesadas Diretrizes Irlandesas de Acessibilidade na WEB, Criador do site www.bengalalegal.com . 7. [email protected]. Marineia Crosara de Resende, Psicloga, Mestre em Gerontologia e Doutora em Educaopela Unicamp, Professora Universitria, Pesquisadora na rea do Envelhecer com [email protected]. Niusarete Margarida de Lima, psicloga, especialista em gesto de projetos sociais egesto da informao; especialista em integrao e reabilitao de pessoas com deficincia pelaUniversidade de Salamanca/Espanha, Coordenadora Geral Substituta da CORDE, Gerente doSistema Nacional de Informaes sobre Deficincia da CORDE/SEDH/PR, Conselheira Suplentedo CONADE pela SEDH/PR26. Pedro Santos Corradino, Advogado, Ps-Graduado em Processo Civil.27. Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, Procurador Regional do Ministrio Pblico doTrabalho 9 Regio, Especialista e Mestre em Direito do Trabalho pela Universidade de SoPaulo e Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paran. Participou da 8. sesso doComit da ONU que elaborou a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia.28.Romeu Kazumi Sassaki, Graduado em Servio Social, Especializado em Aconselhamentode Reabilitao, Consultor de Incluso Escolar, Membro- Fundador do Centro de VidaIndependente Araci Nallin. o Tradutor Oficial da Conveno sobre os Direitos das Pessoascom Deficincia. [email protected] Leo Jnior, Professor de Educao Fsica, Mestre em Gerontologia pelaUnicamp, professor universitrio. [email protected]. Sueli Aparecida Freire, Psicloga, doutora em Educao pela Unicamp, ProfessoraAssociada 1 da Universidade Federal de Uberlndia. [email protected] 8. 31. Vanessa Pugliesse, Assessora da Associao Vida Brasil, Salvador/Bahia.www.vidabrasil.org.br32. Vitor Ribeiro Filho, Mestre e Doutor em Geografia pela Universidade Federal do Rio deJaneiro (UFRJ), Professor do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlndia (UFU).Pesquisador sobre o tema Planejamento Urbano e Deficincia. [email protected]. Wiliam Csar Alves Machado, Enfermeiro, Doutor em Cincias da Enfermagem pela UFRJ,Professor Adjunto no DEF da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Pesquisador daQualidade de Vida e Sade de Pessoas com Deficincia. Presidente do Conselho Municipal dasPessoas com Deficincia de Trs Rios/RJ. [email protected] 9. SUMRIOTituloAutoria Pg.Autores ....................................................................................................5Prefcio,Alexandre Carvalho Baroni..........................................................15Apresentao,Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior........................................19Introduo, Ana Paula Crosara de Resende e Flavia Maria dePaiva Vital....................................................................................17Prembulo,Flavia Maria de Paiva Vital.............................................................23Artigo 1 -Propsito, Geraldo Nogueira..........................................................25Artigo 2 -Definies, Lilia Pinto Marques......................................................27Artigo 3 -Princpios gerais, Ana Rita de Paula...............................................30Artigo 4 -Obrigaes gerais, Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior...........32Artigo 5 -Igualdade e no discriminao, Ana Paula Crosara de Resende.....34Artigo 6 -Mulheres com deficincia, Flvia Cintra........................................37Artigo 7 -Crianas com deficincia, Flvia Cintra.........................................40Artigo 8 -Conscientizao, Ana Paula Crosara de Resende..........................41Artigo 9 -Acessibilidade, Flvia Maria de Paiva Vital e Marco Antniode Queiroz..................................................................................44 10. Artigo 10 - Direito vida, Jorge Mrcio Pereira de Andrade..............................48Artigo 11 - Situaes de risco e emergncias humanitrias, Elza ValdeteAmbrsio e Crismere Gadelha.......................................................51Artigo 12 -Reconhecimento igual perante a lei, Cleide Ramos Reis.............53Artigo 13 -Acesso Justia, Ana Paula Crosara de Resende.......................56Artigo 14 -Liberdade e segurana, Ana Paula Crosara de Resende e.. Geraldo Nogueira......................................................................59Artigo 15 -Preveno contra a tortura ou os tratamentos ou penas cruis, desumanos ou degradantes , Fbio Adiron....................61Artigo 16 -Preveno contra a explorao, a violncia e o abuso,Vanessa Pugliese......................................................................64Artigo 17 -Proteo da integridade da pessoa, Geraldo Nogueira................68Artigo 18 -Liberdade de movimentao e nacionalidade, Vitor Ribeiro Filho e Ana Paula Crosara de Resende........................................69Artigo 19 - Vida independente e incluso na comunidade, Romeu Kazumi Sassaki...............................................................71Artigo 20 -Mobilidade pessoal, Mara Gabrilli..............................................74Artigo 21 -Liberdade de expresso e de opinio e acesso informao, Anah Guedes de Mello.............................................................76Artigo 22 -Respeito privacidade, Pedro Santos Corradino.........................78Artigo 23 -Respeito pelo lar e pela famlia, Marineia Crosara de Resende e Roosevelt Leo Jnior.............................................................80Artigo 24 -Educao, Romeu Kazumi Sassaki..............................................83 11. Artigo 25 -Sade, Marineia Crosara de Resende e Sueli Aparecida Freire............85Artigo 26 -Habilitao e reabilitao, Ana Paula Scramin eWilliam Cesar Alves Machado............................................................88Artigo 27 -Trabalho e emprego, Ricardo Tadeu Marques da Fonseca..................92Artigo 28 -Padro de vida e proteo social adequados, Luiz Baggio Neto..................................................................................................94Artigo 29 -Participao na vida poltica e pblica, Claudio Vereza.......................97Artigo 30 -Participao na vida cultural e em recreao, lazer e es porte, Brbara Kirchner e Mrcia Golfieri..........................................99Artigo 31 -Estatsticas e coleta de dados, Niusarete Margarida de Lima.................................................................................................102Artigo 32 -Cooperao internacional, Flvia Maria de Paiva Vital........................105Artigo 33 -Implementao e monitoramento nacionais, Ana Paula Crosara de Resende e Idari Alves da Silva..........................................106Artigo 34 a 39 -Monitoramento internacional, Joelson Dias e Las Lopes...................109Artigo 40 a 50 - Trmites Legais, Ana Paula Crosara de Resende....................................113Protocolo Facultativo Conveno sobre os direitos das pessoas comDeficincia, Ana Paula Crosara de Resende e Flavia Maria de PaivaVital................................................................................................................................116Declarao Universal dos Direitos Humanos....................................................................119Conveno sobre os Direitos da Pessoa com Deficincia e ProtocoloFacultativo Conveno sobre os Direitos da Pessoa com Deficincia,Organizao das Naes Unidas - Traduo oficial Brasil.................................................129 12. 16 PREFCIOAlexandre Carvalho Baroni * O convite para o prefcio desta obra , sem dvida, um grande desafio para mim pois afinal, todas as pessoas que assumiram o compromisso e a responsabilidade de escrev-la, so pessoas do mais alto nvel profissional e pessoal. Esta obra uma iniciativa mpar no momento em que toda a sociedade brasileira precisa conhecer a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia e conhec-la no apenas sob seu aspecto tcnico/jurdico, mas, sobretudo o que ela envolve em termos de avanos e conquistas para as pessoas com deficincia. Construda a partir da tica de que as prprias pessoas com deficincia so as que sabem o que melhor para elas e por isso devem ser ouvidas em todas as aes que as envolvam, o lema NADA SOBRE NS, SEM NS concede a esta obra, desde a sua concepo at seu desfecho final, a exata dimenso do que as pessoas com deficincia so capazes de fato.Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia Por isso, percorrer as pginas desta obra, possibilitar a qualquer cidado brasileiro conhecer a Conveno de maneira clara, objetiva e elucidativa e com isso, utiliz-la de maneira correta e eficaz passar a ser uma prerrogativa. A informao produzida aqui tambm de suma importncia para todos os nossos representantes legais, seja na esfera executiva, legislativa e judiciria, em seus trs nveis municipal, estadual e federal - pois a partir do conhecimento deles sobre a Conveno, poderemos garantir a efetiva mudana do paradigma do modelo mdico para o modelo social da deficincia, um dos maiores avanos alcanados pela Conveno. Imperativo neste momento afirmar que esta obra, somada a todas as demais j existentes na rea dos direitos humanos das pessoas com deficincia, torna-se mais um forte instrumento de ao poltica na medida em que agrega ao nosso arcabouo jurdico, um instrumento de pesquisa, conhecimento e ao. Conclamo assim a toda sociedade brasileira, e em especial as pessoas com deficincias e seus familiares, a se apoderarem das informaes contidas nesta obra e a partir delas serem agentes de sua prpria histria, exigindo a garantia dos seus direitos. A todos os atores diretos e indiretos desta obra e, em especial as amigas Ana Paula Crosara de Resende e Flavia Maria de Paiva Vital cuja liderana e perseverana na construo e organizao deste material foram vitais para o processo, meus parabns e a certeza de que a frente do CONADE Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficincia, meu desafio e responsabilidade assumidos de difundir os conceitos de vida independente, 13. 