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UNIFLU – CENTRO UNIVERSITÁRIO FLUMINENSE
FACULDADE DE DIREITO DE CAMPOS
PROGRAMA DE MESTRADO
ÂNGELO DA COSTA CAMPOS
A COMPOSIÇÃO DOS CONFLITOS INDIVIDUAIS
TRABALHISTAS:
UMA PERSPECTIVA TUTELAR
Campos dos Goytacazes - RJ
2006
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ÂNGELO DA COSTA CAMPOS
A COMPOSIÇÃO DOS CONFLITOS INDIVIDUAIS
TRABALHISTAS:
UMA PERSPECTIVA TUTELAR
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação da Faculdade de Direito
de Campos, como requisito parcial à
obtenção do Grau de Mestre em Direito,
na área de concentração em Políticas
Públicas e Processo.
Orientadora : Profª. Drª. Zoraide Amaral
de Souza.
Campos dos Goytacazes - RJ
2006
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ÂNGELO DA COSTA CAMPOS
A COMPOSIÇÃO DOS CONFLITOS INDIVIDUAIS
TRABALHISTAS:
UMA PERSPECTIVA TUTELAR
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito
de Campos, como requisito parcial à obtenção do Grau de Mestre em Direito, na
área de concentração em Políticas Públicas e Processo.
Aprovado em 20 de outubro de 2006
COMISSÃO EXAMINADORA
________________________________
Prof.ª Drª. Zoraide Amaral de Souza
Uniflu - Faculdade de Direito de Campos
orientadora.
________________________________
Prof. Dr. Auner Pereira Carneiro.
Uniflu - Faculdade de Direito de Campos
________________________________
Profª. Dra. Maria Lúcia Freire Roboredo
Universidade Federal Fluminense
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A todos os professores do curso de Mestrado e
em especial a minha orientadora, Doutora
Zoraide Amaral de Souza e ao coordenador
Doutor Leonardo Greco, os quais pela
dedicação e arte de ensinar, aperfeiçoei o
conhecido, conheci o desconhecido e espero
tudo transmitir aos que estão descobrindo.
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AGRADECIMENTO
A Deus por toda luz e proteção neste longo caminhar.
Aos meus queridos pais, exemplo de vida a perfilhar
sempre.
Ao meu sobrinho Altair Vinícius P. Campos, mestrando e
companheiro em toda jornada e nas longas viagens de
Manhuaçu-MG à Campos-RJ, encurtando a distância
com sua alegria de viver e estudar.
A minha querida esposa Deise, amor companheiro, pelo
incentivo em todos os momentos.
As minhas amadas filhas Débora e Luisa, com a candura
de crianças fortaleceram-me na busca deste ideal.
A minha primogênita Ângela, com a alegria dos meus
netos Brenda e Daniel, resumem a vida em um só
instante de fé.
A todos trabalhadores, em especial aos que já patrocinei
defesas, inspiração na escolha do tema, e ao lado dos
quais sempre estarei na luta pelo acesso à justiça e na
construção de uma Nação mais justa.
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RESUMO
Considera a propalada crise do poder judiciário brasileiro, sobretudo no
aspecto da morosidade e qualidade da prestação jurisdicional, cujo contexto, também, se insere, acentuadamente, a justiça do trabalho. Considera que a crise se agravará em decorrência da Emenda Constitucional de nº 45/2004, que deu nova redação ao art. 114 da Constituição Federal de 1988, ampliando a competência da justiça do trabalho, onde adverte que ocorrerá uma inundação de novas ações. Descreve e analisa a arbitragem, a conciliação, a mediação, as comissões de conciliação prévia, as mesas de entendimento e os termos de ajustamento de conduta como principais métodos de solução dos conflitos trabalhistas na atualidade. Faz um estudo com o direito comparado e enfrenta as divergências doutrinárias em relação aos métodos alternativos e demonstra a importância dos mesmos como meio de assegurar o direito de acesso à justiça dentro sua acepção mais moderna, dentro de uma perspectiva de preservação dos princípios tutelares do direito do trabalho.
Palavras-chave: Acesso à justiça; Arbitragem; Conciliação; Mediação;
Justiça do Trabalho.
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ABSTRACT
It considers the divulged crisis of the Brazilian judiciary power, over all in the aspect of the morosidade and quality of the judgement, whose context, also, if inserts, accentuated, the justice of the work. It considers that the crisis will be aggravated in result of the Constitutional Emendation of nº 45/2004, that gave new writing art. 114 of the Federal Constitution of 1988, extending ability of the justice of the work, where it warns that flooding of new actions will occur. It describes and it analyzes the arbitration, the conciliation, the mediation, the commissions of previous conciliation, the tables of agreement and the terms of behavior adjustment as main methods of solution of the working conflicts in the present time. It makes a study with the comparative jurisprudence and faces the doctrinal divergences in relation to the alternative methods and demonstrates the importance of the same ones as half to assure the right of access to justice inside its more modern meaning, inside of a perspective of preservation of the principles to tutor of the right of the work. key Word: Access to justice; Arbitration; Conciliation; Mediation; Justice of the Work.
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SUMÁRIO
RESUMO........................................................................................................... 5
ABSTRACT...................................................................................................... 6
INTRODUÇÃO................................................................................................ 8
INTERESSE...................................................................................................... 11
1. ORIGEM DOS CONFLITOS DE INTERESSES E SUA COMPOSIÇÃO 13
2. UM ESTUDO NO DIREITO COMPARADO............................................ 43
3. A MODERNA IDÉIA DE JUSTIÇA........................................................... 67
4. PRINCIPAIS MÉTODOS DE SOLUÇÃO DOS CONFLITOS TRABA-
5. LHISTAS NA ATUALIDADE...................................................................... 80
6. A JUDICIALIZAÇÃO DO CONFLITO DE INTERESSE TRABA-...........
LHISTA........................................................................................................... 125
7. CONCLUSÃO.................................................................................................. 143
8. REFERENCIAS................................................................................................. 147
9. ANEXO A......................................................................................................... 155
10. ANEXO B......................................................................................................... 156
11. ANEXO C......................................................................................................... 158
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INTRODUÇÃO
É consabido que o Estado moderno não mais adota o pensamento liberal,
segundo o qual deve agir como mediador de conflitos individuais e sociais.
Prevalecem, hoje, as idéias do Estado Social, que tem como objeto o bem comum,
intervindo, quando necessário, na ordem social e na ordem econômica.
Neste sentido, o Brasil é um Estado Democrático de Direito (art. 1º,
Constituição da República Federativa do Brasil), social (CF/88, arts. 1º, 3º, 5º, 7º, 8º,
193 etc.), voltado à realização do bem-comum ou dos anseios sociais.
A pacificação com justiça é o escopo magno a ser perseguido na composição
dos conflitos de interesses, sobretudo, em matéria trabalhista, quase sempre revestida
de natureza alimentar, que se insere no princípio da dignidade da pessoa humana,
elemento marcante e tipificador deste conflito social. Entretanto, a realidade impõe
verdades que devem ser reconhecidas e debatidas. O formalismo processual já não
mais acompanha a evolução e as alterações céleres do comportamento social, da
tecnologia de toda gama, das relações sociais e jurídicas multifacetárias. A construção
doutrinária acerca da jurisdição monopolítica do Estado para solução dos conflitos de
interesses envelheceu. Fustigada pela realidade das relações humanas, do comércio
jurídico ou das relações jurídicas originadas da criação do gênio humano, exige
constante renovação e agilização, visando soluções céleres e justas aos constantes
conflitos trabalhistas exsurgentes.
A intensa judicialização dos conflitos trabalhistas tornou impensável o
acesso à Justiça tal como se vêem modelados o processo e o procedimento, ambos
dotados de burocracia dispendiosa, desnecessária e morosa, por conta de excessos ou
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rigorismos formais, ou sob o pálio do embuço da proteção recursal revisional,
exacerbada, porém, na sua teleologia. O monopólio do Estado-juiz já não mais atende
aos anseios dos jurisdicionados, razão por que outras formas jurídico-processuais ou
procedimentais devem ser postas em prática, pena de colapso na prestação e na entrega
da prestação jurisdicional, e pena de tornarem ínvias as atividades de juízes,
advogados e servidores do Judiciário.
Embora os meios alternativos de solução de conflitos venha sendo tema
recorrente, diante da Emenda Constitucional nº 45, de 08.12.2004, que ampliou
significativamente a competência material da justiça do trabalho, conforme nova
redação do art. 114 da Constituição Federal, sem, entretanto, ser precedida de
planejamento e preparação estrutural para suportar uma inundação de novas ações de
proporção gigantesca, torna-se relevante e atual o retorno do estudo dos métodos
alternativos de composição dos conflitos trabalhistas.
Neste sentido, este trabalho pretende analisar estes métodos em face a uma
concepção mais ampla e moderna de acesso a justiça, numa perspectiva tutelar do
trabalhador dentro do quadro sócio-econômico que se apresenta estruturado o Brasil.
Para delinear a abordagem temática, o trabalho foi segmentado em seis
capítulos, além da conclusão.
O primeiro capítulo parte da gênese conceitual de interesse que se define nas
relações humanas em sociedade, apreendendo-o como a posição de um homem
favorável à satisfação de uma necessidade, posição ou situação que se verifica sobre
um bem da vida, possibilitando, assim, situar melhor a compreensão do surgimento
dos conflitos de interesses e sua composição, desde da autotutela à jurisdição,
mediação, conciliação e arbitragem, que são analisados nos capítulo segundo.
A análise, minudente, do instituto da mediação, conciliação e arbitragem é
relevante porquanto, além de tratarem-se, também, de método específico de solução de
conflitos trabalhistas, seus princípios e fundamentos orientam os demais métodos de
composição - constatação que se revela no capítulo quinto.
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Dada a importância destes institutos, no capítulo terceiro desenvolve um
estudo com o direito comparado, dentro de uma análise, ainda que perfunctória, da
ocorrência destes métodos em diversos países, dando, assim, maior referencial para
aplicação mais aprofundada dos métodos alternativos em nosso Direito.
No capítulo quarto, aborda a moderna idéia de acesso a justiça, dentro de
uma coerência temática que é uma justiça célere e de qualidade a todos - ricos ou
pobres - justificando, assim, a importância dos métodos alternativos diante da crise do
judiciário.
Em seguida, no capítulo quinto, analisa a arbitragem, a conciliação, a
mediação, as comissões de conciliação prévia, as mesas de entendimento e os termos
de ajustamento de conduta, como principais métodos de solução dos conflitos
trabalhistas na atualidade. Neste capítulo desenvolve-se uma análise conceitual e
crítica dos referidos institutos, sobretudo no conflito individual trabalhista, ponto nodal
do presente trabalho, enfrentando, inclusive, as divergências da doutrina em relação a
arbitragem como método alternativo de composição de conflito individual trabalhista,
o qual antecipamos nosso pensamento favorável, desde que respeitados os princípios
tutelares do direito do trabalho.
No capítulo sexto aborda especificamente o problema da judicialização do
conflito de interesse trabalhista e a crise na justiça do trabalho que se agravará, sem
dúvidas, diante da Emenda Constitucional de nº 45, o que reforça a necessidade de
implementação dos métodos alternativos estudados no capítulo anterior.
A conclusão pugna pela necessidade de algumas alterações na Lei de
Arbitragem e nas Comissões de Conciliação Prévia e assinala que tanto nos métodos
judiciais e extrajudiciais, numa concepção moderna de acesso a justiça, os princípios
fundamentais e tutelares do Direito do Trabalho devem ser preservados e ressaltados,
para que, além da celeridade, se garanta efetivamente uma justiça.
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1. INTERESSE
Nas lições tradicionais de sociologia e filosofia, o homem é um ser gregário.
Deveras, o homem não simplesmente existe, mas coexiste. Sim, o homem meramente
não vive, mas convive!
Em que pese esta necessidade de coexistência, paradoxalmente, por
fidelidade à sua natureza animal, o homem é um ser egoísta, enroscado em si mesmo,
dedicado, prioritariamente, às necessidades de seu ego, concentrado, de maneira
visceral, em seus próprios interesses.
O interesse de que se fala é aquele traduzido pela necessidade que se tem de
determinado bem, isto é, interesse maior sobre certos bens, e menor, ou nenhum em
relação a outros.
Carnellutti acentua que:
“O conceito de interesse é fundamental, tanto para o estudo do processo como para o Direito.
Interesse não significa um juízo, senão uma posição do homem, ou mais exatamente: a posição favorável a satisfação de uma necessidade. A posse do alimento ou do dinheiro é antes de tudo, um interesse, porque quem possui um ou outro está em condições de satisfazer sua fome.
Os meios para a satisfação das necessiddes humanas são os bens. E se acabamos de dizer que interesse é a situação de um homem, favorável a satisfação de uma necessidade, essa situação se verifica, pois, com respeito a um bem: homem e bem são os termos da relação que denominamos interesse. Sujeito do interesse é o homem, o objeto daquele é o bem." 1
Em verdade, a noção de interesse não é, propriamente, de relação entre o
1 CARNELLUTTI, Francesco. Sistema de Derecho Procesal Civil. Trad. Niceto-Alcalá-Zamora y Castillo e Santiago Sentis Melendo, Buenos Aires: Uteha, 1944, vol. I, p.11.
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homem e o bem da vida, mas de posição entre aquele e este, até porque, quer do ponto
de vista jurídico, quer do sociológico, o conceito de relação deve ser ligado ao de
intersubjetividade.
Assim, por interesse deve-se compreender a posição de um homem favorável
à satisfação de uma necessidade, posição ou situação que se verifica sobre um bem da
vida. Entre o sujeito do interesse e o objeto deste, não há relação, mas posição ou
situação que se verifica sobre um bem da vida. Entre o sujeito do interesse e o objeto
deste, não há relação, mas posição ou situação.
Nas civilizações primitivas, as necessidades eram poucas, pois nossos
irmãos, conheciam os bens essenciais, como a alimentação, a moradia e o vestuário
que na época eram escassos.
Na maioria das vezes, a satisfação da necessidade não se podia mostrar de
forma individualizada, pois, se assim fosse, o homem não precisava viver em
sociedade. A vida em sociedade é muito mais complexa, devem os interesses, em sua
grande parte, atenderem aos anseios de muitos, ou de considerada quantidade de
pessoas, não satisfazendo, apenas a um interesse.
Com a evolução do homem, as necessidades foram aumentando e tornando-
se cada vez mais complexas, onde os interesses de um ou de determinados grupos se
contrapunham aos interesses de outros, dando origem as mais variadas formas de
conflitos, conforme analisa o capítulo seguinte.
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2. ORIGEM DOS CONFLITOS DE INTERESSES E SUA
COMPOSIÇÃO
Como visto no capítulo anterior, da coexistência social do homem em
sociedade brotam muitos interesses, os quais, via de regra, são conflitantes.
Ocorre que o anseio do homem é viver de maneira pacífica. Para isto, cria
sistemas de solução de seus conflitos.
O direito, neste aspecto, é, exatamente, um vetor social, que visa disciplinar
a sociedade e as relações intersubjetivas que dela emanam.
Os romanos já enxergavam o direito sob esta ótica, a ponto de afirmarem:
ubi societas, ibi jus. Sim, onde está a sociedade está o direito.
Neste desdobramento, entre as várias funções da ciência do direito, talvez a
de maior relevo seja exatamente a de ordenação e controle social. O direito busca
conciliar os muitos e cada vez mais crescentes e complexos interesses dos indivíduos.
O desejo de um concorre com o desejo de outrem. E esse conflito de
interesse faz nascer o que se usou chamar de “lide” ou “litígio”.
Esta lide, na clássica definição de Carnelutti, é:
"um conflito de interesses regulado ou posto pelo direito, ou um conflito de interesses qualificado por uma pretensão e por uma resistência a essa, enfim, um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida ou insatisfeita. Conflito de interesses na medida que são muitas as vontades dos envolvidos, todas elas em desarmonia. E a pretensão resistida significa dizer que a vontade de um encontra resistência na vontade do outro.” 2
As situações litigiosas podem ser as mais extremas, sendo que às vezes o
2 CARNELUTTI, Francesco. Op. cit. p. 40.
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direito não está preparado para enfrentá-las e solucioná-las adequadamente. Isto se dá
porque a sociedade evolui muito mais rapidamente que as leis.
Desde os primórdios, o homem tem o intuito de solucionar os conflitos de
interesses, e a mais rudimentar forma de fazê-lo é a autotutela.
Em apertada síntese, autotutela é fazer justiça pelas próprias mãos. Essa
modalidade de solução dos conflitos de interesses foi muito difundida no passado,
entre os povos incivilizados, que desconheciam um Estado organizado e onipresente.
A autotutela é marcada por dois traços principais. O primeiro é que as partes
envolvidas resolvem suas questões sem a presença de terceiros, como um árbitro, por
exemplo. A segunda é que sempre uma vontade se impõe, via de regra pela força, a
outra vontade.
Verifica-se, nos tempos modernos, que a autotutela é repelida, tendo em vista
a existência de um Estado forte, que chama para si a solução dos conflitos. No entanto,
nos contemporâneos ordenamentos jurídicos existem muitos resquícios da força pelas
próprias mãos. Entre nós, a própria Constituição Federal de 1988 a consagra, ao
permitir o direito de greve.
A legislação infraconstitucional também, por exemplo, o artigo 1.210, § 1º,
do Código Civil de 2002, dispõe que o possuidor turbado ou esbulhado poderá
manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo.
Neste desiderato, se alguém invadir um imóvel, o seu proprietário pode usar
de sua própria força para restituir sua posse. Este talvez seja o exemplo mais típico da
autotutela autorizada pela lei.
Na seara penal, o artigo 301 do Código de Processo Penal autoriza a
qualquer do povo a prender aqueles que estejam cometendo crimes em flagrante.
Na esfera trabalhista, encontramos na greve mecanismo de autotutela de
interesses3; de certo modo, é exercício direto das próprias razões, acolhido pela ordem
jurídica. Embora proibida nos primeiros tempos do sindicalismo e do Direito do
3 Martins, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 684.
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Trabalho, assim como nas distintas experiências autoritárias vivenciadas ao longo dos
últimos dois séculos, a greve afirmou-se nas sociedades democráticas como
inquestionável direito dos trabalhadores. Essa sua afirmação, em um quadro de
restrição geral à autotutela, justifica-se do ponto de vista histórico e lógico. É que se
trata de um dos principais mecanismos de pressão e convencimento possuído pelos
obreiros, coletivamente considerados, em seu eventual enfrentamento à força
empresarial, no contexto da negociação coletiva trabalhista. Destituir os trabalhadores
das potencialidades de tal instrumento é tornar falacioso o princípio juscoletivo da
equivalência entre os contratantes coletivos, em vista da magnitude dos instrumentos
de pressão naturalmente detidos pelos empregadores.4
Rosemiro Pereira Leal leciona que:
“É de manifesto equívoco dizer que a autotutela tenha abrigo atualmente na legislação brasileira, ainda mais quando se sabe que as Constituições Brasileiras, em sua maioria, notadamente a Constituição vigente, acolhem o princípio da reserva legal (...) No ordenamento jurídico brasileiro, não há recepção da figura histórica da autotutela, mas a criação do instituto legal da autodefesa na esfera de direitos da pessoa e do Estado.”5
Quer se chame de autotutela, quer de instituto legal da autodefesa na esfera
de direitos da pessoa, somente será permitida como medida excepcional. A lei tem de
autorizá-la expressamente, como o faz nos artigos acima citados. Fora isto, valer-se da
força para solucionar conflitos de interesses, ainda que estes conflitos sejam legítimos,
é ilegal, sendo considerado, inclusive, como crime, ex vi do artigo 345, do Código
Penal.
4 WOLFGANG DÄUBLER informa que na Alemanha, a partir de 1984, tornou-se cada vez mais raro o recurso à greve, em vista de ser uma realidade a parceria social exigida pela legislação e pela jurisprudência. Aponta que, nesse quadro, a forma predominante de paredismo é a “greve de advertência durante as negociações coletivas; ela dura, via de regra, umas poucas horas e fica restrita a diversas empresas”. Completa o autor que o uso parcimonioso do direito de greve é facilitado pelos grandes progressos atingidos nos últimos anos tanto na área de salários quanto nas jornadas de trabalho. Direito do Trabalho e Sociedade na Alemanha. São Paulo: Fundação Friedrich Ebert/ILDES/LTr. 1997, p. 58. 5 LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria geral do processo - Primeiros Estudos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p 37.
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A autotutela quase sempre implicava numa beligerância ou no uso da força.
Mas os homens foram percebendo que poderiam solucionar seus problemas sem se
socorrerem à ela. Nasceu, então, uma nova modalidade de solução de conflitos, por
meio da figura do árbitro ou sistema arbitral, que se constituía através da liderança,
oriunda dos laços sangüíneos ou pela supremacia física e intelectual.
Esta forma de solução de conflitos, por não haver um sistema
predeterminado e obrigatório de normas de conduta, gerava muita insegurança,
porquanto a justiça buscada pelas partes conflitantes realizava-se de acordo com as
convicções do árbitro, que variavam conforme a oportunidade que lhes eram
apresentadas.
Verifica-se que, realmente, havia muita insegurança nessas decisões, pois um
mesmo conflito poderia ser levado ao árbitro, em diversas oportunidades, para ser
decidido e ter soluções diferentes.
Segundo Jaime de Altavila6 naquela ocasião as fórmulas pactuais existentes
ou que eram conhecidas não ofereciam garantias às relações econômicas ou políticas,
pois o testemunho, por medo ou por interesse, quase sempre falhava como expressão
da verdade.
Já se fazia necessária a lei escrita, para manter a legitimidade e a
perpetuidade dos princípios do direito, que começava a aparecer entre a humanidade,
procedente dos deuses, por meio dos profetas-estadistas e dos soberanos que
mantinham o privilégio de ter os primeiros esclarecimentos jurídicos.
Na realidade, esta situação foi muito lenta, porque era muito mais
proveniente da religiosidade, porém não foi tão laboriosa como fora "a lucubração do
primeiro machado de pedra durante a qual muitas borbulhas de suor escorreram da
testa curta do homem primitivo"7.
Em síntese, o surgimento do direito nasce, precisamente, quando as 6 ALTAVILA, Jaime. Origem dos Direitos dos Povos, Rio de Janeiro: Melhoramentos, 4ª edição, 1964. p. 10 e 11 7 Ibidem, p.10.
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civilizações primárias atingiram o momento de suas eclosões, pois já não era mais
possível a sobrevivência do Estado primitivo.
Na verdade, Jaime de Altavila demonstra que não foram os deuses que
ditavam o direito pela boca dos seus predestinados, pois isto, na realidade era um
engodo.
Um dia surgiu o Direito em Roma pela boca dos tribunos. Júpiter presidia,
do Olimpo, ao destino do Lácio, mas não ditava leis por intermédio das Sibilas.
Daí para frente vai se acompanhar a história do homem e perceber que o
mundo se processou sob o modelo justiniâneo e cada povo adotou sua lei, seus direitos
e seus deveres sendo avaliados , e a caminhada do século, os processos laborativos
foram se modificando.
Pelos direitos, os homens lutaram, sobreviveram e morreram.
Apesar de precária, essa segunda forma de composição dos conflitos,
significou grande avanço, sendo utilizados sobretudo no campo do Direito
Internacional Público, conforme salienta Zoraide Amaral:
“a composição pela via arbitral ainda é usada em apreciável escala, sobretudo no campo do Direito Internacional Público, em que os conflitos entre Estados Soberanos não podem ser resolvidos, ao menos até agora, senão pelo arbitramento ou, na hipótese pior, pela violência, justamente pela impossibilidade da edição de normas gerais que lhes possam ser coativamente impostas, e de organismos internacionais com força e poder próprios, capazes de torná-las efetivas no caso de transgressão.”8
A expansão das relações humanas, com aumento contínuo dos interesses e a
conseqüente gravame nos conflitos decorrentes para satisfação pessoal, sendo comum
o não acatamento da decisão arbitral, revelando, assim, a precariedade deste sistema,
8 SOUZA, Zoraide Amaral de. Arbitragem, Conciliação, Mediação nos Conflitos Trabalhistas, São Paulo: LTr, 2004, p. 43.
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bem salientou Hélio Tornaghi:
“essas maneiras de solucionar conflitos são precárias e não pode o Estado cumprir a própria missão desde o momento em que elas falham. Todas são líricas, anódicas quando desrespeitadas. A simples solução teórica dos antagonismos, ainda quando perfeitamente justa, será inócua se não for imposta coativamente. Por isso o Estado, fiador da segurança comum, chamou a si a função de declarar e impor o Direito, isto é a jurisdição. Mas, como contrapartida, deu ao súdito o poder de exigir dele, Estado, que faça justiça.”9
Assim, verifica-se o Estado se organizando politicamente e, chamando a si a
composição dos conflitos de interesses, surgindo a terceira forma de composição: a
jurisdição.
A decisão da autoridade substitui as formas primitivas de composição de
conflitos, sem eliminá-las totalmente, pois aqui e ali no direito escrito, encontramos
resquícios das formas anteriores até mesmo nos povos e nas legislações mais
adiantadas.
O Estado através de um dos seus órgãos assegura aos seus súditos a solução
dos conflitos como contraprestação da destituição da autodefesa e da arbitragem.
Hamilton Moraes de Barros assinala que: “quanto mais os homens expandem
suas relações, quanto mais se afirma a sua personalidade, tanto maior é a necessidade
de normas que rejam o seu comportamento, abrindo-lhes franquias ou impondo-lhes
restrições”.10
Neste passo, surge um novo direito. O direito de exigir do Estado a
composição dos conflitos.
Para que o súdito possa exigi-lo são necessários instrumentos adequados.
Esses instrumentos são fornecidos por um ramo do direito: o Direito
Processual.
O Direito Processual é quem nos responde: quem pode pleitear a composição 9 TORNAGHI, Hélio. Compendio de Processo Penal, vol. I, Rio de Janeiro: José Konfino, 1967, p. 6. 10 MORAES E BARROS, Hamilton de. A Proteção Jurisdicional dos Direitos Humanos no Direito Positivo Brasileiro, Brasília: in Revista de Informação Legislativa, out/dez. 1971 – p. 66.
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dos conflitos? Contra quem há de ser pretendida a intervenção estatal? Quando a
prestação pode ser reclamada? De que forma se desenvolve a atividade das partes para
obterem a solução dos conflitos e como se comporta o Estado para cumprir a sua
função?
O Estado chamando a si essa função assume o dever de manter a paz social,
por meio do cumprimento da lei editada anteriormente.
O veículo de atuação da lei é o processo que, como define Chiovenda: “é o
complexo da atuação da vontade da lei (com respeito a um bem que se pretende) por
parte dos órgãos da jurisdição ordinária”.11
Por meio de uma de suas funções, ou de seus Poderes o Estado exerce a
Jurisdição que ao lado do Legislativo e do Executivo permite completar o exercício da
soberania, atingindo o seu fim.
Carnellutti ensina em sua Teoria Geral do Direito que:
“A função legislativa não é a única função do Estado puramente jurídica, ou, em outros termos, não é o único modo pelo qual a ordem soberana produz direito. Toda a gente sabe que ao lado do Estado-Legislador existe o Estado-Juiz. É possível que, na história ou na pré-história do direito, o Juiz tenha precedido o legislador. Ao Estado-Juiz corresponde a função jurisdicional.
Do ponto de vista lingüístico, legislação e jurisdição significam substancialmente a mesma coisa: no jus dicere resolve-se o legem ferre, e vice-versa. Mas os dois nomes diversos exprimem modalidades diversas da atividade jurídica.
No fundo, a diferença entre elas é verdadeiramente funcional. A legislação é uma produção do direito subespécie normativa, isto é, uma produção de normas jurídicas; poderíamos dizer uma produção do preceito em série, para casos típicos, não para casos concretos. A jurisdição, pelo contrário, produz preceitos, ministra direito para cada caso singular, ousarei dizer não trabalha para armazenar, mas por encomenda, sob medida. Esta diferença, baseada no critério da lex generalis e da lex specialis, é bastante conhecida e exprime-se, quanto à jurisdição, na chamada limitação dos efeitos do caso julgado, que é o nome por que se designa o produto da atividade jurisdicional”.12
11 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 1965, p. 37. 12 CARNELLUTTI, Francesco. Teoria Geral do Direito, trad. A. Rodrigues Queiroz e Artur Anselmo de Castro. São Paulo: Saraiva & Cia. Editores, 1942. pág. 30.
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Com o desenvolvimento em torno do processo, da compreensão de seu duplo
papel, como instrumento de atuação e realização dos direitos subjetivos e da atividade
jurisdicional do Estado por meio da qual torna efetiva e concreta a vontade da lei,
desprendeu-se o processo do praxismo, da prática e dos costumes forenses, para
ostentar a posição de ciência: ciência processual.
Atividade das partes, no exercício do direito de ação e do direito de defesa.
Atividade do Juiz, exercitando a jurisdição, isto é, o poder de dizer a lei.
O exercício do direito de ação deflagra o fenômeno processual. Atua, por
assim dizer, como reagente ou agente provocador do fenômeno. Assim como o calor
provoca o fenômeno da ebulição, a ação (seu exercício) faz com que o processo
(fenômeno) ocorra.
Que direito será esse, que provoca pelo seu exercício fenômeno de tal
significação, como é o processual que, sob um dos seus ângulos, revela o exercício de
uma das expressões da soberania do Estado: a jurisdição?
Sinteticamente, jurisdição é atividade mediante a qual os juízes examinam as
pretensões e resolvem os conflitos de interesses, com o fim de resguardar a paz social
e o império da norma de direito.
Jurisdição é, destarte, o poder dever que o Estado tem de aplicar a norma
jurídica ao caso concreto.
Consoante Ovídio Batista13, “o ato jurisdicional é praticado pelo Juiz, que o
realiza por dever de função.” Além disso, prossegue Ovídio, “o outro componente
essencial do ato jurisdicional é a condição de terceiro imparcial em que se encontra o
Juiz com relação ao interesse sobre o qual recai a sua atividade.”
Vê-se, deste modo, que o Estado moderno avocou para si a exclusividade na
solução dos conflitos de interesses. Todavia, a jurisdição atravessa por grave crise, o que depõe contra seu
efetivo funcionamento. E são vários os seus entraves! Reclama-se de um aparelho
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judiciário moroso, custoso e mormente formalista.
Mesmo detalhes aparentemente pequenos ganham relevo, causando ainda
mais transtorno àqueles que se valem da jurisdição para solucionar seus litígios.
Assim, a jurisdição, que seria a panacéia para os conflitos de interesses,
passa a ser desprestigiada, realmente desacreditada e, por conseguinte, questionada em
seu papel, sobretudo diante da extraordinária evolução tecnológica, onde, após o
fenômeno da globalização e da conectividade iterativa, onde o mundo em rede
celebram negócios, os conflitos exsurgentes não mais suportam aguardar a trajetória
procedimental de um processo judicial formalista, clamando e ampliando o terreno de
outros meios alternativos à justiça.
Mas os conflitos de interesses existem e são cada vez mais constantes e
complexos, como adverte Hamilton de Moraes e Barros14 que “quanto mais os homens
expandem suas relações, quanto mais se afirma a sua personalidade, tanto maior é a
necessidade de normas que rejam o seu comportamento, abrindo-lhes franquias ou
impondo-lhes restrições”.
Tendo em vista a exaustão do modelo litigioso, seja porque os Tribunais
encontram-se soterrados e sem condições de atender à demanda por seus serviços, seja
porque o parâmetro da litigiosidade está esgotado, surgiu a necessidade de se buscar
novas formas de solução de conflitos, as quais se titulou como “formas alternativas”. E
são realmente alternativas ao sistema rigorosamente hierarquizado da Justiça, com
seus procedimentos formais e sua ritualização. Nesse sentido, escreveram Morais e
13 BATISTA, Ovídio. Teoria geral do Processo Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 73-74. 14 MORAES E BARROS, Hamilton de. Op. cit., p. 66 .
22
22
Silveira:
“Esse pensar cria fórmulas renomadas no contexto atual, onde observamos que embora se recorra aos tribunais de forma irracional, por vivermos numa sociedade de cultura essencialmente litigiosa, e exista uma quantidade considerável de conflitos que poderiam ser perfeitamente resolvidos pelas próprias partes ou com a ajuda de um terceiro. Esses mecanismos alternativos, entre os quais cita-se a mediação, a arbitragem, a negociação, a conciliação, colocam-se ao lado do tradicional processo judicial como uma opção que visa descongestionar os tribunais e reduzir o custo e a demora dos procedimentos; estimular a participação da comunidade na resolução dos conflitos, e facilitar o acesso à Justiça, já que, por vezes, muitos conflitos ficam sem resolução porque as vias de obtenção são complicadas e custosas e as partes não têm alternativas disponíveis a não ser, quem sabe, recorrer à força.”15
Assim sendo, analisar-se-á a mediação, a conciliação e a Arbitragem, para
que, no capítulo próprio, possamos melhor compreender a aplicação dos meios
alternativos na composição dos conflitos individuais trabalhistas, ponto nodal de nosso
trabalho.
2.1 - MEDIAÇÃO
Mediação é um método por meio do qual uma terceira pessoa, neutra e
imparcial, ajuda as partes envolvidas em um conflito a restabelecer a comunicação,
para que possam construir um acordo reciprocamente satisfatório, que ponha termo às
divergências, conferindo uma certa ordem no caos. A palavra conflito, que aparece no
conceito, é freqüentemente utilizada no discurso psicológico para referir-se a uma
realidade intrapsíquica, porém, quando pertinente ao campo da mediação, diz respeito
exclusivamente às diferenças interpessoais. O terceiro, referido na noção, neutro e
15 MORAIS, José Luiz Bolzan de e SILVEIRA, Anarita Araújo, no artigo "Os Mecanismos Alternativos", in Em Nome do Acordo - A Mediação no Direito, Luis Alberto Warat (coord.), Buenos Aires, 23. ed., Asociación Latinoamerica de Mediación, Metodologia y Ensefianza deI Derecho, 1999, p. 70.
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imparcial, é o mediador, pessoa que, para além da sua formação de base (Direito,
Psicologia, etc.) possui uma formação específica em mediação e auxilia as partes na
obtenção de um acordo através da confrontação e da negociação dos pontos
divergentes, na perspectiva da autocomposição do litígio e da responsabilização de seu
cumprimento.
Ao longo da história da humanidade foram construídas diferentes
modalidades de resolução de conflitos, das mais informais às mais formais.
No extremo inferior, geralmente dá-se entre familiares, grupo de amigos ou
de trabalhos, ou seja, entre pessoas que têm grande conhecimento entre si. Inexistem
regras para a forma de condução dos conflitos e estas são idiossincrasias dos contextos
nos quais se desenvolvem. Não há terceiros nem custos e é célere. É a negociação.
No extremo mais elevado, impera a formalidade. Existem complexas
organizações, que vão desde os juízos sumários até a arbitragem; utilizam-se de um
processo bem definido (que deu lugar a um dos ramos do Direito, que é o direito
processual); atuam terceiros, que cumprem funções previamente definidas e cujas
decisões são vinculantes para as partes; é onerosa e lenta. É a Justiça.
Entre estes dois extremos existe um espaço intermediário, no qual se situa a
mediação, mais formal que o informal e mais informal que o formal. A mediação não
dispensa um processo definido, estabelecido não por leis ou por códigos, mas pelas
partes mesmas em conflito e o terceiro neutro e imparcial chamado a ajudá-las. Não
raras vezes é o terceiro que decide sobre o processo e as partes aceitam. A participação
na condução da solução do conflito por esta via é voluntária, ninguém pode obrigar a
outrem a eleger este processo. O acordo final não é obrigatório, significando que as
partes podem abandonar o processo a qualquer momento e dirigir-se a um dos outros
dois extremos: passar à negociação ou demandar em juízo. Também é facultado ao
mediador desistir da mediação entre partes conflitivas. É mais barata que uma
demanda judicial, em custo e em tempo. Difere da arbitragem porque as partes não têm
a obrigação de acatar as apreciações do terceiro.
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Maria Nazareth Serpa destaca a informalidade e voluntariedade que permeia
a mediação de conflitos, destacando o papel de neutralidade do interventor, na busca
da composição do conflito, lecionando que:
“a mediação não é uma estrutura que deva ser imposta a nenhuma disputa para propiciar solução, sendo um processo informal, voluntário, onde um terceiro interventor neutro assiste aos disputantes na soluções das questões. O papel do interventor é ajudar na comunicação através da neutralização de emoções, formação de opções e negociação de acordos. Como agente fora do contexto conflituoso, funciona como um catalisador de disputas, ao conduzir as partes às suas soluções, sem propriamente interferir na substâncias delas.”16
Da leitura do acima exposto, apreende-se que a mediação, através do diálogo
conduzido por um terceiro, almeja a composição do conflito sem redundar em um
perde/ganha que transpassa o pensamento das partes conflitantes, ao contrário, busca
um entendimento ponderado, eficaz e satisfatório para os envolvidos, substituindo o
perde/ganha pelo ganha/ganha, já que o conflito se resolve por uma solução
mutuamente acertada e se estrutura de um modo que ajuda a manter a relação entre as
partes envolvidas, já que não há vencidos nem vencedores. Dela nos diz Warat:
“É importante considerar que as práticas sociais de mediação se configuram em um instrumento de realização da autonomia, da democracia e da cidadania, na medida em que educam, facilitam e ajudam a produzir diferenças e a realizar tomadas de decisões sem a intervenção de terceiros que decidem pelos afetados por um conflito.
Falar de autonomia, de democracia e de cidadania, em um certo sentido, é se ocupar da capacidade das pessoas para se autodeterminarem em relação e com os outros; autodeterminarem-se na produção da diferença (produção do tempo com o outro). A autonomia como uma forma de produzir diferenças e tomar decisões com relação à conflitividade que nos determina e configura, em termos de identidade e cidadania. Um trabalho de reconstrução simbólica dos processos conflitivos das diferenças que nos permite formar identidades culturais - de nos integrar no conflito com o outro -, com um sentimento de pertinência comum. Uma forma de poder perceber a responsabilidade que toca a cada um num conflito, gerando devires reparadores e transformadores.”17
16 SERPA, Maria de Nazareth. Teoria e Prática da Mediação de Conflitos. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 1999, p. 90-91 17 WARAT, Luis Alberto, no artigo "Ecologia, Psicanálise e Mediação". In Em Nome do Acordo - A Mediação no Direito, Luis Alberto Warat (coord.), Buenos Aires, 23. ed., Asociación Latinoamerica de Mediación, Metodologia y Ensefianza deI Derecho, 1999, p. 06/07.
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Para atingir seu escopo, a mediação depende muito do mediador, visto que
este atua como facilitador do entendimento entre as partes, sendo oportuno as lições de
Zoraide Amaral sobre a importância do mediador, obtemperando que:
“é figura de fundamental importância para o bem andamento do processo. Deve possuir qualidades pessoais, tais como reconhecida trajetória ética, sensibilidade, facilidade de comunicação e credibilidade, assim como compreender e saber aplicar as etapas do processo de mediação, sabendo administrar habilidades como escutar, promover a harmonia entre as partes, conduzir interesses e necessidades, desenvolver ações, controlar a raiva, saber argumentar, saber reenfocar aspectos, romper barreiras, planejar estratégias, equilibrar poderes, redigir acordos e saber transformar funções. É pacífico e óbvio o fato de este mediador ser competente e conhecer o direito material relativo ao mérito da questão que está em discussão.18
Sem dúvidas é consenso que compete ao mediador conhecer o direito
material relativo ao mérito da questão em discussão, na mesma medida em que são
exigidas habilidades específicas, sem as quais frustar-se-iam o instituto da mediação
como processo de composição de conflitos.
Maria Nazareth Serpa apresenta em sua obra um interessante estudo
formulado por William E. Sinkin, onde demonstra o perfil do mediador, enumerando
suas características, quais sejam:
1. a paciência de Jó; 2. a sinceridade e as características do bulldog de um inglês; 3. a presença de espírito de um irlandês; 4. a resistência física de um maratonista; 5. a habilidade de romper barreiras de um halfack; 6. a personalidade, à prova de investigação, de um bom psiquiatra; 7. a astúcia de Maquiavel; 8. a impenetrabilidade de um rinoceronte; 9. a discrição de um mudo; 10. a capacidade de demonstrar integridade e personalidade; 11. fé no voluntarismo em contraste com a imposição; 12. crença fundamental nos valores humanos e potenciais, moderados pela habilidades de
acesso às fraquezas e fortalezas pessoais; 13. aguçada habilidade para analisar o que é disponível, em castrastes ao que pode ser
desejável; 14. a sabedoria de Salomão; 15. suficiente vigor pessoal e ego, qualificados por disposição de se auto-anular.19
18 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit., p. 69. 19 SERPA, Maria de Nazareth. Op. cit. p. 218.
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Cônsono Zoraide Amaral de Souza20, nos Estados Unidos, por volta dos anos
de 1992 a 1994, formou-se um comitê composto de dois delegados da American
Arbitration Association, dois delegados da American Bar Association e dois delegados
da Society of Professionals in Dispute Resolution, que prepararam um documento que
recebeu a denominação de Modelo-Padrão de Conduta para Mediadores (Model
Standards of Conduct for Mediators).
A criação deste modelo objetivava aperfeiçoar o instituto da mediação,
servindo como guia dos mediadores, estimulando o reconhecimento do instituto,
aumentando sua confiabilidade perante a sociedade.
O Modelo-Padrão revela as características e princípios básicos da Mediação,
quais sejam:
1. Autodeterminação – o mediador deve reconhecer que a mediação é baseada no princípio da autodeterminação pelos envolvidos. As partes devem alcançar um acordo voluntário, sem imposição ou coerção e qualquer espécie.
2. Imparcialidade – o mediador deve manter-se eqüidistante.
3. Conflitos de interesses – um mediador deve esclarecer qualquer conflito de interesses que de alguma forma ele envolva, sendo este materializados ou de possível ocorrência, e que seja por ele conhecido. Após a revelação, o mediador deve interromper o processo, a não ser que as partes decidam mantê-lo.
4. Competência – o mediador precisa possuir as qualificações necessárias para atender razoavelmente às expectativas das partes.
5. Confidencialidade – ao mediador é vedado revelar qualquer informação que alguma das partes a ele solicite que seja mantida em sigilo, somente podendo revelar qualquer informação quando por determinação legal ou autorizado pelas pares.
6. Qualidade do processo – o mediador deve trabalhar para garantir a qualidade do processo de uma maneira justa e desenvolver o mútuo respeito entre os envolvidos.
20 ibidem. P. 73.
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7. Anúncios ou solicitações – anúncios e qualquer outra espécie de comunicação acerca dos serviços oferecidos pelo mediador ou acerca de sua educação, treinamento, etc.
8. Custo – faz-se necessário por parte do mediador o esclarecimento antecipado e integral das bases de compensação, os custos e honorários para as partes. As partes precisam saber de antemão os honorários do mediador para decidir se desejam mantê-lo ou não; assim como também deve ser esclarecido o tempo de duração deste processo.
9. Obrigações para com o processo da Mediação – os mediadores têm o dever de conhecer prática da mediação, que consiste em desenvolver o espírito do consenso no seio da sociedade, contribuindo para educar às pessoas de forma a fazerem o melhor uso possível desse mecanismo.21
2.2 – CONCILIAÇÃO
A conciliação, segundo os historiadores do direito, como forma de solução
de conflitos de interesses, como é intuitivo, surgiu com a própria civilização
organizada, tendo esta vigorado na antigüidade entre os sumérios22, os gregos e
posteriormente os romanos.23
Os "Forais Portugueses" previam de modo expresso a conciliação, após as
"Ordenações" que sempre trataram do tema com relevada atenção. Já o "Código de
Processo Criminal do Império de Primeira Instância com Disposição Provisória Acerca
da Administração da Justiça Civil" (Lei de 29 de novembro de 1832), em seu Título
Único, expressa apego à conciliação, ao estabelecer, a possibilidade de se recorrer ao
Juiz de Paz para a solução do litígio.
No "Regulamento 737" de 1850, a tentativa de conciliação novamente
aparece e é exigida antes da propositura da causa em procedimento contencioso.
Mesmo após a Proclamação da República, o "Regulamento" manteve seu 21 Ibidem, p. 74. 22 SILVA, Hélis Ferreira da. A Conciliação. Minas Gerais. Revista do Curso de Direito da Universidade Federal de Uberlândia, vol. 10, 1981. p. 264. 23 BORGES, Marcos Afonso. A conciliação no direito processual civil brasileiro. Rio Grande do Sul: Revista Jurídica, nº 171/19, 1989. p. 20
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prestígio sendo recepcionado inclusive pela Constituição Republicana de 24 de
fevereiro de 1891, e alguns Estados24 o mantiveram até a entrada em vigor do CPC de
1939, Lei Nacional, que não recepcionou o instituto da conciliação.
É bom lembrar que a partir do período republicano e na primeira fase do
Direito do Trabalho considerado emancipado, alguns órgãos foram destinados a
dirimir os conflitos de interesses trabalhistas, consoante relata Zoraide Amaral:
"a) Em 1907 – os Conselhos Permanentes de Conciliação e Arbitragem;
b) Em 1922 – os Tribunais Rurais Paritários (experiência localizada no Estado de São Paulo);
c) Em 1932 – as Comissões Mistas de Conciliação (com atribuição para apreciar os dissídios coletivos);
c) Em 1932 – as Juntas de Conciliação e Julgamento (com atribuição de conciliar os dissídios individuais);
d) Em 1934 – o Conselho Nacional do Trabalho (com atribuição para decidir conflitos entre empregadores e empregados, quando houvesse falhado a conciliação, nas hipóteses de estabilidade dos empregados e em outras questões decorrentes da legislação previdenciária)."25
Posteriormente, a CLT, de 1943, reviveu a conciliação em dois momentos da
audiência de instrução, no início e ao final. Por certo, os bons frutos da experiência
vivenciada pela prática do Processo Trabalhista fez com que os legisladores do Código
de Processo Civil de 1973 recolocassem a conciliação no altar que merece em bons
Códigos, ou seja, previsão expressa de tal oportunidade na Seção II, do Capítulo VII .
Mas a conciliação da maneira como estava no Código não vinha conduzindo
a bons resultados, quer por falta de preparação dos juízes em nível de "técnicas de
24 O Código de Processo Civil e Comercial e São Paulo incluía em seu art. 368, nos processos preparatórios, a conciliação prévia, de caráter facultativo. 25 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. Cit. p.58.
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conciliação", quer pelo momento processual de sua ocorrência. Então, em boa hora,
visando corrigir esse último empecilho, o legislador nacional, auscultando os ecos da
doutrina e valorizando o trabalho de comissão de estudos da Escola Nacional da
Magistratura, encabeçada pelo Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, houve por bem
aprovar projeto que se consubstanciou na Lei nº 8.951/94, acrescentando, entre outras
modificações, o inciso IV ao art. 125 e dando nova redação ao art. 331 e parágrafos do
CPC, revolucionando o instituto.
Divisado o escorço histórico da conciliação, esta, tal como a mediação e
arbitragem, é uma forma de resolução de conflitos de interesses que também se vale de
terceiros imparciais.
Maurício Godinho Delgado assevera que:
"A conciliação, por sua vez, é o método de solução de conflitos em que as partes agem na composição, mas dirigidas por um terceiro, destituído do poder decisório final, que se mantém com os próprios sujeitos originais da relação jurídica conflituosa. Contudo, a força condutora da dinâmica conciliatória por esse terceiro é real, muitas vezes conseguindo implementar resultado não imaginado ou querido, primitivamente, pelas partes."26
Athos Gusmão assevera que tanto maior será a "probabilidade de êxito da
conciliação quanto maior é a autoridade da pessoa que a tenta".27
Tal afirmativa induz à conclusão de que o conciliador deve ser alguém que
evidentemente valorize a função que exerce. Assim, quer seja pela via extrajudicial,
quer seja pela via judicial, ele deve buscar sempre o respeito de todos os partícipes do
conflito, sendo que no caso da via judicial, cujo papel de mediador, normalmente, é
exercido pelo magistrado, há que se buscar o respeito dos jurisdicionados não pela
força processual que dispõe, não com gritos e murros na mesa, mas deve sempre
pautar pelo elevado nível das suas atitudes, inclusive as pessoais. Neste particular
26 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3 ed. São Paulo: LTr. 2004 , p.1447 27 CARNEIRO, Athos Gusmão. A conciliação do novo CPC. São Paulo: Revista AJURIS nº 2. 1974, p. 89.
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lembramos a lição de Sidnei Agostinho Beneti, para quem:
"O próprio modo de ser, o gesto, o traje, o andar, a voz, controle pessoal, tudo, a rigor, evidencia o Juiz ao pessoal forense e à sociedade a que serve. E evidencia a todo instante, na Sala de Audiências, no Fórum, na rua, na convivência pública, nas festividades e no lazer, ou mesmo no trato particular, até na intimidade. A família do Juiz, por sua vez, completa o quadro de mensagens mudas provindas da personalidade do Juiz, afirmando-lhe ou derruindo-lhe a credibilidade, pelo exemplo da própria casa".28
Assim, corretíssima a inter-relação entre o êxito na conciliação e a
autoridade moral daquele que a tenta, maior esta, maiores as chances do acordo em
audiência ou extrajudicial. Então, é de boa técnica valorizar o conciliador e a função
que exerce.
É comum o emprego terminológico da conciliação como sinônimo da
mediação, embora tais institutos apresentem diferenças cruciais, destacando-se que o
conciliador, dentro de um processo conflituoso, opina e propõe soluções, por meio de
profícuo diálogo entre as partes, buscando derrogar todos os elementos conflituosos,
induzindo-as ou persuadindo-as a uma negociação. Para este desiderato, vale-se de
suas próprias possibilidades de argumentação e de persuasão, daí a importância do
conciliador possuir conhecimento do tema em conflito, imparcialidade e ascendência
sobre as partes, sob pena de sua atuação não ser exitosa. Já no procedimento da
mediação, como visto no título anterior, o mediador não opina, não sugere e nem
decide pelas partes.
2.3 – ARBITRAGEM
A arbitragem é uma forma de solução de conflitos, prevista em nosso 28 BENETI, Sidnei Agostinho. Curso de Deontologia da Magistratura. Tema: Deontologia da linguagem do Juiz. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 114.
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ordenamento jurídico pela Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 , que pode ser
utilizada quando estamos diante de um impasse ou conflito decorrente de um contrato.
No mundo, a arbitragem, no tempo, é imemorial.29 No Brasil, a arbitragem
tem lugar desde os tempos coloniais, normatizando-a a CF de 1.824, art. 160, a
Resolução de 26.07.1831, o Código Comercial de 1.850, o Regulamento 737, de
25.11.1850. No período republicano, O Código Civil e as Constituições de 1.934 e
1.937 a previram, e os CPCs de 1.939 e 1.973 também. A Constituição de 1.988 a
prevê nos parágrafos 1º e 2º do art. 114. A Lei 9.307/96 cuida especificamente do
instituto, revogando expressamente os dispositivos do Código Civil e do Código de
Processo Civil que tratam da matéria.
A pouca utilização da arbitragem era devido ao fato de não oferecer garantia
jurídica e ser muito burocratizada a forma de utilização. No dizer de Zoraide Amaral30
“é que embora existisse a lei, a dificuldade imposta por ela acabava por desestimular o
cidadão que pretendia utilizar a arbitragem, tantas eram as barreiras a serem
transpostas.” Basta lembrar que não outorgava obrigatoriedade de cumprimento à
cláusula contratual que previa a arbitragem, bem como a decisão arbitral precisava ser
homologada por um juiz.
Com a vigência da Lei nº 9.307/96 estas questões foram resolvidas, dando
maior amplitude e garantia ao sistema, que nas lições de Zoraide Amaral31 “é um
exercício de liberdade: liberdade de opção pela sua técnica e de afastamento, em
princípio, da jurisdição, no caso; liberdade de escolha, pelas partes, do procedimento a
ser obedecido; liberdade de indicação dos árbitros; liberdade de adotar a lei aplicável
ou a eqüidade.”
O conflito ou litígio será decidido por um árbitro, ou vários árbitros, sempre
em número ímpar escolhido pelas partes. O árbitro poderá ser qualquer pessoa maior
29 Consulte-se estudo de ALVIM, José Eduardo Carreira, in Tratado Geral da Arbitragem. Belo Horizonte: Livraria Mandamentos Editora, 2.000, p.17 e ss. 30 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p. 176. 31 Ibidem, p.176.
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de idade, no domínio de suas faculdades mentais e que tenha a confiança das partes.
Também deverá ser independente e imparcial, isto é, não pode ter interesse no
resultado da demanda e não pode estar vinculado a nenhum dos litigantes.
Consoante art. 1º da lei nº 9.307/96, qualquer controvérsia, conflito ou
desentendimento que diga respeito a direitos que as partes possam livremente dispor
pode ser resolvida por arbitragem. Assim, estão fora do âmbito de aplicação da
arbitragem questões sobre as quais as partes não podem efetuar transações; não podem
dispor como quiserem, tais como, as referentes ao nome da pessoa, estado civil,
impostos, delitos criminais etc. Enfim, todas as questões que estão fora da livre
disposição das pessoas e que só podem ser resolvidas pelo Judiciário.
Em regra geral, a utilização da arbitragem, as partes, em um contrato, devem
incluir uma cláusula contratual prevendo que os futuros litígios dele originados serão
resolvidos por este instituto. Pode estar disposta em um contrato, como referido, ou em
qualquer documento à parte assinado pelas partes. O nome jurídico desta disposição é
cláusula compromissória. Contudo, é possível utilizar a arbitragem mesmo quando não
exista cláusula contratual que a preveja, para isto a lei determina, após surgida a
controvérsia, as partes precisam estar de acordo e assinarão um documento particular,
na presença de duas testemunhas, ou por escritura pública. O nome jurídico desta
disposição é compromisso arbitral.
Conforme Leciona Wilson Ramos Filho32, a arbitragem pode ser
operacionalizada por meio da arbitragem institucional ou ad hoc. Na institucional, a
arbitragem operacionaliza-se quando em um contrato a cláusula arbitral se reporta a
uma instituição arbitral para administrar o procedimento. Também é chamada de
arbitragem administrada. Esta instituição tem um regulamento que determina como a
arbitragem deve transcorrer. Já na arbitragem ad hoc, são as partes que fixam as regras
32 RAMOS FILHO, Wilson. Nova lei de arbitragem e a solução dos conflitos coletivos de trabalho. Curitiba.
Revista Síntese Trabalhista, 91 - Jan/1997, pág. 121.
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e formas em que o processo arbitral será conduzido naquele caso específico. O
procedimento arbitral não seguirá as regras de uma instituição arbitral, mas as
disposições fixadas pelas partes, ou na ausência de disposição o procedimento será
aquele determinado pelo árbitro.
Importante, destacar, que tanto na arbitragem institucional como na ad hoc,
deverão ser observados princípios jurídicos que não podem ser afastados. Determina a
lei que as partes serão tratadas com igualdade, terão o direito de se manifestar para se
defender, o árbitro será independente e imparcial e fundamentará sua decisão.
Há que se destacar que a arbitragem é facultativa, portanto não é obrigatória,
isto é, as partes elegem a arbitragem num contrato se quiserem. Mas, a partir do
momento que escolhem a arbitragem, estarão obrigadas a cumprir o estabelecido no
contrato, não podendo propor ação judicial. Assim, a cláusula compromissória
devidamente pactuada é obrigatória e vinculante.
Em breve síntese, as vantagens em instituir a arbitragem, podem assim ser
relacionadas:
a) a rapidez, a arbitragem solucionará a questão no prazo fixado pelas partes e, se nada
for previsto a respeito, determina a lei que será em 6 (seis) meses;
b) o sigilo, a arbitragem é sigilosa. Nada do que for tratado poderá ser divulgado a
terceiros. As partes e os árbitros deverão guardar sigilo; diferentemente, portanto, do
processo judicial que é público.
c) a especialidade, o árbitro pode ser um especialista na matéria. Com isso, poderá ser
dispensada a perícia, porque o árbitro tem aptidão profissional para entender e decidir
a questão.
A arbitragem é custeada pelas partes, que poderão dispor a respeito
previamente. Poderão estabelecer que as custas serão divididas na metade, ou que o
árbitro decida.
O árbitro deve respeitar um código de ética, ser independente, imparcial,
competente, diligente e discreto. A lei diz que o árbitro se equipara ao funcionário
34
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público para fins penais, isto é, se o árbitro, por exemplo, foi subornado para decidir a
questão favorável a uma parte, será processado criminalmente e a sentença arbitral
será anulada. O árbitro também pode ser responsabilizado civilmente, por exemplo,
quando há prazo para dar a sentença e o árbitro não decide no prazo determinado,
quando poderia fazê-lo.
Importante, ainda, registrar que segundo o art. 32 e 33, § 1º da lei nº 9.307/96
a sentença arbitral poderá ser anulada – desde que proposta ação de anulação da
sentença arbitral, dentro do prazo de 90 dias - quando:
a)quem foi árbitro estava impedido;
b)quando a sentença não estiver fundamentada;
c) quando não decidir toda a controvérsia;
d) quando for comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção
passiva;
e) quando não observou os princípios da igualdade das partes e do direito de defesa;
f) quando for proferida fora do prazo.
Feita esta brevíssima exposição das linhas gerais da arbitragem, a seguir
analisaremos, com mais acuidade, a natureza jurídica da arbitragem e os requisitos,
finalidades e efeitos da sentença arbitral, possibilitando, assim compreender e focá-la
no aspecto de sua aplicação e legitimidade no conflito individual trabalhista, que será
objeto de estudo em capítulo próprio.
2.3.1 - A NATUREZA JURÍDICA DA ARBITRAGEM
Como já exposto, a arbitragem é uma das formas heterocompositivas de
solução de conflitos. Entretanto, ainda que um terceiro, que não seja juiz togado,
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receba das partes poderes para julgar controvérsias, nada obstante sob o pálio da lei, a
processualística ortodoxa se alevanta e, de pronto, nega-lhe qualquer poder
jurisdicional. Chiovenda33, embora privativista, ao classificar a natureza jurídica da
arbitragem devota a ela verdadeira aversão. Tem-na por “mero resíduo do passado,
quando um pródromo de melhor justiça futura.” Para ele, a arbitragem é totalmente
desprovida de jurisdição, porque o procedimento arbitral pertence à esfera contratual e
se compõe de um juízo lógico e de um comando, sendo certo que o laudo arbitral
depende de homologação judicial para ser executado. Contudo, lembra Carreira
Alvim34 que a posição de Chiovenda se situa no começo do Século XX , portanto antes
do advento da Lei italiana 28, de 1.983, quando o mestre entendia não ser o árbitro
funcionário público e não ter jurisdição, nem própria, nem delegada, não fazendo atuar
a lei e nada podendo executar, defluindo suas faculdades da vontade das partes,
expressas conforme a lei, afirmando ainda que o Estado tornaria executório o laudo
arbitral por ato de um órgão jurisdicional, visão essa que continua atual no art. 825 do
“Codice di Procedura Civile” o que, ex vi do art. 18 da Lei nº 9.307/96, não sucede,
com exceção da sentença arbitral estrangeira (art. 35, Lei nº 9.307/96).
Ludovico Mortara35 vê na convenção arbitral a fonte dos poderes do árbitro,
embora só a lei a tivesse permitido celebrar.
Não obstante o advento da Lei nº 9.307/96, que preencheu verdadeira lacuna
no ordenamento jurídico brasileiro, muitos ainda malquerem o instituto da arbitragem.
Sálvio de Figueiredo Teixeira36, contudo, investe contra os detratores, entendendo-os
como empecilhos à modernidade, corporativistas legalistas e formalistas exacerbados,
“sempre refletindo temor, preconceito e atraso, criando nessa área uma cultura de
resistência ao progresso sob os mais diversos e infundados argumentos.” Excessos à 33CHIOVENDA, Giuseppe, in Instituições de direito processual civil, tradução de J. Magalhães Menegale. São Paulo: Saraiva, 1.965, Vol. V, p. 11. 34 Ibidem, p.88. 35 MORTARA, Ludovico. In Comentario del codice e delle leggi di procedura. Milano, 1.923, Vol. III, p.34, “apud” J.E.Carreira Alvim, op. cit. p.59. 36 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A Arbitragem no Sistema Jurídico Brasileiro. In “A arbitragem na era da globalização”, coordenação de GARCEZ, José Maria Rossani, Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 15.
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parte, autores há que se abalançam acerca do tema. Entretanto, é correto afirmar que a
Lei nº 9.307/96 explicita que o árbitro é juiz de fato e de direito (art. 18, no que repete
o revogado art. 1.078 do CPC/73), o árbitro pode regular o procedimento (art. 21), a
sentença (e não laudo) que proferir, produz, entre as partes e sucessores, os efeitos da
sentença judicial e, sendo condenatória, é título executivo (art. 31), a sentença arbitral
deve obedecer a requisitos obrigatórios (art. 26), sob pena de nulidade (art. 32, I),
donde irrefutável a jurisdicionalidade da arbitragem. Resume Nelson Nery Junior37 que
“o árbitro exerce verdadeira jurisdição”, visto que “com a substituição do juízo
arbitral, as partes não estão renunciando ao direito de ação nem ao juiz natural. Apenas
transferem a jurisdição, ordinariamente exercida por um órgão estatal, para um
destinatário privado”
Carreira Alvim38 expõe, acerca da fonte da jurisdicionalidade da arbitragem
com esta verve didática:
“O Estado cumpre seus objetivos jurídicos, políticos, econômicos e sociais através de ‘órgãos-ente’, ou unidades de ação estatal concretamente determinadas, mas cumprem-nos também através de órgãos que só indiretamente poder-se-iam dizer compreendidos na sua estrutura; verdadeiros ‘órgãos-pessoa’, ou particulares aos quais reconhece, em determinada medida, uma parcela do seu poder e cujas decisões ela chancela com o selo da sua autoridade, outorgando-se-lhe idêntica eficácia à qual confere às decisões dos seus próprios órgãos.”
Prossegue, escrevendo:
“Quando o Estado permite que as partes interessadas se valham do juízo arbitral, não está, na verdade, transigindo com o monopólio da jurisdição, mas, ao contrário, reafirmando-as, na medida em que permite que ‘órgãos-pessoa´ (juízo arbitral) sejam investidos do poder de julgar; e reafirmando-as quando impõe determinados princípios a serem observados na formulação desse juízo, reconhecendo-o legítimo, no mesmo pé de igualdade com o formulado pelos ‘órgão-ente’ (juízo estatal), integrantes do próprio Poder Judiciário. Tanto assim é que admite a arbitragem apenas em determinadas hipóteses - direitos patrimoniais disponíveis - e não permite a justiça privada ao largo dessa limitação.”
37 JÚNIOR, Nelson Nery. in Princípios do processo civil na Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1992, p.72. 38 Ibidem, p.54-55.
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37
Conclui Carreira Alvim que o que as partes convencionam é submeter o
litígio a julgamento do juízo arbitral, porque o poder de julgar outorgado ao árbitro, tal
como ao juiz togado, provém da lei, e assim sendo, não cabe as partes delegar a
jurisdição ao árbitro, visto que só a lei (Estado) pode fazê-lo, pois só ela “disciplina
em toda a sua extensão o exercício da atividade arbitral e a eficácia do produto que
resulta dela (sentença arbitral).”39
Sob outra ótica, e vale a pena trazê-la, José Carlos Magalhães, assenta que:
O Estado nada mais é do que a estrutura jurídica da comunidade nacional, e que a jurisdição, ou seja, a autoridade para declarar o direito, quem a tem é a comunidade, ou a nação e não o Estado.
“Se o indivíduo e, em conseqüência, a comunidade vem antes do Estado, a jurisdição que este exerce é delegada - e não originária -, como, aliás, expresso em todas as Constituições brasileiras, exceto a de 1.891 (...). Essa noção é fundamental para compreender o caráter jurisdicional da atividade do árbitro. A jurisdição de que [o árbitro] se acha investido é a mesma do juiz estatal, com diferença de que sua autoridade jurisdicional decorre diretamente das partes, enquanto a do juiz, da comunidade como um todo, expressa na Constituição. Por isso, não é despropositado falar em jurisdição da comunidade, ou dos indivíduos que a compõem, pois são estes que o delegam ao Estado, por meio da Constituição, conferindo-lhe o poder delegado para declarar, em seu nome, o direito. E é a comunidade que reservou para si prerrogativa não transferidas ao Estado, como a de resolver controvérsias de caráter patrimonial diretamente, sem a interferência do Estado, além de outras.” 40
Visto tratar-se a arbitragem de espécie de justiça privada, considerando-se o
árbitro como juiz de fato de direito (art. 18 da Lei nº 9.307/96), é inegável exercício
por ele da jurisdição visando à pacificação social na dirimência de conflitos de
interesses acerca de direitos patrimoniais disponíveis.
A lume de todo o exposto até aqui, resume-se no sentido de que a arbitragem
é instrumento da jurisdição em sede privada. Ela vem disciplinada pela ordem jurídica,
39 Ibidem. p.57. 40 MAGALHÃES , José Carlos. In prefácio do livro “Comentários à lei brasileira de arbitragem”, de Irineu Strenger. São Paulo: LTr, 1.998, p.11-12.
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38
que estabelece as hipóteses em que as partes podem dela lançar mão, as regras de
procedimento, a eficácia da decisão (sentença arbitral) e os casos de nulidade. O
árbitro, apesar de não deter o “ius imperii”, detém a “iurisdictio”, que lhe atribui o
poder de decidir.
Destarte, concluída a análise a cerca da natureza jurisdicional da arbitragem,
mister se faz o estudo sobre a sentença arbitral, suas características, requisitos,
finalidades e efeitos, para que possamos, numa fase posterior, analisar e enfrentar a
celeuma em torno da aplicabilidade da Lei nº 9.307/96 aos conflitos individuais
trabalhistas.
2.3.2 – A SENTENÇA ARBITRAL
A sentença arbitral - e não laudo, visto, hoje, divergentes seus requisitos,
finalidades e efeitos -, terá os mesmos requisitos da sentença judicial (art. 26 da Lei nº
9.307/96): relatório, motivação e dispositivo, acrescido de mais um, que é a data e
lugar em que foi proferida (inciso VI, art. 26, Lei de Arbitragem), cuja importância é
relevante, face aos efeitos relativos à nacionalidade e aos prazos legais ou concertados.
A atividade arbitral poderá ser homologatória de acordo, e poderá, a pedido
das partes, declarar tal fato mediante sentença, pois, em caso de transação obtém-se
título bastante a permitir a execução forçada perante o juízo estatal (art. 28 da Lei nº
9.307/96, art. 584, III, do Código de Ritos). Adiante cuidar-se-á da relevância ou não
da homologação para as partes acordantes.
A sentença arbitral é irrecorrível (art. 18 da Lei de Arbitragem), mas nada
impede às partes convencionarem o reexame por outro órgão arbitral (v.g., tribunal
arbitral, no caso, superior) ou árbitros, mediante recursos internos, embora tal arte não
seja recomendável.
Nelson Nery Junior, mesmo antes do advento da Lei nº 9.307/96, percebera
39
39
ausência de diferença entre sentença arbitral e judicial, assim obtemperando:
“Ambas, ao nosso ver, constituem exteriorização do poder jurisdicional. Apenas se distanciam quanto ao aspecto confiança, que preside o negócio jurídico do compromisso arbitral, estando ausente na jurisdição estatal, cujo órgão não pode ser escolhido pelas partes e cuja sentença é imposta coativamente aos litigantes. Enquanto no compromisso arbitral as partes convencionam acatar a decisão do árbitro, na jurisdição estatal o réu é compelido a responder ao processo, ainda que contra sua vontade, sendo as partes obrigadas a obedecerem o comando emergente da sentença.” 41
Da sentença, pode a parte interessada solicitar do árbitro (opor “embargos
declaratórios”) que corrija erro material ou esclareça alguma obscuridade, dúvida ou
ponto omitido a respeito do qual deveria manifestar-se a decisão (art. 30, da Lei nº
9.307/96).