17autonomia, independncia a partir de aes eficazes de transformao social, tero nesta obrae em todos aqueles que desejam uma sociedade sem excluso, um grande aliado. E, para encerrar, o lema que traduz o que para mim, h de mais importante nesta obra:NADA SOBRE AS PESSOAS COM DEFICINCIA, SEM AS PESSOAS COM DEFICINCIA!!"Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia* Presidente do Conselho Nacional dos Dieitos da Pessoa Portadora de Deficincia - CONADE 14. 18 INTRODUO Segundo o Censo 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica - IBGE, aproximadamente 25 milhes de brasileiros declararam possuir alguma deficincia, o que significou um salto de 1,41% em 1991 para 14,5% da populao. A principal razo para o grande aumento no nmero de pessoas com deficincia a alterao dos instrumentos de coleta de informaes, incluindo o modelo social. Por outro lado, a populao com deficincia no Brasil tem crescido em decorrncia do aumento na expectativa de vida da populao, e da violncia urbana (assaltos, violncia no trnsito, entre outros motivos), alterando paulatinamente o perfil desta populao que, anteriormente, era o de deficincias geradas por doenas. Apesar do Brasil, ser um dos poucos pases, menos de 50 no mundo, que tm uma legislao especfica para este expressivo contingente populacional, ampla e avanada em relao s demais, continuam s pessoas com deficincia a compor as percentagens mais elevadas das estatsticas de excluso social. Para corroborar esta afirmao basta proceder a anlise da baixa presena de pessoas com deficincia em setores bsicos que promovem incluso formado pelo acesso a escola,Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia pelo acesso ao trabalho, pelo acesso ao meio urbano e rural, aos transportes e pelo acesso aos servios de sade e reabilitao. A pobreza e a marginalizao social agem de forma mais cruel sobre as pessoas com deficincia. Como conseqncia, a reduo da pobreza tambm deve ser considerada nas polticas pblicas que sero implementadas, como um elemento de reduo de desigualdade ou de promoo da igualdade plena e efetiva. O momento poltico atual de dilogo, pactuao de polticas e de um ambiente propcio a efetivao dos direitos das pessoas com deficincia exige um trabalho urgente de aprofundamento em relao as questes sociais, econmicas e polticas, para sustentar a capacidade de intervir e propor solues efetivas de incluso nos mais diversos campos da realizao da cidadania desta expressiva parcela do povo brasileiro. Neste contexto, o movimento em defesa dos direitos humanos e de vida independente assume o papel de ser um indutor das transformaes sociais visando caminhar para uma sociedade inclusiva. Este trabalho prope reflexes e anlises dos fatores determinantes que compem o panorama da realidade scio-econmica brasileira e aes capazes de efetivarem a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia na vida diria da populao brasileira. Esta coletnea de comentrios foi organizada para motivar discusses sobre os diversos temas abordados nesta Conveno; uma ferramenta para disseminar seu contedo para a populao, e em especial s pessoas com deficincia. Os comentrios aqui apresentados foram escritos por especialistas das mais diversas 15. 19reas profissionais, principalmente de incluso e vida independente, que tm compromissocom a promoo da qualidade de vida e da dignidade das pessoas com deficincia.Temos a convico que com o exerccio do conhecimento podemos tirar novas concluses,fazer novas inferncias, agregar novas informaes, reformular significados. Ao exercitar oconhecimento, ele se consolida e cresce.Este o incio de um processo que necessitar um grande esforo de todos para vivermosplenamente um mundo possvel: a sociedade inclusiva.Esperamos com os comentrios aqui apresentados, despertar voc leitor/a para refletirsobre a importncia desta temtica.Ana Paula Crosara de Resende e Flavia Maria de Paiva Vital Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia 16. 20APRESENTAOIzabel Maria Madeira de Loureiro Maior * Estamos em 2008, o ano do sexagsimo aniversrio da Declarao Universal dos Direitos Humanos - DUDH, promulgada pelas Naes Unidas em 10 de dezembro de 1948, na expectativa de conformar uma sociedade construda com liberdade, justia e paz. Aps os crimes hediondos contra a humanidade, em especial contra os mais vulnerveis, os lderes dos pases vencedores da II Guerra Mundial idealizaram uma casa e uma declarao para salvaguardar a dignidade, o valor da pessoa humana e os direitos humanos fundamentais. muito difcil que no saibamos de cor, o artigo 1 dessa Declarao: Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. So dotadas de razo e conscincia e devem agir em relao umas s outras com esprito de fraternidade. Nada mais seria necessrio se, de fato, a igualdade fosse inequvoca entre os homens e as mulheres, independentemente de qualquer adjetivo usado, como mulheres pobres, homens idosos, pessoas negras ou crianas com deficincia, sem esgotar as possibilidades deConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia desigualdade inicial. Da Carta de Direitos Humanos ao seu gozo e exerccio plenos, h uma imensido de obstculos construdos pela prpria humanidade, os quais o Estado de Direito no se mostrou suficiente para mitigar ou corrigir. Para celebrar esta data de alto simbolismo, a ONU cunhou a expresso Dignidade e Justia para Todos Ns e sob esta inspirao, os Estados Partes esto desenvolvendo suas agendas de educao em direitos humanos. No Brasil, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidncia da Repblica, com status de ministrio, j est trabalhando para a mais ampla divulgao da Declarao Universal dos Direitos Humanos. As atividades se desenvolvem com base no lema Iguais na Diferena. Nada melhor do que juntarmos dignidade e justia para reconhecer que muito deve ser feito at que as diferenas no nos impeam de ser iguais. Se todos vo comemorar neste ano o 60 aniversrio da DUDH, h um grupo que deixa de ser apenas subjetivamente protegido em seus direitos fundamentais e passa a ter a mais nova e surpreendente Conveno ou norma internacional vinculante, com seu Protocolo Facultativo. Estamos nos referindo Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia, homologada pela Assemblia das Naes Unidas em 13 de dezembro de 2006, em homenagem ao 58 aniversrio da DUDH. A mais recente das Convenes dirigidas a um segmento marginalizado da sociedade - nem por isto reduzido em tamanho - entrou em vigncia em 3 de maio de 2008, aps ultrapassar o mnimo de vinte ratificaes. O tratado universal dos estimados 650 milhes de pessoas com deficincia traz as especificidades que tornam efetivos para elas os direitos e as garantias fundamentais do texto de 1948. A leitura de cada um dos 30 artigos da DUDH est 17. 21referida diretamente nos 40 artigos de contedo da Conveno estreante na ordem jurdicainternacional, includos os artigos do Comit e da Conferncia dos Estados Partes. Agora estesegmento da humanidade pode dizer que parte dos iguais na diversidade e no valor inerentede cada pessoa.Como parte do calendrio de 2008, o Brasil, que j signatrio da Conveno e do seuProtocolo Facultativo desde 30 de maro de 2007, ratificar esses dois documentos. Entre osbrasileiros h 14,5% da populao com limitao funcional, aferida pelo IBGE em 2000. Nadamenos que a equivalncia emenda constitucional nos interessa, aqui unidos Governo Federalcom a Mensagem Presidencial n 711, de 26 de setembro de 2007, e o movimento social daspessoas com deficincia, os mais diretamente envolvidos com o texto da ONU.Alguns aspectos no podem ser esquecidos. Em nosso pas, a poltica de inclusosocial das pessoas com deficincia existe desde a Constituio de 1988, que originou a Lein 7.853/1989, posteriormente regulamentada pelo Decreto n 3.298/1999. Esses documentosnacionais, junto a outros, com destaque para as Leis n 10.048 e 10.098, de 2000 e o Decreton 5.296/2004, conhecido como o decreto da acessibilidade, nos colocam em igualdade como iderio da Conveno da ONU. Tambm cabe repetir que as questes referentes s pessoascom deficincia so conduzidas na esfera dos direitos humanos desde 1995, quando passoua existir, na estrutura do governo federal, a Secretaria Nacional de Cidadania do MinistrioConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciada Justia. Nada aconteceu por acaso ou como benesse. Cada resultado foi marcado pela lutaininterrupta e pela intransigente promoo e defesa dos direitos desse grupo. As pessoas comdeficincia escrevem no Brasil e na ONU a sua histria, cada vez com mais avanos e conquistasque se traduzem em reduo das desigualdades e equiparao das oportunidades.Em muitas ocasies uma obra, um livro, um estudo, surge somente de uma das partes:o conceito de parceria no sai do papel e jaz como utopia. Aqui no aconteceu assim. A ONUabriu suas portas, pela primeira vez para a sociedade civil organizada, na elaborao, em temporecorde, da Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia (2002 a 2006). A voz dosdestinatrios da conveno foi ouvida a cada sesso do Comit Ad Hoc. Esta voz influenciouas representaes diplomticas e os especialistas dos 192 pases-membros da ONU. Houvediscordncias pontuais, sanadas em discusses paralelas oficiais muito bem conduzidas.No existe quem tenha participado que deixe de atestar a parceria da sociedade e do governobrasileiros. Fato novo, intrigante e instigante, marcar para sempre o peso e o valor da vozdaqueles que esto margem dos fatos. A ONU mudou antes e transformou-se ainda mais, como xito das negociaes maduras, sensatas e progressistas da Conveno sobre os Direitos dasPessoas com Deficincia.Destacamos o Artigo 1, que expressa: Pessoas com deficincia so aquelas que tmimpedimentos de natureza fsica, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interao comdiversas barreiras, podem obstruir sua participao plena e efetiva na sociedade com as demaispessoas. Bastaria esta mudana de conceituao que retira da pessoa a deficincia e a remete 18. 