Pode a sentença arbitral ser alvo de nulidade, em ação anulatória ajuizada
perante o juiz togado, na forma dos artigos 21, 33 e 34 da Lei nº 9.307/96. Proferida,
produz ela, entre as partes e seus sucessores, efeitos da sentença judicial (art. 31). Vale
dizer: idêntica à sentença judicial, proferida a arbitral de mérito, constitui ela coisa
julgada às partes, não beneficiando ou prejudicando terceiros. De lembrada, “tout
court”, a coisa julgada é a imutabilidade dos efeitos de uma sentença, impedindo às
mesmas partes a repropositura da mesma ação em juízo, seja arbitral, seja estatal.
A sentença arbitral, tal como dispõe a Lei nº 9.307/96, tão logo é proferida, e
ultrapassada, quando for o caso, a fase de eventual interposição de “embargos
declaratórios”, transita em julgado, porque irrecorrível, produzindo efeitos da coisa
julgada formal e material, se de mérito. Em outros termos, a imperatividade e a
imutabilidade da sentença arbitral dá-se imediatamente ao seu proferimento. Lembra
Carreira Alvim que a expressão “mesmos efeitos”, do art. 31 da Lei de Arbitragem,
41 JUNIOR, Nelson Nery. Op. cit. p 77.
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possui o seguinte sentido:
“mesmo conteúdo substancial (declaratório, condenatório ou constitutivo), com idêntica qualidade (e grau de eficácia), que lhe dá autoridade de coisa julgada além do processo em que foi proferida. Sob este aspecto, não existe a menor diferença entre a sentença arbitral e a sentença judicial, senão que a primeira não se sujeita a recurso, sujeitando-se, porém, à ação de nulidade; e a segunda, aos recursos cabíveis e à ação rescisória.” 42
E, coerentemente com raciocínio expendido acerca da jurisdição arbitral,
“supra”, aduz Carreira Alvim:
“Essa equivalência de efeitos e eficácia é que coloca a sentença arbitral no mesmo patamar da sentença judicial, pondo em evidência serem, ambas, expressão da vontade do Estado, que nelas coloca o selo da sua autoridade, só que num caso expressa através de órgão-ente (juiz), e, no outro, através de órgão-pessoa (árbitro).” 43
No que tange aos limites subjetivos da coisa julgada arbitral, aplicável é a
regra fundamental que advém do direito romano (res inter alios iudicata tertio nec
nocet nec procedat) tal como o é para o caso das sentenças estatais, até porque de
lembrar que a sentença arbitral é produto de um processo que tem por base uma
convenção de arbitral firmada por interessados.
De acordo com o art. 31 da Lei nº 9.307/96, as partes e seus sucessores se
obrigam a respeitar a sentença, que passa em julgado relativamente a eles, produto da
convenção arbitral; os terceiros, entretanto, não se obrigam a respeitá-la porque, para
eles, embora eficaz, passa em julgado. Certo, entretanto, que se o terceiro intervier,
espontaneamente ou a convite do árbitro, ou porque cristalizado o litisconsórcio
necessário, facultativo ou adesivo no processo arbitral, à sentença arbitral se obrigará,
vez que comporá, de alguma forma, a convenção arbitral.
A sentença arbitral, como cediço, rende ensejo à nulidade, conforme arts. 31,
42 ALVIM, Carreira. Op. cit. p.447. 43 Id, p. 447
41
41
32 e 33 da Lei nº 9.307/96. Nada obstante não haja consenso a respeito entre os
autores, os casos elencados no art. 32 são taxativos, permitindo ao interessado ajuizar
ação de nulidade no prazo decadencial de 90 dias. Também poderá ser impugnada pelo
executado em sede de embargos do devedor, observados os limites do art. 741 do
CPC. Afasta-se a hipótese de litispendência, em caso de o executado da sentença
arbitral ajuizar ação de nulidade devendo, porém, as duas demandas correr perante o
mesmo Juízo.
Dissentem os autores quanto ao cabimento da ação rescisória de sentença
arbitral, sendo que, Carmona, de seu turno, é incisivo quando assevera que o rol do art.
32 da Lei de Arbitragem aumenta a garantia às partes. Diz ele:
"É o caso de previsão do inciso VI do art. 32, que incorpora um dos casos de rescindibilidade da própria sentença estatal, reforçando a credibilidade da via arbitral como meio eficaz e seguro para a solução de controvérsias. Da mesma forma, o inciso VIII prestigia a garantia do ‘due process of law’ ao estabelecer que a violação dos princípios estipulados no art. 21, § 2º, pode levar à destruição da sentença arbitral. Diante da redação do dispositivo legal citado, não hesito em afirmar que não cabe ação rescisória de sentença arbitral, sendo inaplicável, portanto, o disposto no art. 485 do Código de Processo Civil.” 44
Bem de ver que, salvo por consenso das partes, o que retrataria
inconveniência palmar, admitir-se-ia ação rescisória de sentença arbitral, mas somente
contra aquelas em que o árbitro não decidiu por eqüidade e, coerentemente com o
espírito da Lei de Arbitragem, em sede do juízo arbitral. Contudo, caso as partes
tencionassem rescindir a sentença arbitral, deveriam fazê-lo no prazo decadencial de
90 dias, mesmo que sob alegação de uma das hipóteses do art. 485 do CPC. Esta
solução, entretanto, nada obstante guarde conteúdo ético ou moral, não se coaduna
42
42
com o espírito da Lei de Arbitragem.
De remate, para concluir com Carreira Alvim:
“A arbitragem não pode ser considerada um simples equivalente jurisdicional, porquanto não proporciona um resultado ‘equivalente’ à sentença, mas uma ‘verdadeira e própria’ sentença, em tudo e por tudo idêntica, em valor jurídico e eficácia, à que se obtém através da jurisdição estatal. É um ato jurisdicional que, se não chega ao nível da jurisdição estatal (que contém o ‘iudicium’ mais o ‘imperium’), também não se detém nos lindes dos meros equivalentes jurisdicionais, que dependem de uma ‘integração’, por novo ato jurisdicional. A decisão do árbitro não ‘equivale’ a uma sentença; ela é uma sentença; a eficácia da sentença arbitral e a autoridade da coisa julgada que resulta dela não têm nenhuma diferença daquela que qualifica a sentença judicial.” 45
44 CARMONA, Carlos Alberto, in Arbitragem e Processo. São Paulo. Malheiros Editores, 1.998, p. 39. 45
Ibidem. p. 89.
43
43
3. UM ESTUDO NO DIREITO COMPARADO
Os procedimentos e os órgãos encarregados de solucionar os conflitos de
trabalho são muito variados no direito comparado. Em muitos países, conforme
veremos adiante, os dissídios individuais devem ser submetidos, inicialmente, a um
órgão de conciliação e/ou mediação instituídos por lei, convenção ou contrato coletivo
e/ou, com o mesmo objetivo, constituir a fase preliminar do processo a ser julgado
pelos tribunais ou conselhos competentes para a respectiva decisão. Os conflitos
trabalhistas, uma vez configurados, observam, em seqüência, na maioria dos países, os
seguintes procedimentos, conforme sintetiza Arnaldo Süssekind :
“a) negociação direta entre as partes em litígio; b) negociação sob a supervisão de mediadores; c) submissão facultativa ou compulsória do litígio a árbitros privados ou a tribunais ou conselhos estatais. Nesta hipótese, o laudo arbitral ou a decisão terá: a) natureza declaratória, nas controvérsias coletivas de direito; b) natureza constitutiva, nos conflitos coletivos de interesse (pretensões sócio-econômicas).”46
De fato, além da solução judicial, a grande maioria dos países é dotada de
organismos especiais, administrativos para composição dos conflitos trabalhistas,
conforme verifica-se a seguir.
46 SÜSSEKIND, Arnaldo. Tribunais do Trabalho no Direito Comparado e no Brasil. Brasília: Revista do TST, vol. 65, nº 1. 1999, p. 115.
44
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3.1. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
O sistema Americano está baseado na descentralização, ou seja, no baixo
grau de centralização do contrato coletivo e no voluntarismo privado, embora dependa
dos tribunais para a homologação dos contratos de arbitragem no tocante aos laudos
arbitrais, ainda que, na prática, na maioria dos casos as partes cumprem sua cota.
Segundo Daniel Riojas47, as experiências ligadas à arbitragem obrigatória
seja nos EUA, na Europa ou na Austrália, estão relacionadas à pressões externas,
particularmente à existência de um estado de Guerra – tanto a Primeira quanto a
Segunda -, no qual existia a necessidade da manutenção de um nível de produção e de
regulação dos níveis salariais, em razão da alta inflação. Tendo a medida,
originalmente, caráter temporário.
Nos EUA, v.g., 90% dos contratos coletivos dispõem que as controvérsias
serão resolvidas por árbitros privados. Lá a arbitragem pode ser de duas formas:
arbitragem de queixas (grievance arbitration), que tem por objetivo dirimir as
controvérsias oriundas das convenções coletivas, isto é, conflitos de natureza jurídica a
respeito de aplicação ou interpretação desses convênios, e arbitragem de interesses
(interest arbitration), destinada à fixação de novas condições de trabalho, como
salários, horários, pensões e vantagens sociais.
Há duas alternativas: os árbitros são escolhidos pelas partes livremente, em
agências especializadas como a FMCS (Federal Mediation and Conciliation Service),
órgão público; AAA (American Arbitration Association), órgão privado. Ressalte-se
47 FUNES DE RIOJA, Daniel. Negociación y mediación en conflictos colectivos de trabajo, in Julio Gottheil, Adrina Schiffrin e outros, Mediación, una transformación en la cultura, Buenos Aires: Paidos, 1996, p.103.
45
45
que os árbitros considerados mais competentes são os oriundos da National Academy
of Arbitration.
Laerte Augusto Galizia48 aponta que, criada em 1926, a AAA – Associação
Americana de Arbitragem é uma organização privada de serviço público, sem fins
lucrativos, com escritórios espalhados que fazem mediação, arbitragem, intercessão
etc., além de cursos e publicações.
Em 1993 foi criado o Comitê Deliberativo de Trabalho da Califórnia
Setentrional, que elaborou as Normas para a Resolução de Questões Trabalhistas da
Califórnia – formado por 14 advogados, diretores, juízes aposentados e árbitros, que
por seu sucesso difundiu-se por todo o país, renomeadas como Normas Nacionais para
Resolução de Questões Trabalhistas.
A American Arbitration Association administra os programas de resolução
de conflitos dentro dos padrões estabelecidos pelo Due Process Protocol (que é um
protocolo de processo devido para a mediação e arbitragem, elaborado em 1995)
encaminhados pelo empregador, mediante a apresentação de um Plano de resolução de
questões trabalhistas, que se não estiver dentro dos padrões mínimos pode ser
recusado.
Assim, a arbitragem é feita por um órgão de decisão que aprecia a
controvérsia ou reivindicação fora do contrato, o não cumprimento do mesmo sob as
Normas Nacionais, proferindo decisão que pode ser apresentada no tribunal que tenha
jurisdição sobre o mesmo, a saber: de interesses – que define os contratos ou, de
direitos – onde já existe um contrato e arbitra direitos.
No entanto, os altos custos e o procedimento cheio de formalidades são os
maiores problemas do sistema de arbitragem americano.
Já a mediação é feita por um facilitador, o qual promove uma discussão
mediada, sendo pessoa neutra que sugere solução sem impô-la. A mediação poderá ser
48 GALIZIA, Laerte Augusto. Reaprendendo a negociar nas relações trabalhistas. São Paulo: Câmaras Brasileiras do Livro, Pancrom, 1996, p. 87.
46
46
autônoma ou prévia à arbitragem ou outro procedimento.
Esses procedimentos de resolução de conflitos podem constar de um manual
coletivo de trabalho ou ser usados num determinado conflito. Mas não se aplicam a
questões alheias aos acordos coletivos.
Outro processo que se encontra nos Estados Unidos da América é a técnica
denominada fact-finding, que é uma forma de mediação obrigatória, muitas vezes
referida como conciliação obrigatória, de feição própria, pois mescla mediação e
arbitragem.
Rioja49 esclarece que nos EUA o procedimento denominado fact-finding é
obrigatório e está relacionado a um sistema no qual inexiste direito de greve. Assim, o
fact-finding é o ultimo recurso legal nas relações laborais. Nesse caso, não há sanção
alternativa para os empregados, para os quais não há outras opções, além do que não
há obrigatoriedade nas suas decisões por parte dos empregadores.
Apesar desta dificuldade este procedimento continua existindo como uma
técnica de solução dos conflitos, em particular nos setores públicos. Atualmente, a
discussão sobre o fact-finding não se limita à sua aplicação ou não, mas em torná-lo
mais efetivo.
Inclui a designação de um terceiro neutro, distinguindo-se dos acordos de
conciliação que são tripartites. Apesar das críticas, o fact-finding continua sendo
praticado e goza de prestígio por sua contribuição para a solução dos conflitos.
Outro método alternativo utilizado nos Estados Unidos da América que
merece citação é o denominado ombudsman, onde um oficial indicado por uma
instituição tem a função de investigar queixas e prevenir litígios ou facilitar a sua
solução dentro da própria instituição. Dentro de suas prerrogativas, inclui
investigações, publicações e recomendações.
Zoraide Amaral50 esclarece que nas grandes empresas, o papel do
49 Ibidem, p. 101. 50 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p. 89.
47
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ombudsman é importante, principalmente, nas questões de salário e benefícios,
avaliações de desempenho, segurança no trabalho, disciplina, despedimento,
discriminação e assédio, ética e fiscalização, condições de trabalho, saúde pessoal,
conflitos entre trabalhadores, práticas gerenciais, etc.
3.2. Na Alemanha
Na Alemanha a arbitragem é utilizada tão somente para a interpretação de
contratos coletivos (não é permitida, salvo em raras exceções, nos conflitos
individuais). Há livre negociação sobre a forma de reajuste a cada ano e acordo de
âmbito geral que duram de cinco a dez anos, que são registrados e têm força de lei.
Nos acordos há uma cláusula de obrigatoriedade de paz durante toda a sua vigência
que impede a eclosão de greves.
Há uma cultura de democracia participativa implementada desde o pós-
Segunda Guerra, imposta pelos vencedores, em particular na indústria do carvão e do
aço (fornecedores de matéria-prima para a indústria bélica alemã), consubstanciada
nos direitos de participação e co-gestão na empresa que são exercidos por uma
Comissão de Trabalhadores e similares (delegados sindicais), previsto na Lei
Constitucional de Empresas. Além do que há a participação dos representantes dos
trabalhadores e suas entidades de classe nos órgãos de gestão das empresas, através
das leis de co-gestão empresarial, configurando-se, dessa forma uma verdadeira justiça
coexistencial, bem aos moldes do que propugna Cappelletti51.
A Lei Constitucional de Empresas – BetriebsverfassungsgesetzI – de 1972
regula as relações entre empregadores e empregados, prevendo a existência de uma
representação coletiva dos interesses dos operários - comissão de trabalhadores. Nela
51 CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1998, p. 39 e ss.
48
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estão previstos a organização interna da empresa e execução das tarefas, tais como,
nomeação, demissão, limitações ao poder diretivo do patrão em defesa do assalariado e
alocação de recursos humanos. Além da celebração de acordos que podem ser formais
ou verbais com os patrões, na solução dos possíveis litígios entre trabalhadores e
empresa.
Prevê a eleição de empregados ou sindicalistas para os conselhos fiscais das
empresas co-geridas com plenos poderes. Tal participação tem como efeitos o respaldo
das decisões, bem como a proteção e o resguardo do direito do trabalho.
Os delitos contra os órgãos constitucionais de empresa e seus membros são
punidos com pena privativa de liberdade de até um ano ou multa.
3.2.1. A internacionalização da experiência alemã na solução de conflitos laborais
A Revista Trabajo, da OIT, em sua edição de número 36, set/out-2000,
apresenta matéria que expõe o quão avançadas se encontram as relações entre capital e
trabalho numa empresa transnacional de origem alemã, a Volkswagen, que possui
fábricas espalhadas por todo o mundo e cuja Comissão de Empresa, por conta de
acordo firmado, criou, em 1999, um Comitê Mundial de Empresa, formado por
representantes dos trabalhadores em todos os centros pertencentes ao grupo
Volkswagen, internacionalizando definitivamente as atividades dos representantes dos
empregados da empresa automobilística.
O caminho para a criação desse Comitê foi aberto em 1990, com a criação de
uma Comissão de Empresa de caráter continental, composta por membros oriundos
das diversas fábricas da Volks na Europa, com sede em Wolksburg.
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De acordo com a matéria veiculada na referida revista, constata-se que:
“o grupo concede amplos direitos de informação aos representantes dos trabalhadores, tanto em nível local como internacional. O Comitê de Empresa Mundial não conta com direitos de participação, de acordo com a lei alemã de comitês de empresa. Não obstante, a lei alemã de participação dos trabalhadores concede aos membros locais a possibilidade de exercer influência nas operações estratégicas de ultrapassem os limites de um centro específico, já que tais operações podem vir a afetar os centros alemães”... “seu objetivo é promover o intercâmbio de informação sobre a evolução e as estratégias do grupo de conjunto, e garantir que os interesses de cada sede sejam levados em conta de modo equilibrado e conforme o espírito de solidariedade”.
Exemplos relacionadas à atuação político-sindical desse Comitê de
amplitude e composição operária internacional da representação laboral são fornecidos
utilizando-se dois conflitos setorizados que ocorreram na fábrica situada em
Uitenhage, África do Sul e aqui no Brasil, em São Paulo, a despeito de, no primeiro
caso, as negociações das quais o Comitê tomou parte terem sido infrutíferas.
Na África do Sul, em janeiro de 2000, mesmo com a intervenção do Comitê
Mundial, não foi possível evitar a demissão de 1.300 trabalhadores da fábrica
localizada em Uitenhage, devido ao fato de que dos delegados eleitos para negociar
com a direção, uma parte deles se negava a abrir mão de certas conquistas alcançadas
ao longo do processo de superação do sistema apartheid, o qual, os próprios
sindicalistas alemães contribuíram para derrotar.
Esta radicalização levou a uma sucessão de greves espontâneas que
culminaram com a expulsão dos treze delegados que se opunham às medidas de
flexibilização das relações do trabalho em contrapartida à manutenção de parte dos
empregos, por iniciativa da NUMSA – a entidade sindical sul-africana. Esta
radicalização exacerbada da situação de resistência de parte dos líderes sindicais
comprometeu o processo negocial entre os representantes sindicais e a empresa.
Assim, foram promovidas as demissões e posteriormente realizadas novas contratações
pela empresa que se recusou a rever as demissões decorrentes do processo grevista.
50
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No Brasil, entretanto, a experiência foi oposta.
No final dos anos 90 o país atravessava um período difícil, marcado pela
crise econômico-financeira que abalou os países denominados “Tigres asiáticos” e a
América do Sul, tendo como conseqüência a possibilidade de haver um processo de
demissões em massa na fábrica da Volkswagen localizada em Anchieta/São Bernardo,
no estado de São Paulo, onde está a sede central do grupo no Brasil, contando com
cerca de 18.000 postos de trabalho.
O presidente do Comitê Mundial de Empresa, Klaus Volkert, da sede central
de Wolfsburg, intercedeu pessoalmente no conflito que se instalou, participando
ativamente das negociações com a direção local da empresa, que resultaram num
pacote de medidas similar ao da “Alianza para el Trabajo” de Wolfsburg, composto
por redução da jornada de trabalho com redução salarial, além de outras medidas de
flexibilização, mas com garantias futuras de manutenção do emprego.
Houve resistência por parte dos empregados num primeiro momento, em
particular na questão relativa ao reajuste salarial acordado, mas foram mantidos os
postos de trabalho, pelo menos naquele momento.
O saldo mais importante dessa experiência, sem dúvida, foi a superação da
barreira das fronteiras nacionais entre os representantes operários na defesa de seus
interesses de classe, rumo a um sindicalismo autônomo, livre e internacional, com
condições de fazer face à nova feição globalizada das relações capital/trabalho,
utilizando métodos negociais que possam promover a coexistência harmoniosa dos
interesses próprios da patronal, quais sejam, seus lucros, com uma situação de respeito
aos direitos e garantias fundamentais dos empregados que envolva desde a questão da
remuneração e das condições de trabalho até a própria gestão da empresa.
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3.3. Argentina
Um estudo sobre a experiência argentina relativa aos meios autônomos e
heterônomos de resolver as pendências entre o capital e o trabalho, reporta-nos, em
primeiro lugar, à Lei nº 25.573, de 1995, que assim dispõe em seu art. 1º:
Art. 1º - Institui-se em caráter obrigatório a mediação prévia a todos os juízos, mediação esta que será regida pelas disposições da presente lei. Este procedimento promoverá a comunicação direta entre as partes para a solução extrajudicial da controvérsia.
As partes ficarão isentas do cumprimento deste trâmite se provarem que, antes do início da causa, existiu mediação perante os mediadores registrados pelo Ministério da Justiça.
Eis que, desde 1995, para combater a excessiva litigiosidade que também ali
atulhou de causas os tribunais e dilatou prazos, houve uma preocupação, segundo
Goldin52, de promover uma "desjudicialização" do conflito individual trabalhista, na
"linha de evolução também generalizada nos sistemas europeus de solução dos
conflitos" (...), o que determinou "a sanção de um regime de conciliação obrigatória
nos conflitos individuais de trabalho, que deve necessariamente transitar como
condição para aceitar a jurisdição". As atribuições de conciliador foram confiadas a
advogados "que exercem livremente sua profissão e que desempenham essa função
conciliatória em seus próprios escritórios". Alcançada a conciliação, deve ser
submetida à Justiça ou à Administração do Trabalho para homologação, o que dota o
acordo dos efeitos da coisa julgada .
A arbitragem na Argentina também ganhou relevo, sobretudo diante do
52 GOLDIN, Adrián O. Os conflitos trabalhistas e suas formas judiciais e extrajudiciais de solução - anotações e reflexões". Brasília: In "Anais do Seminário Internacional - Relações do Trabalho", Edição do Ministério do Trabalho, 1998. p. 288 e ss.
52
52
Decreto n. 2.184, e 1990, onde segundo Rioja “submeteu à arbitragem obrigatória os
conflitos trabalhista nos serviços essenciais, tais como, a saúde, os hospitais, a água, a
energia, o gás, o combustível, a telecomunicação, a educação e a justiça.”53
Zoraide Amaral54 ressalta, que “a arbitragem, na Argentina, pode ser
utilizada em qualquer espécie de conflito que não esteja fundado em direitos
indisponíveis”
Importante ressaltar, como obtempera Eduardo Zamorano55, a arbitragem
obrigatória fere o princípio da liberdade sindical estabelecido pelas Convenções da
OIT nº 87 (Liberdade Sindical e Proteção do Direito de Sindicalização) e n. 98 (Direito
de Sindicalização e Negociação Coletiva), ratificadas pela Argentina.
3.4. Austrália
O procedimento da arbitragem obrigatória começou em torno de 1890 -
segundo informe de Riojas56 - derivado dos profundos conflitos, frutos da crise interna
das relações industriais, tendo sido considerado como um “audaz experimento social”,
cujo intento foi o de promover a justiça nas relações industriais e assegurar uma
paridade salarial. Tal procedimento funciona tanto nos conflitos individuais quanto nos
coletivos.
O modelo funciona ao estilo de um tribunal, havendo a possibilidade de
apelação aos tribunais cuja função é a de minimizar os precedents contraries e ao
mesmo tempo controlar a qualidade dos laudos arbitrais. Há uma farta jurisprudência
sobre o posicionamento dos árbitros, sendo certo que muitas vezes as partes se valem
53 FUENES DE RIOJA, Daniel. Op. cit. p. 108. 54 Ibidem, p.98. 55 ZAMORANO, Eduardo. El Modelo Laboral Argentino (Antecedentes y Análisis de la Reforma Lavoral. Ley
25.250). Buenos Aires: Dunken, 2000, p. 43 e ss. 56 FUNES DE RIOJA, Daniel. Op. cit. p.104.
53
53
das suas opiniões emitidas pelos árbitros em sua fundamentação, para chegar a um
acordo, permitido no curso da audiência.
Atente-se para o fato da possibilidade da intervenção estatal como terceiro
interessado nos casos que envolvam o interesse público.
3.5. Canadá
Segundo Riojas57, o Projeto de Lei nº 100 de Ontário, prevê a obrigatoriedade
prévia do processo fact- finding, na busca da solução dos conflitos laborais (Lei sobre
os corpos colegiados e lei das negociações coletivas dos professores de 1975).
Também o Código Trabalhista Canadense e a Lei das Relações dos funcionários do
serviço público (federais) adotam o fact- finding.
As críticas ao fact-finding vão no sentido de que tal procedimento impede
uma negociação entre as partes antes de esgotado o processo, permitindo que se
radicalizem as posições de intransigência, dificultando um possível acordo ou de outra
forma de fact- finding pode constituir-se como um óbice à futuros acordos, pelas partes
sentirem-se inclinadas a ele recorrerem necessariamente.
Atualmente está restrito aos setores da administração pública direta e indireta
já que a experiência demonstrou a maior efetividade da conciliação voluntária.
3.6. Espanha
O Direito espanhol prevê como formas de soluções de conflitos a mediação,
a conciliação e a arbitragem, possuindo, inclusive, um órgão específico para esse fim,
57 Ibidem, p. 108.
54
54
denominado Instituto de Mediação, Arbitragem e Conciliação (IMAC), criado por
meio do Real Decreto-Lei nº 5, de 26 de janeiro de 1979, na redemocratização da
Espanha, após a queda do General Franco, com caráter de organismo autônomo
adstrito ao Ministério do Trabalho. O IMAC é órgão autônomo, de composição
tripartite, que atua de forma complementar aos órgãos jurisdicionais trabalhistas. O
Instituto constituiu-se em um órgão estatal independente sem ligação com nenhum dos
poderes.
Solicitada e aceita a mediação, o Instituto convocará e ouvirá as partes em
litígio sobre o perfil que deve possuir o mediador requisitado. Com isso analisará as
pessoas que possuem tais requisitos e nomeará a que melhor se enquadre às exigências
das partes interessadas.
O mediador tem a faculdade de convocar as partes, que estarão obrigadas a
comparecer pessoalmente quantas vezes este entender pertinente, e poderá solicitar
dados e informações para o cumprimento de seu mister. O mediador deve manter
segredo profissional, sob pena das sanções legais. No prazo mais breve possível o
mediador submeterá às partes a proposta de solução que considera justa e, no caso de
aceitação das partes, terá a eficácia de uma convenção coletiva.
O acordado em conciliação tem força executiva entre as partes, sem
necessidade de ratificação ante o Juiz ou Tribunal (art. 68).
Observe-se que há a obrigatoriedade legal do contrato coletivo de trabalho,
havendo a previsão de recurso ao Judiciário. O prazo do contrato é indeterminado,
sendo revogado somente por outro contrato ou se consta um prazo de vigência
original.
A "Lei de Procedimiento Laboral" de 1995 (art. 63 a 73), sob o sugestivo
título “de la evitacion del proceso”, considera obrigatório o intento de conciliação
"perante o serviço administrativo correspondente", como requisito prévio para a
tramitação do processo.
55
55
Contudo, registra Halley de Souza58 que o IMAC não logrou êxito, pois após
a sua criação, surgiram nos locais de trabalho, comissões paritárias que solucionavam
de forma mais eficiente os conflitos, até porque eram órgãos mais próximos da
realidade onde se delimitava a lide.
Joselita Nepomuceno Borba, Deborah da Silva Felix e Maria Regina do
Amaral Virmond59 observam que o modelo espanhol é o que mais se aproxima do
brasileiro, lembrando que recentemente foi criado, em decorrência de um acordo
tripartite (governo, representantes dos trabalhadores e dos empresários - CEDE,
CEPYME , CCOO e UGT), chamado Acordo para Solução Extrajudicial dos Conflitos
Laborais - ASEC, a Fundação SIMA, que é órgão encarregado de viabilizar os
procedimentos de mediação e arbitragem para a solução extrajudicial de conflitos
coletivos trabalhistas. Trata-se de uma fundação tripartite subvencionada pelo governo
espanhol e é administrada por representantes do governo, das organizações de
trabalhadores e dos patrões.
3.7. França
Podem ser encontrados convenções e acordos coletivos. A convenções são
negociadas com as Câmaras de empregadores e os acordos com os sindicatos. O
Ministério do Trabalho intervém fortemente nas relações entre capital e trabalho.
De acordo com o que expõe Villatore60 é a partir do artigo L. 522 e itens, até
o artigo L. 532-1 do Código do Trabalho francês que se encontram os dispositivos que
58 Ibidem, p 03 59 BORBA, Joselita Nepomuceno, FELIX, Deborah da Silva e VIRMOND, Maria Regina do Amaral. Negociação coletiva e os processos de arbitragem e conciliação das relações trabalhistas: as experiências alemã, espanhola, inglesa e italiana (Relatório do Curso A21314, de 04/05 a 15/05/98, Turim - Itália) promovido pela OIT. 60 VILLATORE, Marco Antônio César. Mediação na solução de conflitos de trabalho e o Direito Comparado. Curitiba: in GENESIS – Revista de Direito do Trabalho, nº 74, fevereiro de 1999. p. 05.
56
56
tratam dos procedimentos de regulamentação dos conflitos trabalhistas.
Em consonância com o previsto no artigo L. 524-2, item 1, do Código do
Trabalho, dá-se a mediação, sendo certo que o mediador possui os poderes para se
informar da situação de trabalhadores e demais partes interessadas pelo conflito,
podendo proceder a todas as investigações necessárias e podendo requerer às partes a
produção de todo o documento ou informação de ordem econômica, contábil,
financeira, estatística ou administrativa suscetível. Também pode recorrer a escritórios
de peritos e, geralmente, a qualquer auxiliar necessário.
Zoraide Amaral analisando a Lei de Mediação Processual Francesa n.
95.125, que entrou em vigor em 1995, aponta a semelhança da mediação da França
com a que ocorre nos Estados Unidos da América, aduzindo que:
“Na França, o mediador também tem função semelhante à que tem nos Estados Unidos da América, isso é, aproximar as partes. Por isso, justifica-se o fato de não ser necessário estarmos diante de um jurista ou de um conhecedor do direito, já que o seu papel é de aconselhar e pacificar as partes e litígio.”61
Na ocorrência de acordo entre as partes, o mesmo tem a força de uma
convenção coletiva de trabalho, conforme artigo L. 524-4 do Código do Trabalho.
Já a conciliação pode ser instituída através de convenção coletiva, de acordo
com as cláusulas fixadas pelas partes interessadas. A violação das condições ali
constantes poderá resultar em responsabilidade civil.
Villatore62 informa que conciliação legal, conforme artigo L. 523-2 do
Código do Trabalho, permite às partes submeterem o conflito a uma comissão nacional
ou regional (ou para as seções departamentais), de acordo com o tamanho do conflito:
O presidente da comissão de conciliação, quando esta é infrutífera, convida
as partes a designarem um mediador para se chegar a um acordo amigável de conflito
61 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p.120 62 Ibidem, p. 07.
57
57
coletivo. Caso as partes não queiram designar um mediador, a autoridade
administrativa fa-lo-á através de uma lista de personalidades com autoridade moral e
com competência econômica e social. As listas das personalidades ficam à disposição
de consulta e sugestões das entidades sindicais. As listas são revisadas a cada três
anos.
A arbitragem, por sua vez, é encontrada nos artigos 525 e seguintes do
Código laboral francês e, conforme o mesmo autor63 a natureza desse procedimento
adia profundamente a realização dos procedimentos prévios (conciliação e mediação).
Na França, portanto, a arbitragem não faz parte da autonomia das partes sendo que a
regulamentação do conflito, nesse caso, é uma questão de heteronomia.
O árbitro também é um terceiro que decide a solução do conflito, sendo
importante frisar que a arbitragem não possui uma boa aceitação nas relações
profissionais francesas. Nem empregador, nem entidades sindicais são favoráveis ao
instituto da arbitragem. Tal pensamento tem condição de ser modificado no caso de
uma grande crise social.
Na França o concerto ou a consulta é o instrumento mais utilizado de
prevenção de conflitos coletivos de trabalho, ao invés de se utilizar da resolução dos
mesmos64.
3.8. Inglaterra
Na Gran Bretanha há uma tradição relacionada à arbitragem voluntária. No
entanto, a obrigatoriedade da arbitragem existiu de 1914 a 1919 e de 1940 a 1945, ou
seja, em períodos de excepcionalidade causada pela guerra, como ressalta Riojas65.
63 Ibidem, p. 07. 64 VILLATORE, Marco Antônio César. Op. cit. p.06. 65 FUNES DE RIOJA, Daniel. Op. cit. p. 104
58
58
A arbitragem, apesar de voluntária, conta com a intervenção estatal,
promovida pelo Comitê Central de Arbitragem (CAC) esse limita a setores públicos
restritos .
Em 1974, foi criado o Serviço de Assessoria, Conciliação e de Arbitragem
(ACAS), responsável por implementar o desenvolvimento das relações entre capital e
trabalho, incluindo a reforma dos mecanismos de contratos coletivos. No entanto,
somente após esgotadas todas as possibilidades é que as partes podem recorrer à
ACAS.
A ACAS prima pela independência e imparcialidade, além do que não tem a
faculdade de obrigar, mas sim, procura o consenso entre as partes, desempenhando
funções de assessoria, conciliação e arbitragem. É a ACAS que remete os casos ao
Comitê Central de Arbitragem - CAC, assim como serve a uma série de órgãos
públicos: o Tribunal Nacional dos Ferroviários, o Tribunal de Arbitragem da Polícia,
dos Serviços do Correio e Tribunais segundo a Lei de Remuneração dos Professores
de 1965 e a Lei da Educação de 1980.
3.9. Itália
As quatro principais formas de soluções de conflitos encontradas no Direito
Italiano são a mediação, a conciliação, a arbitragem e a comissão de investigação.
A mediação italiana possui como característica marcante, como explicam
Bruno Veneziani e Lauralba Bellardi66, a propriedade de ser “uma atividade de
composição dos conflitos coletivos executada prevalentemente de organismos
estatais”.
66 VENEZIANI, Bruno; BELLARDI, Lauralba. Mediazione (dei conflitti), in Digesto Commerciale. 4ª ed., Vol. IX. Turim: UTET, 1993. p. 361.
59
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Villatore67 informa que, a partir do final de 1992 vários projetos de lei sobre
arbitragem e conciliação foram elaborados pelo Conselho Nacional de Economia e de
Trabalho (CNEL) sempre com a finalidade de reforçar a autonomia coletiva e reduzir a
carga do judiciário.
A previsão legislativa italiana de solução de conflitos encontra-se, por base,
na sua Constituição de 1947, nos seus artigos 3º (competindo à República remover os
obstáculos de ordem econômico-sociais, que limitam de fato a liberdade e igualdade
dos cidadãos); 4º (a República reconhece a todos os cidadãos o direito ao trabalho e
promove as condições que propiciem efetivamente este direito); 35 (a República tutela
o trabalho em todas as suas formas e aplicações); 41 (utilidade social da iniciativa
privada); 44 (a eqüidade das relações sociais); 46 (a elevação econômica e social do
trabalho).
A expressão jurídica "mediação" inexiste expressamente no ordenamento
jurídico italiano. Sendo certo que se pode intuí-la, mas apenas como conciliação, no
constante do artigo 23, letra “d” do Decreto do Presidente da República nº 520, de 19
de março de 1955 (com regras para os ofícios regionais e provinciais do trabalho) e do
artigo 12, primeiro parágrafo da Lei nº 628, de 22 de julho de 1961 (os ofícios do
trabalho e da máxima ocupação desenvolvem conciliação em matéria trabalhista.
Esta constatação é revelada na obra de Bruno Veneziani e Lauralba
Bellardi68, os quais afirmam que “provavelmente a razão da indeterminação dos
conteúdos normativos nasce do receio do legislador em contrastar com os ditames
encontrados nos artigos 39 e 40 da Constituição italiana ou, no mínimo, de gerar a
hostilidade sindical. Mesmo assim foram apresentados vários projetos de lei a partir de
1944, sem qualquer êxito.”
Por essa razão, foram surgindo inúmeros documentos formais e informais
(documentos, cartas, circulares, pareceres ministeriais) na tentativa de preencher as
67 Ibidem, p.7 68 Ibidem p. 364
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60
lacunas deixadas pelo legislador e sugerindo os contornos da atividade compositiva do
terceiro.
Halley de Souza69 acrescenta que na Itália existe o Estatuto do Trabalhador
lei nº 300/70, que serviu de base para a organização espanhola. O estatuto italiano
prevê várias formas de solução de conflitos, entre as quais, a Comissão no local de
trabalho, o Colégio de Conciliação e Julgamento. Os trabalhadores indicam um
representante e os patrões indicam outro, sendo que os dois representantes de comum
acordo escolhem uma terceira figura e constituem o Colégio.
O autor afirma que as estatísticas italianas informam que as comissões são a
forma mais utilizada para a solução de conflitos na Itália. O sistema italiano possui
garantias reais contra a dispensa arbitrária, sendo que a demissão somente se efetiva se
houver apuração dos fatos por meio de sindicância, ou seja, a convenção 158 da OIT é
aplicada na plenitude.
3.10 Japão
Conforme ressalta Zoraide Amaral70, o acesso à Justiça no Japão é difícil e
lento, além de muito oneroso, já que é da índole do povo oriental aceitar
compromissos mais do que os ocidentais.
No Japão71 existem as Cortes de Conciliação, “compostas por dois membros
leigos e (ao menos formalmente) por um Juiz”. As atribuições da Corte de
Conciliação, naquele país, são de ouvir as partes informalmente e recomendar uma
solução justa.
69SOUZA, Halley de. Solução dos conflitos no âmbito do trabalho. Retirado do site http://www.jusnavigandi.com.br, 2006. O autor é coordenador para América do Sul da ILSA (Internacional Law
Students Association). 70 SOUZA, Zoraide Amaral. Op. cit. p.143. 71 CAPPELLETTI e GARTH. Op. cit. p. 84.
61
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É denominado A SHUNTO o sistema de negociação. Pequenas empresas se
integram ao KEIRTSU que subcontrata as empresas familiares com encargos sociais
menores e jornada de trabalho prolongadas com flexibilidade, que são autorizadas
pelos trabalhadores.
O empregado é contratado para trabalhar na empresa e não na função. Assim,
quase não há contratos escritos, com forte influência do sistema norte-americano.
3.11. México
No México também possui um juízo arbitral que se encontra disciplinado
pelo Código de Procedimientos Civiles (Decreto de 1932, que foi modificado por
Decreto de 21.7.1993, de 23.9.1993 e de 6.10.1994), e uma arbitragem comercial, que
se encontra regulada no Código Comercial Mexicano, Lei de 22 de julho de 1993, arts.
1.415 a 1.463.
Interessante destacar no sistema arbitral mexicano que o seu referido Código
de Procedimientos Civiles autoriza as partes em conflito a submeterem suas
controvérsias ao juízo arbitral, podendo o compromisso ser celebrado antes do
ajuizamento da ação, durante o decorrer da ação e depois da sentença, seja qual for o
estado em que se encontre o processo.
A cláusula compromissória e o compromisso arbitral não sofrem distinção no
direito mexicano, gerando os mesmos efeitos, isto é, há obrigatoriedade de
constituição da arbitragem.
Consoante Néstor de Buen72, no México os conflitos de trabalho são
resolvidos mais freqüentemente por meio de solução jurisdicional, por um órgão
denominado Junta de Conciliação e Arbitragem, instituída pelo art. 123 da
Constituição Federal de 1917 e pertence ao Poder Executivo.
72 DE BUEN, Nestor. A Solução dos Conflitos Trabalhistas. São Paulo: LTr, 1997, pp.118/119.
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3.12. Paraguai
O código Procesal Civil do Paraguai contempla o Juízo Arbitral, sob o título
“Del Proceso Arbitral”, no Título I, capítulo I.
O art. 774 do referido diploma legal informa quais são as hipóteses em que é
possível se utilizar da arbitragem, podendo ser objeto deste sistema qualquer questão
de conteúdo patrimonial, e poderá ser submetida antes ou depois de deduzido em juízo
perante a justiça ordinária, em qualquer fase do processo, sempre que não haja
sentença definitiva transitada em julgado.
A arbitragem ou o sistema arbitral trabalhista encontra-se disciplinada nos
Códigos del Trabajo y Procesal del Trabajo, em seus arts. 296 ao 320.
Assim, as partes envolvidas em conflito trabalhista poderão tentar uma
conciliação; caso não ocorra, a Junta Permanente de Conciliación y Arbitrage
declarará o encerramento da instância conciliatória e dará notícias às partes envolvidas
que deverão submeter a decisão do conflito à arbitragem ou ao árbitro. Encerrado o
procedimento arbitral, o laudo respectivo tem força executiva.
3.13. Portugal
Marco Antônio César Villatore73 informa que as regras portuguesas sobre
soluções de conflitos coletivos de trabalho são encontradas no Capítulo VIII, artigos
30º e seguintes do Decreto-Lei nº 519, de 29 de dezembro de 1979.
No caso português, podem ser citadas como formas de soluções, além da
73 VILLATORE, Marco Antônio César. Op. cit. p.02 ss.
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mediação, a conciliação e a arbitragem, podendo existir, por último, a elaboração de
portarias de regulamentação de trabalho.
Na mediação, as partes podem a qualquer tempo acordar em utilizá-la nos
conflitos coletivos que resultem da celebração ou revisão de uma convenção coletiva.
As próprias partes é que escolhem o mediador que, para chegar ao final de
seu trabalho escrito, possui total liberdade de colher os dados e as informações tanto
das partes quanto de qualquer departamento do Estado.
Villatore74 esclarece que o mediador deverá encaminhar o seu laudo por carta
registrada no prazo máximo de vinte dias a partir de sua nomeação, sendo considerado
recusado se ambas as partes não comunicarem expressamente a sua aceitação no prazo
de dez dias de sua recepção.
Decorrido o prazo final de dez dias, o mediador deve encaminhar
simultaneamente às partes a aceitação ou recusa das mesmas.
Todos e quaisquer dados ou informações colhidos durante os trabalhos pelo
mediador devem ser guardados em sigilo pelo mesmo, sob pena de sanções.
Já a conciliação relativa a conflitos coletivos de trabalho poderá ser
promovida conforme as regras presentes na convenção coletiva de trabalho anterior da
categoria profissional, no caso de celebração de uma nova, ou no próprio documento
normativo coletivo, na hipótese da sua revisão. As partes devem apresentar o pedido
de conciliação ao Ministério do Trabalho, que as convocará para iniciá-la dentro dos
quinze dias seguintes.
Caso não esteja previsto em convenção coletiva o instituto de conciliação,
este poderá ser promovido, conforme as regras dos artigos 31º e 32º do Decreto-Lei nº
519/79, ou seja, por comum acordo das partes ou por uma delas somente quando a
outra não der resposta à proposta de celebração ou de revisão de uma convenção
coletiva. Fora esses dois casos, somente será admitida depois de decorrido um pré-
aviso da proposta, de oito dias, por escrito, à outra parte, caso não se tenha qualquer
74 Ibidem, p. 02 e ss.
64
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resposta.
O Decreto-Lei nº 209, de 2 de outubro de 199275 introduziu nova redação ao
artigo 32º supracitado, estabelecendo que “a conciliação será efetuada pelos serviços
de conciliação do Ministério do Emprego e da Segurança Social”.
Na arbitragem facultativa, cada parte nomeará um árbitro, sendo que o
terceiro será nomeado pelos dois anteriores. Os três poderão ser assistidos por peritos e
possuem ampla liberdade para colher dados e informações necessárias das partes e do
Estado.
A decisão arbitral será tomada por maioria, tendo os mesmos efeitos
jurídicos da convenção coletiva, não podendo diminuir direitos ou garantias já
presentes em convenções coletivas anteriores. Tal decisão deverá ser encaminhada às
partes e ao Ministério do Trabalho dentro do prazo de quinze dias.
Caso frustada uma conciliação ou uma mediação sem que as partes tenham
acordado em iniciar uma arbitragem facultativa, dentro de dois meses do final do
primeiro processo, o Ministério do Emprego e da Segurança Social poderá determinar
uma arbitragem obrigatória.
Por último, encontram-se as “portarias de regulamentação de trabalho”, que
poderão ser emitidas pelos Ministros do Trabalho e da Tutela ou responsável pelo
setor de atividade se verificadas as seguintes hipóteses: a) inexistência de associações
sindicais ou patronais; b) recusa reiterada de uma das partes em negociar; c) prática de
atos ou manobras manifestamente dilatórias que, de qualquer modo, impeçam o
andamento normal do processo de negociação.
Esclarece Villatore76 que por meio de despacho do Ministro do Emprego e da
Segurança Social (Decreto-Lei nº 209/92), será formada uma comissão para a
elaboração da portaria, com a possibilidade de nomeação de assessores pelas duas
partes para assegurar a necessária representação. A comissão terá noventa dias para
75 Diário da República, de 2 de outubro de 1992, in VILLATORE, Marco Antônio César. Op. cit. p. 02. 76 Ibidem, p. 03.
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apresentar a portaria, que terá valor de convenção coletiva de trabalho, salvo
prorrogação do Ministro do Trabalho.
A Constituição da República Portuguesa em seu artigo 56º, item 4, afirma
que: “A lei estabelece as regras respeitantes à legitimidade para a celebração das
convenções coletivas de trabalho, bem como à eficácia das respectivas normas”.
3.14 - Uruguai
A arbitragem também se faz presente no Uruguai, sendo regulada pela Lei n.
15.982/88 – Código General del Proceso.
O referido Código, em seu art. 472 prevê que todo conflito, individual ou
coletivo, poderá ser submetido pelas partes à solução por um Tribunal Arbitral, a não
ser que haja expressa disposição em sentido contrário, como ocorre em relação as
questões proibidas de submissão à transação.
Zoraide Amaral77 aponta como característica do sistema arbitral do Uruguai o
fato de poder ser voluntário ou necessário, e aí, no caso de ser necessário, será imposto
por lei ou por acordo das partes.
Importante ressaltar, entre outras peculiaridades do sistema arbitral Uruguaio
é que não cabe recurso no laudo arbitral, exceto no caso de nulidade, conforme
expresso no art. 499 do Código General del Proceso.
Como outras alternativas não judiciais de solução de conflitos, o Uruguai
também adota a conciliação e mediação, que foram implantados em 1994, com
formação de comissões para implementar e dar ampla divulgação nos meios de
comunicação ao programa por Luis Torello, então presidente da Suprema Corte que,
conforme relata Zoraide Amaral, apresentava as seguintes soluções para a mediação,
77 SOUZA, Zoraide Amaral. Op. cit., p. 157.
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negociação e conciliação:
“1 – uma adequada preparação dos juízes de paz, de primeira instância do cível, família e trabalho, dos defensores públicos, assistentes sociais e professores encarregados dos escritórios de faculdades de direito, mediante cursos de reciclagem. A mesma preparação seria ofertada aos futuros juízes, mediante cursos na escola judicial, aos futuros advogados e assistentes sociais, por meio da inclusão de cadeiras específicas nos currículos universitários; 2 – criação de um juízo de conciliação prévia, exercido pelos juízes de paz (que continuariam sem competência para o contencioso e a jurisdição voluntária), e pelas defensorias e escritórios interessados; 3 regulação da itinerância dos juízes de primeira instancia em matéria cível, trabalhista e família; 4 – criação de normas favoráveis ao comparecimento das partes à conciliação, igualando-se o valor da conciliação obtida nas defensorias e nos escritórios de faculdades, à conciliação intraprocessual.”78
78 Ibidem, p. 159.
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4. A MODERNA IDÉIA DE ACESSO À JUSTIÇA
Ao longo da evolução da humanidade esta, invariavelmente, foi
acompanhada do aumento crescente de conflitos de interesses, que se tornaram cada
vez mais complexos e abundantes, provocando e exigindo a produção de normas e a
intervenção estatal para administrar e assegurar a pacificação social.
O Estado, ao vedar, salvo em casos excepcionais, a autotutela dos direitos,
chamou a si a tarefa de solucionar os conflitos intersubjetivos de interesses, fazendo-o
mediante o processo. Especificamente, no Brasil, este princípio encontra-se agasalhado
na Constituição Federal de 1988, em seu art. 5°, inciso XXXV, que prevê o direito à
apreciação jurisdicional, de qualquer lesão ou ameaça a direito, independente de ser a
pessoa jurídica ou natural, incluindo entre estes direitos, também, aqueles de natureza
coletiva ou difusa. Todavia, a doutrina processual, desenvolvida a partir de fins do
século passado, teve basicamente uma concepção individualista dos litígios, como e.g.
a legitimação para a causa aos titulares do direito subjetivo violado e limitação dos
efeitos da coisa julgada às partes da demanda, conforme comando do art. 472 do
Código de Processo Civil Brasileiro.
Essa concepção individualista do processo ficou superada, mostrando-se
insuficiente para atender às exigências dos tempos modernos, de uma sociedade de
massa cada vez mais consciente dos seus direitos, embora a grande maioria dos seus
membros sinta-se, na prática, impossibilitada de exercitá-los pela dificuldade de acesso
aos órgãos componentes do sistema judiciário. Daí o surgimento do fenômeno da
litigiosidade contida ou, até mesmo, cada dia com mais freqüência, o uso do meio de
solução de conflitos próprios das sociedades primitivas, a violência, fazendo-se justiça
pelas próprias mãos.
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É, pois, preciso repensar a Justiça. E, no desempenho dessa tarefa, é
imperativo que se considerem não apenas, como até aqui tem acontecido, os
operadores do sistema judiciário, mas, especialmente, os consumidores da Justiça. Não
se pode olvidar que, no regime democrático, a atuação precípua do Estado, mediante
os seus órgãos, há de visar sempre à afirmação da cidadania. De nada adianta
conferirem-se direitos aos cidadãos, se não lhes são dados meios eficazes para a
concretização desses direitos.
As idéias sobre a matéria vêm sendo desenvolvidas em países da Europa e da
América, em torno do que se convencionou chamar “acesso à justiça”, sendo
relevantes, a respeito, os sucessivos trabalhos publicados por Mauro Cappelletti que,
seguramente, foi quem mais se debruçou, nos últimos cinqüenta anos, sobre a pesquisa
e a formação do conceito de “acesso à Justiça”, como meta maior de garantia de tutela
jurisdicional assegurada aos cidadãos. Na introdução de uma de suas várias obras
sobre o tema, escrita em parceria com Bryant Garth, o processualista e pensador
italiano registrou que:
“A expressão ‘acesso à Justiça’ é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico - o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos ”.79
Lembra Cappelletti que a idéia de acesso à Justiça evoluiu paralelamente à
passagem da concepção liberal para a concepção social do Estado moderno. De início,
a participação do Estado não ia além da declaração formal dos direitos humanos.
Nessa época, em que prevalecia como máxima dominante o laissez-faire, todos eram
solenemente presumidos iguais e a ordem constitucional se restringia a criar
mecanismos de acesso à Justiça, sem maiores preocupações com sua eficiência prática
79 CAPPELLETTI e GARTH. Op. cit. p. 32.
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ou efetiva. Diferenças econômicas ou institucionais nem sequer eram cogitadas pelo
ordenamento jurídico. Os problemas reais dos indivíduos não chegavam a penetrar no
campo das preocupações doutrinárias em torno do Direito Processual.
No século XX, todavia, o coletivo ou social passou a ser a tônica da política
governamental e legislativa em todos os países do mundo civilizado, mesmo naqueles
em que a ideologia se rotulava de capitalista e liberal ou neoliberal. A política
constitucional deixou, então, de atuar como simples tarefa de declarar direitos, tal
como prevalecera nos séculos XVIII e XIX. As Cartas contemporâneas, refletindo a
consciência social dominante, voltaram-se para a efetivação dos direitos fundamentais.
Assumiu-se, dessa maneira, o encargo não só de defini-los e declará-los, mas também,
e principalmente, de garanti-los, tornando-os efetivos e realmente acessíveis a todos. O
Estado Social de Direito pôs-se a braços com a tarefa nova de criar mecanismos
práticos de operação dos direitos fundamentais.
Assim, o processo, instrumento de atuação de uma das principais garantias
constitucionais - a tutela jurisdicional -, teve de ser repensado. É claro que, nos tempos
atuais, não basta mais ao processualista dominar os conceitos e categorias básicos do
Direito Processual, como a ação, o processo e a jurisdição, em seu estado de inércia. O
processo tem, sobretudo, função política no Estado Social de Direito. Deve ser,
destarte, organizado, entendido e aplicado como instrumento de efetivação de uma
garantia constitucional, assegurando a todos o pleno acesso à tutela jurisdicional, que
há de se manifestar sempre como atributo de uma tutela justa.
O estudioso do processo e o aplicador das normas processuais têm,
necessariamente, de ir além da dogmática jurídica, além dos conceitos e categorias
exclusivas do Direito. Têm de dar ouvidos a todo o clamor que se ouve no meio sócio-
econômico sobre o qual o Direito Processual deve atuar. Somente assim se conseguirá
dar ao processo e às normas que o regem força de garantir, e não apenas de declarar,
direitos na vida social. E será assim que - como, de fato, vem ocorrendo na sensível
transformação do Direito Processual de nosso tempo - se conseguirá realizar o ideal de
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“acesso à Justiça”, preocupação que, necessariamente, ocupa “o ponto central da
moderna processualística ”.
Nessa linha de pensamento, o processo, para cumprir a missão que lhe atribui
o moderno Estado Social de Direito, tem de se apresentar como instrumento capaz de
propiciar efetividade à garantia de “acesso à Justiça”. Na ótica de Cândido Dinamarco
a problemática da efetividade do processo revela quatro facetas, todas fundamentais:
“a) admissão em juízo; b) modo de ser do processo; c) critérios de julgamento (ou justiça nas decisões); d) a efetivação dos direitos (ou utilidade das decisões)’, mas a idéia do acesso à justiça constitui a síntese de todo o pensamento instrumentalista e dos princípios e garantias do processo, seja a nível constitucional ou infraconstitucional; de modo que as garantias de ingresso em juízo, de contraditório, do devido processo legal, do juiz natural, da igualdade entre as partes, todas elas visam o acesso à justiça."80
A garantia de devido processo legal, a que se liga intimamente a de acesso à
justiça, além de exigir a figura do juiz natural e observância do contraditório e ampla
defesa, deve assegurar aos litigantes não apenas uma sentença mas uma sentença justa,
dentro da melhor exegese dos fatos e do direito material pertinente. Só assim se
entende realizado o verdadeiro “acesso à justiça”.
No mesmo sentido, Kazuo Watanabe ressalta que:
“o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional , inscrito no art. 5º, XXXV da CF, não assegura, apenas, o acesso formal aos órgãos judiciários, mas sim o acesso à justiça que propicie a efetiva e tempestiva proteção contra qualquer forma de denegação da justiça e também o acesso à ordem jurídica justa”.81
80 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do Processo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 303 e seg. 81 WATANABE, Kazuo. Tutela Antecipatória e Tutela Específica das Obrigações de Fazer e não Fazer, in TEIXEIRA, Sálvio de Figueredo (Coord.) A Reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 18.
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O Autor salienta, ainda, em relação ao princípio da proteção judiciária, os
seguinte pontos relevantes:
“a) da preordenação dos instrumentos processuais capazes de promover a efetiva, adequada e tempestiva tutela de direitos; b) adequação da organização judiciária ao volume dos serviços judiciários; c) recrutamento adequado; d) remoção de óbices ao acesso à justiça; e) pesquisa sobre causas dos litígios e sobre os meios de sua solução judicial ou extrajudicial.”82
O que se extrai de mais importante dos ensinamentos de Kazuo Watanabe é a
certeza de que não é apenas pela lei processual que se logrará atingir o processo justo.
Muitos problemas de ordem política, social e administrativa haverão de ser
enfrentados e superados, para que se torne efetiva a garantia de acesso à justiça.
No Brasil, apesar de sua Constituição de 1988, no art. 5º, inciso LXXIV,
assegurar a todos “assistência jurídica”, a englobar assistência judiciária e
assessoramento jurídico extrajudicial, o acesso à justiça enfrenta para sua efetividade
três tipos de obstáculos ou barreiras, conforme escólio de Leonardo Greco:
“1 – Barreiras econômicas – o custo da justiça, os honorários de advogados, os riscos de sucumbências;
2- Barreiras geográficas – decorrentes da imensidão do território nacional e da impossibilidade de se colocar pelo menos um juiz ao alcance de qualquer cidadão;
3 – Barreiras burocráticas – desaparelhamento da máquina judiciária, decorrente da má remuneração e da falta de formação técnico-pofissional dos serventuários e da inadequação da estrutura judiciária para enfrentar a massa de feitos que lhe são submetidos.”83
Ainda, inspirado na edificante lição do referido Autor, a situação torna-se
mais grave quando se está perante o incapacitado para o trabalho, o desempregado,
82 Ibidem, p. 20. 83 GRECO, Leonardo. Acesso à Justiça no Brasil. Rio de Janeiro: In Revista Ciências Sociais, UGF, Dez./1997, p. 18.
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idoso, a criança ou “até mesmo para aqueles cuja remuneração não permite sobreviver
com a mínima dignidade, como é o caso daqueles que percebem um salário mínimo,
com filhos para educar e doenças para tratar”
Mauro Cappelletti84 assinala ser muito fácil declarar os direitos sociais; o
difícil é realizá-los. Daí que (...) o movimento para acesso à justiça é um movimento
para a efetividade dos direitos sociais, e a sua investigação deve ser feita sob três
aspectos principais, aos quais denominam-se ondas renovatórias, que assim podem ser
resumidas:
a) A primeira onda refere-se à assistência judiciária mais efetiva aos pobres;
b) A Segunda onda, visa à tutela dos interesses difusos ou coletivos ;
c) E a terceira, o acesso à representação em juízo, com uma concepção mais
ampla de acesso à justiça. Um novo enfoque de acesso à Justiça.
4.1. Assistência Judiciária mais Efetiva aos Pobres
A garantia de adequada representação legal dos pobres, considerada como
primeira onda por Cappelletti, nos Estados Unidos, por exemplo, procurou-se buscar
um melhor atendimento judiciário para ser colocado à disposição do menos favorecido
e, como ponto de partida, criou-se um Programa de serviços Jurídicos denominado
Office of Economic Opportunity, de 1965 – OEO, autorizando a destinação de recursos
federais para os programas aprovados como de “ação comunitária”85
Na França, em janeiro de 1972, houve uma substituição de seu esquema de
assistência judiciária do século XIX, baseado em serviço gratuito prestado pelos
advogados, por um enfoque moderno de “securité sociale”, no qual o custo dos
honorários é suportado pelo Estado; seguiram-se medidas idênticas de reforma a
84 CAPPELLETTI e GARTH. Op. cit. p. 33 e ss. 85 Ibidem, pp. 33 e 34.
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assistência judiciária de desfavorecidos economicamente. No mesmo ano de 1972, na
Suécia, na Inglaterra, pela Lei de Assistência de Assessoramento Jurídico, na
República Federal da Alemanha, aperfeiçoou-se o sistema de assistência judiciária,
aumentado-se a remuneração paga aos advogados particulares por serviços jurídicos
prestados aos pobres e, nos EUA, em junho de 1974, estabeleceu-se a “Legal Services
Corporation”, ampliando os objetivos do programa OEO, dissolvido na ocasião.
Analisando-se as reformas antes citadas de assistência jurídica aos pobres,
Mauro Cappelletti 86procura distribuí-las em duas vertentes:
4.1.1. O Sistema Judicare
Neste sistema, utilizado na Inglaterra e França, a assistência judiciária é
estabelecida como um direito reconhecido a todos e, assim, permite aos cidadãos de
baixa renda terem a mesma representação qualitativa dos advogados de maior renome,
já que são escolhidos pelos litigantes na lista de profissionais indicados pelos litigantes
na lista de profissionais que concordam em prestar seus serviços, por meio de seus
órgãos corporativos e associativos, e os honorários dos advogados particulares são
suportados pelo Estado.
Zoraide Amaral sobre este sistema conclui que o mesmo “concorre para
amenizar, objetivamente, o problema da disparidade técnica que se reconhece
incontrastável quando os litigantes de um processo são desiguais na sua potencialidade
econômico-financeira.”87 Com razão a Autora, pois a designação honorífica de
advogados não tem mais sentido. Deve-se permitir a escolha de profissionais que
melhor apresentem qualificação de acordo com a natureza do conflito.
Quadra, por pertinente, asserir que no Estado de Minas Gerais sistema
86 Ibidem, pp. 35 e ss. 87 SOUZA, Zoraide Amaral. Op. cit. p. 33 e ss.
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semelhante foi adotado, com escopo de suprir a falta de defensores públicos
concursados. Através da Lei Estadual de nº 13.166, de 20 de Janeiro de 1999,
regulamentada pelo Decreto nº 42.718, de 03 de Julho de 2002 e pela Resolução
Conjunta nº 009, de 28 de Novembro de 2002, criou-se a figura do Advogado Dativo,
que se inscrevia perante a OAB, escolhendo indicando sua área de atuação, permitindo
aos pobres escolher o profissional para representá-los em juízo. Os honorários
advocatícios eram arbitrados pelo juiz da causa, que fornecia uma certidão de crédito,
cuja obrigação do pagamento ficava a cargo do Estado. Durante alguns anos, as
Comarcas desprovidas de defensores públicos tiveram grande resultado com este
sistema. Contudo, lamentavelmente, o Estado não cumpriu sua obrigação prevista em
lei, deixando de pagar a milhares de advogados nomeados como dativos, não honrando
os seus honorários, sendo que em fevereiro de 2005 a dívida do Estado com os
advogados dativos era estimada em cinco milhões de reais.88
Diante desta execrável conduta do Estado de Minas Gerais, a 54ª Subseção
da OAB/MG, sediada em Manhuaçu-MG, a qual temos a honra de participar de sua
administração, em 05 de novembro de 2004, expediu ofício circular nº 05/2004
orientando aos advogados de sua jurisdição não aceitarem mais atuar como dativos,
destacando que:
"Esta Subseção não mais irá coadunar com a irresponsabilidade Estatal, que durante anos transferiu o encargo obrigatório de promover o acesso à justiça para nossa classe de profissionais liberais, sem disponibilizar um centavo sequer de ressarcimento, transferindo para os advogados até mesmo os custos operacionais básicos para o andamento processual.
Em paralelo, acomodando-se na boa vontade da OAB e dos advogados dativos, o Estado não realizou concurso para preenchimento de vagas de novos defensores públicos, bem como não equipou ou ofereceu melhores condições para os atuais, num completo gesto de descaso para com o cidadão."89
88 Jornal do Advogado: Belo Horizonte, fevereiro de 2005, p.3. 89 Ofício Circular 05/2004, conforme anexo I.
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A repercussão do nosso ato foi grande, sendo que a assistência judiciária de
várias comarcas pertencentes a 54ª Subseção da OAB/MG praticamente paralisou,
tendo alguns magistrados formulado representação junto ao Tribunal de Justiça de
Minas Gerais, que por sua vez encaminhou denúncia de infração disciplinar para a
Seccional da OAB/MG, que, após deliberação com o Conselho de Ética e Justiça,
aprovou unanimemente a nossa iniciativa90, encaminhando expediente para todas as
Subseções, sendo ao final, objeto de deliberação da Carta de Araxá91, por ocasião do
XVIII Encontro Mineiro de Advogado, onde deliberou-se a reprovação da OAB/MG
diante da conduta do Estado, recomendando, em respeito a dignidade do profissional
advogado não mais atuar como dativo, afirmando no item 4 que a sua recusa não
configura infração disciplinar, o que fortaleceu o movimento iniciado na 54ª Subseção
da OAB/MG.
Diante da irresponsabilidade do Estado em não cumprir sua própria
legislação, Minas Gerais perdeu grande oportunidade de vanguarda na Assistência
Judiciária mais efetiva aos pobres.
4.1.2. O Sistema do Advogado Remunerado pelos Cofres Públicos
O sistema do Advogado Remunerado pelos Cofres Públicos, segundo
Cappelletti92 , “tem um objetivo diferente do Sistema Judicare, refletindo sua origem
moderna no Programa de Serviços Jurídicos do OEO - a vanguarda de uma “guerra
contra a pobreza.”
Neste sistema, os serviços de assistência judiciária são prestados por
“escritórios das vizinhanças”, atendidos por advogados pagos pelo governo e
90 Ofício 002/fevereiro/05, onde o Conselheiro Seccional da OAB/MG, Luís Antônio Lira Pontes registra encômios ao Presidente da 54ª Subseção da OAB/MG, solidarizando com a iniciativa, conforme anexo II. 91 Disponível no site http://www.oabmg.org.br/noticias/jornal. Anexo III. 92 Ibidem, p. 39.
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encarregados de promover os interesses dos pobres, envidando esforços no sentido de
fazê-los mais conscientes dos seus direitos.
Como bem observa Zoraide Amaral93 o fator mais importante ligado a este
sistema está em que os advogados têm a prerrogativa de “aumentar os direitos dos
pobres”, auxiliando-os em sua reivindicação de forma mais eficiente, seja na justiça,
seja fora dela.
4.1.3. Os Modelos Combinados
O sistema do modelo combinado, da Suécia, que nos parece ser mais eficaz,
é um misto do sistema judicare com o de advogados remunerados pelos cofres
públicos. Este modelo combinado permite que o indivíduo escolha entre o serviço
personalizado de um advogado particular e a capacitação especial dos advogados de
equipe, que , no dizer de capppelletti94, encontram-se em maior sintonia com os
problemas dos pobres, o que possibilita tanto as pessoas menos favorecidas como os
pobres, como grupo, beneficiarem-se do serviço de assistência judiciária.
Seja qual for a solução ou sistema adotado, o fundamental é que se assegure
aos necessitados assistência jurídica integral, de qualidade e gratuita.
Como bem lembra Zoraide Amaral95 não se pode perder de vista que o
serviço de assistência judiciária importa em despesas e não são poucas, pois se faz
necessário que haja um número maior de advogados, o que demandará grandes
dotações orçamentárias que representam o problema básico na implantação dos
sistemas, sobretudo, para os países menos desenvolvidos, como é o caso brasileiro,
revelado no exemplo dado em Minas Gerais em que o Estado não disponibiliza em seu
93 Ibidem, p 34. 94 Ibidem, p. 44 95 Ibidem, p. 35.
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orçamento os pagamentos dos advogados dativos.
4.2 Interesses Coletivos
A segunda onda renovatória visa à tutela dos interesses difusos ou coletivos,
com o objetivo de proteger o consumidor ou o meio ambiente. Tem por pressuposto
que o conceito de pobreza não se adstringe ao indivíduo carente de recursos
financeiros, de cultura ou de posição social. É mais vasto: abrange grupos e categorias,
como no caso do consumidor. Uma empresa produz milhões de produtos com um
defeito de pouco valor. Trata-se de interesse fragmentado, pequeno demais para que o
cidadão, individualmente, defenda o seu direito. Mas, se todos os consumidores, em
conjunto, decidirem atuar, estarão em jogo interesses consubstanciados em valores
consideráveis. Há, pois, de atentar-se para os carentes econômicos e os carentes
organizacionais.