22 para o meio, bem como as obrigaes dos Estados Partes, para que todo o trabalho tivesse sido recompensado. Porm, a Conveno supera nossas expectativas, ao cuidar dos direitos civis e polticos, econmicos, sociais e culturais dos cidados com deficincia. A Coordenadoria Nacional para Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia, CORDE, rgo da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidncia da Repblica, tem a honra de editar e distribuir este trabalho do movimento das pessoas com deficincia, aqui representado por autores e ativistas de renome, conhecidos por sua militncia e contedo prtico e acadmico a respeito dos temas abordados na Conveno. As consideraes, reflexes e explicaes so os resultados do amadurecimento e do fortalecimento da parceria essencial entre sociedade civil organizada e governo. Foi assim no processo de tessitura do texto da Conveno, tanto nos bastidores como no plenrio. Foi assim na convico que impulsionou o Presidente Lula a enviar a mensagem ao Congresso Nacional, na qual submete quelas Casas a anlise do tratado com equivalncia a emenda constitucional, tornando a Conveno perene. Est sendo assim, em estreita parceria, o impulso que o movimento social oferece e cobra dos parlamentares responsveis pela ratificao. Este processo precisa ser apressado, feito logo, sem mais nenhum atraso cabvel. Ao apresentarmos, em nome do governo federal, uma criao da sociedade civil, sob a coordenao de Ana Paula Crosara Resende e Flvia Maria de Paiva Vital, o fazemos conscientesConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia de que a obra servir desde logo para a consulta de grupos interessados em conhecer, de forma rpida e profunda, as implicaes da nova Conveno e sua compatibilidade com a legislao nacional. A obra se destina ao uso dos assessores e consultores legislativos, dos deputados e senadores, dos gestores e tcnicos, das lideranas polticas, sindicais e sociais e de cada pessoa, com ou sem deficincia, que defende a Declarao Universal dos Direitos Humanos e h de cumprir igualmente a Conveno dos Direitos das Pessoas com Deficincia. A conquista acontecer com a ratificao pelo Brasil deste tratado universal e ser efetivada quando todos forem tratados com dignidade e justia e puderem exercer o direito de ser iguais na diferena. * Coordenadora Geral da Coordenadoria Nacional para Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia, daSecretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidncia da Repblica; ativista do movimento das pessoas comdeficincia desde 1977 e parceira na elaborao da Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia daONU. 19. 24PREMBULO Flavia Maria de Paiva Vital Os contedos do prembulo no so vinculantes. A sua importncia est em no apenas justificar a elaborao como o contexto sobre o qual deve ser interpretada a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia. Ressalta que mesmo apesar dos diversos tratados, pactos e convenes internacionais em vigncia que protegem os direitos humanos das pessoas, as com deficincia esto mais vulnerveis a situaes de discriminao. A discriminao, a tutela e a caridade so instrumentos que tornam invlidas pessoas produtivas. Um grande avano aparece na proteo dos direitos das mulheres e meninas com deficincia que so mais vulnerveis a todo tipo de violncia domstica, bem como de qualquer outra ordem. O princpio do movimento de vida independente est valorizado quando se assinala aConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia autonomia e independncia individuais das pessoas com deficincia, inclusive da liberdade delas fazerem suas prprias escolhas, e participarem ativamente das decises relativas a programas e polticas pblicas, principalmente as que lhes dizem respeito diretamente. Nada sobre ns, sem ns. A promoo da acessibilidade, assim, o meio que dar a oportunidade s pessoas com deficincia de participarem plenamente na sociedade, em igualdade de condies com as demais. A pobreza e a deficincia esto diretamente ligadas por mltiplas razes e natural que a Conveno contemple o desenvolvimento, conceito extrado dos diferentes documentos oficiais do sistema das Naes Unidas, que alm de sustentvel deve ser inclusivo. A deficincia tanto uma causa como uma conseqncia da pobreza; alguns clculos indicam que uma em cada cinco pessoas pobres apresenta uma deficincia (DEVANDAS, 2006). Podemos ento dizer que todas as famlias de uma comunidade pobre so diretamente afetadas pelos efeitos scio-econmicos dela decorrentes. Existem no mundo 600 milhes de pessoas com deficincia, sendo que 400 milhes vivem em pases pobres ou em desenvolvimento. No Brasil, 27% destes brasileiros vivem em situao de pobreza extrema e 53% so pobres (IBGE, 2000). A pobreza em geral pode se ver refletida nos altos ndices de desemprego das pessoas com deficincia. Segundo o Banco Mundial, o desemprego desta populao de 80 a 90% na Amrica Latina. Isto evidencia que a excluso de pessoas com deficincia gera uma perda 20. 25significativa do PIB Produto Interno Bruto. No Canad, este estudo demonstra que 6,7% doPIB se perde devido falta de contribuies das pessoas com deficincia e seus cuidadores. NaEuropa, a Unio Mundial de Cegos estima que 70% das pessoas cegas no possuem emprego.Algumas estimativas sugerem que entre 15 a 20% das pessoas pobres nos pases em viasde desenvolvimento vivem em situao de deficincia. No Uruguai, uma pesquisa feito com 500famlias beneficirias do Plano de Emergncia - isto , famlias que se encontram em condiesabaixo da linha da pobreza -indicou que em 25% dos lares havia pelo menos uma pessoa comdeficincia - em alguns casos eram mais do que uma (BIELER, 2007).Adicionalmente, como assinala Amartya Sen, Prmio Nobel de Economia, a linha depobreza para as pessoas com deficincia deve levar em conta os gastos adicionais nos quaisincorrem para viverem dignamente, como os gastos com tecnologias assistivas. No Reino Unido,o ndice de pobreza das pessoas com deficincia de 23,1%, comparado com um ndice geral de17,9% em todo o pas. Porm, se os gastos adicionais associados a se ter uma deficincia foremacrescidos, o ndice de pobreza das pessoas com deficincia dispara para 47,4%.Para mudar este quadro, a cooperao internacional ter papel fundamental, no apenascom o apoio financeiro, mas com troca de experincias exitosas e tecnologias.Enfim, no seu item y o prembulo considera que: uma conveno internacional geral eintegral para promover e proteger os direitos e a dignidade das pessoas com deficincia prestar Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciauma significativa contribuio para corrigir as profundas desvantagens sociais das pessoas comdeficincia e para promover sua participao na vida econmica, social e cultural, em igualdade 1de oportunidades, tanto nos pases desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento.Referncias bibliogrficas:DEVANDAS, C. Proyecto Sur. Trabalho apresentado na 2 Reunio do Proyecto Sur. Nova York,2006. No publicado.BIELER, R. B. Desenvolvimento Inclusivo: Uma abordagem universal da Deficincia. [mensagempessoal] Mensagem recebida por: . Acesso em: 28.mar. 2007.1 Texto traduzido da Conveno sobre os direitos da pessoa com deficincia. Disponvel em: < http://www.assinoinclusao.org.br/Downloads/Convencao.pdf >. Acesso em: 08.mar.2007. 21. 26ARTIGO 1 PROPSITOGeraldo Nogueira Acostumamos ouvir a expresso direitos humanos mesmo quando os direitos referidos so civis ou antidiscriminatrios. claro que para uma colocao informal no tem importncia esta generalizao dos termos, mas no sentido jurdico estas expresses tm significados bastante distintos. Direitos civis so aqueles mais diretamente ligados cidadania, os que estabelecem as regras sociais, individuais ou para determinados grupos da sociedade, dando-lhes os limites para atuar dentro de um determinado marco legal. Objetivam a organizao dos bens da vida, aqueles que interessam a todos os membros de uma comunidade ou sociedade. Existem por que foram criados pela legislao para regrarem as relaes sociais em determinado tempo e lugar. Quanto s leis antidiscriminatrias ou leis que probem a discriminao negativa, soConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia normas especficas que protegem os direitos de determinados grupos sociais que podem sofrer um tratamento diferente por causa de uma caracterstica prpria, como por exemplo, a diferena de gnero, preferncia sexual, estilo de vida ou por ter alguma deficincia fsica, intelectual ou sensorial. Este tipo de norma geralmente no estabelece direito e sim, determina a proibio de determinados comportamentos sociais em relao s caractersticas prprias de grupos sociais fragilizados. Com relao s pessoas com deficincia, por exemplo, o sistema procura impedir comportamentos como negar trabalho ou emprego, impedir a inscrio em concursos pblicos ou recusar matrcula em estabelecimento de ensino. Sobre os direitos humanos pode se dizer que a idia vem desde os tempos antigos, quando estes ainda eram conhecidos por direitos do homem e precedidos por outros conceitos do direito, como naturais, inalienveis, essenciais ou inerentes s pessoas. Filsofos gregos e romanos j os entendiam como direitos devidos ao simples fato da condio humana, estando estes direitos implcitos na prpria essncia do ser humano e por isso acima do direito positivo. Assim, a lei escrita pelo homem no pode eliminar ou reduzir este direito essencial que existe independentemente do reconhecimento legislativo. A base normativa internacional dos direitos humanos surgiu aps os cometimentos do holocausto quando na noite de 10 de dezembro de 1948, em defesa dos direitos humanos, adotou- se a Declarao Universal dos Direitos Humanos, como primeira manifestao internacional da recm criada Organizao das Naes Unidas ONU. O objetivo foi estabelecer um consenso acerca de uma tica universal, atravs da qual todos os pases pudessem compartilhar valores 22. 