A concepção, portanto, busca modificações ou criações legais com o escopo
de permitir maior eficácia, quanto à celeridade e efetividade da prestação jurisdicional,
para atendimento dos direitos coletivos, por meio de regras que se dirijam às noções de
legitimidade processual, normas procedimentais, conceito de coisa julgada,
permissivas de se adaptarem à mutação do critério teleológico do processo-
instrumento de atendimento, segurança e certeza de interesses individuais, para
interesses coletivos, comunitários.
No Brasil, a Lei nº 7.347/85 – Ação Civil Pública - regula o procedimento
para impedir violações a direitos coletivos, alcançando bons resultados, que poderiam,
ainda, ser melhores se fossem criados setores especializados na estrutura do Ministério
Público Federal e do Ministério Público Estadual, destinados a promover tais ações
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coletivas.
4.3. Acesso à representação em juízo a uma concepção mais ampla de acesso à justiça. Um novo enfoque de acesso à justiça
A terceira onda preocupa-se com fórmulas para simplificar os
procedimentos, o Direito processual e o Direito material, como, por exemplo, nas
pequenas causas, a fim de que o seu custo não seja superior ao valor pretendido pelo
Autor e a prestação jurisdicional seja o mais breve possível, sem entretanto perder a
qualidade. O tema envolve estudos, entre outros, sobre o princípio da oralidade e da
imediatidade, bem como sobre os poderes do juiz e a instrumentalidade do processo.
Nesse contexto, inclui-se a utilização da arbitragem, da mediação, da conciliação e de
outras formas alternativas da solução de conflitos.
Grinover e outros96, ao traçarem íntima relação entre a instrumentalidade
processual e acesso à justiça observam que não se pode falar em instrumentalidade do
processo ou em sua efetividade sem que se fale dele “como algo posto à disposição das
pessoas com vistas a fazê-las mais felizes (ou menos felizes), mediante a eliminação
de conflitos que as envolvem, com decisões justas.” Mais adiante concluem sobre a
idéia de acesso à justiça, como síntese generosa do pensamento instrumentalista e dos
grandes princípios e garantias constitucionais do processo: “Todos eles coordenam-se
no sentido de tornar o sistema processual acessível, bem administrado, justo e afinal
dotado da maior produtividade possível”
Em que pese a revolução legislativa no Brasil, com a edição da Lei da Ação
Popular (Lei n. 4.717, de 29 de junho de 1965), com a promulgação da Lei da Ação
96 GRINOVER, Ada Pellegrini. CINTRA, A. C., DINAMARCO, C. R. Teoria Geral do Processo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 42 e ss.
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Civil Pública (Lei n. 7.347, de 24 de julho de 1985), estendida até mesmo à tutela da
ordem econômica pela Lei n. 8.884, de 11 de junho de 1994 (art. 88), com a
promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13 de julho de
1990) e Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990) e
com o advento da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995, que dispõe sobre os
juizados especiais cíveis e criminais, com seus princípios básicos de oralidade,
simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que
possível, a conciliação e a transação, chegamos ao terceiro milênio e,
lamentavelmente, ainda não atingimos o patamar de poder oferecer uma prestação
jurisdicional que seja justa, célere e efetiva e que seja capaz de compor um conflito de
interesse.
Nossa Justiça é carente de recursos humanos e materiais, aliadas às
deficiências legislativas, relacionadas às leis de organização judiciária, às decisões
puramente políticas das duas Excelsas Cortes de Justiça e às freqüentes ingerências do
Poder Executivo, que redundam em graves injustiças no deslinde dos litígios.
O aumento de número de juízes, de tribunais e de melhores condições de
trabalho apregoados por muitos é de inescusável importância para minimizar o
volume crescente de demandas e equivalência de sentenças, contudo não basta se não
for acompanhado de fundamentais modificações no Poder Judiciário no sentido de
tornar efetivo o princípio constitucional do amplo acesso à justiça.
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5. PRINCIPAIS MÉTODOS DE SOLUÇÃO DOS CONFLITOS TRABALHISTAS NA ATUALIDADE
Assentados os princípios que governariam a produção de bens e serviços
após a Revolução Industrial, foi a sociedade humana dividida em classes com base em
critério econômico que substituiu todos os anteriores (nobreza, postos militares, títulos
eclesiásticos, etc.). Nas mãos de poucos ficaram os meios de produção. Com os
demais, a prestação de trabalho, único bem de que dispunham para garantir a
subsistência, transformando-o em valor econômico mediante pagamento feito como
retribuição ao serviço prestado. Esta realidade estabeleceu o marco que determinaria a
sociedade de classes até os nossos dias: a distinção rígida entre quem trabalha e quem
emprega. Numa divisão de classes desta natureza fatalmente implicaria no surgimento
de conflitos de interesses, que foram se tornando cada vez mais complexos e
constantes na medida da evolução da sociedade.
O Estado, por sua vez, diante dos conflitos de interesses chamou para si a
responsabilidade da tutela do mesmo. Contudo, como já foi dito alhures e, ainda, será
objeto de estudo no próximo capítulo, a solução jurisdicional dos conflitos não mais
consegue atender a realidade, em face do formalismo e anacronismo do sistema, sem
mencionar, ainda, o grande aumento de demandas originadas pela consciência coletiva
de cidadania, sobretudo, diante de um Estado Social. Assim, a busca de soluções
alternativas para os problemas do Judiciário fora da aparelhagem estatal é uma
constante em todo o mundo, o que justifica a análise dos principais métodos de
solução de conflitos trabalhistas, cujo estudo focar-se-á dentro do contexto brasileiro
conforme abaixo enumerados.
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5.1 ARBITRAGEM
Diante da redação do artigo 1º da Lei nº 9.307/96, onde se define que são
arbitráveis os direitos patrimoniais disponíveis, poder-se-ia afirmar, consubstanciado
nos artigos. 7º e 114, parágrafos 1º e 2º da CF/88 e artigos 9º e 444 da CLT, que todos
os direitos trabalhistas têm natureza patrimonial indisponível, donde impossível levar a
juízos arbitrais conflitos individuais trabalhistas, visto impossível transacioná-los.
Porque de natureza de ordem pública, sua irrenunciabilidade, inflexibilidade,
intransacionalidade impediriam o acesso à arbitragem extrajudicial privada para
dirimência de conflitos individuais. Quando muito restaria ela confinada (a) aos casos
de dissídios coletivos de natureza econômica, não obstante a sua inconveniência, posto
presumido o despreparo intelectual e a parcialidade dos árbitros e (b) aos casos de
solução por mediação ou conciliação, cada um destes meios alternativos, malgrado
também das presunções suso ditas.
Wagner D. Giglio, assim se posiciona:
“De fato, deixar à escolha do julgador por conta dos interessados parece ensejar a imposição, pelos empresários, de elementos favoráveis a seus interesses, posto que o trabalhador, subordinado, não teria liberdade para escolher o árbitro. E sendo lícito ao empregador ‘escolher’ (leia-se impor) árbitro favorável a seus interesses, não deixaria de fazê-lo para se submeter à decisão de um juiz neutro e isento de ânimo, integrante da magistratura trabalhista.” 97
Em outro trabalho, Wagner D. Giglio98, chegou a seguinte conclusão: “A
arbitragem particular, de origem contratual, é inadmissível como forma de solução dos
97 GIGLIO, Wagner D. in Arbitragem e os conflitos coletivos de trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 1.990, p.74. 98 ________ in Os conflitos trabalhistas, a arbitragem e a Justiça do Trabalho. São Paulo: Revista LTr, Vol. 47 n.3, março/1.983, p.271 e ss.
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conflitos individuais do trabalho, por abrir ampla margem de fraude.”
Antônio Lamarca, de seu turno, profetiza e execra: “Não é de tradição do
nosso Direito o juízo arbitral nem apresenta esse dispositivo chance alguma de vingar.
O brasileiro não acredita em ‘árbitros’ e faz muito bem, porque na maioria dos casos
são venais.”99
Para Sérgio Pinto Martins, a arbitragem é alternativa e faculdade para
dissídios coletivos do trabalho, mas para dissídios individuais a Constituição Federal
não faz referência a ela. E aduz:
“Nos conflitos individuais haveria a impossibilidade da arbitragem diante da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas. Apenas alguns direitos trabalhistas poderiam ser renunciados como o aviso prévio concedido pelo empregador quando o empregado tiver outro emprego (Enunciado 276 do TST). O aviso prévio dado pelo empregado pode ser dispensado pelo empregador, mas outros direitos não. Seria necessária lei determinando a possibilidade da utilização da arbitragem para solucionar conflitos individuais do trabalho, de maneira que não se aplicasse o artigo 1º da Lei nº 9.307.” 100
Jorge Luiz Souto Maior101 também trilha o mesmo pensamento, sustentando
que o Direito do Trabalho não se enquadra perfeitamente à previsão do art. 1º da Lei nº
9.307/96, “inviabilizando a arbitragem como mecanismo de solução dos conflitos
individuais do trabalho.”
Em que pese o relevo e propriedade dos pensamentos doutrinários acima
esposados, o que impediria, numa primeira visão, a aplicação da arbitragem aos
conflitos individuais trabalhistas, em face aos princípios de irrenunciabilidade,
vedando assim a autonomia da vontade, analisaremos no título seguinte as
peculiaridades destes princípios e o momento pelo qual a arbitragem torna-se viável,
em face da natureza patrimonial em que se reveste num dado instante.
99 LAMARCA, Antônio. In A competência da Justiça do Trabalho na nova Constituição. São Paulo: Repertório IOB de Jurisprudência, n. 22/88, p.301. 100 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho. São Paulo: Atlas, 14ª Edição, 2.000, p.84. 101 MAIOR, Jorge Luiz Souto. In Arbitragem e Direito do Trabalho. São Paulo: Revista LTr 61-02/155.
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5.1.2 IRRENUNCIABILIDADE E RENUNCIABILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS
Com base no art. 9º da CLT, entende-se defesa a renúncia de direitos
trabalhistas, vez que as normas que os regem são de conteúdo imperativo, têm caráter
de ordem pública. Logo, referidos direitos são indisponíveis, donde inadmitem
transação.
Convém antes estabelecer alguns conceitos. Lei ou norma de ordem pública,
de caráter ordenativo, são as que estabelecem regras de interesse público, em
contrapartida às de ordem privada. M. M. Serpa Lopes, sob o escólio de Ferrara,
escreve que:
“As normas revestidas desse caráter visam garantir e assegurar a existência do corpo social, base do ordenamento jurídico. Disciplinam relações com objetivos relevantes, tendendo à conservação e melhoria da sociedade. Para que ocorra a violação de uma norma de ordem pública é necessária uma lei ‘imperativa’, sancionada pelo ordenamento jurídico, para fazer valer os interesses da generalidade em face dos interesses individuais, e proteger os fundamentos morais e econômicos da vida comum. Impõe-se, ainda, a distinção entre a necessidade de ‘ordem pública’ e a do ‘interesse público’, como bem acentua Ferrara, pois, se a ordem pública é de interesse público, a recíproca não é verdadeira. A ordem pública é aquele interesse público que, como essencial à vida, à incolumidade e prosperidade do corpo social, é oficialmente reconhecido e sancionado pelo Direito positivo.” 102
Leis imperativas ou coativas ou absolutas, são as que encerram uma ordem,
positiva ou negativa, impondo preceito em caráter obrigatório. Leis cogentes são
normas preceptivas de ordem pública, que excluem qualquer arbítrio individual. M. M.
Serpa Lopes103 as conceitua como normas que se impõem por si mesmas, aplicáveis
ainda que pessoas por elas beneficiadas hajam renunciado o favor protecional.
102 LOPES, M. M. Serpa. Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1971, p. 48-49. 103 Id , p.42
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O direito trabalhista é tutelado por normas de ordem pública, imperativas,
cogentes, portanto inderrogáveis e irrenunciáveis. Na verdade, são normas de interesse
público, que o Estado privilegia, fruto de sua intervenção com finalidade social na
proteção do hipossuficiente na relações jurídicas entre os indivíduos.
A renúncia é negócio jurídico unilateral, pelo qual o titular de um direito dele
se desapossa. A maioria dos direitos trabalhistas ou das normas de proteção ao
trabalho é inderrogável, sendo cediço que a irrenunciabilidade de direitos trabalhistas é
princípio do Direito do Trabalho. A imperatividade da norma tutelar dirige-se contra a
própria vontade do titular do direito subjetivo, como também dirige-se contra à parte
contrária. Assim, são irrenunciáveis os direitos que as normas de lei, de convenções e
acordos coletivos de trabalho, as sentenças normativas e as decisões administrativas
tutelam aos trabalhadores, exceto se a renúncia for permitida por lei ou não causar
prejuízos ao trabalhador ou à coletividade, e não for realizada com o controle da
autoridade.
Salvo casos excepcionalíssimos previstos em lei, não há como renunciar,
antecipadamente, a direitos tutelados pela lei trabalhista, ou seja, inadmissível ao
empregado renunciar, v.g., ao gozo e pagamento de férias, ao constituir e concluir o
contrato de trabalho. Do mesmo modo, em regra, inadmissível a renúncia no curso do
contrato, exceto, v.g., se a alteração contratual provier de norma imperativa.
Necessário assentar se há renúncia ou não no momento e depois da extinção
do contrato de emprego. A faculdade de renunciar, do trabalhador, há de ser bem
examinada: primeiro, é de verificar se trata realmente de renúncia ou transação, pois
no caso da primeira, o empregado nada recebe; segundo, é de verificar se a vontade foi
manifestamente livre.
Há autores, entre eles Delgado104, que dirigem o foco da irrenunciabilidade
dos direitos à indisponibilidade; outros, como Mario de La Cueva105, à imperatividade 104 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3 ed. São Paulo: LTr. 2004. p. 165. 105 CUEVA, Mário de La. In Derecho mexicano del trabajo, México: Porrúa, 1.943, T. 1, p.222.
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das normas tutelares; outros ainda, como Plá Rodrigues106, à noção de ordem pública
ou à limitação da autonomia da vontade.
Para os autores que dirigem o foco da irrenunciabilidade à imperatividade
das leis trabalhistas, o Direito do Trabalho se inclui no jus cogens. Explica Mario de
La Cueva que:
“O Direito do Trabalho, como direito imperativo e garantia constitucional, ao regular as relações entre o capital e o trabalho, se dirige, por um lado, a cada patrão e a cada trabalhador, por ocasião do estabelecimento das relações e, por outra, ao Estado, enquanto o obriga a zelar para que as relações se constituam na forma dos princípios contidos na lei e nas normas que a suprem, e sejam por elas governados. Sem este caráter imperativo manifesto nessa dupla direção da norma, não seria o Direito do Trabalho um mínimo de garantias, nem preencheria sua função; pois se a idéia de garantia, seja individual ou social, faz referência àquelas normas cuja observância se considera essencial para a realização da justiça, deixá-las subordinadas à vontade de trabalhadores e patrões equivale a destruir seu conceito, como princípio de cuja observância é o Estado o encarregado.” 107
Américo Plá Rodriguez, escrevendo acerca da irrenunciabilidade como
restrição à autonomia da vontade, questiona saber em que consiste a liberdade dos
indivíduos diante da norma impositiva, ao firmar o contrato de trabalho. É que se as
partes, relacionando-se com o contrato, sua liberdade muitas vezes termina neste
momento, pois, inelutavelmente, bastará contemplar-se a lei:
“A restrição da autonomia da vontade que disso se infere afasta o Direito do Trabalho do direito comum clássico, mas dificilmente redunda em menosprezo da personalidade, nem acaba definitivamente com aquela autonomia. A autonomia da vontade como tal não está em jogo, mas se trata de evitar seu abuso. Para esse efeito, em alguns setores da vida social o legislador transplantou a autonomia da vontade do terreno individual para o terreno coletivo. Hoje em dia, as organizações do trabalho são pessoas que, em primeiro lugar, gozam plenamente desta autonomia, enquanto que os indivíduos só desfrutam dela na medida em que o gozo parece compatível com o interesse social.” 108
106 PLÁ RODRIGUES, Américo. In Princípios de Direito do Trabalho, tradução de Wagner D. Giglio. São Paulo: LTr, 1.978, p.76 107 Ibidem, p.222. 108.Ibidem, p. 76.
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Para alguns autores, como Alcione Niederauer Correia, a renúncia a direitos
trabalhistas, face à indisponibilidade, concentra-se na constituição, na conclusão e na
duração, e muito pouco na extinção ou depois da extinção do contrato de trabalho.
Neste sentido, referida autora escreve:
“Toda a justificação da indisponibilidade do direito parte de uma presunção legal no sentido de que, enquanto perdura a relação de emprego, pelo fato de se achar subordinado ao empregador e deste, na maioria dos casos, depender economicamente, o empregado se encontra sob coação. Já a situação do empregado que deixou o emprego, cujo contrato, por qualquer motivo, se extinguiu, deve ser considerado de maneira diversa. Pode-se mesmo afirmar que os possíveis créditos que tenha contra seu ex-empregador, passaram a integrar seu patrimônio e, como tal, são por ele disponíveis. Rompido o laço que o unia ao patrão, já fora dos limites da autoridade de quem o dirigia e subordinava, não se pode tê-lo, ainda, como um eterno coagido” 109
Num dado aspecto, ousa-se divergir da lição acima, eis que o simples fato do
rompimento do vínculo empregatício não é de per se o suficiente para dar a certeza
que o trabalhador encontra-se livre da coação que vicia sua autonomia, neste sentido o
escólio de Arnaldo Lopes Süssekind :
“Com o término do contrato de trabalho, reconhece a melhor doutrina que, sem embargo de cessar a ‘soggezione impiegatizia’, pode persistir o estado de inferioridade e dependência econômica do trabalhador, capaz de o levar a renunciar a certos direitos, a fim de obter o pagamento imediato de salários atrasados ou, mesmo sua indenização. Neste caso, a renúncia corresponde a uma transação oculta, que não pode ter validade pela inexistência da ‘res dubia’. O vício de consentimento da vontade do empregado, oriundo da coação econômica nitidamente caracterizada, determina a nulidade do ato.” 110
Até aqui viu-se que, em que pese vozes divergentes, nosso ordenamento não
109 CORREIA, Alcione Niederauer. In A desistência no processo do trabalho, São Paulo: Revista Legislação do Trabalho, set/1.974, p.829. 110 SUSSEKIND, Arnaldo Lopes. Instituições de Direito do Trabalho, Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S.A., 1.974, Vol. I, p.161.
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reconhece a renúncia de direitos que contém a característica de norma pública
irrenunciáveis, pouco importando dela ocorrer antes, durante ou após a vigência do
contrato. Contudo, a seguir demonstra-se que a transação, desde que respeitados seus
requisitos, ou seja a questão da res dubia e havendo efetivamente concessões mútuas,
permitirá a composição do conflito individual trabalhista, inclusive perante o juízo
arbitral, sem configurar renúncia de direito, o que inquinaria de nulidade todo o
processo.
5.1.3 TRANSAÇÃO
A transação, à luz do Código Civil vigente (art. 841 e ss.), é um negócio
jurídico, pelo qual os interessados previnem ou terminam litígio, mediante concessões
mútuas, eliminando a incerteza da relação jurídica. Assim, a transação é contrato
bilateral, sinalagmático, oneroso, comutativo e formal. É negócio declaratório, visto
dirimir controvérsias, como também constitutivo, pois sua essência é a reciprocidade
de concessões, pelas quais podem ser criadas relações jurídicas, conforme o ensino de
Orlando Gomes.111
Cada parte, ao transigir, cede parte de seus direitos, visando prevenir ou
terminar litígio acerca da res dubia. Seu efeito específico é a extinção da relação
jurídica controvertida (res dubia), mediante concessões recíprocas.
Nehemias Gueiros, em precioso estudo, ensina que:
“quem disser transação, terá dito, conseqüentemente, concessões recíprocas, ou então estará, por condenável catacrese, atribuindo esse nome a uma simples renúncia ou desistência - ato unilateral que pode pôr termo a uma demanda, mas não dará lugar jamais à exceptio litis per transationem finitae, nem é oponível, por isso mesmo, na hipótese do feito litigioso.” 112
111 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2.000, 20ª Edição, p.440. 112 GUEIROS, Nehemias. In Caráter oneroso da transação, perante o direito civil e o requisito da res dubia. Rio de Janeiro: Revista de Direito - Civil, Comercial e Criminal, direção de Bento de Faria, 138:419.
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Prossegue o autor enfatizando que o objetivo da transação é evitar ou
extinguir o litígio, seja, evitar mediante ato extrajudicial ou pôr termo no aforado nos
pretórios.
Na leitura do art. 840 do Código Civil vigente (“É lícito aos interessados
prevenirem ou terminarem litígio mediante concessões mútuas”) se contém os dois
requisitos da transação: a res dubia e as concessões mútuas, ou seja, não havendo
incerteza acerca do direito, e não havendo concessões recíprocas, não há contrato de
transação. A reciprocidade, pois, é da sua essência, havendo dúvida acerca do
cumprimento da obrigação.
A res dubia deve ser compreendida como a incerteza e dúvida que as partes
têm diante da relação jurídica em conflito.
Concessões mútuas significa cada um dar, reter ou prometer alguma coisa,
sofrendo um sacrifício, imprimindo ao contrato de transação o caráter de bilateral,
sinalagmático, distinguindo-o da doação, da renúncia e de outros institutos. Notório,
pois, que se não devem confundir a renúncia com transação. Renuncia-se
unilateralmente acerca de direitos certos e transaciona-se bilateralmente, fazendo-se
concessões mútuas, acerca de direitos incertos. Todavia, se nesta última só um
interessado fizer concessões, implicará em renúncia ou reconhecimento de direito do
outro, e não transação.
O art. 843 do Código Civil de 2002, a exemplo do art. 1.027 do Código Civil
de 1916, diz que a transação interpreta-se restritivamente, e por ela não se transmitem
mas apenas se declaram e reconhecem direitos, impondo a lei ao juiz a consulta à
provável vontade das partes transatoras, pois a finalidade da transação é a
tranqüilidade das relações sociais.
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Aduz Carlos Alberto Dabus Maluf que:
"a interpretação da transação deve ser feita restritivamente, no sentido de não se poder dar à transação uma extensão que ela não comporta, já quanto à renúncia que em si contém, já em relação a contestações que ela visa a dirimir, porque isso importaria em contrariar a vontade das partes que, por meio dela, fazendo renúncia ou abandonando seus direitos numa certa medida, têm a seu favor a prevenção de que só renunciaram ou abandonaram aquilo que do ato consta.” 113
Em decorrência do exposto, o mesmo Dabus Maluf, com espeque em
Carvalho Santos, adverte:
“A intenção das partes, em última análise, é que deve preponderar, devendo o intérprete procurar descobri-la quando não seja expressamente declarada por meio dos processos normais de interpretação dos atos jurídicos, não podendo, porém, estendê-la além daquilo que razoavelmente se contém no pensamento expresso, ou deduzido pelas partes.” 114
No mesmo sentido, E J. M. Carvalho Santos leciona:
"Daí esta regra, geralmente admitida: com relação às questões que visam pôr fim, as transações serão obrigatórias para as partes a respeito de todas as divergências sobre as quais parece que tiveram a intenção de transigir, ainda mesmo que os termos em que o ato esteja redigido não sejam suficientemente explícitos, desde que essa intenção resulte, não de uma indução mais ou menos duvidosa, mas como uma conseqüência necessária do que no ato está expresso." 115
Razão por que julga-se nula a transação quando, por meio dela, se renuncia a
direito indisponível, ou quando se verifica extrapolação aos limites que a lei manda
observar.
113 MALUF, Carlos Alberto Dabus. A transação no Direito Civil e no Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2ª Edição, 1.999, p.90. 114 Ibidem. p.90. 115 SANTOS, E.J.M Carvalho. Código Civil Interpretado. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1.938, Vol. 13, p.375/376.
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Advirta-se, entretanto, com Süssekind, ao referir-se à “conciliação judicial”,
que:
“(...) as transações ocorridas na Justiça do Trabalho, sob a forma de conciliação, são consideradas sempre válidas, eis que operadas sob a vigilância e a tutela da própria Magistratura especializada. O ajuizamento do dissídio individual revela a configuração, não só da “res dubia”, mas também da “res litigiosa”, sendo legítima a composição das partes mediante recíproca transação de questionados direitos. Aliás, o parágrafo único do art. 831 da CLT prescreve que ‘nos casos de conciliação, o termo que for lavrado valerá como decisão irrecorrível’, o que significa que somente poderá ser anulada por meio de ação rescisória.” 116
De acordo com o Código Civil de 1.916, o art. 1.030 dispunha que a
transação produzia entre as partes o efeito da coisa julgada. O Código Civil de 2.002
não reproduziu esta disposição. Não obstante, o art. 831, parágrafo 1º da CLT, reza
que no caso de conciliação, o princípio se compatibiliza e se contém na transação e é
norteador dos conflitos individuais e coletivos, o termo valerá como decisão
irrecorrível assinado pelas partes e pelo juiz, salvo para a Previdência Social quanto às
contribuições que lhe foram devidas, “terá valor de coisa julgada (...) somente podendo
ser rediscutida através de ação rescisória”117, o que difere das lides do direito comum,
quando, então, caberá ação anulatória, por aplicação dos artigos 849 e 850 do Código
Civil vigente.
A homologação arbitral de acordo ou transação havido entre as partes,
entretanto, tem peculiaridades, conforme se verifica da sistemática da Lei nº 9.307/96.
O árbitro, conforme art. 28, pode homologar o acordo, a pedido das partes, se estas se
contiverem nos limites da convenção de arbitragem (arts. 3º, 4º e 9º, III, da Lei de
Arbitragem). Advirta-se que as partes podem pôr fim ao processo arbitral e, firmando
acordo escrito, criam título extrajudicial, independentemente da intervenção do árbitro.
116 SÜSSEKIND, Arnaldo. Op. cit. p.162. 117 OLIVEIRA, Francisco Antônio de. CLT Comentada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p.774-775.
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Contudo, se elas (ambas, em conjunto) pretenderem dar ao acordo escrito a garantia de
título executivo judicial, devem pedir ao árbitro que profira sentença homologatória do
acordo escrito extrajudicial a que chegaram, o que será feito na conformidade do art.
26 da Lei nº 9.307/96. Porém, relembre-se, as partes devem limitar-se aos termos da
convenção de arbitragem, não podendo o árbitro agir tal como o juiz togado, que pode
livremente sancionar acordos que extrapolem os limites do objeto do processo (art.
584, III, CPC), ou seja, se constatado pelo árbitro desbordamento da convenção
arbitral, a ele apenas restará extinguir o feito arbitral, sem, entretanto, homologar o
acordo. Se as partes se conciliarem e não pedirem ao árbitro seja homologado o acordo
extrajudicial, a este caberá extinguir o feito fundado na carência da ação, por ausência
de interesse de agir superveniente.
Ainda no que toca à validade da transação, dispõe o art. 849 do Código Civil
vigente que a transação se anula (é anulável) quando eivada dos denominados vícios
de consentimento, ou seja, por dolo, coação, ou erro essencial quanto à pessoa ou
quanto à coisa controversa.
As normas de Direito do Trabalho são de ordem pública, cogentes, e não
podem ser feridas pelos transatores, donde a regra do parágrafo único do art. 849 é
inaplicável nas transação extrajudiciais, mas não nas judiciais, consoante se viu; e nas
arbitrais, conforme se verá.
Enfocado o art. 841 do Código Civil vigente, pelo qual se estabelece que
somente quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite transação,
conclui-se que os direitos indisponíveis não são abrangidos no referido preceito.
Assim, direitos personalíssimos, de estado, ou decorrentes de normas de ordem
pública, cogentes, imperativas etc., restariam excluídos da norma sob exame.
Não é bem assim quando se trata de direitos trabalhistas, que, não obstante
regidos por normas de ordem pública, cogentes, imperativas, são, como visto, objeto
de transação, contidas em conciliações, estas previstas legalmente. Os efeitos
patrimoniais dos direitos trabalhistas indigitam transação, porquanto deles pode
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suscitar res dubia, como também reciprocidade de concessões das partes transatoras.
Caio Mário da Silva Pereira118 assinala que “(...) não pode ser objeto de transação
qualquer questão que envolva matéria em que é interessada a ordem pública”, mas
“Não quer isto dizer que os efeitos patrimoniais dos direitos insuscetíveis de transação
não a comportem a seu turno. Comportam.”119
Conforme se exemplificou supra, o empregado não pode dispor, e, portanto,
não pode renunciar, ao pagamento do 13º salário, tutelado por norma pétrea
constitucional (CF/88, art. 7º, VIII e Lei nº 4.090/62), mas pode transacionar sobre os
efeitos pecuniários desse direito, se cristalizada a res dubia. Em outras palavras, o
empregado não pode renunciar (ato unilateral) ao pagamento do 13º salário (certeza do
direito), mas pode transacionar com o empregador (negócio jurídico - acordo de
vontades) acerca do seu valor (res dubia), que corresponde ao efeito patrimonial do
seu direito passível de transação. O mesmo se diga com relação ao direito a alimentos
etc.
Para Iara Alves Cordeiro Pacheco, havida a rescisão contratual, extrai-se o
seguinte escólio:
“o empregador deve, efetivamente, pagar ao empregado todas as verbas decorrentes da rescisão contratual, bem como satisfazer direitos até então adquiridos como saldo salarial e férias vencidas. Sendo verbas decorrentes da lei, nesse momento devem ser integralmente pagas, motivo pelo qual o legislador tomou inúmeras cautelas, consoante preceitos contidos no art. 477 da CLT. Somente com relação aos direitos controvertidos, tais como horas extras, diferenças salariais e outras, e, inclusive, com relação a eventuais diferenças referentes a verbas quitadas, é que poderá ocorrer transação em momento posterior.”120
Deve-se entender, entretanto, que o quantum atinente a toda e cada verba
devida em decorrência da lei cogente, pode ser objeto de transação, visto que se pode
118 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 18ª Edição, 1.997, Vol. 1, p.122. 119 Id. Op. cit. p.183. 120 PACHECO, Iara Alves Cordeiro. Os direitos trabalhistas e a arbitragem. São Paulo: LTr, maio/2003, p.112.
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não controverter acerca do direito à verba trabalhista, mas quanto ao seu valor, pode.
Se, por um lado, em termos absolutos, os direitos trabalhistas são tutelados por normas
de ordem pública e, por isso, são inderrogáveis, irrenunciáveis e não transacionáveis,
donde patrimonialmente indisponíveis, estando este preceito enquadrado nos termos
do art. 9º da CLT, é certo que à luz do art. 841 do Código Civil de 2002, ainda que na
extinção do contrato de trabalho os direitos trabalhistas mantenham a
inderrogabilidade, e, conseqüentemente, a irrenunciabilidade, relativizam-se.
Zoraide Amaral de Souza121 aduz que “há indisponibilidade enquanto a
relação jurídico-material existir, isto é, a indisponibilidade está diretamente ligada ao
desenvolvimento da relação trabalhista.” A Autora sustenta seu fundamento com base
na realidade da Justiça do Trabalho, onde o juiz busca o acordo, sem entretanto
preocupar-se em saber “sobre se o direito que está sendo submetido à conciliação, é
disponível ou indisponível.”
No mesmo sentido, Iara Pacheco obtempera:
“após o rompimento do vínculo, os direitos do trabalhador se transformam em valores pecuniários, integrando seu patrimônio, sendo certo que, em regra, os direitos patrimoniais privados são disponíveis. Tal também ocorre com os direitos da personalidade, cujos reflexos patrimoniais a lei civil considera transacionáveis.” 122
O presente trabalho comunga com o entendimento defendido pelas Autoras
retro, parece, até mesmo induvidoso, que arbitráveis são as controvérsias de direito do
trabalho, no campo dos denominados dissídios individuais, mas restritos aos reflexos
patrimoniais desses direitos, haja vista a tutela de ordem pública de que se revestem. O
processo arbitral, terminado por sentença ou por homologação de transação sem
vícios, é meio eficaz e hígido ao desiderato.
Entretanto, em que pese o acerto das razões defendidas pelas autoras ora
121 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p. 189. 122 Ibidem. p.106.
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citadas, em nosso entendimento, devem ser considerados com as devidas cautelas,
tendo em vista que as relações trabalhistas em nosso ordenamento revela um
comportamento de resistência, por parte do empregador, ao cumprimento das normas
públicas cogentes, aproveitando do desequilíbrio dos atores do contrato, onde o
empregado, quer seja pela grave crise do desemprego, quer seja pelo grau de
ignorância a respeito das garantias legais, é facilmente induzido - sob o manto de um
pseudo res dubia e res litigiosa - a transacionar conflitos, crendo está havendo
concessões recíprocas, o que pode efetivamente não ter ocorrido.
Embora num dado momento reconheçamos a transmudação de determinadas
normas cogentes em direito patrimonial, o que abriria, em muito, o leque transacional
por meio da arbitragem, como defendem referidas autoras, tal interpretação jurídica
clama por um sistema de controle específico, porquanto, da forma em que se encontra
normatizado (Lei nº 9.307/96) abre margem para muitas fraudes contra o ordenamento
jurídico tutelar do trabalhador hipossuficiente, devendo, portanto, ser observada com
mais cautela, ou seja, não se pode abrir mão de direitos irrenunciáveis somente porque
este, em determinada fase, reveste-se de patrimonialidade. O que deve prevalecer na
transação do conflito individual trabalhista, sob a égide da Lei de Arbitragem, é a
concessão mútua entre as partes, onde e somente naquilo em que se verifica res dubia,
o que atende ao interesse social do trabalhador, quando da incerteza do seu direito ou,
ainda, quando da incerteza diante da res litigiosa, que será pacificado e definido o
conflito de forma mais justa pelo árbitro escolhido.