27bsicos do bem comum e de garantia da dignidade humana. Estes procedimentos levarama uma perspectiva que confirmou a indivisibilidade e universalidade dos direitos humanos,presentemente incorporando trs dimenses fundamentais: os direitos civis e polticos, tidoscomo de primeira gerao; os direitos econmicos, sociais e culturais, de segunda gerao e osdireitos ao desenvolvimento, paz e ao meio ambiente, os de terceira gerao. Desde ento, estastrs dimenses dos direitos humanos foram desdobradas e alguns dos temas regulamentados apartir da promulgao de documentos internacionais, como a Conveno sobre o Estatuto dosRefugiados (1951); Pacto Internacional de Direitos Econmicos, Sociais e Culturais (1966); PactoInternacional sobre Direitos Civis e Polticos (1966); Conveno sobre a eliminao de todasas formas de Discriminao Racial (1969); Conveno sobre a eliminao de todas as formasde Discriminao contra a Mulher (1979); Conveno sobre os Direitos Polticos das Mulheres(1979); Conveno sobre os Direitos das Crianas (1989).Podemos notar que faltava um tratamento legal internacional mais voltado para a temticados direitos humanos das pessoas com deficincia o que se alcana com a Conveno Sobreos Direitos da Pessoa com Deficincia. A presente Conveno, em seu artigo primeiro, abaixotranscrito, define de plano que seu propsito proteger e assegurar as condies de igualdadedos direitos humanos e liberdades fundamentais para todas as pessoas com deficincia.Conveno sobre os Direitos das Pessoas com DeficinciaArtigo 1 - Propsito O propsito da presente Conveno o de promover, proteger e assegurar o desfrute pleno e eqitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por parte de todas as pessoas com deficincia e promover o respeito pela sua inerente dignidade. Pessoas com deficincia so aquelas que tm impedimentos de natureza fsica, intelectual ou sensorial, os quais, em interao com diversas barreiras, podem obstruir sua participao plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.Analisando mais atentamente a edio do artigo primeiro, acima transcrito, observamosque o legislador internacional preocupou-se mais com a garantia de que, pessoas com deficinciapossam gozar dos direitos humanos e de sua liberdade fundamental, do que propriamenteem instituir novos direitos. A tcnica empregada foi adotar como parmetro as condies deigualdade, tanto que ao desdobrar o artigo, refora a idia de que barreiras sociais podemimpedir a participao do segmento em condies de igualdade. Portanto, podemos concluirque a conduta adotada pelo legislador internacional, para que as pessoas com deficinciausufruam dos seus direitos e liberdades, justamente a maior condio de igualdade.Igualdade um composto que pressupe o respeito s diferenas pessoais, nosignificando o nivelamento de personalidades individuais. Pelo contrrio, no se ganha uma 23. 28 efetiva e substancial igualdade sem que se tenha em conta as distintas condies das pessoas. A liberdade absoluta na convivncia social conduz ao anarquismo, tal qual a igualdade artificial das desigualdades (igualdade absoluta), leva a despersonalizao e a massificao. O igualitarismo absoluto injusto porque trata aos seres humanos como unidades equivalentes, sem atentar ou atender as desigualdades fatdicas que os diferenciam. O princpio do tratamento igual no contm nada de rigidamente igualitrio, pois s se refere aos casos de homogeneidade e no de uniformidade ou aos de tipicidade e no de identidade. A igualdade fica prejudicada quando se processam discriminaes injustas a uma pessoa ou a determinado grupo e a injustia da discriminao ocorre quando se coloca a pessoa em situao de inferioridade que seja lesiva a sua dignidade.ARTIGO 2 DEFINIESConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia Lilia Pinto Martins O presente artigo discute algumas definies que so muito importantes para a compreenso atual sobre a deficincia. importante salientar que no devemos colocar a deficincia dentro de uma concepo puramente mdica, ficando associada exclusivamente doena. Se bem que a deficincia possa ser causada por uma doena, ela no se caracteriza como doena, no devendo, portanto, ser confundida com uma das causas que a podem gerar, e que no a constitui de fato. Muito mais atual e dinmica a compreenso da deficincia como parte da rea de desenvolvimento social e de direitos humanos, conferindo-lhe uma dimenso mais personalizada e social. Esta concepo traduz a noo de que a pessoa, antes de sua deficincia, o principal foco a ser observado e valorizado, assim como sua real capacidade de ser o agente ativo de suas escolhas, decises e determinaes sobre sua prpria vida. Portanto, a pessoa com deficincia, , antes de mais nada, uma pessoa com uma histria de vida que lhe confere a realidade de possuir uma deficincia, alm de outras experincias de vida, como estrutura familiar, contexto scio-cultural e nvel econmico. E como pessoa, ela quem vai gerir sua prpria vida, mesmo que a deficincia, ou fsica, ou sensorial, ou intelectual, imponha limites. Esta compreenso devolve pessoa com deficincia uma posio ativa, que normalmente desconsiderada social e culturalmente, representando-a com uma mobilidade que lhe negada, e retirando-a da 24. 29condio de precisar ser tutelada pela famlia, pelas instituies e/ou pelo Estado.Alm do mais, a pessoa com deficincia est em interao constante com seu meio scio-cultural, atuando e interferindo como sujeito ativo neste contexto, mas tambm em constanterelao com o que o meio oferece de favorvel ou desfavorvel a seu desenvolvimento pessoale social.A incapacidade que atribuda pessoa por conta da deficincia que possui, e passvel deestigmatiz-la, um conceito que precisa ser amplamente revisto, ao imputar pessoa a nica eexclusiva responsabilidade para ultrapassar seus limites fsicos, sensoriais ou intelectuais. E noatribuindo ao meio social em que a pessoa est em relao, uma responsabilidade inequvoca,ao coloc-la numa situao de maior ou menor desvantagem, por conta de um ambiente maisou menos favorvel a seu desenvolvimento e expanso como pessoa.Quanto mais a pessoa com deficincia estiver num ambiente que lhe restrinja a mobilidade,a comunicao, o acesso informao e aos bens sociais para uma vida plena e autnoma, maisvai encontrar-se numa situao de desvantagem. Se revertermos o cenrio, representando-ocomo mais favorvel s realizaes da pessoa com deficincia, a desvantagem que experimentamodifica-se, relativizando, portanto, a condio de incapacidade com a qual a desvantagem confundida. O no reconhecimento dos direitos humanos que devem ser assegurados aossegmentos sociais que sinalizem mais concretamente a diversidade humana, como as pessoasConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciacom deficincia, uma forma da sociedade praticar a discriminao contra estes segmentossociais, excluindo-os do acesso s oportunidades e aos bens sociais que lhe so devidos pordireito.Uma sociedade, portanto, menos excludente, e, conseqentemente, mais inclusiva,quando reconhece a diversidade humana e as necessidades especficas dos vrios segmentossociais, incluindo as pessoas com deficincia, para promover ajustes razoveis e correesque sejam imprescindveis para seu desenvolvimento pessoal e social, assegurando-lhesas mesmas oportunidades que as demais pessoas para exercer todos os direitos humanos eliberdades fundamentais. dentro deste paradigma da incluso social e dos direitos humanosque devemos inserir e tratar a questo da deficincia. O desafio atual promover uma sociedadeque seja para todos e onde os projetos, programas e servios sigam o conceito de desenhouniversal, atendendo, da melhor forma possvel, s demandas da maioria das pessoas, noexcluindo as necessidades especficas de certos grupos sociais, dentre os quais est o segmentodas pessoas com deficincia. Isto quer dizer que, ao se projetar e desenhar uma sociedade, essetodo, dentro de sua diversidade, deve ser contemplado, incluindo as demandas especficas queno so apenas para as pessoas com deficincia. E mesmo ao se pensar nas demandas especficasdas pessoas com deficincia, e elas existem, podemos observar que seu atendimento, reverte,quase sempre, em benefcio para uma srie de outros grupos sociais, no precisando, portanto,ser encaminhadas com exclusividade para as pessoas com deficincia.Os programas e servios que vo demandar recursos especficos, dentro do que podemos 25. 30 chamar de ajudas tcnicas, servem para compensar restries de movimentos, dos sentidos, da comunicao, e do acesso informao que certos grupos experimentam, como o das pessoas com deficincia. As deficincias, como foi analisado anteriormente, representam o parmetro mais eficaz para revelar a diversidade humana, assinalando as vrias formas de ser que a pessoa pode exercer, e que fogem de um padro tradicional de ser e perceber. nas pessoas com deficincia que podemos observar com mais nitidez as vrias formas de ser como pessoa, pelo que so erroneamente reconhecidas como especiais ou extraordinrias, mas realizando apenas a condio humana de estar no mundo de um modo diferente. Se analisarmos com mais profundidade a questo, vamos verificar que a diferena apenas o modo como podemos exercer outras formas de ser. Exemplos no faltam de pessoas que escrevem com os ps, comunicam-se por gestos ou expresses faciais, ouvem pela leitura labial ou por meio de recursos ou tcnicas especficos, enxergam com as mos ou com instrumentos como a bengala, ou caminham por meio de uma cadeira de rodas. Neste sentido, passamos a entender a comunicao e a mobilidade de uma outra maneira, representando-as dentro de todos os recursos disponveis para sua acessibilidade e a serem disponibilizadas para todos, como meios comuns de estar em interao com o mundo. A comunicao compreende a linguagem simples, escrita ou falada; a linguagem corporalConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia ou gestual; as lnguas, incluindo as lnguas de sinais; o braile; a leitura labial; as legendas; a transcrio simultnea; a udio-descrio; os softwares para leitura de telas; os textos de voz digitalizada; a comunicao ttil; os caracteres ampliados. A diversidade que negada e ignorada pela sociedade, representa a nica realidade plausvel, enquanto somos seres singulares e nicos. No h uma pessoa que por suas condies emocionais, fsicas, culturais, sociais ou econmicas seja igual s outras. E justamente na diversidade que devemos buscar e extrair as riquezas que nos acrescentam e completam. Portanto, imperativo afirmar a diversidade e promover uma sociedade plural, inclusiva, baseada em direitos humanos, e na qual o acesso aos bens sociais seja universal. 