E por estas razões não é recomendável a homologação pura e simples da
rescisão de contrato de trabalho, em substituição aos órgãos competentes (Ministério
do Trabalho, Sindicato e etc., que têm o dever de apurar o cumprimento das normas
trabalhistas) por juiz arbitral, eis que não se instaura, efetivamente, uma res litigiosa
e/ou res dubia , mas sim instrumento a legalizar renúncia e impedir o acesso do
trabalhador à justiça.
O ideal para melhor utilização da Arbitragem nos conflitos individuais
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trabalhistas seria em primeiro lugar a vedação de instauração de juízo arbitral antes da
apresentação da rescisão contratual aos órgãos competentes (Ministério do Trabalho,
Sindicato e etc.) que identificarão, dentro de suas prerrogativas, se há ou não
descumprimento de normas trabalhistas, possibilitando o trabalhador hipossuficiente
conhecer de antemão aquilo que denomina-se de res dubia e res litigiosa, vinculando,
assim, o árbitro a conduzir o processo dentro dos parâmetros estabelecidos na Lei nº
9.307/96, o que evitaria, em muito, qualquer tentativa de fraude contra o sistema
trabalhista vigente. Em segundo lugar, na esteira das lições de Zoraide Amaral123, uma
alteração da referida Lei de Arbitragem para que esta permitisse o reexame judicial de
fundo de sentença arbitral, dificultaria, ainda mais, o desvio de conduta na utilização
deste importante meio alternativo de solução de conflitos.
5.2 CONCILIAÇÃO
A conciliação como figura da autocomposição de conflitos de interesse é
característica do processo trabalhista, sendo sempre utilizada com vistas à solução
mais ágil das lides submetidas ao Judiciário. O próprio espírito do processo do
trabalho embrionariamente assumiu esta feição, inspirado pela consecução da
celeridade de procedimento.
Segundo Délio Maranhão, um dos princípios básicos deste processo é a
tentativa obrigatória de composição proposta pelo magistrado. Diz o autor:
"O direito do trabalho visa à paz social. Não podia o processo deixar de refletir essa destinação do direito que lhe cabe realizar. Estabelece, por isso, o art. 765 da Consolidação que "os dissídios individuais e coletivos submetidos à apreciação da Justiça do Trabalho serão sempre sujeitos à conciliação"."124
123 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p. 193 . 124 MARANHÃO, Délio. Instituições do direito do trabalho. 22ª ed., São Paulo: LTr, 2005, p. 1305
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No contexto, apropriada a distinção efetuada por Wagner D. Giglio, no
tocante a conciliação e acordo. Assevera o doutrinador :
"A conciliação, no nosso entender, tem um conceito mais amplo do que o acordo, significando entendimento, recomposição de relações desarmônicas, desarme de espírito, compreensão, ajustamento de interesses; acordo é apenas a conseqüência material, regra geral de ordem econômica da conciliação das partes. Tradicionalmente, dentro da disciplina celetista, a proposta conciliatória pode ser intentada pelo juiz em qualquer etapa do processo. A homologação do acordo, na forma do art. 831, parágrafo único, do Texto Consolidado, terá força de decisão irrecorrível."125
Cônsono o art. 846 consolidado (Lei nº 9.022/95), no capítulo Dos Dissídios
Individuais, o juiz deverá tentar a composição na abertura da audiência e antes do
julgamento, sob pena de nulidade. Somente se fracassada a iniciativa, a defesa será
oferecida pelo réu.
Em relação aos Dissídios Coletivos, caput do art. 860, a disposição é a
mesma: “recebida e protocolada a representação, e estando na devida forma, o
presidente do tribunal designará a audiência de conciliação, dentro do prazo de dez
dias, determinado a notificação dos dissidentes com observância do disposto no art.
841.”
O procedimento sumaríssimo no processo trabalhista, instituído pela Lei nº
9.957, de 12 de janeiro de 2000, mantendo o princípio da conciliabilidade deste
processo, a conciliação encontra-se prevista no art. 852-E: “(...) Aberta a sessão, o juiz
esclarecerá às partes presentes sobre as vantagens da conciliação e usará os meios
adequados de persuasão para a solução conciliatória do litígio, em qualquer fase da
audiência (...)”.
Ainda convém salientar que, dentro do amplo poder que dispõe o juiz na
direção do processo, em alguns feitos em execução, a audiência de conciliação é
125 GIGLIO, Wagner D. Direito Processual do Trabalho, 8ª ed. São Paulo: LTr, 1993. p. 227.
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viável, sendo a iniciativa resguardada pelo art. 342 do CPC. Do ponto de vista prático,
tem-se mostrado providência profícua, pois as partes sabem o valor certo do crédito e,
muitas vezes, se concretiza um acordo (parcelado ou não). O objetivo é de evitar a
penhora e expropriação e demais incidentes processuais daí decorrentes, que,
freqüentemente, tornam infindáveis as execuções.
A conciliação judicial trabalhista é, portanto, ato judicial, através do qual as
partes litigantes, sob interveniência da autoridade jurisdicional, ajustam solução
transacionada sobre matéria objeto de processo judicial. Embora próxima às figuras da
transação e da mediação, delas distingue-se em três níveis, conforme leciona Maurício
Godinho:
“ no plano subjetivo, em virtude da interveniência de um terceiro e diferenciado sujeito, a autoridade judicial; no plano formal, em virtude de realizar-se no corpo de um processo judicial, podendo extingui-lo parcial ou integralmente; no plano de seu conteúdo, em virtude de poder a conciliação abarcar parcelas trabalhistas não transacionáveis na esfera estritamente privada.”126
Do exposto, a conciliação é o corolário do procedimento da justiça
trabalhista, que, com razão, merece encômios, como conclui Zoraide Amaral:
“Não resta dúvida, portanto, de que no processo judicial trabalhista impera o princípio da conciliabilidade, o que só merece aplausos, já que as relações entre os cidadãos, mesmo que este estejam em campos aparentemente opostos, deverão percorrer uma trilha que os leve a um acordo e não a uma demanda, necessitando que um terceiro por eles solucione problemas que, em muitos casos, são tão pequenos que sem um esforço maior podem lograr solução amigável.”127
Urge, entretanto, ressaltar, em que pese ser a conciliação judicial um notável
e ágil mecanismo de composição dos conflitos trabalhistas, cujo índice de conciliação
126 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit. p.1447. 127 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p.199.
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em 2005 representou 44,3 % dos processos trabalhistas, conforme estatística do TST128
não se pode fechar os olhos para os desmandos que vêm ocorrendo na celebração de
pseudos acordos que sob o manto judicial, encobrem verdadeira renúncia de direitos
pelo trabalhador hipossuficiente, em excessiva e execrável vantagem do empregador,
desequilibrando a comutatividade que deveria permear qualquer conciliação. Com a crescente crise que se instala no judiciário trabalhista, sobretudo pelo
excessivo números de processos e falta de estrutura adequada para dirimir os conflitos
cada vez mais intensos, que serão objetos de estudo em capítulo específico, acabou por
gerar um desvio de conduta dos conciliadores judiciais, in casu os magistrados
trabalhistas que, na ânsia de verem-se livres dos intermináveis processos, celebram
acordos sem nenhum critério crítico do conflito posto ao apreço judicial, fazendo
ouvido moco à fraude e desvirtuamento da aplicação das normas de caráter laboral de
ordem pública. Esta conduta de prevalecimento do acordado sobre o legislado,
estimula o descumprimento, por parte dos empregadores, das normas públicas da
legislação trabalhista, que, por sua vez, redundará em novos conflitos e ações
judiciais, num círculo vicioso de violação dos princípios fundamentais.
Esta realidade percebida no cotidiano forense é confessada por alguns
magistrados trabalhistas que contribuem no mercado editorial. Neste sentido, Antônio
Álvares da Silva, Juiz togado do TRT 3ª Região, escrevendo sobre métodos
alternativos de solução dos conflitos do trabalho sustenta que as conciliações
apressadas, promovidas pelos juízes do trabalho em pautas longas e tumultuadas, não
representam transações, mas costumeira renúncia de direitos. Diante deste grave
contexto, o referido autor lança pertinente indagação:
“E, o que é pior em tais situações, muitas vezes o argumento para que o empregado aceite propostas irrisórias ou insuficientes consiste exatamente na demora do processo e na lentidão da Justiça do Trabalho. Onde fica a garantia de apreciação pelo Poder Judiciário de lesão ou ameaça a direito (art. 5º, item XXXV), se a lesão é perpetrada pelo próprio Poder Judiciário?129
128 http://www.tst.gov.br. 129 SILVA, Antônio Álvares da. "Solução dos Conflitos do Trabalho", in BARROS, A.M. de (Coord.), Curso de direito do trabalho. Estudo em memória de Célio Goyatá. Vol. II, 1ª ed., São Paulo: LTr, 1993. p. 732
99
99
Diante deste quadro caótico e a urgente necessidade de reduzir o volume
estrondoso de reclamatórias trabalhistas ajuizadas perante a Justiça do Trabalho, na
busca de meios alternativos de solução de conflitos, editou-se a Lei nº 9.958, de 12 de
janeiro de 2000, que criou as Comissões de Conciliação Prévia no âmbito trabalhista,
que serão objeto de estudos no próximo item.
5.3 AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA
A instituição da Comissão de Conciliação Prévia teve origem no Egrégio
Tribunal Superior do Trabalho que, preocupado com o imenso volume de processos (2
milhões e meio)130, apresentou proposta de reforma do processo de trabalho.
O Poder Executivo, adotando a idéia originária do Tribunal Superior do
Trabalho, remeteu ao Congresso o anteprojeto com a Mensagem n. 952/98 (06 ago.
1998), subscrita pelo então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, com
exposição de motivos (nº 509, 28 jul. 1998) subscrita pelos então Ministros de Estado
da Justiça (Renan Calheiros) e do Trabalho (Edward Amadeo).
O objetivo expresso na Exposição de Motivos é evitar "... a chegada ao
Judiciário de grande parte das demandas trabalhistas".
O dito projeto de lei sofreu inúmeras modificações até se transformar na Lei
nº 9.958/00, que efetivamente veio instituir as Comissões de Conciliação Prévia de
forma geral no âmbito da Justiça do Trabalho.
Assim, as empresas e os sindicatos ficam autorizados a instituírem núcleos
conciliatórios, com composição paritária. É, portanto, uma faculdade, que poderá ser
exercida através da convenção coletiva.
O intuito do TST e do legislador foi o de desafogar o judiciário trabalhista,
130 Disponível no site htp://www.tst.gov.com.br.
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conciliando as partes, como já tentara anteriormente, com edição da súmula (antigo
Enunciado) nº 330131, furtando-se, assim, o Estado do dever de proteção de direitos
fundamentais trabalhistas.
5.3.1 Decomposição da Lei nº 9.958/00.
A Lei n. 9.958/00 é composta de quatro artigos (1º ao 4º) que introduzem o
TÍTULO VI-A e os artigos 625-A a 625-H na Consolidação das Leis do Trabalho,
além de alterar a redação do art. 876 e de inserir, ainda na CLT, o art. 877-A.
O art. 625-A torna clara a faculdade ("podem") que as empresas e os
sindicatos têm para instituir as Comissões de Conciliação Prévia, de composição
paritária, com representantes dos empregados e dos empregadores, com atribuição
específica de tentar a conciliação dos dissídios individuais do trabalho, podendo ser
criadas por grupos de empresas ou de forma intersindical.
A lei, interpretada em seu conjunto, permite concluir que as Comissões -
embora enquadradas na disciplina do Direito Coletivo - atuam apenas nos dissídios
individuais do trabalho. Para a correta constituição, elas devem observar o princípio da
negociação coletiva, ao passo que, quanto ao funcionamento, o princípio paritário é
imprescindível.
A natureza delas é parajudicial, de composição paritária e de instituição
facultativa, tanto no âmbito das empresas como nos sindicatos, com atribuição
específica de tentar a conciliação dos conflitos individuais do trabalho.
131 A súmula nº 330 do TST estabelece que: “A quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, ao empregador, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas. I - A quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, conseqüentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo; II - Quanto a direitos que deveriam ter sido satisfeitos durante a vigência do contrato de trabalho, a quitação é válida em relação ao período expressamente consignado no recibo de quitação.
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Obtida a conciliação, seus efeitos extrapolam os sujeitos envolvidos
(empregador e empregado), pois o termo lavrado tem natureza de título executivo
extrajudicial (art. 585, II, do Código de Processo Civil), podendo ser executado na
forma prevista no Título X do Capítulo V da Consolidação das Leis do Trabalho (art.
876).
As Comissões podem ser instituídas no âmbito das empresas ou no dos
sindicatos.
Conforme art. 625B, no âmbito das empresas, a composição das Comissões
está prevista o número mínimo de 02 (dois) e o máximo, 10 (dez) membros, com
respectivos suplentes, todos com mandato de um ano, permitida uma recondução,
metade indicada pelo empregador e a outra metade eleita pelos empregados, em
escrutínio secreto, "fiscalizado" pelo sindicato da categoria profissional.
O termo "Fiscalizado" (inc. I do art. 625-B da Lei 9.958/00), tem sentido
mais amplo do que assistir ou exercer vigilância. Reflete, na verdade, a participação
integrativa do sindicato em todo o processo eletivo, desde o seu início (arts. 513 e 514
da Consolidação das Leis do Trabalho e inc. III do art. 8º da Constituição da
República).
Os representantes dos empregadores são indicados (e não eleitos), não se
exigindo que sejam necessariamente empregados (inc. I do art. 625-B).
A Comissão Intersindical, no entendimento de inúmeros autores, é "... a
criada por mais de um sindicato, independentemente de categoria, podendo ser
patronal ou de trabalhadores, com a participação de ambas as espécies para manter a
paridade"132, acresço os princípios retromencionados, que não podem estar ausentes
das Comissões.
As Comissões instituídas em contrariedade à lei padecerão de vício
132SOUSA FILHO, Georgenor de. A lei das comissões de conciliação prévia, in LTr, v. 64, 2000, pp. 174-177; VEIGA JÚNIOR, Celso Leal da. A Lei 9.958 de 12 de janeiro de 2000. Alguns questionamentos práticos em decorrência da instituição e funcionamento das comissões de conciliação prévia, in LTr, Sup. Trab. 029/00, pp. 141-146.
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intrínseco de constituição, que contamina os atos por elas praticados - especificamente
a conciliação - tornando-os passíveis de discussão judicial (nulidade ou anulabilidade),
conforme adiante se abordará. Ou seja, os atos praticados por tais Comissões não terão
a eficácia prevista na Lei n. 9.958/00.
As categorias inorganizadas em sindicatos, no âmbito de suas
representações, poderão, através das Federações ou das Confederações que as
representem - econômicas e profissionais -, celebrar Convenções Coletivas de
Trabalho com o fim de instituir as Comissões de Conciliação Prévia, conforme
franqueado pelo § 2º do art. 611 da CLT.
Os representantes dos empregados integrantes das Comissões, titulares e
suplentes, necessariamente empregados (embora dispensada a filiação sindical), têm
garantia do emprego até um ano após o final do mandato, salvo se cometerem falta
grave, nos termos da lei (art. 625-B, § 1º). Os dirigentes sindicais que as integram têm
as suas próprias estabilidades.
As funções do representante dos empregados na empresa não se alteram (art.
625-B, § 2º). Delas ele apenas se afasta no momento em que tem assento na Comissão,
na qual exercerá a função de "conciliador", "... sendo computado como tempo de
trabalho efetivo o despendido nessa atividade" (art. 4º da CLT).
Diz a lei: "Qualquer demanda de natureza trabalhista" (art. 625-D) será
submetida à Comissão Prévia se, na localidade da prestação de serviços, houver sido
instituída a Comissão no âmbito da empresa ou do sindicato da categoria.
A locução "qualquer demanda" não está a revelar que qualquer demanda
trabalhista deverá obrigatoriamente ser submetida à Comissão de Conciliação.
A dimensão da locução qualquer demanda não pode assumir um sentido
capaz de corromper a utilidade da tentativa prévia de conciliação. Intenciona-se uma
alternativa de autocomposição dos dissídios, mas uma alternativa de algo viável,
factível.
Por exemplo, não faz senso submeter à CCP o objeto de uma ação de
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cumprimento, um inquérito para apuração de falta grave, a ação de consignação em
pagamento, a ação rescisória, a declaratória, a reconvenção, a ação revisional, tutelas
urgentes (cautelar, tutela antecipada, mandado de segurança), a ação anulatória, entre
outras.
Essas hipóteses não desvendam a utilidade de uma tentativa de conciliação
prévia, muito embora a nenhuma delas se irá negar o atributo que faz o gênero de
qualquer demanda. A imperatividade do texto legal não pode orientar a absurdidade,
como viria a corresponder a falta de presteza de sua aplicação e da sua própria
existência.
Logo, o sentido de qualquer demanda cabe para todas as demandas que
possam satisfazer a razoabilidade de algum propósito de utilidade ideado pela lei: a
conciliação.
Seria teratológico, por exemplo, a tentativa de conciliação prévia tendo como
devedor uma Massa Falida. Invariavelmente, a empresa está lacrada e a Massa não
dispõe de ativos disponíveis. Além disso, o síndico nada poderia fazer sem a prévia
autorização do juiz da falência. Não obstante, ao se situar o sentido de toda demanda à
locução qualquer demanda, não se excluiria a massa falida. É escusado discorrer sobre
a flagrância dessa inocuidade.
Em razão de seu escopo estrito, na prevenção de conflitos judiciais, não
cabem às Comissões de Conciliação Prévia prestar a assistência à rescisão contratual,
desfalcada de litigiosidade, do empregado com mais de um ano de serviço, pois
legitimados para tanto são somente o respectivo Sindicato ou a autoridade do
Ministério do Trabalho, ex vi do § 1º do art. 477 da CLT, até porque elas não têm
competência para autorizar a movimentação da conta vinculada do FGTS.
As "demandas" serão formuladas por escrito, podendo ser reduzidas a termo
por qualquer dos integrantes da Comissão, que o assinará e entregará (cópia datada e
assinada) aos interessados (art. 625-D). Os "interessados" são o empregador e o
empregado demandante. Os demais membros da Comissão também deverão ter acesso
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ao pleito, embora não na condição de "interessados".
Não sendo celebrada a conciliação, os membros da Comissão firmarão
declaração de "tentativa conciliatória frustrada", com descrição de seu objeto, que será
entregue ao empregador e ao empregado, a ser juntada à eventual reclamação
trabalhista (art. 625-D, § 2º).
Se houver Comissão no local da prestação de serviços, no âmbito da empresa
ou do sindicato da categoria, o empregado deve submeter a sua demanda ao
procedimento conciliatório. Contudo, o § 3º do art. 625-D excepciona a regra e
permite o ajuizamento de ação trabalhista com desprezo ao sistema prévio
conciliatório, quando houver motivo relevante para tanto.
Constatado o motivo relevante que impossibilite a submissão da lide à
Comissão de Conciliação Prévia, "... será a circunstância declarada na petição inicial
da ação intentada perante a Justiça do Trabalho" (art. 625-D, § 3º).
Um exemplo de motivo relevante é a Comissão não funcionar em
decorrência de caso fortuito (acontecimento derivado da força da natureza) ou força
maior (dano originário em fato de outrem).
A apreciação do motivo ficará na esfera do livre convencimento do Juiz, que
poderá acatá-lo ou não, sempre de forma fundamentada.
Questão que gerou grande polêmica é a da natureza jurídica da submissão da
demanda ao sistema prévio conciliatório. Seria condição da ação (como originalmente
previsto no art. 836-C do Projeto de Lei n. 4.694/98) ou pressuposto processual?
As condições da ação, tradicionalmente aceitas pela doutrina, são três:
possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimação ad causam.
Caracterizam-se como "... condições para que legitimamente se possa exigir, na
espécie, o provimento jurisdicional"133.
Possibilidade jurídica do pedido é a sua acomodação ao ordenamento
133 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini. DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, 7ª ed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 229.
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jurídico, pois, muitas vezes, esse, a priori, afasta ou veda a apreciação do pleito pelo
Poder Judiciário, como no caso clássico das dívidas oriundas de jogo (art. 1477 do
Código Civil).
O interesse de agir revela-se quando a prestação jurisdicional resulte útil para
quem a solicite, além de necessária (só se obtém o bem almejado com a interferência
do Estado) e adequada (a lesão ou ameaça a direito deve corresponder ao provimento
judicial reclamado).
A legitimidade ad causam diz respeito às titularidades, tanto de quem se diz
lesado ou ameaçado em seu direito (titular da ação, art. 6º do Código de Processo
Civil) como daquele que é responsável pela obrigação correlata.
Na ausência de qualquer das condições, o autor é carecedor de ação, que se
extingue sem apreciação do mérito.
A submissão da demanda ao procedimento conciliatório prévio não se
aproxima de nenhuma das condições da ação, não tendo, pois, essa natureza.
Já os pressupostos processuais "... são requisitos para a constituição de uma
relação processual válida (ou seja, com viabilidade para se desenvolver regularmente -
CPC, art. 267, IV)"134.
O art. 82 do Código Civil exige para a validade do ato jurídico, a presença de
"...agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei". No âmbito da
relação processual, que é relação jurídica distinta da encontrada no direito material,
certos requisitos são necessários para que ela seja válida, embora com contornos
próprios, distintos dos daqueles previstos no art. 82 do Código Civil.
Os pressupostos processuais são: "a) uma demanda regularmente formulada
(CPC, art. 2º; CPP, art. 24); b) a capacidade de quem a formula; c) a investidura do
destinatário da demanda, ou seja, a qualidade de juiz. A doutrina mais autorizada
sintetiza esses requisitos nesta fórmula: uma correta propositura da ação, feita perante
134 CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, Op. cit., p. 257.
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uma autoridade jurisdicional, por uma entidade capaz de ser parte em juízo."135
Advertem os processualistas que os pressupostos "... inserem-se entre os
requisitos de admissibilidade do provimento jurisdicional"136. Há, entretanto, na
doutrina brasileira, uma tendência não tão restrita quanto aos pressupostos processuais,
consoante leciona Ada Pelegrini:
"Segundo essa tendência, eles se classificariam em: I- objetivos; II- subjetivos. Os objetivos seriam: a) intrínsecos (regularidade procedimental, existência de citação); b) extrínsecos (ausência de impedimentos, como coisa julgada, litispendência, compromisso). Os subjetivos seriam: a) referentes ao juiz (investidura, competência, imparcialidade); b) referentes às partes (capacidade de ser parte, capacidade de estar em juízo, capacidade postulatória)"137.
Diante da assertiva acima, a pretensa inconstitucionalidade (violação do art.
5º, XXXV da Constituição Federal.), vislumbrada por alguns138, na obrigatoriedade da
passagem prévia da demanda perante a comissão de conciliação, não tem qualquer
procedência, pois, a observância do procedimento previsto no caput do art. 625-D, tem
a natureza de pressuposto processual objetivo extrínseco, o que significa dizer que,
estando instalada a Comissão, não submeter a demanda ao procedimento prévio
conciliatório implica na extinção da reclamação ou do pedido, sem julgamento do
mérito (inc. IV do art. 267 do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicado ao
Processo do Trabalho).
135 Ibidem, p. 258. 136 CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, Op. cit., p. 258. 137, Ibidem pp. 257-258. 138 Tramitam no STF três ações de declaração de inconstitucionalidade sobre questões relativas à obrigatoriedade de submeter a demanda à Comissão e sobre a eficácia liberatória do acordo formalizado perante ela, proposta pelos Partidos Políticos que na época eram de oposição (PT, PSB, PDT e PcdoB), pela ABRAT, através da Confederação Nacional dos Profissionais Liberais e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio.
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Pertine asserir, por oportuno, a observação de Zoraide Amaral no sentido
que algumas Varas do Trabalho não vinham cumprindo este pressuposto processual:
“determinadas varas do Trabalho, apesar de haver comissões instituída para a categoria profissional a que pertence o interessado, os seus juízes não esteja exigindo esse pressuposto para o ajuizamento da reclamação trabalhista, sob a alegação de que o acordo tanto pode ser realizado na Comissão de Conciliação Prévia, como na audiência de conciliação na Vara de Trabalho, o que leva os interessados ao descumprimento da lei e, principalmente, ao afogamento da própria justiça obreira."139
Zoraide Amaral140 destaca ainda que O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª
Região (São Paulo), a respeito do tema, editou a Súmula n. 2, com o seguinte teor:
“CCP extinção de processo. “o comparecimento perante a Comissão de Conciliação prévia é uma faculdade assegurada pelo obreiro, objetivando a obtenção de um título executivo extrajudicial, conforme previsto pelo art. 625-E, parágrafo único, da CLT, mas não constitui condição da ação, nem tampouco pressuposto processual na Reclamação Trabalhista, diante do comando emergente do art. 5º XXXV da CF”141
O Tribunal Superior do Trabalho, por sua vez, não comunga o entendimento
acima esposado, aderindo à corrente que interpreta o comando do art. 625-E, como
pressuposto processual na Reclamação Trabalhista:
"RECURSO DE REVISTA – OBRIGATORIEDADE DA SUBMISSÃO DA DEMANDA À COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA – A submissão da demanda à Comissão Prévia de Conciliação, estabelecida no art. 625-D da CLT, é obrigatória e, assim, constitui pressuposto para a constituição e desenvolvimento válido e regular do processo. Recurso de revista a que se nega provimento."142
139 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p.205 140 Ibidem, p. 206 141 Publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo – Parte Justiça – de 12 de novembro de 2002, Caderno I, parte I, p. 158 142 TST – RR 1.374/2001-113-15-00.4 – 5ª T. – Rel. Min. Gelson de Azevedo – DJU 02.09.2005. No mesmo sentido as seguintes Ementas: TST – RR 157/2002-314-02-00.1 – 4ª T. – Rel. Juiz Conv. José Antonio Pancotti – DJU 02.09.2005; TST – RR 54323/2002-902-02-00.9 – 3ª T. – Relª Minª Maria Cristina Irigoyen Peduzzi –
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Suplantada a celeuma da constitucionalidade do comando do art. 625-D da
CLT, urge, ainda, destacar que quando houver Comissão de empresa e Comissão
sindical na mesma localidade e para a mesma categoria, o interessado optará por uma
delas para submeter a sua demanda. Competente será a Comissão que primeiro
conhecer da demanda (art. 625-D, § 4º).
Não raro, haverá concomitantemente duas Comissões, uma instalada na
empresa, por Acordo Coletivo e, outra, intersindical. Quando tal ocorrer, a regra
contida no § 4º do art. 625-D da Lei n. 9.958/00 dará lugar ao princípio que impõe o
afastamento do geral em prol do específico ou particular. Ou seja, o mais próximo
sobrepõe-se ao afastado ou longínquo. A Comissão no âmbito da empresa (especial)
afasta a possibilidade de opção pela Comissão intersindical (geral), exceto se de forma
diversa prever a negociação coletiva.
Celebrada a conciliação, lavrar-se-á termo assinado pelo empregado, pelo
empregador ou seu preposto e pelos membros da Comissão, fornecendo-se cópias às
partes (art. 625-E).
Diz a lei que o termo de conciliação tem a natureza de título executivo
extrajudicial, com eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente
ressalvadas (parágrafo único do art. 625-E).
Para que sejam evitadas situações altamente lesivas aos interesses dos
empregados - pelas conseqüências decorrentes do inadimplemento do acordo - é
oportuno, nas Comissões, o aproveitamento do texto contido no § 2º do art.
846/CLT.143
A conciliação celebrada na Comissão será passível de anulação judicial,
DJU 10.12.2004; TST – RR 50957 – 1ª T. – Rel. Min. João Oreste Dalazen – DJU 19.11.2004; TST – RR 50.957/02.0 – 1ª T. – Rel. Min. João Oreste Dalazen – DJU 19.11.2004 – p. 539; TST – RR 733 – 4ª T. – Relª Minº Ives Gandra Martins Filho – DJU 11.06.2004 143 CLT - Art. 846, § 2º: Entre as condições a que se refere o parágrafo anterior, poderá ser estabelecida a de ficar a parte que não cumprir o acordo obrigada a satisfazer integralmente o pedido ou pagar uma indenização convencionada, sem prejuízo do cumprimento do acordo.
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como os demais atos jurídicos, devendo, entretanto, numa reclamatória trabalhista, ser
invocado em sede de preliminar a existência de irregularidades no procedimento da
Comissão, invocando-se os preceitos do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, que
veda a lei de excluir qualquer lesão de direito da apreciação do Judiciário.
Destarte, para que os atos da Comissão gerem os efeitos esperados, são
necessários que:
- a) a Comissão atenda aos pressupostos legais de sua existência
(constituição conforme a lei);
- b) a transação seja válida, isto é, perfeita, sem que seus elementos
essenciais padeçam de qualquer deficiência que a invalide (p. ex. erro, art. 86/CCB;
dolo, art. 92/CCB; coação, art. 98/CCB, ou simulação, art. 102/CCB).
Só assim - estando a Comissão devidamente constituída e celebrada a
conciliação (válida) - haverá eficácia jurídica, fonte de direitos e deveres.
O art. 625-F concede às Comissões o prazo de dez dias para a realização da
sessão conciliatória, contados a partir da provocação do interessado.
Como a Comissão fornece "... cópia datada e assinada pelo membro..." (art.
625-D, § 1º) aos interessados, é desta data que se tem a comprovação da provocação e
da qual se conta o prazo de dez dias.
Esgotado o prazo sem que a sessão tenha sido realizada, será fornecida, "...no
último dia do prazo, a declaração a que se refere o § 2º, do art. 625-D" (parágrafo
único do art. 625-F).
O art. 625-G prevê que o "... prazo prescricional será suspenso a partir da
provocação da Comissão de Conciliação Prévia, recomeçando a fluir, pelo que lhe
resta, a partir da tentativa frustrada de conciliação ou do esgotamento do prazo
previsto no art. 625-F".
Trata-se de suspensão da prescrição, que recomeça a fluir, pelo que lhe resta,
após o afastamento da causa suspensiva. Como o prazo para a Comissão realizar a
tentativa de conciliação é de dez dias, a suspensão jamais o ultrapassará.
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Aos Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista, em funcionamento ou
que vierem a ser criados, são aplicáveis as disposições previstas nesse Título, desde
que observados os princípios da paridade e da negociação coletiva na sua constituição
(art. 625-H).
É de particular precisão a crítica de José Alberto Couto Maciel:
"É difícil entender que se estabeleçam as referidas Comissões em órgãos que não existem legalmente. É como se admitir sua criação em centrais sindicais. Não existe previsão legal na criação de Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista. E, ainda que existam, mediante convenção coletiva, quem representa o empregador e o empregado e qual a competência desses núcleos criando-se as Comissões?"144
Antes da Lei n. 9.958/00, os Núcleos Intersindicais tinham existência fática,
mas não se inseriam no ordenamento legal, a despeito das boas intenções daqueles que
os idealizaram. A Lei n. 9.958/00 os integrou ao ordenamento jurídico, desde que
constituídos em consonância com os "princípios da paridade e da negociação coletiva
na sua constituição".
A convalidação prevista na Lei n. 9.958/00 não atinge todos os Núcleos:
somente os que tenham observado os "... princípios da paridade e da negociação
coletiva na sua constituição" (art. 625-H) é que estão salvos. Outros - criados, por
exemplo, com base estatutária, sem observância nos seus atos constitutivos dos
princípios mencionados - continuam à margem da lei, por ausência de pressupostos
existenciais (constituição através de negociação coletiva e paridade representativa). Ou
seja: os Núcleos atuais, desde que constituídos de forma paritária e através da
negociação coletiva, conformam-se à lei. Os demais padecerão de vícios insanáveis de
constituição e seus atos (conciliação, p. ex.) serão destituídos de segurança jurídica (ou
seja, os Núcleos irregulares não têm a atribuição prevista na Lei 9.958/00).
144 COUTO MACIEL, José Alberto. Comentários à Lei n. 9.958, de 12 de janeiro de 2000, São Paulo: Rev. LTr 64, 2000, pp. 178-183.
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O art. 2º da Lei n. 9.958/00 altera o art. 876 da Consolidação das Leis do
Trabalho, que passa a ter a seguinte redação:
"Art. 876. As decisões passadas em julgado ou das quais não tenha havido recurso com efeito suspensivo; os acordos, quando não cumpridos; os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho e os termos de conciliação firmados perante as Comissões de Conciliação Prévia serão executados pela forma estabelecida neste Capítulo."
O art. 876 com a nova redação estende a competência da Justiça do
Trabalho, na forma do que prevê a Constituição Federal (art. 114), para fins de
promoção da execução dos termos de conciliação celebrados perante as Comissões e
dos termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho.
Já o art. 3º da Lei n. 9.958/00, acrescenta à Consolidação das Leis do
Trabalho o art. 877-A, para fixar a competência do título executivo extrajudicial como
sendo a do juiz que a teria para o processo de conhecimento relativo à matéria.
A norma inter-relaciona-se com os artigos 625-D e 651 (e §§), ambos da
Consolidação das Leis do Trabalho, que fixam como regra geral de competência a
localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao
empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.
As Comissões de Conciliação Prévia representam um avanço, não há como
negar. Suprem ou diminuem certas carências ou deficiências, notadamente no campo
processual, no qual o sistema tradicional de solução dos litígios se mostra
insatisfatório. Não resolvem, porém, o estado de empobrecimento geral do povo e do
próprio Estado (acentuado nos últimos anos com a "âncora cambial" encerrada em
janeiro de 1999, a alienação do parque industrial, o comprometimento das receitas
destinadas ao pagamento de juros e a abertura indiscriminada das importações), ao
lado da natural retração dos postos de trabalho decorrente das novas tecnologias, tudo
a acentuar as grandes desigualdades sociais do País, razão que levou o jurista italiano a
112
112
profetizar:
"Podemos ser céticos, por exemplo, a respeito do potencial das reformas tendentes ao acesso à justiça em sistemas sociais fundamentalmente injustos. É preciso que se reconheça que as reformas judiciais e processuais não são substitutos suficientes para as reformas políticas e sociais. Muitas vezes, o problema é mais político e econômico do que institucional."145
Em conseqüência desta realidade nacional, os resultados apurados juntos às
Comissões de Conciliação Prévia não têm sido animador, sendo objeto das mais sérias
denúncias, conforme noticia Benizete Ramos de Medeiros:
“...O mesmo não ocorre com a maioria dos trabalhadores que estão sendo levados às Comissões de Conciliação Prévia, via de regra, para homologarem sua rescisão por suporem se encontrar nos sindicatos de classe ou nas Delegacias Regionais do Trabalho, dando quitação de direitos que sequer conhecem, como horas extraordinárias, multas, diferenças diversas, equiparação salarial, etc.
A fraude circundada pelo erro do empregado vem ganhando campo propício e fecundo em todo o Brasil. Os relatos são inúmeros, as experiências danosas e os resultados nefastos, traduzidos pela revolta do obreiro ao ser noticiado que não poderá ingressar em juízo.
A par disso, é que recentemente em visita ao Presidente do STF, Min. MARCO AURÉLIO DE MELLO, o presidente da ABRAT - Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas, entregou pessoalmente um dossiê, cujo conteúdo dá conta das inúmeras fraudes que vêm ocorrendo em todo o País, em desfavor do trabalhador.”146
Considerando a enorme disparidade econômica-financeira, social e cultural
entre as partes que se submetem às Comissões de Conciliação Prévia, urge uma
adequação na Lei nº 9.958/2000, sobretudo no que diz respeito à assistência jurídica do
trabalhador, acompanhamento de todo o procedimento conciliatório pelo Sindicato,
145 CAPPELLETTI, Mauro, GARTH, Bryant. Op. cit. p. 161. 146 MEDEIROS, Benizete Ramos de. Comissões de Conciliação Prévia e os Princípios do Direito do Trabalho. Porto Alegre: Jornal Síntese nº 64, junho/2002, p. 3.
113
113
sobretudo nas Comissões de Empresa, entre outros mecanismo de controle para coibir
o mal-uso deste importantíssimo instrumento alternativo de solução de conflitos,
desafogando, assim, o judiciário trabalhista.
5.4 MEDIAÇÃO
A mediação, como já estudado no capítulo 2, é a conduta pela qual um
terceiro aproxima as partes conflituosas, auxiliando e, até mesmo, instigando sua
composição, que há de ser decidida, porém, pelas próprias partes.
A ordem jurídica trabalhista anterior a 1988 previa a mediação compulsória
nos conflitos laborais coletivos, a ser realizada por autoridades do Ministério do
Trabalho. De fato, a CLT, no campo regulatório da negociação coletiva trabalhista (art.
616, §§ 1º e 2º), previa a convocação compulsória para comparecimento perante os
órgãos administrativos especializados do Ministério do Trabalho de sindicatos e
empresas recalcitrantes, visando a dinâmica negocial a ser ali implementada. Presentes
as partes, processava-se a mediação administrativa em direção à negociação coletiva.
Contudo, a mesma CLT já indicava que a recusa à convocação ou o insucesso da
mediação facultavam aos sujeitos coletivos interessados a instauração do dissídio
coletivo (art. 616, § 2º).
A mediação na negociação coletiva de natureza trabalhista possuía suas
regras previstas no Decreto nº 1.572, de 28 de julho de 1995.
Em 16 de fevereiro de 2001, foi publicada no Diário Oficial da União, a Lei
nº 10.192, objetivando tentar prevenir o ajuizamento de Dissídio Coletivo, conforme
se revela pelo seu art. 11 que estabelece que "frustada a negociação entre as partes,
114
114
promovida diretamente ou através de mediador, poderá ser ajuizada a ação de dissídio
coletivo."
A referida legislação estabelece os critérios para a escolha do mediador. Este
pode ser pessoa física escolhida pelas partes, de comum acordo, ou, indicado pelo
Ministério do Trabalho ou pelo Ministério Público do Trabalho, se assim as partes
solicitarem. É possível a indicação de servidores do próprio Ministério do Trabalho,
quais sejam inspetores ou fiscais do trabalho. Havendo recusa da indicação pelas
partes, frustrada estará a mediação e a composição do conflito.
A qualificação do mediador é muito importante para obtenção do consenso
entre as partes. O próprio Ministério do Trabalho mantém um cadastro de profissionais
aptos para o desempenho da função. São requisitos para o credenciamento dos
interessados a experiência em composição de conflitos trabalhistas e conhecimentos
técnicos relativos às questões trabalhistas. Neste sentido, adverte Raimundo Simão de
Melo:
“Porém, tanto o mediador, como o árbitro, para cumprirem com êxito seus misteres, precisam estar bem preparados tecnicamente e conhecer as questões e circunstâncias fáticas que envolvem o conflito de trabalho; precisam conhecer os problemas econômicos, sociais e políticos do país; precisam conhecer modernas técnicas de negociação coletiva; finalmente, precisam ter experiência e vivência prática com relação a todas as questões anteriores, para não se desvencilhar do seu norte, que é o bom senso.”147
O § 3º do art. 10 da Lei 10.192/2001 estabelece que iniciada a mediação,
deverá ser concluída em 30 (trinta) dias, salvo acordo expresso entre as partes
interessadas.
O Ministério do Trabalho elaborou um Manual do Mediador, a fim de
orientar e informar as partes sobre a Mediação, que ocorre no âmbito das Delegacias
Regionais do Trabalho.
147 MELO, Raimundo Simão de. O Agravamento dos Conflitos Trabalhistas e a Demora da Prestação Jurisdicional: Algumas Causas e Soluções. Porto Alegre: Revista Síntese Trabalhista, n. 103 - jan. 1998, p. 12.
115
115
O processo de mediação inicia-se com a reclamação do empregado, atermada
pela DRT, com as informações relacionadas com o seu trabalho, o empregador,
jornada e salários, e outras declarações pertinentes. O formulário será assinado pelo
empregado e mediador.
A seguir, o empregador é cientificado da reclamação, por telefone ou carta, e
chamado a comparecer à Delegacia para prestar informações e apresentar proposta de
conciliação, dentro de um prazo mínimo de 5 (cinco) dias. Havendo acordo, as partes
assinam um Termo de Conciliação, contendo a solução do conflito e homologado pela
DRT.
Os fiscais do trabalho devem ficar atentos para que as normas trabalhistas
sejam observadas neste serviço. A mediação não pode, jamais, servir de meio para que
as empresas burlem seus deveres legais para com o empregado.
Não havendo acordo, lavra-se uma ata da reunião, contendo as propostas
apresentadas e rejeitadas pelas partes.
Indubitavelmente, a mediação nos conflitos trabalhistas constitui moderna
técnica de negociação assistida, traduzindo-se em inúmeros benefícios, consoante
obtempera Zoraide Amaral ao tratar do tema:
“Sem dúvida, são inegáveis os benefícios que traz este meio alternativo que, ao compor o conflito, consegue, entre outras vantagens, obter rapidez, eficácia de resultados, redução do desgaste emocional, redução do custo financeiro, garantia de privacidade, de sigilo, redução da duração, redução da reincidência de litígios , maior facilitação da comunicação, promoção de ambientes mais colaborativos, melhoria dos relacionamentos e maior compromisso das partes em cumprir um acordo por elas construídas.”148
Razão assiste a Autora supracitada, porquanto o mediador, pessoa imparcial,
preparada e de confiança das partes, nada impõe, mas estimula a criatividade das
partes na procura de opções para um acordo, buscando intercâmbio de posições e
148 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p. 216
116
116
opiniões, transformando adversários em colaboradores, conseguindo, na maioria das
vezes, restaurar a harmonia entre os litigantes. Além disso, a mediação é um processo
absolutamente informal, movido pelo bom senso, parcimônia, criatividade e muito
equilíbrio, sendo as soluções encontradas muito mais duradouras e personalizadas, daí
porque por meio dela obtém-se excelentes resultados no aprimoramento da
produtividade, qualidade dos produtos e melhora das organizações, prevenindo-se,
evidentemente, pleitos judiciais e conflitos internos.
Exemplo modelar destas assertivas é a experiência em Patrocínio-MG, onde,
por intermédio dos sindicatos dos trabalhadores e empregadores rurais, com estímulo e
apoio da Justiça o Trabalho daquela Comarca, criaram o Núcleo Intersindical de
Conciliação Trabalhista Rural de Patrocínio. Cônsono em Antônio Gomes de
Vasconcelos149, referido órgão é de constituição privada, supra-sindical e composição
paritária, fundamentando-se na autonomia privada, na livre associação e no
reconhecimento da negociação.
O modelo de Patrocínio destaca-se na busca de maior conscientização e
informação, demonstrando e estimulando a boa-fé nas relações de trabalho, o que nos
leva a crença que as fraudes são reduzidas e os princípios tutelares do direito do
trabalho são mais respeitados. É palmar que num ambiente assim delineado os
conflitos levados à tutela estatal se reduzem significativamente, já que o escopo do
Núcleo Intersindical é o entendimento e harmonização das relações trabalhistas.
Segundo Antônio Gomes de Vasconcelos, os resultados obtidos são expressivos:
“A seção intersindical tem obtido grandes resultados e alcance social. Os acertos são realizados total e corretamente, mantém-se a harmonia entre as partes que se posicionam sempre com predisposição ao entendimento e à solução de suas pendências de forma bem mais intensa que no processo judicial; o empregador cumpre o acerto rescisório sem constranger o empregado a sujeitar-se a propostas imorais de acordo, perdura a paz e harmonia nas relações de trabalho, quando rompidas.”150
149 VASCONCELOS, Antônio Gomes de. Sindicatos na administração da justiça: o núcleo intersindical de conciliação trabalhista de Patrocínio e a institucionalização de equivalentes jurisdicionais – mediação e arbitragem voluntária. Temas de Direito e Processo do Trabalho. Belo Horizonte: Del Rey Editora, 1996, p. 30. 150 Ibidem, p. 31.
117
117
5.5 AS MESAS DE ENTENDIMENTO
As Mesas de Entendimento podem ser compreendidas como sendo um
método de composição dos conflitos trabalhistas alternativo à solução por meio da
justiça estatal. Seu procedimento é instituído no âmbito da fiscalização do trabalho
pela Instrução Normativa Intersecretarial nº 23, de 23 de maio de 2001, em
conformidade com o disposto no art. 17, item 2 da Convenção nº 81 da Organização
Internacional do Trabalho e com o art. 18 do Decreto nº 55.841, de 15 de março de
1965.
Referidos diplomas contém normas dirigidas aos Agentes da Inspeção do
Trabalho, no sentido de que considera como inserido entre os seus deveres: advertir,
aconselhar tecnicamente e orientar as partes envolvidas (empregado e empregador) a
cumprirem a legislação trabalhista.
Segundo as lições de Zoraide Amaral151, a Instrução Normativa nº 23 revela
“a preocupação do legislador com a atuação preventiva do auditor, colocando fim à
idéia de que a sua função era apenas de aplicar multa”. Esta mudança de paradigma
revela grande evolução, porquanto nas conturbadas relações entre capital e trabalho, o
fomento da prevenção e, sobretudo, educação para o respeito às normas trabalhistas
devem preceder à penalização, que não dá oportunidade do infrator adequar-se às
normas vigentes, sem amargar um prejuízo financeiro, que agrava, ainda mais, os
conflitos de interesses entre capital e trabalho.
Com efeito, embora os Auditores Fiscais, em sua maioria, travem
diariamente uma luta para dar cabo das inúmeras denúncias que recebem dos próprios
trabalhadores, dos sindicatos e mesmo do Ministério Público do Trabalho, o resultado
de suas ações nem sempre vem ao encontro do anseio social, isto porque o trabalhador,
151SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p. 219 .
118
118
diante da multa imposta ao patrão, guarda para si um sabor de insatisfação quanto à
efetivação de seu direito que, na maioria dos casos, continua desatendido. O
empregador, por outro lado, desespera-se, muitas vezes, diante da impossibilidade de
cumprimento da norma, agravada pelo ônus decorrente da autuação. A sociedade
perde, de modo geral, uma vez que o conflito existente entre as partes permanece. O
que se vê, portanto, é que o auto de infração, encarado como único instrumento de
efetivação da norma, nem sempre se mostra eficiente na obtenção do escopo maior que
deve ser buscado pela Inspeção do Trabalho: a manutenção da paz e justiça sociais,
traduzido pela observância do ordenamento jurídico vigente.
Na busca do escopo acima referido, a Mesa de Entendimento instituída
apresenta-se como mais um instrumento de que dispõe a fiscalização para o
cumprimento de suas obrigações.
Apreende-se na referida Instrução Normativa, tratar-se de uma alternativa,
não de uma obrigação.152 A decisão quanto a instauração ou não de uma Mesa de
Entendimento cabe precipuamente ao Auditor responsável pela ação Fiscal. Esta
discricionariedade é salutar, porquanto não obriga um procedimento em casos em que
a experiência, o histórico do empregador não propicia um entendimento, o que levaria
ao descrédito a atuação dos auditores.
O Auditor, dentro de sua capacidade, decidirá, conforme o caso, após um
diagnóstico, qual o instrumento mais eficaz a ser aplicado para atender as finalidades
do bem comum, sem, entretanto, perder de vista que o trabalhador não pode sofrer
prejuízos. Assim por exemplo, se o Auditor Fiscal constatar que a questão importa em
grave e iminente risco para o trabalhador, não poderá indicar o procedimento da Mesa
de Entendimento, conforme determina o § 2º do art. 1º da Instrução Normativa nº 23
de 23 de maio de 2001.
O procedimento da Mesa de Entendimento, portanto, é recomendado ao
Auditor-Fiscal do Trabalho - AFT, visando a compelir o empregador a sanear
152 Ibidem, p. 220.
119
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irregularidades de difícil solução153 durante a ação fiscal ou pela Chefia da
Fiscalização, para atender o planejamento das ações fiscais.
A Mesa de Entendimento deverá ser instalada no Ministério do Trabalho e
Emprego, e deverá ser precedida de comunicação ao Delegado Regional do Trabalho.
Os participantes da Mesa terão um prazo de 30 dias, contado da primeira
reunião, para concluir os trabalhos, podendo, no entanto, a critério da Coordenação da
Mesa, se prorrogado por 30 dias.
Findo o trabalho, os participantes firmarão um termo de compromisso,
contendo as cláusulas objeto do entendimento, e será fixado um prazo de 120 dias para
o saneamento das irregularidades.
Com escopo de dar efetividade ao Termo de Compromisso, durante o prazo
fixado para saneamento das irregularidades, o empregador será fiscalizado para a
verificação do cumprimento de suas cláusulas, sem prejuízo da fiscalização rotineira
de atributos não contemplados no referido Termo.
Caso o empregador venha desatender a convocação para a Mesa de
Entendimento, ou recusar-se a firmar Termo de Compromisso ou, ainda, descumprir
qualquer cláusula do Termo de Compromisso sofrerá fiscalização reiterada e se
persistir nas irregularidades, o Auditor Fiscal encaminhará ao coordenador da Mesa de
Entendimento relatório circunstanciado, com cópia dos autos de infração lavrados, no
prazo de trinta dias contados do início da ação fiscal, que por sua vez serão
encaminhados pelo coordenador para o Delegado Regional do Trabalho e Emprego,
que expedirá comunicação ao Ministério Público do Trabalho.
A instituição da Mesa de Entendimento, portanto, traduz em uma nova
postura da Fiscalização do Estado, propiciando a solução de conflitos trabalhistas já
em seu nascedouro. É sabido que no Brasil os trabalhadores, em sua grande maioria,
153 O § 1º do Art. 1º da Instrução Normativa n. 23 define o que é irregularidade de difícil solução: “Considera-se de difícil solução a situação em que o empregador não se adequar às normas trabalhistas, seja por recalcitrância, seja pela conclusão do AFT da existência de motivo grave ou relevante que venha impossibilitando a adequação.”
120
120
ajuízam reclamação trabalhista somente quando já se encontram desempregados, o que
não significa inexistência do conflito antes da ruptura contratual. Embora seja
explicitado nessa oportunidade, o conflito já existe de forma latente, no curso do
contrato, quando pode agir a fiscalização. Obtida a efetivação de um direito
descumprido pelo empregador durante a vigência de um contrato de trabalho,
soluciona-se o conflito, impedindo-o de desaguar numa Justiça do Trabalho já
profundamente sobrecarregada.
Sob todos os enfoques, portanto, a adoção de um novo perfil da Inspeção do
Trabalho propiciará o resgate de sua função institucional perfilhada
internacionalmente e consagrada na Convenção 81 da OIT, restabelecendo, inclusive,
a necessária sintonia entre a instituição e o Direito do Trabalho que ela propõe tornar
efetivo.
É bom que se diga, de outra parte, que a instituição da Mesa de
Entendimento não visa retirar do Inspetor do Trabalho o seu poder de polícia. Quando
investido de suas funções, representa o braço do Estado na manutenção da ordem e do
respeito às normas legais vigentes, dispondo, por isso mesmo, da capacidade de impor
sanções. O que se pretende é dotar o Ministério do Trabalho e Emprego de mais
instrumentos, ao lado dos já existentes, para permitir-lhe novos caminhos que levem,
efetivamente, ao atendimento das demandas da sociedade que ele busca proteger,
compondo, assim, os conflitos exsurgentes.
5.6 OS TERMOS DE COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA
Semelhante o que ocorre nas Mesas de Entendimento promovidas pela
Fiscalização Trabalhista, o Ministério Público do Trabalho formaliza adequação
consensual entre os integrantes de uma relação de emprego para cumprimento dos
121
121
comandos legais violados, cujo instrumento recebe a denominação de Termo de
Compromisso de Ajustamento de Conduta – TAC, que possui eficácia de Título
Executivo Extrajudicial, conforme veremos a seguir.
Como é cediço, o Ministério Público do Trabalho, da mesma forma que o
Ministério Público em geral, vale-se do instrumento do inquérito civil público para
promover a investigação e o levantamento de provas, quando há notícia de
descumprimento a direitos sociais trabalhistas difusos, coletivos ou individuais
homogêneos e também lesão à ordem jurídica. Ocorre, amiúde, que o inquérito
termina porque a parte inquirida resolve, voluntariamente e por consenso com o
Ministério Público, adequar-se aos ditames da ordem jurídica, firmando o Termo de
Compromisso de Ajustamento de Conduta ( TAC).
O TAC encontra-se sistematizado no art. 5º, § 6º da Lei nº 7.347, de 24 e
julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública), introduzido pelo art. 113 da Lei nº 8.078,
de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor).
Consoante sistemática da Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000, que alterou
o art. 876 da CLT, os Termos de Compromisso de Ajustamento de Conduta, que neste
diploma legal recebeu redação de “Termos de Ajuste de Conduta”, firmados com o
Ministérios Público do Trabalho, foram considerados títulos passíveis de execução na
Justiça do Trabalho.
Os TACs são, sem nenhuma dúvida, meios extrajudiciais de composição de
conflitos com natureza jurídica de título executivo extrajudicial (art. 585, inc. II do
CPC, c/c art. 876, da CLT e Lei nº 8.078, de 1990, art. 113 c/c Lei nº 7.347, de 1985,
art. 5º, § 6º).
Como meio extrajudicial de composição de conflitos, a natureza jurídica da
técnica, ou da atividade desenvolvida pelos TACs pode, segundo escólio de Lutiana
Nacur Lorentz, “ter a forma de autocomposição (quando o Ministério Público do
Trabalho é parte), ou de mediação (quando o Ministério Público é um terceiro entre as
partes), ou de arbitragem (também no caso do Ministério Público ser um terceiro entre
122
122
as partes).”154
Impende ressaltar, entretanto, que atividade arbitral redunda à prolação de
uma sentença arbitral que careceria de executibilidade, já que existe regra jurídica
restritiva de admissão de títulos executivos no processo trabalhista, nos exatos termos
do art. 876 da CLT. Assim sendo, embora a técnica da arbitragem seja possível perante
ao Ministério Público do Trabalho, esta deverá tomar forma jurídica de TAC, com
escopo de conferir executibilidade ao instrumento perante a Justiça Trabalhista.
Como método alternativo de composição de conflitos trabalhistas, Lutiana
Nacur Lorentz destaca o dever do respeito aos princípios tutelares do direito do
trabalho, aduzindo que:
“Porém, ressalte-se que em ambos os casos, ou seja, tanto no caso de o TAC traduzir uma atividade, tanto técnica de mediação quanto de arbitragem (nesta principalmente, porque importa numa decisão), tais atividades só poderão ser desenvolvidas com total respeito aos princípios basilares do direito do trabalho, da proteção, da indisponibilidade e da imperatividade, sob pena de nulidade do termo.”155
Urgi ressaltar que o Ministério Público num inquérito e diante de um
investigado não defende direitos próprios, mas, dentro de suas prerrogativas, direitos
difusos, coletivos, ou individuais homogêneos ( Lei nº 8.078, de 1990, art. 81, incisos I
a III), na hipótese de o TAC desenvolver a atividade de uma autocomposição, ao
mesmo somente é permitido fazer concessões sobre o modo, tempo e lugar, enfim, as
condições para que o investigado cumpra as normas legais, de maneira completa, ou
seja, restitua o respeito aos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos,
sendo-lhe defeso transacionar sobre o conteúdo das regras, que redundaria em
ilicitude, dado o caráter de extrema indisponibilidade material do direito envolvido,
154 LORENTZ, Lutiana Nacur. Métodos Extrajudiciais de Solução de Conflitos Trabalhistas. São Paulo: LTr, 2002. p.102 155 Ibidem, p 102.
123
123
neste sentido, Mancuso156 e Correia157.
Ponto importante e que tem gerado dissenso entre alguns doutrinadores é
questão de saber quem, além do Ministério Público, é parte legítima para celebrar
termo de ajuste de conduta – TAC.
Consoante o art. 5º, da Lei nº 7.347, de 24 de junho de 1985, O Ministério
Público, a autarquia, a empresa pública, fundação, sociedade de economia mista ou
associação podem propor Ação Civil Pública.
Por sua vez, o parágrafo 6º do art. 5º da lei em comento, estabelece que “os
órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de
ajustamento de conduta”.
É forçoso questionar, em face da redação do art. 5º, da Lei nº 7.347, de 24 de
junho de 1985, se todos os legitimados para moverem Ação Civil Pública estariam
também legitimados para celebração de termos de ajuste de conduta ?
Para alguns autores como José Marcos Rodrigues Vieira158 e Zoraide Amaral
de Souza159, a resposta é positiva, reconhecendo que tanto o Ministério Público, quanto
a administração pública direta, indireta e fundacional e as associações poderiam
celebrar, validamente, termos de ajuste de conduta.
Diferentemente, Lutiana Nacur Lorentz160 e Hugo Nigro Mazzilli161,
entendem que as associações (e, por conseqüência, os sindicatos) não poderiam
celebrar termos de ajuste de conduta, porque a regra jurídica limitou tal prerrogativa
aos “órgãos públicos legitimados. Da mesma forma a administração indireta, ou seja,
empresas públicas e sociedades de economia mista e seus órgãos também não teriam
156 MANCUSO, Rodolfo de Carmargo. Ação Civil Pública. 5ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997, pp. 177-178. 157 CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. Direito Processual Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1998, pp. 29-30. 158 VIEIRA, José Marcos Rodrigues. Ação Civil Pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, pp. 229-230. 159 SOUZA, Zoraide Amaral de. Op. cit. p. 222. 160 Ibidem, p. 108. 161 MAZZILLI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo. 11ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999, pp. 205-207 .
124
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legitimidade, isto porque não têm natureza jurídica pura de “órgãos públicos”, tendo
em vista seus objetivos de lucro e não de proteção ao interesse público, na forma do
art. 173 da Constituição do Brasil.
Este trabalho comunga o entendimento da legitimidade da Administração
Indireta e das associações, isto porque, em que pese a redação do §6º do art. 5º da Lei
nº 7.347, de 24 e julho de 1985 referir-se expressamente que “os órgãos públicos
legitimados”, não é da melhor hermenêutica a utilização da interpretação literal, mas
sim a sistemática e teleológica. Sem querer aprofundar muito nesta ciência,
acreditamos que a velha máxima “de quem pode o mais, pode o menos”, permite uma
interpretação que o espírito da lei foi o de ampliar o leque dos legitimados e não
restringir, harmonizando-se com o paradigma do Estado Democrático do Direito
adotado em nosso modelo Constitucional.
Do exposto, considerando-se, ainda, a importância e necessidade de
estímulos ao desenvolvimento de métodos alternativos de solução de conflitos e, mais
ainda, a necessidade de controle e educação para o cumprimento das normas públicas
das relações de trabalho, os TACs apresentam-se como importantíssimo instrumento
jurídico que devem ser utilizados, não só pelo Ministério Público do Trabalho, mas
por todos os demais legitimados para ação civil pública, ampliando a possibilidade de
composição de conflitos por "outros mecanismos", no dizer de Zoraide Amaral162, sem
ser pela via Judicial.
162 Ibidem, p. 223.
125
125
6. A JUDICIALIZAÇÃO DO CONFLITO DE INTERESSE
TRABALHISTA
A judicialização dos conflitos de interesses, expressão forjada pela
sociologia jurídica, significa a transferência do conflito social para o judiciário163,
dando início ao ativismo judicial ao mesmo tempo em que as autoridades
administrativas adotam procedimentos semelhantes aos judiciais164. Representa a
crescente invasão do direito na organização da vida social e política165. O surgimento
de novos direitos difusos e coletivos, de novos procedimentos judiciais como o juizado
de pequenas causas, de novos poderes como os do atual Ministério Público, todos em
função da democratização que culminou no Brasil com a Constituição Federal de
1988, têm contribuído para a judicialização crescente das relações sociais em nosso
país.
O direito do trabalho sempre foi considerado pioneiro na formulação de um
direito especial, que quebrou o aspecto formal e individualista do próprio direito,
desformalizando-o , através de sua feição coletiva e de proteção. Podemos afirmar que
a judicialização começou cedo na Justiça do Trabalho, fruto da ascensão dos
movimentos reivindicativos de classe, principalmente por meio dos sindicatos. Nas
décadas de 30 e 40 surgiram o direito coletivo do trabalho, a ação coletiva trabalhista,
as juntas de conciliação e julgamento com representação de empregados e
empregadores e com ritos rápidos e diretos. Os conflitos de classe foram 163 SORJ, Bernado. A Nova Sociedade Brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000, p. 114 164 TATE, Neal e VALLINDER, Torbjorn. The Global Expansion of Judicial Power. New York: New York University Press. 1995, p. 32. 165 VIANNA, Luiz Werneck. A Judicialização da Política e das Relações Sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan. 1999, p. 45.
126
126
encaminhados para a Justiça do Trabalho com objetivo de serem solucionadas por
meio pacífico. Oliveira Vianna166, um dos principais mentores da Justiça do Trabalho,
defendia-a enquanto “entidades administrativas providas de processualidade própria”.
Por outro lado, o fato de poder criar regras - o poder normativo a ela conferido -
também feriu a tradicional independência dos três poderes. O sucesso dessa justiça foi
tão grande que com a Constituição Federal de 1946 passou a integrar o Poder
Judiciário, levando para seu interior mecanismos participativos, embora corporativos.
Os novos direitos da época eram os direitos trabalhistas. Hoje, no entanto,
houve uma inversão com o surgimento de novos direitos coletivos difusos e que
procuram defender interesses de cidadania, mais voltados para setores discriminados e
para valores culturais e ambientais. Alguns dos novos interesses coletivos chegam a se
chocar com os dos trabalhadores, especialmente por meio da contraposição entre
indústria e meio ambiente. O próprio mundo do trabalho perde historicamente sua
importância.
Na segunda metade do século XX ocorreram fortes transformações nas
relações de trabalho. Algumas análises167 apontam para o fato do mundo ter vivido os
chamados 30 anos gloriosos do final da Segunda Guerra até a crise do petróleo na
década de 70. O Estado do bem-estar social entra em crise por ter aumentado suas
despesas com a redução da receita.
As transformações do mundo do trabalho são fruto da automação na
indústria, tornando-se desnecessária a constituição de grandes parques industriais com
enorme quantidade de operários. Assim, da mesma forma que o setor primário cedeu
espaço ao setor secundário, agora este cede espaço ao setor terciário, mais concentrado
no mercado que na produção. O tema “mundo do trabalho”, que envolve as relações de
trabalho, a organização sindical e a jurídica passa a ser questionado. Há certo consenso
sobre a diminuição da importância do trabalho fabril e operário no contexto
166 VIANNA, Oliveira. Problemas de Direito Corporativo. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. p. 102 167 Castel, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Petrópolis: Vozes. P. 129 ss.
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127
internacional. O fim do trabalho passa a ser profetizado168, como já o fora a História.
Outras análises procuram demonstrar que tais mudanças correspondem às novas
formas de exploração do trabalho, de exclusão social, com objetivo de abrir o mercado
e enfraquecer o Estado. Esta análise, segundo Ricardo Antunes169, é bem aceita no
Brasil.
Mais especificamente no âmbito das relações de trabalho, destaca-se a
redução do fordismo, que impunha ritmo de produção cadenciado. O cenário da
relação entre capital e trabalho deixa de ser o da grande concentração fabril, para
entrar em cena a acumulação flexível170. Em países como o Brasil aumentou o que
passou a ser chamado de terceirização e precarização do trabalho, com destaque ao
aumento da informalidade do trabalho, rotatividade de mão-de-obra e desemprego.
Diversos postos de trabalho e até categorias inteira de trabalhadores são suprimidos, o
que reflete no enfraquecimento dos sindicatos, principalmente os dos trabalhadores
mais braçais.
No âmbito internacional, com o fim dos regimes do bloco comunista e com a
hegemonia capitalista, o paradigma capitalista passou a ser o do tipo asiático, sem leis
protetoras do trabalho e com a conseqüente prevalência das leis do mercado. Esses
acontecimentos influenciam o direito do trabalho, que sempre foi calcado no princípio
da proteção do trabalhador. Teses a favor da livre negociação contratual, da
flexibilização contratual, crescem no campo do direito. No Brasil, no final do ano de
2001 a Câmara, sob caloroso debate e com enorme acompanhamento da mídia, aprova
o projeto de flexibilização da CLT (PL 5.483/01). Mas com a eleição de Lula o projeto
foi arquivado. Em agosto de 2003 o projeto de terceirização (PL 4.302/02) só não foi
aprovado em função da constituição do Fórum Nacional do Trabalho, onde o governo
pretende concentrar os debates da reforma trabalhista. Todavia, a MP 130 de 168 RIFKIN, Jeremy. O fim dos empregos. São Paulo: Makron Books, 1996, p. 28. 169 ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses do mundo do trabalho. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 1997, p. 54. 170 HARVEY, David. Condição pós-moderna. Uma Pesquisa sobre as Origens da Mudança Cultural. Trad. Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. São Paulo: Edições Loyola, p. 135 e ss.
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17.09.2003 veio a permitir o desconto em folha de dívidas de empréstimos a serem
feitos pelos trabalhadores em instituições financeiras, o que enfraquece um antigo
princípio de impenhorabilidade do salário.
Este fenômeno político, social e econômico de grande e rápidas
transformações tem contribuído para a judicialização crescente das relações de
trabalho, redundando numa crise sem precedentes na Justiça do Trabalho, conforme
análise no tópico seguinte.
6.1 A CRISE NA JUSTIÇA
A antiga e generalizada queixa contra a ineficiência do Judiciário brasileiro,
incluída a Justiça do Trabalho, principalmente em razão de sua exagerada morosidade,
não é problema característico apenas do Brasil, mas sim uma certa universalidade,
conforme atesta Barbosa Moreira:
"Sem de longe insinuar que isso nos sirva de consolo, ou nos permita dormir o sono da boa consciência, ouso assinalar que o problema é praticamente universal e alarma não poucos países do chamado primeiro mundo. Há décadas freqüento congressos internacionais de Direito Processual e não assisti a nenhum em que não ouvisse a propósito gemidos e lamentações, vindos dos mais diversos quadrantes." 171
Este fenômeno emblemático desenvolve-se a partir do momento em que o
Estado moderno, sobretudo a partir do século IX, não mais adota o pensamento liberal,
segundo o qual deve agir como mediador de conflitos individuais e sociais.
Prevalecem, hoje, as idéias do Estado Social, que tem como meta o bem comum,
intervindo, quando necessário, na ordem social e na ordem econômica. A Constituição
171 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O futuro da justiça. Alguns mitos. Rio de Janeiro: Revista da Associação dos Magistrados Brasileiros, V.4, n.8. p. 7, 1º sem. 2000
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da República Federativa do Brasil de 1988 destaca claramente seus objetivos sociais
nos artigos 1º, 3º e 193, incluindo-se a função jurisdicional, pela qual se visa realizar a
justiça.
Consoante advertem Cintra, Grinover e Dinamarco, o Estado moderno, hoje,
tem como escopos: a ordem econômica, a ordem política e a ordem social. Prosseguem
os autores aduzindo:
“A pacificação é o escopo magno da jurisdição e, por conseqüência de todo o interesse processual (uma vez que todo ele pode ser definido como a disciplina jurídica da jurisdição e seu exercício). É um escopo social, uma vez que se relaciona com o resultado do exercício da jurisdição perante a sociedade e sobre a vida gregária dos seus membros e felicidade pessoal de cada um (...) Afirma-se que o objetivo síntese do Estado contemporâneo é o bem-comum e, quando se passa ao estudo da jurisdição, é lícito dizer que a projeção particularizada do bem comum nessa área é a pacificação com justiça.” 172
Neste sentido, o Brasil é um Estado Democrático de Direito (art. 1º, CF/88),
social (CF/88, arts. 1º, 3º, 5º, 7º, 8º, 193 etc.), voltado à realização do bem-comum ou
dos anseios sociais.