26. 31 ARTIGO 3 PRINCPIOS GERAISAna Rita de Paula Os princpios da presente Conveno esto assim relacionados: a)O respeito pela dignidade inerente, independncia da pessoa, inclusive a liberdadede fazer as prprias escolhas, e autonomia individual. O conceito de dignidade humana implica no respeito e reconhecimento de nobreza a todae qualquer pessoa, simplesmente por existir. A idia do homem como centro do mundo surgeno final da Idade Mdia e consolidada em documento internacional quando da promulgaodos Direitos Humanos pela ONU em 1948. O reconhecimento da dignidade da pessoa com deficincia fundamental, por opor-se idia de que a deficincia rebaixa esse ser a uma condio sub-humana ou a uma anomalia quedanifica a sua condio de pertencer humanidade. Do meu ponto de vista, o primeiro tem deveria se restringir ao reconhecimento daConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciadignidade das pessoas com deficincia, uma vez que no h nenhuma condio que rebaixe o seustatus de ser humano. particularmente prejudicial correlacionar dignidade com independnciae autonomia. Toda pessoa digna de respeito, quer seja ou no independente e/ou autnoma. Na rea da ateno s pessoas com deficincia convencionou-se usar o termo autonomia possibilidade das pessoas realizarem suas aes sem o auxlio de terceiros, porm aindasujeitas criao de condies pelo meio ambiente e contexto social. J independncia designa a capacidade da pessoa realizar escolhas, sem pedir autorizaode algum ou de alguma instituio. importante ressaltar que o processo de construo da independncia e da autonomiainicia-se desde a mais tenra infncia, quando a me respeita as primeiras manifestaes davontade do beb. b)A no-discriminao. Apesar da palavra discriminao ter adquirido o sentido negativo, ou seja, da retiradade direitos a determinados grupos sociais, a idia de discriminar, desta vez positivamente,est na base das aes afirmativas, onde eu identifico determinados grupos para oferecerpossibilidades de resgatar a dvida social para com estes. Considerando o sentido negativo adquirido pela palavra em nossa lngua, considerointeressante no nomear as inmeras condies sociais geradoras de preconceito. 27. 32 c) A plena e efetiva participao e incluso na sociedade. Do meu ponto de vista, o princpio da busca da participao plena particularmente importante e deve se iniciar tambm na famlia e difundir-se para todos os outros espaos scio-culturais e polticos, inclusive nas instituies e servios de atendimento populao. necessrio, contudo, retificar o uso da palavra incluso. O conceito de incluso refere-se ao processo de construo de uma sociedade para todos e, portanto, os alvos de transformao so os ambientes sociais e no a pessoa. Assim, o termo incluso no deve ser usado como sinnimo de insero ou integrao. d) O respeito pela diferena e pela aceitao das pessoas com deficincia como parte da diversidade humana e da humanidade. Julgo fundamental estabelecer as origens das diferenas humanas porque h aquelas inerentes natureza do ser humano, as diferenas ecolgicas e as diferenas criadas pelo homem, a saber, as diferenas scio-culturais e as de natureza poltica. Assim, nem todas as diferenas devem ser respeitadas. Aquelas originadas pela m distribuio de renda, pela opresso poltica, pela corrupo devem ser combatidas. Se no estabelecermos estas distines, estaremos incorrendo no erro da despolitizao do discurso e dos movimentos sociais. e) A igualdade de oportunidades.Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia O conceito de igualdade de oportunidades contemporneo ao Plano da Ao Mundial e est intimamente relacionado questo das diferenas. necessrio eliminar os mecanismos de produo da desigualdade e os meios mais eficazes para faz-lo so a politizao da discusso e a busca da igualdade de oportunidades. Tornar as oportunidades iguais significa criar condies diversificadas, respeitando-se as necessidades de cada pessoa. A principal rea onde a igualdade de oportunidades gera transformaes sociais a da educao. Se entendermos educao no como mero servio, e sim como direito inerente a todo ser humano, a sim, estaremos construindo as bases de uma sociedade inclusiva. f) A acessibilidade A acessibilidade aqui precisa ser compreendida em seu sentido amplo, como ingresso e permanncia aos meios fsicos e aos de comunicao (desenho universal) e aos sistemas, polticas, servios e programas implementados pela comunidade. g) A igualdade entre o homem e a mulher Apesar de haver um princpio de no discriminao interessante explicitar a necessidade de igualdade de gneros, uma vez que na rea das deficincias a condio feminina torna a mulher com deficincia particularmente vulnervel e em condies de desvantagem social, havendo uma sobre-marginalizao. h) O respeito pelas capacidades de desenvolvimento de crianas com deficincia e 28. 33respeito pelo seu direito a preservar sua identidadeOutra condio de vulnerabilidade que oportunamente destacada o respeito que todasas crianas com deficincia possuem de ter as suas capacidades desenvolvidas. Um exemplode desrespeito quando, nas avaliaes clnicas e pedaggicas, enfatiza-se os dficits e no aspotencialidades.No acredito que as pessoas com deficincia constituam-se em um grupo homogneo,diferente dos demais, como o caso da identidade do negro, esta sim, baseada em uma etnia ecultura prprias.Apesar de existirem grupos que tendem a considerar que a deficincia constitui-se emuma identidade prpria, como por exemplo, a comunidade surda, no creio que a influncia dapresena de uma deficincia determine uma classe especfica de pessoas.ARTIGO 4 OBRIGAES GERAIS Conveno sobre os Direitos das Pessoas com DeficinciaIzabel Maria Madeira de Loureiro MaiorA Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia um marco para os DireitosHumanos e para seu pblico destinatrio. Sendo um dos tratados do direito internacional, aConveno surgiu para promover, defender e garantir condies de vida com dignidade e aemancipao dos cidados e cidads do mundo que apresentam alguma deficincia.Esta Conveno representa a reafirmao do contedo da Declarao Universal dosDireitos Humanos de 1948, agora dirigida para a situao especfica, no Brasil, de quase 25milhes de pessoas de acordo com Censo IBGE, 2000. Sua adoo deu-se em um momentopropcio, quando no pas j um enunciado da Constituio, desde a emenda n 45/2004, apossibilidade de ratificar uma conveno de direitos humanos em nvel equivalente emendaconstitucional.O artigo das Obrigaes Gerais deve sempre ser entendido e estudado em conjuntocom o artigo anterior, que aborda os Princpios Gerais. Entende-se que dos princpios derivamtodas as obrigaes dos Estados definidas no rol das obrigaes gerais e, posteriormente, emcada um dos artigos temticos que demonstram a forma mais adequada de garantir direitosfundamentais para as pessoas com deficincia, devido s particularidades que so inerentes aelas.As afirmaes dos princpios e das obrigaes gerais so os pontos centrais a serem 29. 34 analisados no aspecto da congruncia ou no entre a Conveno e a legislao nacional. Assim, dentre os princpios da Conveno esto: o respeito pela dignidade inerente, independncia da pessoa, inclusive a liberdade de fazer as prprias escolhas, e autonomia individual, a no-discriminao, a plena e efetiva participao e incluso na sociedade, o respeito pela diferena, a igualdade de oportunidades, a acessibilidade, a igualdade entre o homem e a mulher e o respeito pelas capacidades em desenvolvimento de crianas com deficincia. A Lei n 7.853/1989, que instituiu a Poltica Nacional para Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia, apresenta no captulo das normas gerais, a garantia do exerccio dos direitos e da efetiva integrao social das pessoas com deficincia, bem como os valores bsicos da igualdade de tratamento e oportunidades, da justia social, do respeito dignidade da pessoa humana e outros, indicados da Constituio Federal de 1988. A comparao entre os dois artigos, respectivamente o da Conveno adotada pela ONU e o da lei federal brasileira, revela estreita relao ao escolherem os termos e seus significados: dignidade humana e igualdade de oportunidades. Todavia, a diferena de dezoito anos entre esses documentos enfatiza a evoluo dos processos para a cidadania das pessoas com deficincia, por meio da evoluo de integrao para incluso social. A Conveno trata ainda, mostrando atualizao, da questo de gnero e de crianas, por se tratarem de grupos vulnerveis. No artigo 1 da lei federal encontra-se meno expressa sobre afastar discriminaes eConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia preconceitos, enquanto a Conveno de 2006 explicita a no-discriminao. Pretendeu-se evidenciar que os princpios gerais esto assentados na valorizao da diversidade humana e na no tolerncia com as mais diversas formas de discriminao contra as pessoas com deficincia. Passa-se agora ao foco desse debate, que so as obrigaes do Estado brasileiro, compreendendo o executivo federal e as instncias estaduais e municipais. A Lei n 7.853/89 e, principalmente, o Decreto n 3.298/99 que a regulamentou apresentam os princpios, as diretrizes, os objetivos e os instrumentos referentes poltica nacional que o compromisso do Estado para com seus cidados com deficincia. No por mero acaso que a Conveno fala sobre o que os Estados Partes se comprometem, usando a mesma palavra e fazendo meno direta a polticas e programas para realizao dos direitos reconhecidos, bem como iniciativas e modificaes legislativas e administrativas contra a discriminao do segmento, agindo tambm para coibir tal prtica pelas instituies da sociedade, dentre elas as da iniciativa privada. A legislao nacional vai diretamente para as questes institucionais e rgos pblicos, por intermdio dos quais o pas efetiva os direitos das pessoas com deficincia, em cada um dos setores das polticas pblicas. Por seu turno, a Conveno, uma vez mais sintonizada com as conquistas e conceitos modernos, estabelece entre as obrigaes gerais o desenvolvimento e a pesquisa de tecnologias assistivas ou ajudas tcnicas e do desenho universal como regra da incluso, elevada categoria 30. 