Entretanto, a realidade impõe verdades que devem ser reconhecidas e
debatidas. O formalismo processual já não mais acompanha a evolução e as alterações
céleres do comportamento social, da tecnologia de toda gama, das relações sociais e
jurídicas multifacetárias. A construção doutrinária acerca da jurisdição monopolítica
do Estado envelheceu. Fustigada pela realidade das relações humanas, do comércio
jurídico ou das relações jurídicas originadas da criação do gênio humano, exige
constante renovação e agilização, visando soluções céleres aos constantes conflitos
exsurgentes, tornou impensável o acesso à Justiça tal como se vêem modelados o
processo e o procedimento, ambos dotados de burocracia dispendiosa, desnecessária e
morosa, por conta de excessos ou rigorismos formais, ou sob o pálio do embuço da
172CINTRA Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER Ada Pellegrini e DINAMARCO Cândido Rangel. Op. cit., p. 25.
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proteção recursal revisional, exacerbada, porém, na sua teleologia.
Barbosa Moreira, escrevendo (na década de 80) sobre as tendências do
Direito Processual Civil, a esse respeito assevera, também, que:
"O trabalho empreendido por espíritos agudíssimos levou a requintes de refinamento a técnica do direito processual e executou sobre fundações sólidas projetos arquitetônicos de impressionante majestade. Nem sempre conjurou, todavia, o risco inerente a todo labor do gênero, o deixar-se aprisionar na teia das abstrações e perder o contato com a realidade cotidiana (...). sente-se, porém, a necessidade de aplicar com maior eficácia à modelagem do real as ferramentas pacientemente temperadas e polidas pelo engenho dos estudiosos."173
Assim é de reconhecimento geral que o monopólio do Estado-juiz já não
mais atende aos anseios dos jurisdicionados, razão porque outras formas jurídico-
processuais ou procedimentais devem ser postas em prática, sob pena de colapso na
prestação e na entrega da prestação jurisdicional, e de tornarem ínvias as atividades de
juízes, advogados e servidores do judiciário. Melhor disse Sálvio de Figueiredo
Teixeira, historiando a evolução da composição dos litígios individuais, escrevendo:
“A atividade processual (...) somente veio a definir-se como ramo do Direito em meados do século passado [XIX], na Europa Central, com o denominado ‘processualismo científico’, de onde tiveram início as grandes construções doutrinárias, até desaguar na fecunda fase atual do processo contemporâneo, com suas ‘ondas’, suas tendências e busca de soluções mais rápidas e eficazes, hoje uma inquietação mundial, ante a triste realidade da ineficiência das decisões judiciais, ensejada sobretudo pelo arcaísmo das organizações judiciárias e pela inexistência de órgãos permanentes de planejamento e reflexão no universo estatal do Judiciário.” 174
173 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Tendências contemporâneas do Direito Processual Civil. São Paulo: In
Revista de Processo, n. 31, jul./set. 1983. p. 199-209. v. 8. 174 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Op. cit. p.22.
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Neste sentido, João Oreste Dalazen, já há muito pugnava:
“a Justiça do Trabalho e o processo do trabalho brasileiros vivem uma crise estrutural sem precedentes: concebidos para outorgar justiça distributiva com agilidade e presteza, têm hoje, como tônica, paradoxalmente, uma dramática morosidade, exibindo pontos de estrangulamento insuportáveis à sociedade”175
Embora sejam amplos e fecundos estudos sobre alternativas de reformas do
processo, com escopo principal de maior celeridade e efetividade, as inúmeras
propostas sugeridas, quase sempre, encontram barreiras de difícil transposição,
sobretudo no que diz respeito ao princípio constitucional da ampla defesa e devido
processo legal. Cappelletti e Garth, discorrendo sobre o presente tema, também,
revelam esta preocupação, advertindo que:
"O maior perigo que levamos em consideração ao longo dessa discussão é o risco de que procedimentos modernos e eficientes abandonem as garantias fundamentais do processo civil – essencialmente as de um julgador imparcial e do contraditório."176
Com razão, uma justiça célere, panacéia mundialmente almejada, nem
sempre traduzir-se-á em uma prestação jurisdicional de efetiva qualidade, quando
reduz o contraditório e, via de conseqüência, aumenta o arbítrio do juiz – que no caso
brasileiro, de forma crescente, padece de confiabilidade, sobretudo pelo seu
despreparo e desapego às questões sociais dos conflitos humanos revelados nos
processos.
Conquanto reconheça-se a pertinência e relevância do embate sobre a
reforma processual, é, entretanto, inviável neste estudo o aprofundamento destas
propostas, teses e antíteses, que clamariam um estudo específico neste sentido, o que
175 DALAZEN, João Oreste. Reforma do processo trabalhista. In: Revista do Direito Trabalhista, Brasília: Consulex, ano V, n. 10, p. 16-21, 30 de Outubro de 1998. 176 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Op. cit. p. 163.
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desviaria o foco do presente trabalho. Não poderíamos, entretanto, deixar de registrar
que imputar ao sistema processual vigente como o vilão maior da causa da
morosidade da prestação jurisdicional brasileira é desviar a atenção, fechando os olhos
para outras causas que efetivamente contribuem para o colapso e conseqüente
morosidade da justiça. Ocorre que ao estudar as valiosas contribuições dos
processualistas no sentido de modernização processual, a nossa realidade e vivência
cotidiana no mundo forense deixa-nos uma estranha sensação de engodo, aumentando
nossa perturbação e inquietude. Afinal, o grande embate desenvolvido por parte dos
processualistas redunda numa formulação jurídica dogmática, como se o direito não
dependesse dos juízes, dos escrivães e dos oficiais de justiça, da esperteza dos
advogados e do senso moral de todas esses atores que compõem o grande teatro da
prestação jurisdicional.
Neste sentido, J. J. Calmon de Passos, com uma linguagem direta e
surpreendente, adverte:
“Diz_se tudo como se o cotidiano do foro e da vida social inexistissem ou, existindo, fossem irrelevantes, para o direito, quando a verdade única é justamente inversa ou seja, a de que enquanto permanecer gravemente enferma a nossa sociedade brasileira nenhuma ordem jurídica formal será salutar. Abstrair o social, o econômico, o político para parolar sobre o direito é incidir, em última análise, na falta de senso, para não dizer cinismo, daquele bêbado, que depois de haver, na véspera, ingerido garrafas e garrafas de vodka, intervalando muitas doses com o mastigar de algumas azeitonas solitárias, maldizia_se, diante da ressaca braba, que ameaçava vitimá-lo: Malditas azeitonas, malditas azeitonas! Nós, que temos perfeita ciência dos problemas graves que emperram a efetivação do direito entre nós, todos eles de origem estranha à dogmática jurídica, quando nos comprazemos em criticar os procedimentos e processos, as normas e os conceitos, em verdade nada mais estamos fazendo que camuflar o "porre" que tomamos, impotentes ou indiferentes diante dos problemas que realmente são problemas, atribuindo toda a culpa às formas e aos procedimentos, isto é, às pobres e inocentes azeitonas referidas pelo bêbado, mentindo a ele próprio e aos outros, mas faltando à verdade sem proveito nenhum, porque porre é porre e não é maldizendo as azeitonas que escaparemos do risco de nos termos deixado embebedar sem medida e sem controle.177
177 PASSOS, José Joaquim Calmon. A crise no Processo de Execução. São Paulo: Revista de Processo, 55/67 – 2001.
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De fato, ao ater-se apenas nos dogmas processuais, atribuindo-lhes toda a
culpa, ignorando as raízes do cotidiano social, econômico, político, sendo impossível
colher-se justiça onde impera a opressão, retidão de julgamento, onde campeia a
corrupção do bolso e do coração, senso de responsabilidade quando a coisa pública se
torna "cosa nostra" e quando se busca mais ter do que ser, agimos com cinismo ou
como tabaréus diante de tão graves problemas que contribuem de forma indissolúvel
para o colapso da máquina judiciária.
Dentro deste contexto, não poderia deixar de destacar a atuação da
magistratura como elemento de agravo da prestação jurisdicional, tendo em vista que
nas palavras de José Renato Nalini178 “o déficit de eficiência reconhecido como única
mácula consensual à administração da justiça resulta do anacronismo das idéias ainda
imperantes no universo jurídico”. Referido Autor em sua vivência como
desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, discorrendo sobre a reforma do
judiciário obtempera ser de suma importância a instalação da Escola Nacional de
Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados, a funcionar junto ao STJ, asseverando,
ainda, que:
"Se não houver um novo paradigma de juiz, não haverá reforma capaz de redesenhar a justiça brasileira.
...................................................................................................................... Essa missão atribuída à Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados. Dentre outras funções – ela será de fato um organismo voltado à educação da Magistratura – incumbe-lhe regulamentar os cursos oficias para o ingresso e promoção na carreira.
A dúplice incumbência é prenhe de relevância. A existência de cursos oficiais para ingresso na carreira pressupõe a necessidade de preparação do candidato à Magistratura. Não é tarefa da universidade oferecer juízes prontos e acabados para o Poder Judiciário. Este é que deve se encarregar do modelo de preparo – prévio ao concurso – para recrutar os quadros mais habilitados ao exercício da jurisdição no século XXI."179
178 NALINE, José Renato. Reforma do Judiciário: seqüência inadiável. Curitiba: Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, ano VI, n. 34, p 19, mar/abr. 2005. 179 Id., p. 20
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Nesta mesma esteira de pensamento que aqui se defende, urge perfilhar a
anotação de Santis Garcia em relação a magistratura, não só no aspecto jurídico, mas
também em seus aspectos psicológicos e sociológicos, onde assevera que:
"A rigor a preparação deste deveria começar nas próprias faculdades de Direito, não só no que diz com o aprimoramento do ensino, como no tocante a cursos e seminários especialmente dedicados à atividade jurisdicional, em nível de graduação ou de pós-graduação. Neles se daria atenção não apenas ao preparo jurídico, mas também aos aspectos psicológico e sociológico envolvidos no desempenho da judicatura, em termos de apurar no candidato as qualidades imprescindíveis ao seu exercício, que são, como lembra Pajardi, o equilíbrio, a firmeza de caráter, a objetividade, a imparcialidade, a resistência às sugestões, uma particular saúde psíquica, uma certa imunidade à emoção não separada de uma intensa humanidade, uma capacidade sã de crítica do comportamento humano, dentre outras."180
Quadra asserir, por pertinente, o escólio de José Renato Nalini:
"A convicção de que o profissional juiz precisa ser preparado e não resulta de geração espontânea é uma das idéias mais fecundas do século passado. Talvez a única chave capaz de transformar o Judiciário, de instituição acometida de certo autismo, em serviço público eficiente. O déficit de eficiência reconhecido como única mácula consensual à administração da justiça resulta do anacronismo das idéias ainda imperantes no universo jurídico.
A formação do profissional do direito continua centrada no positivismo, com uma visão puramente formal do positivismo legalista. Em lugar de uma cultura concreta da vida, erigiu-se uma cultura abstrata e dogmática. Em conseqüência, triunfou a burocracia como valor, e o sistema de justiça elevou-se à categoria de instituição e passou a ser considerado fim em si mesmo."181
De fato esta instituição autista posiciona-se distante dos destinatários da
atuação judicial mantendo os cidadãos à margem de sua funcionalidade. Quando,
entretanto, provocados a conectarem-se ao mundo real para efetivamente redundar em
um serviço público eficiente, o judiciário, em coro, justifica-se sob o auspício do
180 GARCIA, Dinio de Santis. A crise da justiça e suas causas. São Paulo: Revista da Escola Paulista da Magistratura, ano 1, n. 1, p. 162, set/dez. 1996. 181 NALINI, José Renato. Op. cit., p. 17.
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número reduzido de magistrados e serventuários e o elevado número de processos.
Este canto de sereia que seduz muitos autores de escol não traduz e muito menos serve
de justificativa para o mal que impera, de forma crescente, no colapso do judiciário.
Ao que parece, está vingando a velha receita nazista “repita uma mentira muitas vezes,
o quanto possível; enfim, ela vira uma verdade absoluta” . Embora reconheça-se que
faticamente há um número excessivo de processos, a desculpa, cada vez mais
crescente, do número de juiz não suporta a demanda processual deve ser revista e
observada com atenção e censo crítico, onde perceber-se-á que tal justificativa não
procede, ou, se procede, não o é na intensidade e efeitos propagados, tanto que,
segundo o então Presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, em entrevista
a Revista Veja , declarou que:
“na comparação com dados globais, o número de juízes no Brasil - 7,7 para cada 100.000 habitantes -, é superior à média internacional. No tocante a servidores do Judiciário, há uma quantidade até exagerada, mais do que o dobro da média de outros países. Apurou-se mais que os juízes constituem a categoria com maior padrão de vencimentos em nosso país.”182
Não obstante esses dados, ficou constatado que a justiça brasileira leva em
média doze anos para julgar um processo. Nossos magistrados, em que pese seu
elevado padrão de vencimentos, não mais dedicam-se com exclusividade à judicatura.
Dedicam-se longo tempo na produção de artigos, livros, palestras e na docência183
reduzindo, desta forma, seu tempo dedicado aos processos – é um contra-senso.
Comportam-se e lembram aquela péssima imagem que o funcionalismo público revela
ao povo brasileiro, qual seja: querem altos salários, sem entretanto, com as devidas
exceções, trabalhar.
182 Revista Veja, Ed. 09.05.2005 “O raio X da Justiça” , p. 44-47. 183 Há que se reconhecer que em relação a docência, embora ocupe o prazo de dedicação do magistrado aos processos, traz benefícios no sentido de atualização e aprofundamento dos dogmas, além da aproximação com o pensamento contemporâneo do mundo acadêmico.
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Este panorama crítico tende a piorar na Justiça do Trabalho, em face da
Emenda Constitucional de nº 45, conforme passaremos a seguir analisar.
6.2 OS EFEITOS DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004
A Emenda Constitucional nº 45, de 08.12.2004, publicada em 31.12.2004,
com vigência imediata, segundo dispõe seu art. 10, determinou profundas mudanças
no Poder Judiciário, com destaque especial para a competência da Justiça do Trabalho,
significativamente ampliada, atendendo aos percucientes reclamos da comunidade
jurídica nacional, sobretudo dos magistrados trabalhistas, que lutaram, e muito, pelo
fortalecimento político, em face ao temor pelas propostas de extinção desta Justiça
Especializada, conforme reconhece Oreste Dalazen, em artigo sobre este tema:
"Por derradeiro, havia uma justificativa política, sumamente relevante, em favor da ampliação da competência da Justiça do Trabalho: a necessidade de fortalecimento político da instituição, de uns tempos a esta parte com balida pela proposta de extinção. E esse fortalecimento se alcançou alargando-se os domínios da Justiça do Trabalho para o dissídio individual. Naturalmente, competência é poder."184
Impende observar que quando o Autor acima assevera que “competência é
poder” confirma um infundado, mas persistente e mal disfarçado complexo de
inferioridade dos magistrados trabalhistas, diante dos juízes de direito que somado ao
justificado temor decorrente da ameaça de extinção da Justiça do Trabalho, levou este
segmento a uma luta intensa, promovida pela ANAMATRA (Associação Nacional dos
Magistrados Trabalhista) junto ao Congresso Nacional para ampliação da competência
material, forma mágica encontrada para ganhar prestígio e combater o propósito
neoliberal de extinção.
184 DALAZEN, op. cit. p. 54.
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Deixando-se de lado as motivações políticas acima, a bem da verdade,
historicamente falando, a Justiça do Trabalho já possuiu competência para processar e
julgar os processos oriundos de questões que envolvessem diaristas e mensalistas da
União, dos Estados, do Distrito Federal, dos territórios, dos municípios e das entidades
autárquicas, que trabalhassem nas suas organizações econômicas, comerciais ou
industriais em forma de empresa, desde que não fossem funcionários públicos ou não
gozassem de garantias especiais, até que a Lei nº 1.890, de 13.06.1953, retirou diversas
destas questões do âmbito da competência material da Justiça do Trabalho. Algumas
matérias relativas ao Instituto de Previdência Social já foram objeto de apreciação da
Justiça do Trabalho. A Lei nº 5.638, de 03.12.1970, modificada pela Lei nº 6.825,
22.09.1980, passou a atribuir à Justiça Federal comum a competência para decidir
ações trabalhistas em que fossem partes a União, suas autarquias e as empresas
públicas federais. Como se vê, estes são alguns exemplos de que a competência
material da Justiça do Trabalho foi se perdendo na linha do tempo.
Ocorre que a história mais uma vez demonstrou que todas as questões que
envolvem, direta ou indiretamente, a relação de trabalho - e não apenas a relação de
emprego - devem ficar concentradas em um único lugar, sendo este lugar, sem dúvida,
a Justiça do Trabalho.
O aumento da competência material da Justiça do Trabalho já vinha se
alargando em termos de interpretação doutrinária e em sede de aplicação
jurisprudencial. Percebe-se, facilmente, a ocorrência gradativa de ampliação da
competência da Justiça do Trabalho. O Tribunal Superior do Trabalho tem abraçado a
tese ampliativa da competência por meio de diversas súmulas (antigos enunciados185),
como, ad instar, o de número 19 (quadro de carreira), o de número 189 (abusividade
de greve) e o de número 300 (cadastramento do PIS). Além de diversas orientações
jurisprudenciais a respeito deste aumento de competência, como nos dá notícia, por
185 Resolução TST nº 129, de 05.04.2005, DJU 20.04.2005, que altera a denominação dos verbetes da jurisprudência predominante do Tribunal Superior do Trabalho de "Enunciado" para "Súmula".
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exemplo, a Orientação Jurisprudencial nº 26 (complementação de pensão requerida por
viúva de ex-empregado), a Orientação Jurisprudencial nº 138 (competência residual,
transposição para o Regime Jurídico Único), a Orientação Jurisprudencial nº 141
(descontos previdenciários e fiscais), a Orientação Jurisprudencial nº 210 (seguro-
desemprego) e a Orientação Jurisprudencial nº 327 (dano moral).
Se a idéia já foi a de restringir a competência material da Justiça do
Trabalho, para limitá-la ao campo apreciativo das relações entre empregados e
empregadores, tal visão não mais se sustenta. Não há mais, no atual estágio em que
vivemos, justificativa plausível para a manutenção do entendimento no sentido de se
considerar a restritividade da Justiça do Trabalho no campo de sua atuação
jurisdicional.
A Emenda Constitucional nº 45, promulgada em 08.12.2004, em que pese as
motivações políticas, apenas cuidou de realizar um acerto de contas histórico,
devolvendo para a Justiça do Trabalho matérias que dela jamais deveriam ter saído,
além de ter-lhe acrescido outras tantas questões de competências.
Embora reconheça-se que historicamente a ampliação da competência
material da Justiça do Trabalho é o caminho lógico e natural vindicado pela
comunidade jurídica, sendo totalmente equivocada a interpretação dada por alguns
autores a redação do art. 114 da Constituição da República Federativa do Brasil no
sentido de restrição da competência ao litígios oriundos da relação de emprego, isto
porque o texto ora aprovado incorre em grave contradição, porquanto o inciso I do art.
114 declara competir à Justiça do Trabalho julgar os dissídios em geral emergentes de
“relação de trabalho”, já o inciso IX estatui que a Justiça do Trabalho pode julgar
“outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei”. Diante desta
redação defeituosa, poder-se-ia objetar que, se a competência da Justiça do Trabalho
para “relação de trabalho” repousará no próprio texto constitucional (inciso I), não
haveria por que se contemplar em outro inciso (IX) a possibilidade de a lei ordinária
estender essa competência a outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho.
139
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Poder-se-ia redargüir que de duas, uma: ou o inciso I alude impropriamente à relação
de trabalho, pretendendo referir-se tão-somente à relação de emprego, única
circunstância em que se compreenderia e justificar-se-ia a norma do inciso IX, ao
contemplar a possibilidade de a lei estender a competência para outras controvérsias
decorrentes da relação de trabalho, tal como sucedia em face da redação originária do
art. 114; ou o inciso I cometeu à Justiça do Trabalho competência para o litígio
advindo mesmo de qualquer “relação de trabalho” em sentido amplo , hipótese em que
o inciso IX despontaria ocioso , a toda evidência. A ociosidade deste inciso facilmente
se revela através de uma interpretação histórica do processo legislativo da EC 45/04,
onde, in tribus verbis, em Plenário, a Câmara dos Deputados aprovou destaque para
substituir a locução “relação de emprego” (locução aprovada na Comissão Especial da
PEC 96/1992) por “relação de trabalho”, olvidando-se, no entanto, de suprimir (porque
inútil e incompatível com o destaque apresentado e aprovado) o inciso (VIII da PEC,
atual IX) pelo qual a lei poderia estender a competência da Justiça do Trabalho para
outras controvérsias derivantes da relação de trabalho. Todo o processo legislativo da
EC 45/04 confirma que a mens legislatoris foi a de repelir a identificação da
competência material da Justiça do Trabalho estritamente com os dissídios emergentes
da “relação de emprego”. Houve, sim, deliberada vontade do Congresso Nacional,
expressa em sucessivos momentos, de alargar os horizontes da atuação da Justiça do
Trabalho, sobretudo no que se renegou a locução “da relação de emprego”, preferindo-
se a esta a locução, muito mais ampla e genérica, “da relação de trabalho”.
Esta ampliação de competência material não foi objeto de planejamento e
preparação estrutural da Justiça do Trabalho, diante de um conseqüente e inevitável
desencadeamento de uma inundação de novas ações de proporção gigantesca, ao qual
a fragilidade da organização trabalhista não terá como resistir.
Com a nova redação dada ao art. 114 da Constituição Federal, que atribuiu
e ampliou sua competência para processar e julgar controvérsias oriundas da "relação
de trabalho". Em decorrência desta atribuição genérica, indefinida, de difícil
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conceituação, passaram ao âmbito da jurisdição da Justiça do Trabalho, entre outros,
litígios que envolvam: prestadores de serviço; autônomos; representante comercial;
cobrança de honorários de profissionais liberais (advogados, médicos, dentistas,
contadores); leiloeiros; créditos de corretagem; trabalhadores de cooperativas;
trabalhadores em atividade informal; execução de contribuições sociais; dano moral (já
reconhecido pelos tribunais quando decorrente do contrato de trabalho) e patrimonial.
Como se não bastasse, a ampliação da competência transfere para a alçada da
Justiça do Trabalho a apreciação e julgamento das ações sobre representação sindical;
entre sindicatos, entre sindicatos e entre trabalhadores e sindicatos, e entre estes e
empregadores; litígios entre federações e confederações sindicais; habeas corpus,
habeas data; controvérsias sobre eleições sindicais; penalidades administrativas às
empresas impostas por órgãos de fiscalização por infração de normas trabalhistas;
questões oriundas do exercício do direito de greve, entre as quais interditos
possessórios decorrentes desta.
Tema polêmico, prestando-se a longas discussões, com repercussão na
duração dos pleitos, será também a aplicação no tempo da norma instituindo novas
competências, particularmente no que toca à competência residual de dezenas de
milhares de processos em curso nas justiças estadual e federal. A expressão "relação
de trabalho", que é usada de pelo legislador de forma vaga, imprecisa, genérica, poderá
ser freqüentemente confundida com relação de consumo, da qual nem sempre é fácil
distinguir, certamente dará azo a intermináveis controvérsias. Divergência de
interpretação ocorrerá sobre os trâmites processuais aplicáveis às novas hipóteses
regidas antes pelo direito comum, elastecendo ainda mais o tempo de duração dos
processos. Objeto de debate serão, por igual, os temas relativos a custas e honorários
de sucumbência, estes, até agora não admitidos pelos tribunais trabalhistas. Assinale-
se ainda que, segundo o texto promulgado da Emenda nº 45, a competência para os
conflitos entre servidores estatutários e a Administração Pública Direta também foi
transferida da Justiça Comum para a Justiça do Trabalho, competência esta, contudo,
141
141
suspensa por liminar deferida pelo STF.
Em suma, uma enorme gama de matérias das justiças federal e estadual foi
deslocada, para desafogo destas, para a esfera da justiça do trabalho.
Indo além, a ANAMATRA pleiteia que a PEC nº 385/05, denominada de
PEC Paralela da Reforma do Judiciário, em tramitação na Câmara dos Deputados,
acresça mais, às competências já reconhecidas e incorporadas à Constituição Federal, a
competência para julgar causas que envolvam questões previdenciárias em municípios
nos quais não exista Vara da Justiça Federal.
Teme-se que tão fundas e abrangentes inovações, verdadeiro salto de etapas,
provoquem o caos na justiça do trabalho, desaparelhada até para enfrentar suas atuais
atribuições. A maneira mais segura de inviabilizar uma reforma é ampliá-la em
demasia, torná-la excessivamente abrangente. Um sábio ditado popular adverte que
quem muito abarca pouco aperta. Com efeito, só se pode realizar em cada estágio o
que em cada estágio é possível. Como alerta Eduardo Couture186, o tempo se vinga
daquilo que se faz sem sua colaboração.
A reforma do Judiciário foi concebida e efetivada com o escopo principal de
possibilitar sua agilização, como, aliás, se deduz do preceito (art. 5º, LXXVIII)
dispondo que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável
duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação". Mas,
como tudo indica, na Justiça do Trabalho, a reforma produzirá resultado inverso,
tornando-a mais complexa e mais morosa.
Os operadores do direito, mesmo boa parte dos que atuam na área trabalhista,
ainda não se aperceberam dos efeitos e impacto resultante da profunda alteração
constitucional introduzida na justiça laboral, que se vê na iminência de perder seu
caráter especializado.
186 COUTURE, Eduardo Juan. Os mandamentos do advogado, tradução Ovídio Batista da Silva. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1979, p. 07.
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Num passado recente, no final dos anos 90, os partidários do neoliberalismo,
entre nós, pretenderam extinguir a justiça do trabalho, com a proposta de esvaziá-la e
deslocar suas atribuições e processos para a justiça federal. Não lograram tal intento.
Quem sabe se agora não estão vislumbrando a possibilidade de sua asfixia e
estrangulamento com o abarrotamento de atribuições e encargos, usando como
coveiros da instituição os próprios juizes, advogados trabalhistas e sindicatos?
Não é preciso clarividência para prever o risco de colapso com que, dentro
de alguns anos, se defrontará inevitavelmente a justiça do trabalho.
A radical e substancial alteração processada no art. 114 da Constituição
Federal é fato consumado, inarredável nessa altura. Resta, pois, aos juízes, tribunais,
advogados, entidades sindicais, enfim, a todos os operadores do direito e demais
interessados empenharem-se e mobilizarem-se para minimizar e absorver o impacto
das mudanças em questão, feitas inoportuna e precipitadamente, embora com a melhor
das intenções. Cumpre, portanto, unir esforços visando à absorção e implementação da
reforma ao longo do tempo, com o mínimo de tumulto, para evitar que o caos se
instale na justiça do trabalho.
Todavia, nenhuma reforma estrutural ou processual, nenhuma mudança
visando à agilização da máquina judiciária será eficaz enquanto parte dos juízes
continuar imbuída de uma cultura patrimonialista e corporativista, que emperra o
desenvolvimento da instituição que compõem. É preciso que muitos magistrados
abram suas mentes, tornem-se receptivos às mudanças, desprendam-se do misoneismo,
conscientizem-se de que o Judiciário não lhes pertence; convençam-se de que são
simples mandatários, e não mandantes da comunidade, que lhes remunera o trabalho
judicante. Persuadam-se, enfim, de que existem para atender à população, aos
jurisdicionados, e não o inverso.
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CONCLUSÃO
A crise do poder judiciário, destacando a morosidade como marca do seu
desempenho na solução dos conflitos, enseja o debate, além da reforma processual,
acerca de métodos alternativos de composição da lide, ganhando relevo maior, ainda,
quando se depara com os inevitáveis efeitos da Emenda Constitucional de nº 45/2004,
que ampliou a competência material da Justiça do Trabalho, sem entretanto, preceder
de qualquer planejamento estrutural e funcional para atender uma gama ingente de
novas ações, conclui-se que a levará, inevitavelmente, a um colapso, a não ser que
novas e urgentes medidas sejam tomadas.
A moderna idéia de acesso a justiça orienta e indica caminhos que devem ser
trilhados para alcançar uma justiça ao mesmo tempo célere e justa. Neste sentido e
dentro do quadro que se apresentam as relações trabalhistas no Brasil, a composição
dos conflitos exsurgentes, em especial os conflitos individuais, deve ser estimulada
através dos métodos alternativos, como a mediação, a arbitragem, a conciliação, as
mesas de entendimento e os termos de ajustamento de conduta.
A mediação demonstra ser um forte instrumento de composição dos
conflitos, ganhando relevo de seus princípios na instituição das mesas de
entendimentos e termos de ajustamento de conduta, que deveriam ser cada vez mais
estimulados, porquanto a composição do litígio dentro destes métodos traz a grande
vantagem pedagógica no sentido do cumprimento das normas trabalhistas antes da
ruptura contratual, o que reduz a judicialização do conflito, já que, na grande maioria
dos casos, a lesão ao direito laboral ocorre na vigência do contrato e não somente no
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seu termo.
A arbitragem, na forma em que se encontra regulamentada precisa de
algumas alterações para melhor adaptá-la ao conflito individual trabalhista, adotando
regras procedimentais que impõem e possibilitem ao árbitro assegurar a verificação
exata do objeto do litígio, para que não sirva de instrumento para legalizar o abuso do
poder econômico. Sendo importante, para este desiderato, a vedação de instauração de
juízo arbitral antes da apresentação da rescisão contratual aos órgãos competentes
(Ministério do Trabalho, Sindicato e etc.) que identificarão, dentro de suas
prerrogativas, se há ou não descumprimento de normas trabalhistas, possibilitando o
trabalhador hipossuficiente conhecer de antemão aquilo que denominamos de res
dubia e res litigiosa, vinculando, assim, o árbitro a conduzir o processo dentro dos
parâmetros estabelecidos na Lei nº 9.307/96, o que evitaria, em muito, qualquer
tentativa de fraude contra o sistema trabalhista vigente.
O artigo 21,§ 3º da Lei 9.307/96, onde expressa uma faculdade da parte
fazer-se representar por advogado, na arbitragem dos conflitos individuais entendemos
que deveria ser obrigatória a assistência - quer via advogados contratados por órgãos
de classe (sindicato), ou contratação particular, assegurando, assim, ao trabalhador
hipossuficiente a orientação necessária na direção de suas reivindicações, mormente
considerando-se os efeitos da sentença arbitral.
Por último e não menos importante, concluímos que se deveria alterar a
referida Lei de Arbitragem para que esta permitisse o reexame judicial de fundo de
sentença arbitral, dificultando, ainda mais, o desvio de conduta na utilização deste
importante meio alternativo de solução de conflitos, que hoje, infelizmente, é pouco
utilizado no Brasil, o que, pela pouca tradição na sua aplicação, não constitui entrave
ou, como dizem alguns, desuso, pois o tempo e os resultados da sua atuação
demarcarão a sua utilidade e auxílio a todos os operadores do direito.
A conciliação judicial dos conflitos individuais trabalhistas, sem dúvidas,
revela sua incontestável importância e traduz todo o espírito da composição destes
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litígios. Urge, entretanto, uma mudança de postura e filosofia dos magistrados
trabalhistas diante da homologação sistemática de acordos que na verdade traduzem-se
como verdadeira renúncia de direito pelo trabalhador - consciente ou imposta.
O critério quantitativo de solução dos conflitos na justiça do trabalho, onde
os Tribunais demonstram grande preocupação de apresentar em número os processos
resolvidos - quer sejam conciliados, quer sejam julgados, deve ser substituído pelo
critério qualitativo, buscando sim, tanto na conciliação ou no julgamento, distribuir
efetivamente justiça de qualidade, sob pena de negação do verdadeiro e correto sentido
de acesso à justiça.
A conciliação buscada pelas Comissões de Conciliação Prévia, instituídas
pela Lei nº 9958/2000 não tem apresentado bons resultados, havendo notícias de
desvios e fraudes contra o trabalhador.
A idéia de se obrigar a sujeição a uma comissão de conciliação como critério
de admissibilidade processual não é feliz, pois desvia o sentido da espontaneidade que
deve permear a pacificação de um conflito por este método. Acordo não pode ser
imposto. Deve ser resultado livre da vontade das partes.
Considerando a enorme disparidade econômico-financeira, social e cultural
entre as pessoas que se submetem às Comissões de Conciliação Prévia, urge uma
adequação na Lei nº 9.958/2000, sobretudo no que diz respeito à assistência jurídica do
trabalhador, acompanhamento de todo o procedimento conciliatório pelo Sindicato,
sobretudo nas Comissões de Empresa, entre outros mecanismos de controle para coibir
o mal-uso deste importantíssimo instrumento alternativo de solução de conflitos,
desafogando, assim, o judiciário trabalhista.
Mesmo com toda esta gama de métodos alternativos de composição de
conflitos, o Estado não pode se furtar da proteção do trabalhador e muito menos sob
embuste da celeridade de solução de conflitos negar e/ou dificultar o acesso à justiça,
devendo sim implementar reformas no judiciário trabalhista, com alterações
processuais, mais celeridade aos processos, maior qualificação dos magistrados,
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propiciando condições humanas e materiais para o melhor funcionamento da justiça.
O legislador tem obrigação de criar mecanismos que permita o democrático
equilíbrio nas relações entre capital e trabalho, fomentando a superação das
divergências jurídicas, sobretudo na vigência do contrato de trabalho.
Não se pode fechar os olhos para os desmandos que vêm ocorrendo, tanto em
nível judicial como extrajudicial, onde sob um falso manto de transação opera-se
graves prejuízos ao patrimônio do trabalhador e, o que é pior, gerando insegurança e
descrédito nas leis e no Estado, aumentando, ainda mais, a constante litigiosidade nas
relações trabalhistas.
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ANEXO A
OFÍCIO CIRCULAR 05/2004 - 54ª SUBSEÇÃO DA OAB/MG.
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ANEXO B
OFÍCIO Nº 002/FEVEREIRO/2004 .
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ANEXO C
CARTA DE ARAXÁ