35de direitos e, a sua falta, passa a ser considerada discriminao. Este um grande e importanteavano trazido pelo texto da Conveno, que est adiante da legislao de muitos pases.Entretanto, quanto ao Brasil, esses e o tema da informao acessvel para as pessoas comdeficincia passaram lei em 2.000 e esto operacionalizados pelo Decreto n 5.296/04.Os temas capacitao de profissionais e de equipes que trabalham com pessoas comdeficincia, em relao aos direitos em geral, pertencem s obrigaes das naes e podem serefetivados com apoio da cooperao internacional, sem reduzir a responsabilidade imediatados prprios governos nacionais e igualmente cumpridas pelas unidades da federao, semexcees aceitas pela Conveno.Esto em perfeita conformidade o comando do novo tratado internacional e as normasbrasileiras quando estabelecem que na elaborao e implementao de legislao e polticaspara executar a presente Conveno e em outros processos de tomada de deciso, devero serconsultadas as pessoas com deficincia, inovando a Conveno quando se refere inclusive scrianas com deficincia, que por intermdio de suas organizaes representativas passamativamente a tomar parte nas deliberaes que se relacionam s suas vidas.A comparao com o marco legal brasileiro e as obrigaes gerais de cada Estadosignatrio da nova Conveno, tanto manifesta a qualidade do conjunto de normas legais comque trabalhamos, como ressalta em quais pontos a Conveno atualiza os direitos e mostra seu Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciavalor como novo parmetro internacional de direitos humanos. As naes mais avanadas naincluso das pessoas com deficincia tm a ganhar com a ratificao do documento da ONU e agrande maioria dos pases que ainda no assegurou as garantias fundamentais desse segmentodaro um grande salto pela dignidade das pessoas com deficincia.ARTIGO 5 IGUALDADE E NO DISCRIMINAO Ana Paula Crosara de ResendeO direito igualdade perante a lei e em virtude dela tido como regra de equilbrio entreas pessoas que tm e as que no tm uma deficincia, uma vez que determina a todos, quetodas as pessoas formam a populao de um pas.No direito, sempre se diz que a igualdade consiste em tratar igualmente os iguais edesigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades, cuidando para que no hajamdesequiparaes fortuitas ou injustificadas (MELLO, 1998). Para a pessoa com deficincia significaque no pode haver nenhuma restrio ou impedimento apenas em razo da deficincia. 31. 36 uma garantia que no sero adotados critrios, tericos ou prticos, que afastem ou impeam o exerccio de outros direitos protegidos e garantidos pela lei, sendo a regra de isonomia, a viga estrutural da sociedade. Sua existncia tambm implica respeito s diferenas individuais e a obrigatoriedade de serem oferecidos servios que atendam as necessidades de todos, independente da condio dos cidados. O princpio aqui comentado se dirige aos poderes constitudos dos Estados e tambm s pessoas que integram a populao. Ou seja, ningum est isento de tratar as pessoas como gente ou de esquecer alguns grupos sociais, nem mesmo os Administradores Pblicos, os Legisladores ou os Julgadores. Importante destacar ainda que ao fazer novas leis, elas tm que estar em consonncia com a isonomia e com os princpios da Conveno. Por exemplo, quando se exige que qualquer estabelecimento de uso pblico seja acessvel, criou-se uma obrigao para quem o responsvel pelo lugar, que no poder recus-la e, ao mesmo tempo, se uma pessoa com deficincia no conseguir utilizar os servios ou as instalaes daquele prdio ela ter como exigir as adequaes e at indenizaes se for o caso, por determinao do direito igualdade. Um dos propsitos principais da Conveno o de promover, proteger e assegurar o usufruto de direitos humanos e liberdades fundamentais para as pessoas com deficincia. A dignidade da pessoa tambm um valor que se destaca neste tratado e para que isso se efetive aConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia igualdade foi eleita como uma regra de aplicao transversal em todos os artigos da Conveno, dado seu carter de pilar de sustentao dos demais direitos (PALCIOS e BARIFFI, 2007). Esse princpio serve tambm como uma regra de flexibilidade para que a deficincia da pessoa, qualquer que seja a causa ou a severidade das limitaes impostas, no seja sinnimo de deficincia de vida e impe que os demais direitos assegurados por lei, devem ser usufrudos por todos. Sabe-se que a efetiva igualdade utpica e muito dificilmente ser conquistada, mesmo quando todo o ambiente em que vivem as pessoas com deficincia estiver adequado. Porm, como a (re)construo desse ambiente feita diariamente, no mnimo, se garante que no hajam discriminaes com base na deficincia, para que as pessoas possam lutar de forma eqitativa e que no lhes sejam negadas oportunidades de acesso, no apenas fsico, a tudo que a comunidade disponibiliza aos outros cidados (RESENDE, 2004). Outro ponto que foi destacado diz respeito aos ajustes de acessibilidade, aqui entendidos como uma das condies de promoo da efetiva igualdade e de eliminao de discriminaes. Por isso, devem ser adotadas medidas eficazes e apropriadas pelos Estados, para que o direito assegurado no fique apenas no papel. A acessibilidade deve ser entendida como um fator de qualidade de vida e, assim, a garantia de instrumentos administrativos, legais e de prtica cotidiana, como reflexo, na Conveno, de algumas boas prticas mundiais. No Brasil, o direito igualdade j est previsto no artigo 5 da Constituio da Repblica Federativa, de 1988, em diversos outros tratados, acordos, convenes internacionais e tambm 32. 37nas leis brasileiras que tm que refletir a determinao constitucional, pelo sistema jurdicoaqui adotado.Para esclarecer: a igualdade vale tanto para a proteo legal, quanto para beneficiar-se dalei. Um detalhe importante: a igualdade no s de direitos, mas tambm de deveres existentespara o povo.Prev a Conveno que ningum poder ser discriminado com base na deficincia, comoj firmado na Conveno Interamericana para Eliminao de Todas as Formas de Discriminaoda OEA Organizao dos Estados Americanos aqui no Brasil chamada de Conveno daGuatemala (Decreto n 3.956/2001) e pretende emancipar cidados para construir seus lugares einfluenci-los da forma como melhor lhes aprouver. Fica, por esta Conveno, terminantementeproibida qualquer discriminao com base na deficincia e se garante proteo legal para coibiras que porventura ocorrerem, j que estamos falando de pessoas.A igualdade perante a lei serve para que as diferenas advindas da deficincia no sejamfatores de excluso ou de marginalizao social, j que garante a participao destas pessoascomo parte da populao. fato que a deficincia uma caracterstica existente em qualquersociedade que aparece sem distino de classe social ou etria, mas um dos fatores que maisdesiguala e agrava as deficincias na populao a pobreza, que hoje causa e efeito dadeficincia. Conveno sobre os Direitos das Pessoas com DeficinciaMais uma considerao que destaca-se do artigo 5 que tambm foi assegurado queas medidas especficas que sejam importantes e teis para acelerar ou alcanar a efetivaigualdade, como por exemplo, a exigncia de legenda oculta em programas de televiso, nosero consideradas como discriminao, exatamente para que a tecnologia e at mesmo ocapital, possam servir ao povo e no ao contrrio.Fvero (2004) ensina que a principal forma para no discriminar sempre que as pessoascom deficincia escolham o que mais adequado para elas e que existam opes. E, por isso,o lema do movimento internacional das pessoas com deficincia utilizado muitas vezes noprocesso de construo desta Conveno deve prevalecer: NADA SOBRE AS PESSOAS COMDEFICINCIA, SEM AS PESSOAS COM DEFICINCIA, para que a igualdade e a incluso sejamefetivas.Referncias bibliogrficas:BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Disponvel em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiao_Compilado.htm. Acesso em: 08.mar.2007.______ Decreto n. 3.956 de 8 de outubro de 2001, publicado no Dirio Oficial da Unio em 33. 38 09.out.2001. Promulga a Conveno Interamericana para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao contra as Pessoas Portadoras de Deficincia. Disponvel em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/D3956.htm. Acesso em: 08.mar.2007. FVERO, E. A. G. Direitos das pessoas com deficincia: garantia de igualdade na diversidade. Rio de Janeiro: WVA Ed., 2004. MELLO, C. A. B. Contedo jurdico do princpio da igualdade. 3 ed. So Paulo: Malheiros Editores, 1998. PALACIOS, A.; BARIFFI, F. La discapacidad como uma cuestin de derechos humanos: uma aproximacin a la Convencin Internacional sobre los Derechos de las Personas com Discapacidad. Coleccin Telefnica Accesible. Madri: Telefonia, CERMI e Ediciones Sinca, 2007. RESENDE, A. P. C. Todos na cidade: o direito a acessibilidade das pessoas com deficincia fsica em Uberlndia. Uberlndia: EDUFU, 2004.Conveno sobre os Direitos das Pessoas com DeficinciaARTIGO 6 MULHERES COM DEFICINCIA Flvia Cintra Os direitos da mulher so direitos humanos. Os direitos da pessoa com deficincia tambm. Desde 10 de dezembro de 1948, os governos reconhecem na Declarao Universal dos Direitos Humanos que toda e qualquer pessoa detentora de direitos humanos, sem distino. As mulheres com deficincia so titulares do conjunto de direitos civis, culturais, econmicos, polticos e sociais em igualdade com todas as outras pessoas. A violncia contra a mulher, em todas as suas formas, viola os direitos humanos, podendo desencadear srias implicaes para a sade sexual e reprodutiva da mulher. Por exemplo: uma situao de violncia sexual pode gerar uma gravidez indesejada que, por sua vez, pode terminar em um aborto clandestino. Mulheres que vivem com parceiros violentos podem ser impedidas de usar mtodos anticoncepcionais, alm de estarem mais expostas a contrair doenas sexualmente transmissveis. 34. 39 Outro tipo de violncia historicamente praticado a esterilizao forada. Durante oholocausto, por exemplo, que comeou na dcada de 1930, se fazia a esterilizao forada dasmulheres que tivessem alguma deficincia ou que pudessem transmitir uma predisposiogentica deficincia fsica, sensorial ou mental. A Suprema Corte dos Estados Unidos julgoua esterilizao forada compatvel com a Constituio em 1927, afirmando que seria melhorpara o mundo se a sociedade pudesse prevenir a perpetuao das pessoas manifestadamenteincapazes. Durante a dcada seguinte, os Estados Unidos esterilizaram 20.000 mulheres fora. Este nmero se torna pequeno quando comparado ao dos suecos, que suspenderam aesterilizao forada de mulheres com genes defeituosos somente na dcada de 1970. Emmuitas culturas e religies, este e outros tipos de violncia ainda so prticas socialmente aceitas,como se a mulher fosse culpada por sofrer a violncia, apenas pelo fato de ser mulher. A Declarao da Eliminao da Violncia contra a Mulher, aprovada em AssembliaGeral das Naes Unidas em 1993, afirma que a violncia contra a mulher viola e degrada osdireitos humanos da mulher em seus aspectos fundamentais. Em 1995, a Plataforma por Aode Beijing, da Quarta Conferncia Mundial da Mulher, convocou os governos a condenarem aviolncia contra a mulher e eliminarem alegaes baseadas em tradies, costumes, e religiocomo forma de desculpas por se manterem afastados de suas obrigaes com respeito aDeclarao da Eliminao da Violncia contra a Mulher.Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia A discriminao e excluso social das pessoas com deficincia tambm so prticashistoricamente cristalizadas, interpretadas com naturalidade e aceitas socialmente. Em todasas partes do mundo, as pessoas com deficincia esto entre os mais pobres dos pobres. A elasso negados o acesso educao, informao, independncia, oportunidades de trabalho e ocontrole sobre a prpria vida. Quando a deficincia se agrega condio feminina, como mais um fator de discriminao,as situaes de excluso, segregao e violncia se potencializam. Do ocidente ao oriente, asmulheres com deficincia tm sido sistematicamente expostas violao de seus direitos maisbsicos. A violncia ocorre tanto nas ruas como em casa, sendo que a maioria causada porparentes de primeiro grau, sobretudo maridos e companheiros. O UNICEF avalia que de cada dez mulheres no mundo, uma vtima de estupro pelomenos uma vez em sua vida. Estima-se que mulheres com deficincia correm 3 vezes mais orisco de serem estupradas do que mulheres sem deficincia. A maior vulnerabilidade fsica, anecessidade de cuidados adicionais e a crena quase universal que as pessoas com deficinciano so testemunhas confiveis para fazer sua prpria defesa, fazem dessa populao um alvofcil para o estupro e o abuso sexual. Em muitos pases, os pais de meninas com deficinciarelatam que o estupro o seu principal receio quanto ao futuro de suas filhas. Nas culturasonde se acredita que pessoas soropositivas podem se livrar do vrus HIV ao terem relaessexuais com virgens, tem havido um aumento significativo de estupro de mulheres e meninascom deficincia. 35. 40 Os resultados de um relatrio recente do Banco Mundial/Faculdade de Yale sobre HIV/ AIDS e Deficincia (2006) chamam a ateno para a extrema vulnerabilidade encarada pelas pessoas com deficincia nessa rea. Estima-se que o abuso sexual entre jovens com alguma deficincia intelectual possa chegar a 70%. A falta de incluso das pessoas com deficincia nos programas de sade sexual agrava esta vulnerabilidade. Uma ativista para os direitos das pessoas com deficincia descreveu: Eu vejo agentes de sade passando de casa em casa, convidando todos os adultos para uma reunio sobre AIDS. Eles passam e sadam uma senhora sentada na porta de casa em uma cadeira de rodas olhando seus filhos, mas eles no a convidam para participar. A discriminao e a violncia contra a mulher com deficincia tambm acontecem no mbito institucional, ou seja, quando os servios pblicos so prestados em condies inadequadas, provocando danos fsicos e psicolgicos para a mulher, como longas esperas para receber atendimento mdico, maus tratos verbais, intimidao, ameaas e falta de medicamentos. A mulher com deficincia, que sempre lutou pela igualdade, por vezes no anonimato, hoje conta com um novo e importante instrumento internacional para fazer valer seus direitos. Na Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia, os Estados reconhecem que mulheres e meninas com deficincia esto sujeitas a mltiplas formas de discriminao e, aConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia este respeito, se comprometem a adotar medidas para assegurar-lhes o pleno e igual desfrute de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. Este instrumento, ao lado da Conveno Sobre a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao Contra a Mulher, significa o reconhecimento da necessidade de que se promovam medidas de proteo a este grupo que vive em um contexto singular de discriminao e desvantagem no que se refere ao exerccio de seus direitos fundamentais. Desta forma, o artigo 6 da Conveno que explicita a vulnerabilidade da mulher com deficincia e prev a adoo de medidas que assegurem sua proteo, pode e deve ser trabalhado como uma referncia positiva nas estratgias de incluso das pessoas com deficincia que vierem a ser construdas daqui por diante, reforando a necessidade de atendimento das demandas especficas das mulheres com deficincia no planejamento, desenvolvimento e monitoramento das polticas pblicas nas esferas locais, regionais, nacionais e internacionais. 36. 41 ARTIGO 7 CRIANAS COM DEFICIENCIA Flvia CintraChegamos ao terceiro milnio diante da constatao de que os direitos universais dascrianas ainda so violados em todas as partes do mundo.A ONU estima, por exemplo, que a cada ano, 2 milhes de meninas so submetidas arituais de mutilao genital, principalmente na frica e na sia, o que resulta em deficinciasseveras, infertilidade e mortalidade. Mutilao genital a prtica da extrao total ou parcialdos rgos genitais femininos. Sua forma mais severa inclui a mutilao total do clitris, aexciso (extirpao total ou parcial dos lbios menores) e a raspagem dos lbios maiores paracriar superfcies em carne viva que, depois de unidas pela cicatrizao, tapem a vagina.A proteo da criana abordada por muitas convenes internacionais. Ao dedicarConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciaum artigo da Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia s crianas, as NaesUnidas reafirmam os direitos conquistados na Declarao dos Direitos da Criana de 1959,bem como nas Regras de Beijing de 1985, na Conveno sobre os Direitos da Criana (1989),nas Regras das Naes Unidas para a proteo dos menores privados de liberdade (1990) enas Diretrizes das Naes Unidas para Preveno da Delinqncia Juvenil (Diretrizes de Riad 1990).No Brasil, o Estatuto da Criana e do Adolescente ECA a norma aplicvel a todos comidade de at 18 anos e, em casos excepcionais, at 21 anos. O ECA foi criado em consonnciacom a Conveno sobre os Direitos da Criana, ratificada pelo Brasil em 21 de novembro de1990 pelo Decreto 99.710, com o objetivo de satisfazer e garantir os direitos inerentes crianae ao adolescente.Por falta de informao ou omisso da famlia e do poder pblico, milhes de crianascom deficincia ainda vivem escondidas em casa ou isoladas em instituies. O lugar destascrianas tambm na escola.A incluso um conceito defendido por educadores de todas as partes do mundo.Atualmente, difcil encontrar quem se oponha publicamente ao convvio de crianas com algumtipo de deficincia com outras de sua idade, tanto para o desenvolvimento social e educacionalcomo para diminuir o preconceito. Porm, no Brasil, a realidade da rede pblica de ensino ainda de salas superlotadas, baixos salrios, m formao dos professores, projetos pedaggicosultrapassados e estrutura precria, o que dificulta a aprendizagem de qualquer criana. Os 37. 42 defensores da incluso acreditam que a entrada dos alunos com deficincia no ambiente educacional regular vai pressionar as escolas a se reestruturarem fsica e pedagogicamente, respeitando o ritmo de aprendizagem de cada aluno, tenha ele uma deficincia ou no. A Constituio Brasileira de 1988 garante o acesso ao Ensino Fundamental regular a todas as crianas, sem exceo. A incluso ganhou reforo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, de 1996, e com a Conveno da Guatemala, de 2001, que probe qualquer tipo de restrio baseada na deficincia de uma pessoa. Todos os instrumentos nacionais e internacionais criados para proteger os direitos da criana, embora o mbito possa variar, giram em torno do tema comum de promover seu bem- estar e desenvolvimento. Deste modo, espera-se combater o ciclo da invisibilidade das pessoas com deficincia. No Brasil, comeam a aparecer os primeiros resultados. A presena das pessoas com deficincia na mdia, especialmente nas telenovelas, tem gerado reflexo do pblico a respeito da incluso, como uma pauta social inadivel. O artigo 7 da Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia o mais novo instrumento que temos para trabalhar pela incluso das crianas com deficincia em todas as rotinas educacionais e sociais, garantindo seu direito ao desenvolvimento pleno, saudvel e seguro.Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia ARTIGO 8 CONSCIENTIZAOAna Paula Crosara de Resende Importante registrar de incio que no se pode lutar pela implementao de algo que no se conhece e ao discutirem e aprovarem, por unanimidade, essa Conveno, as pessoas que ali estavam tinham isso muito claro. Conscincia uma atitude muito prtica, e deve ser estimulada para que seja cada vez mais prxima, dos princpios de direitos humanos. Temos que reconhecer que no pode haver processo de desenvolvimento se todos no estiverem includos, num processo constante de (re)construo do mundo. Incluso no pode ser fruto de doaes; na verdade, resulta do comprometimento pessoal e de atitudes de todos para melhorar as condies de vida para todos. Com relao s pessoas com deficincia preciso divulgar e ensinar a no discrimin- las, a respeit-las enquanto parte da populao. Infelizmente ainda h muita invisibilidade 38. 43social e, em muitos casos, a excluso predomina. Vale ressaltar que nem todas as pessoascom deficincia esto passivas espera de ajuda e no esto excludas por deciso prpria oumesmo por falta de deciso pessoal, como se no tivessem que exercer um enorme esforosimplesmente para seguir vivendo num sistema inflexvel, incapaz de reconhecer o valor dehabilidades incomuns e da diferena. Toda pessoa pode ser um agente de violao de direitos humanos e raramente sabe queest cometendo um ato de discriminao, principalmente contra as pessoas com deficinciaem razo do usual desconhecimento do tema pela populao de um modo geral. Por isso, anecessidade de conscientizao. Ento, necessrio que sejam tomadas medidas imediatas, eficazes e apropriadas parapromover na sociedade o respeito pelos direitos e pela dignidade das pessoas com deficincia,no intuito de gerar, inclusive nas famlias, o conhecimento sobre as suas reais condies, pararomper essa invisibilidade e poder assumir o controle de suas vidas. As famlias tambm precisam de apoio, vez que quando elas se colocam como ncleoinicial a favor de uma formao humana, inclusiva, que aceita, respeita e valoriza a diversidade,quase sempre as deficincias e as limitaes passam a ser apenas mais uma das caractersticasdas pessoas (CNBB, 2005). Quando nasce uma criana com deficincia preciso coragem paracontinuar e so vrios os relatos de pais que tiveram contato primeiro com a deficincia antesConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciamesmo de terem contato com seus filhos. Poucas pessoas se arriscam a evidenciar a diferenaexplcita naqueles casos em que a deficincia evidente e tiram da criana a possibilidade deser diferente, como se isso tivesse um peso entre ser melhor ou pior sendo que, na verdade, ofator diferena inerente a todo ser humano, o que justifica uma diferenciao e um foco naconscientizao das famlias. A educao e a reeducao precisam ser contnuas para que a abordagem das pessoascom deficincia em todas as divulgaes existentes seja antes de tudo uma abordagem humana,j que estamos falando de gente; fornecendo informaes verdadeiras e condizentes comesta Conveno, no intuito de que a pessoa com deficincia assuma o protagonismo de suahistria. urgente a erradicao tanto do preconceito, quanto do tratamento especial existentepara essa parte da populao, devendo prevalecer a igualdade. Para isso preciso discutir,apresentar e combater os esteretipos, as prticas nocivas em relao s pessoas com deficincia,em todos os espaos da vida. Para ilustrar, em muitos casos, preciso reafirmar que o problema a porta estreita, a presena da escada, a falta de udio-descrio ou da legenda oculta e no apresena daquela pessoa com deficincia. Destacou-se nesse artigo a necessidade de lutar para reduzir o preconceito com relaos diferenas de gnero e de idade afim de que no sejam empecilhos para que mulheres comdeficincia possam fazer suas escolhas de forma autnoma, sejam elas quais forem, j que soconstatadas diariamente inmeras violaes de direitos em razo do gnero e da idade e isso 39. 44 no pode continuar acontecendo. Outro tpico abordado sobre a importncia de fomentar no imaginrio coletivo e individual o conhecimento das capacidades e contribuies das pessoas com deficincia, para que elas sejam vistas como parte da diversidade humana e no como problema a ser eliminado ou rejeitado. Importante considerar que as pessoas com deficincia tambm geram capital social e so agentes do prprio desenvolvimento (WERNECK, 2004). Esto previstas entre as aes para atingir os objetivos acima mencionados campanhas pblicas de conscientizao, tanto pelo poder pblico quanto pelas organizaes e pessoas com deficincia, para: a) fomentar atitudes receptivas em relao aos direitos das pessoas com deficincia; b) promover percepes positivas e maior conscincia social em relao s pessoas com deficincia; c) promover o reconhecimento das habilidades e capacidades das pessoas com deficincia e de suas contribuies ao local de trabalho e ao mercado laboral. No que diz respeito ao sistema educacional enfatiza-se que todas as crianas devem ser educadas em classes comuns na escola regular de suas comunidades, contando com medidas especficas que garantam sua incluso, para provocar o convvio, desde a infncia, com essas diferenas, de maneira natural, sem negaes do outro, em ambiente que represente a sociedade como ela (FVERO, 2004). Para exemplificar quem alfabetiza a professora de alfabetizao e quem ensina braile ou libras, por exemplo, so instrutores das salas de apoio que complementamConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia a educao regular, qui ensinando a turma e a escola toda. Afinal, o direito educao um direito humano inalienvel e o respeito para com os direitos das pessoas com deficincia deve ser um valor construdo socialmente e ensinado na prtica escolar. Registre-se que a educao regular no uma opo dos pais e sim, uma obrigao. Os meios de comunicao tambm devem ser incentivados e alertados a retratar as pessoas com deficincia de maneira compatvel com o propsito da presente Conveno, afinal as atitudes no mudam como em um passe de mgica. Para Werneck, 2002, o assunto deficincia ainda gera um tipo de emoo que impede o questionamento e a necessria reflexo dos jornalistas de um modo geral, quase uma comoo. A abordagem das pessoas com deficincia na mdia sob a perspectiva de direitos humanos ainda um fenmeno recente e por isso precisa ser trabalhada especificamente com os responsveis pela comunicao. Outra determinao do artigo 8 da Conveno que sejam promovidos programas de capacitao e de sensibilizao que tenham em conta as pessoas com deficincia e seus direitos, para que as pessoas saibam onde buscar a informao, seus direitos e deveres e se for o caso, a punio, em razo do desrespeito. Um dos objetivos desta parte da Conveno que a informao disseminada amplamente facilite o processo de mudana, sendo utilizada para combater preconceitos, neutralizar estigmas e fortalecer o poder conferido ao cidado para agir de forma consciente sobre as questes da pessoa com deficincia, como parte do povo (BAGGIO NETO e GIL, 2006). Como se trata de um marco mundial, com enfoque em desenvolvimento inclusivo e 40. 45sustentvel, a presente Conveno por ser nova incomodar, despertar curiosidade, indiferenaou negao, ter adeptos e crticos e em razo disso foram previstos mecanismos para gerarconhecimentos sobre o tema. Mudanas de atitudes e de posturas no acontecem por acaso, soresultados de lutas individuais e coletivas de organizaes de e para pessoas com deficinciaque interagem na construo de uma sociedade mais justa, mais humana e para todos, com aparticipao de pessoas com deficincia tambm no processo de conscientizao e sensibilizaosocial.Referncias bibliogrficas:BAGGIO NETO, L. e GIL, M. Acessibilidade, humor, incluso social e desenho universal: tudoa ver! Campanha Acesso de Humor. So Paulo: ABRASPP, Amankay, ARM, IIDI, Futerkids doBrasil, Planeta Educao, 2006.CNBB Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil. Campanha da Fraternidade 2006: texto-base. So Paulo: Editora Salesiana, 2005. Conveno sobre os Direitos das Pessoas com DeficinciaFVERO, E. A. G. Direitos das pessoas com deficincia: garantia de igualdade na diversidade.Rio de Janeiro: WVA Ed., 2004.WERNECK, C. Manual da mdia legal: jornalistas e publicitrios mais qualificados para abordaro tema incluso das pessoas com deficincia na sociedade. Rio de Janeiro: WVA Ed., 2002.______ Manual sobre desenvolvimento inclusivo para a mdia e profissionais de comunicao.Rio de Janeiro: WVA Ed., 2004. ARTIGO 9 ACESSIBILIDADE Flavia Maria de Paiva Vital e Marco Antnio de Queiroz A Conveno se refere acessibilidade como ferramenta para que as pessoas com 41. 46 deficincia atinjam sua autonomia em todos os aspectos da vida, o que demonstra uma viso atualizada das especificidades destas pessoas, que buscam participar dos meios mais usuais que a sociedade em geral utiliza para funcionar plenamente nos dias de hoje, no se reduzindo apenas acessibilidade ao meio fsico. Acessibilidade: Meio FsicoNo meio do caminho tinha uma pedra/ Tinha uma pedra no meio docaminho/ Tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra/ Nuncamais me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinasto fatigadas/ Nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha umapedra/ Tinha uma pedra no meio do caminho/ No meio do caminho tinhauma pedra. (Carlos Drumond de Andrade) Parafraseando o poeta, so vrias pedras nos nossos caminhos, que por mais que queiramos no conseguiramos lembrar de todos os acontecimentos nas nossas vidas. A acessibilidade ao meio fsico, est aqum do que j previsto na legislao brasileira. Ento, porque encontramos tantos obstculos para desenvolvermos nossas atividades do dia aConveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia dia? A acessibilidade ao meio fsico promove a incluso, a equiparao de oportunidades e o exerccio da cidadania para todas as pessoas. Aes que garantam a acessibilidade para pessoas com restrio de mobilidade aos sistemas de transportes, equipamentos urbanos e a circulao em reas pblicas so, nada mais, que o respeito de seus direitos fundamentais como indivduos. Enquanto o espao for produzido a partir dos referenciais do chamado homem-padro (possuidor de todas as habilidades fsicas, mentais e neurolgicas), comum que a construo de rampas nas esquinas e de uma determinada percentagem de vagas para estacionamento de veculos adaptados s pessoas com deficincia fsica, sejam considerados como suficientes para taxar o projeto urbano de projeto inclusivo. A percepo e a experincia de todos os usurios, no entanto, nem sempre levada em considerao nestes momentos. Em funo da idade, estado de sade, estatura e outros fatores, muitas pessoas tm que ter um atendimento adequado para receberem informaes, chegarem at os terminais e pontos de nibus, entrarem nos veculos e realizarem seus deslocamentos pelos espaos pblicos. Torna-se necessria uma viso que considera o acesso universal ao espao, a partir de cenas do dia-a-dia, onde muitos enfrentam dificuldades para realizao de aes simples, como o deslocamento at um centro comerci


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